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DÉCIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

APELAÇÃO Nº 0430577-10.2008.8.19.0001
APELANTE : NONATO JOSE REI DA COSTA
APELADO: OPERADORA UNIESTE DE PLANOS DE SAUDE LTDA
RELATORA: DES. NANCÍ MAHFUZ
CLASSE REGIMENTAL: 1

Apelação cível. Plano de Saúde. Reajuste por


mudança de faixa etária. Segurado que mantém com
a operadora ré relação desde outubro de 1994.
Sentença que julgou parcialmente procedente o pedido
para determinar que o reajuste por faixa etária do
autor se limite a 30%, sem prejuízo dos demais
reajustes anuais determinados pela ANS. Contrato
antigo, que previa reajuste por faixa etária no período
de 60 a 69 anos e de 70 em diante, no percentual de
até 100%. Reajuste praticado nos termos do contrato a
partir da época em que o autor completou 60 anos, que
não pode prevalecer. Estatuto do idoso que veda a
aplicação de reajuste em tal patamar. Cláusula
contratual abusiva. Desequilíbrio do contrato. Arts. 41
e 51 do CDC. Impossibilidade de se afastar qualquer
reajuste. Devolução em dobro das diferenças pagas a
mais, corrigidas desde o efetivo desembolso, acrescidas
de juros de mora a contar da citação. Art. 42,
parágrafo único, do CDC. Dano moral não
configurado. Simples descumprimento de dever
contratual. Súmula 75 do TJRJ. Provimento parcial
do recurso.

Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível


0430577-10.2008.8.19.0001 em que é apelante NONATO JOSE REI
DA COSTA e é apelado OPERADORA UNIESTE DE PLANOS DE
SAUDE LTDA,

ACORDAM

os Desembargadores que compõem a 12ª Câmara Cível do Tribunal de


Justiça do Estado do Rio de Janeiro em dar provimento parcial ao
recurso, nos termos de voto da Relatora, por unanimidade.
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VOTO

Apelação cível em ação declaratória pelo rito sumário, com


pedido de tutela antecipada, proposta pela ora apelante , em face da
apelada, devidamente contestada, alegando o autor ser associado da ré
desde 1994, e que quando completou 60 anos em dezembro de 2005,
sua mensalidade correspondia a R$ 201,74, passando a R$ 390,92 a
partir de fevereiro de 2006, em função de mudança de faixa etária, a
qual, somada a outros acréscimos, alcançou o valor de R$ 450,12, valor
que não possui condições de pagar, violando o que dispõe o CDC e o
Estatuto do idoso. Por estas razões, requer a antecipação de tutela,
para que seja suspenso o aumento da mensalidade por mudança de
faixa etária, voltando a ré a emitir boletos no valor anterior, acrescidos
apenas do reajuste anual, perfazendo o total de R$ 232,29; seja
declarada nula a cláusula nona, parágrafo sexto do contrato, que prevê
o aumento para a faixa etária; caso não seja este o entendimento, seja
estipulado percentual de aumento inferior ao imposto pela ré, que
atenda ao princípio da razoabilidade e da proporcionalidade; a
restituição em dobro dos valores pagos em excesso e indenização pelos
danos morais.

A antecipação da tutela foi deferida às fls. 34 para limitar o


aumento por faixa etária a 30% do valor da mensalidade do autor à
época.

A sentença de fls. 80/82 julgou parcialmente procedente o


pedido, para determinar que o reajuste por faixa etária do autor se
limite a 30%, sem prejuízo dos demais reajustes anuais determinados
pela ANS, ratificando a antecipação da tutela de fls. 34.

Inconformada, apelou a parte autora, apresentando as


razões de fls. 84/92, reiterando os pedidos da inicial, ao fundamento de
que, por menor que seja o percentual aplicado, a título de ingresso na
faixa etária dos 60 anos, ele é abusivo e ilegal, por afrontar o Estatuto
do Idoso, e a existência de dano moral in re ipsa, pois decorre da
própria situação apresentada, da angústia de um idoso de ver-se ainda
mais sobrecarregado financeiramente, sob pena de ficar refém da saúde
pública, além de seu aspecto pedagógico, pois serve de advertência para
que o causador do dano e seus congêneres venham a se abster de
praticar atos geradores desse dano, transcrevendo várias
jurisprudências deste Tribunal nesse sentido.

Contra-razões às fls. 99/113, pugnando pela manutenção


da sentença.

12ª CÂMARA CÍVEL – APELAÇÃO Nº 0430577-10.2008


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É o relatório.

Versa a controvérsia sobre a legalidade do reajuste das


mensalidades pagas pela parte autora ao seguro saúde operado pela ré,
decorrentes de mudança de faixa etária.

Trata-se de relação de consumo, enquadrando-se o autor


na qualidade de consumidor, e a ré, como prestadora de serviços, a teor
do que dispõem os artigos 2º e 3º, § 2º da Lei 8078/90.

Comprovou a parte autora que aderiu ao contrato em


27/10/94, às fls. 19, que a mensalidade em 01/01/2006 era de R$
201,74 e que a partir de 01/02/2006 passou a ser de R$ 390,92,
restando evidente ter sido aplicado reajuste em decorrência de mudança
da faixa etária do autor.

O contrato, conforme se vê às fls. 20, prevê no parágrafo


sexto da cláusula nona, até 30% de reajuste para a faixa de 45 a 59
anos e de até 100% para as faixas etárias de 60 a 69 e de 70 anos em
diante, restando evidente a extrema onerosidade alegada pelo autor e o
desequilíbrio do contrato, o que, sem sombra de dúvida, torna nula e
abusiva a referida cláusula, na forma do artigo 51, incisos IV e X, e do
artigo 41, caput, e inciso III, ambos do CDC, principalmente
considerando-se que se trata de contrato de adesão, com percentual
unilateralmente imposto, não tendo a parte ré demonstrado ser o
mesmo necessário para manter o equilíbrio do contrato.

