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Cozinhas solares: Estratégias de disseminação efectiva e potencialidades

Celestino Ruivo
cruivo@ualg.pt
Escola Superior de Tecnología, U. Algarve, Faro, Portugal

Pedro Serrano R.
pedro.serrano@usm.cl
Escuela de Arquitectura, UTFSM, Chile

Resumo

As cozinhas solares são equipamentos que permitem cozinhar alimentos com calor
resultante do aproveitamento da energia solar. Existem vários modelos com diferente
constituição, tipologia, desempenho e aplicação. Os modelos mais comuns e mais simples
não tiram partido da acumulação de calor, isto é, apenas permitem cozinhar os alimentos
nas horas em que há sol. Estes modelos são mais aplicados no contexto doméstico e
normalmente são classificados em cozinhas do tipo painel, tipo caixa ou tipo parabólico.
As cozinhas solares são uma interessante alternativa aos equipamentos de cocção
utilizados na cozinha tradicional permitindo confeccionar vários pratos lentamente ou tão
rapidamente como no fogão a gás. O tempo de cocção depende obviamente das condições
climatéricas, do modelo de cozinha solar, do tipo e da quantidade dos alimentos a
confeccionar e do modo como vão ser confeccionados.
Existem várias instituições actuando em várias partes do mundo, sobretudo nos países
sub-desenvolvidos, nomeadamente ONG’s e redes envolvendo pessoas de diferentes
países com vista à divulgação das cozinhas solares em maior escala.
O Algarve e o Alentejo são regiões da Europa em que existe um grande potencial
energético solar que urge tirar partido em várias aplicações à escala doméstica e também
à escala industrial. Com este grande potencial energético no Algarve e no Alentejo é pois
possível a muitas famílias cozinhar os seus alimentos em mais de 90% dos dias do ano.
Tendo em conta alguns exemplos reais noutros pontos do globo, nomeadamente no Chile
e na Índia, revela-se também ser muito interessante a integração das cozinhas das escolas
e das fábricas e também a criação de restaurantes solares.

Introdução

A cocção de alimentos recorrendo à radiação solar remonta a um passado distante,


nomeadamente o cozimento de pão em rochas aquecidas pelo sol no deserto pelos
essénios, uma seita primitiva dos Judeus. O primeiro modelo de cozinha solar foi
elaborado por Horace de Saussure, em 1767, tendo este conseguido atingir cerca de 90ºC
ao cozinhar fruta numa caixa rudimentar. Este naturalista suíço é considerado o pioneiro
da cozinha solar. O Padre Himalaya, padre português, inventou no início do século XX
um forno solar com uma grande superfície reflectora parabólica, tendo conseguido fundir
granito e basalto.
Em 1987 foi criada a organização internacional sem fins lucrativos Solar Cookers
International (SCI) com objectivo de promover a difusão do cozimento dos alimentos
com energia solar, divulgando os seus benefícios económicos, humanitários e ambientais
(www.solarcooking.org). Mais recentemente, na sequência da conferência internacional
realizada em Julho de 2006 em Granada-Espanha foi criada no final do ano 2006 a Solar
Cookers International Association (SCIA).
Apesar dos trabalhos de investigação e de desenvolvimento sobre o aproveitamento da
energia solar em aplicações tais como a destilação da água, a secagem e a cocção de
alimentos, os equipamentos utilizados para estes fins, “solar-domésticos” são pouco
conhecidos e utilizados somente por um número muito reduzido de pessoas. A maioria
destes equipamentos são concebidos para comunidades de países em desenvolvimento,
sendo distribuídos principalmente em projectos de cooperação levados a cabo em
comunidades de baixos recursos económicos ou nas comunidades que utilizam lenha
habitualmente em regiões onde esta se está a torna um recurso cada vez mais escasso.
Também são utilizados em pequenas comunidades e grupos de pessoas preocupadas com
a busca de soluções mais ecológicas.

