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Queridos irmãos Falangeiros!

Desde o início da nossa caminhada, lá no dia 14 de abril de 2007, dia de fundação da Nossa Casa,
uma das bases que foram colocadas para o engrandecimento do grupo era o estudo. A partir daí iniciou-se
uma verdadeira busca do conhecimento teórico e prático da Espiritualidade e da nossa Umbanda. E como foi
prazeroso ver cada um debatendo, dividindo opiniões, aprendendo com experiências alheias, enfim,
vivenciando um pouco mais da amplitude que pode alcançar nossa religião.
Mas seria ainda necessária direcionarmos estes estudos para a nossa realidade, para a trajetória que
os Mentores Espirituais traçaram para o nosso grupo. Exatamente por isso que está sendo plantada em nossa
Seara essa semente – os estudos dirigidos.
Trata-se de nossos trabalhos divididos em tópicos, em um estudo minucioso e ao mesmo tempo
simplificado, baseado em textos e pesquisas feitas por alguns médiuns e organizados por mim, com a
orientação do nosso Comando Espiritual – Caboclo Sete Estrelas, mas que pode contar com a colaboração
de todos.
Esperamos que neste primeiro módulo – o Branco – possamos estar unindo força e sabedoria, para o
crescimento de nosso Grupo e de nossa Umbanda. A instrução nos dá o esclarecimento e nos eleva cada vez
mais para junto de nossas entidades. Aprendamos com os nossos Caboclos, Pretos Velhos, com todos os
Guias e Mentores da Umbanda, e também com os nossos irmãos da SEFA. Somente assim estaremos sendo
verdadeiros Falangeiros da Aruanda.

Meu saravá fraterno, e bons estudos para todos!

CCT Cristiano Queiroz


Tupixaba da Seara Espiritualista Falangeiros da Aruanda
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Capítulo 01 – A Umbanda de Caboclo Mirim Pág. 03

Assuntos abordados neste capítulo:


Origem da Escola de Mirim; Desafricanização da Umbanda; Expansão da Escola de Mirim; O
Primado de Umbanda; O Legado de Benjamin Figueiredo.

Capítulo 02 – Os Orixás da Umbanda Pág. 08

Assuntos abordados neste capítulo:


O culto aos Orixás na Umbanda; As Sete Linhas da Umbanda.

Capítulo 03 – Trindade Umbandista: Caboclo, Preto Velho e Ibejada Pág. 13

Assuntos abordados neste capítulo:


As Crianças na Umbanda; Caboclos e Boiadeiros; Pretos Velhos; Yofá

Capítulo 04 – A Gira de Umbanda Pág. 19

Assuntos abordados neste capítulo:


O Ritual; A Gira da Escola de Mirim.
Leitura Complementar:
Bojás e Abarés

Capítulo 05 – Exus e Guardiões na Umbanda Pág. 26

Assuntos abordados neste capítulo:


O que é Exu?; Onde trabalham os Exus?; Zé Pelintra e Malandragem.

Capítulo 06 – O Povo do Oriente Pág. 35

Assuntos abordados neste capítulo:


O Trabalho do Povo do Oriente; O Povo do Oriente e os Orixás; O Povo Cigano.

Capítulo 07 – “Outras Umbandas” Pág. 40

Assuntos abordados neste capítulo:


Os novos Rumos da Umbanda; Omolokô; Umbanda Esotérica; Escola de Magia.
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Introdução

Alguns anos após a histórica incorporação do Caboclo das Sete


Encruzilhadas, marco inicial da fundação da Umbanda, outro fato
importante aconteceria para o engrandecimento da nossa religião: o advento
do Caboclo Mirim, através de seu médium Benjamin Gonçalves Figueiredo.
A entrega do médium para a sua obra missionária, trazida por seu mentor
espiritual, foi tão grande que ambos, entidade e aparelho, às vezes pareciam
um só, ficando registrado para sempre na história da Umbanda como um
exemplo edificante de amor ao próximo e de luta pela dignidade do culto
umbandista.
O ano era de 1920. A família Figueiredo já era adepta do
Kardecismo, e realizava as suas sessões no bairro do Rocha, cidade do Rio
de Janeiro. Ao contrário da família de Zélio Fernandino de Morais,
Benjamin Figueiredo já estudava os fenômenos da mediunidade, e todos da
sua família compreendiam o assunto com naturalidade e ciência dos fatos.
Porém, no dia 12 de Março daquele ano, algo de diferente aconteceu na
mesa durante a sessão da família Figueiredo.
O Médium Benjamim Gonçalves Figueiredo, na época um jovem de
apenas 17 anos, incorporou pela primeira vez o Caboclo Mirim. Mesmo
sendo conhecedores da doutrina espírita os familiares do jovem ficaram Benjamin Figueiredo nos
espantados com tal manifestação. Após a sua chegada, Caboclo Mirim anos 1950
anunciou que aquela seria a última sessão de Kardec, e que as próximas
sessões passariam a ser de Umbanda.

A Tenda Espírita Mirim

Quase toda a família Figueiredo foi convocada para preparar os Postulados da nova Organização, que
no início foi batizada de Seara de Mirim. Mas como mudar as sessões de Kardecismo para Umbanda sem
sequer conhece-la, visto que a religião era ainda muito nova, com menos de dez anos de fundação? O
Caboclo Mirim, Espírito Missionário, preparou a antena receptiva daquele que seria o intermediário do seu
programa, de suas ordens e de suas mensagens, ou seja, o seu Médium, que preservaria a sua missão e que
cumpriria, religiosamente, a sua tarefa. Estudos confirmam que Benjamin Gonçalves Figueiredo teria
passado algum tempo junto com Zélio Fernandino de Morais, médium do Caboclo das Sete Encruzilhadas,
na Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, aprimorando seus conhecimentos sobre a Umbanda.
Aos 13 dias do mês de outubro do ano de 1924 considerou-se fundada aquela que seria um dos mais
importantes núcleos umbandistas do Brasil: a Tenda Espírita Mirim. Desde o início Caboclo Mirim advertiu
que aquela seria uma Organização única no gênero em todo o Brasil, cujo método seria adotado por outras
Tendas, até mesmo em outros Estados da Federação. De fato, o ritual da Tenda Mirim sempre se destacou
no meio umbandista por trazer influências de correntes filosóficas que vão desde o Ocultismo e a Teosofia
ao Espiritismo de Kardec. Caboclo Mirim aboliu do seu culto diversos elementos que estavam intimamente
ligados à noção de que se tinha das “macumbas” e feitiçarias reinantes naqueles tempos, bem como alguns
outros também relacionados ao culto católico e à cultura africana, em especial (naquela época não se usava o
termo “sincretismo”). Ainda como parte da ruptura com outras religiões, nos terreiros orientados por
Caboclo Mirim não se encontravam altares com as imagens católicas, apenas a de Jesus Cristo situado acima
da altura da cabeça dos médiuns, onde se lia a inscrição “O Médium Supremo”.
Os atabaques foram trocados por enormes tambores (tocados sentados), toalhas-de-guarda e as vestes
rendadas coloridas, típicas da Bahia, deram lugar aos brancos uniformes e calçados, sempre sóbrios, como a
lembrar a seus médiuns que todos eram apenas operários da fé, ou melhor, “Soldados de Oxalá”, como na
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letra do hino da Tenda Mirim. Nenhum ornamento, nem guias, colares ou qualquer tipo de ostentação
pessoal eram aceitos. Antes da abertura dos trabalhos, era até difícil ao visitante reconhecer os dirigentes
dentre os demais médiuns da Casa. Foi um primeiro passo em busca de uma identidade própria para a
Umbanda, buscando-se dignificar o culto e seus participantes, tendo como base a organização e a disciplina
do conjunto do corpo mediúnico da casa umbandista.

A desafricanização dos rituais de Umbanda

A liturgia aplicada nos terreiros também introduzia novos


conceitos à fé umbandista. Caboclo Mirim sintetizou o tradicional
panteão africano em algumas linhas de trabalho sob a égide de Tupã,
o Senhor da criação na cultura Tupi-Guarani, correspondente a
Zambi na linha africana. Os Orixás evocados nos trabalhos da Tenda
Mirim eram: Oxalá, Oxossi (e Jurema), Ogum, Iemanjá, Oxum,
Iansã, Nanã, Xangô e Iofá. As manifestações mediúnicas davam-se
sempre através dos Caboclos, Pretos-Velhos e as Ibejadas (crianças),
e não havia na Tenda Mirim sequer uma saudação aos Exus e
Pomba-Giras, muito menos uma Gira ou sessão própria para o
trabalho destes.
Certamente uma atitude que visava ratificar a ruptura da
Umbanda com as populares “macumbas”. Para muitos, Benjamin
Figueiredo parecia ignorar completamente a existência do “Povo
Trabalhador”, bem como a extensão e a importância dos trabalhos
próprios dessa linha. Benjamin parecia ignorar, perante os olhares
menos atentos.
Realmente, nos tempos de Benjamin Figueiredo, as casas
ligadas à Tenda Mirim não faziam Giras próprias de Exu e Pomba-Gira. Mas sua participação sempre foi
fundamental na corrente astral da Casa. Com um olhar mais apurado observava-se a presença do “Povo
Trabalhador” auxiliando desde o desenvolvimento dos médiuns iniciantes bem como trabalhando pesado no
descarrego de médiuns e consulentes. Mas sempre de uma forma extremamente discreta, fosse junto aos
Caboclos e Pretos-Velhos, fosse junto à parte do corpo mediúnico denominados “médiuns de banco”.
Essa categoria de médiuns tinha como principal
característica operar sempre sentado e de forma receptiva
(ou passiva), em contraponto aos médiuns de terreiro
incorporados com seus Caboclos, que ministravam o
passe no consulente, de forma ativa. Os médiuns de
banco se doavam fornecendo ectoplasma e também
auxiliando na dispersão de energias maléficas e/ou
miasmas, bem como na condução de almas sofredoras ou
espíritos trevosos (“kiumbas”).
Daí percebe-se que só com a segurança dos
sempre alertas Exus e Pomba-Giras, em total sintonia e
cooperação com as demais entidades presentes, se
alcançava o pleno êxito em cada sessão.
Em 1942 a Tenda Mirim inaugura a sua matriz
Sessão de Passe na Matriz da Tenda Espírita
definitiva. Uma imponente casa, com seu enorme terreiro
(20 x 50 metros). Cerca de 2000 (dois mil) médiuns da Mirim em 1970
Tenda Mirim, suas filiais e Casas coirmãs,
confraternizavam com seus Caboclos e Pretos Velhos em uma só poderosa vibração de amor aos Orixás e à
Umbanda.
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À esquerda a fachada da Matriz da TEM nos anos 1970; à direita o interior do terreiro em final dos anos 1990

A Expansão da Escola de Caboclo Mirim

A partir dos anos 1950, com um trabalho já bem consolidado na sua matriz no Rio de Janeiro,
Caboclo Mirim responsabilizou vários médiuns a levar as Tendas de Umbanda ao longo de todo território
nacional. A primeira casa descendente da Tenda Mirim foi criada em 30 de junho de 1951, como filial, em
Queimados, na época distrito da cidade de Nova Iguaçu. Depois desta, novas casas foram abertas em Austin,
Realengo, Colégio, Jacarepaguá, Itaboraí, Petrópolis e São Gonçalo. A primeira casa descendente do
Caboclo Mirim, aberta fora do Rio de Janeiro foi na cidade de Assaí, no Paraná.
Caboclo Mirim introduziu também o conceito de graduação aos seus médiuns em desenvolvimento,
com uma classificação própria para cada um nos trabalhos de atendimento público. Foi, talvez, a primeira
Escola de Formação Iniciática Umbandista.
O novo adepto da religião iniciava seu desenvolvimento mediúnico na base da pirâmide hierárquica
do terreiro, e ia ascendendo nela conforme em seu próprio ritmo, levando-se em conta a seriedade e a
dedicação do neófito, e sempre de acordo com a intensidade e a qualidade com que seus próprios Guias
trabalhavam junto ao médium.
Com isso, durante seu desenvolvimento, o médium exercitaria várias funções dentro dos trabalhos de
caridade. A nomenclatura dos sete graus foi baseada na terminologia da língua Nheêngatú, da antiga raça
dos índios Tupy. Assim ficaram classificados:

Grau Função Nomenclatura Letra


1º Iniciante Bojá-Mirim I
2º Banco Bojá B
3º Terreiro Bojá-Guassú T
4º Subchefe de Terreiro Abaré-Mirim SCT
5º Chefe de Terreiro Abaré CT
6º Subcomandante Chefe de Terreiro Abaré-Guassú SCCT
7º Comandante Chefe de Terreiro Morubixaba CCT
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O Primado de Umbanda

Em 1952 Benjamin Figueiredo, orientado pelo Caboclo Mirim, consegue


um feito ainda maior: unindo diversas Casas do Rio de Janeiro, funda o Primado
de Umbanda, fazendo com que a doutrina da Escola de Mirim se espalhasse pelo
território nacional e fosse além das fronteiras do Brasil.

Foram, ao todo, 24 Tendas fundadoras, com seus respectivos Guias Espirituais:

01. Tenda Espírita Mirim - Caboclo Mirim


02. Tenda Espírita São Miguel Arcanjo - Caboclo Pena Branca
03. Grupo Espírita Humildes de Jesus - Mestre Luiz
04. Tenda Espírita Estrela do Mar - Caboclo Ventania
05. Centro Espírita de Caridade Jesus - Preto Velho Pai João
06. Tenda Espírita Maria Madalena - Caboclo Juçuruá
07. Cabana Espírita Pai Joaquim de Loanda - Preta Velha Maria Rosa
08. Tenda Espírita Fraternidade da Luz - Vovó Josefa
09. Tenda Espírita Perseverantes da Fé - Caboclo Cobra Coral
10. Casa de Caridade São Crispim e São Crispiniano - Caboclo Sete Flechas
11. Instituto do Templo dos Pobres de Jesus - Caboclo Rompe Mato
12. Tenda Espírita Ogum Megê - Caboclo Ogum Megê
13. Tenda Espírita São Jorge - Preto Velho Pai Tomé
14. Centro Espírita São Jorge - Pai Joaquim de Angola
15. Tenda de Caridade Filhos de Benedito - Caboclo Taquari
16. Caminheiros Anônimos do Bem - Caboclo Arapuan
17. Tenda Espírita São Jorge - Caboclo Arruda
18. Centro Espírita Pai Benedito - Caboclo 7 Estrelas
19. Tenda Espírita Seara de Jesus - Caboclo Estrela Azul
20. Tenda Espírita Seara do Senhor - Caboclo Aimoré
21. Palhoça do Preto Velho - Caboclo Lagoa Grande
22. Centro de Irradiação Antônio de Pádua - Caboclo 7 Estrelas do Oriente
23. Tenda Espírita São Benedito - Tia Delfina
24. Tenda Espírita Santa Bárbara - Caboclo Flecha Branca

Benjamin Figueiredo ainda incentivou a criação do


Colegiado Espiritualista do Cruzeiro do Sul, do Círculo de
Escritores e Jornalistas de Umbanda, e seria o principal fundador
da Escola Superior Iniciática de Umbanda do Brasil, da qual foi
Conselheiro Nato.

