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Newton Linchen | Tarcísio Peres

Novatec
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É proibida a reprodução desta obra, mesmo parcial, por qualquer processo, sem prévia
autorização, por escrito, do autor e da Editora.
Editor: Rubens Prates
Revisão gramatical: Marta Almeida de Sá
Capa: Victor Bittow
Editoração eletrônica: Camila Kuwabata e Carolina Kuwabata
ISBN: 978-85-7522-659-9
Histórico de edições impressas:
Outubro/2017 Quinta reimpressão
Agosto/2016 Quarta reimpressão
Fevereiro/2016 Terceira reimpressão
Fevereiro/2015 Segunda reimpressão
Junho/2014 Primeira reimpressão
Outubro/2011 Primeira edição
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Para meu lho, Bernardo Bonamigo Linchen.
Newton Linchen

A todos aqueles que são perseverantes e conscientes


na busca de melhores resultados.
Tarcísio Peres
Sumário

Agradecimentos
Prefácio
Capítulo 1 • Quem ganha quando você perde?
1.1 Topos e fundos
1.2 O case que você di cilmente verá no MBA de nanças
1.2.1 Do outro lado
1.2.2 Não há vilões e vítimas
1.3 Siga o dinheiro
1.4 O mercado é cruel?

Capítulo 2 • Você já visitou a cozinha?


2.1 Bom dia, você quer comprar ações?
2.2 O agente autônomo ou corretor de ações
2.3 O analista de valores mobiliários
2.4 Back-o ce e plataformas operacionais
2.5 Entra em cena a CVM

Capítulo 3 • Se você acha o conhecimento caro, experimente a ignorância


3.1 O sonho de qualquer day trader
3.1.1 O dia seguinte
3.1.2 “Entra, entra!”
3.1.3 Deixando para o longo prazo
3.2 O “eu” que você desconhece
3.3 Acumulando funções

Capítulo 4 • Guarde esta palavra: assimetria


4.1 Soma negativa
4.2 A parte da casa
4.3 Assimetria de plataforma
4.3.1 “Quem quer dinheeirooo?”
4.3.2 Correndo Fórmula 1 com um Fusca
4.4 Assimetria de capital
4.4.1 Ter um edge não é su ciente – É preciso ter staying power
4.4.2 Dinheiro apavorado
4.4.3 Que atire a primeira pedra...
4.5 Assimetria de informação
4.5.1 Sábio Sócrates
4.5.2 Jogos de estratégia e o mercado
4.5.3 O trunfo dos grandes players
4.5.4 Vendendo o que não se tem
4.5.5 O que o dono do restaurante está fazendo?
4.5.6 Deception

Capítulo 5 • Qual é a sua estratégia operacional?


5.1 Análise fundamentalista: a busca pelo valor
5.1.1 O outro lado do valor
5.1.2 Bu ett: muito mais do que Coca-Cola
5.2 Se você não pode vencer o mercado, junte-se a ele...
5.3 Análise técnica: utilizando o histórico visual do preço
5.3.1 “La media è mobile...”
5.3.2 Um duro golpe
5.3.3 Operando sem sinal?
5.4 Análise quantitativa: a matemática dos resultados
5.4.1 Finança quantitativa ou trading quantitativo?
5.4.2 Você quer ser um quant?
5.4.3 Modelos fora de controle

Capítulo 6 • Palavras nais


Referências
Agradecimentos

Newton Linchen
Gostaria de agradecer a todos aqueles que tornaram possível este livro, e a
todos os que me ensinaram a ser um ponto de interrogação constante quando
se trata de investimentos, trading e mercado de capitais: Victor Niederho er,
Laurel Kenner, Larry Williams, James Altucher, Toby Crabel, Vitaly
Katsenelson, Charles Ellis, entre tantos outros que de uma forma ou de outra
acrescentaram seu conhecimento e sua experiência. Agradeço a Deus e à minha
família: Maria Luiza Linchen, minha mãe e meus irmãos Dayse, Oliver, Arthur
e Lorean, todos foram importantes no meu crescimento como pessoa e como
pro ssional. A Lavoisier Paulo Linchen, in memoriam. Um abraço especial ao
amigo Marcos Boschetti, CEO da Nelogica, por ter autorizado a reprodução de
imagens do software Pro t Chart pela enriquecedora troca de ideias sobre o
mercado ao longo dos anos. Agradeço também ao doutor José Luiz Bonamigo
Filho, que proporcionou o encontro que mais tarde resultaria neste livro.

Tarcísio Peres
A Deus, à minha família e às pessoas que nos apoiaram neste livro. À minha
esposa por seu apoio e incentivo em nossos investimentos, projetos e sonhos. À
Joana de Souza, mãe virtuosa de quem me orgulho tanto, ainda que ignore
completamente os efeitos da queda do Ibovespa, ache que Dow Jones é algum
amigo meu e que Nasdaq é algum curso que faço. Ao João Tarciso, sempre vivo
em minhas lembranças. Ao João Tarciso, sempre vivo em minhas lembranças.
Ao Mauro Péres pelo incentivo e ao Bonamigo, sem o qual este projeto não
teria começado. A todos os que leram as primeiras versões dos capítulos e
teceram suas críticas e sugestões. Em especial aos amigos: Gilmar Ferreira,
defensor entusiasta das letras do tesouro direto, Jurandir Ferreira por suas
pinceladas e discussões econômicas e Leonardo Yamamoto por suas re exões
sobre pontos importantes do texto. Ao nosso editor Rubens Prates por ter nos
guiado com paciência e agilidade no processo de edição. A Niederho er, Larry
Williams, Charles Ellis e demais autores que nos autorizaram a reproduzir
algumas citações de seus clássicos.
Prefácio

Este é um livro sobre o mercado nanceiro, mais especi camente a Bolsa de


Valores. Nos últimos anos, a simples menção do nome Bolsa de Valores faz
com que as pessoas pensem em especulação (atribuindo um sentido negativo a
essa palavra), negócios vultosos e na possibilidade de ganhar muito dinheiro.
Promessas de ganho fácil são vendidas todos os dias como uma oportunidade
na Bolsa.
Mas o dinheiro fácil existe? Bem, é possível ganhar o equivalente a um carro
zero quilômetro em poucas horas de trading, usando derivativos (conhecidos,
entre outras coisas, por sua alavancagem). Apresentaremos neste livro, por
exemplo, um caso real de valorização exponencial de um ativo em prazos
curtíssimos. (Desde que você considere mais de 2.000% em um dia
exponencial e curtíssimo o su ciente!)
Porém, mesmo quando isso é realizado, não signi ca que foi um dinheiro
fácil: quanto maior o risco e menor a janela de oportunidade da operação, mais
complexo é manter uma rentabilidade consistente.
Assim sendo, a premissa deste livro é: a Bolsa não foi criada com a intenção
de lhe dar dinheiro.
De acordo com o megainvestidor Warren Bu ett, “se você não sabe quem é o
tolo no mercado… provavelmente o tolo é você”. De fato, em seus tempos áureos,
um dos maiores bancos de investimento do mundo dizia que o seu verdadeiro
negócio era identi car quem eram os tolos. “Conhecer o mercado é conhecer as
fraquezas dos outros”, a rmavam eles.
No mercado norte-americano, estima-se que 95% dos players perdem
dinheiro. Essa realidade não parece ser diferente no Brasil e você não precisa
car chateado com isso: não é nada pessoal; são apenas negócios. A nal,
sempre é preciso que alguém perca. Mas acreditamos que não precisa ser você.
Apoiando-se nessa realidade, existe na Bolsa a dicotomia dos tubarões versus
as sardinhas. Tubarões seriam os grandes players – megainvestidores, fundos,
bancos de investimento – e as sardinhas, o público desavisado, possuidor de
pouco ou nenhum conhecimento sobre a real dinâmica do mercado. Como a
mitologia polarizada bem ilustra, a competição entre tubarões e sardinhas não é
uma briga justa. Na prática, o que isso signi ca? Signi ca que o grosso do
dinheiro vai para o bolso de alguém...
Os 5% restantes.
Claro que sempre sobram algumas migalhas. Você certamente conhece
alguém que já lucrou na Bolsa, comprando e vendendo ações – essas pessoas
fazem parte de um universo muito restrito em relação ao volume do mercado.
Provavelmente pegaram carona na barbatana dos tubarões sem nem se darem
conta disso.
Entendemos que as sardinhas também têm sua parcela de culpa. Certos
hábitos adotados por esses traders ou investidores levam à possibilidade de
perda do capital por não serem adequados à realidade do mercado. Isso facilita
as coisas para os tubarões. É quase como se eles perdessem dinheiro
voluntariamente.
Este livro destina-se a traders, investidores, acadêmicos, estudantes do
mercado e ao público em geral que opera ou tem intenção de operar na Bolsa.
Se você pode se identi car com algum destes exemplos, este livro é para você:
• Pro ssional bem-sucedido em sua área de atuação resolve diversi car seus
recursos e criar uma reserva para investir, porém, tem receio e sente-se
desconfortável com a qualidade das informações às quais tem acesso.
• Pechinchador nato que realizou diversos cursos (bem baratinhos!) e quer,
com isso, ter um conhecimento válido que lhe garanta bom retorno (em
suma, quer retorno sem investimento em preparação).
• Alguém que compra ações após a indicação de um corretor que ligou
oferecendo tais papéis – que, segundo ele, deveriam se valorizar muito em
breve –, mas infelizmente o preço despenca logo em seguida.
• O trader opera todos os dias – às vezes até com bastante lucro –, mas acaba
tendo um desempenho mensal negativo e não entende o porquê disso,
achando que deve tratar-se de algum bloqueio mental ou psicológico.
• O indivíduo se sente atordoado pelo excesso de informações sobre trade ou
investimentos e deseja uma literatura mais objetiva.
• O investidor observa que as ações da empresa em que ele está interessado
subiram bastante nos últimos anos, mas foi só ele comprá-las que
começaram a cair (a desvalorizar), e aparentemente sem motivo (sem que
seus fundamentos tenham se modi cado).
• O acadêmico possui conhecimento prévio, embora teórico, sobre a Bolsa, e
deseja adquirir um pouco daquilo que chama de “street smarts” ou
conhecimento empírico não encontrável nos papers disponíveis na
academia.
• O iniciante em investimentos e trading deseja conhecer melhor o mercado
de capitais e acha que a informação disponível tem um caráter mais
publicitário do que informativo (ou mais super cial), não indicando os
perigos reais que pode haver na Bolsa.
• O trader começa a perceber que vários setups ou sinais de trading que
costumava operar começaram a dar sistematicamente errado, e ele suspeita
que os grandes players estejam operando contra esses sinais, mas não sabe
como encontrar evidências disso.
• O indivíduo começa a se perguntar sobre que fenômeno estaria por trás da
ocorrência de topos e fundos, e se haveria um modo de identi car os
players que movimentam o mercado.
É possível que você tenha vivenciado algum dos exemplos anteriores (ou uma
variação deles). Entendemos que este livro pode apoiá-lo e, para tanto,
estruturamos os assuntos da seguinte forma:
No capítulo 1 (Quem ganha quando você perde?), trataremos da relação
“ganha-perde”, que muitas vezes é negligenciada pelos investidores e traders – e
acreditamos que a partir desse ponto você sempre checará quem está do outro
lado das suas operações. Na sequência, o capítulo 2 (Você já visitou a cozinha?)
trata de apresentar com mais detalhes alguns dos importantes atores da Bolsa
(agentes, analistas etc.) e o modo como eles interagem, nem sempre resultando
no melhor benefício dos clientes (apresentaremos casos da CVM que
demonstram multas e acordos). O capítulo 3 (Se você acha o conhecimento caro,
experimente a ignorância) trata da possibilidade de altos ganhos e da
importância do autoconhecimento além do conhecimento de trading e
investimentos. Dedicamos o capítulo 4 (Guarde esta palavra: assimetria) para
falar da assimetria em suas diversas formas (assimetria de capital, de plataforma
e de informação), bem como sobre a característica de “soma negativa” do
mercado, que é ignorada por muitos investidores ou traders. No capítulo 5
(Qual é a sua estratégia operacional?) discutiremos as diferentes formas de
análise (fundamentalista, técnica e quantitativa) e a importância de entender
não só seus benefícios, como também suas fraquezas. Dedicamos o capítulo 6
(Palavras nais) à sedimentação das informações presentes nos demais
capítulos, bem como ao registro de nossos comentários adicionais.
Optamos por evitar o uso de termos em inglês, porém em muitos casos não
há tradução com senso comum ou que seja prontamente reconhecida pelos
investidores. Nestes casos, deixamos os termos em inglês acompanhados por
seus respectivos termos em português. Além disso, muitos termos em inglês
serão úteis ao leitor como palavras chave a serem utilizadas em buscas na
Internet para o aprofundamento de assuntos especí cos não detalhados neste
livro.
Apresentaremos em detalhe alguns exemplos de operações realizadas no Brasil
por várias instituições. Tais exemplos foram obtidos com dados presentes no
livro de ofertas. Como este tipo de visualização só mostra a instituição de
origem das operações é impossível discernir entre uma operação de um único
cliente ou de vários ao mesmo tempo. É impossível discernir entre uma
operação humana e uma automatizada. É impossível discernir entre uma
operação coordenada pela instituição ou uma coincidência de múltiplas
operações distintas entre si. Apenas para tornar a leitura mais simples, muitas
vezes utilizaremos a instituição como geradora da operação e não o termo “os
clientes da instituição”, ou ainda, mais precisamente, “o conjunto de
algoritmos e clientes da instituição operando em sincronismo no período
analisado”.
Nosso propósito é fornecer elementos para que o leitor observe as concepções
distorcidas que são difundidas para o público – muitas vezes tendo como
resultado adverso aliviá-lo de seu capital – e compreenda mais profundamente
o fenômeno de trading e investimentos. Com isso esperamos ajudá-lo em sua
jornada na produção de melhores resultados. A nal, trata-se de lucrar com os
tubarões, tentando evitar (e se possível aproveitar) as armadilhas que existem
no caminho. Você vai conhecer e entender tais armadilhas e – por meio de
exemplos e casos – terá oportunidade de vê-las em ação no dia a dia.
Dado que é impossível todos lucrarem ao mesmo tempo na Bolsa, sempre
teremos os que perdem seu capital para aqueles que estão mais preparados e
mais informados. Esperamos que nosso esforço seja útil para que você adquira
conhecimento su ciente para passar para o lado mais proveitoso da equação.
CAPÍTULO 1
Quem ganha quando você perde?

Quando você perde, ganha quem estava no outro lado da operação. Na Bolsa
existem duas polaridades envolvidas na realização de um negócio: o comprador
e o vendedor. Se houve trade é porque alguém comprou e alguém vendeu. Se
você perdeu, ganhou quem estava “contra” você.

1.1 Topos e fundos


Como não existe trade sem que alguém tenha comprado e alguém tenha
vendido, camos impressionados com o fato de que certamente alguém
comprou no preço que acabou sendo o topo histórico (o preço máximo pelo
qual uma ação já foi negociada num dado período de tempo) da Petrobras
(PETR4), que ocorreu no dia 21 de maio de 2008, conforme apresentado na
gura 1.1. Mesmo após três anos, o preço ainda não retornou ao patamar do
topo histórico. Em 8 de agosto de 2011, o prejuízo ainda estava em torno de
60%.
Comprar no topo (mesmo que não seja topo histórico) signi ca ser o último
a chegar à festa e ver a banda parar de tocar e os convidados indo embora: a sua
ação começa um movimento de queda quase que imediatamente. Quem
comprou no topo parece ter feito um péssimo negócio, então, quem faria isso?
Figura 1.1 – O topo histórico de Petrobras (PETR4).
O problema é que nunca sabemos se o preço atual será um topo ou não. Isso
só é visível depois que o tempo passou e que percebemos que o preço não
retornou ao ponto em que estávamos comprando. Signi ca dizer que no
momento em que alguém comprou a máxima do mercado, esta era apenas a
máxima do momento, não a de nitiva. Alguém compraria naquele preço se
soubesse que era o topo?
O mercado não é como uma estrada, na qual temos a sinalização nos
avisando quando ela se torna perigosa. No momento em que você compra uma
ação, não soa um alarme dizendo: “Cuidado: Aqui pode ser o topo – a partir de
agora ela vai cair.” Também ninguém lhe avisa quando a perspectiva é positiva
e o mercado está para subir (veremos depois que se trata bem do contrário:
quando o público está induzido a comprar ações, a janela de oportunidade não
poderia ser pior).
A identi cação antecipada ou mesmo em tempo real de pontos de in exão
importantes – tais como topos e fundos – é uma tarefa à qual se dedica uma
porção considerável de capital humano e nanceiro. Os maiores bancos de
investimento e gestores de capital têm seus próprios departamentos de pesquisa
– os research centers – e a verba destinada a essa atividade é considerável.
Conseguir identi car antecipadamente a possibilidade de um topo não é
tarefa fácil e geralmente deixa larga margem para erro. Por exemplo, durante o
fenômeno das pontocom – a chamada bolha das ações de tecnologia,
negociadas na NASDAQ, que estourou no ano 2000 –, muitos especuladores
quebraram vendendo as ações da NASDAQ a descoberto durante o ano de
1999. Elas estavam supervalorizadas e um topo poderia se formar a qualquer
momento (dando oportunidade para operação de venda: short selling ou venda
a descoberto), mas a cada posição de venda que eles abriam – apostando na
queda –, o mercado continuava subindo mais e mais, trazendo prejuízos que
acabaram, por exemplo, com o Manhatan Fund1 (gerenciado pelo austríaco
Michael Berger), que, tendo um prejuízo atrás do outro, começou a falsi car os
relatórios operacionais e foi descoberto em 2000 – ironicamente o ano em que
a NASDAQ fez seu topo histórico e começou a cair, na chamada quebra da
bolha das ações de tecnologia.
Desse modo, quem operava na venda acabava tendo prejuízo: cada vez que o
mercado dava sinais de que estava fazendo o topo, o preço arrancava
novamente e continuava a subir com mais força, literalmente quebrando os
operadores que apostavam na queda dos preços.
Isso é possível, basicamente, porque:
“O mercado pode permanecer irracional mais tempo do que você pode
permanecer solvente.” – Keynes
O fenômeno inverso de tentar achar o fundo também é perigoso, se você não
acerta o ponto. Muitos investidores perderam todo o seu capital durante a
longa queda que se seguiu ao crash de 1929. Mais recentemente, quem
comprou logo que o mercado começou a cair em 2008 – dependendo da ação
– ainda não recuperou seu investimento (vide exemplo na gura 1.1).
Se existe tanto risco envolvido em tentar identi car os topos e fundos do
mercado, qual a vantagem dessa prática? A questão é que o risco é geralmente
proporcional à lucratividade e isso signi ca que existe um incentivo nanceiro
muito grande por trás dessas tentativas. Virtualmente, descobrir um ponto
desses é a diferença entre um retorno substancial e um medíocre. É importante
ressaltar que estar mal posicionado durante topos e fundos é estar posicionado
de modo contrário ao novo movimento que se inicia: o que se torna uma
receita infalível para ter prejuízos. Em outras palavras, identi car topos e
fundos pode ser extremamente rentável ou pelo menos evitar perda do capital.
Voltando ao exemplo de PETR4 no topo histórico, cuja máxima foi R$
50,13 no dia 21 de maio de 2008, quem comprou acreditava que o preço iria
se valorizar o su ciente para cobrir os custos operacionais (corretagem,
emolumentos, taxa de custódia etc.) e dar lucro. Quem vendeu, por outro lado,
acreditava que o preço a partir dali iria se desvalorizar.
Em resumo, na estrutura de uma negociação na Bolsa de Valores ocorre a
existência de duas visões contrárias:
Em toda negociação em Bolsa, há duas partes que concordam quanto ao
preço e discordam quanto ao valor.
O “valor” nesse caso é a relação estabelecida entre o preço atual e a
possibilidade de sua apreciação ou depreciação futura. Investir ou operar ações
só é lucrativo ao se comprar barato (subvalorizado) e vender caro
(supervalorizado), fórmula aparentemente simples que todos já conhecemos.
Mas a verdade não é tão trivial: veremos mais adiante situações em que se pode
também lucrar com a queda ou com o movimento descendente dos preços por
meio da venda a descoberto ou short selling.
Lembrando-se da pergunta de quem lucra quando você perde, torna-se
evidente que é importante considerar quem poderia ser a sua contraparte na
negociação. Quando você está comprando uma ação, quem a está vendendo? É
alguém com mais informação ou conhecimento do que você? É alguém mais
preparado, com mais chances de estar certo? E se do outro lado estiver um
tubarão2?

1.2 O case que você di cilmente verá no MBA de nanças


Vamos agora analisar alguns fatos que ocorreram no período relativo ao atual
topo histórico das ações da Petrobras (PETR4).
Topos históricos são pontos de grande importância, pois até que o preço
ultrapasse esse nível, eles constituem a máxima absoluta da ação. Até o
momento em que este livro foi escrito, o preço das ações da Petrobras não
retornou ao nível máximo registrado em maio de 2008. Isso signi ca que quem
comprou nesse período ainda não registrou um dia sequer de lucro.
O caso a seguir (parte ccional e parte verídica) mostra como é possível
identi car certas nuances de percepção que levam os investidores a comprar
ações em momentos extremamente desfavoráveis. Vamos aos fatos:
No dia 20 de maio de 2008, foi divulgada no website da InfoMoney uma
notícia (Figura 1.2) a respeito da revisão para cima das estimativas da Petrobras
pelo Credit Suisse.
Imagine qual pode ser o impacto dessa notícia no comportamento de um
investidor comum, ainda novo no mercado e sem conhecimento de fenômenos
como sazonalidade, venda a descoberto, formação de topos etc.
Consideremos hipoteticamente um investidor essencialmente despreparado –
porém não aos seus próprios olhos –, como são muitos dos investidores pessoa
física que chegam todos os anos à Bolsa. Seu conhecimento em outras áreas
não encontra respaldo no mercado de capitais, suas habilidades pro ssionais
não são perfeitamente aplicáveis na arena dos investimentos porque esta tem
regras próprias que não se revelam ao olhar super cial.

Figura 1.2 – Notícia na InfoMoney (20/5/2008 – 12h08).


Vamos conhecer melhor o nosso amigo em questão: ele teve algum sucesso
em sua vida pro ssional a ponto de ter capital disponível para investir em ações
e isso lhe conferia certo status frente ao seu grupo de convívio. Costumava ser
reconhecido por sua perspicácia, mas investir em ações o elevava a outra
categoria. Isso era algo mais so sticado, inacessível ao comum das pessoas. A
mais de um amigo próximo ele con denciou seu interesse pelo mercado de
capitais e como planejava ser bem-sucedido – o segredo, ele revelou, era
comprar somente ações de grandes empresas com sólida administração e cujos
produtos as pessoas realmente necessitavam – e olhava para o interlocutor com
os olhos brilhando e satisfeito consigo mesmo por sua sagacidade. Seu
contentamento aumentava à medida que o amigo meneava a cabeça
a rmativamente, como se buscasse compreender a grandiosidade do seu plano.
Em qualquer oportunidade que se apresentava de mostrar seu conhecimento,
desde um churrasco com os amigos até uma degustação de vinhos, ele se
regozijava em ser consultado a respeito dessa ou daquela empresa ou da direção
atual do mercado de ações, do preço do dólar, do aumento da gasolina. Em
suma, ele era informalmente o expert em seu círculo de amigos.
Sua autoestima como “especialista” aumentava junto com o nível dos preços,
pois ele já tinha adquirido ações de algumas das principais empresas do país –
embora ainda modestamente, pois primeiro queria “testar” o mercado,
colocando em risco apenas uma pequena parte de seu capital (em torno de
20%), em razão de seu per l avesso ao risco – e lhe fazia bem vê-las subindo...
subindo... Embora sua participação no mercado fosse ín ma frente à sua
possibilidade de investimento – o que levava a um ganho nanceiro não
particularmente expressivo –, o sucesso dessas primeiras experiências o deixava
cada vez mais con ante. “Estas ações”, dizia ele, “são para a vida toda”.
Passados alguns meses de alta do mercado, su cientes para convencê-lo de
sua expertise, ele agora estava pronto para comprometer uma fatia maior de seu
capital investindo em ações. Estava em seus planos aumentar sua exposição no
mercado, comprando mais ações. Sua estratégia era diversi car sua carteira de
investimento comprando ações das 20 maiores empresas do país e aumentando
para 70% a exposição do seu capital em ações – os 30% restantes
permaneceriam em um fundo de renda xa, como uma forma de minimizar o
risco. Como podemos ver, sua estratégia era prudente.
Agora vejamos com atenção o trecho que ele mais absorveu da notícia (Figura
1.3).

