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MUDANÇA NO CÓDIGO CIVIL

PUBLICADA LEI QUE PROÍBE CASAMENTO DE MENORES DE 16 ANOS


Foi publicada no Diário Oficial da União desta quarta-feira (13/3) a Lei 13.811, que altera o
Código Civil para proibir o casamento de menores de 16 anos. De acordo com a nova lei, o artigo 1.520 do
Código Civil passa a ter a seguinte redação: "Não será permitido, em qualquer caso, o casamento de
quem não atingiu a idade núbil, observado o disposto no art. 1.517 deste Código". Jovens com 16 ou
17 anos ainda podem se casar, mas precisam de autorização dos pais ou responsáveis
ANTIGO (excepcionalmente, será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a idade
núbil (art. 1517), para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez) -
A mudança foi aprovada em dezembro pelo Senado. No caso de jovens com 16 ou 17 anos, foi
mantida a possibilidade de se casarem, desde que autorizados pelos pais ou responsáveis. O projeto que
resultou na lei é de autoria da ex-deputada Laura Carneiro (DEM-RJ). Na justificativa, a deputada disse que,
segundo estudo da ONG Promundo, publicado em 2015, o Brasil é o quarto país em números absolutos com
mais casamentos infantis no mundo. Três milhões de mulheres afirmaram ter casado antes dos 18 anos.
Além disso, o estudo indica que 877 mil mulheres brasileiras casaram-se com até 15 anos de idade e que,
atualmente, existiriam cerca de 88 mil meninos e meninas (com idades entre 10 e 14 anos) em uniões
consensuais, civis e/ou religiosas no Brasil.

