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MANUAL DE TEOLOGIA DOGMÁTICA

Por LUDWIG OTT

INTRODUÇÃO

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Sumário
Introdução......................................................................................................... 4
§ 1. Concito e Objeto da Teologia.................................................................................4
1. Conceito............................................................................................................. 4
2. Objeto................................................................................................................ 4
§ 2. A Teologia como Ciência....................................................................................... 5
1. O Caráter Científico da Teologia........................................................................5
2. Uma Ciência da Fé............................................................................................ 6
3. Classificação...................................................................................................... 7
§ 3. Conceito e Método da Teologia Dogmática...........................................................7
1. Conceito............................................................................................................. 7
2. Método.............................................................................................................. 8
§ 4. Conceito e Classificação do Dogma......................................................................8
1. Conceito............................................................................................................. 8
2. Concepção Protestante e Modernista..............................................................10
3. Classificação..................................................................................................... 11
a) De acordo com o seu conteúdo como:.......................................................11
b) De acordo com sua relação com a Razão como:........................................11
c) Segundo o modo como a Igreja as propõe, como:.....................................11
§ 5. O Desenvolvimento do Dogma............................................................................12
1. Noção herética de desenvolvimento dogmático...............................................12
2. Desenvolvimento de Dogmas no Sentido Católico..........................................13
§ 6. As Verdades Católicas.........................................................................................16
1. Conclusões Teológicas (conclusiones theologicae)..........................................17
2. Fatos Dogmáticos (facta dogmatica)..............................................................17
3. Verdades da Razão........................................................................................... 17
§ 7. Opiniões Teológicas.............................................................................................18
§ 8. Os Graus Teológicos de Certeza..........................................................................18
1. Fides Divina – Fides Catholica – de Fide Definita..........................................18
2. Fides Ecclesiastica...........................................................................................18
3. Sententia Fides Proxima.................................................................................18
4. Sententia ad Fidem Pertinens – Theologice Certa..........................................19

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5. Sententia Communis.......................................................................................19
6. Sententia Probabilis, Probabilior, Bene Fundata............................................19
7. Sententia Pia.................................................................................................... 19
9. Opinio Tolerata................................................................................................ 19
§ 9. Censuras Teológicas...........................................................................................20
1. Propositio Haeretica........................................................................................ 20
2. Propositio Haeresi Proxima............................................................................20
3. Propositio Haeresim Sapiens ou de Haeresi Suspecta....................................20
4. Propositio Erronea.......................................................................................... 20
5. Propositio Falsa.............................................................................................. 20
6. Propositio Temeraria......................................................................................20
7. Propositio Piarum Aurium Offensiva..............................................................21
8. Propositio Male Sonans...................................................................................21
9. Propositio Captiosa.........................................................................................21
10. Propositio Scandalosa.................................................................................... 21

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INTRODUÇÃO
§ 1. Concito e Objeto da Teologia

1. Conceito
A palavra teologia, de acordo com sua etimologia, significa “ensinar sobre
Deus” (λόγος περί θεοῦ, de divinitate ratio sive sermo). [1] Assim, a teologia é a
ciência ou estudo de Deus.

2. Objeto
O objeto material da teologia é primeiramente Deus e, em segundo lugar,
as coisas criadas sob o aspecto de sua relação com Deus: Omnia
pertractantur in sacra doctrina sub ratione Dei, vel quia Sunt ipse Deus, vel
quia habent ordinem ad Deum ut ad principium et finem. Na ciência
sagrada todas as coisas são consideradas sob o aspecto de Deus, seja porque
são o próprio Deus ou porque se referem a Deus como seu princípio e fim. [2]
No que diz respeito ao Objeto Formal, deve ser feita uma distinção entre
teologia natural e sobrenatural. A teologia natural foi exposta pela primeira
vez por Platão. É chamada por SANTO AGOSTINHO, de acordo com Varrão, [3]
Theologia Naturalis, e desde o século XIX também é chamada de teodiceia.
É a exposição científica das verdades concernentes a Deus, na medida em
que estas podem ser conhecidas pela razão natural e, portanto, podem ser
consideradas como a culminação da filosofia. A teologia sobrenatural é a
exposição científica das verdades sobre Deus à luz da Revelação Divina. O
objeto formal da teologia natural é Deus, como Ele é conhecido pela razão
natural desde a criação; o objeto formal da teologia sobrenatural é Deus,
como é conhecido pela fé da revelação. [4]
A Teologia natural e a sobrenatural diferem entre si:
(a) em seus princípios de cognição, razão humana sem ajuda (ratio naturalis),
razão iluminada pela fé (ratio fide illuminata);

[1] SÃO AGOSTINHO. De civitate Dei contra paganos. Liber VIII, Cap. 1. PL 41,298. ed.
1864. p. 117.
[2] S. Th. I, q. 1, a. 7.
[3] Marco Terêncio Varrão, lat. Marcus Terentius Varro; * Rieti, península Itálica, 116
a.C., † 27 a.C., foi um polímata romano e um autor prolífico. Ele é considerado o maior
estudioso da Roma antiga e foi descrito por Petrarca como “a terceira grande luz de Roma”
(depois de Virgílio e Cícero). Às vezes é chamado Varro Reatinus para distingui-lo de seu
contemporâneo mais jovem Varro Atacinus.
[4] Cf. SANTO AGOSTINHO. De Civitate Dei contra Paganos libri viginti duo. Liber VI,
Cap. 5. PL 41,181. S. Th. I q. 1, a. 1, ad 2.

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(b) em seus meios de cognição, o estudo das coisas criadas (ea quae facta sunt),
revelação divina (revelatio divina);
(c) em seus objetos formais, Deus como Criador e Senhor (Deus unus, Creator et
Dominus), Deus um e três (Deus Unus et Trinus).
§ 2. A Teologia como Ciência