Figura 1.3 – Trecho da notícia na InfoMoney.


Imediatamente ao ler a nota ele consulta a cotação de PETR4 (Figura 1.4)...

Figura 1.4 – Cotação de PETR4.


E começa a fazer cálculos: de R$ 46,80 a R$ 86,00 será uma alta de 84%!
Uma onda de excitação o percorre todo. Até então tivera resultados razoáveis
investindo em ações... Mas 84% em menos de um ano (contando a partir de
maio) era mais do que ele podia esperar!
Secretamente, ele sente orgulho de ser um pesquisador do mercado, com
acesso a conteúdos que seus amigos jamais sonhariam. A nal, re etia ele, não é
preciso muita inteligência para aplicar em renda xa, mas para entrar no
mercado acionário é preciso, além de um intelecto apurado, possuir uma
imensa disposição para garimpar informações. E isso ele fazia bem: de manhã
até à noite passava vasculhando os sites das empresas nas quais desejava investir,
buscando informações, além de sites especializados para se manter informado
sobre as principais notícias do mercado.
Ria-se dos que investiam em ações apenas acompanhando a cotação pelo
jornal, sem ter acesso às verdadeiras informações, disponíveis somente aos
iniciados na internet. Finalmente seu esforço de pesquisa estava dando
resultados, pois o que tínhamos aqui? O site havia dado uma dica... E uma dica
quente: as ações da Petrobras subiriam 84% até o nal do ano.
Se a notícia fosse referente a ações de outra empresa, especialmente se não
fosse uma blue chip3, ele consideraria a matéria duvidosa. Mas estávamos
falando da Petrobras, não de uma ação qualquer. E ele já estava ansioso por
uma oportunidade, tendo perdido no mês anterior a fabulosa alta de curto
prazo ocasionada pelo grau de investimento4 concedido ao Brasil. Ali teria sido
um ponto ideal para ter investido o montante que faltava do seu capital. Mas
ele perdeu o timing e foi torturante ver o preço subindo daquela forma sem
estar posicionado. Não há nada pior do que a sensação de estar de fora de um
bom movimento de alta. Mas estava além do seu alcance: o grau de
investimento foi concedido praticamente sem aviso. Havia rumores a respeito,
mas ninguém sabia a data ao certo. Quando se viu, as ações já estavam
disparando. Dessa vez ele estava preparado para entrar no mercado ao menor
sinal de oportunidade... Logo após a notícia veiculada no site o preço começa a
subir de forma rápida, fechando na máxima do dia em R$ 48,24, com 3,32%
de alta. Mas ele não havia comprado ainda: estava estudando alguns aspectos
operacionais, como conferir o montante que colocaria na operação, fazendo
cálculos de como caria sua carteira se ela tivesse uma posição predominante
da Petrobras. Queria manter seus investimentos diversi cados, mas sem perder
o esperado upside das ações.
No dia seguinte, PETR4 abriu com um gap de alta (quando o primeiro preço
do dia ocorre acima da máxima do dia anterior) em R$ 49,10, perfazendo
1,79% desde o fechamento anterior já no início dos negócios. Ele estava
ansioso pela abertura do pregão e assim que ela começa a subir ele pede ao seu
corretor que compre. Ela continua altista: em 15 minutos sobe mais 2,06%,
chegando a R$ 50,13. Ele está posicionado agora, muito feliz por ter tido
coragem de investir na hora certa!
É assim que se compra topo.

1.2.1 Do outro lado


Na contraparte de sua operação estava a corretora do Credit Suisse. No
momento da divulgação da notícia, eles já eram os maiores vendedores (e
continuariam vendendo nos dias seguintes).
Com a ferramenta Times and Trades podemos ver as operações de venda de
PETR4 pela corretora do Credit Suisse durante a divulgação da notícia no
website da InfoMoney (Figura 1.5). Se observarmos o saldo dessas operações
até o momento da divulgação da notícia (Figura 1.6), podemos observar que –
em termos de volume – a corretora do Credit Suisse era a maior vendedora de
PETR4. Nesse dia, também é possível constatar os momentos em que
ocorreram as suas vendas até o momento da notícia (Figura 1.7, setas em
destaque).
Figura 1.5 – Operações de venda de PETR4 pelo Credit Suisse durante a divulgação da
notícia.

Figura 1.6 – Saldo das vendas de PETR4 até a divulgação da notícia.


Figura 1.7 – Grá co de preço de PETR4 no dia da notícia.
Nos sete dias seguintes ao da publicação da notícia, eles haviam vendido o
equivalente a 537 milhões de reais em ações preferenciais (PN) da Petrobras
(considerando-se um preço médio de R$ 47), o equivalente a 11.443.600 ações
e 142 milhões de reais em ações ordinárias (ON) (levando-se em conta o preço
médio de R$ 47), ou 3.033.600 ações. A gura 1.8 é um resumo do cenário
entre os dias 20 e 30 de maio de 2008. Nela podemos ver, à esquerda, a
posição de venda acumulada pela corretora do Credit Suisse. À direita, as setas
destacam os pontos de venda.
A posição total vendida seria de aproximadamente 680 milhões de reais.
Para um observador isento dos fatos, é relevante observar que os analistas do
Credit Suisse não conseguiram convencer os seus próprios operadores e os
clientes da corretora da possível alta da Petrobras, já que a notícia era de
elevação do preço-alvo e as operações da corretora estavam no lado da venda.

Figura 1.8 – Cenário do período que acabou gerando o topo histórico de PETR4.
Durante os dias que se seguiram desde a publicação da notícia e o topo
histórico de PETR4, observamos as operações executadas.
Olhando no book (ou livro de ofertas, onde são colocadas todas as ofertas de
compra e de venda) e na ferramenta Times and Trades (na qual se registram os
negócios realizados), percebia-se que a corretora vendia praticamente para
todas as ofertas de compra que apareciam. Após a entrada de novas ordens de
compra no book é possível observar um fracionamento de ordens em lotes de
cem, de 200, de 300, de 500 e eventualmente até mais de mil ações que
acabaram minimizando o impacto que uma posição grande teria no mercado,
caso fosse vendida massivamente. Apenas acompanhando o book, não é
possível discernir entre operações humanas e automatizadas, mas tipicamente
algoritmos de TWAP5 e VWAP conseguem realizar operações de
fracionamento de maneira rápida e coordenada. Nesse cenário é possível
vender uma posição sem afetar a contínua alta do preço. Foi possível observar
ainda que quando havia sinal de que a liquidez estava diminuindo, apareciam
ordens cada vez menores dentro dessa escala e, como consequência, não havia
pressão de preços para baixo. Em alguns casos, a corretora gura nas duas
pontas da negociação. Novamente, não é possível discernir entre um conjunto
de operações coordenadas e operações ao acaso e coincidentes – a corretora
apresenta muitos clientes institucionais e privados –, mas o efeito disso no
book é que o preço se mantinha sem cair, estendendo assim o período propício
às vendas. Quando o uxo de ordens de compra das outras corretoras
aumentava, havia também um aumento do tamanho das ordens de venda. A
gura 1.9 exempli ca as operações executadas via corretora do Credit Suisse no
dia da notícia, e nela se observam diversos tipos de lotes negociados.

Figura 1.9 – Exemplo de operações do Credit Suisse no dia da notícia.


O resultado nal visível é que a corretora vendeu uma posição considerável
durante a alta do preço, e não após ele começar a cair.

É
É assim que se vende topo.

1.2.2 Não há vilões e vítimas


Não é nosso objetivo que o leitor in ra que a corretora Credit Suisse ou a
InfoMoney agiram incorretamente ou criaram uma conspiração contra o
indivíduo ccional relatado no case. Como a rmamos, apenas visualizando o
book é impossível discernir entre operações coordenadas da própria corretora e
um conjunto de operações aleatórias e coincidentes de vários clientes por meio
da corretora. Respeitamos essas empresas e entendemos que elas são
instituições independentes, muito prestigiadas e competentes. Também não
temos intenção de descrever os papéis da Petrobras como “bons”, “ruins” ou
outra classi cação qualquer. O case tem por nalidade ilustrar que não existe a
dialética dos vilões e das vítimas, mas, sim, contextos cotidianos e
comportamentos do investidor que devem ser avaliados com atenção antes da
tomada de decisões de investimento. Vamos destacar alguns pontos
importantes do case:
• Nosso amigo acreditou que a valorização seria “84% em menos de um ano
(contando a partir de maio)”. Isso é um erro básico de in ação de
expectativas, dado que o preço-alvo é uma projeção de 12 meses, e não “até
o m do ano”, como ponderou. Podemos ver claramente no relatório de
“Análise de Empresas” do Credit Suisse referente à Petrobras a indicação
Target price is for 12 months (Figura 1.10, canto inferior esquerdo).

Figura 1.10 – Trecho do relatório de “Análise de Empresas” do Credit Suisse referente à


Petrobras (21/5/2008). Fonte: https://br.credit-suisse.com/.
• O processo decisório foi focado na informação que para o investidor teria
maior peso, ou seja, o preço-alvo da ação, desprezando outras informações
relevantes e disponíveis abertamente. A gura 1.11 destaca as peças de
informação utilizadas no processo decisório.

Figura 1.11 – Peças de informação utilizadas na decisão.


Em contraste, a gura 1.12 destaca as informações que foram ignoradas pelo
investidor: indicador de volatilidade do preço das ações e divulgação de que
o Credit Suisse realiza negócios com as empresas cobertas em seus
relatórios, esclarecendo que os investidores devem estar cientes de um
potencial con ito de interesses que pode afetar a objetividade do relatório.
Essas informações estão claramente explícitas (ou seja, não são letras
miúdas no nal do documento) nas duas primeiras páginas do mesmo
relatório de “Análise de Empresas” do Credit Suisse referente à Petrobras.

Figura 1.12 – Informações não consideradas na decisão.


Ressaltamos que a equipe de analistas que preparou o relatório é imparcial,
sua opinião é independente e autônoma. Eles não possuem vínculo relevante
de ganho direto ou indireto com as empresas que analisam (Figura 1.13).

Figura 1.13 – Trecho do relatório de “Análise de Empresas” do Credit Suisse. Fonte:


https://br.credit-suisse.com/.
Disso decorrem três consequências:
• Como todo ser humano, os analistas podem errar.
• Os analistas não ganham nem perdem com o resultado de suas análises.
Dessa forma, também não perdem dinheiro se erram. Referimo-nos aqui a
perdas nanceiras e diretamente geradas pelos ativos das empresas
analisadas. Obviamente (como em qualquer pro ssão) os erros na atividade
executada terão impactos ( nanceiros, motivacionais etc.) na carreira do
pro ssional e em sua avaliação na empresa em que atua. Analistas que
erram muito não progridem em suas carreiras. Os melhores são aqueles que
erram menos, seja em frequência ou relevância. Desconhecemos analistas
infalíveis.
• A equipe de operações é independente da equipe de análise e é de se esperar
que suas inclinações sejam pouco correlatas. Ou seja, tal equipe segue o
relatório do analista se julgar pertinente. Desde o Global Settlement
(2003), um acordo assinado entre a SEC, a NASD, a NYSE e os dez
maiores bancos norte-americanos de investimento, as instituições
separaram as áreas de pesquisa para garantir a isenção de opinião e
solucionar o con ito de interesses.

1.3 Siga o dinheiro


Em loso a existe uma expressão latina para argumento de autoridade:
magister dixit, que signi ca “o mestre o disse”. Utiliza-se essa expressão no
contexto de algo que nem precisa ser discutido, porque, a nal, foi o mestre que
disse.
Em qualquer outra área, procurar a opinião do especialista é uma atitude
inteligente e pode ser considerada uma boa estratégia. Procuramos um
advogado para resolver questões jurídicas complexas, acatamos a decisão do
médico sobre que medicamento tomar, e assim por diante.
No mercado, porém, seguir os conselhos dos grandes players não está
diretamente correlacionado a bons resultados. Vamos citar como exemplo um
caso julgado pela SEC (Securities & Exchange Commission, o órgão regulador
do mercado de capitais norte-americano), no qual o banco de investimentos
Merrill Lynch realizou o seguinte procedimento:
“De posse de informações que a empresa McDonnel Douglas não tivera resultados
trimestrais favoráveis, recomendou que seus clientes corporativos vendessem a ação
enquanto recomendou a seus clientes pessoa física que comprassem. O preço da
ação despencou logo após estas recomendações.”6
Não parece um absurdo emitir duas recomendações contrárias sobre a mesma
ação no mesmo período? No entanto, sob a perspectiva dos incentivos da teoria
econômica, seria interessante comparar a receita gerada para a empresa pelos
clientes corporativos com a gerada pelos clientes pessoa física. Talvez essa
comparação pudesse nos esclarecer os motivos de um comportamento
aparentemente contraditório. Além do mais, a multa dada pela SEC foi de
aproximadamente 100 mil dólares, talvez um preço pequeno a se pagar pela
delidade de grandes clientes.
Mas a palavra do mestre tem apelo, especialmente para o público que não
possui, naquele momento, conhecimento su ciente para formular sua própria
opinião. Exatamente por isso suas percepções podem se tornar alvo de
in uências diversas que di cilmente teriam como objetivo os seus melhores
interesses.
A receita para evitar confusão a respeito de qualquer assunto relativo ao
mercado de capitais é primar pelo desenvolvimento de suas próprias
concepções e aceitar as opiniões alheias somente depois de passarem pelo crivo
de uma análise menos super cial. É preciso identi car os dois principais meios
pelos quais os grandes podem se expressar: o discurso e a movimentação
nanceira.
Nesse sentido, nossa sugestão é muito simples: sempre que as operações de
um grande player estiverem em desacordo com suas palavras, siga o dinheiro
(vide ressalvas no tópico 4.5.3).
Sempre que um banco de investimento sugerir a valorização ou desvalorização de
uma ação qualquer ou recomendar expressamente compra ou venda, observe no
mesmo dia e nos dias seguintes o teor de suas operações nessa ação. Ele está
fazendo o que sugeriu?

1.4 O mercado é cruel?


“Tudo no mercado está con gurado para separar você do seu dinheiro.” – Larry
Williams
Depois desse primeiro relato, você pode estar pensando que o mercado é um
ambiente cruel. Você não está sozinho, porque possivelmente 95%7 dos traders
e investidores ativos8 pensam da mesma forma, já que esse é o percentual
estimado dos que causam danos ao seu capital em operações malsucedidas.
Mas a verdade está longe disso, pois o mercado em si não é favorável nem
desfavorável a alguém – ele não tem prediletos. Aqui está um dos maiores erros
cometidos pelo investidor neó to, o “sardinha”, como é conhecido: atribuir
personalidade ao mercado.
Sempre que dizemos frases como: “O mercado é cruel”, “Hoje o mercado não
estava fácil”, “Ano passado o mercado estava bom, porque subiu”, “Em 2008 o
mercado estava horrível”, estamos personi cando-o. Isso é uma característica
humana comum, pois ao personi car as coisas, ca mais fácil lidar com elas.
Os antigos faziam assim com os elementos da natureza, a ponto de lhes
atribuírem caráter de divindade: havia o deus da chuva, o deus do trovão, o
deus da oresta etc. Mas essa tentativa de personi cação é a base de muitos dos
erros de investimento que o indivíduo irá cometer.
O principal aspecto de se criar uma persona para o mercado é a transferência
de responsabilidade (um amigo nosso, muito espirituoso, de nia isso
perfeitamente na frase: “A culpa é minha e eu a ponho em quem eu quiser!”).
Inconscientemente, ca mais fácil lidar com a frustração de ter perdido
dinheiro ou oportunidade de ganho se tratamos o mercado como antagonista e
responsável por nossa perda: “Não foi minha culpa... O mercado é que não estava
fácil”.
Emocionalmente, pode funcionar. O indivíduo transmite sua raiva e seu
desgosto para essa imagem personi cada, encontrando apoio e camaradagem
em outros que agem como ele: na internet é comum encontrarmos salas de
chat em que os investidores e traders discutem as últimas malvadezas desse ser
perverso. A questão toda é que a personi cação tem o efeito de obscurecer o
julgamento. Note bem: ninguém o obrigou a comprar ações, escolheu a
quantidade ou o preço, nem tampouco o momento de entrada ou de saída. Em
suma, ninguém o forçou a nada; as escolhas foram suas, o tempo todo. Você
poderia até mesmo ter escolhido não investir em ações!
Se a escolha foi sua, a responsabilidade também pertence a você. O mercado
nem sabe que você existe – ele é impessoal.
Na vida cotidiana percebemos que as pessoas têm di culdade em lidar com
fatores impessoais. Quando chutamos a quina da porta – que é perfeitamente
impessoal – com o dedinho do pé por descuido, reclamamos: “Droga de
quina!” Quando estamos dando um passeio com a namorada ou a família e
começa a chover, dizemos: “Tinha de chover justo hoje que eu vim passear?” Se
saímos de casa atrasados para um compromisso importante e enfrentamos um
engarrafamento inesperado, pensamos: “Todos os dias eu venho por aqui e não
tem engarrafamento... Logo hoje que eu tenho uma reunião importante o trânsito
está trancado!” Se compramos uma ação que estava subindo e ela começa a cair,
dizemos: “Esta ação veio subindo durante semanas... Agora que eu resolvi comprar
ela começa a cair.” Ou, no caso de ordens de stop-loss9: “O mercado veio atrás
dos meus stops!” (Um aluno nosso dizia: “Professor, eu sou um peso... Se eu subo
na ação ela cai, se eu saio ela sobe...” – “subir” e “sair” aqui entendidos como
comprar e vender.)
O foco, portanto, é sempre no “eu, eu, eu, eu...”, mas do modo incorreto,
vitimizado. Essa tendência à vitimização é constante e impede o indivíduo de
operar a realidade.
E a realidade é que a quina da porta nem sabia que você estava passando por
ali; a chuva caiu porque era de sua natureza (e, conforme a Bíblia, Deus faz
chover sobre os bons e sobre os maus); a ocorrência de engarrafamento no
trânsito foi puramente aleatória, em razão de um acidente; enquanto a ação
estava subindo ela não sabia que você estava de fora e quando ela começou a
cair ela não sabia que você tinha comprado; para nalizar, suas ordens de stop-
loss possivelmente estavam muito próximas do preço negociado e foram
atingidas justamente por isso. E se você está pesado, pode sempre fazer um
regime, mas isso não irá afetar seu desempenho como investidor.
É difícil admitirmos que certas coisas acontecem ou existem sem levar em
conta a nossa vontade ou mesmo a nossa existência; é difícil aceitar, por
exemplo, que a chuva é um fenômeno totalmente impessoal e que você devia
ter olhado a previsão meteorológica antes de sair – é muito mais conveniente
argumentar que a previsão nunca funciona e que a chuva no passeio só pode
ser obra do azar. Ninguém gosta de admitir que comprou ações no momento
errado em razão de erro de análise ou algum evento puramente aleatório do
mercado: a teoria mais interessante é a de que o mercado virou para baixo
assim que você decidiu entrar.
Essa tendência à vitimização é um processo psicológico muito elaborado, cuja
nalidade é a de proteger o ego contra um possível ataque à sua autoimagem. É
um processo de racionalização em que quaisquer desculpas, por escabrosas que
sejam, cumprem o papel de transferir responsabilidade e aliviar a tensão
emocional.
Só que o mercado, como tudo que é impessoal, exige uma abordagem
também impessoal. Alcançar ou desenvolver uma abordagem impessoal é o
primeiro e mais difícil passo a ser dado pelo investidor ativo e pelo trader. É o
primeiro passo porque sem ele a tentativa de ser bem-sucedido está
comprometida desde a origem – assim como não se constrói uma casa sobre a
areia, mas, sim, sobre a rocha, a prática de investimentos também deve estar
bem fundamentada. O fundamento aqui é a compreensão do caráter impessoal
do mercado e dos meios de lidar com essa realidade. Isso signi ca ser capaz de
agir racionalmente mesmo em meio às pressões emocionais que o mercado
inevitavelmente provoca nos seus participantes.
Em novembro de 2008, no auge da quebra da Bolsa em razão da crise do
subprime, demos uma palestra num evento de empreendedorismo, a respeito
das perspectivas para o mercado de capitais em meio a cenários de crise. O
público era composto por empreendedores, empresários, pro ssionais liberais e
investidores. (Cremos que os investidores foram os que sentaram mais à frente,
pois tinham o semblante mais carregado.) Imaginem o alvoroço que causou a
nossa seguinte observação sobre a natureza do mercado:
O mercado é justo, imparcial e democrático.
Olhos se arregalaram, tosses nervosas e pigarros foram ouvidos: a mensagem
tinha pegado todos desprevenidos. Ninguém interrompeu a palestra, nem fez
menção de se levantar e ir embora, mas era possível sentir que se não fossem as
convenções sociais – a palestra era no Rio Grande do Sul, um estado bastante
cumpridor das normas tradicionais de etiqueta – era justamente isso que iriam
fazer: ou interromper a nossa fala e nos chamar por adjetivos de baixo calão ou
levantar e ir embora.
Vendo que o público cou de certo modo transtornado pela mensagem,
percebemos que muitos ali estavam encarteirados, ou seja, comprados em uma
carteira de ações. Posicionados na compra durante uma das maiores quedas do
mercado nas últimas décadas, estavam perdendo dinheiro.
Arrematamos:
Vamos repetir: O mercado é justo, imparcial e democrático.
Confessamos que pode ter sido um pouco de sadismo, mas a situação era
muito boa para gravar na mente daquele público alguns princípios saudáveis de
investimento:
• O mercado é justo porque o retorno nanceiro é sempre exatamente
vinculado à sua atuação como investidor ou trader.
• O mercado é imparcial porque não existe a possibilidade de um ganho
realizado por uma operação sua ser creditado na conta de outrem – a não
ser por algum erro administrativo que seria imediatamente resolvido.
• O mercado é democrático porque todo cidadão, independentemente de sua
origem social, pode acessá-lo para realizar suas operações.
Se você também foi pego de surpresa, avalie melhor cada item:
O mercado é justo – Podemos dizer que qualquer ganho ou prejuízo no
mercado está sempre relacionado ao preparo, ao conhecimento e à disciplina
do investidor. Naturalmente, fatos extraordinários podem provocar uma alta
ou uma queda súbita dos preços, sem que pudessem ter sido antecipados –
mesmo nesse caso, especialmente no sentido da queda, é possível colocar de
antemão limites operacionais que minimizem o impacto de eventos
inesperados.
O mercado é imparcial – Imaginem um lugar perfeitamente à prova de
corrupção... É possível?... Sim, como vamos logo demonstrar. O mercado de
capitais é a pedra fundamental do capitalismo e isso signi ca dizer que é um
dos últimos redutos nos quais aspectos operacionais são exatamente cumpridos,
doa a quem doer. Quando George Soros especulou vendendo libra esterlina –
em uma queda de braço com o Banco da Inglaterra –, ninguém veio lhe dizer:
“Não é admissível operar dessa forma contra sua Alteza, a rainha!”; do mesmo
modo, se você entra numa operação de compra de ações e tem lucro, jamais
sua corretora irá lhe telefonar dizendo: “Veja bem... sabemos que você fez uma
operação bem-sucedida e lhe damos os parabéns por isso... Acontece apenas que na
contraparte dessa operação estava o lho do fulano, eminente industrial, e não
podemos deixar no prejuízo dele, não é? Então vamos ngir que não aconteceu
nada...”. A CBLC (Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia) trabalha
justamente para que todas as operações sejam liquidadas com perfeição.
O mercado é democrático – Como diz Larry Williams (um dos maiores
traders do mundo), o dinheiro é trocado sempre por algo de valor, e o dinheiro
que lucramos no mercado é trocado por... horas de estudo. Tempo de estudo e
dedicação, desenvolvimento de conhecimento – essa é a real moeda de troca do
investidor. Agora re ita, essa é uma condição acessível a todas as pessoas
alfabetizadas. Alguém que veio do subúrbio ou de uma favela será tratado da
mesma forma que o lho do industrial ou do senador. Em suma, se num dado
momento ambos estiverem em posições diferentes na mesma operação, vencerá
quem tiver dedicado mais tempo ao estudo do mercado.
O mercado é simplesmente o mecanismo que a todo o momento permite a
aproximação entre dois indivíduos que desejam negociar e que, apesar de
concordar sobre o preço da ação ou do ativo, discordam quanto ao seu valor.

