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Processo de incubação social: o caso de IncubaPop na formação de empreendedores

locais

Klícia Silva Mendonça, klicia.mendonca@alunos.ifsuldeminas.edu.br


Nayara Silva de Noronha, nayara.noronha@ifulsdeminas.edu.br
Samanta Borges Pereira, samantaborges81@gmail.com
Lucas Araujo Pereira lucas.pereira@alunos.ifsuldeminas.edu.br

Resumo
O presente artigo tem como objetivo apresentar o processo de incubação social para pequenos
empreendimentos locais, a partir das experiências percebidas na IncubaPop – Incubadora de
Negócios Populares, Sociais e Solidários, projeto de extensão desenvolvido no Instituto Federal
de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas - IFSULDEMINAS – Campus Passos. O
processo de incubação foi realizado de agosto de 2017 a julho de 2019. Participaram da
IncubaPop sete empreendimentos, sendo: um da agricultura familiar, três de artesanato e três
de quitandas artesanais. Esses setores foram escolhidos por, normalmente, estarem à margem
da literatura de empreendedorismo e de gestão, no entanto, comporem a economia local da
cidade de Passos/MG. Apenas três empreendimentos seguiram para a pós-incubação. A relação
de confiança construída durante esses dois anos de troca de experiências foi o maior ganho do
projeto. Os empreendedores locais aprenderam noções básicas de gestão, enquanto nós, da
comunidade acadêmica, tivemos que rever os modelos prontos ensinados no curso de
Administração para adaptá-los à realidade desses empreendimentos. Assim, neste artigo,
relataremos as experiências vividas no projeto IncubaPop, apresentando os desafios observados
e as possibilidades percebidas, a fim de suscitar uma reflexão sobre a construção de um processo
de incubação humanizado voltado para pequenos empreendimentos locais e com impacto
social.

Palavras-chave: incubação social; desenvolvimento local; empreendimento social; economia


solidária; impacto social.
1. Introdução
Nos anos 2000, a ideia do potencial econômico da população pobre, chamada de Base
da Pirâmide, foi difundida não só no Brasil, mas em todos os países “emergentes”. Prahalad e
Hart (2002) afirmavam que ao inserir as classes pobres no mercado de consumo, as empresas
estariam ajudando-os a melhorar suas vidas através da produção e distribuição de produtos e
serviços. Além dessa discussão, o conceito de empreendedorismo tem sido enriquecido pela
ideia de empreendedorismo social, devido ao aumento da consciência do papel que os
indivíduos podem desempenhar na sociedade e na resolução de alguns dos problemas mais
relevantes que o nosso mundo está enfrentando (ALVORD; BROWN; LETTS, 2004).
Além do empreendedorismo social, que contribui para o desenvolvimento do mercado
local de modo socialmente sustentável, outra corrente de transformação de mercados locais e
geração de renda é a economia solidária. Não há um consenso sobre o conceito de economia
solidária que tem início como um movimento social nos anos 1980 e tem como princípios a
cooperação, autogestão, ação econômica e solidariedade (MTPS, 2015). Paul Singer, referência
no campo da Economia Solidária no Brasil, questiona a competição inerente à economia
capitalista e seus efeitos sociais. Para Singer, uma economia predominantemente igualitária
entre todos e todas, dependeria de uma economia solidária, ao invés de uma economia
competitiva (SINGER, 2002).
Um caminho para a promoção do Empreendedorismo Social e da Economia Solidária é
o desenvolvimento de Incubadoras de princípios solidários e de inclusão, através de
mecanismos que estimulam a criação e o desenvolvimento de empreendimentos locais. Nesse
sentido, a pergunta que norteou esse trabalho foi: como se desenha o processo de incubação de
empreendimentos locais que promovam o desenvolvimento socioeconômico regional? Neste
contexto, foi desenvolvida a IncubaPop, uma iniciativa do IFSULDEMINAS – Campus Passos
cujo objetivo foi criar mecanismos de trabalho, que proporcionassem renda e desenvolvimento
socioeconômico regional através da aplicação de um processo de incubação social para o
desenvolvimento de empreendimentos sociais provenientes da base da pirâmide. O projeto
visou colaborar na criação de modelos alternativos de trabalho e renda, atuando no resgate da
autoestima de pessoas que trabalham à margem do mercado.
Diante disso, o objetivo deste artigo é apresentar o processo de incubação social para
pequenos empreendimentos locais, a partir da experiência da IncubaPop – Incubadora de
Negócios Populares, Sociais e Solidários - do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Sul de Minas (IFSULDEMINAS), Campus Passos. Passos é um município
localizado na mesorregião do Sul de Minas Gerais, com população de 106.290 habitantes
segundo recenseamento de 2010. Os dados de trabalho e rendimento levantados pelo IBGE em
2017 apresentaram um salário médio mensal dos trabalhadores formais de 1,9 salários mínimos,
com 23,9% da população ocupada (IBGE, 2020).
A experiência da implantação da IncubaPoP no município contou com sete
empreendimentos incubados, sendo: um de agricultura familiar, três de artesanato e três de
quitandas. Para o desenvolvimento das atividades fez-se necessário a elaboração de uma
metodologia de trabalho que, verificando as carências de cada um, seu contexto pessoal,
objetivos e dificuldades, possibilitasse a identificação ferramentas de Administração para a
resolução dos problemas que efetivos para a realidade dos incubados.
O texto está organizado em três partes fundamentais, além desta Introdução: i)
Referencial Teórico abordando as aproximações entre Empreendedorismo Social e Economia
Solidário, e o processo de Incubação Social; ii) Metodologia; e iii) Resultados. Encerra-se este
artigo apresentando as considerações finais, com os limites deste trabalho e apresentando as
Referências utilizadas no artigo.
2. Referencial Teórico
2.1. Diálogos entre empreendedorismo social e a economia solidária
Um empreendedor social tem como objetivo primordial a criação de valor social e a
melhoria do bem-estar para a sociedade como um todo (DEES, 1998), buscando, por meio do
mercado, diminuir as vulnerabilidades e as desigualdades sociais no mundo.
Nas últimas décadas o conceito de empreendedorismo tem sido modificado pela ideia
de empreendedorismo social, devido às transformações do modelo capitalista contemporâneo
(ALVORD; BROWN; LETTS, 2004; DEES, 1998). Um empreendedor social tem como
objetivo primordial a criação de valor social e a melhoria do bem-estar para a sociedade como
um todo (DEES, 1998).
O crescimento do interesse pelo conceito de empreendedorismo social ocorreu em
virtude do aumento da consciência do papel que os indivíduos podem desempenhar na
sociedade e na resolução de alguns dos problemas mais relevantes que o nosso mundo está
enfrentando. Alguns desses problemas estão relacionados à falta de acesso à serviços de
necessidades básicas, tais como educação, saúde e moradia. Impulsionada por alguns
indivíduos como Muhammad Yunus, fundador do Grameen Bank, empreendedores sociais se
tornaram mais expressivos em todo o mundo e representam, agora, uma realidade crescente e
impossível de ignorar (VANNI; BARKI; COMINI, 2015).
Há diferentes definições para o que é empreendedorismo social. Ele pode ser definido
como uma abordagem que utiliza dos princípios empresariais para encontrar soluções para
problemas sociais (DANCIN; DANCIN; MATEAR, 2010; AUSTIN; STEVENSON; WEI-
SKILLEM, 2012), ou a adoção de estratégias comerciais por organizações sem fins lucrativos,
com o objetivo de garantir sua segurança financeira (REIS, 1999; MAIR, 2011), ou ainda a
aplicação de práticas de negócios.
A principal finalidade do Empreendedorismo Social é, por meio do mercado, diminuir
as vulnerabilidades e as desigualdades sociais no mundo. De acordo com Yunus (2010), um
dos objetivos dos negócios sociais é reduzir a pobreza. Para Yunus (2007), existem dois tipos
de negócios sociais:

