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UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTIS

CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE ARAGUAÍNA


COORDENAÇÃO DO CURSO DE HISTÓRIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE HISTÓRIA - PPGEHIST

EMANUELA DE MORAES SILVA

ENSINO DE HISTÓRIA EM DEBATE: A HISTÓRIA DA ÁFRICA E CULTURA AFRO-


BRASILEIRA NO LIVRO DIDÁTICO E A ESCOLA JOSÉ CAETANO DOS SANTOS
NA COMUNIDADE QUILOMBOLA SÃO VITOR – SÃO RAIMUNDO NONATO –
PIAUÍ.

Araguaína – Tocantins
2016
EMANUELA DE MORAES SILVA

ENSINO DE HISTÓRIA EM DEBATE: A HISTÓRIA DA ÁFRICA E CULTURA AFRO-


BRASILEIRA NO LIVRO DIDÁTICO E A ESCOLA JOSÉ CAETANO DOS SANTOS
NA COMUNIDADE QUILOMBOLA SÃO VITOR – SÃO RAIMUNDO NONATO –
PIAUÍ.

Dissertação apresentada à Universidade


Federal do Tocantins - UFT, como parte das
exigências do Programa de Mestrado
Profissional em Ensino de História -
PROFHISTÓRIA, para a obtenção do título de
Mestre.
Linha de pesquisa: Saberes Históricos no
Espaço Escolar.

Orientador: Prof. Dr. Dagmar Manieri

Araguaína – Tocantins
2016
ANEXAR FICHA CATALOGRÁFRICA
EMANUELA DE MORAES SILVA

ANEXAR O ORIGINAL ASSINADO

ENSINO DE HISTÓRIA EM DEBATE: A HISTÓRIA DA ÁFRICA E CULTURA AFRO-


BRASILEIRA NO LIVRO DIDÁTICO E A ESCOLA JOSÉ CAETANO DOS SANTOS
NA COMUNIDADE QUILOMBOLA SÃO VITOR – SÃO RAIMUNDO NONATO –
PIAUÍ.

Dissertação apresentada à Universidade


Federal do Tocantins - UFT, como parte das
exigências do Programa de Mestrado
Profissional em Ensino de História -
PROFHISTÓRIA, para a obtenção do título de
Mestre.
Linha de pesquisa: Saberes Históricos no
Espaço Escolar.

Orientador: Prof. Dr. Dagmar Manieri

BANCA EXAMINADORA

_______________________________
Prof. Dr. Dagmar Manieri (UFT - Orientador)

________________________________
Prof. Dr. Fernando Luiz Vale Castro (UFRJ)

_______________________________
Prof. Dr. Vasni de Almeida (UFT)

Aprovada em ___/___/___.
Às companheiras e companheiros que
acreditam que ao ensinar, aprendemos,
libertamos e somos libertados.
AGRADECIMENTOS

Grata à minha família de sangue, mãe, pai e irmã, pelo apoio ao longo de
todas às empreitadas que ousei fazer.
À minha família de amigas e amigos, figuras maternas que me adotaram
nessa caminhada, e mesmo nas ausências, estavam e estão comigo.
Às pessoas que não estão mais ao meu lado, mas jamais serão
esquecidas.
À Judson Jorge, Simone Cristina e Rafael pela colaboração nos trabalhos
de campo, inclusive quando o nosso transporte atolou e tivemos que dar aquele
empurrãozinho.
À professora de História, à direção da escola e aos alunos e alunas da
Unidade Escolar José Caetano dos Santos.
À toda comunidade São Vitor por nos receber tão bem.
Ao meu orientador Dagmar Manieri, pelas indicações, conversas, e
principalmente paciência, apontando caminhos para que este trabalho fosse
concluído.
Aos professores e professoras do Programa de Pós-graduação de Ensino
de História da Universidade Federal do Tocantins.
CNPq pela concessão da bolsa de estudos, sem a qual não teria
condições de permanecer no programa de pós-graduação.
À coordenadora nacional do Mestrado Profissional em Rede, ProfHistória,
Marieta Moraes, pela dedicação e atenção aos professores e professoras do ensino
básico.
Aos colegas do curso que ao logo do caminho se tornaram amigos e
amigas, principalmente a Mik-Elson Desidério (in memoriam), amigo querido à quem
dedico este trabalho.
A todos e todas que de uma forma ou de outra me auxiliou e me auxilia
nesta penosa, porém prazerosa vida acadêmica.
RESUMO

Os estudos sobre Ensino de História e Cultura Africana e Afro-brasileira vêm


ganhando cada vez mais espaços nos debates acadêmicos. Uma de suas razões é
a obrigatoriedade de seu ensino nas instituições escolares, a partir da lei 10.639/
2003. A proposta deste trabalho é fazer uma análise das diretrizes que regem e
orientam este ensino, tentando perceber como estes documentos compreendem
conceitos como: Alteridade, Diferença e Identidade e quais demandas sociais
inseriram este tema como obrigatório nas legislações educacionais. A partir de uma
perspectiva de um ensino para a diversidade, tentaremos fazer uma análise dos
discursos textuais e iconográficos de uma coleção didática “História nos dias de
Hoje”, editora Leya, do ensino fundamental (6º ao 9º ano) utilizada na Escola José
Caetano dos Santos, situada na comunidade Quilombola São Vitor, no município de
São Raimundo Nonato, Piauí, como também compreender o processo de escolha e
a apropriações que alunos e professores fazem com este material didático. Por fim,
este trabalho propõe caracterizar as experiências do ensino de História na escola e
sua relação com o passado desta comunidade, elaborando uma coletânea de
narrativas, a partir de entrevistas com os moradores mais antigos da comunidade.

Palavras-chave: Ensino de História. Livro Didático. História e Cultura Africana e Afro-


brasileira.
ABSTRACT

Studies on teaching of African and Afro-Brazilian culture are gaining more space in
academic debates. One of its reasons is the obligation of his teaching in schools,
from the Law 10.639 / 2003. The purpose of this study is to analyze the guidelines
that govern and guide this teaching, trying to understand how these documents
include concepts such as alterity, difference and identity and social demands which
inserted this topic as mandatory in educational legislation. From a perspective of
education for diversity, will try to make an analysis of textual and iconographic
discourse of a didactic collection "History in the days of Today," Leya publisher,
elementary school (6th to 9th grade) used in school José Caetano dos Santos,
located in the Quilomola comunity St. Victor, in São Raimundo Nonato, Piauí, but
also understand the process of choosing and appropriations that students and
teachers do with this learning material. Finally, this paper, we describe the history of
teaching experience at school and its relationship to the past of this community,
developing a collection of narratives, from interviews with older residents of the
community.

Key-words: History of Education. Textbook. History and African and Afro-Brazilian


Culture.
LISTA DE ILUSTRAÇÃO

Fotografia 1 - Documento 1 anexado nos materiais didáticos enviados pelo Fundo


Nacional de Desenvolvimento da Educação para a U.E. José Caetano dos Santos.
Fotografia 2 - Documento 2 anexado nos materiais didáticos enviados pelo Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação.
Fotografia 3 - Almoxarifado dos livros didáticos da U. E. José Caetano dos Santos.
Fotografia 4 - Unidade Escolar José Caetano dos Santos – São Vítor –São
Raimundo Nonato – Piauí.
Fotografia 5 - Comunidade Quilombola São Vitor - São Raimundo Nonato – Piauí.
Fotografia 6 - Pedra do São Vitor - São Raimundo Nonato – Piauí.
Fotografia 7 – Mureta de Pedra do São Vitor - São Raimundo Nonato – Piauí.
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Atividade realizada com alunos do ensino médio de escolas


públicas de zona urbana de São Raimundo Nonato, Piauí.
Tabela 2 - atividade realizada com alunos do ensino fundamental II da
escola pública municipal de zona rural de São Raimundo Nonato, Piauí.
LISTA DE SIGLAS

CNE Conselho Nacional de Educação


DCN’S Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica
FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
FCP Fundação Cultural Palmares
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC Ministério da Educação
PCN Parâmetros Curriculares Nacionais
SEB Secretaria de Educação Básica
SECADI Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e
Inclusão
PNLD Plano Nacional do Livro Didático
RTDI Relatório Técnico de Identificação e Delimitação
SEPPIR Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 13

CAPÍTULO I - HISTÓRIA E CULTURA DA ÁFRICA E DOS AFRO-BRASILEIROS E


A QUESTÃO DO OUTRO: O ENSINO DE HISTÓRIA PARA UMA EDUCAÇÃO DAS
RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS...........................................................................199

1.1 Identidade e Diferença nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação


Básica e o Ensino para a Diversidade. ..................................................................... 21
1.2 As políticas educacionais e as orientações para o ensino de História e Cultura
africana e afro-brasileira. ....................................................................................... 266

CAPÍTULO II - A ÁFRICA, OS AFRICANOS E OS AFRO-BRASILEIROS NOS


MANUAIS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA ..................................................................... 34

2.1 Seleção e Processo de escolha dos manuais didáticos para a escola José
Caetano dos Santos................................................................................................. 36
2.2 A História e Cultura africana e afro-brasileira na Coleção Didática “História nos
dias de Hoje” ............................................................................................................ 43

CAPÍTULO III - A UNIDADE ESCOLAR JOSÉ CAETANO DOS SANTOS: UMA


EXPERIÊNCIA PARA O ENSINO DE HISTÓRIA A PARTIR DA LEI Nº
10.639/03..........................................................................................................64

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 76

5 BIBLIOGRAFIA........................................................................................................79

6 APÊNDICE............................................................................................................ 84

7 ANEXOS................................................................................................................97
13

INTRODUÇÃO
Enquanto os leões não tiverem
seus historiadores, a história das
caçadas glorificarão os feitos
dos caçadores

Provérbio Yorùbá

Os estudos sobre o ensino de História da África e cultura Afro-brasileira,


vêm ganhando mais espaço na comunidade acadêmica. Uma das razões é a
obrigatoriedade do seu ensino nas instituições escolares, a partir da Lei nº 10.639, 1
promulgada em 2003. No entanto, mais de uma década se passou e as
preocupações sobre o “como” e o “quê” se ensinar sobre África ainda desencadeia
dúvidas aos que se dedicam ao seu estudo voltado para o ensino. De certo, muito se
avançou no âmbito das pesquisas voltadas para academia, nas pesquisas para o
ensino. Os desafios se apresentam no momento, no sentido de manter o diálogo
entre essas esferas de produção de conhecimento para que este mantenha contato
direto com os espaços escolares de ensino básico, que contempla a Educação
Infantil, os Ensinos Fundamental e Médio, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, a LDB 9394/ 962, que organiza e estrutura as modalidades
de ensino no Brasil.
A assertiva de que a História da África foi relegada a um segundo plano
reflete as dificuldades metodológicas e didáticas em ensiná-la e com a
obrigatoriedade dos estudos africanistas no ensino básico brasileiro, uma gama de
deficiências tem-se apresentado, na docência, na gestão escolar e nos materiais de
suporte didáticos. Essas deficiências comumente acabam por trabalhar a História e
cultura africana e afro-brasileira de forma generalizada e distorcida, europeizada,
estigmatizada, partindo de “uma tradição de imagens e representações formuladas

1
A lei 10.639/ 2003 foi alterada em 2008 pela Lei 11.645, ampliando a obrigatoriedade dos estudos
de História e Culturas indígenas, juntamente com os estudos de História e Cultura Africana e afro-
brasileira. Pelo direcionamento especifico, optamos por utilizar os termos da lei 10.639/ 03, por se
tratar do objeto de análise deste trabalho, não por suposta importância entre os temas, mas por
funções metodológicas de pesquisa, optamos pelo recorte.
2
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a LDB 9394/96, foi alterada pelas leis 10.639/03
e 11.645/ 08 com a inclusão dos artigos 26-A e 79-B (que terão seu espaço para discussão ao longo
do trabalho). No entanto, por motivos de destaque que essas leis tomaram, ainda nos referimos a
elas para tratar da obrigatoriedade do ensino da História e culturas Indígenas Africanas e afro-
brasileiras. Por tanto, é a LDB que salvaguarda essas leis e que, por conseguinte, é quem deve ser
cumprida pelos sistemas de ensino de todos os níveis e modalidades.
14

sobre África e suas populações, associam aos africanos um grande número de


estigmas e leituras depreciativas” (OLIVA, 2007, p. 03).
Essas tradições de imagens e representações sobre as quais nos diz
Oliva podem ser identificadas e localizadas nos manuais de suporte didáticos que
esta dissertação se propôs a fazer a análise em um capítulo especifico. Geralmente,
os conteúdos dos livros didáticos que fazem referência à África e à Cultura afro-
brasileira estão inseridos nos temas tradicionais. As temáticas que abordam o tema
“África” estão comumente inseridas em capítulos, tais como Civilizações Antigas:
Egito; Diásporas Africanas (deslocamentos populacionais forçados/ Resistencia e
libertação) África e Ásia no século XIX (Colonização e descolonização). Todos esses
tópicos inseridos no interior de grandes temas/conteúdos, num viés eurocêntrico,
não permitindo uma nova representação do continente Africano, silenciando suas
relações de resistência, organização social das comunidades africanas e suas
especificidades, religiosidade e cultura, reproduzindo com isso estereótipos e
distorções. Não podemos deixar de mencionar que novas abordagens da Historia da
África nos livros didáticos têm sido verificadas, devido às novas produções da
historiografia, como também por questões de políticas públicas desenvolvidas para a
educação. Tudo isto requer novas representações da identidade negra. No entanto,
ainda há elementos a serem inseridos e reelaborados.
Compreendendo a importância dos discursos textuais e iconográficos que
fazem parte dos manuais didáticos utilizados no ensino básico brasileiro,
destacamos as variadas abordagens do livro didático: como mercadoria; depositário
de conteúdos escolares; instrumento pedagógico; meio portador de sistema de
valores, de ideologia, culturas e construtor de identidades, além de passar por vários
sujeitos em seu processo de produção. Diante disto tudo, há o fato dos livros
didáticos sofrerem intervenção de alunos e professores que se apropriam de forma
diversificada em seu uso escolar. Como enfatiza Bittencourt, “para entender o papel
do que o livro didático desempenha, não basta analisar a ideologia e as defasagens
dos conteúdos (...) é preciso analisá-lo em todos os aspectos e contradição”
(BITTENCOURT, 2013, p. 73). Quanto aos critérios de escolha e avalição destes
livros didáticos, temos o Plano Nacional do Livro Didático (PNLD). Programa do
Governo Federal que distribui os livros para as escolas públicas, através do Guia do
Livro Didático, por conseguinte, os manuais que estão neste guia são selecionados
para suporte de apoio de alunos e professores para o ensino na rede pública
15

brasileira. O PNLD orienta e avalia as obras que se inscrevem em seus editais


trienais.
Como já foi citado, algumas narrativas didáticas ainda se utilizam do
modelo europeu de desenvolvimento (político, econômico e cultural). Eles não
apresentam uma abordagem da História que dê uma abertura para um debate mais
equitativo com outras culturas, priorizando a linearidade simplificada dos fatos
históricos; essa abordagem tende a conceber a história da África como
complemento à história dos europeus: o tráfico de escravos, o modelo de economia
escravista etc. Quanto à cultura de matriz africana no conjunto da cultura brasileira,
há uma ênfase em temas como a religião, a culinária, as danças, a música. Tudo
isso reforça os estereótipos da superioridade da cultura europeia como a
determinante para a formação da nação brasileira.
Portanto, devemos entender o livro didático como um objeto
multifacetado; como artefato cultural, ele mantém ou altera repertórios de
representações. O “objeto” livro didático compreende um rico material de análise,
onde constatamos permanências ou mudanças de discursos que compõem os
manuais didáticos de História, discursos esses que se reproduzem ou podem alterar
o desenvolvimento escolar, tanto dos professores, quanto dos alunos.
Outra questão importante para o debate do ensino de História da África e
Cultura afro-brasileira é a possibilidade do diálogo de questões como a identidade
no espaço escolar. A construção identitária, como enfatizam as produções mais
recentes, tem-nos auxiliado a tratar esses conceitos de forma mais plástica, onde
descartamos aquela ideia de uma identidade petrificada, integral, originária e
unificada, que nos fins do século XIX serviu como elemento ideológico no âmbito de
várias disputas. Compreendemos aqui, a Identidade como um conceito de uso
estratégico, elástico, onde as identidades dos sujeitos se alteram ao longo do tempo;
em nosso tempo atual, tais identidades estão cada vez mais fragmentadas,
“multiplamente construídas ao longo de discursos, práticas e posições que podem se
cruzar ou ser antagônicos. As identidades estão sujeitas a uma historicização
radical, estando constantemente em processo de mudança e transformação” (HALL,
2007, p. 108).
Ao referirmo-nos sobre o Ensino de História da África e Cultura afro-
brasileira, isto quer dizer também uma referência sobre a educação para as relações
Étnico-raciais que, segundo o Conselho Nacional de Educação (CNE), em sua
16

Resolução n° 1 de 20043 objetiva uma divulgação e promoção de conhecimentos,


atitudes, postura e valores que eduquem cidadãos acerca da pluralidade étnico-
racial. Eles devem interagir e negociar objetivos comuns que garantam a todos o
respeito aos direitos legais e valorização associada à identidade, buscando a
consolidação de uma postura democrática. O documento do CNE também destaca a
importância do Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e africana para que os
objetivos da educação das Relações Étnico-Raciais sejam cumpridos. Ao se
reconhecer e valorizar a identidade em termos da africanidade (através da História e
Cultura dos Afro-brasileiros,) garante-se o reconhecimento das raízes africanas que
constituem a nação brasileira, juntamente com os indígenas e os europeus.
Essa concepção do que vem a ser uma Educação para as Relações
Étnico-Raciais e os objetivos para esta educação é uma concepção norteadora que
deve ser ampliada, discutida e apropriada. São orientações, no entanto, em nível
nacional, que nos ajudam a pensar sobre as formas e os métodos de se trabalhar a
Lei nº 10.639/03, principalmente por meio da Diretriz Curricular Nacional (DCN) para
Educação das Relações Étnico-Raciais que este parecer implementa.
Ressaltamos a importância da inclusão da temática africana e
afrodescentes nas instituições de ensino para a formação da consciência histórica
livre de preconceitos e fortificada no discurso de pluriculturalidade e diversidade
étnica que formou, e forma, a realidade brasileira. Trazer esse tema para sala de
aula também serve de elemento para revisar as imagens que se têm do continente
africano nos alunos e, principalmente, dos elementos difusores dessa nova
abordagem da história da África, a escola, o livro didático e o professor.
Segundo Oliva, “se continuarmos a reproduzir essas leituras distorcidas, é
muito pouco provável que o imaginário de nossas futuras gerações sobre a África
sofra modificações significativa.” (OLIVA, 2007, p.18), e aqui entra o papel
fundamental das escolas, dos professores e dos manuais didáticos, que apesar dos
últimos anos, abordagens positivas sobre África, africanos e afro-brasileiros tem-se
apresentado nos livros.
Porém há ainda livros que continuam a reproduzir, principalmente nas
iconografias, que estereotipam a África, africanos e afro-brasileiros, com imagens

3
Esta resolução do Conselho Nacional de Educação institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o ensino de História da África e Cultura Afro-brasileira
e Africana que no primeiro capitulo deste trabalho, será desenvolvido uma análise da criação destas
Diretrizes e sua intrínseca relação com a alteração da LDB com a lei 10.639/03.
17

que brutalizam e normatizam a escravidão, ou mostram um continente da fome e


miséria e que se não continuarmos na tentativa de desconstrução destes discursos
negativos sobre África em toda sua complexidade, assim como as demais
sociedades, continuaremos a reproduzir estereótipos e preconceitos.
É somente com uma leitura renovada de nossa História e formação
cultural que iremos romper com os velhos paradigmas de uma História da África
submissa à saga de grupos heroicos europeus.
Permeados os tópicos desta pesquisa, proporemos aqui, no primeiro
capítulo intitulado “História e Cultura da África e dos Afro-brasileiros e a Questão do
Outro: O Ensino de História para uma Educação das Relações Étnico-raciais” uma
subdivisão em dois tópicos: primeiro “A Identidade e Diferença nas Diretrizes
Curriculares Nacionais da Educação Básica e o Ensino para a Diversidade”, onde se
percebe como este documento compreende questões como a alteridade, o estatuto
do Outro e suas reflexões para a construção da(s) Identidade(s) nos currículos
escolares. No segundo tópico “As Políticas Educacionais e as Orientações para o
Ensino de História e Cultura Africana e Afro-brasileira” há uma consideração sobre
os textos da Lei nº 10.639/03, das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação
para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana (2005). Documentos que conceituam, regem e normatizam
o Ensino de História da África e cultura Afro-brasileira no ensino básico brasileiro,
bem como as demandas sociais em torno desses temas.
No segundo capítulo, “A África, os africanos e os afro-brasileiros nos
manuais didáticos de História”, analisaremos os discursos textuais e iconográficos
sobre a África e os Afro-brasileiros em específico a coleção didática História nos dias
de Hoje, da Editora Leya. Esta obra é utilizada no ensino fundamental (6º ao 9º ano)
da Unidade Escolar José Caetano dos Santos da comunidade quilombola Lagoa do
São Vitor no Piauí. Trabalharemos também com o processo de escolha deste livro
para a escola, quais os métodos que os professores e gestores utilizaram para a
escolha dos livros didáticos, e os trâmites e negociações usados para esta escolha.
Seguindo a proposta do mestrado profissional em Ensino de História, o
terceiro capítulo tem caráter experimental/propositivo. Terá como campo de proposta
de ensino, a Unidade Escolar José Caetano dos Santos, situada no interior da
comunidade Lagoa do São Vitor, no território quilombola Lagoas, localizada no
sudeste do Piauí. Ela constitui-se de 118 comunidades, “com área de 60.917,463ha,
18

e fazem parte os municípios de São Raimundo Nonato (que concentra a maior área
do território e onde a comunidade Lagoa do São Vitor está localizada), Várzea
Branca, Fartura do Piauí, São Lourenço, Bonfim do Piauí e Dirceu Arcoverde”
(MATOS e MORAIS, 2013, p. 08). O capítulo intitulado a unidade escolar José
Caetano dos Santos: Uma experiência para o ensino de História a partir da Lei nº
10.639/03 tem como objetivo caracterizar a escolar e propor experiências para o
ensino de História. Neste contexto específico de uma comunidade quilombola,
podemos observar as dificuldades e perspectivas para este ensino. A proposta será
a partir de um grupo de trabalho e oficinas introdutórias sobre História e Memória
com alunos, orientada pelo professor, e culminará em uma coletânea de narrativas
que os moradores mais antigos da comunidade contam. Acreditamos que esta
proposta contribuirá para o ensino de História, já que corresponde às experiências,
às memórias e à História local da comunidade.
Antes de darmos início à pesquisa de fato, tomemos de empréstimo as
palavras do filósofo, filho de dois mundos (nascido na Inglaterra e criado em Gana),
Kwame Anthony Appiah. Em seu livro Na Casa de meu Pai: África na Filosofia da
Cultura, diz que, um ensaio que tenta abranger temas interdisciplinares, está fadado
a usar parte de seu tempo dizendo ao leitor algo o que ele já sabe, porém, devemos
imaginar os companheiros de leitura que estão entrando em contato com este tema
pela primeira vez, “antes de se perguntar por que expliquei o que não requer
explicação pra você”. E continua “E, quando constatar ignorando o que você julga
importante, lembre-se que ninguém é capaz de abranger todas as áreas com igual
competência e que isso não torna menos válida a tentativa” (APPIAH, 1997, p. 15).
Dito isto, deixo o registro do esforço e o rigor que um trabalho acadêmico
exige, e que em todo seu trajeto de escrita, tentará ser um pouco mais que um
ensaio.
19

CAPÍTULO I

HISTÓRIA E CULTURA DA ÁFRICA E DOS AFRO-BRASILEIROS E A QUESTÃO


DO OUTRO: O ENSINO DE HISTÓRIA PARA UMA EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES
ÉTNICO-RACIAIS.

