Você está na página 1de 28

1ºENCONTRO DE

ESTUDOS
P R A G M ÁT I C O S

Wenilson Salasar de Santana


“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Pressuposição como elemento articulador
de sentidos no diálogo entre autor e leitor
no gênero tirinha

2
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

Resumo
O presente trabalho objetiva, a partir do escopo de Estudos Pragmáticos, identificar e
descrever a presença de pressupostos como elementos linguísticos que, ao
constituírem sentidos no gênero tirinha, justificam o diálogo entre autor e leitor. O
embasamento teórico ancora-se nas discussões de Armengaud (2006), Solé (1998),
Pinto (2012), Koch & Elias (2017), Fiorin (2019), Goldnadel (2019) e outros. O corpus
consiste em tirinhas da obra Toda Mafalda (1993), do cartunista argentino Joaquín
Salvador Lavado. Metodologicamente optou-se pela pesquisa bibliográfica, de
abordagem qualitativa, interpretativista e por instrumentos de análise baseados em
Levinson (1983, 2007). Os resultados indicaram a presença de pressupostos enquanto
elementos linguísticos para compreensão textual, condição para o diálogo autor-leitor
no gênero analisado, o que sugere que a linguagem não articula sentidos restrita às
formas explícitas de uso da língua.
Palavras-chave: Diálogo; Estudos pragmáticos; Linguagem; Sentidos.
3
Identificar e descrever a
presença de pressupostos

OBJETIVO como elementos linguísticos


que, ao constituírem sentidos
no gênero tirinha, justificam o
diálogo entre autor e leitor

4
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

INTRODUÇÃO

- Sentidos são constituídos em diálogos entre autor e leitor, durante a


realização de leituras;
- O que o autor desse ou daquele texto quis dizer com isso?;
- Tirinhas tematizam e ilustram situações muito próximas de ocorrências reais
dos usos da língua;
- Há interesse do leitor em estabelecer inferências a partir do que lhe é
comunicado nos diversos gêneros verbais com os quais tem contato no dia a
dia.
5
Sentido literal,
CONTEXTUALIZAÇÃO
significado
expresso e leitura

6
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

Sentido literal, significado expresso e leitura

Nos enunciados verbais, há sentidos explícitos (postos) e implícitos (inferências). Entre os


vários tipos de estudos sobre inferências existentes, Fiorin (2019) destaca a Pressuposição
entre os conceitos-chave da Pragmática. O autor sustenta sua discussão em Orecchioni
(1998), que inspirado no linguista francês Oswald Ducrot (1968), propõe o estudo de uma
série de sentidos associados aos usos de sentenças – cuja produção depende de
processamento nitidamente inferencial –, buscando-se o entendimento do papel desses
processos inferenciais ou implícitos que atuam na estrutura linguístico-discursiva dos
enunciados, inclusive, em situações interacionais de leitura, pois, nessa perspectiva teórica, a
linguagem tem a característica de persuadir o interlocutor.
7
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

Sentido literal, significado expresso e leitura

O Dicionário de Linguagem e Linguística de R. L. Trask ([2004], 2015)


explica que a Pressuposição é um tipo particular de inferência que
difere sob vários aspectos de outros tipos de inferências pragmáticas,
entre os quais a implicatura conversacional e o acarretamento. Segundo
esta fonte, um dos mais evidentes aspectos distintivos é que a
pressuposição sobrevive à negação, merecendo atenção, as situações
que situam, no espaço e no tempo, os usos concretos da linguagem na
prática linguística.
8
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

Sentido literal, significado expresso e leitura

Considerando-se, por exemplo, a afirmativa [A] O marido de Maria gerencia um bar, somos
autorizados a extrair dela a seguinte inferência [B]: Maria é casada, o que configura uma
pressuposição, ou seja, dizemos que a primeira sentença pressupõe a segunda. Se negarmos a
sentença inicial na forma [C] É uma inverdade que o marido de Maria gerencia um bar, ainda é
possível pressupor que [B] Maria é casada. Há, tanto na afirmação [A] quanto na negação [C]
uma propriedade linguisticamente intrigante de ser dita, contextualmente invalidada em
termos de sentido, que é o caso de [X] Maria ser solteira. Assim, uma pressuposição de um
enunciado (B) é algo que precisa ser verdade válida a partir do que está posto no enunciado
(A) e que não sofre alteração de sentido em (C), como condição prévia para que (B) seja uma
coisa plausível de ser dita, inclusive, do que está posto em (C) (cf. TRASK [2004], 2015).
9
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