Ao primeiro pertencem as empresas que se concentram em oferecer um


benefício social, em vez de maximizar os lucros para os proprietários, e
investidores que objetivam benefícios sociais, como redução da pobreza,
saúde para os pobres, justiça social, sustentabilidade global, e buscam
satisfações psicológicas, emocionais e espirituais, em vez de recompensa
financeira. Ao segundo, aquelas que operam de forma bastante diferente:
maximizando os lucros das empresas pertencentes a pobres ou desfavorecidos.
Nesse caso, o benefício social é derivado do fato de que os dividendos
produzidos pela empresa irão beneficiar os pobres, ajudando-os a reduzir sua
pobreza ou mesmo dela escapar completamente (YUNUS, 2007, p. XX).

Oliveira (2019) aponta que o empreendedorismo social surge no Brasil, mais


acentuadamente na metade da década de 1990, junto ao crescimento do terceiro setor e o
desenvolvimento da política neoliberal, caracterizada principalmente pela redução dos gastos
sociais e menor interferência do Estado na dinâmica do mercado. Mendonça, Miranda e Ferraz
(2015) investigaram as novas alternativas desenvolvidas por três ONGs localizadas em
Fortaleza (CE) para o financiamento de seus projetos sociais. As ONG´s voltavam-se para
atividades de projetos ambientais sustentáveis, segurança alimentar e nutricional e pessoas com
deficiência e aprimoramento de projetos pedagógicos em escolas públicas. O surgimento das
atividades geradoras de recursos próprios nas três organizações ocorreu por meio da percepção
de uma oportunidade de mercado. A demanda pelas atividades desenvolvidas pelas ONGs e a
formação de parcerias estão entre os pontos principais a serem elencados no que se refere à
diferença de representatividade financeira entre as atividades geradoras de recursos nas ONGs
estudadas. (MENDONÇA; MIRANDA, FERRAZ, 2015).
Outra corrente de transformação de mercados locais e geração de renda é a economia
solidária. Não há um consenso sobre o conceito de economia solidária que surgiu como um
movimento social nos anos 1980, como contraproposta ao aumento do desemprego, mas que
ganhou forma econômica em 2003, com a criação da Secretaria Nacional de Economia Solidária
do Brasil (SENAES), dentro do Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS)
(SINGER, 2004). Apesar de não haver um conceito único, os princípios da economia solidária
são cooperação, autogestão, ação econômica e solidariedade (MTPS, 2015).
Paul Singer é a maior referência no campo da Economia Solidária no Brasil. O autor
questiona a competição inerente à economia capitalista e seus efeitos sociais. Para Singer, uma
predominantemente igualitária entre todos e todas, dependeria de uma economia solidária, ao
invés de uma economia competitiva (SINGER, 2002).

A solidariedade na economia só pode se realizar se ela for organizada


igualitariamente pelos que se associam para produzir, comerciar, produzir ou
poupar. A chave dessa proposta é a associação entre iguais, ao invés do
contrato entre desiguais. Na cooperativa de produção, protótipo de empresa
solidária, todos os sócios têm a mesma parcela do capital e, por decorrência,
o mesmo direito de voto em todas as decisões. Este é o seu princípio básico
(SINGER, 2002, p. 9).

A Economia Solidária se ampara em princípios de autogestão, cooperativismo,


associativismo e ajuda mútua, que se diferencia da lógica puramente capitalista e da lógica
puramente do Estado (MENEZES, 2007). Para Gaiger (2003), a economia solidária apresenta
características da economia camponesa no que diz respeito às relações sociais de produção e de
trabalho, entendendo que a economia solidária perpassa pelas práticas de autogestão e
cooperação.
Gaiger (2015) defende que os empreendimentos econômicos solidários devem ser
reputados como alternativa de geração de renda e combate à pobreza, rompendo a lógica das
desigualdades, já que que promovem o protagonismo dos pobres, buscam eficiência e lutam por
trabalho decente.
Alguns dos problemas mais relevantes que o mundo está enfrentando estão relacionados
à falta de acesso à serviços de necessidades básicas, tais como educação, saúde e moradia.
Impulsionada por alguns indivíduos, como Muhammad Yunus, fundador do Grameen Bank de
Bangladesh1, empreendedores sociais se tornaram mais expressivos em todo o mundo e
representam, agora, uma realidade crescente e impossível de ignorar (VANNI, BARKI;
COMINI, 2015).
Ao relacionar Empreendedorismo Social e Economia Solidária, Esteves (2011 apud
OLIVEIRA, 2019) ressaltou que a Economia Solidária permite que a proposta do
Empreendedorismo Social se torne um discurso político concreto. O levantamento realizado
por Medeiros et al (2017) das publicações dos eventos da ANPAD sobre Inovações Sociais e
Empreendimentos Sociais mostrou que a maioria apresenta a visão de Economia Solidária como
pano de fundo para as análises realizadas. O empreendedorismo social pauta-se na formação da