Tenda Espírita São Miguel Arcanjo – um


dos terreiros fundadores do Primado de
Umbanda (foto dos anos de 1960).
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O Legado de Benjamin Figueiredo

Benjamin Figueiredo soube estar à altura de


uma obra maior, orientada pela legítima cúpula
espiritual do movimento umbandista. Sabia que, em
seu tempo, seria conhecido como um radical, pela
intransigência que precisaria defender uma Umbanda
livre dos grilhões de feiticeiros e exploradores da fé,
das superstições que poluíam as mentes mais
imaturas de alguns fiéis, e principalmente da
marginalidade que a sociedade relegava nossa
religião. Realmente não foi um grande escritor, mas
seu exemplo seria seu maior diferencial.
Como médium dedicado de Caboclo Mirim e
Pai Roberto, consolidou a Tenda Mirim e o Primado
A histórica Gira no Maracanãzinho, encerrando o 2º de Umbanda como verdadeiras Escolas Iniciáticas,
Congresso de Umbanda em 1961 provando que a Umbanda tinha vida própria fora da
cultura afro-brasileira. Alguns o acusaram de
“embranquecer” a Umbanda, mas Benjamin nunca
aceitou o ser humano, e suas manifestações socioculturais, como algo estático. Acreditava que tudo evolui,
cresce e se desenvolve. É a “Escola da Vida” trazida por Caboclo Mirim! Claro que respeitava a cultura
negra que tanto enriquece nossa religião, mas achava dispensável ao culto alguns dos rituais africanos mais
rústicos. Para ele, Umbanda nunca seria lugar para matanças de animais, “fundangas”, raspagens de cabeça,
camarinhas, “recolhimentos” ou “obrigações” aos Orixás.
Os ensinamentos do Caboclo Mirim perduram até hoje, como base na fundação de muitas Casas de
Umbanda, como é o caso da Seara Espiritualista Falangeiros da Aruanda. E os exemplos de Benjamin
Figueiredo ficarão marcados sempre na história da Umbanda, como médium revolucionário e à frente do seu
tempo.

Gira Festiva de 10 anos da SEFA


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Introdução
Muitas pessoas que não conhecem a Umbanda
acabam confundindo a nossa religião com o
Candomblé, por causa de uma coisa que temos em
comum: o culto aos Orixás. Mas embora as duas
religiões façam louvações aos deuses do panteão
africano, a representação dos Orixás na Umbanda se
dá completamente diferente à do Candomblé.
E a confusão dos cultos religiosos está muitas
vezes nos próprios irmãos umbandistas e
candomblecistas, que não procuram entender seus
fundamentos.
No Candomblé, o culto aos Orixás é feito
através da mitologia Yorubá. Os deuses do panteão
O Panteão Africano na visão da Mitologia Yorubá africanos são numerosos, alguns até desconhecidos
pelos próprios umbandistas. Eles teriam vivido na
Terra há milhares de ano, vivenciando até hoje as suas paixões e sentimentos de quando eram encarnados.
Por isso é muito comum de se falar que Ogum é ciumento, Oxum é vaidosa e chorona, Iansã é raivosa, etc.
Ainda no culto Yorubá as características de cada Orixá os deuses dos seres humanos, pois eles se
manifestam através de emoções como os filhos de fé. Sentem raiva, ciúmes, amam em excesso, são
passionais. Isso faz com que o filho daquele Orixá tenha as mesmas características e sentimentos dele. Cada
orixá tem ainda o seu sistema simbólico particular, composto de cores, comidas, cantigas, rezas, ambientes,
espaços físicos e até horários.

O culto aos Orixás na Umbanda


Diferentemente do Candomblé, a Umbanda cultua os Orixás como manifestações divinas
representadas pelas forças da natureza, e não como seres personificados. A Umbanda acredita que os Orixás
não tiveram vida corpórea na terra; mas sim que se tratam da representação da energia, força oriunda da
natureza, e é tal força que auxilia os seres humanos nas dificuldades do dia a dia.
Na Umbanda, os orixás também não incorporam (diferentemente do Candomblé), o que se vê é a
manifestação dos Falangeiros dos Orixás, que são os Guias ou Entidades que trabalham sob influência da
energia de um determinado Orixá. O fato do filho de fé trabalhar ou ter mais afinidade com determinado
guia ou falangeiro de um Orixá não faz dele mais poderoso que ninguém. Ao contrário, a vaidade em
ostentar o seu guia como uma arma poderosa contra tudo e contra todos (a famosa frase “não mexe comigo,
que eu não ando sozinho”), acaba afastando o médium do seu guia e do seu propósito de evolução espiritual.

As Sete Linhas da Umbanda


Muitos terreiros de Umbanda adotam o setenário sagrado como parte de sua ritualística. É o exemplo
da SEFA, que seguindo a Escola do Caboclo Mirim, organiza o seu corpo mediúnico distribuído em sete
graus. Em outras casas também pode haver a hierarquia em sete níveis. Ou há também as casas com
vertentes mais africanistas, onde o médium tem que passar por obrigações, geralmente, de sete em sete anos.
Mas o que mais define o setenário sagrado dentro dos rituais de Umbanda são as sete linhas da Umbanda.
As Sete Linhas de Umbanda são presentes e faladas desde o nascimento da religião, pois o próprio
Caboclo das Sete Encruzilhadas, através de seu médium Zélio de Moraes, fundador da Religião de
Umbanda, já abordava esta questão.
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O primeiro livro de Umbanda publicado, que se tem notícia, foi “Espiritismo, Magia e as Sete Linhas
de Umbanda”. Escrito no ano de 1933 por Leal de Souza, um dos médiuns preparados por Zélio de Moraes,
o livro traz uma visão teológica que o Caboclo das Sete Encruzilhadas passava aos seus médiuns sobre as
Sete Linhas da Umbanda, que eram classificadas da seguinte forma:

LINHA BRANCA DE UMBANDA E A SUA HIERARQUIA

Os 7 Pontos da Linha Branca de Umbanda

1° Grau de iniciação, ou seja o 1° Ponto – ALMAS


2° Grau de iniciação, ou seja o 2° Ponto – XANGÔ
3° Grau de iniciação, ou seja o 3° Ponto – OGUM
4° Grau de iniciação, ou seja o 4° Ponto – NHÃSSAN
5° Grau de iniciação, ou seja o 5° Ponto – EUXOCE
6° Grau de iniciação, ou seja o 6° Ponto – YEMANJÁ
7° Grau de iniciação, ou seja o 7° Ponto – OXALÁ

Com o passar dos anos, outros mentores espirituais foram instruindo seus médiuns, trazendo mais
esclarecimentos e vertentes diferenciadas sobre as representações das sete linhas de Umbanda, como foi na
própria Escola de Caboclo Mirim, que classificou as Sete Linhas com Orixás Regentes, onde se encaixariam
guias e falangeiros que trabalham na força de outros orixás afins.

Oxalá Tupã – A Criação

Oxossi Caboclo, Boiadeiro e Jurema (Caboclas)

Rompe-Mato, Megê, Canjira, Matinata, Sete


Ogum
Espadas, Iara, Beira-Mar, Exu

Iemanjá Iemanjá, Oxum, Iansã e Nanã

Xangô Xangô, Oriente e Ciganos

Ibejis Ibejadas

Iofá Pretos Velhos, Almas, Omulu

Na SEFA as Sete Linhas Sagradas da Umbanda se fazem presente já no ponto da Casa.


As sete estrelas, em sete cores diferentes, representam cada falange da Aruanda: Orixalá/Oxalá
(branca), Oxossi (verde), Ogum (vermelha), Iemanjá (azul), Xangô (amarela), Ibejis (rosa) e Iofá (laranja).

— O arquiteto Universal, o Orixá da Criação. Na Umbanda, a representação de


Oxalá está diretamente ligada à imagem de Jesus Cristo ressuscitado.
Em nossa doutrina Oxalá é um dos pontos fundamentais do Triângulo da Vida.
Na Umbanda também se faz a saudação a Zambi, o Deus Maior na mitologia africana.
Em nossa Casa, cremos que Zambi está diretamente ligado a Tupã, o Deus Sol, Entidade
Suprema de nossos ancestrais indígenas.
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— A Linha de Oxossi representa o conhecimento, a fartura e a agilidade. É


também a linha regente das falanges dos Caboclos de “pena” (entidades que através de
sua roupagem fluídica representam os silvícolas) e dos Caboclos de “couro” (os
chamados boiadeiros).
A falange dos caboclos é numerosa e é responsável por um dos sustentáculos da
egrégora astral de nossa religião. “Caboclo” não necessariamente representa o “índio”, mas sim a todos as
entidades que se afinizam com essa energia de Oxossi. Os Caboclos, embora associados a Oxossi, Orixá da
caça, que na Umbanda é louvado como rei das Matas, estão sempre ligados a um determinado Orixá e
mantém suas características, de alguma forma ligada a esse Orixá. Por isso, podemos ter Caboclos de
Oxossi, de Ogum, de Xangô, de Iemanjá, de Oxum, etc.

— Esta é a Linha das batalhas contra as demandas, da fé, da coragem e dos


trabalhos, etc. Ogum é a Divindade que, no sentido místico, protege os guerreiros. Por
isso está tão diretamente ligado à representação de São Jorge, conhecido por todos como
o Santo Guerreiro. Ogum é o orixá da transformação, da astúcia, da vontade. Por esse
motivo, temos várias correntes de falangeiros que trabalham e vibram na linha de Ogum,
manipulando essa energia transformadora para purificar as almas dos encarnados e
desencarnados. Os falangeiros de Ogum se apresentam com diversos nomes: Ogum Matinata, Ogum Megê,
Ogum Beira-Mar, entre outros.
Mas vemos ainda a presença de caboclos (falangeiros de Oxossi) que trabalham nessa energia
(Cabocla Jupira, Caboclo Rompe Mato, Caboclo Sete Espadas, etc). Em nossa Casa, a falange de Exu está
subordinada à Linha de Ogum e pedimos permissão a este orixá para as giras com o Povo Trabalhador. Os
nossos guardiões Exus atuam em nosso terreiro como soldado nas batalhas espirituais, sempre com a
permissão de Ogum.

— Esta Linha é conhecida também como Linha das Águas, regida pelas
Iabás (Orixás femininos). A Vibração de Iemanjá representa a força feminina da
natureza, inserida no elemento água. Por isso que esta grande falange agrega as linhas
de Iemanjá, propriamente dita, cujo elemento é a água do mar, dos oceanos; Oxum, que
reina sobre as águas doces, dos rios e das cachoeiras; Iansã, que vibra nas tempestades,
nos temporais, nos ventos e nos raios, senhora das águas mais revoltas; e Nanã,
considerada a mais velha, dona da matéria da criação – o barro, senhora das águas lodosas, dos pântanos e
das nascentes.

— A Vibração de Xangô é responsável pelo equilíbrio e pela consciência que


devemos ter da Lei da Causa e Efeito. Xangô é considerado “Orixá da Justiça”, o
“Senhor da Balança Universal”, que afere o nosso estado espiritual. A linha de Xangô
também agrega a força das falanges curadoras, através de Xangô-Kaô (Linha do Povo
do Oriente, da qual faz parte o Caboclo Muyrakitan e diversos outros caboclos). Em
nosso terreiro, essa linha também coordena a falange do Povo Cigano.

— A “Linha das Crianças”, que na Umbanda também é conhecida como


“Ibejada” (variação do nome dado aos chamados Orixás gêmeos). Dentro da tradição do
sincretismo, acabamos adotando os santos gêmeos São Cosme e São Damião como
“patronos” das Ibejadas, sendo que, na Umbanda, a imagem dos dois é acompanhada de
uma criança, Doum (variação do termo ioruba “idowú” que representa as crianças com
menos de sete anos de idade). Também se faz louvação aos gêmeos Crispim e
Crispiniano. A Vibração de Ibejis traz a energia, a vitalidade e a jovialidade, sendo também considerada
uma forte linha de trabalho de cura.
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— É a linha regente da falange dos nossos Pretos Velhos, espíritos que


conhecem todos os segredos da magia da umbanda e empregam todos os rituais na
prática da caridade em benefício daqueles que buscam auxílio. A Vibração de Iofá
representa a força, a resignação, a sabedoria, o amor e a caridade. Esta Linha é
composta dos primeiros espíritos que foram ordenados a combater o mal em todas as
suas manifestações. São verdadeiros magos que usam da roupagem fluídica de Pretos-
Velhos, ensinando as verdadeiras “mirongas” sem deturpações. São os Mestres da Magia, experientes
devido às seculares encarnações. Na SEFA, a linha de Iofá agrega, ainda, a energia de Obaluaê ou Omulu,
orixá da cura. Os pretos-velhos são a outra frente principal de comando da Casa, ao lado dos caboclos.

O Trecho abaixo é do Livro “Reflexões sobre a Escola de Caboclo Mirim”, de autoria de Sérgio
Navarro Teixeira, e define bem como trabalhamos a questão dos guias e Orixás em nossa Casa.
É preciso ressaltar, entretanto, que a Escola de Caboclo Mirim nunca incentivou alguém a procurar
seu “orixá de cabeça”, pois o processo de iniciação requer desenvolvimento lento, fazendo com que o
médium viva experiências sob a vibração de todos os raios, ou seja, cresce-se pela luz e aprendizado de
vários guias e falangeiros de Orixás em nossa Umbanda, sempre orientados pelos Caboclos e Pretos Velhos.
Não é vantajoso para o médium se fixar em um arquétipo, justificando e apoiando sua conduta na vida diária
á influência do orixá A ou B. Aprendemos que o guia de cada um que irá, no momento certo, trazer maiores
detalhes sobre a coroa de seu filho.
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Questão 1
Quando instituiu a sua Escola, Caboclo Mirim consagrou os meses do ano a algumas Linhas de Umbanda
que trabalhamos em nosso terreiro.

MÊS IRRADIAÇÃO MÊS IRRADIAÇÃO


JANEIRO OXOSSI JULHO IEMANJÁ
FEVEREIRO OGUM AGOSTO IEMANJÁ
MARÇO OXOSSI SETEMBRO XANGÔ
ABRIL OGUM OUTUBRO OXOSSI
MAIO IOFÁ NOVEMBRO IOFÁ
JUNHO XANGÔ DEZEMBRO IEMANJÁ

Analisando o quadro acima procure explicar, com suas próprias palavras, o porquê dessa classificação.
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Introdução

Em 1908, a religião de Umbanda foi oficialmente anunciada e fundada no plano terrestre. Anterior a
esse fato o que havia eram diversas manifestações espirituais, algumas praticadas em casa, outras em
espaços abertos. Havia então uma mistura onde não se sabia o limite entre um espírito evoluído e um outro
de baixa vibração. No Rio de Janeiro essas manifestações ganharam o nome pejorativo de “macumba
carioca”.