1 Fonte: http://www.bloomberg.com/apps/news?pid=newsarchive&sid=aglER9IsisrQ
2 No jargão do mercado, “tubarão” é o grande player – indivíduo ou instituição com capital su ciente
para mover o mercado num dado contexto.
3 No jogo de pôquer, as chas azuis (blue chips) são as mais valiosas. O termo é usado no mercado
nanceiro para designar ações de empresas consideradas de primeira linha: sólidas, com comprovada
lucratividade, principalmente em longo prazo.
4 O grau de investimento é uma classi cação dada pelas agências de rating (exemplos: Fitch Ratings, a
Moody’s e a Standard & Poor’s) a países com mais possibilidades de honrar seus compromissos.
5 TWAP, VWAP – Médias de preço relacionado a tempo (TWAP) ou volume (VWAP). Negociar em
TWAP signi ca não pagar muito além do preço médio negociado naquele período (por exemplo,
durante 15 minutos). O mesmo para VWAP, só que nesse caso a grandeza de valor é o volume.
6 Conferir em: e de nitive guide to futures trading, Larry Williams.
7 Ver o livro de Noble Drakoln, Winning the trading game. Why 95% of traders lose and what you must do
to win.
8 Investidor ativo: ao contrário do investidor “passivo”, que permanece posicionado durante longo
período de tempo, este tipo de investidor é caracterizado por gerenciar suas aplicações mais
ativamente, entrando e saindo de posições a cada mês ou grupo de meses.
9 Stop-Loss ou simplesmente “stop” é um tipo de ordem utilizada para preservação do capital, não
permitindo que a posição continue negativa além de certo ponto. É um limite de perda con gurado
pelo próprio trader ou investidor. Pode ser automática (ordem de stop-loss) ou apenas uma referência
do ponto em que o trader quer encerrar a operação, caso negativa.
CAPÍTULO 2
Você já visitou a cozinha?

“Aprendam a viver com os con itos de interesses.” (Frase dos advogados do Goldman
Sachs aos sócios da empresa.)
Charles Ellis, em e Partnership: e Making of Goldman Sachs.

Experimente entrar no seu restaurante predileto, sentar-se à mesa e escolher no


cardápio um prato de sua preferência. Enquanto ele é preparado, belisque o
couvert despreocupadamente, saboreando um dos melhores vinhos da carta. O
seu prato vem após um período razoável de espera, fumegando e com um
aroma delicioso. Você experimenta um bocado e sente-se feliz por desfrutar dos
prazeres da gastronomia.
Essa é uma experiência. Bem diversa é a experiência de logo depois de fazer o
pedido, acompanhar a preparação do prato na cozinha, ou melhor, nos
bastidores.
A série de TV Kitchen Nightmares mostra o chef internacional Gordon
Ramsay remodelando restaurantes que estão à beira da falência – e isso signi ca
inclusive expor e eliminar práticas de higiene duvidosas que estejam ocorrendo
em sua cozinha: comida estragada, comida reutilizada, freezers desligados
durante a noite para economizar energia elétrica, sujeira, baratas, vemos de
tudo nos episódios do programa e invariavelmente o chef Gordon Ramsay
passa um sermão nos donos por tamanha negligência com os princípios básicos
de higiene.
No mercado, a primeira experiência acima (a positiva) seria equivalente a
conhecer super cialmente os serviços e o ambiente da Bolsa. Sites de corretoras
com fotos de pessoas sorridentes e bem-sucedidas, o primeiro atendimento ou
a reunião no escritório dos agentes autônomos, palestras educacionais
promovidas para atrair o público, tudo isso equivale a ver somente os aspectos
positivos do restaurante.
Mas se desejar realmente conhecer a cozinha, você pode encontrar algumas
surpresas...

2.1 Bom dia, você quer comprar ações?


A conversa poderia seguir mais ou menos assim:
– Bom dia! Estou ligando para falar dos prospectos de investimento para este
mês...
– Não estou interessado.
– Não está interessado em ganhar dinheiro? Todos estão interessados em
fazer algum dinheiro... Deixe-me explicar melhor do que se trata... A
empresa XYZ está obtendo resultados fenomenais e suas ações estão com
um potencial de valorização de X%, o que, ao preço corrente por ação, é
realmente uma barganha!
– ...
– Como eu estava lhe dizendo, a empresa XYZ...
E assim seguia o corretor de ações no seu trabalho de realizar hard calls ou
chamadas aleatórias a pessoas que ele não conhece, a m de vender ações e
gerar comissões para a corretora.
Se você nunca recebeu uma ligação como essa, é porque esse modelo
agressivo de abordagem de possíveis clientes está mais em voga nos Estados
Unidos do que no Brasil. Por aqui, as corretoras buscam trazer o público para
eventos educacionais como palestras gratuitas (com sorteio para os cursos!), no
intuito de abrir o máximo de contas possível e transformar os ouvintes em
clientes.
Você pode não ter recebido (ainda) uma ligação telefônica desse tipo, mas
certamente já recebeu e-mails (ou spams?) convidando você para cursos,
palestras e eventos diversos de divulgação do mercado nanceiro. E não adianta
pedir para descadastrarem seu e-mail: sempre volta. Eles são persistentes.
Os títulos são impactantes (Curso avançado..., Aprenda a dominar..., Tudo
sobre derivativos e... etc.), as apresentações em Flash no corpo do e-mail tem
um layout elegante, sempre com imagens de pessoas sorrindo ou com estilo de
executivos. “Venha para a nossa corretora e você será bem-sucedido também” é
a mensagem subliminar.
É de se car entusiasmado. Ainda mais se você visita algumas corretoras ou
alguns escritórios de agentes autônomos: geralmente localizadas em prédios
imponentes, nos bairros mais elegantes da cidade, hall com pé-direito triplo,
sala de estar decorada com sofás de couro e recepcionista oferecendo café com
um sorriso no rosto.
Nas reuniões com futuros clientes (prospects é o termo utilizado), a
calculadora nanceira torna-se instrumento fundamental para convencê-lo de
que eles possuem conhecimento superior. O seu contato na corretora tenta
adivinhar quanto de dinheiro disponível você tem para investir, e talvez lhe
pergunte isso sem mais delongas. E podem ser hábeis em convencê-lo – graças
à calculadora nanceira e a algumas ações escolhidas previamente – de que se
você tivesse sido cliente desde o ano passado, estaria agora com o dobro do seu
capital.

2.2 O agente autônomo ou corretor de ações


Muito provavelmente o seu contato na corretora é um agente autônomo ou
corretor de ações. Eles fazem a linha de frente, interagindo com os clientes e
abordando possíveis futuros clientes.
De agente autônomo para analista há uma distância fenomenal. O agente
autônomo de investimentos é um pro ssional regulamentado pela CVM, cuja
função (e total extensão de atribuições) é a de atuar como um mediador entre
você e os outros investidores ou traders na negociação de ações ou derivativos.
Ele serve de canal entre as duas partes de um negócio, buscando realizar o
casamento das ordens de compra e venda.
Com o advento dos sistemas de negociação eletrônica, o corretor de ações
saiu do pregão viva voz, local físico na Bolsa onde os corretores se encontravam
para apregoar as ofertas de compra ou de venda de seus clientes, perdendo sua
função primordial de intermediário.
Observe o uxo da execução de uma ordem de compra de ações antes e
depois da extinção do pregão viva-voz:
Pregão viva-voz:
1. O cliente liga para a corretora;
2. O agente autônomo recebe a ordem;
3. E a comunica ao operador que negocia no pregão;
4. O operador se comunica com os operadores das outras corretoras em
busca de uma contraparte para a ordem do seu cliente;
5. Quando isso acontece, fecha o negócio, transmite o preço de execução ao
agente autônomo na corretora;
6. O agente, então, comunica ao cliente os detalhes do negócio realizado.
Pregão eletrônico (ordem “via mesa”):
1. O cliente liga para a corretora;
2. O agente autônomo recebe a ordem;
3. O próprio agente a executa no TROM ou no Sistema Mega Bolsa
(plataforma de execução do pregão eletrônico);
4. O agente autônomo comunica ao cliente os detalhes de execução.
Observe como a mudança do pregão viva-voz para pregão eletrônico já
eliminou a presença de um dos agentes na execução da ordem (aquele que
estava no pit ou local físico de negociação nas dependências da Bolsa).
Analise agora o seguinte uxo de ordem, quando o cliente utiliza o sistema
do home broker:
Pregão eletrônico (via home broker):
1. O cliente não liga para a corretora;
2. O cliente visualiza por si próprio na plataforma do home broker os níveis
de negociação (melhores ordens de compra e de venda);
3. Ele mesmo envia sua ordem, simplesmente digitando nos campos
apropriados o código da ação, a quantidade, o valor e seu código de cliente;
4. O negócio é executado e ele é avisado imediatamente da execução.
Nesse último caso, em nenhum momento o agente autônomo de
investimentos teve participação ou foi necessário. Dada a possibilidade de se
enviar as ordens sozinho, pelo computador, qual a nalidade de utilizar os
serviços de um agente autônomo?
O agente autônomo, por de nição da instrução 497 da CVM, intermedeia
negociações. Não faz parte da de nição (artigo 1º):
a. Decidir pelo cliente;
b. Induzir o cliente a operar;
c. Fornecer análises ao cliente.
Mas alguns agentes tentam convencê-lo de que são essenciais para o seu
sucesso nas operações... De outro modo, como você se disporia a pagar
corretagem de mesa? Parte desse processo de convencimento se dá por meio de
dicas sobre o mercado e suas operações.
Segue o trecho da instrução da CVM que dispõe sobre o que é vedado a um
agente autônomo:
“INSTRUÇÃO CVM Nº 497, DE 3 DE JUNHO DE 2011
Dispõe sobre a atividade de agente autônomo de investimento.
CAPÍTULO IV – VEDAÇÕES
Art. 13. É vedado ao agente autônomo de investimento ou à pessoa jurídica
constituída na forma do art. 2º:

I. manter contrato para a prestação dos serviços relacionados no art. 1º


com mais de uma instituição integrante do sistema de distribuição de
valores mobiliários;

II. receber de clientes ou em nome de clientes, ou a eles entregar, por


qualquer razão e inclusive a título de remuneração pela prestação de
quaisquer serviços, numerário, títulos ou valores mobiliários ou
outros ativos;
III. ser procurador ou representante de clientes perante instituições
integrantes do sistema de distribuição de valores mobiliários, para
quaisquer ns;
IV. contratar com clientes ou realizar, ainda que a título gratuito, serviços
de administração de carteira de valores mobiliários, consultoria ou
análise de valores mobiliários;

V. atuar como preposto de instituição integrante do sistema de


distribuição de valores mobiliários com a qual não tenha contrato
para a prestação dos serviços relacionados no art. 1º;

VI. delegar a terceiros, total ou parcialmente, a execução dos serviços que


constituam objeto do contrato celebrado com a instituição integrante
do sistema de distribuição de valores mobiliários pela qual tenha sido
contratado;
VII. usar senhas ou assinaturas eletrônicas de uso exclusivo do cliente para
transmissão de ordens por meio de sistema eletrônico; e
VIII. confeccionar e enviar para os clientes extratos contendo informações
sobre as operações realizadas ou posições em aberto.”

Desse modo, sempre que você liga para o seu corretor e pergunta “Você acha
que é um bom momento para comprar ações?”, ele pode lhe dar um panorama do
mercado ou fatos, como “a bolsa americana está caindo”, “nossa bolsa está
subindo x%”, e deixá-lo tirar suas conclusões. Se ele zer mais do que isso –
tirar qualquer conclusão dos acontecimentos correntes e administrar sua
carteira –, ele desviou-se do escopo principal de sua pro ssão que é o de ser um
mediador.
Para dar uma ideia dos prejuízos que um agente autônomo que conduz mal
sua atividade pro ssional pode causar, lê-se no relatório de 2008 do
ombudsman da Bovespa:
“Agentes Autônomos
A maioria das reclamações com pleito de ressarcimento de prejuízos teve origem na
atuação de agentes autônomos de investimento, que atuaram como
administradores de carteira, tomando decisões de operações que não foram
ordenadas pelos clientes.
Como eles são normalmente remunerados tendo por base um percentual da
corretagem gerada, a tentação de alavancar posições é muito grande, sendo muito
frequentes as situações em que os agentes tentam convencer o cliente das vantagens
dessa estratégia. Raramente dão a mesma ênfase nos riscos de prejuízo na hipótese
de queda dos preços das ações.”
Quando o cliente exige reparação do prejuízo causado pelo agente autônomo,
pode ocorrer de a própria Bolsa, na gura do seu ombudsman, intermediar o
acordo, sem que chegue às vias judiciais:
“Acordos Formais
Em 2008, os acordos formais foram em maior número e envolveram valores
superiores aos dos anos anteriores, (...).
Com uma única exceção, os prejuízos que geraram as reclamações foram
decorrentes da atuação de Agentes Autônomos de Investimento.
Foram rmados 10 acordos, no montante de R$ 1.427.000,00, sendo R$
1.112.000,00 pagos em espécie e R$ 315 mil com reposição de ações.
A maioria das reclamações que deram origem a esses acordos ocorreu no último
trimestre, o que demandou esforços redobrados do Ombudsman nessas mediações.
Algumas ainda estão em curso na data deste relatório.
Como a condição essencial para se chegar a um acordo é a transigência das partes,
houve diversos percentuais de ressarcimento de prejuízos, oscilando entre 50% e
80%.”
Somente no primeiro semestre de 2011 a CVM abriu 505 processos por
queixas de investidores. A gura 2.1 apresenta o ranking com os processos
abertos, por instituição. Estes processos foram provenientes de um total mais
de 15 mil reclamações.
O maior volume de reclamações (35,64%) trata da atuação de instituições
participantes do sistema de distribuição de valores mobiliários em operações no
mercado. Nesse grupo, 66% eram problemas na negociação de ativos,
principalmente sobre ordens não cumpridas ou alegadamente realizadas sem a
anuência de clientes. Desse percentual, em 12% ouve menção ao envolvimento de
agentes autônomos.
Valor online1

Figura 2.1 – Processos abertos na CVM . (Fonte: Valor online)


Somente nas duas primeiras provas para agente autônomo, realizadas no ano
passado (até agosto de 2010), havia mais de 1.400 inscritos. A ANCOR
(Associação Nacional das Corretoras) registra cerca de mil novos agentes
autônomos por ano. Como vimos, não há a menor possibilidade de todos esses
pro ssionais sobreviverem no mercado por meio de corretagem de home
broker. Desse modo, o corretor de ações, o broker, que até então era uma
pro ssão de relativo prestígio, está se encaminhando para tornar-se uma
atividade secundária.
Os motivos pelos quais alguém usaria o corretor para enviar ordens via mesa
seriam:
1. A impossibilidade de acompanhar o pregão;
2. A necessidade pessoal (emocional) de ter alguém gerenciando suas ordens;
3. O desejo de solicitar um tipo de parecer pro ssional quanto à validade da
operação, contando com a experiência pro ssional do corretor.
Os dois primeiros motivos podem fazer parte do escopo da de nição da
CVM (Instrução 434). O terceiro não é derivado da de nição, tampouco no
que diz respeito ao exercício da atividade do agente autônomo (artigo 3º e
artigo 4º), no entanto, pode ocorrer que, em virtude de pressões originadas
pelos próprios clientes, alguns agentes autônomos acabem expressando, ainda
que indiretamente, suas visões sobre o mercado.
Sob esse aspecto é muito louvável a iniciativa das corretoras e dos agentes de
difundir conhecimento e educação nanceira com palestras e cursos. Toda
forma de contribuir para o conhecimento dos clientes é válida, na medida em
que os torna mais independentes de opiniões alheias para sua tomada de
decisão.

2.3 O analista de valores mobiliários


A quem recorrer, então, na busca de informações, orientações, dicas sobre o
mercado nanceiro? A primeira resposta que vem à mente é: “Ao analista de
ações.” No Brasil, a pessoa autorizada pela CVM para gerar relatórios de
indicação de investimento, emitir pareceres e sugerir carteira de ações é o
analista de valores mobiliários. No entanto, às vezes vale a pena ser um pouco
cético quanto à qualidade das informações obtidas de alguns analistas.
Em primeiro lugar, o analista não precisa ser necessariamente formado em
áreas correlatas com o mercado nanceiro (tais como economia, contabilidade
ou administração), podendo ter sua formação em qualquer área de nível
superior, contanto que comprove experiência pro ssional su ciente em
entidade do mercado nanceiro para atender aos requisitos da CVM. Por meio
do estudo das variáveis econômicas nacionais e mundiais, além de estudo dos
setores da economia mais propensos a uma expansão ou retração, os analistas
buscam identi car a composição ideal de um portfólio de ações que possa gerar
o maior lucro possível dentro da menor faixa de risco.
Em segundo lugar, pode ocorrer uso ilegítimo da prerrogativa pro ssional. A
seguir, exemplos do que consideramos que seria conduta inadequada para um
analista:
• Envio consciente de análises boas sobre empresas em situação ruim.
Em seu livro e partnership, Charles Ellis indica a prática de analistas das
equipes de research manipulando dados para não prejudicar as empresas
que tinham relacionamento comercial com o banco. Como a maior parte
do salário dos analistas era paga pelos investment bankers, estes não
desejavam nenhuma cobertura ou análise negativa sobre as empresas que
eram suas clientes. Isso gerou todo tipo de desinformação possível:
imaginem uma empresa cujo balanço, as vendas ou qualquer outro aspecto
de saúde nanceira estivessem apresentando problemas – haveria uma forte
pressão interna para que os analistas não divulgassem ao público esse tipo
de informação. Nos piores casos, relatórios favoráveis recomendavam a
compra de ações de empresas que, internamente, os e-mails dos analistas
consideravam como “lixo”. Essas eram violações puras e simples das regras
da NASD e da NYSE contra atos ou práticas contrárias à negociação justa.
Há casos em que os analistas publicavam avaliações exageradas ou sem
garantia com opiniões sem base razoável. Esses casos incluem também o
não rebaixamento das estimativas de lucro de uma companhia porque ela
estava perto de seu IPO (Oferta Pública Inicial de Ações).
• Publicação de análises destinadas a gerar demanda arti cial no público.
(Quaisquer avaliações positivas cujo propósito seja manter o público
comprando a ação, embora os fundamentos da empresa não re itam
perspectiva favorável.)
Para darmos um exemplo, em maio de 2001 a empresa WorldCom tinha a
melhor avaliação possível pelos analistas do Goldman Sachs, embora o
analista sênior norte-americano tenha dito ao seu colega europeu que “teria
amado cortar a avaliação positiva há muito tempo”, mas que não o fazia
porque “infelizmente, nós não podemos cortar [a AT&T] porque nós estamos
essencialmente restringidos ali. E sem cortar a AT&T, não há consistência
alguma em cortar a WorldCom”. Quando um fundo hedge perguntou ao
analista do setor de telecomunicações, em abril de 2001, se deveria
comprar, vender ou segurar a WorldCom – cuja ação custava 20 dólares –,
a resposta foi vender. Para quem não lembra, a WorldCom foi em seguida
acusada pela SEC (Securities and Exchange Commission) de fraude
contábil e suas ações fecharam a dez centavos de dólar.
• Envio de análises con itantes para dois grupos distintos de clientes
(exemplo: caso relatado no tópico 1.3, “Siga o dinheiro”, sobre a Merrill
Lynch enviando recomendação de “compra” para os clientes menores e
recomendando “venda” para os grandes clientes institucionais).
As práticas citadas constituem exemplos de como a atividade do analista pode
ser utilizada para servir a outros interesses que não os do público investidor.
Isso nos leva à compreensão de que nem todos os relatórios de análise são
isentos de viés, e, como não temos como saber quais podem estar virtualmente
comprometidos, somos forçados a abordar todos eles com uma dose sadia de
ceticismo, buscando, sempre que possível, con rmar as informações – e
conferir se a corretora ou o banco de investimento que publicou o relatório está
seguindo, na prática, suas próprias recomendações (vide exemplo no tópico
1.3, “Siga o dinheiro”).
Mas agentes autônomos que podem in uenciar o cliente a realizar operações
visando apenas à comissão na corretagem e analistas que podem ser
tendenciosos em seus relatórios de análise não são os únicos problemas que o
investidor ou trader têm de enfrentar.
Ainda temos que prestar bastante atenção à estrutura operacional, que
envolve back-o ce e plataformas.

2.4 Back-o ce e plataformas operacionais


Um importante elemento da estrutura do mercado é o centro onde são
realizados os processos relativos à manutenção das contas dos clientes de uma
corretora. Em outras palavras, o back-o ce. Nele são resolvidas questões como
margens de garantia, custódia, autorização para operar mercados, crédito de
valores etc.
Parte do serviço do back-o ce é realizada por pessoas, e pessoas podem
cometer erros. Em certos casos, o erro é corrigido rapidamente. Em outros,
pode ser o início de uma longa jornada, especialmente se corrigir o erro implica
prejuízo para a corretora. Nesse particular, vale o velho ditado: “O cliente
sempre tem razão... A menos que deseje ser ressarcido!”
Especialmente quando o erro ocorreu em razão de uma parceira da corretora:
a empresa que fornece o sistema de tecnologia. Se um erro de sistema causou
prejuízo ao cliente – dando um exemplo, se o cliente enviou uma ordem de
venda de uma ação a um preço X e, por qualquer motivo, a ordem não foi
executada e no dia seguinte o preço da ação caiu consideravelmente e ele cou
preso na operação, achando que estava fora, mas na verdade sofrendo a
desvalorização do preço –, muito provavelmente a corretora jogará a
responsabilidade para a empresa de tecnologia, que possivelmente culpará a
própria Bolsa – e, enquanto isso, o cliente é quem ca com o prejuízo e ele se
questiona se vale a pena ou não passar o trabalho de entrar em juízo contra a
corretora, dada a morosidade do sistema judiciário brasileiro. (Para citar um
exemplo, uma corretora que conhecemos às vezes decide atualizar o sistema
durante o pregão... e sem aviso prévio!)
Nesse caso, a corretora entende que a responsável é a empresa que fornece a
tecnologia, mas na visão do cliente quem contratou a empresa de tecnologia foi
a própria corretora, que, portanto, deve arcar com a escolha de seus parceiros
de negócio.
A Instrução CVM nº 380 esclarece:
“Art. 5º – As corretoras eletrônicas devem medir, continuamente, a capacidade de
atendimento aos clientes de seus respectivos sistemas, por meio de indicadores de
capacidade.
(...)
§ 4° As entidades autorreguladoras devem de nir, no prazo de 30 (trinta) dias
contado da publicação desta Instrução, limites minimamente aceitáveis para cada
um dos indicadores referidos no §1° deste artigo, comunicando-os imediatamente
à CVM.”
Os ofícios circulares “217/2001-SG” e “082/2006-SG” da Bovespa dizem
respeito às exigências para sites home broker e sobre os indicadores pertinentes.
Porém, a disponibilização de indicadores para os usuários ainda não é um rito
simples ou padronizado. No site da CVM2 é possível visualizar um processo
indeferido – Processo CVM nº SP2010/0062 – no qual o requerente (um
usuário de home broker) faz um “Pedido de disponibilização de indicador de
tempo de registro de ordem”.
Analisando contratos padrão de qualquer corretora, provavelmente você não
encontrará uma a rmação de responsabilidade por quaisquer prejuízos ou
lucros cessantes decorrentes de mau funcionamento da plataforma que a
corretora oferece aos clientes.

