Nas três últimas décadas do milênio, em particular
na última, renasce o reconhecimento da relevância de empresas de pequeno porte, principalmente por sua capacidade de gerar empregos e mobilizar o desenvol- vimento regional, contribuindo para melhorar a distri- buição de renda e compensar desequilíbrios. Reconhe- ce-se, também, nas micro, pequenas e médias empre- sas (MPME) uma importante capacidade de gerar e in- COORDENAÇÃO DO corporar inovações, atuar nas áreas de tecnologias de PROJETO: ponta, assim como de gerar divisas. Acompanhando Helena M. M. Lastres tal tendência, vem crescentemente, ganhando maior José Eduardo Cassiolato destaque nos âmbitos internacional e nacional a defi- Marina Szapiro nição e implementação de novas políticas, formas e Sarita Albagli instrumentos de promoção destas empresas. Liz-Rejane Legey Cristina Lemos Relaciona-se, a seguir, um conjunto de pontos que, Maria Lúcia Maciel justificando a necessidade de repensar a contribuição que pode ser dada por MPME ao desenvolvimento eco- nômico, regional e social de um país, aponta para no- vas formas de incentivar a competitividade sustentada destas empresas.
1. São as próprias dificuldades decorrentes de condi-
ções econômicas adversas, problemas financeiros (entre eles, a falta de crédito adequado) e a eleva- da carga tributária, os principais motivos que le- vam muitas das micro e pequenas empresas à fa- lência, impedindo-as de realizar uma contribuição maior ao desenvolvimento. Portanto, verdades cris- talizadas ao longo do tempo estão sendo revistas, como a suposta insignificante contribuição dessas empresas para o desenvolvimento econômico e sua inerente alta taxa de mortalidade. Tais conclusões, na verdade, sinalizam e reforçam a necessidade de programas específicos que atendam de forma ade- quada aos requerimentos das MPE e confiram con- dições semelhantes de competição com as gran- des. 2. A aglomeração de empresas e o aproveitamento das sinergias coletivas geradas por suas interações, e destas com o ambiente onde se localizam, vêm efetivamente fortalecendo suas chances de sobrevivência e crescimento, cons- tituindo-se em importante fonte geradora de vantagens competi- tivas. A participação dinâmica em arranjos e cadeias produtivas locais tem auxiliado empresas de todo o tamanho, particularmente MPE, a ultrapassarem conhecidas barreiras ao crescimento das firmas, a produzirem eficientemente e a comercializarem seus produtos em mercados nacionais e até internacionais.
3. Diversas experiências atestam o maior dinamismo tecnológico e
o potencial de desenvolvimento de vários tipos de arranjos de pequenas empresas localizadas em um mesmo espaço regional: distritos industriais da Terceira Itália, do Vale do Silício na Califórnia e do Vale dos Sinos no Rio Grande do Sul, entre outros.
4. Arranjos e sistemas produtivos locais de MPME, existentes em
ampla gama de países, regiões e setores, têm se mostrado parti- cularmente importantes:
• nos casos em que os desequilíbrios regionais e a distribuição
de renda são grandes; • naquelas regiões e setores onde representam parcela signifi- cativa dos investimentos do setor privado e onde significam as principais oportunidades de emprego e de promoção do de- senvolvimento econômico local.
5. Os processos de aprendizagem coletiva, cooperação e dinâmica
inovativa assumem importância ainda mais fundamental para o enfrentamento dos novos desafios colocados pela difusão da cha- mada Sociedade da Informação ou Era do Conhecimento, crescen- temente globalizada.
6. Acompanhando tal reconhecimento, termos e conceitos – Distri-
tos, Pólos Industriais, Cadeias Produtivas, Clusters, Redes, Arran- jos e Sistemas Locais de Inovação, Eficiência Coletiva, Economi- as de Aglomeração, Economias e Aprendizado por Interação, Eco- nomia Associacional, Economia de Redes – passaram a exprimir as principais preocupações e alvos das novas políticas de promo- ção de desenvolvimento tecnológico e industrial.