A Fundação da Primeira Tenda Umbandista

Após a histórica incorporação do Caboclo das Sete Encruzilhadas, na mesa da Federação Espírita de
Niterói em 15 de Novembro de 1908, deu-se a fundação oficial da primeira Tenda Umbandista no plano
terrestre.
No dia seguinte ao do acontecido na Federeção, todos foram à casa da família de Zélio de Morais, na
Rua Floriano Peixoto, 30, em Neves, para presenciar o que o Caboclo havia anunciado. Ao se aproximar à
hora marcada - 20 horas - já se reuniam os membros da Federação Espírita, seguramente para comprovar a
veracidade do que fora declarado na véspera; os parentes mais chegados, amigos, vizinhos e, do lado de
fora, um grande número de desconhecidos. Todos estavam curiosos para saber o que realmente iria
acontecer.
Às 20 horas, manifestou-se o Caboclo das
Sete Encruzilhadas. Declarou que se iniciava,
naquele momento, um novo culto. Nele, espíritos na
forma de índios nativos de nossa terra, e outros
como velhos africanos, que não encontravam campo
de ação nos remanescentes das seitas já deturpadas e
dirigidas quase exclusivamente para trabalhos de
feitiçaria, poderiam trabalhar em benefício dos seus
irmãos encarnados, qualquer que fosse a cor, a raça,
o credo e a condição social. A prática da caridade,
no sentido do amor fraterno, seria a característica
desse culto, que teria como mestre supremo Jesus.
Ainda naquela mesma noite, Zélio
Casa da família de Zélio, foi a primeira Tenda de incorporou um preto velho chamado Pai Antônio.
Umbanda. Demolida em 2011, hoje funciona um Com fala mansa e palavras de muita sabedoria e
galpão de materiais de construção. humildade e com timidez aparente, recusava se
sentar junto com os presentes à mesa dizendo as
seguintes palavras:
“— Num carece preocupá não. Nêgo fica no toco que é lugá di nego”. Quando foi solicitado um
banquinho para o Preto Velho.
Assim, continuou dizendo outras palavras representando a sua humildade. Uma pessoa na reunião
pergunta se ele sentia falta de alguma coisa que tinha deixado na terra e ele responde:
“— Minha caximba, nêgo qué o pito que deixou no toco. Manda mureque buscar”.
Foi o primeiro elemento de trabalho solicitado por um guia de Umbanda.
A partir destes fatos fundou-se a Corrente Astral de Umbanda, sendo reconhecido o dia 15 de
novembro (quando houve a primeira manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas) como dia oficial da
fundação da Umbanda.
14

Do lado espiritual, aos poucos diversos espíritos foram se agregando ao novo culto trazido por Seu
Sete Encruzilhadas e por Pai Antônio. Começavam então a se formar os grupamentos espirituais de trabalho,
que mais tarde ficou conhecido por todos nós como Falanges Espirituais.
Assim, nas diversas Casas de Umbanda fundadas ao longo de mais de 100 anos podemos ver
diversas falanges espirituais trabalhando nos terreiros. Cada terreiro de Umbanda pode ter uma linha
doutrinária diferente, ou trabalhar com algumas falanges distintas. Porém uma característica é comum a
todos os terreiros de Umbanda: além dos Caboclos, encontramos outras duas formas básicas na Umbanda –
os Pretos Velhos e as Crianças (Ibejadas).
Essa tríade umbandista representa o desenvolvimento da vida, ou seja o início, a pureza e a
simplicidade, a descoberta (infância = crianças); o amadurecimento, a virilidade o destemor, a vontade e o
arrojo, a força (adulto = caboclo); e a maturidade, a sabedoria da vivência, a humildade, a experiência e o
conhecer das outras fases (velhice = pretos-velhos).

As Crianças na Umbanda

Na Umbanda a linha das Crianças é também


conhecida como Ibejadas. A palavra é uma variação do
termo Ibejis, nome dado aos Orixás gêmeos do culto
Yorubá. Muitos irmãos confundem o nome dado aos
orixás com Erês, termo que significa “criança”, mas
não se trata da divindade africana. Outros nomes dados
à linha das Ibejadas são: Yori, Cosmes (por causa da
ligação com os santos católicos Cosme e Damião),
Dois-Dois (também relacionando a linha das crianças
aos santos Crispim e Crispiniano). São entidades que
se apresentam de maneira infantil. Quando chegam no
terreiro transformam o ambiente em pura alegria.
Essa falange espiritual tem como patronos os
santos católicos Cosme e Damião. Por isso, a festa das
O Tupixaba da SEFA, CCT Cristiano, incorporado com Ibejadas do terreiro de Umbanda acontece no dia 27 de
a Ibejada Pedrinho da Praia, na Tenda Espírita Setembro. Uma curiosidade: o dia oficial dos santos na
Mirim, em 2001. igreja católica é dia 26, mas até mesmo alguns irmãos
católicos confundem as datas, tamanha foi a força do
culto às Ibejadas, uma das linhas de trabalho mais
15

populares da nossa religião. Por sua vez, Cosme e Damião acabaram sendo conhecidos no Brasil como
santos protetores das crianças.
Outra característica marcante na Umbanda em relação às representações de São Cosme e São
Damião é que junto aos dois santos católicos aparece uma criancinha vestida igual a eles. Essa criança é
chamada de Doum. Trata-se de uma variação do termo Idowu, que era como os africanos chamavam as
crianças de até sete anos de idade. Doum passou a representar o protetor das crianças nessa faixa etária.

À esquerda, a imagem da Igreja Católica de São Cosme e São Damião. À direita,


Cosme e Damião como são cultuados na Umbanda, com a companhia de Doum.

A força dessas entidades espirituais, no entanto, é pouco conhecida pela maior parte dos filhos de fé.
Muitos irmãos, inclusive médiuns, só querem vê-las como crianças peraltas ou insubmissas.
O trabalho dessas entidades é incansável, tendo energias inesgotáveis como uma criança e sabedoria a de um
ancião. Em muitos terreiros são entregues às Ibejadas a corrente de saúde, sendo eles formadores de uma
grande falange curadora. Os guias que atuam na linha de Ibejada possui um extenso sítio vibratório. Por isso
temos Ibejadas da mata, da cachoeira, da praia, dos campos, etc. Balas, doces e guaraná que esses guias
espirituais utilizam são apenas ferramentas de trabalho que são benzidos e vibrados para nossa proteção.

Os Caboclos de Umbanda

Originalmente, a palavra Caboclo significa mestiço de Branco com


Índio. Mas, na percepção umbandista, os espíritos que no terreiro se
manifestam como Caboclos vão muito além da figura do silvícola. São
espíritos ancestrais, dotados de grande sabedoria de manipulação de energia e
de trabalhos de magia.
É importante dizer que nem todo caboclo foi índio. Trata-se de
espíritos que, embora em suas encarnações tenham vivido em outros países,
identificam-se espiritualmente na vibração não apenas das tribos indígenas
que povoaram a América do Sul, mas também na ancestralidade dos índios
Americanos, os Astecas, os Maias, os Incas e demais espíritos milenares. A
linha dos caboclos representa o raio da força, da vitalidade, do
desprendimento, de tudo que é vivo, expressões da mãe natureza.
No Brasil, o culto aos Caboclos é tão amplo, que a regionalidade de um país continental como o
nosso influencia também na forma do trabalho. Logo em alguns terreiros, os caboclos de identificação
indígena dão lugar aos chamados boaideiros, ou à própria falange da encantaria, muito comum no norte do
país, onde os Caboclos dão nome aos encantados. Por exemplo: a Cabocla Mariana e Caboclo Jeremias,
entidades que, pelas lendas da encantaria, são oriundas dos reinos, mas que se apresentam numa roupagem
de Caboclos, dependendo da linha em que se manifestam, assim por diante.
16

Em nossa Casa, seguindo os Ensinamentos


da Escola de Mirim, trabalhamos com os Caboclos
chefiando o terreiro. Para isso, quando o médium
chega ao primeiro grau de chefia (Subchefe de
Terreiro) é confirmado o nome do Caboclo que é
chefe na coroa do médium. Isso quer dizer que,
mesmo que o médium tenha outro caboclo com o
qual possa também trabalhar, quem deve chefiar e
sempre responder pelo médium é o Caboclo chefe,
que confirma o nome e o ponto riscado quando lhe
é feita a ordenação de Abaré-Mirim.
Os Caboclos, embora associados a Oxossi,
Orixá da caça, que na Umbanda é louvado como rei
das Matas, estão sempre ligados a um determinado
Orixá e mantém suas características, de alguma Nosso Tupixaba, CCT Cristiano Queiroz, incorporado
forma ligada a esse Orixá. Por isso, podemos ter com o Caboclo Sete Estrelas, Guia Chefe de nossa
Caboclos de Oxossi, de Ogum, de Xangô, de
Organização Religiosa.
Iemanjá, de Oxum, etc.
Estes espíritos são exímios na arte de curar e na limpeza espiritual, são profundos conhecedores das
ervas medicinais e de suas propriedades espirituais, assim como suas propriedades terapêuticas para o
tratamento de muitos males. São grandes passistas, quando seus médiuns se preparam para este tipo de
trabalho.
Também em nossa Casa, na Gira de Caboclos, há uma divisão na saudação aos Caboclos: saudamos
os Caboclos e Jurema (aqueles que identificamos com a roupagem fluídica da imagem dos ancestrais
indígenas, e manifestação feminina dessa força), e saudamos os Boiadeiros. Mas qual a diferença entre essas
duas entidades?

Em relação aos Caboclos já explicamos a nossa visão em relação a essa falange espiritual e à sua
linha de trabalho. Já os Boiadeiros se apresentam na roupagem fluídica do sertanejo, aquele que está mais
ligado à terra. Em algumas partes do país os Boiadeiros também são conhecidos como “Encantados” por
alguns segmentos e fora da Umbanda. Eles não teriam morrido para se espiritualizarem, teriam sido
encantados e se transformados em entidades especiais. Em outros estados brasileiros eles são cultuados
como “Baianos”, mantendo quase a mesma característica de trabalho.
No nosso terreiro, os boiadeiros fazem o trabalho de depuração de energia, sendo sempre chamado
ao final de uma corrente de Caboclos. É sempre bom lembrar que todo médium tem seu Caboclo e o seu
Boiadeiro. Na SEFA o médium aprende a buscar sempre a energia do seu Caboclo, que é a falange que
chefia todo nosso trabalho.
17

Há ainda o Caboclo que adota o nome “Caboclo Boiadeiro”. Esse é um chamado “Caboclo de Pena”
(que se identifica como um ancestral indígena), mas que Boaideiro como seu nome. Um médium que
trabalha com um Caboclo Boiadeiro tem uma outra entidade que trabalha na linha dos Boiadeiros (que em
algumas regiões são chamados de “Caboclos de Couro”).

Os Pretos Velhos

Existe uma curimba que diz que “Os


Pretos Velhos, do tempo do cativeiro, hoje
pisam no terreiro de cachimbo e pé no chão”.
De fato, é assim que esses espíritos
benevolentes se apresentam, trazendo os sinais
característicos de antigos africanos, dos anciãos,
e dos negros que viveram nas senzalas.
Entretanto, não se pode dizer que em sua
totalidade eles são diretamente os mesmos que
sofreram na escravidão. Muitos, no processo
cíclico da reencarnação, passaram por outras
vidas como sacerdotes, filósofos, médicos;
ricos, pobres, etc. Outros nem negros foram,
mas optaram como missão pelo trabalho através
dessa roupagem fluídica, na irradiação de Iofá,
para ajudar àqueles que necessitam da caridade e sempre em busca do progresso espiritual.
Quer dizer que o espírito que hoje se apresenta como um preto velho não foi um escravo?
Nem todo preto velho é preto ou velho. A forma como eles incorporam, curvados, expressa a
qualidade de espíritos que, apesar de altíssimo grau de sabedoria e evolução, trabalham no campo da
humildade e resignação. O peso que parecem carregar não é fruto do cansaço, da idade avançada ou velhice,
mas a ação da qualidade estabilizadora, diante da qual todos se curvam, se tranquilizam e evoluem
calmamente.
Nesse sentido, além da sapiência por meio do arquétipo
ancião e da figura do negro representando a humildade de todos
aqueles que se curvaram forçadamente diante da escravidão,
mesmo aqueles que não viveram como escravos, mas ainda sim
vem na roupagem do preto velho, quem sabe em homenagem,
em resistência e na quebra de paradigmas que se tem a respeito
do “velho” e do “negro” numa sociedade, aonde os valores e
regras são ditadas por uma elite obediente aos interesses de uma
maioria branca, ainda marcada pela herança de tempos onde
predominavam preconceitos étnicos e socioculturais, em
especial entre negros e indígenas.
A aproximação da figura do escravo com a Umbanda se
deu justamente por ser esta uma religião agregadora,
genuinamente brasileira e síntese da construção de nossa nação:
além dos índigenas, com sua pajelança e os brancos, com seus
preceitos cristãos, os cultos africanos aos seus ancestrais e às
forças da natureza, iniciados nas senzalas, evoluíram e
contribuíram para a formação da nossa doutrina. Os pretos
velhos trouxeram consigo a pregação da humildade, da
simplicidade e da serenidade; agregaram experiência e
ensinaram os “zifios” a exercitar a paciência. Atravessaram
preconceitos, como o da primeira incorporação registrada na fundação da Umbanda, em 15 de novembro de
1908, quando Pai Antônio, entidade de Zélio Fernandino de Moraes, foi classificado de “espírito atrasado”
18

ao se manifestar em uma sessão espírita. Antes mesmo disso, toda e qualquer entidade que demonstrasse
traços similares aos de um negro escravo, eram “convidados” a se retirar de tais sessões.

Conhecidos como mandingueiros poderosos, sentados no toco com cachimbo na boca, alguns com
terço na mão, outros utilizam ervas e outros elementos para a limpeza de seus “filhos”. Benzendo, rezando e
irradiando conforto, saúde e harmonização, trazem sempre bons conselhos e palavras de sabedoria, virtude
agregada através de experiências de quem aprendeu a lidar com o tempo da melhor forma: sendo paciente e
tendo fé. Por isso são carinhosamente conhecidos como os “psicólogos” da Umbanda.
Nos trabalhos de consulta, muitas vezes não é necessário falar nada. Só o fato de ouvir uma palavra
tranquila de um preto velho, nos aconselhando e nos auxiliando, já passa para o consulente a paz de espírito
que ele tanto almeja.
A vibração que rege os pretos velhos, em nossa Escola recebe o nome de Iofá. Segundo o Caboclo
Mirim, Iofá (ou “Yophá”, como foi originalmente escrito) é a filosofia. São aqueles que nos vêm passar
ensinamentos por meio de mensagens enigmáticas, das quais as respostas são conquistadas aos poucos pelos
médiuns, à medida que vão trabalhando e progredindo espiritualmente. É a palavra divina que vem dos
“céus” até os homens, do sutil ao denso, para enfim permear e ampliar a consciência dos filhos de fé sobre
tudo que há na relação entre os planos material e espiritual. Em resumo, pura sabedoria de Preto Velho.
19

Introdução
Toda religião possui o seu culto, uma cerimônia criada pelos seus seguidores para reverenciar as suas
divindades. O culto religioso é um ato de ligação direta do mundo terreno com o Astral. Através de uma
liturgia estabelecida no culto, os fiéis louvam os seus deuses, renovam votos de fé e também revigoram suas
forças espirituais.
Um ritual é um conjunto de gestos, palavras e formalidades, geralmente imbuídos de um valor
simbólico, cuja performance é, usualmente, prescrita e codificada por uma religião ou pelas tradições de
uma comunidade.
Podemos conferir em várias religiões,
cerimônias e cultos distintos, cujos rituais
representam o momento de ligação dos seus
seguidores com o Divino, com o Astral
Superior, com a Espiritualidade. Por
exemplo: os católicos realizam as suas
missas dominicais; os evangélicos os seus
cultos de louvor e estudo da Palavra; já os
judeus se reúnem em suas sinagogas para as
tradições básicas e liturgias de prece,
chamadas de Ashkenazitas; e o budismo de
Ritual religioso indígena
Nitiren Daishonin traz duas liturgias
principais – o Daimoku, reuniões de preces em que emana um único mantra, e o Gongyo, conjunto de preces
coletivas.
Na Umbanda, o nosso principal ritual litúrgico é a chamada “gira”, tendo esse nome por imitar o
“giro cósmico” do universo.