1
Muhammad Yunus e o Grameen Bank de Bangladesh ganharam o prêmio Nobel da Paz em 2006. O microcrédito
do método de Grameen é inovador pela natureza da relação social, uma relação social alternativa. O empréstimo
é feito sem caução, pois ele acredita nas pessoas, ou seja, o recurso principal é a própria pessoa. Ele também é um
crédito itinerante: é o Grameen que vai atrás das pessoas nas aldeias mais afastadas de Bangladesh. Por fim, seu
dispositivo organizado de grupo de crédito, que funciona com um controle social lateral se mostrou o melhor
mecanismo de controle (HIGGINS; NEVES, 2016).
consciência individual. A economia solidária se baseia na autogestão e na consciência coletiva,
fundamentos que distinguem e aproximam as duas correntes.

2.2. As ITCP´s e o processo de Incubação Social


As Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (ITCPs) compõem um
programa que tem como objetivo utilizar os recursos humanos e o conhecimento produzido nas
universidades para formar, qualificar e assessorar trabalhadores e trabalhadoras na construção
de atividades autogestionárias (GUIMARÃES, 2003). O objetivo fundamental de uma
incubadora solidária é oferecer assessoria técnica aos empreendimentos incubados,
desenvolvendo a autonomia dos empreendedores solidários para que possam, no futuro, atuar
independente do suporte da incubadora (GALLO; DAKUZAKU; EID, 2000).
A primeira ITCP nasceu em 1995, dentro da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ), por meio de convênio com a Financiadora de Estudo e Projetos (FINEP) e com a
Fundação Banco do Brasil (FBB) e teve como objetivo estimular a constituição de cooperativas
na Baixada Fluminense e nas comunidades vulneráveis do Rio de Janeiro (SILVA; LISBOA;
SILVA; 2014). Lima (2009) ressalta que a experiência da COOPPE-UFRJ (Instituto Alberto
Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia), também influenciou a criação do
Programa Nacional de Incubadora de Cooperativas – PRONINC e as primeiras produções
teóricas sobre o tema da autogestão como possibilidade efetiva de emancipação do trabalhador
surgiram nesse processo.
Cruz (2004) faz lembrar que a COPPE/UFRJ vinha sendo questionada sobre seu papel
na resolução dos problemas sociais brasileiros. A pergunta-chave era: para que serve a
tecnologia pesquisada pela COPPE? É nesse contexto que questionamento desta universidade
– que pode ser estendido a todas as instituições de nível superior brasileiras – que as alternativas
foram pensadas.
Guerra e Pereira (2010) afirmaram que as ITCPs são organismos fundamentais no
processo de capacitação de trabalhadores, devido a sua natureza interdisciplinar, adesão aos
princípios da economia solidária e por estarem vinculadas a Instituições de Nível Superior,
ONGs e a algumas prefeituras. Os autores apontam que as ITCPs contribuem em dupla direção:
(i) na formação de estudantes, vinculando do ensino, pesquisa e extensão e (ii) no estímulo à
geração de renda e trabalho. Na esfera das universidades, as ITCPS passaram a atuar de maneira
mais dialógica, aprendendo, ensinando e trabalhando junto às comunidades empobrecidas,
inspiradas na lógica da troca de saberes entre a comunidade universitária e a sociedade
(GUERRA; PEREIRA, 2010).
Araújo e Castro (2016) buscaram identificar os principais desafios na consolidação dos
empreendimentos solidários incubados na Incubadora Pública de Empreendimentos Populares
e Solidários de Osasco (IPEPS), dentre os quais estão a baixa escolaridade, dificuldades para
gerir os empreendimentos, competir no mercado e obter financiamentos, urgência de geração
de renda, etc. Os autores recomendaram algumas ações, visando melhor apoiar seus associados,
tais como: ajustes e aprimoramento das metodologias solidárias de avaliação; introdução de
métricas quantitativas de eficiência e monitoramento ao longo do tempo; fortalecimento de
políticas públicas que melhores as condições de acesso a crédito e financiamentos, dentre
outras.
Costa (2013) analisou a contribuição da Incubadora Tecnológica de Cooperativas
Populares da Universidade Federal de Viçosa (ITCP-UFV) para a conformação da economia
solidária no país. A ITCP-UFV foi fundada em 2003 e, ao longo de sua trajetória, executou
diversos projetos e programas, contribuindo para o desenvolvimento da economia solidária na
Zona da Mata Mineira. Os principais resultados alcançados envolveram a formação de
estudantes nesse campo, a realização de ações de extensão baseadas em pressupostos
dialógicos, desenvolvimento de pesquisas e avanços metodológicos. A principal dificuldade
apresentada refere-se à dificuldades financeiras. Os recursos para o desenvolvimento das ações
geralmente são disponibilizados anualmente, no entanto, o processo de incubação é contínuo e,
frequentemente, a escassez de recursos provoca interrupção nas atividades em curso, causando
resultados negativos (COSTA, 2013).
Freitas, Freitas e Dias (2012) apresentaram uma experiência de incubação realizada pela