Quando falamos de Ensino de História, logo nos vem a imagem da sala


de aula. E não há nada mais diversificado do que um sala de aula, que em média
comporta entre 30 a 40 alunos, todos diferentes entre si, em vários aspectos sociais
e culturais e que, no entanto, estão num mesmo espaço, para os mesmos fins:
apreender processos históricos, valores éticos e cidadania, transmitidos pelo
professor e que, ao fim do ano, possam progredir tanto nas séries escolar, quanto na
vida enquanto pessoas-cidadãos. Então, como o professor pode trabalhar com um
conjunto de alunos tão diferentes em suas especificidades?
Uma primeira problemática que logo localizamos refere-se ao seguinte
tema: como o professor de História, diante de grandes diferenças, pode nos auxiliar
a trabalhar questões como respeito e compreensão do Outro, da diferença e da
alteridade?
Quando nós pensamos em compreender o outro, quando nós intentamos
em ir ao outro não vamos para conhecê-lo, mas ao pensar o outro, começamos a
desconfiar de si mesmos. A ideia de alteridade é, sobretudo de relação ao
compreender o outro, você está alterando a você mesmo. Ao compreender o outro
estamos alargando o nosso próprio Eu, e leva, sobretudo, a uma profunda
desconfiança dos nossos próprios valores construídos socialmente.
Em que o Ensino de História pode contribuir para esse enriquecimento do
Eu? No confronto com o processo histórico, os acontecimentos, as diferentes formas
de organização de sociedades e povos (no exemplo deste estudo, os africanos e
afro-brasileiros) tudo isto contribui para enriquecer o nosso próprio “mundo da vida”
(termo utilizado frequentemente pela fenomenologia) Passamos a ter uma nova
compreensão acerca do Outro.
Este Outro, não entra em nossa compreensão, passivos, como se
esperassem por “nós” para serem vistos ou ouvidos. Este Outro, antes de tudo, é
agente e autônomo. A relação que se dá entre o eu e o outro é de compreensão
20

múltipla, a compreensão passa a ser de via dupla, eu compreendo o outro na


medida em que sou compreendido e assim se dá a situação relacional. Este estado
de compreensão nos leva a um estado de reflexão de nós mesmos.
Sendo assim, a análise proposta neste capítulo perpassa pela polaridade
entre o Eu e o Outro; buscando nas entrelinhas das Diretrizes Curriculares
Nacionais, dos Parâmetros Curriculares Nacionais de História e das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais algumas
respostas para uma educação equânime, tentando compreender a noção de
diferença em seu contexto escolar: nas dimensões físicas, ideológicas, étnicas,
culturais, religiosas e de gênero.
21

2.1 IDENTIDADE E DIFERENÇA NAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS


DA EDUCAÇÃO BÁSICA E O ENSINO PARA A DIVERSIDADE.

As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (utilizaremos


aqui a sigla DCN’s) são normas que regem e orientam o currículo escolar no Brasil.
Elas têm como finalidade a garantia da promoção da igualdade na aprendizagem,
propondo e orientando uma base comum dos conteúdos e do currículo escolar. As
DCN’s vêm com intuito de assegurar que o ensino básico tenha uma base nacional
comum, para que a formação dos alunos seja realizada de maneira igualitária, em
todas as escolas do país, respeitados as especificidades e contextos sociais de cada
região do país. Como fonte norteadora, as DCN’s dão às escolas e aos professores
uma autonomia no planejamento do currículo e da seleção de seus conteúdos:

Nesse sentido, as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação


Básica visam estabelecer bases comuns nacionais para a Educação Infantil,
o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, bem como para as modalidades
com que podem se apresentar, a partir das quais os sistemas federal,
estaduais, distrital e municipais, por suas competências próprias e
complementares, formularão as suas orientações assegurando a integração
curricular das três etapas sequentes desse nível da escolarização,
essencialmente para compor um todo orgânico. (BRASIL, 2013, p. 07).

O documento das DCN’s é formado por um conjunto de textos de


orientam professores e gestores a cumprirem os seguintes objetivos:
- sistematizar os princípios e diretrizes gerais da Educação Básica
contidos na Constituição, na LDB e demais dispositivos legais, traduzindo-os em
orientações que contribuam para assegurar a formação básica comum nacional,
tendo como foco os sujeitos que dão vida ao currículo e à escola;
- estimular a reflexão crítica e propositiva que deve subsidiar a
formulação, execução e avaliação do projeto político-pedagógico da escola de
Educação Básica;
- orientar os cursos de formação inicial e continuada de profissionais –
docentes, técnicos, funcionários – da Educação Básica, os sistemas educativos dos
diferentes entes federados e as escolas que os integram, indistintamente da rede a
que pertençam.
Dando mais especificidade aos objetivos das DCN’s, os textos abordam
os seguintes temas: Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação
22

Básica; Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil;


Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos;
Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio; Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio; Diretrizes da
Educação do Campo; Diretrizes Operacionais para o atendimento educacional
especializado na Educação Básica, na modalidade Educação Especial; Diretrizes
Curriculares Nacionais para oferta de Educação para Jovens e Adultos em situação
de privação de liberdade nos estabelecimentos penais, Diretrizes Operacionais para
a Educação Jovens e Adultos (EJA), Diretrizes Curriculares Nacionais para
Educação Escolar Indígena, Diretrizes para atendimento de educação escolar de
crianças, adolescentes e jovens em situação de itinerância, Diretrizes Curriculares
Nacionais para Educação Escolar Quilombola, Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-
Brasileira e Africana, Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos e
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental.
Neste primeiro momento, elencamos o texto geral das DCN’s para, numa
análise mais crítica, tentarmos compreender como esta Diretriz para base curricular
comum da educação age no tocante às relações de diversidade em que nosso país
é formado. Reiterando que estamos num momento histórico de renovação de
nossas práticas de ensino, novas abordagens e perspectivas dos manuais didáticos,
reconhecendo e afirmando as diferenças e as múltiplas identidades do Brasil. É
através da educação que podemos formar cidadãos capazes de conviver com as
diferenças.
Segundo Abreu e Matos (2008), as determinações legais são fruto do
encontro de múltiplas intenções e vontades. Os documentos finais nesse tipo de
processo são, antes de tudo, o resultado de muita negociação. Neste sentido, o
texto das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental não foge
desta perspectiva.
Em seus fundamentos, as DCN’s indicam que o Ensino Fundamental é
resultante de uma luta travada pelos diferentes grupos sociais, principalmente aos
setores populares onde a luta por esse direito está diretamente ligada ao exercício
da cidadania, “uma vez que a educação como processo do potencial humano
garante o exercício dos direitos civis, políticos e sócias” (BRASIL, 2013, p. 104).
Esse processo de formação de um “potencial humano”, nos leva a crer que a
23

educação tem como um dos objetivos primordiais o acesso ao conhecimento que,


consequentemente, nos leva a uma autonomia:

É urgente afirmar esse horizonte emancipatório em todas as ações e


intervenções, nas políticas, nos livros didáticos, na formação de
professores, nas ações afirmativas etc. Se essas intervenções perderem
essa dimensão libertadora e emancipatória e se reduzirem a ações
integracionistas sem intervir no sistema e nas logicas e estruturas
excludentes ou nas logicas do mercado ou do sucesso perdem seu sentido
de origem. (ARROYO, 2010, p. 118).

No entanto, como levar esta educação para uma postura mais


democrática para a escola, sabendo que ao longo de sua história tal sistema escolar
se estrutura como uma instituição reguladora e normatizadora? Segundo Arroyo
(2010), a escola tem sido, e continua sendo, extremamente reguladora das
instâncias da diferença, da diversidade dos povos e reproduzindo uma espécie de
marginalização. Regula o tempo de pesquisa, o tipo de conhecimento que considera
como legítimo, regula valores, culturas, as memorias e identidades a partir de
padrões universalistas. Tudo isto sem construir um dialogo com a diversidade ou
alteridade. As DCN’s como projeto norteador do currículo escolar, apresentam em
seu texto, exatamente o oposto deste ideário regulamentador. Em relação aos
direitos civis, políticos, sociais e o direito à diferença, seja esta cultural, étnica,
religiosa, de gênero, de orientação sexual, ressalta-se:

Nas ultimas décadas, tem se afirmado ainda, como resultado dos


movimentos sociais, o direto á diferença, como também tem sido chamado
o direito de grupos específicos verem atendidas suas demandas, não
apenas de natureza social, mas também individual. Ele tem fundamento a
ideia de que devem ser consideradas e respeitadas as diferenças que
fazem parte do tecido social e assegurado lugar à sua expressão. O direito
a diferença, assegurado no espaço publico, significa não apenas a
tolerância ao outro, aquele que é diferente de nós, mas implica na revisão
do conjunto dos padrões sociais da sociedade, exigindo uma mudança que
afeta a todos, o que significa que a questão da identidade e da diferença
tem caráter politico. O direito à diferença se manifesta por meio da
afirmação dos direitos das crianças, das mulheres, dos jovens, dos
homossexuais, nos negros, dos indígenas, das pessoas com deficiência,
entre outros, para que de fato se efetivares, necessitam ser reconhecidos
socialmente. (BRASIL, 2013, p. 105).
24

Utilizaremos o conceito de Identidade como um fenômeno circunstancial,


alterativo, relativo e de uso extremamente político. Entendemos aqui como a
Identidade pode ser agenciada de acordo com determinados contextos. É preciso
trabalhar as identidades, diferenciando-as, porém sem impor um padrão único. E, a
partir da compreensão de como essas identidades são formadas e em quais
contextos elas são construídas, é que segundo as DCN’s partimos para uma
formação de um currículo multicultural. Mas, aqui, reside uma questão: como fazer
este exercício de identidade, sem categorizar os sujeitos como superior e inferior?
Nós que ainda somos intolerantes com a diferença e tendemos a transformar tudo
que não nos é igual como “falta” (culturas que faltam isso, costumes que faltam
aquilo).
A construção identitária e a formação/reformação da memória, com suas
produções mais recentes, têm-nos auxiliado a abordar esses conceitos a seguir, de
uma forma mais plástica. Nos últimos anos, porém, o conceito de Identidade tem
sido um campo de investigação para várias disciplinares. Todas essas novas
posturas criticam a ideia de uma identidade integral, originária e unificada. Portanto,
há uma nova compreensão sobre a Identidade como um conceito “estratégico, onde
as identidades dos sujeitos se alteram ao longo do tempo, e estão cada vez mais
fragmentadas e fraturadas e multiplamente construída ao longo de discursos” (HALL,
2007: 108). As identidades estão constantemente em processo de mudança e
transformação.
Nas DCN’s, a escola tem um papel primordial para a elaboração do
currículo escolar, de acordo com o contexto e as experiências que a escola traz,
buscando articular a experiência dos alunos, seus saberes, suas histórias de vida.
Partindo para um currículo multicultural, temos uma abordagem:

A perspectiva multicultural do currículo, leva ao reconhecimento da riqueza


das produções culturais e à valorização das realizações dos indivíduos e
grupos sociais e possibilita a construção de uma autoimagem positiva a
muitos alunos que vêm defrontando constantemente com fracasso escolar,
agravadas pela discriminação manifesta ou escamoteada no interior da
escola. Além de evidenciar relações interdependência e poder na sociedade
e entre sociedades e culturas, a perspectiva multicultural tem o potencial de
conduzir a uma profunda transformação do currículo comum. ( BRASIL,
2013, p. 115).
25

Para Tomaz Tadeu da Silva (2009), um currículo multicultural caracteriza-


se por não compreender as diferenças culturais fora das relações de poder, como
cita a DCN’s. Para além de um currículo que se baseie nas propostas como de
tolerância e respeito entre as diferentes culturas, a abordagem crítica deste currículo
multicultural é que, termos como tolerância e respeito “implica certa superioridade de
quem mostra tolerância e a noção de respeito implica certo essencialismo cultural,
pela qual as diferenças são fixas, devidamente estabelecidas, restando apenas,
respeitá-las” (SILVA: 2009, p. 88)
Portanto, as propostas das DCN’s, como um documento normatizador do
currículo escolar nacional, nos orientam a trabalhar numa perspectiva multicultural,
que a partir de uma abordagem crítica, para além do ensino do respeito e da
tolerância, manter em constante debate essas questões sobre a diferença, como são
produzidas, e em qual contexto, evitando, assim, como já dito, essencialismo ou
naturalizando as diferenças.

A escola, face às exigências da Educação Básica, precisa ser reinventada:


priorizar processos capazes de gerar sujeitos inventivos, participativos,
cooperativos, preparados para diversificadas inserções sociais, políticas,
culturais, laborais e, ao mesmo tempo, capazes de intervir e problematizar
as formas de produção e de vida. A escola tem, diante de si, o desafio de
sua própria recriação, pois tudo que a ela se refere constitui-se como
invenção: os rituais escolares são invenções de um determinado contexto
sociocultural em movimento. (BRASIL, 2013, p. 16).

É a partir dessas lacunas que podemos subverter a instituição escolar


reguladora, como um espaço de compreensão das diferenças, como espaço de
disputas dessas diferenças e que constantemente se agenciam, se modificam, se
alteram.
26

2.2 AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS E AS ORIENTAÇÕES PARA O ENSINO DE


HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA

Iniciar uma escrita diante de um tema tão amplo nos vem à memoria os
escritos de Galeano, onde o garoto que nunca tinha visto o mar chama seu pai para
ajudá-lo a olhar. Aqui, nos deparamos com um oceano, denominado Atlântico, que
nos faz perder a vista diante de tantas vidas e histórias que cruzaram este oceano,
bem como de tantas outras que ficaram pelo caminho.
O Brasil, desde as suas primeiras narrativas históricas enquanto nação
tentou construir a ideia de que estamos num país de democracia racial. 4 Em meados
do século XIX, os desdobramentos deste “mito da democracia racial”, na afirmação
de Cabral e Coelho, “podem ser percebido sem dificuldades; um dos mais evidentes
ficou conhecido como ideologia do “branqueamento” (COELHO E CABRAL, 2008, p.
27). O pensamento que propunha o embranquecimento da população brasileira,
surgido em fins do século XIX, a partir dos estudos de Nina Rodrigues (médico
baiano), do sociólogo Oliveira Viana e de João Batista de Lacerda, também médico,
no início do século XX. Todos eles acreditavam que o Brasil deveria, através da
mestiçagem, adquirir um padrão europeu, como raça branca - tinha “jeito” se,
através da mestiçagem, se “lavasse com a gene branca, superior, o sangue
brasileiro” - Daí o incentivo imigratório europeu, patrocinado pelo governo até os
anos 1930 e encerrada por Getúlio Vargas. Toda essa mentalidade de
“embranquecimento” ainda permanece, em alguns aspectos, arraigada na
mentalidade do povo brasileiro (PEREIRA, 2012, p. 22). De fato, esse ideal de
“branqueamento” permanece em nossa história. Se na fase da escravidão o negro
era associado ao trabalho escravo, como concebê-lo no período após a Abolição?
No entender de Thomas Skidmore (que se contrapõe a de Florestan Fernandes),
mesmo antes da Abolição presenciava-se no Brasil “oportunidades econômicas e
sociais” para homens livres de cor; isto é uma prova do “padrão multirracial da
categorização racial” no Brasil. (SKIDMORE, 1976, p. 60). O ideal de
“branqueamento”, por exemplo, apresenta-se como ideia básica em muitos

4
Embora, na prática real, não era isto que se presenciava. O decreto nº 1.331, de 17 de fevereiro de
1854, estabelecia que nas escolas públicas do país, não seriam permitidos escravos, e a previsão de
instrução para adultos negros dependia da disponibilidade do professor; o decreto nº 7.031 – A de 6
de setembro de 1878, estabelecia que os negros só podiam estudar no período noturno.
27

intelectuais. Oliveira Viana foi um deles. Em sua visão, “as duas raças primitivas
(negros e índios) só se tornariam agentes civilizadores (...) [se perdessem] sua
pureza e [cruzassem] com a branca” (p. 222). Após Oliveira Viana, também Gilberto
Freire, Paulo Prado e Alberto Torres compartilharam desse ideal de
“branqueamento”. Segundo Gomes:

Raça é entendida como uma construção social e histórica. Ela é


compreendida também no seu sentido politico como uma ressignificação do
termo construída na luta política pela superação do racismo na sociedade
brasileira. Nesse sentido, refere-se ao reconhecimento de uma diferença
que nos remete a uma ancestralidade negra e africana. Trata-se, portanto,
de uma forma de classificação social construída nas relações sociais,
culturais e politicas brasileiras. (GOMES, 2010, p.98).

A partir daqui, daremos uma atenção especial ao papel do Movimento


Negro, sua postura diante desta situação das desigualdades que permeia as
populações negras. Desde os fins do século XIX, circulavam periódicos editados por
negros cujos principais temas eram a “raça negra” e o preconceito. Periódicos
intitulados Treze de Maio, fundado no Rio de Janeiro em 1888, A Pátria, em São
Paulo, 1889, O Exemplo, em Porto Alegre, 1892 (ALBERTI e PEREIRA: 2007).
E Assim, durante os anos a seguir e nos dias atuais, o movimento negro
ou o negro em movimento como fala Nilma Lino Gomes, atua em busca de direitos,
reconhecimento e valorização da cultura e História dos negros no Brasil. Há de se
reconhecer, também, ações apoio de indivíduos de fora do movimento; mas o
protagonismo negro foi essencial, requisitando o devido reconhecimento e
representatividade na sociedade brasileira, principalmente no âmbito educacional.
Sobre o Movimento Negro, podemos afirmar:

Enquanto movimento social pode ser compreendido como um novo sujeito


coletivo e politico que, juntamente com os outros movimentos sociais,
emergiu na década de 70 no cenário brasileiro. Enquanto sujeito coletivo,
esse movimento é visto de Sader (1988), ou seja, como uma coletividade
onde se elaboram identidades e se organizam praticas através das quais
defendem-se interesses, expressam-se vontades e constituem-se
identidades, marcados por interações, processos de reconhecimento
recíprocos, com uma composição mutável e intercambiável. Enquanto
sujeito político, esse movimento produz discursos, reordena enunciados,
nomeia aspirações difusas ou as articula, possibilitando aos indivíduos que
dele fazem parte reconhecerem-se nesses novos significados. Abre-se
espaço para interpretações antagônicas, nomeações de conflitos, mudança
de sentido das palavras e praticas, instaurando novo significados e novas
ações. (ALBERTI e PEREIRA: 2007, p. 108)
28

A gênese do movimento negro está associada à conscientização que


envolve o tema da diferença: “A conscientização da diferença, de forma a
transformá-la em atitudes politicas, no entanto, encontrava um obstáculo. A
identidade brasileira pautava-se na ideia da ausência da discriminação”. (COELHO
E CABRAL, 2008, p.27). Reconhecer a discriminação era reconhecer que o mito
fundador da democracia racial era uma falácia, algo que precisaria ser revisto. Nesta
nova abordagem, dever-se-ia problematizar todas as narrativas que comportassem
uma fundamentação mais sólida e verídica sobre a “construção do Brasil”:

O fato dessas ações serem projetos e propostas construídos por um povo


que tem em seu passado, a sua história e a sua cultura desenvolvidos no
contexto de opressão e dominação tais como: a colonização, a escravidão,
o racismo e a desigualdade social e racial e que, mesmo assim, segue
persistindo e colocando questões para a sociedade , para a educação e
para o Estado brasileiro, pode ser visto como o potencial emancipatório das
lutas e da organização politica dos negros no brasil e na diáspora. Esse
potencial também é visto na capacidade de mudança social, educacional,
cultural e politica que a comunidade negra “em movimento”, com sua
contradições, tensões e lutas consegue imprimir nos vários países da
diáspora africana. (GOMES, 2010, p.106).