7. As políticas dos países, particularmente dos mais avançados, as-
sim como organismos internacionais vêm crescentemente incor- porando essas tendências. As novas formas e instrumentos de promoção do desenvolvimento industrial e inovativo tendem, cada 12 vez mais, a focalizar, prioritariamente, um conjunto de empresas e outros agentes, assim como as articulações entre os mesmos, fonte primordial de sua força competitiva.
8. No Brasil, urge promover a renovação e o desenvolvimento de
novas bases produtivas, prioritariamente por meio da mobilização de arranjos de micro e pequenas empresas e empreendimentos. Trata-se, fundamentalmente, de contribuir para a geração de em- prego e renda, bem como de ampliar a competitividade sistêmica e sustentável da estrutura produtiva brasileira, tendo em vista os novos desafios associados à Era do Conhecimento.
O objetivo principal deste livro consiste em apresentar e discutir
um conjunto de proposições de estratégias de ação que contribuam para estimular, coletivamente, os sistemas e arranjos produtivos reu- nindo MPE, visando seu fortalecimento e o aprimoramento de sua competitividade de forma sustentada, dinâmica e condizente com as exigências do atual milênio.
Conforme desenvolvido e proposto pela Rede de Sistemas Pro-
dutivos e Inovativos Locais – RedeSist – neste livro utilizamos a seguin- te definição de arranjos e sistemas produtivos locais:
Arranjos produtivos locais são aglomerações territoriais de
agentes econômicos, políticos e sociais, com foco em um conjunto específico de atividades econômicas e que apresentam vínculos e inter- dependência. Geralmente, envolvem a participação e a interação de empresas – que podem ser desde produtoras de bens e serviços finais até fornecedoras de insumos e equipamentos, prestadoras de consul- toria e serviços, comercializadoras, clientes, entre outros – e suas va- riadas formas de representação e associação. Incluem, também, diver- sas outras instituições públicas e privadas voltadas para: formação e capacitação de recursos humanos, como escolas técnicas e universi- dades; pesquisa, desenvolvimento e engenharia; política, promoção e financiamento;
Sistemas produtivos e inovativos locais são aqueles arran-
jos produtivos cuja interdependência, articulação e vínculos consis- tentes resultam em interação, cooperação e aprendizagem, possibili- tando inovações de produtos, processos e formatos organizacionais, gerando maior competitividade empresarial e capacitação social.1
1 Para maiores detalhes ver www.ie.ufrj.br/redesist. 13
O conjunto de proposições discutidas e apresentadas contemplou os seguintes objetivos, selecionados pelos financiadores do projeto de pesquisa que originou este livro:
• promover a formação e o desenvolvimento da mentalidade em-
preendedora no país, assim como o desenvolvimento produtivo e inovativo de MPME, tendo em vista os desafios associados à Era do Conhecimento crescentemente globalizada; • estimular o surgimento de novos empreendimentos articulados em sistemas produtivos locais, como meio de contribuir para sua sobrevivência sustentada, inovatividade, maior capacitação, competitividade e internacionalização; • estimular a capacitação, inovatividade e associativismo dinâmico das MPME; • promover e consolidar os processos locais de aprendizado e de inovação conjuntos e dinamizar as interações entre parceiros, por meio da mobilização de agentes produtivos e outros atores rele- vantes nos arranjos locais; • incentivar a inserção das MPME na Sociedade da Informação, estimulando a atuação em áreas e segmentos de tecnologias de ponta e que vêm apresentando maior dinamismo na economia doméstica e internacional; • estimular a incorporação e a difusão de tecnologias, processos produtivos e formatos organizacionais avançados, inclusive por parte daquelas MPE que atuam em áreas mais tradicionais; • promover e apoiar a internacionalização de sistemas produtivos locais de MPME brasileiras; • contribuir para a descentralização das políticas, abrindo maior espaço para atuações nos níveis municipais, estaduais e regio- nais, atendendo aos objetivos nacionais de compatibilizar, articu- lar e coordenar tais políticas; • contribuir para a criação de novos empregos, para o crescimento econômico e para o desenvolvimento das regiões que abrigam os sistemas locais produtivos de MPME, assim como para a dimi- nuição de desigualdades regionais e sociais; • contribuir para resolver o tradicional problema de incompatibili- dade entre formas usuais de concessão de financiamento e exi- gências específicas das MPE, tratando as mesmas como um con- junto de agentes articulados, ao invés de uma coleção de atores individuais; • sugerir novas formas de financiamento para a promoção de ar- ranjos produtivos de MPE adaptados ao caso brasileiro (por exem- plo, a operacionalização de cluster banks) como forma de operacio- nalizar tais proposições. 