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CENTRO UNIVERSITÁRIO DA GRANDE FORTALEZA

FUNDAMENTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS DE


HISTÓRIA

Fonte: https://brasilescola.uol.com.br/historia/

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M149f

MACHADO, Adriano Silveira. BEZERRA, Ana de Sena Tavares

Fundamentos Teóricos e Práticos do Ensino de História / Adriano Silveira Machado.


Ana de Sena Tavares Bezerra – Fortaleza: FGF, 2019.

102 p. Imagens coloridas.


ISBN: 978-85-8467-066-6

1. Ensino de História. 2. Teoria e Prática - História. 3. Fundamentos teóricos – História. I. Título

CDD: 372.89

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SUMÁRIO

UNIDADE 1 – HISTÓRIA E SEUS CONTEXTOS........................................ 04

Tema 1 – O estudo das Ciências Humanas: História e Geografia........................ 04

Tema 2 – História para a Educação Infantil: parte 1............................................ 20

Tema 3 – O estudo da História no 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental - 20


Conceitos fundamentais: o fator histórico, o sujeito histórico e o tempo
histórico................................................................................................................

Tema 4 – A História e as propostas dos Temas Transversais: História e 30


cidadania, eixo de trabalho..................................................................................

Tema 5 – A seleção de conteúdos e fontes e a importância dos conhecimentos 41


históricos..............................................................................................................

Tema 6 – Os calendários.................................................................................... 71

UNIDADE 2 – HISTÓRIA, TEMPO E DIVERSIDADE CULTURAL ........ 71

Tema 1 – A compreensão do fenômeno "tempo"................................................ 52


Tema 2 – Observando a Lua................................................................................ 62

Tema 3 – A história da criança no contexto social.............................................. 96


Tema 4 – Diversidade cultural............................................................................ 85
Tema 5 – Surgimento da humanidade.............................................................. 91
Tema 7 – Memória e identidade......................................................................... X

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FUNDAMENTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS DO ENSINO DE HISTÓRIA

UNIDADE 1 - HISTÓRIA E SEUS CONTEXTOS

Objetivo Geral da unidade

Compreender o papel do ensino de história na educação Infantil


Identificar metodologias de trabalho para Educação Infantil
Compreender o papel do ensino de história no Ensino Fundamental
Trabalhar o conceito de fato histórico
Trabalhar conceito de sujeito histórico
Trabalhar o conceito de tempo histórico
Analisar o papel das fontes históricas
Analisar a importância dos conhecimentos históricos
Compreender o fenômeno de tempo
Compreender o conceito de tempo
Compreender o papel da contagem do tempo na história na humanidade
Analisar o fascínio que a lua exercesse sobre o homem.
Relacionar a lunação com a forma do homem conta o tempo.
Analisar a origem do calendário
Identificar os tipos de calendário
Estabelecer a diferença entre calendário de base lunar, solar e lunissolar.
Relacionar o uso do calendário a questões religiosas
Compreender a criação do calendário como uma questão social.

1. História para a Educação Infantil: parte 1

Objetivo do tema

Identificar o conceito de infância


Analisar as mudanças no conceito de infância
Relacionar a reformulação do conceito de infância e as transformações sociais.
Identificar o papel da história na Educação Infantil

Introdução

O primeiro tema deste capítulo, visa discutir o ensino de história na educação


infantil. Mas, quem é essa criança? Qual a história vem sendo ensinada nas nossas
escolas? Para compreendermos melhor essa questão é fundamental que se compreenda
que o conceito que temos de criança hoje, não é o mesmo que se tinha a 100 anos.
Embora o conceito de infância comece a passar por mudanças por volta do século
XIII, é somente no século XX que começam a serem formuladas leis com o intuito de
proteger a criança e garantir que a mesma seja protegida durante essa importante etapa da
vida.

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Da mesma forma que o conceito de infância passou por mudanças ao longo da
história, a educação a ser dada a essa criança, também foi ser modificada ao longo da
história, bem como a criação de politicas educacionais voltadas para garantir o acesso e
a permanência da criança na escola.

1.1. Construção Social do Conceito de Infância.

Bartolomeu Vivari- Madonna


Esta Foto de Autor Desconhecido está licenciado em
Col bambino CC BY-NC-ND

Quando pedimos a uma pessoa nos dias atuais que use palavras para se referir a
infância. Provavelmente ela citaria palavras como: alegria, brincadeira, espontaneidade e
etc. Mas, essa concepção de infância é relativamente nova e não pode ser vista de maneira
absoluta, pois as crianças que vivem em periferias de grandes cidades, ou em regiões
remotas do mundo, enfrentam problemas graves como a fome, a violência, culminando
com a perda do encanto infantil as vezes muito cedo, pois se ver obrigada a lutar para
sobreviver.
Mas, apesar dessas discrepâncias em torno da infância, é importante que se
compreenda que o conceito de infância tal como vemos hoje, como sendo “Período da
vida, no ser humano, que vai desde o nascimento até o início da adolescência; meninice,
puerícia” (Dicionário http://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-
brasileiro/inf%C3%A2ncia/), é um conceito relativamente novo e que foi sendo construindo
ao longo dos séculos.
Segundo Caldeira (2015) na Idade Média, até volta do século XII, as crianças eram
vistas como adultos em miniatura, e não havia por parte da família uma preocupação
especifica com essa fase da vida. Essa situação pode estar ligada as condições de vida na
Idade Média, que gerava muitas vezes uma situação de descanso dos pais em relação as

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crianças, já que a mortalidade infantil na primeira infância era muito elevada (Caldeira
2015). Nesse período a criança não era percebida como um ser com necessidades básicas
inerentes a sua condição, segundo Henick, e Fária (2015, s/pag), a criança
[....], não passavam pela fase de brincar, estudar e se divertir como ocorre com
crianças da sociedade atual, ou seja, não experimentavam o período da infância
e juventude. A educação escolar era apenas de técnicas, de aprender o como
fazer, assim, a criança tinha sua formação em meio aos adultos, realizando as
mesmas tarefas que eles, carregando as mesmas quantidades que eles, sem
diferenciação alguma

Muitas vezes esse processo de aprendizagem ocorria longe do seio da família.


Corroborando com as autoras, Arié (1986, pág. 10), destaca que
A transmissão dos valores e dos conhecimentos, e de modo mais geral, a
socialização da criança, não eram, portanto, nem asseguradas nem controladas
pela família A criança se afastava logo de seus pais, e pode-se dizer que durante
séculos a educação foi garantida pela aprendizagem, graças ã convivência da
criança ou do jovem com os adultos. A criança aprendia as coisas que devia
saber ajudando os adultos a fazê-las.

Essa ausência de compreensão das características e necessidades especificas da


criança podiam ser percebidas inclusive na arte medieval, pois de acordo com Ariés
(1986, pág. 50) “até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a infância ou
não tentava representá-la. É difícil crer que essa ausência se devesse à incompetência ou
à falta de habilidade. É mais provável que não houvesse lugar para a infância nesse mundo
(pág. 50)”.
O reconhecimento da infância como uma etapa que requeria cuidados específicos
só ocorreu a partir do século XV, quando começa a surgir por parte de famílias mais
abastadas uma preocupação com a educação dos filhos e a garantir de manutenção do
status das famílias, surgem os colégios internos, destinos especialmente a educação dos
meninos. As meninas dessas famílias eram educadas por preceptoras, que deveria lhes
ensinar, a ler escrever, falar algum idioma e prepara-las para administrarem uma casa.
As mudanças mais amplas no que tange a educação das crianças, só ocorre a partir
do século XVIII, com a Revolução Francesa, pois os “governos começaram a se
preocupar com o bem-estar e a educação das crianças.Com isso se estabeleceram escolas
de “pequenos” e creches para os filhos dos trabalhadores” (Levin, 2002, pág. 253).
No entanto, as práticas pedagógicas utilizadas ainda eram bem arcaicas, utilizava-
se o castigo físico com as crianças que apresentavam dificuldades de aprendizagem.
Henick, e Fária (2015, s/pag), assinalam que “a preocupação com a educação pedagógica

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e a inserção das crianças na sociedade são ideias e inquietações do fim do século XIX e
início do século XX”.

No entanto, as políticas voltadas a infância começam a tomar corpo com a


publicação da Declaração Universal dos Direitos da Criança e do Adolescente, publicada
em 1959. No Brasil essa mudança só ocorre de maneira efetiva a partir da Constituição
de 1988, que determina em seu Artigo 227 que Art.
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade,
ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-
los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de
2010)

Esse cuidado com a infância e a adolescência foi fortalecido com a aprovação do


Estatuto da criança e do Adolescente (Lei 8069/1990) e com criação do Conselho
Nacional da Criança e do Adolescente, pela Lei nº 8.242 de 1991.
Os avanços trazidos com as leis que amparam a criança e o adolescente do Brasil,
são de fundamental importância, pois passam a reconhecer a infância com suas
características especificas e a entender a criança como
[...] sujeito histórico, social, produtor de cultura, ativo e criativo, cujo
desenvolvimento se dá de forma indivisível. Ela não pode ser vista apenas
como um corpo que precisa de cuidado, tampouco como uma mente sem corpo
ou uma inteligência que aprende num corpo ao qual não se dê atenção. O
argumento é, pois, da coerência das ações de educação infantil, que sejam
respeitosas da unidade da criança. (NUNES, CORSINO, DIDONET, 2011
pág. 38)

A escola também tem seu papel revisto, pois ela começa a ser pensada para essa
criança, buscando reconhecer suas necessidades básicas, bem como respeitar o processo
de formação de sua identidade individual e coletiva. Além disso, a Lei de Diretrizes e
Bases (Lei 9394/1996), regulamenta a integração da Educação Infantil ao Ensino Básico.
Incialmente a lei não determinava a idade mínima de acesso a educação, mas a partir da
Lei (12.7696/2013), ficou estabelecido no Artigo 4º, item I- a “educação básica
obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade,[...]”. A educação
básica, passa a ser organizada em três níveis: Pré-escola; Ensino Fundamental e Ensino

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Médio. Em seu Art. 29 a LDB, estabelece que “educação infantil, primeira etapa da
educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5
(cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando
a ação da família e da comunidade”.
A lei reconhece que a educação infantil é importante para formação psicológica,
intelectual e social da criança, e os professores que atuam nessa etapa da educação escolar
das crianças assumem um papel relevante na formação das mesmas.

1.2.O currículo da educação infantil

A educação Infantil, é a base inicial da


formação das crianças, essa etapa abrange as creches
que atendem crianças de 0 a 3 anos e a Educação
Infantil para as crianças de 4 e 5 anos de idade.
Embora a LDB, defina a obrigatoriedade da educação escolar a partir dos 4 anos como
idade, as creches são importantes em especial para atender as famílias mais carentes, visto
que os pais precisam trabalhar e não tem com que deixar os filhos.
Mas, o que trabalhar nessa etapa inicial da educação escolar? A resposta para essa
pergunta encontra-se nos documentos legais que norteiam a educação brasileira. As
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI- Resolução nº 5 de
17 de dezembro de 2009), em seu Artigo 3º estabelece que
O currículo da Educação Infantil é concebido como um conjunto de práticas
que buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os
conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental,
científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento integral de
crianças de 0 a 5 anos de idade.

A lei ressaltar que a criança deve ser percebida como centro do processo de ensino,
de maneira integral, ou seja, o professor ao planejar suas atividades precisa considerar
que essa criança chegar a escola com uma bagagem de conhecimentos, ela não é um
“recipiente vazio” que que necessita ser “cheio” pelas informações dadas pelo professor,
pois como afirma Paulo Freire (2008, pág.30): “ensinar exige respeito aos saberes dos
educandos”, e isso se aplica também as crianças da educação infantil, especialmente nos
dias de hoje, pois a criança de 3, 4 anos que chega a escola, já teve contato com diversos
saberes, seja no contato com a família e a comunidade ou pelos meios de comunicação.

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Dando continuidade a questão acerca da proposta pedagógica a DCNEI, em seu
Artigo 8º estabelece que
A proposta pedagógica das instituições de Educação Infantil deve ter como
objetivo garantir à criança acesso a processos de apropriação, renovação e
articulação de conhecimentos e aprendizagens de diferentes linguagens, assim
como o direito à proteção, à saúde, à liberdade, à confiança, ao respeito, à
dignidade, à brincadeira, à convivência e à interação com outras crianças

O papel do professor é o de mediador, ele deve planejar suas atividades de maneira


a oferecer atividades que contribuam para fortalecimento da autoconfiança da criança,
criem novas oportunidades para que ela conheça o mundo e também se conheça, e
desenvolvam as relações interpessoais, a medida que aprendem a partilhar com outras
crianças, bem como resolver pequenos conflitos. Vale lembrar que ainda de acordo com
referido documento os eixos norteadores da proposta pedagógica da Educação Infantil,
são as brincadeiras e a interação.
A aprendizagem nessa etapa na educação não está organizada em diferentes
disciplinas como ocorre no Ensino Fundamental, portanto o currículo da Educação
Infantil deve ser organizado com base nos princípios de éticos, políticos e estéticos. No
que diz respeito ao primeiro princípio o currículo deve a levar em consideração que

Desde muito pequenas, as crianças devem ser mediadas na construção de uma


visão de mundo e de conhecimento como elementos plurais, formar atitudes de
solidariedade e aprender a identificar e combater preconceitos que incidem
sobre as diferentes formas dos seres humanos se constituírem enquanto
pessoas. Poderão assim questionar e romper com formas de dominação etária,
socioeconômica, étnico-racial, de gênero, regional, linguística e religiosa,
existentes em nossa sociedade e recriadas na relação dos adultos com as
crianças e entre elas. Com isso elas podem e devem aprender sobre o valor de
cada pessoa e dos diferentes grupos culturais, adquirir valores como os da
inviolabilidade da vida humana, a liberdade e a integridade individuais, a
igualdade de direitos de todas as pessoas, a igualdade entre homens e mulheres,
assim como a solidariedade com grupos enfraquecidos e vulneráveis política e
economicamente. Essa valorização também se estende à relação com a
natureza e os espaços públicos, o respeito a todas as formas de vida, o cuidado
de seres vivos e a preservação dos recursos naturais (BRASIL, 2013, PÁG.
87).

O documento chama atenção para o papel do currículo da Educação Infantil, visto


que este deve contribuir para que as crianças desenvolvam uma visão de mundo pautada
na solidariedade e estimule a criticidade das crianças, a fim de promover a valorização da
diversidade cultural.
A DCNEI, deixa evidente que o Ensino Infantil, não está organizado por
disciplina, mas em campos de experiência, conforme veremos mais a frente. Encerrando
essa primeira parte é importante considerar o que a Base Nacional Comum Curricular

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(BNCC), no que se concerne à Educação Infantil. O referido documento apresenta como
os direitos de aprendizagem e desenvolvimento na educação infantil, os seguintes pontos:

Conviver com outras crianças e adultos, em pequenos e grandes grupos,


utilizando diferentes linguagens, ampliando o conhecimento de si e do outro,
o respeito em relação à cultura e às diferenças entre as pessoas.
Brincar cotidianamente de diversas formas, em diferentes espaços e tempos,
com diferentes parceiros (crianças e adultos), ampliando e diversificando seu
acesso a produções culturais, seus conhecimentos, sua imaginação, sua
criatividade, suas experiências emocionais, corporais, sensoriais, expressivas,
cognitivas, sociais e relacionais. Participar ativamente, com adultos e outras
crianças, tanto do planejamento da gestão da escola e das atividades propostas
pelo educador quanto da realização das atividades da vida cotidiana, tais como
a escolha das brincadeiras, dos materiais e dos ambientes, desenvolvendo
diferentes linguagens e elaborando conhecimentos, decidindo e se
posicionando. Explorar movimentos, gestos, sons, formas, texturas, cores,
palavras, emoções, transformações, relacionamentos, histórias, objetos,
elementos da natureza, na escola e fora dela, ampliando seus saberes sobre a
cultura, em suas diversas modalidades: as artes, a escrita, a ciência e a
tecnologia. Expressar, como sujeito dialógico, criativo e sensível, suas
necessidades, emoções, sentimentos, dúvidas, hipóteses, descobertas,
opiniões, questionamentos, por meio de diferentes linguagens. Conhecer-se e
construir sua identidade pessoal, social e cultural, constituindo uma imagem
positiva de si e de seus grupos de pertencimento, nas diversas experiências de
cuidados, interações, brincadeiras e linguagens vivenciadas na instituição
escolar e em seu contexto familiar e comunitário. (MEC 2017, pág. 36) (grifo
nosso)

Os aspectos apontados nos diferentes documentos que tratam da educação infantil


tais como “conviver, brincar, explorar, expressar, conhecer-se”, sinalizam o caminho a
ser seguido pelo professor no trabalho com a história nessa etapa da educação. Como
destacamos antes nenhum dos documentos enfatizam o ensino de disciplinas especificas,
mas ao analisarmos os documentos que tratam do Ensino de História no Ensino
Fundamental encontramos que
um dos importantes objetivos de História no Ensino Fundamental é estimular
a autonomia de pensamento e a capacidade de reconhecer que os indivíduos
agem de acordo com a época e o lugar nos quais vivem, de forma a preservar
ou transformar seus hábitos e condutas. A percepção de que existe uma grande
diversidade de sujeitos e histórias estimula o pensamento crítico, a autonomia
e a formação para a cidadania. (MEC, 2017, pág.398)

Analisando os aspectos do documento no que se refere a Educação Infantil e os


objetivos do ensino de História no Fundamental, podemos definir que a história na
educação Infantil, deve ser trabalhada de maneira a
1. Estimular a curiosidade da criança;
2. Favorecer a autonomia de pensamento;
3. Contribuir para a formação da identidade pessoal, social e cultural da criança;

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4. Favorecer o contato com diferentes aspectos culturais;
5. Estimular o respeito as diferenças;
6. Promover a aproximação com elementos de diferentes culturas
7. Contribuir para que a criança se expresse de diferentes formas.
8. Contribuir para a formação cidadã da criança

Sem dúvida esse são pontos importantes que podem ser trabalhados pelo professor
da educação infantil. No entanto, a pergunta que você deve está se fazendo quais os temas
a serem trabalhados pelo professor e qual a metodologia a ser utilizada para alcançar esses
objetivos?

1.3. O ensino de história na Educação Infantil: Parte II

De acordo com a BNCC na Educação Infantil “as aprendizagens e o


desenvolvimento das crianças têm como eixos estruturantes as interações e a brincadeira,
assegurando-lhes os direitos de conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e
conhecer-se[...]” (20017, pág.38). É importante ressalta que essa brincadeira tem uma
intencionalidade, como assinalar o RCNEI (1998, pág. 27, v.1)
A brincadeira é uma linguagem infantil que mantém um vínculo essencial com
aquilo que é o “não-brincar”. Se a brincadeira é uma ação que ocorre no plano
da imaginação isto implica que aquele que brinca tenha o domínio da
linguagem simbólica. Isto quer dizer que é preciso haver consciência da
diferença existente entre a brincadeira e a realidade imediata que lhe forneceu
conteúdo para realizar-se. Nesse sentido, para brincar é preciso apropriar-se de
elementos da realidade imediata de tal forma a atribuir-lhes novos significados.
Essa peculiaridade da brincadeira ocorre por meio da articulação entre a
imaginação e a imitação da realidade. Toda brincadeira é uma imitação
transformada, no plano das emoções e das ideias, de uma realidade
anteriormente vivenciada.

O documento assinala a importância do brincar, como uma linguagem que auxiliar


a criança na sua interação com a realidade, sendo assim o lúdico deve perpassar a
diferentes ações formativas da criança na educação infantil.
Em concordância com DCNEI, a BNCC aponta que aprendizagem na educação
infantil está estrutura em cinco (05) campos de experiências, que são: O eu, o outro e
nós; Corpo, gestos e movimentos; Traços, sons, cores e formas; Escuta, fala,
pensamento e imaginação; Espaços, tempos, quantidades, relações e
transformações.

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Em todos os campos de experiência apontados existem possibilidades de
abordagem do ensino de história. Lembrando sempre que nessa etapa uma mesma
experiência de aprendizagem pode ser abordada por diferentes áreas do conhecimento,
cabe ao professor o conhecimento desses campos e a definição do que será trabalhado.
Vamos discutir algumas dessas possibilidades do ensino de história nos diferentes
campos de experiência. Começaremos com o primeiro campo: O eu, o outro e nós. Nesse
campo professor pode desenvolver atividades que favoreça o autoconhecimento e
estimule o desenvolvimento da autonomia, bem como estimular a convivência com outras
crianças. As DCNEI orientam o professor quanto aos objetivos a serem alcançados com
as crianças da Educação Infantil conforme a idade. Para as crianças de 0 a 3 anos as
atividades devem contribuir para que a crianças seja capaz de:
• experimentar e utilizar os recursos de que dispõem para a satisfação de suas
necessidades essenciais, expressando seus desejos, sentimentos, vontades e
desagrados, e agindo com progressiva autonomia; • familiarizar-se com a
imagem do próprio corpo, conhecendo progressivamente seus limites, sua
unidade e as sensações que ele produz; [...] • brincar; • relacionar-se
progressivamente com mais crianças, com seus professores e com demais
profissionais da instituição, demonstrando suas necessidades e interesses.
(Brasil, 1998, pág. 27)

Corroborando com essas questões Vigostki (1999, pág. 33), afirma que “antes de
controlar o próprio comportamento, a criança começa a controlar o ambiente com ajuda
da fala”. Ou seja, a criança já dissociada da figura materna, busca seu espaço, passando a
fazer escolhas, a ter preferência por este ou aquele brinquedo. Outro aspecto importante
diz respeito a interação com outras crianças, para isso o professor pode desenvolver
atividades do “faz de conta”, estimulando jogos de imitação, criando ambientes no qual
as crianças precisem agir em conjunto e assim por diante.
Nessa etapa as atividades com fichas com nomes das crianças é uma atividade
importante, visto que o nome é uma marca identitária de cada indivíduo. Como nos
lembra Bittencourt (2009, pág. 121) “um dos objetivos centrais do ensino de História na
atualidade, relaciona-se à sua contribuição na construção de identidades” (grifo da
autora). Ao utilizar o temo identidades a autora nos lembrar que existem diferentes
identidades, pois temos uma identidade enquanto individuo, que vai sendo constituída ao
longo da nossa vida. Temos uma identidade social, que nos remete a ideia de
pertencimento a um determinado grupo. Além disso temos uma identidade nacional, pois
fazemos parte de um determinado lugar, que fica em um determinado país que possuía
características especificas.

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A medida que a criança vai crescendo as atividades vão se diversificando, ou seja,
no que se refere ao campo eu, outro e nós, a partir dos 4 anos já podem ser desenvolvidas
atividades mais direcionadas para a compreensão do mundo que a cerca. Por exemplo,
dando continuidade a atividade com o nome, é possível trabalhar, outras questões, tais
como estimular uma pesquisa, buscando conhecer a história do nome da criança. Pode-se
pedir que alguém da família conte acerca da escolha do nome, quem participou da
escolha? O Porque da escolha do nome? Durante a correção da atividade o professor deve
chamar atenção para o fato de que todas as crianças têm uma história e essa história é
importante. Ainda com relação ao nome é possível mostrar que o nome de uma pessoa
está presente em diferentes documentos que lhe identificam enquanto sujeito.
A BNCC aponta como um dos objetivos para esse campo de experiência para
crianças a partir de 04 anos “demonstrar valorização das características de seu corpo e
respeitar as características dos outros (crianças e adultos) com os quais convive” (BNCC,
2017, pág. 43). No escopo desse objetivo o professor tem a possibilidade de desenvolver
inúmeras atividades, desde a contação de histórias, ao uso de vídeos, imagens, pinturas,
de forma a provocar a criança a pensar sobre si, o outro, e acerca das diferenças e
semelhanças existentes nos diferentes grupos tais como os indígenas, afro-brasileiros,
grupos de imigrantes, visto que todos integram a formação do povo brasileiro.
No campo que envolve o tema Corpo, gestos e movimentos, é importante que o
professor compreenda que a criança aprende desde os primeiros meses de vida a descobrir
elementos ligados a seu corpo, a tomada de consciência de diferenciar entre a criança e o
outro, perpassa pelo processo de aquisição da consciência que essa passa a ter do seu
próprio corpo (Brasil, 1998). O DCNEI destaca que “por meio das explorações que faz,
do contato físico com outras pessoas, da observação daqueles com quem convive, a
criança aprende sobre o mundo, sobre si mesma e comunica-se pela linguagem corporal”.
(BRASIL, 1998b, pág. 25)
Dentre as atividades as serem desenvolvidas para esse campo de aprendizagem,
para crianças de 0 a 3, é possível trabalhar com jogos de imitação, brincadeiras de roda,
ou ainda apresentar brincadeiras de diferentes épocas ou locais. Para as crianças de 04 a
05 anos é indicado o trabalho com projetos como o “Brincadeiras de Diferentes Épocas e
Lugares”, permitindo com isso que a criança interaja e conheça o modo de brincar de
outras crianças em diferentes épocas e lugares. Por exemplo
Colômbia – Pare

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Uma das crianças lança uma bola para o alto e grita o nome de outra que estiver
na brincadeira. Esta tem de tentar apanhar a bola antes que ela toque no chão.
Se conseguir, repete-se o processo. Senão, assim que a pessoa a pegar, deve
gritar "pare", o que obriga todos a pararem de correr, dar três longos passos em
direção ao mais próximo e atirar a bola nele (Disponível em:
http://guiadoscuriosos.uol.com.br/categorias/3842/1/brincadeiras-de-
criancas-de-10-nacionalidades-diferentes.html. /Acessado em 24 de fevereiro
de 2019)

Centro-Oeste do Brasil - Corre Cotia1


Faixa etária: Acima dos 4 anos

Escolha a criança que será o pegador. Dê a ela um lenço. Então, peça para as
demais crianças se sentarem no chão em um círculo. Enquanto cantam a
parlenda Corre Cotia, o pegador caminha do lado de fora do círculo ao som
da música. Ao final da canção, todos fecham os olhos. Então, o pegador deixa
o lenço cair atrás de uma das crianças.