1. O Caráter Científico da Teologia


a) Segundo o ensinamento de Santo Tomás de Aquino, a teologia é uma
verdadeira ciência, porque usa como princípios as verdades básicas da
Revelação Divina, firmemente fundamentadas, e extrai desses novos
conhecimentos (conclusões teológicas) por um método científico rigoroso e
une o todo em um sistema fechado.
Mas a teologia é uma ciência subordinada (scientia subalternata) porque
seus princípios não nos são imediatamente evidentes em si mesmos, mas são
tomados de uma ciência superior, das verdades que Deus nos comunica na
revelação. A doutrina sagrada é uma ciência porque procede de princípios
estabelecidos pela luz de uma ciência superior, a saber, o conhecimento
possuído por Deus e pelos Bem-aventurados; Sacra doctrina est scientia,
quia procedit ex principiis notis lumine superioris scientiae, quae scilicet est
scientia Dei et beatorum. [1]
As questões levantadas pelos escolásticos eram exclusivamente as da teologia
especulativa. O desenvolvimento da pesquisa histórica no início da era moderna
levou a uma extensão do conceito de “ciência” que permite sua aplicação também à
teologia positiva. Por “ciência” no sentido objetivo entende-se hoje um sistema de
conhecimento metodicamente elaborado sobre um objeto unitário. A teologia possui
um objeto unitário, utiliza um processo metódico adaptado ao objeto e une seus
resultados em um sistema fechado. A dependência da teologia da autoridade divina e
da Igreja não derroga seu caráter científico, porque a teologia pertence à verdade
revelada dada por Deus nas mãos da Igreja e, portanto, estas não podem ser
dissociadas do objeto da teologia.
b) A teologia transcende todas as outras ciências: pela sublimidade de seu
objeto; pela suprema certeza de seu conhecimento que se baseia no
conhecimento infalível de Deus; e por seu propósito prático que é a bem-
aventurança eterna, ou seja, o destino final da humanidade. [2]
c) Segundo São Tomás, a teologia é uma ciência especulativa e prática,
pois, à luz da Verdade Divina, contempla, por um lado, Deus, a Primeira
Verdade, e as coisas em sua relação com Deus e, por outro, Por outro lado,
contempla as ações morais do homem em relação ao seu objetivo final
sobrenatural. A teologia especulativa é a mais nobre, pois a teologia se
preocupa acima de tudo com a Verdade Divina. Assim, o objetivo final
[1] cf. S. Th. I q. 1, a. 2.
[2] cf. S. Th. I q. 1, a. 5.

5
mesmo da Teologia Moral é levar os homens à perfeição do conhecimento de
Deus. [1]
A escola franciscana medieval valoriza a Teologia principalmente como uma
ciência prática ou afetiva, porque o conhecimento teológico por sua própria natureza
visa mover os afetos ou a vontade. O objeto principal da teologia moral é a perfeição
moral do homem: ut boni fiamus. [2]
A razão última para as várias respostas ao problema está nas várias estimativas da
hierarquia das potências da alma humana. [3] São Tomás da Aquino e sua Escola, com
Aristóteles, reconhecem a primazia do intelecto, a Escola Franciscana com Santo
Agostinho, a da vontade.
d) A teologia é “Sabedoria”, pois seu objeto é Deus a origem última de todas as
coisas. É a sabedoria suprema, pois contempla Deus, a origem última, à luz das
verdades da revelação comunicadas ao homem pela sabedoria de Deus Ele mesmo. [4]

2. Uma Ciência da Fé
A teologia é uma ciência da fé. Trata-se da fé no sentido objetivo (fides
quae creditur) aquilo que se acredita, e no sentido subjetivo (fides qua
creditur) aquilo pelo qual acreditamos. A teologia como fé aceita, como
fontes de seu conhecimento, as Sagradas Escrituras e a Tradição (regra
remota de fé) e também as afirmações doutrinárias da Igreja (regra próxima
de fé). Mas, como ciência da fé, procura pela razão humana (com a ajuda da
graça) penetrar no conteúdo e no contexto do sistema sobrenatural da
verdade e compreendê-lo na medida do possível. SANTO AGOSTINHO expressa
este pensamento com as palavras: “Crede, ut intelligas” Creio para
compreender; [5] SANTO ANSELMO DE CANTUÁRIA, com as palavras: “Fides
quaerens intellectum” [6] Fé procura compreender e “Credo, ut intelligam”
Creio, para compreender; [7] RICARDO DE SÃO VÍTOR [8] com as palavras:

[1] S. Th. I q. 1, a. 4.
[2] Doctoris Seraphici S. Bonaventurae Opera omnia… In primum librum Sententiarum
(prima parte). Prooemium q. 3. p. 12. edita studio et cura PP. Collegii a S.
Bonaventura, Ad Claras Aquas (Quaracchi), 1882.
[3] Potencias Superiores da Alma: Inteligencia, Vontade e Memória.
[4] cf. S. Th. I q. 1, a. 6.
[5] SANTO AGOSTINHO. Sermo XLIII (43). De eo quod scriptum est in Isaia, cap. VII, 9, Nisi
credideritis, non intelligetis. Cap. VII (7), 9: PL 38,258. p. 142.
[6] SANTO ANSELMO DE CANTUÁRIA. Proslógion seu Alloquium de Dei Existentia.
Proœmium. PL 158,225A. ed 1863. p. 118.
[7] Idem; Caput Primum. PL 158,227C. ed 1863. p. 119.
[8] Ricardo de São Vitor, C.R.S.A. Teólogo mistico, natural da Escócia, mas a data e o local
de seu nascimento são desconhecidos; † 1173 e foi comemorado em 10 de março na
necrologia da abadia. Professou no mosteiro de São Vítor sob o primeiro abade Gilduin
(falecido em 1155) e foi discípulo do grande místico Hugo, cujos princípios e métodos ele
adotou e elaborou. Sua carreira foi estritamente monástica, e suas relações com o mundo
exterior eram poucas e leves. Cônegos Regulares de São Vitor.

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“Properemus de fide ad cognitionem. Satagamus, in quantum possumus, ut
intelligamus, quod credimus”. [1] Apressemo-nos da fé para o conhecimento.
Esforcemo-nos, tanto quanto pudermos, para compreender aquilo em que
cremos.

3. Classificação
A teologia é uma ciência unitária, pois tem um único objeto formal:
Deus e o mundo criado, na medida em que são objetos da Revelação Divina.
Assim como a Revelação é uma comunicação do conhecimento divino, a
teologia é, nas palavras de SANTO TOMÁS DE AQUINO, uma marca ou
impressão imposta pelo conhecimento divino, que é unitário e
absolutamente simples, sobre o espírito humano criado. [2]
A teologia é, no entanto, dividida em vários ramos e departamentos de
acordo com suas várias funções, que são todas subdivisões da única ciência
teológica:
a) Teologia Dogmática, que inclui a Teologia Fundamental, ou seja, a
base da Teologia Dogmática.
b) Teologia Bíblica-Histórica: Introdução Bíblica, Hermenêutica,
Exegese; História da Eclesiástica, História dos Dogmas, História da Liturgia,
História do Direito Canônico, Patrologia.
c) Teologia Prática: Teologia Moral, Direito Canônico, Teologia
Pastoral, incluindo Catequética e Homilética.

