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INTEGRAÇÃO CURRICULAR DAS TIC NO 1º CEB:

CONTRIBUTOS DO COMPUTADOR MAGALHÃES

Conceição Coelho
Agrupamento de Escolas José Saraiva

Conceição Fernandes
Agrupamento de Escolas José Saraiva

Joana Viana
Instituto de Educação, Universidade de Lisboa

Pedro Silva
Escola Superior de Educação e Ciências Sociais, Instituto Politécnico de Leiria

Resumo

Apresentam-se os resultados sobre a utilização do computador Magalhães, em


contexto de sala de aula, analisando os efeitos escolares da sua utilização e a
integração curricular das TIC no 1º ciclo do Ensino Básico. O estudo surge no âmbito
de uma investigação, de cariz sociológico, sobre os usos e efeitos, escolares e sociais,
do computador Magalhães, num agrupamento de escolas de Leiria. A investigação de
natureza longitudinal (2009-2011) apresenta um design metodológico misto, com uma
componente extensiva (questionários a alunos, professores e famílias) e outra
intensiva (etnografia de uma turma, entrevistas).
Na relação com a escola, o computador e a Internet são encarados como instrumentos
potenciadores de novas práticas e novas relações pedagógicas onde “a contribuição
real dos meios de comunicação digitais para a educação é a flexibilidade que pode
permitir a cada indivíduo encontrar trajetos pessoais para aprender” (Papert, 1997).
Contudo, diversos estudos apontam para uma visão cautelosa em relação aos efeitos
das TIC, revelando que a sua aplicação simples, sem nada modificar as práticas de
ensino, tal como sucede frequentemente, não traz mudanças significativas aos
sistemas educativos (Eurydice, 2001; Miranda, 2007).
Os dados analisados revelam uma adesão significativa ao Magalhães, que sobressai
como um computador pessoal para a criança, e uma utilização crescente do
computador em situação de aula. A Língua Portuguesa é a área mais trabalhada com
o computador Magalhães na sala de aula, seguida pelo Estudo do Meio, e, com bem
menor representatividade, a Matemática e as Expressões. A utilização do portátil nas
atividades letivas incide principalmente na escrita de textos, nos jogos didáticos e na
consulta de enciclopédias. A Internet é utilizada principalmente para pesquisas e, com
valores mais reduzidos, jogos e acesso a blogues.
Com base no estudo etnográfico destaca-se o contributo do uso do Magalhães para
uma maior autonomia e respeito pelos ritmos de aprendizagem dos alunos. O portátil é
usado em atividades curriculares disciplinares e não disciplinares, encarado como
mais um meio e material de apoio à aprendizagem, como mais um recurso para
professor e alunos, a par dos mais “tradicionais”. A professora da turma promove uma
integração entre todos os meios à sua disposição.
Palavras-chave: computador Magalhães, TIC, integração curricular, 1º CEB
Résumé

On présente les résultats de l’utilisation de l’ordinateur Magalhães en classe, avec


l’analyse des conséquences pédagogiques de son utilisation et de l’inclusion des
Technologies de l’Information et de la Communication (TIC) dans le programme
scolaire du niveau élémentaire. Cette étude est le fruit d’une recherche sociologique
sur l’utilisation et effets, scolaires et sociaux, de l’ordinateur Magalhães, dans un
groupe d’écoles élémentaires de Leiria, Portugal. L’étude longitudinal (2009-2011) est
de méthodologie mixte avec une partie extensive (questionnaires aux élèves, maîtres
et la famille des élèves) et une partie intensive (ethnographie d’une classe, interviews).
À l’école, l’ordinateur et l’internet sont vus comme des instruments qui incitent à
l’utilisation de nouvelles méthodes et de nouvelles interactions pédagogiques où « la
contribution réel des médias digital pour l’éducation est la flexibilité que celle-ci peut
permettre a chaque individu de trouver un parcours personnel d’apprentissage »
(Papert, 1997). Cependant, plusieurs études demandent d’analyser avec prudence les
effets des TIC dans l’apprentissage, car son application simple, sans rien changer aux
méthodes d’enseignement déjà utilisées, comme c’est souvent le cas, n’apportent pas
d’importants changements aux systèmes éducatifs (Eurydice, 2001; Miranda, 2007).
Les donnés obtenues montrent une forte adhésion à l’ordinateur Magalhães, avec une
utilisation croissante de celui-ci pendant les cours et comme ordinateur personel pour
les élèves. Au sein des classes, les matières les plus travaillés avec l’ordinateur
Magalhães sont la Langue Portugaise, suivi de l’Étude Civique. Pour les
Mathématiques et l'Education Artistique l’utilisation de l’ordinateur est moins fréquente.
L’ordinateur est principalement utiliser pour l’écriture, la réalisation de jeux
pédagogiques et consulter des encyclopédies. En ce qui concerne l’internet, celle-ci
est fréquemment utilisé comme moteur de recherche et de façon très peu importante
pour accéder à des jeux et blogs.
L’étude ethnographique révèle que l’utilisation de l’ordinateur Magalhães permet
l’autonomie des élèves et le respect des différents rythmes d’apprentissages.
L’ordinateur est utilisé au cours des activités scolaires et non scolaires, comme un
matériel de plus utilisé par la maitresse et les élèves, dans l’apprentissage, au même
niveau que d’autres matériaux dit traditionnels. La maitresse incite l’utilisation
équilibrée de toutes les ressources disponibles.
Mots clés: ordinateur Magalhães, TIC, cursus, école élémentaire
Introdução