14 Para tal, buscou-se identificar e analisar experiências internacio- nais relevantes, identificando desafios e oportunidades associados à difusão do novo padrão sócio-técnico-econômico que se mostram vitais para promover a competitividade sustentada de arranjos e sis- temas produtivos de MPME no Brasil. Neste esforço, objetivou-se:
• sistematizar e discutir, criticamente, as experiências bem sucedi-
das de diferentes países quanto ao estímulo às aglomerações de MPME, focalizando as novas formas e papel das políticas e instru- mentos de desenvolvimento industrial e tecnológico nos âmbitos local e nacional; • detalhar e discutir, especialmente, as novas engenharias finan- ceiras e formatos institucionais desenvolvidos e implementados em outros países, para a promoção de conjuntos de MPE e de- mais agentes dos arranjos produtivos locais; • tendo em vista as condições atuais e perspectivas de arranjos produtivos de MPME no Brasil, recomendar ações e instrumen- tos para promoção da competitividade de forma sustentada e adequada aos contextos econômico-produtivos peculiares das localidades onde se inserem e suas possibilidades de inserção internacional.
No plano internacional, foram investigadas as principais tendên-
cias de políticas adotadas por organismos internacionais, tais como o Banco Mundial, IFC, OCDE, ONU, Comunidade Européia, assim como aquelas praticadas por países como os EUA, Japão, Alemanha, Fran- ça, Inglaterra, Itália, Espanha, Finlândia, Israel, Coréia e alguns Lati- no-Americanos.
Deste esforço resultou a elaboração dos doze capítulos deste li-
vro, os quais versam sobre os seguintes temas respectivamente:
1. Políticas e Estrutura Institucional de Promoção das MPME.
2. Capacitação, Sensibilização e Informação em Arranjos e Sistemas de MPME. 3. Inovação em Arranjos e Sistemas de MPME. 4. Incubação em Arranjos e Sistemas MPME. 5. Cooperativas Populares em Arranjos e Sistemas de MPME. 6. Comércio Eletrônico em Arranjos e Sistemas de MPME. 7. Design em Arranjos e Sistemas Produtivos de MPME. 8. Internacionalização em Arranjos e Sistemas de MPME. 9. Formatos Organizacionais para Financiamento de Arranjos e Sis- temas de MPME. 10. Uma Nova Iniciativa para Fortalecer as Economias Locais: Banco de Arranjos Produtivo. 15 11. Instrumentos Financeiros para Arranjos e Sistemas de MPME. 12. Microfinanças em Arranjos e Sistemas de MPE.
Dentre as principais motivações para a implementação de políti-
cas de promoção de arranjos de MPME no Brasil incluímos, em pri- meiro lugar, a busca por um melhor posicionamento do país no atual cenário mundial.
Em segundo lugar, apontamos para a importância da reconstru-
ção da estrutura produtiva brasileira em novas bases, de modo a pos- sibilitar o atendimento de prioridades nacionais, regionais e locais. Por um lado, objetiva-se potencializar as sinergias positivas entre agentes produtivos e demais parceiros, o uso e a difusão das novas tecnologias e formatos organizacionais e os programas de promoção de integração regional. Por outro, visa-se gerar soluções para proble- mas como o desequilíbrio do Balanço de Pagamentos, a crise ener- gética, etc.
Em terceiro lugar, destacamos o ambiente mais favorável ao cres-
cimento de pequenas empresas, particularmente a partir do desen- volvimento e implementação de programas de financiamento ade- quados às suas necessidades e características, incluindo as experiên- cias com agências e mecanismos de financiamento a conjuntos de empresas e outros agentes (como cluster banks).
Finalmente, destacamos a oportunidade de uma agência como o
SEBRAE – por sua capilaridade e capacidade de mobilizar parceiros locais – articular uma política de abrangência nacional que seja implementada a partir de uma abordagem baseada em arranjos e sis- temas produtivos locais.