§ 3. Conceito e Método da Teologia Dogmática

1. Conceito
Tendo como base as proposições e declarações de Fé da Igreja, todo o
campo da Teologia Sobrenatural poderia ser chamado de Teologia
Dogmática. Na verdade, porém, apenas as verdades teóricas da Revelação
sobre Deus e Sua atividade são tratadas na teologia dogmática (doctrina
credendorum: a ciência das coisas a serem cridas), enquanto os
ensinamentos práticos da Revelação que regulam a atividade dos homens
são objeto da Teologia Moral (doctrina faciendorum: a ciência das coisas a
serem feitas). Assim, a teologia dogmática pode com SCHEEBEN [3] ser

[1] RICARDO DE SÃO VÍTOR. De Trinitate. Prologus. PL 196,889B. ed. 1955


[2] S. Th. I q. 1, a. 3.
[3] Matthias Joseph Scheeben. Escritor teológico e mistico de reconhecido mérito, nascido
em Meckenheim, perto de, em 1º de março de 1835; morreu em Colônia, em 21 de julho de
1888. Estudou na Universidade Gregoriana de Roma com Passaglia e Perrone (1852-59),
foi ordenado em 18 de dezembro de 1858 e ensinou teologia dogmática no seminário
episcopal de Colônia (1860-1875). “As gerações que se seguiram a Scheeben o
consideraram uma das maiores mentes da teologia católica moderna.”

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definida como “a exposição científica de toda a doutrina teórica revelada por
Deus sobre o próprio Deus e Sua atividade e que aceitamos sob a autoridade
da Igreja”. [1]

2. Método
O método da teologia dogmática é tanto positivo quanto especulativo.
A teologia dogmática positiva está preocupada com doutrinas que
foram propostas à nossa crença pela Autoridade de Ensino da Igreja (fator
dogmático) e que estão contidas nas fontes da Revelação, Escritura e
Tradição (fator Bíblico-Patrístico). Na medida em que defende a doutrina da
Igreja contra falsas concepções, torna-se teologia controversa (fator
apologético ou polêmico).
A teologia dogmática especulativa, que é idêntica à chamada
teologia escolástica, esforça-se tanto quanto possível por uma compreensão
das verdades da fé pela aplicação da razão humana ao conteúdo da revelação.
Os métodos positivo e especulativo não devem ser separados um do outro. O ideal
está na fusão harmoniosa de autoridade e razão. Isto é, de fato, expressamente
prescrito pela Autoridade Eclesiástica: o PAPA PIO XI, na Instituição Apostólica “Deus
scientiarum Dominus” de 1931, orienta que a Sagrada Teologia “deve ser apresentada
de acordo com o método positivo, bem como o escolástico”. A exposição especulativa
deve proceder “de acordo com os princípios e ensinamentos de Santo Tomás de
Aquino” (artigo 29). [2]

§ 4. Conceito e Classificação do Dogma

1. Conceito
Por dogma, em sentido estrito, entende-se a verdade diretamente
(formalmente) revelada por Deus, que foi proposta pela Autoridade de
Ensino da Igreja para ser acreditada como tal pelos fiéis. O Concílio Vaticano
I explica: “Fide divina et catholica ea omnia credenda sunt, quae in verbo
Dei scripta vel tradito continente et ab Ecclesia sive solemni iudicio sive
ordinario et universali magisterio tanquam divinitus revelata credenda
proponuntur”. [3] Todas essas coisas devem ser acreditadas pela fé divina e
católica que estão contidas na Palavra de Deus escrita ou transmitida e que
são propostas para nossa crença pela Igreja em uma definição solene ou em
seu ensinamento comum e universal.
Dois fatores ou elementos podem ser distinguidos no conceito de dogma:

[1] MATTHIAS JOSEPH SCHEEBEN. Dogmatik, Einleitung n. 2.


[2] Cf. Santo Tomás de Aquino. Quaestiones de quolibet. Quodlibet IV. Quaestio 9,
Quaestio 12 a.1 arg. 18.
[3] Dz 1792.

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a) Uma revelação divina imediata [1] particular [2] do Dogma (revelatio
immediata divina ou revelatio formalis), ou seja, o Dogma deve ser
imediatamente (diretamente) revelado por Deus, seja explicitamente
(explicite) ou inclusivamente (implicite), e, portanto, estar contido nas fontes
da Revelação (Sagradas Escrituras ou Tradição).
b) A Promulgação do Dogma pelo Magistério da Igreja (propositio
Ecclesiae). Isto implica, não apenas a promulgação da Verdade, mas também
a obrigação por parte dos Fiéis de crer na Verdade. Esta Promulgação pela
Igreja pode ser feita de forma extraordinária, por decisão solene de fé do
Papa ou de um Concílio Geral (Iudicium solemne) ou pelo poder ordinário e
geral de ensino da Igreja (Magisterium ordinarium et universale). Este
último pode ser encontrado facilmente nos catecismos publicados pelos
Bispos em suas dioceses.
Nesta visão, que é a usual, e que é principalmente exposta pelos tomistas, a
Verdade proposta no dogma deve ser imediata e formalmente informada nas fontes
da Revelação, seja explícita ou implicitamente. De acordo com outra opinião, porém,
que é sustentada pelos escotistas, e também por vários teólogos dominicanos, [3] uma
Verdade pode ser proposta como um dogma, se for apenas mediata ou virtualmente
contido nas fontes da Revelação, isto é, de tal maneira que possa ser derivado de uma
Verdade ou Revelação com o auxílio de uma verdade conhecida pela Razão Natural. A
visão escotista permite maior espaço de jogo na ação formal da Autoridade de Ensino
e torna mais fácil provar que o Dogma está contido nas fontes da Revelação, mas sua
validade é contestada pelo fato de que a Verdade do Dogma é sustentada não apenas
pela autoridade do Deus revelador, mas também pelo conhecimento natural da razão,
enquanto a Igreja exige como dogma uma fé divina [4] (fides divina).
O dogma em sua significação estrita é objeto tanto da fé divina (Fides
Divina) quanto da fé católica (Fides Catholica); é objeto da Fé Divina (Fides
Divina) em razão de sua Revelação Divina; é objeto da fé católica (Fides

[1] Imediata: sem mediador, direta.