Na relação com a escola, o computador e a Internet são encarados como instrumentos


potenciadores de novas práticas e novas relações pedagógicas onde “a contribuição
real dos meios de comunicação digitais para a educação é a flexibilidade que pode
permitir a cada indivíduo encontrar trajetos pessoais para aprender” (Papert, 1997).
Contudo, diversos estudos apontam para uma visão cautelosa em relação aos efeitos
das TIC, revelando que a sua aplicação simples, sem nada modificar as práticas de
ensino, tal como sucede frequentemente, não traz mudanças significativas aos
sistemas educativos (Eurydice, 2001; Miranda, 2007).

Para a integração pedagógica das TIC na escola, existem três elementos


fundamentais a ter em consideração: o aluno, o currículo e a tecnologia (Costa, 2007),
assumindo, desde logo, que ao professor caberá um papel decisivo na articulação
entre estes três elementos (Darling-Hammond e Youngs, 2002; Kenski, 2006; Vrasidas
e Glass, 2005a in Costa, 2008; Laurillard, 1993; Ponte, 2000; 2001; Salomon, 2002),
para que sejam diferentes as oportunidades de trabalho com os computadores
oferecidas aos alunos em contexto escolar, envolvendo outras dimensões
consideradas relevantes (os professores e a sua formação), mas sobretudo em
sintonia com o que for decidido sobre o papel para as tecnologias na escola.

A introdução do computador Magalhães no 1º ciclo do ensino básico (CEB) teve início


no ano lectivo 2008/09, no território português, ao abrigo do programa e.escolinha, no
quadro do Plano Tecnológico da Educação, definido pelo XVII Governo Constitucional.

O que parece estar em causa é o uso precoce das TIC, assim como o alargamento da
base sociológica da sua utilização, não só na escola, mas também noutros contextos,
nomeadamente na família.

É sobre a utilização do computador Magalhães, em contexto de sala de aula, que se


centram os dados que aqui se apresentam, analisando-se os efeitos escolares da sua
utilização e a integração curricular das TIC no 1º ciclo do Ensino Básico. Os dados
gerais aqui analisados referem-se à aquisição do computador Magalhães, no
Agrupamento em estudo, à sua utilização em situação de aula, às atividades
realizadas e áreas curriculares trabalhadas. Apresentam-se também resultados
provenientes da análise intensiva do uso e integração curricular das TIC na turma
etnografada – alvo de um acompanhamento em profundidade - concluindo sobre os
contributos do computador Magalhães.
O Estudo

O estudo e resultados apresentados referem-se a parte de uma investigação mais


abrangente, realizada num Agrupamento de Escolas de Leiria, de cariz sociológico e
natureza longitudinal (Novembro 2009-Dezembro 2011), com um design metodológico
misto, com uma componente extensiva e outra intensiva.

No que respeita à natureza extensiva da pesquisa, foram administrados questionários


aos alunos, professores e famílias de turmas do 1º CEB. Quanto à vertente intensiva
realizou-se a etnografia de uma turma selecionada numa das escolas do
Agrupamento. A sua seleção obedeceu a dois critérios: a) uma turma que estivesse no
1º ano de escolaridade aquando da introdução dos computadores Magalhães na
escola (ano letivo de 2008/2009); b) uma turma que os utilize desde então. Acresce
ainda que na turma selecionada todos os alunos adquiriram o computador Magalhães.
Esta turma foi, assim, acompanhada durante os seus 2º e 3º anos de escolaridade.