2.5 Entra em cena a CVM


A CVM (Comissão de Valores Mobiliários), na sua qualidade de
regulamentadora e scalizadora do mercado de bolsa e de balcão brasileiro,
busca informar os investidores sobre os riscos inerentes ao mercado, por meio
de alertas em seu site.
Alguns alertas, para exempli car:
“Alertas ao Investidor
Situações de risco ao investidor:
Golpe das ligações sobre ações ou outros investimentos “esquecidos” –
Nesse tipo de golpe, alguém entra em contato informando que você possui ações
de uma determinada companhia (ou cotas do “Fundo 157”) e oferece o serviço de
“recuperar” o investimento e vendê-lo em seguida. No entanto, para que os papéis
possam ser vendidos, é exigido o pagamento de um valor, antecipado, o qual é
justi cado de diferentes formas: “imposto de renda”, “taxa cobrada pela CVM” ou
“corretagem” (...).
Oferta irregular de contratos de investimento coletivo
Algumas empresas ou pessoas se passando por empreendedores oferecem ao
público a oportunidade de realizar investimentos por meio de contratos de
parceria, mas sem registro na CVM. Muitas vezes, essa distribuição pública é
acompanhada de promessas irreais de rentabilidade, de modo a atrair um número
maior de aplicadores. O convite é para que se aplique, por exemplo, na engorda de
animais ou ainda em outros empreendimentos (produção agrícola, re orestamento
etc.) que seriam capazes de gerar lucro su ciente para remunerar o capital investido
pelas diversas pessoas que aceitam integrar esse “pool” de aplicadores.
A oferta pública de valores mobiliários (como os contratos de investimento
coletivo) exige registro na CVM (podendo ser dispensada em casos especí cos),
sendo regulada pela Instrução CVM nº 296/98. Nesses empreendimentos
irregulares, além de a operação ocorrer à margem da lei, é comum que existam
casos onde os saques dos investidores sejam pagos com o dinheiro de novas
aplicações, caso em que o sistema funciona como uma espécie de “pirâmide”
nanceira. Quando as retiradas superam as aplicações, o sistema entra em colapso,
por incapacidade de honrar os pedidos de saque. Mesmo com a responsabilização
dos infratores, a recuperação do capital investido encontra bastante di culdade.”
Quando são constatadas práticas irregulares por parte dos membros do
mercado de capitais brasileiro, a CVM julga esses casos e impõe advertências,
multas e punições.
A seguir, alguns tipos de condutas sujeitas a punição pela CVM3. Nestes
exemplos, iremos ver:
1. O caso que ocorreu naa corretora Ágora: a conta de um cliente foi operada
em opções, sem que o cliente tivesse assinado um contrato para esse tipo de
operação.
2. O caso do banco de investimentos Morgan Stanley ter divulgado
informações sobre a empresa Le Lis Blanc, antes de sua oferta pública de
ações – durante o chamado período de silêncio, imposto pela
regulamentação para não in uenciar os investidores.
3. O caso do banco de investimentos Credit Suisse ter operado com
informações privilegiadas as ações da EMBRAER (aqui a multa foi uma
quantia considerável: 19,2 milhões de reais!). A gura 2.2 destaca o trecho
da notícia da revista Veja que fala sobre o caso e a multa aplicada pela
CVM4.
Figura 2.2 – Notícia da revista Veja sobre a multa do Credit Suisse pela CVM.
4. Eike Batista rompendo o período de silêncio durante o IPO da OGX
Petróleo e Gás Participações S.A. A gura 2.3 destaca o trecho da notícia da
revista Veja que fala sobre o caso5.
Figura 2.3 – Notícia da revista Veja sobre a multa de Eike Batista pela CVM. Fonte:
http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-line/economia/cvm-multa-eike-por-falar-demais/.
5. O caso da corretora PAX, que empregava como agentes autônomos
pessoas não credenciadas pela CVM para exercer a função.
6. O caso da empresa de auditoria KPMG, pela emissão de um parecer sem
ressalvas para demonstrações contábeis de uma empresa que iria abrir
capital na Bolsa.
7. O caso do Banco Safra, que aplicou automaticamente o saldo de contas
correntes de clientes em fundos de investimento de sua própria gestão.
Exemplo 1
“APRECIAÇÃO DE PROPOSTA DE TERMO DE COMPROMISSO – PROC.
RJ2004/4457 – ÁGORA CTVM S.A.
Reg. nº 6730/09 Relator: SGE
Trata-se de apreciação de proposta de Termo de Compromisso apresentada pela
Ágora Corretora de Títulos e Valores Mobiliários S.A. previamente à instauração
de Processo Administrativo Sancionador, tendo em vista a possível infração ao art.
12 da Instrução 14/80, ao ter realizado operações no mercado de opções em nome
de cliente da corretora, sem apresentação do contrato padrão para operações nesse
mercado devidamente assinado.
A Ágora encaminhou proposta de celebração de Termo de Compromisso em que,
após negociações com o Comitê, se comprometeu a: (i) ressarcir o cliente no
montante de R$ 3.520,00, devidamente corrigido pela taxa referencial do Sistema
Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), a partir da data das operações tidas
como irregulares até a data do efetivo pagamento; e (ii) pagar à CVM a quantia de
R$ 100 mil.”

Exemplo 2
“APRECIAÇÃO DE PROPOSTA DE TERMO DE COMPROMISSO – PROC.
RJ2008/3931 – BANCO MORGAN STANLEY S.A.
Reg. nº 6106/08 Relator: SGE
O presente processo teve como origem as declarações do Sr. Carlos Guilherme
Steagall Gertsenchtein, Vice-Presidente do Banco Morgan Stanley S.A., publicadas
pela Agência de Notícias Broadcast, que faziam referências à oferta pública de
distribuição primária de ações ordinárias da Le Lis Blanc Deux Comércio e
Confecções de Roupas S.A. (“Companhia”) durante o período de silêncio
(possíveis infrações ao art. 48, IV e art. 49 da Instrução 400/03). Ressalte-se que o
Banco Morgan Stanley S.A. era um dos coordenadores da oferta pública da
Companhia. (...)
Posteriormente, o Banco Morgan Stanley S.A. apresentou proposta de Termo de
Compromisso, se comprometendo a: (i) observar as orientações emanadas da
CVM com a nalidade de assegurar a tempestiva divulgação de informações no
âmbito de eventuais ofertas públicas de valores mobiliários das quais participe ou
venha a participar, nos termos da legislação aplicável emanada da CVM; e (ii)
pagar à CVM o montante de R$ 100 mil.
Quanto à proposta apresentada, o Comitê considerou que, além de terem sido
preenchidos os requisitos legais, a proposta atende ao escopo do instituto do
Termo de Compromisso, mostrando-se conveniente e oportuna sua aceitação, por
contemplar obrigação tida como bastante para inibir práticas da mesma natureza
pelos participantes do mercado, em especial aqueles que tomam parte em uma
oferta pública. No que tange ao compromisso de observar as regras emanadas pela
CVM acerca da matéria, o Comitê entende que se a gura desnecessária, vez que se
cuida de obrigação a qual o proponente já está impelido a cumprir,
independentemente da celebração do ajuste em tela.
O Colegiado deliberou pela aceitação da proposta de celebração de Termo de
Compromisso apresentada pelo Banco Morgan Stanley S.A.”
Exemplo 3
“APRECIAÇÃO DE NOVA PROPOSTA DE TERMO DE COMPROMISSO –
PAS 22/2006 – EMBRAER
Reg. nº 6152/08 Relator: DEM
Trata-se de apreciação de nova proposta de celebração de Termo de Compromisso
apresentada por Credit Suisse International (atual denominação de Credit Suisse
First Boston International), acusado no âmbito do PAS 22/2006 de ter se utilizado
de informação relevante ainda não divulgada ao mercado (§ 4º do art. 155 da Lei
6404/76 e § 1º do art. 13 da Instrução 358/02).
Em reunião realizada em 12.08.08, o Colegiado rejeitou a proposta anteriormente
apresentada, acompanhando o parecer do Comitê de Termo de Compromisso.
Posteriormente, o proponente apresentou nova proposta em que se propõe a pagar
à CVM o valor de R$ 19,2 milhões, em duas parcelas.
Durante a discussão do assunto, a Procuradoria Federal Especializada concluiu pela
inexistência de óbice legal para análise acerca da conveniência e oportunidade na
celebração do compromisso ora proposto, nos termos do que dispõe o art. 9° da
Deliberação 390/01. Os três membros do Comitê de Termo de Compromisso
presentes à reunião, Roberto Tadeu Antunes Fernandes, Elizabeth Lopes Rios
Machado e José Carlos Bezerra da Silva, também se manifestaram pela aceitação da
nova proposta.”

Exemplo 4
“APRECIAÇÃO DE PROPOSTA DE TERMO DE COMPROMISSO – PAS
RJ2009/0485 – OGX PETRÓLEO E GÁS PARTICIPAÇÕES S.A.
Reg. nº 6693/09 Relator: SGE
Trata-se de apreciação de propostas de Termos de Compromisso apresentadas por
Eike Fuhrken Batista, Banco de Investimento Credit Suisse Brasil S.A. e José
Olympio da Veiga Pereira, no âmbito do PAS RJ2009/0485. Os proponentes
foram acusados, o primeiro na qualidade de controlador indireto e presidente do
conselho de administração da OGX Petróleo e Gás Participações S.A., o segundo
na de banco coordenador da oferta pública e o terceiro na de diretor do banco
coordenador de divulgar na mídia declarações sobre a oferta pública de
distribuição primária de ações ordinárias de emissão da OGX previamente à
publicação do Anúncio de Encerramento da Distribuição (infração ao inciso IV do
art. 48 da Instrução 400/03).
Devidamente intimados, todos os acusados apresentaram suas defesas, bem como
propostas de celebração de termos de compromisso em que, após negociações com
o Comitê, se comprometem a:
Sr. Eike Fuhrken Batista: pagar à CVM o montante de R$ 100 mil;
Banco de Investimento Credit Suisse Brasil S.A. e o Sr. José Olympio da Veiga
Pereira: pagar à CVM individualmente o montante de R$ 50 mil cada um,
totalizando R$ 100 mil.
Segundo o Comitê, a proposta apresentada pelo Sr. Eike Fuhrken Batista
contempla obrigação adequada para inibir a prática de condutas semelhantes pelo
próprio proponente e por terceiros que se encontrem em situação similar,
revelando-se conveniente e oportuna sua aceitação.
Em relação à proposta apresentada em conjunto pelo Credit Suisse e seu Diretor, o
Comitê entendeu que ela é inadequada para atender à nalidade do instituto do
Termo de Compromisso. Em sua opinião, a proposta deveria contemplar
pagamento à CVM do valor total de R$ 150 mil, sendo R$ 100 mil para o Credit
Suisse (coordenador da oferta pública) e R$ 50 mil para o Sr. José Olympio da
Veiga Pereira. Embora tenha admitido que a grande maioria de precedentes de
Termos de Compromisso envolvendo supostas infrações ao período de silêncio
aponta para o valor ora ofertado pelos proponentes (R$ 50 mil por proponente), o
Comitê ressaltou que tais precedentes se referem a fatos ocorridos em 2005 e 2006.
Segundo o Comitê, em decisão recente (termo de compromisso celebrado no
âmbito do PAS RJ2008/3931 e apreciado na reunião de 06.01.09, o Colegiado
aceitou a celebração de termo de compromisso, envolvendo infração ao inciso IV
do art. 48, que previa o pagamento de valores mais elevados, sob a motivação de
que os participantes do mercado, em especial as instituições intermediárias, já
deveriam estar mais familiarizados com a regra infringida). Na opinião do Comitê,
é esse último precedente, semelhante ao caso ora em análise, que serve de
balizamento para a apreciação da presente proposta de termo de compromisso. Por
essas razões, o Comitê entendeu que a proposta apresentada em conjunto pelo
Banco de Investimento Credit Suisse Brasil S.A. e seu Diretor José Olympio da
Veiga Pereira deveria ser rejeitada.
O Colegiado, acompanhando o entendimento consubstanciado no parecer do
Comitê, deliberou:
a rejeição da proposta apresentada em conjunto pelo Banco de Investimento
Credit Suisse Brasil S.A. e seu Diretor José Olympio da Veiga Pereira; e
a aceitação da proposta de Termo de Compromisso apresentada pelo Sr. Eike
Fuhrken Batista.
Em sua decisão, o Colegiado ressaltou que a redação do Termo de Compromisso
deverá quali car o pagamento a ser efetuado como “condição para celebração do
termo de compromisso”. O Colegiado xou, ainda, o prazo de dez dias, a contar
da publicação do Termo no Diário O cial da União, para o cumprimento da
obrigação pecuniária assumida, e o prazo de trinta dias para a assinatura do Termo,
contado da comunicação da presente decisão ao proponente. A Superintendência
Administrativo-Financeira – SAD – foi designada como responsável por atestar o
cumprimento da obrigação pecuniária assumida pelo proponente.”

Exemplo 5
“APRECIAÇÃO DE PROPOSTA DE TERMO DE COMPROMISSO – PAS
SP2008/0040 – PAX CVC LTDA. E OUTROS
Reg. nº 6769/09 Relator: SGE
Trata-se de apreciação de proposta de Termo de Compromisso apresentada por Pax
Corretora de Valores e Câmbio Ltda., Geraldo de Lima Gadelha Filho, Renda
Corretora de Mercadorias S/C Ltda., Francisco Deusmar de Queirós e Ielton
Barreto de Oliveira, no âmbito do PAS SP2008/0040.
Os proponentes foram acusados de praticar as seguintes infrações:
– Pax Corretora de Valores e Câmbio Ltda., de permitir o exercício das atividades
de mediação ou corretagem por pessoas não autorizadas pela CVM para esse m e
de ter utilizado ou contratado pessoas não integrantes do sistema de distribuição
de valores mobiliários em atividades próprias desse sistema (infração ao item II da
Deliberação 372/01, ao art. 1º da Instrução 348/01 e ao art. 13, I, “c”, da
Instrução 387/03);
– Geraldo de Lima Gadelha Filho, na qualidade de diretor responsável da Pax, de
ter negligenciado o dever de diligência (infração ao item II da Deliberação 372/01,
ao art. 1º da Instrução 348/01 e ao art. 13, I, “c”, da Instrução 387/03);
– Renda Corretora de Mercadorias S/C Ltda. e seus sócios-gerentes Francisco
Deusmar de Queirós e Ielton Barreto de Oliveira, de terem exercido atividade de
mediação ou corretagem de operações com valores mobiliários sem a autorização
prévia da CVM (infração ao art. 16, III, da Lei nº 6385/76), e ainda de terem
exercido pro ssionalmente a atividade de agente autônomo de investimento sem
prévia autorização da CVM (infração ao art. 4º da Instrução 355/01).
Devidamente intimados, todos os acusados apresentaram suas defesas, bem como
proposta conjunta de celebração de termo de compromisso. Após negociações com
o Comitê, os proponentes aditaram sua proposta no sentido de pagar à CVM, em
conjunto, a quantia de R$ 430 mil.
O Comitê observou que, não obstante a proposta diferir daquela sugerida por
ocasião da fase de negociação, sua aceitação é conveniente e oportuna, concluindo
que o montante proposto mostra-se su ciente e adequado para inibir condutas
assemelhadas, de acordo com a nalidade do instituto do termo de compromisso.”

Exemplo 6
“APRECIAÇÃO DE PROPOSTA DE TERMO DE COMPROMISSO – PAS
RJ2008/11749 – KPMG AUDITORES INDEPENDENTES
Reg. nº 6657/09 Relator: SGE
Trata-se de apreciação de proposta de celebração de Termo de Compromisso
apresentada por KPMG Auditores Independentes e seu sócio e responsável técnico
Giuseppe Masi, acusados, no âmbito do Termo de Acusação instaurado
Superintendência de Normas Contábeis e de Auditoria – SNC –, de emissão de
parecer de auditoria sem ressalva para as demonstrações contábeis especiais da
Wtorre Empreendimentos Imobiliários S/A de 31.07.06, utilizadas como base para
o registro inicial de companhia aberta (inciso I do art. 35 da instrução 308/99).
Após negociações levadas a efeito pelo Comitê, a KPMG Auditores Independentes
e o Sr. Giuseppe Masi propuseram pagar à CVM, em conjunto, o montante de R$
400 mil.
Na opinião do Comitê, a proposta é adequada para inibir a prática de condutas
assemelhadas, servindo de orientação aos demais participantes do mercado de
valores mobiliários, em especial aos auditores independentes.”

Exemplo 7
“APRECIAÇÃO DE PROPOSTA DE TERMO DE COMPROMISSO – PAS
RJ2006/6235 – BANCO SAFRA DE INVESTIMENTO S.A.
Reg. nº 5406/06 Relator: DPS
Trata-se de processo administrativo sancionador que tem por objeto a acusação de
aplicação automática de saldos de contas correntes de clientes do Banco Safra S.A.
em fundo de investimento administrado pelo Banco Safra de Investimentos S.A.,
com remuneração reduzida por cobrança de taxa de administração variável.
Os indiciados Banco Safra de Investimentos S.A., Banco Safra S.A. e seus Diretores
Ezra Safra e Luciane Ribeiro apresentaram proposta de celebração de Termo de
Compromisso em que se obrigam a pagar aos clientes cujos recursos foram
aplicados em tal fundo a remuneração média ponderada paga pelos outros fundos
de aplicação automática com características semelhantes que estavam disponíveis
no mercado no mesmo período, o que equivalerá a um pagamento de cerca de R$
28 milhões.
Além desse pagamento aos cotistas, o Banco Safra de Investimentos S.A. pagará à
CVM a quantia de R$ 1,5 milhão, tendo ainda se obrigado a não mais constituir
fundos de investimento similares no futuro.
O Diretor Pedro Marcilio a rmou que considera que a proposta atende
plenamente ao interesse público e é uma resposta adequada, por parte dos
acusados, à atuação repressora da CVM. Assim, os cotistas receberão a
remuneração que teriam em fundos similares ofertados no mercado pelo mesmo
período coberto pela acusação, e o pagamento à CVM será feito em um montante
adequado para desestimular condutas futuras da mesma natureza, seja dos próprios
acusados, seja de terceiros.”
A maioria dos investidores não sabe onde procurar informações desse tipo.
No entanto, elas estão à disposição do público no site da CVM. Quando
estiver em dúvida quanto à integridade ou conduta da sua corretora ou do seu
banco, vale a pena checar os fatos.
Além disso, a CVM constitui um canal e caz para reclamações, sugestões e
monitoramento dos participantes do mercado.
Ao estudar esses aspectos do mercado, o investidor ou trader percebe que não
se trata apenas de escolher uma ação para comprar, existe toda uma ecologia do
mercado que envolve o seu trade e pode torná-lo uma experiência desagradável
sem que se tenha um controle direto sobre tais efeitos.

1 Fonte: http://www.valor.com.br/brasil/993580/cvm-abriu-505-processos-por-queixas-de-investidores
2 Vide o endereço: http://www.cvm.gov.br/port/descol/respdecis.asp?File=7129-0.HTM
3 Vide o endereço: www.cvm.gov.br, (link “decisões do colegiado”).
4 Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-line/economia/credit-suisse-e-multado-em-192-milhoes-de-
reais-pela-cvm/.
5 Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-line/economia/cvm-multa-eike-por-falar-demais/.
CAPÍTULO 3
Se você acha o conhecimento caro, experimente a ignorância

“Não vá além da sua zona de competência porque fora desta zona você pode se tornar
emocional, e estar emocional nunca é bom para os seus investimentos.”
Charles Ellis, em Winning the loser’s game.

As pessoas deveriam encarar o seu ingresso no mercado de capitais como um


evento que exige cuidadosa preparação. Em geral se admite que na maioria das
atividades de desempenho o resultado é correlacionado ao treinamento
realizado. Ninguém pensaria em ir à guerra sem possuir o conhecimento e o
equipamento necessários, assim como ninguém se permitiria fazer os exames
nais da faculdade sem ter estudado. No entanto, é muito comum observar as
pessoas indo à Bolsa como quem vai ao shopping: despreocupadamente, a
passeio. Quais são as chances de alguém sobreviver na guerra usando bermuda
e sandálias?
Nem sempre é o caso de o iniciante não ter estudado, feito cursos ou estar
interessado em aprender – pode acontecer algo diferente: muitas vezes, é difícil
aplicar na prática a disciplina quase monástica exigida para se ter continuidade
de bons resultados. Especialmente quando acontece de operar sem disciplina e
produzir inicialmente resultados satisfatórios.
Para ilustrar a temática, observem o caso a seguir.
O ano era 2007. Pedro Henrique não sabia que nas próximas horas sua vida
como investidor e trader seria alterada para sempre.
Era um pro ssional bem-sucedido e exercia in uência marcante sobre todos
com quem lidava – era carismático, bem relacionado e considerado um
formador de opinião entre amigos e colegas. De personalidade forte, possuía
percepções bem de nidas sobre a maioria dos assuntos e não hesitava em expor
seu ponto de vista até convencer o interlocutor. A nal, seu trabalho dependia
disso, pois era advogado.
Havia poucos meses, tinha feito um treinamento sobre trading e
investimento em ações, mas não havia mantido contato com o instrutor, de
modo que este não sabia como ele estava se saindo nas operações a não ser
pelas eventuais notícias que traziam seus colegas de curso. Foi então que, em
meados de novembro, algo extraordinário aconteceu.

3.1 O sonho de qualquer day trader


No oitavo dia do mês, PETR4 abriu seus negócios com o preço 4,95% acima
do fechamento anterior – uma abertura considerada volátil segundo os padrões
do momento. O instrutor de Pedro Henrique estava operando o índice futuro
desde a abertura antes do pregão da Bovespa (a BM&F – Bolsa de Mercadorias
e Futuros – abre uma hora antes) e não estava planejando acompanhar de perto
as ações naquele dia, decisão reforçada quando viu a abertura em gap de alta
(quando o primeiro preço do dia ocorre acima da máxima do dia anterior) e
interpretou que o preço tenderia a cair durante a sessão, como acontecia com
frequência nesse tipo de abertura.
Durante a tarde, observou PETR4 e viu a alta que ela havia feito até o
momento (8%), motivada pela notícia de que havia descoberto petróleo no
campo de Tupi (Figura 3.1). Ele considerou que para day trading não havia
mais o que fazer e que para um posicionamento mais longo era importante
avaliar melhor.
Figura 3.1 – Notícia sobre a descoberta em Tupi.
Naquela noite, cerca de duas horas após o fechamento dos negócios, o
instrutor recebeu a ligação de uma de suas alunas: “Por que não compramos
opções da Petrobras hoje?”, a voz era de angústia e exaltação, “Pedro Henrique
comprou... E lucrou 60 mil reais!”. O instrutor entendia a emoção bastante
negativa de car de fora de um movimento de alta, nesse caso uma alta sem
precedentes em termos de day trading, mas compreendia também que é
impossível participar de todos os movimentos do mercado e que é normal o
trader car de fora de alguns deles. “Correr atrás do mercado é um jogo para
tolos”, diz o ditado.
Mas a aluna continuou: “Amanhã de manhã vou comprar as opções!”, “O
senhor vai estar operando?”. O instrutor respondeu que estaria acompanhando o
mercado, mas que antes de entrar em qualquer operação era importante avaliar
o cenário, mesmo que ele agora se mostrasse promissor, porque as coisas
poderiam mudar. Como talvez não fosse o que ela esperava ouvir, a ligação foi
bruscamente interrompida. O mercado é realmente cheio de emoções. As ações
da Petrobras haviam fechado o dia com 14,16% de alta, algo sem precedentes,
dado que eram consideradas de pouca volatilidade. Mas não quemos
animados... Pelo menos não antes de saber da alta realizada pela opção
PETRK80 (vide variação na gura 3.2):

Figura 3.2 – Variação da opção PETRK80 no dia do anúncio do poço de Tupi.


