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CRÍTICA DO DIREITO
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Só leia se estiver seguro para abandonar o
conforto de suas certezas

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25 de abril a 1º de maio

Ano 1, nº 1, 2011

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CRÍTICA DO DIREITO
Só leia se estiver seguro para abandonar o conforto de suas certezas
Ano 1, nº 1, 2011 www.criticadodireito.com.br 25 de abril a 1º de maio / 2011

EDITORIAL
Na nossa primeira edição, viemos a público apresentar nosso projeto editorial,
assim como um breve relato da nossa história. A Revista Crítica do Direito
surge diante da necessidade de se aumentarem os esforços no enfrentamento
do secular conservadorismo e dogmatismo do pensamento jurídico. Desde que
capitalismo mostrou sua realidade de crises, empobrecimento e exploração dos
povos de todo o mundo, o direito, a política e a economia passaram a ser
pensados pelo ponto de vista dos trabalhadores e do povo. Desde então, a luta
entre a transformação social e o conservadorismo das classes dominantes tem
sido intensa e constante. Inclusive no Brasil, o direito, a política e as estruturas
de poder, de maneira geral, em última instância, serviram e servem para
manter a exploração e impedir o desenvolvimento das lutas populares, e para
manter a ilusão jurídica de que vivemos num regime democrático. A Revista
Crítica do Direito vem para tomar posição nesse cenário, enquanto certeza de
que a história precisa marchar para a transformação radical da sociedade.
Assim, a proposta da presente Revista é agregar a opinião e o pensamento de
juristas progressistas, atraindo conjuntamente estudantes e profissionais para a
reflexão crítica e a ação corajosa no âmbito da construção de um mundo mais
justo.

Com funciona a Revista? Por enquanto, nossa Revista não contará com
versões impressas, figurando apenas sua versão digital, acessível no endereço
www.criticadodireito.com.br. Essencialmente, a Crítica do Direito contará com
artigos de opinião, resenhas, entrevistas e traduções. Também haverá
divulgação de eventos, lançamentos e notícias. Nosso leitor terá acesso ao
material por duas maneiras. Pela primeira, obtendo um exemplar com conteúdo
completo, de quaisquer das nossas edições, bastando fazer o "download" da
mesma. Pela segunda, acessando diretamente as seções e colunas de seu
interesse, dispostas no "site".

E logo na primeira edição, já contamos com grandes questões de peso. Nosso


entrevistado especial é o professor Alysson Mascaro, conhecido intelectual
brasileiro. Em seguida, nossos colunistas apresentam suas opniões. Ainda,
contamos com nosso suplemento, o Caderno Especial: “A Questão do
Gênero”. Os Cadernos Especiais serão periodicamente publicados e
concentrar-se-ão em alguma questão temática de grande repercussão. Em
homenagem ao último Dia das Mulheres, tratamos sobre a questão do gênero.
Dividido em duas partes, com publicação da segunda parte na próxima edição,
serão três importantes colaborações. Paula Loureiro, estudiosa da teórica
feminista russa Alexandra Kollontai, em entrevista, apresenta as principais
concepções teóricas e os fatos mais importantes da biografia da revolucionária
russa. Em seguida, um texto de maior fôlego, de Bruna Zeni: “Breves notas
acerca do Feminismo no Brasil”.
Vinícius Magalhães Pinheiro
Editor

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Conteúdo
EDITORIAL ........................................................................................................ 1
ENTREVISTA EXCLUSIVA: Alysson Mascaro, o jurista da esperança ............. 3
Tupac Amaru bradado aos berros. ..................................................................... 7
Žižek e o Direito ................................................................................................. 9
CADERNO ESPECIAL: A questão do gênero (1ª parte) .................................. 12
Paula Loureiro da Cruz, marxista e feminista ................................................... 12
Breves notas acerca do Feminismo no Brasil .................................................. 14
SUGESTÃO DE LEITURA ............................................................................... 23

ENTREVISTA EXCLUSIVA: Alysson Mascaro, o jurista


da esperança

Alysson Leandro Barbate Mascaro é um dos grandes


nomes da filosofia do direito no Brasil, formando e
liderando a sua mais destacada escola de pensamento
jurídico crítico. Tendo desenvolvido sua carreira
intelectual na tradicional Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo, o Largo de São
Francisco, nela ingressou aos 17 anos, para graduar-se
em direito. Ainda muito jovem, aos 26 anos, doutorou-se
em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela USP, e
pela mesma instituição também é Livre-Docente e
professor regente da disciplina de Filosofia do Direito. Além de sua carreira
docente na USP, é professor dos programas de Mestrado e Doutorado em
Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em cuja Faculdade de
Direito começou a lecionar aos 22 anos de idade. Fundador de cursos de
direito que se destacaram ao seu tempo pelo seu caráter inovador e pela sua
qualidade, Mascaro foi o instalador e primeiro Coordenador de Graduação da
Faculdade de Direito da Fundação Padre Albino, em Catanduva, SP, sua
terra natal, instituição da qual também recebeu o título de Professor Emérito e
foi homenageado pelos alunos com seu nome no Centro Acadêmico. Ainda no
campo do ensino jurídico, Mascaro é membro da Comissão de Ensino
Jurídico da OAB/SP, tendo sido seu vice-presidente. No campo educacional,
também, é membro do Conselho Pedagógico da Escola de Governo – USP.
Advogado e parecerista em São Paulo, autor de mais de dez livros, com

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destaque para "Filosofia do Direito" e "Introdução ao Estudo do Direito",


ambos pela Editora Atlas, e "Crítica da Legalidade e do Direito Brasileiro",
pela Editora Quartier Latin, Mascaro é também autor de muitos textos, artigos e
prefácios, além de um dos maiores oradores do direito do Brasil. Suas
palestras e conferências, por todo o país, tradicionalmente chegam a reunir um
público de centenas e até milhares de pessoas. Desde o final da década de
1990, na resistência ao auge do conservadorismo neoliberal que dominava
tanto a política quanto a intelectualidade e a universidade, Mascaro tem se
destacado por suas pesquisas, aulas e produções teóricas baseadas em uma
visão crítica do direito. Juristas de norte a sul do Brasil têm vindo a São Paulo,
para seus estudos de pós-graduação sob orientação de Mascaro. Tem formado
e agregado em torno de si uma legião de orientandos e discípulos, todos com
grande destaque nas carreiras acadêmicas e forenses, repercutindo suas
idéias.

Para o editor e os colunistas da Revista Crítica do Direito, é uma grande


satisfação entrevistar em sua primeira edição o Professor Alysson Leandro
Mascaro, estando seguros de que suas palavras serão uma grande trunfo para
a caminhada do pensamento jurídico crítico brasileiro.

RCD: Professor Mascaro, como se deu sua formação intelectual e política?