ITCP/UFV junto a um projeto de assentamento de reforma agrária em Minas Gerais. Os autores
analisaram o processo de intervenção e as implicações da inversão da metodologia para o
processo de incubação, que neste caso ocorreu de maneira inversa, iniciando os trabalhos pela
formalização, que normalmente se dá na última etapa.
A metodologia adotada utilizou de demonstrações técnicas, oficinas e dinâmicas de
grupos para capacitação dos assentados em questões jurídico-administrativas. O resultado deste
processo inverso de incubação possibilitou a constituição da Associação Regional de
Cooperação Agrícola da Zona da Mata de Minas Gerais (ARCA/ZM) no assentamento “Olga
Benário” e a construção, pelos assentados, de uma estrutura organizacional adequada à
realidade de organização do assentamento.
O levantamento de Cruz (2004) sobre as ITCPs existentes até aquele momento mostrou
um total de 18 ITCPs, iniciadas entre 1996 e 2002, com 211 cooperativas incubadas ou em
processo de incubação, 11.157 postos de trabalho gerados, sendo que mais de 77% participavam
da rede de ITCPs. A variedade de produtos e serviços, passava pela indústria de transformação
(metalúrgica, têxtil, vidros etc.), extração mineral (pedras ornamentais), pesca, serviços (coleta
e seleção de lixo, limpeza, vigilância, turismo etc.) e pela pequena agricultura familiar.
Das 18 ITCPs analisadas, 83% tinham o rural como público alvo, os mesmos 83%
também trabalhavam com grupos populares como público alvo e 44% tinham os grupos médios
como público alvo. (CRUZ, 2004). Em torno de 78% das ITCPs trabalhavam com mais de um
público alvo, por isso os valores superam 100%. Cruz (2004) apresenta uma descrição desses
públicos: (a) popular: trabalhadores pobres, de baixos ingressos e pouca ou nenhuma
escolarização, em geral em situação de desemprego ou de trabalho precário; (b) médio:
trabalhadores egressos da universidade ou com algum grau de escolarização ou com experiência
qualificada no mercado formal; (c) rural: pequenos produtores rurais ou agricultores assentados
da reforma agrária.
Para Andino (2005) são fundamentalmente três as etapas pelas quais os negócios
atravessam dentro de processo de incubação: i) fase de implantação representada pelo processo
de seleção, ii) fase de crescimento e consolidação, na qual o empreendimento recebe
assessoramento administrativo necessário para seu desenvolvimento e ingresso no mercado por
seus próprios meios; iii) fase de graduação, que é a saída do negócio da incubadora.
As ITCPs são iniciativas fundamentais para fomentar os debates teóricos e práticos no
desenvolvimento de experiências solidárias, fundamentalmente de bases populares. As
trajetórias das ITCPs não são lineares e muitas mudanças ocorreram desde a fundação da
primeira ITCP, avançando nos debates metodológicos, especialmente em relação às ações mais
integradas, que envolvem temas como desenvolvimento local, tecnologia social, finanças
solidárias, moedas sociais, comunidades tradicionais etc. (COSTA, 2013).
Com o intuito de contribuir com a questão colocada por Cruz (2004) sobre qual o papel
das instituições de ensino superior na solução dos problemas da sociedade brasileira, surge a
IncubaPop, projeto de ensino-extensão-pesquisa realizado no IFSULDEMINAS – Campus
Passos, que foi desenvolvido a partir da necessidade observada de contribuir para o
desenvolvimento de empreendedores sociais da região, em especial aqueles que se encontram
na base da pirâmide, tendo como objetivo fomentar ideias de negócios com impacto social e
geração de renda para a sua população. O processo de incubação dos empreendimentos locais
será apresentado nas sessões seguintes.
3. Metodologia de pesquisa
O artigo apresenta o caso da IncubaPop por meio de uma abordagem qualitativa. O
estudo de caso, definido por Yin (2001, p.32) como “uma investigação empírica de um
fenômeno contemporâneo dentro de um contexto da vida real” demonstrou ser uma estratégia
de pesquisa adequada para a análise de uma situação local com o intuito de contribuir para a
reflexão de contextos mais amplos. A abordagem qualitativa possibilitou o aprofundamento da
compreensão da situação que cada empreendimento local se encontrava, bem como a
subjetividade de cada empreendedor social por trás de seu pequeno negócio (MINAYO;
DESLANDES; GOMES, 2009).
O projeto IncubaPop teve início em agosto de 2017 e finalizou-se em julho de 2019.
Contou, ao longo de todo seu processo, com a participação de dois professores do curso de
Administração, um aluno bolsista e quatro alunos voluntários que atuaram em diferentes
momentos ao longo desses dois anos, além do envolvimento da empresa júnior ADIF
(Assessoria e Consultoria Júnior do curso de Administração do IFSULDEMINAS - Campus
Passos). O projeto aconteceu em três etapas, a saber: (i) triagem e seleção dos
empreendimentos; (2) processo de incubação social; (3) pós-incubação. Cada uma dessas etapas
será descrita e detalhada nos resultados.