Segundo Monica Lima (2006, p. 41), a negação da História dos povos


africanos e seus descendentes sempre esteve associada a formas de controle social
e dominação ideológica, além do interesse na construção da identidade brasileira
pautada no “branqueamento”, já discutido anteriormente.
Em janeiro de 2003, foi aprovada a Lei nº 10.639/03 que tornou
obrigatório, nas instituições escolares, o ensino de História e cultura Afro-brasileira:

26 A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais


e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-
Brasileira.
§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o
estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a
cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional,
resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e
política pertinentes à História do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão
ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de
Educação Artística e de Literatura e História Brasileira ( BRASIL, 2003).
29

A Lei nº 10.639/ 2003 foi alterada, em 2008, pela Lei nº 11.645, ampliando
a obrigatoriedade dos estudos de História e Culturas indígenas, juntamente com os
estudos de História e Cultura Africana e afro-brasileira. Pelo direcionamento
especifico, optamos por utilizar os termos da Lei nº 10.639/03, por se tratar do objeto
de análise deste trabalho, não pela suposta importância entre os temas, mas por
funções metodológicas de pesquisa, optamos pelo recorte. As Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, a LDB 9394/96, foi alterada pelas leis 10.639/03 e 11.645/08
com a inclusão dos artigos 26-A e 79-B. No entanto, pela importância que essas leis
tomaram, ainda nos referimos a elas para tratar da obrigatoriedade do ensino da
História e Culturas Indígenas, Africanas e afro-brasileiras. Portanto é a LDB que
salvaguarda essas leis e que, por conseguinte, devem ser cumpridas pelos sistemas
de ensino de todos os níveis e modalidades do país.
Com a alteração da LDB, a partir da inclusão da Lei nº 10.639/03, é criado
pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), tendo como relatora a professora
Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, que produziu as Diretrizes Curriculares
Nacionais de Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana. A finalidade deste documento é regulamentar e
orientar a alteração das Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

A obrigatoriedade de inclusão de História e Cultura Afro-Brasileira e


Africana nos currículos e da Educação Básica trata-se de decisão politica,
com forte repercussão pedagógica, inclusive na formação de professores.
Com esta medida, reconhece-se que além de garantir vagas pra negros nos
bancos escolares, é preciso valorizar devidamente a historia e cultura de
seu povo, buscando reparar danos, que se repetem há cinco séculos, à sua
identidade e a seus direitos. A relevância do estudo decorrente da historia e
cultura afro-brasileira e africana não se restringe a população negra, ao
contrario, diz respeito a todos os brasileiros, uma vez que devem educar-se
enquanto cidadãos atuantes no seio de uma sociedade multicultural e
pluriétnica, capazes de construir uma nação democrática. (BRASIL, 2005, p.
17).

Reiterando que nos livros didáticos de História do Brasil, mesmo com as


leis, diretrizes e orientações para uma nova perspectiva sobre a História dos
africanos e afro-brasileiros e sua cultura, os afrodescendentes “pareciam
coisificados ou quase invisíveis. Mesmo quando louvados, como Zumbi dos
30

Palmares,5 ainda sim representava um breve paragrafo na História e sobre África


então, parecia tudo ainda longe” (LIMA, 2006, p.42).
Geralmente, os conteúdos dos livros didáticos que fazem referência à
África e Cultura afro-brasileira estão inseridos nos temas tradicionais. As temáticas
que abordam a África estão inseridas em: Civilizações Antigas: Egito; Diásporas
Africanas (deslocamentos populacionais forçados/Resistência e libertação) África e
Ásia no século XIX (Colonização e descolonização).
Todos esses tópicos são inseridos no conjunto de grandes temas/
conteúdos, num viés eurocêntrico. Eles não permitem uma nova representação do
continente Africano, pouco percebem suas relações de resistência, organização
social das comunidades africanas e suas especificidades de ordem religiosa,
cultural. Por isso, reproduzem estereótipos e causam distorções. Não podemos
deixar de mencionar que novas abordagens da Historia da África e Cultura Afro-
Brasileira, nos livros didáticos, tem sido revisadas. Isto ocorreu devido a mudanças
da produção historiográfica, bem como por questões de políticas públicas
desenvolvidas no setor educacional que requer uma nova representação da
identidade negra. No entanto, é necessária uma ampliação de perspectivas:

Não se trata de mudar um foco etnocêntrico marcadamente de raiz europeu,


por um africano, mas de ampliar o foco dos currículos escolares para
diversidade cultural, racial, social e econômica brasileira. Nesta perspectiva,
cabe ás escolas incluir no contexto dos estudos e atividades, que
proporciona diariamente, também as contribuições histórico-culturais dos
povos indígenas e dos descendentes asiáticos, além de raiz africana e
europeia que o Art. 26 A acrescido Lei 9394/ 1996 provoca bem mais do
que a inclusão de novos conteúdos, exige que se repensem as relações
Étnico-raciais, sócias, pedagógicas, procedimentos de ensino, condições
oferecidas para aprendizagem, objetivos tácitos, explícitos da educação
oferecida pelas escolas. (BRASIL, 2005, p. 17).

Então, por onde começar a trabalhar a História da África e dos africanos,


sob o viés de que a África tem sua própria História? É complexo falar de “uma África
no singular ou de uma África no Brasil. São muitas sociedades, diversas em seu
desenvolvimento, em sua origem em sua cultura” (LIMA, 2006, p. 44).

5
Zumbi dos Palmares (1655? -1695). Líder mais conhecido da confederação de quilombo de
Palmares, que se estava localizado nos territórios da atual Alagoas e Pernambuco. O dia 20 de
novembro data de sua morte, é lembrado como dia da Consciência Negra.
31

Primeiramente devemos entender que o continente africano, assim como


as demais regiões, possuem suas especificidades e singularidades culturais. É
exatamente quando ingressamos neste campo, que estamos sujeitos (devido à
gama de interpretações que a história nos permite) a uma má interpretação
reproduzindo o racismo e outras formas de preconceitos de ordem religiosa ou
cultural.
A África como berço da humanidade, ponto de partida para o povoamento de
várias regiões, berço das primeiras civilizações e de grandes reinos. Para
entendermos a variedade de abordagens sobre a África, Moore lança a seguinte
proposta:

A África deve ser estudada a partir de suas próprias estruturas, analisando-


as em função das interrelações dentro do continente, mas também em
relação ao mundo extra-africano. Somente assim se poderão descobrir as
múltiplas maneiras pelas quais a evolução dos povos africanos interferiu
e/ou influenciaram eventos nas diversas sociedades do mundo e não
somente o inverso, como se dá o caso até agora. Um enfoque diacrônico
que privilegie tanto as relações intra-africanas como a interação do
continente com o mundo exterior permitirá dar conta de fenômenos e de
períodos que ainda se mantém na escuridão e são lacunas do
conhecimento mundial. (MOORE, 2005, p. 13).

Portanto, a intenção não é isolar a África como costumeiramente tem sido


realizado, mas integrá-la à história do restante do mundo como princípio formador.
Para Moore, somente uma periodização de longa duração poderia refletir esses
fatos históricos que a ciência moderna legitima e convir àquelas singularidades que
são próprias à historiografia africana. Há várias formas de abordagem para
potencializar a inteligibilidade desses grandes períodos de uma história com tal
extensão (MOORE, 2005, p. 13). Pela proposta acima, podemos utilizar um padrão
de periodização da História da África que leva em conta:

O processo de hominização; o povoamento do continente africano pela


humanidade arcaica; os êxodos do continente e o subsequente povoamento
do planeta; o processo de migração intra-africana, sedentarização e
assentamento agrícola; o processo da construção dos primeiros Estados
agro- burocráticos da história; as lutas e rivalidades políticas entre povos e
nações africanas, os expansionismos intra-africanos desde a antiguidade
núbio-egípcia até a contemporaneidade; as invasões do exterior; a
conquista e colonização árabe da África setentrional; os tráficos negreiros
intra-continentais e transoceânicos; os processos de desintegração de
espaços sócio-históricos constituídos e, consequentemente, os processos
de regressão social; a conquista e colonização europeia de todo o
32

continente africano; as lutas de libertação e a descolonização da África.


(MOORE, 2005, p. 21)

Quanto à África no Brasil, devemos nos lembrar do processo histórico que


explica a vinda da população africana ao continente americano. De forma alguma
negligenciando o período de cativeiro e exploração que por aqui passaram e
sofreram; porém não deixando de constatar que eram pessoas com vontades,
desejos e esperanças. Mesmo o sistema escravista, de certa forma, concebendo-os
como “coisas”:

Os africanos ensinaram aos habitantes do território brasileiro e das


Américas escravistas muitas coisas fundamentais para sobrevivência e
funcionamento do chamado “Novo Mundo”. E realizaram outras tantas
criações a partir de sua capacidade de aprendizado. Foram artífices,
construtores, cirurgiões-barbeiros, cozinheiras. Foram agricultores que
trouxeram novas plantas, que serviram e servem como alimento e remédio,
e também introduziram diferentes técnicas de cultivo. Entres esses
escravos, havia artistas, músicos com novos instrumentos, ritmos e
movimentos que encheram nossa terra de cores e sons [...] E suas línguas
modificaram o português, fizeram dele sua língua nacional, levando-o pelo
território e introduzindo palavras e tonalidades. E também trouxeram novas
maneiras de se comportar nas relações familiares, de se relacionar com o
sagrado, novos modos de celebrar e de se ligar aos antepassados, ou seja,
posturas diante da vida e da morte. ( LIMA, 2006, p. 45)

No texto das Diretrizes, sugere-se que o ensino de História Afro-Brasileira,


deverá comtemplar, também, as iniciativas e as organizações de populações negras,
incluindo a história dos quilombos, a começar pelo de Palmares, e de remanescente
de quilombos. Esses locais têm contribuído para o desenvolvimento de
comunidades, bairros, localidades e municípios, regiões (associações negras,
recreativas, culturais, educativas, artísticas, de assistência, de pesquisa, irmandades
religiosas e grupos do Movimento Negro, por exemplo):

Assim os estudantes podem reconhecer de forma prática que tradições e


experiência confluíram para definir hoje, a identidade negra dos grupos
estudados. Além do mais, abre-se a possibilidade de se avaliar a atuação
politica dos afrodescendentes para além da luta contra a escravidão,
perspectiva que predomina nos livros didáticos e no próprio ensino de
história. (ABREU E MATTOS, 2008, p. 15).
33

Problematizar as datas atribuídas às comemorações das datas cívicas


também é uma das orientações que as Diretrizes estabelecem. Elas devem ser
atribuídas à luta contra o racismo, como o 20 de Novembro (Dia da Consciência
Negra), 13 de Maio (Dia da Luta contra o Racismo), 21 de Março (Dia Internacional
da Luta pela Eliminação da Discriminação Racial). Abreu e Matos afirmam:

É possível problematizar historicamente os contextos em que foram


instituídas, não apenas no Brasil, datas cívicas ligadas à afirmação da
consciência negra e à luta contra o racismo. Historicizar tais datas
comemorativas, confrontando com documentos de época, apresenta-se
como excelente forma de ensinar, de uma perspectiva critica e dinâmica, a
história das relações Étnico-raciais no Brasil, relacionando-a com a memoria
da experiência da escravidão e da abolição, e de suas mudanças na nossa
historia recente. (ABREU E MATTOS, 2008, p. 16)

Portanto, abordando a História Africana e Cultura Afro-Brasileira desta


maneira, não se desconfiguraria a historicidade desses povos. Haveria uma maior
inteligibilidade para os estudos e o ensino desses povos, onde “cultura brasileira e
sua pluriculturalidade devem ser pensadas e consideradas os intercâmbios e trocas
entre culturas, pondo em evidência a pluralidade da própria experiência negra no
país” (ABREU E MATTOS, 2008, p. 16). Afinal, o papel do historiador (e do professor
de História) é repensar o passado para que ele sirva como fator de ampliação e
aprofundamento de nossa postura democrática. Isto não quer dizer que os
historiadores devam mudar os acontecimentos históricos. O que constatamos,
segundo as novas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCN’s) é
que se pode utilizar a História para enriquecer a postura democrática no Brasil.
“Tornar o passado melhor significa dar um sentido que pode mudar as
atitudes das pessoas na luta da busca ou afirmações de suas identidades. Isso é o
que se chama de razão prática.” (RÜSEN: 2001) O exemplo de que se pode ver um
passado de forma diversa, comprova a possibilidade do reconhecimento da
“diferença significativa” (na expressão de Pierucci), quebrando os resquícios do
etnocentrismo.
34

CAPÍTULO II

A ÁFRICA, OS AFRICANOS E OS AFRO-BRASILEIROS NOS


MANUAIS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA

Segundo a historiadora Selva Guimarães Fonseca, o livro didático é o


principal veiculador de conhecimentos sistematizados que são utilizados nas escolas
no Brasil. A distribuição desses livros é feita a partir de programas como Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação, o FNDE, adquiridas e distribuídas pelo
Ministério da Educação, além de passar pela seleção e avaliação do Plano Nacional
do Livro Didático (PNLD), cujo guia serve como documento orientador e mediador
entre as coleções didáticas para a escolha de livros nas escolas públicas no Brasil e
os professores da rede. Em suas orientações, há uma referência de que estes
manuais devam contribuir para o aprofundamento dos conceitos estruturantes da
disciplina História, tais como fontes, historiografia, memória, acontecimento,
sequência, duração, sucessão, periodização, fato, processo, simultaneidade, ritmos
de tempo, medidas de tempo, sujeito histórico, espaço, historicidade, trabalho,
cultura, identidade, semelhança, diferença, contradição, permanência, mudança,
evidência, causalidade, multicausalidade, ficção, narrativa. Além de desenvolver
abordagens qualificadas sobre a História da África, história e cultura dos
afrodescendentes e dos povos indígenas. (PNLD, 2015, p. 20).
O PNLD 2015 adquiriu 144 milhões 291 mil e 373 exemplares, 6
beneficiando ao todo, neste mesmo ano, 30 milhões 601 mil e 334 alunos de escolas
públicas de ensino fundamental e médio em todo país. Esses números nos dão ideia
da quantidade de alunos que utilizam este material escolar. Segundo Oliva (2007),
este material está tão integrado ao sistema educacional que os próprios documentos
legisladores do ensino os definem e dão sentido para seu uso, como os PCN’s:

Os livros, os manuais e apostilas são bem aceitos no sistema educacional


brasileiro atendem as expectativas e concretizam modelos, concordâncias e
aceitações por parte de um grande número de agentes sociais e
institucionais. (...) Para o professor, assegura um modelo de prática,

6
FNDE, Fundo Nacional de desenvolvimento da Educação. Programa do Livro Didático. Disponível
em: http://www.fnde.gov.br/programas/livro-didatico/livro-didatico-dados-estatisticos.
35

segurança no processo de desenvolvimento do trabalho e eficiência na


transmissão de conteúdos exigidos por programas ou currículos. Para as
famílias, expressam um sinal de qualidade na educação. E para a indústria
editorial garantem mercado certo e seguro. Existem livros, manuais,
apostilas de boa e má qualidade. Todas precisam ser analisadas e
avaliadas pelos professores. (Ministério da Educação, 1999: 79 Apud
OLIVA, 2007: 235).

O livro didático, apesar de muitas críticas, principalmente para os livros


didáticos de História, segundo Bittencourt (2003) – por ainda reproduzir e difundir
conteúdos conservadores e muitas vezes preconceituosos – está paulatinamente
sendo revisado e reformulado devido às demandas sociais, reformas do currículo
escolar, processos de avaliações do próprio sistema educacional e da própria escola
além dos professores, que também começam a fazer parte da escolha dos materiais
utilizados na sala de aula. A partir de todas as criticas e apesar de todas essas
mudanças, é possível concluir que “não existe livro didático ideal, mas que, no
entanto, ele continua sendo um instrumento escolar muito importante”
(BITTENCOURT, 2003, p. 54).
36

3.1 SELEÇÃO E PROCESSO DE ESCOLHA DOS MANUAIS DIDÁTICOS PARA A


ESCOLA JOSÉ CAETANO DOS SANTOS

Para compreendermos o processo de escolha do material didático


utilizado na unidade escolar José Caetano dos Santos, na comunidade quilombola
do São Vitor (no Estado do Piauí), entrevistamos a professora de História do ensino
fundamental, do 6º ao 9º ano, a quem nomearemos sob o codinome Rosa*, pois a
professora não quis ser identificada. As respostas foram obtidas através de
entrevista, realizada na própria escola, onde seguimos um roteiro de perguntas pré-
estabelecidas. Quando perguntada se ela participou da escolha do material utilizado
na escola, ela afirma:

Na verdade, a gente nem pode dizer que participou. Porque a gente


participa, tem vez. Na escolha mesmo desse 2014, nós os professores da
escola, participamos. Só que livro que nós escolhemos, não foi esse.
Sempre acontece isso. A gente escolhe, analisa os livros e na hora, vem
outro, não é o que a gente escolheu. Já do fundamental menor, já agora
dessa última vez, no ano passado, já nem chamaram a gente. Só fez
jogarem os livros. (Prof.ª Rosa, comunicação oral. Localidade São Vítor, Jul.
2016).

Perguntamos a professora Rosa, se ela lembrava-se do material


escolhido, porém, dado ao ano da seleção do material ter sido em 2014, ela nos
disse que não lembrava. Ela nos explica também que o material da pesquisa é do
triênio 2014, 2015 e 2016. Neste ano de 2016, haverá novas seleções e escolhas de
livros, para serem utilizados no próximo ano letivo.
Questionamos a professora se a Secretaria Municipal realizou alguma
oficina ou formação para auxiliar aos professores na escolha dos livros. Eis sua
resposta:

Não. A secretaria não! Quando eu estava estudando, no curso de História,


teve uma disciplina que eu nem lembro qual o nome, que teve também
analise do livro, por que a gente fez um trabalho, eles deram um roteiro, pra
ver quais eram os livros melhores a ser escolhido. Mas a secretaria não se
envolveu com isso não.
37

Perguntamos também se em 2014, havia muitas coleções para serem


analisadas e escolhidas e se houve algum direcionamento ou influência para
escolha desse material, da editora:

Tinha, tinha muito. Sempre tem bastante livro. Olha, só pra esse ano, as
editoras chega aqui e já tem livro de umas três a quatro editoras. Eles têm
uma vontade de vender aí eles já trazem. Em 2014 eu acho que aqui só
veio, pra trazer livro aqui na escola, só uma editora. Eles deixam pra gente
analisar, eles mostram uns folhetos, por que já tem mais ou menos o que é
que tem no livro. Mas aí eles voltam, por que a escolha é feita depois, aí
nessa hora eles não interferem não.

E da Secretaria Municipal de educação:

Não, na hora a gente sente que lá eles escolhem a critério deles. Mas não
que eles cheguem assim pra gente e diga: - escolha esse! Os professores
escolhem, e também a gente não sabe o que o outro escolheu e também
nem sabe qual foi que ganhou a concorrência, só que a gente comenta
entre si que não tem muita vantagem os professores escolher que na
verdade, num prevalece as escolha deles não (dos professores). Tem uma
maneira também que as editoras fazem, vendem seu peixe, o mais barato,
tudo isso aí existe. Eles levam a gente pra escolher, pra dizer que teve a
escolha, mas na verdade não é não. Eles escolhem o que é melhor pro
bolso deles lá.

Segundo a professora Rosa, essa mesma coleção é utilizada em toda


rede municipal de educação do município de São Raimundo Nonato, tanto para as
escolas localizadas na zona urbana, quanto nas escolas localizadas na zona rural,
como no caso da escola José Caetano dos Santos. Também perguntamos se houve
alguma preocupação na escolha desse material pelo fato de a escola estar num
território quilombola:

Não. Não porque já que a escolha da gente num é valida, eles não vão
pensar. É o mesmo livro, pro município todo. Já no fundamental menor,
esse ano, já tá sendo. Tem o livro da cidade e o livro do campo. É diferente,
mas no... a não ser agora, no próximo, ano que vem, pode vir com essa
mudança. Como do fundamental menor já veio com essa mudança, aí não
sei, no próximo ano.

Sobre o ensino de História, perguntamos a professora, já que não há


diferença nos livros, ou no processo de escolha dos mesmos, uma vez que a escola
38

está inserida num quilombola, o Território Lagoas, se há alguma diferenciação na


metodologia de ensino, outros materiais específicos para os alunos e professores:

Praticamente não. Porque até mesmo a gente não tem material. Quase, pra
trabalhar assim mais a cultura deles, a afro-brasileira por que já é mais
assim, a parte quilombola mesmo. Alguns livros hoje apresentam assim, uns
pequenos textozinhos sobre isso, mas é pouco. Não tem diferença
praticamente não. Por que é uma coisa que eles sempre falam que tem que
ter né. Hoje já é determinada por lei que o ensino afro-brasileiro já que tem
que ter em toda escola de ensino médio, de fundamental maior... Mas fica
só na teoria.