[2] Particular: própria.
[3] Fr. Marcolinus Maria Tuyaerts O.P., Fr. Ambroise Gardeil O.P., Fr. Francisco Marín-Sola
O.P.
[4] A FÉ É UMA GRAÇA Cat.I.C. 153 Quando São Pedro confessa que Jesus é o Cristo, Filho do
Deus vivo, Jesus lhe declara que esta revelação não lhe veio “da carne e do sangue, mas de
meu Pai que está nos céus”. A fé é um dom de Deus, uma virtude sobrenatural infundida
por Ele. “Para que se preste esta fé, exigem-se a graça prévia e adjuvante de Deus e os
auxílios internos do Espírito Santo, que move o coração e o converte a Deus, abre os olhos
da mente e dá a todos suavidade no consentir e crer na verdade.”
Mt 16,17 Jesus disse: “Você é feliz, Simão, filho de Jonas, porque não foi um ser humano
que lhe revelou isso, mas o meu Pai que está no céu.”
Gl 1,15 Deus, porém, me escolheu antes de eu nascer e me chamou por sua graça. Quando
ele resolveu 16 revelar em mim o seu Filho, para que eu o anunciasse entre os pagãos, não
consultei a ninguém,
Mt 11,25 Naquele tempo, Jesus disse: “Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque
escondeste essas coisas aos sábios e inteligentes, e as revelaste aos pequeninos.”

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Catholica) por causa de sua definição doutrinal infalível pela Igreja. Se uma
pessoa batizada deliberadamente nega ou duvida de um dogma
propriamente dito, é culpado do pecado de heresia, [1] e automaticamente fica
sujeito à pena de excomunhão. [2]
Se, apesar de uma Verdade não ser proposta para crer pela Igreja, alguém se
convence de que ela é imediatamente revelada por Deus, então, segundo a opinião de
muitos teólogos (Suarez, De Lugo), é obrigado a acreditar nela, com a Fé Divina (fide
divina). No entanto, a maioria dos teólogos ensina que tal Verdade anterior à sua
proposição oficial da Igreja deve ser aceita apenas com assentimento teológico
(assensus theologicus), pois o indivíduo pode estar enganado.

2. Concepção Protestante e Modernista


a) O Protestantismo rejeita a Autoridade de Ensino da Igreja. e,
consequentemente, também a proposição autorizada do conteúdo da Revelação pela
Igreja. Alega que a Revelação Bíblica atesta a si mesma. Apesar disso, e por causa da
unidade da doutrina, reconhece-se certa conexão entre o dogma e a autoridade da
Igreja. “Dogma é o ensinamento válido da Igreja” (Werner Elert). [3] O movimento
liberal do protestantismo mais recente rejeita não apenas a proclamação doutrinária
da Autoridade da Igreja, mas também a Revelação Divina objetiva, ao conceber
a Revelação como uma experiência religiosa subjetiva, na qual a alma entra em
contato com Deus.

[1] CIC 1917 1325, § 2.


CIC 1983 Cân. 750 – § 1. Deve-se crer com fé divina e católica em tudo o que se contém na
palavra de Deus escrita ou transmitida por Tradição, ou seja, no único depósito da fé
confiado à Igreja, quando ao mesmo tempo é proposto como divinamente revelado quer
pelo magistério solene da Igreja, quer pelo seu magistério ordinário e universal; isto é, o
que se manifesta na adesão comum dos fiéis sob a condução do sagrado magistério; por
conseguinte, todos têm a obrigação de evitar quaisquer doutrinas contrárias.
CIC 1983 Cân. 751. Chama-se heresia a negação pertinaz, após a recepção do batismo, de
qualquer verdade que se deva crer com fé divina e católica, ou a dúvida pertinaz a respeito
dela; apostasia, o repúdio total da fé cristã; cisma, a recusa de sujeição ao Sumo Pontífice
ou de comunhão com os membros da Igreja a ele sujeitos.
[2] CIC 1917 2314, § 1.
CIC 1983 Cân. 1364 § 1. O apóstata da fé, o herege ou o cismático incorre em excomunhão
latae sententiae, salva a prescrição do cân. 194, § 1, n. 2; além disso, o clérigo pode ser
punido com as penas mencionadas no cân. 1336, § 1, n. 1, 2 e 3.
[3] Werner August Friedrich Immanuel Elert * 19 de agosto de 1885, † 21 de novembro
de 1954, foi um teólogo luterano alemão e professor de história da igreja e teologia
sistemática na Universidade de Erlangen-Nuremberg. Seus escritos nos campos da
dogmática cristã, ética e história tiveram grande influência no cristianismo moderno em
geral e no luteranismo moderno em particular.

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b) De acordo com ALFRED LOISY [1] as concepções que a Igreja representa como
dogmas revelados não são verdades que vieram do Céu, e que foram preservadas pela
tradição religiosa na forma exata em que apareceram pela primeira vez. O historiador
vê neles “a interpretação dos fatos religiosos adquiridos pela labuta do trabalho
mental teológico”. [2] O fundamento do dogma é, segundo a visão modernista, a
experiência religiosa subjetiva, na qual Deus se revela ao homem (fator religioso). A
totalidade da experiência religiosa é penetrada pela ciência teológica e expressa por
ela em formulários definidos (fator intelectual). O PAPA PIO X condenou esta doutrina
no Decreto “Lamentabili” (1907) e na Encíclica “Pascendi Dominici Gregis” (1907). [3]
Contra o Modernismo, a Igreja Católica destaca que o dogma segundo seu
conteúdo é de origem verdadeiramente divina, ou seja, é a expressão de uma
verdade objetiva, e seu conteúdo é imutável.

3. Classificação
Os dogmas são classificados:
a) De acordo com o seu conteúdo como:
Dogmas Gerais (dogmata generalia) e Dogmas Especiais (dogmata
specialia). Ao primeiro pertencem as verdades fundamentais do
cristianismo, ao segundo as verdades individuais nele contidas.
b) De acordo com sua relação com a Razão como:
Dogmas Puros (dogmata pura) e Dogmas Mistos (dogmata mixta).
Dogmas Puros: Conhecemos apenas por meio da Revelação Divina, por
exemplo, A Santíssima Trindade (mistérios)
Dogmas Mistos: Conhecemos por meio da Revelação Divina e também
pela Razão Natural, por exemplo, A Existência de Deus.
c) Segundo o modo como a Igreja as propõe, como:
Dogmas Formais (dogmata formalia) e Dogmas Materiais (dogmata
materialia).
Dogmas Formais: São propostos para serem acreditados pela
Autoridade Docente da Igreja como verdades da Revelação;

[1] Alfred Firmin Loisy * 28 de fevereiro de 1857, † 1º de junho de 1940. foi um padre
católico, professor e teólogo francês. É geralmente creditado como um fundador do
modernismo teológico na Igreja Católica. Ele era um crítico das visões tradicionais da
criação bíblica, e argumentava que o criticismo da Bíblia poderia ser utilizado para
interpretar as Sagradas Escrituras. As suas posições o colocavam em conflito com os
membros conservadores da igreja, incluindo os Papas Leão XIII e Pio X. Em 1893, ele foi
demitido como professor do Instituto Católico de Paris. Os seus livros foram condenados
pelo Vaticano I e, em 7 de março de 1908, ele foi excomungado. Após sua excomunhão, ele
se tornou um intelectual secular.
[2] L’Èvangile et l’Èglise, Paris, 1902, 158.
[3] Dz 2022, 2078, 2079, 2080.

