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INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
CUIABÁ-MT
2013
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
CUIABÁ-MT
2013
IMARA PIZZATO QUADROS
Cuiabá-MT
2013
IMARA PIZZATO QUADROS
DEDICATÓRIA1:
Agrada o ser!
Mostra-se grato, exibir a gratidão que se sente por aqueles que de alguma maneira
partilharam a trajetória comigo, conosco. Estudar-aprender, bem como, elaborar uma tese e
chegar à condição de Professora Pesquisadora Doutora não é uma caminhada solitária, ao
contrário, é um caminhar de forma sempre partilhada... Certamente neste texto, mal cabem
todas as pessoas que direta ou indiretamente estiveram comigo... A cada uma serei
eternamente grata! Então, segue meu carinho em forma de palavra escrita para aquelas que
compassaram o passo comigo em algum momento do trajeto!
Agradeço minha amiga-orientadora, Professora Doutora Michèle Tomoko Sato pela acolhida
neste percurso, pela sensibilidade com que me orientou e pelo respeito dispensado ao meu
percurso, portanto, ao meu trabalho de doutoramento.
Agradeço a Iára Pizzato Quadros, minha primeira e fiel leitora-crítica da tese. Sem seus
pareceres, provocações e discussões teria sido impossível desamadurecer e reamadurecer
nesta jornada.
Agradeço ao César Pizzato Quadros, minha segunda mãe, pela força no início do doutorado,
trabalhando inclusive algumas imagens quando eu ainda não sabia muito como fazer.
Agradeço ainda, outra leitora sensível-crítica do trabalho ainda embrião, Ruth Albernaz
Silveira, amiga sempre pronta a dar força!
Agradeço a banca, Professora Doutora Martha Tristão, Professor Doutor Celso Sánchez,
Professora Doutora Solange Ikeda, Professor Doutor Luiz Augusto Passos e Professora
Doutora Regina Silva pelo exame parceiro, sensível, crítico e criativo do meu trabalho.
Agradeço especialmente a Luísa Teixeira, pela prontidão e carinho com que nos atende e
conduz na secretaria do PPGE/UFMT.
Mi, Likita e Luchy pelas aventuras e carinhos partilhados! Um abração apertado aos meninos
Samuka e Rona pelas ajudas e palavras indispensáveis. Beijos mil a Gi pelas dicas de leitura
para melhorar o conceito de território, e a Simone pela força no dia da defesa.
Agradeço a Sônia Palma pela primeira correção da escrita, a Marlene Silva pela correção final
e a Leen Gilles pela força na escrita da Língua Inglesa.
Agradeço com todo o carinho a comunidade de Joselândia pela acolhida, confiança, carinho
e ensinamentos desde 2007.
Agradeço imensamente a minha família, minha mãe tão amiga e parceira, meus irmãos
sempre amados Álvaro, César e Juarez, minhas cunhadas, meus sobrinhos e sobrinhas pelo
amor.
Agradeço meu filho João e meu namorado-companheiro-marido Hélio Caldas, pela grande
força e compreensão de sempre.
Agradeço a minha Tia Helena pelo último olhar e palavras, um diálogo só nosso.
Agradeço as minhas amigas-irmãs Márcia Pizzato (RS), Ruth (Cuiabá - MT), Rê e Mi (Cuiabá
– MT) e Fabi (Rondonópolis – MT) pela prontidão para o aconchego.
Este estudo expressa o resultante de uma pesquisa fenomenológica com foco na Educação
Ambiental, onde oferta contornos bem expressivos à relação Natureza e Cultura através das
práticas artísticas de uma comunidade pantaneira, Pantanal Norte, Complexo comunitário de
Joselândia, distrito do município de Barão de Melgaço em Mato Grosso – Brasil. Uma
pesquisa que trilhou pelo caminho formativo-aprendiz da Arte Educação Ambiental partindo
das ligações ecossistêmicas da canoa pantaneira feita pelos Mestres canoeiros, seguindo
para as aprendizagens científicas. Para tal, apoiou-se em Gaston Bachelard (Fenomenologia
da Imagem e da Imaginação), em Michèle Sato (Cartografia do Imaginário para Pesquisa em
Educação Ambiental), em Paulo Freire (Educação Popular), Michèle Sato (Educação
Ambiental) e em Ana Mae Barbosa (Arte Educação). O percurso compreensivo foi bordado
pelos objetivos que se compuseram por buscar possibilidades para reabrir o diálogo entre
Natureza e Cultura; compor uma cartografia sistêmica pelo viés artístico cultural dos serviços
ecossistêmicos e tecer ligações entre Arte e Ciência, esferas ainda dicotomizadas.
Compreender o fio sistêmico da canoa pantaneira mergulhada no contexto das relações
estabelecidas com o Pantanal Norte, Bacia do Alto Paraguai com as suas águas chegantes na
atualidade, permitiu o nascer de imagens artísticas poética-científicas, promovedoras da
compreensão da relação Arte e Ciência. A tradição moderna assentou dicotomias que não
permitem o brotar possibilidades da complementariedade-dialogantes, desembocando na
potencia da objetividade na despotencialização da subjetividade, tracejando diferenças,
esculpindo desigualdades, exclusões, invisibilidades, portanto, injustiças e
insustentabilidades. O estudo ao revelar as compreensões almejadas, abriu caminhos
importantes para a contemporaneidade educacional, científica e cotidiana. A pesquisa
desenhou uma educação sensível criativa como indispensável à formação humana em todos
os âmbitos, em especial para as questões ambientais que estampam com palheta forte, a
necessidade de uma Educação Ambiental em todas as estâncias de atuação-relações
humanas, inclusive na Ciência, clamando por superações das dicotomias instauradas pelo
pensamento moderno, transcendendo em busca de brechas, em busca de diálogos, em
busca de complementariedades. No caso desta pesquisa a busca foi pela
complementariedade entre Natureza e Cultura, bem como, Ciência e Arte no intento de
alcançar reinvenções necessárias na expectativa de contribuir com a superação dos
problemas sociais e ambientais existentes. Uma Educação Ambiental sensível, crítica e
criativa transbordante de transformação social com responsabilidade e compromisso,
considera este estudo, por se revelar um referencial significativo às pesquisas, aos governos
e a sociedade em geral, pois, ao pensar políticas públicas no viés sociocultural se deve aliar
o socioambiental para compor as tomadas de decisões que desenharão as políticas e a
Ciência em tempos Pós-Modernos.
APÊNDICES 267
ANEXOS 268
LISTA DE IMAGENS
Não deixei de produzir ciência só porque não imprimo o ritmo frenético solicitado pela
ciência hoje.
outros no mundo com você e de se ver no mundo com os outros, tecendo assim, o
estar junto, a (s) identidade (s).
Nesta primeira parte do trabalho escrito, situo meus pontos de partida para ancorar
o solo que não só sustentou esta investigação, como também contornou a tese que
aqui apresento. Iniciado em 2009, o meu caminho foi percorrido nas trilhas do
processo do Curso de Doutorado em Educação, da Universidade Federal de Mato
Grosso – UFMT, sob a orientação da Prof.ª Dr.ª Michèle Sato. Para tal, elaboramos
um projeto de pesquisa circunscrito no Programa de Pós-Graduação em Educação –
PPGE dessa Universidade, imbuído de percorrer, pelo campo qualitativo Educacional
Popular não escolarizado das Ciências Humanas, caminho de aprendizagem
científica.
1
Mapa-múndi é um mapa que representa toda a superfície da terra (Bueno, 2000, p 494). Neste título
a ideia é representar o todo da viagem científica empreendida. (BUENO, Silveira. Minidicionário da
Língua Portuguesa. São Paulo: FDT, 2000).
2
Acessos disponíveis: http://tratadodeeducacaoambiental.net/index.php?menu=otratado
http://tratadoeducacaoambiental.net/Jornada///Home_pt.html
http://tratadodeea.blogspot.com.br/
http://pt.wikipedia.org/wiki/Tratado_de_Educa%C3%A7%C3%A3o_Ambiental_para_Sociedades_Sust
ent%C3%A1veis_e_Responsabilidade_Global
http://www.youtube.com/watch?v=xe_LNLntVCE&feature=share&list=UUzZlc8bs2lavQh0o8Wjiecw
http://remtea.blogspot.com.br/
3
Acesso disponível: RBJA – Rede Brasileira de Justiça Ambiental, movimento brasileiro, site:
http://www.justicaambiental.org.br
27
4
Acesso disponível: No site do GPEA/UFMT (http://www.cpd1.ufmt.br/gpea/), poderá ser encontrado
os Projetos deste grupo pesquisador, tanto os encontram-se em andamento, como os já finalizados.
Assim como, poerão ser encontrados no blog spot do GPEA/UFMT:
(http://gpeaufmt.blogspot.com.br/p/banco-de-tese.html, e no http://inaugpea.blogspot.com.br/).
5
Acessos disponíveis: Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia – INCT
(http://www.pbct.inweb.org.br/pbct/). Instituto Nacional de Ciências e Tecnologia em Áreas Úmidas –
INAU (http://www.inau.org.br/homepage.php). Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
tecnológico – CNPq (http://www.cnpq.br/. Ministério de Ciências e Tecnologias – MCT, site:
http://www.mct.gov.br/), aliado à rede mundial Sub-Global Assessment - SGA de Avaliação dos
ecossistemas (http://www.ecosystemassessments.net/). SESC Pantanal
(http://www.sescpantanal.com.br/).
6
Citação literal do Projeto Inau/Gpea, Acesso disponível: http://www.cpd1.ufmt.br/gpea/.
7
Para melhor compreensão, ver Tese de SILVA (2012), acesso disponível:
http://gpeaufmt.blogspot.com.br/p/banco-de-tese.html.
28
A AEM8 revela que, nos últimos 50 anos os ecossistemas, sofreram perdas aceleradas
e irreversíveis, apesar de promover o viver humano9. Essas perdas se desvelam pelo
uso não sustentável dos ecossistemas via ser humano e ofertam sinais de
consequências negativas para o próprio ser humano, sendo que os primeiros a
sentirem esses efeitos devastadores são os grupos sociais menos favorecidos pelo
sistema capital, uma injustiça insustentável no sentido socioambiental.
8
Avaliação Ecossistêmica do Milênio Kofi Annan [SECRETÁRIO GENERAL DAS NAÇÕES UNIDAS] lançou
em junho de 2001 e finalizou em março de 2005 – AEM, que fornece informações científicas à
Convenção sobre Diversidade Biológica, Convenção sobre Combate à Desertificação, Convenção de
Ramsar sobre Zonas Úmidas e à Convenção sobre Espécies Migratórias, assim como a múltiplos
usuários no setor privado e na sociedade civil.
9
Relatório Síntese da Avaliação Ecossistêmica do Milênio, solicitado pelo Secretário Geral das Nações
Unidas, Kofi Annan em 2000, p. 17 e 18. Acesso disponível em:
www.unep.org/maweb/documents/document.446.aspx.pdf, acesso em: 17/07/12.
10
No site do GPEA/UFMT (acesso disponível em: http://www.cpd1.ufmt.br/gpea/), poderá ser
encontrado os Projetos deste grupo pesquisador, tanto os encontram-se em andamento, como os já
finalizados. Assim como no blog spot do GPEA/UFMT (acesso disponível:
http://gpeaufmt.blogspot.com.br/p/banco-de-tese.html e no http://inaugpea.blogspot.com.br/).
29
Com esta composição de Projetos e outros, o GPEA tem acreditado contribuir para a
visibilidade dos grupos sociais, favorecendo um poder de escuta e de fala a eles, no
desejo de se sentirem incluídos e fortes para protagonizarem na formulação de
políticas públicas para a autonomia de suas histórias14. Na construção deste mapear,
acreditou-se que um bom fio condutor para desencadear o nascer do protagonismo
fosse a Arte Educação Ambiental enquanto possibilidade de uma construção sensível,
crítica e criativa.
Foi nessa gênese que a hipótese a ser investigada neste processo de pesquisa se
desenhou pela crença de que os ecossistemas celebram vida ‘também’ nas
comunidades tradicionais quando as presenteiam com matérias que lhes possibilitam
11
Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Mato Grosso – FAPEMAT (Acesso disponível em:
http://www.fapemat.mt.gov.br/TNX/).
12
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq (Acesso disponível em:
http://www.cnpq.br/).
13
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES (Acesso disponível em:
http://www.capes.gov.br/).
14
Para melhor compreensão ver Tese de Silva (2011) – (Acesso disponível em:
http://gpeaufmt.blogspot.com.br/p/banco-de-tese.html).
30
15
Acesso disponível: www.maweb.org/
16
Acesso disponível: http://www.maweb.org/documents/document.356.aspx.pdf
31
Viver
cultural
Inter-
relação Natureza impacta o
ambiente
permanente
gera viver humano natural
[cultural]
É a tessitura ambiental que oferta para a humanidade o viver cotidiano, berço das
criações, portanto da vida cultural. Assim, todas as vidas, todas as pessoas,
indistintamente, são dependentes dos ecossistemas, ligadas a eles. Mas,
infelizmente, no mundo atual há uma contingência gigantesca, insuportável,
insustentável de desrespeito ambiental, Antrópico. Nesse sentido, vejamos os três
grandes problemas associados à forma como se vem tratando a gestão dos
ecossistemas, segundo Relatório Síntese da AEM17:
17
Relatório Síntese da Avaliação Ecossistêmica do Milênio, solicitado pelo Secretário Geral das Nações
Unidas, Kofi Annan em 2000, p. 17 e 18. Acesso disponível em:
www.unep.org/maweb/documents/document.446.aspx.pdf, acesso em: 17/07/12.
32
A AEM é um caminho inédito para apontar e avaliar de maneira local, formando uma
espécie de mapeamento avaliativo global dos serviços ecossistêmicos, e, para isso,
importa fomentar pesquisas nesse sentido. No documento avaliador os serviços
ecossistêmicos foram agrupados em quatro eixos. Para melhor entendimento, os
reinauguro abaixo (Quadro: 01): Serviços ecossistêmicos de Suporte, Regulação,
Provisão e Cultural.
18
O bem estar, o bem ser, o bem viver considerando toda a descompensação que o mal provoca ou
pode provocar.
19
Relatório Final do Ministério Público de São Paulo – GT Valoração de Danos Ambientais, 2012.
Acesso disponível: www.mp.sp.gov.br/.../Relatorio%20Final%20-%20GT%20Valoração ... Acesso
em: 19/06/2011.
33
Mauro Grün (1996), na obra “Ética e Educação Ambiental”, trata a ética centrada no
ser humano, no sentido da degradação ambiental. Nos estudos desse autor, esse
quadro de horror ambiental, é desencadeado a partir do Renascimento, o ser
humano é considerado o todo poderoso, e a natureza apenas uma subalterna que
existe para servi-lo. Nesse contexto, o ser humano não se sente mais parte da
natureza, mas alguém que se encontra fora dela, melhor e maior que ela, com
capacidade e vontade total de dominá-la (Imagem: 02). Sato (2009, p. vi) interpreta
esta questão:
Imagem 02: Desenho “Ser humano: todo poderoso”. Arte: Imara Quadros.
20
O sentido de loucas da casa que se buscou foi de ser menosprezado, desconsiderado, posto de lado
por serem diferente do estabelecido, do comum, do usual.
35
Imagem 03: Esquema cartográfico das ligações ecossistêmicas. Fonte inspiradora: Andrade (2009). Recriação:
Imara Quadros e Michèle Sato.
Natureza/Ecossistemas
Não humano
transcendência planetária
Funções
Ecossistêmicas
Dinâmica natural
Serviços Ecossistêmicos
fins humanos
[Suporte, Provisão, Regulação
e Cultural]
Uso humano
Para tecer as
ligações
ecossistêmicas, se
deve peguntar:
De onde vem? Prá
onde vai?
21
Acesso disponível: http://gpeaufmt.blogspot.com.br/p/banco-de-tese.html
36
de desenhos nas políticas públicas, bem como a inclusão das atividades artísticas
pantaneiras na pauta das discussões e dos programas políticos culturais.
22
No sentido dado pelos estudos do Educador Paulo Freire.
37
Imagem 04: Esquema das esferas dialogantes.Criação: Imara Quadros e Michèle Sato.
23
Existir, brotar, multiplicar.
38
Segundo Maffesoli (1988, p.57), “este fim de século mostra a saturação de algumas
práticas teóricas, tal fato nos deve incitar a buscar com audácia, uma atitude
alternativa mais apta a acercar-se da vida de todos os dias”. No atual contexto, o
global é desigual, pois distribui a cultura das relações de forma desproporcional.
home/main/ramsar/1_4000_0__.).
25
Instituto Nacional de Ciências e Tecnologia em Áreas Úmidas – INAU e Centro de Pesquisa do
Pantanal – CPP.
39
Imagem 05: Mapa pictórico “Lócus da investigação: solo científico e poético”. Fotos da canoa com o canoeiro e
borboleta Morfo, João Quadros Ramos. Foto da flor do Cambará, Fernandez (2010, p. 3). Arte: Imara Quadros.
É a esta “casa natal” que retornamos quando necessitamos de nos “sentir em casa”
para nos encontrar quantas vezes se fizer necessário, para nos reinventar como
afirma Bachelard ( 003, p. 75) “não habitamos mais a casa da intimidade absoluta,
então, ela é mais do que uma lembrança. É uma casa de sonhos, a nossa casa
onírica".
40
26
Por uma geografia nova(1978).
41
que “o mesmo espaço pode ser visto como o terreno das operações individuais e
coletivas, ou como realidade percebida” (2012, p.53 e 55)27.
Para uma melhor compreensão da ideia “sentir em casa” também se recorri às ideias
propagadas por Gaston Bachelard, em suas obras “A Poética do Espaço” (1993) e “A
Terra e os Devaneios do Repouso” ( 003), nessas obras a casa natal é considerada
um mundo próprio que se encontra tatuado em nós, ou seja, na nossa história de
vida, gênese dos nossos valores, dos nossos sentidos, dos nossos significados-
significadores.
Considerar o encontro entre ‘natureza e cultura’28 aqui se faz pela crença fiel do
brotar dialógico transformador, via ‘arte popular’. Trata-se de um território de
‘transformação-criação’ que revela saberes sustentáveis no sentido ecológico, porém,
na atualidade faz-se necessário subsidiar discussões e amadurecimentos sociais e
políticos na dimensão econômica de perspectiva justa e sustentável. Para que isso
27
A natureza do espaço(2012).
28
Considerar o encontro entre Natureza e Cultura é compreender o prolongamento entre estes dois
eixos, é compreender a relação complementar existente entre, ou seja, este encontro sempre esteve
estabelecido. Assim considerando, é preciso desvelar o prolongamento, que por razões outras foram
veladas dificultando a compreensão desta complementariedade.
42
É necessário compreender que não se muda tudo que se deve e/ou que se necessita
mudar ao mesmo tempo e no mesmo espaço de aprendizagens. Esse fenômeno
transformador se coloca sempre contínuo e múltiplo e por isso dialógico. Essa
dialogicidade acontece ao caminhar através de caminhos diversos, ao caminhar com
outrem, ao vivenciar variadas situações, ao realizar os múltiplos fazeres, ao saborear
as leituras entre outras situações vividas, inclusive ao andar consigo mesmo em uma
espécie de diálogo silencioso, reflexivo. O renomado professor brasileiro Paulo Freire
trata do diálogo como vida humana:
o construído, para que se possa escolher ‘o que’ se deseja manter e o ‘porquê’ desse
desejo, bem como, ‘o que’ se quer mudar e ‘por quê’.
Michel Maffesoli (1996, p. 84, 85 e 92), afirma que o sentimento de vida, a sensação
de viver “[...] obriga-nos a focalizar nosso olhar sobre os sentidos constitutivos da
vida humana”. Segue abordando este estudioso que “As refeições, as festas, as
procissões são, sabiamente, um modo de dizer o prazer de estar-junto. Na
perspectiva de uma teoria da complexidade, todos os elementos constitutivos, o
homem e a sociedade, se correspondem, interagem uns sobre os outros”. Maffesoli
ainda declara que “Participa-se junto de uma experiência comum, comunica-se, põe-
se em comum, etc. [...] a experiência não é vivida por um ego forte e solitário, ela
deve ser dita, contada, vista”.
O mesmo autor apresenta questões que tratam do “conjunto do corpo social” que,
segundo suas ideias transbordam lógica “coletiva” a qual nada mais é do que uma
“cultura do sentimento”, ou seja, o valor e o gosto partilhados desenhando ética
grupal. Maffesoli nomeia esse ‘sentido de união’, de ser “corpo coletivo, corpo social”
(estar junto), denomina que a “ética da estética: o fato de experimentar algo junto é
fator de socialização” (IBID, 1996, p. 37 e 38).
Na ideia maffesoliana, a estética pode ser tomada como forma de agregar, fortalecer
a sociabilidade. Talvez a trilha social deva mesmo seguir esse rumo, considerado
uma busca audaciosa de alternativas no desenho de outro quadro rumo à “ética da
estética”. Trata-se de um corpo social na partilha de valores e gosto, tomando lugar
no cenário social, ofertando audiência de suas posições diante da vida e assumindo a
caneta para projetar e realizar, a próprio punho, seus sonhos e desejos.
Somente conhecendo a forja dos fazeres cotidianos que posso redesenhar meus
sonhos em lutas, em posições sociais e políticas.
A Educação Ambiental proposta pelo GPEA se ancora não só numa posição aberta,
como instiga o dialogar entre os diferentes e a diferença. Assim contextualizado, este
trabalho investigatório rumou pelas trilhas do território pantaneiro feito à mão, lugar
de gente sonhadora e lutadora, que tem mão-alma-espírito laboriosos, um território
onde que vicejam serviços ecossistêmicos artísticos.
Este caminho pesquisador, ao ser percorrido por esta pesquisadora, abriu caminhos
pelos descaminharam das trilhas da Ciência Clássica e Moderna. Estes descaminhos
46
Um dos saberes bachelardianos se revela por uma Filosofia da Poesia, que trata da
Imaginação Poética, portanto, da Imagem Poética. A Imaginação Poética tem sua
origem no ser imaginante, nos impulsos criadores deste ser, na criação. Assim,
compreendo que a potência inicial da Imaginação Poética reside nos devaneios do
ser imaginante, fenômeno da alma imaginadora, território das criações-
transformações.
Vale ressaltar que a Imagem Poética tem sua origem na imaginação do ser
imaginante, e sua potência inicial reside na alma do ser devaneador. Essa imagem é
resultante da imaginação poética, da criação do ser sensível, uma vez que imaginar,
devanear e criar constituem esferas de valor humano. Imagens poéticas são
carregadas de valores da alma humana, logo, transbordante de significação também
humana. Esses valores da alma em imagem poética despertam o que se encontra
adormecido, assentado sem reflexão, sem crítica, em estado de dormência. Assim, a
imagem poética desperta tanto o espírito do ser imaginante para novos-outros voos,
como também provoca outras almas que acordarão seu espírito sensível-criador.
29
PASSOS, Luiz Augusto. Território e Espaço, e espaço simbólico. O espaço simbólico e a
transcendência. (13 de Março de 2013). Acesso disponível:
http://luizaugustopassos.com.br/territorio-e-espaco-e-espaco-simbolico/#.UT_x3bCOyts.facebook
(Acesso em: 13/03/2013 - 12H43).
48
Para discutir ‘Educação’, considerei as ideias dos educadores Paulo Freire e Carlos
Rodrigues Brandão; acerca de ‘Educação Ambiental’, tomei de empréstimo as ideias
difundidas por Michele Sato, com toques e retoques de enriquecimento por Martha
Tristão e Celso Sánchez; sobre ‘Arte Educação’, me apossei das ideias de Ana Mae
Barbosa. Esta empreita investigatória se solidifica pelo arcabouço teórico-
metodológico adotado, porém, também busquei algumas ajudas epistemológicas,
entre elas está Marilena Chauí, Edgar Morin e Michel Maffesoli, entre muitos outros
que muito contribuíram para as compreensões necessárias pelo caminho. Este
percurso também foi delicadamente enriquecido por suaves pinceladas
epistemológicas de Michel de Certeau, Merleau-Ponty, Claudinei Silva e Luiz Augusto
Passos. E, ao trilhar pelos campos epistemológicos e metodológicos, contei com o
auxílio dos estudos de Regina Silva e Michelle Jaber.
30
Creio que o desenrolar da tese, mas em especial este parágrafo, pode de antemão justificar o
porquê da escritura deste documento científico ter sido na primeira pessoa, forma não comum nas
ciências. Mas com o consentimento bachelardiano, satiano, merleau-pontyniano sigo este descaminho
na primeira pessoa.
49
Eu queria ser como a aranha que tira do seu ventre todos os fios
de sua obra. (BACHELARD, 2003, p. 7 e 8).
tecer e desenhar educação libertadora como propôs Paulo Feire, pois, esta é a
intenção que perpassa por toda a Tese aqui apresentada.
Não é possível propor libertação das amarras, se eu, a estudiosa não fosse liberta ou
pelo menos não experimentasse a libertação no âmbito científico, ou seja, não
sentisse na própria carne, a liberdade. Não é possível ser liberto e ou propor
liberdade se não se tiver a coragem para o enfrentamento, a ousadia para se
desenhar a coragem que dinamiza as ações transformadoras, é esta trama que
perpassa por toda esta Tese.
Nesta parte do meu trabalho escrito na tese, pretendi pontuar o meu ser existencial,
no sentido enraizador, pois sem ele, a aventura científica não seria uma aventura
feliz. Então, procurei revelar meu ser profissional, meu ser artístico e meu ser
científico, em estreita relação um com o outro. Percebi que quanto mais quero
escrever sobre o vivido nas trilhas científicas via fenomenologia, mais o viver
fenomenológico me escreve na tese.
31
No meu entendimento primeiro e básico relativo ao espírito, é que este se posiciona o lócus exato da
gênese, o nascedouro do pensamento dos indivíduos, de cada qual, uma espécie de esboçador das
compreensões e saberes. E a alma, digamos que possa ser considerado um corpo entro-interno, que
juntos corpo externo compõem um só corpo, a pessoa que sente, percebe, reflete e cria. É a alma
lançando o espírito criador, o espírito científico-criador!
52
Meu sentir aponta que o meu trabalho, o meu labor investigativo está para muito
além dos limites que a ciência propõe, está além da própria pesquisa, e até para
muito além do meu ser investigador. Na minha pesquisa, a ciência não tem dado
conta dos limites estritamente científicos, pois são pedagogias que se entrelaçam à
científica, à artística e à da vida, para que meu ser aprendente aprenda de si, do
outro e do mundo, ao caminhar pesquisador-aprendiz.
Ao compartilhar a viagem investigativa, compartilho o meu ser com tudo que lhe é
próprio neste exato momento, e tudo que só lhe pertence agora no segundo em que
digito este texto! Então, segue o eco da minha palavra sentida, sonhada, despertada,
pensada, re-significada, transformada... Minha palavra sonorizada, grafada,
poetizada, desenhada, mas sempre em mediação, totalmente provisória por um ser,
por estar, e continuar sempre a estar em eterna construção-desconstrução-
reconstrução...!