Ao abrir os olhos, a criança que tiver com o lenço atrás de si deve se levantar
e correr atrás do pegador. Nesse movimento, o pegador deve ser mais ágil
para ocupar o lugar vago na roda. Se ele conseguir, o participante que ficou
com o lenço na mão deve se tornar o pegador. Caso contrário, se o pegador for
apanhado antes de conseguir se sentar no lugar do companheiro, então, ele
continua na mesma função na próxima rodada. (Disponível em:
http://comoeducarseusfilhos.com.br/blog/de-norte-sul-5-divertidas-
brincadeiras-regionais-para-ensinar-aos-pequenos/. Acessado em 24/02/2019)

Essas brincadeiras ao mesmo tempo que a criança trabalha com o os movimentos,


permite que o professor explore os aspectos culturais que fazem parte do brincar nos
diferentes lugares. Nesse sentido é importante que o professor conte a criança acerca da
brincadeira e fale do lugar de onde ela veio. Poderá ainda realizar atividades com danças
típicas de diferentes partes do Brasil representando culturas diversas, como indígena, a
afro-brasileira, ou de grupos de descendentes como dos japoneses, italianos, etc.
No campo de experiência “Traços, sons, cores e formas”, podemos colocar a
criança em contato com a história de diferentes pintores, cantores e estimular que a mesma
se expresse livremente. Como a criança de 0 a 3 anos gosta de cores vibrantes é possível
trabalhar com obras de pintores que retrataram a infância como Ivan Cruz, Portinari, ou
com artistas como Pollock, cuja a técnica utilizada tem uma proximidade com os
garranchos que as crianças costumam fazer em seus primeiros desenhos.
Para as crianças de 04 anos, é possível introduzir as pinturas rupestres e mostrar
que estas eram utilizadas pelos primeiros homens antes mesmo da invenção da escrita. E

1
As orientações completas para a realização dessa e de outras brincadeiras estão disponível no site:
http://comoeducarseusfilhos.com.br/blog/de-norte-sul-5-divertidas-brincadeiras-regionais-para-ensinar-
aos-pequenos/. Acessado em 24/02/2019

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que através da análise dessas pinturas, aprendemos um pouco acerca do modo de vida dos
primeiros homens. Como assinala o RCNEI (1998c, pág 107) um dos objetivos das
atividades com artes na educação infantil é que “ a criança possa compreender e conhecer
a diversidade da produção artística na medida em que estabelece contato com as imagens
das artes nos diversos meios, como livros de arte, revistas, visitas às exposições, contato
com artistas, filmes etc.”. As atividades com arte permitem a criança possam utilizar o
desenho, a pintura, a modelagem para expressar seus sentimentos e até mesmo para se
comunicar. E todas essas atividades podem ser desenvolvidas a partir de uma
contextualização histórica, que nessa faixa etária deve ser apresentada de maneira simples
e objetiva.
O campo da Escuta, fala, pensamento e imaginação, é um espaço importante
para estimular a criança a se expressar verbalmente, mas também aprender a escutar o
outro. Nesse sentido
A roda de conversa é o momento privilegiado de diálogo e intercâmbio de
ideias. Por meio desse exercício cotidiano as crianças podem ampliar suas
capacidades comunicativas, como a fluência para falar, perguntar, expor suas
ideias, dúvidas e descobertas, ampliar seu vocabulário e aprender a valorizar o
grupo como instância de troca e aprendizagem. A participação na roda permite
que as crianças aprendam a olhar e a ouvir os amigos, trocando experiências.
Pode-se, na roda, contar fatos às crianças, descrever ações e promover uma
aproximação com aspectos mais formais da linguagem por meio de situações
como ler e contar histórias, cantar ou entoar canções, declamar poesias, dizer
parlendas, textos de brincadeiras infantis etc. (BRASIL, 1998c, pág. 138)

O documenta ressalta a importância da roda de conversa como momento


formativo importante no qual a criança aprende a ouvir o colega e também deve se sentir
seguro para falar. O professor deve ser o mediador desse processo. A criança deve ser
instigada a pensar sobre diferentes questões e a falar acerca do que pensou. E ao fazer
isso ela aprende a elabora questionamentos, hipóteses e argumentos, acerca de um
determinado assunto, ao mesmo tempo que desenvolver empatia pelo outro. Essas
competências são fundamentais para o estudo da história.
Outro ponto relevante é compreender o que é pensar para a criança? Vigostki
destaca que “Para as crianças, pensar significa lembrar [....]”. Ou seja, nessa primeira
etapa formativa a criança deve ser apresentada a diferentes situações e instigadas a fala
sobre as mesmas, para que possa organizar seu pensamento, à medida que lembra do que
já viu e ouviu. Esse campo de atividade da Educação Infantil, contribuir para a formação
do pensamento histórico da criança.
No último campo de experiência que trata dos Espaços, tempos, quantidades,
relações e transformações, embora em um primeiro momento possa remeter o professor
15
apenas para a matemática, temos diversas possibilidades de trabalhar a história, visto que
a história estuda as mudanças ocorridas na sociedade dentro de um determinado tempo e
do espaço (PENTEADO, 1994). Sendo assim o trabalho com imagens permitirá que as
crianças conheçam por exemplo como era a sua cidade em outras épocas, ou ainda como
as crianças se vestiam, quais as suas brincadeiras do tempo de seus avós e assim por
diante. Ou até mesmo com a história dos números, contado como estes surgiram.
Como vimos os campos de experiências são os eixos formativos que organizam o
currículo e as atividades a serem desenvolvidas pelo professor com os alunos. O papel do
docente é fundamental para o desenvolvimento intelectual da criança e como destacar
Vigostki
A tarefa do docente consiste em desenvolver não uma única capacidade de
pensar, mas muitas capacidades particulares de pensar em campos diferentes;
não em reforçar nossa capacidade geral de prestar atenção, mas em
desenvolver diferentes faculdades de concentrar a atenção sobre diferentes
matérias. (1998, pág. 108)

O autor chama atenção para o papel do professor que deve contribuir para o
desenvolvimento das inúmeras capacidades de pensar da criança. Quando está tem
contato com temas que lhes permite conhecer outras culturas, saber como as pessoas
viviam em outras épocas, explorar o lugar em que vive, aprende a conviver em grupo,
dentre outras coisas, essa criança está tendo um primeiro e importante contato com a
história e principalmente estará ampliando a sua capacidade de pensar e compreender o
mundo em que vive.
No nosso próximo tópico aprofundaremos a questão do Ensino de História,
abordando acerca do trabalho com essa disciplina no Ensino Fundamental.

RESUMO
Durante muito tempo a criança não teve reconhecida suas características
especificas e havia pouca preocupação com suas necessidades básicas, visto que esta era
percebida como um adulto em miniatura e muito cedo passava a ser inserida no mundo
trabalho. É somente no final do século XIX e início do século XX, que a infância passa a
ser estudada e entendida como uma etapa com características específicas e é a partir da
publicação da Declaração Universal dos Direitos da Criança e do Adolescente, publicada
em 1959 que a infância passa a ser reconhecida como uma etapa a ser protegida pelo
Estado. No Brasil, a proteção à infância ganha relevância a partir da Constituição de 1988
e da publicação do Estatuto da Criança e do adolescente em 1990. Os documentos legais

16
passam a reconhecer a criança como um sujeito social e histórico, com identidade própria.
A infância passa a ser vista como etapa importante do desenvolvimento humano e que
precisa ser protegida pela lei em todos os sentidos.
No que concerne à educação a Constituição de 1988, determina a educação como
sendo pública e gratuita para todos e a LDB, define que a primeira etapa da educação
escolar é a Educação Infantil, mas não enfatizar uma idade especifica para o ingresso na
escola, mas, desde 2013 a lei foi alterada garantido o acesso à escola a partir dos 04 anos
de idade.
Os documentos legais que tratam da Educação Infantil como as DCNEI e a BNCC,
destacam que essa é primeira etapa da educação básica e devem estar pautadas em três
princípios básicos: princípios éticos, políticos e estéticos. Além do mais as práticas
pedagógicas para essa etapa da educação “devem ter como eixos norteadores a interação
e a brincadeira” (Brasil, 2009). Além disso, relembramos que essa etapa da educação
escolar não está estrutura com base em disciplinas, mas sim em 05 campos de experiência,
conforme os documentos legais como a DCNEI e a BNCC. Cada campo de experiência
permite que o professor trabalhe diferentes áreas do conhecimento, e que as atividades
podem se relacionadas com conhecimentos históricos. Dessa forma entendemos que o
ensino de história na educação infantil precisa fortalecer a formação da identidade
individual e social da criança, contribuir para sua formação cidadã, favorecer o respeito
as diferenças, conhecer e respeitar diferentes culturas.
Para o bom resultado dessas atividades o professor deve respeitar a criança
enquanto sujeito histórico e assumir um papel de mediador na realização das atividades
que devem respeitar as diferentes fases da criança.

AUTOAVALIAÇÃO

1. Explique porque o conceito de infância é conceito socialmente construindo?


2. Quais os eixos norteadores da Educação Infantil, de acordo a DCNEI e a
BNCC?
3. Que relação podemos estabelecer entre o conceito de criança nos dias atuais e
o ensino de história para essa etapa da educação básica?
4. Quais os eixos formativos na Educação Infantil de acordo com a RCNEI e a
BNCC?

17
5. Qual o papel da brincadeira no processo formativo da criança na Educação
Infantil?
6. Aponte ao menos duas possibilidades de trabalhar a história na Educação
Infantil a partir dos campos de experiência?

Referências bibliográficas
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Guanabara, 1986.
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BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.
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MEC/SEF, 1998 (b).
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.
Referencial curricular nacional para a educação infantil / Ministério da
Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental. — Brasília:
MEC/SEF, 1998. (vol.3) (c )
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18
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Sirotsky Sobrinho, 2005. (Série Fundo do Milênio para a Primeira Infância Cadernos
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PENTEADO, Heloisa Dupas. Metodologias do Ensino de História e Geografia. São
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(Psicologia e Pedagogia)
VIGOTSKI, L.S; Aprendizagem e Desenvolvimento Intelectual na Idade Escolar. In:
VIGOTSKI, L.S; LURIA, A.R; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e
aprendizagem. 6ª ed. São Paulo: Editora Universidade de São Paulo, 1998. (Coleção
educação crítica).

19
2. ESTUDO DA HISTÓRIA NO 1º E 2º CICLOS DO ENSINO
FUNDAMENTAL - CONCEITOS FUNDAMENTAIS: O
FATOR HISTÓRICO, O SUJEITO HISTÓRICO E O TEMPO
HISTÓRICO

Objetivos Gerais do tema:


Identificar os objetivos do estudo de história no Ensino Fundamental
Compreender o conceito de fator histórico
Conceituar sujeito histórico
Conceituar tempo histórico
Diferencial tempo histórico e tempo cronológico

Introdução
A universalização do acesso à educação ainda é processo recente no Brasil, se
comparados com outros países. Ao analisarmos a legislação educacional brasileira
observa-se que a Lei nº 4.024/1961, fixava em seu Artigo 2º: “A educação é direito de
todos e será dada no lar e na escola” e no seu Art. 25 estabelecia a obrigatoriedade de 04
anos para o ensino primário, podendo está ser estendida até o total de seis. Mas, apesar
do que determinava a lei não havia uma preocupação do Estado em concretiza o acesso à
educação. Esse quadro começa mudar a partir da promulgação da Constituição de 1988
que determinava em seu Art. 205: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da
família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação
para o trabalho”.
Durante a década de 1990, conhecida como a “década da educação”, a
universalização do ensino começa a ser concretizada, impulsionada por movimentos
externos como a Declaração Mundial sobre Educação para Todos, aprovada em Jomtier
pela UNESCO, e por ações do Banco Mundial que passa a defender a educação como
investimento social e lhe confere “a função de dar respostas de desenvolvimento
econômico” (CABRAL NETO E RODIGUES, 2007. P, 21-22). Passamos a assistir no
Brasil um movimento pela ampliação das vagas nas escolas públicas, bem como a
elaboração de uma gama de legislações visando apresentar um novo arcabouço para
educação brasileira. Nesse contexto ocorreu a aprovação da nova Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (LDB), Lei nº 93494/1996 e os Parâmetros Curriculares Nacionais da

20
Educação, publicados em 1998. Esse último passou a ser utilizado como norteador para
organização do currículo nas escolas.

2.1 O ENSINO DE HISTÓRIA NO BRASIL: BREVE CONTEXTO HISTÓRICO

O ensino de história nas escolas passou por mudanças nas últimas quatro décadas,
ele deixou de estar pautado na repetição e na decoreba de datas e fatos, começou a ser
substituído por um modelo inspirado na “historiografia inglesa e na nova história
francesa” que “defende uma história capaz de ‘resgatar’ as múltiplas experiências vividas
pelos sujeitos históricos em diversos tempos e lugares” (FONSECA, 2008, p. 93).
Para compreender as mudanças é necessária uma breve retrospectiva na história
do ensino de história, para isso vamos conhecer os documentos legais que norteiam essa
mudança. Bem como autores como Fonseca (2008), Schmidt e Cainelli (2009)
Bittencourt (2009), que destacam as mudanças ocorridas no ensino de história
O ensino de história no Brasil após a República tinha por objetivo “a formação da
nacionalidade, com seus heróis e marcos históricos, sendo a pátria o principal personagem
nesse tipo de história” (Schmidt e Cainelli, 2009, pág.13). A proposta era consolidação
de uma memória nacional, nas quais as datas e festas cívicas passam a ser celebradas.
Durante o Regime Militar o modelo de sentimento nacionalista foi fortalecido, mas o
ensino de história perdeu espaço no ensino Fundamental sendo substituída pela disciplina
de Estudos Sociais.
É somente na década de 1980 durante o processo de redemocratização do país que
o ensino de história volta a ser discutido, reassumindo o seu papel na educação escolar e
ganhando novos contornos, à medida que se propõe um ensino de história que favorecesse
a articulação entre a realidade do aluno e a realidade histórica pesquisada. Segundo
Bezerra (2010, pág.20) nesse novo conceito de ensino de História o “educando é
reconhecido como um sujeito histórico e, como tal, seus saberes precisam ser valorizados
pelo professor, que deve partir do conhecimento prévio do aluno e não mais só repassar
o já reconhecido como socialmente válido”. Mudar o foco do que ensinar em História e
como ensinar.

2.2 O ENSINO DE HISTÓRIA NO 1º E 2º CICLO DO ENSINO FUNDAMENTAL

21
Vimos anteriormente que a História passou por mudanças nos últimos quarenta anos.
Para uma melhor compreensão dessa mudança é importante discernirmos que o saber
histórico escolar, difere do conhecimento produzido por especialistas em seus diferentes
campos de pesquisa. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN- 1998,
pág. 35 )

[...] o saber histórico escolar reelabora o conhecimento produzido no


campo das pesquisas dos historiadores e especialistas do campo das
Ciências Humanas, selecionando e se apropriando de partes dos
resultados acadêmicos, articulando-os de acordo com seus objetivos.
Nesse processo de reelaboração, agrega-se um conjunto de
“representações sociais” do mundo e da história, produzidos por
professores e alunos. As “representações sociais” são constituídas pela
vivência dos alunos e professores, que adquirem conhecimentos
dinâmicos provenientes de várias fontes de informações veiculadas pela
comunidade e pelos meios de comunicação. Na sala de aula, os
materiais didáticos e as diversas formas de comunicação escolar
apresentadas no processo pedagógico constituem o que se denomina
saber histórico escolar.

O documento sinaliza para as mudanças ocorridas no conceito da história a ser


ensinada nas escolas. Cabe ao professor aproximar o conteúdo ensinado a realidade dos
alunos, e também respeitar as vivências trazidas pelos diferentes grupos para dentro da
escola. Mas, quais os objetivos a serem alcançados no Ensino Fundamental no que diz
respeito a História? Os PCN’s (1998, pág. 43) estabeleceram uma gama de objetivos que
podem ser sintetizados na ideia que “ao longo do ensino fundamental os alunos
gradativamente possam ampliar a compreensão de sua realidade, especialmente
confrontando-a e relacionando-a com outras realidades históricas, e, assim, possam fazer
suas escolhas e estabelecer critérios para orientar suas ações”. A BNCC aponta para a
ideia de competências a serem desenvolvidas pelo educando nas etapas de formação. E
estabelece como competências especificas de História para o Ensino Fundamental

1. Compreender acontecimentos históricos, relações de poder e processos e


mecanismos de transformação e manutenção das estruturas sociais, políticas,
econômicas e culturais ao longo do tempo e em diferentes espaços para
analisar, posicionar-se e intervir no mundo contemporâneo;
2. Compreender a historicidade no tempo e no espaço, relacionando
acontecimentos e processos de transformação e manutenção das estruturas
sociais, políticas, econômicas e culturais, bem como problematizar os
significados das lógicas de organização cronológica.;
3. Elaborar questionamentos, hipóteses, argumentos e proposições em relação
a documentos, interpretações e contextos históricos específicos, recorrendo a
diferentes linguagens e mídias, exercitando a empatia, o diálogo, a resolução
de conflitos, a cooperação e o respeito.
4. Identificar interpretações que expressem visões de diferentes sujeitos,
culturas e povos com relação a um mesmo contexto histórico, e posicionar-se

22
criticamente com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos,
sustentáveis e solidários.
5. Analisar e compreender o movimento de populações e mercadorias no
tempo e no espaço e seus significados históricos, levando em conta o respeito
e a solidariedade com as diferentes populações.
6. Compreender e problematizar os conceitos e procedimentos norteadores da
produção historiográfica.
7. Produzir, avaliar e utilizar tecnologias digitais de informação e comunicação
de modo crítico, ético e responsável, compreendendo seus significados para os
diferentes grupos ou estratos sociais. (MEC. 2017, pág. 400)

O documento destaca as competências as serem desenvolvidas pelos alunos no


que se refere a disciplina de História no decorrer de todo o ensino fundamental. O mesmo
ainda trata das unidades temáticas, objetos de conhecimento e habilidades a serem
trabalhadas no primeiro e segundo segmento do Ensino Fundamental.
Ao retomamos aos PCN’s de História (1998), observamos que estes organizam os
conteúdos por ciclo. No primeiro ciclo os conteúdos de História estão pautados na
“História local e do cotidiano e comunidades indígenas”. O segundo ciclo que
correspondia a 3ª e quarta série o eixo temático é a história das “organizações
populacionais, deslocamentos populacionais’, “organizações e lutas de grupos sociais e
étnicos”, “Organizações políticas e administrações urbanas” e finaliza com “organização
histórica e temporal”
A BNCC traz algumas alterações, embora o ensino de história nas séries inicias
também estejam organizado em ciclos. No que se refere ao primeiro ciclo, o documento
apresenta uma continuidade da ideia formativa iniciada na Educação Infantil, pois,
destaca a construção da identidade individual, social e coletiva do aluno enquanto sujeito,
a medida que este aprende a diferenciar, o “Eu”, “Outro” e o “Nós”, de acordo com o
referido documento,
[...] pode-se dizer que, do 1º ao 5º ano, as habilidades trabalham com diferentes
graus de complexidade, mas o objetivo primordial é o reconhecimento do
“Eu”, do “Outro” e do “Nós”. Há uma ampliação de escala e de percepção,
mas o que se busca, de início, é o conhecimento de si, das referências imediatas
do círculo pessoal, da noção de comunidade e da vida em sociedade. Em
seguida, por meio da relação diferenciada entre sujeitos e objetos, é possível
separar o “Eu” do “Outro”. (MEC, 2017; PÁG.402)

Nesse primeiro ciclo a medida que as crianças vão ampliando o conhecimento de


mundo, estas com ajuda do professor passam a refletir acerca das relações interpessoais
e coletivas no qual estão inseridas, elas aprendem a diferenciar os sujeitos e objetos. No
que diz respeito a metodologia de trabalho o educador precisar lembrar que os educados
nessa etapa ainda estão na fase da alfabetização, sendo assim o professor deve dá
“preferência aos trabalhos com fontes orais e iconográficas, e a partir delas desenvolver

23
trabalhos com a linguagem escrita” (MEC, 1997, pág. 49). No que se refere ao 3º e 4º
ano, a BNCC (2017, pág. 402), destaca o trabalho com a

[...] noção de lugar em que se vive e as dinâmicas em torno da cidade, com


ênfase nas diferenciações entre a vida privada e a vida pública, a urbana e a
rural. Nesse momento, também são analisados processos mais longínquos na
escala temporal, como a circulação dos primeiros grupos humanos.

De certa forma o trabalho com história local e do cotidiano dá continuidade ao


processo de construção de identidades, pois como afirma Fonseca (2009, p.123)
“ensinar e aprender a história local e do cotidiano é parte do processo de
(re)construção das identidades individuais e coletivas, [...], fundamental para
que os sujeitos possam se situar, compreender e intervir no espaço local em
que vivem como cidadãos críticos”.

A fala da autora sinaliza para o fato de que é no contato com a história de


diferentes grupos que nos constituímos enquanto sujeitos históricos pertencentes a um
determinado grupo, em um tempo e espaço específico. É a partir desse referencial que
passamos a compreender as diferenças e semelhanças existentes entre os grupos e
aprendemos a respeitar o outro. A BNCC, ainda ressalta que no 5º ano, a análise dos temas
anteriores se amplia e a ênfase passa a ser “pensar a diversidade dos povos e culturas e
suas formas de organização. A noção de cidadania, com direitos e deveres, e o
reconhecimento da diversidade das sociedades pressupõem uma educação que estimule o
convívio e o respeito entre os povos” (MEC 2017, pág. 402).
No que se refere as abordagens metodológicas o professor de história nas séries
iniciais pode e deve utilizar diferentes fontes escritas e orais, bem como trabalhar
a partir problematização das vivências de professores e alunos, além do diálogo
com textos e imagens, possibilita a recuperação do presente e do passado de
forma dinâmica e processual. O ponto de partida, [...] é o sujeito histórico. As
crianças e os professores são protagonistas da história, e não meros
coadjuvantes ou espectadores. (FONSECA, 2009, pág. 79)

Outra possibilidade é trabalhar com Projetos, introduzindo o aluno no universo da


pesquisa (que é uma das competências apontadas na BNCC), aqui entendida como um
processo que estimula o aluno a investigar determinado tema ou assunto. Para envolver
as crianças é interessante que o projeto seja construindo com os alunos, para que estes se
sintam provocados a buscar as respostas para o problema formulado.

2.3 O ENSINO DE HISTÓRIA E A FORMAÇÃO DE CONCEITOS

24
Um dos desafios para o professor no Ensino Fundamental é trabalhar os conceitos
históricos, visto que estes são fundamentais para a compreensão do fato histórico. Pois
como destaca Bittencourt (2009, pág. 195) “as especificidades dos conceitos históricos a
ser apreendidos no processo de escolarização têm conotações próprias de formação
intelectual e valorativa, e a precisão conceitual torna-se fundamental para evitar
deformações ideológicas”. Para Schmidt e Cainelli (2009), ao trabalhar o conceito no
ensino de História o professor deve valorizar o conhecimento prévio que com o aluno
traz consigo, ou seja, antes de começar a trabalhar um conceito novo o educador deve ter
como ponto de partida as representações que os alunos tem acerca do assunto estudado e
ampliar esses conhecimentos, saindo do terreno do conhecimento informal para o
conhecimento cientifico. As mesmas autoras destacam que
A construção de conceitos é, assim, um processo cognitivo e articulado, já que
os conceitos não são autônomos. Eles articulam-se, contrapõem-se e associam-
se de forma solidária, pela acomodação e pela relação dialógica com um campo
de conhecimento, uma relação com as representações já elaboradas pelos
alunos, para modifica-las. [...] Nesse caso, o pressuposto fundamental é a
constatação de que os conceitos devem ser elaborados e sistematizados pelos
alunos e, para serem trabalhados em sala de aula, é imprescindível a utilização
de linguagem acessível a sua maneira de pensar, a seu vocabulário, a seu
desenvolvimento intelectual e a sua cultura experiencial. (2009, pág. 85)

O professor deve estar atento ao seu papel no processo de construção do conceito


histórico por parte do aluno, ele é o responsável por auxiliar o educando a pensar
historicamente, a compreender que um determinado conceito precisa ser entendido dentro
de um determinado tempo e espaço, pois o conceito de democracia na Grécia Antiga, não
é mesmo se olharmos para os dias atuais.
Vamos procurar entender alguns desses conoceitos como: fato histórico, sujeito
histórico e tempo histórico. Os PCN’s de História (1998, pág. 98) ressaltam que “os fatos
históricos remetem para as ações realizadas por indivíduos e pelas coletividades,
envolvendo eventos políticos, sociais, econômicos e culturais”. Micelli (2014, s/pág.),
destaca que
[...] Fatos e acontecimentos, portanto, são arranjos ou montagens, mais ou
menos conscientes, que devem ser habilidosamente desmontados pelo fazer
histórico. Desse modo, fazer história, pode começar pelo que seria a inversão
de um quebra-cabeças: o acontecimento pronto e acabado, que sempre compõe
uma imagem que ambiciona abranger a totalidade do processo, deve ser
decomposto para denunciar aos espectadores o arbítrio de sua construção,
como se alguém mostrasse à plateia que fios invisíveis sustentam os truques
de ilusionismo do mágico – tão sobrenatural quanto qualquer um de nós.

25
O autor lembra que o fato histórico está em construção e cabe ao professor no
contexto de sua sala de aula, selecionar os fatos ou conhecimentos históricos a ser
estudado e por fim, levantar os questionamentos necessários para que este pode ser
compreendido.
Outro conceito importante é o de sujeito histórico. Durante muito tempo a história
reconhecia como sujeitos históricos apenas os grandes homens, reis, rainhas, generais que
“tinham feito a diferença”, mas hoje esse conceito mudou e os “sujeitos históricos são
indivíduos, grupos ou classes sociais participantes de acontecimentos de repercussão
coletiva e/ou imersos em situações cotidianas na luta por transformações ou
permanências”. (BRASIL, 1998, pág.39). Legitimando essa questão Bezerra (2008, pág.
45), destaca que:
O sujeito histórico que se configura na inter-relação complexa, duradoura e
contraditória entre as identidades sociais e as pessoais, é o verdadeiro
construtor da História. Assim, é necessário acentuar que a trama da História
não é resultado apenas da ação de figuras de destaque, consagradas pelos
interesses explicativos de grupos, mas sim a construção
consciente/inconsciente, paulatina e imperceptível de todos os agentes sociais,
individuais ou coletivos.

Essa mudança no conceito de sujeito histórico insere-se no contexto das


transformações trazidas pela “Escola dos Annales” e a “Nova História”, e na “Teoria
Marxista”, com isso fatos ou pessoas que antes eram ignoradas agora passaram a ser
estudadas. Dessa forma “a base filosófica da nova história é a ideia de que a realidade é
social ou culturalmente constituída” (Burke, 2011, pág. 12). Ou seja, se antes ao se estudar
uma guerra olhava-se apenas para os estadistas e generais a frente das batalhas, agora, o
soldado, as crianças, as mulheres, os idosos, todos tem uma história a contar e o fato
estudado pode ganhar novas conotações a partir do ponto de vista pelo qual o fato é
estudado.
A compreensão do fato histórico e do sujeito histórico insere-se dentro de um
determinado tempo e espaço. Mas afinal, o que é tempo histórico?

O tempo histórico baseia-se em parte no tempo institucionalizado – tempo


cronológico - e o transforma à sua maneira. O tempo cronológico - calendários
e datas - possibilita referenciar o lugar dos momentos históricos na sucessão
do tempo, mas pode remeter à compreensão de acontecimentos datados
relacionados a um determinado ponto de uma longa e infinita linha numérica.
Os acontecimentos identificados dessa forma podem assumir uma concepção
de uniformidade, de regularidade e, ao mesmo tempo, de sucessão crescente e
cumulativa. A sequência cronológica dos acontecimentos pode sugerir que
toda a humanidade seguiu ou deveria seguir o mesmo percurso, criando a ideia
de povos atrasados e civilizados. (Brasil 1998, pág. 39, 40)

26
O tempo histórico situa-se dentro de um tempo cronológico, mas não se encerra
nele. Bittencourt (2009, pág.207) aponta que para Braudel os

[...] fatos históricos têm uma duração distinguível em três ordens que não se
diferenciam mecanicamente pelas categorias de medida de tempo[...]. Essa três
ordens da duração possuem ritmos diferentes: o acontecimento (fato de breve
duração) [...]a estrutura (fato de longa duração) [...] a conjuntura (fato de média
duração)[...].