Gira de Umbanda
A Gira é o termo dado à principal sessão de uma Casa umbandista, com cânticos, danças, rezas e
passes magnéticos fluidificados. Existem as giras internas, que são fechadas apenas para o corpo mediúnico,
principalmente para os que estão se iniciando na religião, desenvolvendo a mediunidade; e há também as
giras externas, abertas ao público, destinam-se à realização de correntes para as mais diversas finalidades.
A Gira interna, ou Gira de
Desenvolvimento Mediúnico é muito
importante para o Terreiro, pois se trata da
manutenção da disciplina e do aprendizado
pregado na Casa. O desenvolvimento
mediúnico visa desenvolver não só o
contato com as outras esferas, mas antes
desenvolver e aprimorar suas próprias
capacidades internas, melhorando seu
relacionamento com o seu semelhante e
com o mundo que o cerca.
O estudioso Roberto Rasgulaeff
publicou na página da internet do Terreiro
Pai Joaquim de Angola (PR), onde o
médium trabalha: “É no desenvolvimento
que o médium aprende que a mediunidade não é brincadeira. Mediunidade é tão séria que chega interferir na
vida do médium em seus aspectos mais profanos. O fato de alguém ser médium não quer dizer em absoluto
20

que seja melhor do que os outros pelo contrário, mas que ele precisa sempre se melhorar, por si só e pela
comunidade que se comprometeu em ajudar. Existem deveres e obrigações a serem cumpridos perante
o terreiro e a assistência. É necessário que se adaptem de forma disciplinada e responsável ao meio que se
vive.”
Nas Giras abertas ao público o médium tem a oportunidade de colocar em prática tudo o que se
aprende tanto no desenvolvimento quanto nos seus estudos, entrando em sintonia com as suas entidades para
fazer os trabalhos de Umbanda, de acordo com o objetivo de cada sessão.

Elementos e etapas de uma Gira


A Umbanda, como uma religião universalista, possui vários seguimentos dentro da própria religião,
cada qual com seu próprio ritual sagrado. Mesmo com diferentes formas de se realizar um trabalho em sua
ritualística, podemos encontrar elementos comuns na giras de Umbanda, independentemente da linha de
trabalho que o terreiro segue.
Normalmente, antes do início dos trabalhos, o
terreiro precisa ser preparado pelos médiuns. É
importante que nesse momento o médium já se sinta
no meio do trabalho, entrando no padrão vibratório da
Gira que vai se realizar. Qualquer médium que esteja
limpando, varrendo o chão, preparando os tambores,
preparando o defumador, arrumando o gongá, já está
entrando no padrão vibratório da Gira que em breve
será aberta.
Na abertura da Gira, geralmente é cantado o
Hino da Umbanda. O trabalho se abre
com defumação, saudações e firmezas das forças do
Terreiro, e prece de abertura. Tendo a permissão da
egrégora espiritual da Casa, o zelador do terreiro Defumação em abertura de Gira
(equivalente ao CCT na nossa Casa) chama a sua
entidade para que este guia, junto com o seu médium, tome conta de todo o trabalho que será realizado.
Depois, seguindo a ordem hierárquica de cada Casa, seus médiuns vão incorporando seus guias, de acordo
com o tipo de sessão a ser trabalhada: Caboclos, Pretos Velhos, Crianças, Exus, etc. Importante seguir
aquilo que a Casa determina para o trabalho. Em Gira de Caboclos só se trabalha com Caboclos, em Pretos
Velhos com os vovôs e vovós, com as Crianças na Gira de Ibejadas, com os guardiões na Gira de Exu, e
assim por diante. Não se trabalha com o que não está autorizado pelo Chefe do Terreiro. O médium que faz
isso põe em risco o seu trabalho no terreiro e o de toda a corrente mediúnica, podendo haver uma “virada de
banda” (um descontrole da corrente, muitas vezes movidos por espíritos perturbadores), que dá muito
trabalho para se desfazer.
Após isso, começa a Gira, o trabalho que foi proposto para aquela sessão e o atendimento.
Finalizando o trabalho, são cantados os pontos para subida, ou desincorporação dos médiuns. Assim que
desincorporar o seu guia o médium deve buscar manter sempre o equilíbrio, retomando sua consciência
plena e o domínio de seu corpo físico, mantendo-se ainda em prece para que não seja surpreendido por
nenhuma interferência espiritual desnecessária. O objetivo de cada Gira de Umbanda é trazer as boas
vibrações dos espíritos de Aruanda para todos os filhos de fé. Para isso, o médium precisa vibrar nesse
pensamento e mantê-lo firme, antes, durante e depois da Gira.
O tipo de ritual conduzido e os pontos cantados dependem da linha que cada Casa segue, por isso se
vê rituais diferentes em casas diferentes. O branco é sempre a cor mais usada, embora algumas casas
admitam cores nas vestimentas. Há terreiros em que os médiuns usam parte da roupa colorida (Verde na
Gira de Oxossi, Vermelho na Gira de Ogum, quadriculado nas Giras de Preto Velho). Em outros terreiros é
também comum o vermelho e o preto nos trabalhos de Exu. Em nossa Casa o uniforme é predominante em
todas as sessões e Giras. É dever do médium cuidar do bom estado do seu uniforme, e mantê-lo sempre
completo.
21

Como já colocado no Módulo Preparatório, o nosso uniforme consiste em:

 Homens – Macacão, cueca (samba-canção) ou short, sapatos e meias brancas.

 Mulheres – Vestido, anágua, roupa de baixo (calçolão), sapatos brancos, sendo facultativo o
uso da meia.

Atenção: A cor da roupa íntima também deverá ser branco ou cor da pele.

Entendendo o Ritual de nossa Gira


Um ritual é um conjunto de gestos, palavras e formalidades, geralmente imbuídos de um valor
simbólico, cuja performance é, usualmente, prescrita e codificada por uma religião ou pelas tradições da
comunidade. Partindo desse conceito, notamos que as nossas sessões são repletas de elementos e gestos que
pertencem a um ritual (como o Kaô-deci e o Kaô-aci, o ritual de bater cabeça, o ritual de bandeiras nas Giras
Festivas, etc). Mas para aqueles que enxergam a Escola de Caboclo Mirim com uma visão mais limitada
acaba considerando sua disciplina e ritualística apenas como “formas materiais” de uma “Umbanda de
púlpito”.
Como seguidores de qualquer Escola Doutrinária devemos procurar entender os rituais antes de
menosprezá-los, pois se eles foram determinados pelo Comando da Casa, seja o guia chefe ou o próprio
CCT, há uma razão magística para isso.
Em seu livro “Reflexões sobre a Escola de Caboclo Mirim”, o Comandante Chefe de Terreiro Sérgio
Navarro, nos leva a compreender melhor cada parte do principal evento de um terreiro que segue a Escola de
Caboclo Mirim: a Gira Mensal.
“Muito longe de ser um ‘xirê1’ de orixá, as giras são o momento maior da Escola, onde se une todo o
manancial do conhecimento esotérico, dos fundamentos da alquimia, da astrologia, da Cabala e da força e
vibração do culto aos Orixás”, afirma Navarro.
É claro que quando se fala de um ritual único, não se fala de ditar regras e procedimentos, pois cabe
ao Morubixaba/Tupixaba à frente de cada Casa a sensibilidade perante o momento magístico da gira,
absolutamente repleto de variantes e necessidades próprias daquele instante.
Entretanto, há alguns fatores que devem ser observados com muito cuidado na gira. Deve-se haver
um equilíbrio entre ritualística material com o trabalho espiritual para que não se torne um trabalho
“robotizado”, conduzido apenas pela forma com gestos puramente copiados, assim como não se podem tirar
ideias mirabolantes da sua “intuição”. É o famoso ditado “nem muito ao céu, nem muito à Terra”.
A seleção de curimbas, por exemplo, não pode ser feita sempre seguindo fielmente um roteiro, pois
cada gira difere da outra, e em alguns momentos há necessidades de se cantar curimbas diferentes, ainda que
dentro do contexto, para atender a algo dentro da gira. O curimbeiro deve sempre estar focado no tipo de
trabalho que é programado pelo calendário do terreiro, bem como ao seu próprio andamento na hora da
execução.
Ainda citando a obra do CCT Sérgio, o autor cita exemplos de elementos que decidem a qualidade
dos resultados da gira:

 O ambiente físico deve estar de acordo com o que se propõe: terreiro limpo e harmonioso. A
falta ou o excesso de pessoas no espaço físico poderá acarretar problemas relacionados a
conforto e bem-estar dos presentes;
 A música bem executada. Não se trata apenas de “bater tambor” ou “gritar” os pontos. As
curimbas são como mantras, e devem ser executadas de forma clara e afinadas, para que
todos possam entender o que está sendo cantado, deixando-se envolver pelas vibrações da
curimba. Importante também manter a qualidade dos equipamentos de som;

1
Xirê no candomblé é uma estrutura sequencial de cantigas para todos os orixás cultuados na casa ou mesmo pela “nação”,
começando por Exú e indo até Oxalá.
22

 A concentração dos médiuns, esquecendo a vida fora da Tenda e se entregando felizes ao


movimento da gria também faz a diferença. Sabemos que eventos externos acontecem. O
CCT sabe que realmente só em caso extremo a gira não acontecerá, e por isso tomará as
medidas necessária para dar continuidade ao trabalho.

Importante o médium umbandista saber que Umbanda não trabalha com incorporação de Orixá, pois
a nossa visão de Orixá é diferente das divindades do Candomblé. Logo, devemos ter em mente que
trabalhamos com espíritos que canalizam a força e a vibração dos orixás. No caso de médiuns que estão em
posição de comando, como os Morubixabas, Abarés-guassús (SCCT) e Abarés (CT), a troca de energia é
feita sem a troca de entidade.
É possível isso? Sim.
O seu Caboclo, comandando a gira, ou auxiliando o comando, pode canalizar a energia daquele orixá
que está vibrando no momento, sem precisar o médium desincorporar o seu guia. Dessa forma, tanto o
médium quanto o guia permanecem atentos ao que ocorre na gira, podendo agir de imediato em qualquer
eventualidade.
O mesmo pode se dizer dos médiuns Abarés-mirins (SCT) e Bojás-guassús (T). Quando estes estão
tomando conta de um iniciante na gira, é importante que tanto entidade quanto o médium estejam atentos ao
irmão que está sendo desenvolvido. Neste caso, a troca de entidade pode levar a um descuido do médium
orientador, podendo causar um acidente que resultaria numa possível insegurança do médium iniciante a
partir daquele momento.

Formação do Terreiro

Todo médium já deve ter percebido que


antes da Gira começar são dados três sinais. Cada
sinal serve para chamar a atenção do médium para o
início dos trabalhos, devendo ele se colocar ao
máximo em sintonia.
1º sinal: Médiuns no Terreiro. Os médiuns
devem já entrar no terreiro, devidamente
uniformizados, e buscar a sintonia com os trabalhos
que serão executados. Sabemos que muitos têm uma
vida corrida e muitas preocupações. Por isso,
sempre se ensinou que é positivo que o médium
vista sua roupa branca e vá para o terreiro, fazer as
suas preces pessoais, meditar, preparando-se para a
sessão ou gira.
2º sinal: Formação de Terreiro. Todos devem
tomar os seus lugares, de acordo com seu grau. No
caso da gira, cada médium perfilará lado a lado,
com os demais do seu grau, de onde só sairá após a
incorporação do caboclo, com a devida permissão
do comandante da gira. No caso dos Abarés (SCCT,
CT, SCT), sempre se forma com o mais novo no
grau na ponta da fila para o mais velho no grau mais
ao centro.
3º sinal: Início da Gira. Com tudo pronto, a
gira tem permissão para começar. Após o terceiro
sinal, médiuns que chegarem ao terreiro só poderão entrar na formação com permissão do comandante da
gira. Dada a permissão ele vai à frente do terreiro, pedir a benção ao seu Morubixaba e ao Tupixaba (caso
este esteja presente, mesmo que fora da formação), e se posiciona na formação de terreiro, no seu grau.
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Início da Gira e Defumação

A Gira se inicia com a curimba entoando o


Hino da Umbanda e em seguida o Hino da SEFA.
Fazemos uma saudação ao fundador da Umbanda,
Caboclo das Sete Encruzilhadas. Cumprida essa
parte, o terreiro passa pela defumação. Em capítulos
futuros deste módulo falaremos da propriedade das
ervas na defumação. Importante saber que a
defumação segue a irradiação do mês, de acordo com
a nossa Escola Doutrinária (vide Módulo
Preparatório).
Nas tendas mais antigas, a imagem de Oxalá é
envolvida com uma fita cuja cor indica a irradiação
do mês (como mostra a imagem ao lado, no gongá da
Tenda Espírita Caboclo Calmaria). Em nosso
terreiro, optamos por utilizar essa diferenciação de
cores na iluminação da imagem no gongá. Mas, caso não seja possível mudar a iluminação, o elemento da
fita também pode ser utilizado. Assim fica mais fácil para a curimba puxar o ponto de defumação guiando-se
pela irradiação do mês.

Cerimonial de abertura

Chamamos de cerimonial o conjunto de procedimentos ritualísticos que são seguidos para preparar a
execução da gira. Para quem olha de fora, pode parecer um pouco com uma “parada militar”. Porém é
importante ressaltar que o ideal buscado pelo cerimonial é a ordem e a disciplina física da coletividade
presente à gira, para que o trabalho espiritual possa fluir tranquilamente.
Benjamin Figueiredo, médium do Caboclo Mirim, dizia sobre a disciplina no terreiro:
“Aquele que estiver na direção dos trabalhos (CCT) deverá agir cuidadosamente, a fim de não perder
a armação material do terreiro, cuja liturgia provoque um potencial de força suficiente para anular ou, pelo
menos, neutralizar a ação isolada desarmônica que algum elemento (médium) esteja vibrando. Logo, é
necessário que cada médium saiba que a sua presença no terreiro está sendo observada, e que ele só poderá
estar presente como elemento útil àquele ato de magia se estiver colaborando com a sua disciplina.”

Chegada das entidades

As entidades chegarão gradativamente, grau a grau, a partir do CCT. Em nosso terreiro, incorpora-se
primeiro o Tupixaba (CCT que comanda toda a nossa Organização Religiosa), na curimba do nosso Guia
Chefe, Caboclo Sete Estrelas. Todo o restante do terreiro deverá estar na posição Kaô-deci (coroa abaixo),
permanecendo de joelhos até que os trabalhos sejam entregues ao comando. Caso o Tupixaba não esteja
presente, ou não esteja na formação para incorporação, cantamos para saudar o Caboclo Sete Estrelas, e
seguimos direto para a incorporação de Morubixaba (CCTs que comandam as filiais da SEFA, ou CCTs
visitantes), feita na curimba do Caboclo comandante da filial. Aqui, novamente, todo o restante do terreiro
deverá estar na posição Kaô-deci.

Depois vem a incorporação dos Abarés-guassus - SCCTs, na irradiação de Xangô;


Incorporação dos Abarés - CTs, na irradiação das Mães d’Água (sempre abrindo a saudação com
Iemanjá);
Incorporação dos Abarés-mirins - SCTs, na irradiação de Ogum;
E, por fim, os bojás – B, T e I – na irradiação de Oxossi.
24

Quando se entoa a curimba para a entidade o MG/MGA deverá saudar sempre a Linha vibratória da
entidade, e o nome do Caboclo (representando sua falange), na abertura e na finalização da curimba.

Exemplo:

Saravá Oxossi! Saravá o Caboclo Sete Estrelas! Salve o nosso Tupixaba!