É a estética da arte que guia uma educação sensível pelas trilhas científicas, capaz
de identificar, na ambiência acadêmica, seu potencial de vida, conjugando o verbo
amar como uma das possibilidades de mudança dos padrões injustos, instaurando o
encantamento de quem reconhece as ideias freirianas de que estudar é um ato
revolucionário! Segundo Paulo Freire, na obra “Educação e Mudanças” (1979, p. 9):
53
Na partilha da experiência vivida que só o ser viveu, pode brotar autonomia, pois o
vivido pelo ser é a sua realidade, mesmo que instantânea. Um trilheiro que entrelaça
vida e ciência pode ser visto, estudado via Ciências Humanas no campo educacional
no território instituinte da aprendizagem do ser. A fenomenologia da imagem
bachelardiana é quem fornece a autorização para esta jornada de entrelaços, na
tessitura da aprendizagem do próprio ser buscante, e, também, dos seres tocados
pelo trabalho do buscador.
Os pontos de onde parto modelaram minha maneira de sentir, entender, ser e estar
no mundo partilhado e no meu mundo pessoal, particular e me ajudaram a entender
que constituo uma parte insignificante que oferta significância ao conjunto humano.
Creio na força da interdependência, de nós todos, bem como de todas as pessoas e
coisas interdependemos.
Tudo e todos se\me tocam e, ao mesmo tempo, toco a tudo e todos. Nessa inteireza,
fragmento-me para retornar a inteirar-me! Um exercício constante de fragmentar em
sinfonia, em uma verdadeira dança bordada para tentar não romper a parte do todo
e o todo da parte. Todo-partes-todo, perspectivas importantes para a vida humana,
também relevantes na educação-educador e na ciência-investigador, se configurou
em um grande desafio para o meu caminhar aprendente!
Mas, assumindo uma posição de entremeio, se pode se assentar nos limites entre a
dialética33 da insignificância-significância e entrelaçá-las e recheá-las de propósito
sensível na busca permanente de atenção criativa. Então, insignificante significa
na/para o deleite da imaginação criadora. Assim, não é só no terreno das
significações, das coisas com valor que se pode encontrar a matéria da criação, pois
na dinâmica, no movimento se encontram e ou se pode encontrar substâncias para
as constantes e necessárias criações.
No contexto da vida social onde o instituído se coloca mais óbvio a todas as pessoas,
já o instituinte pode não se revelar tão aparente assim, algo entre linhas como se
diz. A referência que se faz ao ‘insignificante’ é tudo o que se evidencia ao meu ser
32
Tratado geral das grandezas do ínfimo (2001); Retrato do artista quando coisa (2009) e Livro sobre
nada (1996).
33
Dialética aqui neste contexto, bem como, no contexto de toda a tese se considera por uma ação
dialógica, a ação de dialogar, desenhar melhor os conceitos diversos-divergentes, para melhor
contorna-los, berço das novas ideias-conceitos-entendimentos, no sentido bachelardiano de
alargamento dos quadros do conhecimento.
56
Um bom exemplo, entre muitos outros, para ilustrar essa compreensão, são os
desenhos, rabiscos que as pessoas e os alunos fazem nas folhas das agendas, nas
últimas folhas do caderno, nas carteiras da sala de aula entre outros. Esses espaços
não são formalizados para tais rabiscos-desenhos, entretanto, ao se prestarem a
receptáculos, se tornam expressões que devem ou podem ser consideradas no bojo
das significações da vida humana, tanto no sentido pessoal, como cultura escolar,
como científico.
Não me peçam, nem tentem pegar a receita: não adianta prá nada,
não serve prá mim, quem dirá para outra pessoa [...] Pois é
professores, não peçam mais a receita! Isto não existe, em termos de
nada: nem da vida, nem da educação. Nenhum de nós poderá falar
sobre algo que não acredita. Que cada um encontre seu caminho, o
reformule quantas vezes precisar e quiser, durante a sua trajetória
professoral. Educação acontece na vivência pessoal, na descoberta
em cada aula, junto com um determinado grupo de alunos.
sem valor algum. Esse tipo de vida nem deveria existir para ninguém, para nenhuma
vida, pois ninguém pode, ou pelo menos, não deveria falar, escrever, desenhar,
estudar-pesquisar, buscar e expressar sobre o que não crê com toda a sua força34,
berço do espírito humano!
34
É como escrever com o próprio sangue. Sangue é o espírito (NIETZSCHE, 2009). (NIETZSCHE,
Friedrich. Assim falava Zaratustra. Um livro para todos e para ninguém. 3° Ed. Petrópolis, RJ: 2009).
35
O mito Grego da caixa de Pandora faz alusão à origem dos males que permeiam o mundo, e muitas
interpretações podem ser realizadas, porém, a que desejo usar aqui, encontra-se relativa a uma caixa
que guarda coisas de valor, não classificando se é ‘bem-mal’, mas valor apenas
58
Ao reexaminar minha existência, percebo que minha vida sempre foi traçada e
tingida pela criatividade, com o fazer de outra forma, por caminhos outros, como
aponta Bachelard (1997, p. 10), “com toda a força primordial que respinga no
outro”. Procurei existir a meu modo, sem buscar caminhos mais fáceis, da
reprodução, da passividade, da mesmice e da ordem estabelecida. Sempre sonhante
com algo outro, sempre inquieta na minha quietude observadora e desejosa de
imaginar outras formas, outras maneiras, outras possibilidades, outros caminhos.
Tenho seguido por estas trilhas até o presente momento, na vida, na educação e
agora, na pesquisa, por isto, na ciência.
Lembro-me de que quando ainda criança, aluna de uma escola pública no Rio
Grande do Sul, “desejava muito mais do que a minha escola me proporcionava,
desejava conhecer além dos limites do seu muro, além do livro didático, além das
atividades de copiar textos do quadro-negro, além de pintar desenhos prontos e
marcar “X” nas provas que me avaliavam. Tinha a expectativa de desvelar mais do
que a escola propunha, tinha sede de vida, tinha fome de mundo, sonhava com algo
outro e tinha muita pressa e força para buscar!” (QUADROS, 2006, p. 7). A minha
força de busca pelo novo-renovado, hoje aos 50 anos de idade, reside e resiste em
cada brotar da teimosia, na permanência e insistência do amor e respeito à vida, no
encantamento que se traduz pelo brilho do meu olhar em cada nova possibilidade
anunciada pelos meus devaneios.
Esse desejo, esse sonhar com toda a força e pressa para chegar a algo diferente do
ofertado, foi entendido no passado, e ainda o é como mero desligamento e/ou
ingenuidade, segundo as pessoas com quem convivo no meio familiar e profissional.
Sempre fui considerada uma criança-adolescente-aluna “desligada” e “fraca”, o que
me fazia sentir alguém fora da lista dos comuns, ou seja, dos melhores, dos mais,
dos sempre vistos, dos certos. Contudo, sempre questionava, no meu silêncio fiel ao
meu ser, se seria eu ou a forma nada instigante como a vida dentro e fora da escola
me era proposta.
59
Existir nas fôrmas rígidas formantes sempre fora muito difícil para meu ser alargado,
deformante e reformante a cada descoberta-aprendizado. Não nasci e nem existo
para ser enformada como produto industrial. Produção-fazer em série? Não existe
essa possibilidade na minha felicidade existencial, porque creio na arte, creio na
artesania, creio no lavor! Estas são, portanto, meu Deus e minha Deusa! Este foi e é
o meu caminho, meu rumo em qualquer instância e tempo de vida!
Em meu trajeto profissional, não foi diferente. No meio educacional, meu espaço de
trabalho, de certa forma sempre me senti única, diferente mesmo (Imagem: 06).
Muito ouvi nas entrelinhas que minhas atitudes profissionais eram diferentes, e que
não passavam de rebeldias, de exibicionismo, de excentricidade e até mesmo de
ingenuidade. Mas prefiro nomeá-las de ousadias, de coragem em busca de desejos,
de amor, de esperança e de crença em outros caminhos, em outras possibilidades de
formação do ser e do meu ser, são pequenas ações revolucionárias nos grandes
campos instituintes, como bem recomendam as ideias maffesolianas.
Imagem 06: Retrato. Arte: Sérgio Venny [artista plástico e ex-aluno]. Interferência artística: Imara Quadros.
60
Na instância científica, tampouco foi diferente. Ainda quando era criança, no Ensino
Fundamental, participei de uma feira de ciências onde desenvolvi uma pesquisa que
buscava conhecer a absorção da temperatura das cores em diversos materiais,
anúncios de um desejo pululante e ávido pela ciranda entre ciência e arte. Muito
mais tarde, na passagem do século passado para este, desenvolvi uma pesquisa
circunscrita no Curso de Mestrado de uma instituição particular em que trabalhava,
onde conheci a mim mesma e, na época, percebi que só conseguia escrever, no
sentido do signo escrito, se primeiro desenhasse. Assim, aquela dissertação, insegura
e acanhadamente, revelou meus textos artísticos e escritos em complementariedade.
Mas como só fiz o exame de qualificação, não defendendo a dissertação de
mestrado, meu trabalho inaugurador nunca saiu da pasta onde se encontra
guardado até hoje.
Imagem 07: Cópia digital1 da “Capa, Sumário e Resumo”. Fonte: Teixeira e Porto (2004).
Imagem 08: Cópia digital 2das páginas que mostram os desenhos de uma pesquisa publicados 1. Fonte:
Teixeira e Porto (2004, p.20 e 21).
62
Imagem 09: Cópia digital 3das páginas que mostram os desenhos de uma pesquisa publicados 2. Fonte:
Teixeira e Porto (2004, p.22 e 23).
Não consigo entender a educação senão como de e para vida e, por isso, dinâmica.
Entendo a educação como o ar que respiro todos os dias, uma ambiência formativa-
aprendizagem múltipla, permanente e constante até a minha morte física. A
educação, como entendo, deve propor o encorajamento da dignidade, escolhas e
mudanças necessárias no sentido justo. Não é justo uma educação que, velada ou
escancarada, oprima, que seja indiferente, que oculte a possibilidade da esperança.
Hoje, na minha opinião, não cabe mais uma educação voltada para mera reprodução
e passividade, enformada e enformante (QUADROS, 2006; 2010; 2012).
Apenas desejo e por isso busco viver com toda a intensidade a minha fidelidade
criante. Por essa razão, talvez tenha encarado todos os desafios que a mim se
apresentam, inclusive, este que hora vivo, que é-foi e está sendo o de
abordar/declarar, via ciência, minha experiência vivida na pesquisa, meus desafios e
aprendizagens científicas, também constituintes de uma experiência de vida
(Imagem: 10).
Compreendo criação como um ato de amor e coragem! Por isso, meus instrumentos
da artesania na luta contra modelos/padrões estabelecidos sempre foram: folha de
papel sulfite, lápis grafite e de cor, entre outros materiais escolares que se
revestiram de materiais artísticos. Hoje, me detenho num esforço de incluir ao meu
‘arsenal’ artesanal a palavra vestida de rigor científico e de densidade acadêmica!
Mais um desafio e talvez o mais difícil!
Imagem 10: Desenho “Da Arte para a Ciência”. Foto da borboleta Morfo: João Quadros Ramos. Arte: Imara
Quadros.
Nasci e existo para criar minhas próprias fôrmas na forja da minha vida, que, talvez,
poderão não servir para mais ninguém. Os demais só poderão conhecer e, se
desejarem, se inspirar na maneira singular para criar seus próprios caminhos
aventurantes, assim como o ferreiro que, no seu trabalho, forja o ferro em formas
diversas sempre únicas, uma artesania!!!!
As almas que se sentirem tocadas pela minha tese que se encham de coragem para
a livre escolha por um viver artesão também na ciência, pois o pensamento
complexo, mergulhado na pós-modernidade, oferta escolha não se posicionando
fechada a uma única abordagem de se produzir conhecimento nos campos das
ciências humanas e sociais. Se a educação é dimensão cultural, então a escolha pela
artesania da\na formação dos seres humanos é uma boa escolha sem saudosismos,
sem nostalgias... Uma livre e feliz escolha!
Meu descaminho... Uma imagem líquida ecoa do passado... Nasce uma necessidade
de bordar minha ligação pessoal com o bojo desta investigação, e a realizo via
devaneio... Como o Pantanal de Mato Grosso é uma área úmida protegida -
RAMSAR36, então busquei uma ligação pessoal com este solo úmido, fazendo do
Pantanal e de mim um ser único através das águas em busca de proteção. Ela, a
água, foi o fio no sentido poético para que eu pudesse bordar a tessitura científica.
36
RAMSAR WETLAND CONVENTION, Acesso disponível: http://www.ramsar.org/cda/en/ramsar-
home/main/ramsar/1_4000_0__ .
65
A primeira imagem que se fez necessária para minha tessitura escrita foi a minha
imagem nominal nas águas (Imagem: 11). Uma imagem geográfica das águas que
une, serpenteando, caminhos imaginados. Acredito que os nossos caminhos, sejam
eles pessoais, profissionais e mesmo os científicos, se construam a partir dos lugares
de onde nos encontramos. É só a partir deles que damos conta de olhar o mundo, de
pensar, poetizar, sonhar e contar sobre tudo isto (QUADROS, 2006; 2010; 2012).
Imagem 11: Fotografia “Dunas na praia Imara”. Foto: João Leite de Quadros [Pai], Iára Pizzato Quadros [mãe] e
Imara Pizzato Quadros [eu], aproximadamente em 1967 - Álbum de família.
É por esta razão que divulgar fragmentos da força nominal, nome recebido ao
nascer, se constitui em um aspecto importante a ser considerado neste começo de
escrita-reflexão toda bordada pelas águas e pelas poeiras pantaneiras. Aqui me
66
Imagem 12: Fotografia “Imagem refletida” [Lagoa nas dunas da praia Imara]. Foto: João Quadros Ramos.
Imagem 13: Mapa pictórico “Ligações imaginárias”. Fotos da canoa e da borboleta Morfo: João Quadros
Ramos. Foto da flor do Cambará Fernndez (2010, p. 3). Arte: Imara Quadros.
68
No litoral norte do estado do Rio Grande do Sul, há uma praia chamada Imara
(Imagem: 14). Ali, se situa um ponto original do meu percurso pessoal relacionado à
água. Meu nome Imara, foi tomado desta praia no inicio do ano de 1962, pelos
meus pais ainda grávidos. Anos se passaram sem a preocupação com a descoberta
do significado deste nome, bastava saber que era nome de uma praia vizinha da
casa onde passávamos as férias de verão.
Imagem 14: Fotografia “Placa de indicação da Praia Imara” [Avenida Interpraias/RS]. Foto: Imara Quadros.
Quando eu era criança, Imara era uma praia praticamente sem casas, constituída
somente por dunas, morros de areia. Por vezes, por entre as dunas, revelavam-se
rasas lagoas de água doce, advindas das chuvas que encharcavam o solo arenoso
até transbordar a superfície e desvelarem lagoas (Imagens: 15 e 16). Aqueles
pequenos campos de água serviam, até onde consigo me lembrar, de habitat para
pequenas rãs, sapos, girinos, lagartixas, pequenos lagartos, conchas diversas levadas
pelas aves costeiras e uma vegetação rasteira. Entre suas dunas e lagoas, também
se apresentavam algumas poucas casas, além de uma velha e enferrujada caixa
d’água (Imagem: 17), quase sempre coberta com areia bem sequinha pela ação do
vento.
a ser uma grande cidade, e assim espero. Mas, vislumbro a possibilidade de que
chegue a ser travestido de latifúndios, onde a monocultura, o agronegócio serão o
regente, fazendo dormir para sempre o “natifúndio” que Manoel de Barros ( 00 , p.
15) poetizou.
Imagem 15, 16, 17 e 18: Fotografias “Fragmentos imagéticos da praia Imara/RS”. Fotos: Imara Quadros.
Foi assim que consegui dar um sentido primeiro, uma imagem escrita a uma imagem
que, em mim, sempre morouna memória, “I Mara” só pode ser o mesmo que “Y
Marã”, “Y [água] Marã [sem males]” - água sem males, água pura, água doce.
Não são respostas comprovadas pela história e nem pelos estudos científicos, talvez,
por ser este um pedaço provável da história dos povos primeiros das terras
brasileiras, os indígenas. E, como para muitos, a história do Brasil só se inicia com a
chegada dos europeus em solo brasileiro, essas páginas ainda não foram escritas.
Mas isto é outra história, outra pesquisa.
O nome que se dá a alguém quando do seu nascimento pode se revelar como algo
com força própria, pois, quando se sabe a origem do nome e se gosta dela, há de se
querer divulgar, propagar aos quatro ventos, só para ter o prazer de revelar a força
primordial que nos lança ao mundo em partilha.
71
Assim, consigo entender minha ligação singular com a água, nesta presença
imaginada – ausência física. Minha força nominal vem da língua indígena do sul do
Brasil, que desvela a força da água doce em ‘vizinhamento’ com a água salgada do
mar. Um rico tecido poético se constitui e se desvela para anunciar o ligante com a
proposição científica: Mar de Xarayés37 com Mar de Imara38 (Imagem: 13 - p. 52).
Imagem 19: Fotografia “Eu no Pantanal, e o Pantanal em mim”.Foto da Imara, Ruth Albernaz. Foto da flor do
Cambará, Fernndez (2010, p. 3). Foto da borboleta Morfo: João Quadros Ramos. Arte digital: Imara Quadros.
37
Mato Grosso.
38
Rio Grande do Sul.
72
Para Freire, educação é o próprio ser humano, o tempo todo, em todos os espaços.
Segundo esse Mestre nos revela “Educação tem caráter permanente! Não há seres
educados e não educados. Estamos todos nos educando” (FREIRE, 1979, p. 8).
Nessa perspectiva, considera-se educação a própria vida humana, o viver, pois ela se
concretiza todos os dias com ou sem professor e também com ou sem escola. A
educação se dá em cada dia, nos lugares e situações de vida cotidiana. Assim,
nenhum humano, nenhum setor escapa dela. A educação, no sentido ensino-
39
Entre chaves foi acréscimo meu.
73
Hoje a escola, e tudo o que ela envolve parece estar num processo
de deterioração, em ruínas em alguns aspectos. A população virou
massa consumidora do descartável. Produtora só do que é fácil e
rápido. Vivemos a cultura da [rapidez, eficiência] concorrência, da
competição que transforma a educação em vestibular [ENEM]. A
escola se põe carregada demais de alunos, completamente
empobrecida de tempo [profissionais sensíveis, críticos e criativos] e
recursos. O problema de hoje é a necessidade social de transmitir
conhecimento através da escola e, junto com esta, está a
necessidade que parece pouco acrescentar; principalmente em
74
Acredito, como Freire, que o ser humano denota ser e ter capacidade de perceber a
realidade vivida, e por isso esse grande mestre declarou que não há ignorância, nem
sabedoria absoluta. Ainda ensina Paulo Freire que é nas bases populares e com elas,
que se pode dizer algo de sério e autêntico para elas. Como sinaliza Brandão (2002,
p.165), “É a partir de uma compreensão do modo de vida e da lógica do pensar de
cada cultura, em cada sociedade, que é possível equacionar métodos proveitosos e
realizar um ensino-aprendizagem criativo”.
A escola da vida é uma voz que deve ser validada no campo escolar e não escolar,
pois é, seguramente, um acervo cultural riquíssimo local e universalmente colocado.
Para atingir essa proposição necessária, se faz imprescindível o entrelaço entre
educação da vida, que se encontra fora do âmbito escolar, e a educação escolar,
uma em complementariedade a outra. Esse outro universo da educação, o não
escolar, a escola da vida, é sempre criativo e, por isso subversivo, porque viceja o
40
Nesta citação de Brandão (2002), foi incluído dentro de chaves observações-acréscimos meus.
75
Segundo Paulo Freire, urge uma educação com o intuito de propor um dialogar
permanentemente com o outro e o mundo: “Uma educação que coloque em diálogo
constante com o outro. Que o predisponha a constante revisões. À análise crítica de
seus achados. A certa rebeldia, no sentido mais humano da expressão.” (FREIRE,
1989, p. 90). Para este grande mestre, diálogo é a ação de reunir pessoas, círculo da
cultura, de uma prática do dialogar. Propõe a pedagogia freiriana que seja um
dialogar entre pessoas em que a palavra seja sempre pulsante, viva porque são eles,
os participantes do diálogo, falando do viver. As ideias freirianas revelam que o
educador apenas deve conduzir a proposição, mostrar o caminho.
Este rumo proposto por Freire se deve dar via imagens que traduzam a cultura, o
tecido vivido pelo participante, para que possa decodificar e entrar no processo de
alfabetização-conversação com e através de diferentes linguagens. Esse caminho
freiriano pode ser ainda mais enriquecedor, se os próprios alfabetizandos, os
participantes da proposição, produzirem, artisticamente, as imagens que
desencadearão o processo alfabetizador, ou seja, suas leituras de mundo. Mas
também podem ser imagens vivas, imagens vividas aqui-agora, desde que sejam
sempre imagens que expressem algo deles próprios, imagens locais.
capacidade criativa da/na ação dialógica. A pedagogia comunicativa posta por Freire
é uma pedagogia corajosa, porque incorpora, como parte do processo educativo, a
fala-discussão com o aluno, que é uma pessoa comum. Nesse sentido, Forquin
(1993, p. 13 e 14) aponta que:
Se cultura for compreendida em âmbito bem genérico, pode-se dizer que é todo e
qualquer universo que dá forma, que caracteriza um determinado grupo social
humano. Via cultura se entende o caminho percorrido, se reinventa o presente e se
projeta o futuro de cada indivíduo, de cada grupo, de cada comunidade. Assim
considerado, se pode tecer cultura como riqueza, pois guarda a multiplicidade da
existência humana. Cada grupo cultural desenha, cria e recria seu viver, conforme
seu jeito de sentir, ver, pensar e posicionar-se no e com o mundo e, dessa maneira,
cada grupo interpreta o contexto de vida e a constrói, conforme seu entendimento e
necessidades. Cultura diz respeito a toda humanidade, mas, ao mesmo tempo, a
cada uma das sociedades. Assim, cada realidade cultural tem sua lógica interna
(BRANDÃO, 1985; 2002).
Vale ressaltar, porém, que a vida humana está para muito além das fronteiras do
biológico. O viver de cada indivíduo, de cada grupo social tem um sentido, e é nesse
percurso que reside o conteúdo de vida que se passa adiante, ofertando significância
às posições e ações dos indivíduos-grupo. Portanto, cultura é um sistema de
significâncias próprias, singulares e, ao mesmo tempo, sistema universal no âmbito
da humanidade (QUADROS, 2006). Nessa perspectiva, a cultura é considerada fruto
do convívio humano, resultante da ação, da experiência vivida e compartilhada,
tecida cotidianamente, recheada de significados que acabam situando quem dela
participa. A cultura é o portal que se abre ao mundo dos símbolos e alimenta o
diálogo e, através da linguagem humana, aprendemos a ser humanos, ou seja,
aprendemos como devemos pensar, falar, agir de acordo com o grupo, com a cultura
a que pertencemos (ARANHA E MARTINS, 1986).
Retornando ao legado freiriano, afirmo que a existência humana não pode ser muda,
pois tem que ser nutrida de palavras “vividas”. Existir humanamente, para Freire, é
pronunciar o mundo, é modificá-lo, pois o mundo pronunciado retorna
problematizado aos pronunciantes, exigindo um novo pronunciar. Ainda afirma que
“Dizer a palavra, é um direito de todos os homens. O diálogo é o caminho, pelo qual
os homens ganham significação enquanto homens” (FREIRE, 1983, p. 92).
É preciso construir significados para que a sociedade faça o controle social, de modo
a construir um projeto civilizatório de formação cidadã em relação ao mundo, a seus
78
No mesmo livro, encontrei outro artigo que trata do conhecimento popular, do qual
também gostei no passado e continuo gostando. Um texto intitulado “A sala de aula
como lugar de vida” do autor Adriano Taveira41 (1989, p. 51) provocou a reflexão:
Cabe então falar na urgente necessidade tardia da ida da cultura popular à escola,
ou à escola da vida, instituinte ir até à escola instituída, à velha e boa Educação e
Cultura. A escola instituída tem ainda muito a aprender com a escola da vida.
Embora esta não conferir a diplomas, com ela se aprende o labor artesanal que
enche o aprendente de alegria, prazer e amor, gozo da humanidade.
41
Pedagogo e Jornalista.
80
perceber que nosso conhecimento é limitado e que devemos buscar novas fontes do
saber. [...] Quem julga saber tudo, não cria condições para a troca, portanto, não
ocorrendo diálogos. Da mesma maneira, quem acha que não sabe nada, também
não estabelece comunicação.” ( 000, p. 3-4 e 9-10). Então, se pode considerar que
é necessário renascer a cada passo da jornada, mantendo uma saber de si mesmo
em complementariedade do outro, do mundo.
A EA indica uma trilha em que o meio natural está ligado ao cultural, lugar onde se
encontra a ciência popular, a lógica de determinada comunidade, de determinado
grupo social. Então, nela também se podem encontrar saberes que são próprios,
particulares à vivência de cada grupo social. O mundo natural-cultural, que envolve o
viver dos grupos sociais, desperta no sentido provocador de múltiplas e variadas
emoções e sentimentos que podem se revelar agradáveis ou não aos sentidos do
percebedor-provocado. Desenhar múltiplas e variadas possibilidades interpretativas
olhares, abordagens, entendimentos, ideias e caminhos é, bastante complexo, mas,
sobretudo, farto, sendo, portanto, provocador.
É sobre o seu solo de vida cotidiana que os grupos sociais desenham seu jeito de
gostar, de fazer, de julgar e de selecionar as coisas, inclusive as obras, os objetos
de/da arte, sempre próprios e singulares. E assim, vivendo a vida, eles
vãoaprendendo e ensinando a vida, no próprio viver comunitário, incluindo a estética
e arte. Então, é certo afirmar que todo ser humano expressa e comunica ideias e
sentimentos através de linguagens, entre as quais figuram a fala e a escrita. No
então, também importa considerar que as pessoas fazem uso de outras linguagens,
sabendo ou não disso, como da expressão e comunicação artística, uma linguagem
que revela sempre no sentido plural, através dos produtos do fazer sensível-criativo e
estético dos grupos e dos indivíduos sociais.
A arte está presente na vida humana desde os primórdios da sua existência. É via
arte que os diversos grupos humanos também podem expressar sua estética e seus
fazeres criativos. As sociedades, ao construírem o seu legado cultural e artístico,
tecem o da humanidade concomitante, bordando saberes artísticos locais e
universais. Ferraz e Fusari (1999, p. 16), no livro “Metodologia do Ensino de Arte”,
afirmam que “o mundo em que nascemos e vivemos traz uma história social,
82
42
Um carioca nascido em 1937, falecido em 1980, artista visual-plástico e performático. Acesso
disponível: http://lazer.hsw.uol.com.br/parangole.htm. Acesso em: 15/11/2012, ás 12h52min. Acesso
disponível:
http://www.digestivocultural.com/colunistas/coluna.asp?codigo=856&titulo=Parangole:_anti-
obra_de_Helio_Oiticica, acesso em: 15/11/2012, ás 12h54min e Acesso disponível em:
http://bethccruz.blogspot.com.br/2010/03/helio-oiticica-arte-e-parangoles.html, acesso em:
15/11/2012, ás 13h10min.
