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C569
Ciências da natureza na diversidade dos contextos educacionais.
/ Wender Faleiro, Geize Kelle Ribeiro, Lázara Cristina da Silva
(Organizadores). – Goiânia: / Kelps, 2020.
ISBN: 978-85-400-3183-8
CDU: 37.02+502.34
DIREITOS RESERVADOS
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
2020
CAPÍTULO 4
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pelo MST, para lutas mais amplas pela educação do conjunto dos
trabalhadores do campo. Para isso, era preciso articular experiências
históricas de luta e resistência, como as das escolas família agrícola, do
Movimento de Educação de Base (MEB), das organizações indígenas
e quilombolas, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB),
de organizações sindicais, de diferentes comunidades e escolas rurais,
fortalecendo-se a compreensão de que a questão da educação não se
resolve por si mesma e nem apenas no âmbito local: não é por acaso
que são os mesmos trabalhadores que estão lutando por terra, trabalho
e território os que organizam esta luta por educação. Também não é
por acaso que se entra no debate sobre política pública.
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Na interação TU/TE e TC promove-se a formação dos
licenciandos na perspectiva de pesquisadores, direcionando seus olhares
para realidade de forma crítica, levantando as tensões e contradições
para possibilitar o entendimento de qual escola se tem e inserida em qual
sociedade, para traçar estratégias para a transformação social. Deste
modo, a Pedagogia da Alternância concretiza-se como “um diálogo
entre o saber sistematizado e o saber popular em que o educando e a
sua realidade são o foco central do processo de ensino-aprendizagem”
(PASSOS; MELO, 2012, p. 244). Além disso, a alternância facilita o
acesso e permanência de professores em exercícios nas escolas do
campo, sem que precisem deixar o trabalho na escola, de modo que
não reforça a alternativa de deixar a vida no campo, pois se configura
como uma alternativa para o estudo associado à vida no campo e com
a comunidade. (MOLINA, 2017).
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Natureza e (ii) Linguagens e Códigos; UFTM: (i) Ciências da Natureza
e (ii) Matemática; UFV: (i) Ciências da Natureza. UFMG: (i) Ciências
da Vida e da Natureza, (ii) Matemática, (iii) Línguas, Artes e Literatura
e, (iv) Ciências Sociais e Humanas.
Para os propósitos do presente trabalho serão analisadas as
ementas das habilitações em Ciências da Natureza (CN), habilitação
comum as quatro UF. A principal preocupação na formação do Educador
do Campo, no caso da habilitação em CN, é possibilitar subsídios para
que seu egresso possa atuar como professor de CN em ciências nos
anos finais do ensino fundamental e em três disciplinas do ensino
médio (Química, Física e Biologia). Assim como fora mencionado,
essa formação visa romper com a fragmentação do conhecimento, no
entanto esse processo “não significa negar o caráter das especificidades
disciplinares” (RITTER; MALDANER, 2015, p. 210). Além disso,
também é possível a seu egresso atuar em outros espaços com vistas a
perspectiva da Educação do Campo.
Dentro desse contexto, um desafio que se coloca é a formação em
química do educador do campo na área de Ciências da Natureza, a qual
não pode ser uma réplica da formação do licenciado em química, que
além de disciplinar, costuma ser associada aos cursos de bacharelado
em química. Diante deste cenário buscamos compreender, a partir da
análise das ementas presentes nos Projetos Pedagógicos Curriculares
(PPC) das LEdoC, habilitação Ciências da Natureza das universidades
federais mineiras, como a química está presente na formação dos
estudantes dos referidos cursos.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
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do Triângulo Mineiro (UFTM), de Viçosa (UFV) e dos Vales do
Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM).
O presente estudo insere-se no campo denominado como
pesquisa qualitativa (MINAYO, 2001), onde como meio para coleta
de informações foi realizada uma pesquisa documental, que envolveu
a análise dos PPC das quatro universidades federais mineiras que
ofertam licenciatura em educação do campo, habilitação em ciências
da natureza. Foram analisados os documentos das versões em vigência
e disponibilizadas nos sites das referidas instituições.
Os PPC foram analisados com vistas a busca das possibilidades de
discussão de conteúdos da química, mas também tendo como premissa
que a formação do educador do campo se alicerça em uma formação
por área do conhecimento. Assim, considerou-se a possibilidade de que
tais discussões sejam realizadas no âmbito de componentes curriculares
específicos da Química e, ainda, demais componentes curriculares
pertencentes às Ciências da Natureza.