2.183,94% de alta, num único dia!
Isso sim era algo extraordinário. Como é possível as opções subirem tanto?
Opções são um tipo de ativo nanceiro da classe dos derivativos, chamados
assim porque derivam de alguma coisa; as opções da Petrobras, por exemplo,
derivam das ações da empresa. Podemos encarar as opções como contratos-
promessa de compra e venda, em que pagamos uma caução. Imagine que você
pagou uma caução de 10 mil reais pelo direito de integralizar a compra de um
apartamento, no prazo máximo de 30 dias, pelo valor de 200 mil reais.
Na semana seguinte ao contrato assinado, você descobre que será construído
um shopping de alto padrão nas imediações do imóvel. Seu preço
imediatamente se valoriza, e ele agora passa a valer 280 mil reais.
Você tem duas alternativas: a primeira é comprar o imóvel pelo preço
acordado de 200 mil reais, pois o pagamento da caução lhe conferiu o direito
de comprá-lo por esse preço e o vendedor assumiu o compromisso de vendê-lo;
a segunda seria vender esse seu direito a terceiros – com um ganho percentual
signi cativo –, pois se o apartamento valorizou 80 mil reais, o direito de
compra ou a caução (prêmio) paga por ele também se valorizaram.
Porém, e se depois de pagar pela caução você descobre que vão construir um
viaduto na frente do prédio?
A situação é bem inversa, agora: o preço do imóvel se desvaloriza no ato. O
apartamento que valia 200 mil reais passa a valer 150 mil reais. O que
aconteceu com a sua caução já paga? Perdeu totalmente o valor: por que você
desejaria exercer o direito de comprar o apartamento a 200 mil reais se ele
agora vale menos? Lembre-se: você adquiriu o direito de comprar, não o dever
de fazê-lo.
É exatamente isso que acontece com as opções de uma ação. Existem dois
tipos de opções: as calls são opções de compra, dando ao seu titular o direito de
comprar a ação em um preço combinado; as puts são opções de venda, dando
o direito de vender a ação por certo preço.
Quem compra a opção (e se torna seu titular) adquire o direito de comprar
ou vender a ação. Quem vende a opção, o chamado “lançador”, assume o dever
de vender ou comprar a ação.
Um detalhe importante é que as opções custam muito menos do que as ações
e se valorizam ou desvalorizam a uma taxa superior – em outras palavras, são
mais voláteis. Se o preço da ação correspondente se valoriza ou desvaloriza uma
vez, o das opções o faz na taxa de cinco vezes, dez vezes, quinze vezes, vinte
vezes.
Como a ação da Petrobras subiu muito em um único dia (a nal, 14,16%
pode signi car mais de um ano de aplicações conservadoras, como a
poupança), as opções foram valorizadas em um nível estratosférico.
Voltando ao relato, no dia seguinte, PETR4 abriu novamente com gap de
alta, 12,2% acima do fechamento do dia anterior. O instrutor estava
acompanhando a negociação e decidiu não fazer nenhuma compra: “Nem
pensar”, re etiu, “este gap vai fechar”.
À noite recebeu uma ligação da mesma aluna:
– Você soube o que aconteceu com o Pedro Henrique? Ele tinha 130 mil
reais de capital e ontem havia feito 60 mil reais de lucro... Então hoje ele
resolveu comprar tudo em opções da Petrobras logo na abertura.
– Mas a abertura foi um gap de alta. As chances eram de um dia de queda!
– Eu sei, mas como ontem também havia sido e o dia fechou em alta, ele
achou que hoje ainda dava para comprar. Pois bem: ele comprou tudo em
opções e agora está perdendo metade do capital!
3.1.1 O dia seguinte
Antes de continuarmos o relato, pedimos que se imagine por um momento
diante do seu computador, digitando: “petrk80”, “compra” (na verdade, apenas
apertando no botão de compra), “130.000” (campo do valor), “preço” (campo
do preço). Leva menos de um minuto. Agora, imagine-se repetindo esse
procedimento, algum tempo depois, apenas invertendo a ordem de compra
para venda e alterando o preço de venda. Por todo esse trabalho você ganhou
60 mil reais. Dinheiro fácil...
A pergunta agora é a seguinte: o que faria uma pessoa sensata depois de ter
feito 46,5% sobre o capital em um único dia? Re itam bem: grosso modo, isso
equivale a quase três anos de poupança... Em nosso entendimento, qualquer
pessoa jamais deveria se arriscar tanto sem ter a informação e o preparo
necessário (colocando todo o capital em uma operação de day trade,
especialmente em derivativos). Mas, supondo que zesse e tivesse esse resultado
espetacular, o que ela faria em seguida? Talvez percebesse o estado de loucura
momentâneo do mercado e casse de fora das operações até essa euforia passar.
Mas não o Pedro Henrique. Ele queria mais. E certamente teria, porém não
do mesmo.
Quando colocou a integridade do seu capital em PETRK80 na manhã
seguinte, o preço estava cotado a R$ 11,66. No m do dia, a cotação era cinco
reais... Uma queda de -54,79% em apenas um dia de negociação.
Como isso pôde acontecer? Entram em cena os amigos e alguns vieses de
comportamento facilmente identi cáveis pelo estudo de nanças
comportamentais.

3.1.2 “Entra, entra!”


Meses atrás, Pedro Henrique e um grupo de amigos haviam feito juntos um
treinamento para operar ações e um deles fez em seguida outro treinamento,
mais especí co, para aprender a operar derivativos. No dia da alta da Petrobras,
esse amigo e dois colegas de trabalho estavam operando opções e lucrando
signi cativamente, para dizer o mínimo, e, como sempre fazem os bons
amigos, quiseram que Pedro Henrique também participasse da festa. “Entra!”,
foi o chamado, “Entra logo!”.
Quando recebeu a ligação para comprar opções elas já tinham subido
exageradamente. Ele estava atrasado na operação, mesmo assim sua entrada foi
vantajosa o su ciente para que tivesse um ganho substancial. Quem precisa
saber o que é uma opção se bastava comprá-la para ter lucro? No entanto, seus
amigos sabiam, e por isso mesmo evitaram operar dali em diante. Ele, no
entanto, ignorava o terreno em que estava pisando e no dia seguinte era só
entusiasmo.
Entusiasmo que não é incomum entre iniciantes – os mais experientes já
conseguem ver o mercado como ele realmente é, e isso é um antídoto e caz
contra a euforia.
Aqui entra o viés de excesso de con ança (overcon dence): é comum o
entusiasmo levar a uma percepção minimizada do risco e maximizada do
sentido de con ança, especialmente se o histórico de resultados recentes foi
positivo. “A nal, se o resultado está positivo, devemos estar fazendo algo certo.”
Nem sempre: é muito comum ocorrer lucro em uma operação de trading ou
investimento em razão de fatores diversos, perfeitamente alheios à estratégia
utilizada. Se o mercado subiu quando alguém comprou (e este teve resultado
lucrativo na operação), a alta foi antecipada pela estratégia utilizada ou as duas
ocorrências coincidiram no tempo? É perfeitamente possível termos resultado
positivo simplesmente por pura chance. Comprou-se uma ação e ela subiu.
Não signi ca necessariamente que a estratégia produz resultados superiores,
nem que o indivíduo tem o toque de Midas para investimentos. Quando um
hominídeo primitivo coçou o nariz e viu a chuva caindo, logo informou seus
pares e a tribo começou a desenvolver elaborados rituais de coçar o nariz para
produzir chuva – em vão. Da mesma forma, é comum um investidor ou trader
que teve o privilégio de ter estado no lugar certo e na hora certa (além de ter
feito a operação certa) começar a acreditar que tem poderes de previsão acima
da média. O ditado “Não confunda inteligência com um mercado de alta” deveria
nos manter sempre de sobreaviso quando surge entusiasmo ou excesso de
con ança em nós mesmos e em nossa capacidade preditiva.
Mas não são apenas os iniciantes sortudos que deveriam estar em guarda. Os
pro ssionais do mercado também, especialmente os muito competentes. Os
medianos sabem que devem car com um olho no padre e outro na missa,
reconhecendo prontamente quando estão errados a m de minimizar o
impacto negativo para seus clientes.
O excesso de con ança nem sempre resulta de sorte no curto prazo; às vezes
ele vem como um processo de construção do qual faz parte a real competência
do pro ssional, aliada aos resultados positivos do seu trabalho ao longo de
muitos anos; em outras palavras, ele é competente, sabe disso e con a na sua
capacidade. Daí a considerar que em uma determinada operação ele está certo
e o mercado está errado, é um passo.
Mesmo uma equipe considerada brilhante pode realizar operações que levam
a prejuízos – e em alguns casos até à quebra do fundo que operam, como o
caso do LTCM (Long-Term Capital Management), que era gerido pelos ases de
Wall Street (e sua equipe era composta por expoentes da economia e da
matemática – mestres, doutores, ph.Ds. –, até mesmo dois prêmios Nobel) e
acabou sendo fechado. Esse fundo foi recebido com expectativa e aplauso por
parte da comunidade nanceira e seu resultado anualizado (40% após
impostos) excitou ainda mais os ânimos dos investidores – era considerado
uma dica certa que não poderia dar errado. Se o conhecimento superior era
fonte de resultados superiores, todos esperavam que esses resultados iriam se
propagar por um futuro inde nido, dada a superioridade técnica e acadêmica
dos gestores. Como o nome “long-term” sugeria.
Para ilustrar uma das estratégias usadas no LTCM, daremos um exemplo
ctício com papéis nacionais: se hipoteticamente PETR4 (Petrobras) e VALE5
(Companhia Vale do Rio Doce) estão positivamente correlacionadas, ou seja,
quando uma sobe, a outra também sobe, quando uma cai, a outra também cai,
deveria haver um spread ou uma diferença de preço padrão entre elas. Se, por
exemplo, PETR4 custa R$ 34 e VALE5 custa R$ 40, a diferença (spread) entre
elas é de seis reais. Tendo esse dado, os gestores buscavam determinar qual seria
o spread médio histórico, numa sequência longa de preços, e com base nisso
conseguiam observar o comportamento do spread atual em relação ao
histórico.
Supomos então que a diferença entre as duas ações varia historicamente entre
quatro reais e sete reais. Num dado momento, se observa que essa diferença
está em 12 reais (quatro reais a mais do que o spread máximo normal). Os
gestores operando pairs trading fariam o seguinte: venderiam a ação que subiu
mais e comprariam a ação que caiu, na expectativa de que a ação que subiu
caia, e a ação que caiu suba, para que o nível do spread volte à média.
Isso funciona desde que as ações mantenham sua paridade. Se ocorrer de as
ações operadas nesse sistema simplesmente deixarem de ter correlação (o que
faria o spread “abrir” cada vez mais, sem retorno), aí o gestor está com
problemas...
Note-se que o viés de excesso de con ança é bastante democrático, afetando
não somente os investidores iniciantes, mas também os mais experientes
pro ssionais do mercado.

3.1.3 Deixando para o longo prazo


Pedro Henrique viu seu capital erodindo logo após a entrada na operação e não
tomou nenhuma medida de segurança. Obviamente, a principal medida de
segurança era não ter entrado em nenhuma operação com a totalidade do
capital – nem naquele dia, nem em qualquer outro –, especialmente em
derivativos. Mas ele havia feito exatamente isso no dia anterior e voltou a fazer
naquele dia.
Quando viu o preço começar a cair quase que imediatamente à sua entrada,
seu pensamento muito provavelmente foi: “Em seguida ele volta a subir.” É a
famosa expressão “Vai voltar”. Signi ca que em vez de o investidor ou trader
gerenciar ativamente o risco da operação, ele ca esperando que o preço
retorne ao patamar do seu ponto de compra. Em muitas circunstâncias isso
funciona, mas não recomendamos esse tipo de abordagem pouco estratégica.
Funciona muitas vezes, apesar do custo de oportunidade envolvido. O
indivíduo compra uma ação e o preço começa a cair, tornando a operação
negativa, então ele mantém o negócio, esperando que em algum momento a
ação volte a ser negociada num patamar superior de preço, de modo que possa
minimizar o prejuízo ou até nalizar a operação com lucro.
É muito semelhante à analogia que Taleb faz com o peru de Natal. Nessa
analogia, Taleb expõe a possibilidade dos eventos raros, cuja proximidade de
sua ocorrência é imperceptível em razão de seu ciclo ser muito longo e sua
possibilidade não ser levada em consideração para efeitos práticos. A história é
mais ou menos assim:
Para um peru, os seres humanos são seus protetores e seus melhores amigos.
A nal, eles o alimentam todos os dias! O peru colhe dados empíricos – o
alimento vindo das mãos humanas, diariamente – e cada ocorrência reforça sua
crença na bondade e na amizade dos homens para com os perus. Até que um
dia... Algo inédito acontece. Os humanos, geralmente tão amigos dos perus,
aparecem com um cutelo nas mãos... Pois é véspera de Natal.
Com investidores ocorre algo parecido. Certa vez um deles nos disse:
“Eu jamais realizo prejuízos. Se comprei uma ação e o preço caiu, não vendo na
baixa... Espero ela voltar a subir. Dessa forma, sempre tive lucro.”
E isso funciona. Uma vez, duas, três... N vezes. Até que chega a véspera de
Natal, o que para o peru (o investidor) signi ca más notícias.
Quem atua dessa forma não suspeita que possa haver um momento no
futuro em que sua abordagem venha a não funcionar mais. Mas acontece.
Desse modo, uma série de ganhos ao longo do tempo é interrompida por uma
perda fenomenal totalmente inesperada.
Não querer assumir um prejuízo pequeno para evitar um prejuízo maior é o
que se chama “deixar para o longo prazo”, aqui estamos falando do viés “loss
aversion” (aversão a prejuízos).
Niederho er chama isso de break-even-itis (síndrome de querer sair no
break-even ou zero a zero). Esse retorno da ação pode ocorrer em poucos dias,
em algumas semanas, em alguns casos leva anos – e, em outras situações, a ação
nunca mais retorna ao preço desejado. Observe os grá cos da gura 3.3 e da
gura 3.4. Podemos ver dois exemplos de ações que jamais – pelo menos até
agora – voltaram ao patamar máximo de negociação ou topo histórico. Você
entendeu: deixar para o longo prazo funciona bem enquanto a ação
permanecer subindo!
Figura 3.3 – Exemplo de ação com grande queda.
Figura 3.4 – Exemplo de ação com grande queda.
Pedro Henrique havia utilizado essa estratégia com sucesso na primeira
quebra do mercado relativa à crise do subprime no período julho/agosto de
2007. Naquela ocasião ele estava em pleno curso prático de trading e seu
instrutor exigia que ele fechasse suas operações que estavam mostrando
resultado negativo.
Foi nesse ponto que ele abandonou o treinamento e passou a operar sozinho
– sabia-se que ele não havia encerrado as operações negativas, mas as estava
mantendo, “segurando no osso do peito”, como dizia aos amigos. Ele manteve as
operações em aberto até que elas voltassem a car positivas, um mês depois.
No auge da queda, essas operações chegaram a registrar um prejuízo de -22%.
Mas as ações voltaram a subir, e o que era prejuízo nominal passou a ser lucro.
O escritor e trader John Carter diz que se alguma vez você segurou um
prejuízo além do necessário, até que ele chegasse a -20%, e aguardou ele
reverter para lucro, você estaria perdido como trader. Isso basicamente porque
o mercado havia lhe ensinado um modo errado de proceder e fatalmente você
teria resultados negativos no futuro. Com o viés “anchoring” (ancoragem), o
resultado da experiência adquire status de lição aprendida, e se torna muito
difícil para o investidor mudar sua percepção sobre o fato. (A nal de contas, a
operação funcionou, não é mesmo?)
Pedro Henrique era o caso perfeito. Ele felicitava a si mesmo por sua
resiliência em ter esperado que o mercado voltasse ao normal. Sua percepção
cou ancorada na possibilidade de recuperar prejuízos simplesmente
aguentando rme. Além do mais, o fato de “aguentar a pressão” ressaltava o
caráter de virilidade que ele gostava de imprimir a tudo: “não é qualquer um
que aguenta essa pressão”, pensava ele. Entretanto, como o mercado é impessoal,
de nada adianta uma atitude “macho man”, ainda que signi que deixar uma
operação para o longo prazo.
Mas, como dissemos, aquela opção era apenas um direito de compra e, como
todo direito, tinha um prazo de validade, nesse caso, de um mês. Ou seja, um
mês depois ela perdia todo o poder e o vendedor da opção se veria livre do
compromisso assumido, enquanto o comprador não teria mais direito a nada,
pois esse direito prescreveria: a opção simplesmente deixaria de existir.
E as opções venceriam dali a uma semana. Dessa vez, para Pedro Henrique,
não haveria longo prazo.

3.2 O “eu” que você desconhece


“Se você não sabe quem é, o mercado de ações é um lugar muito caro para
descobrir.” – George J. W. Goodman
Agora o quadro começa a car mais completo e, por isso mesmo, mais
tenebroso. Pedro Henrique não somente tinha arriscado todo o capital, ele o
tinha feito com vistas a um ganho de curto prazo, utilizando derivativos, cuja
principal característica é a de oferecer retornos muito mais voláteis e, portanto,
mais arriscados do que as próprias ações (que já são voláteis e arriscadas). Além
disso, ele entrou cegamente numa operação que não compreendia, pois não
havia feito treinamento sobre opções e nem sequer sabia que elas tinham data
de vencimento.
Como uma pessoa inteligente e respeitada no seu círculo de amigos e no
meio pro ssional pode cometer tanta insensatez no que tange a investimentos?
Já vimos alguns vieses cognitivos ou comportamentais, mas existem muitos
outros. Segundo os especialistas, são esses vieses os responsáveis por tornar
pessoas sensatas e prudentes em arrojados e impetuosos aventureiros no
mercado. É como se, ao se aproximar da Bolsa, uma pessoa de repente revelasse
seu lado Indiana Jones. Pior ainda, Mr. Hyde.
Quando Pedro Henrique viu no nal do dia que 54,79% do seu capital havia
evaporado, podemos imaginar a sensação que isso lhe causou, pois uma coisa é
observar o prejuízo durante o pregão – as oscilações para baixo e para cima
provocam alternadamente emoções de desespero e de esperança –, outra bem
diferente é observar o resultado negativo após o fechamento dos negócios: um
número estático, imutável até o próximo pregão, tal como uma sentença
proferida. Nos dias seguintes, poderia haver retorno, mas naquele dia o
resultado era esse número pairando no ar, ameaçador. “O que foi que eu z?”,
pensava ele, “Como isso foi acontecer?”.
A verdade é que ele havia passado a noite anterior lendo perspectivas de
economistas sobre o futuro grandioso da empresa, tão grandioso que ele
acreditava que as ações passariam a ser negociadas num patamar totalmente
diferente de preço, como se a descoberta das reservas de petróleo fosse
su ciente para que a ação nunca mais voltasse a cair. Ele não se contentou com
o lucro de 46,5% sobre o capital... E nem poderia se contentar, pois seus
amigos haviam lucrado 700%!
Ele havia colocado 130 mil reais e lucrado 60 mil reais, enquanto seus amigos
haviam colocado menos da metade (50 mil reais) e lucrado quase seis vezes
mais (350 mil reais). Pedro Henrique não podia car para trás... Ele precisava
recuperar o lucro perdido.
Além das perspectivas nababescas dos economistas de plantão, o fato de ter
lucrado consideravelmente menos do que seus amigos contribuiu para a
redução da lucidez de Pedro Henrique no dia seguinte. Soma-se a isso a
possibilidade de ter entrado em cena o viés “falácia do jogador”, segundo o
qual o jogador acredita que o resultado de eventos passados pode alterar a
probabilidade de eventos futuros – ou seja, se ele ganhou hoje, está numa maré
de boa sorte e certamente ganhará amanhã também.
O impacto psicológico de um dia de ganhos pode ter levado, no dia seguinte
(em que a nova operação logo passou a dar prejuízo), ao viés de “efeito de
primazia”, no qual há uma tendência de atribuir peso maior ao primeiro evento
do que aos eventos subsequentes; em outras palavras, a possibilidade de
prejuízo foi minimizada pela euforia do ganho. Qual a relevância de um
pequeno prejuízo no início da nova operação se o resultado da operação havia
sido magní co? Mas o prejuízo logo se intensi cou. No nal do dia, Pedro
Henrique cogitava em ligar ou não para o seu instrutor de trading e solicitar
sua opinião. Resolveu não ligar, pois acreditava que a situação ainda era
gerenciável: no próximo pregão ela certamente deverá voltar a subir, pensou
ele. Era sexta-feira.
Soube-se depois que ele havia passado o m de semana inteiro estudando a
natureza das opções sobre ações: foi então que descobriu que elas tinham
vencimento, que venceriam em uma semana, que as opções variam conforme o
preço da ação, que essa variação tem uma medida que se degrada com o tempo
– ou seja, quanto mais perto do vencimento, maior deve ser o movimento de
alta de uma ação para a opção também realizar uma alta –, que cerca de 80%
das opções expiram valendo um centavo de real, que existem certas
características básicas das opções que são representadas por letras do alfabeto
grego (as gregas), en m, uma série de informações que estavam disponíveis na
internet o tempo todo, e que teriam feito diferença em seu trading.
Na segunda-feira, o mercado continuou caindo. Desesperado, ele nalmente
liga para seu instrutor e pede para marcar um encontro num café. Eles se
encontram. Pedro Henrique expõe os fatos e o instrutor tem de controlar
sentimentos contraditórios, parte de riso, parte de pena e compaixão, e ainda
uma parte de “bem feito, seu sardinha!”.
Quando nalmente decidiu encerrar a operação, Pedro Henrique havia
transformado um capital de 190 mil reais (130 mil reais iniciais acrescidos dos
60 mil reais de lucro do primeiro dia) em apenas 9 mil reais. A máxima
popular diz que o que vem fácil vai fácil. Nesse caso, ocorreu algo pior: os 60
mil reais que vieram levaram junto os 130 mil reais que já existiam.
Agora, a parte comovente: dos 130 mil reais iniciais, 30 mil reais eram dele...
E 100 mil reais provinham de um empréstimo feito no banco, a juros, tendo o
apartamento de sua mãe como garantia.
Não se sabe ao certo se ela algum dia chegou a ter conhecimento dos fatos.
Pedro Henrique saiu da Bolsa, de nitivamente, e hoje em dia ainda trabalha
como advogado e paga mensalmente as parcelas do empréstimo.