83
As ideias de Rosa Iavelberg43 (2003) sinalizam que fazer arte44 e pensar sobre arte
são ações fundamentais para a aprendizagem hoje. Enfatiza especificamente em
seus estudos que, uma das bases do fazer arte, é associar, de maneira criativa e
sensível, materiais e técnicas, melhor dizendo, maneiras de fazer(IAVELBERG,2003).
(Imagem: 20).
43
Estudiosa da arte educação.
44
Voltada para o desenvolvimento do percurso criador pessoal, da pessoa fora da escola e do aluno,
dentro da escola.
85
A arte, a educação e o ambiente podem ser tomados como uma boa proposição
curricular da vida (Imagem: 21). O entendimento de arte popular que construí para
percorrer esta trilha compreensiva foi o da artesania, como um labor da mão
sonhadora do ser que lavra as coisas para a vida e para o próprio viver, configurando
um aprender e ensinar na escola da vida. Nessa perspectiva, toda a prática da arte,
seja ela popular ou não, é compreendida como uma prática da presença, da
resistência e da esperança. A arte popular evidencia um saber entremeado com o
modo de vida do fazedor, a cultura com o ecossistema-natureza.
86
Imagem 21: Arte “Ciranda socioambiental: Arte Educação Ambiental”. Foto do planeta arte, Imara Quadros.
Foto da flor do Cambará, Fernndez (2010, p. 3). Foto da borboleta Morfo, João Quadros Ramos. Arte: Imara
Quadros.
Canção Mínima
No mistério do Sem-Fim
Equilibra-se um planeta.
As sociedades têm uma interação íntima com o seu meio natural, mesmo que não se
considere e ou não se perceba mais disso. Certamente, desde sempre, o que tem
moldado a diversidade cultural e os sistemas de valores humanos é o meio natural
onde o ser está inserido, mesmo no universo do industrializado, do comércio, do
consumo - coadjuvantes do ambiente urbano. Um bom exemplo disso podem ser os
tijolos e o cimento usados nas edificações de moradias, sejam casas ou prédios. Sob
essa ótica, os serviços ecossistêmicos são/estão intimamente ligados aos valores e
comportamentos humanos. De acordo com Andrade (2009), os ecossistemas e os
seus serviços prestam um importante papel à identidade cultural, a diversidade dos
ecossistemas desenha a multiplicidade das culturas e a diversidade cultural
diversifica o ecossistema, trazendo outras espécies, outras vidas.
Esse caminho que segue do local ao universal e vice versa considera que todos os
tons e sonoridades das diferentes formas de ser e existir humano se colocam como
um desafio a ser vencido neste mundo contemporâneo entendido como complexo.
Urge, então, o desenho de um caminho sensível no qual tanto a mente-racionalidade
quanto o coração-sensibilidade coexistam em uma única tessitura, território de
encantamentos e estranhamento (SATO e PASSOS, 2006). E essa urgência
cartográfica sensível e racional se abre através de uma educação ambiental proposta
por um grupo pesquisador que constrói conceitos com afeto, COM-FETOS,
vislumbrando políticas públicas. Nesse trilhar, a arte é posta como importante
contribuidora na abertura das brechas para que outras linguagens possam
compartilhar na mesma intensidade com a linguagem ainda predominante, a escrita.
88
As trilhas apontam que, para caminhar por uma EA, deve-se priorizar o meio onde se
vive, pois é nele que também está a ciência popular, a lógica de determinada
comunidade, de determinado grupo social, é onde se podem encontrar saberes que
são próprios, particulares à vivência de cada grupo social. Assim, clama-se por uma
urgente sensibilização ambiental, e um caminho muitíssimo interessante pararealizá-
la é por meio da educação não escolarizada, uma formação dialógica com base em
Paulo Freire, o qual propõe um dialogar permanente e constante, um solo bastante
rico para a educação ambiental se enraizar e provocar estas discussões e criações
45
Este estado permanente e constante de Educação Ambiental, que se sabe que é necessário e
urgente pensar e agir, não acredita na transversalidade proposta nos PCN, nem tampouco crê na
instauração de uma disciplina específica para Educação Ambiental, como alguns rumores existentes. O
que se considera é a possibilidade de um movimento divergente que aponte reinvenções educativas,
superando as propostas vigentes e anunciadas para a questão ambiental na educação (Educação
Ambiental), e a Arte Educação Ambiental proposta pelo GPEA, é uma destas tentativas.
89
necessárias. Como afirma Sato ( 003, p. 13): “As modernas atividades educacionais
clamam por mudanças de valores, atividades e responsabilidades com o ambiente”.
Imagem 22: Fotografia “Antes Arte do que tarde”. Frase, Bené Fonteles. Papel artesanal de banana, Ruth
Albernaz. Foto borboleta Morfo, João Quadros Ramos. Foto do trabalho artístico e Arte, Imara Quadros.
91
É hora de reabrir a casa... [e entrar nela]. E é possível que, ao fechá-la, [...] percamos a
oníricas: a leitura de bons livros, consultas na internet ou um bom descanso na própria cama
[um bom descanso na própria cama?]... conseguir enxergar o que a viagem científica conseguiu
O começo poderia ser outro, poderia ser vários, mas creio que, no meu caso, seja
mais interessante começar por aqui... Um apelo a novas maneiras de pensar a
sociedade e a relação com o ambiente...
Na civilização atual que se revela capitalista, tudo vira produto vendável, até cultura
e arte já apresentam a versão industrial e mercadológica, ou seja, todo e qualquer
produto obtém precificação, lógica da venda-preço-consumo-comércio/indústria-lucro
a qual por sua vez imprime uma lógica insustentável, portanto, crise socioambiental.
46
Sub-título inspirado em Paulo Freire (1983, p. 101).
93
Segundo Tristão (2005, p. 253), esse quadro acima também “impregna o corpo dos
sentidos da Educação Ambiental” e “despotencializa a dimensão social”, gerando
impotência individual e social, impedindo um “processo educativo com base cotidiana
significativa”. Essa estudiosa ( 005, p. 6 ) alerta que “só saber que estamos em
crise, que as políticas públicas não atendem as expectativas e que a mercantilização
domina o mundo não basta”. Revela ainda Tristão (IBIDEM, 005, p. 6 ) que “é
preciso superar”, buscar brechas para o reencantamento e reinvenção. Ela (p. 253)
ainda aponta que “é preciso resgatar o sabor do saber no bojo de mudar a vida”.
Talvez este seja não só o melhor, mas o caminho a ser seguido.
94
47
Imagem 23: Fotografia “Rio sujo” . Foto: Acervo Imara Quadros e Ruth Albernaz.
E aproveito para parafraseá-lo com o intuito reflexivo, "quem não sente uma atração
especial pelo rio limpo?" (parafraseado de BACHELARD, 1997, p. 143), (Imagem:
24).
47
Embora possa parecer que os objetos foram intencionalmente compostos para a foto, vale ressaltar
que não. Esta imagem foi encontrada exatamente assim em uma comunidade pantaneira em 2007.
95
E segue parafraseando o filósofo, provocando com esta outra imagem, agora escrita,
“quem não sente uma repugnância irracional-racional, inconsciente-consciente e
direta-indireta pelas imagens INJUSTAS?" (Parafraseando BACHELARD, 1997, p.
143).
Quando pela vida se veem pessoas com muito dinheiro e outras que precisam
estender as mãos pelas ruas da cidade pedindo moedas; quando pela vida se veem
pessoas com fartura e variedade de alimento, e a outra resta agradecer pelo prato
de comida doado; quando pela vida se veem pessoas que residem em mansões, e
outras que improvisam cubículos cobertos de papelão e ou de plástico, o que
devemos sentir e pensar?
Hoje, somos etiquetadores de preço, pois andamos precificando tudo como caminho
sustentável: os ecossistemas têm preço, os rios têm um preço, a terra tem preço e
assim por diante. Ou seja, vemos tudo pelo enfoque da mercadoria-venda-consumo-
lucro. Todavia, a natureza, enquanto ficamos a precificar, continua sua rotina na
produção e manutenção de vidas. Apesar disso, a natureza não esgotou ainda sua
capacidade geradora de vidas e tudo fornece para a vida humana, inclusive poesia e
arte48.
48
Ideia construída a partir da Entrevista de “Satish Kumar” (Professor no Schumacher College, Sul de
Inglaterra, e director da revista “Ressurgence”), concedida em setembro de 2011, que esteve na
Fundação Calouste Gulbenkian em Lisboa para falar do livro Small is Beautiful - de E. F. Shumacher.
Entrevista divulgada através de email na RedeLusofona (googlegroups) assinada por Maria Trindade
Marques Serralheiro (Direção Geral de Arquivos/Arquivo Nacional da Torre do Tombo/Gabinete de
Relações Externas e Cooperação/Serviço Educativo) Alameda da Universidade/Lisboa,
www.dgarq.gov.pt.
97
Michèle Sato, em seu livro Alice no país da sustentabilidade, (2011b, p. 11) alerta
quanto “a forma como lidamos com a natureza”. Segundo a autora:
O dinheiro ajuda a vida humana nos dias atuais, isso não dá mais para negar.
Todavia, o foco da vida, hoje, também não pode e não deve deixar de considerar as
diversas dimensões que tecem em ciranda a vida hoje no planeta Terra como um
todo. É preciso que mudemos nossa forma de considerar, olhar, escolher, valorar,
portanto, refletir para reinventar.
Este mundo injusto e insustentável que hoje se põe me incomoda, pois a “Crise
Ambiental - Manutenção da Vida” não é um problema e tampouco uma busca
49
Ideia construída a partir de Satish Kumar 2011, já apontado na citação anterior.
50
Ideia construída a partir de Satish Kumar 2011, já apontado nas duas citações anteriores.
98
Imagem 25: Esquema “Entrelaço híbrido”. Composição: Imara Quadros e Michèle Sato.
Este hibridismo se dá pela mistura entre três dimensões: Ambiente, Educação e Arte.
Entrelaçadas, Arte e Educação geram Arte Educação; e o mesmo para Ambiente e
Educação, que, juntas, geram Educação Ambiental. Agora, se toma o entrelaço
destas dimensões - Arte Educação e Educação Ambiental e as mistura mais uma vez
será gerada a Arte Educação Ambiental. Essa nova abordagem tem o intuito de
complementariedade destas duas dimensões educacionais, ou seja, a Arte Educação
99
Na tentativa de melhor desenhar o que estou considerando como sonho, sonhar, ter
esperança, projetar um futuro, trilhar pelas transformações e mudanças do hoje que
se impõe, recorro a Paulo Freire mais uma vez, ao texto “Educação: sonho possível”,
palestra proferida em um encontro educacional brasileiro no ano em que retornou do
exílio em Genebra ao Brasil. Nesse texto, o estudioso brasileiro (FREIRE, 1982, p. 99-
101) demarca os limites e deslimites dos “sonhos possíveis e impossíveis”. Segundo
sua compreensão, o “critério de possibilidade ou impossibilidade dos sonhos é
histórico-social e não individual”.
100
Esta pesquisa se pauta na crença de que tanto a Arte Educação como a Educação
Ambiental se colocam onde seus aspectos - sensibilidade, criticidade e criatividade
encontram espaço para vicejar, desformando os sonhos e transformando-os em
possibilidades de escolhas. Dessa forma, geram novos ou inovadores enfoques para
as diversas questões que urgem e afligem o aqui-agora dos diversos grupos sociais
minoritários, sob a ótica do capital. O fenômeno transformador só pode ser garantido
via superação dessas estruturas endurecidas, mantenedoras dessas bases desiguais
e injustas, mantenedoras e geradoras da exclusão social, das diferenças, dos
preconceitos, das passividades, da miséria e pobreza e pela perda total da conexão
com o ambiente e com a força dos saberes tradicionais e populares.
Nesse sentido, recorro mais uma vez ao que relatou Paulo Freire no encontro
educacional já mencionado acima. Na palestra proferida, Freire abordou sobre o
depoimento que ouviu de uma militante do Partido Africano da Independência da
Guiné e Cabo Verde – PAIGC, segundo o Mestre (FREIRE, 1982, p. 100-101) ela
contou que:
Para Freire (198 , p. 101), os profetas “são os que se molham de tal forma nas
águas da sua cultura e da sua história, da cultura e da história do seu povo, que
conhecem o seu aqui e o seu agora e, por isto, podem prever o amanhã que eles
mais do que advinham, realizam”. A militante que relatava a Paulo Freire sobre o
episódio do sonho ecoado pelo profeta lutador fecha o enredo contando que:
“alguém entre eles51, disse ao Amílcar Cabral: isto é um sonho. E Amílcar respondeu
ao militante: Exato, é um sonho e ai das revoluções que não sonham!”. Acrescento
aqui, parafraseando o que disse o revolucionário africano: Ai das transformações que
antes não foram sonhadas!
51
Militantes de Guiné–Bissau.
52
Acréscimo meu: poesia artística, ou seja, arte.
53
Acréscimo meu: pensar com os corações é o mesmo que sensibilidade e crítica.
102
poesia no sentido artístico, desde que tenham como direção o encontro com a
“Justiça Ambiental”, entendida como conectada ao social, e a “Sustentabilidade da
vida planetária” ancoradas na educação – Arte Educação Ambiental. Justifica-se
ainda a necessidade de se buscar caminhos que possam se revelar sensíveis, críticos
e criativos desde que tenham como direção as “INJustiças Sócio-ambientais” e
“INSustentabilidade da vida planetária”.
Por este desenho, a Justiça ambiental54se revela por ações mobilizadoras de todos
aqueles que se sintam afetados pelos danos, riscos e injustiças, provocando o
imobilismo a se reinventar sempre e continuamente em mobilização. Em contra
posição à Justiça ambiental, encontramos a Injustiça ambiental, produto da lógica
capitalista inauguradora do desrespeito socioambiental, pois afeta a saúde planetária
de uma forma geral, além de também afetar diretamente os grupos populares e a
identidade cultural destes.
54
De acordo com a Rede Brasileira de Justiça Ambiental - RBJA, o conceito de Justiça Ambiental liga-
se intimamente a maneira justa e equitativa na consideração de todos os grupos sociais seja no
âmbito que for. Acesso disponível: RBJA – Rede Brasileira de Justiça Ambiental, movimento brasileiro,
site: http://www.justicaambiental.org.br
103
Estudos do GPEA/UFMT apontam que, nas tantas definições oferecidas à EA, se tem
uma que indica direção aos “desejos de mudança social” e, para tal, se buscam
“táticas sociais preventivas, de cuidados ambientais”, na ideia de “empoderamento
político” e de “controle social” por meio das opções e escolhas dos próprios grupos
sociais.
Quanto à definição da EA, Sato e Passos ( 006, p. 18) afirmam que “uma definição
hermética constituir-se-ia numa circunscrição de sua abrangência, implodindo a
riqueza de sua contribuição”. Ainda apontam que a Educação Ambiental é levada
pelas “forças metafóricas”, e “busca a esperança que recusa aceitar os limites à
transcendência”.
foram criados por homens e mulheres e deles virão às soluções. Estas serão obras de
cidadãos e cidadãs”. Paulo Freire (1989) propõe o diálogo como ponto crucial porque
revela a palavra como uma força de vida, justificando as dores, as alegrias e os
desejos das pessoas (o saber local). Segundo Ana Maria Araújo Freire (2003, p. 11-
1 ), “as teorias de Paulo Freire têm muito a dizer e a propor para a ação dos que se
preocupam com a necessidade de educação ambiental, na perspectiva de
totalidade”.
Como lembram Sato e Passos ( 006, p.19): “Há que se construir uma democracia
direta cuja sustentabilidade promova uma educação ambiental ampla e consequente.
Há que sonhar e transgredir. Nada no tempo é eterno, as estruturas políticas
existentes, passarão. E nós? Passarinho! Como pronuncia o poeta Mário Quintana no
Poeminho do Contra ( 006, p. 107): “Todos estes que aí estão/Atravancando o meu
caminho,/ Eles passarão… /Eu passarinho”!
Então, como passarinhos, voemos alto, coloquemos os pés bem longe do chão, para
enxergarmos bem além de nosso cotidiano, Assim, teremos condições de propor
formas de vida mais justas e sustentáveis a todos os seres do planeta terra, com
mesmo tamanho e força, sem diferenças, seja na vida cotidiana, no âmbito
educacional escolar ou não, seja na ciência. Só assim as estruturas injustas, hoje
determinantes, passarão de fato! Enquanto nós permaneceremos sempre
passarinhos da esperança de um mundo melhor que este, a ciência não só trará
esperança ao mundo da saúde física dos corpos, mas anunciará esperança de uma
vida, de um mundo bem melhor, muito mais saudável.
pessoas que fazem objetos diversos para o bem viver, bem ser e estar, resultando
em felicidade, qualidade de vida sob a ótica cultural dos criadores que revelam
saberes sustentáveis no sentido ecológico.
Concomitante, acredito que falta desvelar uma dimensão econômica que se revele
mais justa, com base na/pela/para vida de tudo e de todos e todas, incluindo no bojo
das discussões e políticas públicas esse grupo social, a dos artistas populares. Uma
economia que se posicione em contraponto, mas em diálogo com a economia
‘instaurada pelo sistema capital’, em busca de compor uma sustentabilidade com
vistas à qualidade de vida, um viver mais digno e justo no sentido humano, mas
também não humano. Nesse trânsito, conhecer as ligações ecossistêmicas para
fundar nova outra dimensão econômica se faz necessário. No caminho proposto fica
impossível não trazer o solo da pós-modernidade, para esta pesquisa se assentar e
vicejar. Essa perspectiva parte do que afirmou Maffesoli (1996, p. 69): “o processo
de racionalização evacua tudo o que é suspeito da cidadela do cérebro”.
55
Entendendo por dialogicidade, ação do dialogar.
56
O apoio no entendimento do conceito de dialogicidade foram as obras: Pedagogia do Oprimido
(1983-2003) e Educação como Prática da Liberdade (1979-2006).
108
Para incorporar essa prática libertária freiriana, não se pode permanecer acomodado
na alienação, na passividade. Considera o estudioso que “é preciso pensar-se a si
mesmo e ao mundo, simultaneamente, sem dicotomizar reflexão-ação” (FREIRE,
2003, p.72). A práxis, o viver é travestido de palavra que deve ser composta na
trama da ação-reflexão, caso contrário, não passará de uma palavra vazia. E uma
palavra, um diálogo esvaziado de significações e sentidos, demonstra a ausência de
espírito que sinta com toda a força, que viva com toda intensidade. Então, o diálogo
deve ser sempre um ato de coragem, além de um sério compromisso. A esperança
não é simplesmente cruzar os braços e contar que um milagre aconteça, mas um
movimento de um espírito corajoso e decidido que empunha a certeza da esperança
enquanto luta (FREIRE, 2003a).
Dialética revela dois polos distintos, mas que, diante da complexidade, podem se
apresentar como dimensões complementares, sem que um tenha que ser fixado e o
outro desconsiderado, no sentido de este ou aquele. Assim, a dialética pode ser
tracejada como ação dialógica, uma ação da prática do dialogar na perspectiva de
desenhar melhor os conceitos, as compreensões para o alargamento dos quadros do
conhecimento, como firma Bachelard (1996a, p. 120). Sato e Passos (2006, p. 26)
consideram que “O não-eu da negação, o momento inicial da dialética [...]. Conhecer
é pesquisar, e para pesquisar é necessário instaurar uma certa inquietação, um
indagar constante (SATO e SANTOS, 2003). Na conjuntura complexa, a
complementariedade entre dimensões já inaugura um caminho desenhador de
novos-outros valores, posturas, abordagens.
Ao abordar a questão de razão aberta, fica inevitável não trazer no contexto o que
Morin chama de “razão complexa”. Segundo esse estudioso:
110
Tudo isto está imerso num ambiente afetuoso, emocional que torna
bem difícil a análise ou a ação simplesmente racional. Como uma
colcha de retalhos, a pós-modernidade é feita de um conjunto de
elementos totalmente diversos que estabelecem entre si interações
constantes feitas de agressividade ou de amabilidade, de amor ou de
ódio, mas que não deixam de constituir uma solidariedade específica
que é preciso levar em conta (IBIDEM, p.15 e 16).
A poesia está guardada nas palavras [...]. Meu fado é não saber
quase tudo. Sobre o nada tenho profundidades. Poderoso para
mim é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e das
nossas). Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.
Fiquei emocionado e chorei. Sou fraco para elogios.
(MANOEL DE BARROS, 2001, p.19).
Meu ponto de partida da escritura desta tese se dá pelo exercício de comunicar meu
aprendizado científico, minha pesquisa de doutorado. Para tanto, considero a tese
como uma alquimia, como tentativas de traçar uma arquitetura científica,
entrelaçando e costurando as leituras, as reflexões e as ideias, que nada mais são do
que fruto do meu caminhar de aprendiz de pesquisadora. Sigo carregando na minha
mochila epistemológica as ideias de Eco (2004) e Mills (2009).
deste encontro desafiador! Desvelar meu trajeto, desenhar minha tese é revelar,
concomitante, meus sentidos como ser aprendente da ciência rumo à maturidade
sensível-criativa-científica. Os caminhos percorridos por mim apontam trilhas talvez
primárias, mas necessárias ao meu caminhar particular, por isto singular.
Segundo Eco (2004, p. 14), “escrever uma tese é um exercício de comunicação que
presume a existência de um leitor”. Nas trilhas desse estudioso, compreendi o
processo envolvente de uma tese, mesmo antes de se configurar em texto escrito.
Toda a tese se constitui mesmo antes do formato solicitado pelas normas científicas
das ciências humanas. No caminho-descaminho da composição de uma tese, se
aprende que é próprio das ciências reinventar caminhos, ciência como uma atividade
de transformação (ECO, 2004).
É assim que estou considerando também esta etapa da tese, momento de escrevê-la
como um momento criador. É entendendo desta maneira que me encorajo para
enfrentar este meu grande desafio, a composição escrita não só academicamente.
Mas antes é preciso revelar minha particularidade, pois só assim meu desafio e
minha coragem criativa inauguram este enfrentamento.
Imagem 25 a: Alma e Espírito humano, desenhadores de Imagens Poéticas. Inspiração em BACHELARD (1993).
Uma audácia talvez, mas ninguém pode negar que se trata de uma emergência-
urgência há muito detectado no âmbito científico, que, para tal, necessita de um
estudo, de uma aprendizagem científica para que alcance os contornos de um novo-
outro espírito científico no território da pós-modernidade.
A primeira série de trabalhos artísticos (Imagem: 26) teve sua criação em pesquisa
educacional numa escola pública da capital mato-grossense, Cuiabá, no decorrer dos
115
Imagem 26: Cópia digital “Série artística tecida em pesquisa numa escola estadual”. Teixeira e Porto (2004).
Arte: Imara Quadros.
Imagem 27: Cópia digitalizada “Série artística tecida em pesquisa numa Comunidade Quilombola”. Arte: Imara
Quadros.
58
Acesso disponível: http://gpeaufmt.blogspot.com.br/p/projetos-finalizados.html
117
Imagem 27a:Flores, mãos fazendeiras e altar em enfeitado em devoção. Fotos: Imara Quadros.
O nascimento da última série mostrada aqui, logo mais abaixo, (Imagem: 27b), não
foi diferente das demais séries. É fruto de uma pesquisa desenvolvida no arquipélago
de Cabo Verde, continente africano em meados de 2010-2012, como parte de um
118
59
Acesso disponível: http://gpeaufmt.blogspot.com.br/p/projetos-finalizados.html
60
Esta rede se caracteriza pelo reconhecimento das diferentes culturas que expressam os itinerários de
sonhos na Educação Ambiental. Foi como fruto das articulações da REDELUSO que surgiu a
necessidade do um projeto, que discutisse as relações de gênero dos oito países falantes da lusofonia,
mais a Galícia. Assim, foi criada a Rede Internacional de Gênero e Meio Ambiente liderada pelo Brasil
envolvendo oito países lusófonos e Galícia. Com o propósito de fortalecer e articular pessoas nesta
rede, alguns pesquisadores do GPEA/UFMT, grupo coordenador da Rede de Gênero e Meio Ambiente,
realizou visita exploratória a Ilha de Santiago em Cabo Verde no continente africano.
119
Imagem 27b: Cópia digitalizada “Série artística tecida em pesquisa no continente africano – Cabo Verde”. Arte:
Imara Quadros.
61
Michèle Sato, Regina Silva, Michelle Jaber, Lúcia Shiguemy e eu, Imara Quadros.
62
Para ler mais sobre: Artigo escrito para Comunicação Oral e Resumo nos Anais do X Encontro de
Pesquisa em Educação da ANPED Centro Oeste, Uberlândia-MG: FACED, 2010. E também um
pequeno artigo publicado na Revista Afromundo (Nov-Dez – 2011, p. 38 e 39). Acesso disponível:
www.afromundo.com.br – revistaafromundo@gmail.com
120
Imagem 28: Esquema “Ciranda da imaginação criadora”. Inspiração bachelardiana e Composição: Imara
Quadros.
compreender esta ideia propagada por Bachelard (1998, p.2): "a imagem poética
não é eco de um passado".
Meus desenhos nascentes das e nas pesquisas, são filhos só da lua, ou seja,
epistemologia noturna bachelardiana? Ou nascem nas vinte quatro horas, da mistura
do pensamento diurno e noturno proposto por Gaston Bachelard? Seguindo pelas
trilhas do investigativo-criador não foi, e nem me é possível, separar a artista da
pesquisadora. Ambas clamam pelo imaginativo e criativo, pela arte e ciência juntas,
justificando a tentativa desta complementariedade neste trajeto científico formativo.
Foi e está sendo assim minha relação com a minha pesquisa, estou 24 horas
envolvida, presente. Mesmo não estando no campo de pesquisa ou em estudo
conceitual, estou sempre, em qualquer lugar e tempo, em estado presente na
pesquisa proposta.
[...] não copie aquilo que os outros fazem, porque não vai adiantar.
Isto não quer dizer que não podemos aprender por meio dos
trabalhos dos outros. Podemos sim, e muito. Ademais, todo o
artista é inspirado pelas obras de outros e encontrará semelhanças
nos trabalhos dos seus contemporâneos (HALLAWELL, p. 8,
1996).
Esse recomeço também poderia ser outro, ser vários e até nenhum, mas também
acreditei ser, no meu caso, interessante recomeçar com o assunto dos estereótipos.
Há uma liga do banal da vida com questões sérias da epistemologia, que, no seu
bojo, são aplicáveis aos campos científicos também.
E é ledo engano acreditar que os estereótipos estão nos limites da borda da folha
sulfite e ou das paredes da sala da aula de artes. Eles ocupam a escola toda em
nome da “linda” decoração, “agradabilidade visual” e, também figuram nas demais
124
Ana Mae Barbosa (2008, p. 24) revela uma reflexão mais ampliada sobre os
estereótipos, preconceitos, reprodução passiva, quando nos alerta para este viés da
abordagem esvaziado de sensibilidade, crítica e criatividade. Interpreta a estudiosa
da Arte Educação: “Se é para ter algum resultado, a não ser um conformismo cego e
reprodução passiva, deve-se encarar o domínio da indústria na vida moderna, com
tudo que isto importa. Como a escola deve selecionar e perpetuar o significativo e
valioso para a vida humana, devendo rejeitar e expulsar o que é degradante e
escravizante”. Buoro (1998, p. 35-36) declarou que:
63
Este sentido desenhado para trabalho artístico está impregnado nesse texto-tese, tanto nas páginas
anteriores a esta, como as posteriores.