As técnicas de análise foram inspiradas na Análise de Conteúdo
proposta por Bardin (1977), de modo que, após a leitura de todas as
ementas dos componentes curriculares específicos do eixo de CN,
foram selecionados os componentes curriculares em que a possibilidade
de abordagem dos conteúdos da química foi evidenciada. Os dados
foram categorizados em dois núcleos: i) componentes curriculares
específicos de Química e ii) componentes curriculares que possibilitam
uma abordagem interdisciplinar envolvendo a Química (Gráfico 1;
Tabelas 1 a 4).
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RESULTADOS E DISCUSSÃO
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ensino, trabalho interdisciplinar de tempo comunidade e estágios
(BRASIL, 2018).
A UFMG, por sua vez, tem os eixos de formação distribuídos
da seguinte forma: Específica, Complementar e Livre. No primeiro
estão os núcleos da área do conhecimento, ciências da Educação e
Integrador, sendo este último os conhecimentos que integram toda
a formação específica na prática de ensino e na realização do estágio
supervisionado. Diferentemente das outras três universidades
analisadas no escopo deste trabalho, a UFMG apresenta a oferta
de componentes curriculares, no chamado eixo de formação
complementar, que possibilitam que o estudante escolha os temas
de seu interesse em uma perspectiva de flexibilização curricular. No
último eixo, estão as Atividades Acadêmicas, Científicas e Culturais
(BRASIL, 2016).
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No que se diz respeito as possibilidades para abordagem da
Química, o Gráfico 1 apresenta uma síntese de como os componentes
curriculares específicos de Química e os demais componentes da
Ciências da Natureza, em que a Química pode ser abordados de modo
interdisciplinar, considerando a essência do currículo da LedoC
pautado em uma formação por área do conhecimento. Nesse sentido,
há a possibilidade de que sejam encontrados componentes específicos
da Química no chamado eixo Específico, nomeado de mesmo modo
pelos quatro cursos, e a possibilidade interdisciplinar pode estar
presente nos outros dois eixos, nomeados de modo distinto entre as
LEdoC mineiras.
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para abordagem interdisciplinar em que a Química esteja presente, um
total de 38 (Tabela 2).
No caso da UFTM, onde se encontra um maior número de
componentes curriculares específicos de Química, em um total de
cinco, mais escassas são as disciplinas que comportam uma abordagem
de conceitos químicos por meio da interdisciplinaridade, apenas em 20
delas (Tabela 1).
Na UFMG e UFVJM encontramos certas similaridades, onde o
número de componentes curriculares específicos da área da Química
são, respectivamente, três e quatro. Essa similitude se estende ao
número de disciplinas que permitem uma abordagem interdisciplinar,
sendo 31 na UFMG e 27 na UFVJM. Assim, as possibilidades para a
inserção da Química representam cerca de 81,6% do currículo da UFV,
64, 15% da UFMG, 42,37% da UFTM e, 55% da UFVJM, considerando
as específicas e as interdisciplinares.
A título de ilustração, na UFVJM (Tabela 3), existem quatro
diferentes tipos de componentes curriculares presentes nestes 55%, a
saber os presentes na: (i) área de Ciências da Natureza com potenciais
significativos para abordagem interdisciplinar; (ii) os explicitamente
interdisciplinares; (iii) os do ensino de ciências e, (iv) específicas. Neste
primeiro, embora se refiram a componentes curriculares específicos
da Física ou da Biologia, dada a natureza dos conteúdos abordados,
é possível estabelecer um diálogo com a Química, por exemplo, os
componentes curriculares “Fundamentos de Citologia e Histologia”
(com conceito de fotossíntese); “Cinemática, Leis de Newton e
Energias” (com o conceito conservação de energia e suas aplicações em
física, Ciências Biológicas e Química); “Termodinâmica e Óptica” (com
calorimetria e primeira e segunda lei da termodinâmica). No segundo
tipo, explicitamente interdisciplinares, como “Ciências do Solo e
agriculturas” (com os conceitos em torno de ciclo biogeoquímicos). Por
sua vez, no último tipo, embora não sejam trabalhados os conteúdos de
Química, Biologia e Física em si, existem componentes curriculares de
ensino de ciências em que, por meio de instrumentos e fundamentos
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para o processo de ensino e aprendizagem, os conceitos são trabalhados
de forma integrada.
O que se pode perceber, no caso específico da UFMG (Tabela 4),
é que todos os componentes curriculares apresentam denominações
que sugerem uma abordagem interdisciplinar. No entanto, após
a leitura das ementas, em três dos componentes, os conteúdos de
Química podem assumir maior centralidade no aprendizado, o qual
ocorre em torno de uma temática, de modo que foram classificados
como específicos de Química. Como exemplo, em “Qualidade da água
e da vida”, são trabalhados: “a questão das águas: distribuição, usos e
disputas no planeta; água pura e água potável; misturas e soluções; ciclos
hidrológicos; parâmetros físico-químicos e biológicos de qualidade.