3.3 Acumulando funções


Vimos até agora somente alguns dos vieses cognitivos; existem muitos outros.
E é importante ressaltar uma característica importante presente em quase todos
os vieses: eles são involuntários. O indivíduo nem sequer percebe que sua lente
está colorida e ele enxerga tudo dessa cor. Por isso é preciso um esforço
prolongado para nos vermos livres desses vieses durante a prática de gestão de
investimentos – porque eles são naturais para nós.
De certo modo, não temos culpa. Mas como tudo na vida, temos
responsabilidade. Se você até hoje não tinha ouvido falar de nanças
comportamentais, sugerimos que procure as obras publicadas sobre o assunto.
Mas nem tudo é viés cognitivo na interação com o mercado. Existem coisas
de ordem prática que devem ser abordadas corretamente se o indivíduo deseja
que sua atuação como investidor ou trader seja bem-sucedida.
Voltando ao exemplo de Pedro Henrique, existe um motivo pelo qual esse
tipo de situação acontece com tanta frequência no mercado, e não se pode
atribuir totalmente à ganância ou à falta de conhecimento. O fato é que o
trader individual está sobrecarregado por um acúmulo de funções e nem sequer
tem consciência disso.
Há traders individuais e há empresas de trading (ou divisões de trading
dentro de empresas). O trader individual tenta fazer sozinho o trabalho de
diversas pessoas que, no contexto de uma empresa de trading, realizam, cada
uma, sua tarefa especí ca. Essa comparação poderia se estender por um exame
minucioso de todas as funções e tarefas, mas, para brevidade e clareza, iremos
nos ater a três pontos fundamentais: análise, gestão de risco e trading.
Em toda empresa de trading ou investimentos, existem pessoas diferentes,
aliás, tendo per l psicológico e formação completamente diferente, ocupando
cada um destes três cargos: analista, gestor de riscos e trader. Certamente,
nenhuma empresa pensaria em colocar um analista, cujas características
principais são a introspecção e a análise metódica dos fatos, na pista de alta
velocidade das operações de trading propriamente ditas – há uma diferença
importante entre os dois per s, em termos de agressividade, rapidez de resposta
e assunção de riscos. O inverso também é verdadeiro – possivelmente o trader
não teria a paciência e o denodo necessários para formular diversas hipóteses e
cenários, realizar levantamento de dados e estudos, para nalmente expressar
suas convicções em um relatório de análise impresso. São funções diferentes,
desenhadas para pessoas diferentes.
O trabalho do gestor também tem certas particularidades: o trader pode vir
até ele com sua melhor argumentação, mas o trabalho do gestor é vetar a
operação se ela coloca em risco um capital maior do que o estimado ou se o
trader já atingiu seu limite de risco operacional para aquele período. Além
disso, ele deve monitorar elementos como desempenho, volatilidade do
mercado, volatilidade da carteira, distribuição de resultados e valor em risco
(value at risk), para balizar suas decisões.
Analista, trader e gestor – não poderíamos pensar em três pessoas mais
diferentes uma da outra. No entanto, o trader individual, se quiser ser bem-
sucedido no mercado, deve incorporar as três. Aqui começa o paradoxo: não se
trata apenas de um acúmulo de tarefas, mas de um acúmulo de personalidades.
A distribuição dessas características em qualquer indivíduo pode variar
enormemente, sendo quase impossível que elas estejam perfeitamente
distribuídas. E onde estiver o peso maior, ali se terá o maior desa o, seja para
controlar esse aspecto, seja para reforçar o seu contrário.
Se dos três elementos o indivíduo possui maior ênfase, por exemplo, no
analista, pode ser o caso de alguém que leva muito tempo para tomar uma
decisão e, quando ela é tomada, o melhor momento para implementá-la no
mercado já passou, ou pode ocorrer de esse indivíduo congelar sob pressão, não
conseguindo colocar em prática as estratégias delineadas.
Caso o peso maior esteja no trader, é preciso muito cuidado para que a
pessoa não caia na tentação de operar sem setup (técnica operacional especí ca)
ou estratégia ou que não ultrapasse seu limite de risco operacional para o dia
ou período.
No caso do gestor de risco como personalidade dominante, é possível que
certas oportunidades no mercado sejam perdidas, porque não se enquadram
perfeitamente nos modelos de risco utilizados. É provável também que ele
tenha di culdade em lidar com o aspecto de perdas, o chamado drawdown ou
período em que a distribuição de resultados se mostra negativa, e venha a
interromper as operações antes que elas produzam seus resultados estimados.
Sob qualquer ângulo que se possa olhar essa questão, torna-se evidente que a
supremacia de um tipo de personalidade sobre o outro altera totalmente o
resultado prático operacional que o trader deverá produzir. Nesse aspecto, o
autoconhecimento é peça fundamental para identi car as forças e fraquezas de
personalidade e tentar contrabalançá-las para adquirir a maestria sobre si
mesmo e sobre sua atuação no mercado.
Mas o mais difícil de tudo para o trader ou investidor individual é a noção de
que ele está absolutamente livre para fazer o que quiser. Se avaliarmos bem,
nossa conduta é balizada por reguladores em todas as áreas da atividade
humana e estamos acostumados a isso. Nosso trabalho tem determinadas
regras, nosso convívio com as pessoas socialmente ou no trabalho ocorre dentro
de normas de conduta amplamente conhecidas, quer seja na família, quer seja
no escritório, agimos com o olhar público constantemente xado em nós,
esperando que nos comportemos conforme certas regras.
Quando o iniciante entra no mundo dos investimentos, ele percebe que não
há regras para sua conduta além das normas básicas de negociação e de
cumprimento das obrigações nanceiras. Não existe uma regulamentação que
o força a investir e operar dessa forma ou o proíbe de fazê-lo de outra forma. Se
ele quiser comprar ou vender ações, opções ou futuros, fazer operações simples
ou complexas, está totalmente livre para isso. Não há nenhuma supervisão do
que ele está fazendo com seu capital, ninguém liga para a sua esposa avisando
que ele está tendo prejuízo. É um jogo de cavalheiros, e desde que ele seja capaz
de honrar as obrigações nanceiras da operação, ninguém se importa.
Em outras palavras, não há um gestor de risco no seu pé. Ele está livre para
voar e ninguém irá impedi-lo. Ninguém veio impedir Pedro Henrique, nem
nunca virá, porque simplesmente não é assim que as coisas funcionam. No
mercado não existem babás.
Aqui entramos em outro problema, não de ordem cognitiva, nem prático-
administrativa, mas, sim, de uma natureza muito mais grave: a compulsão pelo
jogo.
Vamos ilustrar esse ponto com outro exemplo: o do bancário aposentado que
desejou virar trader.
Roberto era um funcionário de um grande banco estatal do país e trabalhava
na concessão de crédito rural. Dia após dia, ano após ano, sua atividade
pro ssional estava restrita a regras de conduta e de risco muito rígidas, como
são as regras em um banco. Para conceder uma carta de crédito, ele devia
estudar detalhadamente o caso, o prospecto do cliente, o tipo de operação a ser
realizada, a quantidade de crédito liberada e as circunstâncias de risco
envolvidas. Era um trabalho metódico, que beirava a monotonia.
Quando se aposentou, de repente se viu com tempo e capital disponíveis para
investir em ações. Começou a frequentar palestras e fazer cursos, de modo a
entender melhor o mercado. Era habitué em certas corretoras, marcando
presença todos os dias, de manhã à tarde – apreciava sobretudo a interação com
os agentes autônomos de investimento, jovens com idade para ser seus lhos
ou netos. Sentia-se bem num ambiente jovem e voltado para realização de
negócios, era motivador.
Imperceptivelmente, seu interesse real passou a ser matar o tempo livre em
vez de realizar operações positivas, pois era divorciado e vivia sozinho. Ia às
corretoras não somente para realizar suas operações (que poderiam ser
realizadas de casa, via home broker), mas para ter com quem conversar. Além
disso, o tratamento cortês que recebia fazia-o sentir-se VIP, e isso é sempre a
receita para manter a delidade do cliente. Ele também passou a achar as
operações algo muito divertido.
Logo, suas operações deterioraram. À medida que ia perdendo dinheiro em
ações (começou a investir em 2008), sua atenção foi se transferindo para
derivativos. A receita é muito simples: se alguém está perdendo dinheiro em
ações, começar a operar derivativos o fará perder de cinco a vinte vezes mais
rápido, dependendo da alavancagem embutida no ativo operado. Roberto
começou então a perder capital em todas as frentes.
Mas ele não parou por aí: começou a operar day trading, na expectativa de
ter retorno imediato. Seu amigo Bernado certa vez o acompanhava num dia de
trading e o diálogo entre os dois ocorreu mais ou menos assim:
Roberto: “Vamos comprar VALE5.”
Bernardo: “Por quê?”
Roberto: “Olha, porque ela caiu.” (Apontando com o dedo no grá co de
15min.)
Bernardo: “E por que compraríamos ela agora?”
Roberto: “Se caiu, vai subir.”
Bernardo: “Como assim? Se o preço está caindo, ele está caindo... Por que
deveríamos comprar?”
Roberto: “Ela sempre sobe.”
Bernardo: “Você parametrizou isso? Você tem uma estatística das ocorrências
de alta após queda durante o dia? Em que tipo de dia? Quanto de queda?
Quantas vezes o resultado foi positivo?”
Roberto: “...”
Bernardo: “Percebe? Você ia entrar num impulse trading. Ia operar sem
possuir uma estratégia.”
Roberto: “Ó, comprei.”
Bernardo: “Você fez o quê???”
Roberto queria atividade. Não interessava para ele se era o melhor momento
para comprar ações ou não. Ele sentia verdadeira compulsão por fazer alguma
coisa. Ele provavelmente faria sucesso nas casas de bingo. Mas esse tipo de
atividade não atraía Roberto porque há toda uma aura negativa associada à
imagem do jogador. Di cilmente um jogador compulsivo admitiria que seja
jogador. Portanto, perder dinheiro em bingo, pôquer ou corrida de cavalos não
seria aceitável para ele. Ele não conseguiria dormir à noite. Perder dinheiro
operando ações não tinha para ele a mesma conotação negativa, pelo contrário:
operando ações ele adquiria o status de especulador. O próprio som da palavra
o fazia parecer mais inteligente, mais arrojado, mais importante que a média
dos mortais.
A atividade de operar no mercado pode estar associada à descarga de
adrenalina. Quando o foco do trader passa de fazer lucros a inconscientemente
sentir a adrenalina, ele pode dizer adeus ao seu capital. Isso porque a adrenalina
é descarregada tanto nas operações positivas (lucrativas), como nas operações
negativas (prejuízos).
Aí está o cerne do problema: qualquer que seja o resultado da operação de
trading... Ele recebeu o que veio buscar: a adrenalina. Isso faz com que ele nem
se preocupe com o nível dos prejuízos, que vai rapidamente se tornando mais
elevado. Ele inventa uma série de racionalizações sobre o porquê de estar
perdendo dinheiro e de como recuperá-lo. As expressões “eu deveria”, “eu
poderia” e “mas” pontuam a maior parte de suas frases: “Eu deveria ter saído
logo daquela operação”, “Eu poderia ter ganhado mais naquela última operação, se
tivesse cado mais tempo”, “Eu estava ganhando, mas o mercado virou”. Ele vai
entrando em novas operações não porque perceba nelas uma oportunidade
real, mas porque precisa manter-se em atividade. Adrenalina pode viciar.
O fato de que existem pessoas que realmente vão para a Bolsa com intuito
diverso de buscar resultado nanceiro está expresso na separação dos players do
mercado feita por Larry Harris, economista chefe da SEC (Securities &
Exchange Commission), em seu livro Trading & Exchanges. Depois de elencar
diversas categorias por função, motivação e tipo de estratégia, ele reserva espaço
para uma última:
Categoria: “Gamblers” (Jogadores).
Por Que Operam: Entretenimento.
Casos como esse, em que o investidor ou trader perde o foco do que deveria
estar fazendo na Bolsa, são infelizmente muito comuns. Larry Williams, um
dos grandes traders norte-americanos, conduziu uma pesquisa com traders de
todo o país com a pergunta: “Por que você opera no mercado?” Ele cou
impressionado com os resultados: somente 15% disseram: “Para ganhar
dinheiro.” Os outros 85% tinham motivos diversos: “porque é estimulante”,
“porque é divertido”, “porque é um desa o”. Alguns até com motivos
extravagantes, como: “para impressionar o meu cunhado.” No entanto, Larry
esperava que todos estivessem operando com o intuito de ganhar dinheiro.
Em suma, você sempre encontra no mercado aquilo que veio procurar. Se
estiver em busca de resultados nanceiros superiores aos da renda xa,
certamente os terá; se desejava emoção, encontrará. O mercado age como um
espelho – por isso temos de ter certeza de que nossa aproximação dele é
motivada pelos propósitos corretos.
CAPÍTULO 4
Guarde esta palavra: assimetria

“Se você não lê os jornais,


está desinformado.
Se os lê, está mal informado.”
Mark Twain

Caso nos fosse solicitado de nir com apenas uma palavra o melhor meio de
alcançar retornos no mercado de capitais, esta palavra seria assimetria.
A assimetria pode ser entendida como uma relação de desigualdade entre dois
polos; um lado tendo características a mais ou a menos do que o outro e essas
características correspondendo a vantagens ou desvantagens. Na Bolsa, sempre
que houver lucro, prejuízo, resultados acima ou abaixo da média,
conhecimento ou ignorância de fatores importantes, podemos a rmar que
houve assimetria.
Quando pensamos em um objeto assimétrico, logo imaginamos algo com um
lado desproporcional ao outro. Essa visualização representa bem as relações
entre os players na arena de investimentos, em que, num dado momento, um
lado efetivamente tem mais recursos do que o outro. Os principais pontos de
assimetria no mercado estão relacionados com:
• Assimetria de plataforma:
• Plataforma de dados – Software para acesso aos dados do mercado com
cotações e grá cos;
• Plataforma de negociação – Eletrônica ou via telefone;
• Serviços personalizados – Alavancagem, desconto de corretagem etc.
• Assimetria de capital:
• “Staying power” – Capacidade de executar suas estratégias com o melhor
aproveitamento em razão da maior capitalização ou do acesso a recursos.
• Assimetria de informações:
• Acesso à pesquisa sobre empresas e mercados, bem como a informações
relevantes para a estratégia operacional.
Não seria exagero a rmar que o investidor individual, seja ele iniciante ou
não, está em desvantagem em quase todos esses quesitos. Veremos, logo em
seguida, como isso contribui para seu prejuízo nas operações de
trading/investimento que ele realiza.

4.1 Soma negativa


Os investidores ou traders mais imprudentes acreditam que a Bolsa é como
uma canção de John Lennon na qual “tudo o que você precisa é amor” e que
devemos andar todos de mãos dadas, cantarolando por “campos de morango”
para termos todos, juntos, retornos maravilhosos em nossos investimentos.
Essas pessoas geralmente acreditam que as corretoras, os economistas, as
revistas, os jornais, os sites, os programas de TV e quaisquer meios de
comunicação que em algum momento tratam do mercado estão ali justamente
para provê-lo com as melhores informações possíveis, desejam o seu bem-estar
e a realização de seus mais caros interesses. Especialmente se produzem algum
tipo de conteúdo gratuito: haveria maior prova de que eles estão do nosso lado?
Os que adquiriram um pouco mais de experiência entendem que, no
mercado, quando alguém ganha, outro perde, especialmente em ativos com
data de vencimento estipulada como contratos de opções e futuros. (Em ações
não ocorre necessariamente assim: a perda é de oportunidade, geralmente.)
Esses acreditam que o mercado é um jogo de soma zero, no qual uma linha
imaginária é traçada entre os dois participantes da operação e a conta no nal
do período “tem de fechar”, isto é, se o lado direito recebeu capital em forma de
lucro, este proveio do lado esquerdo e vice-versa.
Essa é uma percepção de que o mercado não produz riqueza, mas apenas a
transfere. Aqui é preciso fazer uma distinção importante entre mercado
primário e mercado secundário. O mercado primário trata da empresa até o
momento em que esta abre seu capital e passa a ser negociada em Bolsa – o
chamado IPO (Initial Public O ering ou Oferta Pública Inicial). A partir desse
momento, as ações passam a ser negociadas todos os dias no pregão, o que se
convencionou chamar mercado secundário, que funciona também como
termômetro da saúde da empresa e como regulador de seu valor em mercado.
Se a empresa vai mal, as ações tendem a se desvalorizar, se apresenta bons
resultados ou prospecto de bons resultados, as ações se valorizam.
O fato é que a riqueza é criada (para os stockholders ou detentores das ações
da empresa enquanto ela ainda estava de capital fechado) apenas no mercado
primário: é ali que a empresa recebe dos investidores o capital de que necessita
para nanciar suas atividades de expansão, gerar empregos e contribuir com a
economia do país. Não devemos esquecer que essa é a função básica do
mercado de capitais. Portanto, no mercado secundário não há geração de
riqueza, apenas distribuição dela entre os participantes. Isso é ilustrado quando
o especulador Gordon Gekko, personagem de Michael Douglas no lme Wall
Street, diz:
“Eu não crio nada. Eu possuo.”
Nessa esfera o dinheiro literalmente circula entre uma conta e outra e sempre
que há lucro, houve prejuízo. Mas essa é ainda uma visão parcial. O mercado (a
partir de agora signi cando sempre o mercado secundário) não é um jogo de
soma zero: podemos entendê-lo como um jogo de soma negativa. (Nada de
campos de morango – a Bolsa não tem como função tornar as pessoas felizes e
prósperas.)

4.2 A parte da casa


O mercado ser um jogo de soma negativa implica que todo real que alguém
recebeu de lucro proveio do conjunto daqueles que perderam e que todos,
vencedores e perdedores, deixaram parte dessa riqueza para a própria Bolsa na
forma de taxas operacionais, como corretagem, emolumentos, taxa de
liquidação e de custódia. Essa é a parte da casa, quer você lucre ou perca.
Vamos entender isso melhor: o caráter de soma negativa ocorre porque há
um custo envolvido. Esse custo absorve parte do capital utilizado nas operações
e afeta tanto quem teve lucro como quem teve prejuízo. Se Pedro teve 10% de
lucro, deve descontar desse lucro o custo operacional; se João teve 10% de
prejuízo, deve adicionar a esse prejuízo o custo envolvido. O custo afeta os dois
lados da operação. Ao contrário do Direito, por exemplo, no qual a parte
vencedora da ação tem suas despesas advocatícias pagas pela parte perdedora,
na Bolsa, todos pagam.
E esse custo pode se tornar signi cativo, dado que o capital é consumido
mais rapidamente em virtude da frequência com que se realizam operações –
seja especulando no curto prazo, seja rebalanceando seu portfólio de longo
prazo.
A tabela Bovespa sugere às corretoras que cobrem 0,5% de corretagem sobre
o montante nanceiro executado a cada ordem. Porém, essa é apenas uma
referência de mercado e se permite liberdade às corretoras para praticar outros
níveis de preço. Aqui, a assimetria começa a aparecer na prática: as pessoas em
geral aceitam as taxas operacionais sem buscar mais informações. Existem
diversos preços praticados para o mesmo serviço, variando de corretora para
corretora.
Vamos dar um exemplo: um conhecido nosso, um senhor na casa dos 60
anos, comprava ações por meio da corretora do seu banco pagando 0,5% de
corretagem a cada ordem executada. Em uma conversa particular,
mencionamos o fato de a taxa ainda ser alta (em termos nominais, em função
de seu capital) e lhe indicamos algumas alternativas (falaremos sobre home
broker em seguida). Ressaltamos que ele tinha condições de operar de forma
mais econômica e que não havia motivo para continuar pagando as taxas mais
elevadas, praticadas pela corretora do banco. Mas, como dizia o Analista de
Bagé, personagem do gênio literário Luis Fernando Verissimo, “Foi como mijar
em incêndio”, quer dizer, não adiantou nada.
Meses depois veio seu aniversário e fomos convidados para a comemoração.
Ele estava muito orgulhoso, mostrando um cartão de felicitações enviado pelo
gerente do banco cumprimentando-o pela data. “O banco me enviou um cartão
de aniversário”, disse ele, sorrindo. Aproveitamos a oportunidade para dizer que
pelo seu custo de corretagem, deveriam tê-lo presenteado com um notebook...
Esse é um case de marketing interessante: com um investimento
provavelmente inferior a um real, o banco foi capaz de deixar contente um
cliente que a cada operação desembolsava em corretagem o equivalente a 3 mil
reais! Ele permanece cliente el até hoje, e não estamos falando de alguém sem
instrução, um simplório, não: ele tinha sido broker de commodities (mercado
físico), tendo morado nos Estados Unidos. Mas o aspecto sentimental fala mais
alto: ele é de uma geração cujo símbolo de status incluía ser reconhecido pelo
gerente do banco, ter conta especial etc. Receber um cartão de aniversário,
então, era para ele algo tão importante quanto ser presidente do seu clube do
Rotary: praticamente uma carta de referências nacional.
Os investidores mais jovens têm outro per l. A maioria deles já descobriu a
ferramenta home broker (ou plataforma eletrônica de operações) que as
corretoras disponibilizam para que seus clientes “de desconto” operem de casa,
do escritório, da lan house etc. Essa é uma inovação importante, pois a ordem
executada pelo “hb”, como é chamado, tem corretagem xa que varia de cinco
reais a 20 reais. Aqui temos economia, comparando-se com os exemplos
anteriores de corretagem.
Home broker é um termo em inglês que serve para indicar a natureza do
processo de operação. “Broker” é o corretor de ações (agente autônomo de
investimentos), da corretora. Se você liga para a corretora e pede para comprar
cem ações de XYZ, você está utilizando os serviços do “broker”: ele
literalmente vai ouvir a sua ordem e executá-la, digitando os códigos
necessários na plataforma de operação da corretora, o sistema Trom ou o Mega
Bolsa.
Como você utilizou seu tempo e seus recursos, você então incorre no
pagamento da corretagem com taxa percentual; é o que se chama de operar
pela mesa. Se você opera pelo home broker – literalmente, corretor em casa –,
você abre o sistema no site da corretora e digita todas as ordens sozinho. Por
não estar utilizando o corretor de ações, a taxa de corretagem ca mais barata –
de percentual ela passa a ser xa, entre cinco reais a 20 reais, dependendo da
corretora.
A tabela 4.1 dá exemplos de preço para o mesmo serviço (ordens executadas
na Bolsa):
Tabela 4.1 – Tabela de corretagem
Tabela de Corretagem
Mesa de Corretora de Banco 0,5% (Tabela Bovespa, com negociação para descontos)
Mesa de Corretora Independente 0,5% (Tabela Bovespa, com negociação para descontos)
Sistema Home Broker R$ 5,00 a R$ 20,00 ( xos)
Observamos, contudo, a existência de corretoras que além da taxa xa para
utilização do home broker praticam também uma taxa percentual. Quer dizer,
o cliente opera de casa ou do escritório utilizando o home broker, isto é, não
gerando trabalho algum para o corretor, e paga a taxa integral de quem utiliza
os serviços completos da mesa de investimentos. Tenha em mente: se você
opera pelo home broker, deveria pagar apenas a taxa de corretagem xa, sem
nenhum percentual embutido.
No entanto, muitas pessoas optam, por motivos diversos, por operar via
mesa. Por exemplo, conhecemos um ex-diretor nanceiro de uma grande
empresa que, depois de se aposentar, resolveu investir em ações. Logo,
começou a operar via mesa. Quando lhe indagamos por que ele não usava o
home broker, dado que ele sabia da existência dessa ferramenta, ele respondeu:
“Tenho medo de digitar as ordens errado.”
Estamos falando de um ex-diretor nanceiro que não se perturbou em
minimizar os custos operacionais em que estava incorrendo por causa de um
receio simples de ser resolvido. Havia, no mínimo, três soluções para o seu
caso:
a. Fazer um curso de digitação. Valor (único): R$ 100.
b. Contratar um estagiário para enviar as ordens. Valor (mensal): R$ 700.
c. Pedir a seu lho que digitasse as ordens para ele (o lho trabalhava no
escritório da família a duas mesas de distância). Valor: zero reais ou talvez
um aumento de mesada.
Qualquer dessas alternativas era mais econômica do que pagar 2 mil reais
cada vez que desejava alterar a composição da sua carteira de ações, avaliada em
200 mil reais.
A pergunta é: se um ex-diretor nanceiro de empresas de grande porte é
capaz de tomar decisões tão tacanhas, sem computar estrategicamente sua
atuação no mercado de capitais, o que podemos esperar de um leigo? (Aliás,
para colocá-los a par das últimas novidades, esse senhor atualmente se dedica a
dar gratuitamente seu parecer de expert em investimentos todos os dias,
comentando o mercado brasileiro – e mundial – por meio de um newsletter
que sempre insiste em aparecer no dia seguinte.)

4.3 Assimetria de plataforma


Nem todos os players do mercado têm acesso ou utilizam os mesmos sistemas
operacionais. Isso torna evidente a possibilidade de um desnível em resultados
práticos, puramente em razão do melhor desempenho de um sistema sobre o
outro. Imagine que você quer negociar uma ação e a sua plataforma apresenta
atraso nas cotações, enquanto outro investidor (pessoa física ou institucional)
utiliza o estado da arte em sistema operacional...
4.3.1 “Quem quer dinheeirooo?”
A utilização crescente do home broker e os descontos de corretagem a ele
relacionados (descontos que variam de corretora para corretora) tiveram o
efeito de aproximar o investidor e o trader novatos do fascinante mundo das
operações eletrônicas. Embora não tenha emplacado entre os investidores mais
antigos, o home broker de nitivamente “pegou” entre o público mais jovem,
talvez por terem convivido mais de perto com as facilidades tecnológicas – até
o inocente videogame conta como treinamento nesse aspecto.
A disputa das corretoras pela preferência do público de home broker se
tornou uma guerra de preços e de popularidade. Num evento anual importante
para a divulgação do mercado realizado nas principais capitais do país, os
stands das corretoras se engal nhavam para atrair o público passante usando
todos os recursos disponíveis: mulheres bonitas, comes e bebes, videogames de
última geração à disposição no stand, tudo para chamar a atenção e despertar o
interesse do futuro cliente. Uma corretora inclusive oferecia cem reais em cotas
de um fundo para cada um que preenchesse o cadastro como cliente. Vai um
dinheirinho aí?
Geralmente, quando começa uma guerra de preços – existem corretoras que
até isentam a taxa para contratos futuros de mini-índice –, o resultado é uma
queda brutal na qualidade dos serviços. Em uma corretora famosa por oferecer
ordens de home broker por apenas cinco reais (“aqui você não tem sócio”, diz o
anúncio), quando ocorre de o sistema travar, o cliente que liga para o
atendimento frequentemente ouve a mensagem:
“Sua ligação é a de número X na la de espera, por favor, aguarde um momento...”
E tome musiquinha. Um cliente dessa corretora reportou que até chegar a vez
de ser atendido o sistema geralmente já normalizou.