125
mas uma produção que qualquer ser humano seja capaz de fazer e de ler como
trabalho-expressão-linguagem. Considera Aranha (2009, p. 67):
Às vezes a paisagem me conta, às vezes é um livro que me conta, às vezes é alguém, às vezes é um
filme, uma música, um poema, uma pintura... Aí me apaixono! No passado cheguei a me apaixonar
pelas paisagens que eram paixões dos outros, não a minha paisagem da paixão. Hoje, prefiro olhar
ao vivo, eu olhar e me apaixonar por alguma razão. Não devemos só falar a língua dos outros... nem
só utilizar o olhar dos outros, porque assim existimos só através do outro, e é preciso tentar existir
por si mesmo na partilha, na troca.
Me alimento do olhar do outro, de ver o outro. Estou no olho do outro, eu ouço o outro, mas
necessito ver o outro, estar enxergando o outro.
Buoro (1998, p. 37) questiona que é preciso problematizar: “Como incorporar, com
mais sentido o trabalho de arte na formação?”. E na página 38, nos oferta um
caminho possível, compreendendo que: “O primeiro passo nessa direção é favorecer
a autoconfiança, a capacidade de enfrentar desafios, o autoconhecimento e a
IMAGINAÇÃO CRIADORA66a fim de resgatar a criança inventiva67”.
64
Livro Filosofando, Unidade VI, Capítulo 36 “Estética”. (ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS,
Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução a Filosofia. São Paulo: Moderna, 1986).
65
Inclusão minha.
66
Destaque meu.
67
Recuperar a capacidade da inventividade que todos os humanos dispõem.
127
O ato de ver não se limita ao olhar para fora [exterior], não se limita ao olhar só o visível, mas
também o invisível. Que de certa forma, é o que chamamos de imaginação. [...] Nossa imaginação
complementa as palavras. Ler entre linhas, um espaço para se projetar nas imagens, se projetar os
sonhos. Hoje, tudo está pronto, dado. O clichê [estereótipo] não deixa espaços para o
preenchimento [nossa presença no mundo], tudo tá pronto e acabado, é só consumir. [contrário do
dialogar]
Considero obstáculo como algo que impede alguma coisa e ou alguém e que,
epistemológico, está relacionado à ciência, ao conhecimento. Então, numa primeira
abordagem, pode-se afirmar que obstáculo epistemológico é algo que impede a
construção dos saberes, tanto na vida, na escola, como no solo científico. Obstáculo
epistemológico, nessa perspectiva, pode ser um modelo, um estereótipo, um
conhecimento acomodado na certeza, um preconceito entre outros. Segundo
Bachelard (1996, p 21), “A noção de obstáculo epistemológico pode ser estudada no
desenvolvimento histórico do pensamento científico e na prática da educação”.
68
Até que se ganhe desejo e intenções para a mudança do exercício para a ação propriamente dita.
128
69
Refeito, rearranjado, transformado.
70
Assumir, considerar.
129
Isso revela que a arte, na formação humana, ainda é tratada como uma disciplina
‘menor’, no sentido de um preconceito, devido a resquícios de um pensamento
clássico! A arte é uma área de conhecimento tão importante quanto qualquer outra,
como a ciência, as quais, juntas, poderão fazer toda a diferença!
71
Destaque meu.
72
Um imaginário manipulador, imagens desprovidas de qualquer potencial criador.
73
Mesmo que hoje ainda tardio.
130
Acho que as coisas minhas vem, aparecem de dentro de mim. É a imaginação que transvê,
transfigura o mundo, que faz o outro mundo. Transfiguração é a coisa mais importante para um
artista, para um poeta. [deveria ser para um pesquisador também!].
(1979, p. 9), “As informações e dados obtidos pela ciência que vêm a público, o não
cientista quando tem acesso ao material científico, não consegue estabelecer o elo
entre o que foi pesquisado e o seu cotidiano, por lhe faltar o saber da linguagem
científica”. Assim, a forma comunicativa científica pode ser enriquecida de outras
linguagens, com o intuito compreensivo de que seja este um caminho para o
empoderamento das informações para o alcance da libertação massificadora e
passiva.
Talvez esse tal novo paradigma da ciência comporte um entrelaço que dê conta de
unir Arte e Ciência, considerando a hipótese de que a imaginação criadora produz
arte, e produz ciência. E assim, quem sabe, possamos chegar ao porto da
possibilidade de um conhecimento que leve em conta a totalidade do ser. O
caminho, para isso e talvez já se saiba, é o de perceber a função da arte em muitas
trilhas na vida, no educacional, no científico... Lá vamos nós nesta aventura
audaciosa, e talvez, revolucionária demais, mas, em nome do porvir, tentar tornar
possível um entrelaçar de ciência e arte em busca de uma estética científica, para
começar!
Imagem 30: Pintura em vidro, “Entre o sol e a lua”. Fotografia e Arte: Imara Quadros.
Palavras não são tão somente sons, símbolos escritos ou desenhados. A palavra é
poder que se tem para comunicar e expressar, traduzir o sentir, o pensar e o
desejado. A palavra é uma poderosa ferramenta que se possui e, por meio dela,
133
pode ser realizada a guerra ou selada a paz. Devemos ficar atentos para o
conhecimento dessa dualidade que existe na força da palavra, pois, dependendo de
como é usada, pode nos libertar ou nos acorrentar. Todavia, é bastante interessante
que se diga sempre aquilo que se acredita com toda a intensidade, no sentido de
procurar o uso da força significante da palavra.
Esta pesquisa se fez por escutas sensíveis, uma escuta visual, na expectativa de
melhor captar o foco fenomenológico desta investigação. Assim, a escuta também se
fez em filmes. O cineasta Win Wenders, no filme Janelas da Alma, revela que a
maioria de nós é capaz de ver com os ouvidos de ouvir, ver com o cérebro, com o
estômago e com a alma. Vemos em parte com os olhos, mas não exclusivamente.
Segundo o cineasta, perdemos76 a capacidade do olhar interior, porque vivemos
numa espécie de cegueira generalizada77. Há tantos clichês que estabelecem
comunicação rápida, que fica muito fácil e cômodo reproduzi-los.
74
Um bailado que supõe crítica, criação e estética, e não um bailado qualquer.
75
Neste caso um pesquisador-pesquisadora.
76
Ou estamos perdendo.
77
Uma espécie de bombardeio midiático.
134
78
Belezas com muitos esses, no plural mesmo. É como se deve considerar quando se sai dos padrões
modernos que estabelecem modelos e matrizes, inclusive um padrão de beleza.
135
que meu olhar capturou e que minha percepção primeira contornou, e ainda, que
minha reflexão coloriu! Um trajeto não com intenções de produção de arte comercial,
vendável das do tipo que se compra-vende em galerias para ‘decorar’ ambientes
sofisticados.
Reside aqui uma tentativa, digamos, ousada e porque não dizer, de certa forma,
revolucionária de se buscar uma tessitura incomum aos trabalhos científicos, de uma
Ciência colorida pela Arte, na qual o tear é a Educação Ambiental, porque propõe o
136
diálogo entre saberes, possibilitando, inclusive, o dialogar entre Arte e Ciência, via a
fenomenologia da Imagem de Gaston Bachelard.
Nesta trilha de investigação que almeja uma trama entre ciência e Arte, procuro
tecer um potencial científico-artístico, considerando ambas como áreas de
conhecimento humano compartilhadoras de um só território, onde o mundo científico
toca a Arte e o mundo artístico toca a Ciência. Território da imaginação criadora,
aspecto que importa às duas áreas, importa também ao viver cotidiano e
sobremaneira para a vida atual, que urge quebrar paradigmas para o surgimento de
novas maneiras de se relacionar com o mundo humano e não humano. Revitalizar o
espírito criativo na ciência, na não ciência e na vida urge para as transcendências
necessárias, injustiças socioambientais e a insustentabilidade planetária.
Nesse sentido, Enrique Leff ( 003, p. 14) aponta que “a crise ambiental é o limiteda
racionalidadebaseada em umacrençainsustentável: a compreensão e construção
domundo, lideradospela idéia deuniversalidade,totalidade eobjetividadeconhecimento
137
79
Na resenha da obra Epistemologia ambiental (2001), de Enrique Leff, publicada na Revista Ambiente
e Sociedade. N° 8, Campinas – Jan./June 2001. Acesso disponível: http://dx.doi.org/10.1590/S1414-
753X2001000800009
138
Se levanto os olhos do livro para olhar uma vela, em vez de estudar, sonho. Então se o sonhador
inflamado fala com a chama, fala consigo mesmo, ei- lo, poeta. O menor objeto para o filosofo que
sonha, pode ordenar seus mais secretos [...] mais solitários pensamentos. Não posso sentar perto
de um riacho sem cair num devaneio profundo [...] É preciso prestar a atenção às alegrias dos
primeiros desenhos [...]. O poeta da mão que sonha, lápis nos dedos sobre a página em branco. O
papel é despertado do seu pesadelo branco. O devaneio poético já está diante desse grande
universo que é a página em branco. Então, as imagens se compõe e se ordenam. O sonhador
escuta já os sons da palavra escrita. Sonoridades escritas [...] Dando ao sonho o tempo de
encontrar o seu signo, de forma lentamente o seu significado
que dormem nos livros impressos, digitais e no livro da vida, do mundo. “A poesia é
um dos destinos da palavra. A imagem poética, em sua novidade abre um porvir da
linguagem”(BACHELARD, 2006, p. 3). Segundo este estudioso (2006, p. 6):
Se o sonhador tiver o caminho, com o seu devaneio fará uma tese, uma vida. “E
essa obra será grandiosa, porque o mundo sonhado é grandioso. Há horas na vida
de um poeta em que o devaneio assimila o próprio real. O mundo real é absorvido
pelo mundo imaginário” (BACHELARD, 2006, p. 13). “As ideias se aprimoram, se
multiplicam no comércio dos espíritos. As ideias, em seu esplendor, realizam uma
comunhão muito simples das almas. Dois vocabulários deveriam ser organizados
para estudar, um o saber, o outro a poesia. Mas esses vocabulários não se
correspondem” (BACHELARD, 2006, p. 15).
80
Na ideia de rabiscos iniciais de uma tessitura mais ampla e complexa.
81
Um dos significados para Lavrado apontado pelo dicionário Aurélio é ornado de lavores. E em lavrar,
se encontra Desenhar em bordados. O lavrado das redes cuiabanas, então é o mesmo que dizer
ornamento, bordado. É um trabalho artesanal composto em tear próprio para tal. (FERREIRA, João
Carlos Vicente. Mato Grosso e seus municípios. Cuiabá: Secretaria de Estado da Educação, 2001 e
FLORENCE, Hércules. Viagem Fluvial do Tietê ao Amazonas: 1825 a 1829. São Paulo: Cultrix - Editora
da Universidade de São Paulo, 1997).
143
Para melhor compreender o pensamento desse filósofo, é preciso estar despido e/ou
ter o desejo de despir-se do já estabelecido, das certezas-verdades cristalizadas e da
objetividade como dogmas. O fato é que, por vezes, nos fechamos sem sentir em
nossos trajetos de vida cotidiana e científicos. Também é fato que, quando se
percorre o caminho artístico, assim como o científico, sempre se enriquece. Porém,
quando se trilha pelo artístico-científico complementarmente, é especialmente
enriquecedor.
A vida, a existência humana, não é feita da monocromia, nem afinada num único
som, nem tampouco é expressa num monólogo. As pessoas, percebedoras,
pensadoras, falantes, comunicadoras das culturas pulsantes na cultura humana, e
constroem, estabelecem e reconstroem relações cotidianamente. Assim situadas no
meio de vida, no mundo, aprendem com o vivido, criam e se transformam tecendo
ponto a ponto o porvir, a esperança, um aspecto primordial da/para vida humana.
Freire (1989) denuncia a “imagem-palavra” como força vital, justificando que é nela
que se pode desenhar a dor, a alegria e os desejos, entre outros aspectos da vida
humana, abrindo a possibilidade vivencial da experiência expressiva artística como
um texto que quer dizer e diz. Demonstram as ideias desse estudioso que, dessa
maneira, as pessoas poderão estar favorecendo o desenvolvimento sensível e
cognitivo, apurando os conceitos estabelecidos e as posições diante do mundo.
Segundo essa base freiriana, a imagem-arte-palavra é uma possibilidade de fala-
145
Árvores, vegetais que enraízam para brotar da terra seu tronco, seus galhos, suas
folhas, suas flores, seus frutos e sementes, em nome da contínua vida vegetal no
planeta terra, alimentam a vida animal. Rizoma, raízes ramificadas mergulham na
terra-água, guardadoras de vida da espécie vegetal que pode ou não sair terra a
fora. Dois germes conceituais que foram tomados aqui com o objetivo de traçar as
ideias de enraizar, como solidez necessária para ganhar forças para brotar, sair em
busca de outra experiência não mais intrauterina, mas substancialmente ligada a ela.
Arvorar-se para alimentar a faminta alma sensível-criativa, assim como melhor revela
o poema de Líria Porto82: “Arvorar-se poeta é tão audacioso quanto o Ipê florir na
serra no mês de agosto”. Sigo esses indícios poéticos, dizendo que ser arvorizante e
rizomática é fruto de uma tentativa laboriosa de enraizamento-liberdade, na
expectativa de prender-soltar minha alma sensível-criativa [poética artística] por um
eterno instante que seja, assim como o Cambará do território temporal pantaneiro
que, marcado por caminhos de poeira na seca e por caminhos de água nas cheias,
entre o elemento terra e o elemento água se enraíza para o porvir das canoas no
tempo das águas.
82
Este poema da Líria Porto foi encontrado na página de n° 97, correspondente ao dia 07 de Abril de
uma agenda da Editora Tribo -2010/2011, onde os organizadores foram Regina Garbelline e Décio de
Mello.
146
Escrever um texto é desenhar com letras, é pintar com palavras, é compor com
conceitos! Como diria poeticamente Bachelard, sonhar com o desejo, deitado no
berço esplendido das constelações imaginárias. E, como diria Manoel de Barros, só
um descaminho permitiria um trajeto destes. Assim é a gênese das minhas obras,
seja obra da arte, seja obra da ciência.
Imagem 31: Fotografias “Água e pó, matérias dissolventes”. Fotos: João Quadros Ramos. Foto da flor do
Cambará Fernndez (2010, p. 3). Composição digitalizada: Imara Quadros.
Na obra As águas e os sonhos, Bachelard (1997), faz brotar ideias sobre a paixão,
“crenças e convicções íntimas”, sentimentos geradores de um movimento interno
“estado onírico e passional”, espécies de forças centrais que são capazes de
impulsionar o ser na sua particularidade, desenhando posições pessoais, uma
cartografia do ser. Tomando o eu, então o ser, como ponto de partida e chegada, as
crenças pessoais deverão ser descristalizadas para que se abram brechas, fissuras de
passagem que despertem o ser passivo e o coloquem em estado de inquietações
moventes.
148
83
A casa, o mundo, o território, tudo sem qualquer limite porque são da ordem significante.
84
Bachelard (1993, p. 18 e 127 - (BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo: Martins
Fontes, 1993).
85
Bachelard (1993, p. 151, 232, 235) – (BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo: Martins
Fontes, 1993).
86
Bachelard (1993, p. 37) comenta que “convém eliminar um termo da fórmula de Jasper para torna-
la mais pura fenomenologicamente, parece redondo”. (Mesma referência da Nota de Rodapé 85).
87
O uso do itálico nos termos, redondo, redonda e redondinha, na citação foram meus.
149
Imagem 31a: fotografia “Redondeza do ser 1”. Foto: César Quadros. Escultura em madeira: autoria
desconhecida.
88
Repentinamente.
89
O filósofo se refere à Noz, um fruto da espécie Nogueira.
150
seja na arte, seja na ciência. O estudioso (1993, p. 37) considera que as “imagens
da redondeza plena ajudam a congregarmos em nós mesmos, a darmos a nós
mesmos a primeira constituição, a afirmar o nosso ser intimamente, pelo interior.
Vivido do interior, sem exterioridade, o ser não poderia deixar de ser redondo”
(Imagem: 31b).
Imagem 31b: fotografia “Redondeza do ser 2”. Foto: César Quadros. Escultura em madeira: autoria
desconhecida.
Considera Bachelard (1993, p. 237) que a “filosofia coloca-nos diante das ideias
muito intensamente coordenadas para que de detalhe em detalhe, coloquemo-nos e
voltemos a colocar-nos, em situação de ponto de partida, como deve fazer um
fenomenólogo”. Eis a imagem da Fenomenologia do Redondo bachelardiana!
Não se deve perder de vista as “virtudes iniciais” de uma imagem para que se
mantenha a “primitividade das imagens do ser”, ou seja, conhecer e revelar o
“conhecimento dos valores da imagem”, contrariando o “desconhecimento de
valores” das mesmas. “A esfera do geômetra é a esfera vazia, essencialmente vazia.
Não pode ser bom símbolo para nossos estudos fenomenológicos da redondeza
plena” (BACHELARD, 1993, p. 238). O ser redondo propaga sua redondeza, pois há
uma forma que guia e encerra os primeiros sonhos. Para um pintor, a árvore se
compõe em sua redondeza, e o mundo é redondo ao redor do ser redondo (IBIDEM,
p. 241 E 242).
Merleau-Ponty (2006, p.110), quando aborda sobre corpo próprio, revela que são
“fios intencionais que o ligam ao seu ambiente e finalmente nos revelará o sujeito
que percebe assim como o mundo percebido”. “A fala significa não apenas pelas
palavras, mas acima pelo sotaque, pelo tom, pelos gestos e pela fisionomia, e assim
como este suplemento de sentido revela não mais os pensamentos daquele que fala,
mas a fonte de seus pensamentos e a sua maneira de ser fundamental. Nosso corpo
é comparável à obra de arte. Ele é um nó de significações” (MERLEAU-PONTY, 2006,
p. 209 e 210). E, ao tratar do próprio corpo e do corpo do outro esse estudioso
considera que, para se conhecer o corpo próprio, “é só vivê-lo. Retomar o drama que
o transpassa e confundir-me com ele. Sou meu corpo! Meu corpo é um sujeito
natural, como um esboço provisório de meu ser total” (MERLEAU-PONTY, 2006, p.
269).
90
O Professor da UFMT e Filósofo Dr. Luiz Augusto Passos, membro avaliador desta tese abordou este
conceito em conversa orientadora em Dezembro de 2012.
153
singular, parte da totalidade em nós, no espaço em que somente nós temos a chave.
O lugar da reserva, da indiossincrasia91, da solidão (PASSOS, 2012).
91
Disposição do temperamento do indivíduo, que o leva a influência de diversos agentes; maneira de
ver, sentir, reagir, própria, especial, de cada pessoa (BUENO, 2000, p. 418) - (BUENO, Silveira.
Minidicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: FTD, 2000).
154
92
Estudar; inventar; criar (BUENO, 2000, p. 276) - (BUENO, Silveira. Minidicionário da
LínguaPortuguesa. São Paulo: FTD, 2000).
.
155
Creio que se faça necessário dialogar um pouco mais este ‘natifúndio pantaneiro
manuelino’. A metáfora de natifúndio do poeta em questão é bastante poética e
interessante para subverter o sentido de latifúndio, porções gigantescas de terra
concentradas pela minoria. No natifúndio de Manoel de Barros, essa abundância da
água transcende seus limites, vaza pelos dedos humanos permitindo que outros
animais gozem, usufruam o frescor aquático, vibrem nas ondas líquidas de um dos
bens minerais mais preciosos da terra para a vida.
156
93
Comissão Pastoral da Terra.
94
Acesso disponível: http://www.cptnacional.org.br/index.php/noticias/12-conflitos/1081-conflitos-no-
campo-brasil-2011
95
PCH - Pequena Centrais Hidroelétricas.
96
Para saber mais sobre esta questão, ver Tese de Jaber (SILVA, 2012). Acesso disponível:
http://gpeaufmt.blogspot.com.br/p/banco-de-tese.html.
157
Imagem 32: Esquema cartográfico da minha imagem artística. Composição: Imara Quadros.
Provocação Gênese da
da Imagem Imagem
Revelação,
presença da
Imagem
Imagem 32a: Esquema “Mapa do percurso da minha imagem artística”.Composição: Imara Quadros.
158
Imagem 33 e 34: Fotografias “Paisagens da Ilha do Fogo/Cabo Verde/África”. Fotos: Regina Silva e Michelle
Jaber.
159
Imagem 35: Fotografia “Pedras vulcânicas da Ilha do Fogo”. Fotos Regina Silva e Michelle Jaber.
Imagem 36: Fotografia “Instrumentos do trabalho transformador de pedras vulcânicas em arte pelas mãos
caboverdianas”. Fotos Regina Silva e Michelle Jaber.
(35) (36)
160
Imagem 37: Fotografia “Pedras vulcânicas da Ilha do Fogo, transformadas em arte – arquitetura local”. Fotos
Regina Silva e Michelle Jaber.
Imagem 38: Fotografias “Pedras vulcânicas da Ilha do Fogo, transformadas em arte – artesanato”. Fotos Regina
Silva e Michelle Jaber.
(37) (38)
Imagens 39 e 40: Fotografias “Arte nascente 1”. Foto 37 [lado esquerdo da página], Regina Silva. Foto 38 [lado
direito da página], Lúcia Shiguemi I. Kawahara e Arte digital sobre a Imagem 38: Imara Quadros.
161
Se, para Bachelard, pensar não é a única e nem a última instância, para Merleau-
Ponty essa dimensão também se revela. Assim, a imagem nascente se fez em
processo, antes mesmo de existir no papel canson pintada com aquarela, onde meu
olho apreendeu a matéria para o devaneio da minha alma. Ao devanear, imaginei... e
assim, fui traçando a imagem ainda na minha subjetividade (Imagens: 41, 42 e 43).
162
Imagens 41 e 42: Fotografias “Arte nascente do devaneio”. Fotos, Regina Silva e Michelle Jaber. Rabiscos
ilustrativos do devaneio: Imara Quadros.
Imagem 43: Pintura “Fogo e água parindo ilhas”. Arte: Imara Quadros.
163
contornando identidades.
(QUADROS, 2009)
Segundo Iná Elias Castro (2007), em sua escrita na orelha do livro de Edgar Morin,
“Ciência com consciência” (2007), as ideias trazidas nesta obra revelam oposição ao
paradigma clássico, é posição marcada sobre os fundamentos do paradigma novo,
que se revela complexo. Ela segue apontando que este novo paradigma é próprio
“para todos aqueles que têm se empenhado em participar da aventura da construção
do novo espírito científico proposto por Gaston Bachelard (CASTRO In MORIN, 2007,
orelha da obra)”.
Todo o ser humano responde em reação às sensações e percepções que tocam o seu
ser. Este ser em relação com o mundo capta e realiza recortes conforme a sua
existência, berço das primeiras visões de mundo, das compreensões primeiras,
imagens iniciais que alguns estudiosos chamam de senso comum, considerando-os
acríticos e ingênuos, mas que, neste instante primeiro, também podem ser
considerados como obstáculos a serem superados, como propõe Bachelard (1996).
Dessa forma, podem ser revistos, espiados por outros ângulos, na expectativa de
fundar um olhar mais apurado sem abandonar a sensibilidade, ampliando os
contornos das imagens primeiras, uma espécie de permissão essencial para o
surgimento de novos-outros contornos (SANS, 1994).
A trilha pululante, por ser questionadora, é a prática do olhar para nós mesmos e
também para o(s) grupo(s) o qual pertencemos identitariamente, para o lugar de
vida, para o tempo em que se está contextualizado, para as condições nas quais se
encontra inserido. É preciso um exame cuidadoso acerca do que se enraizou em nós,
uma atitude filosófica, uma aprendizagem que nos redesenhe e nos reconduz,
porque possibilita uma reinvenção.
Bachelard ( 000, p. 1 1), na sua obra “O novo espírito científico” no capítulo VI, ao
abordar sobre epistemologia não-cartesiana, assim afirma: “Todo o pensamento
científico deve mudar ante uma experiência nova”. E segue afirmando ( 000, p. 1 7)
que “Bem entendido, o não cartesiano da epistemologia contemporânea não poderia
fazer-nos ignorar a importância do pensamento cartesiano”, e ainda ressalta ( 000,
p. 1 8) quanto à “importância do movimento dialético, que faz encontrar variações
sob o idêntico e que esclarece o pensamento primeiro completando-o”.
Revitalizar o espírito criativo, seja na ciência e na não ciência97, urge que se instale a
transcendência na contemporaneidade, porque só um espírito revitalizado conseguirá
soltar as amarras para sair em liberdade de escolhas, decisões e posições. Eis a
formação de um espírito científico! Entretanto, promover a visão não clássica, uma
tarefa desafiadora e muito difícil pela sua complexidade, demanda postura ética e
estética. Nesse contexto, o maior desafio é desencadear e promover a formação do
espírito na contemporaneidade.
Vale retomar o que já foi apontado nesta tese, na ponderação de Bachelard (2000,
p. 1 7): “Todo o pensamento científico deve mudar ante uma experiência nova. Bem
entendido, o não cartesiano da epistemologia contemporânea não poderia fazer-nos
ignorar a importância do pensamento cartesiano”. Mas importa também retomar o
novo espírito científico que necessita de se compreender a desordem e as
superações como libertadoras rumo a transformação e re-formação (SATO, 2011).
97
Considerando, por exemplo, a educação escolar e não escolar- educação popular.
167
Nesse caminho é preciso ter a coragem revolucionária, é preciso ter a força vital de
um artesão forjador de matérias brutas, densas, difíceis e complexas. É preciso ter
um espírito de um mestre canoeiro que forje a madeira do tronco de um Cambará, é
preciso ter a labuta artesanal intelectual de um espírito cientista-sensível-criativo, é
preciso um trabalho laborioso para fundar uma ciência-sensível-criativa. Portanto, a
escolha por revitalizar o espírito científico na contemporaneidade, não é uma escolha
fácil!
Trouxe todo este tecido a fim de procurar um entendimento deste percurso sensível,
crítico e criador em que tanto revelo grito e o imprimo na existência, em cada ação e
espaço por onde circulo. Essa prática criativa tão minha, que trago para dentro do
98
Assim como os artistas que compunham as expedições exploradoras.
168
O fato é que, por vezes, nos fechamos e nos acomodamos sem sentir em nossos
trajetos de vida cotidiana e científicos, um mundo que já se encontra dominado,
conhecido. Mas, também é fato que, ao percorrer o caminho artístico e científico,
sempre se enriquece, pois se modifica ao caminhar, isso tanto para o pesquisador
que caminha, como para o leitor estudioso da pesquisa que percorre o caminho
realizado, mas que também é um caminhante pelas/das aprendizagens-reflexões
ofertadas pela leitura-estudo das pesquisas e das vidas cotidianas estudadas.
Inserido neste mesmo contexto encontra-se o campo educacional dentro e fora do
âmbito escolar.