Radiação Solar e a cocção de alimentos em cozinhas solares

O sol é uma estrela com um diâmetro aproximado de 1391000 km e está a 149000000 km


de distância da terra. O diâmetro aproximado da terra é apenas de 12000 km. O sol emite
radiação em todas as direcções, sendo apenas uma pequeníssima parte interceptada pela
terra, mas se 1% desta pequena parcela fosse aproveitada seria possível superar muitas
das necessidades energéticas associadas à actividade humana actual. Fora da camada
atmosférica, a radiação solar é constante e é normalmente caracterizada pela constante
solar cujo valor é de 1.340 W.m-2. Esta intensidade da radiação reduz-se ao atravessar a
atmosfera devido aos efeitos de reflexão, refracção e de absorção, chegando à superfície
terrestre um valor varia de acordo com o local, hora, mês, nebulosidade e composição da
atmosfera. O valor máximo é da ordem de 1000 W.m-2. Os fogões convencionais
propiciam potências da ordem de 1800 W, correspondendo à intensidade de energia solar
incidente numa superfície perpendicular ao raios solares com de 2 m2. Para a cocção de
alimentos não é necessário uma potência tão elevada, desde que se opte por cozinhar
durante um período maior. A potência proporcionada pelos raios solares, quando estes
incidem directamente no recipiente, sendo reduzida permite aquecer mas não cozinhar os
alimentos. É por este motivo que é necessário encontrar maneira de fornecer ao recipiente
energia com um nível mínimo de potência de aquecimento mínimo. Esta é precisamente a
função de uma cozinha solar em que os alimentos podem ser cozinhados utilizando
instantaneamente a radiação solar concentrada no recipiente ou mais tarde através da
utilização da energia acumulada. As cozinhas solares normalmente também são
designadas por fornos solares ou até mesmo por fogões solares.
A concentração da radiação solar consiste em redireccionar os raios solares para uma
zona com menor área do que a área da superfície receptora. Isto consegue-se utilizando
materiais de alta reflectividade de que é exemplo os espelho, chapa de alumínio ou
plástico metalizado. A energia reflectida para a zona de cocção é tanto maior quando
maior for a reflectividade e a área da superfície receptora da radiação solar. Na zona de
trabalho devem utilizar-se recipientes de cor escura para que as temperaturas alcançadas
permitam cozinhar os alimentos. Para conseguir a concentração dos raios solares na zona
de cocção é necessário conhecer os fundamentos básicos de óptica. A reflexão e
concentração dos raios solares numa cozinha solar consegue-se com superfícies
reflectoras curvas e planas. Existem certos modelos que combinam os dois tipos de
superfícies reflectoras. As superfícies curvas mais comuns são as parabólicas, mas
poderão ser cónicas ou outras superfícies irregulares.
A superfície parabólica, figura 1. a), é um paraboloide em que a concentração da radiação
se processa no seu foco, quando a superfície reflectora côncava do paraboloide está
perfeitamente orientada para o sol. A concentração da radiação solar reflectida no foco
depende da área da captação mas também da qualidade da superfície reflectora.
As superfícies reflectoras planas, figura 1. b) são planos de material reflector que alteram
a direcção dos raios solares para uma área determinada na qual deve estar a zona de
cocção. O efeito concentrador de radiação ocorrerá quando se combinam várias
superfícies reflectoras reflectindo os raios solares para a mesma zona. Nestas
configurações, a área de captação corresponde à projecção da superfície reflectora sobre
um plano perpendicular aos raios solares.

a) b)
Fig. 1 – Superfície reflectora: a) parabólica e b) plana
A radiação solar reflectida nas superfícies reflectoras diz respeito apenas à parcela de
radiação solar directa, não contemplando assim a componente difusa, havendo por isso
necessidade da sua re-orientação após períodos de 15 a 20 minutos. A este respeito, as
configurações parabólicas são as mais sensíveis e por isso alguns sistemas parabólicos
mais efectivos integram um dispositivo mecânico para fazer a re-orientação.
A forma de utilizar estas superfícies reflectoras para cozinhar consiste em colocar o
recipiente de cocção na zona onde se obtém a concentração da radiação. O recipiente
deve ser um material em que a superfície externa absorva eficientemente a radiação solar
e que transmita eficazmente o calor absorvido aos alimentos.
O funcionamento das cozinhas solares mais comuns rege-se por princípios físicos
básicos. A radiação solar incidente na superfície reflectora é reflectida para a zona de
cocção de modo a obter-se uma elevada concentração da radiação no recipiente com os
alimentos. A superfície exterior do recipiente deve ser preferencialmente preta para que a
eficiência na absorção da radiação incidente seja elevada. Obtém-se melhores resultados
em recipientes de metal escuros, rasos e finos enquanto as tampas, pretas ou
transparentes, devem assentar bem para que as perdas de calor e de vapor sejam
pequenas. É imprescindível dispor de um lugar com boa exposição solar durante várias
horas, sendo a eficiência do processo de cocção melhor em locais abrigados do vento.
Existem actualmente três tipos de cozinhas solares, figura 2: cozinha do tipo parabólico,
cozinha do do tipo caixa e cozinha tipo painel.