Assim, adequada se mostra a sentença ao limitar o reajuste


a 30% sobre o valor da mensalidade cobrada no último mês antes do
autor completar 60 ano, além do que for determinado pela ANS.

Ademais, o próprio autor, em seu pedido inicial, requereu


que fosse declarada nula a cláusula que estipula o aumento em até
100% e que fosse revisto o contrato firmado para estipular aumento
inferior ao imposto pela parte ré, que atendesse ao princípio da
razoabilidade e da proporcionalidade, o que restou atendido.

Além disso, o percentual de 30% estabelecido na sentença


atende o disposto no artigo 15, § 3º, da Lei Federal nº 10.741/2003,
pois não discrimina o idoso, posto que mantém o mesmo percentual
estabelecido para a faixa etária anterior.

Corroborando, jurisprudência do Superior Tribunal de


Justiça e deste Tribunal:

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Direito civil e processual civil. Estatuto do Idoso. Planos de


Saúde. Reajuste de mensalidades em razão de mudança de
faixa etária. Vedação.
- O plano de assistência à saúde é contrato de trato
sucessivo, por prazo indeterminado, a envolver a
transferência onerosa de riscos, que possam afetar
futuramente a saúde do consumidor e seus dependentes,
mediante a prestação de serviços de assistência médico-
ambulatorial e hospitalar, diretamente ou por meio de rede
credenciada, ou ainda pelo simples reembolso das
despesas.
- Como característica principal, sobressai o fato de envolver
execução periódica ou continuada, por se tratar de contrato
de fazer de longa duração, que se prolonga no tempo; os
direitos e obrigações dele decorrentes são exercidos por
tempo indeterminado e sucessivamente.
- Ao firmar contrato de plano de saúde, o consumidor tem
como objetivo primordial a garantia de que, no futuro,
quando ele e sua família necessitarem, obterá a cobertura
nos termos em que contratada.
- O interesse social que subjaz do Estatuto do Idoso, exige
sua incidência aos contratos de trato sucessivo, assim
considerados os planos de saúde, ainda que firmados
anteriormente à vigência do Estatuto Protetito.
- Deve ser declarada a abusividade e conseqüente
nulidade de cláusula contratual que prevê reajuste de
mensalidade de plano de saúde calcada exclusivamente,
no percentual de 100% e 200%, ambas inseridas no âmbito
de proteção do Estatuto do Idoso.
- Veda-se a discriminação do idoso em razão da idade, nos
termos do art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso, o que impede
especificamente o reajuste das mensalidades dos planos de
saúde que se derem por mudança de faixa etária; tal
vedação não envolve, portanto, os demais reajuster
permitidos em lei, os quais ficam garantidos à empresas
prestadoras de planos de saúde, sempre ressalvada a
abusividade. Recurso especial conhecido e provido.” (Resp
nº 989.380/RN, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, 3ª
TURMA, julgado em 06/11/2008, DJ de 20/11/2008).

APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. REAJUSTE


INDEVIDO POR MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA. Segundo o
Estatuto do Idoso – Lei nº 10.741/2003, é vedada qualquer
discriminação do idoso em relação à cobrança de valores
diferenciados em razão da idade. O Estatuto do Idoso, por
ser norma de ordem pública e interesse social, aplica-se de
imediato, inocorrendo, pois, violação ao princípio da
irretroatividade da lei, se a hipótese versar sobre contrato
celebrado antes de sua entrada em vigor. De acordo com o
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entendimento esposado pelo Superior Tribunal de Justiça, a


incidência do referido comando legal fica condicionada ao
momento em que o usuário atinja a idade para o reajuste e
não ao momento da celebração do contrato. Dessa forma,
se o usuário atinge a idade que lhe confere a condição de
idoso sob a égide do respectivo Estatuto não está sujeito
aos reajustes previsto no contrato primitivo. Decisão do
Juízo a quo que se mantém. Art. 557, caput, do
CPC.(0138785-56.2008.8.19.0001 – Apelação – 1ª Ementa-
Des. Lúcia Miguel S. Lima – Julgamento: 01/10/2010 –
Décima Segunda Câmara Cível).

A indenização por dano moral não merece prosperar, pois


se trata de simples descumprimento contratual, que não gerou
qualquer circunstância contra a dignidade da parte.

Nesse sentido, a Súmula Nº 75 do TJRJ:

O simples descumprimento do dever legal ou contratual, por


caracterizar mero aborrecimento, em princípio, não
configura dano moral, salvo se da infração advém
circunstância que atenta contra a dignidade da parte.

Em relação à devolução em dobro dos valores


indevidamente pagos, ainda que a mesma não tenha sido apreciada na
sentença, passa-se à sua análise, para determinar que os valores pagos
pelo autor, superiores ao determinado na sentença, deverão ser
repetidos em dobro, na forma do art. 41, parágrafo único, do CDC,
devidamente corrigidos desde a data do desembolso, com juros legais a
partir da citação.

Assim, a sentença merece reforma apenas em relação à


devolução do que foi pago a maior, que deve ser em dobro.

Pelo exposto, voto pelo provimento parcial do recurso.

Rio de Janeiro, 24 de agosto de 2010.

DES. NANCÍ MAHFUZ


RELATORA

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Certificado por DES. NANCI MAHFUZ


A cópia impressa deste documento poderá ser conferida com o original eletrônico no endereço www.tjrj.jus.br.
Data: 12/01/2011 15:26:57Local: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Processo: 0430577-10.2008.8.19.0001 - Tot. Pag.: 5

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