4.3.2 Correndo Fórmula 1 com um Fusca


Enquanto o home broker do cliente de varejo apresenta problemas diversos –
há ocorrências de ordens não enviadas, de ordens em branco (não aparecendo),
de atraso no livro de cotações, de fechamento não solicitado da janela de
negociação, de atraso na comunicação com a Bolsa, entre outros –, os grandes
players utilizam o estado da arte em plataforma operacional, com sistemas de
redundância, roteamento automático de ordens, notícias em primeiríssima mão
e acesso direto ao mercado (DMA – Direct Market Access).
Para exempli car o impacto dos problemas do home broker no resultado
operacional de um trader, citamos o caso em que ele precisa enviar uma ordem
para sair de uma operação positiva e a ordem ca cinza (código da Bolsa para
atraso de comunicação), levando até vários minutos para ser executada. O
resultado: a ordem é executada em um preço diverso (às vezes negativo)
daquele desejado pelo trader. Quando isso ocorre na saída de uma operação
negativa, é ainda pior: o impacto de uma ordem executada com atraso a torna
mais negativa ainda. Some-se a isso que os traders de curtíssimo prazo
(intraday) podem estar operando veículos de trading com alavancagem (como
opções e futuros), e aí temos um quadro realmente desagradável, dado que a
alavancagem contribui para maximizar o prejuízo.
E o home broker trava nos momentos mais delicados, justamente de maior
volatilidade. Isso ocorre porque os períodos de volatilidade se caracterizam por
um excesso de ordens sendo enviadas para a Bolsa – um excesso momentâneo
de participantes envolvendo-se nas operações.
Imaginem o seguinte cenário: a corretora XYZ tem 50 mil clientes, mas
avaliou o uxo de operações e constatou que apenas 10 mil operam com
frequência. Ela então contrata o fornecimento de banda de internet, servidores
e suporte para, digamos, 12 mil clientes operarem ao mesmo tempo – essa é a
sua capacidade operacional. Se apenas 10 mil clientes operam com frequência,
por que contratar o fornecimento de estrutura tecnológica para o total de 50
mil clientes? É o princípio da otimização de recursos. Quando surge uma
notícia importante que mexe com o mercado, logo temos um aumento do
número de usuários operando ao mesmo tempo. O resultado é que o sistema
operacional não suporta o excesso de clientes... e trava. Quando dizemos trava,
não entendam outra coisa: ele trava mesmo. É como se você tivesse aberto 50
programas para rodar ao mesmo tempo no seu computador pessoal. A cada
programa aberto – consumindo memória – ele ca mais lento, mais lento, até
o ponto de nem sequer responder ao comando de desligar e a única saída seja
desligá-lo manualmente.
O problema é que justamente nos períodos de volatilidade encontram-se as
maiores oportunidades, mas também os maiores perigos da Bolsa. Nesse
cenário, o home broker se comporta como um airbag que funciona sempre,
exceto quando você sofre um acidente. Na gura 4.1, citamos o relatório anual
do ombudsman da Bovespa (2008), no qual os problemas com home broker
guram no topo da lista de reclamações à Bolsa:

Figura 4.1 – Tipologia das reclamações ao ombudsman Bovespa (2008).


Sempre que você estiver com o home broker travado, com atraso de cotações,
sem comunicação com a Bolsa ou desligando sozinho, pense por um momento
nos seus competidores mais bem equipados, no conforto de seus escritórios
com recursos de última geração, utilizando o Algo Tools, a Reuters ou o
Bloomberg... Com acesso direto à Bolsa e sem nenhum problema operacional.
Perceba a diferença de tamanho de barbatana e seja um peixe prudente.
Mas a assimetria de plataforma não ocorre apenas em relação à estabilidade
operacional. Mesmo com o home broker funcionando plenamente ele não é
páreo para os sistemas operacionais dos grandes players. Isso signi ca que se
duas ordens forem enviadas ao mesmo tempo, uma provinda de home broker e
outra de uma plataforma com DMA, esta chega primeiro na Bolsa e realiza a
operação. Isso se chama latência ou velocidade no acesso à negociação – como
o mercado é um leilão, acaba vencendo quem tem mais facilidade de acesso à
liquidez, especialmente em trades intradiários ou de alta frequência (os
chamados high-frequency trading).
Um aspecto negativo da disponibilização do home broker com corretagem
xa para o público é o trader individual começar a operar sem controle,
tentando imitar os trades de alta frequência dos fundos de investimento. Aqui,
ele escapa da pesada taxa de corretagem percentual, mas cai em outra
armadilha: a do overtrading. Este é um termo em inglês que designa a
atividade de operar em demasia ou além da conta.
É importante lembrar que toda vez que alguém abre uma operação, digamos,
comprando a ação XYZ, ele está colocando seu capital em risco, por de nição.
Quanto mais operações alguém zer, em mais riscos ele incorre, grande parte
desnecessários. (Se é possível ter uma lucratividade X com uma operação, qual
é o ponto de ter a mesma lucratividade fazendo dez operações?) Jake Bernstein,
trader, conferencista, psicólogo e consultor de trading, diz que “se você opera
mais de uma vez por dia é para levar os lhos do corretor para a faculdade” – e nós
sabemos como são caras as faculdades norte-americanas.
Quando se estima que o público de home broker brasileiro alcançará o nível
de 5 milhões nos próximos anos, acabamos entendendo o porquê da disputa
acirrada entre as corretoras por uma fatia maior desse público. Multipliquem-se
5 milhões de clientes pelo valor da corretagem de apenas uma operação (40
reais) e teremos a bagatela de 200 milhões de reais por operação. Ensine esse
público a fazer day trading e logo teremos duas, cinco, dez operações por dia, o
su ciente para mandar os lhos dos corretores para as melhores universidades.
O que o público não percebe é que os trades de alta frequência são
geralmente realizados por mesas proprietárias ou de tesouraria de bancos. O
termo proprietárias indica que essas operações são feitas com o próprio capital
do banco; como todo banco de investimento tem sua própria corretora, disso
decorre que as mesas proprietárias de banco ou corretoras não pagam
corretagem.
Em tremenda desvantagem se encontra o trader que deseja copiar as
operações dos bancos: além de operar um sistema com muitas de ciências (o
home broker), suas operações incorrem na taxa de corretagem, coisa com que
os traders de bancos não precisam se preocupar. Convém lembrar que pagar ou
não a taxa de corretagem tem um efeito imediato na qualidade das operações.
Vamos supor que um trader individual, operando de sua residência, entra
numa operação ao mesmo tempo em que um trader de banco, operando pela
mesa proprietária. Ambos compraram a ação no mesmo momento por R$ 40 a
ação. Quando a ação sobe para R$ 40,01, tecnicamente o trader do banco já
está no lucro, enquanto o trader individual ainda está no prejuízo, mesmo com
a ação tendo subido um pouco, em razão do impacto negativo da taxa de
corretagem que ele pagou1. Como o mercado tem no intraday o que se pode
chamar níveis de ruído ou de oscilação do preço, quando se percebe que a
operação estava equivocada, o trader do banco é capaz de sair rapidamente com
um pequeno lucro ou no zero a zero, enquanto o trader de home broker sai da
operação possivelmente no prejuízo.
Observamos, portanto, que a diferença ou assimetria entre plataformas
operacionais faz toda diferença na qualidade da atuação dos traders. Mesmo
que o trader individual seja muito bem preparado, seja um bom piloto, o fato é
que ele está disputando Fórmula 1 com um Fusca. A questão de plataforma
tem um espectro mais amplo do que mostramos até agora; ela não se limita ao
trader de banco e ao de home broker. A seguir, uma tentativa de categorizar os
players por plataforma em ordem crescente, do menos provido ao mais
equipado:
1. Investidor estilo antigo, que acompanha as cotações na coluna de
investimentos do jornal, geralmente no café da manhã, e envia ordens via
telefone para a mesa.
2. Investidor que acompanha os preços das ações no site da corretora do
banco e envia ordens por telefone para a mesa.
3. Traders que utilizam serviço de cotações e grá co diário ou com cotação
intradiária com atraso de 15min e enviam ordens via home broker.
4. Investidores e traders que acompanham o mercado em tempo real por
meio de algum software de data feed e que, mesmo dispondo de home
broker, enviam ordens via mesa.
5. Traders com software de acompanhamento da bolsa em tempo real que
enviam ordens via home broker.
6. Traders cuja plataforma de acompanhamento em tempo real tem sistema
de envio de ordens (plataforma de negociação integrada).
7. Traders com software de acompanhamento (cotações e grá cos),
plataforma de negociação integrada e sistema de backtesting (estudo
histórico customizado de estratégias).
8. Traders, geralmente institucionais, que operam diretamente na Bolsa por
meio de DMA – Direct Market Access –, geralmente de forma totalmente
automatizada por meio de estratégias envolvendo algoritmos e trades de
alta frequência, com APIs (aplicativos) com recursos de machine learning.
Procure analisar em qual desses casos você se enquadra, do ponto de vista
operacional; quanto mais no início da lista você se encontrou, maior a sua
desvantagem em relação aos outros players.
E a competição não para por aí.

4.4 Assimetria de capital


Esse é um ponto muito importante a ser considerado por todos que desejam
dedicar-se aos investimentos em Bolsa. Imagine que você tem um mapa
geológico com uma indicação precisa de onde existem poços de petróleo. Se
você não tiver dinheiro su ciente para comprar a terra e adquirir os materiais
necessários à exploração... Seu mapa não é tão útil assim.

4.4.1 Ter um edge não é su ciente – É preciso ter staying power


“Staying power” é uma expressão utilizada pelos pro ssionais do mercado
mundial que encontramos di culdade de traduzir em poucas palavras. Tomada
literalmente, signi ca “poder de permanecer” ou “poder de car”. Expressão
estranha: permanecer onde? Ficar onde?
Permanecer na operação; car posicionado. Signi ca capacidade de
permanecer no trade quando a operação enfrenta um movimento adverso de
preço. Aqui estamos falando de assimetria de capital e dos efeitos psicológicos
que acompanham uma maior ou menor disponibilidade de recursos, porque a
sua capacidade de suportar as oscilações do mercado está diretamente ligada à
sua relação pessoal com o montante empregado na operação. É um capital
disponível para investimento, o qual você não terá necessidade de resgatar nos
próximos meses e anos? Ou se trata de capital especulativo com prazo de
resgate menor? Você precisará desse dinheiro em pouco tempo, ou, pior
ainda... É dinheiro do aluguel ou proveniente de empréstimo?
Se compararmos dois investidores ou traders, um com capital acima de suas
necessidades e outro com capital limitado, o primeiro terá mais staying power
nas operações. Isso signi ca que o primeiro terá mais chances de ser bem-
sucedido, porque conseguirá suportar sem problemas as pressões envolvidas na
negociação, além de possuir acesso não somente a mais oportunidades, mas a
oportunidades mais so sticadas. Como diz o ditado, dinheiro traz dinheiro.
Acreditamos sinceramente na necessidade de possuir superioridade técnica ou
ter um edge (vantagem competitiva) no mercado. No entanto, por mais que
possa parecer estranho ou até mesmo injusto, no mercado de capitais a
habilidade técnica não é su ciente; claro que é necessário possuir um edge,
uma forma de extrair dinheiro do mercado, mas, além de possuir essa
vantagem competitiva conceitual, você tem que conseguir explorá-la a seu
favor. E aqui entra a disponibilidade de capital.
Tomemos como exemplo um caso extremo e muito interessante: Soros
operando contra o Banco da Inglaterra2.
Ele acreditava que a libra esterlina deveria se desvalorizar em função da
política do Bundesbank, o banco central alemão, de defender o marco contra
as outras moedas. Soros anteviu a possibilidade de lucro vendendo a libra, e foi
justamente isso o que ele fez. Mas atentem para o seguinte detalhe, expresso
numa declaração dele:
“O Banco da Inglaterra vai tentar defender a libra, mas isso não importa, porque
estarei vendendo com uma posição muitas vezes maior do que a deles.”
Aqui temos um exemplo dramático do poder de capitalização: a posição de
Soros na venda da libra chegava a 20 bilhões de dólares. Seu lucro na operação
que durou um dia foi de mais de 1 bilhão de dólares.
Agora imagine a mesma situação, só que, no lugar do Soros, coloque um
investidor menos capitalizado. Imagine que ele teve o mesmo processo de
estudo das variáveis do mercado, o mesmo processo de raciocínio e – gênio,
sem dúvida – chegou ao mesmo resultado: a hipótese clara de que a libra
deveria se desvalorizar.
No dia seguinte – supondo que ele já tivesse isso tudo preparado –, ele abre
sua plataforma de negociação de FOREX (Foreign Exchange, termo usado para
o ambiente mundial de negociação de moedas, usualmente em pares: libra
versus dólar, euro versus yen, libra versus euro etc.), e decide vender a libra.
Só que ele faz isso sozinho, sem que o Soros esteja na mesma operação. Qual
seria o resultado? Ele moveria o mercado a favor de sua operação? Ele poderia
disputar essa queda de braço com o banco inglês? Naturalmente que não. A
despeito de suas convicções, a despeito mesmo de sua análise estar correta, se
não houvesse um grande player no mesmo lado da sua operação,
movimentando o mercado, de nada adiantaria o tão custoso edge que ele
desenvolveu.
Nesse sentido, o capital necessário para entrar e permanecer nas operações
atua como instrumento do edge que você possui. Isso é a tal ponto importante
que a disponibilidade de capital passa a ser, ela própria, um edge. Como diz o
ditado, cash is king.
A assimetria de capital atua também na forma de melhores condições de
negociação, nas quais o volume transacionado adquire status que permite
descontos nas taxas operacionais. Não é incomum clientes de grande porte
terem acesso a melhor execução, melhor qualidade em serviços e ainda por
cima obterem vantagens que aumentam sua distância dos investidores e traders
pouco capitalizados. No mercado, vale a regra de que você é reconhecido (e
tratado) conforme o que você traz para a mesa.

4.4.2 Dinheiro apavorado


Muitas di culdades se impõem ao trader mal capitalizado, mas talvez a pior
delas seja lidar com o aspecto emocional, uma vez que cada centavo que está
em risco é contado e faz diferença.
Na Bolsa, um dos fatores que concorre para aumentar o risco inerente à
atividade e minimizar as chances de um bom desempenho é o aspecto
psicológico, que certamente é afetado de modo negativo quando a capitalização
é insu ciente. Não há como escapar: quanto menor o seu capital ou quanto
maior sua necessidade desse capital, mais intensa será sua experiência
emocional.
Em primeiro lugar, é importante perceber desde já que é impossível viver da
Bolsa com um capital reduzido. Isso signi ca que na eventualidade de não se
dispor de capital su ciente, o trading ou investimento passa a ser, do ponto de
vista nanceiro, uma atividade paralela, não a atividade principal. Como
acontece com toda atividade desse tipo, muitas vezes ocorre a perda de
oportunidades justamente porque não se estava presente ou disponível para
aproveitá-las. Isso gera frustração, o que pode acarretar o desejo de operar em
momentos que não oferecem a mesma perspectiva de risco/retorno, para
compensar a oportunidade perdida.
Em situação pior estão aqueles que, possuindo capital limitado, decidem se
dedicar full-time ao trading. Vamos colocar em perspectiva: se o trader precisa
de 10 mil reais por mês para se manter, se ele possui o capital de 1 milhão de
reais, então ele precisa fazer apenas 1% de lucro para cobrir suas despesas
mensais. Se ele possui 100 mil reais, então já é preciso fazer 10%. Se ele possui
somente 10 mil reais... Quais são as chances de ele fazer 100%, todo mês?
Mas ele não quer saber de probabilidades... Especialmente se elas provam
estar contra ele e seu desejo de operar. Disso decorre que o investidor ou trader
mal capitalizado assume mais riscos, geralmente desnecessários, do que os
grandes players. Torna-se muito fácil para ele abraçar as promessas de lucro
fácil da alavancagem.
Daí para o overtrading é um passo. Overtrading é um problema que afeta
praticamente todos os traders sem capital su ciente. Ele pode ocorrer de três
formas: excesso de operações, excesso de alavancagem em uma operação ou
ambos.
A limitação de capital, as nanças pessoais dependendo do resultado das
operações em Bolsa, a alavancagem... Cada um desses itens coloca um peso
emocional a mais sobre o trader ou investidor e constitui um risco extra à
atividade – resultando no chamado “scared money” ou “dinheiro apavorado”,
situação em que o trader perde a fortaleza emocional necessária para operar
e cazmente.
Comparemos os dois tipos de player: o bem capitalizado versus o mal
capitalizado. O primeiro dispõe de recursos su cientes para não se preocupar
com o resultado imediato das operações; ele entende que a distribuição dos
resultados inclui operações negativas, e que a lei dos grandes números opera a
seu favor. Entendendo isso e sendo capaz de suportar um período
relativamente longo sem necessidade de resultados, ele é capaz de seguir a
estratégia sem assumir mais riscos que o necessário.
Já o investidor mal capitalizado age de forma diferente. Ele precisa do
resultado. Em sua perspectiva, cada operação é fundamental e ele não consegue
vincular sua expectativa à série de operações e a seu resultado nal. Cada trade
assume para ele uma amplitude fantástica: se teve lucro, vai enriquecer; se teve
prejuízo, precisa burlar – só dessa vez – os limites de risco da estratégia que
utiliza, a m de recuperar o resultado negativo da operação (ou operações)
anterior. E aí começam as di culdades.
O fato de ele assumir risco excessivo por meio do overtrading minimiza
drasticamente suas chances de sucesso. Para sermos francos, gestão de risco é
um tópico que não desperta muito o interesse do investidor e trader individual,
especialmente se for novato, porque isso implica controles e quase ninguém
deseja instruções sobre o que não fazer. As pessoas querem apenas descobrir
como ganhar dinheiro na Bolsa – e abstraem os fatores de risco, relegando-os
para segundo plano.
Em geral, risco é tratado de forma simplória, e fórmulas prontas, como o uso
de ordens de stop, assumem lugar privilegiado. No entanto, mesmo uma
ferramenta simples de gestão de risco como o uso de stops funcionaria bem se
o trader a utilizasse corretamente. O problema é que no contexto de scared
money existe uma tentação muito grande de cancelar os stops. Vamos examinar
isso de perto...
Cancelamento de ordens de stop é um primeiro sinal de que o trading está
sendo regido não mais pelo aspecto racional, mas adentrou rmemente na
esfera da irracionalidade e da emoção pura. Signi ca também que o trader está
sem a menor resiliência a perdas, ainda que seja para assumir perdas
temporárias (e pequenas) como parte de seu planejamento para conquistar
lucros maiores, no cômputo nal.
Se cancelar stops vira uma rotina, a operacionalidade da estratégia está
totalmente comprometida. Vamos explicar: toda distribuição de resultados
inclui, para ser dedigna, a possibilidade de resultados negativos. Não existe
estratégia alguma, nem mesmo no nível de hedge funds, que entregue um
desempenho com 100% de trades vencedores. Isso é matemática, estatística,
losó ca e praticamente impossível. Em algum momento haverá uma
sequência de operações perdedoras, pois todo sistema de trading apresenta
drawdowns ou períodos de resultado negativo.
Esse é o primeiro ponto, aceito universalmente.
O segundo ponto é que uma estratégia operacional deve ter, em sua
distribuição de resultados, mais resultados positivos do que negativos ou
resultados positivos com um impacto (amplitude) maior do que o impacto dos
resultados negativos. No primeiro caso, temos, para dar um exemplo, 65% de
resultados positivos versus 35% negativos, todos com a mesma amplitude ou o
mesmo impacto, gerando um desempenho positivo da estratégia após n
operações; no segundo caso, teríamos o inverso: 65% de trades negativos mais
os 35% restantes (positivos), tendo um impacto maior (digamos, 65%
negativos gerando resultado X contra 35% positivos com resultado 5X). Nesse
caso, o resultado geral será positivo não pela frequência de operações positivas,
mas por sua signi cância e amplitude.
Então, supondo que o trader tenha realmente uma estratégia consolidada,
ca claro que esse é apenas um primeiro passo, mas não o passo de nitivo, para
o sucesso na Bolsa. O segundo e conclusivo passo é ter uma gestão de risco
apropriada. E ela provém, primeiro, de adequada capitalização.
Se uma prática simples como ordens de stop pode ajudar a gerir melhor o
risco (embora haja ferramentas mais so sticadas para isso), por que um trader
cancelaria o stop?
Vamos refazer o raciocínio: o trader com capital insu ciente percebe as
alterações em seu capital de forma magni cada, pois não está planejando a série
de operações como um conjunto – ao invés disso, seu foco está em cada
resultado considerado individualmente.
O problema é que qualquer resultado individualmente considerado tem a
capacidade de afetar negativamente um trader mal capitalizado! Quer ele ganhe
ou perca, as probabilidades de sucesso estão contra ele, à medida que avança
nas operações.
Se ele tem um resultado positivo, a ora a euforia e ele pode se tornar:
a. desatento nas operações seguintes;
b. con ante em excesso, a ponto de abusar da alavancagem (mesmo que não
a tenha utilizado antes) – efeito “house money”.
Qualquer uma dessas alternativas leva a uma probabilidade maior de perda
nas próximas operações, assumindo-se que o trader usa um sistema
discricionário (estratégia que precisa de avaliação em tempo real e cujo
comando para efetivar a operação depende da vontade de quem a utiliza).
Se ele obtém um resultado negativo, o impacto emocional (também
negativo) produz a possibilidade de:
a. tentativa de aumentar a exposição ou operar com mais recursos do que o
normal (via aporte nanceiro ou alavancagem) para tentar recuperar mais
rapidamente o prejuízo;
b. aversão a perdas, impedindo que ele siga à risca os parâmetros de gestão de
risco.
Em suma: má capitalização leva a um estado emocional alterado, que
aumenta a tendência ao desvio dos parâmetros de risco, causando uma
deformação na distribuição de resultados, o que minimiza severamente a
possibilidade de sucesso.