Sentido literal, significado expresso e leitura

Armengaud (2006) citando o filósofo britânico Peter Strawson (1952) afirma


“[...] diz-se que um enunciado pressupõe outro se a verdade desse último é
uma precondição da verdade do primeiro.” (ARMENGAUD, 2006, p.87). Esta
concepção leva-nos à seguinte reflexão acerca do exemplo anteriormente
apresentado: pode-se dizer que (B) pressupõe (A) se (e somente se) (B) seja
verdadeiro como precondição que (A) possa ser ou verdadeiro ou falso. Logo,
se (B) for falso, então (A) não poderá ser verdadeiro nem falso, simplesmente
não terá valor de verdade nenhum.
10
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

Sentido literal, significado expresso e leitura

Portanto, se Maria é solteira, então O marido de Maria gerencia um bar não é nem
verdadeiro nem falso, simplesmente carece de valor de verdade. Fiorin (2019)
esclarece que o que é dito explicitamente pode ser questionado, os pressupostos, no
entanto, devem ser verdadeiros ou, ao menos, tomados como tal. Os explícitos são
construídos sobre os pressupostos, pois se um pressuposto for falso, ou considerado
como tal, os conteúdos explícitos não têm o menor sentido. Se o interlocutor não
achasse (pressuposto) que Maria fosse solteira, não teria o menor sentido ele dizer
(posto) que Maria é casada, o que não configura falsidade à última afirmação, mas,
carência de valor de verdade.
11
Descrição dos procedimentos
metodológicos, desde o contexto
de origem deste trabalho,
passando pela descrição do
METODOLOGIA
corpus, até a indicação, com base
em Levinson ([1983], 2007), de
instrumentos pragmáticos de
análise

12
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

S O B R E O CO R P U S E A M E TO DOLOG I A

- Contexto formativo do componente curricular Estudos Pragmáticos,


do Mestrado em Letras/Linguística, do Programa de Pós-Graduação
em Letras [PPGEL], da Universidade Federal do Piauí [UFPI];

- Resulta de uma investigação de natureza básica, com abordagem


qualitativa, cujos objetivos são descritivos e os procedimentos foram
a pesquisa bibliográfica interpretativista e a análise pragmática;

- No gênero textual tirinha foi escolhido o corpus de análise, através


de 2 (dois) recortes da obra Toda Mafalda, do cartunista argentino
QUINO, J. L. Toda Mafalda. São
Joaquín Salvador Lavado, que a escreveu sob o pseudônimo Quino.
Paulo: Martins Fontes, 2003.

13
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

S O B R E O CO R P U S E A M E TO DOLOG I A

Para sistematização dos instrumentos de análise, a Figura 1 (um) abaixo, dispõe 13


(treze) Acionadores de Pressuposição – sentenças ou de enunciados linguísticos que
possibilitam a realização de inferências pragmáticas – listados por Levinson ([1983],
2007), a partir de outros 31 (tinta e um) tipos de acionadores, apresentados por L.
Karttunen, em 1973, como variáveis de aspectos da estrutura superficial da palavras
que parecem ligar-se às pressuposições, onde: (i) as versões positivas e negativas
das sentenças são separadas por “/”, de modo a permitir a verificação das
inferências; (ii) os acionadores de pressuposição estão em itálico; (iii) o símbolo >> é
uma abreviação de “pressupõe” (cf. LEVINSON, 2007, p.226-234).

