FARRET, Ricardo L. Paradigmas da estruturação do espaço residencial intra-urbano.
In: GONZALES, Suely F. N.; HOLANDA, Frederico de; KOHLSDORF, Maria E. (Orgs.). O espaço da cidade - contribuição à análise urbana. São Paulo: Ed. Projeto, 1985, p. 73-90.
Dois paradigmas se estabeleceram em torno e a partir de grandes correntes do pensamento
econômico, e a partir estruturação do espaço urbano, considerando a residência como fato social e como uma fonte de barganha e de conflitos de grupos de interesse e de poder. Propuseram-se como paradigmas explicativos conflitantes entre si: o paradigma do equilíbrio (questão de eficiência e competência individual) e o paradigma do conflito (questão de poder de classe, conflitos sociais latentes).
O paradigma do equilíbrio se subdivide em duas escolas:
1. Ecologia Humana de Chicago (darwinismo social – forças subpessoais bióticas operam na
sociedade): modelos zonais (Burguess), setoriais (Hoyt) e multicêntricos (Harris e Ullman). 1.1. Os modelos ecológicos enfatizam os processos espaciais de competição > dominação > invasão > sucessão, cabendo ao indivíduo “acomodar-se” à uma determinação área do espaço urbano, movendo-se mecanicamente para a “área social” que lhe couber (mobilidade residencial – hierarquia social – valores culturais), sendo o mercado o melhor alocador de recursos da sociedade 2. Economia neoclássica: 2.1. Modelos econômicos – os indivíduos buscam a maximização dos benefícios de sua decisão locacional dentro dos limites de seu orçamento familiar, ampliando a cidade em anéis concêntricos, dada a maior disponibilidade de terrenos mais baratos nos anéis periféricos, em detrimento da ampliação da distância e dos gastos em mobilidade decorrentes. Críticas a este modelo rescindiram nas supostas: informação perfeita, concorrência perfeita, busca da maximização como comportamento padrão, ausência de acidentes topográficos, concentração de empregos unicamente nas áreas centrais, e a principal debilidade do modelo, a soberania da demanda. 2.2. Modelos comportamentais não econômicos: indivíduo como gerador de demanda e como força propulsora das decisões locacionais. O modelo substitui o determinismo econômico neoclássico por um conjunto mais amplo de valores sociais, culturais e comportamentais.
E o paradigma do conflito em duas vertentes:
1. A vertente institucionalista: enfoque de natureza macroeconômica que enfatiza o papel
das instituições sociais, ao invés das classes sociais como no marxismo, através de seus vínculos e decisões na tomada de decisões na determinação dos padrões locacionais urbanos. 2. Economia política (marxista): a estruturação do espaço urbano é produto das relações sociais e das condições materiais de produção sob o capitalismo. As decisões locacionais resultam das interações de agentes produtores do espaço urbano que organizam o mercado imobiliário: proprietários fundiários, industriais (proprietários dos meios de produção), promotores imobiliários, Estado e grupos sociais excluídos. A preocupação mais eminente é com a renda fundiária. A renda fundiária em Marx compõe a Teoria do Valor. A terra possui natureza peculiar como mercadoria, pois pelo fato de não ser produto do trabalho humano não possui valor, entretanto possui preço, o qual diz respeito à renda nela incorporada como relação social e ao processo de valorização social do espaço nela que valoriza seletiva e desigualmente as localizações na cidade. Portanto, não é a terra que gera renda, mas sua propriedade jurídica. A renda fundiária subdivide-se em: o Renda absoluta (propriedade privada da terra); o Renda de monopólio (grandes porções do espaço em regime de propriedade privada); o Renda Diferencial I (fertilidade e vantagens locacionais naturais) e Renda Diferencial II (vantagens locacionais socialmente criadas);
São determinantes da acumulação capitalista a redução no tempo de circulação das
mercadorias, o aumento de produtividade e a divisão técnica do trabalho. Assim, o processo de produção do espaço urbano não é independente da acumulação capitalista, mas sua condição e seu produto. Os ganhos de produtividade na produção do espaço urbano são objetos de disputa entre setores econômicos e agentes, e a estruturação espacial é resultante dessa disputa, não sendo, portanto, equilibrada nem neutra e tampouco natural. Nessa disputa nenhum agente é neutro e a demanda não é soberana, posto que a oferta (promotores imobiliários, Estado etc.) cria a demanda ao criar novas necessidades e meios desiguais de satisfazê-la.