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Dogmas Materiais: Não são assim propostos, razão pela qual não são
Dogmas em sentido estrito (stricto sensu).
d) De acordo com sua relação com a salvação como:
Dogmas Necessários (dogmata necessaria) e Dogmas Não Necessários
(dogmata non-necessaria).
Dogmas Necessários: Deve ser explicitamente crido por todos para
alcançar a salvação eterna; [1]
Dogmas Não Necessários: Basta a fé implícita (fides implicita). [2]

§ 5. O Desenvolvimento do Dogma

1. Noção herética de desenvolvimento dogmático


O conceito protestante liberal de dogma [3] assim como o Modernismo [4]
supõe um desenvolvimento substancial dos dogmas, de modo que o
conteúdo do dogma muda radicalmente ao longo do tempo. O modernismo
coloca o desafio: “O progresso nas ciências exige que sejam remodeladas as
concepções do ensinamento cristão de Deus, Criação, Revelação, Pessoa do
Verbo Encarnado, Redenção”. [5] Loisy declara: “Assim como o progresso na
ciência (filosofia) exige um novo conceito do problema de Deus, também o
progresso na pesquisa histórica dá origem a um novo conceito do problema
de Cristo e da Igreja”. [6] Nessa visão, não há dogmas fixos e constantes; seu
conceito está sempre em desenvolvimento.
O Concílio Vaticano I condenou a aplicação de Anton Günther [7] da ideia
de desenvolvimento neste sentido aos dogmas como heréticos: “Si quis
dixerit, fieri posse, ut dogmatibus ab Ecclesia propositis aliquando
secundum progressum scientiae sensus tribuendus sit alius ab eo, quem

[1] Mc 16,16 Aquele que crer e for batizado será salvo; o que não crer será condenado.
Jo 3,15 a fim de que todo aquele que crer tenha nele vida eterna. Pois Deus amou tanto o
mundo, que entregou o seu Filho único, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha
vida eterna.
[2] Cf. Hb 11,6 Ora, sem a fé é impossível ser-lhe agradável. Pois aquele que se aproxima de
Deus deve crer que ele existe e que recompensa os que o procura.
[3] Cf. Adolf von Harnack * Dorpat, Estônia, 7 de maio de 1851, † Heidelberg, 10 de junho
de 1930, foi um teólogo alemão, além de historiador do cristianismo. Suas duas obras mais
conhecidas são o Lehrbuch der Dogmengeschichte (“Manual de história do dogma”, em três
volumes) e a série de palestras Das Wesen des Christentums (“A essência do cristianismo”),
texto clássico da teologia liberal.
[4] Cf. Alfred Firmin Loisy.
[5] Cf. Dz 2064.
[6] Autour d’un petit livre, Paris 1903, XXIV.
[7] Anton Günther * 17 de novembro de 1783 Lindenau, Bohemia (agora parte de Cvikov,
República Tcheca), † 24 de fevereiro de 1863 Viena, foi um filósofo católico romano
austríaco cujo trabalho foi condenado pela igreja como triteísmo herético. Seu trabalho foi
descrito como o catolicismo liberal e o primeiro movimento político católico de Viena.

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intellexit et intelligit Ecclesia. Se alguém diz que, em razão do progresso da
ciência, deve-se dar aos dogmas da Igreja um sentido diferente daquele que a
Igreja entendeu e os entende para que seja anátema.” [1] Na Encíclica
“Humani Generis” (1950), [2] o Papa Pio XII rejeitou esse relativismo
dogmático, que exigiria que os dogmas fossem expressos nos conceitos da
filosofia dominante em qualquer momento particular, e envoltos na corrente
do desenvolvimento filosófico: “Esta concepção”, diz ele, “faz do dogma uma
cana, que é levada de um lado para outro pelo vento”. [3]
A fundamentação para a imutabilidade dos dogmas está na origem divina
das Verdades que eles expressam. A Verdade Divina é tão imutável quanto o
próprio Deus: [4] “A verdade do Senhor permanece para sempre” (Sl 116, 2). “O
céu e a terra passarão, mas a minha palavra não passará” (Mc 13,31).

2. Desenvolvimento de Dogmas no Sentido Católico


a) Do lado Material do dogma, ou seja, na comunicação das Verdades da
Revelação à humanidade, ocorreu um crescimento substancial na história
humana até que a Revelação atingiu seu apogeu e conclusão em Cristo. [5]
[1] Dz 1818.
[2] Dz 1792, 1793, 1794 a b.
[3] DZ 2312. PAPA PIO XII. Carta Encíclica “Humani Generis”. n. 17.
[4] Cat.I.C. 91 Todos os fiéis participam da compreensão e da transmissão da verdade
revelada. Receberam a unção do Espírito Santo, que os instrui e os conduz à verdade em
sua totalidade.
Cat.I.C. 94 Graças à assistência do Espírito Santo, a compreensão tanto das realidades
como das palavras do depósito da fé pode crescer na vida da Igreja:
“Pela contemplação e estudo dos que creem, os quais as meditam em seu coração”, é em
especial “a pesquisa teológica que aprofunda o conhecimento da verdade revelada”.
“Pela íntima compreensão que os fiéis desfrutam das coisas espirituais”; “Divina eloquia
cum legente crescunt – as palavras divinas crescem com o leitor”.
“Pela pregação daqueles que, com a sucessão episcopal, receberam o carisma seguro da
verdade.”
Cat.I.C. 2104 “Todos os homens estão obrigados a procurar a verdade, sobretudo naquilo
que diz respeito a Deus e à sua Igreja e, depois de conhecê-la, a abraçá-la e praticá-la.” Este
dever decorre da “própria natureza dos homens” e não contraria um “respeito sincero” para
com as diversas religiões que “refletem lampejos daquela verdade que ilumina a todos os
homens”, nem a exigência da caridade que insta os cristãos a “tratar com amor, prudência e
paciência os homens que vivem no erro ou na ignorância acerca da fé”.
Cat.I.C. 2468 A verdade como retidão do agir e da palavra humana tem o nome de
veracidade, sinceridade ou franqueza. A verdade ou a veracidade é a virtude que consiste
em mostrar-se verdadeiro no agir e no falar, guardando-se da duplicidade, da simulação e
da hipocrisia.
[5] Cf. Hb 1,1 Muitas vezes e de modos diversos falou Deus, outrora, aos Pais pelos profetas; 2
agora, nestes dias que são os últimos, falou-nos por meio do Filho, a quem constituiu
herdeiro de todas as coisas, e pelo qual fez os séculos.
Cat.I.C. 66 “A Economia cristã, portanto, como aliança nova e definitiva, jamais passará, e
já não há que esperar nenhuma nova revelação pública antes da gloriosa manifestação de
Nosso Senhor Jesus Cristo”. Todavia, embora a Revelação esteja terminada, não está