14
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

S O B R E O CO R P U S E A M E TO DOLOG I A
TIPO DE SENTENÇAS OU ENUNCIADOS
VERSÕES POSITIVAS E NEGATIVAS INFERÊNCIAS
LINGUÍSTICOS
1. Descrições definidas John viu/não viu o homem com duas cabeças >> existe um homem com duas cabeças
Martha lamenta/não lamenta ter bebido o fermentado caseiro de
2. Verbos factivos >> Martha bebeu o fermentado caseiro de John
John
3. Verbos Implicativos John conseguiu/não conseguiu abrir a porta. >> John tentou abrir a porta
4. Verbos de mudança de estado John parou/não parou de bater na porta >> John vinha batendo na porta
5. Iterativas O disco-voador veio/não veio novamente >> O disco-voador tinha vindo antes
6. Verbos de julgamento Agatha acusou/não acusou Ian de plágio >> (Agatha acha) que plágio é ruim
Enquanto Chomsky estava revolucionado a linguística, o resto da
7. Orações temporais >> Chomsky estava revolucionado a linguística
ciência estava/não estava adormecido

Foi/não foi Henry quem beijou Rose >> alguém beijou Rose
8. Sentenças clivadas (e pseudoclivadas)
O que John perdeu/não perdeu foi sua carteira >> John perdeu alguma coisa

>> John competiu em alguma coisa (cf. “Foi/não foi nas Olimpíadas
9. Clivagens implícitas com constituintes enfatizados John competiu/não competiu nas OLIMPÍADAS
que John competiu”)

Marianne chamou Adolph de chauvinista e então ele respondeu


10. Comparações e contrastes >> Marianne chamar Adolph de chauvinista era um xingamento
com outro xingo

Os proto-harrapianos, que floresceram entre 2800-2650 a.C.


11. Orações relativas não restritivas >> Os proto-harrapianos floresceram entre 2800-2650 a.C.
foram/não foram grandes construtores

Se Aníbal tivesse apenas mais doze elefantes, as línguas românicas


12. Condicionais contrafactuais >> Aníbal não tinha mais doze elefantes
hoje existiriam/não existiriam

13. Interrogações Quem é professor de linguística do MIT? >> Alguém é professor de linguística do MIT

Figura 1. Acionadores de pressuposição. Fonte: baseado em Levinson (2007)


15
Identificação, descrição e

interpretação de pressupostos

no corpus selecionado, sob a

ANÁLISES perspectiva teórica adotada

16
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
Estudos Pragmáticos “O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a Pressuposição como
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes elemento articulador de sentidos no diálogo entre autor e leitor
no gênero tirinha

A N Á L I S E P R A G M ÁT I C A
Situação 1

Fonte: QUINO, 2003, p.253.


17
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
Estudos Pragmáticos “O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a Pressuposição como
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes elemento articulador de sentidos no diálogo entre autor e leitor
no gênero tirinha

A N Á L I S E P R A G M ÁT I C A

Da situação enunciativa 1 acima [Realização de um passeio urbano no qual


Mafalda tem a intenção de apresentar ao amigo Miguelito um modelo de carro que
seu pai pretende comprar], temos a seguinte configuração sentencial: (1) É este
aqui! Meu pai está querendo comprar um carro como este! Trata-se de um
enunciado declarativo sob o qual poderíamos pressupor que (2) Há carros como
este à venda, pois a explícita intenção de querer/não querer comprar um carro
semelhante ao apontado por Mafalda, permite-nos a pressuposição de que o
modelo de carro indicado esteja disponível para compra.
18
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
Estudos Pragmáticos “O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a Pressuposição como
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes elemento articulador de sentidos no diálogo entre autor e leitor
no gênero tirinha

A N Á L I S E P R A G M ÁT I C A

Submetendo-se, simultaneamente, o pressuposto (2) ao que está posto (1) e à negação (3) É este aqui!
Meu pai não está querendo comprar um carro como este!, percebemos que na inferência (2), embora pareça
óbvio, ou seja, que o modelo apontado por Mafalda está disponível para compra – há um carro estacionado
que é a referência escolhida pela personagem para levar ao seu interlocutor a entusiasmada informação
sobre a compra pretendida por seu pai –, a sequência da tirinha mostra a relevância de tal pressuposto (2)
para o entendimento do texto, visto que a reação de Miguelito não é a esperada por Mafalda (o contexto, as
expressões dos personagens auxiliam a leitura). Isto fica evidente em (4) Para se gabar de quê? e em (5)
Mas... você está contente mesmo por seu pai comprar um carro destes?, questionamentos feitos por Miguelito
(em resposta à enunciação de Mafalda), dos quais também poderíamos pressupor que (6) O modelo de carro
escolhido para compra: (a) está ultrapassado; (b) não impressiona mais; (c) surpreende que ainda esteja à
venda; (d) não dá status de importância ao motorista; (e) a escolha feita pelo pai de Mafalda é uma decepção;
(f) esperava-se mais em relação à compra de um carro.