MASCARO: Nasci e cresci numa cidade média do interior paulista, Catanduva,


filho de pais comerciantes. No interior, a proximidade entre ricos e pobres e o
contraste entre pujança econômica e miséria do povo, entre a opulência da
usina de cana-de-açúcar e a miséria do cortador de cana, são de angustiante
evidência. Ao mesmo tempo, marcas indeléveis de uma cidade interiorana,
nova e solar, me formaram: uma fraternidade no convívio entre todos, o
respeito pelo ser humano, o amistoso querer-bem universal, uma esperança
inexorável na humanidade e no seu progresso. De família espírita, o
cristianismo em que me forjei foi de muita abertura, caridade, ecumenismo e
impulso à razão. A instituição cristã que freqüentei em minha adolescência
trabalhava diretamente com uma favela, ao lado da qual estava instalada, além
de asilos da cidade e região. No tempo de escola, minha formação e minha
compreensão de mundo sempre se abriram para horizontes progressistas,
próximos dos movimentos sociais. Na época de faculdade, fui líder estudantil
de esquerda, num período de muito refluxo das lutas sociais. O partido
estudantil de que participei, Rasgando o Verbo, pautou muitos debates do
Centro Acadêmico XI de Agosto, ainda que não tenha alcançado a maioria em
muitos dos pleitos eleitorais. Era o tempo de apogeu do neoliberalismo. Meu
pensamento se consolidou de modo bastante solitário, compartilhado com
poucos companheiros e professores de visão crítica, dado que era de um

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contraste angustiante em relação àquilo que era a boa moda intelectual de


então, francamente a favor do triunfo capitalista neoliberal.

RCD: Em sua opinião, por que o pensamento jurídico crítico é tão minoritário
na atualidade?

MASCARO: O direito está muito próximo do poder. É um de seus braços


institucionais. Ao jurista, é enorme a tentação de se identificar, pensar e agir
como elite, ao lado do capital e da ordem. Daí que o conservadorismo é o
padrão do pensamento jurídico e da prática do jurista. Com a Constituição de
1988, essa tendência conservadora se amolda a um horizonte de mundo que
anestesia a grande angústia: a democracia e a cidadania são um berço que
aninha com ares muito prestigiosos o jurista. Ele se sente promotor de uma
sociedade boa, porque sua ordem é cidadã. Nisto está o limite médio do jurista
progressista: ser juspositivista imaginando que, com isso, cumpre o quantum
máximo que a sociedade pode ter de justiça. De outro lado, deve-se lembrar
que a crítica jurídica é minoritária também porque o pensamento crítico, no
geral, é minoritário. O capitalismo consolidou uma sociedade mundial do
consumo, atravessada pela forma-mercadoria, egoísta e individualista. Os
intelectuais se conformaram à burocracia do financiamento do ensino. O
pensar deve gerar algum lucro. A universidade produz o que atende a essa
reprodução infinita do capital. Ao mesmo tempo, muitas lutas sociais atuais são
de horizonte pequeno: pequenos ganhos dentro da mesma lógica. A crítica, de
modo geral, tem sido desprestigiada. Postular grandes questões críticas na
sociedade capitalista do financismo neoliberal sem lastro tem sido um anátema.
O gozo do consumo conformou a inteligência à mercadoria. A verdade é o
odiado de nosso tempo.

RCD: As vertentes do pensamento jurídico crítico e do marxismo são muitas.


Como seu pensamento se posiciona perante elas?

MASCARO: Minha tese de doutorado na USP, “Crítica da Legalidade e do


Direito Brasileiro”, busca postular uma leitura de questões atuais do direito
resgatando uma leitura do marxismo jurídico a partir de sua lógica e de sua
estrutura mais profundas. Para isso, encontrei-me com o notável pensamento
de Pachukanis, que conseguiu definitivamente ultrapassar uma genérica
identificação do direito ao poder e ao domínio de uma classe para entendê-lo a
partir de sua própria razão na reprodução capitalista. Além de situar-se no
quadro da luta de classes, a forma jurídica moderna está necessariamente
ligada à forma mercantil. Minha tese de livre-docência, “Utopia e direito: Ernst
Bloch e a ontologia jurídica da utopia”, abre o campo de diálogo da apreensão
rigorosa do direito como fenômeno capitalista às energias transformadoras do
próprio socialismo. Assim completo o círculo de minha própria forja pessoal,

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humanista e socialista. Creio fundamental que se funde a plena e rigorosa


investigação marxista com a máxima expansão das nossas possibilidades de
luta social e superação das misérias e explorações de nosso tempo. É deste
modo que compreendo filosoficamente o justo: como superação do capitalismo.
As energias utópicas do socialismo, generosas e fraternas, humanas e
amorosas, no dizer de Bloch, permitem abrir-se para estender as mãos a todas
as lutas progressistas e às variadas formas de pensamento crítico.

RCD: Qual a importância do marxismo no quadro do pensamento jurídico


atual?

MASCARO: Em meu livro “Filosofia do Direito”, aponto para o fato de que o


pensamento jurídico contemporâneo pode ser compreendido a partir de três
grandes vertentes: filosofias do direito juspositivistas, não-juspositivistas e
críticas. No primeiro campo, a redução do direito à norma jurídica estatal é sua
pedra de toque. Trata-se de uma visão limitadora. No segundo campo,
perspectivas como as de Carl Schmitt e Michel Foucault se abrem para o
poder, seja aquele da exceção à norma, seja o da microfísica que passa pelos
dedos das normas. Mas o marxismo permite a compreensão histórica e
dialética da totalidade estruturada: direito, poder e sociedade se entendem a
partir dos horizontes mais amplos, buscando identificar as funções específicas
do jurídico e do estatal e seu aparecer necessário na reprodução do
capitalismo. Abrindo-se também para albergar junto de si o melhor de algumas
outras perspectivas filosóficas, tal qual as existenciais e a de Foucault, o
pensamento jurídico marxista, desde Marx, Engels ou
Pachukanis ou, como entre nós no Brasil, o de Márcio
Bilharinho Naves, é de importância crucial para os nossos
tempos.

RCD: Vivemos um quadro difícil, de grande


conservadorismo dos meios de comunicação e da
intelectualidade. A Revista Crítica do Direito é um meio de
luta transformadora da comunicação da produção
intelectual, jurídica e política. No âmbito geral, pode-se
dizer que exista esperança na possibilidade de um pensamento crítico? Quais
suas expectativas sobre o capitalismo e a sociedade contemporânea?

MASCARO: Já desde o século XIX as contradições do capitalismo permitem


apontar à possibilidade da esperança transformadora, o socialismo. Trata-se da
única opção para fundar a humanidade justa e fraterna. Mas o século XX
pensou olvidar as contradições do capitalismo com recursos conservadores
médios, como o bem-estar social, ou com remédios extremos, como o
fascismo. O nazismo demonstrou a tragédia absoluta de uma dessas vias. As

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crises de acumulação e de valorização especulativa do final do século XX


demonstram a fraqueza do pretenso controle jurídico e estatal do capital. Como
ainda temos insistido em um modo de produção de exploração e egoísmo, os
meios de comunicação e de formação dos valores e pensamentos
hegemônicos têm alimentado a ilusão do consumo infinito e do gozo imediato
dentro da lógica conservadora. Parabenizo Vinícius Magalhães Pinheiro e a
Revista Crítica do Direito pela iniciativa de se contrapor ao bom senso da
reprodução do mundo explorado. Da realidade, a crítica. Da verdade crítica, a
esperança; desta a luta. Da luta, o justo.