A compreensão do tempo histórico nos permite perceber que embora estejamos


no determinado tempo cronológico, nem todos os grupos sociais podem ser inseridos
dentro de um mesmo tempo histórico. Por exemplo, no século XXI, o Brasil tornou-se
um país urbano e industrializado, mas ainda temos grupos indígenas que vivem isolados
como os Awá, que são nômades e vivem da caça e da coleta. Ou seja, embora esse povo
também faça parte do Brasil, vivem outro ritmo de tempo, possuem uma organização
social e política diferente do que prevalece no país de uma maneira geral. Finalizando é
importante lembrar que não é necessário que o professor
[...]“obrigue” o aluno é decorar datas e fatos como se fazia antes. Nesse novo
contexto do ensinar e aprender história o papel do professor é ajudar “o aluno
a adquirir as ferramentas de trabalho necessárias para aprender a pensar
historicamente, o saber-fazer, o saber-fazer-bem, lançando os germes do
histórico. (SCHMITH e CAINELLI, 2009, pág.34).

As autoras sinalizam para o papel do professor enquanto mediador, visto que cabe
a esse profissional auxiliar o aluno a desenvolver as competências e habilidades
necessárias para a sua formação, a fim de que este esteja apto a conhecer, analisar, debater
as questões históricas e sociais que emergem, para que possa ampliar a compreensão de
sua realidade histórica e paulatinamente se sinta apto a fazer escolhas que irão orientar as
suas ações enquanto cidadão.

RESUMO

A universalização do acesso à educação no Brasil, começa a se concretizar a partir


da publicação da Constituição de 1988. No contexto dessas mudanças o ensino de
História, volta a ocupar o lugar de destaque que havia sido perdido durante o regime
militar nas salas de aula. A nova história a ser ensinada apresenta novas abordagens
“iluminam as análises políticas de instituições, de líderes governamentais, de partidos, de
lutas sociais e de políticas públicas. Ao mesmo tempo, novos temas sociais e culturais

27
ganham relevância [...]” (BRASIL, 1998, pág. 30). Ou seja, muda não só o que ensinar,
mais o como ensinar.
Os documentos legais que tratam do ensino de História como os PCN’s e a BNCC,
destacam a importância das identidades dentro do contexto formativo, bem como
contribuir para a formação de uma consciência histórica que ao longo do ensino
fundamental torna-se mais complexa e permite que o educando seja capaz de interpretar
o passado, visando compreender o que ocorre na vida prática. O novo ensino de história
também aponta para a importância dos conceitos no ensino e na aprendizagem em
história. Conceitos esses que não devem ser decorados mais compreendidos em sua
totalidade pelo aluno, pois só assim este poderão ser empregados corretamente no
contexto da análise do conhecimento histórico.

AUTOAVALIAÇÃO
1. Analise as mudanças ocorrida na História nas últimas quatro décadas?
2. De acordo com a BNCC quais as competências fundamentais a serem
desenvolvidas pelos alunos no que se refere ao estudo da história ao aluno do
Ensino Fundamental?
3. Que relação podemos estabelecer entre o ensino de história a formação de uma
consciência histórica e critica por parte do educando?
4. Analise os conceitos de fato histórico, sujeito histórico e tempo histórico.

REFERÊNCIAS
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29
3 A História e as propostas dos Temas Transversais: História e
cidadania, eixo de trabalho

Objetivos do tema:

Analisar o papel dos temas transversais na História


Conceituar cidadania
Identificar a relação entre a história a formação cidadã dos alunos
Conceituar trabalho
Analisar o eixo trabalho no contexto do ensino de história.

INTRODUÇÃO

A formação de nossas crianças e jovens não se restringem ao espaço da escola, no


entanto, sabemos que esta têm assumindo um papel relevante na formação dos educandos
frente as transformações sociais ocorridas, pois muitos pais passam cada vez mais tempo
no trabalho e menos tempo com os filhos. Além disso, não podemos esquecer que em
uma sociedade marcada pela desigualdade como a nossa é muitas vezes no espaço escolar
que muitas crianças e jovens tem acesso a informações básicas tais como os cuidados com
a saúde, conhecer seus direitos e deveres a medida que se reconhece enquanto um sujeito
histórico e compreende seu papel social no contexto da sociedade em que vive. Nesse
sentido a Resolução nº7 /2010, em seu Art. 16, destaca que

Os componentes curriculares e as áreas de conhecimento devem articular em


seus conteúdos, a partir das possibilidades abertas pelos seus referenciais, a
abordagem de temas abrangentes e contemporâneos que afetam a vida humana
em escala global, regional e local, bem como na esfera individual. Temas como
saúde, sexualidade e gênero, vida familiar e social, assim como os direitos das
crianças e adolescentes, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente
(Lei nº 8.069/90), preservação do meio ambiente, nos termos da política
nacional de educação ambiental (Lei nº 9.795/99), educação para o consumo,
educação fiscal, trabalho, ciência e tecnologia, e diversidade cultural devem
permear o desenvolvimento dos conteúdos da base nacional comum e da parte
diversificada do currículo.

O documento aponta para o os diferentes temas a serem trabalhados de forma


transversal pelos diversos componentes curriculares. A orientação para a abordagem de
temas transversais na formação básica é confirmada pela Resolução CNE/CP nº 02/2017,
em seu Art. 07 parágrafo §1º, ao afirmar que

Os currículos devem incluir a abordagem, de forma transversal e integradora,


de temas exigidos por legislação e normas específicas, e temas
contemporâneos relevantes para o desenvolvimento da cidadania, que afetam

30
a vida humana em escala local, regional e global, observando-se a
obrigatoriedade de temas tais como o processo de envelhecimento e o 7
respeito e valorização do idoso; os direitos das crianças e adolescentes; a
educação para o trânsito; a educação ambiental; a educação alimentar e
nutricional; a educação em direitos humanos; e a educação digital, bem como
o tratamento adequado da temática da diversidade cultural, étnica, linguística
e epistêmica, na perspectiva do desenvolvimento de práticas educativas
ancoradas no interculturalismo e no respeito ao caráter pluriétnico e plurilíngue
da sociedade brasileira. (grifo nosso)

O trabalho com temas transversais, envolvem temáticas que podem ir questões regionais,
quando a escola assim considere necessário abordá-las até questões mais gerais, ética, saúde, meio
ambiente, orientação sexual, pluralidade cultural. Neto, (2008, pág. 66) assinala que no trabalho
com os temas transversais
[...] deve-se abandonar a visão do conhecimento específico da disciplina, sem
abrir mão dos repertórios e recursos de cada área do conhecimento, e, ao
mesmo tempo, incorporar o papel de formação exercido pelo educador,
tratando de temas e questões que ultrapassam o conteúdo programático.

É importante compreender, que os temas transversais devem permear os diferentes


conteúdos programáticos, não se faz necessário parar os conteúdos das disciplinas para
tratar dos temas transversais. No que diz respeito a disciplina de história existe uma gama
de temas transversais que podem ser trabalhados articulados ao conteúdo de história
conforme as orientações contidas nos PCN’s de história (1998; pág. 48,49)
 as relações de trabalho existentes entre os indivíduos e as classes, envolvendo
a produção de bens, o consumo, as desigualdades sociais, as transformações
das técnicas e das tecnologias e a apropriação ou a expropriação dos meios de
produção pelos trabalhadores;
 as diferenças culturais, étnicas, etárias, religiosas, de costume, gênero e poder
econômico, na perspectiva do fortalecimento de laços de identidade e reflexão
crítica sobre as consequências históricas das atitudes de discriminação e
segregação;
 as lutas e as conquistas políticas travadas por indivíduos, classes e
movimentos sociais;
 a relação entre o homem e a natureza, nas dimensões culturais e materiais,
individuais e coletivas, contemporâneas e históricas, envolvendo a construção
de paisagens e o discernimento das formas de manipulação, uso e preservação
da fauna, flora e recursos naturais;
 reflexões históricas sobre saúde, higiene, vida e morte, doenças endêmicas e
epidêmicas e as drogas;
 as imagens, representações e valores em relação ao corpo, à sexualidade, aos
cuidados e embelezamento do indivíduo, aos tabus coletivos, à organização
familiar, à educação sexual e à distribuição de papéis entre homens, mulheres,
crianças e velhos nas diferentes sociedades historicamente constituídas;
 os acordos ou desacordos que favorecem ou desfavorecem convivências
humanas mais igualitárias e pacíficas e que podem auxiliar no respeito à paz,
à vida e à concepção e prática da alteridade.

Análise do documento nos permite identifica que o tema da cidadania e o trabalho,


assumem relevância no contexto da formação dos educandos. Vale lembrar que quando
o professor trabalha com temas transversais, ele contribuir para que o aluno tenha uma

31
“visão mais ampla da realidade e, portanto, deverá desenvolver atitudes de cidadania,
respeito ao próximo e ao ambiente, segundo uma visão crítica, de modo que possa
interferir na realidade e transformá-la. (BRODBECK, 2012; pág. 15). Além do mais, um
educando melhor preparado para os desafios do mundo moderno, estará apto a adentrar
no futuro no mundo do trabalho.

3.1 ENSINO DE HISTÓRIA E A FORMAÇÃO CIDADÃ

Há alguns conheci o professor José Pacheco, que era diretor da Escola da Ponte
em Portugal, em sua fala ele afirmava que não entendia porque os Projetos Políticos
Pedagógicos brasileiros, insistiam em afirmar em uma formação do aluno para a
cidadania, e reiterava não se forma para, pois a formação cidadã se dá segundo ele (e
concordo), no dia a dia, quando este aluno aprende sobre seus direitos e deveres, mas
principalmente quando este vivência situações na qual consegue perceber seu papel
enquanto cidadão. Os diversos documentos legais da educação brasileira enfatizam o
papel da educação na formação cidadã. Mais o que significa cidadania? Como trabalhar
a formação cidadã no contexto das disciplinas curriculares, em especial a História?
Precisamos primeiro compreender o conceito de cidadania e ter ciência que este
conceito mudou ao longo do tempo na sociedade ocidental e atualmente tem sentidos
diferentes em lugares diferentes pelo mundo. Guarinello (2012, pág. 29) afirma que

[...] não podemos falar de continuidade do mundo antigo, de repetição de uma


experiência passada e nem mesmo de um desenvolvimento progressivo que
unisse o mundo contemporâneo ao antigo. São mundos diferentes, com
sociedades distintas, nas quais pertencimento, participação e direitos têm
sentidos diversos.

O autor chama atenção para o fato de que se faz necessário entender que a ideia
de cidadania muda, dependendo do lugar e do tempo em questão. Os PCN’s de História
(1998, pág. 36) confirmam essa questão ao assinalar
A ideia de cidadania foi inicialmente construída em uma época e em uma
sociedade, mas foi reconstruída por outras épocas e culturas. A cidadania não
é compreendida de modo semelhante por todos os indivíduos e grupos hoje no
Brasil, como não era em outras épocas. É diferente ainda do sentido atribuído
pelos atenienses da época de Péricles ou pelos revolucionários franceses de
1789, nem é idêntica às práticas e crenças da população norte-americana atual.
Os sentidos que a palavra assume para os brasileiros incluem os demais
sentidos historicamente construídos, mas ultrapassam os seus contornos,
incorporando problemáticas e debates especificamente nacionais, que são e
que foram moldados, no presente e no passado, por indivíduos, grupos, classes,
instituições, governos e Estado e, também, nas suas inter-relações.

32
O documento pontua as mudanças quanto ao conceito de cidadania, visto que na
Grécia Antiga, apesar de ser considerada o berço da democracia, não era considerado
como cidadão, mas mulheres, os escravos e os estrangeiros. Se olharmos apenas para o
nosso país veremos que o conceito de cidadania existente no século XVIII por exemplo,
é completamente diferente do que entendemos como cidadania nos dias atuais.
Busquemos então compreender o conceito moderno de cidadania. De acordo com
Campos (2012, pág. 17) “a moderna concepção de cidadania considera como cidadão
aquele que é membro de um estado-nação. Essa condição é dada pelo nascimento ou pela
naturalização [...]”. Corroborando com a autora encontramos entre os objetivos gerais
do Ensino Fundamental, apontados nos PCN’s que o aluno deve

compreender a cidadania como participação social e política, assim como


exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia-a-dia,
atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o
outro e exigindo para si o mesmo respeito; (BRASIL, 1998 S/PÁG)

Nesse sentido é essencial que o educando compreenda que a cidadania é uma


conquista histórica que vem se processando ao longo dos tempos. O Art. 5º da
Constituição Brasileira em vigor preconiza que “todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes”. Mais nem sempre foi assim, até 1888 o Brasil era um
país escravocrata e os negros não eram considerados cidadãos e mesmo após a abolição
estes tiveram que traçar muitas lutas para conquistarem direitos que lhes havia sido
negado. As mulheres também tiveram que lutar para conquistas o direito de voto, e de
igualdade com os homens.
Ao mesmo tempo os alunos devem ser levados a refletir que o conceito de
cidadania também ganha novos contornos no mundo globalizado em que vivemos.
Preocupado com os problemas do mundo global a UNESCO aponta para o conceito de
cidadania global
A noção de cidadania foi ampliada como um conceito de múltiplas
perspectivas. Está vinculada a uma crescente interdependência e
interconectividade entre países nas áreas econômica, cultural e social, por meio
de maior comércio internacional, migração, comunicação etc. Essa noção está
vinculada também a nossas preocupações com o bem-estar global além das
fronteiras nacionais, assim como se baseia-se no entendimento de que o bem-
estar global influencia o bem-estar nacional e local (UNESCO 2015, pág. 14)

33
No existe uma concordância quanto ao conceito de cidadania global, no entanto, sabemos
que nos dias atuais existe um fluxo muito grande de pessoas entre os diferentes países,
seja transitando em busca de novas oportunidades de emprego, ou ainda participando de
intercâmbio estudantil, ou simplesmente como turistas. Mas, seja qual for a situação é
relevante que se conheça e respeite as diferentes culturas e nesse sentido a UNESCO
aponta como objetivos a serem alcançados para uma educação visando uma formação
dentro do contexto da cidadania global
 estimular alunos a analisar criticamente questões da vida real e a
identificar possíveis soluções de forma criativa e inovadora;
 apoiar alunos a reexaminar pressupostos, visões de mundo e relações
de poder em discursos “oficiais” e considerar pessoas e grupos
sistematicamente sub-representados ou marginalizados;
 enfocar o engajamento em ações individuais e coletivas, a fim de
promover as mudanças desejadas; e
 envolver múltiplas partes interessadas, incluindo aquelas que estão
fora do ambiente de aprendizagem, na comunidade e na sociedade
mais ampla. (pág. 16)

Corroborando com a UNESCO, no que diz respeito a uma compreensão mais ampla do
conceito de cidadania, a BNCC (2017, pág. 09) reafirma a importância da formação cidadã ao
indicar entre as competências gerais para educação básica que o aluno deve “valorizar e utilizar
os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para
entender e explicar a realidade, continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma
sociedade justa, democrática e inclusiva”. Isso significa inclusive receber os imigrantes que aqui
chegam e buscar acolhe-los, pois muitas vezes estes vêm para cá fugindo de situações adversas
nos seus países, um exemplo é a questão dos venezuelanos, só em 2018 chegaram cerca de 10 mil
imigrantes em buscar de uma vida melhor.
Os documentos apontam caminhos a serem seguido pelo professor ao incorporar
a formação cidadã em suas aulas, pois este precisa estimular o processo reflexivo para
que o aluno, análise, questione, critique e se posicione frente a determinado tema ou
assunto que diga respeito as relações sociais, aos direitos e deveres e a formação de uma
sociedade mais justa, democrática e igualitária. Além disso, a escola deve promover ações
nas quais o educador se sinta participante nas tomadas de decisões da escola, seja na
criação conjunta das regras adotadas, ou na elaboração do Regimento Escolar, para que
este possam conhecer o documento que norteia a tomada de decisão, ou ainda na criação
dos Grêmios.
Além disso, o professor pode trabalhar com projetos para que os alunos conheçam
questões relevantes com a dos “Direitos Humanos”, os “Direitos da Criança e do

34
Adolescente”, os “Direitos do Idosos”, os “Direitos Sociais” e etc. Mas, vale lembrar que
o professor carece está atento as questões que emergem na sala de aula para orientar os
projetos. Como professora de História e Coordenadora Pedagógica já acompanhei alguns
projetos maravilhosos que nasceram de questões que emergiram no contexto da sala de
aula. Há alguns anos trabalhando em uma escola particular como coordenadora
acompanhamos um projeto desenvolvido sobre Direitos Humanos, em uma turma de
Ensino Médio, durante um debate em sala de aula, no qual alguns alunos afirmavam que
“Direitos Humanos” só servia para beneficiar bandido. Aquela afirmação chocou o
professor, mas este ao invés de simplesmente rebater a afirmativa dos alunos, propôs que
este fosse o tema do projeto de trabalho deles. E depois de estudar e analisar os
documentos legais, realizar entrevistas com promotores, advogados e até mesmo um ex-
detentos, os alunos passaram a ter um novo olhar sobre a importância dos Direitos
Humanos e o papel destes especialmente em uma sociedade como a nossa marcada por
grandes injustiças sociais.
Em outro momento já em uma escola pública, observamos que a questão do
racismo era muito forte e que muitos alunos não se reconheciam como negros, até tinham
vergonha do cabelo, de sua cor de pele, e assim por diante. Foi criado então em parceria
com os professores o projeto “Brasil de Todas as Cores”, cujo foco era “estimular a
criação de uma imagem positiva da identidade do povo brasileiro, adotando como ponto
de partida o conhecimento das culturas indígenas, africanas e afro-brasileiras”. O projeto
contou com diferentes atividades que envolveram pesquisa acerca das diferentes culturas,
reflexão sobre a contribuição dessas culturas na formação do povo brasileiro, e cada sala
fez uma sessão de fotos individuais e coletivas, que foram utilizadas para promover uma
valorização da identidade de cada um. Um dos resultados positivo do projeto foi ver
alunas e alunos mantendo os cabelos cacheados, reconhecendo que existe diferentes tipos
de beleza e não apenas a que é imposta pela sociedade.

3.2 História e o Eixo Trabalho

O eixo da formação para trabalho é tratado na atual LDB (Lei 9394/96) no Título
II que trata dos princípios e fins da Educação Nacional quando em seu Art. 2º afirma
que
a educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade
e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho. (grifo nosso)

35
Ainda encontramos no mesmo documento no capítulo II Seção I, Art. 22 que “a
educação básica tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação
comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para
progredir no trabalho e em estudos posteriores”. (grifo nosso).
Os dois artigos apontam como uma das finalidades da Educação Básica a
qualificação e as condições para progredir no trabalho e em estudos posteriores. Mas, é
preciso pontuar que principalmente no que se refere ao Ensino Fundamental o documento
não trata de uma formação profissionalizante, mas sim em possibilitar ao aluno que
desenvolva habilidades e competências que permita aos jovens no futuro o seu ingresso
no mundo do trabalho. Essa temática inclusive foi inserida na BNCC, quando esta assinala
que no

Mundo do trabalho, abordam-se, no Ensino Fundamental – Anos Iniciais, os


processos e as técnicas construtivas e o uso de diferentes materiais produzidos
pelas sociedades em diversos tempos. São igualmente abordadas as
características das inúmeras atividades e suas funções socioeconômicas nos
setores da economia e os processos produtivos agroindustriais, expressos em
distintas cadeias produtivas. No Ensino Fundamental – Anos Finais, essa
unidade temática ganha relevância: incorpora-se o processo de produção do
espaço agrário e industrial em sua relação entre campo e cidade, destacando-
se as alterações provocadas pelas novas tecnologias no setor produtivo, fator
desencadeador de mudanças substanciais nas relações de trabalho, na geração
de emprego e na distribuição de renda em diferentes escalas. A Revolução
Industrial, a revolução técnico-científico-informacional e a urbanização devem
ser associadas às alterações no mundo do trabalho. Nesse sentido, os alunos
terão condição de compreender as mudanças que ocorreram no mundo do
trabalho em variados tempos, escalas e processos históricos, sociais e étnico-
raciais. (MEC, 2017; pág. 361)

O documento não propõe apenas que o aluno conheça as mudanças ocorridas no


mundo no trabalho, ela também está ancorando no desenvolvimento de competências e
habilidades de maneira a preparar os educados para os desafios do século XXI.
Entendemos que as competências e habilidades necessárias no campo profissional hoje
são diferentes das que eram importantes a 30 anos atrás, e das que serão necessárias daqui
a 10, 20 anos. O trabalho da escola nesse sentido é qualificar os alunos para os desafios
atuais, e futuros. Ao analisar as mudanças ocorridas no mundo contemporâneo no que diz
respeito às questões econômicas e o mundo do trabalho, o relatório Delors (1998, pág.
71) destaca que

A relação entre o ritmo do progresso técnico e a qualidade da intervenção


humana torna-se, então, cada vez mais evidente, assim como a necessidade de
formar agentes econômicos aptos a utilizar as novas tecnologias e que revelem

36
um comportamento inovador. Requerem-se novas aptidões e os sistemas
educativos devem dar resposta a esta necessidade, não só assegurando os anos
de escolarização ou de formação profissional estritamente necessários, mas
formando cientistas, inovadores e quadros técnicos de alto nível. (grifo
nosso)

Os parâmetros curriculares nacionais já apontavam para o desenvolvimento de


competências de acordo com as orientações internacionais, pautadas nos quatro pilares
da educação: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser, aprender a viver
juntos. A ideia do desenvolvimento de competências habilidades passaram então a nortear
o processo educacional brasileiro. Nesse sentido a BNCC apresenta como sendo
competências gerais a serem desenvolvidas no decorrer da Educação Básica:

1. Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o


mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade,
continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma sociedade justa,
democrática e inclusiva.
2. Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das
ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e
a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e
resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos
conhecimentos das diferentes áreas.
3. Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais
às mundiais, e também participar de práticas diversificadas da produção
artístico-cultural.
4. Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras,
e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, bem como conhecimentos das
linguagens artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar
informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e
produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo.
5. Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e
comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas
práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e
disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e
exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.
6. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de
conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações
próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da
cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência
crítica e responsabilidade.
7. Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para
formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que
respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o
consumo responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento
ético em relação ao cuidado de si mesmo,
dos outros e do planeta. Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua saúde física
e emocional, compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas
emoções e as dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas.
9. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação,
fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos,
com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos
sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos
de qualquer natureza.
10. Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade,
flexibilidade, resiliência e determinação, tomando decisões com base em

37
princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários. (MEC,
2017; PÁG. 9-10)

A análise das competências apontadas na BNCC, estão diretamente ligadas aos


quatro pilares definidos para a educação do século XXI, rompendo com o modelo de
educação que estava centrado apenas no desenvolvimento cognitivo em detrimento de
outros conhecimentos. Essa perspectiva defende que o aluno precisa “exercitar sua
curiosidade intelectual”, também deve estar apto a “, formular e resolver problemas e criar
soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas”.
Ou seja, o modelo de educação pautada no “decoreba” e na repetição perde espaço, pois
o conhecimento hoje modifica-se em uma velocidade nunca antes visto, e o aluno deve estar apto
a utilizar os conhecimentos já adquiridos para formular novos conhecimentos, ampliado assim
sua competência e sua habilidade para lidar com novas situações.
O documento reconhece que não existe apenas um único tipo de linguagem e destaca a
necessidade de o educando conhecer e utilizar as diferentes linguagens, tais como: verbal,
corporal, visual, sonora e digital. Admite também o papel das tecnologias digitais na sociedade
atual e assevera que não basta conhecer, é preciso
Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e
comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas
práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e
disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e
exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva (MEC, 2017;
PÁG.09)

Sem dúvida esses são pontos importantes, especialmente no contexto atual em que
muitas pessoas passaram a ter acesso as diferentes tecnologias digitais, porém, muitas
vezes as empregam de maneira inadequada propagando as chamadas “fake News”.
Outras competências importantes são o desenvolvimento da capacidade de
argumentação, o exercício da empatia e da resolução de conflitos, a resiliência e o
compromisso com o coletivo. Todas essas competências têm como foco preparar o
educador para lidar com as mudanças constantes que o nosso planeta vive hoje.
RESUMO

O trabalho com temas transversais está previsto nos documentos legais que
orientam a educação brasileira. O objetivo é inserir no currículo escolar temas e questões
que extrapolem o conteúdo programático das diferentes disciplinas. A escolha dos temas
e questões a serem tratadas devem levar em consideração as necessidades da região em
que o educando vive e está atento as questões que emergem em sua sala de aula.

38
O tema cidadania permeia toda a educação básica e é apresentado como um ponto
importante da formação dos educandos, pois estes devem conhecer os seus direitos e
deveres, analisar as questões sociais e posicionar-se criticamente. Além disso, frente a as
mudanças da globalização a UNESCO assinala que é preciso reconhecer que existe hoje
uma cidadania global, embora essa posição não seja um consenso entre os diferentes
países.
Outro tema relevante é o trabalho, apontado nos documentos legais como um eixo
de formação que perpassa toda a educação básica. Não se trata de transformar a educação
básica em uma formação profissionalizante, mas sim de contribuir para desenvolvimento
de competências e habilidades que permitam a esse educando insere-se no mundo do
trabalho quando for o momento.
AUTOAVALIAÇÃO

1. Qual o conceito moderno de cidadania?


2. Analise as competências apontadas na BNCC e como estas estão relacionadas
a formação cidadã.
3. Que competências apontadas nos PCN’s e agora na BNCC, indicam a
importância do eixo trabalho na formação dos educandos?
4. Que relação podemos estabelecer entre a globalização e a ideia de cidadania
global?

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In: KARNAL, Leandro (org). História na sala de aula: conceitos, práticas e
propostas- 5ª ed. 1ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2008.
UNESCO. Educação para a cidadania global: preparando alunos para os desafiosdo
século XXI. -- Brasília: UNESCO, 2015.

40
4. A SELEÇÃO DE CONTEÚDOS E FONTES E A
IMPORTÂNCIA DOS CONHECIMENTOS HISTÓRICOS

OBJETIVO DO TEMA

Analisar a evolução da ciência História


Identificar as principais correntes metodológicas da histórica
Discernir como se dá a seleção dos conteúdos de História no contexto atual
Analisar como os conteúdos de história escolar são apresentados nos PCN’s e na
BNCC.

INTRODUÇÃO

A seleção de conteúdos para ser trabalhado em uma sala de aula tem uma relação
direta como a concepção que a sociedade tem do papel da escola e do objetivo a ser
alcançado pelas disciplinas ensinadas. Para entendermos o contexto que orienta a seleção
dos conteúdos a serem trabalhados na História, faz-se necessário retornamos um pouco
na história da referida disciplina.
No Brasil, durante séculos a escola tinha como função primordial atender a
formação da elite. No período entre os séculos XVI e XVIII os jesuítas dominaram o
cenário educacional brasileiro, criando escolas que tinham por objetivo a formação moral,
religiosa e humanística da elite local. Segundo Fonseca (2006, p.39) nesse modelo de
educação a “História não se constituía, pois, como disciplina escolar e tinha, na verdade,
função instrumental, com objetivos exteriores a ela”, visto que textos antigos
especialmente os gregos eram utilizados como aporte ao ensino de disciplinas como
Gramática, Retórica e Filosofia. Mas, não existia uma preocupação com a formação
historiográfica.
No século XIX como já vimos anteriormente ocorreram debates em torno do dos
projetos educacionais no país e acerca do que abordar no currículo de História. A
discussão incluía questões como o ensino da História Sagrada, História Universal e
História da Pátria. (FONSECA 2006).
Vale lembrar que a Igreja tinha um papel relevante no país naquele momento e
por isso a história Sagrada acaba por ocupar muito espaço no ensino de História.
Bittencourt (2009) afirma que mesmo após a proclamação da República quando houve a
separação entre a Igreja e o Estado, o ensino da história Sagrada ainda prevalecia. É
somente com a consolidação da República e a necessidade de se propagar uma história

41
nacional que a história vai assumindo um novo papel que é o de criar uma identidade
nacionalista. Os conteúdos de história passam ser focados na ideia de propagação ao culto
aos heróis da pátria e aos grandes homens, que eram sempre membros da elite local.
Esse modelo de ensino de História tinha um papel claro na manutenção da ordem
social vigente, e permanece ao longo da maior parte do século XX, apesar de alguns
incipientes movimentos em determinados períodos para promover inovações no currículo
de História. Nesse sentido Bittencourt (2009) aponta ações como a do intelectual Manuel
Bonfim que procurou introduzir História da América nos cursos de formação de
professores primários, ou ainda a criação de escolas de educação popular por seguidores
das ideias anarquistas.
No entanto, o conceito de cidadania criado pela História ainda perdura no século
XIX e boa parte do século XX, com objetivo de colocar cada cidadão no seu devido lugar,
no qual “cabia ao político cuidar da política, e ao trabalhador comum restava o direito de
votar e de trabalhar dentro da ordem institucional” (ID IBID, pág.64). A História estudava
os feitos dos “grandes homens”, seres de uma elite predestinada, para promover a nação
e o seu progresso. O papel da classe trabalhadora era negado, os movimentos realizados
pelos grupos populares eram omitidos do estudo ou apresentados de maneira negativa.
Mas, como vimos anteriormente as últimas quatro décadas foram marcadas por
muitas mudanças no cenário educacional brasileiro e em especial no diz respeito ao ensino
de história na sala de aula. A História deixou de estar centrada na concepção positiva e
passou a ter fonte influência das correntes historiográficas: marxista e Escola dos
Annales.