A imaginação é nascida da emoção, de uma força dinâmica, viva que acorda “belas
adormecidas” das razões cristalizadas, e mantém o ser em alerta. Com residência
fixa no território do devaneio, a imaginação permite projetar entre o que é o que não
é, mas que poderia ser. Gaston Bachelard, com suas ideias diurnas-noturnas,
autoriza a ligação entre as culturas até então consideradas em separadas, científica-
Razão e a humanista-Poética-Emoção/Sensibilidade.
Com essa ligação, é possível trilhar pelo território da pesquisa sem fissuras entre
Razão e Poética-sensibilidade, entre texto-imagem e texto-escrito, entre Ciência e
Arte. Segundo esse estudioso da Fenomenologia da Imagem, a imagem tanto pode
ser de forma escrita, no caso bachelardiano, literária, como pode ser fotográfica,
pictórica, escultórica, ou seja, artística, uma vez que construções mentais compõem
as compreensões que se revelam por meio de diferentes linguagens e comunicam.
Para Bachelard, a ciência é uma caminhada que deve manter foco na crítica,
desassossegando constantemente o próprio conhecimento científico. Esse estudioso
revela que esse tipo de conhecimento é fruto de um conhecimento outro, cuja
origem reside no conhecimento humano. Trata-se de um trajeto de aprofundamento
do ser, compreendido como parte de uma jornada investigativa no sentido
compreensivo para as transformações das pessoas comuns, das áreas científicas que
como consequência toca no social.
Todo o conhecimento deve fugir dos dogmas, das certezas absolutas, pois só assim
um novo espírito científico pode renascer. Para que isso corra, necessita-se de uma
formação ótica de que só a desordem e as superações libertam rumo à
transformação e re-formação (SATO, 2011). Bachelard (1996, p. 7-9) provoca
quando afirma e indaga: “A primeira representação, fundada num realismo ingênuo,
são vínculos essenciais, mais profundos do que se costuma encontrar nas
representações geométricas”.
Esse estudioso, em uma de suas obras diurnas (1996, p. 13), considera que a “tarefa
de um filósofo científico é tornar claramente consciente e ativo o prazer da
estimulação espiritual na descoberta da verdade. O amor, de acordo com a ciência,
deve ser um dinamismo psíquico autógeno, gerado por si mesmo. A ciência é a
estética da inteligência”, e a arte [não uma obra de arte, mas a arte no sentido de
um trabalho artístico], nascida no território temporal-espacial de pesquisa, pode ser
parte da estética científica, assim como a ciência, segundo Bachelard, é estética da
inteligência.
171
Na obra A Água e sonhos, Bachelard (1997) propõe um bom exemplo para a reflexão
sobre esta questão, e provoca trazendo que o caráter utilidade de navegar´ não é
suficientemente claro, para determinar o ato de entalhar a canoa. Segundo ideias
desse estudioso, são necessários interesses ‘verdadeiros’, “interesses sonhados”,
“interesses fabulosos”, em contraposição aos “interesses calculados”.
uma das ideias desenhadas pelo empreendimento científico. Esse filósofo inspira a
reformulação constante, permanentemente e continua em qualquer setor humano.
( 008, p. 13 e 14) que “A reflexão é que vai dar sentido ao fenômeno inicial,
sugerindo uma sequencia orgânica de pesquisa, uma perspectiva racional de
experiências. O conhecimento científico é sempre a reforma de uma ilusão. Por isto
só podemos ver na descrição, mesmo minuciosa, de um mundo imediato uma
fenomenologia do trabalho no sentido em que se falava hipótese de trabalho”.
E tudo isso escapará, num estilhaço fugidio de quem ainda interpretará a imagem de
acordo com suas próprias vivências, leituras, sonhos, aprendizagens, memória,
sentimentos, percepção. Fenomenologicamente, a educação ambiental é sempre
inacabada. Dos respingos da tinta na soma da quantidade de água, a coloração se
altera fazendo surgir tonalidades diversas, as luzes e as sombras. Da pureza da cor
primária ou do matiz da mistura, a obra ainda dependerá do olhar de quem a
enxergará, ou até daqueles que insensíveis a outras linguagens não textuais, se
manterão indiferentes à imagem, ignorando-a por completo.
174
Por isso cada pesquisa é uma reinvenção, de quem colore o mundo, escolhe o preto
das pedras vulcânicas, ou ainda guarda o branco daquilo que não se revela que
permanece no silêncio da inspiração criadora como uma obra do inefável, pura e
simplesmente encantada.
A filósofa Chauí ( 010, p. 19) anuncia que “A filosofia se interessa pelo instante em
que o mundo das coisas e o mundo dos humanos revelam questões problemáticas,
estranhas, incompreensíveis e enigmáticas, sobre os quais as opiniões disponíveis já
não podem satisfazer. Então, pode-se dizer que a filosofia, de um modo geral, está
voltada para os momentos de crise, crise no pensamento, na linguagem e na ação,
momento críticos manifestos”.
Segundo Chauí ( 010, p. 17 e 18) “dizer não é atitude crítica”. Dizer não às certezas
cotidianas, as crenças e aos preconceitos do dia a dia para que possa ser avaliada de
maneira sensível, racional, critica e criativamente. O tecido compreensivo aqui é
entender como provocar e manter um sentido de alerta, um sentido crítico, sem ter
que dispensar a sensibilidade, para se chegar às transformações necessárias, tanto
175
Imagem 45: Fotografia “Ciência e Arte em mim habitando”. Foto da Imara: Dóris Ilena. Foto da borboleta
Morfo, João Quadros Ramos. Foto da flor do Cambará, Fernndez (2010, p. 3). Arte digital: Imara Quadros.
querer mudar a vida, reinventando a paixão! Inicia [ada] a trajetória na ressonância ontológica de
um mundo singular, abre as arestas, lança-se nos mistérios subterrâneos, ganha corpo, asas
[para] reiniciar um novo ciclo pela repercussão do devir. Estudando... Estudando... Estudando!
Uma pesquisa em Educação Ambiental é ter liberdade para melhorar nossa condição humana
Inicio dialogando com Sato (2011), pois é ela com sua proposição cartográfica que
me conduziu e ainda está a conduzir cada passo meu, neste multimundo da
pesquisa [teórico-prática/científico-poético e etc.].
A Cartografia do Imaginário (SATO, 2011) tem sido uma das bases para esta
pesquisa, que, segundo a própria autora (2011, p.1), “não é um receituário ou
heurística, é só um texto que retrata um fazer e pensar pesquisa em Educação
Ambiental. Que surgiu para com o intuito de ajudar os participantes do GPEA”.
Ainda adverte Sato ( 011, p. 1) que “não se trata de uma metodologia, muito
menos uma orientação fechada e imutável em sua proposição. É uma provocação
para que os pesquisadores reinventem a palavra, iniciando nesta orientação
pontilhada para novas invenções”. Por esta propositura apresentada, confirmo a
cartografia satiana como meu mapa companheiro neste trajetar investigatório,
sempre à mão para ser aberto e reaberto quantas vezes desejar e necessitar.
179
Desejo pontuar, neste trajetar, o que Sato e Passos (2006, p. 17) já pronunciaram
“insistimos na ambiguidade, na precariedade, na criatividade, na arte, na paixão e
na busca solidária em favor da ecologia, separando-nos afirmativamente”, da
modernidade não no sentido de evidenciar a dicotomia, mas de uma desconstrução
epistemológica. Segundo o que já afirmaram Sato e Passos (2006, p. 26):
Uma teoria pensada no sentido da complexidade, ou seja, não clássica mas Pós-
moderna só pode se dá na ambiência da complexidade, na pulsante recriação
intelectual. Toda a teoria revela um papel cognitivo quando acionada pela atividade
mental de uma pessoa, que é o pesquisador, o viajante científico. Segundo Morin
(2007, p. 335 e 336), teoria não é ponto de chegada, nem solução de nada, mas é
a possibilidade de um ponto de partida, de um caminho para se tecer o trato de
um problema percebido cientificamente. Assim, toda essa ação ofertará vida ao
método. Dessa forma, pode-se considerar que a teoria é uma espécie de ‘carteira’
validadora da caminhada do pesquisador, permitindo que ele atravesse cada portal
do trajeto, que teça sentidos e borde ações que façam pulsar o caminho escolhido.
Morin diz que método é uma práxis esculpida por uma teoria. O artesão desse
entalhe é uma pessoa pensante, procurante, conhecente, é o pesquisador, o
viajante científico (SATO, 2011) que talha lasca por lasca o método com suas
qualidades. A arte de um método só se realiza pela composição de um caminho,
pela busca e pela apresentação de proposições. Nessa perspectiva, método é uma
atividade pensante e consciente, é o mapa para a pilotagem [em contraposição à
perspectiva clássica de verificação, passividade e aceitação dos postulados].
Método é uma atividade pensante e consciente, é o mapa para a pilotagem [em
contraposição à perspectiva clássica de verificação, passividade e aceitação dos
postulados]. O método, assim considerado, se coloca como um reorganizador
constante da teoria [ciclo vital] como compreende Morin (2007). Segundo Sato (2011, p.
12 e 13):
Uma pesquisa segundo Sato (2011, p.2), reside em “conjugar o verbo pensar no
eterno gerúndio, como se fosse um movimento que não se acaba, e por ser algo em
plena construção”, aqui - agora. Ela ainda afirma na mesma página que é por esta
razão acima apontada, que “é possível fugir da rigidez do método científico da
Modernidade, abrindo miríades de possibilidades. Cabendo a cada qual, pesquisa-
pesquisador, adaptar tudo ao seu contexto particular, acomodando conceitos,
mudando títulos, ou revendo pontes para novas ligações”.
Imagem 46: Esquema cartográfico das ligações ecossistêmicas 2. Fotos, João Quadros Ramos. Concepção,
Imara Quadros e Michèle Sato
Esses serviços mantêm uma relação íntima e dinâmica entre si, constituindo, no
movimento, a unidade pulsante e complexa da vida neste planeta. O documento
Kofi Annan [SECRETÁRIO GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS] lançou em junho de 2001 e finalizou em
99
março de 2005 [AEM], que fornece informações científicas à Convenção sobre Diversidade Biológica,
Convenção sobre Combate à Desertificação, Convenção de RAMSAR sobre Zonas Úmidas e à
Convenção sobre Espécies Migratórias, assim como a múltiplos usuários no setor privado e na
sociedade civil.
184
avaliador não ignora os impactos atuais, e os que ainda se agravarão se nada for
feito pelo grupo humano. É deste quadro dado pela AEM que a gênese de um novo-
outro desenho se pronuncia urgente, o de se buscar mudanças políticas de toda
ordem, inclusive pessoais. Nesse contexto, a Arte Educação Ambiental, via Educação
Ambiental, pode trazer boas e interessantes contribuições.
É por esta razão que, nesse caminho buscador, foi preciso mais do que
seguir/buscar, foi preciso um espírito de ferreiro que forjasse o ferro; foi preciso um
espírito de mestre marceneiro que forjasse a madeira; foi preciso labuta artesanal
intelectual de um espírito cientista-sensível-criativo; e foi preciso um artesão que
forjasse o trabalho laborioso da ciência-sensível-criativa, a caminho de um mundo
melhor do que o que está posto.
Foi nesse lugar e com sua gente que pude propor um artesanato intelectual,
constituído pela artesania tecida pela pesquisadora no seu ofício sensível-intelectual-
investigativo (MILLS, 2009). Compreende Mills (2009) que essa posição desenhada
acima difere de uma posição de um cientista “duro, que só ‘reproduz dados’”. Trata-
100
Acesso disponível: http://www.ramsar.org/cda/en/ramsar-home/main/ramsar/1_4000_0__ .
185
Nesse sentido, foi necessário que eu, a caminhante artesã, deixasse aflorado meu
espírito criador, mantendo-o sensível, crítico, criativo e atento para iniciar e continuar
a caminhada na busca pretendida. Foi preciso mantê-lo crítico e acordado para não
só examinar o caminho com atenção, mas para não me deixar seduzir pelo feitiço de
uma apreciação vazia, de postulados travestidos de verdades cabíveis, os tais
obstáculos epistemológicos bachelardianos. O meu espírito criador foi primordial para
não perder de vista a capacidade de imaginar e projetar desenhos outros, a partir do
revelado.
Para Passos (2013), o espaço não está somente fora de nós. Vejamos como o
estudioso considera: “Nessa noite prosseguimos em nossa escalada de compreensão
do que seja a territorialidade, e nela o conceito de espaço, e espaços simbólicos. O
espaço não é uma dimensão exterior a nós, mas uma das dimensões pelas quais nos
a-presentamos ao mundo, diria Melreau-Ponty. Não é uma exterioridade...”101.
101
PASSOS, Luiz Augusto. Território e Espaço, e espaço simbólico. O espaço simbólico e a
transcendência. (13 de Março de 2013). Acesso disponível:
http://luizaugustopassos.com.br/territorio-e-espaco-e-espaco-simbolico/#.UT_x3bCOyts.facebook
(Acesso em: 13/03/2013 - 12H43).
186
Este estudioso do imaginário ainda diz (IBID, p.9 ) que “Participa-se junto de uma
experiência comum, comunica-se, põe-se em comum, etc. Assim a experiência não é
vivida por um ego forte e solitário, ela deve ser dita, contada, vista”. Maffesoli (IBDI,
p. 13) diz que “o sentir comum, é um bom [melhor] meio de elaborar nossos olhos,
sentimento partilhado. Uma estética descompartimentada permite compreender
estar-junto desordenado, versátil, inatingível: a sociedade”.
mesma força e peso às tramas dos diversos saberes, das diversas linguagens, das
diversas maneiras de estabelecer comunicação e da diferença de toda ordem.
Esta investigação também considerou como uma boa ajuda neste trajeto as ideias de
Bodgan e Biklen (1994), no apoio à compreensão de uma investigação qualitativa no
âmbito da educação. Neste rumo qualitativo de investigação, os caminhos e trilhas
se revelam por um empreendimento desafiador e agradável para o campo
educacional, pois promove um vasculhar de lugares de modo criativo e original, útil
às investigações educacionais (BODGAN; BIKLEN, 1994).
O GPEA é coordenado pela Profa. Dra. Michèle Sato, certificado pela UFMT e pelo
CNPq. A moldura desse grupo pesquisador se estabelece pela realização de
pesquisas em Educação Ambiental entrelaçando o compromisso político ecologista
[militância] com o processo formativo e com a subjetividade humana. É um grupo
que visa transcender o isolamento do pesquisador, cavaleiro solitário, e reinventar
um Don Quixote na força plural, Dons Quixotes.
102
Que solicita alguns conhecimentos específicos do artista (retratador), sobre o suporte que receberá
o registro, sobre os materiais expressivos que materializarão o retrato e sobre anatomia humana.
192
Para que se chegue a contar fatos/relações via imagens-arte, é preciso olhar a “vida
vivida” com sensibilidade/crítica e também com consciência que se está olhando para
si mesmo enquanto ser social. Assim, a criticidade viceja para que se consiga
captar/acolher, no cotidiano, o que de melhor podem representar as relações
estabelecidas, incluindo os conflitos e sonhos da vida pessoal e comum, ao fazer
brotar o desejo de transformá-las, de reinventá-las. É preciso tomar o sentido
criativo-representativo que a arte educação promove, a fim de se propor a
consideração da estética local no viés das ligações ecossistêmicas, para seguir nas
trilhas da representação do viver com todos os sabores e des-sabores.
Este caminhar híbrido via Arte Educação Ambiental teve seus primeiros ensaios
oficiais desenvolvidos por volta do ano de 2007 e somente foram publicados em
011, no livro organizado por Michèle Sato “Eco-Ar-Te para o reencantamento do
mundo. São Carlos: RiMa Editora, FAPEMAT, 2011”.
Essa busca híbrida iniciou suas primeiras pegadas por volta do final da década de 90,
quando foi inaugurado um estudo na cidade de Lábrea no Amazonas, no qual se
perseguiram as ideias propagadas por Paulo Freire - alfabetizar por imagens. Com
essa base epistemológica, se propôs que, ao usar imagens desencadeadoras do
processo alfabetizador de jovens e adultos, o alfabetizando produzisse as próprias
imagens alfabetizantes via produção de imagens artísticas sobre o seu mundo vivido
via arte educação. Dessa experiência, brotou a compreensão da forte ligação entre
natureza e cultura naturalmente posta no viver cotidiano dessa comunidade
amazônica, bem como ficou patente a força de uma imagem criada enquanto texto
num contexto arte educativo. Esse fato conduziu a um pensar que não seriam
fenômenos exclusivos da comunidade envolvida.
195
Essa mistura híbrida foi sendo fortalecida com as experiências circunscritas nos
Projetos e nas pesquisas propostas pelo grupo pesquisador - GPEA foram eles:
103
PIGNATI, M.; CASTRO, S.P.; QUADROS, I.P; ALBERNAZ SILVEIRA, R. Água na gente e Gente na
água: o caminho das águas em São Pedro de Joselândia, Mato Grosso Brasil. Cuiabá: EdUFMT, 2007.
104
QUADROS, Imara. Tecendo Educação Ambiental para escola com alunos e alunas de Limpo Grande
(Várzea Grande/Mato Grosso), PPGE/UFMT, 2006.
105
A referência “agora sem barras” se dá por usar Arte/Educação/Ambiental (Quadros, 011, p. 5 ) no
mesmo sentido atribuído por Ana Mae Barbosa para Arte /Educação (Barbosa, 2005, p.21). E ao
encontrar a Profa Dra Michèle Sato julgamos mais interessante retirar as barras por não fornecer a
ideia de interação entre as esferas.
106
SATO, M.; ALVES, M.L.; JABER, M.; QUADROS, I.P. e SILVA, R. Caderno Pedagógico: comunidade
quilombola de Mata Cavalo. Cuiabá: PRINT, 2010. (INBN 9788591143603).
196
107
SILVA, Regina. Do invisível ao visível: mapeamento dos grupos sociais do estado de Mato Grosso –
Brasil. Tese (Doutorado em Ciências) Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais,
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), São Carlos, 2011.
108
SILVA, Michelle Tatiane Jaber da. O mapeamento dos conflitos socioambientais de Mato Grosso:
denunciando injustiças ambientais e anunciando táticas de resistência. Tese (Doutorado em Ciências)
Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais, Universidade Federal de São Carlos
(UFSCar), São Carlos, 2012.
109
SILVA, Regina. Mapa Social: mapeando os grupos sociais do estado de Mato Grosso – Brasil Cuiabá:
UFMT-GPEA & GTMS, 2011.
110
QUADROS, I.P.; SATO, Michèle e JANUÁRIO CORRÊIA, J. No caminho das águas, a feitura da canoa
Joselândia/Mato Grosso/Brasil. Cuiabá: UFMT-GPEA & GTMS, 2011.
111
SATO, M.; BUSSATO, I.; SILVA, M. L. A.; SILVA, R. A.; FAZERES, A.; REGINA, A.W.; LIMA, A.;
JABER, M. T.; ALBERNAZ SILVEIRA, R.; QUADROS, I.P. KAYABI, E. Avaliação Ecossistêmica do milênio
e o pensamento indígena. Caderno Pedagógico, Cuiabá: GPEA, UFMT, 2011.
197
Imagem 47: Esquema do calendário das idas a campo. Concepção, Imara Quadros.
112
A ideia de complementariedade do olhar, um visual expandido pelo sonoro – escuta visual, na
expectativa de melhor captar o foco de pesquisa fenomenologicamente abordando.
198
Nesse ciclo anual das idas a campo, considerando a primeira como de cunho
exploratório, alcançou-se certa equidade no tempo pantaneiro, nas idas entre
enchente-cheia e vazante-seca (Imagem: 48).
Imagem 48: Gráfico das idas a campo relacionados ao ciclo das águas pantaneiras 1.
Imagem 49: Gráfico das idas a campo relacionadas ao ciclo das águas pantaneiras 2.
Na ida partilhada, tocamos nossa pesquisa, mas também fomos tocados pela
parceria dos companheiros de expedição a campo, por desejos e sonhos e também
literalmente, nas andanças pelos caminhos de busca, nas paradas necessárias para
olhar com mais atenção e cuidado, nas horas de repouso do movimento corporal e
perceptivo, momentos de reflexão do revelado na propositura de entrelaços com os
propósitos investigativos. Cada qual teve fundamental importância, pois, se tudo
tivesse ocorrido de forma solitária, certamente o desenho seria outro, nem melhor
nem pior, mas outro.
Quadro 03: Contato informal com as pessoas e lideranças da comunidade. Foto: Michelle Jaber.
202
Quadro 04: Observação direta e Entrevista aberta. Fotos, João Quadros Ramos eLúcia Shiguemi I. Kawahara .
Foto montagem: Imara Quadros.
Quanto às entrevistas de cunho qualitativo, Gaskell (2002, p. 65) abordou que são
uma “metodologia de coleta de dados amplamente empregada” que fornece “dados
básicos” para o desenvolvimento e compreensões das relações tecidas pelos atores
sobre a situação investigada. Assim, o objetivo de uma entrevista deve seguir rumo a
203
No meu trajeto investigativo a campo, a tessitura se fez pela constituição dos diários
de campo, relatórios de pesquisa, bem como pela organização e trabalho, com
informações obtidas da escuta fenomenológica. Segundo (SATO E SANTOS, 2009, p.
11),
Imagem 50: Registro fotográfico da pesquisa pela pesquisadora. Foto, João Quadros Ramos.
Imagem 51: Registro escrito - manual da pesquisa pela pesquisadora, durante a Oficina: Atelier Água.Foto, João
Quadros Ramos.
205
Imagem 52: Registro escrito - manual da pesquisa pela pesquisadora, durante a Oficina: Atelier Terra. Foto,
João Quadros Ramos.
Loizos (2002, p. 137), ao abordar sobre vídeos, filme e fotos como documento de
pesquisa, revela que “Imagem, com ou sem som, oferta registro poderoso, concreto
e material”, embora restrito, alerta o estudioso. Ainda considera (p. 138) que “o
mundo em que vivemos é influenciado pelos meios de comunicação, que dependem
dos elementos visuais. O visual desempenha então, papel importante na vida social,
política e econômica.” Segue afirmando (p. 143) que “imagens por ressoarem criam
e ou podem criar uma construção partilhada na pesquisa, onde pesquisador e
pesquisados podem falar juntos”.
A Expedição virtual se deu por uma viagem de cunho investigador em páginas dos
livros, documentos, tese, dissertações, artigos, web, revistas, guias turísticos e
outros, antes, durante e depois da pesquisa de campo. Empenhei-me num vasculhar
imagens escritas e não escritas nas páginas impressas e virtuais, em busca de um
contornar a canoa pelo imaginário e por páginas e mapas que ofertassem indícios
para se perseguir as águas chegantes da cheia em Joselândia. A pretensão de busca
nessa expedição virtual também residiu em ofertar contornos ao lugar de vida, sua
gente, seus significados, valores, hábitos e saberes, às criações artísticas, à
identidade do mato-grossense com a canoa – imaginário coletivo não só do
pantaneiro. Também consistiu em compor cenários ancorados no tempo presente,
para se projetar cenários futuros.
Por sua vez, a expedição presencial se deu por andanças em busca de imagens que
se revelassem pelos caminhos secos e líquidos do Pantanal de Joselândia, Barão de
Melgaço; pelos saberes dos Mestres quanto à feitura da canoa pantaneira; pelo
imaginário da canoa nas ruas da capital mato-grossense, Cuiabá, e pelos caminhos
que cartografassem imageticamente as águas chegantes da cheia pantaneira.
Imagem 53: Oficina do fazer canoa, fase Atelier Água. Foto, João Quadros Ramos.
Imagem 54: Encontro 1: com os “Mestres canoeiros” para revisão e conversa sobre o processo realizado na
Oficina. Foto, João Quadros Ramos.
Imagem 55: Encontro 2 com os “Mestres canoeiros, professores e alunos da escola”, para revisão e conversa
sobre os saberes envolventes no processo realizado na Oficina. Foto, João Quadros Ramos.
210
Imagem 56: Mestres canoeiros de Joselândia, participantes da pesquisa. Fotos dos Mestres canoeiros, João
Quadros Ramos e Lúcia Kawahara Shiguemy. Foto da flor do Cambará Fernndez (2010, p. 3).
211
originada do sol de Van Gogh, como se todo o sonho fosse possível na entrega apaixonada de
quem quer mudar a vida pelo ato e pensamento da pesquisa (SATO, 2011, p. 12).
212
A palavra sustentabilidade está na moda, usada pela ciência, pela educação, “pelos
governos, pelas empresas, pela diplomacia e pelos meios de comunicação. É uma
etiqueta que se procura colocar nos produtos e nos processos, para agregar valor”
(BOFF, 2011, p. 9). É necessário que se vá muito além do modismo quando se trata
de sustentabilidade, para não ficarmos reféns da “falsidade ecológica”, que nada
mais é do que “uso da palavra sustentabilidade para ocultar [maquiar, acréscimo
meu] problemas de agressão à natureza, de contaminação química dos alimentos e
de marketing comercial apenas para vender e lucrar” (BOFF, 2011, p. 9).
214
Oliveira, em texto publicado virtualmente na Revista Sina (2012, p. 1), aponta que “o
meio ambiente apresenta evidentes sinais de estar enfraquecido em face da
agressão patrocinada pela expansão econômica sem freios” [...]. Segue evidenciando
o autor que:
Assim considerando, se questiona como Oliveira (2012, p. 1): a economia posta hoje
no nosso sistema de vida percebe-se maior, superior ao meio ambiente? Segundo
este autor (OLIVEIRA, 01 , p. 1) “a economia é dependente das coisas da natureza,
e não ao contrário” (Imagem: 57).
Imagem 57: Esquema “ligações entre natureza, economia e ser humano”. Concepção: Imara Quadros.
215
Imagem 57 a: Esquema “Ligações entre Natureza, cultura e economia”. Concepção: Imara Quadros.
É por meio das funções ecossistêmicas que os serviços são gerados, propondo vida
de maneira direta [óbvia] e indiretamente [não percebidos imediatamente], mas
fundamentalmente usados, consumidos para a manutenção da vida humana e não
humana no planeta. Segundo Boff (2011, p. 133),
Imagem 58: Esquema “Ciclo da água”. Fotos da Imara refletida na água, borboleta Morfo e canoa, João
Quadros Ramos. Foto da flor do Cambará: Fernndez (2010, p. 3). Arte: Imara Quadros.
No trecho primeiro da obra A água e os sonhos, Bachelard (1997, p.1) contorna duas
imaginações que, segundo suas ideias, ofertam forma à causa formal e material,
“imaginação formal e material”. Para este filósofo, esses conceitos “são
indispensáveis a um estudo filosófico completo da criação poética”, segundo ele
(1997, p. 1-2),
Na Estação 1, parei para conhecer a natureza, o Pantanal, lócus deste estudo. Assim
iniciei meus esforços em desvelar o Pantanal mato-grossense, não que já não o
conhecesse antes, mas o foco neste intento era novo para mim. Assim, era preciso
revisitar o Pantanal com a nova bagagem, para além da mera contemplação, na
verdade, um conhecer o lugar!