Tupac Amaru bradado aos berros.


Thiago Colombo Bertoncelo

*Advogado e mestrando em Direito Político e Econômico pela Universidade


Presbiteriana Mackenzie (São Paulo-SP)

Em conjunto com o nascimento desta Revista


Crítica do Direito devemos relembrar uma das
personalidades mais importantes para
aqueles que lutam por um espaço em face da
atual hegemonia, José Gabriel Tupac Amaru,
que na sua luta por emancipação decretou o
fim da escravidão nas colônias espanholas,
em 4 de novembro de 1780.

Descendente da família imperial Inca herdou mais de 70 pares de mulas,


responsáveis pelo transporte local, o que garantia uma tranqüila renda e o
respeito em todos os estratos sociais. Discordando do modo de exploração
colonial espanhola e do sacrifício de vidas para se garantir a exploração dos
metais da região, buscou transformar o sistema colonial adotando todos os
meios institucionais existentes, fazendo inclusive alguns pedidos ao tribunal do
vice-reino, para que se elegessem democraticamente os líderes tribais.

Todavia, o resultado de toda aquela luta burocrática e institucional foi nulo. A


coroa espanhola aumentou a intensidade da exploração, exatamente como
previa a doutrina econômica hegemônica daquele período e a sua decorrência,
o metalismo.

O principal motivo para celebrarmos o nome de Tupac Amaru nessa


inauguração da Revista Crítica do Direito é o fato de que todas as derrotas
burocráticas não o afastaram de sua luta pelos explorados; com a ajuda de
outros lideres locais, denominados curacas, conclamou todos os negros, índios
e mestiços a derrubarem o representante espanhol que controlava a região de
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Tinta e com a vitória nessa primeira batalha declarou o fim dos impostos e o fim
da escravidão.

A rebelião se espalhou rapidamente pela região e ao passo que a força popular


derrubava as autoridades espanholas das vilas, dividia a riqueza conquistada
com a população local. A repercussão dessa vitória foi tamanha que Tupac
chegou a controlar um exército de 40 mil homens que, embora destreinados e
desarmados, sitiaram Cuzco e enfrentaram o exército espanhol composto de
20 mil homens, treinados e com os mais avançados recursos militares da
época, inclusive armas de fogo.

A derrota era inevitável, Cuzco era uma cidade muito bem fortificada e após
aproximadamente sete horas de batalha, as muralhas da cidade
permaneceram intactas, os realistas tiveram poucas baixas. Com a frustrada
tentativa de dominar a capital do Vice-reino do Peru, os rebelados
aquartelaram-se em Tinta, o que permitiu aos realistas receber o reforço de
mais 17 mil soldados espanhóis, partindo, então, para impor uma penosa
derrota aos rebelados.

Apesar da superioridade militar espanhola, cumpre-se ressaltar o papel da


igreja católica como uma das maiores responsáveis por esta derrota, pois,
ligada à elite exploradora, optou por excomungar Tupac e todos aqueles
relacionados ao seu movimento, sendo que somente seriam perdoados
aqueles que traíssem a sua causa popular, unindo-se ao exército espanhol.
Essa atuação da Igreja enfraqueceu o movimento, levando vários índios que,
tementes de serem excomungados, traíram Tupac e em uma emboscada
conseguiram prendê-lo. Após vários meses de tortura, foi sentenciado ao
esquartejamento, mas somente depois de assistir seus homens, seus filhos e
sua mulher serem torturados e enforcados. Diante da impossibilidade de os
cavalos realizarem a sentença prevista, o líder da rebelião foi decapitado.
Após a morte de Tupac, a rebelião remanesceu sob a liderança de seu irmão,
porém, pouco tempo depois, foi dizimada. O que os espanhóis não esperavam
foi o poder que a história de Tupac teria sobre as massas, influenciando líderes
como Símon Bolívar e Ernesto “Che” Guevara.

Por conta desta força e da influência de Tupac, Pablo Neruda, renomado


literato argentino, escreveu em seu Canto Geral: “as úmidas casas de areia/
dizem em silêncio: „Tupac‟/ e Tupac é uma semente/(...) dizem em silêncio:
„Tupac‟/ e Tupac germina na terra.”. Com todo respeito à Neruda, Tupac
germina na terra, mas seu nome não deve jamais ser dito em silêncio, deve ser
bradado aos berros por todas as minorias e trabalhadores explorados, em
busca de sua emancipação.

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Žižek e o Direito
Thiago Arcanjo Calheiros de Melo
* Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Alagoas, Advogado,
Funcionário Público e Mestrando em Direito Político e Econômico (São Paulo-
SP)

Resenha: GRILLO, Marcelo Franco. O Direito na Filosofia de Slavoj Žižek:


perspectivas para o pensamento jurídico crítico. São Paulo: Alfa-Ômega, 2011i.

*Marcelo Gomes Franco Grillo é bacharel em Direito e


advogado. Tem estudos de graduação em Filosofia na
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor
universitário, é mestre em Direito Político e Econômico
pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

A obra resenhada tem como objeto a análise dos


fundamentos teóricos da obra de Žižek que se afiguram
importantes e férteis para a pesquisa do Direito, na quadra
histórica do capitalismo.

Žižek por ser pensador da “totalidade”, sem restrições prévias a campos de


investigação da vida social, acaba sendo levado a refletir também sobre o
Direito, tema intransponível àqueles que visam teorizar sobre a relação entre
as manifestações econômicas, ideológicas e políticas. Estudar um tema
específico na obra de Žižek é sempre um imenso desafio, seja pela confluência
de aspectos das mais variadas correntes filosóficas, pela diversidade de temas
sempre em discussão, ou pela forma de intervenção do próprio autor: seus
livros são como a urgência materializada; a filosofia de Žižek é construída ao
“meio-dia”, com sol a pino.

O livro aqui analisado se divide em três partes. Na primeira, é estabelecida a


interpretação de Grillo sobre os fundamentos de Žižek que particularmente
interessam à pesquisa, situando-os perante a tradição de pensamento
marxista. Grillo, ao transcorrer do livro, assenta um Žižek pós-moderno na
forma, mas bem diferente do que seja pós-moderno no conteúdo.

Na segunda, o objetivo é detectar as várias tendências de filosofia do Direito


latentes no interior da obra de Žižek, com evidente destaque para as
aproximações “Žižek-Carl Schmitt” e “Žižek-Pachukanis”, para a contraposição
ao positivismo jurídico positivista e para o terreno ainda muito fértil “Direito e
psicanálise”.