4.1 A seleção de conteúdos e a tendência historiográfica.

Como discutimos antes para definir o que será trabalhando em sala de aula e os
objetivos a serem alcançados, depende da concepção que a sociedade tem da função social
da escola. Para entendermos melhor o papel do ensino de história da formação dos
educandos hoje, faz-se necessário conhecer o pouco as correntes historiográficas que
passaram a influencias as pesquisas históricas e o conhecimento historiográfico a ser
trabalhado. Segundo Bittencourt (2009, pág. 139) “situar os referenciais teóricos no
processo da seleção de conteúdos escolares não tem como objetivo a participação em
debates acadêmicos, mas é uma necessidade para o trabalho docente que
permanentemente se realiza na escola”. Ou seja, é partir dos referenciais teóricos que

42
podemos estabelecer um critério claro quanto a seleção de conteúdo, visando um objetivo
especifico de aprendizagem.
Como vimo na maior parte do século XX o ensino de história no Brasil foi pautado
na história dos heróis, grandes homens, dos grandes feitos históricos. Essa tendência era
“denominada de historicismo cuja metodologia ficou conhecida como positivismo, por
basear-se nos princípios da objetividade e da neutralidade no trabalho do historiador” (ID
IBID, pág. 141).
A ideia de imparcialidade por parte do historiador foi questionada por alguns
estudiosos. Cardoso e Brignoli (2002, pág. 22), enfatizam que muitos historiadores

[...] seguros do conjunto de regras e de seus métodos, em geral, eles estavam


longe de perceber que os famosos “fatos históricos”, supostamente uma
realidade exterior e substancial que se impõe ao pesquisador eram, antes uma
criação deste; que embora não se evidenciassem, explicitas, uma teoria
explicativa ou hipótese de trabalho, nem por isso deixavam de existir – e
determinavam a seleção do objeto e dos documentos; a elaboração dos “fatos”
a partir de tais testemunhos; e sua exposição ordenada. Uma concepção
transcendente da história, do movimento histórico – claro que implícita e nunca
mencionada – era o critério para definir cada fato como histórico ou não, e era
o que permitia “saltar” de um fato para outro, assim compondo um fato
ordenado.

Essa ideia de uma história imparcial influenciou durante décadas no Brasil um


modelo de história escolar pautada no modelo eurocêntrico, e temas como história da
África, da Ásia ou até mesmos das diferentes populações indígenas eram negligenciados
como se não tivessem uma história, ou essa aparecia apenas como um complemento da
história da Europa. A metodologia adotada pelos professores para ensinar ancorava-se na
narrativa, e cabia aos alunos decorar as datas, nomes de personagens e fatos importantes.
A crítica e a reflexão não faziam parte das aulas de história.
A partir da década de 1980, influenciado pelas mudanças que ocorriam no Brasil,
e pelas discussões historiográficas que se processavam no contexto global especialmente
a partir dos anos de 1950 e 1968, duas correntes vão se destacar a Escola dos Annales e
o marxismo. Tinha outras correntes como da História Cultural e a Nova História, mas
vamos nos ater as duas primeiras pela forte influência que elas tiveram no contexto da
história escolar brasileira.
O movimento dos Annales surgiu na França em 1929, com um pequeno grupo de
historiadores que tinha entre eles Lucien Febvre, Marc Bloc, Fernand Braudel, Deorge
Duby, Jacques Le Goff, que fundaram a revista Annales, para publicarem suas pesquisas

43
que vinha na contramão da corrente positivista. As ideias desse novo modelo de estudo
historiográficos propunha a
em primeiro lugar a substituição da história tradicional narrativa de
acontecimentos por uma história-problema. Em segundo lugar, a história de
todas as atividades humanas e não apenas história política. Em terceiro lugar,
visando completar os dois primeiros objetivos, a colaboração com outras
disciplinas, tais como a geografia, a sociologia, a psicologia, a economia, a
linguística, a antropologia social e tantas outras. (BURKE, 2010, pág. 12)

A concepção de história adotada pela Escola de Annales rompe com a perspectiva


tradicional da história dos grandes heróis, dos grandes homens. Agora a história passa a
se interessar pelas diferentes atividades humanas e novos personagens passam a fazer
parte do contexto histórico. Em paralelo ao movimento dos Annales, outros estudiosos,
buscavam outras metodologias para explicar o conhecimento histórico, nesse caso os
grupos influenciados pelas ideias marxistas que buscavam compreender a história
humana com base nas questões estruturais. Bittercourt (2209, pág. 145) destaca que

O paradigma marxista desenvolvido paralelamente ao grupo dos Annales tem


como princípio o caráter científico do conhecimento histórico, e o enfoque de
sua análise é a estrutura dinâmica das sociedades humanas. A análise marxista
parte das estruturas presentes com a finalidade de orientar a práxis social,
e tais estruturas conduzem à percepção de fatores formados no passado
cujo o conhecimento é útil para a atuação da realidade hodierna. Existe
assim uma vinculação epistemológica dialética entre presente e passado. Para
o estudo das sociedades humanas, o marxismo utiliza como conceitos
fundamentais o modo de produção, a formação econômico-social e classes
sociais. (grifo nosso)

Na concepção marxista da História o coletivo ganha força em detrimento do


individual, pois as transformações ocorridas na sociedade não são vistas como o resultado
do esforço de um herói, mais decorrentes das lutas sociais. Por exemplo, ao tomamos
como referência a compreensão marxista dos fatos históricos, a abolição dos escravos no
Brasil, não seria decorrente de um ato de bondade da princesa Isabel, como propagavam
os ideários do positivismo, e sim o resultado de um amplo movimento local e
internacional que levou a abolição gradual da escravatura até a assinatura da Lei Áurea,
que encerra a escravidão, porém não põe fim as lutas dos negros por direitos e a conquista
de espaço na sociedade brasileira. No contexto atual esse segundo posicionamento é
reconhecido como legitimo por estudiosos da área.
Quando analisamos as orientações contidas nos PCN’s de História e mais
recentemente a BNCC, é possível reconhecer a influência das ideias da Escola de Annales

44
e do Marxismo e do que diz respeito ao que se espera do ensino de História na Educação
Básica. De acordo com a BNCC (2017, pág. 399)
[...] espera-se que o conhecimento histórico seja tratado como uma forma de
pensar, entre várias; uma forma de indagar sobre as coisas do passado e do
presente, de construir explicações, desvendar significados, compor e decompor
interpretações, em movimento contínuo ao longo do tempo e do espaço. Enfim,
trata-se de transformar a história em ferramenta a serviço de um discernimento
maior sobre as experiências humanas e as sociedades em que se vive.

O documento ressalta que a função do conhecimento histórico é estimular o


educando a questionar, pensar, analisar, indagar o passado e o presente, para poder
construir explicações, ou seja, o aluno não é um ser pacifico que recebe todo o
conhecimento pronto e a história não é um conhecimento pronto e acabado, portanto na
educação atual, o modelo tradicional positivo de ensino de história perdeu espaço, para a
nova concepção de história.
Mas, o que deve ser ensinado em História para os alunos da Educação Básica? No
que diz respeito a seleção dos conteúdos vale salientar que alguns estudiosos defendem a
organização dos conteúdos por temas. Por exemplo, o tema democracia, permitiria que o
professor apresentasse o tema em diferentes épocas, desde a Grécia Antiga até a
atualidades.
No entanto, a maioria dos autores de livros didáticos, continuam organizando os
conteúdos com base nos tempos históricos: Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna e
Idade Contemporânea. Mesmo seguindo a estrutura mais linear do estudo da história
elementos importantes passaram a fazer parte da seleção dos conteúdos a serem
ministrados em sala de aula. A BNCC, apontar a organização linear dos conteúdos
históricos, mais também enfatiza a inclusão de assuntos importantes já apontados em
documentos anteriores, como o papel das mulheres em diferentes momentos da história,
o estudos das culturas clássicas (Egito, Grécia, Roma, etc), além da inclusão de outros
culturas, como os chineses, os japoneses, os africanos, os povos pré-colombianos, as
populações indígenas e etc.
Vale salientar que no Brasil, duas leis foram importantes para garantir o estudo
das culturas africanas e afro-brasileiras e a cultura indígena. Em 2003, foi sancionada a
Lei nº. 10693, que tornava obrigatória a presença da temática “História e Cultura Afro-
Brasileira e Africana”, no currículo escolar. Em 2008 a referida lei foi alterada pela Lei
nº. 11645, que determinava também a obrigatoriedade do ensino da cultura indígena, além
da Africana e Afro-Brasileira. Outro fator importante assegurando na lei é que esses

45
conteúdos devem permear todo o currículo escolar. Essas duas leis foram marcantes para
implementação de reformulações não apenas nas escolas, mas nas universidades, onde se
dá a formação dos professores.
Quanto a esse último ponto, Pinsk e Pinsk (2008, pág. 22) afirmam que “Um
professor mal preparado e desmotivado não consegue dar boas aulas nem com o melhor
dos livros, ao passo que um bom professor pode até aproveitar-se de um livro com falhas
para corrigi-las e desenvolver o velho e bom espirito critico entre os alunos”.
Concordamos com os autores e enfatizamos a importância do professor se apropriar do
conhecimento a ser trabalhado com os alunos, pois só assim ele poderá instigar a
curiosidade histórica dos alunos, partindo de questões da atualidade, para buscar
compreender o passado.

4.2. As fontes históricas e o conhecimento histórico.

Como já destacamos o conhecimento histórico a ser trabalhado em sala de aula,


tem uma relação direta com a concepção que temos de história. O mesmo se dá no que
diz respeito ao que pode ser considerado como fonte histórica ou não.
No século XIX com a predominância da concepção positivista da história o
documento escrito era considerado uma fonte imprescindível para o historiador, que
deveria “extrair do documento a informação que nele estava contida” (SCHIMDT e
CAINELLI, 2010, pág. 112). E via de regra os chamados documentos oficiais eram
considerados como determinantes na compreensão do conhecimento histórico. Nos livros
didáticos os documentos apareciam para comprovar o que estava sendo dito, não havia
espaço para questionamentos.
Hoje a pesquisa histórica está “baseada numa multiplicidade de documentos;
escritos de todos os tipos, documentos figurados, produtos de escavações arqueológicas,
documentos orais etc”. (NIKITIUK, 2007; pág. 13). E se trouxéssemos para a chamada
história do presente ainda podemos incluir novas fontes como as redes sociais, a internet,
a televisão. No entanto, é essencial que esses documentos sejam questionados, pelo
historiador e que este utilize diferentes fontes e documentos históricos para se provar um
determinado fato.
A nova concepção do que pode ser considerado um documento histórico, redefini
o uso destes no ensino de história. Schimdt e Cainelli (2010, pág. 117), asseveram que
nessa nova percepção “os documentos não são tratados como um fim em si mesmo, mas

46
deverão responder às indagações e às problematizações de alunos e professores, com o
objetivo de estabelecer um diálogo com o passado e o presente, tendo como referência o
conteúdo histórico a ser ensinado”. Cabe ao professor utilizar as diferentes fontes
documentais, e ter como foco, que é importante o uso de fontes diferentes acerca de um
mesmo tema e orientar o aluno na interrogação das mesmas, bem como no confronto entre
as fontes e principalmente saber como utilizá-las em sala de aula e em qual momento
estas devem ser introduzidas.
Outro aspecto a ser considerado na análise das fontes é a compreensão do contexto
histórico em que estes foram produzidos. Um exemplo para essa questão é quando o
professor decide utilizar a música para trabalhar uma determinada época. Vamos supor
que o professor decida trabalhar a ditadura militar através das chamadas músicas de
protesto, ora para que elas não são sejam meras ilustrações, é necessário interrogar esse
documento. Perguntas como: Quem escreveu? Com que objetivo foram escritas? Em que
contexto foram escritas? Qual o assunto abordado? Bittencourt (2009, pág. 334) apresenta
um esquema interessante para análise de um documento, que apresentamos seguir:

DESCREVER, o documento, isto é, destacar e PARA MOBILIZAR, os saberes e


indicar as informações que ele contém. conhecimentos prévios

EXPLICAR o documento, isto é,


associar essas informações aos SITUAR, o documento no
contexto e em relação ao IDENTIFICAR a natureza
saberes anteriores
seu autor desse documento e também
explorar esta característica.
PARA CHEGAR A

Identificar os LIMITES e o interesse do documento, isto é, criticá-lo

Fonte: BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos. – 3ed. – São Paulo, Cortez, 2009

Observe que autora apresenta um roteiro detalhado para auxiliar o professor a


trabalhar qualquer documento dentro de um contexto pedagógico. Mas, é claro que as
práticas pedagógicas irão variar conforme o nível do grupo de alunos a ser trabalhado.
Além dos documentos escritos, outras fontes documentais ganharam espaço, tais
como a iconografia, a fotografia, o cinema e as audiovisuais. Embora sejam fontes
importantes, algumas questões precisam ser consideradas. As fontes não escritas, são

47
elementos relativamente novos no que se refere a pesquisa histórica e ao seu uso como
ferramentas pedagógicas para o ensino de história.
Temos muito o que discutir acerca do uso dessas fontes históricas, mas nesse
momento trataremos apenas do uso da fotografia e da internet. A fotografia surgiu no
século XIX e popularizou-se no decorrer do século XX. Oliveira, Almeida e Fonseca
(2012, pág. 50), destacam que
A fotografia foi responsável por introduzir no cotidiano das pessoas imagens
que consolidaram na sociedade a crueldade do conflito impossibilitando o seu
questionamento, ou seja, a imagem fotográfica ganhou status de “real”, por
meio de sua representação persuasiva e convincente, mas passou também a ser
vista como instrumento de denúncia, elemento bastante utilizando pela
impressa.

Nos dias atuais observamos uma explosão de imagens com advento das câmeras
digitais, do uso do celular para fotografar e da popularização das redes sociais.
Ferramentas que passaram a ser utilizadas com diferentes finalidades, como ferramenta
de trabalho, como fonte de pesquisa em educação, com matérias jornalísticas e inclusive
políticas. Nesse sentido é importante considerar o alerta de Bittencourt (2009, pá. 366)
para uma questão delicada, visto que a fotografia precisa ser compreendida como uma
“representação do real”, e não como o fato real, visto que o autor da foto capta um
determinado instante do real.
Você deve estar se perguntado, então isso anular a fotografia como fonte
histórica? A Resposta é não, mas, é preciso também questionar essa fonte, procurando
compreender em que contexto ela foi tirada e com qual objetivo. Por isso nenhuma
imagem pode ser analisada de maneira isolada, é necessário que imagem na fotografia
dialogue com outras fontes, para que possamos contextualizá-la dentro de um
determinado tempo e espaço, bem como compreender “a trama na qual foi construída, os
interesses que a cercam, a ideia que pretende consolidar, a memória que pretende
construir” (OLIVEIRA, ALMEIDA E FONSECA, 2012, 49).
O professor deve selecionar que imagens poderão causar maior impacto. Como
exemplo podemos citar a imagem da menina vietnamita correndo nua após o bombardeio
de sua vila durante a guerra do Vietnã. Essa imagem chocou a opinião mundial e
contribuiu para ampliação dos protestos contra a guerra do Vietnã e contra o uso de armas
químicas na guerra. Existem muitas imagens marcantes que são amplamente utilizadas
nos livros didáticos, cabe ao professor aprender a trabalhar com leitura de imagens.

48
O professor deve juntamente com o aluno buscar informações internas a
imagens, tais como: quem aparece em primeiro plano, e ao fundo? O que estão fazendo?
Etc. Outros questionamentos ainda podem ser feitos, como por exemplo: Quem fez a foto?
Em que momento fez? Com qual objetivo a foto foi tirada e assim pode diante. Por fim
com base nos dados obtidos o professor pode solicitar que o aluno compare a imagem a
outros documentos históricos para que esse possa fazer uma analise critica do fato
histórico em questão. A metodologia utilizada para trabalhar com a fotografia, pode ser
estendida a outras fontes iconográficas.
O uso da internet tem sido um elemento fundamental, em especial do que diz
respeito a história do presente. Mas também requer cuidado no contexto da elaboração do
conhecimento histórico, mas não pode ser ignorado. A facilidade de acesso a informação
produzida pela internet e as redes sociais, promoveu um aumento absurdo das chamadas
“Fakes News”, e ficou claro que estás podem influenciar muitas pessoas. Por isso, o aluno
deve ser orientado no uso correto da internet, questionar as informações que encontra,
buscar fontes diferentes para confirmar ou negar determinada informação, analisar as
informações encontradas, buscar sites confiáveis.
Para finalizar esse tema precisamos estar cientes que o conhecimento histórico
não é imutável, que novas pesquisas, bem como a análise de novos documentos e o acesso
a diferentes fontes de pesquisa pode alterar o que antes era visto como correto. Hoje
devemos sempre está pronto para enfrentar as mudanças. Theodoro (2008, pág. 53)
afirmar que a maneira que temos para enfrentar as mudanças é “identificando,
comparando, relacionado, traduzindo e abstraindo”. Ou seja, o aluno precisar aprender a
conhecer e a pensar historicamente e isso requer conhecimento, e uso de diferentes
habilidades para trabalhar esse conhecimento.
RESUMO

A seleção de conteúdos bem como uso de diferentes fontes históricas na


produção do conhecimento histórico está diretamente ligada a concepção que temos de
história na sociedade atual. Vimos que influenciado pelas novas correntes historiográficas
a seleção de conteúdos mudou, além das culturas clássicas outras culturas passaram a
fazer parte do conteúdo histórico escolar, tais como a sociedade japonesa, a africana, e a
indígena. A introdução das duas últimas no currículo escolar brasileiro está amparada
pelas leis 10.693/03 e 11.645/08.

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Vimos ainda que além das fontes documentais escritas, a produção do
conhecimento histórico utilizar diversas outras fontes tais como a iconográfica, a
audiovisual, a oral etc. O uso dessas fontes na formação histórica do aluno em sala de
aula, não deve ser meramente ilustrativa, mas o educando necessita ser orientado a
indagar as diferentes fontes, analisá-las e criticá-las. Por fim, compreendemos que o
conhecimento histórico não é imutável e, portanto, faz-se necessário aprender a lidar com
as mudanças.
AUTOAVALIAÇÃO

1. Que mudanças podem ser apontadas na seleção dos conteúdos históricos? Qual
relação entre essas mudanças e a nova concepção de história?
2. Qual a importância das fontes históricas no trabalho com a história em sala de
aula?
3. Que cuidados são necessários com relação ao uso das fontes históricas na
produção do conhecimento?

REFERÊNCIAS

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estudo sobre o ensinar na universidade. Dissertação (Mestrado Acadêmico em
Educação- Universidade Estadual do Ceará) Fortaleza, 2010.

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bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a
obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras
providências. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2003/L10.639.htm. Acessado em 19 de
março de 2019.

BRASIL. LEI Nº 11.645, DE 10 MARÇO DE 2008. Altera a Lei no 9.394, de 20 de


dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que
estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo
oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-
Brasileira e Indígena”. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11645.htm.
Acessado em 19 de março de 2019

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais


história /Secretaria de Educação Fundamental. - Brasília : MEC / SEF, 1998.

BRASIL. LEI Nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da


educação nacional. Disponível em:

50
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei9394_ldbn1.pdf. Acessado em
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Lopes. São Paulo: Editora Unesp, 2011.

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Leandro (org). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas- 5ª ed. 1ª
reimpressão. São Paulo: Contexto, 2008.

51
5. A COMPREENSÃO DO FENÔMENO "TEMPO"

OBJETIVO DO TEMA
Compreender o conceito de tempo
Compreender o papel da contagem do tempo na história na humanidade
Analisar o tempo cíclico e o tempo linear na História da humanidade
Analisar o conceito de tempo histórico

5.1. INTRODUÇÃO

Expressões como “tempo é dinheiro”, “não tenho tempo”, o “tempo voa”, o


“tempo hoje passa mais rápido do que antigamente”, tornaram-se comum nos dias atuais.
O homem moderno perdeu sua conexão com a natureza e vive em uma corrida constante
contra o tempo para dar conta das inúmeras atividades que se propõe a fazer. No entanto,
devemos lembrar que a relação do homem com o tempo não é mesma em todos os lugares
e nem todas as sociedades. Um exemplo próximo de nossa realidade, é a relação do
homem do sertão com o tempo. Se você já visitou o sertão deve percebido que a relação
desse homem com o tempo é diferente. Mesmo tendo muito o que fazer, ele não vive em
uma corrida desenfreada como a do homem urbano, para dar conta de suas atividades.

A preocupação com o tempo presente, passado e futuro é uma característica


humana, no entanto, durante séculos a relação do homem com o tempo foi completamente
diferente da que temos hoje. Mas, afinal o que é tempo? Por que o homem atual corre
tanto? O conceito de tempo hoje é mesmo de outras épocas? O que precisamos
compreender sobre o tempo e sua relação com a história do homem? Estas são algumas
das perguntas que tentaremos responder nesse tópico.

5.2. O TEMPO E O HOMEM

A palavra tempo é utilizada pelo homem em diferentes circunstâncias, atribuindo-


lhe significados diversos, como podemos ver no poema a seguir de Barbara Adam, citado
por Tonelli (2008, pág. 209)
TEMPO É
Tempo é
Tempo é ordem
Tempo é duração
Tempo é estabilidade e estrutura
Tempo é persistência e permanência
Tempo é repetição, ciclo e ritmos

52
Tempo é começo e fim, pausa e transição
Tempo é a diferença entre o antes e o depois, a causa e o efeito
Tempo é vida e morte, crescimento e declínio, noite e dia
Tempo é mudança, transitoriedade e efemeridade
Tempo é evolução, história e desenvolvimento
Tempo é fluxo e transformação
Tempo é processo e potencial
Tempo é mutabilidade
Tempo é caos
Tempo é
Tempo é velocidade
Tempo é duração
Tempo é simultaneidade
Tempo é Chrono & Kairos
Tempo é passado, presente e futuro
Tempo é a sucessão de momentos
Tempo é memória, percepção & antecipação
Tempo é mercadoria & valor de troca
Tempo é medida de movimento
Tempo é, a priori, intuição
Tempo é instantaneidade
Tempo é um recurso
Tempo é dinheiro
Tempo é um presente
Tempo está
Tempo está voando
Tempo está passando
Tempo está continuando
Tempo não está esperando por ninguém
Tempo está desaparecendo como um sonho
Tempo está indo para sempre
Tempo está evaporando
Tempo está chegando
Tempo é tempo
Tempo é

O poema apresentar diferentes percepções do que seja o tempo, por isso é


importante esclarecer que não iremos exaurir o assunto tempo nesse tópico, visto que este
é bem complexo, mas procuremos refletir um pouco sobre a formulação e a mudança no
conceito de tempo ao longo da nossa história.
Em uma consulta no dicionário Houaiss, encontramos que tempo é um “período
continuo e indefinido no qual os eventos se sucedem e criam no homem a noção de
presente, passado e futuro”. Essa é a noção mais comum que o homem tem do tempo,
mas, ao conferirmos o dicionário de filosofia, verificamos que

Podemos distinguir três concepções fundamentais: 1ª o T. como ordem


mensurável do movimento; 2ª o T. como movimento intuído; 3ª o T. como

53
estrutura de possibilidades. A primeira concepção vincula-se, na Antiguidade,
o conceito cíclico do mundo e da vida do homem (metempsicose) e, na época
moderna, o conceito científico de tempo. À segunda concepção vincula-se ao
conceito de consciência, com o qual o tempo é identificado. A terceira
concepção deriva da filosofia existencialista, apresenta algumas inovações na
análise do conceito de tempo. (ABBAGNANO, 2007, pág. 1111).

Abbagnano (2007), deixa claro que não existe apenas um único conceito para
tempo e que tentar defini-lo pode ser um pouco mais complexo do que parece em um
primeiro momento. O tempo tal como conhecemos hoje também é uma construção social
e sua concepção foi mudado ao longo dos séculos, bem como a forma do homem lidar
com ele.
Para entendemos como se deu essa construção social em torno do conceito de
tempo, vamos fazer um pequeno passeio pela história humana. Poucos sabemos acerca
da concepção do homem primitivo acerca do tempo, mas as pinturas rupestres e alguns
artefatos encontrados podem ser um indicativo que este homem já tinha alguma percepção
quanto ao presente e ao passado. As primeiras concepções do homem quanto ao conceito
de tempo, está ligado as mudanças ocorridas na natureza: dia e noite; período de chuva e
seca e assim sucessivamente.
O homem do paleolítico era nômade e vivia da caça da pesca e da coleta de frutos,
portanto, ele precisava aprender a conhecer a natureza para puder sobreviver. Durante o
dia ele podia caça, coletar frutos e se locomover de um lugar para o outro. A escuridão da
noite o deixava a mercê dos animais ferozes e não permitia sua locomoção em virtude do
perigo. Aos poucos o homem passou a observar que em determinados períodos as noites
eram mais claras, o período de lua, esse fator contribuiu para que muitos povos
utilizassem as fases da lua na contagem dos dias.
Na antiguidade a relação do homem com relação ao tempo ainda estava muito
ligada aos ciclos da natureza, que eram muitas vezes associados a figuras divinas, para os
Egípcios, Rá era o deus Sol; Thoth era patrono da Lua; e assim por diante. Os gregos
também relacionavam seus deuses e elementos da natureza, por exemplo, Artémis era a
deusa da Lua; Deméter, deus da terra fértil; Hélios, deus do Sol etc. Essa associação entre
deuses e elementos da natureza, resultava em uma eterna luta entre o bem e o mal.
Como resultado dessa luta e da dependência do homem da natureza, cabia a este
relacionar-se com as forças divinas. Whitrow, (2003, s/pág), ressalta que

Isso significou a criação de um conjunto de rituais. Por mais de dois mil anos,
até os tempos helênicos, os babilônios faziam uma festa de vários dias para
celebrar o Ano-Novo, que ocorria por volta do equinócio da primavera. A
história da criação era encenada e até mesmo se travava uma falsa batalha, com

54
o rei personificando o deus vitorioso. No Egito, onde tudo dependia do Nilo, a
coroação de um novo faraó era programada para coincidir com a subida do rio,
no início do verão, ou com o recuo das águas, no outono, quando os campos
fertilizados estavam prontos para serem semeados.