Conhecer o ciclo das águas pantaneiras, constatar que cada período instaura um
desenho de vida animal e vegetal próprio, portanto, paisagens, cores, sonoridades,
aromas, texturas diferentes e diversas em uma unidade foi importante e significativo,
não só para a presente pesquisa, mas para meu ser situado neste lugar, Mato
Grosso, com esta gente pantaneira, pois, como apontou Aline Figueiredo113:
113
Historiadora e crítica de arte em Mato Grosso.
219
Imagem 58a: Mapa pictórico do caminho investigador. Desenho e Arte digital: Imara Quadros.
Leonardo Boff ( 01 , p. 133) chama a atenção para “Cuidado todo especial merece
nosso planeta Terra. Temos unicamente ele para viver e morar. É um sistema de
sistemas e superorganismo de complexo equilíbrio, urdido ao longo de milhões e
milhões de anos”. E o Pantanal não é só parte desse todo delicado, como apresenta
seu próprio corpo também urdido delicadamente há muito tempo, e por isso mesmo
faz parte deste todo carece de atenção e cuidado.
O território pantaneiro ocupa parte dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do
Sul, formando um imenso mapa hídrico: a hidrografia pantaneira (Imagem: 59).
Imagem 59: Mapa dos Pantanais. Foto, acervo do Centro de Aprendizagem [CA]- SESC Pantanal – MT.
221
O Pantanal como um todo tem regência das/pelas águas que se fazem e se refazem
a cada ano, seguindo um curso natural que inicia com as águas das chuvas que
enchem os rios e estes, por sua vez, correm vizinhança afora até chegar ao seu
primeiro destino, a planície pantaneira mato-grossense, sem interrupções-prejuízos e
impactos. Desejo das águas chegantes, assim o Pantanal se enche de abundância e
fartura, ou seja, de vida. Caso esse correr livre e natural não aconteça no Pantanal, o
viver farto e abundante minguará ou quem sabe deixará de existir, pelo menos nesta
forma conhecida hoje.
A lisura da paisagem da extensa planície pantaneira é, por vezes, rompida por alguns
morros e serras. Ao norte, por exemplo, a planície revela duas grandes chapadas,
114
Barão de Melgaço - MT.
222
O Pantanal revela dois períodos distintos, a cheia e a seca. Para que a cheia se faça
presente, é preciso um movimento cíclico de cima para baixo, momento em que a
chuva enche os rios para transbordarem lentamente suas margens e encharcarem a
planície pantaneira, enchente. Após a parada das chuvas, as águas iniciam outro
movimento, agora de baixo para cima, a presença da seca nasce em processo lento,
e as águas, evaporam/secam [vazante], cambiando as multicores refletidas nas
águas pelos matizes do marrom ardente refletidos na poeira (Imagem: 60).
223
Imagem 60: Ciclo das águas no Pantanal Norte. Fotos borboleta Morfo e canoa, João Quadros Ramos. Foto da
flor do Cambará: Fernandez (2010, p. 3). Arte: Imara Quadros.
Esse é o Ciclo das Águas pantaneiras, no qual cada tempo - enchente, cheia, vazante
e seca, tem temporalidades e paisagens próprias, ou seja, se revelam de forma
variável, conforme o volume de água que cai dos céus, da quantidade das águas que
correm livres pelos rios seguindo o curso natural, sem impactos pelo caminho, e
também conforme o calor do sol, dos ventos que secam a umidade do ar.
No período seco acontece a queda das folhas de muitas espécies vegetais que depois
revivem nas águas. Existem espécies que ofertam o colorido exuberante da seca com
suas floradas multicoloridas, tonalizando o espaço acima dos olhos, como a piúva, o
para-tudo, o ipê, o novateiro e o cambará, só para citar algumas espécies (CA-SESC
Pantanal).
225
O fato é que o Pantanal é todo desenhado pelo ciclo das águas, que revela uma
forma de ser e estar toda cambiante, multicolorida, com sabores variados e ricos
saberes para além da medida do ponto final e de qualquer verbo.
Cambará é seu nome popular, e Vochysia divergens Pohl é seu nome científico
(Imagem: 62). A espécie é encontrada na região Centro-Oeste brasileira e na Bolívia,
“particularmente frequente no Pantanal mato-grossense”, “própria de matas ciliares”
e de “áreas abertas de terrenos aluviais inundáveis, onde chega a crescer e
reproduzir-se com tanto vigor, formando populações puras chamadas cambarazais,
que são consideradas pelos pecuaristas do Pantanal como uma das piores
infestantes ou planta daninha de pastagens.” (LORENZI, 2009, p. 354).
226
115
Pesquisador do Pantanal de Cáceres - MT.
116
POTT, A. Pastagens no Pantanal. Corumbá. EMBRAPA/CPAP de Corumbá. (EMBRAPA-CPAP.
Documentos 7), 1988.
117
O sublinhado, o grifo, foi dado por mim nas citações de Fernandez, com intento de evidenciar como
o Cambará é considerado no Pantanal, “invasor” sob a ótica dos pecuaristas extensivos, e não, como
pertencente as ligações-serviços ecossistêmicos cultural.
227
Como características, essa espécie pode apresentar “altura entre 7 a 18 m”, revela
um “tronco ereto e cilíndrico, com 30-50 cm de diâmetro”, com casca em tons claros
e fissuras/rachaduras que “caem em placas irregulares” (Imagem: 63).
Construindo seu viver nesse lugar, o pantaneiro tornou-se, segundo o mesmo autor
acima citado, “hábil no cultivo, na pesca e no artesanato”. Ser de mãos fazedoras, o
pantaneiro aprendeu a produzir com as próprias mãos quase tudo de que necessita
para o seu cotidiano. O pantaneiro é, portanto, um ser criador por natureza, inclusive
de seus sonhos.
Segundo Oliveira e Andrade ( 007, p. 35), “Surge pouco a pouco, uma cultura com
linguagem própria, como também um conjunto de construções e de alimentação
230
Ainda seguindo o que apontaram esses autores (OLIVEIRA E ANDRADE, 2007, p. 49-
51), as “expressões artísticas” marcantes do Estado se revelam pela “tecelagem”, ou
seja, redes feitas antigamente com algodão nativo pelos indígenas, e hoje com o
algodão cultivado. A “cerâmica”, outra “expressão artística” apontada pelos autores,
é feita a partir do barro retirado das barrancas dos rios, e, por fim, a “expressão que
usa a madeira” como matéria. A arte de esculpir também é herança indígena, pois os
indígenas já a utilizavam para o fabrico de “flechas e demais instrumentos de caça”,
assim como a “fabricação de canoas”, segundo Oliveira e Andrade ( 007, p.50).
Imagem 66: Mapa Pictórico de Barão de Melgaço MT - Joselândia. Foto da canoa, João Quadros Ramos. Foto da
flor do Cambará, Fernandez (2010, p. 3). Arte: Imara Quadros.
232
Imagem 67: Vista aérea da sede comunitária, São Pedro. Foto, Ferreira (1993, p. 22).
Joselândia apresenta duas formas de acesso, uma no período das águas e outra na
seca. Nas águas, sai-se da capital Cuiabá rumo a Poconé via terrestre, que tanto
pode ser de transporte coletivo – Ônibus ou Van, como carro particular; depois, no
Porto Cercado, ao lado do SESC Pantanal-MT, deve-se pegar um barco a motor ou
não, que pode ser contratado tanto coletivamente como individual, para seguir pelo
rio Cuiabá e se adentrar nos caminhos d´água que conduzem até São Pedro. Na
seca, o caminho é todo terrestre, verdadeiros caminhos de poeira. Nessa época, sai-
se de Cuiabá rumo a Santo Antônio do Leverger, passa-se por Mimoso118, atravessa-
se a ponte ainda de madeira sobre o rio Mutum, segue-se em direção à comunidade
joselandense denominada de Capoeirinha, depois passa-se pela comunidade Lagoa
do Algodão, também no território de Joselândia, e, por fim, chega-se a São Pedro
(Imagem: 68).
118
Terra do Marechal Rondon, persona matogrossense.
234
Imagem 68: Caminhos que levam a Joselândia. Foto da canoa e borboleta Morfo, João Quadros Ramos. Foto da
flor do Cambará, Fernandez (2010, p. 3). Arte: Imara Quadros.
119
Oficina de Arte Educação Ambiental [UFMT/IDRC/CRDI/PROVIDAS/CPP/PANTANAL NORTE],com a
comunidade de Joselândia e as profissionais Imara Quadros e Ruth Albernaz Silveira. Trabalho
coletivo publicado como um material pedagógico intitulado “Agua na Gente e Gente na água”.
235
A Arte do Entalhe é uma expressão artesanal que corta, escava e alisa madeiras de
árvores regionais diversas, transformando a madeira em estado bruto em arte
popular, ou seja, pilões, cochos e gamelas, usados para esmagar/triturar grãos e
outros tipos de alimentos, constituindo, portanto, peças utilitárias usadas no
cotidiano da casa, da família. Da madeira também se entalham (Imagem: 70): i)
Violas de Cocho120 que embalam ritmada a fé; ii) iconografias de peixes encontrados
nas águas deste lugar, que servem para adornar os lares e estabelecimentos
comerciais; e iii) carro de boi e carroças usados como ferramenta de trabalho para
transporte, bem como, levar e trazer pessoas dos lugares.
120
Instrumento musical semelhante a um violão/viola típico da região Centro-Oeste brasileira.
237
Imagem 71: Arte do corte, costuras e tranças. Fotos, João Quadros Ramos.
238
Imagem 72: Esquema “Ligações entre serviços ecossistêmicos”. Concepção, Imara Quadros.
239
Assim, atentando para a proposição da AEM que se retome o desenho das relações
entre Natureza-cultura, no sentido de instigar a busca de reinvenções necessárias ao
viver humano no planeta, tanto no presente como para o futuro, segui rumo ao
rastreamento das ligações ecossistêmicas da canoa feita no e a partir do Pantanal
com intento de explicitá-las o mais possível no sentido compreensivo.
240
A questão primeira a ser mapeada foi de onde vinha à canoa. E revelar esta trilha
significou revelar uma atividade criadora desta gente encravada nesse lugar. Ferraz e
Fusari (1999, p. 60-61), ao abordarem sobre atividade criadora, atividade
imaginativa apontam, “Uma atividade criadora é uma atividade imaginativa. A
imaginação se constitui, portanto, de novas imagens, ideias e conceitos”.
Na busca de ligar a canoa com o Pantanal, pude constatar que os joselandenses não
detêm o hábito de replantio da espécie utilizada, pois, segundo afirmaram, os
participantes da oficina, “nunca plantamos Cambarás, mas sabemos como eles
reproduzem, florescem, maduram a semente que cai e roda com as águas. É desta
maneira que nascem Cambarás”. Eles demonstram que há espaço para uma nova
prática, novo hábito, o de replantar e manejar o Cambará para a preservação do
saber fazer canoas, se a comunidade achar necessário e quando julgar ser oportuno.
Para essa gente, a florada do Cambará importa muito, ela é significativa, pois, no
dialogar com a natureza, eles interpretam a florada do Cambará como um sinal de
que se na cheia terá muita ou pouca chuva. Conforme informaram, “muitas flores
241
Também são conhecedores dos outros animais que, assim como eles, dependem da
existência dessa espécie pantaneira. Nas suas falas, os Mestres apontaram alguns
animais que vivem no Cambará. Segundo eles, “as abelhas gostam de fazer suas
casas nestas árvores, porque ela tem uma copa alta, e nas águas lá em cima se
torna um lugar bem seco, próprio para construir ninhos e moradias. Os tuiuiús
também gostam de fazer seus ninhos nas copas pelo mesmo motivo que as
abelhas”.
Até aqui persegui indícios do antecedente de uma canoa, quando o Cambará ainda
não sonhava em mudar sua forma de árvore para uma canoa, mantendo sua
essência de madeira de Cambará. Daqui para frente, porém, mostrarei o percurso do
ato transformativo pelas mãos humanas, melhor dizendo, do Cambará que doa a
vida vegetal para ofertar mobilidade, estética e arte para os pantaneiros significarem
sua vida nesse território úmido.
Aranha e Martins ( 009, p. 413) interpretam que “a arte é, sem dúvida, uma
pequena parte da cultura, no sentido antropológico”. Afirmam ainda que:
Esse saber transformar caule em canoa foi realizado através de uma Oficina no
tempo das águas ao ar livre, em que muitas pessoas da localidade se envolveram
nesse trabalho Entre os participantes, tivemos dois Mestres; um assistente dos
Mestres; um dos senhores mais velhos na comunidade; um jovem aluno da escola
local e aprendiz do fazer canoas e um empresário local que ajudou para que esta
Oficina fosse realizada (Imagem: 73).
242
Imagem 73: Participantes locais da Oficina do Fazer canoa. Fotos, João Quadros Ramos.
Mas foi o Mestre Jânio Gonçalves Correia Filho quem conduziu do começo ao fim o
processo desta canoa feita para o presente estudo. O Mestre relatou que só
descobriu que era um Mestre quando percebeu que sabia fazer canoas sozinho,
canoas sozinho, pois, ajudava o seu Mestre, o Sr. Zé Silva seu irmão mais velho, hoje
com 51 anos. Segundo Jânio, ”para ser um Mestre é preciso “vocação”, a pessoa tem
que ter o “gosto” de fazer. Se a pessoa não tiver gosto, pode até tentar fazer, mas
não vai prosseguir fazendo canoas. Tem que fazer o que gosta! Lavrar a terra e a
madeira”.
na seca, mas a sua retirada para um lugar mais aberto onde se possa fazer o
acabamento, deve ser com trator ou a cavalo, que isto é mais trabalhoso”.
Imagem 74: Fotografia “Procura do melhor tronco de Cambará”. Fotos, João Quadros Ramos.
244
Imagem 75: Fotografia “Estudo da altura e retidão do tronco para a melhor canoa”. Fotos, João Quadros
Ramos.
Os Mestres canoeiros revelaram que os mais velhos apontavam a lua crescente como
a melhor lua para cortar, derrubar o Cambará na crença de que, nessa fase lunar a
madeira ganharia maior durabilidade, maior sustentabilidade. “Na lua minguante a
madeira fica mais fraca, diziam os mais velhos”. Os Mestres em Oficina também
indicaram que “a madeira engrenhada [dura] pode durar mais tempo, e a madeira
mais fácil de talhar, macia [cortar] dura menos tempo”.
Imagem 76: Fotografia “Posicionando as estivas para a queda do Cambará”. Fotos, João Quadros Ramos.
Relataram os fazedores que “depois de derrubado o tronco, pelo peso, fica difícil
levantar do chão para o trabalho”. Pude observar que, dessa maneira, com as estivas
colocadas antes da queda do tronco, os fazedores puderam trabalhar com muita
mobilidade mesmo, pois manejavam o tronco com mais facilidade, virando-o de um
lado a outro. Segundo os Mestres, “as estivas podem ser feitas do próprio Cambará,
mas também é comum usar a Marmelada ou então de outra madeira qualquer”.
Assim constatamos que, na derrubada do Cambará escolhido como matéria para a
existência da canoa pantaneira, o Cambará cai lenta e estrondosamente na mata
alagada (Imagem: 77)!
246
Imagem 77: Fotografias “A queda do Cambará escolhido”. Fotos, João Quadros Ramos.
O passo primeiro depois da queda do tronco usa a mão do fazedor como forma de
medir em metro, para calcular o tronco de metro em metro e projetar o tamanho da
canoa (Imagem: 78). Essa ação matemática é realizada através de um galho fino e
comprido do próprio Cambará, a fim de se obter o comprimento da canoa, ou seja, a
medida necessária da popa (traseira) à proa (frente) da canoa em projeto.
247
Imagem 78: Fotografia “Canoa-matemática, medição do tronco para a existência da canoa”. Fotos, João
Quadros Ramos.
Imagem 79: Fotografias: “Feitura da alavanca que proporciona o movimento do tronco”. Fotos, João Quadros
Ramos.
Imagem 80: Fotografias “Limpeza do tronco para as medidas primeiras”. Fotos, João Quadros Ramos.
Toda medição é feita com uma linha de nylon guardada em um pote plástico,
contendo tinta de ‘pó de pilha’ da marca ‘Rayovac’, Segundo apontam os mestres,
somente essa marca serve como tinta fixadora para o registro das medidas que
entrarão em contato com a água, e assim imprimem marcas da medida no tronco
(madeira). Segundo os Mestres, essa tinta específica é eleita por não sair em contato
com a água, facilitando o esculpir matemático (Imagem: 81).
250
Atelier Água
‘Alinhar’ a canoa (projetar) é medir toda ela antes dos cortes esboçadores de uma
canoa. Para deixar essa marca, os Mestres também usam a linha sintética guardada
no pote plástico junto com pó de pilhas. Esse material tóxico, embora seja tóxico,
entra em contato direto com a mão do fazedor de canoa (Imagem: 82)121. O
alinhamento é feito para se ‘afeiçoar’ a canoa, ou seja, dar forma a ela. Outra
medida é tirada, outra linha é impressa, mas agora nas laterais do tronco, para
alcançar a altura da canoa.
121
O uso da pilha de fato é/deve ser uma preocupação, por esta razão deve ser trabalhada em
momentos educativos, de Educação Ambiental local, para que se busque alternativas não tóxicas para
gravar a medidas na madeira ao fazer canoas. Nesta pesquisa não se cumpriu a Oficina de Educação
Ambiental programada no Projeto de investigação, porém, mesmo não sido realizada, encontra-se na
programação pós-defesa.
251
Imagem 82: Fotografias: “Pó de pilha para deixar marcas que não saem na água”. Fotos, João Quadros Ramos.
Imagem 83: Fotografias “Primeiros cortes do tronco para a existência da canoa”. Fotos, João Quadros Ramos.
Depois do tronco cortado adquirindo a base reta, foi retirada a madeira nas laterais
do tronco, dando a forma inicial à canoa (Imagem: 84).
Imagem 84: Fotografias “O entalhe da canoa 1”. Fotos, João Quadros Ramos.
253
O tronco, agora com contornos de uma canoa, foi mais uma vez cortado em gomos
para ser cavado. A canoa já com cara de canoa (Imagem: 85), é hora de trocar de
Atelier! Até aqui o trabalho realizado foi no Atelier Água, agora é rumar para o de
Terra!
Imagem 85: Fotografias “O entalhe da canoa 2”. Fotos, João Quadros Ramos.
No Atelier (Água), a mão foi usada como parâmetro para as medidas, e o corpo
inteiro foi usado como força motriz para trabalhar o tronco nas primeiras formas de
canoa. As ferramentas industrializadas usadas nessa fase do processo de feitura
foram: i) o machado que cortou a parte mais pesada da madeira; ii) o facão que
cortou a parte mais fina; e iii) as cordas que amarraram as estivas. As ferramentas
artesanais improvisadas foram: i) o medidor que efetuou as medidas para alcançar a
precisão do entalhe; e ii) o espanador que limpou os espaços a serem trabalhados
(Imagem: 86).
254
Imagem 86: Fotografias “Instrumentos utilizados na fase Atelier Água do entalhe”. Fotos, João Quadros Ramos.
A ‘lima’ foi a ferramenta usada para afiar todos os instrumentos de corte no Atelier
Água e da lapidação da canoa no Atelier Terra (Imagem: 87).
Imagem 87: Fotografias “Lima, instrumento que afia os demais”. Fotos, João Quadros Ramos.
255
No Ateliê Água, pode-se chegar até a parte do alisamento da canoa que é feita com
o ‘enxadão’, mas o acabamento, o apuramento das formas da canoa devem ser
feitos em terra firme com a ferramenta chamada ‘enxó’. A ‘zinga’, uma espécie de
remo feita de taquara122,fornece apoio ao condutor da canoa para o deslizar pelas
águas, principalmente nas partes mais fundas dos caminhos d’água.
Chegou o momento de trocar de Atelier. Até aqui o processo de feitura foi realizado
no Atelier Água e, a partir daí, todo o trabalho foi feito no Atelier Terra! No
deslocamento para a troca de Atelier, a pré-canoa seguiu puxada por outro barco
pelos caminhos de água formados pela cheia e também pelo próprio escultor que
ofertava a direção da canoa usando a `zinga´. No passado, sem nenhum
aproveitamento no Atelier Água, ficaram os resíduos do Cambará tombado, bem
como restos de algumas outras pequenas árvores que também foram derrubadas
para o nascer da canoa (Imagem: 88).
Imagem 88: Fotografias “Resíduos da escultura da canoa na fase Atelier Água”. Fotos, João Quadros Ramos.
122
Espécie vegetal.
256
Atelier Terra
Primeiro foi organizado o espaço para receber a canoa depois. Foi preparada a corda
que ligou a canoa ao cavalo e cavaleiro, para serem conduzidos da água (líquido)
para a terra (seco). Assim que a pré-canoa foi disposta em terra firme, ancorada nas
suas estivas, novas medidas foram tiradas com a linha sintética e o ‘pó de pilha’
(Imagem: 89).
`cipio´ para alisar; o `arco de pua´ para furar (Imagem: 90); o ‘graminho’ para
marcar a borda e a ´cuia´, hoje, feita de garrafa pet ou lata reutilizada, para retirar
a água da chuva de dentro da canoa. Relembrando que esse fazer se dá no tempo
das águas [chuvas] e, como os Atelier´s são ao ar livre, todo o processo ocorre ou
pode ocorrer com ou sem chuvas.
Imagem 90: Fotografias “Entalhe-acabamento no Atelier Terra”. Fotos, João Quadros Ramos.
A canoa recebe cinco ou seis furos de cada lado do fundo do seu corpo, da proa à
popa, chamados de ‘cavias’. São feitos com ´arco de pua´, medidas que indicam a
profundidade da canoa, aproximadamente de dois dedos, para que a espessura dê
leveza à canoa, porque tira o peso da madeira. Depois os furos serão fechados com
pedaços de `Cedro´ mais ou menos em forma de ´pregos´ de madeira (Imagem:
91). São estes furos que determinam até onde se vai cavando o fundo da canoa.
Medir através de variadas formas e com diferentes instrumentos antes de determinar
a forma é uma atividade constante do fazedor de canoas, e para isso a mão oferta
os parâmetros de medida, e o pé sente as texturas e as profundidades.
258
O espírito racional, existente nos mestres da canoa, é quem pensa e calcula cada
gesto esculpidor, cada ação transformadora da matéria. É o espírito criador que
desliza nos gestos e ações calculadas para lavorar o projeto da canoa em canoa. O
espírito sensível ajuda o espírito racional a olhar, perceber, medir com o próprio
corpo em precisão, e o espírito sonhador, já está em projeções de outros fazeres.
Vídeo 01: Oficina “O fazer canoa”. Produção: João Quadros Ramos. Acesso em: (Drop Box):
Nesse Atelier, a mão também foi usada como parâmetro de medidas, o pé como
parâmetro de texturas e formas e o corpo inteiro mais uma vez se prestou como
força motriz para o trabalho de entalhar a canoa. As ferramentas industrializadas
usadas nessa fase do processo de feitura foram: i) o machado que cortou as partes
mais densas da madeira; ii) o facão e a faca que cortaram as partes mais finas; iii)
as cordas que puxaram a canoa; iv) o arco de pua que furou; v) o cipio que ofertou
textura lisa; vi) o enxadão e o enxó entalharam a madeira; e vii) a lima que afiou as
ferramentas. As ferramentas artesanais improvisadas usadas foram: i) a linha
sintética e o compasso que mediram e imprimiram marcas para alcançar precisão no
entalhe; ii) a alavanca que ofertou manuseio da peça para o entalhe; iv) o graminho
que tornou plana as bordas da canoa; e v) as cuias de lata e pet que ajudavam a
retirar a água de dentro da canoa, depositada pela chuvas (Imagens: 92 e 93).
Imagem 92: Fotografias “Instrumentos utilizados no entalhe-acabamento, fase Atelier Terra 1”. Fotos, João
Quadros Ramos.
260
Imagem 93: Fotografias “Instrumentos utilizados no entalhe-acabamento, fase Atelier Terra 2”. Fotos, João
Quadros Ramos.
Como já foi enfatizado, ao fazer canoa, o corpo todo se torna em ferramenta para
entalhar, e, segundo o Mestre Jânio, “a parte do corpo que mais é forçada no
processo fazedor é a coluna”. Ainda explicou o Mestre que “o momento do fazer que
mais afeta a coluna, ocasionando dores, é o trabalho com o enxadão”, acabamento.
Vale ressaltar que esse entalhar a madeira bruta na busca da melhor forma é um
trabalho pesado, porque se pôde constatar que, com o corpo por muito tempo em
posição abaixada, os Mestres chegam à forma final da canoa. Por essa razão,
importa que se faça este entalhar em mais de uma pessoa dividindo o trabalho do
entalhe da madeira, o que significa ou pode significar menos dores, um saber fazer
junto para um bem viver, um estar junto maffesoliano!
interativas, feito afetos, emoções, sensações que constituem, stricto sensu, o corpo
social”. Por fim Maffesoli (IBDEM, p. 13) revela que “o sentir comum, é um bom
meio de elaborar nossos olhos, sentimento partilhado. Uma estética
descompartimentada permite compreender estar-junto desordenado, versátil,
inatingível: a sociedade”, e eu acrescento, o grupo social.
Acompanhando esta Oficina do fazer canoas, pode-se constatar que todo o trabalho
de esculpir a madeira bruta é destinado aos homens em Joselândia, mas o uso dela
se destina aos moradores do complexo comunitário como um todo. Segundo
informações obtidas através das conversas, entrevistas abertas, é sabido por eles
que a origem da canoa é indígena, porém, afirmaram que essa história nunca foi de
fato contada por lá.
Muitos fazedores guardam o saber fazer canoa, fazendo-as somente para uso
familiar; apenas cinco fazedores são considerados Mestres no saber fazer na e pela
comunidade. Uma das pessoas mais velhas em Joselândia123 contou que sempre fez
para o uso da sua família, e que seu pai também sempre fez canoas com esta
mesma intenção de uso familiar.
Os Mestres do fazer só fazem canoas para além do uso familiar se for solicitada
alguma encomenda. Nesse complexo comunitário, não existe o hábito de fazer
canoas para colocar à venda em algum estabelecimento dentro dos limites da
comunidade, nem fora dela. As encomendas são advindas dos próprios moradores de
Joselândia, tanto da sede São Pedro como das demais comunidades. A média anual
de encomendas de canoas gira, aproximadamente, entre quatro a cinco canoas ao
ano, e o ápice ocorre, segundo informações dos Mestres em Oficina, com a chegada
123
Fevereiro de 2011 com 96 anos.
262
Imagem 94: Fotografias “Caminhos de água na cheia, desenhadores da necessidade da canoa”. Fotos, João
Quadros Ramos.
Nem todos os Mestres possuem ferramentas adequadas para fazer canoas, mas para
superar essa questão, eles próprios desenvolveram um sistema de empréstimos
entre eles. Então, mesmo um Mestre que não possui ferramentas para a empreita de
transformar a madeira em canoa, pode fazer o trabalho. Somente um dos Mestres
possui todas as ferramentas necessárias, e os demais possuem somente algumas
delas.
para sentir, já está acontecendo, quanto mais desmatamos, mais atrasa as chuvas
[águas]”, afirmam os canoeiros.