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Por fim, estabelece-se a relação do que “quotidianamente” aparece como


política e Direito: cidadania, direito ambiental, direitos humanos e democracia.
Mesmo tendo em vista toda a gama de temas envolvidos no livro aqui
analisado, iremos nos deter apenas em algumas poucas questões que têm
como móvel a discussão da primeira parte do livro. Quanto à explanação ampla
e detalhada do livro de Marcelo Franco Grillo, remetemos o leitor à entrevista
realizada ao próprio autor do livro aqui sob análise, à ocasião de seu
lançamento1.

Žižek decididamente realiza uma crítica virulenta tanto ao capitalismo de modo


geral, como ao discurso politicamente correto da Democracia e dos Direitos
Humanos (ressalte-se sua incisiva crítica às ações “humanitárias” do império
estadounidense pelo mundo). Não bastassem as polêmicas “conteudísticas” de
suas posições, a forma pela qual se dá essa intervenção de Žižek é também
bem discutida tanto entre críticos da sociabilidade capitalista quanto entre
leitores de Žižek. Nesse diapasão, o debate posto por Grillo se realiza
intentando situar se Žižek é eclético ou “não-eclético”. Certamente, pela
tradição acadêmica e para fins preponderantemente acadêmicos
(principalmente quando considerada a importância de sondar a filiação teórica
de um importante pensador), é relevante e justificado o esquadrinhar das
raízes teóricas do pensamento.

Entretanto, esta resenha destaca um aspecto de Žižek que considera ser de


extrema relevância: a relação entre o método e as coisas. Das coisas
mundanas é que Žižek sente sede! A postura investigativa de Žižek é, por si,
uma afronta a maior parte da pesquisa jurídica hoje corrente.

O modos operandi de Žižek, desapegado que é da escolha de tal ou qual


aparato epistemológico como impostação prévia da pesquisa, demonstra que
seu “ecletismo” nada mais é que um reflexo das tendências teóricas aptas
(segundo a visão do próprio pensador) a desenvolver críticas radicais: é por
isso que o trajeto teórico inclui desde Hegel e Marx a Lacan. O mundo
enquanto laboratório de pesquisa de Žižek fica demonstrado pelo imenso
repertório cultural apresentado (literatura, cinema, propaganda etc.). As coisas
são o que interessa!

Note-se que isso põe a perspectiva metodológica de Žižek para além inclusive
do Moderno (para não falar do pós-moderno): o conhecimento estritamente
fenomenal kantiano está na base do tão em voga ecletismo pós-moderno. O
Moderno nunca ou pouco procurou as coisas. Melhor dizendo: procurou as
coisas através do sujeito. Foi sempre uma procura do sujeito que “conhece”.
Assim, a postura metodológica resultante da investigação de Žižek não cai
numa relação em que o objeto é impassível de apreensão, em que pese Žižek
analisar e problematizar os próprios problemas do conhecimento para o

1
Disponível em http://alfaomega.com.br/filosofia-zizek.php

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homem contemporâneo. Enquanto conteúdo da própria análise, Žižek


problematiza a relação de conhecimento do homem para com o mundo em
grandes doses. Porém, o método de Žižek não conhece limites epistemológicos
prévios, apesar da extensa discussão sobre a epistemologia e seus problemas
no mundo contemporâneo.

Nesse sentido, apesar de Žižek ser uma boa representação de nosso tempo
(quanto à forma e ao conteúdo) em muitas de suas análises, a forma de sua
obra é muito pouco distanciada do objeto que investiga. O reflexo das próprias
coisas que representa se faz sentir de tal maneira que a “convulsão do mundo”
é, em grande medida, também posta na obra sob a forma de uma imensa
plêiade de assuntos que se discutem e se misturam velozmente.

Isto assentado, Grillo constata que essas latências de radicalidade também se


apresentam na caracterização do Direito, abrindo caminhos notáveis. Ora Žižek
se aproxima de uma crítica aos moldes pachukanianos, da própria “forma
jurídica”, correlata da forma valor; ora se aproxima da análise do direito como
resultado da “luta de classes”. E este último assunto o livro de Grillo
aparentemente deixa em aberto.

Sabe-se que Žižek trabalha com conceitos bem diferenciados de “classes”. Sua
análise dos “grupos sociais em luta” certamente traz uma idéia de
antagonismo. Entretanto, torna muito problemática a própria idéia de classes.
Quais seriam as implicações desta idéia de “antagonismo”? Quais as
conseqüências, para as conclusões marxistas respeitantes ao Direito, de uma
concepção com base na idéia de antagonismo? Se assim é quanto ao Direito, o
que dizer então do Estado? Uma divisão da sociedade em grupos antagônicos
que não são classes seria mais um reflexo do empírico na obra zizekiana? Este
certamente é um campo de pesquisa razoavelmente “aberto” no que respeita a
obra de Žižek, o que põe em questão várias tendências marxistas.

De estilo bem diferente do esloveno, Grillo constrói uma pesquisa jurídica que
busca seguir um “caminho de segurança” e austero, dado o emaranhado das
idéias zizekianas. Grillo, ao tempo em que põe de pé as vigas mais sólidas da
obra de Žižek, desenha de fato uma “planta baixa” dos fundamentos
jusfilosóficos nela encontrados. Essa é a maneira escolhida por Franco Grillo
de trazer todo o questionamento inquieto do esloveno ao âmbito da
investigação jurídica.

É, certamente, livro de leitura obrigatória para aqueles que tanto se interessam


pela obra de Slavoj Žižek quanto para os que investigam o fenômeno jurídico
contemporâneo.

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CADERNO ESPECIAL: A questão do gênero (1ª parte)


ENTREVISTA

Paula Loureiro da Cruz, marxista e feminista

A Revista Crítica do Direito entrevista, nesta sua primeira edição, Paula


Loureiro da Cruz. Obtido há pouco seu título de mestre em Direito Político e
Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (São Paulo-SP), as s
pesquisas em marxismo e direito de Paula Loureiro inovaram profundamente o
debate ao enfocar a questão do gênero feminimo. Voltando-se a um grupo de
intelectuais e revolucionários clássicos do marxismo, Paula Loureiro estudou a
fundo o pensamento de Alexandra Kollontai, filósofa e política russa à época da
Revolução de 1917. Kollontai desempenhou um papel essencial na história dos
povos, tanto pela sua sagacidade teórica quanto pela coragem militante,
opondo-se, quando julgou necessário, às orientações do seu próprio partido.
Para saber mais sobre Alexandra Kollontai, acesse
http://www.marxists.org/archive/kollonta/index.htm (VMP)

RCD: Sua palestra versando sobre o pensamento de


Alexandra Kollontai, em homenagem ao Dia das
Mulheres, realizada em 31/03, na sede do Sindicato dos
Bancários e Financiários de são Paulo, Osasco e região,
teve grande repercussão. Antes de mais nada,
gostaríamos de saber quem foi Alexandra Kollontai.