O autor chama atenção para as celebrações realizadas pelo homem, buscando


assim agradar aos deuses e garantir que o “tempo” fosse propicio para o plantio e a
colheita. Essa concepção de tempo para alguns povos se apresentava dentro de uma
perspectiva cíclica.
Devido as mudanças ocorridas em sua organização social, o homem sentiu a
necessidades de organizar uma forma de contagem de tempo. Alguns estudiosos atribuem
aos babilônios a criação dos setes dias da semana associadas ao Sol e a Lua. Esse modelo
de calendário vai influência na organização de outros calendários. De acordo com
Whitrow (2003, s/pág)

Da Babilônia veio a doutrina da influência das estrelas sobre o destino dos


homens; dos gregos alexandrinos veio a astronomia matemática, que colocava
os planetas em uma certa ordem de distância da Terra; e sobre esses
fundamentos os últimos astrólogos helênicos, conhecedores do antigo culto ao
mágico número sete, construíram uma semana puramente pagã.

A fala do autor aponta para a influência de diferentes povos na organização dos


dias semanas, ou seja, a contagem do tempo tal como conhecemos hoje, dia, semana, mês,
ano e assim sucessivamente é uma criação cultural do homem ao longo de sua história.
Quanto a forma de se relacionar com o tempo essa também foi se modificando.
Poucos povos na antiguidade tinham uma visão não cíclica do tempo, como exemplo
podemos citar os hebreus e os gregos. Embora alguns autores também assinalem os
iranianos zoroástricos nessa categoria.
Vejamos, a história dos Hebreus está diretamente ligada à sua futura salvação,
portanto, rompe com a ideia cíclica de tempo utilizada por alguns povos. Com os gregos
o tempo ganha um conceito filosófico. Aróstegui (2006, pág. 274) afirma que “na análise
aristotélica, o fundamental é que se absolutiza a relação do tempo e movimento, mas se
nega que o tempo seja equivalente ao próprio movimento”
Na Idade Média, o tempo continuar a ter uma relação com o divino, visto que as
pessoas comuns não tinham uma noção clara de tempo e que a igreja católica havia
assumindo um papel importante, inclusive no que diz respeito a organização das
sociedades, sendo ela a detentora de conhecimento e poder, chegando inclusive a arbitrar
na decisão de questões políticas e sociais. Domingues (2016, s/pág) citando Le Gof,
assinala que

55
O tempo da Idade Média é, em primeiro lugar, um tempo de Deus e da terra,
depois dos senhores e dos que estão sujeitos ao senhorio, depois – sem que os
tempos precedentes tenham deixado de ser presentes e exigentes –um tempo
das cidades e dos mercadores, e, finalmente, um tempo do príncipe e do
indivíduo.

O homem medieval em especial o que viveu até o século XIV dependia da


natureza para sobreviver, portanto o tempo continuava a ser marcado pelo ritmo da
natureza, mas a igreja introduziu novos marcadores temporais, agora ao invés de celebrar
o solstício para marcar o início do verão, o tempo passar a ser marcado pelas festas
religiosas, tais como:

Advento, Natal, Quaresma, Semana Santa (com o Domingo de Ramos,


Eucaristia, Paixão culminando na Páscoa, a ressurreição), Domingo de
Pentecostes etc. Outras festas religiosas, em particular, as dos santos, também
eram marcadores temporais da sociedade cristã, entre eles: Candelária (2 de
fevereiro), Corpus Christi (segundo domingo após o Pentecoste), São Joao (24
de junho), Todos os Santos (1º de novembro) e Dia dos Mortos (2 de
novembro). (Domingues, 2016; s/ pág.)

O homem comum do período medievo não tinha uma necessidade maior quanto a
contagem do tempo. Mas, é importante compreender como o cristianismo influenciou no
rompimento de um conceito cíclico de tempo. O Whitrow (2003, s/pág) afirma que
A influência do cristianismo sobre nosso conceito moderno de tempo não se
restringe aos detalhes do calendário. Ela foi bem mais fundamental que isso.
Considerou-se a doutrina central da Crucificação um evento único no tempo,
não sujeito a repetição, implicando assim que o tempo deve ser linear, e não
cíclico. A crença no modelo cíclico de tempo era um aspecto comum a várias
culturas antigas, e caracterizava em particular as ideias cosmológicas gregas,
sobretudo na época helênica. Encontrou sua apoteose na ideia do “Grande
Ano”, vividamente descrita por Nemésio, bispo de Emesa, no século IV:

Esse rompimento com ideia de um tempo cíclico passou a fazer parte da cultura
ocidental moderna. No entanto, vale lembrar que o homem simples do período medievo
estava por vezes tão isolado que era comum a mistura do mítico com o religioso. E
segundo Franco Junior (2001, s/pág) “a cristianização das camadas populares não aboliu
a teoria cíclica, pelo contrário, influenciou o cristianismo erudito e reforçou certas
categorias do pensamento mítico”. Esse conflito entre as ideias cristãs e as ditas pagãs
provocou durante a inquisição uma ferrenha perseguição há alguns grupos que ainda
permaneciam ligados as festividades pagãs, pois passaram a ser acusados de bruxaria.
Quanto a forma de contar o tempo estes não se interessavam por uma contagem
de tempo clara e uniforme, a exemplo do que já acontecia desde a antiguidade o dia tinha

56
12hs, assim como a noite. A contagem das horas de um dia era feita com a ajuda de
ampulhetas, velas e relógios d´água. Com isso a contagem dos minutos e segundos eram
praticamente ignorados. Nas vilas e cidades que vão surgido é o toque do sino da igreja
que marca as horas.
Como vimos mesmo com o choque entre as ideias cristãs e pagãs, ou até mesmo
sua mescla em alguns momentos, a igreja foi estabelecendo o ritmo de contagem do
tempo, utilizando como marco as festas religiosas. No que diz respeito a organização das
atividades durante o dia é igreja quem vai ditar o ritmo das atividades. Domingues (2016;
s/pág), assinala que

A Igreja medieval herdou do calendário latino a denominação de cada intervalo


de tempo: prima (corresponde às 6h), terça (9h), sexta (12h) e nona (15h).
Acrescentou mais quatro intervalos: louvor (alvorecer), véspera (pôr do sol) e
completa (antes do repouso, quando a jornada está “completa”) e matina (meia
noite).

Essa organização do dia servia para marcar as atividades desenvolvidas nos


mosteiros. O ritmo dos intervalos de tempo era ditado pelo sino das igrejas, que também
servia de referência para as pessoas que viviam próxima as abadias. Essa relação do
homem com a organização do tempo atendia as suas necessidades. Whitrow (2003, s/pág)
assinala que
Ao longo de todo o período medieval, os conceitos de tempo cíclico e linear
existiram em conflito. Os cientistas e eruditos, influenciados pela astronomia
e pela astrologia, tendiam a enfatizar o conceito cíclico. A concepção linear
era promovida pela classe mercantil e pela ascensão de uma economia
monetária. Pois enquanto o poder se concentrava na propriedade da terra, o
tempo era considerado abundante e associado ao ciclo imutável do solo. Mas
com a circulação da moeda deu-se ênfase à mobilidade. O ritmo de vida
aumentou, e o tempo passou a ser considerado algo valioso que parecia escapar
continuamente; depois do século XIV, os relógios públicos das cidades
italianas batiam as 24 horas do dia. Os homens começavam a acreditar que
“tempo é dinheiro” e que deviam tentar usá-lo de forma econômica.

O autor assinala que o crescimento da organização urbana das sociedades


modificou a relação do homem com o tempo. A vida nas cidades exigia mais desse
homem que precisava de dinheiro para comprar o que era necessário para se alimentar,
vestir, divertir-se. Com isso a contagem do tempo necessitava ser mais precisa, o que
levou a invenção de um relógio mecânico que permitia uma contagem mais precisa do
tempo. O primeiro relógio mecânico surgiu na China no século VIII, mais na Europa os
primeiros relógios mecânicos datam do século XIII. Domingues (2016), assevera que
A precisão dos relógios mecânicos era pequena; em razão do atrito dos
mecanismos, a defasagem acumulada era, geralmente, de pelo menos uma hora
por dia. O ponteiro de minutos, aliás, só foi introduzido em 1577, pelo alemão

57
Jost Burgi. Sem ele, pode-se supor a larga tolerância com que se via o passar
do tempo e a imprecisão com que era medido naquela sociedade do “daqui a
pouco”.

Complementando a informação Whitrow (2001, s/pág) assinala que a “a origem


da exata contagem moderna do tempo foi descoberta por Galileu a partir de um processo
periódico natural que pode ser repetido infinitamente e contado: a oscilação do pêndulo”.
A popularização do relógio mecânico ganha força, e a partir da revolução industrial a
ideia de que tempo é dinheiro assume o papel significativo na dinâmica social. Os
operários trabalhavam em média 12h até 14h ao dia.
Embora na atualidade a existência de legislação trabalhista busque proteger o
trabalhador para evitar a sua exploração, tornou-se comum as pessoas terem mais de um
emprego para conseguir arcar com as questões financeiras. Além do mais as
transformações ocorridas na sociedade nos aspectos econômicos, sociais, políticos,
tecnológicos criaram uma verdadeira corrida do homem contemporâneo contra o tempo,
criando uma falsa ideia de que o tempo hoje passa mais rápido do que antigamente, na
realidade o que modificou foi a maneira de se relacionar com o tempo.
O advento da internet e sua popularização provocou um intenso fluxo de
informação, o que provoca mudanças em uma velocidade nunca antes vistas. Outro ponto
importante é que o uso da internet alterou as relações de trabalho, de um lado existe uma
maior flexibilização quanto as relações de trabalho, mas por outro lado, o uso da
tecnologia provocou o prolongamento de suas horas de trabalho, visto que mesmo em
casa, ou viajando de férias, o trabalhador se desliga totalmente do trabalho.
Muitas vezes ele é “convidado”, a resolver alguma demanda de trabalho. Essa
situação acaba por gerar nas pessoas a uma falsa ideia de que tempo não é suficiente para
fazer tudo que precisa, cuidar de sua vida e da família, trabalhar, reservar um período para
o lazer.
Para finalizar essa discussão sobre o tempo queremos reiterar que o conceito de
tempo é um conceito socialmente construído e no que diz respeito ao tempo histórico Gil
e Almeida (2012, pág. 47), assinalam que

O tempo histórico não trabalha com medidas exatas como o tempo


cronológico, expresso nos calendários. A organização feita pela História
considera os eventos de curta e longa duração, observando a forma como as
sociedades se organizam e as modificações no desenvolvimento das relações
políticas, no comportamento das práticas econômicas e culturais. Mesmo
parecendo que o tempo histórico e tempo cronológico sejam diferentes, o
historiador utiliza a cronologia para a organizar as narrativas que constrói;

58
ambos têm grande importância para que o homem organize as representações
sobre a sua existência.
O tempo histórico precisa ser compreendido dentro da trama que o forma, pois
embora os historiadores utilizem o tempo cronológico linear para organizar os tempos
históricos em determinados períodos, e selecionem determinadas características para
nomeá-los, isso não significa que todas as sociedades apresentem as mesmas
características dentro de um tempo e espaço.
Sendo assim, precisamos ter cuidado ao trabalhar com os alunos com a
periodização tradicional da história, afinal hoje não podemos mais considerar povos que
não dominam a escrita com um povo sem história, nem tão pouco afirmar que todos os
grupos evoluíram historicamente da mesma forma e da mesma maneira. Ou seja, as datas
são importantes e os alunos deve conhecê-las. Porém estas devem ser apresentadas de
maneira a criar um espaço de problematização que instigue o aluno a pensar
historicamente, levantamento questionamentos, analisando os fatos e criticando-os.

RESUMO
Nesse tema aprendemos que o homem utiliza a palavra tempo para se referir a
diferentes situações. Compreendemos também que o conceito de tempo é construção
social e que ao longo de sua história o homem foi modificado a forma de entender e se
relacionar com ele. A relação do homem primitivo com o tempo estava diretamente ligada
as mudanças de fases da natureza, ideia que ainda vai continua a prevalecer na antiguidade
e parte da Idade Média. A maioria dos povos da antiguidade tinham uma compreensão
cíclica de tempo, ideia essa que começa a ser rompida definitivamente com a influência
do cristianismo, que define a crucificação de Cristo como evento único que não se
repetirá. Embora a igreja passe a ditar os ritmos de tempo no período medievo, utilizado
as festas religiosas como elementos de marcação de tempo, a ideia do tempo cíclico não
foi totalmente rompida, pois em regiões mais isoladas, as festividades pagãs como a do
solstício, acabavam sendo mescladas com as festas cristãs.
Com advento das cidades estas passaram a ditar novas formas de organização
social e econômica. E o tempo passa a ter maior importância na vida desse novo homem,
o que leva ao surgimento do relógio mecânico na Europa no século XIV. Com o passar
dos séculos ocorreu um aprimoramento na forma de contagem do tempo, até chegar aos
relógios digitais que existem hoje. Ao longo da história o homem mudou sua maneira de
relacionar e lidar com o tempo. A vida nas grandes e advento da tecnologia, criou uma
falsa ideia de que o tempo passa mais rápido hoje e que não existe tempo suficiente para

59
fazer tudo que desejamos. Por fim é importante destacar que o tempo histórico não segue
o mesmo processo do tempo cronológico, visto que este é organizado pela história
levando em consideração a forma como a sociedade se organiza e as modificações,
sociais, culturais, políticas e econômicas vivenciadas. Além disso, esses eventos podem
ser classificados em períodos de curta duração e longa duração.

AUTOAVALIAÇÃO
1. Explique porque o conceito de tempo é um conceito socialmente construindo
pelo homem?
2. Que mudanças podem ser apontadas na maneira do homem de lidar com o
tempo da pré-história a atualidade?
3. Porque o cristianismo contribuiu para o rompimento do conceito cíclico de
tempo?
4. Diferencie tempo cronológico de tempo histórico.

REFERÊNCIAS
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revista por Alfredo Bossi; revisão da tradução e tradução de novos textos Ivone
Castilho Benedetti. – 5ª end. – São Paulo: Martins Fontes, 2007.
AROSTEGUI, Júlio. A pesquisa histórica: teoria e método. Tradução: André Dore;
revisão técnica José Jobson de Andrade Arruda. Bauru, SP: Edusc: 2006 (Coleção
História).
BLOCH, Marc. A sociedade Feudal. São Paulo: Martins Fontes, 1982. Edição digital.
DOMINGUES, Joelza Ester. O tempo na idade média e a invenção do relógio.
Disponível em https://ensinarhistoriajoelza.com.br/tempo-na-idade-media-
invencao-do-relogio/a - . Acessado em 23/03/2019.
GIL; Carmem Zeli de Vargas; ALMEIDA, Dóris Bittencourt. A docência em História:
reflexões e propostas para a ação. Erichim: Edelbra, 2012.
HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Sales. Minidicionário Houaiss da Língua
Portuguesa. 3ª ed. ver. E aum. – Rio de Janeiro: Objetiva; 2008.
JÚNIOR, Hilário Franco. A Idade Média: nascimento do ocidente. - 2. ed. rev. e ampl.
--São Paulo: Brasiliense, 2001. Edição digital.
http://www.letras.ufrj.br/veralima/historia_arte/Hilario-Franco-Jr-A-Idade-Media-
PDF.pdf. Acessado em 23/03/2019.
TONELLI, Maria José. Sentidos do tempo e do tempo de Trabalho na vida cotidiana1.
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http://www.scielo.br/pdf/osoc/v15n45/v15n45a16.pdf Acessado em 23/03/2019.
WHITROW, G.J. O que é tempo? Uma visão clássica sobre a natureza do tempo.
Tradução: Maria Ignez Duque Estrada. Rio de Janeiro, Zaar Editora, 2005. Edição

60
digital: Setembro de 2013 ISBN: 978-85-378-0407-0. Disponível em:
file:///C:/Users/anade/OneDrive/Documents/Documento%20de%20educa%C3%A7
%C3%A3o%20e%20ensino%20de%20hist%C3%B3ria/O%20que%20%C3%A9%
20Tempo%20-%20G.%20J.%20Whitrow.PDF Acessado em 23/03/2018

61
6. OBSERVANDO A LUA

OBJETIVOS DO TEMA:

Analisar o fascínio que a lua exercesse sobre o homem.


Identificar a presença da lua na mitologia antiga.
Relacionar a lunação com a forma do homem conta o tempo.

Introdução

Você já parou para observar o céu? Sabe identificar as diferentes fases da lua?
Você já ouviu a expressão “fulano é de lua”? Para muitas pessoas essa expressão é
estranha, até mesmo absurda, mas outras pessoas ainda hoje acreditam que a lua tem
influencia no comportamento de animais, das plantas e até mesmo do próprio homem.
Alguns estudos vem sendo realizando a fim de negar ou não essas hipóteses. Mas, esse
não será o foco de nossa abordagem aqui. Os questionamentos iniciais têm apenas o
intuito de indagar que conhecimentos você tem sobre a lua.

A vida nas grandes cidades distanciou o homem de uma relação mais próxima
com a natureza, mas como vimos antes, em tempos passados a sobrevivência dependia
do conhecimento que este tinha da natureza. O homem na pré-história teve que aprender
a lida com luz e a escuridão, ou seja, o dia e a noite. Imaginem o que você faria se
tivéssemos um colapso de energia e a cidade em que mora ficasse vários dias sem luz.
Talvez o primeiro desafio fosse aprender a se movimentar com pouca luminosidade, pois
as velas e lampiões que com certeza seriam utilizados, não oferecem a mesma capacidade
de iluminação que a luz elétrica fornece. Ou até mesmo aprendesse a observar o céu, as
estrelas e as mudanças de fase da lua e assim perceberia que algumas noites são mais
claras do que outras.

Observar a natureza e suas mudanças, foi fundamental para o homem sobreviver


e ao longo de sua história ele aprendeu a diferenciar dia e noite, inicialmente a explicação
para o desaparecimento do sol e o surgimento da lua era puramente mítica, mas com o
passar do tempo o homem foi buscando explicações cientificas para esse e outros
fenômenos.

6.1. A LUA

62
A atração que a lua exerce sobre o homem, levou a humanidade a buscar
compreender a influência que esta tinha sobre as ações da natureza e do próprio homem.
Ao longo da história o homem aprendeu a ler as imagens celestes e a entender as
diferentes fases da lua. A compreensão do mapa celestes e das diferentes fases da lua
eram determinantes em certas épocas, para auxiliar o homem a se guiar, até mesmo nas
navegações.
De acordo com Milone (2003, pág. 1-41) “a Lua é o único satélite natural da
Terra. Foi denominada, na antiguidade, de Luna, antiga cidade de Tucana (Itália) pelos
romanos e Selene, irmã de Hélio e filha de Hipérion e Téia pelos gregos. É o astro mais
brilhante do céu noturno”. Complementando afirmação anterior Rodrigues Junior (2012,
pág.45), destaca que quase todas as culturas antigas cultuavam a lua
Os egípcios chamavam de Khonsu [...] ao seu deus Lua, os sumérios,
de Nanna. As deusas grega e romana da Lua tinham três faces: na sua
forma escura era Hécate, na crescente Artêmis (Diana), e na forma cheia
era Selene (Luna). Selene foi descrita como uma mulher numa
carruagem puxada por um par de cavalos alados.

A existência de diferentes cultos a lua destaca a importância que essa tinha para
as culturas antigas, que buscavam explicação para os fenômenos naturais. Mas, é possível
que a lua já despertasse o interesse de povos na pré-história.
No site do Núcleo de Astronomia do Centro de Ciência Via do Algave (CCVAL)
encontramos informações curiosas acerca da astronomia dos povos pré-históricos uma
delas destaca que os elementos megalíticos de Stonehenge poderia ter funcionado como
um observatório astronômico, visto que seus círculos “exteriores constituídos por 27 ou
28 pedras, que representam a duração do ciclo lunar”. De acordo com referido site,

O alinhamento de Stonehenge ao meio-dia do solstício é talvez a maior


manifestação da Astronomia dos nossos antepassados. Não é provável, apesar
da precisão que se verifica com certas efemérides astronómicas, que
Stonehenge tenha funcionado como observatório astronómico, no sentido
actual do termo, sendo mais provável que tenha sido um local de culto para
rituais pagãos ligados a essas mesmas efemérides. O eixo do alinhamento de
Stonehenge encontra-se na direcção do nascer-do-sol no soltício de Inverno, e
em direcção ao pôr-do-sol no solstício de Verão

Essa teoria, chama atenção para importância que os nossos antepassados já davam
não apenas aos fenômenos ocorridos na terra, mas estavam de olho no nosso sistema
espacial. O homem primitivo precisava saber por exemplo quanto tempo ainda tinha de

63
sol, para isso ele vai criar mecanismo para medir esse tempo, conforme indicar Trogello,
et all, (2013, pág. 9) citando Soares

A humanidade, desde os tempos remotos, necessitou de [...] (orientação) e de


medir o tempo. Os homens precisavam saber quanto tempo tinham de claridade
para poder realizar diferentes tarefas. Observar a variação do comprimento da
sombra durante o dia foi uma das primeiras práticas para medir a passagem do
tempo, e para buscar orientação de acordo com os pontos cardeais. Observando
também as sombras foi possível definir as estações do ano que influenciavam
fortemente nas atividades agrícolas

Além de saber o que ainda lhe restava de luz solar o homem precisou aprender a
lidar com a escuridão da noite. Para isso ele começou a observar a lua e aos poucos foi
compreendendo suas diferentes fases. A capacidade dos nossos antepassados em lidar
com os diversos desafios da natureza foi fundamental para que esse evoluísse de um modo
de vida nômade para vida sedentária. Para isso eles desenvolveram habilidades para lidar
como os fenômenos da natureza, as cheias, as drenagens de pântanos, o período correto
para o plantio e colheita. Os sumérios por exemplo, já por volta do ano 3000 a.C,
desenvolveram cidades, organizaram obras de drenagem, criaram a escrita cuneiforme,
elaboram leis, criaram um calendário lunar. Além disso,

A Lua também foi adorada como um deus andrógino, que reúne características
masculinas e femininas — como Shiva, o deus transformador do hinduísmo,
que carrega a Lua Crescente como um de seus símbolos. Temperamental,
instável e misterioso como a loucura, o satélite podia trazer fartura e saúde, ou
miséria e doenças. Suas fases — Nova, Crescente, Cheia e Minguante
ajudaram decisivamente para essa reputação. Para os antigos, o próprio astro
parecia nascer, crescer, atingir a plenitude e desaparecer, como a barriga de
uma gestante. Por isso, ela foi associada à fertilidade da terra, dos animais e
das mulheres. Era a senhora absoluta dos ritmos de vida e morte.
(https://super.abril.com.br/ciencia/sob-o-dominio-da-lua-os-mitos-deste-
satelite/. Acessado em 27/03/2019)

Observe que para os nossos antepassados haviam uma relação entre as diferentes
fases da lua e da natureza e inclusive, relacionavam suas mudanças a fertilidade da terra,
dos animais e da própria mulher. Por isso ela muitas vezes vai ser representada em forma
de deusas, como vimos antes. Além disso, as diferentes fases da lua permitiram que essa
fosse utilizada para marcar determinados eventos. Saraiva e Oliveira Filho (2018, s/pág),
assinalam que

O ciclo completo dura aproximadamente 29,5 dias. Esse fenômeno é bem


compreendido desde a Antiguidade. Acredita-se que o grego Anaxágoras (≈
430 a.C.), já conhecia sua causa, e Aristóteles (384 - 322 a.C.) registrou a
explicação correta do fenômeno: as fases da Lua resultam do fato de que ela
não é um corpo luminoso, e sim um corpo iluminado pela luz do Sol

64
Complementando essa ideia Doberstein (2010, pág. 27), apresentado elementos
da cultura egípcia destaca

A cada ciclo de tempo, a partir de meados de julho, uma enchente acontecia.


Durante umas doze luas, de julho a setembro [..] ficava tudo inundado. Dava
tempo para que os nutrientes orgânicos, que vinham junto com as águas, se
fixassem no solo. Depois disso o rio voltava ao seu leito normal e não chovia
mais. [...]

A lunação também foi utilizada para marca períodos festivos. Conforme Shultz
(1995, pág 67), para os judeus no Antigo Testamento

Toques de trombeta proclamavam, oficialmente, o começo de um novo mês


(veja Nm 10:10). A lua nova também era observada mediante holocaustos
e sacrifícios pelo pecado, com as devidas provisões de ofertas de manjares
e de libação (veja NM 28:11-15). O sétimo mês, no qual havia o Dia da
Expiação e a Festa das Semanas, assinalava o clímax do ano religioso, ou o
fim do ano (veja Êx 34:22). No primeiro dia da semana, a lua nova era
intitulada Festa das Trombetas, quando eram apresentadas oferendas
adicionais (veja Lv 23:23-25 e Nm 29: 1-6). E era esse por igual modo, o
começo do ano civil. (grifo nosso)

As celebrações realizadas no período na Lua Nova mostram os judeus utilizaram


as fases da lua para assinalar eventos importantes dentro de sua cultura. O mesmo também
ocorreu com outros povos da antiguidade. No século VI uma decisão de Roma determina
que a Páscoa cristã deveria ser celebrada no primeiro domingo de lua cheia após o
equinócio, o que assinala que não apenas os povos antigos utilizaram os movimentos
lunares para determinar datas importantes, mas também o homem do período medievo,
como destaca Belmaia (2017, pág. 558, 559):

O concílio de Niceia, convocado por Constantino em 325 d.C., o primeiro


grande concílio da cristandade, intentava obter consenso sobre questões
basilares da Igreja. Embora nada conste nos cânones, Eusébio de Cesareia, em
Vita Constantini, III, XIV, menciona que Niceia estava de acordo sobre o
“tempo para a celebração da festa da Páscoa”, mas nenhum detalhe foi
registrado. Após vários embates, um cálculo definitivo para determinar a data
da Páscoa foi promulgado por Roma no século VI, quando o ecumênico
Dionísio Exíguo (470 d.C. – 544 d.C.) reformulou o ciclo de 19 anos
alexandrino, instituindo que a Páscoa deveria ser celebrada por toda a
Igreja no primeiro domingo de lua cheia após o equinócio da primavera
no hemisfério norte (grifo nosso)

65
A definição da celebração da Páscoa cristã utilizando as passagens lunares para
definir a época correta demonstra que de certa forma a lunação ainda tinha influência na
mentalidade medieval para a contagem do tempo. Não podemos esquecer que a Páscoa
era uma celebração cristã e que na Idade Média a igreja vai em muitos momentos
perseguir de forma severa aqueles que ainda mantinham celebrações pagãs.
A importância atribuída a lua e suas fases na organização de calendários, na
definição de datas festivas, levou a uma busca por explicações cientificas para esse
fenômeno. É somente com os gregos que teremos as primeiras tentativas de explicações
lógicas sobre os fenômenos que envolve as esferas celestes. De acordo com o site
astro.if.ufrgs.br, Pitágoras, foi o primeiro a denominar o céu de cosmos e acreditava que
“os planetas, o Sol, e a Lua eram transportados por esferas separadas da que carregava as
estrelas”. O mesmo site ainda destaca que
Aristóteles de Estagira (384-322 a.C.), aluno de Platão, e este aluno de
Sócrates, explicou que as fases da Lua dependem de quanto da parte da face
da Lua iluminada pelo Sol está voltada para a Terra. Explicou, também, os
eclipses: um eclipse do Sol ocorre quando a Lua passa entre a Terra e o Sol;
um eclipse da Lua ocorre quando a Lua entra na sombra da Terra. Aristóteles
argumentou a favor da esfericidade da Terra, já que a sombra da Terra na
Lua durante um eclipse lunar é sempre arredondada. Afirmava que o
Universo é esférico e finito. Aperfeiçoou a teoria das esferas concêntricas de
Eudoxus de Cnidus (408-355 a.C.), propondo eu seu livro De Cælo, que "o
Universo é finito e esférico, ou não terá centro e não pode se mover." Após
Aristóteles, o desenvolvimento científico passou para Alexandria, capital do
Egito, fundada por Alexandre o Grande (356-323 a.C.) em 332 a.C., que fora
aluno de Aristóteles (grifo nosso)

O interesse pelo nosso sistema celeste favoreceu o aprimoramento da astronomia.