19
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
Estudos Pragmáticos “O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a Pressuposição como
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes elemento articulador de sentidos no diálogo entre autor e leitor
no gênero tirinha

A N Á L I S E P R A G M ÁT I C A

Essas noções são decisivas para a compreensão da reação final, observada nos enunciados afirmativos
que dão sequência à interação, á saber, (7) Claro, Miguelito! e (8) É um dos poucos carros onde o mais
importante continua sendo a pessoa, que revelam ao leitor, a verdadeira natureza e/ou motivos da intenção
do pai de Mafalda: a compra de um carro antigo muda a atenção do veículo para o proprietário, o que deveria
ser o modelo de comportamento social, apesar da circulação de carros novos.

TIPO DE SENTENÇA OU VERSÕES POSITIVAS E


INFERÊNCIA
ENUNCIADO LINGUÍSTICO NEGATIVAS
É este aqui! Meu pai está querendo
comprar um carro como este! / É
1. Descrições definidas este aqui! Meu pai não está >> há carros como este à venda
querendo comprar um carro como
este!
Figura 2. Procedimento de análise da situação enunciativa 1. Fonte: dados da própria pesquisa

20
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
Estudos Pragmáticos “O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a Pressuposição como
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes elemento articulador de sentidos no diálogo entre autor e leitor
no gênero tirinha

A N Á L I S E P R A G M ÁT I C A

Consideremos agora, a situação enunciativa 2, que apresenta a visão de


mundo das personagens sobre o tema da pobreza:

Situação 2

Fonte: QUINO, 2003, p.91.

21
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
Estudos Pragmáticos “O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a Pressuposição como
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes elemento articulador de sentidos no diálogo entre autor e leitor
no gênero tirinha

A N Á L I S E P R A G M ÁT I C A

No contexto de enunciação 2, que consiste em um passeio urbano ao dia, num


período de inverno, Mafalda e sua interlocutora percebem (primeiro quadro) a
presença de um morador de rua sentindo muito frio, indivíduo a quem a
personagem principal se refere (segundo quadro) como “um pobre”, ao dizer (1)
Quando eu vejo um pobre fico com o coração apertado!, de onde se pode pressupor
que (2) moradores de rua são pessoas pobres, o que é válido ainda que Mafalda
tivesse enunciado (3) Quando eu vejo um pobre não fico com o coração apertado!,
permaneceríamos pressupondo, dado o contexto da enunciação, que (2)
moradores de rua são pessoas pobres.
22
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
Estudos Pragmáticos “O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a Pressuposição como
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes elemento articulador de sentidos no diálogo entre autor e leitor
no gênero tirinha

A N Á L I S E P R A G M ÁT I C A

É observável que sua interlocutora parece sentir semelhante “aperto no


coração” quando tem contato com a existência de pessoas pobres nas ruas, pois a
resposta (segundo quadro) foi (4) Eu também!, mas vemos que na sequência do
diálogo, o enunciado (5) Deviam dar casa, trabalho, proteção e bem-estar aos
pobres!, emitido por Mafalda (terceiro quadro), gera um efeito revelador de
sentido, sobre o tipo de “aperto” ao qual se refere sua amiga (último quadro) em
(7) Pra quê tudo isso? Era só escondê-los!, sentido que expõe a verdadeira visão da
personagem sobre a pobreza dos moradores de rua.

23
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
Estudos Pragmáticos “O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a Pressuposição como
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes elemento articulador de sentidos no diálogo entre autor e leitor
no gênero tirinha

A N Á L I S E P R A G M ÁT I C A

A visão de Mafalda acerca da pobreza que caracteriza a vida de moradores de rua revela
valores como empatia, preocupação e a intenção de medidas assistencialistas para mitigar o
problema, enquanto a visão de sua interlocutora, aparentemente partidária dos mesmos
princípios, desvela-se tão somente materialista. Tal leitura é permitida porque o item lexical
“Quando”, que neste contexto, é um elemento linguístico que marca da ideia de tempo,
caracteriza a fala inicial de Mafalda como uma oração temporal.
TIPO DE SENTENÇA OU VERSÕES POSITIVAS E
INFERÊNCIA
ENUNCIADO LINGUÍSTICO NEGATIVAS
Quando eu vejo um pobre fico com
o coração apertado! / Quando eu >> moradores de rua são pessoas
7. Orações temporais
vejo um pobre não fico com o pobres
coração apertado!
Figura 3. Procedimento de análise da situação enunciativa 2. Fonte: dados da própria pesquisa