A investigação visava responder a um conjunto de questões, entre as quais, identificar


os atores sociais que surgem associados ao computador Magalhães e as suas
representações sociais sobre o mesmo; traçar o perfil sociológico dos adquiridores e
não adquiridores do Magalhães; entender os usos deste, nomeadamente por parte de
quem, em que contextos e quais os seus modos de regulação; compreender os efeitos
escolares e sociais da sua utilização, em particular nos contextos de sala de aula e da
interação escola-família.

A informação obtida foi objeto de um tratamento adequado, nomeadamente estatístico


e por análise de conteúdo.

A amostra: alunos, professores, famílias, turma

Foram inquiridos todos os docentes do 1º ciclo, através de questionário, em quatro


momentos distintos: no final do ano letivo 2008/2009 (32 professores), primeiro ano de
distribuição do computador Magalhães aos alunos do 1º ciclo, no início (31) e no final
do ano letivo 2009/2010 (33) e no final do ano letivo 2010/2011 (32).

No que se refere aos alunos e famílias, foram inquiridas metade das turmas, através
de uma amostra estratificada que permitiu a inclusão de turmas de todas as escolas
do Agrupamento. Para a seleção da amostra, outro dos critérios considerado foi
incluir os vários anos letivos, à exceção do 1º ano de escolaridade, por este ser o ano
de distribuição do computador, o que significava a chegada do computador de forma
faseada ao longo do ano, não sendo por isso possível recolher dados sobre a sua
utilização.
A turma etnografada foi alvo de um acompanhamento sistemático durante dois anos,
no 2º e 3º anos de escolaridade. A turma teve sempre 20 alunos, embora tenham
saído dois e entrado outros dois. No 2º ano a turma era constituída por 12 rapazes e 8
raparigas e no 3º ano 11 rapazes e 9 raparigas. A sala de aula contém 2
computadores de secretária, um deles ligado a um quadro interativo, uma impressora
e uma câmara Web.

Resultados

Apresentam-se os resultados obtidos sobre a utilização do computador Magalhães,


em situação de aula, e os seus contributos para a integração curricular das TIC, no
contexto do Agrupamento de Escolas analisado.

Adesão significativa ao computador Magalhães

Os dados mostram uma adesão significativa ao computador Magalhães, verificando-se


um ligeiro acréscimo de 2010 para 2011, ano em que 93% das famílias inquiridas
declaram possuir o portátil.

Gráfico nº 1 - Aquisição do CM pelas famílias

junho 10  maio 11 

88.6  93.0 
100 

80 

60 

40 

20  11.4  7.0 


Sim  Não 

Fonte: Inquérito aos pais N=210 (IF1) N=157 (IF2)

Utilização do computador nas aulas

A esmagadora maioria dos professores refere que os seus alunos usam o Magalhães
nas aulas, percentagem que foi aumentando, gradualmente, situando-se nos 96,9% no
final do ano letivo 2010/2011.

No entanto, segundo as respostas dadas pelos alunos, a utilização do Magalhães nas


aulas foi diminuindo ao longo do ano letivo 2010/2011, apresentando percentagens de
utilização muito inferiores (65,2% em novembro de 2010 e 54,5% em junho de 2011)
às referidas pelos professores.
As famílias referem-se à utilização do Magalhães nas aulas pelos seus filhos em
percentagens semelhantes a estes, sublinhando que esse uso é mais esporádico do
que frequente.

Os dados indicam que pais e filhos estão mais próximos na sua apreciação sobre o
uso do Magalhães em contexto de sala de aula do que os professores, incluindo a
tendência de decréscimo de utilização. Significará esta aparente inflação estarmos
perante um efeito do “politicamente correto” por parte dos docentes?

Ainda neste âmbito, segundo os alunos, a utilização do computador Magalhães nas


aulas é superior ao uso de outros computadores (quase o dobro).

Gráfico nº 2 – Uso do Magalhães e de outros computadores nas aulas segundo os alunos

100 

80 
65.2  67.2 
64.0 

60  54.5 
45.5 

36.0  34.8 
40  32.8 
Computador Magalhães nov 10 
Computador Magalhães jun 11 
20  Outros computadores nov 11 
Outros computadores jun 11 

Sim  Não 

Fonte: Inquérito aos alunos N= 181 (IA1 – computador Magalhães) N= 154 (IA2 – computador
Magalhães); N= 200 (IA1 – outros computadores) N= 174 (IA2 – outros computadores)

Comparando as respostas dadas pelos alunos e pelos professores, a frequência de


utilização do Magalhães nas aulas aumentou, observando-se que o computador é
usado regularmente nas aulas (várias vezes por semana e uma vez por semana).