Os babilônios por exemplo tinham um grande interesse pela observação da natureza e
deixaram registrados diversas informações acerca dos fenômenos naturais, conforme
podemos ver a seguir:

7000 interpretações de fenómenos estranhos (omens) foram acumuladas ao


longo dos anos em 70 lâminas de pedra, conhecidas pelas suas palavras de
abertura como Enuma Anu Enlil, tendo a sua versão final sido terminada cerca
de 900 A.C..
O corpo celeste mais vezes citado no Enuma é a Lua; o calendário babilónico
era lunar, pelo que o ciclo da Lua era de extrema importância.
(http://www.ccvalg.pt/astronomia/historia/antiguidade.htm. Acessado em
27/03/2019)

A criação de um calendário pelos babilônios com base na lunação, ressalta a


importância desse corpo celeste para aquele povo. A busca por compreender a lua e seus
fenômenos levou o homem a buscar respostas. As primeiras explicações para esse

66
fenômeno tinham um caráter puramente mítico, depois começaram a aparecer as
tentativas de explicações cientificas até chegar ao que sabemos hoje.
Na busca por respostas Ptolomeu, um grego-egípcio que tinha cidadania romana
e vivia em Alexandria, e é considerado como o último grande astrônomo da antiguidade,
organizou o Almagest, onde registrou a compilação de inúmeros conhecimentos da
antiguidade, e continha respostas para diferentes perguntas, acerca do universo e sua
organização?
No Almagest, Ptolomeu sugere um sistema de mundos geocêntrico, baseado
em conceitos de geometria dados por Apolónio de Perga. O sistema
geocêntrico resultante é muitas vezes chamado sistema ptolemaico. Este
sistema possuía pela primeira vez explicação para o carácter errante dos
planetas, para além de explicar as diferenças de velocidade entre os diferentes
pontos da alegada órbita do planeta em torno da Terra.
(http://www.ccvalg.pt/astronomia/historia/antiguidade.htm. Acessado em
27/03/2019)

No século XVII, no período que conhecemos como Revolução Científica o


homem faria um grande avanço em busca por respostas para decifrar o universo. Galileu
Galilei desenvolveu o telescópio e com isso conseguiu em 1610 descrever as chamadas
montanhas na lua, bem como os satélites de Júpiter e diversas estrelas que ainda não tinha
sido vistas a olho nu. As descrições feitas por Galileu modificaram a visão cosmológica
que haviam sido descritas por Aristóteles.
O aprimoramento dos telescópios levou o homem a desvendar mais elementos que
buscavam explicar a lua e seus fenômenos, mais ainda não parecia suficiente e o homem
passou a sonhar em ir à lua. Em 1865 o autor francês Julio Verne, publicaria uma das
maiores obras de ficção cientifica, que narra a ida do homem à lua, antecipando em mais
de 100 anos o feito. O trecho a seguir foi retirado do livro e mostra alguns dos
questionamentos feitos pelo diretor do observatório de Cambridge ao presidente do Gun-
Club2, de Baltimore nos EUA
As perguntas que lhe foram feitas são as seguintes: 1.º Será possível enviar um
projétil até à Lua? 2.º Qual é a distância exata que há entre a Terra e o seu
satélite? 3.º Quanto tempo durará o trajeto do projétil ao qual tenha sido
imprimida a velocidade inicial suficiente, e por consequência, em que
momento deverá ser arremessado para que encontre a Lua num ponto
determinado? 4.º Em que momento prefixo estará a Lua na posição mais
favorável para ser alcançada pelo projétil? 5.º A que ponto do céu deve fazer-
se a pontaria com o canhão destinado a lançar o projétil? 6.º Que lugar há de
ocupar a Lua no céu, no momento da partida do projétil? Em relação à primeira
pergunta: Será possível enviar um projétil até à Lua? Sim, é possível alcançar
a Lua com um projétil, contanto que se consiga animar esse projétil de uma

2
O Gun-club no livro de Júlio Verne era um clube balístico localizado nos EUA, cujo os associados
decidem após a guerra, criar um grande canhão com o objetivo é disparar um projetil que alcance a lua

67
velocidade inicial de 12.000 jardas por segundo. Demonstra o cálculo que tal
velocidade é bastante. À medida que nos afastamos da terra, a ação da
gravidade diminui na razão inversa do quadrado das distâncias, isto é, por
exemplo, para uma distância três vezes maior, torna-se nove vezes menor. Por
consequência o peso da bala há de decrescer rapidamente, até chegar a ser
completamente nulo, o que há de suceder no momento em que a atração da Lua
fizer equilíbrio à da Terra, isto é, quando tiver percorrido 47/52 do seu trajeto.
Nesse momento o projétil não terá peso algum, e se passar além desse ponto
há de cair para a Lua só por efeito da atração lunar. Fica portanto
irrecusavelmente demonstrada a possibilidade teórica da experiência;
enquanto ao seu bom êxito, esse depende unicamente da potência do
maquinismo que se empregar. Com respeito à segunda pergunta: Qual é a
distância exata que há entre a Terra e o seu satélite? A Lua não descreve em
torno da terra uma circunferência de círculo, mas sim uma elipse, num dos
focos da qual está situado o nosso globo; daí vem por consequência que a Lua
está, ora mais próxima, ora mais afastada da terra, ou em termos astronómicos,
agora no apogeu, logo no perigeu; e a diferença entre a maior e a menor
distância é relativamente bastante considerável para que não devamos
desprezá-la. Com efeito, no apogeu está a Lua a 247.552 milhas (398.396 km)
e no perigeu a 218.657 milhas (351.894 km) somente da Terra, o que dá uma
diferença de 28.895 milhas (46.502 km), que é mais da nona parte do percurso
total. Portanto a distância perigeia da Lua é que deve servir de base aos
cálculos. [....] (Verne, s/n; s/p)

As perguntas e respostas lançadas pelo autor aponta para os avanços que o homem
já havia alcançado naquele momento. Embora a distância entre a terra e a lua não fosse
exata, pois hoje sabemos que essa distância 384 400km, mas, a confirmação de
proximidade com a terra é verdadeira.
A atração que a lua sempre exerceu sobre a humanidade, bem como a sua
proximidade com a terra, favoreceu a sua exploração. Em 1959 a sonda soviética Lunik
2, partiu rumo a lua. No dia seguinte momentos do impacto de um pousou abrupto foram
registrados por observatórios soviéticos e estrangeiros
(https://br.rbth.com/historia/79118-neste-dia-sonda-espacial-sovietica-lancada Acessado
em 27/03/2019).
Em plena guerra fria o fato dos soviéticos terem sido os primeiros a conseguirem
pousar na lua uma sonda, mesmo que está não tenha retomando, contribuiu para o
crescimento da “chamada corrida espacial” na qual soviéticos e norte-americanos
tentavam demonstram seu poder e obter vantagens estratégicas e bélicas através do
desenvolvimento de satélites, e da conquista do espaço, considerados por muitos como a
última fronteira. Em 1961, a Rússia venceria mais uma etapa da corrida espacial ao lança
a primeira espaçonave pilotada pelo cosmonauta Yuri Gagarin, este tripulou a nave
espacial Vostok I, que realizou um voo orbital de 108 minutos

68
(https://acervo.estadao.com.br/noticias/topicos,corrida-espacial,469,0.htm. Acessado em
27/03/2019)
Os Estados Unidos se sentiram pressionados a realizarem um feito ainda maior e
após lançarem Alan Shepard ao espaço sideral em 1961, e John Glen, se tornar em 1962
o primeiro americano a orbitar a terra. Ainda em 1961 John Kennedy então presidente
norte-americano anunciou que os EUA enviariam uma nave tribulada a lua até o final da
década. Em 1968 a primeira fase da promessa de Kennedy seria cumprida quando a nave
Apollo 8 efetuou o primeiro voo tripulado na orbita lunar. Mas, foi em julho de 1969 que
os norte-americanos marcariam a sua maior conquista no processo da corrida espacial, ao
aterrissar na lua e transmitir para todo o planeta o momento em que Neil Armstrong e
Edwin Adrin, pisaram na lua.
De lá para cá foram realizadas outras expedições tripuladas a lua com voos de
curta duração e em 1986 os soviéticos colocaram na orbita terrestre a primeira estação
permanente, a MIR, que passou a funcionar como um laboratório para pesquisas de
astrofísica, ciência dos materiais e estudo da terra. Mas, outro feito importante marcaria
a exploração do espaço, dessa vez o ponto mais importante foi a união entre norte-
americanos e soviéticos ao colocar em orbita em 2001 a Estação Espacial Internacional.

RESUMO

A lua sempre exerceu um fascínio sobre o homem, que desde tempos remotos
busca compreender os fenômenos que envolvem a lua. A lua foi utilizada pelo homem
como marco para a contagem do tempo, a criação de calendários e foi adorada como uma
divindade por alguns povos. Em busca de respostas incialmente os fenômenos lunares
são associados a divindades e com o passar do tempo começam a surgir as primeiras
explicações cientificas. Os gregos são os primeiros a buscarem uma resposta lógica para
as diferentes perguntas que cercavam a humanidade, inclusive a que diz respeito ao nosso
sistema celeste e em um primeiro momento surge a teoria geocêntrica, na qual Ptolomeu
aponta a terra como centro do universo. Essa teoria iria prevalece até a era moderna.
No século XVI com a criação do telescópio foi possível ver pela primeira vez as
montanhas da lua. No século XIX, Júlio Verne escreve uma obra de ficção cientifica
antecipando em mais de 100 anos a ida do homem a lua. Em 1959 os russos lançaram a
sonda Lunik 2, que apesar de ter pousado na lua não retornou. Esse episódio torna-se um
marco na corrida espacial que ocorria em plena guerra fria entre os soviéticos e os norte-

69
americanos. Em 1969, os Estados Unidos tornar-se-ia o primeiro país do mundo, a pisar
em solo lunar, com Armstrong, pisou na lua e ficou uma bandeira norte-
americana. Mesmo após a ida do homem à lua, muitas perguntas ainda precisam ser
respondidas a fim de compreendemos, porque a lua continua a fascinar o homem e qual
a real influência dessa em nossa vida.

AUTOAVALIAÇÃO
1. Qual a influência da lua na organização da vida dos homens na antiguidade?
2. Como a lua influenciou na organização dos calendários?
3. Qual a importância da criação do telescópio?
4. Análise a ida do homem a lua e apresente uma explicação para o fascínio que
essa continua a exercer sobre a humanidade?

REFERÊNCIAS
BELMAIA , Nathany Andrea Wagenheimer. Do Pessach à Pascha: ressignificação
dos significantes da Páscoa judaica pela Páscoa cristã. ANTÍTESES. v. 10, n.
19, p. 543-564, jan./jun. 2017.
http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/antiteses/article/viewFile/27412/21287.
Acesso em 23/03/2019.
CANALLE, João Batista Garcia; MATSUURA, Oscar Toshiaki. Astronomia. Curso de
Astronomia e Ciências do Espaço. Formação Continuada de professores. Agência
Espacial brasileira. Programa AEB escola, 2007. Disponível em:
http://www.cdcc.usp.br/cda/oba/aeb/astronomia.pdf. Acessado em 23/03/2019.
DOBERSTEIN, Arnoldo Walter. O EGITO ANTIGO. Porto Alegre: Edipucs, 2010.
IVANOV, Stepan. Neste dia: Sonda espacial soviética ‘Luna 2’ era lançada. 2017.
Disponível em: https://br.rbth.com/historia/79118-neste-dia-sonda-espacial-
sovietica-lancada. Acessado em 28/03/2019
SCHUTZ, Samuel. A história de Israel no antigo testamento. São Paulo: Vida Nova,
1995.
VERNE, Júlio. Da terra a Lua: viagem direta em 97 horas e 20 minutos. Livro eletrônico.
Disponível em: http://www.ebc.com.br/sites/_portalebc2014/files/atoms/files/-
da_terra_a_lua_-_julio_verne.pdf. Acessado em 30/03/2019.

Sites
Corrida espacial Disputa entre os Estados Unidos e a União Soviética pela supremacia
da exploração espacial. (1957-1975).
https://acervo.estadao.com.br/noticias/topicos,corrida-espacial,469,0.htm
Astronomia Antiga. http://astro.if.ufrgs.br/antiga/antiga.htm. Acessado em 23/03/2019
http://www.ccvalg.pt/astronomia/historia/antiguidade.htm. Acessado em 27/03/2019)

70
UNIDADE 2 – História, Tempo e Diversidade cultural.

Objetivos da Unidade
Analisar a origem do calendário
Identificar os tipos de calendário
Identificar os tipos de diversidade;
Estabelecer a diferença entre diversidade e cultura
Determinar como e quando os seres humanos começaram a existir;
Entender que o homem moderno evoluiu em etapas a partir de uma série de ancestrais,
entre eles várias formas anteriores de seres humanos;
Apresentar um pouco da história da criança no Brasil;
Abordar o processo de mudanças na concepção de infância, como ela era vista nos séculos
XII e XIII;

9. OS CALENDÁRIOS
Objetivos do tema
Analisar a origem do calendário
Identificar os tipos de calendário
Estabelecer a diferença entre calendário de base lunar, solar e lunissolar.
Relacionar o uso do calendário a questões religiosas
Compreender a criação do calendário como uma questão social.

9.1. INTRODUÇÃO

Você é uma daquelas pessoas que no início do ano olha o calendário para conferir
o total de feriados, ou para saber em que dia uma data importante para você irá cair? Hoje
o calendário faz parte da vida da sociedade, mas nem sempre foi assim. A organização
dos primeiros calendários teve uma função iminentemente pratica, pois o homem
precisava saber o período em que teriam uma nova lua cheia, o que permitiria uma noite
mais clara, ou ainda quantas luas haviam se passado desde que ocorrera determinado
evento.

No tema sobre o tempo estudamos que o conceito de tempo tal como


compreendemos hoje é construção social que se consolidou ao longo dos anos e a forma
do homem lidar com o tempo também sofreu alterações. O mesmo podemos afirmar em
relação a organização de um calendário pela humanidade, pois este também é uma

71
construção social que foi sendo consolidada conforme as mudanças sofridas no processo
de organização das diferentes sociedades.
Nos dias atuais temos mais de 40 calendários, mas nas sociedades ocidentais
prevalece o uso calendário Gregoriano, introduzido em 1582. Nesse tópico vamos
conhecer um pouco mais sobrea a criação e a introdução do calendário feita pelos nossos
antepassados.

9.2. A CRIAÇÃO DO CALENDÁRIO

Um calendário é um “sistema de organização das unidades de tempo, com o


objetivo de conta-las por períodos longos, de modo a satisfazer as necessidades e
preocupações de uma sociedade” Tarsia (1995, 50). De acordo com a referida autora
existem três tipos de calendário. (1995, pág51)

a.Solar, como Gregoriano, que procura manter sincronia com o ano trópico 3.
O Lunar tal como o Islâmico, que segue as fases da Lua sem tomar
conhecimento do ano trópico. Lunissolar, como o Hebreu ou o Chinês, que
tem a sequência de meses baseada no ciclo lunar mas que periodicamente
intercala um mês inteiro para ficar em fase com o ano trópico.

Não sabemos com exatidão quando o homem criou o primeiro calendário. No


entanto, como já vimos anteriormente, inicialmente o homem aprendeu a perceber as
diferenças entre dia e noite, bem como as mudanças climáticas. É possível que este possa
ter desenvolvido uma forma de contagem de dias, sem prever nada. Em seguida ele
aprende a contar o tempo com base nas fases da lua. Acerca dessa possível forma de
contagem do tempo, Rodrigues Junior (2012, pág. 44) relata

Por várias noites, este “astrônomo” da Idade da Pedra, e “pensador do tempo”,


tinha estado a observar a pálida bola no céu crescer e minguar. Isto era uma
informação útil para uma tribo ou clã que queria utilizar a luz para cozinhar e
caçar, ou para calcular eventos futuros como número de luas cheias entre a
primeira geada do inverno e a chegada da primavera. Para ele era uma
informação valiosa que ele poderia usar para impressionar seu clã, prevendo
quando a Lua ficaria cheia novamente, ou quando ela desapareceria, eventos
que mesmo hoje sinalizam cerimônias e celebrações religiosas. Este homem
não era o primeiro a usar a Lua como um relógio primitivo, mas nesta noite em
particular ele não apenas olhou para o alto e ponderou as fases da lua, mas

3
O ano trópico, corresponde ao tempo decorrido entre duas passagens consecutivas do Sol médio pelo
ponto vernal, é atualmente de 365 d 05 h 48 m 45,3 s. [...] É o ano trópico que regula o retorno das estações
e que intervém nos calendários solares (Marques s/d; s/pág)

72
cuidadosamente entalhou uma ranhura em um osso de águia do tamanho de
uma faca de manteiga, acrescentando em seguida, uma série de ranhuras que
correm verticalmente ao longo do osso (grifo nosso)

A hipótese levantada pelo autor é de que essas ranhuras feitas em osso, era uma
forma do homem conta os dias entre uma lua e outra. Corroborando com essa ideia
Cherman e Vieira (2013, s/pág.), ressalta que um dos calendários primitivos “mais
conhecidos é formado por uma placa de osso entalhado, encontrada em Abri Blanchard,
na França”. Essa forma de contagem do tempo fornecia os elementos que indicariam a
existência de um possível calendário bem mais antigo do que acreditamos.
Mas, no que diz respeito a existência de um calendário mais próximo da ideia que
temos hoje, este surgiu entre as “antigas culturas egípcias, babilônicas, chinesas e
mesoamericanas” (Rodrigues Junior, pág.51).

9.3. O Calendário Lunar

As sociedades mais antigas cultuavam diferentes divindades quase sempre


relacionadas a elementos da natureza e a lua ocupou um lugar de destaque em muitas
dessas sociedades. Por isso é compreensivo que os primeiros calendários conhecidos
usem como base de sua contagem as mudanças de fase da lua. De acordo com Cherman
e Vieira (2013, s/pág.), “um calendário lunar não está preocupado com o ciclo sazonal.
Seus meses possuem, de modo alternado, 29 e 30 dias. Começam sempre na neomênia, a
Lua nova, seguindo este padrão, a Lua cheia será sempre na noite do dia 15 de cada mês.”
O calendário lunar tem cerca de 354 dias, o que o difere do solar em 11 dias. No
que se refere a essa questão Rodrigues Junior (, 2012, pág. 52) que “situação é inaceitável
para qualquer pessoa que utilize tal calendário como guia para plantar e colher, saber as
estações corretas para velejar, efetuar cultos religiosos, etc”. Dando continuidade à
reflexão acerca do descompasso do calendário lunar, o mesmo autor ainda destaca que:

Já no século XXI a.C., os sumérios – povo que precedeu e foi incorporado à


cultura babilônica – tinham desenvolvido um sistema ligeiramente diferente,
baseado no ano de calendário de 360 dias. Este número tinha origem no
arredondamento do mês lunar para trinta dias, que se encaixava perfeitamente
no sistema matemático e astronômico dos sumérios que era sexagesimal.
Assim, os babilônios herdaram a velha numerologia sexagesimal suméria para
dividir o dia em 24 horas (o qual é divisível por seis) e também divide
redondamente o ano de 360 dias. A razão para o uso de 24 horas, em uma de

73
suas hipóteses, pode ter relação com o zodíaco, que os babilônicos utilizavam
com grande fervor para guiar suas vidas. Possivelmente, dividiam o dia e
depois a noite em 12 horas para corresponder aos signos do zodíaco, somando-
os para atingir o dia de 24 horas. (RODRIGUES JUNIOR, pág. 52)

A preocupação das sociedades antigas em aperfeiçoar o calendário, indica uma


preocupação com questões práticas, afim de prever com maior precisão períodos
relativos as estações do ano e garantir o plantio e a colheita nos períodos mais
adequados. Além disso, o calendário era importante para garantir as celebrações
religiosas. Essa relação entre a contagem do tempo e adoração aos deuses, “vem
justamente da vontade de fazer uma homenagem precisa, a um ser superior, não só
reconhecendo ciclos que existem na natureza, mas observando fenômenos repetitivos
e, em determinadas ocasiões, relacionando-os a eventos da fé” (CHERMAN E
VIEIRA, 2013, s/pág). Os islâmicos utilizam o calendário lunar, mas nem sempre foi
assim. De acordo com Cherman e Vieira (2013, s/pág.)

Antes de Maomé, os árabes tinham um calendário lunissolar: meses lunares


com a adição periódica de um mês intercalar para se manter sincronizado com
o ano solar. Esta intervenção humana pareceu inaceitável ao profeta 4. Assim,
impôs um calendário puramente lunar que vigora até hoje.

Observe que a questão religiosa tem uma importância significativa na organização


do calendário islâmico. Como o atual calendário está associado ao início do Islamismo,
ele também é conhecido hegírico, por ter seu marco inicial na Hégira, período que marca
a fuga do profeta Maomé da cidade de Meca para Medina. Ou seja, o ano um (01) do
atual calendário Islâmico se deu no ano de 622 d.C do calendário cristão.

9.4. CALENDÁRIO SOLAR

O calendário solar tem como base as estações do ano, e segue o movimento do sol
na esfera celeste e existem duas formas de se fazer isso: a primeira é geográfica e a outra
astronômica. A posição geográfica do sol, ainda serve de parâmetro para algumas
sociedades se guiarem quanto a passagem do tempo.
O calendário solar foi introduzido pelos egípcios, que utilizaram a astronomia para
organização do seu calendário. Rodrigues Júnior, (2013, s/pág) assinala que

4
O autor refere-se a Maomé que é considerado o fundador do Islamismo.

74
há 6000 anos os Egípcios criaram um sistema melhor para substituir o
“flutuante” calendário lunar. Este método era uma maneira muito mais simples
de registrar a passagem dos dias, produzindo um calendário que se mantinha
em sincronia com as estações por muitos anos. Em vez de utilizarem a Lua
para registrar a passagem do tempo, os Egípcios utilizavam o Sol, tal como a
maioria das nações faz hoje.

Essa mudança na organização do calendário egípcio também tem relação com


questões religiosas, visto que eles adoravam o deus Sol, conhecido como Rá. Os
astrônomos egípcios também foram eficientes na verificação “de que Sírius23, chamada
pelo nome de Sothis24 aparecia sobre o horizonte oriental aproximadamente ao instante
do nascer do Sol” (Rodrigues Junior, 2012), o que tornava a contagem do ano mais exata.
O trabalho realizado pelos astrônomos egípcios foi determinante para organização do
calendário. De acordo com Rodrigues Junior (2012; pág. 57)

Para evitar atraso no registro da data do nascer helíaco, os sacerdotes egípcios,


que determinavam as estações em função desse fenômeno, eram obrigados a
vigílias rigorosas. Assim, se fixou o primeiro dia do mês de Tot, o deus egípcio
do Ano Novo, comemorado anualmente com cerimônias elaboradas que
começavam quando Sírius aparecia no topo dos obeliscos, precisamente
alinhados como pontos de observação no chão abaixo. Registrando o momento
da aparição de Sírius com exatidão, a cada ano, os astrônomos egípcios
acabaram percebendo que o ano solar era ¼ de dia mais longo que 365 dias.

Com os egípcios o nascer helíaco passa a ser um marco importante na contagem


do tempo. Mas, o que significa esse nascer helíaco? em astronomia o nascer helíaco
corresponde ao nascimento a “primeira aparição anual de um astro sobre o horizonte
oriental, quando surgem os primeiros raios do Sol. Isso se dá ao fim da noite, isto é, pouco
antes do nascer do Sol, quando o crepúsculo astronômico já teve início, há quase uma
hora” (Mourão, 1987; pág.558 e 559). Essa preocupação em conferir a data exata do
nascer helíaco demonstrar uma certa
sofisticação da astronomia egípcia. Essa por
sua vez era importante para a definição das
celebrações religiosas. De acordo com Marques
(s/d) “depois de muitas reformas, por volta do
ano 5000 a. C., os egípcios estabeleceram um
ano civil invariável de 365 dias, conservando a
tradicional divisão em 12 meses de 30 dias e 5
dias adicionais no fim de cada ano”.

75
Outro exemplo que podemos apontar de calendário solar é o dos astecas. Estes
tinham dois tipos de calendário: um civil com 365 dias e um místico com 260 dias. O
calendário civil era utilizado pela sociedade asteca para orientar suas tarefas, em especial
aquelas relacionadas a agricultura. O ano foi dividido em 18 meses, denominados de
meztli de 20 dias, que eram dedicados aos deuses.
Os astecas tinham rituais de sacrifícios
humanos e de animais para apaziguar os https://nationalgeographic.sapo.pt/historia/actualidade/1694-os-
deuses-astecas. Acessado em 07 de abril de 2019.
deuses. Muitos desses sacrifícios eram
realizados nas pirâmides do Sol5 e da Lua, localizadas na cidade de Teotihuacan.

Fonte:https://www.istockphoto.com/br/foto/pir%C3%A2mide-do-sol-e-da-lua-no-teotihuacan-m%C3%A9xico-gm182777963-
12996677. Acessado em 12/04/2019

Acerca dos rituais sacrificiais realizados pelos astecas, Rodrigues Junior (2012,
s/pág), destaca que
Obcecados com suas crenças de que deveriam manter o tempo em seu curso
próprio, os astecas ofereciam uma estarrecedora progressão de sacrifícios
humanos para apaziguar seu deus Sol – Tonatiuh - para assegurar de que ele
nasceria todos os dias e cruzaria o céu. Normalmente sacrificavam milhares de
pessoas por ano na sua capital Tenochtitlán, com uma prescrição de vítimas
para cada mês: homens e mulheres, crianças e adultos. Por exemplo, nos meses
nos quais as chuvas deveriam chegar, crianças eram afogadas ou emparedadas
em cavernas. Quanto maior o choro melhor seria a expectativa de chuva.
Outras eram esfoladas vivas para ajudar as plantações a crescerem e queimadas
vivas durante a época da colheita

5
A pirâmide do Sol é considerada a terceira maior pirâmide do mundo e hoje é visitada por milhares de
turistas todos os anos. Aqueles que tiverem disposição podem subir seus 248 degraus e chegar ao topo onde
poderão ter uma visão da pirâmide da lua que é um pouco menor e da antiga estrutura que funcionava ali
antes da chegada do europeu. Um dos aspectos que chama atenção é as ruas largas.