Sobre a formação profissional da professora, ela nos conta que fez sua
graduação em História na Universidade Estadual do Piauí, pelo Programa Nacional
de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR):

Sou formada em História. Me formei aqui na UESPI em São Raimundo, no


Campus de São Raimundo Nonato. 2014. Que terminou o curso. E, foi pelo
PARFOR. O programa de formação de professores. Já atuava como
professora mesmo sem ter formação na área, mas eu já tinha talvez uns
três anos que eu já trabalhava com História. Sem ser formada na área, mas
por necessidade. Sempre trabalhei com ensino fundamental menor, seja no
segundo ano, terceiro ano. E no ginásio, no fundamental maior com
geografia e ciências e aí estava trabalhando com História quando comecei a
estudar.

Em relação ao ensino de História da África e Cultura Afro-brasileira e a


Lei nº 10.639/03, ela nos diz que não foi ofertado nenhum curso especifico para
orientar o seu ensino, porém na graduação, tinha uma disciplina de História da
África, e nos conta também as suas próprias dificuldades em trabalhar esta temática:

Não, não, não. Não tive curso nenhum pra isso não separado não.
Na graduação [...] Teve uma disciplina que falava de afro-brasileiro...
História da África! Que já envolvia um pouco assim. Mas assim, voltado pra
região aqui, o quilombo lagoas que é esse aqui, que nós estamos inseridos,
nunca teve não. Até eu que morava aqui dentro do quilombo, eu não sabia
era nada! Esse negócio de quilombo. Eu vim ficar mais por dentro, sabendo
o que é que era isso, por que meu trabalho de conclusão de curso eu fiz
História e Memória do Quilombo Lagoas, aí eu tive que fazer umas
pesquisas.
39

Perguntamos se ela pode nos disponibilizar este material de conclusão de


curso e ela nos diz que “ele tá lá na UESPI, ficou lá, eu nunca nem imprimi pra mim,
eu não tenho nenhuma cópia, uma xerox assim, ficou num pen drive lá, eu fico
dizendo que vou imprimir um pra mim, mas até hoje...”
Sobre o do livro didático, ela nos diz que é muito importante, que serve
como suporte para as aulas, para os planejamentos. Acentua, também, que é
importante para os alunos, pois a escola não tem acesso à Internet e o livro fica
sendo um dos meios mais importantes de pesquisa, principalmente para os alunos,
porém há um problema nesses últimos anos, não tem livros suficientes para todos
os alunos:

Porque o livro é um suporte pra você pelo menos se basear e dali você
planejar suas atividades em cima daquilo. Sem o livro fica assim, mais difícil
pra gente. Mas esse ano mesmo, metade dos alunos, não tem o livro. Ai
isso ai complica, você diz que tá trabalhando com o livro, mas ao mesmo
tempo muitas atividades não são feitas com o livro. Mas o livro ajuda, tem
livro que não ajuda muito não, mas tem outros livros que são ótimos, tem
atividades boas que você pode trabalhar mesmo. Mas esse ano está essa
dificuldade, assim, por que metade dos alunos não tem livro. E ainda tem
outros que não trazem o livro. Tem e não trazem. Tem hora que eu digo: _
traga o livro pra eu dar pra outro que quer, por que tem aluno sem livro! Mas
são meio enrolados... Tem uma turminha ai...

Sobre a causa de não ter livros para todos os alunos, a professora tem
sua teoria:

Eu acho, é por que, já serem três anos que a gente está com esse livro aí
os alunos levam no primeiro ano pra casa aí, no ano seguinte tinha que
devolver pra escola, pras turmas seguintes e eles, metade não devolve. Por
que de inicio tinha, e o número de alunos não aumentou e os livros
sumiram. É pra ser isso.

Mesmo com as reposições feitas pelo MEC, ainda assim a falta de livros é
grande:

Ás vezes vem um pouco, uns livrinhos a mais, mas não dá pra repor não.
Acontece que, tem ano que vem assim, teve esse livro que trabalhamos ano
passado, aí deixa que esse ano, a secretaria mandou uns restinho que tinha
lá, mas não dá pra cobrir não.
40

Abaixo estão os documentos referentes à reposição dos livros didáticos


de História:

Foto1: Documentos anexados nos materiais didáticos enviados pelo Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação para a U.E. José Caetano dos Santos. Referente reposição
dos materiais. Ano 2015.
41

Foto2: Documentos anexados nos materiais didáticos enviados pelo Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação para a U.E. José Caetano dos Santos. Ano 2015.

Almoxarifado da Unidade escolar José Caetano dos Santos, abaixo, a


coleção História nos dias de Hoje, utilizada pela escola:

Foto 3: Almoxarifado dos livros didáticos da U. E. José Caetano dos Santos, 2016.
42

Sendo assim, foi escolhida a Coleção História nos Dias de Hoje, cujos
autores são Flávio de Campo, doutor e mestre em História Social pela Universidade
de São Paulo, professor do Departamento de História também da Universidade de
São Paulo, ex-professor de História do ensino fundamental e do ensino médio em
escolas públicas e particulares, autor de livros didáticos e paradidáticos,
Coordenador Científico do LUDENS-USP (Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas
sobre Futebol e Modalidades Lúdicas); Regina Claro, mestre em História Social pela
universidade de São Paulo, africanista e pesquisadora da cultura afro-americana.
Autora de livros didáticos e paradidáticos com temática africana; Miriam Dolhnikoff,
doutora e mestre em História Econômica pela Universidade de São Paulo,
professora do departamento de História da Universidade de São Paulo, ex-
professora de História do ensino fundamental médio, e pesquisadora do CEBRAP
(Centro Brasileiro de Análise e Planejamento). Publicado pela editora Leya, ano
2012. E seu triênio de utilização nas escolas, segundo o PNLD é de 2014, 2015 e
2016.
No tópico seguinte, analisaremos esta coleção que conta com quatro
volumes, distribuído nas respectivas séries do ensino fundamental, 6º, 7º, 8º e 9º
anos, atentos aos conteúdos e/ou temas que abordam a África, os africanos e os
afro-brasileiros, textos e, sobretudo, as imagens que referenciam esses temas, pois
acreditamos que as imagens, corroborando com Bittencourt (2013), concretizam a
noção abstrata do tempo histórico. “A importância das imagens como recurso
pedagógico tem sido destacada há mais de um século por editores e autores de
livros escolares” (BITTENCOURT, 2013, p.75).
43

3.2 A HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA NA COLEÇÃO


DIDÁTICA “HISTÓRIA NOS DIAS DE HOJE”

O relevante papel desempenhado pelos livros didáticos de História, como


instrumento auxiliar na atividade docente e como uma das fontes de leitura
para os alunos – apesar de sua condição passível de criticas e geradora de
muitas reflexões – parece-nos inquestionável. Sendo assim, as abordagens
acerca dos estudos africanos e afro-brasileiros , presentes ou ausentes nas
coleções de História utilizada para os últimos quatro anos do ensino
fundamental, aparecem como ingredientes chaves na composição,
transformação e manutenção das referencias e imagens que o público
escolar constrói sobre o continente. (OLIVA, 2007, p. 259).

Uma análise constante do material didático é importante para


começarmos a desconstruir estereótipos.
No material selecionado para análise, História Nos Dias de Hoje,
trabalharemos sobre os textos e algumas imagens que as acompanham os
conteúdos nos livros, analisando as temáticas, abordagens, conteúdos. Uma
abordagem crítica dos textos, tentando tecer continuidades ou rupturas de leituras
sobre África, africanos e afro-brasileiros, dialogando tanto com as diretrizes para o
ensino de História e Cultura africana e afro-brasileira, debatida no capítulo anterior,
quanto com teóricos, sobre o assunto.
O primeiro livro do conjunto de quatro para análise que seguirá a ordem
dos anos do Ensino Fundamental:

Imagem 1. História nos dias de Hoje 6º ano.


44

O livro está organizado em 10 capítulos, dividido nos respectivos


conteúdos: Capítulo 1: A História, os seres humanos e o tempo: O que é história?/
Presente, passado, futuro/ As festas e o tempo circular. Capítulo 2: Pré-História e
História: Origens/ Sítios arqueológicos/ Datas e períodos. Capitulo 3: Mesopotâmia/
A organização da vida coletiva/ Os primeiros estados. Capítulo 4: O Egito antigo/ A
África de muitos povos/ A unificação do Egito/ A religião egípcia/ A periodização da
História egípcia. Capítulo 5: Fenícios e Hebreus: Os Semitas/ Os Fenícios / Os
Hebreus. Capítulo 6: A formação da Grécia: O mundo grego/ Período homérico/
Período arcaico. Capítulo 7: Grécia Antiga: das Polis ao império macedônio/ Período
clássico/ Domínio macedônio. Capítulo 8: A formação da Roma antiga/ As origens
lendárias de Roma/ O período monárquico/ A fundação da república/ As conquistas
romanas / Consequências das conquistas. Capítulo 9: O império romano/ A crise da
república/ O império/ A crise do império romano/ Centralização e divisão do império
romano. Capítulo 10: A África de muitos povos/ Senhores da fronteira do sul/ A terra
da arvore de perfume/O Egito sob o controle de gregos e romanos/ Os povos do
deserto/ Os reinos em movimento/ Os povos da savana/ Os grandes mercados/ Os
povos da floresta.
A partir dos conteúdos citados, por opção metodológica de análise,
iremos mapear os temas que abordam a África e os africanos englobados na
perspectiva do recorte temporal da “Pré-História”, localizados no capítulo 2: Pré-
História e História: Origens/ Sítios arqueológicos/ Datas e períodos, e na “História
Antiga” nos capítulos 4: O Egito antigo/ A África de muitos povos/ A unificação do
Egito/ A religião egípcia/ A periodização da História egípcia e, por último, no capítulo
10: A África de muitos povos/ Senhores da fronteira do sul/ A terra da arvore de
perfume/O Egito sob o controle de gregos e romanos/ Os povos do deserto/ Os
reinos em movimento/ Os povos da savana/ Os grandes mercados/ Os povos da
floresta.

África na Pré-História:

Os autores inserem o tema África, ao comentar sobre os vestígios


arqueológicos encontrados no continente, seguido da imagem mapas e uma pintura
rupestre (ver imagens 2, 3 e 4 no Anexo II)
45

Na África foi encontrada a mais numerosa serie de registros do processo de


hominização (a longa trajetória que resultou na constituição de seres
humanos). Os vestígios de diversos hominídeos foram preservados no
continente africano em alguns importantes sítios arqueológicos, formado a
um conjunto de fatores biológicos, geológicos e químicos. Até o momento,
fósseis(restos petrificados de seres vivos) de Australopitecos e de Homo
habilissó foram encontrados no continente africano. Provavelmente,
utilizando-se da rota do Nilo, grupos Homo erectus de Homo Sapiens teriam
se distanciado dos seus locais de origem e se espalhado por outros
continentes adaptando-se a ambientes diversos. Do continente africano,
num longo processo que levou milhares de anos, nossos antepassados
teriam alcançado a Europa e a Ásia. Do Continente asiático, grupos de
seres humanos teriam alcançado à Oceania e posteriormente, à América.
(CAMPOS et al., 2012, p. 38.)

A África como continente, de longa extensão geográfica e climática,


estaria representada de forma um tanto simplista na abordagem “pré-histórica”,
segundo o parágrafo acima. Segundo Silvério (2013) 7, a África pré-histórica poderia
se especificar em suas regiões, mostrando suas especificidades e diferenças como,
por exemplo, Pré-História da África-Central, Pré-História da África do Norte, Pré-
História do Saara, Pré-História da África Ocidental, Pré-História do Vale do Nilo,
Origens e expansão das técnicas agrícolas. Sobre o surgimento da agricultura, a
África tem um papel importante, porém, na abordagem quanto ao surgimento da
agricultura e sedentarização do homem, fala-se de maneira generalizada. Há
explicações:

Apesar de alguns autores terem reconhecido, há quase meio século, a


existência de centro de origem de plantas cultivadas na África e ter sido
demonstrada a presença de berços agrícolas primários nesse continente,
por muito tempo, toda via, o papel da África no desenvolvimento da
agricultura foi minimizado, até mesmo ignorado, devido a preconceitos
coloniais e ao desconhecimento da origem de vários cultígenos africanos e,
em geral, da pré-história do continente (SILVERIO, 2013, p. 126).

Não estamos afirmando que os autores do manual analisado tratam de


maneira preconceituosa sobre a África. O que pretendemos neste trabalho é tentar
perceber os reflexos da Lei nº 10.639/03, nesta coleção em específico. Lembrando,

7
Ver em SILVERIO, Valter Roberto. Síntese da Coleção História Geral da África: Pré-história ao
século XVI. Brasília: UNESCO, MEC, UFSCar, 2013.
46

como citado no capítulo anterior, que existe toda uma equipe de editores, autores,
ilustradores, empresas, por trás da criação de materiais didáticos.

África na História Antiga: O Egito antigo

Neste capítulo, os autores se dedicam ao tema Egito e suas organizações


sociais, religiosa e econômica, organizada nos temas sobre formação do Egito, “tal
formação social desenvolveu-se no fértil Vale do Rio Nilo, no nordeste da África,
entre os desertos do Saara e da Núbia” (CAMPOS, et al., 2012, p. 77). O trabalho de
irrigação do Nilo, “para um melhor aproveitamento das terras fertilizadas, as águas
do Nilo deveriam ser controladas [...] permitindo a organização de uma forma de vida
sedentária, ou seja, com habitação fixa, dependente da cheia do Nilo” (CAMPOS, et
al., 2012, p.79). Unificação do Egito, a escrita, a divisão social do Egito e a religião
egípcia. Também nos traz imagens de mapas e uma fotografia do atual Rio Nilo (ver
imagens 5, 6, 7 no Anexo II), sendo importante trazer imagens atuais do Egito, tema
estudado.
Os autores nos trazem tópicos interessantes sobre a importância das
mulheres no Egito:

As mulheres da realeza no Egito antigo exerciam papeis de importância,


como mães, esposas e filhas de faraós. Algumas esposas desfrutavam de
uma posição de força dentro da sociedade egípcia [...] Hatshepsut foi
esposa, rainha regente e governou o Egito como uma faraó[...] com a morte
do seu marido, proclamou-se faraó. Para simbolizar sua nova posição,
Hatshepsut tomou o título de Hórus fêmea e usava a coroa dupla, símbolo
de poder sobre o Baixo e Alto Egito. [...] Mais do que qualquer rainha,
Nefertiti desempenhou um papel de importância ao lado de Akhenaton. Por
ela o faraó desafiou a tradição e fez representar sua esposa como outros
reis, conduzindo carros de guerra ou abatendo inimigos. [...] Cleópatra VII
foi a última governante do Egito antigo [...]governou entre 51 e 30 a.C. num
período em que o Egito estava sob o domínio dos gregos (CAMPOS, et al.,
2012,p.83).

Sobre as representações do Egito nos filmes e em imagens, os autores


trazem imagens que representam Cleópatra branca. Os autores pedem aos alunos
para refletirem sobre as imagens (ver imagens 8 e 9 e Anexo II), pois,

“apesar da sociedade egípcia ter se desenvolvido no continente africano e


evidencias apontarem que os egípcios antigos eram negros, durante muito
47

tempo acreditou-se que a região tivesse sido povoada por povos vindos da
Ásia” (CAMPOS, et al.,2012,p.94).

Ainda sobre a África antiga, os autores, nos apresentam a África e seus


Reinos, no último capítulo do livro intitulado “A África de muitos povos”. Os autores
abordam os Reinos Kush, Axum. Apesar de haver um grande debate entre os
historiadores africanistas acerca de termos europeus como Reino e Impérios para
nomear as organizações de sociedades africanas, os autores utilizaram essas
nomenclaturas, como nos explica Oliva:

É preciso que o emprego dessas categorias para o estudo de algumas das


formações políticas africanas passe por um processo de ajuste e
adequação. Para o historiador congolês Elikia M’Bokolo, podemos fazer uso
de outras categorias para definir essas estruturas e configurações politicas,
como, por exemplo, “hegemonias políticas”. O conceito empregado nessa
definição encontra alguma relação com a categoria elaborada pelo
antropólogo francês Jean-Loup Amselle, chamado de “sociedades
englobantes” (Amselle e M’Bokolo, 1999:29). Ele envolve a perspectiva de
que as relações de poder estabelecidas não se prendiam às questões de
fronteiras fixas e da imposição de controle essencialmente centralizado. Os
mecanismos das trocas comerciais, o pagamento de tributos, os
movimentos de reciprocidade, os graus variados de autonomia e os lações
de parentesco compunham variantes chaves dessas formações. (OLIVA,
2007, p.277)

Este aspecto é importante, pois se deve mostrar aos alunos que os reinos
europeus não eram iguais aos reinos africanos, apesar de se utilizarem os mesmos
termos. Também é abordado o Egito sob o domínio de gregos e romanos. Sobre
Alexandria e a sua grandiosa biblioteca (ver imagem 10, Anexo II).
Ao final do livro, os autores nos trazem informações sobre a importância
da oralidade para os diversos povos africanos, sobre a função dos griots (ver
imagem 11, Anexo II). Também apresentam a diversidade de povos do deserto
(Mauro, Númida, Getulo e Garamante), povos das savanas, da floresta, e povos das
etnias Sonikê, Bantos, Pigmeus (Twa, Mbuti, Baka, Aka), San, Khoi-Khoi (ver
imagens 12, 13, 14, 15,16, Anexo II).
Podemos perceber nos temas e abordagem sobre o tema África neste
livro dedicado ao 6º ano do ensino fundamental, uma preocupação dos autores em
mostrar uma África histórica, mesmo inserida num recorte-temporal europeu.
Tratando temas como pré-história, o Egito antigo, Os reinos Africanos e sua
48

diversidade de povos, culturas, línguas, costumes, dessa maneira, contribuindo para


a desconstrução de uma África homogênea, simples.
O segundo livro a ser analisado corresponde ao 7º ano do ensino
fundamental:

Imagem 16. História nos dias de Hoje 7º ano.

O livro está organizado em 15 capítulos, dividido nos respectivos


conteúdos: Capítulo 1: Cristãos e mulçumanos durante a alta idade média:
Pensando a idade média/ Os reinos germânicos / Império bizantino /O islã. Capítulo
2: A baixa idade média: A sociedade feudal/ As cruzadas/ A reconquista ibérica.
Capítulo 3: A transição da idade média para a época moderna: Tempo é dinheiro/
Feudalismo e capitalismo/ O renascimento/ A crise no feudalismo. Capítulo 4: A
expansão marítima europeia: A linguagem dos mapas/ As especiarias/ O mar
tenebroso/ África: terra incógnita/ Império do Mali/ O périplo africano. Capitulo 5: A
disputa por oceanos e continentes: Os turcos chegam a Constantinopla/ A expansão
espanhola/ África ocidental: as belas cidades de pedra/ O mundo dividido entre
portugueses e espanhóis/ Significados da expansão marítima. Capítulo 6: A reforma
protestante: Contestações ao poder de Roma/ A crise espiritual dos séculos XV e
XVI/ O luteranismo/ O calvinismo/ O anglicanismo/ Reforma protestante: início da
época moderna? Capítulo 7: A reforma católica: Reforma católica ou
contrarreforma? O Concilio de Trento/ A igreja e as monarquias católicas/ A união
ibérica/ As guerras de religião. Capítulo 8: A América antes da chegada dos
conquistadores europeus: Descoberta da América? Os Astecas/ Os Incas. Capítulo
49

9: A América espanhola:- uma conquista sangrenta/ Francisco Pizarro e a conquista


do Império Inca/ A dominação espanhola. Capítulo 10: O Brasil antes de Cabral:
Quem inventou o Brasil? Povos indígenas/ As comunidades indígenas/ O olhar dos
portugueses/ Espíritos da natureza/ Guerra e paz/ Cotidiano dos indígenas. Capítulo
11: A conquista colonial portuguesa/ A chegada dos portugueses vista de
Pindorama/ A crise do comércio oriental/ Entradas e bandeiras/ A motivação
religiosa. Capítulo 12: a organização politica e o antigo regime colonial: O governo-
geral/ Produzir para dominar/ A justiça colonial/ Mercantilismo/ O sistema colonial.
Capítulo 13: A economia colonial e tráfico negreiro/ O engenho de açúcar/ Outras
atividades econômicas: fumo, algodão, pecuária/A escravidão na África/O
escravismo. Capítulo 14: A sociedade escravista colonial/ Ser senhor de
escravos/Resistência à escravidão. Capítulo 15: A sociedade do antigo regime: A
sociedade estamental/ O estado absolutista. O poderia ibérico. O absolutismo
francês/ O absolutismo inglês/ As lutas entre os estados absolutistas.
A África, africanos e, posteriormente, afro-brasileiros são abordados nos
seguintes conteúdos do livro, capítulo 1: Cristãos e mulçumanos durante a Alta
Idade Média, no tópico “mulçumanos na África”. Capítulo 4: A expansão marítima
europeia, “África, terra incógnita?” Capítulo 5: A disputa por oceanos e continentes,
num pequeno tópico, “África oriental: As belas cidades.” Capítulo 13: A economia
colonial e o tráfico negreiro, capítulo 14: A sociedade escravista colonial.
Sobre mulçumanos na África, é destinado um pequeno texto e duas
imagens (ver imagem 17 e 18, Anexo II):

No seu processo de expansão, o islamismo espalhou-se por diversas partes


do continente africano. Muitas minas de metais e pedras preciosas da
África, dispersas e ocultas no interior das grandes florestas, acabaram de
certo modo integrados pelo comércio. Alguns povos africanos foram
fortemente influenciados pela cultura islâmica. Outros apenas forneciam
mercadorias que acabavam entre os carregamentos variados dos
comerciantes mulçumanos. No continente africano estabelecia-se um
grande sistema de trocas que ligava regiões distantes e regiões diversas.
Os mercadores mulçumanos não penetravam no coração da África,
circulavam por suas bordas, nos limites do Saara, no litoral do oceano
indico e em áreas de florestas menos densas.(CAMPOS, et al., 2012,p.26)

Importante lembrar que além de trocas de mercadorias, como os autores


mencionam, também ocorrera trocas e mudanças culturais, que permitiu à África
mediterrânea “uma escolha de sociedade”,
50

O encontro do Islã com a África foi uma das mais fecundas aventuras
humanas da história universal. O Islã propôs aquilo que se poderia “chamar
de uma escolha de sociedade”. Os ecos se fizeram ouvir diferentemente no
tempo e no espaço sobre o continente negro. O desafio era imponente.
Tratava-se de uma mudança de mentalidade, de concepção, de
representação do mundo, de comportamento. Tratava-se de trocar a sua
cultura pela a de outrem, em suma, ser outro. Em que pesem as
resistências entre o século I/VII e o início do século XI/XVII, a África
mediterrânea aceitou a alternativa mulçumana. Ela islamizou-se e pôs se a
arabizar. (SILVERIO, 2013, p. 308).