Paula Loureiro: Alexandra Kollontai foi uma das


primeiras mulheres feministas marxistas da história, que
se tornou mundialmente conhecida por ser a primeira Alexandra Kollontai
mulher no mundo: a) a ocupar um cargo no alto escalão
do governo, in casu, de Comissária do Povo (Ministra) na Rússia, após a
Revolução Proletária de 1917; b) a ser nomeada Embaixadora; c) a receber o

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título de Ministra Plenipotenciária conferido pelo Rei da Noruega. Kollontai


também ficou conhecida por suas idéias polêmicas no campo da moral
sexual, bem como por sua participação como líder da "Oposição Operária" -
movimento que se opunha a decisões adotadas pelo governo bolchevique, logo
após a Revolução Proletária Russa.

RCD: Defina Alexandra Kollontai numa única palavra.

Paula Loureiro: Atualidade.

RCD: Por que a "atualidade" de Alexandra Kollontai?

Paula Loureiro: As contribuições deixadas por Kollontai no início do século XX


aplicam-se indiscutivelmente à realidade contemporânea, seja com maior, seja
com menor tempero. A autora não teve receio de expor ideias que, mesmo em
dias atuais, são passíveis de críticas contundentes.

Revista Crítica do Direito: Quais as contribuições de


Alexandra Kollontai para o feminismo?

Paula Loureiro: Kollontai percebera que a questão da


mulher envolve duas vertentes: a exploração suportada
no mercado de trabalho capitalista, e a opressão
suportada no âmbito doméstico, em virtude da forma
familiar monogâmica burguesa. Em sua visão, a
libertação da mulher pressupõe não só a
transformação das bases econômicas com o
Kollontai na tribuna da comunismo, como também a superação da moral
capitalista que impõe à mulher julgamentos morais
Conferência Internacional de
Mulheres distintos daqueles que seriam aplicáveis aos homens
na prática de condutas idênticas. A socialização
dos serviços domésticos, mediante a sua conversão em serviço público, assim
como a transferência para a sociedade dos cuidados com os filhos, no seio do
que a autora define de "família universal proletária" seriam medidas capazes de
minimizar a opressão suportada pela mulher que, além de trabalhar
fora, tem preciosas energias consumidas na execução dos
serviços domésticos, os quais não lhe propiciam nenhum crescimento nem
tampouco reconhecimento. A autora também sugere a abertura dos
relacionamentos amorosos, com o fim do direito de propriedade de um cônjuge
sobre o outro, vale dizer, Kollontai propõe o fim da exclusividade nos
relacionamentos entre os sexos.

RCD: Por fim, qual o papel do direito e da moral em Alexandra Kollontai?

Paula Loureiro: Embora Kollontai não tenha se detido a analisar o Direito em


sua obra, é possível dizer que, na visão da autora, os princípios morais que se
encontrarão presentes na futura sociedade comunista, quais sejam:
solidariedade, camaradagem e coletividade, serão suficientes para reger as
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relações entre os seres, sejam elas sentimentais ou não. Somente referidos


princípios terão o condão de aumentar o potencial de amor da humanidade,
fazendo com que a igualdade, o respeito mútuo e a confiança recíproca
imperem em todas as esferas de relações entre os seres. Nesse momento
futuro, em que forem sedimentadas transformações nas bases econômicas
com a gradativa implementação do comunismo, será possível falar-se no
perecimento do direito, numa perspectiva filosófica próxima a de Pachukanis.
Mas, até que isso ocorra, o direito deve ser utilizado em prol da mulher, com
vistas a minimizar a condição de opressão e exploração por ela suportada.

Breves notas acerca do Feminismo no Brasil


Bruna Zeni

* Bruna Zeni é mestre em Direitos Sociais e Políticas Públicas pela


Universidade de Santa Cruz do Sul (RS).

No Brasil, e em que pesem as muitas lutas e manifestações de apoio, as


mulheres alcançaram o direito ao voto com um século de atraso em relação
aos homens. E mesmo agora, no século XXI, depois de mais de uma década
da lei de cotas nas eleições, mantém-se praticamente inalterada a participação
das mulheres no parlamento, motivo pelo qual a crítica feminista aos limites da
democracia política brasileira e à cultura política hegemônica que ainda produz
interdições, obstáculos e mesmo bloqueios à participação das mulheres na
política (monopólio dos homens até pouco tempo) tem sido incansável.

A baixa representatividade das mulheres é uma das contradições fundantes da


democracia ocidental apontada pelo feminismo. Nesse sentido, para o
feminismo, debater e lutar por participação política das mulheres é propor o
lugar de sujeito político para todas elas. É negar o lugar da família e da casa
como destino e única possibilidade de inserção das mulheres na sociedade, o
que tem sido lugar de confinamento e exclusão para as mulheres.2

Até boa parte do século passado a maioria dos teóricos políticos – do sexo
masculino, por óbvio -, acreditava que havia um fundamento natural para o
confinamento das mulheres à família e para sua sujeição aos seus maridos. As
restrições aos direitos civis e políticos das mulheres justificavam-se, segundo
essa ótica, pela inaptidão das mulheres às atividades políticas e econômicas

2
CAMURÇA, Sílvia. As Mulheres na Política e a Reforma Política. Disponível em:
http://www.maismulheresnopoderbrasil.com.br/pdf/Executivo/As_mulheres_na_politica_e_a_ref
orma_politica.pdf. Acesso em: 10 ago. 2010.

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fora do lar. Essa crença foi progressivamente abandonada pelos teóricos


contemporâneos, que aceitaram que as mulheres, assim como os homens,
precisam ser vistas como livres e iguais; autodeterminadas e dotadas de senso
de justiça.3

Nesse sentido, o feminismo brasileiro possui objetivos, manifestações e


pretensões múltiplas, cujas principais tendências situam-se em dois momentos:
o iniciado no final do século XIX e terminado em 1932, e o feminismo pós-1968.
Ao primeiro momento deu-se o nome de feminismo “bem comportado”, vez que
não questionava a opressão da mulher. Buscava-se somente a inclusão da
mulher na cidadania, não havia desejo quanto a alteração das relações de
gênero. O segundo momento ficou conhecido como feminismo
“malcomportado”, pois reuniu uma gama heterogênea de militantes
(anarquistas, intelectuais, líderes operárias) que, além da participação política,
passaram a defender o direito à educação, falar em dominação masculina e
abordar temas que para a época eram muito delicados, como por exemplo, a
sexualidade e o divórcio.4

Assim, para o estudo das principais conquistas femininas ocorridas nesses


momentos, será feita uma análise que parte do estudo dos textos das
Constituições anteriores, culminando com a Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 e a Lei de Cotas.