a) b) c)
Fig. 2 – Cozinha solar: a) parabólica, b) caixa e c) painel

As cozinhas solares do tipo parabólico são constituídas por uma superfície parabólica de
revoluçao altamente reflectora que quando bem orientada com o sol concentra a radiação
solar reflectida no seu foco, zona onde se coloca o recipiente com os alimentos. A
elevada concentração da radiação obtida permite cozinhar tão rapidamente como nos
fogões convencionais. No entanto, também possui desvantagens das quais se destacam a
necessidade de re-orientação cada 15 minutos e a possibilidade de causar queimaduras e
ferimentos nos olhos. Por outro lado caso haja material de fácil ignição por perto e a
superfície parabólica não esteja devidamente arrumada ou posicionada com a parte
convexa voltada para cima existe a possibilidade de causar incêndio.
A cozinha solar do tipo caixa é basicamente constituída por uma caixa com uma
cobertura transparente, para criar o efeito de estufa, e por uma ou mais abas reflectoras
para aumentar a concentração da radiação solar no interior da caixa. Possui a vantagem
de se poder cozinhar grandes quantidades de alimento lentamente e de forma uniforme. A
luz solar, directa e reflectida, entra no interior da caixa através de uma superfície de vidro
ou plástico transparente e transforma-se em energia térmica ao ser absorvida pelo
recipiente absorvente. Apesar da potência de aquecimento efectivamente transmitida aos
alimentos ser normalmente menor do que nas cozinhas tipo parabólico, conseguem-se
bons resultados sem re-orientar a cozinha durante o processo de cocção.
As cozinhas solares do tipo painel são de simples, fácil e rápida concepção. Tipicamente
são constituídas por uma ou mais superfícies reflectoras que reflectem a luz solar
incidente para o recipiente com a comida. Este recipiente deve estar colocado no interior
de um saco de plástico ou envolvido com peças de vidro de forma a que seja criado o
efeito de estufa, figura 3. O efeito de estufa para além de melhorar o rendimento do
processo em termos de eficiência energética devido à entrada fácil da radiação solar na
estufa e à atenuação das perdas por radiação e por convecção permite aumentar a eficácia
do processo uma vez que assim consegue-se atingir valores de temperatura no interior do
recipiente suficientes para confeccionar os alimentos. Os recipientes recomendados
devem também ter a sua superfície exterior preta para que a eficiência e a eficácia do
processo sejam as melhores.
a) b)
Fig. 3 – Efeito de estufa: a) saco de plástico transparente, b) dispositivo em vidro

O tempo do processo de cocção numa cozinha solar depende de vários parâmetros.