76
A religiosidade asteca encontrava-se presente na vida de todo o povo e alguns
estudiosos defendem que aqueles que eram sacrificados, que fossem homem, mulher ou
criança, aceitava o sacrifício por acreditar ser uma honra ou fato inevitável.
O segundo calendário era considerado místico e servia de base para os horóscopos
e previsões de dias bons, ou até mesmo gloriosos, e ou ainda os dias agourentos de cada
ciclo. Os astecas faziam parte do grupo povos mesoamericanos que acreditava que ao
final de um “Grande Ciclo, [...] todas as coisas deixariam de existir e um mundo
inteiramente novo apareceria para começar o Grande Ciclo seguinte. O atual Grande Ciclo
começou provavelmente em 3114 a.C e terminará em 23 de dezembro de 2012”.
(Rodrigues Junior, 2012; pág. 61). O mundo não deixou de existir destruído por um
grande fenômeno natural como muitos acreditaram que aconteceria em 2012, mas de uma
certa forma, estamos vivendo em mundo completamente novo, se fomos analisar bem as
mudanças, socioeconômicas, tecnológicas, e culturais que tem se consolidado na última
década.
O calendário Gregoriano que utilizamos hoje no mundo ocidental também é um
calendário solar. Suas origens remontam o calendário romano, que teria sido criado por
Rômulo, o fundador da cidade de Roma em 753 a. C, data que equivale ao marco inicial
do calendário romano. Esse primeiro calendário tinha “304 dias, divididos em dez meses
com duração que variava entre 16 e 36 dias” (Cherman e Vieira, 2013; s/pág). Chama
atenção o fato do calendário feito por Rômulo, ter 61 dias ao menos do que o ano
astronômico. Eles não ignoravam os 61 dias que faltavam, mas também não o
incorporavam ao calendário, esse período era considerado como parte do período
invernal. E o novo ano só começava com a chegada da primavera. Confira como eram
denominados os meses no calendário Romano

1º Martius (31 dias) 6º Sextilis (30 dias)


2º Aprilis (30 dias) 7º September (30 dias)
3º Maius (31 dias) 8º October (31 dias)
4º Junius (31 dias 9º November (30 dias)
5º Quíntilis (31 dias) 10º December (30 dias)

Observe que o primeiro mês do ano era março, isso ocorre porque o ano iniciava
no equinócio da primavera, em nosso calendário equivale ao mês de março. Outra
curiosidade refere-se aos nomes dados aos meses do calendário romano, pois alguns deles
77
eram homenagem aos deuses, como é o caso do primeiro mês Martius, que homenageava
o deus Marte, considerado o pai de Rômulo.
A anomalia identificada no calendário lunar, tanto que se refere a flutuação no
total de dias em cada mês, como no que diz respeito a diferença em relação de total de
dias em referência ao ano astronômico, gerava alguns problemas. Objetivando corrigir
essa situação, no século VI a. C, houve um aprimoramento do calendário e cada mês
passou a ter 30 ou 31 dias, dessa forma apresentaria uma concordância, mais próxima
com as fases da lua.
Além disso, um decreto real introduziu os meses de Januarius e Februarius,
que correspondiam aos dois últimos meses do ano, dessa forma o período invernal foi
incorporado ao calendário. Outra mudança feita nesse período é que os meses passaram
até 29 dias ou 31 dias, pois os romanos acreditavam que números pares trazia má sorte.
A única exceção, era o mês de Februarius, com 28 dias. O desvio da regra talvez se deva
ao fato deste ser considerado um mês de purificação e por isso, talvez fosse menos afetado
pela má sorte.
Mesmo com acréscimo de dois meses o calendário romano ainda contava com
354 dias, mas por conta da superstição este foi acrescido de um dia passado a ter 355 dias,
divididos em 10 meses. Os romanos ainda fizeram um novo ajuste no calendário, tentando
coordenar o ano lunar por eles adotado com o ciclo das estações e criaram o que alguns
estudiosos chamam de falso calendário lunissolar, no qual introduziram a cada dois anos
um novo mês denominado de Mercedonius. No entanto a tentativa de ajuste acabou por
gerar novos problemas na organização do calendário, pois o acréscimo tornou irregular a
sequência dos anos (355,377, 355,378) (Cherman e Vieira, 2013).
As imprecisões do calendário, provocaram diversas dificuldades para a
realização das atividades práticas ou religiosas, pois algumas vezes o calendário acabava
por ficar adiantado em relação ao período natural do ciclo das estações. Por conta disso o
calendário lunar foi abolido e adotou-se um calendário solar que ficou conhecido por
calendário Juliano, por ter começado a vigorar no governo de Júlio Cesar6 em 46 a.C.
A organização do calendário juliano foi realizada a partir das orientações do
astrônomo Sosígenes de Alexandria, que orientou que fosse acrescentado 90 dias ano de

6
Júlio Cesar, foi um dos maiores estadistas da Roma Antiga, participou do primeiro Triunvirato e após a
morte e após a morte Crasso entrou em uma disputa de poder com Pompeu. Após uma guerra civil foi
nomeado ditador, uma função legal, que deveria durar 10 anos. Durante seu governo ele combateu a
corrupção, estendeu o direito à cidadania romana, realizou diversas obras públicas, etc. Cesar foi
assassinado por membros da aristocracia romana.

78
46 a.C, a qual seriam acrescentados dois meses, ao final do ano Januarius e Februarius.
Esse período ficou conhecido como o “ano da confusão” (RODRIGUES JUNIOR,
2012;). Os anos que se seguiram a reforma, passariam a ter 365 dias.
O novo calendário estava organizado “mediante um sistema que devia desenrolar-
se por ciclos de quatro anos, com três comuns de 365 dias e um bissexto de 366 dias, a
fim de compensar as quase seis horas que havia de diferença para o ano trópico” (Marques
s/d; s/pág).
Outras duas mudanças interessantes vão ser determinadas no novo calendário: a
primeira diz respeito a ordenação dos meses, Januarius e Februarius passaram a ser
respectivamente o primeiro e o segundo mês, sendo que Januarius tinha 31 dias e
Febuarius 28 ou 29, caso fosse um ano bissexto. Seguidos de Martius, Aprilis, Maius,
Junius, Quintilis, Sextilis, September, October, November, December. A segunda é que o
imperador determinou que os meses tivessem alternadamente 30 e 31 dias, exceto
Februarius. Dessa forma o imperador desconsiderava a ideia de superstição quanto aos
dias pares. Vale salientar que o primeiro mês do ano continuava sendo março, pois era o
período em que o senado assumia o governo. Em 153 a.C. uma mudança política alterou
mais uma vez o calendário, pois a posse do senado passou para o dia 1º de janeiro e essa
passou a ser considerada como nova data para o começo do ano, que permanecer até os
nossos dias.
O calendário juliano ainda teria duas alterações: A primeira foi em 44 a.C, quendo
senado determinou que o mês de Quintilis, passasse a ser denominado de Julius, como
um tributo a Júlio Cesar. A segunda ocorreu em 8 a.C, quando o mês de Sextilis, passou
a ser chamado de Augustus, para homenagear o imperado Augusto 7. E para garantir que
os dias dedicados a um não fosse superior ao outro, os dois meses passaram a ser de 31
dias.
O calendário juliano foi utilizado na Europa até o século XIV, quando o papa
Gregório XIII, alterou o calendário através de uma bula papal. O motivo para a reforma
segundo Domingues (2018, pág.2) foi que

O calendário juliano também ficou defasado. No século IV, por ocasião do


Primeiro Concílio de Niceia, o equinócio da primavera ocorria no dia 21 de
março. Nove séculos depois, no XIII, os cálculos da medida no ano solar

7
Agustus, título semi-religioso e sagrado que foi dado pelo senado a Otávio, este havia assumido o governo
após um período conturbado em Roma, e apesar de recusa o título de rei e de ditador, se denominou de
princips, que significa primeiro cidadão. Seu governo marca o fim da República em Roma e o início do
Império Romano.

79
indicavam que o equinócio de primavera ocorria vários dias antes. No século
XVI, quando foi feita a reforma gregoriana, o equinócio retrocedera para 11 de
março. A Páscoa que deveria ser celebrada no primeiro domingo depois da lua
cheia da primavera (por volta de 21 de março), ocorria a intervalos cada vez
maiores após a lua cheia.

A correção do calendário agora tinha uma motivação religiosa, visto que a Igreja Católica
havia assumido um papel importante na Europa, e desde o século II havia diversas controvérsias
em torno da data correta da celebração da Páscoa8. Data importante para os cristãos que celebram
a ressureição de Cristo. Mas, porque a data da Páscoa não é fixa enquanto outras datas como a
celebração do Natal, ocorre sempre no dia 25 de dezembro independente do dia da semana?
Rodrigues Junior (2012, pág. 89) destaca que de acordo com o

[...] calendário eclesiástico, as datas dessas festividades são baseadas na da


Páscoa, que por sua vez, é calculada em função da data da Lua Cheia (e do
equinócio da primavera), pois, como referido, desde o Concílio de Nicéia
realizado em 325 d.C., ficou decretado que a data da Páscoa seria fixada no
primeiro domingo depois da primeira Lua Cheia após o equinócio da primavera
no hemisfério norte – estabelecido como ocorrendo em 21 de março. Portanto,
a Páscoa sempre é celebrada no período da Lua Cheia. Para que esse evento
não perdesse a sincronia, alguma providência tinha que ser tomada. Além do
mais, fazia-se sentir o atraso do calendário civil também em diversos outros
aspectos da vida cotidiana.

Para garantir uma data mais exata para a celebração da Páscoa, que como destaca
o autor deveria ocorrer no primeiro domingo depois da Lua Cheia, após o equinócio da
primavera, o papa Gregório XIII em 1572, reuniu “um grupo de estudiosos onde se
destacavam o jesuíta alemão Christopher Clavius, sábio e matemático, o dominicano
italiano Ignazio Danti, astrônomo e cartógrafo, e o médico italiano Luigi Giglio, médico,
astrônomo e cronologista” (DOMINGUES, 2018; pág 3).
Cinco anos após a convocação papal e depois de longas deliberações, “as
recomendações dessa comissão foram transcritas na bula papal Inter gravíssimas, que
estabelecia a reforma gregoriana. No entanto, esta reforma somente viria a ser colocada
em prática cinco anos mais tarde, em 1582” (RODRIGUES JUNIOR, 2012; PÁG. 93).
Ao determinar que o novo calendário entrasse em vigor, aconteceu um fato curioso, visto
que foram abolidos dez dias do calendário juliano, ou seja, as pessoas que viviam naquela
época foram dormir no dia 05 de outubro de 1582 e acordaram no dia 15 de outubro.
Existem dois aspectos importantes a serem analisados na introdução do novo
calendário: o primeiro refere-se ao controle que a igreja passou a exercer sobre a

8
Para os cristãos essa celebração é muito importante, visto que essa buscar relembrar a todos os cristãos
que Cristo ressuscitou e que um dia todo aquele que crê nele também ressuscitarão.

80
impressão dos calendários (lembre-se a Igreja era uma grande senhora feudal), podendo
levar a excomunhão daqueles que desobedecessem a ordem papal. O segundo diz respeito
ao mês escolhido para introdução do novo calendário, pois de acordo com o calendário
eclesiástico o mês de outubro tinha poucos dias santos e dias eclesiásticos especiais
(Rodrigues, 2018).
Mas, vale salientar que no século XVI, já tínhamos alguns países que haviam
rompido com a Igreja Católica, após a Reforma de 1517. Por isso nem todos os países
vão aceitar a determinação papal. Adoção começou com os países católicos, dentre os
primeiros a adotar o novo calendário encontram-se Portugal, Espanha e os Estados
Italianos, nos séculos seguintes outros países católicos passaram adotar o calendário
Gregoriano. Já os países cristãos não católicos resistiram muito ao novo calendário. Na
Inglaterra essa adoção só se deu no século XVIII, e alguns outros países como o caso
Bulgária, Rússia, Grécia, etc., só o fizeram no século XX.

9.5. CALENDÁRIOS LUNISOLARES.

Os calendários lunissolar, baseia-se nas observações do Sol e da Lua, ou seja, este


tipos de “calendários se dispõem a acompanhar as fases da Lua mas ao mesmo tempo
reconhecem a importância do ciclo das estações” (CHERMAN E VIEIRA, 2013; s/pág).
Este modelo de calendário é bem complexo, pois ao utilizar uma base lunar e ao mesmo
tempo acompanhar as estações, faz-se intercalar um mês extra ao final de certo número
de anos que formam um ciclo. Os mesmos autores assinalam que “um calendário
lunissolar típico alterna, de forma não-trivial, anos com 12 e 13 meses. Os meses
respeitam sempre o período de lunação e, com este procedimento intercalar, os anos não
ficam muito defasados em relação ao ciclo sazonal” (CHERMAN E VIEIRA, 2013,
s/pág).
Um exemplo de calendário lunissolar é o judaico, e este tem uma forte ligação
com questões religiosas, pois a criação desse calendário remota a saída dos hebreus do
Egito. Os hebreus permaneceram cerca de 400 anos sob o domínio dos egípcios e durante
esse tempo seguiam o calendário do Egito. Mas, segundo o site da Confederação Israelita
do Brasil (CONIB), a criação do calendário judeu ocorreu

[...]há mais de 3.300 anos, quando Deus teria mostrado a Moisés a lua nova do
mês de Nissan, duas semanas antes do início do êxodo dos escravos judeus do

81
Egito. Esta revelação teria acontecido 2.448 anos após a criação do mundo,
que é considerado o marco zero do calendário.

Atente para o fato que após o êxodo, Moisés institui o ano lunar, que “começava
na primavera”, além disso o “começo dos meses era marcado pelo primeiro aparecimento
da Lua, após a Lua nova” (CHERMAN E VIEIRA, 2013; s/pág). Alguns estudiosos
indicam que adoção do calendário lunissolar teria começado com o cativeiro da Babilônia,
já que o calendário babilônico era lunissolar. Sabemos que até esse período apenas quatro
meses do calendário judaico recebiam uma nominação própria, e a partir de então eles
adotaram os mesmos nomes dos meses do calendário babilônico. Que são:

Nissan (março/abril); Iyar (abril/maio); Sivan (maio/junho); Tamuz


(junho/julho); Av (julho/agosto); Elul (agosto/setembro); Tishrei
(setembro/outubro); Chesvan (outubro/novembro); Kislev
(novembro/dezembro); Tevet (dezembro/janeiro); Shevat (janeiro/fevereiro);
Adar (fevereiro/março) e Adar 2, em consequência do ano bissexto,
(março/abril). (Site do CONIB)

A nominação dada aos meses permanece até os dias de hoje, além disso o início
do dia ocorre após o “aparecimento da primeira estrela na noite anterior [...] por exemplo,
se um feriado cair na terça-feira, seu início oficial, pelo calendário judaico, será ao
anoitecer de segunda-feira” (site do CONIB). A celebração de determinadas festividades
“judaicas, como Páscoa (Pessach) e a festa da colheita (Sucot) são próprias de certas
estações do ano. A primeira é realizada na primavera e a segunda no outono”
(CHERMAN E VIEIRA, 2013). Para garantir que as celebrações ocorressem nas datas
exatas, evitado as defasagens oriundas de um calendário lunar o Sinédrio determinava a
intercalação de um mês adicional.
De acordo com Rodrigues Junior (2012, pág. 69) “a atual forma do calendário
hebraico foi introduzida durante o século IV d.C., quando se aboliram as antigas regras
para os cálculos – anteriormente considerados uma ciência sagrada, atribuída apenas às
autoridades religiosas”. Complementado essa questão Cheman e Vieira (2013; s/pág),
destacam que o acréscimo de um mês extra passa a ser determinado

[...] pelo ciclo lunar de Méton, que tem 19 anos e perfaz 235 lunações médias,
fazendo com que as luas novas caiam nos mesmos dias do mês. Ou seja, a
criação de um período de 19 anos no qual haverá 7 anos com 13 meses e 12
anos com 12 meses, provoca uma concordância bastante satisfatória entre o
ano solar e o ano lunar.

82
Finalizando essa questão é importante salientar que a questão religiosa tem forte
influência no calendário judaico e estes definem uma diferenciação entre o ano civil e o
ano religioso. Enquanto o ano novo judaico tem início no mês Tishri, que corresponde a
setembro/ou outubro, esse seria de acordo com a crença religioso a época em que Deus
criou o homem. O ano religioso começa com mês de Nissan, época que os judeus
celebram a Páscoa, para lembrar a saída do povo hebreu do Egito, fato que marca o
começo de sua trajetória para a terra prometida.

RESUMO

Vimos que o calendário é uma construção social que tem por finalidade a organização das
unidades de tempo, e atualmente existem mais de 40 calendários, sendo que a maioria
pode ser classificada dentro de uma das três principais categorias: calendário lunar, solar,
lunissolar. Ao longo da história da humanidade a elaboração dos calendários sofreu
influência religiosa, política e até mesmo econômica. Notamos que a astronomia teve um
papel relevante na formulação dos calendários e que estes já estiveram sob o controle de
grupos religiosos. Vale destacar que apesar do calendário Gregoriano hoje está em vigor
no mundo ocidental, existem outros calendários que são adotados em diferentes países,
como é o caso do calendário chinês.

AUTOAVALIAÇÃO
1. Porque o calendário pode ser definido como uma construção social?
2. Qual a importância dos calendários?
3. É possível afirmar que a criação de alguns calendários tem influência
religiosa? Justifique sua resposta
4. Estabeleça a diferença entre calendário lunar, solar e lunissolar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHERMAN, Alexandre e VIEIRA, Fernando. O tempo que o tempo tem: porque o


ano tem 12 meses e outras curiosidades sobre o calendário. Rio de Janeiro; Jorge
Zahar Editora, 2013 (Edição eletrônica).
DOMINGUES, Joelza Ester. Calendário Gregoriano: o tempo decretado pelo papa.
Disponível em: https://ensinarhistoriajoelza.com.br/calendario-gregoriano-o-
tempo-decretado-pelo-papa/ ( 06 de outubro 2018).Acessado em 07 de abril de
2019.

83
LAS CASAS, Renato. Calendários. Disponível em:
http://www.observatorio.ufmg.br/pas39.htm (26 de fevereiro de 2002). Acessado
em 08 de abril de 2019.
MARQUES, Manuel Nunes. Origem e evolução do nosso calendário. Disponível em:
http://www.mat.uc.pt/~helios/Mestre/H01orige.htm. Acessado em 04 de abril de
2019
MOURÃO, Ronaldo Rogério de Freitas. Dicionário Enciclopédico de Astronomia e
Astronáutica. Rio de Janeiro, RJ; Editora Nova Fronteira e CNPQ; 1987.
Disponível em: http://servidor.demec.ufpr.br/CFD/bibliografia/1987_Mourao%20-
%20Dicionario%20Enciclopedico%20de%20Astronomia%20e%20Astronautica.p
df. Acessado em 11 de abril de 2019.

RODRIGUES JUNIOR, Manoel Alves. OS CALENDÁRIOS E A SUA


CONTRIBUIÇÃO PARA O ENSINO DA ASTRONOMIA. Faculdade de
ciências da universidade do porto Departamento de física e astronomia (Tese).
Porto, 2012. Disponível em: https://docplayer.com.br/24810333-Manoel-alves-
rodrigues-junior-os-calendarios-e-a-sua-contribuicao-para-o-ensino-da-astronomia.html.
Acessado em 07 de abril de 2019.
TARSIA, Rodrigo Dias. O calendário Gregoriano. Revista Brasileira de Ensino de
Física, vol. 17, nº 1, 1995. Disponível em:
http://www.sbfisica.org.br/rbef/pdf/vol17a06.pdf. Acessado em 10 de abril de
2019.

SITES
O Calendário Asteca e a ligação com os Deuses. Disponível:
https://nationalgeographic.sapo.pt/historia/actualidade/1694-os-deuses-astecas

Calendário Judaico
http://www.conib.org.br/glossario/calendario-judaico/

84
10. DIVERSIDADE CULTURAL

Objetivos do tema
Identificar os tipos de diversidade;
Estabelecer a diferença entre diversidade e cultura;
Relacionar o desenvolvimento da sociedade e desenvolvimento da cultura;

10.1. Introdução:

Diversidade significa variedade, pluralidade, diferença. É um substantivo


feminino que caracteriza tudo que é diverso, que tem multiplicidade. Diversidade é a
reunião de tudo aquilo que apresenta múltiplos aspectos e que se diferenciam entre si, ex.:
diversidade cultural, diversidade biológica, diversidade étnica, linguística, religiosa etc.

a. Diversidade biológica

A diversidade biológica ou biodiversidade é a grande variedade de organismos


vivos que compreende a fauna, a flora e os micro-organismos da face da Terra. A Floresta
Amazônica, a Mata Atlântica e o Pantanal abrigam a maior biodiversidade do nosso
planeta.

b. Diversidade étnica

Diversidade étnica é a união de vários povos numa mesma sociedade. Etnia é


um grupo de indivíduos que possuem afinidades de origem, história, idioma religião e
cultura, independente do país em que se encontrem. O Brasil é um país com grande
diversidade étnica, sua população é composta da miscigenação de vários povos que juntos
formaram uma nova identidade cultural.

10.2. O que é Cultura:

Cultura significa todo aquele complexo que inclui o conhecimento, a arte, as


crenças, a lei, a moral, os costumes e todos os hábitos e aptidões adquiridos pelo ser
humano não somente em família, como também por fazer parte de uma sociedade da qual
é membro.
85
Cada país tem a sua própria cultura, que é influenciada por vários fatores.
A cultura brasileira é marcada pela boa disposição e alegria, e isso se reflete também na
música, no caso do samba, que também faz parte da cultura brasileira. No caso da cultura
portuguesa, o fado é o patrimônio musical mais famoso, que reflete uma característica do
povo português: o saudosismo.
Cultura na língua latina, entre os romanos, tinha o sentido de agricultura, que se
referia ao cultivo da terra para a produção, e ainda hoje é conservado desta forma quando
é referida a cultura da soja, a cultura do arroz etc. Cultura também é definida em ciências
sociais como um conjunto de ideias, comportamentos, símbolos e práticas sociais,
aprendidos de geração em geração através da vida em sociedade.
Seria a herança social da humanidade ou ainda, de forma específica, uma
determinada variante da herança social. Já em biologia a cultura é uma criação especial
de organismos para fins determinados. A principal característica da cultura é o mecanismo
adaptativo, que consiste na capacidade que os indivíduos têm de responder ao meio de
acordo com mudança de hábitos, mais até que possivelmente uma evolução biológica.
A cultura é também um mecanismo cumulativo porque as modificações trazidas
por uma geração passam à geração seguinte, onde vai se transformando, perdendo e
incorporando outros aspetos procurando assim melhorar a vivência das novas gerações.
A cultura é um conceito que está sempre em desenvolvimento, pois com o passar do
tempo ela é influenciada por novas maneiras de pensar inerentes ao desenvolvimento do
ser humano.

a. Cultura organizacional

O conceito de cultura organizacional remete ao conjunto de normas, padrões e


condições que definem a forma de atuação de uma organização ou empresa.

b. Cultura Popular

A cultura popular é algo criado por um determinado povo, sendo que esse povo
tem parte ativa nessa criação. Pode ser representada pela literatura, música, arte, dança e
etc. A cultura popular é influenciada pelas crenças do povo em questão e é formada graças
ao contato entre indivíduos de certas regiões.

86
c. Cultura na Filosofia

De acordo com a filosofia, a cultura é o conjunto de manifestações humanas que


contrastam com a natureza ou o comportamento natural. É uma atitude de interpretação
pessoal e coerente da realidade, destinada as posições suscetíveis de valor íntimo,
argumentação e aperfeiçoamento.
Além dessa condição pessoal, cultura envolve sempre uma exigência global e
uma justificação satisfatória, sobretudo para o próprio. Podemos dizer que há cultura
quando essa interpretação pessoal e global se liga a um esforço de informação, no sentido
de aprofundar a posição adotada de modo a poder intervir em debates. Essa dimensão
pessoal da cultura, como síntese ou atitude interior, é indispensável.

d. Cultura na Antropologia

A cultura na antropologia é compreendida como a totalidade dos padrões


aprendidos e desenvolvidos pelo ser humano. Este tipo de cultura tem como objetivo
representar o saber experiente de uma comunidade, saber obtido graças à sua organização
espacial, na ocupação do seu tempo, na manutenção e defesa das suas formas de relação
humana. Estas manifestações constituem aquilo que é denominado como a sua “alma
cultural”, os ideais estéticos e diferentes formas de apresentação.

10.3. O que é Diversidade cultural:

Diversidade cultural são os vários aspectos que representam particularmente


as diferentes culturas, como a linguagem, as tradições, a culinária, a religião, os costumes,
o modelo de organização familiar, a política, entre outras características próprias de um
grupo de seres humanos que habitam um determinado território.
A diversidade cultural é um conceito criado para compreender os processos de
diferenciação entre as várias culturas que existem ao redor do mundo. As múltiplas
culturas formam a chamada identidade cultural dos indivíduos ou de uma sociedade; uma
"marca" que personaliza e diferencia os membros de determinado lugar do restante da
população mundial.

87
A diversidade significa pluralidade, variedade e diferenciação, conceito que é
considerado o oposto total da homogeneidade. Atualmente, devido ao processo de
colonização e miscigenação cultural entre a maioria das nações do planeta, quase todos
os países possuem a sua diversidade cultural, ou seja, um "pedacinho" das tradições e
costumes de várias culturas diferentes.
Algumas pessoas consideram a globalização um perigo para a preservação da
diversidade cultural, pois acreditam na perda de costumes tradicionais e típicos de cada
sociedade, dando lugar às características globais e “impessoais”.
Com o intuito de tentar preservar a riqueza da diversidade cultural dos países,
a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO)
criou a "Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural".
A Declaração da UNESCO sobre Diversidade Cultural reconhece as múltiplas
culturas como uma "herança comum da humanidade", e é considerada o primeiro
instrumento que promove e protege a diversidade cultural e o diálogo intercultural entre
as nações.

a. Diversidade cultural no Brasil

O Brasil é um país incrivelmente rico em diversidade cultural, devido a sua


extensão territorial e a pluralidade de colonizações e influências que sofreu ao longo do
processo de construção da sociedade brasileira.
As diferenças são bastante visíveis mesmo entre as diferentes regiões do país:
norte, nordeste, centro-oeste, sudeste e sul. Nas regiões norte e nordeste, a predominância
é das tradições indígenas e africanas, sincretizadas com os costumes dos povos europeus,
que colonizaram o país.
Na região centro-oeste, onde predomina o Pantanal, existe ainda uma grande
presença da diversidade cultural indígena, com forte influência da culinária mineira e
paulista. No sudeste e sul destacam-se costumes de origem europeia, com colônias
portuguesas, germânicas, italianas e espanholas que, ainda hoje, mantêm a cultura típica
de seus países de origem.

b. Diversidade cultural indígena

88
A Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural prevê ações de preservação
das múltiplas culturas de origem indígena e africana, como as línguas indígenas
ameaçadas de extinção, além dos rituais e festas tradicionais do povo indígena e
afrodescendente.

c. Diversidade cultural e religiosa

A diversidade religiosa está intrinsecamente relacionada com a cultura. O


chamado sincretismo religioso conceitua o processo de mistura e diversificação de
várias religiões reunidas dentro de uma sociedade. No Brasil, por exemplo, a diversidade
religiosa está na presença das várias crendices coabitando em um mesmo território, como
os católicos, judeus, muçulmanos, hindus e etc.

Fonte: https://www.significados.com.br/diversidade-cultural/

RESUMO

Diversidade cultural são os vários aspectos que representam particularmente as diferentes


culturas, como a linguagem, as tradições, a culinária, a religião, os costumes, o modelo
de organização familiar, a política, entre outras características próprias de um grupo de
seres humanos que habitam um determinado território. A diversidade cultural é um
conceito criado para compreender os processos de diferenciação entre as várias culturas
que existem ao redor do mundo. As múltiplas culturas formam a chamada identidade
cultural dos indivíduos ou de uma sociedade ou seja, ela é uma "marca" que personaliza
e diferencia os membros de determinado lugar do restante da população mundial.