13
SÃO GREGÓRIO MAGNO diz: “Com o progresso dos tempos, o
conhecimento dos Pais espirituais aumentou; pois, na Ciência de Deus,
Moisés foi mais instruído do que Abraão, os Profetas mais do que Moisés, os
Apóstolos mais do que os Profetas”. [1]
Com Cristo e os Apóstolos concluiu-se a Revelação Geral.
(Sententia certa)
O Papa Pio X rejeitou a doutrina liberal protestante e modernista da
evolução da religião através das “Novas Revelações”. Assim, ele condenou a
proposição de que: “A Revelação, que é o objeto da Fé Católica, não terminou
com os Apóstolos”. [2]
O ensinamento claro das Sagradas Escrituras e da Tradição é que depois
de Cristo e dos Apóstolos que proclamaram a mensagem de Cristo, nenhuma
outra Revelação será feita. Cristo foi o cumprimento da Lei do Antigo
Testamento, [3] e o mestre absoluto da humanidade: [4] “Um é o vosso mestre,
Cristo”. [5] Os Apóstolos viam em Cristo “a vinda da plenitude dos tempos” [6]
e consideravam como tarefa sua a preservação, integral e não falsificada, da
herança de fé que lhes foi confiada por Cristo. [7] Os Santos Padres

explicitada por completo; caberá à fé cristã captar gradualmente todo o seu alcance ao
longo dos séculos.
[1] SÃO GREGÓRIO MAGNO. Homiliae in Ezechielem. liber 2, homilia IV (4),12. PL 76,980B.
p. 496.
[2] Dz 2021.
[3] Mt. 5,17 Não penseis que vim revogar a Lei e os Profetas. Não vim revogá-los, mas dar-lhes
pleno cumprimento, 18 porque em verdade vos digo que, até que passem o céu e a terra, não
será omitido nem um só i, uma só vírgula da Lei, sem que tudo seja realizado. 19 Aquele,
portanto, que violar um só desses menores mandamentos e ensinar os homens a fazerem o
mesmo, será chamado o menor no Reino dos Céus. Aquele, porém, que os praticar e os
ensinar, esse será chamado grande no Reino dos Céus. 20 Com efeito, eu vos asseguro que se
a vossa justiça não exceder a dos escribas e a dos fariseus, não entrareis no Reino dos Céus.
21
Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; aquele que matar terá de responder no
tribunal. 22 Eu, porém, vos digo: todo aquele que se encolerizar contra seu irmão, terá de
responder no tribunal; aquele que chamar ao seu irmão ‘Cretino!’ estará sujeito ao
julgamento do Sinédrio; aquele que lhe chamar ‘Louco’ terá de responder na geena de fogo.
[4] Mt 23,10 Nem permitais que vos chamem ‘Guias’, pois um só é o vosso guia, Cristo.
[5] cf. Mt 28,18 Jesus, aproximando-se deles, falou: “Toda a autoridade sobre o céu e sobre a
terra me foi entregue. 19 Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos,
batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo 20 e ensinando-as a observar
tudo quanto vos ordenei. E eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos
séculos!”
[6] Gl 4,4 Quando, porém, chegou a plenitude do tempo, enviou Deus o seu Filho, nascido de
uma mulher, nascido sob a Lei, 5 para remir os que estavam sob a Lei, a fim de que
recebêssemos a adoção filial.
[7] 1Tm 6,14 guarda o mandamento imaculado, irrepreensível, até à Aparição de nosso Senhor
Jesus Cristo, … 20 Timóteo, guarda o depósito, evita o palavreado vão e ímpio, e as
contradições de uma falsa ciência, 21 pois alguns, professando-a, se desviaram da fé. A graça
esteja convosco!

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repudiaram indignados a pretensão dos hereges de possuir doutrinas
secretas ou novas Revelações do Espírito Santo. SANTO IRINEU DE LIÃO, [1] e
TERTULIANO [2] enfatizam, contra os gnósticos, que a plena verdade do
Apocalipse está contida na doutrina dos Apóstolos que é preservada
infalsificável através da sucessão ininterrupta dos bispos.
b) Quanto ao lado Formal do dogma, isto é, no conhecimento e na
proposta eclesiástica da Verdade Revelada, e consequentemente também na
fé pública da Igreja, há um progresso (desenvolvimento acidental dos
dogmas) que ocorre da seguinte maneira:
1) Verdades que antes eram apenas cridas implicitamente, são propostas
expressamente para serem cridas. “quantum ad explicationem crevit
numerus articulorum (fidei), quia quaedam explicite cognita sunt a
posterioribus, quae a prioribus non cognoscebantur explicite. Houve um
aumento no número de artigos (de fé) acreditados explicitamente, uma vez
que para aqueles que viveram em tempos posteriores alguns eram
conhecidos explicitamente, que não eram conhecidos explicitamente por
aqueles que viveram antes deles.” [3]
2) Dogmas Materiais são elevados ao status de Dogmas Formais.
3) Para facilitar a compreensão geral e evitar mal-entendidos e distorções,
as antigas verdades que sempre foram acreditadas, por exemplo, a União
Hipostática (unio hypostatica), Transubstanciação, etc., são formuladas em
conceitos novos e bem definidos.
4) As questões anteriormente disputadas são explicadas e decididas, e as
proposições heréticas são condenadas. “ab adversario mota quaestio
discendi existit occasio” (uma pergunta movida por um adversário dá
ocasião para aprender). [4]
A exposição dos dogmas no sentido dado é preparada pela ciência
teológica e promulgada pelo Magistério da Igreja sob a direção do Espírito
Santo. [5] Essas novas exposições da verdade dogmática são motivadas, por
um lado, pelo esforço natural do homem por uma compreensão mais
profunda da Verdade Revelada, e por outro lado por influências externas,

2Tm 1,14 Guarda o bom depósito, por meio do Espírito Santo que habita em nós.
2Tm 2,2 O que de mim ouviste na presença de muitas testemunhas, confia-o a homens
fiéis, que sejam idôneos para ensiná-lo a outros.
2Tm 3,14 u, porém, permanece firme naquilo que aprendeste e aceitaste como certo; tu
sabes de quem o aprendeste.
[1] SANTO IRINEU DE LIÃO. Adversus haereses. Liber III. Cap. 1; Liber IV. 35, 8
[2] TERTULIANO. De praescriptionibus adversus haereticos. 21. PL 2,33AB. ed. 1844. p.
31.
[3] Cf. S. Th. II-II, q. 1, a. 7.
[4] Cf. SANTO AGOSTINHO, De Civitate Dei contra Paganos libri viginti duo. Liber XVI,
Cap. 2, 1. PL 41,477. ed 1845. p. 247.
[5] Jo 14,26 Mas o Paráclito, o Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará
tudo e vos recordará tudo o que eu vos disse.