E por fim, acompanhando o fazer canoa, pode-se constatar que é usado o tronco do
Cambará para fazer canoas, porém há outros usos locais dessa espécie. É costume
em Joselândia transformar a madeira do Cambará em mourões usados em cercas;
vigas, ripas e tábuas para fazer casas e currais; e a casca é usual para fazer chá a
fim de combater a tosse.
Podemos afirmar que uma canoa feita em Joselândia nunca é igual à outra, mesmo
feitas pelo mesmo fazedor (Imagem 96)! Um fazer pode ser bem feito, um bem
fazer, que pode se revelar um belo e interessante fazer artesanal. Esse bem fazer
pode ganhar volume e se tornar um bem comum, um bem público e um bem
cultural, podendo, inclusive, se tornar um bem econômico, mantendo, contudo, o
foco no viés de ajudar a pensar e projetar outras paisagens, outros comércios,
outras formas de se conceituar o lucro, o sentido de investimento.
Um bem que pode animar a alma, despertar sonhos e provocar espíritos fazedores,
usuários, professores e estudiosos que tenham como mote a sustentabilidade do
lugar de morada. Como lembra Milton Santos ( 009, p.39) “o sonho que obriga o
124
Cartografia da Canoa realizada em Oficina-pesquisa com os Mestres da Canoa.
265
Imagem 96: Fotografia “Canoa, objeto da arte popular mato-grossense”. Foto, João Quadros Ramos.
Arte é também expressão que desvela sensibilidade estética local e própria, ou seja,
não é uma estética somente com fins econômicos, como propõe o mundo industrial-
capital. Não é somente como uma estética massificadora com fins globalizadores
nem uma estética que atenda à demanda da indústria cultural de serviços para o
turismo, por exemplo. Os produtos populares, tradicionais são feitos para atender,
numa primeira instância, às necessidades da vida cotidiana de uma comunidade e,
concomitante, desenham valores estéticos dessa gente.
A arte reconhecida como popular comunica uma identidade local, uma tradição, um
jeito próprio de ser e estar historicamente construído (HALL, 2005), contado pela
266
ótica de um fazedor inserido num grupo social ou sociedade, que é o artista popular,
reconhecido como tal ou não, através da sua criação. Posto isso, o produto da arte
revela um ser humano na perspectiva do feito à mão.
Boaventura (Santos, 00 , p. 11) afirma que “os objetos artesanais estão muito
próximo (e eu acrescento, junto) à natureza. Eles usam materiais disponíveis nas
diversas regiões: o barro, a pedra, a madeira”. E Müller ( 00 , p. 7) revela que:
Aqui a busca se desenhou pelas iconografias que ecoam do imaginário artístico dos
fazedores de arte – os artistas, assim como uma espécie de “olho de dentro”,
“imagens que penetram, catalisam e resultam numa certa estética” (GUIMARÃES,
2007, p. 158 e 159). Como reforça a mesma estudiosa da arte mato-grossense
mencionada acima ( 007, p. 165), “O elo que se constrói entre fruta – bicho – mato
e homem, a primeira vista, pode parecer banal. Diria até que nem aparece. É de
125
Espécie de Palmeira.
269
certa forma invisível”. Mas as imagens artísticas são intensas pela presença, sejam
nas ruas, nos livros, nos trabalhos científicos e nas teses. Teixeira e Porto (2004, p.
11) ao se remeterem aos desenhos de uma pesquisadora, feitos em pesquisa, um
território artístico-científico inspiradores do tema de um Fórum, território científico
sobre “Violência simbólica na escola”126, alertam quanto a esta presença da imagem
em diálogo:
Considerando essa presença intensa da imagem artística no seu papel falante via
idioma universal (QUADROS, 2004) seja nos livros ou a céu aberto, empreendeu-
se este inventario artístico mato-grossense bibliográfico e não bibliográfico, na
ideia de perseguir indícios de uma canoa identitária.
126
Desenhos já mostrados nas p. 64 e 65 desta tese.
270
Imagem 97: Desenho “Gravuras do fazer canoa 1”. Gravura, Florence (1997, p. 270).
Imagem 98: Desenho “Gravuras do fazer canoa 2”. Gravura, Florence (1997, p. 270).
271
Imagem 99: Pintura “Índio pescando em cima de uma canoa”. Pintura, Machado (2008, capa).
Na capa da obra de Siqueira (2002), que aborda sobre a história de Mato Grosso,
encontrei uma imagem provavelmente pintada, que mostra os batelões127 em
tempos de bandeira (Imagem: 101).
127
Uma canoa para muitas pessoas.
273
Imagem 102: Fotografia “Canoa na pintura de Clóvis Iriguaray”. Foto, Figueiredo (1990, p. 29).
Imagem 103: Fotografia “Canoa na pintura de Gervane de Paula”. Foto, Figueiredo (1990, p. 40).
275
Imagem 104: Fotografia “Canoa na beira do rio, fotografia de José Maurício”. Foto, Figueiredo (1990, p.
62).
Imagem 105: Pintura “Pescadores com canoas na obra Geracy Bianchini”. Foto, Figueiredo (1990, p. 61).
Imagem 106: Arte “Canoas na obra de Benedito Filho”. Foto, Figueiredo (1990, p. 64).
277
Imagem 107: Arte “Canoas-onça, canoas-casas e canoas-fé nas obras de João Sebastião”. Fotos, Figueiredo
(1990, p. 123, 125, 128 e 130).
Vídeo 02: Vasculhar imagético escrito e icnográfico artístico-cultural. Produção: Imara Quadros. Acesso em:
(Drop Box): https://www.dropbox.com/sh/g4gm0khukt399ne/tqtSS8Ru2I e (You Tube):
https://www.youtube.com/watch?v=MqELiRYBTrI
278
Ludimila Brandão (2007, p. 10), ao abordar sobre a obra “Arte na rua”, revela que é
“uma arte que não se esconde nos museus, que não se guarda para poucos, que é
apropriada também pelas classes populares, capazes de usufruir dela de forma que
essa experiência estética repercutisse em seus problemas essências e os auxiliasse a
lidar com eles [...]”. Ao abordar sobre a obra “Arte na rua” revela que é “uma arte
que não se esconde nos museus, que não se guarda para poucos, que é apropriada
também pelas classes populares, capazes de usufruir dela de forma que essa
experiência estética repercutisse em seus problemas essências e os auxiliasse a lidar
com eles [...]”. E Guimarães ( 007, p. 7) também contorna essa arte posta nas ruas
em Cuiabá [capital mato-grossense], a céu aberto, “espalhando-se pelos muros,
prédios, viadutos, ônibus, caminhões de lixo, entre outros suportes, essa arte visual
não só educou um olhar para fazer o visível, como fixou e constituiu uma iconografia
nos termos de uma estreita relação entre arte, natureza e identidade”.
Seguindo pelas vias da capital, encontrei, em uma das avenidas uma escultura que
mostrava a canoa acompanhada de um índio com seu pescado (Imagem: 108).
Imagem 108: Fotografias “Escultura com a presença da canoa na Av. Fernando Correia”. Fotos, João Quadros
Ramos.
280
Passando por uma feira popular no setor comercial bastante frequentada pela
população local, encontrei, nas paredes de um dos boxes que comercializava
material de pesca, uma pintura provavelmente de um artista popular que revelou a
canoa na ambiência pantaneira, exibindo um pescador na canoa (Imagem: 109).
Imagem 109: Fotografias “Pintura com a presença da canoa no Mercado do Porto”. Fotos, João Quadros
Ramos.
Imagem 110: Fotografias “Intervenções com a presença da canoa no Shopping Três Américas”. Fotos, João
Quadros Ramos.
Imagem 111: Fotografias “Canoa de vidro na entrada do cinema no Shopping Pantanal 1”. Fotos, João Quadros
Ramos.
Imagem 112: Fotografias “Canoa de vidro na entrada do cinema no Shopping Pantanal 2”.Fotos, João Quadros
Ramos.
alimentação. Uma delas, uma fotografia em preto e branco, revela a canoa que exibe
pescadores no rio, acompanhada de um poema do poeta Manoel de Barros, expostos
em um grande painel no espaço onde ficam as mesas do restaurante (Imagem:
113).
Imagem 113: Fotografias “A canoa no Restaurante Serras no Shopping Três Américas”. Fotos, João Quadros
Ramos.
Imagem 114: Fotografias “A canoa na ambientação do Restaurante Vale Verde no Shopping Pantanal 1. Fotos,
João Quadros Ramos.
Imagem 115: Fotografias “A canoa na ambientação do Restaurante Vale Verde no Shopping Pantanal 2. Fotos,
João Quadros Ramos.
285
Imagem 116: Fotografias “A canoa na ambientação do Restaurante Vale Verde no Shopping Pantanal 3. Fotos,
João Quadros Ramos.
Vídeo 03: Vasculhar icnográfico artístico. Produção: Imara Quadros. Acesso em: (Drop Box):
Posso ressaltar que, com essas andanças, constatei que a canoa foi encontrada em
diferentes obras bibliográficas da cultura local, do passado ao presente, bem como
em variados lugares, em diversas versões, deliberando um entendimento de que a
canoa se coloca como um forte elemento identitário para além de Joselândia e do
Pantanal mato-grossense, para muito além do preço econômico da canoa pantaneira,
das obras artísticas que revelam canoas e para muito além de quem destrói o
ecossistema e biodiversidade em nome do lucro, para muito além de qualquer
imposto, prêmio ou pagamento que acredite poder precificar uma identidade cultural
que nasceu da mais forte relação humana entre natureza e cultura.
O Pantanal, como um todo, se coloca como uma importante reserva de água doce,
abrigando espécies e mantendo vidas humanas e não humanas. Então, deve
importar muito também a parte brasileira dessa área úmida, bem como o Pantanal
Norte, que se encontra em território mato-grossense. Se assim for considerado, o
Pantanal de Joselândia, como parte desse grande Pantanal, deve importar muito
para a humanidade.
Segundo estudos do World Wide Fund – WWF, The Nature Conservancy – TNC e o
Centro de Pesquisas do Pantanal - CPP que objetivam conhecer a saúde pantaneira
(presente) para revelar possíveis problemas (futuro), resultantes do efeito das
mudanças climáticas, por exemplo, afirmaram que esse ecossistema é “importante
frente ao futuro incerto das mudanças climáticas” (SALLES, 2012, p.8).
percorrido e encontrado pelas águas das nascentes dos rios envolvidos na empreita
até chegar ao complexo de Joselândia.
Mas logo nos primeiros passos da descoberta, percebi mais uma vez ser impossível
percorrer todos os rios emoldurantes do Pantanal de Joselândia , o Cuiabá e o São
Lourenço. Empreendi, então, um recorte devido ao tempo e logística para realizar tal
empreita expedicionária. A opção foi ficar com parte do Rio São Lourenço, da
nascente até um pouco antes de iniciar a descida para a planície pantaneira, o
restante encontra-se a caminho, mas não dará tempo para este presente estudo
(Imagem: 117).
Imagem 117: Mapa pictórico “Expedição dos rios chegantes na cheia de Joselândia”. Arte: Imara Quadros.
Essa expedição exploratória, que percorreu da nascente do rio São Lourenço até um
pouco antes de iniciar a descida ao Pantanal, mostrou-me a importância das águas
nascentes e correntes no ecossistema vizinho do Pantanal, o Cerrado, do qual
também depende a saúde pantaneira. Essa expedição, ao conhecer minimamente as
águas chegantes da cheia pantaneira, mapeou alguns impactos sofridos nesse
289
O rio São Lourenço nasce na cidade de Campo Verde, em Mato Grosso, passa pelo
município de Dom Aquino, atravessa a cidade de São Pedro da Cipa e encontra com
o rio Areia, que passa pelo município de Juscimeira. Essa soma líquida corre para
contribuir com suas águas na Bacia do São Lourenço. As águas que passam pelo
município de Jaciara também seguem para o encontro do São Lourenço. O rio
Vermelho, que passa pela cidade de Rondonópolis, parte sul do estado mato-
grossense, encontra com o São Lourenço para, juntos, engrossarem as águas
pantaneiras, compondo a Bacia do rio São Lourenço (FERREIRA, 2001).
128
Granja 1, 2 e 3.
290
Imagem 118: Fotografias “Nascente do rio São Lourenço”. Fotos: Imara Quadros e Hélio RamosCaldas.
Em visita a essa granja, pude observar que apresenta galpões, provavelmente para
frangos e muitas plantações de eucalipto, inclusive muito próximos às margens da
mata ciliar onde é apontada a nascente do São Lourenço. No entorno da Granja da
Sadia é encontrado um cemitério e, como moldura, esse município revela não só
cenário industrial, como latifundiário com extensivas plantações de soja, algodão,
milho, eucalipto e cana de açúcar, com tudo o que este quadro revela.
Saindo de Campo Verde em direção a Dom Aquino, passei pelo córrego Barroso,
também rodeado de plantações de cana; pelo rio Parnaíba; pela estação
hidromineral Guarani de água fluente, com uma empresa instalada ali, que engarrafa
e vende a água da marca Puríssima.
Imagem 119: Fotografias “Passagem do São Lourenço por Campo Verde e Dom Aquino”. Fotos: Imara Quadros
e Hélio RamosCaldas.
Ainda na MT-344, há outra ponte sobre o rio São Lourenço. Em seu entorno, não se
tem cidade, mas está bastante próxima às cidades de São Pedro da Cipa e Jaciara.
Nesse percurso, além da estrada e seus problemas, deparei-me com grandes
plantações de cana de açúcar. De um determinado ponto da estrada, logo se avista
ao longe uma baixada captadora das águas para continuar correndo rumo ao
292
Ao sair da MT-344, passei pelo trevo de Jaciara, onde se encontra a entrada para a
BR-163, sentido Rondonópolis, sul do estado de Mato Grosso. A primeira cidade por
onde passei a partir deste ponto foi São Pedro da Cipa, onde o rio São Lourenço
atravessa enfrentando as problemáticas que advêm dos centros urbanos. Depois de
São Pedro, está o município de Juscimeira, por onde passa o rio Areia, o qual
também deságua no São Lourenço mais à frente (Imagem: 120). O rio Vermelho,
que passa por Rondonópolis, também deságua no São Lourenço, mas esse trecho
não foi possível terminar, está a caminho, pois, ao iniciar a expedição nesse
percurso, percebi que necessitava de apoio logístico bem maior do que o realizado
até aqui, e naquele momento isso não seria possível projetar e empreender129.
129
Quanto a continuidade desta expedição, no final do ano de 2011 e no desenrolar de 2012 foram
realizada visitas informais a alguns trechos, um deles foi o encontro do São Lourenço com o rio
Vermelho, e o outro, foram outros trechos do São Lourenço. Estas pesquisas exploratórias foram
feitas com a ajuda de alguns professores, colegas do Instituto Federal de Mato Grosso –
IFMT/Campus de Rondonópolis foram eles: Professor Pedro Barros (Diretor Geral da Escola),
Professor Wilson José Soares (Professor de Geografia), Professor Benjamin Rodrigues Ferreira (então
Professor de Literatura da Escola, hoje da UFMT/Campus Roo) e o Prof. Valter Cardoso da Silva
(Professor de Filosofia). Os custos destas empreitas exploratórias saíram dos próprios professores que
dividiram e ou assumiram o total dos gastos; primeiro pelo prazer em participar da pesquisa, e depois,
porque esta experiência primeira já estava rumando para se tornar um projeto de pesquisa
exploratória da escola em parceria com o GPEA/UFMT. A ideia estava amadurecendo para a
montagem de um Projeto que percorreria o Rio Vermelho da nascente ao encontro com o São
Lourenço, e da nascente do São Lourenço ao encontro com o Vermelho em uma primeira etapa, e na
segunda, deste encontro de rios ao Pantanal de Joselândia. Só que neste processo encontrei alguns
impactos de ordem familiar associados a possibilidade de ter que ser removida para um dos Campus
de Cuiabá, assim, a ideia ficou adormecida, aguardando novos impulsos. Quem sabe possa se
desenhar melhor após a defesa do Doutorado, considerando que pesquisar não se esgota em um
percurso de doutoramento.
293
Imagem 120: Fotografias “Passagem do Rio São Lourenço por São Pedro da Cipa”. Fotos: Imara Quadros e Hélio
Ramos Caldas.
O quadro encontrado nesse fragmento do rastro líquido do São Lourenço foi muito
parecido com os apontados pelos estudos do WWWF, TNC E CPP (SALLES, 2012,
p.8). Encontrei a nascente e o próprio rio São Lourenço, desrespeitado como
importante para a bacia pantaneira, portanto, Pantanal. Encontrei no percurso
percorrido indústrias na cabeceira e no percurso do rio, cidades, latifúndios do
agronegócio, dragas para retirada de areia, estradas estaduais e federais sem
corredores ecológicos e em péssimo estado de conservação. O encontrado desvela a
ligação íntima do grupo humano com a canoa pantaneira de Joselândia. Ligação que
exibe um prolongamento dos eixos indústria-comércio-consumo-compra-venda-uso-
destruição ambiental- socioambiental (Imagem: 120a). Mostra as cidades com toda a
294
130
Imagem 120a: Uso e consumo. Imagens retiradas Google imagens trabalhadas com efeitos artísticos.
130
Acesso disponível em: https://www.google.com.br/imghp?hl=pt-BR&tab=wi.
295
131
De onde vem a canoa de Joselândia feita de um tronco só, e para onde vai?
297
Não há receitas para se fazer pesquisa, do contrário, não seria pesquisa, pois pesquisar é
Aqui revelo a emergência poética na ciência que se desenhou pelo desvelar do meu
caminho-caminhada pela investigação que não se despiu da dimensão poética da
criação artística para tecer ciência, assim uma tessitura que buscou bordar de
maneira sensível, crítica e criativa uma ciência enriquecida pelo artístico-científico.
Como lembram Sato e Passos ( 006, p. 7), “Somos o estofo do mesmo mundo e da
mesma massa estelar do universo. Minha mundianidade é também minha
essencialidade”.
contribuir com um mundo, uma vida mais sustentável onde os polos da justiça social
exibido pela internet132, aborda o entrelaço dos problemas ambientais com a justiça
não se encontra separado do humano. Desvela ainda que a ciência atrelada aos
Ainda chama a nossa atenção para o fato de a Educação Ambiental hoje se voltar
mais para além dos muros da escola, ou seja, se presentifica também nas empresas,
comunidades.
“saber científico e saber popular” e até mesmo entre “Ciência e Poesia- Arte”. Em
Foi posicionada neste rumo que caminhei pelas trilhas científicas sem ter que
abandonar o artístico, desenhando, assim, uma ciência-artística poética. Dessa
forma, enriqueci, modifiquei ao caminhar e, certamente, também tocarei o leitor da
minha jornada. A tessitura nascida desta trilha científica-aventureira residiu na
superação, na ousadia e no enfrentamento de complementariedade, na produção
132
Acesso disponível:
http://cienciahoje.uol.com.br/podcasts/Educacao%20ambiental%20em%20foco.mp3#clique-abaixo-
para-ouvir
301
Segundo Sato e Passos (2006, p. 19), as Ciências e Poesias “Lutam pela vida contra
a satisfação mortal”; e ainda apontam que “é necessário romper com a dicotomia do
espírito e da matéria, permitindo que os sujeitos da EA pensem com os corações, ou
seja, é necessário unificar a racionalidade na sensação, oferecendo,
simultaneamente, o estranhamento ao lado do maravilhamento”.
Os diferentes textos no corpo desta pesquisa - texto escrito e texto imagem, foram
tratados com mesmo peso e força, e apenas se revelaram por meio de linguagens,
ou melhor, por linguagens específicas em complementariedade, comunicando de
forma enriquecedora, contribuindo com a audiência do texto científico, costurados
pela imaginação criadora que transita livre pelos dois territórios, ciência e arte.
Segundo o pensamento bachelardiano, a imagem é resultante de uma construção
mental que tece as compreensões, que acabam se revelando por meio de diferentes
linguagens e, por isso, comunicam, tocam outras almas andantes.
pois, é produto do amor pela pesquisa, do amor pela vida, é compreender mundo.
Assim, posso melhor compreender a existência do outro igual ou diferente de mim,
então, compreensão.
Imagem 121: Desenho e fotografia “desenhando e pensando a canoa de Joselândia”. Fotos, João Quadros
Ramos. Arte, Imara Quadros.
133
BARBOSA, Ana Mae. Política cultural como prefácio. In: O Museu de Arte Contemporânea da
Universidade de São Paulo. São Paulo: Banco Safra, 1990.
134
BARBOSA, Ana Mae. Inquietações e mudanças no Ensino da Arte. São Paulo: Cortez, 2008.
135
BREDARIOLLI, Rita Luciana Berti. XIV Festival de Inverno de Campos do Jordão: variações sobre
temas de ensino da arte. Tese (Doutorado). São Paulo: ECA-USP, 2009. Acesso disponível
www.teses.usp.br/teses/disponiveis/27/27160/.../1706152.pdf.
304
Esta proposta desloca a ênfase modernista (fazer por fazer) para apreciação,
ampliando os campos da arte para além do muro escolar e alargando o dialogo de
arte do fazer para os aspectos: ler e contextualizar (Imagem: 121 a), por considerar
de extrema importância a “alfabetização para a leitura da imagem artística”
(BARBOSA, 1998; RIZZI, 1999; ANJOS, 2010136).
Imagem 121 a: Diagrama “Proposta Triangular” (Ana Mae Barbosa, arte educadora brasileira).
FAZER ARTE
Expressão-Criação
artística
LER ARTE
Fruição, Leitura Estética
CONTEXTUALIZAR ARTE e Artística, mas
Ambiencia sociocultural também de outros
aspectos como a
e entrelaçamentos, natureza/ambiente
incluindo a (Apreciação -
natureza/ambiente Observação/Crítica/Cog
nição)
136
Anjos, Ana Cristina Chagas dos. Arte-Educação e Educação Ambiental. Uma reflexão sobre a
colaboração teórica e metodológica da Arte-Educação para a Educação Ambiental. Dissertação
(Mestrado). São Paulo: ECA – USP, 2010. Acesso disponível:
http://www.pos.eca.usp.br/sites/default/files/File/dissertacoes/2010/2010-me-anjos-ana.pdf
305
época, que a educação escolar que ela vivenciou foi de “abafamento” e “modelagem”
no sentido de fôrmas. Então, ela aprendeu que a educação poderia ser libertadora. E
foi isso que também aprendi com Paulo Freire, e certamente compreendi melhor
através dessa empreita investigativa-aprendizagem, que a arte, na formação-
aprendizagem de corações e mentes, pode ser bastante interessante, se considerada
para além da escola.
Barbosa ( 006) ainda alerta que “é preciso desenvolver o país culturalmente. Arte é
uma fatia enorme da produção humana. E com uma vantagem imensa de rever cada
época. Diferente do fato, o objeto arte permanece para ser revisto, relido ou
reconcebido. Isso é essencial: operar no mundo com conhecimento”. A estudiosa da
arte educação critica quanto à ausência de políticas públicas para a presença da arte
educação escolar:
Não há políticas públicas. Uma das minhas grandes decepções com o
atual Ministério da Educação é o silêncio absoluto sobre Arte-
Educação, sobre a função da Arte. E, no ministério anterior, só se
pensou em normatizar, parâmetros mínimos. O que é a mesma coisa.
Não serve para nada, não funciona.
A estudiosa da arte educação afirma que faltam políticas públicas para que a arte se
desenhe na educação escolar. Mas, o que dizer no âmbito não escolar? Assim
entendendo, posso considerar a continuidade como marginalidade-invisibilidade da
arte no bojo dos conhecimentos humanos dentro e fora da educação escolar.
à obra de arte criada na formação para além dos limites da escola, pois todo este
envolvente, ou seja, as fases do processo criador, os saberes envolventes, suas
ligações com a natureza, o objeto criado em si, o significado cultural, o imaginário
não possuem fôrmas. Ao contrário, ofertam caminhos para os caminhantes desejosos
em manterem-se atualizados, e assim, manter a vida atualizada.
Paulo Freire (1979, p. 71), ao abordar a alfabetização como um ato criador, aponta
subsídios para uma reflexão na aprendizagem criativa:
Imagem 122: Fotografia “tronco cortado de um Cambará”. Foto, João Quadros Ramos.
Toda a imagem artística tem sua gênese em um lócus, no sentido de ser um ponto
de/para a criação da imagem e está enraíza para o arvorizar, que é o devaneio e
posteriori a criação. No caso das imagens artísticas criadas a partir desta pesquisa
em específico, o lócus esteve ancorado nos saberes envolventes do fazer canoas
pelos Mestres canoeiros do Pantanal de Joselândia. Esse saber tanto foi/é objeto da
minha investigação científica, como é um saber popular, tradicional dessa gente,
neste lugar mato-grossense. Aranha ( 009, p.55) afirma que “A linguagem, em
específico a artística, é um instrumento que nos permite pensar e comunicar o
pensamento, estabelecer diálogos com nossos semelhantes e dar sentido a realidade
que nos cerca, inclusive o/no científico”.
Então, este foi o lócus de Ressonância, que, no eco, foi escutado, provocando o meu
movimento de criação artística – uma alma tocada pelo convite de aprofundamento
da existência humana, um coração aprendente, sedente de atualização – consciente
dela, que escutou, deixando que esta escuta da ressonância do lócus se enraízasse
no seu ser, tornando-se seu, nosso. A ressonância do lócus fez brotar a imagem
artística, uma linguagem que expressa e comunica, “toca outras almas”, outros
corações. Assim, a imagem artística criada a partir da ressonância do lócus, é um ser
novo, ou seja, a alma tocada pela ressonância do lócus, agora na imagem criada,
tornou dele o que expressou – “expressão criando o ser”. A repercussão da imagem
artística criada, desperta abrindo espaço, numa espécie de convite ao sentir/a
309
escuta, despertando assim, outra alma/outro coração, que, tocado, fará da imagem
apreciada a sua imagem (BACHELARD, 1993). Compreendendo desta maneira,
somente na junção da ressonância-repercussão, é que o desenho do poder, da força
poética dinamizadora de corações e mentes em nós se efetivará.
Imagem 123: Desenho “Uma poética artística da cartografia ecossistêmica da canoa 1”. Arte, Imara Quadros.
310
Compreendi todo o processo de feitura deste objeto, a canoa, com os Mestres. Com
eles constatei que todo o fazer se realiza ao ar livre, nos Atelier´s “Água” (mata
baixa/Cambarazal) e “Terra” (terra alta/firme e seca) e todos os saberes envolventes
neste ato escultórico.
Assim, na arte abaixo (Imagem: 124), o sol a lua e as estrelas apontam o processo
do fazer que foi conceitual e sonhante, formante, deformante e transformante. As
gotas d´água, a semente, as flores e folhas expressam os saberes envolventes que
tocam esse fazer, parte do dialogar entre natureza e cultura. O ser humano e a
canoa evidenciam os serviços ecossistêmicos, a forte ligação entre o ser humano e
natureza.
311
Imagem 124: Desenho “Uma poética artística da cartografia ecossistêmica da canoa 2”. Arte, Imara Quadros.
O olho amarelado do tempo presente indica boa ou má florada. Flores anunciam as águas do céu.
Chuvas bailam a alegria do tempo! O passado indica a melhor lua.
Pés mergulhados nas águas que desceram dos céus, que se adentram nas entranhas da terra para
o gozo da cheia.
