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PUC MINAS.

PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO STRICTO SENSU


EM DIREITO - ENSINO JURÍDICO – PROFESSOR MARCIANO SEABRA
DE GODOI – ALUNO: AUGUSTO LACERDA TANURE - RESUMO
CRÍTICO.

1. OBRAS:

SANTOS, Boaventura de Souza. Para além do pensamento abissal: das linas globais a uma
ecologia dos saberes, In: SANTOS, Boaventura & Meneses, Maria Paula (Orgs.). Epistemologias
do Sul, São Paulo: Cortez, 2013

MALDONADO-TORRES, Nelson. A topologia do ser e a geopolítica do conhecimento.


Modernidade, império e colonialidade, In: SANTOS, Boaventura & Meneses, Maria Paula (Orgs.).
Epistemologias do Sul, São Paulo: Cortez, 2013

GOMES, Nilma. Intelectuais negros e a produção do conhecimento: algumas reflexões sobre a


realidade brasileira. In: SANTOS, Boaventura & Meneses, Maria Paula (Orgs.). Epistemologias
do Sul, São Paulo: Cortez, 2013

2. RESUMO:

Toda e experiência social produz e reproduz conhecimento e, ao fazê-lo,


pressupõe uma ou várias epistemologias. Epistemologia é toda a noção ou ideia, reflectida
ou não, sobre as condições do que conta como conhecimento válido. É por via do
conhecimento válido que uma dada experiência social se torna intencional e inteligível.
Não há, pois, conhecimento sem práticas ou atores sociais. E como umas e outros não
existem senão no interior de relações sociais, diferentes tipos de relações sociais podem
dar origem à diferentes tipos de Epistemologias. (...) Assim sendo, qualquer
conhecimento válido é sempre contextual, tanto em termos de diferença cultural, quanto
em termos de diferença política. (BOAVENTURA, 2009a, p.9)

A citação de Boaventura Santos, nos permite identificar o que de comum há nos três textos
indicados. Em todos, expõe-se a ideia de que a construção do saber (epistemologia) é sempre
contextual, ou seja, acontece no meio das relações sociais. Nesse sentido, os textos evidenciam
que a epistemologia acaba por criar um abismo social (SANTOS, 2009b), especialmente através
de um pensamento não crítico no que tange a relação norte do globo (europeu) e sul do globo (no
nosso caso, brasileiro) (MALDONADO, 2009), reforçando um posicionamento inferiorizado e
subalterno de várias minorias, inclusive do negro enquanto ator social da construção do saber
(GOMES, 2009).
Boaventura Santos começa seu texto explicando que a criação de abismos epistemológicos
e sociais reproduz uma perspectiva em que o outro (outro lado da linha) pode ser excluído sem que
se quebre a lógica do “aplicável a todos”. Assim, “os outros” podem ser igualados à sub-humanos
desalmados; seu conhecimento passa à condição de magia e idolatria; sua existência passa a
permitir a correção por meio da apropriação e da violência. Lida-se com “os outros” ora
instrumentalizando seu conhecimento para a dominação, ora destruindo-o. Transforma-se “o
outro” em coisa. “Assim, a exclusão torna-se simultaneamente radical e excludente, uma vez que
seres sub-humanos não são considerados sequer candidatos à inclusão social” (SANTOS, 2009b,
p.30).
Inicialmente, este processo ocorria em uma relação colonial, hoje, porém, se revela nas
relações sociais do terrorista, do imigrante indocumentado e do refugiado. Excluídos e
juridicamente “inexistentes”, essas realidades são legisladas pela lógica apropriação/violência.
Enfrentam – assim como outras realidades sociais não expostas por Boaventura, mas igualmente
marginalizadas como os favelados e pobres brasileiros – uma nova fronteira que separa “o outro”
através da complexidade controversa de seus próprios argumentos. Os direitos humanos, a
democracia e a vida tornam-se mitigáveis para a sua “própria autoproteção”. Nasce o que
Boaventura (2009, p.37) chama de fascismo social: “um regime social de relações de poder
extremamente desiguais que concedem à parte mais forte o poder de veto sobre a vida e o modo
de vida da parte mais fraca”.
Para combater essa epistemologia, o autor propõe um pensamento pós-abissal, com
características decoloniais, que se fundamente na ecologia dos saberes, ou seja, na perspectiva de
que as formas de conhecimento são plurais e heterogêneas. Assim, é necessário assimilar a
possibilidade de co-presença desses pensamentos heterogêneos.
Maldonado (2009), nesse sentido, nos alerta para a importância do espaço enquanto tema
filosófico, fato que nos levaria à um questionamento da Europa enquanto local epistêmico
privilegiado. Demonstra que vários filósofos importantes não conseguiram deixar de reforçar a
relação de poder entre norte e sul e alimenta a necessidade de rever tais posicionamentos,
escancarando a centralidade europeia em seus pensamentos, tal como o fez Frantz Fanon.
Ao mesmo passo, Gomes (2009) tenta recuperar a epistemologia de pensadores negros
brasileiros, na tentativa de compreender suas produções, histórias, tensões e desafios e a resposta
que seus estudos sugerem para tais contextos em que se encontram. Em uma análise rica, a autora
mapeia o movimento acadêmico negro enquanto movimento de pesquisa militante; movimento
situado e localizado que questiona a posição secundária do negro na academia.
3. CRÍTICAS

Os textos selecionados apresentam um único ponto de vista: qual seja a necessidade de um


pensamento geograficamente localizado que questione os pensamentos hegemônicos europeus
colonizadores. Uma epistemologia localizada é, sem dúvidas, necessária, entretanto, não se deve
desconsiderar outras possibilidades de interlocução com outras epistemologias. Na minha opinião,
a maior contribuição dos textos é instigar uma epistemologia crítica. O pensamento científico deve
ser sempre crítico, inclusive ao abordar as relações espaciais existentes. O locus ocupado,
realmente, apresenta importância primordial na construção do saber. Cabe, porém, ao estudioso
ser crítico, até mesmo, com relação aos textos apresentados e entender que as relações sociais não
se resumem ao espaço. O neoliberalismo, não se restringe às questões de espaço, se concentra, por
vezes, na atomização dos indivíduos, independentemente de onde se encontram. Tal como o
próprio texto da Nilma Gomes apresenta, o capitalismo quer, inclusive, aumentar as diferenças.
Assim, as indagações demonstradas nos textos devem ser lidas de forma mais abrangente,
enaltecendo uma postura crítica do pesquisador, não só espacialmente crítica, mas crítica com um
todo. As subdivisões devem existir, mas devem existir criticamente, inclusive nas próprias divisões
que representam.

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