No Brasil semifeudal e escravocrata, sob a égide da “Constituição Política do


Império do Brazil”, de 25 de março de 1824, somente às mulheres e aos
escravos eram vedados os direitos políticos. O resultado disso foi um maior
isolamento das mulheres.5 A Constituição Política do Império cita a mulher
apenas ao elencar as restrições a ela aplicáveis em caso de sucessão ao
trono, caso em que prevalecia o descendente masculino sobre o feminino, para
regular o casamento da princesa herdeira presuntiva ao trono e, ao estabelecer
que, falecido o Imperador, a Imperatriz-Mãe seria tutora do Sucessor da Coroa
enquanto não tornar a casar.6 De resto, o ensino superior até então somente
existente na Europa, era acessível à pequena parcela da elite e permitido
apenas aos homens. Era vedado à mulher não só o acesso aos direitos
políticos, mas à educação e seus benefícios.

Na vigência dessa constituição, as mulheres obtiveram algumas conquistas: no


ano de 1879, permitiu-se o acesso das mulheres ao ensino superior,
3
KYMLICKA, Will. Filosofia política contemporânea: uma introdução. São Paulo: Martins Fontes,
2006. p. 304-305.
4
PINTO, Célia Regina Jardim. Uma História do feminismo no Brasil. São Paulo: Fundação
Perseu Abramo, 2006.
5
SANTOS,Tânia Maria dos. A mulher nas constituições brasileiras. Disponível em:
www6.ufrgs.br/nucleomulher/.../Mulher%20e%20CF%20-%20Final%20tania.pdf. p. 4. Acesso
em: 17 ago. 2009.
6
Artigo 116 e seguintes da Constituição do Império. In: NOGUEIRA, Octaciano. (Org.).
Constituições Brasileiras: 1824. Brasília: Senado Federal e Ministério da Ciência e Tecnologia,
Centro de Estudos Estratégicos, 2001. p. 95-96.

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entretanto, poucas mulheres o fizeram, diante do preconceito existente na


sociedade. Em 1885, a pianista e compositora Chiquinha Gonzaga estreia
como maestrina regendo a opereta "A Corte na Roça", foi a primeira mulher no
Brasil a estar à frente de uma orquestra. No ano de 1887 formou-se a primeira
médica no Brasil, Rita Lobato Velho.

Na primeira Constituição da República, a Constituição da República dos


Estados Unidos do Brasil, de 24 de fevereiro de 1891, foi estabelecido o voto
universal aos cidadãos maiores de 21 anos, excetuados os analfabetos,
mendigos, soldados e religiosos sujeitos ao voto de obediência. Mesmo a
Constituição não excluindo formalmente o voto feminino, as brasileiras ainda
tiveram que lutar mais de trinta anos para votar. Luta que fora fortalecida com a
fundação do Partido Republicano Feminista do Brasil, em 1910, por Deolinda
Daltro, que também promoveu, em 1917, a primeira passeata a exigir a
extensão do voto às mulheres.

O Rio Grande do Norte, ainda na vigência da Constituição da República, foi o


primeiro estado a permitir às mulheres o direito de votar e serem votadas. Tal
permissão deu-se através da Lei Estadual n. 660, de 25 de janeiro de 1927 7. A
primeira eleitora registrada foi Célia Guimarães Viana e o voto de saias, como
ficou conhecido, ocorreu somente no ano seguinte, na data de 05 de abril, nas
eleições municipais.

Essa abertura política conferida às mulheres no Rio Grande do Norte resultou


das reivindicações feministas por igualdade social lideradas em âmbito
nacional pela bióloga paulista Bertha Lutz (1894-1976). Ela se tornaria, a partir
de 1918,

[...] uma das mais expressivas lideranças feministas na


campanha pelo voto feminino e pela igualdade de direitos
entre homens e mulheres no Brasil. Foi através do contato
com Bertha Lutz no Congresso Nacional que Juvenal
Lamartine, deputado federal pelo Rio Grande do Norte no
período entre 1906 e 1926, apresentou como uma das
propostas da sua plataforma de governo a intenção de
contar [...] com o concurso [voto] da mulher [...] na
escolha daqueles que vêm representar o povo [...] e
elaboram e votam a lei.8

7
O Art. 77 da Lei Estadual n. 660, de 25 de janeiro de 1927, determinava: “No Rio Grande do
Norte poderão votar e ser votados, sem distincção de sexos, todos os cidadãos que reunirem
as condições exigidas por esta lei.” RIO GRANDE DO NORTE. Tribunal de Justiça do Estado
do Rio Grande do Norte. Centro da Memória da Justiça Eleitoral Professor Tarcísio Medeiros.
Os 80 anos do ‘voto de saias’ no Brasil. Disponível em: http://www.tre-
rn.gov.br/legado/centro_de_memoria/index.htm. Acesso em 16 de jun. de 2010.
8
SOIHET, Rachel. A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres e a militância
feminista de Bertha Lutz. Revista Brasileira de Educação. Campinas/SP: Autores Associados,

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Além de ter sido o primeiro estado do Brasil a permitir o voto feminino, foi
também em Rio Grande do Norte, na cidade de Lajes, que elegeu-se, pelo
Partido Republicano, a primeira prefeita do sexo feminino não só do Brasil, mas
de toda a América do Sul: Alzira Soriano. Alzira foi eleita em 1928, exatamente
no mesmo ano em que a mulher adquiriu o direito ao voto. A eleição de Alzira
Soriano e o pioneirismo do direito de voto conferido às mulheres no Rio Grande
do Norte representaram, e continuam representando, fatos decisivos na luta
por cidadania e igualdade de direitos entre homens e mulheres no Brasil. 9

No ano de 1932, durante o Governo Vargas, emerge o primeiro Código


Eleitoral (Decreto n. 21.076, de 24 de fevereiro de 1932), que possibilitou a
candidatura da médica Carlota Pereira de Queirós, primeira Deputada do
Brasil, eleita em 1933 para a formação da Assembléia Nacional Constituinte.
Carlota foi reeleita em 1934 sob os auspícios da Constituição da República dos
Estados Unidos do Brasil, de 16 de junho de 1934, que reproduziu os
dispositivos do Código Eleitoral de 1932, assegurando constitucionalmente o
voto feminino.10 Nesse mesmo ano, embarca para Los Angeles a primeira
atleta brasileira a participar de uma Olimpíada, a nadadora Maria Lenk, então
com 17 anos de idade. Ela foi a única mulher integrante da delegação
olímpica.11

Após o Golpe de Estado, em 10 de novembro de 1937, o Poder Legislativo


ficou extinto por quase 10 anos e igualmente extintos os mandatos dos
Deputados e Deputadas antes eleitos. A nova Constituição silenciou sobre o
voto feminino autorizado pelo Código Eleitoral de 1932 e consagrado na
Constituição de 1934. A Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 18 de
setembro de 1946 determinou o retorno do país à via democrática, restituindo o
direito de votar e ser votado para ambos os sexos. Ademais, a Estado Novo
criou o Decreto n. 3.199, que proibiu às mulheres a prática dos esportes então
considerados incompatíveis com as condições femininas: luta de qualquer
natureza, futebol de salão, futebol de praia, pólo, pólo aquático, halterofilismo e

n. 15, set/out/nov. 2000, p. 97-117. Disponível em: <http:// www.anped.org.br/rbe/rbe/rbe.htm>.