AUTOAVALIAÇÃO

De que modos podemos propiciar, por meio do ensino em todos os níveis, o conhecimento
de nossa diversidade cultural e pluralidade étnica, bem como a necessária informação
sobre os bens culturais de nosso rico e multifacetado patrimônio histórico? Na atualidade
com a permanência de uma economia globalizada, ao contrário do que se previa, houve
um revigoramento e uma valorização das culturas regionais e a afirmação de identidades

89
étnico-culturais latentes que, nessa nova “aldeia global”. Quais movimentos devem
acontecer para que haja defesa de seu direito à diferença e reconhecimento da alteridade?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros


curriculares nacionais: pluralidade cultural, orientação sexual. Brasília, DF: MEC/SEF,
1997.

BRASIL. Presidência da República. Programa Nacional de Direitos Humanos. Brasília,


DF: Presidência da República; Secretaria de Comunicação Social; Ministério da Justiça,
1996.
EDUCAÇÃO e diferenciação cultural: índios e negros. Cadernos Cedes, Campinas, n.
32, 1993.

CRUZ, M.A. Alternativas para combater o racismo segundo a pedagogia interétnica.


Salvador: Núcleo Cultural Afro-Brasileiro, 1989.

GADOTTI, M. Diversidade cultural e educação para todos. Rio de Janeiro: Graal, 1992.
p. 23.

MCLAREN, P. Multiculturalismo crítico. São Paulo: Cortez, 1997. MUNANGA, K.


(Org.). Estratégias e políticas de combate à discriminação racial. São Paulo: USP; Estação
Ciência, 1996.

ORIÁ, R. O negro na historiografia didática: imagens, identidades e representações.


Textos de História, Brasília, DF, v. 4, n. 2, 1996.

ORIÁ, R. Educação, cidadania e diversidade cultural. Revista Humanidades, Brasília,


DF, n. 24, 1997.

REIS, J.J. Aprender a raça. Veja, São Paulo, edição especial: 25 anos: reflexões para o
futuro, 1993.

90
11. SURGIMENTO DA HUMANIDADE

Objetivos:

Determinar como e quando os seres humanos começaram a existir;


Entender que o homem moderno evoluiu em etapas a partir de uma série de ancestrais,
entre eles várias formas anteriores de seres humanos;

11.1. Introdução

O estudo das origens humanas busca determinar como e quando os seres


humanos começaram a existir. Há muitas teorias científicas sobre isso, mas todas
concordam em que a espécie humana se desenvolveu ao longo de muitos milhões de anos,
partindo de ancestrais longínquos que eram semelhantes aos antropoides atuais. Esse
processo, pelo qual um tipo de ser vivo evolui e transforma-se em outro, é
chamado evolução.
O homem moderno evoluiu em etapas a partir de uma série de ancestrais, entre
eles várias formas anteriores de seres humanos. Os corpos desses ancestrais foram
mudando ao longo do tempo. De modo geral, seus cérebros cresceram, enquanto os
maxilares e os dentes ficaram menores. Os ancestrais do homem começaram a andar
eretos, sobre dois pés, e a usar ferramentas. À medida que isso aconteceu, a forma das
pernas, dos pés, das mãos e de outras partes do corpo também foi se modificando.
Os cientistas dispõem de pouco material para o estudo das origens do homem. A
maioria das evidências vem de fósseis, isto é, resquícios de seres vivos que ficaram
preservados no solo, na natureza. O estudo dos fósseis é chamado paleontologia.
Na África, na Ásia e na Europa, cientistas encontraram ossos e ferramentas de
ancestrais do homem que viveram milhões de anos atrás. Do estudo desses fósseis é que
surge o conhecimento e nascem as conclusões. E os cientistas continuam a descobrir
novos indícios sobre como os seres humanos se desenvolveram.

11.2. Antropoides e seres humanos

91
O homem não evoluiu a partir do macaco, como vulgarmente se diz. Na verdade,
tanto o ser humano moderno como os antropoides se desenvolveram a partir de um
mesmo ancestral semelhante a um macaco. Os ancestrais dos seres humanos se separaram
dos ancestrais dos antropoides entre 8 milhões e 5 milhões de anos atrás. Depois disso,
cada grupo se desenvolveu separadamente. O mais correto, portanto, é dizer que o homem
e o macaco são parentes com ancestrais comuns.
A maioria dos cientistas considera que os seres humanos e os grandes
antropoides — chimpanzés, bonobos, gorilas e orangotangos — pertencem à mesma
família científica: a Hominidae, que abrange os hominídeos. Mas existem diferenças
importantes entre eles. Por essa razão, a família divide-se em grupos menores. Os
orangotangos pertencem a um grupo chamado Ponginae. Gorilas, chimpanzés e bonobos
fazem parte do grupo conhecido como tribo Gorillini. Os seres humanos pertencem ao
grupo Hominini. O termo “hominíneo” (uma subdivisão dos hominídeos) engloba os
seres humanos e todos os seus ancestrais, desde o tempo em que começaram a se
desenvolver separadamente dos antepassados dos antropoides.

a. Hominídeos

Hoje só existe uma espécie, ou tipo, de hominíneo — o homem moderno. No


passado, era comum duas ou mais espécies de hominíneos conviverem. Os cientistas nem
sempre concordam em relação a quais espécies são antepassadas diretas de outras e quais
não são. Mas todos os hominíneos são estreitamente aparentados.

b. Australopitecinos

Alguns dos primeiros hominíneos são conhecidos como australopitecinos.


Houve diversas espécies dentro desse grupo, sendo as principais as dos chamados
australopitecos. Fósseis revelam que os australopitecinos viveram na África entre
aproximadamente 4 milhões e 2,5 milhões de anos atrás. Um dos mais famosos desses
fósseis é um esqueleto parcial que foi encontrado na Etiópia e apelidado de “Lucy”.
Os ossos têm cerca de 3 milhões de anos de idade.
Os australopitecinos tinham algumas características semelhantes às dos
antropoides. Por exemplo, seu cérebro era muito menor que o cérebro do homem
moderno. Eles subiam em árvores com muita facilidade, mas andavam sobre dois pés,

92
como os seres humanos. Os cientistas sabem disso pelo estudo de fósseis de pernas,
joelhos, pés e pelves — outra evidência é o conjunto de pegadas preservadas no solo
encontradas na Tanzânia.

Fonte:
https://scholar.google.com/scholar_url?url=https://periodicos.ufmg.br/index.php/revistadaufmg/article/view/2643/1510&hl=pt-
BR&sa=T&oi=gsb-
ggp&ct=res&cd=1&d=4706214556867924566&ei=YN7SXNTDLIjmmwHKqZDwDQ&scisig=AAGBfm322IYBtcBulKhuF3Hdp3
ooMh8Z4A

c. Seres humanos

Todas as espécies humanas pertencem a um grupo ou gênero científico que faz


parte do grupo Hominini. Esse gênero se chama Homo. É por isso que os nomes
científicos de todas as espécies humanas começam com a palavra Homo, do latim, que
significa “homem”. As formas mais antigas de seres humanos surgiram entre 2 milhões e
1,5 milhão de anos atrás. Esses homens antigos possuíam cérebro maior e, em geral,
maxilares e dentes menores que os australopitecinos.
É provável que seu comportamento também fosse mais semelhante ao do homem
moderno. Por exemplo, uma espécie humana primitiva chamada Homo habilis (“homem

93
habilidoso”) usava ferramentas de pedra para abater animais. Entre as espécies humanas
posteriores estão o Homo erectus (“homem ereto”) e o Homo heidelbergensis (“homem
de Heidelberg”). Cientistas acreditam que esses seres humanos já usavam o fogo para
cozinhar alimentos.
O chamado Homo neandertalensis (“homem de Neandertal”) conviveu por
algum tempo com o homem moderno e tinha parentesco estreito com eles. Os neandertais
desapareceram há cerca de 28 mil anos. Mas a maioria dos cientistas acha que essa espécie
não foi ancestral direta do homem moderno.

Fonte: https://escola.britannica.com.br/artigo/origem-da-humanidade/481536

RESUMO

O ser humano moderno provavelmente se desenvolveu entre 200 mil e 100 mil anos atrás.
O nome científico da espécie é Homo sapiens (“homem racional”). Muitos cientistas
acreditam que os primeiros representantes da espécie surgiram na África, espalhando-se
depois pela Ásia e pela Europa, e, mais tarde, pela América. Ainda não se sabe exatamente
em que circunstâncias eles surgiram, mas os cientistas continuam em busca de evidências
que ajudem a entender esse processo.

AUTOAVALIAÇÃO

Quais condições de vida no planeta foram preponderantes para o processo de


desenvolvimento e evolução do homem ao longo da História? Quais as diferenças entre
os honiníneos e os australoptécus?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BEHAR, D. M. et alet al. The Dawn of Human Matrilineal Diversity. American Journal
of Human Genetics, v. 82, p. 1130-1140, 2008.

CANN, R. L.; STONEKING M.; WILSON A. C. Mitochondrial DNA and human


evolution. Nature, v. 325, p. 31-36, 1987.

DARWIN, C. The Descent of man and selection in relation to sex. Ed. John Murray,
Londres, Reino Unido, 1871.

94
GROSS, M. The paradoxical evolution of agriculture. Current Biology, v. 23, p. R667–
R670, 2013

HUXLEY, T. H. Evidence as to Man’s place in nature. Ed. Williams &Norwood.


Londres, Reino Unido, 1863.

JOBLING, M. et al. Human Evolutionary Genetics. Ed. Garland Science, New York,
EUA, 2013. KRINGS, M. et al. Neandertal DNA sequences and the origin of modern
humans. Cell, v. 90, p. 19-30, 1997

95
12. A HISTÓRIA DA CRIANÇA NO CONTEXTO SOCIAL

OBJETIVOS

Apresentar um pouco da história da criança no Brasil;


Abordar o processo de mudanças na concepção de infância, como ela era vista nos séculos
XII e XIII;
Entender que a concepção de infância na atualidade é decorrente de constantes
transformações socioculturais;

12.1. INTRODUÇÃO:

A História Social da Infância é uma conquista recente. A análise das relações


entre sociedade, infância e escola, teve início na historiografia nacional e internacional
apenas a partir do século XIX, percebendo a criança como sujeito histórico e de direitos.
Parte desse interesse, deve-se as mudanças ocorridas no início do século XX, onde novas
fontes e metodologia da pesquisa em História tornaram possível a inserção de pesquisas
científicas acerca da História da infância. O alargamento das fontes ocorrido dentro da
História Social, permitiu que novos sujeitos se tornassem alvo de investigações.
A partir deste momento, percebesse a necessidade de entender a criança e parte
deste processo se deu através do surgimento de disciplinas como a História Social da
Infância. As mudanças historiográficas sobre o conceito de criança, começaram no século
XX, mais precisamente na década de 1970 com a publicação do livro “História Social da
Infância e da Família” ARIÈS (1981). A partir deste evento, concepções de infância
começaram a ser pensadas por historiadores europeus e americanos, a criança passava a
ser compreendida no seu contexto social e econômico a partir das diferentes idades.
Ariès foi um dos pioneiros nesta discussão e apontou a necessidade de
compreender a criança a partir das suas necessidades inerentes a idade, como um período
distinto da vida, algo que até então, nenhum estudioso havia feito. A vida era vista de
forma homogênea, não havia diferenciação entre os períodos da vida.
Durante a Idade Média, crianças e adultos eram tratados como iguais
socialmente, facilitando a exploração, maus tratos, como afirma Ariès (2002), que o
“sentimento de infância foi construído socialmente no final da idade média, até então as
crianças eram tratadas como “adultos em miniatura” e que necessitavam de cuidados

96
básicos só até conseguirem executar tudo sozinhas”. Ariès pesquisou a história da
infância, a partir da análise de imagens de famílias e crianças na Europa da Idade média,
observando as transformações familiares ao longo dos anos, nesse sentido, dialoga que:

As “idades da vida” ocupam um lugar importante nos tratados


pseudocientíficos da Idade média. Seus autores empregam uma terminologia que nos
parece puramente verbal: infância e puerilidade, juventude e adolescência, velhice e
senilidade – cada uma dessas palavras 24 História Social da Infância designando um
período diferente da vida. Desde então, adotamos algumas dessas palavras para
designar noções abstratas como puerilidade e senilidade, mas estes sentidos não
estavam contidos nas primeiras acepções. (ARIÈS, 1981 p. 4).

Percebemos as mudanças nos termos utilizados para identificar o que Philipe


Ariès chama de “idades da vida”, para ele palavras como criança, adolescente e adultos
só foram surgir com a sociedade moderna. A análise foi feita a partir de obras de arte,
onde identificou que crianças eram representadas de forma adulta, como se fossem
miniaturas, e isso demonstrava a ausência de sentimento de infância. Ariès afirma que “A
criança, por muito tempo, não foi vista como um ser em desenvolvimento, com
características e necessidades próprias, e sim, homens de tamanho reduzido” (ARIÈS,
1981 p.18).
A distinção entre infância e idade adulta começou com a identificação das idades
da vida. Philippe Ariès (1981), chama a atenção para a preocupação da contagem de
tempo demarcando as idades nos últimos anos, algo que não ocorria em séculos
anteriores, pois: Um homem do século XVI ou XVII ficaria espantado com as exigências
de identidade civil que nós nos submetemos com naturalidade.
Logo que nossas crianças começam a falar, ensinamos - lhes seu nome, o nome
de seus pais e sua idade. Ficamos muito orgulhosos quando Paulinho, ao ser perguntado
sobre sua idade, responde corretamente que tem dois anos e meio. De fato, sentimos que
é importante que Paulinho não erre: o que História Social da Infância 25 seria dele se
esquecesse sua idade? Na savana africana a idade é ainda uma noção bastante obscura,
algo não tão importante a ponto de não poder ser esquecido.
Mas em nossas civilizações técnicas, como poderíamos esquecer a data exata de
nosso nascimento, se a cada viagem temos de escrevê-la na ficha de polícia do hotel, se a
cada candidatura, a cada requerimento, a cada formulário a ser preenchido, e Deus sabe
quantos há e quantos haverá no futuro, é sempre preciso recordá-la. Paulinho dará sua

97
idade na escola e logo se tornará Paulo N. da turma X. Quando arranjar seu primeiro
emprego, junto com sua carteira de trabalho, receberá um número de inscrição que passará
a acompanhar seu nome. Ao mesmo tempo, e até mesmo mais do que Paulo N., ele será
um número, que começará por seu sexo, seu ano e mês de nascimento. (ARIÈS, 1981, p.
20)
Observamos que durante toda a Idade Média, enumerar a idade não consistia
numa ação comum as pessoas, isto só vem acontecer, com o advento da sociedade
moderna e industrial. A identificação das idades, relaciona-se à modernidade do espaço
urbano e das relações de trabalho, onde todos devem ser identificados de diversas formas.
Somente a partir do século XIX, a ordem numérica das idades veio a tornarem-se
corriqueiras.
Ariès (1981) explica que a ausência do sentimento de infância é facilmente
percebida quando, analisamos o alto índice de mortalidade infantil e de infanticídio
praticado pelas mulheres na Idade Média. Era bastante comum entre as famílias, perdas
de filhos ainda pequenos e visto com bastante naturalidade, pois poderiam ser substituído
por outros. O próprio sentimento de amor materno vai ser construído posteriormente,
como afirma o autor:

De onde tiraste a ideia, meu irmão, vós que possuís tantos bens e tendes uma filha –
pois não conto a pequena – de mandar para o convento? A pequena não contava
porque podia desaparecer. Perdi dois ou três filhos pequenos, não sem tristeza, mas
sem desespero (ARIÈS, 1973 p. 99)

Ultrapassada esta idade, a criança seria considerada um adulto em miniatura,


sendo, portanto, tratada como tal, nas vestimentas, na alimentação e no trabalho. Apesar
das críticas feitas ao trabalho do autor, que giram em torno das limitações de suas
pesquisas realizadas apenas na Europa, deixando de fora outras crianças, para os
historiadores da infância, a obra de Philipe Ariès representa o início da percepção
científica sobre o que é ser criança no mundo moderno.
A construção do sentimento de infância A forma como a vida é periodizada
varia em cada cultura, umas pela experiência adquirida na sociedade, independentemente
do número de anos vividos, outras, como a nossa cultura, identifica e separa os grupos de
acordo com a idade comprovada em documentos, como por exemplo, o Registro Geral.

98
Observe como existem idades mínimas para vários aspectos da nossa sociedade; faixa
etária para programas televisivos e cinemas, para consumo de bebidas entre outras.
Atualmente as divisões de idades são muito claras, a biológica concebida em
anos de vida tornou-se cada vez mais demarcadas, percebemos claramente a noção de
criança, adolescente, adulto e velhice, apesar de que essa idade cronológica/ biológica
nem sempre representa uma realidade. Ariès (1981) ao analisar a literatura na Idade
Média, identificou essa preocupação com as idades da vida, quando afirma: As idades da
vida eram também uma das formas mais comuns de conceber a biologia humana, em
relação as correspondências secretas internaturais.
É possível observar como a divisão de idades da vida são recentes, ao analisar
obras da época, ele identificou o surgimento de infância em trechos de literatura e imagens
pintadas no período estudado. A criança inicialmente, surge como uma miniatura do
adulto retratada assim pelos seus trajes e expressão facial, já a adolescência não é uma
fase conhecida no período, pois como afirma Ariès (1981) “como juventude significava
força da idade, “idade média”, não havia lugar para a adolescência”.
O autor afirma ainda que o termo “adolescente” foi usado como sinônimo de
criança até o século XVIII e a ideia de infância estava ligado à ideia de dependência.
Havia ainda uma confusão entre o que era infância e adolescência, como bem exemplifica
o autor, ao afirmar que, a nomenclatura que hoje atribuímos de adolescência, não
demoraria a se formar, tendo em vista que a construção do sentimento de infância, surgiu
numa ordem temporal que, se vista de perto seria dividida em séculos, onde a juventude
se destacaria no século XVIII, a infância no século XIX e a adolescência no século XX
(ARIÈS, 1981 p. 14).
Portanto, o conceito de infância foi construído historicamente, a partir do final
da Idade Média e durante a Idade Moderna na Europa. É perceptível como na literatura e
nas pinturas as crianças vão ganhando espaço, demonstrando que a sociedade passava a
ver naquele momento a criança com outros olhos. Ela passava a ter direito a uma infância
tranquila, cuidados próprios inerentes a idade, não só de dependência, mas principalmente
voltados para suas capacidades cognitivas. Isso só se tornou possível, por exemplo, com
o uso de brincadeiras como forma de aprendizagem.

12.2. A CRIANÇA TEM HISTÓRIA

99
A trajetória da criança e adolescente no Brasil é marcada por diversas privações
e dificuldades. Ao estudá-la evidenciam-se diversos problemas enfrentados por elas, tais
como, maus tratos, abusos sexuais, mortalidade infantil, miséria, fome, crianças sem teto,
sem família, escrava do trabalho, isso tudo sendo causado por negligência do Estado, da
família e da sociedade em geral. No Brasil os primeiros modelos de crianças foram
trazidos pelos Jesuítas, essas diferenciavam-se muito das crianças brasileiras; e muito
pouco com as descobertas europeias sobre a infância.
Neste contexto propagam-se duas representações infantis: uma mística repleta
de fé, é o mito da criança-santa; a outra de uma criança que é o modelo de Jesus, muito
difundida pelas freiras carmelitas. Inspirados por estas imagens, capazes de
transcenderem aos pecados terrenos, os jesuítas vêem nas crianças indígenas “o papel em
blanco” que desejam escrever; antes que os adultos com seus maus costumes os
contaminem. (PASSETI, s/a p. 3). 25829 Para os Jesuítas “A puberdade era entendida
como o momento da passagem da inocência original da infância à idade perigosa do
conhecimento do bem e do mal, em que a criança assumiria o comportamento do adulto”
(NETO, 2000, p. 105).
Assim, entendiam que a criança deveria receber “luz”, ser “modulada”, antes que
atingisse a idade da puberdade, momento esse, que já seriam corrompidos pelos adultos
que estão a sua volta. Diante dessa problemática, e para que pudesse “modular” as
crianças e evitar que seguissem os costumes dos adultos, os Jesuítas criaram o projeto
pedagógico de colonização jesuítica, no qual tinha como missão divulgar a fé cristã e
catequisar os indígenas. Para os Jesuítas, “A infância é percebida como momento
oportuno para a catequese porque é também momento de unção, iluminação e revelação
[...] Momento visceral de renúncia, da cultura autóctone das crianças indígenas” (DEL
PRIORI, 1995, apud PASSETI s/a, p. 4).
Assim, as crianças que resistiam a esse projeto, que não queriam participar, os
jesuítas diziam que estavam em “tentação demoníaca”, o mau já havia habitado neles. Os
jesuítas viam a catequese como forma de “conservar a docilidade e a obediência da
criança, mais uma forma de ação que acabava por negar a cultura indígena” (NETO, 2000,
p. 106). Mas com essa prática pedagógica, aproveitavam também para explorar o trabalho
dos indígenas e as riquezas naturais de suas terras (NETO, 2000). No entanto, mesmo
com essa proposta pedagógica para as crianças, os jesuítas enfrentaram um grande
problema, os quais não conseguiam enquadrar as crianças abandonadas, órfãs e migrantes

100
em seu projeto pedagógico. Presenciavam por volta do século XVIII: [...] um estrondoso
número de bebês abandonados que eram deixados pelas mães à noite, nas ruas sujas.
Muitas vezes eram devorados por cães e outros animais que viviam nas
proximidades ou vitimados pelas intempéries ou pela fome (NETO, 2000, p. 107). Para
diminuir as situações de abandono e sofrimento na época da Colônia e prosseguindo
durante o império, é instalada no Brasil, uma instituição de origem medieval, chamada a
Roda dos Expostos. De acordo com Passeti: 25830 Esta roda era uma espécie de
dispositivos onde eram colocados os bebês abandonados por quem desejasse faze-lo.
Apresentava uma forma cilíndrica, dividida ao meio, sendo fixada no muro ou na janela
da instituição. O bebê era colocado numa das partes desse mecanismo que tinha uma
abertura externa.
Depois, a roda era girada para o outro lado do muro ou da janela, possibilitando
a entrada da criança para dentro da instituição. Prosseguindo o ritual, era puxada uma
cordinha com uma sineta, pela pessoa que havia trazido a criança, a fim de avisar o
vigilante ou a rodeira dessa chegada, e imediatamente a mesma se retirava do local
(PASSETI, s/a, p. 9). Esta foi uma forma encontrada para que as pessoas levassem os
bebês não desejados para a roda, sendo garantido o anonimato do expositor, e assim não
as deixando jogadas nas ruas, lixeiros, portas de igrejas e casas de outras famílias.
O fenômeno de abandonar crianças é muito antigo, na época da Colônia muitas
crianças eram largadas por diversos fatores, tais como falta de recursos financeiros, filhos
fora do casamento, escravas que tinham filhos com seus senhores e entre outros, e então
depois que nasciam as mulheres precisavam dar um “fim” na criança, momento o qual
aconteciam os casos de bebes jogados em becos, lixeiras, nas portas de outras famílias,
igrejas. Quanto à instalação da roda dos expostos, Passeti salienta que: a primeira foi
aberta na Santa Casa de Misericórdia em Salvador, no ano de 1726.
Ainda no período colonial, uma segunda e última roda é estabelecida em Recife.
Mesmo, após a independência do Brasil, essas rodas continuaram a funcionar. Em 1825,
uma outra roda é instalada na Santa Casa de misericórdia de São Paulo (PASSETI, s/a, p.
10). No entanto, a Roda dos Expostos não perdurou por muito tempo, por volta do século
XIX no Brasil essas instituições começaram a ser fechadas, pois passaram a serem
consideradas contrárias aos interesses do Estado, as rodas começam a “receber críticas de
médicos higienistas, que viam esta forma de assistencialismo como responsável pelas
mortes prematuras de crianças” (PASSETI, s/a, p. 11).

101
Com essas instituições fechadas, as crianças passaram a ser vistas como
marginais, que estavam largadas a marginalidade e vadiagem nas ruas, diante desse
cenário, era necessária alguma providência, sendo a educação como solução. Desta
forma, “Caberia ao Estado implantar uma política de proteção e assistência à criança, a
qual foi estabelecida por meio do Decreto 16.272, de novembro de 1923” (NETO, 2000,
p. 110). Consequentemente, a criança deveria ter seus cuidados higiênicos, saúde e
educação atendidas, buscando a reintegração da criança na sociedade.

Fonte: HENICK, Angelica Cristina; FARIA, Paula Maria Ferreira. História da infância no
brasil. ANAIS EDUCERE, 2015.

RESUMO

No Brasil apenas no século XX que a criança começou a ter certo valor, sendo
reconhecida na sociedade, e passou a ter seus direitos minimante assegurados pelo Estado,
onde eram criadas leis trabalhistas em prol da defesa da criança e adolescente. A trajetória
da criança e adolescente no Brasil é marcada por muitas privações e dificuldades. Ao
estudá-la evidenciam-se diversas consequências enfrentadas pelas crianças, como, maus
tratos, abusos sexuais, mortalidade infantil, miséria, fome, crianças em situação de rua,
sem família e escravas do trabalho. A concepção de infância de hoje é decorrente de
constantes transformações socioculturais, na qual mudaram os valores, os significados,
as representações e papéis das crianças e adolescentes dentro da sociedade.

AUTOAVALIAÇÃO

O que é ser criança? Criança tem vez e voz? Qual papel a infância exerce na tomada e
decisões dos adolescentes e adultos no cotidiano?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARIÉS, Philippe. História Social da Criança e da Família. 2. Ed. Rio de Janeiro: Zahar
Editores, 1978. DEL PRIORE, Mary. História das crianças no Brasil. 7ª ed., 1ª
reimpressão. – São Paulo: Contexto, 2013.

102
DIGIÁCOMO, Murilo José.; DIGIÀCOMO, Ildeara de Amorim. Estatuto da Criança e
Adolescente; anotado e interpretado. Curitiba, SEDS, 2013.

DOURADO, Ana Cristina Dubeux. História da Infância e Direitos da Criança. Edição


Especial Salto para o Futuro. Ano 19 – Nº 10 – Setembro/2009.

HENICK, Angelica Cristina; FARIA, Paula Maria Ferreira. História da infância no


brasil. ANAIS EDUCERE, 2015.

LIMA, Letícia Conceição de AlmeiDa e. A educação da criança no Brasil – (RE)


Contando Histórias. Revista Paradoxa- Projetivas múltiplas em educação UNIVERSO,
vol. 8, nº 10/11, 2001.

NETO, João Clemente de Souza. História da Criança e do Adolescente no Brasil. Revista


unifeo, revista semestral do Centro Universitário FIEO – ano 2, nº 3 (2000).

OLIVEIRA, Zilda Ramos de. Educação Infantil: fundamentos e métodos. – São Paulo:
Cortez, 2002. – (Coleção docência em formação).

DEL PRIORI, Mary. História da criança no Brasil. In: PASSETI, Edson. As crianças
brasileiras: um pouco de sua história. Texto mimeografado [S.I: s.n].

SCHULTZ, Elisa Stroberg. BARROS, Solange de Moraes. A concepção da infância ao


longo da sua história no Brasil contemporâneo. Lumiar, revista de Ciências Jurídicas,
Ponta Grossa, vol. 3(2): 137-147, 2011.

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