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como os ataques oriundos da heresia e da incredulidade: controvérsias
teológicas, avanços no conhecimento filosófico e na pesquisa histórica, no
desenvolvimento da liturgia e na afirmação geral da Fé nela expressa.
Até mesmo os Santos Padres enfatizam a necessidade de uma pesquisa
mais profunda sobre as verdades da Revelação, de esclarecer as obscuridades
e de desenvolver os ensinamentos da Revelação. Conforme clássico
testemunho de SÃO VICENTE DE LERIN [1] “Mas talvez alguém diga: Não
haverá então progresso na religião de Cristo? Certamente deve haver, mesmo
um grande e rico progresso … apenas, deve na verdade ser um progresso na
Fé e não uma alteração da Fé. Para o progresso é necessário que algo cresça
por si mesmo, para a alteração, porém, que algo mude de uma coisa para
outra.” [2]
5) Pode haver também um progresso na confissão de fé do crente
individual através da extensão e aprofundamento de seu conhecimento
teológico. A base para a possibilidade deste progresso está na profundidade
das verdades da Fé, por um lado, e, por outro, na variada capacidade de
perfeição da razão humana.
As condições para um verdadeiro progresso no conhecimento da fé por
parte das pessoas são, segundo a declaração do Concílio Vaticano I, o zelo, a
reverência e a moderação: cum sedule, pie et sobrie quaerit. [3]
§ 6. As Verdades Católicas
Correspondendo ao propósito da Autoridade de Ensino da Igreja de
preservar infalsificáveis e de interpretar infalivelmente as Verdades da
Revelação, [4] o objeto primário (obiectum primarium) do Ofício de Ensino
da Igreja é o corpo de verdades e fatos imediatamente revelados por Deus. O
poder doutrinário infalível da Igreja se estende, no entanto,
secundariamente a todas aquelas verdades e fatos que são uma consequência
do ensino da Revelação ou uma pressuposição dele (obiectum secundarium).
Essas doutrinas e verdades definidas pela Igreja não reveladas
imediatamente, mas como intrinsecamente conectadas com as verdades da
Revelação, de modo que sua negação prejudicaria as verdades reveladas, são
chamadas Verdades Católicas (veritates catholicae) ou Ensinamentos
Eclesiásticos (doctrinae ecclesiasticae) para distingui-las das Verdades
Divinas ou Doutrinas Divinas da Revelação (veritates vel doctrinae divinae).
[1] São Vicente de Lérins. Monge galo-romano, santo e Pai da Igreja. Nasceu em Toulouse,
na Gália. A notícia da sua vida resume-se em que, depois de uma existência mundana,
entrou no mosteiro de Lérins, perto de Marselha. Genadio de Marselha escreveu que
Vicente morreu durante o reinado dos imperadores Teodósio II do Oriente e Valentiniano
III do Ocidente, então sua morte deve ter ocorrido em 450, ou pouco antes. Suas relíquias
foram preservadas em Lérins.
[2] Dz 1800.
[3] Dz 1796.
[4] Dz 1800.

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Estes são propostos para a crença em virtude da infalibilidade da Igreja em
ensinar doutrinas de fé ou moral (fides ecclesiastica).
A estas verdades católicas pertencem:

1. Conclusões Teológicas (conclusiones theologicae)


Conclusões teológicas propriamente ditas. Por estes são entendidas as
verdades religiosas, que derivam de duas premissas, das quais uma é uma
verdade imediatamente revelada e a outra uma verdade da razão natural.
Uma vez que uma premissa é uma verdade da Revelação, as conclusões
teológicas são ditas como sendo mediata ou virtualmente (virtualiter)
reveladas. Se, no entanto, ambas as premissas são verdades imediatamente
reveladas, então a conclusão também deve ser considerada como sendo
imediatamente revelada e como o objeto da Fé Divina Imediata (fides
Immediate Divina).

2. Fatos Dogmáticos (facta dogmatica).


Fatos Dogmáticos. Por estes se entendem os fatos históricos, que não são
revelados, mas que estão intrinsecamente ligados à verdade revelada, por
exemplo, a legitimidade de um Papa ou de um Concílio Geral, ou o fato do
episcopado Romano de São Pedro. O fato de um texto definido concordar ou
não com a doutrina da Fé Católica também é, em sentido mais restrito, um
“fato dogmático”. Ao decidir o significado de um texto, a Igreja não
pronuncia julgamento sobre a intenção subjetiva do autor, mas sobre o
sentido objetivo do texto. [1]

3. Verdades da Razão
Verdades da Razão, que não foram reveladas, mas que estão
intrinsecamente associadas a uma verdade revelada, por exemplo, aquelas
verdades filosóficas que são pressupostos dos atos de Fé (conhecimento do
suprassensível, possibilidade de provas de Deus, espiritualidade da alma, o
livre arbítrio), ou conceitos filosóficos, em termos dos quais se promulga o
dogma (pessoa, substância, transubstanciação, etc.). A Igreja tem o direito e
o dever, para a proteção do patrimônio da fé, de proscrever ensinamentos
filosóficos que direta ou indiretamente ponham em perigo o dogma. O
Concílio Vaticano I declara: “Ius etiam et officium divinitus habet falsi
nominis scientiam proscribendi, Ele também tem o direito e o dever divinos
de proibir o conhecimento de um nome falso. [2]
[1] Dz 1350: sensum quem verba prae se ferunt.
[2] Dz 1798; 1Tm 6,20 Timóteo, guarda o depósito, evita o palavreado vão e ímpio, e as
contradições de uma falsa ciência, 21 pois alguns, professando-a, se desviaram da fé. A graça
esteja convosco! Cl 2,8 Tomai cuidado para que ninguém vos escravize por vãs e enganosas