Diz ainda que nem toda a África aderiu ao islamismo, “no restante da
África, o Islã não encontrou as circunstâncias históricas favoráveis que explicaram
os seus sucessos no Oriente, no norte do continente e na Espanha.” (SILVERIO,
2013, p. 308).

“A expansão marítima europeia e A disputa por oceanos e continentes”

Os autores nos falam nestes tópicos sobre um continente africano


imaginado pelos europeus, enquanto a Ásia era tida como exótica, a África era a
qual “ninguém ousava penetrar” e contrapõe com o seguinte texto:

Os europeus ignoravam que no interior da África existiam grandes cidades,


reinos e impérios. Não sabiam que no continente africano havia grande
sistema de trocas, capaz de interligar regiões distantes e as mais diversas
populações. Os europeus desconheciam a existência de tantos povos,
línguas e religiões. (CAMPOS, et al., 2012,p.26).

A partir daí, os autores nos levam à África e seu desenvolvimento cultural


e econômico dos séculos XII e XVI, com os grandes mercados, feiras de Bobo-
Diulasso, Bida, Kano, Tomboctu, Djenné, Benin, Oyo e nos apesenta imagens de
alguns desses mercados na atualidade (Ver imagem 19. Anexo II). O império do
Mali, o Reino do Congo/Kongo e seus apogeus (Ver imagem 20 e 21. Anexo II).
Lembrando a utilização dos termos Impérios e Reinos, não se configura nas
mesmas estruturas e dinâmicas de reinos e impérios europeus.
Sobre os caminhos percorridos por Portugal, a travessia do Cabo bojador,
do Cabo da Boa Esperança e o caminho para as Índias e suas primeiras feitorias no
51

litoral da África, os autores falam em exploração de litoral e “primeira fonte de


abastecimento de escravos”,

Os portugueses passaram cerca de sessenta anos explorando o litoral


africano, que se tornava a primeira fonte de abastecimento de escravos. A
medida que atingiam novas regiões, criavam feitorias, pequenas fortalezas
situadas em pontos do litoral, onde trocavam mercadorias europeias por
produtos locais. Esses seriam os primeiros estabelecimentos de muitos que
os europeus viriam a possuir na costa e no interior do continente africano.
Após muitas viagens, em 1488, Bartolomeu Dias alcançava o extremo sul
do continente e contornava o Cabo da Boa Esperança. Estava aberto o
caminho para as Índias. (CAMPOS, et al., 2012,p.92).

Um destaque sobre a África Oriental e as fascinantes cidades


encontradas pelos portugueses que eram “tão sofisticadas quanto as cidades
europeias”. São mencionadas as cidades de Sofala e a lenda referente ao reino de
Preste João e também sobre o Zimbabwe e suas antigas muralhas de pedras. Sobre
a África dos séculos XII ao XVI, Silvério (2013) nos permite chegar a três conclusões
que nos levam a problematizar o texto dos autores do material analisado, trazendo
uma maior complexidade sobre a economia, distribuição populacional, e o comércio
de escravos, na África,

1. Apesar de a economia fundamentar-se na agricultura e na criação de


gado, a propriedade privada não era generalizada; o direito principal
pertencia a comunidade. A classe de mercadores começava a realizar
uma certa acumulação de capital, mas acabou não formando uma
verdadeira burguesia
2. A África não era um continente subpovoado, fato extremamente
importante. O continente era muito povoado, principalmente a África ao
sul do Saara: no Vale do Senegal, do delta interior do Níger, ao redor do
Lago Chade, havia centenas de aldeias agrícolas, centros comerciais e
cidades. As primeiras escavações arqueológicas nessas regiões
permitem afirmações categóricas nessa questão.
3. O comércio de escravos foi praticado antes de 1600 na África, mas os
números envolvidos eram limitados. Não há nenhuma comparação com
o trafico negreiro que a Europa iria impor ao mundo negro a partir de
1500.

“A economia colonial e o tráfico negreiro e A sociedade escravista


colonial” são os dois conteúdos seguintes e também os dois últimos do manual
analisado. Nestes dois capítulos percebemos uma maior quantidade e variedades de
imagens que referenciam este período histórico. As imagens representam os
africanos e afro-brasileiros que vão desde cenas de um jogo de capoeira, ao
52

cotidiano doméstico de uma casa grande, nos comércios aos castigos, torturas e o
próprio movimento de tráfico, tanto em África quanto no Brasil, que estas pessoas
sofreram. (Ver imagens 23 a 40. Anexo II).
Os autores introduzem o tema a partir dos engenhos de açúcar e sua
logística de funcionamento,

Os engenhos podiam ser divididos em dois tipos principais: Os trapiches,


movidos por força animal (bois, cavalos); e os reais, movidos por força
hidráulica ( movimentos por uma roda d’agua) [...] Completavam a paisagem
do engenho: A casa-grande, residência da família do proprietário; a capela,
onde eram realizadas missas; e a senzala, enorme barracão onde moravam
os cativos.(CAMPOS, et al., 2012,p.231).

Também nos fala sobre as outras atividades econômicas na América


portuguesa, tais como o fumo, o algodão e a pecuária e, antes de abordar sobre a
escravidão na colônia, nos introduz ao tema da escravidão na antiguidade, com a
Grécia, (ver imagem 41. Anexo II) Egito, Mesopotâmia, na África pré-colonial, e
posteriormente à escravidão moderna. Uma abordagem estratégica, pois podemos
perceber as diferentes relações quanto ao uso da escravidão na África e sua imensa
diferença na dinâmica da escravidão imposta pelos europeus no continente.

A escravidão é uma prática que remonta à Antiguidade. Ela origina-se das


lutas entre os seres humanos que submetiam os vencidos a trabalhos
forçados. Na antiguidade oriental, como no Egito e na Mesopotâmia, os
cativos trabalhavam ao lado de seus senhores, ocupando se das tarefas
mais penosas, ou tornavam-se propriedade do Estado e de templos
religiosos. Eram empregados em obras públicas e no trabalho nas minas.
[...] Em algumas sociedades da África pré-colonial, os cativos dividiam-se
em cativos domésticos e cativos de guerra. [...] A escravidão e o comercio
de escravos tiveram grande impulso com a difusão da religião mulçumana.
Com as feiras, o mercado negreiro se espalhou pela região ao sul do
deserto do Saara. (CAMPOS, et al., 2012, p.234).

Ao longo do texto os autores inserem os portugueses e o início do tráfico


de escravos:

A escravidão africana já era praticada pelos portugueses desde meados do


século XV. A vantagem de utilizar mão de obra escrava na América foi aos
poucos sendo percebida pela metrópole. Em 1441, ocorreu a primeira
compra de escravos por uma expedição portuguesa. Em 1455, já eram
transportados para Europa de 700 a 800 escravos por ano. Os africanos
escravizados foram empregados na Ilha da Madeira em meados do século
53

XVI. Tinha início o uso do trabalho escravo em larga escala nas colônias
portuguesas do Atlântico. (CAMPOS, et al., 2012, p.234).

Percebemos a preocupação dos autores em diferenciar escravidão


africana e a escravidão praticada nas Américas pelos europeus. Fazendo assim,
percebemos as diferenças entre essas duas formas de escravidão e também a
participação de africanos neste processo.
Passando para o conteúdo seguinte, a sociedade escravista colonial
portuguesa, os autores dividem o capítulo nos temas sobre o senhor de escravos, o
trabalho e a disciplina, os termos que identificavam os africanos na colônia, como
boçais e ladinos. Diferencia a escravidão no campo e nas cidades. E por último,
abordam as resistências à escravidão, seja por laços de irmandades e rede de
solidariedades entre os africanos e afro-brasileiros, seja por resistências individuais
como o roubo, o suicídio e as resistências coletivas, como os quilombos (Ver
imagens 42, 43. Anexo II). Sobre os quilombos, nos traz um texto da Fundação
Palmares, com o título “O direito dos quilombolas à posse da terra” nos mostrando a
atualidade do tema:

O que era um quilombo para um branco? Segundo um decreto aprovado


pela Câmara da Capitania de são Paulo, em 1733, quilombo era um
“ajuntamento de mais de quatro escravos vindos em matos para viver nele,
e fazerem roubos e homicídios”. Na Constituição Federal Brasileira de 1988
constam dois artigos em que se lê o termo quilombo. O parágrafo 5º. do
artigo 216 determina que “ficam tombados todos os documentos e os sítios
detentores de reminiscências históricas dos antigos quilombos”. Já no artigo
68 está escrito: “aos remanescentes das comunidades dos quilombos que
estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva,
devendo o estado emitir-lhes os títulos respectivos”. A partir desses artigos,
o conceito de quilombo adquiriu uma nova interpretação, mais ampla,
associada a ideia de resistência no presente: o campesinato negro,
comunidade negra tradicional ou comunidade étnica, capaz de se organizar
e se reproduzir em determinado espaço físico, ao longo do tempo. Existindo
até mesmo em condições adversas para manter sua forma de vida. No
entanto, nem todas as comunidades se encaixam no modelo de
“remanescentes”. Por que ao longo da história houve diferentes formas de
ocupação da terra por grupos de escravos ou ex-escravos, como herança,
doação ou negociação com fazendeiros. E muitas dessas comunidades não
têm como provar sua origem histórica. A Fundação Palmares é a
responsável pelo reconhecimento da titulação, mas cabe ao governo a
emissão dos títulos definitivos de posse da terra. Apesar da lei, pouco se
tem feito para devolver as terras aos descendentes dos quilombolas. Será
que precisamos de outros 500 anos?
54

Um texto reflexivo, para alunos e professores, quanto a atual situação das


maiorias dos territórios quilombolas brasileiros (Ver imagens 44 e 45. Anexo II), a
Fundação Palmares certifica essas comunidades como remanescentes de
quilombos, porém, o Estado não emite o título de posse dessas terras, como é o
caso do Quilombo Lagoas, onde está situada a escola cujo material didático está
sendo analisado.
Sobre a diversidade de povos que desembarcaram nos portos brasileiros,
percebemos uma falta dos autores em tratar este tema. Segundo a historiadora
Marina de Mello e Souza (2008) em 1580 foi que, com maior frequência, chegaram
escravos no Brasil, vindos de portos de Luanda, 1580 a 1690. De 1690 a 1850, final
do tráfico, portos angolanos e portos da Costa da Mina forneceram escravos para o
Brasil,

Dessa forma, chegaram mais escravos de origem sudanesa (etnias


mandinga, hauçás, fulanis, fons e os vários grupos iorubás) ao nordeste e
mais escravos bantos ao sudeste, redistribuídos a partir desses dois portos
brasileiros. Ao norte do país, pelos portos de São Luís do Maranhão e
Belém do Pará, chegaram escravos vindos da Alta Guiné, principalmente de
Bissau e de Cabo Verde, mas também da região de Angola. Além dessas
regiões, no século XIX também a Zambézia passou a fornecer escravos
para o Brasil a partir da colônia portuguesa de Moçambique. (SOUZA, 2008,
p.84).

Sobre as religiosidades afro-brasileiras e questões como identidade e de


nomes de resistência à escravidão, nos quilombos, como Dandara e Aqualtune,
lideranças importantes no quilombo de Palmares (no livro é citado apenas Ganga
Zumba e seu sobrinho Zumbi) e outros agentes importantes não são mencionados.
Percebemos também uma lacuna nos textos analisados. Tratar sobre esta temática
é de suma importância, pois, como nos diz Abreu e Mattos (2008, p. 15), estudantes
podem reconhecer de forma prática que tradições e experiências confluíram para
definir hoje, a identidade negra dos grupos estudados, para além da luta contra a
escravidão.
55

Terceiro livro, 8º ano do ensino fundamental:

Imagem 46: História nos dias de Hoje 8º ano.

14 Capítulos. Capítulo 1: Revoluções inglesas: Nascimento do parlamento


inglês/ A sociedade inglesa e os cercamentos / A revolução puritana/ A revolução
gloriosa. Capítulo 2: A ilustração e o despotismo esclarecido: A ilustração/ Luzes
sobre a filosofia/ O pensamento ilustrado/ Luzes sobre a economia/ O liberalismo
econômico/ Luzes e a politica. O absolutismo ilustrado/ A modernização do Império
Português/ As luzes e a escravidão. Capitulo 3: A independência do Estados Unidos:
/ A América Inglesa/ Insatisfações Coloniais/ A proclamação da Independência.
Capítulo 4: A Revolução Francesa e o período Napoleônico: A França antes da
revolução/ O início da Revolução/ O nascimento da república/ O golpe do 18
Brumário/ O período Napoleônico. Capitulo 5: A Primeira Revolução Industrial: O
mundo das máquinas/ O pioneirismo no setor têxtil/ A transformação da sociedade.
Capitulo 6: A idade do ouro no Brasil e as revoltas coloniais: Os bandeirantes e a
Conquista do território/ As riquezas de Minas Gerais/ Mineração e a economia
portuguesa/ Mercado interno colonial/ Transformações na sociedade colonial/
Inconfidência Mineira/ A conspiração no Rio de Janeiro/ A conjuração baiana: a
Revolta dos Alfaiates. Capitulo 7: As independências da América Latina: Agitações
na América Espanhola/ Haiti/ México/ A difusão da contestação colonial. Capitulo 8:
56

A Independência do Brasil: Transformações na América e na Europa/ A abertura do


Portos/ A emancipação política do Brasil/ A África e o Império do Brasil/ Capitulo 9: A
construção do Estado e a economia brasileira/ A construção do Estado brasileiro/
Revoltas e Rebeliões/ Economia brasileira. Capitulo 10: Nações, Nacionalismos, e
socialismo: França: terra das revoluções/ A segunda república francesa/ Pensando a
Revolução/ A unificação da Itália/ A unificação Alemã. Capítulo 11: A construção dos
Estados Unidos da América. Peles-vermelhas e caras-pálidas/ Início da guerra de
Secessão/ Desenvolvimento econômico e expansão territorial. Capítulo 12: A
Segunda Revolução Industrial e o Imperialismo/ A velocidade da Revolução/ O
imperialismo/ África: O coração dos Impérios. Capítulo 13: O segundo Reinado no
Brasil (1840-1889) / A estabilidade política/ O fim do trabalho escravo no Brasil/ A
expansão cafeeira e a modernização. Capítulo 14: A crise do Regime Monárquico:
Tensões na Região da Prata/ A crise do Regime monárquico.
Os autores dão continuidade ao tema escravidão, agora em outro período
da História do Brasil colonial, a era do ouro. “A sociedade mineradora apresentava
uma complexidade maior em termos de diferenciação social” (Campos et al., 2012,
p.107) e nos apresenta a “sociedade escravista”,

Ás vezes a ação dos grandes senhores assumia uma feição paternalista.


Em geral, procuravam deixar para os feitores e jagunços as tarefas mais
violentas. Castigos, ordens de trabalhos mais pesados, repreensões não
eram ações do seu dia a dia. O senhor aparecia como aquele que concedia
prêmios, folgas, alforrias. Aquele que batizava os filhos dos seus
empregados mais próximos e que se tornava compadre dos vizinhos mais
pobres. As mulheres dos senhores, por sua vez, também recorriam à
violência no controle doméstico. Olhos e dentes arrancados, queimaduras,
chicotes, e trabalho árduo eram formas de descarregar a fúria das esposas
que se sentiam mais poderosas, porém menos desejadas que as cativas.
(CAMPOS et al., 2012. p.108).

Uma atenção que devemos dar a este trecho do livro é a de não


simplificar as relações entre senhores e escravos, devemos também abordar as
negociações, trocas e outras maneiras de burlar a condição em que se encontravam
como nos mostra Souza (2008, p. 100):

Fugiam para uma fazendo vizinha, na qual pediam que o seu proprietário
interviesse junto ao seu senhor com relação à causa que os havia feito fugir,
geralmente excesso de trabalho e castigos. [...] Esses e outros tipos de
negociação iam pouco a pouco tornando parte do sistema escravista, que
ao longo dos séculos assumiu formas diferentes, mudando junto com a
sociedade brasileira.
57

São citados também os “mestiços” e sua arte como Antônio Francisco


Lisboa (1730-1814), conhecido como Aleijadinho e Manuel da Costa Ataíde (1762-
1830); porém, não mencionam suas negritudes e suas descendências escravas.
Também não há imagens desses artistas no manual, apenas suas obras (ver
imagens 47 e 48. Anexo II).
Sobre a independência do Brasil, tópicos pontuais são mencionados
acerca da atuação de africanos e afro-brasileiros neste período:

A independência do Brasil provocou fortes reações em determinadas


regiões africanas. Os primeiros reconhecimentos diplomáticos foram
realizados em 1823 pelos reis do Benin ( atual Nigéria) e de Onim ( atual
Lagos). Mercadores e traficantes de escravos de Luanda e Benguela eram
favoráveis a incorporação de angola ao Brasil. Muitos desses comerciantes
eram brasileiros e desejavam manter a continuidades das vendas de
escravos. Diante disso, a coroa portuguesa intensificou o controle obre sua
possessões africanas. Sem apoio diplomático ou militar e, divididos entre si,
não conseguiram reunir forças para resistir ao governo metropolitano. O
governo britânico também temia a influência do Brasil no continente africano
e a formação de um império sul-atlântico sob o domínio brasileiro. Desde
1823, a Grã-Bretanha exercia forte pressão contra anexação de qualquer
das possessões africanas de Portugal ao Brasil. (CAMPOS, et al. 2012,p.
160).

Sobre as revoltas e rebeliões, os autores comentam sobre a importante


Revolta dos Malês, onde são dedicadas duas páginas sobre o evento e seus
importantes líderes como Luísa Mahim, Manuel Calafati e quatro imagens
representando escravos e libertos mulçumanos ( ver imagens 49, 50, 51, 52. Anexo
II).
No capítulo 12, que aborda a segunda revolução industrial e o
imperialismo, um tópico é destinado à partilha da África. Que inicia o texto da
seguinte forma ao lado de uma imagem representando o mapa africano (ver imagem
53 e 54, anexo II):

No século XXI a África se encontra marcada pela miséria, por guerras e


epidemias. Com raras exceções, a situação do continente africano é trágica.
Prolongadas guerras civis levaram países como Angola Moçambique a
figurar entre os mais miseráveis do mundo. Os conflitos entre Libéria,
Guiné, Serra Leoa, pelo controle do tráfico de diamantes dizimaram
milhares de pessoas. A fome faz milhões de mortos e levam os pais a
venderem seus próprios filhos. No passado a África foi explorada, recortada,
colonizada. Hoje é lembrada nos noticiários da TV por suas tristezas. O
coração da riqueza dos europeus no século XIX transformou-se no coração
da miséria dos dias de hoje. O espetáculo de horrores que começou no a
58

ser encenado a partir do século XV, teve seu apogeu no século XIX.
(CAMPOS, et al., 2012, p. 247)

Percebemos neste texto do livro didático uma passividade e uma


depreciação do continente africano atual. O importante é mostrar os processos de
exploração pelo qual o continente africano passou. Interessante perceber que este
mesmo recorte textual foi citado em outro manual didático escolar, de autoria do
mesmo autor, no ano de 2002, citado por Oliva (2007, p. 295).
Ao longo do conteúdo, os autores dedicam um texto sobre as resistências
africanas ao processo de imperialismo colonial, e utilizam imagens de guerreiros
africanos (Ver imagens 55, 56 e 57. Anexo II) “a força militar e a violência dos
dominadores, muitas vezes não foram suficientes para submeter os povos africanos,
que não estavam dispostos a cederem suas terras sem lutar”. (Campos et al. 2012,
p.255).
O historiador africano M’ Bokolo nos auxilia a pensar este processo
complexo em que o continente africano passou. Importante saber que a atual
situação de alguns países do continente não se resume simplesmente a
associações diretas com o tráfico de escravos e ao neocolonialismo,

Desde suas primeiras manifestações até aos nossos dias, o imperialismo


suscitou sempre debates tanto intelectuais como políticos, muitas vezes
extremamente vivos. É toda via claro que ele só interessa à África devido à
forma concreta como se expandiu no continente negro (guerras de
conquista, partilhas territoriais, investimentos, práticas econômicas, politicas
e culturais e etc.) e à propaganda que seus partidários utilizaram para
legitimar sua ação e que veio a fabricar imagens duradouras da África e dos
Africanos. (M´BOKOLO, 2011, p.348).