Corpos em uníssono dão forma outra a mais bela, reta e alta árvore!
Lágrimas de suor corporal seguem ao encontro das águas do chão, um choro corporal pelo rito de
passagem.
Sons cantam a morte e encantam a fé do novo que chega. Um tronco de Cambará sonha ser
canoa, e uma canoa, guarda o passado na memória!!!
O Cambará ser vivo vegetal, se torna agora corpo de um ser vivo animal! Num ato nobre de pura
criação, se torna arte de um lugar.
Canta o silêncio do ciclo vital, entoa o verbo deslizar, desenha linhas que se apagam na flor d’água
e esculpe sonhos de um melhor viver.
Imagem 125: Esquema “Caminho cíclico da criação da imagem”. Concepção, Imara Quadros.
Compor imagens demanda uma certa ação, um ato corporal, primeiro desejante do
jogar-se no/ao mundo. Em seguida, ao terminar a composição, já lançado, passa a
compreender melhor o mundo vivido, desenho do mundo inteligível. Assim, compor
imagens, uma experiência de alguém, do fazedor de imagens (Imagens: 128), torna-
se bojo de imagens-arte que declara o mundo pela ótica do fazedor. Uma vez
atualizado pela imagem criada, o ser fazedor que aprendeu sobre si mesmo
aprendeu também sobre o outro no mundo com ele e sobre o próprio mundo em que
vive. Assim, todo o ciclo renasce para mais uma jornada aprendiz feliz (Imagem
125)! Este processo é contínuo e lento, movido pelo pulsar dos pensamentos
conceitual-imagético (BACHELARD, 1990; RICTHER,2008).
315
Imagem 129: Esquema “A imagem criada, uma força provocadora”.Concepção, Imara Quadros.
O termo imaginário não revela “fácil delimitação”, e o “uso mais frequente da palavra
no século XX pode ser atribuído ao desagrado com relação ao termo “imaginação”,
entendida como faculdade psicológica”, segundo Wunenburger ( 007, p. 8). Para
este estudioso (2007, p.11), imaginário é:
Foi empreendendo um esforço para tecer a minha palavra poética vestida de rigor
científico e densidade acadêmica em complementariedade, que enfrentei o meu
maior desafio, e certamente o mais difícil da minha formação científica.
Assim cheguei a este momento, nesta frase, nestas palavras que não representam o
final, porque seguem para muito além das regras ortográficas da Língua Portuguesa
e para muito além dos limites da tela deste computador que hora escrevo, da folha
impressa que conterá esta tese, do próprio produto final da tese. É um ponto que
demarca o início de novos e outros voos, no limite exato entre superar o aprendido e
se posicionar para o novo. Eis o exercício de que um novo espírito científico,
ancorado no paradigma da pós-modernidade, necessita.
Eu tinha vontade de fazer como os dois homens que vi sentados na terra escovando osso. No
começo achei que aqueles homens não batiam bem. Porque ficavam sentados na terra o dia
318
inteiro escovando osso. Depois aprendi que aqueles homens eram arqueólogos. E que eles
faziam o serviço de escovar osso por amor. E que eles queriam encontrar nos ossos vestígios
de antigas civilizações que estariam enterrados por séculos naquele chão. Logo pensei em
escovar palavras. Porque eu havia lido em algum lugar que as palavras eram conchas de
clamores antigos. Eu queria ir atrás dos clamores antigos que estariam guardados dentro das
palavras. Eu já sabia também que as palavras possuem no corpo muitas oralidades remontadas
e muitas significâncias remontadas. Eu queria então escovar as palavras para escutar o
primeiro esgar de cada uma. Para escutar os primeiros sons, mesmo que ainda bígrafos.
Comecei a fazer isto sentado em minha escrivaninha. Passava horas inteiras, dias inteiros
fechado no quarto, trancado, a escovar palavras. [...] (BARROS, 2010, p.5).
Isto tudo aí em cima, não é uma canoa, não são flores e tão pouco, é um caracol.
Será afinal como meus olhos percebem Mas está escrito ao contrário... Uma linguagem
contrariando a outra convida à fatal pergunta: quem fala a verdade? Haverá uma verdade? É
possível que o texto ainda se constitua como centro do intelecto, mas no jogo da diversidade, a
periferia também tem muito a expressar... Novas formas de se fazer ciência são possíveis: a poesia
vive!
137
Como a Cartografia de Sato foi a fiel companheira de pesquisa, usarei daqui por diante as
referências as citações deste documento no rodapé, com intento de contribuir com a fluência da
leitura. No caso, esta citação é encontrada em Sato (2011, p. 1).
321
Sato propõe que devemos então esperar de uma pesquisa em campos pós-
modernos. Nesse sentido, revela a estudiosa: “É só um texto de cunho científico-
poético fruto de uma pesquisa em Educação. Um texto que busca retratar uma das
faces em estar no mundo: um fazer e pensar pesquisa em educação ambiental” Sato
(2011, p. 1). Ainda considera a estudiosa na mesma página que uma pesquisa em
EA “é uma contribuição de alta magnitude, desde que o conhecimento científico
colabora com o que podemos alicerçar para o nosso futuro”. Sato, na sua
Cartografia, incentiva que “os pesquisadores reinventem a palavra...”138.
138
(SATO, 2011, p. 1).
322
Assim foi com a Cartografia do Imaginário criada e publicada por Michèle Sato. Elegi
esta Cartografia para ocupar um lugar na minha mochila epistemológica, a qual foi
aberta conforme as tantas necessidades enfrentadas. A companhia da “Cartô de
Sato” me fez acreditar por todo o percurso que esse texto-estudo-cartografia havida
sido produzido “só” para que trilhasse corajosamente, que andarilhasse sem medo
pelos caminhos da grande e audaciosa viagem empreendida. Segundo o documento
cartográfico ( 011, p. 1), “a liberdade de escolha é algo também para ressignificar
139
As imagens dos Palcos neste capítulo (p. 316 e 317) foram copiadas dos links:
http://safadopoeta.blogspot.com.br/2010/05/palco-da-vida.html
ehttp://www.grupoheureca.com.br/historico.html .A fotografia da pesquisadora é de autoria de
Michèle Sato. As demais imagens contidas no palco encontram-se sem referências e autorias porque
já foram apontadas no decorrer da Tese.
323
140
Todo o corpo teórico acolhido.
141
Minha Orientadora e minha Banca avaliadora que foi além dos limites acadêmicos, contribuindo
sensivelmente com o tecido.
325
142
Os títulos usados nesta parte da tese tiveram inspiração e também foram copiados da Cartografia
do Imaginário (SATO, 2011), base do meu caminhar-pesquisador em Educação Ambiental.
143
O uso do hífen entre palavras é um sinal de pontuação usado na Língua Portuguesa. Ele fornece a
compreensão de ligamento, de traço-de-união que revela sentido de união e ou separação. No caso
deste trabalho, o uso quer dizer união entre.
144
Visualmente o hífen separa, embora o sentido seja de união. Por esta razão, este estudo a partir
desta etapa do trabalho escrito usará as palavras até então com hífen, agora sem hífen. Visualmente
juntadas, emendadas as palavras fornecem a ideia de uma única tessitura, uma inteireza.
145
A escritura apresentada teve as mesmas intenções presentadas em NaturezaCultura.
326
Cambará que oferta seu tronco para a escultura da canoa pantaneira, desenvolvendo
tessitura da trama, caminho da fenomenologia.
Assim, esta pesquisa produziu três tessituras ligantes. A primeira se revela por
desvelar as interações entre Natureza-Cultura, Ecossistema-Arte, por consequência já
expõe as interações entre Canoa-pantaneiro-imaginário, e ainda Conhecimento
Popular-Conhecimento Científico. A segunda se revela pelo desvelar as interações
entre Ciência-Arte/Poético-acadêmico, que, por consequência, já expõem as
interações entre Pesquisa-Pesquisadora/interior-exterior/Pesquisadora-
Criadora/Artista, fundando uma importância de formar espíritos científicos
atualizados com a Pós-modernidade. Já a terceira composição ligante se revela por
desvelar interações entre Arte Educação e Educação Ambiental, apontando
significativa contribuição para EA.
147
Formativos.
328
Um bom pincel para esta pintura Pós-moderna foi dialogar com Bachelard
(Fenomenologia da Imagem-Imaginação), Paulo Freire (Educação cultural, pela
imagem em diálogo para a transcendência) e Sato (Educação Ambiental). Outro
pincel foi Ana Mae (Proposição Triangular como suporte ao caminhar Arte-
educativo). Juntos, apresentaram um leque de possibilidades para alcançar a
compreensão de uma formação do ‘meu’ espírito científico-poético, me aprontando
para as reinvenções. Portanto, composições que devem importar aos estudos e
pesquisas referentes à Educação, à EA, à Arte Educação, à Ecologia e aos estudos
relacionados à AEM, às Áreas Úmidas, à Cultura e à Arte, entre outros, mas também
deve interessar à própria Ciência.
objeto no cotidiano líquido da comunidade, pelos impactos que este fazer do objeto
provoca, bem como, ao ir além do lugar do
fazer e do uso, chegou-se às forças imaginárias do objeto no cotidiano de outras
gentes, aquelas que não fazem e que, por vezes, não usam o objeto artístico
diretamente.
Existe canoa de um tronco só espalhadas por outros Pantanais e também por outros
ecossistemas, regiões, estados, países. Porém, a canoa deste estudo nasce só na
ambiência Joselândense. É no mergulho do lugar que se desenha natureza-cognitivo-
cultura, é no diálogo dos saberes148 que se pode desenhar um processo único,
singular, resultante de uma captura sensível, de uma capacidade criativa e de um
registro científico.
148
No sentido tratado por Boaventura Souza Santos, ecologia dos saberes. Estudioso preocupando
com o aspecto social pela sua militância contribuiu com o pensamento contemporâneo traçando
caminhos plurais rumo a emancipação social.
333
Ecologia dos Saberes é um sentido tratado por Boaventura Souza Santos (2007, p. 3-
46), que transcende a ideia do contorno dos saberes e fazeres de grupos sociais
diversos. Segundo a compreensão obtida a partir das leituras desse estudioso, o
sistema capital, aliado a valores e ações que conservam o sentido colonialista mesmo
travestido, mantém e acaba por estabelecer dominação, opressão, diferenças,
‘verdade’ no singular, desenhando saberes superiores, melhores e certos, invalidando
assim os conhecimentos dos grupos sociais e criando uma ideia inclusive de
conhecimentos inferiores e errados.
Como ainda nos situamos na herança deixada pela Modernidade, é interessante que
se perceba onde e como estamos, para que nos posicionemos em busca de
reinvenções Pós-Modernas que, certamente, devem seguir no sentido da
solidariedade, da emancipação, da justiça socioambiental, da sustentabilidade
planetária.
Este diálogo nascido da/na/com a pesquisa desvelou a ciência como terra fértil para
criações artísticas de cunho científico-poético, desvelando miríades de saberes-
pensares-fazeres pesquisa em educação ambiental. A singularidade da
pesquisadorapesquisa é o propositor de uma jornada científica formativa-aprendiz.
335
Para abordar a Arte Educação Ambiental proposta e vivida neste estudo, será preciso
recuperar alguns aspectos da EA, assim como alguns aspectos da Arte Educação. Por
isto seguem.
149
Coordenado pela Profa Dra Michèle Sato.
337
150
O texto sobre Arte Educação apresentado aqui teve como base de estudo Quadros (2012, p. 33 a
39).
339
mas caso contrário, também se constituirá rico. Neste instante, pode ser
interessante comparar obras, gêneros e diferentes situações da vida.
Contextualização Contextualizar é conhecer o mundo envolvente da obra de arte e de fato des-
envolver o mundo da obra apreciada para conhecê-la. O que não é de maneira
alguma apenas conhecer a história, mas conhecer a obra pela via social,
ambiental, antropológica, político e etc., bem como, outras questões que o
contexto da obra possa suscitar. Contextualizar não significa só conhecer a vida
e obra do artista em apreço, mas também estabelecer relações dessa obra com
o mundo151 em que foi gerada e publicada, significando conhecer-pensar sobre a
obra de arte da forma mais ampla possível.
Fazer É momento de entrar em cena a percepção, os devaneios e a criação pessoal
e/ou coletiva dos expressadores-artistas, mas também tempo de interpretar, de
buscar inspirações, de imaginar, de brincar, de experimentar, de errar, de
representar, de expressar, de fazer, trabalhar, obrar. É um espaço tempo de/e
para a criação, de expressão-concretização da imaginação criadora.
A partir do que propõe Ana Mae na sua Proposição Triangular, pode-se considerar
que toda obra de arte é aberta a diversas interpretações e depende muito do ponto
de vista, da posição, da história, dos interesses do leitor (apreciador/espectador).
Apreciar obras artísticas propõe leitura de mundo, do mundo dado pela obra na qual
cabe uma leitura de nós mesmos, assim tecendo uma leitura de nós todos e todas no
mundo da obra, uma interpretação cultural sempre diversa.
151
Considerando o espaço, o tempo e a ambiência.
340
A Educação Ambiental gpeana e a Arte Educação proposta por Ana Mae Barbosa
podem se entrelaçar, reinventando uma possibilidade de Arte Educação Ambiental
(Imagem:133), como sinalizadoras de escolhas que não desejam negar, nem tão
152
Considerando um mundo injusto, insustentável, massificador e globalizador; reconhecer e
potencializar a expressão da alma, do espírito livre das amarras que o imobilizam, por isto livre
expressão; pode inaugurar novos campos epistemológicos e de formas de vida.
153
Ana Mae Barbosa.
341
Se Ambiente for reconhecido pela Educação via Arte, enriquecerá a EA, e esta, por
sua vez, enriquecerá o mundo contemporâneo. A educação pode nos apresentar e
nos fazer compreender155 as coisas postas e as possibilidades do que poderiam ser
se não fossem como são. O caminho formativo pode propor um saber teórico ligado
ao prático, à vida (saberfazer ou fazersaber). No rumo razãoemoção, a arte nos
154
Obras a partir daqui terá conotação de ação laboriosa, trabalho. Neste sentido pode ser tanto obra
de arte popular ou não, como tese, como texto, como atividade e etc.
155
Ou deveria...
342
Mas como ficam os sonhos que se sonha junto? Sonhamos sozinhos porque sonhos
individuais são necessários até para desenhar sonhos coletivos. Sonhando
coletivamente se está unido no/pelo sonho, inaugurando a fortaleza do sonho, um
corpo sonhante, desejoso e carregado de esperanças. Pela situação dada no viver
hoje se faz necessário, ao sonhar sozinho e coletivamente, que se realize uma
revisão crítica do sonhado. É preciso examinar se os sonhos não estão sendo injustos
e insustentáveis, ou seja, se não estão indo além do justo socioambientalmente, e se
o que se sonha é e será realmente melhor para o planeta.
156
Tanto do fazedor como do leitor.
157
Arte Educação Ambiental.
158
Arte Educação.
343
está expressando formas de sentir, ver e pensar o viver por uma linguagem diferente
da palavra falada e escrita.
O trilhar proposto pelo trilhar da alma (indivíduo interno) que perpassa pela formação de um
espírito (indivíduo interno) que pode propor caminhos para as relações humanas com a
natureza e também, com as relações sociais, em busca de redenhos ancorados na
sustentabilidade e na justiça socioambiental, foi um bom trilheiro para este estudo.
Este desenho se dá de acordo com a dinâmica, com a vivência, com cada pessoa,
com cada grupo, com cada estudo, com cada pesquisa. Não se desenha, portanto,
uma receita única nem uma forma melhor para ser replicada. Revela-se a
sensibilidade, a presença, a escuta, a abertura, o reconhecimento da importância da
alma e do espírito criativo na ciência, na escola, na vida, no trabalho, na obra feita e
conhecida.
Este é um caminho que pode ser interessantíssimo para jornadas de cunho Pós-
Moderno na ciência e na educação ambiental. Esta trilha pode apontar caminhos
mais justos, mais sustentáveis e mais democráticos, superando as desigualdades, a
indiferença à diversidade cultural, às injustiças. Caminhos que invadam e libertem o
cárcere das comunidades por médio de seus saberes e fazeres além de outras
desvalias. Para tanto, é preciso ultrapassar os contornos rígidos, transbordando-os
como as águas pantaneiras na cheia para o gozo pleno da seca. Propor diálogo,
propor complementariedade entre conhecimentos enriquece sobremaneira as
reflexões que impulsionarão a melhora da quantidade-qualidade das reinvenções
necessárias.
345
As cortinas de um palco que assume ser pós-moderno não podem ser fechadas, em
prol dos diálogos sempre a caminho! Como pondera Sato (2011, p. 17):
Sato ( 011, p.18) alerta que “nunca se viu tamanho progresso científico em
contramão à miséria social do mundo”.
As imagens dos Palcos neste capítulo (p. 339 e 341) foram copiadas do link:
159
Acrescento, nessa última imagem escrita proposta por Sato, que se faz necessário
reinventar a vida, o viver, os caminhos, os estudos, as lutas para manter a paixão,
melhor dizendo, para manter o amor sempre vivo, não permitindo que ele apague ou
enfraqueça, eis a questão!
“Dentre tantos meios de transporte, é bem provável que alguém escolha uma
viagem num caracol... Arrastando-se em sua gosma...”160. Mas eu escolhi
justamente este jeito tão peculiar de viajar! Esta tese iniciou afirmando isto que
escrevi na página 21 desta Tese:
160
Afirmou Sato (2011, p.19).
161
Declara Sato (2011, p. 19).
348
162
Virtualmente através das leituras e estudos das suas produções múltiplas e variadas.
349
A banca constituída para validar este estudo não cumpriu meramente o papel
acadêmico, transgrediu, foi além de um mero crítico academicamente correto. A
banca foi ética, foi respeitosa, foi afetuosa ao ler, ao interpretar, ao comentar, ao
sugerir, estabelecendo uma parceria íntima sensível-crítica e criativa. Fez as críticas e
sugestões necessárias para melhorar o estudo e também, ao se permitir percorrer a
viagem feita por mim, devaneou, cantarolou, poetizou, criou comigo... Razões que
me fazem agora, melhor que antes, mas sempre a caminho pra a melhora!
Esta pesquisa se configurou por uma viagem científica que se aprontou poética-
educadora, na qual se mapearam terras e águas pantaneiras, propondo encontros e
reencontros com o próprio pantanal, com o Cambará, com o pantaneiro, com o
fazedor de canoas, com a canoa e também com sonhos e arte, nascidos na vivência
pantaneira e materializados em imagem artística-palavra cientifica. Razões que
desenham um estudo que reflete sonhos, vivências em diálogo com a ciência
aprendiz.
Estas conquistas foram possíveis nesta pesquisa por se trilhar pelas vias da EA, pois,
neste campo de conhecimento bastante recente, podem-se ofertar forças
complementares às dicotomias instauradas pela modernidade que persistem em
campos científicos e reverberam, em campos não científicos, desenho opositor às
351
Esta pesquisa revelou contribuições ao campo da EA por reconhecer que este campo
de conhecimentos bem contemporâneo está estreitamente vinculado a gentes,
fazeres e saberes com o meio circundante; e este estudo assume e declara esta
perspectiva, contribuindo para que ocorra uma espécie de oxigenação no campo da
EA, através da inserção da arte-sensibilidade-criatividade (caminho da Arte Educação
Ambiental); através do reconhecimento do saber tradicional-popular e da promoção
de um dialogar com a filosofia-epistemologia.
Este caminho formativo-aprendiz da AEA contribui ainda para aprender sobre si,
concomitante sobre os outros e ainda sobre o mundo. Considerando que aprender é
vivenciar teoria-prática e construir saberes, os efeitos resultantes das jornadas
aprendizes são sempre transformadoras, pois, ao vivenciar e construir as nova
percepções de si e dos outros, se formam, transbordando para a percepção das
interações do lugar do corpo (interno-externo) na produção destes saberes. Dessa
352
É certo que todos, fatalmente, estamos ligados ao meio em que vivemos, incluída aí
a natureza, nesse contexto em que nos realizamos enquanto seres humanos. A
grandeza humana só se desenhará se reaprendermos a nos religar com a natureza,
com os nossos ecossistemas tão agredidos, tão ofendidos, tão vilipendiados.
Um Cambará sonha ser uma canoa! Uma canoa não esquece seu passado, guarda na
memória que foi nascida de um Cambará escolhido entre tantos num cambarazal. A
mão sonhadora e fazedora de canoas sabe da forte ligação do seu trabalho
modelador com o Cambará, com o cambarazal, com o Pantanal, com o ciclo das
águas, com a sustentabilidade, e sabe da relação com as questões de justiça
socioambiental. O que falta, talvez, seja a confiança nesses saberes, a certeza de
que os possuem para que os usem. Pode ser que falta uma melhor compreensão
referente a esses saberes existentes. Por isso, faz-se necessário instituir uma
educação ambiental local que contribua com mobilizações dos saberes do grupo
fazedor e da comunidade para que busquem conhecer seus direitos, saberes e
deveres para que possam se sentir mais confiantes e participem ativamente de
programas e políticas ambientais-culturais que os potencializem, instaurando, quem
sabe, protagonismo dos fazedores-comunidades nos cenários políticos que
contornem programas socioambientais-culturais.
O entrelaço entre NaturezaCultura proposto neste estudo revelou que podem existir
alternativas para se desenhar possibilidades econômicas outras. Uma economia
complementar às tessituras da sustentabilidade frente às justiças socioambientais
provavelmente seja uma boa fonte inspiradora para tais desenhos. Nesse rumo, o
caminho econômico, aliado à preocupação com as vidas no/do planeta, seria um
bojo para reinvenções econômicas bem interessantes.
Este estudo revela a necessidade de instaurar uma EA local, regional pantaneira para
além das divisas geográficas, transbordante dos limites locais tocando a
universalidade humana. Uma EA que contribua com um melhor desenho das
identidades construídas no território de vida, lócus de valores e significados
ancorados na dimensão local em inter-relação íntima com a universalidade humana.
Para tanto, deve-se considerar a Cultura local como identidade via arte. Essa
consideração pode ser um rico e importante subsídio de/para um desenhar de
políticas no sentido de um apuramento justo e sustentável para cidadãos e cidadãs,
bem como para todas as vidas, humanas e não humanas, portanto, para a natureza.
354
Para que se consiga sair de uma invisibilidade, é preciso ser visto. Assim, um
mapeamento da arte popular mato-grossense se torna pertinente. No caso local de
Joselândia, mapear a arte e as manifestações populares que importam para a
comunidade contribui para a visibilidade dessa gente nesse lugar. Mas só mapear
não propõe todo o empoderamento necessário para se chegar a políticas e
programas, é preciso mais que mapear. Pensando nesse rumo, quem sabe importa
construir uma carta e uma agenda da arte e das manifestações populares
tradicionais, assegurando mobilização enfática e pronta para lutas políticas
necessárias.
Propor Oficinas de Educação Ambiental para traçar mapas junto com os moradores,
para que possam melhor se ver e transcender. Oficinas que evidenciem a
importância de gritar do quintal de Joselândia para o mundo, através da produção de
documentos do tipo Carta e Agenda local, quem sabe da Arte Popular aliada ao
ecossistema pantaneiro possa ser a tônica dessa construção. Provavelmente,
poderiam ser bons instrumentos pedagógicos para se alcançar, de maneira
totalizante, o empoderamento. Assim, esta pesquisa dá início a esta possibilidade
para este grupo, para esta comunidade.
A Arte sonha (des) contornar os rígidos limites científicos! E a Ciência sabe dessa
força que a complementa e a enriquece tanto. Falta-lhes, porém, assumir esta
possibilidade em tempos Pós-modernos sem medos e inseguranças do novo-outro,
sem medo do dialogar, sem medo da complementariedade, sem medo da
complexidade, se medo de se desacomodar, sem medo das reinvenções necessárias,
mas rumando em busca de superações dos seus obstáculos dicotômicos, herança
insistente da modernidade. Só assim a ciência dará conta de ser uma ciência para/na
Pós-modernidade, contribuindo com a vida humana e não humana, com a
sustentabilidade-justiça socioambiental tão urgente para a manutenção da vida para
todos os seres no planeta.
usadas na viola de cocho163, na rede e objetos feitos com argila, artesanias mato-
grossenses.
Quando sonhei com a proposição da canoa, eu era uma pessoa situada em outro
contexto de vida no sentido particular do ser. Assim, saí pelas trilhas da pesquisa
realizando cada passo sonhado e cuidadosamente planejado. Assim foi até ser
chamada para assumir um Concurso Federal para docência artística em uma cidade
do interior de Mato Grosso.
163
Instrumento da arte popular mato-grossense e do Centro-Oeste brasileiro.
164
Regina Silva e Michelle Jaber.
357
impulsionada por um Processo Judicial que durou oito meses, de Junho de 2012 a
Fevereiro de 2013.
A partir daí, Fevereiro de 2013, outro quadro novo se aprontou, uma vez que, nem
eu, nem ninguém que deixei, nem nada era o mesmo de quando parti. Reafirmando,
a vida pulsa continuamente nova a cada segundo! Assim, encontro-me neste exato
momento tentando me redesenhar neste novo quadro de vida.
Este quadro que apresento da pesquisa empreendida, não teve problemas pelo ritmo
caracoleano escolhido para a viagem. A maior barreira enfrentada foi produzida por
mim mesma, com meu péssimo gerenciamento. Não soube encarar todos os NÃOS
necessários, aliás, ainda não compreendo se devo. Doeram muito, e eu sofri além de
qualquer lenda... Ainda estou sofrendo e, neste exato instante em que escrevo, as
lágrimas correm.
Mas como Sato sempre diz nas orientações, é preciso encontrar caminhos do meio
entre a dureza da ciência ainda desenhante e a moleza da vida necessária. Portanto,
o caminho é interminavelmente vivo e rico, e o caminhante deve seguir o caminho
caminhando, aprendendo e reinventando. Assim, tenho certeza de que, em breve,
redesenhada na vida pessoal e profissional, retornarei ao Pantanal ao encontro dos
amigos pantaneiros que fiz por lá desde 2007, meus Mestres! Sábios Mestres!
Retornarei outra-nova para as pesquisas e proposições que desta empreita nascerão.
358
Que a esfera científica poderia rever alguns valores ambientais, e para tal, seria bem
interessante começar pelo consumo de papel...165
165
A imagem a seguir, um desenho virtual, aborda sobre o consumo de papel quando se produz uma
Tese, foi criado por Imara Quadros.
359
360
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APÊNDICE
Acesso em:
http://issuu.com/reginaasilva/docs/feitura_da_canoa
369
ANEXOS
Anexo 01: Vídeo 01 Pesquisa Mata Cavalo
Acesso em (You Tube): https://www.youtube.com/watch?v=xWkt1fxXQqI
Esta política de gestão e proteção para esta Bacia, objetiva promover a preservação
e conservação dos bens ambientais, a melhoria e recuperação da qualidade
ambiental, visando assegurar a manutenção da sustentabilidade e o bem-estar da
população envolvida, desde que atendido alguns princípios, entre eles estão:
garantir aos povos e comunidades tradicionais, seus territórios, bem como, o acesso
aos recursos naturais que tradicionalmente utilizam para sua reprodução física,
cultural e econômica.