Nas matas lá da Jurema


Bis
Eu vi uma estrela brilhar

Era uma estrela de Oxossi


Bis
Anunciando que caboclo vai chegar

Okê, Okê Caboclo


Caboclo Sete Estrelas no gongá
Okê, Okê Caboclo
Vem de Aruanda pra seus filhos ajudar

Saravá Oxossi! Saravá o Caboclo Sete Estrelas! Salve o nosso Tupixaba!

Benjamin Figueiredo orientava a seus curimbeiros que os rituais respeitassem ciclos, movendo
energias que se expandem e se contraem sempre. E isso deve ser observado até na saudação aos guias
quando se cantam suas curimbas.
Após a incorporação de todos, o pessoal
do cerimonial conduzirá a fila de médiuns (já
incorporados com seus caboclos) para que possam
um a um, cumprimentar o grau imediatamente
acima. Assim, o Morubixaba cumprimenta o
Tupixaba. O SCCT cumprimenta o Morubixaba, o
CT cumprimenta o SCCT, e o SCT cumprimenta
o CT. Mas não se trata de um cumprimento
simples de quem chega numa festa e diz: “Oi,
você vem sempre aqui?”. O próprio Benjamin
Figueiredo explica que o Caboclo Mirim
denominava esse ritual como “entrega de
valores”. Em 1952 ele já dizia:
“Muitos filhos de terreiro não sabem, até
hoje, que as trocas de saudações feitas do
Terreiro, entre as entidades, não significam
Entrega de valores de Tupixaba aos Morubixabas, na cumprimentos de boas-vindas ou de despedidas
Gira de aniversário da SEFA entre elas, pois que os Espíritos não vivem essas
formalidades, nem precisam tampouco estar entre
nós para viverem as nossas. A saudação entre as entidades é a Lei de interpretação de valores, materiais ou
espirituais, para a boa preparação dum ambiente.”
Ainda de acordo com o Caboclo Mirim, a saudação é feita dentro de três planos, de acordo com os
valores presentes ao mesmo ato:
 Feita por um valor menor a um maior, sendo um ato de preparação da vibração;
 Feita por valores do mesmo nível, sendo um ato de condensação da energia vibratória;
 Feita por valores maiores aos menores, sendo um ato de distribuição de energia.
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Assim sendo, quando o grau menor vem à frente para saudar o grau logo acima, ele se coloca
preparado para o trabalho a ser realizado, e recebe imediatamente valores de distribuição de energia, para
que sejam passados aos demais. É como se acendêssemos velas através de uma única chama, que fosse
passando de um a um.

A gira girando

Após a incorporação de todos os guias tem início a gira, evocando-se as forças universais sagradas,
não os orixás personificados, mas as forças vibratórias do Universo que se manifestam na Terra através dos
elementos da natureza: Oxossi (matas), Ogum (campos), Iemanjá (mar), Oxum (rios, cachoeiras), Iansã
(ventos, raios), Nanã (chuva, nascente), Ibejadas (todos os elementos), Xangô (pedreira, trovão) e Iofá
(ciência, conhecimento).
A nossa gira tem o movimento anti-horário, acompanhando o mesmo movimento de rotação do
planeta, que nos coloca em sintonia com todas as forças citadas anteriormente, e toda a egrégora formada
pela emanação do pensamento firme e constante dos médiuns e dos guias formarão sobre o terreiro uma
poderosa espiral de luz, na qual orbitam todos que se integram àquele momento sublime de fé. A gira é a
nossa energia em movimento, para que tudo possa fluir harmonicamente.

Nada está parado, tudo se move, tudo vibra.

A gira é dividida em quatro ciclos, em que são


trabalhados os corpos físicos, astral, mental e
espiritual dos médiuns presentes. Por isso sempre
reforçamos a ideia de que a Gira Mensal é o principal
evento do terreiro, e deve ser sempre priorizada pelos
médiuns da Casa. Da mesma forma que Gira Mensal
da Matriz deve ter a presença de todos os integrantes
da Organização, pois potencializa os trabalhos dentro
desses quatro ciclos, recebendo essas forças
diretamente da cúpula espiritual da Casa.
Sob o comando do Tupixaba e condução do
Mestre Guaú, a série de curimbas evocará as forças
cósmicas de acordo com o ritmo e a intenção que o Curimbeiros (Guaús) em Gira Festiva da SEFA
momento pede, levando os participantes ao
envolvimento pleno com seus próprios guias e
fortalecendo, gradualmente, a egrégora espiritual da SEFA.

As seis horas sagradas

Nos tempos de Caboclo Mirim, o relógio se aproxima das seis horas da tarde, e ele realizava a
saudação às “seis horas sagradas”, em um momento de contrição e respeito ao pôr do sol simbólico, que
agora deixa o plano da matéria para reinar absoluto no plano espiritual. Com todos de joelhos no terreiro,
eram evocadas três curimbas, e lida a prece umbandista das dezoito horas:

Com as vibrações sadias da nossa Umbanda


Fortalecidos na fé do bem servir ao próximo,
Sentimo-nos alegres e felizes pelas graças que do Alto recebemos.
Pedimos à fonte divina da criação,
Que sobre toda a Humanidade impere a harmonia do amor e a luz da fraternidade,
E que a paz, a verdade e a justiça se façam sentir entre todos os povos da Terra.
Salve as seis horas sagradas!
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Hoje muitos terreiros da Escola de Mirim aboliram essa prática. A própria Tenda Espírita Mirim já
não a realiza mais. Na SEFA, resgatamos essa tradição, saudando as seis horas sagradas, com todo o terreiro
de joelhos, cantando uma única curimba:

Deus me salve a Estrela guia


Nessa hora de alegria
Viemos aqui pedir a Jesus
E à Virgem Maria
Que aumente as nossas forças
Que possamos alcançar
Muita proteção nesse gongá

Pretos Velhos na gira

Na segunda parte da gira, é hora


da chegada dos Pretos Velhos. Seguindo
a mesma ordem que a gira de Caboclos:
Incorporação de Tupixaba, Morubixaba,
Abaré-guassú. Depois incorporam juntos
CTs e SCTs, e depois os Bojás (T, B e I).
A sequência clássica das linhas evocadas
em pontos cantados originalmente na
Escola de Mirim, eram: Congo / Angola /
Bahia / Minas / Cativeiro / Santo
Antônio. Na época de Benjamin
Figueiredo não se cantava para a linha
das “Almas”, pois ele considerava todas
as linhas como almas, e tinha uma frase
clássica: “Umbanda não trabalha com as Almas, mas para as Almas”. Aos poucos, os terreiros foram
seguindo seus próprios caminhos, respeitando a essência da Escola de Mirim, mas incluíram cantar para as
Almas, entre Cativeiro e Santo Antônio. Na SEFA, em algumas giras, aproveita-se essa transição para fazer
uma breve louvação a Omulu, cantando apenas uma curimba.
Na parte de Pretos Velhos, a assistência, além de tomar passes, pode se consultar com os médiuns
que estão aptos para este trabalho. Porém, enquanto o terreiro estiver cantando para “Cativeiro”, o trabalho
de passe e consultas precisa ser encerrado e toda a assistência deverá ter saído, para que a gira já seja
encaminhada para um trabalho de limpeza astral do ambiente do terreiro, pela evocação das falanges
espirituais que vibram de forma mais densa. Essa limpeza tem o seu ápice ao final da gira de velhos, quando
se cantam as curimbas de “Santo Antônio”.
Há a presença velada da vibração de Exu, fazendo a limpeza do terreiro, revitalizando os presentes.

Entretanto, não se deve confundir “vibração” com “incorporação”.

É Preto Velho que está no comando, permitindo que o médium sinta de forma saudável a força e a
energia do seu guardião, sem a necessidade de incorporar. Exu, nesse caso, auxilia no trabalho dos Pretos
Velhos, que continuam no comando da sessão, e estão cientes de que não há necessidade alguma de
incorporação, devendo o seu médium aprender isso também.

Encerramento da gira

Tendo o terreiro vibrado em “Santo Antônio”, inicia-se o processo de gradual fechamento da gira,
entoando os pontos “Café de Meia” e “Poeira da saia”. Tendo o terreiro “sacudido a poeira”, é dada a ordem
para subida de Pretos Velhos dos médiuns de 1º ao 5º graus, visando o retorno de seus caboclos para o
encerramento da gira em cada linha. Após a curimba de Oxossi para a chegada dos Caboclos (de uma a três
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curimbas) saúda-se a força protetora de Ogum para iniciar o encerramento dos trabalhos, entoando a
curimba de Ogum Tranca-Gira. Em seguida encerra-se a Gira a agradecendo a vibração de cada linha:
Oxossi, Ogum, Águas (Iemanjá), Iofá (Cambinda) e finalizamos com Xangô, senhor do equilíbrio das Leis
Cósmicas, para que todas as energias, agora descondensadas, voltem ao equilíbrio nas mãos do regente do
nosso Universo: Oxalá.
Finalizado todo o trabalho, é hora de arrumar o terreiro, cada um ocupando a linha de seu grau, para
que sejam entoadas as respectivas curimbas, quando irão desincorporar gradualmente todos os médiuns,
respeitando-se a ordem hierárquica do menor ao maior grau.
Com a subida do guia chefe, faz-se o ritual de encerramento da gira, a prece de encerramento; por
fim, todos entoarão o Hino da SEFA e o Hino da Umbanda. É o fim de mais uma tarde/noite de muita
energia e vibração.
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Bojás e Abarés
Desde quando ingressamos no Corpo Mediúnico da SEFA entendemos que sua estrutura de
organização segue os padrões de hierarquia fundamentados na Escola de Caboclo Mirim. Essa escola
iniciática divide o seu corpo mediúnico em sete graus distintos: três graus de iniciação (Bojás), três graus de
chefia (Abarés) e um grau de comando (Morubixaba).
Os bojás são os médiuns nos primeiros graus de aprendizado da Escola de Mirim, aqueles que
sentem o “chamado” interior, o impulso que faz os médiuns quererem respostas, pois muitas são as dúvidas
e os conflitos interiores.
Alguns iniciantes ainda vivem as dúvidas das mais frequentes: “sou eu, ou é a entidade?”; “é normal
vir um outro caboclo?”; “por que ele me balança tanto?”; “por que minha entidade ainda não deu nome? E
quando vai dar?”. Há ainda os médiuns que acreditam que “santo forte” só assim: no calor e no grito, na
força do “orixá” batendo no peito e no bradado do caboclo.
Devemos estar muito atentos a este tipo de manifestação, principalmente no início da caminhada do
médium que pouco ainda sabe sobre mediunidade. Não é difícil para um espírito perturbador ou vingativo se
passar por uma entidade, a fim de confundir o médium. Sem estudo e sem orientação esse médium pode ser
levado à mistificação. Então, para o bojá seria mais fácil acreditar que está levando uma “surra de santo”, ou
que ele precisa atender, imediatamente, às exigências dos guias que acabaram de se manifestar.
Cabe ao CCT ter carinho e paciência, orientar sempre que possível e respeitar as crenças que o
iniciante traz consigo, pois, principalmente os bons exemplos e o tempo irão cuidar desses irmãos. Porém é
importante esclarecer que carinho e respeito não significam anarquia. É necessário exigir disciplina dos
novos membros do corpo mediúnico, para que estes saibam exatamente como se comportar junto à
coletividade do terreiro.
E onde estão, ou onde devem estar esses bons exemplos?
Além do CCT, os Abarés também têm a missão de transmitir aos mais novos os conhecimentos já
adquiridos dentro da Escola, bem como servir de bom exemplo de mediunidade, fraternidade, respeito e
carinho com todos os irmãos do grupo.
Mesmo assim, há irmãos que, colocados nesse grau, caem equivocadamente na prova do “poder”. Ser
um grau de chefia não significa ter mais “poder”, mas sim ter muita responsabilidade.
Por isso, na formação do terreiro para as Giras, os Abarés são colocados numa posição de
“destaque”, ao centro do terreiro, logo atrás do Comando, seguindo a ordem hierárquica da Casa: SCCT, CT
e SCT. E não é por uma questão de status. Ali eles são vistos pelos bojás, os aprendizes, que formam nas
laterais, e também acompanhados pelos assistentes numa visão mais de fora. Logo a conduta de um Abaré
dentro e fora do terreiro deve ser das mais equilibradas e ilibadas.
O médium que chega ao grau de Abaré e Abaré-guassu (CT e SCCT) o alcançou por missão,
merecimento, dedicação à Escola e ao terreiro, e também pela confiança do Comandante Chefe de Terreiro
no seu trabalho. Tudo isso é confirmado pelo guia chefe da Casa, que o promove ao grau e lhe entrega as
devidas responsabilidades. Eles são preparados para comandar, eventualmente, algumas sessões do terreiro.
A manipulação correta do poder é um dos maiores testes que podem ser impostos a qualquer ser
humano. E é justamente quando o médium é colocado na posição de comando, substituindo
momentaneamente o CCT da Casa, que ele passa pela sua maior provação: entender que está representando
um Comando espiritual maior, não apenas se aproveitando de um posto de liderança para mandar e
desmandar.
Algumas vezes os Abarés comandam a sessão na presença do seu Morubixaba, reportando-se a ele
em caso de dúvidas, ou recebendo orientações diretas do CCT. Ninguém está desrespeitando a entidade do
Abaré, ali incorporada no comando da sessão. Mas entendemos que ele é um médium consciente, que
quando testado pode ter dúvidas ou ainda se ver um pouco tenso diante da difícil tarefa de comandar uma
sessão. E a figura do CCT no terreiro é importante, zelando sempre pela disciplina e pelos fundamentos do
terreiro. O mesmo acontece quando o Tupixaba está presente em qualquer sessão em alguma filial da SEFA,
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mesmo na presença do Morubixaba da Casa. É o Comando maior da nossa Organização Religiosa que está
presente, e pode, sim, auxiliar e orientar nos trabalhos do terreiro, mesmo estando desincorporado,
respeitando as entidades ali presentes.
Os Subcomandantes Chefes de Terreiro têm a missão ainda maior de reproduzir o trabalho do seu
Morubixaba na sua ausência. Aquele que tenta fazer diferente só porque tem o comando momentaneamente
em suas mãos, assume a responsabilidades de desorganizar um trabalho que possui fundamentos e ainda
plantar mais dúvidas nos seus aprendizes, principalmente nos médiuns em graus iniciantes. Por isso é
importante sempre nos lembrarmos de uma frase marcante na Umbanda: “Quem não sabe obedecer, jamais
poderá comandar”.
No blog “Universo da Umbanda” um dirigente de um terreiro de São Paulo deixou a seguinte
mensagem para aqueles que ainda não entenderam o significado das responsabilidades num terreiro de
Umbanda:
“Muitos querem estar à frente do comando de uma sessão mediúnica, mas eu digo: querer não é
poder, ainda mais se muitos querem estar por status ou por pura vaidade.
Estar à frente de um ‘congá’ comandando uma sessão não é tarefa nada fácil, nem para o guia chefe
da casa nem para o médium chefe do terreiro. Sabemos como uma sessão começa mas nunca como ela
termina.
O problema de alguns médiuns é quererem estar à frente de onde seus pés não podem alcançar.
Muitos não querem ser doutrinados, não querem estudar, mas querem comandar sem estudos, querem
doutrinar sem serem doutrinados. Acreditam que seus guias lhe deram essa missão e pronto. Abrem uma
casa a esmo.
Missão de Comando é para médiuns que estejam realmente comprometidos com sua missão, e que
buscam preparo para isso, pois a tarefa não é fácil. Por muitas vezes nem os escolhidos aguentam a pressão,
abandonam seus cargos ou não chegam nem a assumi-los. Então, meus filhos, eu digo a vocês: não adianta
pular a janela, pois lá na frente você vai implorar pra entrar pela porta.”
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Introdução
Muitos assistentes, médiuns e até dirigentes acham que os Exus são espíritos que trabalham tanto
para o bem quanto para o mal. Que eles estariam dispostos a atrapalhar a vida de alguém, ou amarrar uma
pessoa a outra, em troca de agrados. Essa visão equivocada sobre os Exus conduz os trabalhos de terreiro
para o baixo espiritismo, com a aproximação de “quiumbas” (obsessores). Os espíritos mistificadores estão
sempre prontos para seduzir alguém pelas ambições e anseios materiais.
Ao começarmos a estudar esse assunto, veja a imagem abaixo e pergunte-se: É assim que você
acredita que seja Exu?