Seguindo este raciocínio, ele conclui:

Estes fenômenos tão variados incitam-nos a ir muito mais além do que as


posições esquemáticas muitas vezes utilizadas para evocar a colonização
europeia. Não havia tradição de um lado e a modernidade de outro, nem
resistência e a cooperação. Sob choque da conquista estrangeira e da
opressão colonial, choque imprevisto, incompreensível, que ficou muito
tempo por explicar os africanos procuravam e conseguiram encontrar,
individualmente ou em grupos, os recursos necessários para não perder
todos os registros. A adoção precoce, logo desde os inicios da colonização,
dos métodos mais modernos de intervenção politica (imprensa, associações
59

e partidos) e das linguagens mais complexas, como, por exemplo, a das


religiões negras independentes e dos messianismos políticos religiosos,
confirmava essa vontade, não só de sobreviver à catástrofe, forçosamente
passageira, mas de sair dela transformado, melhor ou mais forte. (IDEM,
2011, p.421).

Por fim, os autores abordam o processo histórico que deu fim ao trabalho
escravo no Brasil, como as leis Eusébio de Queiroz, 1850, Lei do Ventre Livre, 1871,
Lei dos sexagenários, 1885, e por fim a Lei Áurea. Movimentos e os líderes
abolicionistas como, Luís Gama, José do Patrocínio, André Rebouças, Antônio
Bento, Francisco do Nascimento. (Ver imagens 58, 59, 60, 61, 62. Anexo II) e
também faz referência a importantes figuras negras contemporâneas como Abdias
Nascimento, Milton Santos, Ismael Ivo, Heitor dos Prazeres. (Ver imagens 63, 64,
65, 66. Anexo II).
No quarto e último livro, destinado ao 9º ano do ensino fundamental, o
sumário divide-se em:

Imagem 67: História nos dias de Hoje 9º ano.

17 capítulos: Capítulo 1: A Primeira Guerra Mundial: A belle époque


europeia/ As políticas de aliança/ A questão Balcânica e o início da guerra. Capítulo
2: A Revolução Russa: Rússia: um país de camponeses/ A Revolução de fevereiro
60

de 1917/ A Revolução Bolchevique. Capítulo 3: República Velha: A modernização


das cidades/ Os governos Militares/ A república das Oligarquias/ A política da
valorização do café. Capitulo 4: Tensões sociais na República Velha: O cangaço/ O
milagreiros e beatos/ A reurbanização do Rio de Janeiro. Capítulo 5: Período
Entreguerras: Os Estados Unidos após a primeira guerra/ Mussoline e o fascismo/ A
República de Weimar. Capítulo 6: O fim da República Velha: A crise do Regime
oligárquico/ O movimento operário/ O modernismo brasileiro/ o tenentismo/ A crise
de 1929 e fim do regime oligárquico. Capítulo 7: A segunda guerra mundial/ Os
jogos Olímpicos de Berlim/ A guerra civil espanhola/ A política expansionista alemã
/Repercussões da guerra. Capítulo 8: O Brasil sob Vargas: a industrialização em
larga escala/ Um novo arranjo institucional/ O populismo. Capítulo 9: A Guerra Fria:
A guerra fria e os blocos antagônicos/ O inicios das rivalidades: os acordos de paz
do pós-guerra/ Bipolarização. Capítulo 10: O fim do Estado Novo e a
democratização: O fim do estado novo. A volta de Vargas/ O governo de Juscelino
Kubitscheck. Capitulo 11: América Latina: A revolução mexicana/ A Argentina e o
Peronismo/ A Revolução Cubana/ Ditaduras Latino-americanas. Capítulo 12:
Descolonização e o Terceiro mundo: Guerra fria e descolonização/ Indochina/ Luta
dos povos africanos pela independência/ A África austral/ Oriente médio: conflitos
entre árabes e israelenses. Capitulo 13: A era da contestação: Uma década de
mudanças profundas/ corrida espacial: o céu é o limite/ A guerra do Vietnã/ O
movimento hippie/ A arte na década de 60/ Relações de Gênero/ O direito de ser
negro/ 1968: ano da contestação. Capitulo 14: Crise politica e golpe militar no Brasil:
Crise politica/O governo de João Goulart. Capitulo 15: A ditadura militar no Brasil: O
inicio da Ditadura/ Prisões e cassações/ A cultura de contestação/ Os confrontos de
1968/ Os anos de chumbo/ O “milagre econômico”. Capitulo 16: Democratização no
Brasil: A crise do “milagre” / Abertura lenta e gradual/ O período democrático/ O
breve governo de Fernando Collor de Mello/ O governo de Itamar Franco/ O governo
de Fernando Henrique Cardoso/ O governo Lula/ A eleição de Dilma. Capitulo 17 A
nova ordem mundial: O fim da guerra fria/ A nova ordem mundial/ O neoliberalismo/
A África e os senhores da guerra.
Os temas sobre os africanos e afro-brasileiros são abordados na
chamada República Velha, com a temática Capoeira (ver imagem 67, 68 e 69). Os
autores nos dizem que a resistência negra é representada pela capoeira,
61

As mudanças ocorridas na economia e na política do império, a crescente


substituição da mão de obra escrava pela do imigrante geraram uma
inevitável situação de marginalidade. Vários aspectos da cultura afro-
brasileira passaram a sofrer forte pressão, pois para as elites essas
manifestações comprometiam o modelo civilizador que buscavam, ou seja,
não estavam de acordo com os costumes dos países que consideravam
mais civilizados. Em nomes dessas justificativas, forjaram argumentos para
a repressão e proibição dessas manifestações. [...] Mas, apesar da
repressão e da apropriação, a capoeira como outras manifestações afro-
brasileiras, passou uma rasteira nas autoridades e nas elites. Continuou a
ser praticada e muitos capoeiras entraram para história, por meio de
narrativas, cantigas, ladainhas que os eternizaram, como o Besouro
Mangangá (1897-1924), na Bahia ou Madame Satã (1900-1976), no Rio. As
figuras mais ilustres e consideradas como ancestrais da capoeira são
Vicente Ferreira (1889-1981), o Mestre Pastinha, fundador da capoeira
Angola, e Manoel dos Reis Machado (1900-1974) O Mestre Bimba,
fundador da capoeira regional. CAMPOS, et al., 2012, p. 57).

No capítulo intitulado Tensões sociais na República Velha, os autores


iniciam o debate a partir de quatro imagens de favelas no Rio de Janeiro em
diferentes épocas (ver imagens 70, 71, 72 e 73. Anexo II) e pedem para os alunos
apontar semelhanças e diferenças. Posteriormente falam sobre o samba e o
carnaval como heranças afrodescendentes. (Ver imagens 74 e 75. Anexo II). Ao fim
do capítulo, os autores falam sobre a revolta da chibata e sobre o seu líder, João
Candido, segundo os autores conhecido como Almirante Negro (Ver imagem 76.
Anexo II).
Encerrando a análise dos conteúdos dos manuais didáticos que abordam
a História da África e cultura afro-brasileiras, este último livro aborda os temas sobre
a descolonização da África e as lutas pela independência, Apartheid e suas
contestações. Aborda também questões sobre a negritude e a luta contra o racismo
e a segregação nos Estados Unidos da América. O movimento negro. No capítulo
intitulado A era das contestações (Ver imagens 77 a ). Sobre o movimento negro
no Brasil, os autores destinam uma pequena caixa de texto,

No século XX, dando continuidade a uma longa trajetória de luta o


movimento negro no Brasil se organizou para enfrentar preconceitos e
discriminações e defender seus interesses. Um dos marcos dessa luta foi a
criação , em 1931, da Frente Negra Brasileira que, posteriormente, foi
fechada pela ditadura do estado Novo. Mais tarde, em 1944, surgiu o Teatro
Experimental do Negro, dirigido por Abdias Nascimento (1914-2011),
entidade que passou a publicar o jorna Quilombo, cujo primeiro numero
62

circulou em 1948. Em 1950, realizou-se o I Congresso Negro Brasileiro. O


movimento cresceu nos anos seguintes destacando-se a formação da
Associação Cultural do Negro (1954), em são Paulo. Enfraquecido com o
golpe militar de 1964, o movimento voltou a fortalecer se apos 1975, ainda
sob o regime Militar coma difusão de entidades negras como o instituo
brasileiro de estudos africanistas o, o centro de cultura e arte negra e o
instituto de pesquisa das culturas negras. Em 1978 surgiu o Movimento
Negro Unificado, que passou a coordenar em todo o Brasil diversas
entidades. (CAMPOS, et al, 2012, p. 258 e 259).

Portanto, ao fim da análise desses quatro livros utilizados no Ensino


Fundamental, notamos a inserção das temáticas “África, africanos e afro-brasileiros”,
de forma positiva, principalmente ao tratar África pré-histórica e a África Antiga.
Porém, há passagens no material analisado onde os autores reproduzem termos
que estudiosos sobre a temática africana têm criticado veementemente sua
utilização, como misérias, fome, mazelas. Notamos também que esses termos são
utilizados principalmente quando a África e afrodescendentes são abordos no
contexto atual. Segundo Oliva (2007), os problemas relacionados ao continente e
também aos afro-brasileiros, são reais e devem ser abordados, porém há outras
faces dessa história, e devem ser apresentadas. E mais que apresentar seus
dilemas, é explicitar suas causas, a participação de agentes externos, que
contribuíram e contribuem para que haja conflitos em algumas regiões do
continente, e não de forma geral.
Como afirmamos, não existem livros didáticos ideais, porém há métodos e
metodologias que os enriquecem e os complementam, e a participação do professor
é essencial. No terceiro e último capítulo propomos uma oficina de narrativas, com
orientação do professor de História, para que os alunos possam, a partir desta
oficina, elaborar um banco de narrativas de sua comunidade ou bairro, fortalecendo
a história local. Esta proposta está voltada para comunidades tradicionais, assim
como orienta as diretrizes para o Ensino de História da África e cultura afro-
brasileira, valorizar a oralidade, uma das principais heranças culturais africanas.
Esta oficina, mesmo tendo sido pensada para os alunos da escola José Caetano dos
Santos, também poderá ser utilizada em outras escolas, seja de zona rural,
quilombola, indígena ou urbana. A principal proposta é trabalhar a oralidade e
memória dos moradores mais antigos de uma localidade, apresentar a importância
dessas narrativas para os alunos, mostrando que a disciplina História é viva e está
presente no cotidiano das pessoas, dos lugares, da escola.
63

A História mais que ensina. Através de novos conteúdos, ela nos faz
experienciar coisas estranhas ao nosso cotidiano. Isto quando não sentimos uma
identidade com o conteúdo. Philippe Ariès comenta sermos “sensíveis aos
contrastes da História”8. Tudo isto são sementes de uma futura “consciência
histórica”, na medida em que nos representamos na duração (histórica).
E, para aqueles que se identificam com o conteúdo (no caso dos
afrodescendentes), a história é um aprofundamento de suas raízes. Ela auxilia na
práxis geral, pois estão conscientes (ou se conscientizando) do sofrimento e dos
enriquecimentos que povos (antepassados) trouxeram.
Acreditamos também que ao conhecer a História e culturas de outros
povos, Adquirimos ferramentas para o embate cotidiano de preconceitos que é um
dos legados mais importantes do ensino da História: cotidianamente, desnaturalizar
temas que por muito tempo eram dados como naturais.

8
Ver em: ARIÈS, Philippe. O tempo da história. Tradução de Roberto L. Ferreira. São Paulo: Editora
da UNESP, 2013. (p. 311).
64

CAPÍTULO III

A UNIDADE ESCOLAR JOSÉ CAETANO DOS SANTOS: UMA


EXPERIÊNCIA PARA O ENSINO DE HISTÓRIA A PARTIR DA LEI Nº 10.639/03

As crianças têm necessidade de ver as cenas históricas para compreender


a história. É por esta razão que os livros de História que vos apresento
estão repletos de imagens. Desejamos forçar os alunos a fixarem as
imagens. Sem diminuir o número de gravuras que existiam no texto,
compusemos novas series delas correspondendo a uma série para cada
livro. Cada série é acompanhada de questões que os alunos responderão
por escrito, após terem olhado o desenho e feito uma pequena reflexão
sobre ele. É o que denominamos de revisão pelas imagens e acreditamos
que este trabalho possa desenvolver a inteligência das crianças ao mesmo
tempo que sua memória. (LAVISSE 1887 Apud BITTENCOURT, 2013, p.
75).

Poderíamos localizar esta citação em qualquer livro didático atual de


história, mas estamos tratando de um trecho de um livro didático de história francês
do ano de 1887. Percebemos a atual preocupação dos autores de livros didáticos
quanto às imagens que irão compor o livro, tendo conhecimento também de que há
uma equipe por trás da construção deste material, inclusive para a seleção das
imagens:

A questão da ilustração dos livros está relacionada, assim, aos aspectos


mercadológicos e técnicos que demonstram os limites do autor do texto
quando observamos os livros também como objeto fabricado. A
diagramação e a paginação do livro são estabelecidas por um profissional
especializado e, dessa forma, os caracteres, a dimensão, as cores das
ilustrações enfim são decisões de técnicos, de programadores visuais, na
composição final do livro. A história do livro didático possibilita verificar
como os autores foram perdendo o poder sobre as ilustrações de suas
obras. Hoje existem especialistas em pesquisas iconográficas contratados
pelas editoras para desenvolverem esta parte especifica do livro
(BITTENCOURT, 2013, p.77).

Os livros didáticos, como já comentamos anteriormente, são utilizados de


formas diversas entre alunos e professores. Professores os utilizam como
ferramenta de apoio para a elaboração e planejamento de suas aulas, como guia
para o planejamento das aulas no decorrer do ano letivo. Os alunos e alunas, o
65

utilizam, frequentemente, como única ferramenta de pesquisas, de fonte de leituras,


revisão dos conteúdos escolares. Partindo desta perspectiva, os textos e imagens
contidos nestes materiais, como fonte única de pesquisa e leitura para os alunos,
acabam por criar certo imaginário sobre determinados assuntos que podem
perpetuar determinados preconceitos como, por exemplo, temas como África e
africano, em seus países ou em descolamentos forçados.
Para corroborar a afirmação acima, partimos de um método de
mapeamento de imagens sobre África e africanos, que deriva de pesquisas
realizadas pelo professor e pesquisador Anderson de Oliva (2007), que utilizou este
mesmo método com alunos da educação básica no Recôncavo Baiano.
Também, seguindo a mesma metodologia, o professor e pesquisador,
Dernival Venâncio Ramos Junior, com professores em formação de uma
especialização em Ensino de História, na disciplina de História da África que o
mesmo ministrava em 2010, na Universidade Federal do Tocantins, campus de
Araguaína.
Realizamos esta atividade com alunos do Ensino Médio de duas escolas
públicas estaduais o Centro de Educação Profissional Gercílio de Castro Macedo e
na Unidade Escolar Edith Nobre de Castro, ambas localizadas na zona urbana de
São Raimundo Nonato, Piauí, entre os meses de abril e maio de 2016.
Contabilizamos nesta pesquisa 87 alunos e alunas do Ensino Médio
regular, período noturno, e 103 alunos e alunas no Ensino Médio Técnico Integrado,
período vespertino. Ao todo, 190 alunos de ensino médio da rede estadual (zona
urbana) de ensino do Piauí participaram desta pesquisa.
Esta mesma atividade também foi realizada com alunos do Ensino
Fundamental (do 6º ao 9º anos) da Escola José Caetano dos Santos, como já dito
anteriormente, localizada na zona rural de São Raimundo Nonato, na comunidade
São Vítor, que por sua vez está localizada do Território Quilombola Lagoas. Ao todo,
nesta escola, 91 alunos e alunas do Ensino Fundamental, da rede municipal de
ensino, participaram da pesquisa.
Foi solicitado aos alunos escreverem entre 5 e 10 palavras que os
fizessem lembrar sobre a África e/ou africanos, de forma aleatória e espontânea. A
quantidade de palavras recebidas variou, porém poucos alunos entregaram as 10
palavras solicitadas.
66

As imagens foram organizadas, assim como o trabalho dos professores


acima citados em grupos: Natureza/Geografia, Cultura/educação, Negros/questão
racial, História/ Colonização, Guerra/fome/miséria/ doenças, escravidão, religião.
Segue abaixo a tabela com as palavras que foram coletadas em relação à
África e africanos nas escolas da zona urbana:

GRUPO OCORRÊNCIA
Natureza/Geografia 101
Cultura/Educação 32
Escravidão 13
Negros/Questão racial 27
Religião 5
Guerra/Fome/Miséria/Doenças 93
História/Colonização 13
Tabela 1. Fonte: atividade realizada com alunos do ensino médio de escolas públicas de zona urbana
de São Raimundo Nonato, Piauí, em abril e maio de 2016.

As Imagens recorrentes no imaginário dos alunos do Ensino Médio, da


zona urbana, em relação à África e aos africanos contabilizaram 291 palavras. Os
grupos que mais se destacaram foram: Natureza/ Geografia, palavras como safári,
animais, árvores, savanas, rio. Guerra/ fome/ miséria/ doenças: Ebola, zika, aids,
pobres. Cultura/educação: conhecimento, modos de viver, danças, comidas, línguas
diferentes. Negros/ questão racial: feios, diferentes, racismo. Escravidão: senzala,
escravos, escravos negros. História/Colonização: Reinos, impérios, tribos, pirâmides,
berço da humanidade. Religião: Islamismo, deus.
Abaixo, disponibilizamos a tabela com as palavras que foram coletadas
em relação à África e africanos na Escola Municipal José Caetano dos Santos,
localizada em zona rural, e dentro de um território quilombola, em São Raimundo
Nonato, Piauí:
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GRUPO OCORRÊNCIA
Natureza/Geografia 97
Cultura/Educação 136
Escravidão 59
Negros/Questão racial 70
Religião 3
Guerra/Fome/Miséria/Doenças 62
História/Colonização 12
Tabela 2. Fonte: atividade realizada com alunos do ensino fundamental II da escola pública municipal
de zona rural de São Raimundo Nonato, Piauí, em julho de 2016.

Contabilizamos ao todo 468 palavras; as mais recorrentes estão inseridas


nos respectivos grupos: Cultura/Educação: cultura, arte, dança, capoeira.
Natureza/Geografia: Animais, árvore, natureza. Negros/Questão racial: Negros,
pretos. Guerra/Fome/Miséria/Doenças: Fome, morte, guerra. Escravidão:
Escravidão, quilombos. História/Colonização: História, portugueses. Religião:
Candomblé, Rastafári. Das 468 palavras, nove estavam ilegíveis. Uma palavra
recorrente que nos chamou a atenção foi “indígena” ou “índio”, ela foi citada 20
vezes. Porém, não podemos aprofundar esta recorrência de palavra devido ao
tempo e ao foco da pesquisa.
Mesmo com algumas diferenças entre as palavras citadas pelas crianças
da escola rural de ensino fundamental e de ensino médio de zona urbana, como por
exemplo, nenhuma palavra pejorativa, referente à raça/racismo, foi citada pelas
crianças do Ensino Fundamental, ao contrário do grupo de jovens do Ensino Médio.
Observação que deverá ser investigada posteriormente.
Portanto, deixamos o registro da importância da constante vigilância tanto
de professores e gestores escolares de acompanhar essa produção de imaginário
escolar que está sendo construída nas salas de aula.
A escola, objeto de nossa pesquisa, está localizada no Povoado São
Vítor, na Zona rural de São Raimundo Nonato, Piaui. Modalidade escolar pública e
68

rural de ensino regular, apesar de se encontrar em território quilombola, 9 a escola


não apresenta um currículo especifico para comunidades quilombolas:

O território Lagoas, no sertão semiárido do sudeste do estado do Piauí, é


constituído por cerca de 118 localidades, com uma predominação
predominantemente camponesa, em torno de 1.498 famílias e 5.128
habitantes, encontra-se em processo de reconhecimento em andamento,
cujo relatório antropológico foi realizado em 2010. De lá pra cá, observam-
se questões internas relacionadas à forma jurídica da propriedade da terra,
além de negociações nas quais emergem múltiplas identidades
(quilombolas, camponesas, sertanejas, dentre outras) no território e, mais
recente, incertezas e temores ante a ameaça segundo informações locais,
constituída por interesses de empresas mineradoras que fazem pesquisas
10
de prospecção de minérios na região.

A escola foi construída em 1975, e recebeu este nome em homenagem a


José Caetano dos Santos, o primeiro professor da comunidade. Tal escola atende
em torno de 230 crianças, ofertando a educação infantil, nível I e II, ensino
fundamental I e fundamental II, 1º ao 9º ano, nos turnos manhã e tarde. No período
noturno, a escola funciona como anexo da Unidade Escolar Estadual Gercílio
Macêdo de Castro, que oferta o ensino médio para alunos da comunidade e entorno
(1º ao 3º ano).