Figura 1. Etapas do processo de incubação social realizados na IncubaPop.

Fonte: elaborado pelos autores.


Os dados foram coletados por meio da observação participante nos encontros
presenciais e foram registradas em forma de ata. Também foram realizadas entrevistas semi-
estruturadas com 16 empreendimentos que se inscreveram para participar do projeto e sete
visitas locais nos espaços de trabalho dos empreendedores sociais selecionados. Nestas visitas
foram realizados registros fotográficos e depoimentos gravados em vídeo. Por meio de análise
de conteúdo (BARDIN, 2011), os dados foram descritos nas categorias pré-estabelecidas: (i)
seleção; (ii) incubação e (iii) pós-incubação. Dentro dessas categorias, foram analisadas as
ações, atividades e processos feitos, resultando em 16 etapas. O esquema abaixo condensa todo
o processo realizado ao longo do projeto IncubaPop.
O processo de incubação da IncubaPop ocorreu a partir de mediações com o setor
público, divulgação em redes sociais, entrevistas individuais, encontros de formação,
construção de modelos de gestão e, acima de tudo, o estabelecimento da relação de confiança.
Cada uma dessas etapas do processo de incubação social, bem como a análises do material
levantado ao longo desse processo será descrito abaixo.

4. Processo de incubação social: o caso da IncubaPop


A Incubadora de Negócios Populares, Sociais e Solidários – IncubaPop foi uma
iniciativa do IFSULDEMINAS – Campus Passos na tentativa de criar mecanismos de trabalho,
renda e desenvolvimento socioeconômico regional. Teve como objetivo desenvolver um
processo de incubação social para empreendimentos sociais provenientes da base da pirâmide.
O projeto se desenvolveu com a incubação de sete empreendimentos, sendo dos seguintes
setores: um de agricultura familiar, três de artesanato e três de quitandas artesanais. O projeto
contou com a participação de um aluno bolsista, três alunos de iniciação científica voluntária,
a atuação assessoria da empresa júnior ADIF do próprio curso de Administração do Campus,
além dos professores, ressaltando o caráter multidisciplinar ao envolver ensino-extensão-
pesquisa.
A fase de triagem e seleção de empreendimentos aconteceu de agosto de 2017 a
dezembro de 2017. Neste processo de seleção foi aberto para pequenos empreendimentos locais
que tivessem um caráter de negócios sociais e/ou ideias com potencial de se transformar em um
negócio com impacto social. Uma campanha de divulgação e reuniões de sensibilização nas
redes sociais e comércio local foi realizada durante os meses de agosto e setembro de 2017,
inicialmente com o apoio do governo municipal. Foram realizados 23 cadastros de interesse,
sendo que 16 deles participaram da etapa de entrevistas que aconteceram nos meses de outubro
e novembro de 2017. As entrevistas foram semiestruturadas e gravadas com a autorização dos
participantes. Ao final do processo, nove empreendimentos foram selecionados.
A etapa do processo de incubação teve duração de 10 meses, de março a dezembro de
2018. Ao todo foram realizados 15 encontros na Instituição de Ensino e uma visita ao local do
empreendimento.
Por fim, após esse período de incubação, todos os empreendimentos foram convidados
a participar da pós-incubação. A ideia da pós-incubação era o aprofundamento de uma das
áreas de negócios do empreendimento, escolhido pelo próprio empreendedor, por um período
de um mês. Assim, três empreendimentos aceitaram participar e receberam a consultoria da
empresa júnior ADIF.

4.1. Análise do processo de incubação social: potencialidades e desafios


A categoria de análise “Seleção” se refere à primeira fase do processo de incubação
social da IncubaPop. Organizamos as atividades, encontros e processos em sete ações e
analisamos as potencialidades e os desafios encontrados em cada uma delas. Estas ações não
foram sequenciais, sendo que algumas aconteceram de modo concomitante a outras, conforme
será descrito na sequência.
A primeira ação foi a “Mediação com o setor público”. Havia uma relação informal
com a gestão municipal na tentativa de estabelecer uma parceria entre a Prefeitura e o
IFSULDEMINAS para a reabertura do Mercado Municipal da cidade. A Prefeitura Municipal
de Passos havia publicado o Regimento Interno do Mercado Municipal por meio do Decreto
378 de 7 de outubro de 2013, após uma reforma de revitalização do edifício. No entanto, até
2017, os espaços do mercado ainda não haviam sido ocupados pelo comércio local. O espaço
era subutilizado para a realização de eventos específicos e não para sua função de ser um
“equipamento coletivo constituído por um conjunto de instalações e de infraestrutura, integrada
por diversas unidades comerciais destinadas ao exercício do comércio e de serviços” (PASSOS,
2013).
A proposta era que a instalação do processo de incubação social no espaço do Mercado
Municipal fortalecesse a política pública de Economia Solidária local. A princípio houve
interesse da Prefeitura em estreitar esses laços, com diversas reuniões que atrasaram o
cronograma do projeto. O Prefeito chegou a participar e discursar numa ação coletiva que
envolveu o munícipio, comunidade local e acadêmica no espaço do próprio Mercado Municipal
(ATA, 16/08/2017). Houve um chamamento público divulgando o projeto e movimentando a
comunidade local em torno de uma possível reabertura do Mercado Municipal e haviam
indicativos que sinalizavam que o convênio seria realizado.
O “cadastro de interesse” podia ser preenchido de modo eletrônico pelo site do
IFSULDEMINAS ou pela página do Facebook do projeto e, presencialmente, no Campus da
Instituição de Ensino ou na Secretaria Municipal de Assistência Social. Foram cadastrados 23
empreendimentos interessados, a maioria feita presencialmente na Secretaria Municipal de
Assistência Social devido ao interesse em ocupar o espaço físico do Mercado.
Nesse mesmo período de cadastro de interesse, como marco simbólico do projeto, foi
realizada uma feira de agricultura familiar, artesanato e comidas e bebidas locais com intuito
de chamar a atenção da população para a reabertura do espaço e apresentação do projeto (ATA
30/09/2017). O evento ficou conhecido como Ocupa Mercadão, porque, inicialmente, a
proposta era a realização da feira dentro do espaço do Mercado. No entanto, as burocracias da
gestão municipal e as disputas entre diferentes Secretarias dificultaram a realização do evento.
Por isso, a feira acabou sendo realizada do lado de fora, na rua lateral ao mercado, tornando-se
assim um “Ato de ocupação do Mercado”. Tanto o cadastro de interesse, quanto o Ocupa
Mercadão foram divulgadas pelo Facebook e as “Redes sociais” contribuíram para a divulgação
do projeto em si como também para publicação de conteúdos formadores, como vídeos
explicando conceitos de Economia Solidária, Empreendedorismo Social e outros. No entanto,
as redes sociais não se mostraram efetivas para o público-alvo do projeto, pois os feirantes e os
pequenos empreendimentos não as utilizavam.
Após esse evento, as relações com a gestão municipal foram afrouxando. Devido à
disputas políticas locais, não foi firmada a parceria entre a Prefeitura e a Instituição de Ensino
e o Mercado Municipal de Passos continua sendo um espaço subutilizado pela comunidade,
com eventos esporádicos e sem a abertura contínua e diária do comércio local. Após o declínio
de participação do governo municipal, a IncubaPop realizou os encontros no próprio campus.
A primeira ação interna foi a realização de “Entrevistas individuais” com todos os
empreendimentos que manifestaram interesse pelo cadastro anterior. Dos 23 cadastrados, 16
empreendedores participaram das entrevistas, que foram realizadas em dupla pelos integrantes
do projeto. Mesmo sendo um momento para conhecer pessoalmente as histórias dos
empreendedores, como foram realizadas entrevistas semiestruturadas, parece que alguns
empreendedores sentiram o peso da formalidade da entrevista e ficaram tímidos ao contar-nos
sua história.
Os empreendedores selecionados para participar do processo de incubação se
conheceram e se apresentaram em um “Encontro inicial”, no modelo de roda de conversa. Foi
um momento importante para o estabelecimento de laços iniciais e, por espontânea vontade,
alguns dos participantes trouxeram suas quitandas e alimentos para um café compartilhado o
que quebrou a impressão de formalidade que tinha sido gerada nas entrevistas. Essa prática de
levar para cada encontro algo para o café tornou-se rotina e foi um elemento importante para a
construção de laços fortes. Dos nove empreendimentos selecionados, dois deles desistiram por
não ter mais a possibilidade de utilização do espaço do Mercado Municipal (ATA 15/12/2017).
O quadro abaixo sintetiza as etapas que foram realizadas na fase de “Seleção”
apresentando as potencialidades e desafios de cada uma.