Segundo a maioria dos professores, quando usam o Magalhães na aula, o tempo


médio de utilização num dia é entre 1 a 3 horas.

Áreas curriculares trabalhadas com o uso do Magalhães


Quando usam o Magalhães com os alunos, os professores referem que as áreas
curriculares que mais trabalham são a Língua Portuguesa e o Estudo do Meio. A
percentagem de professores que diz trabalhar a Matemática e as Expressões, quando
usa o Magalhães com os alunos, aumentou consideravelmente entre o início e o fim
do ano letivo 2010/2011.
Gráfico nº 3 - Áreas curriculares trabalhadas na utilização do Magalhães segundo os professores

jun 10  jun 11 

Língua  96.3 
portuguesa  96.6 

55.6 
MatemáJca 
69.0 

44.4 
Expressões 
62.1 

81.5 
Estudo do meio 
79.3 

14.8 
Outra 
24.1 
%  0  20  40  60  80  100 

Fonte: Inquérito aos professores N=27 (IP3) N=29 (IP4)

Atividades realizadas com os computadores nas aulas

A esmagadora maioria dos professores refere que as atividades que os alunos


desenvolvem com o Magalhães, na aula, são “escrever textos” (a mais realizada),
“fazer jogos didáticos”, “consultar enciclopédias do computador”, “fazer desenhos” e
“aceder à Internet”. Segundo os alunos, as atividades realizadas maioritariamente com
o computador Magalhães são “escrever textos” e “aceder à Internet”; verificando-se
uma situação de concordância entre professores e alunos.

No final do ano letivo, de acordo com as respostas dadas pelos professores, observa-
se o aumento das atividades “fazer desenhos”, “fazer apresentações em PowerPoint”,
“aceder à Internet” e “escrever textos” com o Magalhães nas aulas, comparativamente
ao início do ano. Enquanto que, segundo os alunos, essas atividades diminuíram, à
exceção de “aceder à Internet” que aumentou tal como a atividade “jogar”.
Gráfico nº 4 – Atividades realizadas no Magalhães nas aulas segundo os professores

jun 10  jun 11 

92.6 
Escrever textos 
100 

33.3 
Fazer cálculos 
16.7 

37.0 
Fazer apresentações em PowerPoint 
46.7 

59.3 
Fazer desenhos 
73.3 

Consultar enciclopédias do  70.4 
computador  60.0 

74.1 
Fazer jogos didáJcos 
73.3 

14.8 
 Fazer jogos não didáJcos 
16.7 

59.3 
Aceder à internet 
66.7 

7.4 
Outra 

%  .0  20.0  40.0  60.0  80.0  100.0 

Fonte: Inquérito aos professores N= 27 (IP3) N=30 (IP4)

Comparando estes dados com os anteriores, da mesma forma que a Língua


Portuguesa é a área curricular que os professores mais referem trabalhar com o
Magalhães, também a atividade “escrever textos” apresenta maior percentagem. Se
estabelecermos o paralelismo entre a área das Expressões e a atividade “fazer
desenhos”, a última apresenta maior percentagem; enquanto que, no caso da
Matemática em articulação com a atividade “fazer cálculos”, a área curricular é referida
em maior percentagem pelos professores.

No entanto, o paralelismo criado não é estanque nem unidirecional, pois cada área
poderá ser trabalhada através de diversas atividades, entre as que foram referidas nas
respostas dadas, nomeadamente, quando 74,1% dos professores indicam que os
alunos fazem jogos didáticos, qualquer uma das áreas poderá ser trabalhada.
Gráfico nº 5 – Utilização da Internet na aula pelos alunos segundo os professores

jun 10  jun 11 

11.1 
Não uJlizam 
13.8 

88.9 
Pesquisar informações 
86.2 

33.3 
Jogar 
31.0 

11.1 
Aceder a blogs 
20.7 

14.8 
Trocar mensagens 
17.2 

7.4 
Outra 

0  20  40  60  80  100 

Fonte: Inquérito aos professores N= 27 (IP3) N= 29 (IP4)

De acordo com as respostas dos professores, nos anos letivos 2009/2010 e


2010/2011, a maioria dos alunos usou a Internet na aula para “pesquisar informações”.
Para além desse uso, os alunos recorrem à Internet na aula para “jogar”, para “trocar
mensagens por correio electrónico”, para “aceder a blogs”.