NOVAS LEIS PROÍBEM CASAMENTOS COM MENORES DE 16 ANOS NOS EUA

Desde sexta-feira (1º/7), meninas de 12 a 16 anos não podem mais se casar no estado americano de
Virgínia. Uma nova lei estabelece que a idade mínima para o casamento é 18 anos, embora adolescentes de
16 e 17 anos possam ser emancipados só por decisão judicial. De acordo com a nova lei, adolescentes nessa
faixa etária não podem mais ser emancipados pelos pais, que podem ser convencidos ou “comprados” pelo
noivo adulto. Uma possível gravidez da adolescente também deixou de ser um fator para justificar um
casamento de um adulto com uma menor, porque esse “recurso” vinha sendo usado por estupradores para
escapar da Justiça. Leis de seis estados americanos permitem o casamento de adolescentes com menos de
16 anos com o consentimento dos pais, de acordo com o The Washington Post, The Christian Science
Monitor e outras publicações. As Assembleias Legislativas da Califórnia, Maryland, Nova Jersey, e Nova
York pretendem aprovar projetos de lei semelhantes, a exemplo de Virgínia. A maioria dos estados permite
casamentos de adolescentes de 16 e 17 anos, com consentimento dos pais. E alguns estados estabeleceram
em lei que a idade mínima para o casamento é a de 18 anos.
O casamento com “crianças”, que foi tema do filme “Child Bride” (Noiva Criança), não é uma
raridade nos EUA. Só em Virgínia, de 2004 a 2013, cerca de 4,5 mil adolescentes, com menos de 18 anos, se
casaram. Mais de 200 eram meninas com menos de 15 anos, segundo os dados disponíveis. Em Nova
Jersey, 3.481 adolescentes se casaram entre 1995 e 2012 com consentimento dos pais. A maioria tinha 16 e
17 anos, mas 163 delas tinham de 13 a 15 anos e se casaram com aprovação judicial, quase sempre por
estarem grávidas. De todos os casos, 91% se casaram com adultos. Os defensores da lei argumentaram que a
antiga legislação, que permitia o casamento de “crianças” (90% meninas) com adultos encorajava
casamentos forçados, tráfico humano e estupro com violência presumida (statutory rape), em razão da idade
ou incapacidade da vítima, disfarçados em casamento. Um caso desses originou o projeto de lei em
Virgínia, que acabou com a aprovação judicial, praticamente automática, do casamento, devido à gravidez de
menores. O estupro de menor é punido com uma pena de prisão muito rigorosa. No entanto, se o estuprador
se casar com a vítima, depois de obtido o consentimento dos pais, o crime deixa de existir. E não há punição.
A senadora estadual Jill Holtzman Vogel foi informada que um cidadão de 50 anos, que mantinha relações
sexuais com uma estudante colegial, conseguiu permissão dos pais para se casar com ela, quando foi
descoberto — e, assim, as investigações foram encerradas. Posteriormente, se descobriu que essa foi a
segunda vez que ele usou essa tática. E o primeiro casamento com uma menor terminou em divórcio. A taxa
de divórcio nesses casamentos forçados é de 80%, disse a advogada Jeanne Smoot, do grupo Tahirih Justice
Center, ao Christian Science Monitor. A maioria resulta em violência física, psicológica, sexual e econômica
e, muitas vezes, em doenças físicas e mentais. A maioria também abandona os estudos e têm filhos com
maior frequência do que as demais mulheres. Isso vem acontecendo nos EUA há tempos, em grande medida
por “distração” da população e dos políticos. No entanto, em fevereiro, o youtuber Coby Persin publicou um
vídeo gravado na Times Square de Nova York, em que um homem de 65 anos desfilou e posou para fotos
com uma noiva de 12 anos. Não era de verdade. Era só uma espécie de “pegadinha”, inventada pelo autor
para alertar a população sobre essa realidade aterrorizadora do país. As pessoas se mostraram indignadas,
discutiram com o homem, que se defendia dizendo que tinha permissão dos pais dela e que era legal casar
com uma menina de 12 anos nos EUA. O vídeo se tornou viral na rede. Esse foi um alerta que a população
precisava para se informar sobre o assunto. E o que os americanos descobriram não foi nada animador. Por
exemplo, souberam que os Estados Unidos e o Canadá estão tão mal posicionados no mundo, em termos de
proteção a essas adolescentes, quanto o Afeganistão, Nigéria, Tanzânia e outros países da África. O Centro
de Política Mundial, organização que analisa políticas governamentais, afirma que 88% dos países do mundo
estabeleceram a idade mínima de 18 anos para casamento. Os EUA não estão entre eles. Por causa dos
países que não se preocupam com isso, 700 milhões de mulheres se casam ainda “crianças” no mundo. Isso
equivale a quatro vezes toda a população feminina dos EUA, de acordo com a Unicef.
O Projeto de Lei da Câmara dos Deputados 7.119/2017, enviado para sanção presidencial no dia 21
de fevereiro, propõe nova redação ao artigo 1.520 do Código Civil brasileiro. Considere-se, pois, o texto da
proposta:
“O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º O art. 1.520 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), passa a vigorar com a
seguinte redação: ‘Art. 1.520. Não será permitido, em qualquer caso, o casamento de quem não atingiu a
idade núbil, observado o disposto no art. 1.517 deste Código.’
Art. 2º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação”.
De acordo com as razões do PL da Câmara dos Deputados, “o Brasil é o quarto país em números
absolutos com mais casamentos infantis no mundo. (...). Mais do que isso, o estudo indica que 877 mil
mulheres brasileiras casaram-se com até 15 anos de idade e que, atualmente, existiriam cerca de 88 mil
meninos e meninas (com idades entre 10 e 14 anos) em uniões consensuais, civis e/ou religiosas no Brasil”.
Tais dados apresentados teriam sido obtidos em estudo conduzido por uma organização não
governamental chamada Promundo. De acordo com as razões do projeto de lei, existiria uma correlação
entre o casamento precoce e a gravidez na adolescência, o abandono escolar, a exploração sexual e outros
males. Ainda que as razões de projeto de lei, como é sabido, não tenham força cogente, não se pode deixar
de olvidar os alarmantes dados apresentados. Contudo, ao cotejar tais dados com a série histórica obtida pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, cabe questionamento em relação à metodologia utilizada para
a identificação de tais quantitativos.
Observando-se a série histórica brasileira em relação aos casamentos contraídos por mulheres de até
15 anos, desde 1992 até 2002, constata-se um consistente decréscimo ano após ano nos números
apresentados, o que, em princípio, contradiz as mencionadas razões do projeto de lei sob comento. O que nos
parece é que as razões apresentadas para a vedação absoluta do acesso ao casamento para aqueles que ainda
não atingiram a idade núbil não possuem força de convencimento e, ainda, o projeto de lei aprovado pelo
Senado Federal fere frontalmente preceitos constitucionais, havendo a Presidência da República de vetá-lo
integralmente. Senão, vejamos.