24
1º Encontro de Estudos Pragmáticos:
“O que o autor ‘quis dizer’ com isso?”: a
Estudos Pragmáticos Pressuposição como elemento articulador de
Profa. Dra. Iveuta de Abreu Lopes sentidos no diálogo entre autor e leitor no
gênero tirinha

CO N S I DERAÇ ÕE S F I N AI S

- A linguagem não articula sentidos apenas nas formas explícitas de usos da língua e o objetivo dos estudos
pragmáticos é a produção e a interpretação completa de enunciados, nas situações reais desses usos.

- O conhecimento pragmático sobre pressuposição confere aos estudos linguísticos acerca de


procedimentos de leitura, uma possibilidade mais assertiva para o entendimento de textos, devido,
principalmente, à existência de condições contextuais para o acionamento de pressuposições, a partir de
sentenças ou enunciados no gênero tirinha.

- Ciente de que nossa análise representa singela amostra da aplicação do aporte teórico discutido, espera-
se que estudos sequentes permitam o entendimento de outros gêneros sob uma perspectiva pragmática
de leitura, não apenas por razões estritamente acadêmicas, mas pela convicção, advinda também da
própria experiência dos pesquisadores, de que o sentido está no uso.

25
REFERÊNCIAS

ARMENGAUD, F. A pragmática. 1ed. Tradução: Marcos Marcionilo. São Paulo: Parábola Editorial, 2006.
FIORIN, J. L. A linguagem em uso. In: FIORIN, J. L. (Org.). Introdução à linguística: I. Objetos teóricos. 6ed. São Paulo: Contexto, 2019. p. 165-186.
FIORIN, J. L. Pragmática. In: FIORIN, J. L. (Org.). Introdução à linguística: II. Princípios de análise. 6ed. São Paulo: Contexto, 2019. p. 161-185.
GOLDNADEL, M. Pragmática. In: ROMERO, M. GOLDNADEL, M. RIBEIRO, P. N. FLORES, V. do N. Manual de linguística: Semântica, Pragmática e
Enunciação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2019. p. 67-141.
KOCH, I. V. ELIAS, V. M. Ler e compreender: os sentidos do texto. 3ed. São Paulo: Contexto, 2012.
LEVINSON, Stephen C. [1983]. Pragmática. 1ed. Tradução: Luís Carlos Borges, Aníbal Mari; revisão da tradução: Aníbal Mari; revisão técnica:
Rodolfo Ilari. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
MEDEIROS, F. D. Mafalda: uma análise textual. [Dissertação de mestrado]. Disponível em:
https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/11400/000611529.pdf?sequence=1. Acesso em: 12 de set de 2020.
PINTO, J. P. Pragmática. In: MUSSALIN, F. BENTES, A. C. (Org.). Introdução à linguística: domínios e fronteiras, vol. 2. 8ed. São Paulo: Cortez, 2012.
p. 55-79.
QUINO, J. L. Toda Mafalda. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
ROMERO, M. GOLDNADEL, M. RIBEIRO, P. N. FLORES, V. do N. Manual de linguística: Semântica, Pragmática e Enunciação. Petrópolis, RJ: Vozes,
2019.
SOLÉ, I. Estratégias de leitura. 6ed. Tradução: Cláudia Schilling. Porto Alegre, RS: Artmed, 1998.
TRASK, R. L. [2004]. Dicionário de linguagem e linguística. Tradução: Rodolfo Ilari; revisão técnica: Ingedore Villaça Koch e Thaïs Cristófaro Silva.
3ed. São Paulo, Contexto, 2015.
WILSON, V. [2008] Motivações pragmáticas. In: MARTELOTTA, M. E. (Org.). Manual de linguística. 2ed. São Paulo: Contexto, 2018. p. 87-109.
26
QUESTIONAMENTOS?
OBRIGADO!

Você também pode gostar