Foto 4:Unidade Escolar José Caetano dos Santos – São Vítor –São Raimundo Nonato –
Piauí. Março, 2016. Fonte: Autor.

9
Ver em OLIVEIRA, S.M. SOUSA, M. S. R. Relatório Antropológico do Território Lagoas – RTID.
Teresina, 2010. Texto apresentado ao Incra, Piauí.
10
Ver em MATOS, Simone de Oliveira. MORAES, Maria Dione Carvalho de. Territorialidade
Quilombola em Lagoas (PI): “memória dos tempos de cativeiro” e questões de titulação. In: LIMA,
Solimar Oliveira. FIABANI, Aldemir (Org.). Sertão Quilombola: Comunidade negra no Piauí. Teresina:
EDUFPI, 2015.
69

A proposta deste capítulo é realizar uma oficina de narrativas, através de


orientações e sugestões para o professor de História trabalhar em sala de aula e,
posteriormente, em campo, para que os alunos possam, a partir desta oficina,
elaborar um banco de narrativas de sua comunidade, fortalecendo a história local.
Esta proposta está voltada para comunidades tradicionais, assim como uma das
orientações das diretrizes para o Ensino de História da África e cultura afro-
brasileira, que objetiva valorizar a oralidade, uma das principais heranças culturais
africanas. Esta oficina, mesmo tendo sido pensada para os alunos da escola José
Caetano dos Santos, também poderá ser utilizada em outras escolas, seja de zona
rural, quilombola, indígena ou urbana. A principal proposta é trabalhar a oralidade e
a memória dos moradores mais antigos da localidade, e apresentar ao final a
importância dessas narrativas para os alunos, mostrando que a disciplina História é
viva e está presente no cotidiano das pessoas, dos lugares, da escola.
Nos últimos anos, principalmente a partir dos anos 1990, com a
reformulação dos currículos de História pós-ditadura, grupos e movimentos sociais
pleitearam seu lugar na História ensinada nas escolas, nas universidades, na
historiografia brasileira. Lugar este ocupado não pela “adaptação às contingencias
politicas e retóricas de sua época” (PEREIRA, 2014, p.187). mas pela ampliação dos
horizontes de conhecimento e de perspectivas múltiplas que a História nos oferece,
dando total legitimidade às reinvindicações de grupos, movimentos sociais/negro.
Reconhecendo que estamos num momento de revisão sobre a
construção do conhecimento, do conhecimento cientifico, hierarquizado e ocidental,
onde, ocorrem os conhecimentos múltiplos e interconectados e específicos em suas
singularidades, “um arquipélago de inteligibilidade (...) que se traduz politicamente
em uma ordem social em que possa viver-juntos com relações horizontais e
reciprocas, sem privilégios e exclusões, pacifica que reconhece e valoriza a todos
sem diferença” (REIS, 2013, p. 254). Novas perspectivas sobre o passado brasileiro
precisam ser conhecidas e reconhecidas quando tratamos do período histórico
brasileiro que suas consequências perduram nos dias atuais: O Brasil escravocrata.
O passado está para ser agenciado; para isto está o oficio laborioso dos
historiadores e historiadoras, não para silenciar a História de um período traumático
da História do Brasil ou fazer “modificações de histórias com justificativa de ser essa
uma forma de proteção dos estudantes em face da lembrança traumática da
70

violência impetrada contra as populações negras” (PEREIRA, 2014, p.187). muito


pelo contrário, isso seria deslegitimar a realidade presente no Brasil, as lutas pela
igualdade racial e social que estão intimamente ligadas e que são heranças desse
passado que não pode ser esquecido ou modificado.

“Não é suficiente discutir a história desse período baseados num modelo de


sociedade que se limite apenas aos senhores de engenho e de escravos,
de um lado (e em cima) e, de outro (e embaixo), os próprios escravos. Esta
é uma visão empobrecedora, mesmo quando se reconhece mesmo que de
favor outras categorias sociais.
Para além (mas não “por fora”) da matriz escravo-senhor, outros grupos
existiam e desempenhavam importantes funções sociais, econômicas e
culturais e politicas na sociedade baiana do século XIX, sobretudo (não
exclusivamente) no meio urbano. Os setores livres pobres, em especial de
descendências africana, cresciam com rapidez desde pelo menos a
segunda metade do século XVIII. Somados aos escravos, eles constituíam
a imensa maioria da população. Entre esses incluía-se um crescente
contingente de ex-escravos, ou libertos, os quais teriam participação ativa
no levante de 1835 e em outros anteriores”. (PEREIRA, 2014, p.187).

Abordar a História do Brasil a partir (e somente) da relação escravo-


senhor - como afirma a citação acima - é deixar de explorar as variadas relações
que os africanos e os afro-brasileiros escravos ou livres mantinham na sociedade,
suas negociações, suas lutas cotidianas e levantes como no caso supracitado. Não
abordar a história dos africanos e afrodescendentes no Brasil sob um viés de
protagonismo que eles tiveram é perpetuar a pobreza de um rico e variado horizonte
histórico, reproduzindo conceitos e preconceitos que este período está sujeito a ser
compreendido. O dever de memória não pode e não poderá impedir o direito à
História. Não é isto que esta nova perspectiva histórica sobre o passado afro-
brasileiro requer no presente.
71

PROPOSTA DE OFICINA: NARRATIVAS QUE CONTAM HISTÓRIA.

Foto 5: Comunidade Quilombola São Vitor. Junho de 2016. Fonte: Autor

A proposta desta oficina é que ocorra em sala de aula,


concomitantemente com os conteúdos abordados em História do Brasil (neste caso,
referente ao período escravocrata brasileiro). Porém, como já dito, o professor
poderá adaptar esta oficina de narrativas a partir do conteúdo a ser trabalhado.
Neste caso, os alunos coletarão as memórias a partir deste conteúdo.
A partir do livro didático, o professor irá analisar juntamente com alunos,
de que forma os africanos e afro-brasileiros são retratados, nas imagens e textos.
Com orientação do professor e após uma pequena introdução sobre “memória e
História”, e sobre “História Oral”, os alunos serão divididos em grupos, onde cada
grupo elaborará um texto-relatório sobre a análise do seu livro didático.
72

Através das lacunas e inquietações que os alunos elaborarem em seu


texto-relatório, o professor irá orientá-los e auxiliar a construir um mapeamento dos
moradores mais antigos da comunidade e, a partir deles, elaborar questionários
referentes às histórias daquela comunidade. Os alunos trabalharão em equipe e
utilizarão questionários para orientar as entrevistas, gravadores e fotografias,
desenhos. No final, montarão e apresentarão o material coletado e, posteriormente,
depositarão na biblioteca da escola, disponibilizando para alunos e professores tanto
da comunidade, quanto de outras escolas.
Segundo as diretrizes para o ensino de História e cultura brasileira e
africana, o ensino, entre outros conteúdos, abordará iniciativas e organizações
negras, incluindo a história dos quilombos, a começar pelo de Palmares, e de
remanescente de quilombos, que tem contribuído para o desenvolvimento de
comunidades, bairros, localidades, município, onde se dará destaque a
acontecimentos e realizações próprios de cada região e localidade.
Essa proposta aproxima a disciplina História da vida cotidiana do aluno, a
partir de outra perspectiva de um conteúdo abordado em sala, dos conteúdos do
livro didático, muitas vezes distante e sem sentido, essas narrativas se tornam
significativas por estarem mais próximas da realidade daquele aluno. Assim, os
alunos elaboram uma espécie de material didático local, a partir da perspectiva da
História local, complementa o manual convencional.
Abaixo segue um trecho de uma narrativa de uma antiga moradora da
comunidade quilombolas Lagoas, onde ela rememora algumas lembranças
herdadas dos tempos de cativeiro:

“Quando gritaram alforria, disse que as brancas choravam e elas (as


negras) dançavam no meio do terreiro, uns batendo tambor e eles
dançando, dançando... E disse que elas (as brancas): “oh! Que eu ainda
nem tomei um cafezinho hoje!” E elas (as negras): “Vai fazer!” E elas
cantavam: “pisa o café, penera e côa, o café da menina é coisa boa!
Amanheça, amanheça, amanheça – adeus meu povo vou embora. A cuia
quebra e a dona chora e eu bato o pé e vou embora” [ risada] eles
cantavam, cantavam, dançando bem aí no São Vitor, olhando para aquela
pedra do São Vitor (Dona Julieta, 81 anos, comunicação oral, localidade do
Retiro, fev. 2012).”11

11
Ver em: MATOS, Simone de Oliveira. MORAES, Maria Dione Carvalho de. Territorialidade
Quilombola em Lagoas (PI): “memória dos tempos de cativeiro” e questões de titulação. In: LIMA,
Solimar Oliveira. FIABANI, Aldemir (Org.). Sertão Quilombola: Comunidade negra no Piauí. Teresina:
EDUFPI, 2015.
73

Este é um exemplo de narrativa que pode ser coletada por alunos a partir
do conteúdo em sala de aula: abolição da escravatura no Brasil. O aluno através da
história local tem outra visão de como ocorreu a libertação do trabalho escravo em
sua própria comunidade. Infelizmente a Dona Julieta faleceu no decorrer deste
trabalho, mas algumas de suas memórias continuam vivas em alguns trabalhos e
teses acadêmicas.
Abaixo, visualizamos a pedra do São Vítor, onde em seu sopé, em
tempos chuvosos, acumula água e serve de bebedouro para os animais. Conta-se
que na pedra há rastros de escravos, marcas na rocha parecidas com pegadas.

Foto 6: Pedra do São Vitor. Março, 2016. Fonte: Autor.

Na fotografia abaixo, visualiza-se uma mureta de pedra, segundo os


moradores, construída pelos escravos da antiga fazendo São Vítor para acumular
água para as criações.
74

Foto 7: Mureta de pedra. São Vítor. Junho, 2016. Fonte: Autor.


75

Portanto, através das narrativas e fotografias coletadas pelos alunos e a


elaboração de um banco de narrativas sobre sua comunidade, os alunos terão uma
maior proximidade com determinados conteúdos abordados em sala de aula; nesse
contexto, o manual didático não será a única fonte de conhecimento e pesquisa.
Essa proposta de atividade oferece um conhecimento da História mais significativo,
pois aproxima temas referentes ao passado com o presente vivenciado dos alunos.
76

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em 16 anos da lei que obriga todas as escolas de ensino básico a inserir


em seus Planos Políticos Pedagógicos (PPP), nas salas de aula e nos materiais de
apoio pedagógicos utilizados na escola, como o livro didático (propostas e respostas
às demandas) as lacunas sobre o passado africano e sobre a história dos
afrodescendentes no Brasil, a passos lentos, percebe-se uma mudança nesta nova
perspectiva do ensino de História.
Das demandas dos movimentos sociais negros até a aprovação das
Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-raciais e
Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana, muito se percorreu, se exigiu,
para que pelo menos na área da educação, políticas de ações afirmativas, de
reparação, fossem reconhecidas e transformadas em lei pelo Estado brasileiro.
Reconhecer, valorizar, reparar a História, a Cultura, a Identidade dos
povos africanos e afrodescendentes, indígenas, imigrante: tudo isto implica em
reconhecer e notar a História e a realidade do nosso país de outra representação,
envolvendo a região e a comunidade.
Trazer esses temas para sala de aula, também é trazer temas como
democracia racial, racismo, preconceito, desigualdades sociais e raciais,
relacionadas intimamente. São temas sensíveis e interessantes a serem discutidos e
desconstruídos em espaços escolares, devido à diversidade de alunos e
professores, em sua dimensão religiosa, cultural e identitária. Não podemos afirmar
que preconceitos e racismo têm inicio no ambiente escolar, mas essas atitudes
perversas perpassam o ambiente escolar e deve ser combatida.
Quanto aos livros didáticos, percebe-se que há uma série de mudanças
em percurso. Nota-se, também, a ocorrência de termos equivocados ao longo dos
textos dos livros didáticos analisados, onde os autores reproduzem termos como
“misérias”, “fome”, “mazelas”. São imagens de africanos em tribos, com lanças e
escudos, quando querem se referir à diversidade de povos africanos. Já ao se tratar
dos africanos no Brasil e dos afro-brasileiros, pouco se problematiza sobre suas
condições pós-abolição da escravatura. Esses termos são utilizados principalmente
quando a África e afrodescendentes são abordados no contexto atual. Não se trata
77

de ocultar aos alunos questões como pobreza e conflitos políticos em território


africano, ou mesmo em omitir a atual condição da maioria da população negra
afrodescendente, mas debater questões cujo embrião desses problemas não se
encontra na África. Afinal, não existe, nem existirão manuais didáticos que deem
conta de toda problemática histórica dos povos. Cabe ao professor historiador estar
bem preparado para suprir as carências do cotidiano em sala de aula.
Uma dessas formas (e metodologia) para suprir essas carências dos
livros didáticos em relação à História dos afrodescentes no Brasil, seria trabalhar de
forma localizada; recuperar as memórias de pessoas que de forma direta ou indireta
vivenciaram ou vivenciam a negritude, a afrodescendência que na proposta final
desta dissertação, foi a oficina de narrativas com as pessoas mais velhas da
comunidade quilombola São Vitor, no Piauí. Mas podemos também direcionar essas
narrativas para integrantes do movimento negro local, ativistas de coletivos negros,
do embate ao racismo, lideres de religiosidades afro-brasileiras, movimentos negros
artísticos, mestres de capoeira. Uma infinidade de propostas pode ser realizada a
partir da coleta de narrativas dessas figuras que fazem história, para transformar
realidade de suas localidades.
No interior desta proposta, há espaço para que os alunos produzam suas
próprias narrativas didáticas sobre sua localidade, aproximando mais a disciplina de
História do cotidiano vivido, aprofundando o conhecimento de suas raízes. Já os
alunos que não se consideram afrodescentes, há a possibilidade de conhecer,
valorizar e principalmente, respeitar a cultura e História do Outro.
Portanto, estamos em busca de um aprimoramento do Ensino de História
e o Ensino de História da África e cultura Afro-brasileira; percebe-se um momento
histórico de renovação de nossas práticas de ensino. Isto quer dizer que em nossos
dias busca-se um novo eixo de compreensão tendo em vista as narrativas dos livros
didáticos. Através da abordagem multifacetada da formação histórica brasileira, de
afirmação das diferenças e da identidade pessoal múltipla, da incorporação da
História dos povos africanos (sua importância e contribuição para a formação da
sociedade brasileira), tudo isto corresponde a um novo modelo de representação
sobre o Brasil. Nesse novo modelo, está implícita, através da educação, a formação
de um novo modelo de cidadão, capaz de compreender e conviver com as
diferenças. Viver em uma sociedade plurirracial e pluricultural não deve mais gerar
conflitos graves. Como afirma Munanga: “(...) a identidade é sempre um processo
78

negociado e renegociado, de acordo com os critérios ideológicos, políticos e das


relações de poder” (2004, p.119)
O Brasil como país multicultural deve garantir o acesso à aprendizagem
da História de todos os povos que constituem nosso país. Que todos esses temas
sejam inseridos no ambiente escolar para que sejam conhecidos por todos.
79

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84

APÊNDICES
85

APÊNDICE A – Entrevista com a professora de História – em 05 de julho de 2017 –


local escola municipal José Caetano dos Santos – Comunidade São Vítor – São
Raimundo Nonato – Piauí

Tempo: 00h28min:09
- A senhora é formada em História?

Profa. Rosa*: Sou formada em História. Me formei aqui na UESPI em São Raimundo,
no Campus de São Raimundo Nonato.

- Há quanto tempo a senhora é formada em História?

Profa. Rosa*: 2014. Que terminou o curso. E, foi pelo PARFOR. O programa de
formação de professores

- Então, a senhora já atuava como professora de História, mesmo sem a graduação?

Profa. Rosa*: Já, mesmo sem ter formação na área, mas eu já tinha talvez uns três
anos que eu já trabalhava com História. Sem ser formada na área, mas por
necessidade.

- Já tinha trabalhado com outra disciplina antes da História?

Profa. Rosa* Já. Já tinha trabalhado com ciências, geografia. Um multiseriado aí.

- todas no ensino fundamental?

Profa. Rosa*: Sempre eu trabalhei com ensino fundamental menor seja no segundo
ano, terceiro ano. E no ginásio, no fundamental maior com geografia e ciências e aí
estava trabalhando com História quando comecei a estudar.

- a senhora é daqui mesmo? Do São Vítor?


86

Profa. Rosa*: sou daqui do São Vítor.

- A família também?

Profa. Rosa*: A família... Eu morava em Poço Dantas, no município de São Lourenço,


aí quando me casei, vim morar aqui. Meu esposo que é daqui.

- A senhora participou do processo de escolha deste livro ( Livro utilizado na escola),


desse material?

Profa. Rosa*: Na verdade, a gente nem pode dizer que participou. Por que a gente
participa, tem vez, na escolha mesmo desse 2014, nós os professores da escola,
participamos. Só que livro que nós escolhemos, não foi esse. Sempre acontece isso. A
gente escolhe, analisa os livros e na hora, vem outro, não é o que a gente escolheu.

- A senhora lembra qual foi o que foi escolhido?

Profa. Rosa*: Não lembro não. Já do fundamental menor, já agora dessa última vez, no
ano passado, já nem chamaram a gente. Só fez jogarem os livros.

- As reuniões são feitas na sede? Em São Raimundo?

Profa. Rosa*: às vezes é lá. Aí Já teve vez de ser aqui na escola, também, só com os
professores daqui que escolhem e mandam pra lá, a escolha, mas eu acho que tem
uma... [silêncio]

- Ano passado teve escolha?

Profa. Rosa*: Não, esse aqui, já foi desde 2014, 2015 e 2016. Ano que vem é que
muda. Esse ano é o ano da escolha de livro. Pro próximo ano já vai ser outro.

- A secretaria municipal, ela realizou alguma oficina, assim de apresentação de livros,


de como o professor pode escolher melhor os livros, alguma formação?
87

Profa. Rosa*: Não. A secretaria não. Quando eu estava estudando, no curso de


História, teve uma disciplina que eu nem lembro qual o nome, que teve também analise
do livro, por que a gente fez um trabalho, eles deram um roteiro, pra ver quais eram os
livros melhores a ser escolhido. Mas a secretaria não se envolveu com isso não.

- Quando a senhora participou, em 2014, tinham muitos livros a serem escolhidos?

Profa. Rosa*: Tinha, tinha muito. Sempre tem bastante livro. Olha só pra esse ano, as
editoras chegam aqui e já tem livro de uma três a quatro editoras. Eles têm uma
vontade de vender aí eles já trazem.

- A senhora já sentiu alguma influencia das editoras pra escolha desse livro na época?
(2014) dessa coleção?

Profa. Rosa* 2014 eu acho que aqui só veio, pra trazer livro aqui na escola só uma
editora.

- eles só deixam a caixa (de livros)?

Profa. Rosa* - Eles deixam pra gente analisar, eles mostram uns folhetos, por que já
tem mais ou menos o que é que tem no livro. Mas aí eles voltam, por que a escolha é
feita depois, aí nessa hora eles não interferem não.

- A secretaria municipal ela influência?

Profa. Rosa*: Não, na hora a gente sente que lá eles escolhem a critério deles. Mas
não que eles cheguem assim pra gente e diga: _ escolha esse! Os professores
escolhem, e também a gente não sabe o que o outro escolheu e também nem sabe
qual foi que ganhou a concorrência, só que a gente comenta entre si que não tem
muita vantagem os professores escolherem que na verdade num prevalece as escolha
deles não (dos professores). Tem uma maneira também que as editoras fazem, vende
seu peixe, o mais barato, tudo isso aí existe. Eles levam a gente pra escolher, pra dizer
88

que teve a escolha, mas na verdade não é não. Eles escolhem o que é melhor pro
bolso deles lá.

- esse livro já foi utilizado em outros anos?

Profa. Rosa*: antes de 2014? Não tenho conhecimento.

- esse livro é utilizado em outras escolas?

Profa. Rosa* Eu sei que é utilizado no município. Em todas as escolas é esse livro. Nas
escolas públicas do município é esse.

- Houve alguma preocupação na escolha desse material por conta da escola estar
num território quilombola?

Profa. Rosa* não. Não por que já que a escolha da gente num é valida, eles não vão
pensar. É o mesmo livro pro município todo. É... Já no fundamental menor, esse ano, já
tá sendo. Tem o livro da cidade e o livro do campo. É diferente, mas no... a não ser
agora, no próximo, ano que vem, pode vir com essa mudança. Como do fundamental
menor já veio com essa mudança, aí não sei, no próximo ano...

- A senhora pode dizer, se pela escola estar num território quilombola, há alguma
diferença no ensino.

Profa. Rosa* Praticamente não. Por que até mesmo a gente não tem material. Quase,
pra trabalhar assim mais a cultura deles... A afro-brasileira por que já é mais assim, a
parte quilombola mesmo. Alguns livros hoje apresentam assim uns pequenos
textozinhos sobre isso, mas é pouco. Não tem diferença praticamente não. Por que é
uma coisa que eles sempre falam que tem que ter né. Hoje já é determinada por lei
que o ensino afro-brasileiro já que tem que ter em toda escola de ensino médio, de
fundamental maior... Mas fica só na teoria.

- A senhora teve alguma formação para passar esse tipo de conteúdo? Sobre
quilombos, sobre História da África, cultura afro-brasileira?
89

Profa. Rosa* não, não, não. Não tive curso nenhum pra isso não separado não.

- Na graduação, teve alguma disciplina?