Quadro 1: potencialidades e desafios na fase de “Seleção” da IncubaPop

Ações Potencialidades Desafios


Mediação com * Possibilidade de desenvolvimento
*Articulação política com
setor público de política pública municipal;
diferentes atores;
*Abrangência maior do projeto;
*Interesses divergentes entre a
*Oportunidade de abarcar outros
gestão municipal e o escopo do
setores e empreendimentos não
projeto.
contemplados.
Cadastro de * Envolvimento com a Secretaria * Formulário online foi pouco
interesse de Assistência Social para a efetivo, apenas empreendedores
realização do cadastro de interesse; mais jovens o utilizaram;
*Visita dos empreendedores ao * Dados incompletos ou errados
Campus para realização do cadastro pelo cadastro feito à mão.
pessoalmente.
Ato de * Possibilidade de ter espaço físico * Excesso de burocracias por parte
Ocupação do para a comercialização dos da gestão municipal na
Mercado empreendimentos; disponibilização do espaço;
* Visibilidade ao projeto; * Interesses divergentes entre a
* Reuniões de sensibilização; gestão municipal e o escopo do
*Ato simbólico de ocupação e projeto;
movimentação social.
* Atraso no cronograma do projeto.
Redes Sociais * Divulgação do projeto; * Público-alvo do projeto não tinha
(Facebook) *Produção de conteúdo para familiaridade com as redes sociais;
formação sobre negócios;
*Engajamento de diferentes
usuários da rede social.
Entrevistas * Conhecimento sobre os * As entrevistas, ainda que abertas,
individuais empreendedores e seus apresentaram certa formalidade que
empreendimentos de modo mais era incompatível com o contexto
subjetivo e aprofundado; dos empreendedores.

Encontro inicial * Apresentação do projeto, dos *Desistência de alguns


empreendedores e de seus empreendedores após as
empreendimentos nos setores de negociações do espaço público do
agricultura familiar, artesanato e Mercado Municipal terem sido
quitandas artesanais. abandonadas.
* Quebra da formalidade inicial das
entrevistas;
* Estabelecimento de laços.
Fonte: Elaborado pelos autores.
A partir da experiência da IncubaPop e para o desenvolvimento de uma proposta
metodologia de incubação social, as atividades que demonstram-se ser efetivas no período de
“Seleção” foram: cadastro de interesse, entrevistas individuais e encontro presencial com café
compartilhado. As demais etapas, ainda que importantes para este caso, não precisariam
acontecer em um novo processo de incubação social.
Já na análise da categoria “Incubação” apresentamos diferentes atividades, ações,
encontros e processos que podem ser entendidos como o processo de incubação em si. Ao todo,
foram realizados 15 encontros presenciais no campus do IFSULDEMINAS e esses encontros
foram sistematizados em nove ações as quais analisamos as potencialidades e os desafios
encontrados em cada uma delas, conforme exposto logo abaixo. A ideia inicial era a realização
de encontros de formação e atividades práticas de gestão.
Num segundo momento, os empreendedores apresentaram seus “sonhos a serem
realizados”, utilizando como metodologia a análise SWOT e o painel semântico. Também
foram realizadas visitas nos locais de produção nos sete empreendimentos, utilizando
metodologias de observação e participação ativa dos alunos membros do projeto, resultando
numa espécie de diagnóstico organizacional de cada empreendimento. A partir da análise
SWOT, do painel semântico e do diagnóstico organizacional, foram identificadas as demandas
específicas de cada participante. Também foram realizadas formações sobre principais
dificuldades de gestão identificadas, tais como áreas de finanças, estoque, regulamentações e
relacionamento com o cliente, no entanto, foi percebido um descompasso de linguagem.
Os empreendedores não eram familiarizados com conceitos básicos de gestão, nem
ferramentas tecnológicas básicas, como por exemplo, planilhas de excel. Esse foi o primeiro
desafio: simplificar modelos de gestão básicos para uma linguagem acessível para esses
empreendimentos. Assim, foram elaborados planners, planilhas e um diário impresso para que
cada empreendimento tomasse nota de seu processo de produção e finanças de modo a tentar
construir uma rotina de controle e gestão.
Outro ponto a ser destacado foi a construção de uma narrativa da marca a partir das
histórias de vida desses empreendedores. O processo de escuta e valorização da memória de
uma vida aparentemente simples e comum em uma marca contribuiu para a elevação de
autoestima desses empreendedores.
Na categoria “Incubação” que pode ser considerado o processo de incubação social em
si, organizamos todas as atividades, ações, encontros e processos em nove subcategorias.
Durante o início dos encontros de formação, tentou-se aplicar integralmente técnicas utilizadas
em consultorias estratégicas de gestão tais como: i) análise SWOT, ferramenta utilizada na
análise dos ambientes interno e externo por meio do levantamento de forças, fraquezas,
oportunidades e ameaças, ii) cinco forças de Porter, ferramenta utilizada na análise do mercado
através da observação da força exercida por cinco atores importantes que influenciam as
organizações, identificados como clientes, fornecedores, concorrentes, novos entrantes e
substitutos.
Assim, após as visitas, foram elaborados os Diagnósticos Organizacionais de cada
empreendimento, sendo observadas questões como os produtos, realizando a análise do
portfólio e diferenciação; análise de custos fixos e variáveis; preço e valor; observação do
processo, espaço e equipamentos, pessoas envolvidas, recursos disponíveis, conhecimento e
formação. Além disso, foi coletada a história e trajetória, que foi importante para a elaboração
da narrativa de cada empreendimento, ponto fundamental para o desenvolvimento posterior das
marcas.
A partir do diagnóstico realizado, foram percebidas as seguintes demandas: i) criação
da marca, envolvendo a elaboração visual e gráfica, logotipos e slogan; ii) marketing,
englobando técnicas de comunicação, relacionamento com o cliente e propaganda; iii) análise
de fornecedores disponíveis na escolha das matérias-primas; iv) identificação de possíveis
parcerias tanto na produção quanto na distribuição dos produtos; v) análise da aceitação do
produto e diversificação do portfólio; vi) controles de estoques, caixa, custos e precificação;
vii) pesquisa de mercado para a realização de benchmarking e identificação das melhores
práticas, principais concorrentes e parcela de clientes identificados.
Como ferramentas de Incubação, foram utilizadas a análise SWOT ou FOFA, para
levantamento das forças, fraquezas, ameaças e oportunidades; o Painel Semântico, com a
construção da representação de seus sonhos; as Visitas aos Empreendimentos para levantar a
história dos empreendedores, o processo produtivo, a cartela de produtos, clientes e recursos; o
Diagnóstico Organizacional, estruturando as demandas de cada empreendedor e apresentando
a proposta das atividades a serem desenvolvidas no projeto; a Identidade/Marca, construindo
narrativas de cada empreendimento e a identidade organizacional/marca; as Formações sobre
diferentes temas relacionais à gestão dos empreendimentos; a Conversa/Escuta, convidando
os empreendedores a conversar com os alunos participantes do projeto, de forma
individualizada e personalizada de acordo com as demandas verificadas para cada
empreendimento; a elaboração dos Planners de organização e controle sobre recursos, vendas,
custos, gastos, investimentos, lucros, clientes e estoque de cada empreendimento; as Reuniões
por Setor, quando os os empreendedores foram divididos por grupos de acordo com o tipo de
produto e empreendimento, tais como o setor de alimentação, artesanato e agricultura.
Os encontros passaram a ser realizados para a execução de consultorias seguindo as
temáticas identificadas como demanda, implementando ferramentas de gestão e discussão de
conteúdos da área de administração. As ações/ferramentas desenvolvidas e aplicadas, a
potencialidade, os desafios e a eficácia de cada dessas ações foram sintetizadas no quadro 2.

