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ANÁLISE CRÍTICA – ESTAMIRA (2004)

Dirigido por Marcos Prado, o documentário conta a história de Estamira, uma senhora de 63
anos, portadora de transtornos mentais, que vive e trabalha a duas décadas em um aterro sanitário
localizado no Rio de Janeiro, o qual recebe, em média, oito mil toneladas de lixo da cidade. O
documentário buscou demonstrar a realidade vivida por Estamira que, ao longo do documentário,
apresentava diversos discursos filosóficos, ditos por muito como uma mistura extrema de lucidez e
loucura.
O discurso de Estamira aborda diversos assuntos, muitas frases podem ser interpretadas
como sem sentido, mas várias de suas falas questionavam de forma filosófica a sociedade, a
existência de um Deus, o trabalho e a vida. Ela acreditava perceber e enxergar coisas que ninguém
mais via, percebendo o mundo e a existência, em si, de forma diferente do restante da sociedade,
enxergando-o de uma forma verdadeira, como ele realmente é, tendo como missão mostrar essa
realidade ao restante da sociedade.
Uma das questões mais abordadas no documentário foi a crença, ou a falta desta, de
Estamira em um Deus. A senhora afirmava não acreditar no Deus que todos acreditam, pois este é
um Deus malvado, um Deus “estuprador”. Estamira não se dizia completamente descrente de um
poder superior, mas vários de seus discursos falavam sobre a inexistência de um Deus hipócrita,
chegando a falar “meu ouvido não é penico”, enquanto um de seus filhos citava certo trecho da
bíblia. Dá-se a entender que Estamira crê em um Deus muito além do que se pode ser compreendido
por qualquer pessoa, é um ser que só ela seria capaz de perceber.
Outro ponto relevante, ainda sobre o tema de crença, é como as pessoas ao redor de Estamira
a cobravam por não acreditar no Deus católico, principalmente da parte de seus próprios filhos. Era
constante a fala dos familiares sobre como esse ódio de Deus sentido pela senhora era prejudicial na
vida dela, como ela deveria acreditar no ser superior, como deveria ir à igreja, ler a bíblia etc. Uma
das filhas de Estamira até mesmo disse que o transtorno mental da mãe era causado pela falta de fé
da mesma e, também é perceptível que seus outros dois filhos também acreditam nisso, pois estes
insistem em citar textos religiosos e falar sobre Deus e a igreja para ela, influenciando também os
netos de Estamira a fazerem o mesmo.
Ao demonstrar a realidade do dia a dia de Estamira, o documentário aborda uma grande
crítica social, mostrando a vida real fora da zona de conforto de muitos telespectadores, causando
um certo desconforto nas pessoas que assistem. Estamira acredita que o lixo não é o aterro sanitário
onde ela se encontra, mas sim os valores falidos da sociedade, aqueles que usam os outros para seu
próprio interesse e depois os descartam. A negligência para com diversos membros da sociedade
fica clara do início ao fim do documentário, que permite aos telespectadores, enxergarem a
realidade do mundo e se questionarem sobre esta, ajudando Estamira, portanto, a cumprir sua
missão, que seria a de revelar e mostrar a realidade social de forma completa.

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