Quem é Exu?

Antes de entrarmos no assunto, temos que lembrar que Exu NÃO É O DIABO!
Exu, entidade ainda tão mal compreendida por nossos irmãos encarnados e por isso mesmo, tão
relegada a posições de inferioridade moral, é um dos nossos focos neste capítulo.
Este espírito/vibração tem algumas definições que por sua vez determinam seu trabalho na Umbanda,
de maneira particular, e para a Humanidade em geral.
Apesar de ser um espírito num grau de evolução maior do que o nosso plano terrestre, Exu é a
energia que mais se aproxima da matéria. Por essa razão, muitos irmãos ainda confundem os trabalhos de
Exus com os de espíritos desencarnados arruaceiros, zombeteiros e indisciplinados. Muitos utilizam a
denominação “Povo de Rua” para se referir a Exu, considerando que seriam espíritos que adoram farras e só
trabalham na boemia.
Recentemente também ouvimos muito falar em Exu como “entidades de esquerda”, como se
houvesse algum lado bom e mau para se trabalhar.
Muitos são os terreiros que transformam a Gira de Exu num samba, pagode de fundo de quintal, com
direito a bar, petiscos e cerveja gelada. Outros chegam a realizar essas giras em boates.
Temos que começar a mudar nossos conceitos de Exu e Pomba Gira. Vamos a partir de agora ver o
Exu e a Pomba Gira como aquela polícia que guarda e toma conta das ruas obedecendo sempre uma
hierarquia de comando, que é o Exu chefe do Terreiro, e acima dele os guias chefes da Casa.
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Dentro da linha de Exu também se trabalha com as entidades


femininas, chamadas de “Pomba-giras”, uma variação do termo
originário da Angola “Bombogira”. Esse termo era utilizado para
designar as mulheres que eram rainhas de tribos.
Assim como devemos ter um conceito mais respeitoso do Exu,
devemos também dedicar mais respeito aos trabalhos das Pombas
Giras, deixando de encará-las como mulheres vulgares e da vida
(como mostra a equivocada imagem ao lado), que só vêm “para
arranjar casamento” ou o que é pior, para desfazer casamentos, mito
absurdo e vulgar, criado por aqueles desconhecem o verdadeiro
trabalho de Umbanda. O trabalho da Pomba Gira é sério. É também
um trabalho de descarrego, de limpeza, de união entre as pessoas. De
abertura dos caminhos da vida, seja do ponto de vista material, mental
ou espiritual.

Onde trabalham os Exus?


Muitos irmãos pensam que Exu é um habitante das zonas de baixa vibração. E por isso muitos os
chamam de “Povo de Rua”, por acharem que a rua é a sua morada. Claro que isso é uma fantasia criada por
pessoas que confundem Exus com quiumbas (espíritos atrasados) e catiços (manifestações espirituais de
baixíssima vibração). Ao contrário, os Exus atuam nesses ambientes justamente para resgatar esses espíritos
que ainda se encontram nas sombras. Para isso alguns Exus precisam “se disfarçar” como eles, evitando o
afastamento e a resistência desses espíritos.
Mas isso não quer dizer que o Exu assuma uma postura semelhante à de um catiço em um terreiro,
provocando desordem, usando da indisciplina ou ainda dando “surra” no médium. Se o médium, ao
incorporar um Exu, se comporta dessa maneira, pode estar entrando em sintonia com quiumbas, ou com
espíritos mistificadores (inteligências utilizadas para o negativo). Esse médium precisa estudar, evoluir e se
doutrinar, para poder trabalhar com suas entidades, caso contrário, estará colocando em risco seu trabalho
mediúnico e até mesmo da corrente.
Mas então, o que seriam essas áreas de atuação de Exu: Encruzilhada, Figueira, Porteira, Calunga?
Segundo explicação do Caboclo Sete Estrelas, a Encruzilhada não é o cruzamento de ruas que nós
temos, mas os diversos caminhos diferentes que são colocados em nossos caminhos espirituais. Quantas
vezes não nos deparamos como que no meio de uma Encruzilhada, sem saber que rumo tomar? É nessas
horas que um Exu da Encruzilhada nos chama para nos mostrar o caminho, nos protege para que não
tomemos a direção errada. Mas caso isso aconteça, temos a oportunidade de voltar atrás, e seguir pelo
caminho correto.
A Figueira vem de uma história contada pelo Mestre Jesus, da Figueira que não dava frutos. O texto
nos esclarece que a relação com a Figueira está no trabalho do médium. Aquele que tem mediunidade e não
desenvolve, é como uma Figueira que não dá frutos. Uma figueira pode ser alta, forte, bonita, com folhagem
exuberante e até flores, mas, se não tiver fruto, não estará cumprindo sua missão. Então, Exu atua na
Figueira para nos dar consciência de nossas missões em nossa passagem pela Terra.
O Exu da Porteira não está guardando somente a entrada física do terreiro. Ele trabalha as energias
trazidas por cada irmão que vai se aproximando da Casa Espiritual, mesmo que este ainda não tenha
chegado ao local. Está presente em todos os trabalhos auxiliando os guias que atuam na tronqueira do
terreiro. Na nossa Casa, fazemos uma firmeza para o Exu da porteira, deixando um recipiente com marafo
(cachaça), para que o álcool ajude a depurar as energias deletérias antes que elas cheguem ao terreiro. E
também firmamos uma vela, não para os Exus, mas para que seja sinalizado a qualquer espírito que ali é
uma casa de luz, como se fosse um farol aceso a guiar os espíritos para a nossa Casa.
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Por que na SEFA cantamos para Calunga e não para o Cemitério?


É preciso entender que o fato de alguma entidade ser da Calunga não quer dizer que ela vá atuar no
cemitério. A palavra calunga vem do termo quimbundo “ka’lunga” e significa “imensidão, grandeza,
eternidade”. Logo qualquer espírito da Calunga são aqueles que atuam nos portais para a eternidade. Por isso
que, para nós, esses portais estariam localizados na “Calunga grande” (mar) e na “Calunga pequena”
(cemitério). Mas isso não quer dizer que tudo que está no cemitério é da calunga.

O trabalho de Exu

Devido à imensa diversidade de trabalhos efetuados pelos nossos irmãos vamos resumir, por ordem
do Comando Espiritual de nossa Casa, as atividades dos irmãos exus para fins didáticos, mas sem ressaltar
que seu trabalho vai muito além daquilo que estamos informando:

1. Guarda – Desde muito antes dos trabalhos dentro de um terreiro começar a ser feito nossos irmãos exus já
realizam uma “batida policial” nas vizinhanças da casa, criando uma barreira para que não seja permitida a
entrada de espíritos contrários ao bem. Os médiuns, por sua vez, já estão sendo acompanhados e guardados
pelos exus de suas coroas para que cheguem ao local com a devida segurança e para que retornem a seus
lares também protegidos.

2. Limpeza fluídica – São especialistas em desagregar miasmas e outras sustâncias fluídicas nocivas,
produzidas por mentes em desequilíbrio, tanto de encarnados quanto de desencarnados. O acúmulo dessas
energias negativas muitas vezes causa problemas de ordem física e para que outros espíritos especializados
em cura possam trabalhar é necessário que os exus façam primeiro a limpeza do material mais pesado,
agindo como verdadeiros profissionais de enfermagem.

3. Resgate – Apoio ao resgate de irmãos que se encontram nas regiões umbralinas, destruindo pontos que
servem como base para espíritos vinculados ao mal que mantém sofredores em cativeiro.

4. Transporte – Nas sessões de passe e irradiação, nas situações em que se fizer necessário, é exu quem faz a
triagem para saber qual espírito está em condições de ser atendido, para depois ser encaminhado a
tratamento.

5. Desmanche de trabalhos de baixa magia, utilizando para isto todo um conjunto de símbolos que trazem
em si grande força que é capaz de desmantelar nódulos de energia negativa acumulada. Um exemplo
prático: Ao riscar seu ponto com a pemba Exu está invocando forças do Astral que irão lhe ajudar a
desmanchar aquilo de negativo e impuro que está impregnando a atmosfera fluídica de um local ou
indivíduo, como se içasse uma bandeira a indicar que ali o bem há de prevalecer, pela fé e pela força mental
empregada.

6. Aconselhamento – Nas consultas com exus, temos o prazer da palavra desses amigos tão experientes nas
coisas próprias da vida terrena e do astral. Previnem-nos quanto aos erros em nossas atitudes; abraçam-nos
em momentos de angústia, sempre com palavras de encorajamento e fé e se alegram conosco em momentos
de felicidade.

Então por que Exu, se é assim tão evoluído, se manifesta nos terreiros de maneira tão acintosa, por
vezes assustadora, jocosa, debochada ou séria demais? Por quê tantos trejeitos?
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Bolo e decoração de uma festa de Maria Padilha, realizada dentro de uma boate: exagero ou visão
distorcida do trabalho de Exu?

A resposta a esta pergunta é o fato de que há muito exagero por parte dos próprios médiuns, que
ainda têm em seu inconsciente o Exu como um ser extremamente atrasado, que fala palavrão, bebe pra se
satisfazer e que só existe pra resolver os problemas materiais dos filhos.

Qual a ligação de Exu com Santo Antônio?


Em alguns terreiros a imagem de Exu está EQUIVOCADAMENTE ligada à imagem do DIABO
CRISTÃO. Isso faz com que a nossa religião caia no misticismo em que se trabalha “tanto para o bem
quanto para o mal”.
E parte da culpa desse preconceito acerca de nossa religião é dos próprios umbandistas, que aceitam
essa imagem, que são capazes de produzir imagens bizarras com Exus em formas grotescas remetendo a
uma invocação do mal. E agora, com a massificação das redes sociais, são muitos os que utilizam esses
canais para publicar mensagens e imagens utilizando o nome de Exu de forma vulgar, vingativa ou ainda
para arrumar alguma discussão ou briga.
Mais uma vez afirmamos: EXU NÃO É O DIABO!!!
Por outro lado, há também o sincretismo com a imagem de Santo Antônio. E de onde vem essa
ligação?
Antônio de Pádua era um grande estudioso, lecionou em várias universidades e foi considerado o
primeiro doutor Franciscano da Igreja Católica. Apesar disso, vivia na humildade que a Ordem Franciscana
pregava. Considerado por muitos como aquele que conhecia a ciência dos anjos, depois de canonizado pela
Igreja, seus devotos passaram a reportar milagres cujas ligações eram dotadas de intensa sensibilidade
humana, que Exú compreende muito bem. Acabou também responsável pelas ligações amorosas, sendo
conhecido aqui no Brasil como “santo casamenteiro”.
Santo Antônio hoje é visto como um dos grandes santos do Catolicismo, recebendo larga veneração e
sendo o centro de rico folclore. Tem relações estreitas com Exú devido ao dom da
oratória que Exú comanda, e pelos milagres acerca das ligações amorosas que tanto Santo Antônio é
conhecido, assim como Exú também.
Por este motivo o dia 13 de junho é um dia propício para louvar a Exú e pedir-lhe, não que arrume
marido ou esposa, mas que interceda por nosso amor, por nossa união amorosa ou que abra nossos caminhos
para o amor.
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Zé Pelintra é um Malandro da Lapa? E o que é Malandragem?


Desculpe-nos acabar com essa fantasia, mas Zé Pelintra NÃO VIVEU NA LAPA CARIOCA, não
jogou carteado com os malandros da cidade, nem mesmo frequentava os bares do bairro. Então,
primeiramente, vamos quebrar esse mito de que qualquer trabalho com Zé tem que ter open bar, cerveja,
carteado ou jogo de dados... e o que é pior: grupo de pagode no lugar de curimba.
O trabalho dessa entidade é muito sério, e por causa da sua alegria foi confundido com farra por
aqueles que apreciam um trabalho solto sem disciplina.
O culto a Zé Pelintra se originou no Catimbó e nos batuques das regiões norte e principalmente
nordeste. Lá ele é um Mestre Juremeiro, entidade guardiã do culto da Jurema – uma bebida que é servida aos
médiuns e seguidores do culto nas festividades da Jurema e do Catimbó.
Na medida em que o Catimbó sai da área rural e penetra cada vez mais na área urbana encontra-se
com a Umbanda e os dois cultos acabam se fundindo em algumas regiões. É neste momento que o Zé
Pelintra “entra para a Umbanda”. Porém no Nordeste do Brasil ele ainda mantém a figura de Mestre, sendo
os trabalhos das Casas abertos e encerrados com louvação a esta entidade.

À esquerda, a imagem de Zé Pelintra – Mestre Juremeiro – utilizada no culto do Catimbó; À


direita, a imagem de Zé Pelintra mais famosa no Sudeste, com os Arcos da Lapa ao fundo.

Pelas características festivas em torno da entidade, principalmente com o culto da Jurema, ao ser
trazido para o Rio de Janeiro, o culto a Zé Pelintra se incorporou ao culto aos Exus, criando-se assim uma
linha complementar de trabalhos – a linha dos Malandros. Porém a falta de informação dos adeptos fez com
que se confundisse culto e imagem com farra, bebedeira, indisciplina e exageros.
Apesar de ser um espírito que representa a alegria da boemia, a malandragem no sentido mais
simples, a Linha dos Malandros é composta por entidades de luz, que trabalham com seriedade e mesmo
com a fama distorcida que possuem, provam que não é bem assim que as coisas funcionam. Os malandros
cobram muita responsabilidade de seus médiuns, cobram por seriedade, disciplina e aprendizado entre outras
virtudes.

Exu não é o Diabo


E para finalizar uma frase que todo Umbandista deve ter em mente: Exu não é o Diabo. Se hoje em
dia nossa religião ainda é demonizada, e os nossos guias desrespeitados e confundidos como algo
demoníaco, a culpa em parte é do próprio umbandista, que ainda insiste em cultuar a imagem de Exu como o
diabo católico, com seus chifres e seu rabo. Ou ainda a pomba-gira como mulher vulgar, muitas vezes com
os seios de fora.
Muitos são os terreiros e filhos de Umbanda que equivocadamente cantam curimbas associando o
nome de Exu ao diabo, como se Exu fosse uma entidade utilizada para trabalhos de vingança. Isso não
acrescenta em nada ao médium, e nem á Umbanda, e ainda suja a nossa imagem.
Lembremos, para que os demais irmãos possam nos respeitar, o respeito e a disciplina devem partir
primeiro de nós mesmos.
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Salve Mirim, nosso Chefe do Oriente!