No regime jurídico atual, o acesso ao casamento para aqueles que ainda não alcançaram a
idade núbil encontra-se limitado à hipótese de gravidez, conforme prescreve o texto atual do artigo
1.520 do Código Civil: “Excepcionalmente, será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a
idade núbil (art. 1517), para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de
gravidez”.
Costuma-se dizer que a criança e ao adolescente são pessoas em desenvolvimento, de modo que não
devem ser compreendidos como categorias uniformes. Enquanto, na primeira infância, a criança é
completamente dependente e particularmente receptiva, verifica-se que a adolescência é o tempo “em que o
sujeito alcança a sexualidade adulta, aparta-se do ambiente familiar e adquire uma identidade estável na
sociedade”. Tal dinâmica é tutelada pelo direito fundamental ao livre desenvolvimento da personalidade, que
impõe às pessoas que exercem autoridade sobre o jovem o dever de levar em consideração as especificidades
desses diferentes estágios da vida.
O projeto de lei sob análise, todavia, recai em uma simplificação equivocada ao reputar como
igualmente inaptos para o casamento todos os que ainda não têm 16 anos de idade. De acordo com o
magistério de Carlos Alberto Bittar Filho, a gravidez desmente a alegação de imaturidade fisiológica dos
cônjuges; além de ser “melhor para o filho encontrar, ao nascer, um lar constituído do que deste ser privado
pela anulação do casamento dos genitores”. Destarte, a vedação ao casamento das pessoas com menos de 16
anos também viola o direito à convivência familiar assegurado à criança no artigo 227 da Constituição
Federal.
Ao vedar o casamento, o Estado criará uma situação paradoxal, uma vez que tais jovens, por serem
menores, continuarão sob o poder familiar de seus pais (CC, artigo 1.630), que terão o poder de determinar o
lugar da residência daquele grupo familiar, impedindo, por consequência, que as jovens mães possam
conviver livremente com seus companheiros e respectivos pais de seus bebês. O projeto de lei em questão
também ofende o princípio constitucional da paternidade responsável, insculpido no parágrafo 7º, do artigo
226, da Constituição, valendo notar que, na medida em que o texto constitucional também garante a
igualdade de direitos e deveres relacionados à sociedade conjugal (artigo 226, parágrafo 5º), onde se lê
paternidade responsável também deve se ler maternidade responsável.
Ora, caso seja promulgada tal lei, o pai ou a mãe com 16 anos incompletos, porquanto se encontrem
privados da possibilidade da obtenção da cessação da incapacidade pela via do casamento, não poderão
dirigir a criação e educação de seus filhos. Isso porque, como acima mencionado, ainda se encontrarão sob o
poder familiar de seus genitores, nos termos do artigo 1.630 do Código Civil. Em conclusão, com a
instituição de tal óbice ao casamento restará vulnerada a paternidade/maternidade responsável, já que os
jovens pais não poderão responder pela criação e educação de seus filhos, porquanto permaneçam sob o
poder familiar.
Ainda, a modificação da redação do artigo 1.520, do Código Civil brasileiro, também resultará na
violação do direito fundamental à igualdade, porquanto tal previsão termina por gerar uma injustificada
disparidade quanto ao tratamento dispensado a situações jurídicas idênticas. É que, tendo em vista a teoria
das nulidades textuais, as situações que permitem a decretação da anulação ou da nulidade do casamento
limitam-se àquelas previstas em lei. Diante da falta de previsão legal em sentido diverso, o casamento dos
que ainda não completaram a idade mínima para casar corresponde a uma hipótese de anulabilidade (Código
Civil, artigo 1.550, I). Entretanto, nos termos do artigo 1.551 do Código Civil brasileiro: “Não se anulará,
por motivo de idade, o casamento de que resultou gravidez”.
Assim, ao mesmo tempo em que o legislador termina por considerar válido o casamento de que
resultou gravidez em relação àqueles que não completaram os 16 anos, também impede o acesso ao
casamento para aqueles que ainda não completaram a idade núbil, mesmo que igualmente comprovada a
gravidez. Indubitavelmente, a sexualização precoce causa preocupação a toda sociedade brasileira. Contudo,
não será a proibição ao casamento que impedirá a iniciação sexual antes dos 16 anos. No sistema atual,
inclusive, deve-se atentar para o fato de que a celebração excepcional do casamento para as pessoas com
menos de 16 anos dá-se justamente porque existiu uma gravidez a justificar o pedido de suprimento judicial.
Os jovens com menos de 16 anos não deixarão, por decreto, de manter relações sexuais das quais possa
resultar a concepção, muito provavelmente.
No sentido de proteger os adolescentes de relações abusivas, poderia ser adotada uma medida
interessante como a da close-in-age exception, que se baseia na ideia de que pessoas com idade aproximada
“têm menor probabilidade de se aproveitar da idade um do outro, na medida em que se encontram,
usualmente, em condição semelhante de amadurecimento sexual, psicológico e cognitivo”. Assim, por
exemplo, apesar de um dos jovens ter apenas 15 anos quando da concepção do filho do futuro casal, o fato
de sua parceira ter 17 ou 18 anos demonstra que os dois se encontram em um estágio semelhante de
maturidade. O que é bem diferente de situações várias retratadas no cotidiano como a de uma jovem
paupérrima de 14 anos quase que forçada a casar com um homem de 40 anos que se aproveitou de sua
inexperiência.
Por fim, tal projeto de lei deve ser vetado sobretudo por ser inconstitucional, mas também por
inócuo. Observe-se, pois, que o texto proposto não contém cláusula de revogação tácita ou expressa. Com
isso, os demais dispositivos previstos no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente pertinentes
ao casamento dos que não alcançaram a idade núbil permaneceriam plenamente aplicáveis.
O artigo 1.520 do Código Civil brasileiro não é o único dispositivo de lei que confere poderes ao juiz
para suprir a capacidade para o casamento. De acordo com a regra contida na alínea “c” do parágrafo único
do artigo 148 do Estatuto da Criança e do Adolescente, “quando se tratar de criança ou adolescente nas
hipóteses do art. 98, é também competente a Justiça da Infância e da Juventude para o fim de: c) suprir a
capacidade ou o consentimento para o casamento”.
A Justiça da Infância e da Juventude, portanto, preservará a competência para suprir a falta de
capacidade para o casamento a fim de promover a proteção dos direitos reconhecidos por lei aos jovens.
Entretanto, a modificação da redação do artigo 1.520 do Código Civil terminará por ampliar as hipóteses de
suprimento judicial da idade núbil à falta de regra restritiva. É forçoso concluir, portanto, que a reforma
legislativa pretendida é inconstitucional e injustificável, além de inútil.

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