Relativamente às condições atmosféricas, a nebulosidade é o parâmetro mais influente no
sucesso ou insucesso do processo de cocção. Quanto menor for a velocidade do vento e
maior for a temperatura ambiente melhor menores a eficiência do processo é melhor uma
vez que nos lugares abrigados as perdas de calor são menores.
Os menores tempos obtêm-se normalmente nas cozinhas do tipo parabólico, mas o risco
de a comida ficar queimada, por exemplo por distracção, é elevado devido ao facto de
serem relativamente potentes. Estas cozinhas apresentam bom desempenho mesmo com
recipientes que não sejam escuros e sem o dispositivo para criar o efeito de estufa.
Qualquer dos modos quando existe alguma nebulosidade ou vento forte pode ser
importante tirar partido do efeito de estufa e utilizar um recipiente escuro para se
conseguir um bom resultado.
As cozinhas do tipo painel são normalmente as mais lentas, uma vez que são
relativamente pouco potentes. Na maior parte dos casos destas cozinhas não existe o risco
de a comida ficar queimada, mas por outro lado quando as condições climatéricas não são
as melhores, por exemplo em dias com nebulosidade intermitente, poder-se-á não
conseguir cozinhar a comida. Quando o utilizador pretende fazer outra actividade
enquanto a comida está a ser confeccionada com estas condições climatéricas instáveis, é
preferível optar por uma cozinha solar do tipo caixa com elevado rendimento e contendo
no seu interior elementos que permitam acumular calor, por exemplo pedras, para que
nos instantes em que a radiação incidente é reduzida o calor acumulado seja libertado e o
processo de cocção continue a ser alimentado termicamente. A qualidade térmica da
estufa, no que respeita à transmissividade, à resistência térmica e à vedação do elemento
transparente também influencia o desenrolar do processo. Os tempos de cocção em qual
dos tipos de cozinhas dependem da área e da forma da superfície reflectora, das
características termofísicas do elemento que cria o efeito de estufa, do tipo de recipiente
utilizado, do tipo de prato a ser confeccionado, da quantidade de alimentos. O tempo de
cocção também depende da experiência e sensibilidade do utilizador, pois este deve saber
orientar a cozinha solar e posicionar correctamente as superfícies reflectoras em função
da hora do dia em que começa a confeccionar e da hora em que a comida estará pronta e
da necessidade ou não de re-orientar uma ou mais vezes a cozinha solar.
O processo de cozinhar os alimentos lentamente conduz à conservação das suas
propriedades nutricionais e energéticas. Por outro lado, forma-se um ciclo termodinâmico
em que o vapor formado durante o processo condensa praticamente na sua totalidade,
sendo a perda de vapor e a libertação de cheiros normalmente muito baixas. O risco de
queimar os alimentos é também reduzido, não há chama, o perigo de incêndio e explosão
é praticamente inexistente.
Disseminação efectiva e potencialidades da cozinha solar