Quando ele chega é pra salvar a sua gente.
(Ponto de Caboclo Mirim)

Introdução

Como acompanhamos anteriormente, neste e em outros módulos de estudos, a espiritualidade


encontra diversas formas para se comunicar conosco, e assim realizar um trabalho conjunto, através dos
médiuns, buscando a evolução espiritual de encarnados e desencarnados.
Conferimos também as variadas formas de apresentação do espírito, utilizando a roupagem fluídica
específica para determinado trabalho. É o caso dos espíritos que nos terreiros se apresentam como
“entidades de Umbanda”, porque estão em uma faixa de vibração astral boa para o trabalho na seara
umbandista. Esses espíritos são levados a fazer parte de uma falange, um agrupamento de espíritos que
atuam em uma determinada linha de trabalho. Os estudiosos do assunto acreditam que, pelo seu grau de
evolução espiritual em comparação com a faixa vibracional da Terra, os espíritos que se apresentam como
entidades de Umbanda dificilmente voltariam a uma reencarnação, e sim, seguiriam, através da evolução,
para um plano espiritual superior.
As entidades se dividem em vários grupos, de acordo com a suas afinidades vibratórias: Falangeiros
de Orixá, Caboclos, Pretos Velhos, Exus e Pomba-Giras, Ibejadas, entre outras entidades que atuam de
formas diversas.
Cada falange recebe o nome de seu chefe e cada espírito dentro desta falange, atende por este mesmo
nome. Por isso é comum vermos no terreiro dois ou mais Caboclos, Pretos Velhos, Crianças e demais
entidades que se apresentam com o mesmo nome.

Exemplos: Cabocla Jurema da Mata e Cabocla Jurema da Cachoeira;


Vovó Maria Conga do Cruzeiro e Vovó Maria Conga das Almas;
Pedrinho da Cachoeira e Pedrinho da Praia; entre outros.

Quando a Umbanda foi fundada, em 1908, pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, apenas Caboclos e
Pretos Velhos faziam parte da corrente astral criada inicialmente pelo mentor de Zélio de Moraes. Com o
passar dos anos, outras frentes de trabalho foram se apresentando, constituindo uma egrégora formada por
sete linhas vibratórias. Dentro dessas sete linhas, outras falanges foram convocadas para auxiliar nos
trabalhos da corrente de Umbanda, surgindo assim os Boiadeiros, os Marinheiros, o Povo Cigano, o Povo do
Oriente, etc. Nem os Guardiões Exus e Pombas Giras, estavam presentes, de modo explícito, na organização
espiritual inicial da Umbanda.

Como surgiu a Linha do Oriente


Apesar de não ser muito comum, é possível acontecer que um mesmo espírito, embora seja uma só
vibração, venha em diversas falanges, com diferentes nomes, conforme sua missão espiritual. Um espírito de
certo grau de evolução pode se desdobrar na vibração, ou seja, aumentá-la ou diminuí-la, obviamente que
dentro de um certo limite pré-estabelecido. Desta forma, essa entidade pode se apresentar ora numa faixa,
ora em outra. Por exemplo: Se ela atua normalmente sob a linha do Oriente, pode num desdobramento de
vibração, apresentar-se na forma de um caboclo, embora conserve também suas características essenciais.
Necessário também é, compreender-se à diferença entre hierarquia terrena e evolução espiritual.
Algumas pessoas pensam que a posição hierárquica de uma entidade corresponde à sua posição na vida
física anterior. Isto não corresponde à verdade porque as falanges não se agrupam conforme as raças ou
costumes da vida terrena, mas sim de acordo com o grau de evolução espiritual e afinidade vibratória.
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Desta forma, um espírito pode se apresentar, por exemplo, como um caboclo, apenas para ter um
melhor acesso a um médium e a seus consulentes.
A Linha do Oriente é parte da herança da Umbanda brasileira. Ela é composta por inúmeras
entidades, que se apresentam utilizando a roupagem fluídica de um mestre de origem oriental. Apesar disso,
muitos espíritos desta Linha podem apresentar-se como caboclos ou pretos velhos.
Embora ainda sejam poucos os terreiros
que trabalham abertamente com esta Linha, e
muito pouco se fala ou estuda sobre ela, há
registros históricos de uma presença bem atuante
desta linha nos trabalhos de Umbanda, desde o
seu início.
Segundo uma matéria publicada pelo
médium Norberto Peixoto na revista “Caminho
Espiritual”, depois que a Umbanda foi anunciada
em 15 de novembro de 1908 pelo Caboclo das
Sete Encruzilhadas, este espírito, além de
convocar para o labor o Preto-Velho Pai Antônio,
trouxe também outro colaborador astral que
tivera encarnação como sacerdote no continente
asiático. Apresentou-se este espírito com o nome
de Caboclo Orixá Malé, atuando na irradiação
vibratória de Ogum, entidade de muita luz e
força, e experiente no combate à baixa magia.
A Linha do Oriente tornou-se mais popular entre os anos de 1950 e 1960, quando as tradições
budistas e hindus se firmaram entre o povo brasileiro. Os imigrantes chineses e japoneses, sobretudo,
passaram a freqüentar a Umbanda e trouxeram seus ancestrais e costumes mágicos. Mas nem todos os
espíritos são orientais no sentido comum da palavra. Esta Linha procurou abrigar as mais diversas entidades,
que a princípio não se apresentavam utilizando roupagens fluídicas que se encaixassem na matriz formadora
do brasileiro (índio, português e africano).
Sobre este assunto, Norberto Peixoto, em seu texto, também explica: “Temos de refletir os motivos
dos espíritos manterem-se ligados às etnias terrenas. Sendo espíritos isto não seria dispensável? Estamos
falando de intercâmbio mediúnico entre planos dimensionais diferentes, em que se impõe comunicação
entre dois lados da vida, portanto, temos de considerar os aglomerados espirituais em torno do planeta e as
migrações geográficas entre as encarnações. Como a maioria dos espíritos que atuam no astral tem
compromisso evolutivo com a mediunidade e com aqueles que os recepcionam, por vezes optam por
determinada forma de apresentação mais afim com seu compromisso evolutivo”.
Aos poucos, outras linhas foram se unindo à Linha do Oriente, formando uma corrente de trabalho
auxiliar, como é o caso do Povo Cigano, que ainda hoje, em algumas casa, é confundido com a falange de
Exus e Pomba-Giras. Esses espíritos, também dotados de profundos conhecimentos de magia, foram aos
poucos ganhando a simpatia dos seguidores da Umbanda, que hoje em dia já há casos de terreiros de
Umbanda chefiados por espíritos da Linha dos Ciganos.
O médium e escritor Emídio Jorge escreveu no Blog ―Espada de Ogum‖ que a falange do Povo do
Oriente seria composta por espíritos que atuam de modo efetivo nos processos de curas físicas, emocionais
e espirituais. Porém não são, necessariamente, espíritos de médicos convencionais, como podemos pensar.
Mas espíritos de altíssimo grau de evolução, profundos conhecedores de química, biologia, psicologia,
física, medicina oriental, técnicas de curas milenares com uso e domínio da energia mental e espiritual
sobre energia condensada da matéria.
Essa linha do Povo do Oriente, além de atuar no movimento umbandista, também está presente em
outras casas, como Centros kardecistas e outras Fraternidades, sendo denominados de “Mestres” e
“Mestras”.
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Os Trabalhos do Povo do Oriente


Assim, as entidades que se apresentam como orientais no movimento umbandista trabalham na
missão de unir a sabedoria oriental com os conhecimentos científicos orientais. Em sua matéria, Norberto
Peixoto, que já psicografou diversas obras sob a orientação do espírito Ramatis, enfatiza a verdadeira missão
desses espíritos na esfera umbandista: “Os espíritos orientais estão na Umbanda com a missão de
amalgamar os conhecimentos iniciáticos milenares do Oriente com o cientificismo racionalista ocidental,
sem perda do foco, que é tornar os corações endurecidos mais amorosos. Eles procuram fecundar nas
mentes os reais valores espirituais, morais e éticos, em consonância com os ensinamentos de Jesus e de
todos os avatares do Oriente”.
Embora chamada de Oriente, esta Linha agrega espíritos que estiveram encarnados em diversos
continentes de nosso planeta e ainda de outros sistemas do Cosmos. Emídio Jorge acrescenta em seu blog
que o Povo do Oriente é a linha de trabalho com o poder de acessar as egrégoras de pura luz de Mestres
Ascencionados, Profetas, Santos e Tronos Angelicais: “Eles usam como elemento principal em seus
trabalhos, o ectoplasma dos médiuns e assistentes presentes, pura e simplesmente. Raramente usam os
elementos materiais convencionais utilizados por entidades de outras linhas da Umbanda. São Seres de
pura Luz, 'literalmente falando' que nos transmitem sensações de profunda paz, quietude mental, amor
universal, fé e confiança”.
Segundo a médium e escritora Áurea Oliveira, a linha do Povo do Oriente é uma das falanges que
mais tem enviado espíritos à Corrente Astral de Umbanda, razão pela qual também muitos terreiros vêm
adquirindo conhecimento e “abrindo as portas” para os espíritos que atuam nessa linha. Ela ainda acrescenta
que esses espíritos “são muito discretos em sua forma de se apresentar e trabalhar, e estas formas mudam
de acordo com a linha de trabalho ou local em que irão atuar.”
Os Mentores de Cura se dirigem ao raciocínio, conduzindo o consulente, muitas vezes, a
compreender bem as causas de suas enfermidades e a necessidade de mudança nessas causas, bem como a
necessidade de seguirem à risca os tratamentos indicados.
São espíritos que quando encarnados foram Médicos, Enfermeiros, Boticários, Orientais (que exercem sua
própria medicina desde bem antes das civilizações ocidentais), Religiosos (monges, freis, padres, freiras,
etc.), ou exerceram qualquer outra atividade ligada a cura das enfermidades dos seres humanos, seja por
métodos físicos, científicos ou espirituais.

O Povo do Oriente e os Orixás


O Povo do Oriente não se constitui em linha ou irradiação tal como as de Oxossi, Iemanjá, Ogum,
etc. Esta falange tem como patrono um espírito irradiador de muita luz, e que em sua última encarnação
conhecida recebeu o nome de João Batista, aquele que batizava o povo e anunciava a chegada do Messias.
Logo, na Escola de Caboclo Mirim, que também é um Chefe do Oriente, e trouxe muitos conhecimentos
iniciáticos para a Umbanda, a Linha do Povo do Oriente está ligada diretamente à vibração de Xangô.
O símbolo dos falangeiros do oriente é o sol, astro-rei, cujo nascer acontece no oriente ou ponto
cardeal leste, e a sua cor é o amarelo, que representa sabedoria e elevação espiritual. Por isso, é comum ver
em pontos riscados de entidades ligadas ao Oriente elementos como sol, estrela de seis pontas (estrela de
Davi), etc.

Cuidados e preparações de médiuns e assistentes


Apesar dos fatos históricos comprovarem a atuação de espíritos considerados da Linha do Oriente
nos trabalhos de Umbanda, pouco se fala e também se cultua esse Povo nos terreiros. Em razão disso,
poucas são as informações que os irmãos de fé têm sobre esses espíritos e seus verdadeiros propósitos dentro
dos trabalhos de caridade na Umbanda. Essa falta de informação leva médiuns e assistentes aos caminhos
perigosos do mediunismo e da mistificação.
Vale a pena esclarecermos a médiuns e assistentes que em alguns terreiros, por conta de supostas
atividades de espíritos de origem oriental, alguns ―médiuns‖, dizendo-se manifestados por estes espíritos,
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estão se colocando em posição de mãos e pés cruzados, ou seja em posição de meditação ou de Lótus,
usando turbantes e sentados em tapetes coloridos, num verdadeiro espetáculo teatral, atraindo assim os
descuidados. Há ainda aqueles que promovem vidências fantásticas, resgates de almas gêmeas, troca de
karmas, entre outros fenômenos, inclusive com anúncio em jornais.
“Afirmamos que os espíritos orientais da genuína Umbanda não têm o mínimo interesse e
necessidade de se apresentarem de tal forma espalhafatosa. Lamentavelmente, virou moda para médiuns
vaidosos dizerem aos quatro ventos que trabalham com espíritos orientais, enquanto novatos anseiam
ardorosamente o mentor indiano de turbante.”, alerta o médium Norberto Peixoto.
Agrava-se a situação pelo enxerto exagerado de termos estrangeiros nas comunicações escritas e
faladas, fazendo com que muitos consulentes não entendam nada do que está sendo orientado.
Estamos no Brasil, falamos português e o que os espíritos mentores ganhariam falando difícil com termos de
outra língua? Há que se falar claro e direto aos corações das almas aflitas, e quanto mais sabedoria mais
simples são os espíritos.