Quadro 2: potencialidades e desafios na fase de “Incubação” da IncubaPop


Ações Potencialidade Desafios
Análise SWOT * A ferramenta SWOT é muito * A aplicação da ferramenta não foi
(Planejamento popular nos processos de efetiva devido à impessoalidade e
estratégico) consultorias para planejamento objetividade, que exigia dos
estratégico. empreendedores um nível de
*Os alunos participantes do projeto planejamento e gestão
possuíam familiaridade com a incompatíveis com a realidade de
ferramenta SWOT. seus empreendimentos.
* Levantamento de informações
importantes sobre os ambiente
interno e externo dos
empreendimentos.
Sonho * Tal atividade possibilitou maior
(Painel pessoalidade já que os *Alguns empreendedores
semântico) empreendedores conseguiram apresentaram alto nível de
expressar seus sonhos, dificuldades subjetividade na elaboração do
e objetivos de forma subjetiva e painel semântico, exigindo dos
simples, facilitando a aproximação alunos participantes do projeto a
dos alunos participantes e dos elaboração de ferramentas distintas
empreendedores. das propostas acadêmicas e formais
* Substituição da formalidade pela da área de Administração.
pessoalidade.
Visitas nas * Construção de uma relação de * Dificuldade de estruturar as
casas/locais de confiança entre os empreendedores informações a serem coletadas.
produção
e os alunos participantes do
projeto.
* Inserção dos alunos na realidade
dos empreendedores.
Diagnóstico * Alinhamento das dificuldades e * Criação de alta expectativa por
organizacional demandas dos empreendedores parte dos empreendedores quanto
com as propostas de atividades dos às ações dos alunos, sem que
alunos do projeto. conhecessem a real importância de
* Estrutura individualizada das seus próprios esforços, dedicação e
atividades para cada comprometimento com o processo
empreendimento de incubação
Narrativas *Conscientização dos * Frustração dos empreendedores
pessoas e empreendedores na sua capacidade ao perceberem que nenhuma
construção da de evolução consultoria ou ferramenta de gestão
marca * Identificação dos é completamente eficiente na
empreendedores com a narrativa, a resolução de todos os problemas
identidade e a marca elaboradas.
* Consolidação da identidade
construída por cada empreendedor
durante o processo de incubação
Formações de * Possibilidade de serem sanadas * Apesar de as formações
gestão e dúvidas relacionadas à gestão dos abordarem temas relevantes para os
princípios empreendimentos empreendimentos, foi observado
sociais e baixo nível de apropriação das
solidários informações por parte dos
empreendedores
Escuta atenta * Estreitamento da relação de * Necessidade de reorganizar o
confiança e aumento da abertura de cronograma do projeto
cada empreendedor para
compartilhar informações e
engajar-se na realização das
atividades sugeridas pelos alunos
do projeto
Planners * Oferta de uma ferramenta de * Pouca aceitação por parte dos
(Planejamento gestão simples com o objetivo de empreendedores às atividades de
estratégico) estimular a familiaridade dos preenchimento e análise das
empreendedores com processos de informações.
gestão de recursos * Dificuldade dos empreendedores
perceberem os objetivos e possíveis
resultados das atividades de
planejamento
Reuniões por * Maior entrosamento entre os * Diferentes níveis em
setores empreendedores de um mesmo empreendedores de um mesmo
setor. setor.
* Facilidade de organizar as *Atenção dispersa dos
atividades demandadas de acordo empreendedores durante as
com cada setor reuniões
Fonte: Elaborado pelos autores.
Entretanto, o que se verificou foi que a efetividade e a prática das atividades propostas
aos empreendedores aumentavam à medida que os encontros se tornavam não só um espaço de
troca de conteúdo de formação, mas também momentos de escuta, onde os empreendedores
podiam se perceber reconhecidos. Ao final do projeto, os empreendedores receberam materiais
gráficos com a marca, tais como banner, cartões de visitas e embalagem, além de utilizarem a
narrativa de suas histórias pessoais e profissionais como diferencial competitivo.
O estreitamento entre os empreendedores selecionados e os membros participantes do
projeto foi de fundamental importância dentro de um processo de incubação, já que é necessário
que os orientados sintam confiança e espaço de diálogo para com os mentores. A observação
participante também possibilitou tal relação mais interativa entre as partes, visto que propiciou
aos encontros periódicos um contato direto dos discentes para com os incubados, tornando mais
efetiva a resposta ao processo de incubação por parte dos empreendimentos, proporcionando,
ainda, aos discentes, uma oportunidade de maior envolvimento no processo e desenvolvimento
das atividades.
Foi desenvolvida, ainda, identidade e marca de cada empreendimento, a partir da
construção da narrativa pessoal de cada empreendedor, sendo utilizadas na elaboração de
etiquetas, rótulos e criação de mídias sociais e de comunicação. Todos os encontros e atividades
realizadas foram gratuitas aos empreendedores e contaram com a participação voluntária dos
alunos membros do projeto.
Por fim, na categoria de “Pós-incubação”, apenas uma ação foi realizada com três dos
empreendedores que desejaram continuar no processo. Com o número reduzido de
empreendimentos, foi possível realizar um “Atendimento individualizado” a partir de uma
demanda específica de cada negócio. Nesta etapa, o projeto contou com a colaboração da
empresa júnior ADIF que fez quatro encontros durante o período de um mês com cada um dos
empreendimentos, propondo soluções de gestão em um setor escolhido pelo próprio
empreendedor. Os três pós-incubados escolheram desenvolver ferramentas de marketing
digital, principalmente, a utilização das redes sociais e o desenvolvimento de um catálogo de
produtos.
O empreendimento de quitanda artesanal – bolos – solicitou que a ADIF auxiliasse na
criação de uma página no Instagram para catálogo de seus bolos, marketing promocional e
também a organização da rede social para que os clientes pudessem fazer seus pedidos
diretamente por lá. O resultado foi efetivo e a empreendedora passou a utilizar a rede social
como principal canal de divulgação e vendas, anteriormente feito na porta de sua casa, por meio
de um catálogo de fotos impressas dos bolos (ATAS 08/03/2019; 29/03/2019).
O empreendimento de artesanato – bordados – também teve como demanda a utilização
de redes sociais para a exposição de suas peças bordadas. Foi criada uma página para o
empreendimento, porém, foi produzido pouco conteúdo, devido ao perfil do grupo de mulheres
que compõem o empreendimento – mulheres, entre 40 e 70 anos, moradoras de uma cidade
com menos de 5 mil habitantes, cuja internet não é elemento tão presente no cotidiano. A
demanda delas foi atendida, porém, em nossa avaliação, pouco efetiva (ATA 25/06/2019).
O empreendimento de artesanato – objetos ecológicos produzidos por folha de
bananeira – teve como demanda o desenvolvimento de um catálogo de produtos online e a
avaliação de plataformas coletivas de e-commerce (ATA 24/05/2019). A ausência em alguns
encontros prejudicou o resultado final, no entanto, uma versão inicial do catálogo online foi
finalizada e foi feita uma pesquisa sobre plataformas de vendas online.
O quadro 3 sintetiza a etapa que foram realizadas na fase de “Pós-incubação”
apresentando as potencialidades e desafios encontrados nesse período do projeto.
Quadro 3: potencialidades e desafios na fase de “Pós-incubação” da IncubaPop