A utilização das cozinhas solares é uma solução alternativa importante em termos


energéticos e ecológicos na cocção dos alimentos, bem como até uma solução bastante
cómoda e prática para alguns tipos de pessoas. Aproximadamente dois terços da
população mundial dependem da lenha para fazer face às suas necessidades de
aquecimento de água e ambiente, bem como para confeccionarem os seus alimentos. O
abate anual de florestas associado estima-se ser da ordem de 25 000 km2. Em muitos dos
casos, este cenário ocorre exactamente em regiões com elevado número de horas de céu
limpo. A utilização das cozinhas solares nestas regiões para além do importante
contributo para a melhoria do ambiente, propicia às populações mais desfavorecidas mais
tempo para actividades produtivas, aumentando assim os seus recursos porque já não
precisam de recolher e armazenar lenha em quantidades elevadas, e não precisam de estar
permanentemente a vigiar a confecção dos alimentos.
A utilização das cozinhas solares nos países mais desenvolvidos também apresenta
grandes vantagens que vão para além da redução na emissão de gases poluentes para a
atmosfera que propiciam. Em contexto doméstico é pois possível deixar os alimentos a
serem confeccionados sem haver risco de se queimarem durante algumas horas e
enquanto são confeccionados é possível estar a trabalhar em casa ou no emprego, há
tempo para ir às compras, fazer passeios, bem como para muitas outras actividades. Para
aqueles que gostam de acampar ou de fazer piqueniques, a cozinha solar é uma óptima
solução, com a grande vantagem adicional de o risco de provocar incêndios ser
praticamente nulo, caso das cozinhas do tipo painel e do tipo caixa.
As cozinhas solares podem ser utilizados também para pasteurizar água, sendo suficiente
atingir 66 °C para matar os micróbios causadores de doenças, nomeadamente a diarreia,
que continua a ser responsável por muitas mortes de crianças e de adultos sem acesso a
uma rede de água potável.
Algumas instalações de cozinhas solares industriais permitem confeccionar um número
elevado de refeições, de que é exemplo o caso de trinta mil refeições diárias numa
instalação na Índia.
O uso de cozinhas solares tem vindo a ser divulgado já há algumas décadas. Todavia,
ainda existe uma grande parte da população que não sabe o que é uma cozinha solar e
quais são as suas potencialidades. Por outro lado, muitos daqueles onde a informação
chega mais facilmente dispõem de meios convencionais para fazer a sua comida a partir
da electricidade ou do gás, acabando por não sentirem o apelo ou necessidade de utilizar
as cozinhas solares. Uma das razões parece estar relacionada com a dificuldade em
implementar uma mudança nos hábitos quotidianos no que respeita aos procedimentos
associados à preparação das refeições solares. Talvez também pelo facto das cozinhas
solares mais divulgadas, na maior parte dos casos, não propiciarem uma utilização tão
cómoda no contexto doméstico diário uma vez que exigem que a cocção da comida seja
feita no exterior. Qualquer dos modos, importa divulgar de forma efectiva as cozinhas
solares junto destas camadas da população explicando convenientemente quais os
procedimentos a adoptar na cocção de comida solar. Apesar de algum trabalho já ter sido
feito junto de populações mais desfavorecidas sem acesso a gás e à electricidade urge
também dinamizar o mercado das cozinhas solares através da construção de cozinhas
solares de baixo custo e sua distribuição, com especial destaque nas regiões mais ricas em
sol.
A construção da cozinha solar está ao alcance de qualquer pessoa. É possível utilizar
materiais reciclados para fazer qualquer um dos tipos de cozinha solar de baixo custo.
Qualquer dos modos, é importante ter em conta alguns conhecimentos básicos de física
para que o desempenho da cozinha solar de baixo custo seja no mínimo razoável e que os
materiais empregues não causem problemas aos alimentos confeccionados.
É pois importante delinear estratégias de disseminação da utilização da energia solar na
confecção de refeições, dando especial destaque às tecnologias de baixo custo que
possibilitem ao utilizador uma significativa redução dos seus encargos financeiros e, à
escala global, um melhor uso dos recursos energéticos, alcançando-se melhores
resultados ambientais e por outro lado exercendo-se um papel social que dê dignidade às
comunidades carentes e desprovidas das fontes energéticas convencionais.
Algum caminho já foi percorrido por muitos, mas que ainda são muito poucos. Neste
âmbito, o co-autor deste trabalho, professor Pedro Serrano, bem como muitos outros fãs
da cozinha solar espalhados pelo mundo, lutam por esta causa há muitas décadas, tendo
conseguido resultados muito interessantes que são sem sombra de dúvida exemplos a
terem em conta devido às experiências vividas. O autor deste trabalho, professor
Celestino Ruivo, conheceu o professor Pedro Serrano, no congresso ibero-americano de
energia solar que se realizou no Algarve no início do Outono de 2002. Desde então,
existe uma relação de amizade e interesse mútuo em trabalhar a temática das aplicações
das energias renováveis em vários contextos. Em Julho de 2006, o professor Pedro
Serrano voltou à península ibérica para participar na conferência internacional de
cozinhas solares em Granada-Espanha. Até então o autor deste trabalho, professor
Celestino Ruivo, apesar da sua área de interesse enquanto docente do curso de engenharia
mecânica-ramo térmica na Escola Superior de Tecnologia da Universidade do Algarve
em temas tais como a termodinâmica aplicada, transmissão de calor e massa,
climatização nunca tinha tido qualquer experiência sobre a temática das cozinhas solares,
apesar de viver já há largos anos no Algarve, onde o sol “abunda”.
Na sequência da vinda professor Pedro Serrano para a referida conferência e dos
momentos que ambos privaram, o autor deste trabalho converteu-se às cozinhas solares,
tendo desde logo abraçado o tema e delineado algumas estratégias no sentido de
contribuir para a divulgação da cozinha solar em Portugal, em particular no Algarve.
Assim no Verão de 2006, teve oportunidade de desfrutar das simples cozinhas de tipo
painel para realização de almoços solares em contexto familiar, almoços e jantares
solares com grupos de amigos, aniversários com comida solar, sessões de construção de
cozinhas solares do tipo painel de baixo custo, bem como na exposição sobre energias
renováveis em Faro. As fotos na figura 4 mostram o arsenal das cozinhas solares em
acção num aniversário realizado em pleno Jardim da Alameda - Faro durante a manhã do
dia 3 de Agosto de 2006. Aproximadamente 30 crianças e 15 adultos participaram nesta
festa de aniversário, em que a actividade principal consistiu na construção de cozinhas
solares do tipo painel. O arsenal de cozinhas utilizado foi de 10 simples cozinhas solares
tendo 4 sido construídas na própria manhã, tendo-se confeccionado 2 pizas, massinha de
peixe, frango estufado, caldeirada, arroz cozido, maçã assada, pêra bêbada, hamburguers,
rissóis, café e o bolo de aniversário. Uma outra festa de aniversário foi realizada no
Algarve em Janeiro de 2007, sendo a temperatura máxima de 12ºC e estando o céu
completamente nublado até às 10 h. Condições estas que não impediram a confecção de
vários pratos e o bolo de aniversário, desta vez em cozinhas solares do tipo caixa e do
tipo parabólico. O jantar foi servido depois das 21h, tendo participado cerca de 30
pessoas.