O Povo Cigano na Umbanda


A linha do Povo Cigano é uma das que
despertam curiosidade para alguns umbandistas,
para outros uma rejeição por acharem alguns rituais
desnecessários ou carnavalizados demais. De fato o
trabalho desse povo já começou na Umbanda de
maneira distorcida, e quanto menos estudamos, mais
fantasiamos sobre eles.
Curiosamente, essa linha começou a ganhar
notoriedade nos terreiros em meados dos anos 1990,
quando a televisão brasileira mostrava uma
telenovela muito popular que trazia em sua trama a
cultura cigana de maneira mais fantasiosa e
folhetinesca, cheia de danças, fogueiras, comidas,
Os ciganos da ficção na novela “Explode Coração” etc. As pessoas passaram a adotar esse tipo de
(1995) trabalho no terreiro, copiando apenas a festa. Mas e
por trás da festa? Não há trabalho?
Primeiro devemos ter em mente que o Povo Cigano que se apresenta nos terreiros não é igual aos
ciganos de ruas, de banquinhas de tarô ou de circo de lona. Assim como quase todas as entidades que
baixam nos terreiros de Umbanda, trata-se de espíritos ancestrais elevados e dotados de sabedoria e
conhecimento de magia.
Um texto publicado no blog “Povo Cigano na Umbanda” nos esclarece:
“Sempre se faz necessário deixar claro que uma coisa é ‘Magia do Povo Cigano’, ou ‘Magia
Cigana’, e outra coisa bem diferente são as Entidades de Umbanda que se manifestam nesta linha de
trabalho. Existe uma pequena semelhança somente no poder da Magia, mas suas atuações são bem
diferentes, pois as Entidades de Umbanda trabalham sob o domínio da Lei e dos Orixás, conhecem Magia
como ninguém e, principalmente, não vendem soluções ou adivinhações.”
Os espíritos que se apresentam como Ciganos são entidades que há muito tempo trabalham na
Umbanda, mas que foram confundidos com Exus. Isso porque em muitos terreiros haviam Exus Ciganos e
Pombas-Giras Ciganas, e pouco se conhecia sobre a falange do Povo Cigano.
Aos poucos eles foram aparecendo em um trabalho separado e totalmente diferente do Povo
Trabalhador. Normalmente se manifestam sob domínio da linha do oriente. Isso é possível pelo fato da
energia de trabalho ser a mesma, o que muda é a forma de manipular os fluídos. O trabalho do Povo Cigano
é voltado mais para a harmonia e para a prosperidade não somente do indivíduo, mas da sua família como
um todo.
Os espíritos que se manifestam como Ciganos na Umbanda não trabalham a serviço do mal ou para
resolver nossos problemas a qualquer custo, mas é importante saber que eles dominam a magia e preservam
a liberdade e, tanto quanto em qualquer outra linha de trabalho da Umbanda, teremos aqueles espíritos que
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não agem dentro do contexto da Lei, os chamados ‘quiumbas’, que se encontram espalhados pela escuridão
e a serviço das Trevas. Portanto, é imprescindível o bom nível espiritual do médium para trabalhar com essa
linha para que não atraia esses tipos de espíritos pela Lei da Afinidade.
Entre as legiões de Ciganos os nomes mais conhecidos são: Cigano Pablo, Wlademir, Ramirez, Juan,
Pedrovick, Artemio, Hiago, Igor, Vitor e tantos outros. Da mesma forma temos as ciganas, como:
Esmeralda, Carmem, Salomé, Carmencita, Rosita, Madalena, Yasmin, Maria Dolores, Zaira, Sunakana,
Sulamita, Wlavira, Iiarin, Sarita e muitas outras também.
Por que o colorido na Gira dos Ciganos?
Os Ciganos usam muitas cores em seus
trabalhos, mas cada Cigano tem sua cor de vibração
no plano espiritual, uma cor de identificação. Na
SEFA, na Louvação que fazemos a Santa Sara
(Padroeira do Povo Cigano, cujo dia é celebrado em
24 de Maio), utilizamos muitas cores na mesa, além
de acendermos velas com sete cores distintas.
Também por determinação do comando espiritual da
Casa, é permitido aos médiuns de 5º grau em diante
utilizar um lenço liso, na cor escolhida pelo seu
cigano.
É comum também os Ciganos utilizarem
incenso no passe e na irradiação. Importante: sempre
consulte o seu morubixaba antes de trazer qualquer
elemento, para saber se é permitido ou não. Lembre-
se que temos uma Escola Doutrinária, e para realizar
o trabalho com o Povo Cigano, não saímos da nossa
Escola, não nos fantasiamos nem mesmo transformamos o terreiro numa tenda cigana folclórica. Ao
contrário, trazemos o trabalho para dentro, mostrando que a Umbanda de Caboclo Mirim também é
agregadora de outros trabalhos, e pode nos ensinar a trabalhar com outras linhas dentro do que seguimos da
raiz da Escola da Vida.
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Os tempos difíceis
Alguns anos após a sua fundação, o culto a Umbanda se via marginalizado em meio à opressão
praticada pelo próprio Estado. A repressão ao dito baixo espiritismo era bastante intensa, mas a falta de
entendimento das autoridades fazia com que muitas instituições e religiões ficassem no mesmo “caldeirão”.
A Maçonaria, a Umbanda, o Espiritismo de Kardec e principalmente os cultos afro-brasileiros eram
reprimidos com vigor.
Pior ainda durante o período da ditadura Vargas, quando a polícia agia violentamente, com a
justificativa de que a macumba tinha ligações com a subversão, servindo até para dar cobertura a grupos
comunistas, segundo relatos da época. Uma lei datada de 1934 colocou todos esses grupos sob a jurisdição
do Departamento de Tóxicos e Mistificações da Polícia do Rio de Janeiro, na seção especial de Costumes e
Diversões, que lidava com problemas relacionados com álcool, drogas, jogo ilegal e prostituição. Praticar a
Umbanda era então uma atividade marginal (perdurou com tal classificação até a reorganização do
Departamento de Polícia do Rio, em 1964).
Não era difícil ver a polícia invadir e fechar terreiros, confiscando objetos rituais, e muitas vezes
prendendo os participantes. Benjamin Figueiredo, Zélio Fernandino de Moraes e muitos outros dirigentes
foram presos diversas vezes nesse período.
Mas havia um “modelo” que vinha conquistando seu espaço na sociedade brasileira: A Federação
Espírita Brasileira (FEB), fundada desde 1º de janeiro de 1884. Nos anos 30 a FEB já conseguira se firmar
como legítima representante do Espiritismo no Brasil, unificando, fortalecendo e tornando coesas as Casas
espíritas.
Tentando se livrar do estigma marginal dos feiticeiros,
iniciou-se um claro movimento por uma auto identificação dos
umbandistas com o Kardecismo e com o alto espiritismo. O próprio
termo espírita foi usado para esconder nomes e para disfarçar os
praticantes da Umbanda. Daí a denominação de tantas Casas
umbandistas tradicionais como “Centro Espírita” e não como “Tenda
de Umbanda”.
Em 1939 fundou-se a Federação Espírita de Umbanda, atual
União Espiritista de Umbanda do Brasil (UEUB). Zélio de
Moraes, Benjamin Figueiredo, Tancredo Pinto e outros se uniram em
torno de um só ideal: tirar a Umbanda da marginalidade,
organizando-a como uma religião coerente e hegemônica e assim
obtendo sua legitimação social.
Em 1944, essas mesmas lideranças umbandistas apresentam
ao então Presidente Getúlio Vargas um documento intitulado “O
Culto da Umbanda em Face da Lei”, conseguindo que o governo
brasileiro aprovasse a descriminalização da nossa querida religião.

Os novos rumos da Umbanda


Apesar de uma grande vitória, a descriminalização da Umbanda não foi suficiente para manter unidas
as lideranças do movimento, juntas até então pela legitimação da religião. Por volta de 1950, essas mesmas
lideranças passaram a se entrincheirar em torno de seus pontos de vista pessoais, cada qual defendido com
ardor e paixão, abrindo-se assim um enorme fosso dentre as diversas correntes umbandistas. Diversas
Federações são fundadas no Brasil (só no Rio de Janeiro foram novas seis).
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Com o fim da perseguição das autoridades públicas à


Umbanda, a religião passou por um rápido período de
crescimento. Estavam abertas as portas da Umbanda aos mais
diversos grupos que ainda se encontravam marginalizados, da
mesma forma que um dia esta se encontrara. Todos os terreiros,
das mais variadas “linhas”, incluíram em seus nomes a palavra
Umbanda como forma de fugir à repressão policial. Nesse
momento, cresce a corrente que defende a influência da cultura
africana sobre o culto umbandista. A Umbanda começa a se
“traçar” com cultos do candomblé, e nesse movimento ganha
destaque um dos seus principais expoentes: Tancredo da Silva
Pinto (1904-1979), considerado o organizador do culto Omolokô
no Brasil.
Bastante atuante, Tancredo viaja por quase todo o país,
fundando Federações no Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do
Sul, Minas Gerais, Pernambuco, dentre outros, sempre com o
objetivo de organizar e dar personalidade ao culto. Ele defendeu
com ardor sua visão da Umbanda, que via na pureza racial negra a
legitimidade das práticas umbandistas, sendo a umbanda quase que uma extensão, ou um “estágio” para o
candomblé.
Tancredo Pinto lançou mais de 30 livros, e passaria 25 anos escrevendo uma coluna semanal no
jornal “O Dia”, o que faria com que seus ideais tivessem grande ascendência sobre os setores mais humildes
da Umbanda, chegando inclusive a receber o título de “Táta de Umbanda” (“Papa da Umbanda”).
A Escola de Caboclo Mirim também se espalhava, com a abertura das filiais da Tenda Mirim, a partir
de 1951, e com o Primado de Umbanda, fundado no ano seguinte. Todos os terreiros que seguiam a filosofia
da Escola da Vida, sejam filiais da Tenda ou terreiros federados pelo Primado, tinham em sua essência a
mesma liturgia praticada nas Casas. Isso criava uma identificação que qualquer pessoa, ao ingressar no
terreiro reconhecia que naquela Casa se praticava a Escola de Caboclo Mirim (fato que ocorre até hoje). Em
meados dos anos 1960 a Tenda Espírita Mirim já contava com aproximadamente 60 filiais, e o Primado de
Umbanda tinha mais de 30 Casas federadas.
Em meio a várias tentativas de codificação da Umbanda, todas elas sem sucesso, a religião vai
ganhando força e despertando o interesse de muitos teólogos e estudiosos, que aos poucos também vão se
afinizando com os rituais da doutrina umbandista, e se tornando adeptos.
A partir daí a Umbanda se encontra em uma necessidade extrema de se voltar para os estudos. Nas
décadas de 1950 e 1960 muitos estudiosos do assunto e dirigentes de terreiros passaram seus conhecimentos
e estudos para o papel, lançando diversos títulos de obras literárias sobre a Umbanda. Além de Benjamin
Figueiredo (Okê Caboclo – 1962) e Tancredo da Silva Pinto, também há livros lançados por Aluízio
Fontenele, Byron Torres, Decelso, Emanuel Zespo, Jota Alves de Oliveira, João Varela, Lourenço Braga,
Oliveira Magno, Samuel Ponze, Silvio Pereira Maciel, dentre outros.

O Esoterismo na Umbanda
Em 1956 surge um novo personagem que merece destaque: é W.W. da Matta e Silva (1917-1988)
com o seu livro “Umbanda de Todos Nós”. Sua pesquisa apresenta a religião como ciência e filosofia, em
uma linha próxima ao que já apresentara o Primado de Umbanda e Oliveira Magno em seu livro “A
Umbanda Esotérica e Iniciática” (1950).
Com grande repercussão no meio umbandista, o livro também é visto como mais uma tentativa de
codificação da religião. Matta e Silva ainda lançaria mais oito livros, apresentando sua forma particular de se
praticar Umbanda, que viria a ser conhecida como “Umbanda Esotérica”, criando assim mais uma
segmentação dentro da religião.
Sempre lutando contra o uso comercial da Umbanda, contra as práticas que alimentam o “baixo
espiritismo” e, principalmente, contra a ignorância do corpo mediúnico, Matta e Silva (Mestre Yapacani)
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iniciou em seu terreiro centenas de médiuns na sua corrente astral do “Aumbhandan”, e preparou muitos
outros para liderarem agrupamentos religiosos que hoje se distribuem por todo território nacional.

Talvez o mais famoso deles, tido como seu sucessor, seja o Sr. Francisco Rivas Neto (Mestre
Ahrapiagha), Presidente da Ordem Iniciática do Cruzeiro Divino (O.I.C.D.) e Reitor Geral da Faculdade de
Teologia Umbandista (FTU).

A Escola de Magia
Os diversos títulos e lançamentos de livros atuais remetem a
uma Umbanda como verdadeira Escola de Magia, formadora de
sacerdotes e magos. Essa vertente ganhou força em São Paulo,
berço da FTU, onde também foram fundadas várias Escolas de
Umbanda.
Um dos personagens importantes desse movimento foi
Rubens Saraceni. Ordenado Sacerdote de Umbanda Sagrada em
1996, Saraceni foi autor de vários livros de Umbanda, todos eles
tratando da religião quase como uma escola de magia e cheia de
mistérios e revelações.
Dentre os diversos livros lançados estão: “Orixás - Teogonia
de Umbanda”(2005), “Código de Umbanda” (2006), “O Guardião
das Sete Cruzes - Um Livro Mistério” (2007). Foram mais de 50
títulos que adotam o mesmo estilo de uma Umbanda cheia de
mistérios.
Nesta onda de uma Umbanda formadora de magos,
trabalhava com o Mestre Seiman Hamiser Yê, um Ogum Sete
Espadas da Lei e da Vida. O guia assumiu a abertura da Magia do
Fogo no plano material, na qual eram ensinados os fundamentos da
Magia Riscada dos Orixás, a Grafia Sagrada, bem como a correta utilização magística das velas, suas cores e
o elemento fogo na arte da Magia.
Em 1999 Saraceni fundou o Colégio de Umbanda Sagrada Pai Benedito de Aruanda, que oferece
formação mediúnica e sacerdotal de Umbanda, bem como, sustentação, Religiosa e Magística aos que
buscam o Conhecimento Sagrado sobre O Divino Criador Olorum (Deus), suas Divindades e seus Mistérios
Geradores.
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Os conflitos de Umbandistas contra Umbandistas


O “radicalismo” de Zélio de Moraes, Benjamin Figueiredo e seus companheiros permitiu que não
predominasse na Umbanda apenas a matriz africana e a avassaladora cultura Yorubá, da mesma forma que
se observa sua forte presença nos Cultos de Nação. Talvez, sem sua contribuição, a Umbanda hoje seria
apenas uma forma “light” do Candomblé. Mas, respeitando-se como religiões irmãs, cada qual vem
aprendendo a consolidar sua própria visão do universo, com seus próprios fundamentos, rituais e,
principalmente, sacerdotes.
Assim, a Umbanda pôde consolidar-se como religião universalista, com espaço para diversas
influências que enriqueceram e fortaleceram os umbandistas, permitindo que observemos em nossos
terreiros a presença da matriz católica, da matriz espírita, da matriz orientalista, etc.
Alguns dizem que a Umbanda de Zélio Fernandino de Morais quase não existe mais. A Escola do
Caboclo das Sete Encruzilhadas praticamente se extinguiu em meio a tantas misturas de ideias de líderes que
se consideravam os verdadeiros “donos da verdade”.
Há aqueles também que chamam a Escola de Caboclo Mirim como uma “Umbanda água com
açúcar”, onde não se vê grandes manifestações, descarregos, trabalhos “pesados”, etc.
E as denominações variantes de Umbanda não param por aí. São tantos os terreiros de Umbanda
traçada, Umbanda cruzada, Umbandomblé, Omolokô, Candomblé que bate Umbanda, e por aí vai.
A verdade é que, cada representante teve sua importância dentro da história da Umbanda. E o
antagonismo dessas principais correntes gera debates que afetam os umbandistas até os dias de hoje. E tal
qual naqueles tempos, hoje ainda observa-se que cada grupo ou organização implanta sua própria
“codificação”, tentando influenciar o movimento umbandista com sua visão e seus ideais, através da mídia
escrita, TV ou Internet.
E nessas questões sempre vemos alguns irmãos de fé usarem o mesmo argumento:

“No terreiro que eu frequento não é assim!”;


“Isso está errado! No meu terreiro não é assim!”.

Mas vale ressaltar que não há verdade absoluta, Centro ou Tenda melhor ou pior, mais “evoluída” do
que qualquer outra. Será sempre seguindo princípios básicos de amor e, principalmente, respeito ao
próximo, que conseguirá o umbandista ver que, abaixo das pequenas diferenças de culto exterior, somos
todos irmãos de fé.

Conclusão

A conclusão que chegamos é que será na busca do equilíbrio, do “Caminho do Meio”, que a
Umbanda crescerá. Os gregos antigos já nos ensinavam que a temperança, a prudência e a modéstia, aliadas
à moderação e ao bom senso, compõe as condições indispensáveis a se alcançar um estado de espírito são e
calmo (Sophrosyne).
Mas trilhar pelo meio não significa ignorar a energia dos extremos, com sua força e sua vitalidade. O
melhor caminho será encontrado na polarização correta dessas forças, não na sua anulação. No caminho do
meio todos os extremos se encontram, e nele todos os extremos se apoiam e se fortalecem.
Que os filhos da nossa querida Umbanda reconheçam o conjunto das forças presentes em sua
religião, e possam encontrar em seu equilíbrio a verdadeira Luz de Aruanda!!!
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Internet

 Site Semeadura – www.semeadura.com;


 Genuína Umbanda – www.genuinaumbanda.com.br;
 Site Povo de Aruanda – www.povodearuanda.wordpress.com
 Blog da SEFA – www.falangeirosdaaruanda-sefa.blogspot.com
 Povo Cigano na Umbanda – www.povociganonaumbanda.blogspot.com

Livros

 Reflexões sobre a Escola de Caboclo Mirim – Sérgio Navarro Teixeira;


 Jornal Nossa Seara – Informativo da Seara Espiritualista Falangeiros da Aruanda
 Mediunidade – Edgard Armond;
 Revista Caminho Espiritual – Editora Minuano;
 Umbanda Pé no chão - Norberto Peixoto – pelo espírito Ramatis – Ed. Do Conhecimento;

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