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§ 7. Opiniões Teológicas
As opiniões teológicas são opiniões livres sobre aspectos das doutrinas
relativas à fé e à moral, que não são claramente atestadas na Revelação e
nem decididas pela Autoridade de Ensino da Igreja. Seu valor depende das
razões apresentadas em seu favor (associação com a doutrina da Revelação, a
atitude da Igreja, etc.).
Um ponto de doutrina deixa de ser objeto de livre julgamento quando o
Magistério da Igreja toma uma atitude claramente a favor de uma opinião. O
Papa Pio XII explica na Encíclica “Humani generis” (1950): “Quando os
Papas em seus Atos pronunciam intencionalmente um julgamento sobre um
ponto muito controverso, fica claro para todos que isso, de acordo com a
intenção e vontade desses Papas, não pode mais ser aberto à livre discussão
dos teólogos”. [1]

§ 8. Os Graus Teológicos de Certeza

1. Fides Divina – Fides Catholica – de Fide Definita


O mais alto grau de certeza pertence às verdades reveladas
imediatamente. A Fé que lhes é devida baseia-se na autoridade do Deus
Revelador (fides divina), e se a Igreja, por meio de seu ensinamento, atesta
que uma verdade está contida na Revelação, então a certeza se baseia
também na autoridade do Magistério Infalível de Ensino da Igreja (fides
catholica). Se as Verdades são definidas por um julgamento solene de fé
(definição) do Papa ou de Consílio Geral, elas são “de fide definita”.

2. Fides Ecclesiastica
As verdades Católicas ou doutrinas da Igreja, sobre as quais o infalível
Magistério da Igreja finalmente decidiu, sejam aceitas com uma fé baseada
na autoridade única da Igreja (fides ecclesiastica). Essas verdades são tão
infalivelmente certas quanto os dogmas propriamente ditos.

3. Sententia Fides Proxima


Uma sentença próximo da Fé (sententia fidei proxima) é uma
doutrina que é considerada pelos teólogos geralmente como uma verdade da
Revelação, mas que ainda não foi finalmente promulgada como tal pela
Igreja.

especulações da “filosofia”, segundo a tradição dos homens, segundo os elementos do


mundo, e não segundo Cristo.
[1] Dz 2313.

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4. Sententia ad Fidem Pertinens – Theologice Certa
Sentença pertencente a Fé, isto é, teologicamente certa [1] é uma doutrina
sobre a qual o Magistério da Igreja ainda não se pronunciou definitivamente,
mas cuja verdade é garantida por sua intrínseca conexão com a doutrina da
revelação (conclusões teológicas).

5. Sententia Communis
A Sentença Comum (sententia communis) é a doutrina que pertence em
si mesma ao campo das opiniões livres, mas que é aceita pelos teólogos em
geral.

6. Sententia Probabilis, Probabilior, Bene Fundata


As opiniões teológicas de menor grau de certeza são chamadas de
prováveis, mais prováveis, bem fundamentadas (sententia probabilis,
probabilior, bene fundata).

7. Sententia Pia
Aqueles que são considerados de acordo com a consciência da Fé da
Igreja são chamados de opiniões piedosas – sentença piedosa (sententia
pia).

9. Opinio Tolerata
O menor grau de certeza é possuído pela opinião tolerada (opinio
tolerata), que é apenas fracamente fundamentada, mas que é tolerada pela
Igreja.
No que diz respeito ao ensino doutrinário da Igreja, deve-se notar que
nem todas as afirmações do Magistério da Igreja sobre questões de fé e moral
são infalíveis e, portanto, irrevogáveis. Só são infalíveis os que emanam dos
Consílios Gerais que representam todo o episcopado e das Decisões
Pontifícias Ex Cathedra. [2] A forma ordinária e usual da atividade de ensino
papal não é infalível. Além disso, as decisões das Congregações Romanas
(Santo Ofício, Comissão Bíblica) não são infalíveis. No entanto,
normalmente eles devem ser aceitos com um consentimento interior que se
baseia na alta autoridade sobrenatural da Santa Sé (assensus internus
supernaturalis, assensus religiosus). O chamado “silentium obsequious”,
que é “silêncio reverente”, geralmente não é suficiente. Excepcionalmente, a
obrigação de acordo interno pode cessar se um perito competente, após

[1] Sententia ad fidem pertinens vel theologice certa.


[2] Cf. Dz 1839.

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renovada investigação científica de todos os fundamentos, chegar à
convicção positiva de que a decisão assenta em erro. [1]

§ 9. Censuras Teológicas
Por censura teológica entende-se o julgamento que caracteriza uma
proposição que toca a fé católica ou o ensinamento moral como contrária à fé
ou pelo menos como duvidosa. Se for proferida pela Autoridade do
Magistério da Igreja, é uma sentença de autoridade ou judicial (censura
authentica ou iudicialis). Se for pronunciado pela Ciência Teológica, é um
juízo doutrinário privado (censura doctrinalis).
As censuras usuais são as seguintes:

1. Propositio Haeretica
Uma proposição herética (propositio haeretica). Isso significa que a
proposição se opõe a um dogma formal;

2. Propositio Haeresi Proxima


Uma proposição próxima da heresia (propositio haeresi proxima) que
significa que a proposição se opõe a uma verdade próxima da fé (Sententia
fidei próxima);

3. Propositio Haeresim Sapiens ou de Haeresi Suspecta


Uma Proposição com Sabor ou Suspeita de heresia (propositio haeresim
sapiens ou de haeresi suspecta);

4. Propositio Erronea
Uma proposição errônea (propositio erronea), isto é, oposta a uma
verdade que é proposta pela Igreja como uma verdade intrinsecamente
ligada a uma verdade revelada (error in fide ecclesiastica) ou oposta ao
ensinamento comum dos teólogos (error theologicus);

5. Propositio Falsa
Uma Proposição Falsa (propositio falsa). isto é, contradizendo um fato
dogmático;

[1] Dz 1684, 2008, 2123.

20
6. Propositio Temeraria
Uma Proposta Temerária (propositio temeraria). isto é, desviando-se
sem razão do ensino geral;

7. Propositio Piarum Aurium Offensiva


Uma Proposta Ofensiva aos ouvidos piedosos (propositio piarum aurium
offensiva), isto é, ofensiva ao sentimento religioso;

8. Propositio Male Sonans


Uma proposição mal expressa (propositio male sonans), ou seja, sujeita a
mal-entendidos em razão de seu método de expressão;

9. Propositio Captiosa
Uma proposição capciosa (propositio captiosa), ou seja, repreensível por
causa de sua ambiguidade intencional;

10. Propositio Scandalosa


A Proposta emocionante escândalo (propositio scandalosa).
Quanto à forma das censuras, distingue-se entre a Damnatio Specialis,
pela qual uma censura é atrelada a uma proposição individual, e a Damnatio
na Globo, em que as censuras são impostas a uma série de proposições.

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