Organização dos alunos para trabalhar com o Magalhães na aula

No ano letivo 2009/2010, a estratégia usada pelos professores para organizarem os


alunos para trabalharem com o computador Magalhães na aula era essencialmente
aos pares ou individualmente. No ano letivo seguinte verifica-se a diminuição da
percentagem de professores que organizam os alunos individualmente, aumentando a
estratégia de os colocar a trabalhar em grupo quando usam o Magalhães, o que pode
ser justificado pelo aumento do número de alunos sem o Magalhães na aula,
especialmente devido às avarias do computador.
Gráfico nº 6 – Estratégia usada pelos professores na organização dos alunos para trabalharem com o
Magalhães

jun. 10  jun. 11 

76.9 
Individualmente 
23.3 

76.9 
Aos pares 
86.7 

34.6 
Em grupos 
73.3 

3.8 
Outra 

%  0  20  40  60  80  100 

Fonte: Inquérito aos professores N= 26 (IP3) N= 30 (IP4)

Contributos do Magalhães para a integração curricular das TIC

Na turma, o tempo médio de utilização dos Magalhães foi de 6h semanais, repartidas


por dois períodos, acrescidos de 45m nas Atividades de Enriquecimento Curricular
(Apoio ao Estudo), orientadas pela professora da turma.

As atividades desenvolveram-se, ora de forma transversal a todas as áreas, ora com


maior incidência disciplinar, dependendo das necessidades ao nível de organização e
avaliação das atividades que periodicamente foram desenvolvidas. Nas Áreas
Curriculares Disciplinares (ACD) a Língua Portuguesa, o Estudo do Meio e a
Expressão Plástica foram as privilegiadas, em detrimento da Matemática. No entanto,
esta área passou também a ser contemplada nas planificações disciplinares, com
recurso aos computadores e elaboraram-se gráficos, tabelas, grelhas; criaram-se
problemas e respetivas soluções, e exploraram-se jogos educativos.

A introdução do uso dos computadores Magalhães implicou a necessidade de se


definirem regras, que foram criadas a dois níveis: escola e turma.

Apesar da estratégia de trabalho se ter mantido (alternância entre o trabalho individual


e de grupo), notou-se que os alunos revelaram grande tendência para irem partilhando
o trabalho com os pares, pelo que esta foi uma das estratégias utilizada com
frequência.

O facto do Magalhães já não ser visto como “brinquedo novo”, mas sim como
instrumento de trabalho - a par dos manuais e outros materiais didáticos – terá
contribuído para uma maior e mais espontânea partilha, o que, de certo modo,
contraria a ideia de que o computador “isola”. Outra razão tem a ver com a
necessidade de agrupar os alunos dada a quantidade de Magalhães que
frequentemente avariam.

As atividades realizadas com recursos aos computadores centraram-se na pesquisa


temática (individual, em grupos ou aos pares), orientada para temas definidos ou de
livre escolha, com recurso à Internet; na escrita individual e coletiva - textos, poemas,
relatórios de atividades, mensagens, cartas e e-mails para os colegas estrangeiros
das escolas parceiras, com correspondente ilustração de desenhos (em Paint e Tux
Paint); na elaboração de apresentações em PowerPoint para tópicos do programa
e/ou para as temáticas dos projetos em curso; na utilização do Photo Story para a
criação de pequenas histórias, do Movie Maker para animações curtas; no
visionamento de vídeos, audição de músicas e captura de imagens fotográficas.

Uma das vantagens que se pode realçar na utilização dos Magalhães na turma é o
facto dos alunos com diferentes níveis de aprendizagem poderem trabalhar cada um
ao seu ritmo, sem se incomodarem uns aos outros, desenvolvendo diversas
aprendizagens de forma orientada, mas autónoma. A procura, seleção e
descodificação de informação, a redação de diferentes tipos de textos, entre outras
atividades, serviu para apoiar, reforçar e consolidar as aprendizagens efetuadas nas
diferentes áreas disciplinares.

Outro facto a realçar prende-se com a constatação de que, desde que os Magalhães
chegaram, todas as crianças da turma, independentemente da sua condição social,
podem na escola e também em casa ter o “seu computador”, privilégio a que
anteriormente só os mais favorecidos tinham direito. Pode-se afirmar que este aspeto
contribuiu para melhorar a sua autoestima e motivação pessoal para as aprendizagens
escolares. O acesso a um instrumento de aprendizagem que a experiência profissional
revela como “poderoso”, quando utilizado de forma adequada, veio contribuir para
uma situação de maior equidade e justiça social.