Fig. 4 – Arsenal de cozinhas solares

A actividade de disseminação de cozinhas solares levada a cabo durante o ano lectivo


2006/2007 veio a revelar-se muito intensiva e muito interessante, tendo-se realizado
vários encontros de cozinhas solares, muitas palestras nas escolas nacionais e
internacionais, bem como a participação em programas de radio e de televisão nacionais e
internacionais bem como a informação em páginas na internet. O tema das cozinhas
solares é abordado experimentalmente, ainda que de uma forma básica, em algumas
escolas dos segundo e terceiro ciclos e também em algumas escolas superiores do ensino
universitário e politécnico, nomeadamente, em trabalhos finais de curso de alunos de
engenharia. Um destes exemplos é o trabalho de projecto de um aluno do curso de
engenharia mecânica da Escola Superior de Tecnologia da Universidade do Algarve em
que o principal objectivo consiste em estudar o comportamento de um forno solar de
elevada inércia térmica no sentido de caracterizar o seu desempenho para averiguar as
suas potencialidades no que toca à possibilidade de fazer a confecção de comida a
qualquer hora do dia (das 0 h às 24h) ou até mesmo em dias de chuva ou muito nublados
com energia térmica acumulada.

Conclusão

A utilização efectiva dos recursos e das fontes de energia renováveis exige que
conheçamos os recursos disponíveis associados ao vento, ao sol, à água e à vegetação e
que estejamos dispostos a alterar muitos dos nossos hábitos na vida quotidiana. Apesar de
não ser uma tarefa fácil, urge que cada um de nós tenha uma atitude responsável
relativamente à utilização dos recursos. A disseminação efectiva das cozinhas solares
pode dar um contributo interessante, uma vez que é possível por um lado construírem-se
cozinhas solares de baixo custo, do tipo painel, caixa ou parabólico utilizando-se para o
efeito uma grande quantidade de materiais recicláveis e por outro reduzir o consumo de
gás, electricidade e de lenha. Face à experiência vivida pelo autor deste trabalho, é
possível para muitas famílias no Algarve em mais de 90% dos dias do ano ter à sua mesa
uma refeição confeccionada em cozinhas solares, incluindo-se os meses mais frios.
Para além dos almoços e jantares de amigos, festas de aniversário (em casa, restaurantes,
parques, etc) é importante desenvolver esforços e lançar o desafio às organizações de
eventos temáticos (congressos, exposições, feiras, etc) que a comida na sua totalidade ou
em parte seja confeccionada em cozinha solar.
A realização de palestras nas escolas complementadas com a demonstração de construção
de cozinhas solares, funcionamento de vários tipos de cozinhas solares dando a provar
vários tipos de pratos parece também ser uma estratégia interessante no sentido de
despertar o interesse a muitos outros potenciais adeptos.
A organização de concursos nacionais e regionais envolvendo alunos e outros grupos de
pessoas, bem como a organização de encontros específicos sobre cozinhas solares,
nomeadamente workshops, encontros ECOSOL, congressos, feira das cozinhas solares
parecem também ser vias interessantes de divulgação do mundo das cozinhas solares.
A realização de acções de formação para professores dos primeiro, segundo e terceiro
ciclos deve também ser uma prioridade, bem como a integração da cozinha solar em
cantinas de escolas e restaurantes algarvios.
A integração de uma componente das cozinhas solares em alguns cursos técnico-
profissionais das áreas da tecnologia e de hotelaria poderá fazer com que num futuro
próximo hajam profissionais a trabalhar nesta área, o que agora aparenta ser um nicho de
mercado interessante a explorar, principalmente no Algarve, região turística do país por
excelência com mais de 300 dias de sol por ano.

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