Profa. Rosa* Na graduação... Teve uma disciplina que falava de afro-brasileiro...


História da África! Que já envolvia um pouco assim. Mas assim, voltado pra região aqui,
o quilombo lagoas que é esse aqui, que nós estamos inserido, nunca teve não.

- A secretaria municipal de educação nunca ofertou curso?

Profa. Rosa* não, até eu que morava aqui dentro do quilombo, eu não sabia era nada!
Esse negócio de quilombo. Eu vim ficar mais por dentro, sabendo o que é que era isso,
por que meu trabalho de conclusão de curso eu fiz História e Memória do Quilombo
Lagoas, aí eu tive que fazer umas pesquisas e...

- A senhora poderia me emprestar? (risos)

Profa. Rosa* Só que, eu, ele tá lá na UESPI, ficou lá, eu nunca nem imprimi pra mim,
eu não tenho nenhuma cópia, uma Xerox assim, ficou num pen drive lá, eu fico dizendo
que vou imprimi um pra mim, mas até hoje...

- a senhora sabe me dizer se tem algum trabalho sobre a escola, um histórico, que
conte a história da escola

Profa. Rosa* tem o projeto politico, só tem esses documentos assim. A diretora sabe
informar mais do que eu. Eu acho que tem um levantamento sobre isso ai, a história,
que fizeram antes deu trabalhar aqui. Por que de inicio eu trabalha ali no Calango,
comunidade Calango, ai fechou lá. Ai eu , me trouxeram pra aqui. Mas isso aí a diretora
sabe mais do que eu. Eu num sei informar bem.

- E o livro didático pra senhora, serve pra que? Ele ajuda?


90

Profa. Rosa* Eu acho que ajuda. Por que o livro é um suporte pra você, pelo menos se
basear e dali você planejar suas atividades em cima daquilo. Sem o livro fica assim,
mais difícil pra gente. Mas esse ano mesmo, metade dos alunos, não tem o livro. Ai
isso ai complica, você diz que tá trabalhando com o livro, mas ao mesmo tempo muitas
atividades não são feitas com o livro. Mas o livro ajuda, tem livro que não ajuda muito
não, mas tem outros livros que só ótimos tem atividades boas que você pode trabalhar
mesmo. Mas esse ano está essa dificuldade, assim, por que metade dos alunos não
tem livro.
E os alunos também viraram muito sem interesse e tem deles que tem e não traz para
a sala de aula. Acho que os alunos dão muita pouca importância ao livro, mas eu não
acho que seja por que o livro não tenha importância, é falta de interesse dos alunos
que tá.... Por que hoje em dia é grande a falta de interesse dos alunos. A grande
maioria deles. Seja em qualquer lugar. Cada dia você percebe isso, que os alunos
estão perdendo o interesse pela aprendizagem.

- A senhora gostou desse livro? Já faz uns três anos que a senhora usa né?

Profa. Rosa* faz uns três anos. Na verdade num foi dos livros que eu gostei mais não.
Eu já estou com vontade que chegue o próximo ano pra mudar de livro. Até mesmo por
que a gente fica com vontade de ver outras... Deixe que eu tenho outros livros, eu
pesquiso em vários outros livros, mas como aqui a gente não tem acesso a internet ,
pra você pesquisar, nada, então no momento o livro é o maior meio de fonte de
pesquisa, por que se a gente não tem acesso a esse outros meios tecnológicos, o livro
ainda é a base principal pra gente.

- Pelo que a senhora já percebeu do livro, trabalha com a lei ( 10.639) que pede que a
gente trabalhe com historia da África?

Profa. Rosa*Não, não fala, não trata. Esse aqui não.

- Então ele precisa ser renovado?

Profa. Rosa* tá, se é lei a gente trabalhar com isso aí, eles tão atrasados. (risos) Se já
tá lá na constituição que e lei.
91

- a senhora tem acesso a outros materiais pra planeja aula, vai além desse livro não é?

Profa. Rosa* É, eu pesquiso em vários outros livros.

- Então um problema dos alunos é que nem todo mundo tem livro?

Profa. Rosa* é, e ainda tem outros que não trazem o livro. Tem e não trazem. Tem
hora que eu digo: _ traga o livro pra eu dar pra outro que quer, por que tem aluno sem
livro! Mas são meio enrolados... Tem uma turminha ai...

- A senhora saberia dizer por que não tem livro pra todo mundo?

Profa. Rosa* Eu acho eu é por que já ser três anos que a gente está com esse livro ai
os alunos levam no primeiro ano pra casa aí , no ano seguinte tinha que devolver pra
escola, pras turmas seguintes e eles, metade não devolvem . por que de inicio tinha, e
o numero de alunos não aumentou e os livros sumiram. É pra ser isso.

- Então, vem reposição?

Profa. Rosa* as vezes vem um pouco, uns livrinhos a mais, mas não dá pra repôs não.
Acontece que, tem ano que vem assim, teve esse livro que trabalhamos ano passado,
ai deixa que esse ano a secretaria mandasse uns restinho que tem lá, mas não dá pra
cobrir não.

- Me deixa fazer uma atividade que vou fazer com os meninos, com a senhora
também? A senhora poderia pensar em umas dez palavras que venham a cabeça
quando a gente fala, África?

Profa. Rosa* Escravos, indígenas, cultura, é que assim, de repente dá um branco, [...]

- Não precisa ser dez, o que a senhora conseguir...


92

Profa. Rosa* África... Tem uma teoria, que nossa origem veio de lá, não sei se...
Origem. Tem outros que dizem que não é mais, mas ainda tá por aí... E... [silêncio]
bora, me ajude ai! [risos].
- Na televisão, nos livro... [risos]

Profa. Rosa* geralmente aparece mais... Deserto, animais, girafa, nos filmes... eu num
assisto muita televisão não, mas é isso ai...é que na hora a gente...dá um branco...

- está ótimo!

- a senhora sabe me dizer se os alunos pesquisam além desse livro didático?

Profa. Rosa* não tem muito interesse não, por que tem muita preguiça de ler. Agente
coloca um estudo dirigido, questionário umas coisa pra eles responder pelo livro e tem
deles que fica perguntando: _ professora diz a pagina aí! Que pagina é? E na verdade
também a gente num tem muito habito de pesquisa, é tentado mudar por que ainda
aquele método um pouco tradicional, a gente tenta, mas... Os alunos são preguiçosos,
já estão viciados, são preguiçosos, marcam estudo dirigido e ainda pedem a página.
Eles querem encontrar uma reposta pronta, eles não querem ler, pra eles mesmos
formular a reposta deles. Tem uns que quer, a gente diz, eles, mas tem uns ...Mas é a
maioria que não quer. Bote aí uns vinte por cento que querem.

- Pra fazer os planejamentos de aula, a senhora usa esse livro?

Profa. Rosa* é. Pra planejamento, mesmo, mensal, eu faço baseado nesse livro, até
mesmo a secretaria , lá ela, tem vez que a gente vai fazer planejamento lá em são
Raimundo , eles dizem bem assim:_ listem ai os conteúdos ! Já aconteceu deles os
coordenadores dizer bem assim _ só precisa dividir aí o livro nas unidades , e organiza
e lista os conteúdos , ai a gente faz assim, mas na verdade, o planejamento diário,
que nos trabalha por semanário , a gente faz o planejamento mensal, e trabalha com
semanário . Cada dia você vai registrando, vai registrar o que você tá fazendo.
Planejando diariamente. Ai esse ai não, você coloca coisas que nem tem lá no mensal.
Vai pesquisar em outros livros, pensar no que vai fazer.
93

- da lei 10.639, a escola tem algum projeto, ou pediu que os professores fizessem
projetos por conta dessa lei?

Profa. Rosa* não, às vezes a gente entre si conversa, tem que trabalhar, tem que
trabalhar mais a região, mas fica... Tem... E não tem... Fica no planejamento. A
diretora gosta de falar: te, que trabalhar mais! Mas aí ela não tem nada pra dizer: olha
trabalha com isso aqui, por se for mesmo, as fontes com essa lei é pouca. Eu se eu
fosse trabalhar mais isso aí eu ia usar meu projeto, meu trabalho de conclusão de
curso, por que outra coisa não tem, a gente acha assim, uns paragrafozinhos em algum
livro, e pra, que eu vejo assim, acho que mais até no livro do fundamental menor, no
quarto ao, no quinto ano, é que eu tenho mais lembrança que eu tenho encontrado
mais completo no livro sobre isso.

- Quando a senhora vai trabalhar temas como escravidão, o período do Brasil


escravocrata, os alunos lembram algo que já ouviu o avô falar, que aqui “no tempo da
escravidão...” ou até fora da escola mesmo?

Profa. Rosa* eu acho que eles num, num, algum deve saber pela família, mas num é
muito falado assim. Agora mesmo nos estávamos trabalhando ouro no Brasil, dos
bandeirantes, captura que eles faziam dos indígenas, na sétima serie, eles começaram
a falar, eu coloquei um vídeo lá que mostrava tudo sobre aquilo e eles começaram a
discutir, falar coisas que eles, já sabiam de antes, mas eu não sei dizer se era da
família, ou da escola mesmo, que eles já tinham aprendido mais lá atrás.

- eles falam que por aqui tinha indígenas?

Profa. Rosa* eles sabem que aqui tinha escravo. A maioria deles sabem que aqui tinha,
que aqui já foi uma fazenda, onde teve escravo aqui também, eles sabem. Por causa
deles viverem no quilombo Lagoas, eles sabem e tem uns que moram ate aqui, pelo
lado das Emas, Moisés, que eles ainda sabem mais que os que moram no São Vitor.
Que os alunos aqui do Moisés eles estudam aqui à tarde. Ai lá é mais forte esse
negocio do quilombo, que é mais de lá é que saiu , parece que teve mais origem foi lá
mesmo. Foi o lugar que começou mesmo a se destacar a se apresentar como
quilombola foi onde surgiram os primeiros benefícios, em relação eles serem
94

quilombolas, foi lá, ai eles já sabiam, mais por dentro. Mas aqui mesmo no povoado
eles num sabe muito não. Eu nem tiro eles da razão, que num sabia quase nada de
quilombola, foi ai que disse_ não! Vou fazer meu trabalho sobre isso por que eu moro
dentro de um quilombo, e eu num sei nada dessa região.

- Os alunos se reconhecem como quilombolas?

Profa. Rosa* eu acho que sim, mas, eu acho que sim. Pode aparecer um ou dois
dizendo que não, mas... Consideram.

-E a senhora? Considera-se?

Profa. Rosa* Eu me considero assim, nem tanto cem por cento, por que eu penso
assim, eu nem morava aqui, eu hoje to aqui é questão por eu ser quilombola é por eu
está aqui, mas assim, minhas raízes não são, mas eu me considero.
Mas tem assim, cor, que eu acho engraçado, nas matriculas, a gente sabe que tem a
cor, que pedem a cor, os pais, é poucos que dizem ai lá sempre vem a cor, negro,
pardo, branca, amarela, essas quatro cores, mas é muito difícil, o pai que diz a cor pra
dizer , preto. Ai tem desse que tão lá moreninho que é uma beleza, sem querer dizer o
porquê, num sei por que. Tem vez que eles falam assim, preconceito de cor, mas eu
acho que assim, o, o, o, negro, ele é quem se discrimina, por que muito deles são
negros, e eles não dizem negro! Por que se fosse eu dizia. Por que cor não quer dizer
nada. Mas quando o dos dizem assim: pardo! É poucos que se assumem por negro, e
muitos, muitos, são bem escurinhos, eu não sei por que. É engraçado. Tem vezes que
a gente comenta. Tem a questão do racismo, que hoje é muito comentado, por que
acontece demais, mas tem muitos, negros que eles é quem comentem o racismo por
parte deles, por que eles mesmo não tem coragem de dizer que é negro!

- é algo pra gente pensar né?

Profa. Rosa* É! A gente faz matricula aqui, pra gente ver assim, esse é negro, negro, e
quando a gente vai ver a cor, (na matricula) são bem poucos que são negros. E se a
95

gente colocar, a cor sem perguntar pros pais, que a obrigação é perguntar, mas se a
gente não perguntasse, a gente iria colocar negro. Cor negra. Mas eles dizem que são
pardos. Então temos que colocar pardo. Ai eles dizem: sou quilombola! Mas a gente
sente que eles não assumem cem por cento, não tá no sangue, que quando tá no
sangue você defende, por mais que pode aquilo.

Agradecimentos e encerramento.
96

APÊNDICE B - Roteiro de perguntas para a professora sobre o livro


didático.

Como ocorreu o processo de escolha do material didático?


A secretaria municipal realizou alguma oficina para orientar o processo de
escolha do livro didático?
Quantas coleções senhora teve acesso para esta escolha?
Quais critérios a senhora utilizou para esta escola?
Houve algum tipo de influência ou indicação de terceiro para escolha
deste material?
Da editora? Da regional de educação? Da direção?
Este material já tinha sido utilizado em outros anos escolares?
Por quê?
Este material é utilizado em outras escolas do município?
Houve alguma preocupação na escolha deste material por conta da
escola estar inserida num território quilombola?
Você conhece a lei 10.639?
Há algum evento ou planejamento que cumpra a proposta da lei 10639?
Você é formada em História?
Onde se formou? Faz quanto tempo?
Você recebeu alguma formação para trabalhar História de África e Cultura
afro-brasileira?
De que maneira você utiliza o livro didático?
Seus alunos utilizam o livro?
Sempre?
Tem acesso a outros materiais para leitura/planejamento de aulas?
E os alunos?
97

ANEXOS
98

ANEXO I – Projeto Político Pedagógico da U. E. José Caetano dos


Santos
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ANEXO II – Imagens do Livro Didático


Figura 2

Principais sítios arqueologicos na África.


(CAMPOS et al. 2012: 38)

Figura 3

Possíveis rotas de expansão de hominídeos(200-100 mil anos atrás)


(CAMPOS et al. 2012)
121

Figura 4

Pastores. Pintura Rupestre. Argélia, c.5500-2000 a.C.


(CAMPOS et al. 2012)

Figura 5

Imagem de Satéite Rio Nilo


(CAMPOS et al, 2012)
122

Figura 6

Mapa Rio Nilo


(CAMPOS et al, 2012)
123

Figura 7

Imagem atual do Rio Nilo


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 8

Elizabethe Taylor representa Cleópatra.


(CAMPOS et al, 2012)
124

Imagem 9

A morte de Cleópatra, Luca Ferrari. 1530-1540


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 10

Biblioteca de Alexadria, Egito.


(CAMPOS et al, 2012)
125

Imagem 11

Griots, Nigéria.
(CAMPOS et al, 2012)
126

Imagem 12

Etnia Fula, Nigéria.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 13
127

Etnia Baca, Congo, 2006.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 14

Etnia Mbuti, Congo.


(CAMPOS et al, 2012)
128

Imagem 15

Etnia Mbuti, Congo.


(CAMPOS et al, 2012)
129

Imagem 16

Etnia San, Namíbia.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 17

Comercio entre africanos e árabes.


(CAMPOS et al, 2012)
130

Imagem 18

Mapa da África no ano mil.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 19

Mercado Djenné, República do Mali, 2002.


(CAMPOS et al, 2012)
131

Imagem 20

Mapa Africa Ocidental e o Império do Mali (Sec. XIII-XV)


(CAMPOS et al, 2012)
132

Imagem 21

Mapa África Central e o Reino do Kongo (Sec. XV-XVI)


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 22

Jogar capoeira ou dança de guera. J. M. Rugendas, 1835.


(CAMPOS et al, 2012)
133

Imagem 23

Engenho, F. Post, 1644.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 24

Engenho. F. Post, 1661.


(CAMPOS et al, 2012)
134

Imagem 25

Engenho. F. Post, 1661.


(CAMPOS et al, 2012)
135

Imagem 26

Casa Grande
Engenho. F. Post, 1661.
(CAMPOS et al, 2012)
136

Imagem 27

Milagra de Nossa Senhora do Rosário. Anônimo, 1726.


(CAMPOS et al, 2012)
Imagem 28

Navio Negreiro, 1790


(CAMPOS et al, 2012)
137

Imagem 29

Recife, Séc. XVI


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 31

Paisagem de Várzea com cabana. F. Post, 1658.


(CAMPOS et al, 2012)
138

Imagem 32

Aplicação de Castigo. J.B. Debret, 1839.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 33

Sapataria. J.B. Debret, 1839.


(CAMPOS et al, 2012)
139

Imagem 34

Loja de barbeiros. J.B. Debret. 1839.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 35

Ama de leite. J. F. Vilda. 1880.


(CAMPOS et al, 2012)
140

Imagem 36

Banzo.
(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 37

Escravas de diferentes nações. J.B. Debret,1839.


(CAMPOS et al, 2012)
141

Imagem 38

Senzala. V. Frond. 1885.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 39

Mapa do tráfico negreiro (séc. XV-XVI)


(CAMPOS et al, 2012)
142

Imagem 40

Mapa do tráfico negreiro (séc. XVIII)


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 41

Prisioneiros de Guerra, Grécia.


(CAMPOS et al, 2012)
143

Imagem 42

Quilombo dos Palmares. G. Barleus 1647


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 43

Quilombo dos Palmares. G. Barleus 1647


(CAMPOS et al, 2012)
144

Imagem 44

Mapa de comunidades quilombolas.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 45

Mapa de Comunidades quilombolas tituladas.2009


(CAMPOS et al, 2012)
145

Imagem 46

Mapa de quilombos no Rio Grande do Sul.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 47

Nossa Senhora do Rosário, Aleijadinho.


(CAMPOS et al, 2012)
146

Imagem 48

Anjos, mestre Ataíde.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 49

Negra da Bahia usando amuleto. J.B. Debret, 1839.


(CAMPOS et al, 2012)
147

Imagem 50

Jovem negra Nagô, 1860-1865.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 51

Negro Malê. C. Junior, 1865.


(CAMPOS et al, 2012)
148

Imagem 52

Negro mulçumano. J.B. Debret, 1839.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 53

Mapa da África em recortes de jornal.


(CAMPOS et al, 2012)
149

Imagem 54

Trabalhos forçados, atual Tanzânia, 1927.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 55

Guerreiros Zulu. África do Sul, 1875


(CAMPOS et al, 2012)
150

Imagem 56

Guerreiros etíopes, inicio do séc. XX.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 57

Guerreros Massai. Quênia, 1890.


(CAMPOS et al, 2012)
151

Imagem 58

Crítica a lei do ventre livre.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 59

Primeiras trovas burlescas. Luis da Gama, 1904.


(CAMPOS et al, 2012)
152

Imagem 60

José do Patrocínio, séc. XIX.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 61

Machado de Assis, 1890.


(CAMPOS et al, 2012)
153

Imagem 62

Francisco Nascimento, 1884.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 63

Abdias Nasciemento, 1997.


(CAMPOS et al, 2012)
154

Imagem 64

Milton Santos, 2000.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 65

Ismael Ivo, 2011.


(CAMPOS et al, 2012)
155

Imagem 66

Heitor dos Prazeres,1963.


(CAMPOS et al, 2012)

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Jogar Capoeira. J.M. Rujendas


(CAMPOS et al, 2012)
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Imagem 68

Mestre Bimba.
(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 69

Mestre Pastinh
CAMPOS et al, 2012)

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157

Rocinha, 2011.
(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 71

Rocinha, 2011.
(CAMPOS et al, 2012)

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Morro do Rio de Janeiro. A. Malta, 1905.

Imagem 73

Rocinha, 2011.
(CAMPOS et al, 2012)
159

Imagem 74

Baianas dirante o carnaval, 1930.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 75

Ala das baianas, 1999.

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160

João Candido. A. Malta, 1910.


(CAMPOS et al, 2012)

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Capoeira. P. Verger, 1946-1947.


(CAMPOS et al, 2012)

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Mandela,Africa do Sul, 2000.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 79

Cartaz O imperio Colonial


(CAMPOS et al, 2012)

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162

Kwanw Nkrumah, Gana, 1960.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 81

Kwanw Nkrumah, Gana, 1960.


(CAMPOS et al, 2012)
163

Imagem 82

Ellen J. Sirleaf. Noruega, 2011.


Kwanw Nkrumah, Gana, 1960.
(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 83

Jonas Savimbi, Angola, 1975.


(CAMPOS et al, 2012)
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164

Amílcar Cabral, Guiné, 1963.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 85

Farp. Guiné Bissau, 1971.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 86
165

Massacre de Sharpeville, Africa do Sul. 1960.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 87

Mapa África 1939.


(CAMPOS et al, 2012)

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Mapa África – Independencias.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 89

Mapa África e Guerra fria.


(CAMPOS et al, 2012)

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Mapa África 2012.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 91

Saudação Black Power, EUA, 1969.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 92
168

Ali. Las Vegas, EUA. 1965.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 93

Martin L. King e Malcom X, Capitólio, EUA. 1964.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 94
169

Black Power, EUA. 1972


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 95

Pantera Negra. Carolina do Norte, EUA, 2006.


(CAMPOS et al, 2012)

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Steve Biko. Cidade do Cabo, Africa do Sul 1972.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 97

Abdias Nascimento, Salvador, 2006.


(CAMPOS et al, 2012)
Imagem 98
171

Protesto de estudantes negros. Soweto, Africa do Sul.1976.


(CAMPOS et al, 2012)

Imagem 99

J. Carlos e T. Smith. Olimpiadas do México.


(CAMPOS et al, 2012)

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172

Cartaz de campanha da Anistia Internacional.


(CAMPOS et al, 2012)

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