Dinâmica de populações e atributos de comunidade: a diversidade da
vida em ambientes aquáticos.” (BRASIL, 2016, p. 45).
A partir da análise dos componentes curriculares específicos de
Química, sintetizados nas tabelas, constata-se que as áreas clássicas
da Química abordadas no Ensino Médio (inorgânica, físico-química,
química orgânica e bioquímica) são abordadas, dando um panorama
geral do conhecimento químico para o licenciado em Educação do
Campo. Acresce-se que para essa licenciatura o conhecimento químico
em específico e o de ciências da natureza de modo geral e processo de
aprendizagem desses conhecimentos não é o bastante, onde deve-se
também “fomentar a valorização de conhecimentos, saberes, culturas,
memórias, história dos sujeitos do campo [...] contribuindo com o
projeto de sociedade desses sujeitos” (MORENO, 2014, p. 184).
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Quadro 1: Distribuição da inserção da Química nos componentes
curriculares específicos e nas possibilidades interdisciplinares da UFTM
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Quadro 2: Distribuição da inserção da Química nos componentes
curriculares específicos e nas possibilidades interdisciplinares da UFV
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Quadro 3: Distribuição da inserção da Química nos componentes
curriculares específicos e nas possibilidades interdisciplinares da UFVJM
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Quadro 4: Distribuição da inserção da Química nos componentes
curriculares específicos e nas possibilidades interdisciplinares da UFMG
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educando possa refletir sobre como o ser humano dominou e domina
a natureza, para entender e problematizar a sua própria realidade, o
que dialoga também com Moradillo e colaboradores (2017).
Nesse sentido, Lima e colaboradores (2009) nos trazem reflexões
quanto aos desafios de construir uma formação sob um paradigma
distinto do vigente, como é o caso das LEdoC em que a complexidade
dos fenômenos no cotidiano é o ponto central de toda a aprendizagem:
[...] no cotidiano, os contextos são complexos e, por isso, não há garantia
de que o domínio do conhecimento científico ajude no enfrentamento
e na solução dos problemas. Por outro lado, o conhecimento que se
aprende tradicionalmente na escola corresponde à escolha de aspectos
restritos e simplificações do conhecimento científico (LIMA et al.,
2009, p.113).
CONSIDERAÇÕES
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para síntese de um composto, por exemplo. O foco nessas licenciaturas
é, além do conhecimento, a compreensão das implicações sociais deste
conhecimento. Deste modo, o licenciado poderá trabalhar com os modos
de compreender e intervir na realidade, que é essencialmente complexa.
Sendo assim a interdisciplinaridade, aspecto que alicerça essa
formação, é vista como potencializadora para a transformação social
e não para a manutenção das estruturas sociais vigentes. Em outras
palavras, a formação almejada dos licenciados em educação do
campo visa construir subsídios para a compreensão da “[...] Química
e as Ciências da Natureza como uma outra forma de ler o mundo,
compreendendo-as dissociadas de uma aprendizagem mecânica e
sem significado, contribuindo para a superação do que Paulo Freire
denominou como ‘educação bancária’” (MIRANDA, 2018, p. 39).
Vale ressaltar, que para fins de análise, neste trabalho,
focalizamos a questão por área do conhecimento, dando especial ênfase
nos conhecimentos químicos, no entanto, o curso não se restringe aos
conhecimentos das Ciências da Natureza. Existem outras dimensões
que fazem parte dessa formação: a alternância, as novas práticas
pedagógicas, a questão política, etc. Isso pressupõe que as LedoC estão
em constante construção, em um processo contínuo de avaliação e
remodelação, tendo em vista que, além de relativamente nova, esta
formação por área e em educação do campo é muito complexa. Os
desafios são inúmeros, por exemplo, a estrutura curricular das escolas
que se ancora na divisão por disciplinas e não por área do conhecimento,
como foram formados. Por isso esse trabalho contribui para o debate
dos cursos em construção/reestruturação.
Nesta direção, ainda reconhecendo parte desses desafios, a
formação por área do conhecimento nas LEdoC, ao buscar superar essa
simplificação e fragmentação do conhecimento escolar, almeja que os
estudantes tenham acesso ao conhecimento da Ciências da Natureza
para promover a transformação social no sentido de construção de um
projeto de campo sem os interesses do capital. E, ao serem colocados
diante dos desafios das escolas e das comunidades do campo, tenham
condições de aprofundar a busca utilizando de conhecimentos básicos
e estruturas investigativas adquiridas nas LEdoC.
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REFERÊNCIAS
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