Acesso em: 20 dez. 2010.
9
RIO GRANDE DO NORTE. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte. Centro da
Memória da Justiça Eleitoral Professor Tarcísio Medeiros. Os 80 anos do „voto de saias’ no
Brasil. Disponível em: http://www.tre-rn.gov.br/legado/centro_de_memoria/index.htm . Acesso
em 16 de jun. de 2010.
10
RIBEIRO, Antonio Sergio. A Mulher e o Voto. Disponível em:
www.al.sp.gov.br/web/eleição/mulher_voto.htm. Acesso em: 17 jun. 2010.
11
BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. As Mulheres Fazem História. Disponível
em: http://www.ibge.gov.br/ibgeteen/datas/mulher/mulherhistoria.html. Acesso em: 30 dez.
2010.

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beisebol. Esse Decreto só foi regulamentado em 1965.12

Considerável avanço das mulheres na conquista de espaço em direção à


igualdade de direitos civis ocorreu pela alteração do Código Civil de 1916, que
restringia a autonomia feminina a um obscuro segundo lugar, muito distante da
supremacia masculina. Conhecida como Estatuto da Mulher Casada, a Lei n.
4.121, de 27 de agosto de 1962, deu início ao processo legislativo de
equiparação de direitos entre homem e mulher. Tal Estatuto declarou a mulher
plenamente capaz para atos da vida civil aos 21 anos e a reconheceu como
colaboradora do marido nos encargos familiares. Concedeu, ainda, ao homem
e a mulher igualdade de condições ao pátrio poder e, mesmo determinando a
prevalência da vontade do homem no caso de discordância do casal acerca
dos filhos, ressalvou à mãe o direito de recorrer ao juiz para solução da
divergência.

Na vigência da Constituição do Brasil, de 24 de janeiro de 1967, não há registro


de benefícios à condição feminina. O país seguiu sob a ação de atos
institucionais, notadamente o Ato Institucional n. 5, de 13 de dezembro de1968.
A Constituição foi totalmente reformada pela Emenda Constitucional n. 1, de 17
de outubro de 1969 - uma nova constituição outorgada. Mesmo no auge da
repressão13, as mulheres brasileiras, seguindo exemplo do movimento
feminista que eclodia na Europa e nos Estados Unidos, organizaram-se em
ações contra o regime de exceção. Independentemente de partidos políticos,
idade e classe social, inicialmente liderado por mulheres com maridos e
familiares perseguidos pela ditadura, o movimento feminista granjeou a
atenção da sociedade e encontrou apoio em organizações sociais e grupos
políticos.14

Uma Comissão Parlamentar de Inquérito foi instaurada em 1977 para verificar


até que ponto a legislação vigente à época contribuía para manter a posição de
inferioridade atribuída à mulher e que pontos deveriam ser alterados.
Instauração reflexo do plano de ação elaborado pela ONU na I Conferência
Mundial sobre a Mulher, ocorrida na Cidade do México, em 1975, ano
internacional da mulher. A Comissão Parlamentar investigou a situação da
mulher no mercado de trabalho, na família e na sociedade. Realçaram-se
questões não político-partidárias, mas de absoluta relevância e que
permanecem até hoje como marcas da desigualdade ainda impingida às

12
BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. As Mulheres Fazem História. Disponível
em: http://www.ibge.gov.br/ibgeteen/datas/mulher/mulherhistoria.html. Acesso em: 30 dez.
2010.
13
Sobre a relação entre mulher e política durante o regime popular recomenda-se a leitura da
obra: COLLING, Ana Maria. A resistência da mulher à ditadura militar no Brasil. Rio de Janeiro:
Rosa dos Tempos, 1997.
14
BRASIL. Confederação das Mulheres do Brasil. (No prelo). Mulher Trabalho e Desenvolvimento
– Teses III Congresso da Confederação das Mulheres do Brasil, 2009. p. 6.

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mulheres no Brasil.15 Dois anos após, em 1979, Eunice Michilles, então


representante do PSD/AM, torna-se a primeira mulher a ocupar o cargo de
Senadora, em virtude do falecimento do titular da vaga.16

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 deu nova feição às


estruturas de poder no país. Delineou com clareza os direitos fundamentais, as
garantias individuais e as liberdades civis, garantindo às mulheres, de forma
expressa, o direito à igualdade e à titularidade da plena cidadania, deflagrando
uma maior inserção feminina nos espaços sociais e na vida política da Nação.17

Nas primeiras eleições que seguiram a proclamação da Constituição da


República Federativa do Brasil de 1988, em 1990, é eleita à primeira mulher
para o cargo de senadora: Júnia Marise, do PDT/MG18 e escolhida, pelo então
Presidente, a primeira ministra do sexo feminino, Zélia Cardoso de Mello, que
assume a pasta da Economia. Nas eleições seguintes, em 1994, Roseana
Sarney é a primeira mulher a ser eleita governadora de um estado brasileiro: o
Maranhão, tendo sido reeleita em 1998. No ano de 2010, Dilma Rousseff do PT
chega a Presidência da República. Primeira mulher a alcançar o cargo máximo
do país. Evidencia-se com essa importante conquista histórica para as
mulheres e, sobretudo para o Brasil, que, desde a candidatura e posterior
eleição da primeira mulher a um cargo político, em 1929, a participação
feminina na vida pública cresceu e se fortaleceu.

Antes encarada como um fato curioso, prosaico ou


meramente formal, para cumprir as exigências da
legislação eleitoral, a candidatura e o exercício de cargos
públicos por parte das mulheres já se tornaram parte
cotidiana nas organizações partidárias, sindicais e sociais
do Brasil. Entretanto, ainda estamos bem distantes da
representação feminina que consideramos justa! Embora
sejamos pouco mais de 50% da população, mal

15
Foram ouvidas 39 personalidades dos mais diversificados setores para examinar a situação da
mulher em todos os ramos de atividades. Foram promovidos estudos e audiências públicas, de
março a outubro de 1977, para tanto. SANTOS, Tânia Maria dos. A mulher nas constituições
brasileiras. Disponível em: www6.ufrgs.br/nucleomulher/.../Mulher%20e%20CF%20-
%20Final%20tania.pdf. p. 10. Acesso em: 17 ago. 2009.
16
BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. As Mulheres Fazem História. Disponível
em: http://www.ibge.gov.br/ibgeteen/datas/mulher/mulherhistoria.html. Acesso em: 30 dez.
2010.
17
“Art. 5º– Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residente no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e a propriedade, nos termos seguintes. I – homens e mulheres são
iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.” Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm .
Acesso em: 10 ago. 2010.
18
BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. As Mulheres Fazem História. Disponível
em: http://www.ibge.gov.br/ibgeteen/datas/mulher/mulherhistoria.html. Acesso em: 30 dez.
2010.