Em suma, os computadores Magalhães assumiram-se como uma enorme mais-valia


nas diferentes dimensões da vida escolar da turma. Mas é preciso acrescentar que
também foram frequentemente um quebra-cabeças e uma fonte de problemas,
relacionados basicamente com a qualidade do material informático, bloqueios e
avarias muito frequentes, baixa capacidade de armazenamento e reduzida dimensão
da tela de visionamento. Acrescente-se a estes constrangimentos a ausência de uma
rede de apoio técnico aos professores, levando-os a perderem muito do tempo que
devia ser aproveitado para atividades pedagógicas com este tipo de ocorrências que,
por vezes, nem sabem resolver por falta de conhecimentos informáticos. A
necessidade das escolas terem melhores condições físicas nas salas, quer ao nível do
mobiliário e da luz natural, quer das condições da instalação eléctrica, e a
necessidade de um maior e mais eficaz apoio, da empresa fabricante, na reparação
das avarias constituem outras das condicionantes ao uso dos computadores na sala
de aula.

Os alunos são unânimes em referir como os Magalhães são importantes não só para
brincar, mas também para aprender. À pergunta “para que serve ter um Magalhães?”
respondem que, para além dos jogos com que podem brincar, também podem
aprender muitas outras coisas:

O Magalhães é como um amigo para mim. Ajuda-me a aprender (...). Eu gosto do


Magalhães porque dentro dele existem coisas importantes para mim. Coisas de
aprender, conhecer, jogar e até fotografias. (...) Quando o Magalhães está sem bateria
eu carrego-a logo para depois poder estar com ele outra vez. O Magalhães é como um
chupa-chupa e eu adoro chupar, chupar… [Maria Soledade]

O Magalhães é nosso amigo e ajuda-nos a crescer no mundo do aprender. Eu gosto


muito de usar o Magalhães. [Diogo Silva]

Adorei usá-lo, é giro! Eu fiz vários PowerPoint: do Natal, do Dia das Bruxas, do S.
Martinho, das lendas, do tigre, etc. Também fiz muitos desenhos e textos.
À Internet vou pesquisar e jogar, mas só quando a professora deixa.
Em casa faço aulas da Escola Virtual. O meu pai e o meu irmão também. [Maria
Guarda]

Conclusões

O computador Magalhães configura-se como um autêntico computador pessoal para


as crianças.

A maioria dos pais declarou ter adquirido o Magalhães pelas vantagens que acredita
trazer para os seus filhos. As vantagens reportadas enfatizam o melhor desempenho
no uso das TIC e a aquisição de conhecimentos, em geral. Para além da referência a
outros aspetos menores, não deixa de ser relevante a distinção feita pelos próprios
encarregados de educação entre a aquisição de mais conhecimentos – mesmo
escolares – e o rendimento escolar.

Por outras palavras, a aquisição de mais conhecimentos proporcionada pelo uso do


portátil não se traduz diretamente em maior aproveitamento escolar, o que parece ser
corroborado pelos docentes. Estamos, no entanto, a falar de efeitos no curto prazo. É
possível que venham a verificar-se ganhos escolares no médio e longo prazo, se o
uso do Magalhães vier a generalizar-se. Pelo menos, é o que sugerem os professores
que falam em “melhorar os resultados escolares dos alunos” e “aumentar as
aprendizagens escolares dos alunos”, assim como os dados da turma selecionada,
nomeadamente quando a professora refere que, sobretudo junto dos alunos mais
carenciados e que não possuíam computador, se nota um aumento da sua autoestima
e uma maior confiança no próprio uso do computador.

Não deixam de ser interessantes, mais uma vez, os dados qualitativos da nossa
pesquisa (turma) que apontam para que o trabalho com o computador, mesmo
pessoal, não deixa de promover a troca e a partilha entre os alunos, rompendo, assim,
com a ideia do eventual isolamento que tenderia a fechar o aluno numa espécie de
casulo. Por outro lado, também esta componente da investigação sublinha que o
computador pessoal permite ao aluno, quando necessário, progredir ao seu próprio
ritmo, o que não seria possível com a existência de apenas alguns PC na sala de aula.

Em síntese, o estudo revela que o computador Magalhães é valorizado por todos os


atores sociais (famílias, professores e alunos). Há indícios de efeitos positivos
escolares, mas também sociais, a prazo, os quais terão, no entanto, de ser
confirmados no futuro.

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