Ações Potencialidade Desafios


Atendimento * Atendimento de uma demanda * Número reduzido de encontros;
individualizado específica; * Ausência em algum encontro
dificultava a finalização do
trabalho.
Fonte: Elaborado pelos autores.

O modelo de atuação no período de “Pós-incubação” foi interessante ao dar autonomia


para os empreendedores escolherem que setor e o tipo de auxílio de gestão que ele desejava e
por envolver a empresa júnior da Instituição de Ensino. Essa troca entre os alunos de um curso
que é construído por discursos e modelos de “sucesso” com a realidade de pequenos
empreendedores à margem desse perfil competitivo de negócios foi a grande contribuição do
projeto.
Os empreendedores que participaram da IncubaPop, não têm modelos de negócios
inovadores, com grande potencial de impacto, geradores de receitas lucrativas. São
empreendimentos que flertam com um suposto empreendedorismo de necessidade, mas que vai
além: são empreendimentos em que as histórias de vidas de seus empreendedores estão
intimamente ligadas ao processo produtivo que envolve criatividade e/ou regionalidade. São
negócios marginalizados nesse modelo de mercado do “sucesso”, mas que ao nível micro, tem
é extremamente relevante ao resgatar a memória local e a autoestima dessas pessoas.

5. Considerações Finais
A IncubaPop cumpriu seu objetivo de desenvolver um processo de incubação, obtendo
como principal resultado a conscientização dos empreendedores da sua capacidade de evolução,
sua importância e potencial de transformação como ator social, tomando a realização pessoal e
autoafirmação de suas narrativas pessoais como diferencial competitivo. Verificou-se nos
membros do projeto, a capacidade de observar as particularidades e se adaptarem à realidade
do outro, ao invés de replicar ferramentas e metodologias prontas, o que possibilitou um
crescimento não só acadêmico ao buscarem as ferramentas administrativas, mas também
desenvolvimento pessoal e humano ao se colocarem em uma posição de escuta e respeito.
A experiência do projeto IncubaPop demonstrou grande potencial de impacto positivo
em seu desenvolvimento, podendo ser reaplicada desde que observada a importância de se
perceber a individualidade de cada empreendedor participante do projeto, buscando
metodologias que sejam coerentes às diferentes realidades de cada um. A adequação da
linguagem utilizada no desenvolvimento das atividades também foi um ponto importante já que
possibilitou a comunicação e a pessoalidade das ferramentas que a área da Administração há
muito tempo desenvolve.
Dessa forma, conclui-se que a metodologia se desenvolveu através da percepção das
particularidades de cada empreendimento e a conscientização de que os resultados de um
processo é muito mais do que a monetização ou dados quantitativos de sucesso pautados nos
conceitos da gestão de negócios convencionais, mas que, em se tratando de empreendimentos
sociais, resultados como a autoafirmação e realização pessoal são muito importantes.
Em 2019, o projeto foi concluído e não foram abertos outro processo de incubação em
seguida para que fosse desenho melhor uma metodologia de incubação social alinhada com a
realidade. Pretende-se, futuramente, abrir novamente outra chamada de incubação seguindo os
processos que tiveram êxito aqui apresentados. A experiência de implantação da IncubaPop e
a formação dos empreendedores em toda a sua completude, se mostrou de grande relevância
tanto por seu potencial de transformação verificado na vivência dos empreendedores como na
complementação da formação dos alunos participantes, uma vez que foi possível o
desenvolvimento de competências não só acadêmicas como pessoais e humanas.

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