19
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alcançamos a marca de 10% no Congresso Nacional,


bem abaixo da média mundial de 18,5% de mulheres no
Parlamento.19

Com efeito, “de todas as barreiras à participação das mulheres, a da política é,


sem dúvida, a mais difícil de transpor, exatamente por ser a política o espaço
das decisões e do poder e, como tal, tem sido privilégio dos homens.”20 Muito
embora a Constituição da República Federativa de 1988 elenque dispositivos
de grande importância para o fim da tradicional discriminação sofrida pelas
mulheres ao garantir expressamente o direito à igualdade (art. 5º, inciso I 21) e
ao assegurar cidadania plena e abertura de espaços à atuação feminina,
ressalta-se que as chefias de órgãos e entes públicos ainda são, em sua
imensa maioria, ocupadas por homens, assim como as cadeiras do Congresso
Nacional.

Assim, mesmo após a promulgação da Constituição de 1988, a participação de


mulheres nos Poderes Executivo e Legislativo permanece em níveis
baixíssimos. Em verdade, até houve aumento no número de deputadas e
senadoras, entretanto, em valores percentuais, as mulheres ainda
permanecem sub-representadas.22 Diante dessa realidade, não é possível
afirmar que vivemos em uma democracia, uma vez que mais da metade da
população brasileira, representada pelas mulheres, está excluída das decisões
políticas - até mesmo daquelas que lhe dizem respeito.

Atualmente é a Lei 9.504/97, Lei de Cotas, que determina as regras do jogo


eleitoral e, mesmo não dispondo diretamente sobre cotas para as mulheres,
vez que determinou a reserva de no mínimo 30%, e no máximo, 70% para as
candidaturas de cada sexo, é preciso reconhecer que, no plano fático, ela
representa um importante mecanismo de promoção da participação política
feminina nos espaços formais de poder, assegurando que a candidatura de
mulheres representará no mínimo 30% do total de inscrições eleitorais, o que

19
BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Políticas para as Mulheres. Comissão
Tripartite para revisão da Lei 9.504/1977: relatório final. Brasília: Secretaria de Políticas para as
Mulheres, 2010. p. 7.
20
BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Políticas para as Mulheres. Comissão
Tripartite para revisão da Lei 9.504/1977: relatório final. Brasília: Secretaria de Políticas para as
Mulheres, 2010. p. 4. (texto de Luíza Erundina).
21
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm.
Acesso em: 10 ago. 2010.
22
NÓBREGA, Luciana Nogueira; LOPES, Ana Maria D‟Ávila. Democratizando a Democracia: a
participação política das mulheres no Brasil e a reforma do sistema político. Disponível em:
http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/bh/ana_maria_davila_lopes2.pdf .
Acesso em: 10 ago. 2010.

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tende a aproximar a composição dos órgãos representativos da composição da


sociedade brasileira.23

Imperioso reconhecer que são principalmente as mulheres que se preocupam


com a qualidade dos serviços de educação e de saúde; que lutam por mais
vagas nas creches; que clamam por uma política de segurança pública eficaz,
etc. E é por isso que o olhar feminino precisa chegar às Câmaras Municipais,
Prefeituras, Assembléias Legislativas, Governos Estaduais e no Congresso
Nacional. É preciso que a maioria feminina se espelhe na representação
parlamentar nos três níveis de governo e com presença em todas as áreas de
expressão da vida pública e de ação política.

A longa estrada percorrida pelas mulheres brasileiras na busca de igualdade e


garantia de acesso à cidadania plena, aos espaços públicos, sociais e a uma
inclusão paritária na vida política nacional tem sido reflexo do contexto
sociológico presente na formação do Brasil, desde seus primórdios até nossos
dias, em que a evolução do quadro ocorre em um ritmo lento e apresenta
ganhos aquém dos desejados. Antes, via-se a mulher como “rainha do lar”.
Uma prisioneira em seu castelo e súdita fiel do rei todo-poderoso de seu
domínio; o estigma do feminino marcado pela diminuição, quando não da
invisibilidade de seu papel de parceira na construção e manutenção da vida
familiar, só recentemente passou a adquirir novos contornos, graças ao esforço
continuado de mulheres e homens dispostos a compartilhar o direito à
dignidade da pessoa humana em igualdade de condições.

Atualmente, com idênticas responsabilidades e direitos na formação e no


acesso à participação nos espaços sociais, abertura garantida no Brasil a partir
da Constituição Federal de 1988 que quer o país um Estado Democrático de
Direito, a capacidade da mulher ainda é subaproveitada e pouco expressiva
nos foros de poder e decisão da vida nacional. Seu acesso à participação
política institucional ainda é dificultado pela barreira imposta pela dupla jornada
decorrente da divisão sexual do trabalho e limitado pelo tempo desigual
dedicado pela mulher em atividade exclusiva como a reprodução, mas
desnecessariamente desigual na divisão das responsabilidades e tarefas afins,
é uma das razões de o Brasil ocupar posição abaixo de Venezuela, Bolívia e
Paraguai no quesito participação da mulher nos parlamentos.

Acredita-se que somente com mais mulheres nos espaços de poder e decisão
será possível superar o atual modelo societal maculado pela supremacia de um
sexo sobre o outro, alcançar a verdadeira igualdade constitucional e recuperar
o déficit de democracia que ainda estimagmatiza o Brasil perante o mundo.

Referências

23
NÓBREGA, Luciana Nogueira; LOPES, Ana Maria D‟Ávila. Democratizando a Democracia: a
participação política das mulheres no Brasil e a reforma do sistema político. Disponível em:
http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/bh/ana_maria_davila_lopes2.pdf .
Acesso em: 10 ago. 2010.

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BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Políticas para as Mulheres.


Comissão Tripartite para revisão da Lei 9.504/1977: relatório final. Brasília:
Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2010.

BRASIL. Confederação das Mulheres do Brasil. (No prelo). Mulher Trabalho e


Desenvolvimento – Teses III Congresso da Confederação das Mulheres do
Brasil, 2009.

BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. As Mulheres Fazem


História. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/ibgeteen/datas/mulher/mulherhistoria.html. Acesso em:
30 dez. 2010.

CAMURÇA, Sílvia. As Mulheres na Política e a Reforma Política. Disponível


em:
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CRÍTICA DO DIREITO
Só leia se estiver seguro para abandonar o conforto de suas certezas
Ano 1, nº 1, 2011 www.criticadodireito.com.br 25 de abril a 1º de maio / 2011

SOIHET, Rachel. A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres


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SUGESTÃO DE LEITURA

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Edição, diagramação, distribuição: Vinícius Magalhães Pinheiro

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