4.4.3 Que atire a primeira pedra...


Os norte-americanos têm uma expressão irônica para signi car experiência real
com alguma coisa: “been there, done that” (“estive lá, z aquilo”, em tradução
literal). Quando a experiência foi malsucedida e quer se passar a impressão de
realmente ter passado por ela de forma dramática, há o “been there, done that,
bought the shirt!” (“estive lá, z aquilo e comprei a camiseta!”). Todo trader já
cancelou stops alguma vez, e é por isso que se torna importante analisar esse
fenômeno detalhadamente.
O ponto focal da prática de cancelamento de stops é a di culdade em aceitar
prejuízos. Isso pode ter origem na má capitalização, como mencionamos, ou
pode ser intrínseco ao trader (fobia ou autocobrança excessiva), ou ainda advir
da sua ocupação como operador de recursos de terceiros, o que exige que ele
faça uma prestação de contas sobre os resultados negativos.
Mesmo para os pro ssionais do mercado nanceiro é difícil aceitar prejuízos,
mas nessa pro ssão deve-se ter em mente a distribuição de resultados e apenas
monitorar para que os prejuízos não saiam de controle nem sobrepujem as
operações positivas.
O uso de stops é fundamental para manter os prejuízos num limite aceitável.
Se você comprou uma ação e em algum momento o preço caiu abaixo do seu
ponto de compra, você está sofrendo prejuízo. Para manter o risco dentro de
limites aceitáveis, é importante que esse prejuízo não aumente além do ponto
determinado por sua estratégia. Vamos supor que o preço está avançando em
2% contra o seu trade e esse é o limite máximo de perda aceitável. Nesse
ponto, a ordem de stop tem que ser executada, interrompendo o prejuízo
(mantendo-o dentro de limites preestabelecidos). Se essa prática de acionar o
stop automaticamente for executada sempre, a distribuição de resultados
tenderá a ser conforme o parametrizado em sua estratégia.
Porém, se na prática operacional o trader alterar as ordens, essas alterações
re etirão na distribuição de resultados, geralmente com impacto negativo.
Existem dois motivos utilizados para justi car a errônea alteração das ordens
de stop e o consequente abandono dos parâmetros de risco:
1. O trader remove o stop porque quer “deixar mais espaço para o mercado se
recuperar” (isso ocorre geralmente depois de se ter vivenciado a situação de
ter seu trade stopado – interrompido pela ordem de stop sendo executada –
e o mercado retomar o movimento inicial favorável... Com o trader de fora
do movimento – na prática, o que mais ocorre é justamente o trade car
cada vez mais negativo à medida que o tempo passa).
2. O trader acredita que será stopado e antecipa a execução do stop para um
preço mais próximo, a m de evitar o prejuízo em sua integridade (nesse
caso, temos o raciocínio inverso: o trader está certo de que será stopado e,
portanto, em vez de deixar o preço andar 2% contra a operação, ele
antecipa sua saída com um prejuízo inferior, digamos, 1% ou mesmo
0,5%... de modo geral racionalizando: “Já que vou ser stopado de qualquer
jeito, melhor sair com pouco prejuízo...” O resultado prático é que muitas
vezes ele não seria stopado na operação e ela teria funcionado
perfeitamente, uma vez que ele assumisse a possibilidade do stop e não
antecipasse sua saída).
Concordamos que é angustiante ver o preço mover-se contra a sua posição.
Como às vezes acontece de o trader acertar na mosca o início de um
movimento e ver o preço afastando-se de seu ponto de entrada imediatamente,
gerando lucro, é possível que essas ocorrências o tornem impaciente para
movimentos de preço adversos.
Só que muitas vezes um movimento de preço contra sua operação não
signi ca que ela estava errada ou que não irá funcionar. O mercado se move
em pulsações de preço (para cima e para baixo) intercaladas de ruído. Isso
signi ca que o mercado passa mais tempo indo a lugar nenhum (o que favorece
estratégias mean reversal) do que realmente deslocando-se para níveis
superiores ou inferiores de preço.
Então, é normal que esse ruído encontre-se presente na sua operação. Você
entra num determinado ponto e o preço ca indo e vindo, ameaçando a todo
momento virar-se de nitivamente contra você.
Isso é enervante, especialmente após uma série de operações, sejam elas
positivas ou negativas (se foram positivas, podem gerar aversão à perda do lucro
acumulado, se foram negativas, aversão à ocorrência de mais prejuízos).
É
É como um jogo de paciência: você ca olhando o grá co na tela e vê ora o
preço indo a favor de sua operação, ora indo contra... Independentemente do
time frame utilizado, é muito possível que após uma, duas, três, quatro idas e
vindas do preço você comece a repensar se o fato de ter entrado na operação foi
realmente uma boa ideia.
E aí duas coisas são possíveis, as duas impactando negativamente na
distribuição de resultados:
a. você antecipa o possível stop, saindo da operação com um prejuízo menor
do que se fosse stopado “de verdade”;
b. você antecipa sua saída, mas no momento em que o preço está
marginalmente a favor de sua operação, agarrando um lucro pequeno com
medo de que a operação realmente não dê certo.
Num primeiro momento, pode não car evidente por que essas duas atitudes
impactariam negativamente o desempenho do trader. A nal, as duas parecem
atitudes prudentes. Na primeira, dada a inevitabilidade do stop, o trader
antecipou a saída e teve um prejuízo menor; na segunda, dada a probabilidade
do stop, o trader foi aparentemente mais e caz ainda: conseguiu “livrar-se de
uma operação ruim” sem prejuízo algum, na verdade, com pequeno lucro.
Aqui, realmente é preciso um olhar mais atento para perceber o caráter
negativo dessas duas atitudes. Antecipar um stop é diferente de removê-lo e
deixar o preço ir livremente contra a operação. Parece inclusive mais ativo, do
ponto de gestão de risco. Da mesma forma, sair da operação com um lucro
pequeno em vez de prejuízo parece ser altamente louvável como prática de
gestão de risco (a nal, a operação “ia dar errado mesmo”).
Esse é mais um exemplo de como a atividade de trading é enganosa e de
como merece ser estudada criteriosamente antes que haja envolvimento de
capital.
Vamos voltar ao que dissemos sobre distribuição de resultados. Numa
estratégia vencedora, deve haver:
1. Uma ocorrência maior de resultados positivos do que negativos; ou
2. Uma distribuição equivalente, desde que os resultados positivos tenham
impacto maior do que os negativos, para anular seu efeito e ainda gerar
lucro.
Isso signi ca que uma vez de nidos os parâmetros de uma estratégia, estes
não deveriam ser modi cados pela prática operacional do trader, com risco de
alterar o resultado da distribuição.
Vamos simular uma hipótese:
a. estratégia com 60% de acerto, gerando 5% de lucro em cada operação
positiva e admitindo 2% de stop nas operações negativas.
A tabela 4.2 ilustra como ca o resultado nal após dez trades.
Tabela 4.2 – Exemplo de distribuição de resultados
Trades Trades Resultado dos Trades Resultado dos Trades Negativos Resultado
Positivos Negativos Positivos (Stops) Final
30% - 8% =
6 4 6 x 5% = 30% 4 x -2% = -8%
22%
Agora, basta alterar o uso da ordem de stop para alterar toda a distribuição de
resultados:
1. Se o stop é removido (mesmo que uma única vez), existe a possibilidade de
um movimento adverso de preço considerável contra a operação – por
exemplo, situações em que o movimento negativo chega a 20% –,
anulando todo o efeito da estratégia. Esse é o caso de um impacto negativo
imediato.
2. Se o stop é antecipado, com a operação causando prejuízo menor, há
também uma alteração negativa na distribuição de resultados, porque
muitas operações stopadas antecipadamente não seriam stopadas de modo
algum se o trader utilizasse o nível de stop original. Aqui há um impacto
negativo distribuído, pois ocorre um aumento do número de operações
negativas.
3. Se o trader encerra a operação com lucro, porém antes do target de lucro
derivado da estratégia, também há uma alteração na distribuição de
resultados, em razão de os parâmetros de lucro, que na estratégia se
estimam em X, na prática serem reduzidos para Y (lucro reduzido, obtido
pela saída antecipada).
Market noise signi ca que há realmente ruído no movimento dos preços no
mercado. De modo geral, sua ordem de stop deveria estar posicionada de modo
a não ser afetada pelo ruído do mercado. Se você foi stopado em um nível de
ruído, é muito provável que sua operação pudesse ainda ser bem-sucedida. Em
outras palavras, você saiu por não aguentar nem mesmo uma variação mínima
de preço contra sua posição. Isso nos leva para a ideia seguinte: maximum
adverse excursion, que é o ponto máximo em que o mercado poderia se mover
contra a sua operação e ela ainda estar certa. É, portanto, uma noção
fundamental para a correta de nição do ponto de stop. Signi ca que o preço
pode se mover X contra a sua posição: a partir desse X em diante, a mensagem
seria de que o trade realmente não funcionou.
De nir esse X é, logicamente, todo o problema. Diversos fatores devem ser
levados em consideração: o time frame da operação, a volatilidade atual do
mercado, o tipo de trade que está sendo realizado etc. Toda a ideia de
parametrização ou desenvolvimento de sistemas e estratégias quantitativas de
trading visa a responder essa e outras perguntas essenciais.
Esses estudos parametrizados são realizados pelas equipes de research de
grandes bancos e hedge funds e não estão disponíveis para o público. Tendo-se
em vista o montante de recursos destinado a research, percebe-se que até nisso
a assimetria de capital intervém de forma importante.
Isso nos leva a considerar a terceira manifestação fundamental da assimetria.

4.5 Assimetria de informação


Não podemos esquecer a importância do conhecimento. Dos diversos itens que
compõem nossa autoestima e a saúde de nossa psique, ele tem um lugar
especial. É tão importante para nosso bem-estar saber ou pelo menos acreditar
que sabemos. Talvez porque nossa psique esteja voltada à autossatisfação e seja
doloroso nos reconhecermos ignorantes em qualquer assunto. Qual foi a
última vez que você viu alguém dizer em voz alta, para quem quisesse ouvir:
“Eu não sei”?
Escapa-nos o porquê de isso ser assim (este não é um tratado de psicologia),
mas a evidência nos prova que quanto mais acreditamos que sabemos, sem de
fato saber, mais vulneráveis estamos à atuação daqueles que realmente sabem. E
aí começa o uso da assimetria de informação contra nós.
Essa forma de assimetria signi ca que um grupo (pequeno) estará no lado
mais forte da equação, possuindo maior parte do conhecimento necessário,
enquanto o outro grupo, signi cativamente maior, terá pouco ou nenhum
conhecimento ou informação de como as coisas realmente funcionam.
Quando você está no lado mais fraco da equação da assimetria, suas decisões
correm o risco de ser tomadas sem a menor validade conceitual – em outras
palavras, você pode não saber realmente o que está fazendo. Desse modo, é
fácil tomar decisões equivocadas, cujo resultado é certamente o prejuízo.
Se observarmos bem, essa forma de assimetria está em toda parte, não
somente no mercado nanceiro. Sempre que você pagou por uma informação,
quem recebeu o seu dinheiro só o fez porque estava no lado mais forte da
assimetria. Em outras palavras, ele sabia e você não sabia... Então você pagou
para saber ou para obter o resultado daquele conhecimento.
Pense na última vez que levou um aparelho eletrônico, seu carro ou qualquer
outro objeto para consertar. Se você dispusesse da informação e das ferramentas
necessárias, poderia muito bem realizar o conserto sozinho. Poderia até ter
levado para o conserto de qualquer modo, por uma questão de comodidade,
mas não haveria a necessidade de fazê-lo. Desse modo, assim como o
desconhecimento gera necessidade, o conhecimento nos livra dela.
Aí entram os especialistas: quando estamos pressionados pela necessidade,
consultamos alguém que saiba mais do que nós. Você iria a um médico se
soubesse exatamente qual o seu problema e como solucioná-lo? Ou, dando
outro exemplo, já que a legislação brasileira permite a um indivíduo defender a
si mesmo em juízo em alguns casos, se você soubesse realmente como fazê-lo,
contrataria um advogado?
No mercado, essa forma de assimetria determina seu nível tró co ou lugar na
cadeia alimentar: se você sabe mais, tem mais possibilidades de lucro do que
aqueles que sabem menos. É matemático: sua visão de mercado, sua estratégia,
sua tática operacional, que tipo de informação considera relevante, sua forma
de análise, a possibilidade de aproveitar oportunidades, o conhecimento de
veículos de trading (classes de ativos) mais adequados ao momento, tudo re ete
o seu grau de conhecimento ou de que modo você está posicionado na equação
da assimetria.
Sendo possível no mercado transformar conhecimento em dinheiro (lucros),
passamos a entender o caráter fundamental da preservação de informações ou
de conhecimentos importantes. De fato, a assimetria de informação não
somente existe, mas ela é propositalmente cultivada, pois toda possibilidade de
lucro depende dela. Desse modo, é de total interesse dos grandes players que o
público não tenha acesso a conhecimento relevante.
Isso se agrava ainda mais no Brasil, se levarmos em conta:
a. A não existência do hábito da leitura;
b. A enorme defasagem em material publicado de trading e investimentos
comparando-se com as publicações no mercado americano. Para termos
uma ideia, a seção de trading, nanças e investimento somente da editora
Wiley comporta 408 títulos, contra os 15 da Elsevier no Brasil. Isso para
levar em conta somente uma editora brasileira versus uma americana.
Além disso, os livros traduzidos para o português são em número limitado e
muitas vezes ocorrem erros patentes de tradução. Por exemplo, num certo
livro3 traduziram bearish (baixista) como altista (bullish)... Agora imagine a
cena: o tradutor, tarde da noite, trabalhando num livro enfadonho de mercado
nanceiro (quem se interessa por esse assunto, a nal?), tomado pelo sono,
recorrendo a bules e bules de café para se manter acordado, tendo diante de si
duas palavrinhas, “bullish” e “bearish”, que não somente começam com a
mesma letra (“b”), mas também terminam com as mesmas três letras (“ish”). É
muito fácil um deslize e a troca de uma pela outra, especialmente se ocorrem
com frequência.
Só que, no mercado, qualquer deslize é fatal: traduzir “bearish” como
“bullish” signi ca modi car a ideia original do autor de que aquela
circunstância em especial era baixista e faria o mercado cair, passando a
signi car altista e que o mercado irá subir quando ela se apresentar. E lá vai o
trader, vítima da forma mais prosaica de assimetria de informação, unicamente
porque não sabe ler em inglês ou não teve acesso à obra original do autor.
Disso ca claro que no mercado não é somente o que você conhece que
importa, mas também e principalmente o que você desconhece. Aí temos um
paradoxo: não conseguimos imaginar a extensão daquilo que desconhecemos.
Do que se apreende que o pro ssional de mercado ou mesmo o trader eventual
deveria ser um buscador incansável de novas informações para ampliar sua
esfera de conhecimento. A nal, alguém lá fora sabe mais... E se essa pessoa
estiver do outro lado da sua operação?

4.5.1 Sábio Sócrates


Para uma de nição de termos, vamos chamar quem está no lado mais forte
dessa assimetria de sapiente, ou aquele que sabe, e quem está posicionado no
lado mais fraco dessa equação de insipiente, ou aquele que ignora.
Ser insipiente é chamar para si toda desvantagem possível. E a maior
di culdade em sair dessa condição é que o insipiente nem imagina a
importância da assimetria nos resultados de suas operações. De fato, em seu
extremo, signi ca ignorar o papel fundamental do conhecimento como
ferramenta operacional. Naturalmente, ele admite que alguém sabe mais do
que ele, mas isso não o impede de entrar no próximo trade ou de realizar o
próximo investimento.
Ele está preso no lado mais frágil da assimetria porque nem sequer reconhece
o poder que ela tem. (Se reconhecesse – já um sinal de sabedoria quase
socrática –, jamais entraria em outra operação antes de ter adquirido
conhecimento su ciente.) Toda di culdade em sair do lado mais fraco da
equação ocorre em razão de:
1. Falta de conhecimento;
2. Ignorância quanto à extensão daquilo que desconhecemos;
3. Ter uma necessidade interna de acreditar que se conhece.
Para o completo desastre, falta apenas um elemento, que logo surge no dia a
dia: O mercado muitas vezes nos dá uma falsa con rmação de que sabemos.
Como isso acontece?
Nassim Nicholas Taleb cou famoso mundialmente por expor a possibilidade
de resultados aleatórios darem a impressão de terem sido previsíveis, por meio
de uma associação posterior sem qualquer nexo causal. Em seu livro Fooled by
randomness (Iludidos pelo acaso), ele cita o exemplo cômico de um aborígene
que viu a chuva começar a cair no exato momento em que coçava o nariz... E a
partir daí desenvolveu rituais elaborados de coçar o nariz para fazer a chuva cair
quando desejasse.
Se você se acha melhor do que um aborígene, experimente o seguinte:
compre uma ação, qualquer que seja e a qualquer preço; observe então seu
preço no dia, na semana ou no mês seguinte. Se ela estiver mais cara do que
quando você comprou (ou seja, você está tendo lucro porque a compra deu
certo), a não ser que você seja excepcionalmente honesto consigo mesmo a
ponto de dizer: “tive sorte”, muito provavelmente você irá encontrar uma série
de argumentos provando que aquela possibilidade de ganho fazia sentido. Você
tentará justi car para si mesmo que sabia o que estava fazendo, que escolheu
essa ação em vez das outras por causa de seus prospectos de retorno futuro etc.
Nas outras pro ssões, essa possibilidade não existe. Alguém poderia chegar ao
aeroporto após um nal de semana jogando Flight Simulator no computador e
dizer para o piloto de um avião: “Deixa comigo!”? Ou empunhar o bisturi e
realizar uma neurocirurgia após ler um livro sobre o assunto? A possibilidade
de sucesso é nula.
No entanto, alguém sem treinamento algum pode entrar no mercado e
realizar operações bem-sucedidas logo de início, simplesmente porque a
possibilidade de resultado é binária (o mercado pode subir ou cair), assim
como as alternativas de decisão (comprar ou vender).
Dado que nem passa pela cabeça do investidor ou trader novato a
possibilidade da venda a descoberto, seu universo de atuação é ainda mais
restrito: “operação” signi ca comprar ações e “resultado” signi ca o preço subir
ou cair, dando a ele, de imediato, 50% de chances de estar certo. E, sim, isso
pode acontecer logo na sua primeira vez comprando ações.
Após realizar sua primeira operação e ela ter sido bem-sucedida, é muito fácil
chegar à conclusão de que não é necessário treinamento algum:
• “Por que eu precisaria de treinamento?”
• “Basta avaliar o que ocorreu no momento em que comprei e esperar que
ocorra de novo.”
• “Foi isso: tinha saído uma notícia favorável sobre o setor daquela empresa.”
Pronto: já temos a coçada no nariz que ocorreu simultaneamente quando a
chuva começou a cair. Nosso trader em questão já tem um método para fazer
chover – isto é, para gerar lucros.
A partir daí, se ele for do tipo diligente, assinará todos os periódicos,
newsletters, canais e sites de notícias disponíveis, em busca do elusivo edge que
lhe conferiu lucros nas primeiras operações. Se ele continuou operando, a
distribuição aleatória pode já ter tido o seu ponto de virada, signi cando que
agora ele já experimenta alguns resultados negativos (prejuízos), que reforçam
nele ainda mais o anseio de aperfeiçoar o seu método. Ele está iludido e não
percebe.

4.5.2 Jogos de estratégia e o mercado


É muito comum encontrarmos analogias com o mercado nos jogos de
estratégia, como xadrez, damas, pôquer etc. Que elemento eles teriam em
comum e qual sua relação com trading e investimento?
Dominic Connors, famoso headhunter especializado em contratar
estrategistas quantitativos de trading (os chamados “quants”) para bancos de
investimento e fundos hedge, disse que além de toda a bagagem de
conhecimento acadêmico necessária, os candidatos que possuem experiência
com jogos de cartas são preferidos pelas empresas contratantes.
Victor Niederho er dedicou vários capítulos de seu clássico e education of
a speculator às relações existentes entre jogos diversos (xadrez, dama, squash,
tênis, pôquer) e as habilidades requeridas para o sucesso nos investimentos.
Fica evidente num tabuleiro de xadrez que o jogador que possui melhor
memória e mais experiência (um catálogo maior de possíveis jogadas) tem um
uphand em relação ao adversário. No pôquer, para citar outro exemplo, o
jogador que possui mais facilidade com números e probabilidade está em
vantagem contra todos os outros. Estratégia, raciocínio, memória, acesso a
dados e informações são elementos comuns à vitória, tanto nos jogos como no
mercado.
A habilidade com jogos é um exemplo interessante da assimetria de
informação porque essa assimetria foi buscada em outra esfera de
conhecimento (a dos jogos, não no próprio mercado), donde se infere que
entram no cômputo de pontos de assimetria quaisquer habilidades intelectuais
que possam ser aplicáveis ao mercado.

4.5.3 O trunfo dos grandes players


Existem verdadeiras máquinas trabalhando na produção de edge para as
grandes instituições do mercado. Estamos falando dos departamentos de
research. Esse ponto é importante para que você possa se lembrar contra quem
está competindo sempre que decide operar no mercado.
Os players institucionais estão bem preparados: as maiores gestoras de recurso
pagam para Wall Street cerca de 1 bilhão de dólares anualmente, em conjunto,
e pagam a suas corretoras preferidas a bagatela de 100 milhões de dólares cada
uma em custos de negociação4 – e as corretoras ganham isso por prestar o
melhor serviço de mercado e a melhor pesquisa que puderem fornecer. Essas
gestoras têm Bloomberg (o terminal de informações, cotações e negociação
mais prestigiado do mundo) e todos os outros serviços so sticados de
informação. Seus pro ssionais se encontram frequentemente com a alta
administração das empresas. Todas elas têm equipes próprias de analistas e
gestores de carteira seniores com uma média de 20 anos de experiência em
investimentos – todos trabalhando com seus contatos e suas redes de
relacionamento para conseguir a melhor informação, o tempo todo.
Não há como competir, há? O trader ou investidor que se dá conta desse fato
logo percebe que possui apenas duas saídas:
1. Tentar encontrar um nicho em que possa ter alguma vantagem
competitiva;
2. Tentar imitar a atuação dos grandes players.
Existe também uma terceira alternativa que é simplesmente colocar a viola no
saco e parar de operar no mercado. Se você leu até aqui, algo nos diz que essa
alternativa não seria a mais satisfatória no seu caso, portanto, vamos avaliar
mais de perto as duas alternativas anteriores.
1. Tentar encontrar um nicho em que possa ter alguma vantagem
competitiva:
Uma das formas para se posicionar melhor na assimetria de informação é
encontrar um nicho no qual se possa atuar com certa vantagem competitiva.
Isso é certamente difícil, mas não é impossível. A possibilidade de se encontrar
um nicho vem da crescente complexidade do mercado e de seus instrumentos.
Você pode se tornar especialista em um tipo de veículo (instrumento) do
mercado ou em um tipo especí co de tática operacional.
No primeiro caso, basta reconhecer que existe uma série de veículos ou
instrumentos de investimento e trading diferentes, cada um com suas
particularidades e nem todos ao alcance do público. O grande público conhece
apenas as ações, que são frações do capital social de uma empresa. Existem
outros veículos, tais como contratos futuros (divididos em nanceiros e
agrícolas, sendo o mais conhecido o contrato futuro sobre o índice de ações);
opções (contratos de direito sobre compra ou venda de ações a um preço
determinado); ETFs (Exchanged Traded Funds ou fundos negociados em
bolsa), nos quais você compra apenas uma ação (o ETF) e assim está
posicionado como se houvesse comprado toda a carteira de investimentos que
o fundo representa; swaps (troca de indexadores ou taxas de juros); opções
sobre futuros etc.
Focando em um tipo especí co de veículo, há uma possibilidade de seu
conhecimento sobre ele aumentar a ponto de o fazer perceber nuances do seu
comportamento – elementos-chave para o desenvolvimento de estratégias
vencedoras.
Você pode também focar seus esforços para dominar não um instrumento
especí co, mas um tipo especí co de tática operacional. Você pode se
especializar em operações de compra, de venda, de hedge (proteção de uma
posição comprada com o uso de outro ativo numa posição de venda),
operações de longo prazo, de curto prazo (swing trade), de day trade (realizadas
dentro do próprio dia, sem car posicionado para o dia seguinte), operações
utilizando dados de um único mercado, operações utilizando dados de diversos
mercados em conjunto etc.
Qualquer um dos meios descritos de encontrar seu nicho constitui um
desa o formidável e requer um esforço contínuo de aperfeiçoamento que, por
si só, justi caria a passagem do trader ou investidor para o lado mais forte da
equação da assimetria. Sugerimos também a possibilidade de se concentrar no
conjunto “um veículo + uma tática operacional”, como no caso do trader que
se especializa em uma empresa especí ca para trading de curto prazo ou foca
em trading intradiário em opções etc. A mensagem é que quanto mais
especí ca e focada for sua área de atuação, mais chances você terá de
desenvolver o que é necessário para vencer no mercado:
“Sua fortuna virá de seu foco. Foco em um mercado ou em uma estratégia.” –
Larry Williams

2. Tentar imitar a atuação dos grandes players:


Se a primeira forma de competir num mercado dominado pelas grandes
instituições é procurar um nicho para atuar, a segunda é simplesmente tentar
seguir suas operações.
Tarefa fácil, se você souber cozinhar... A forma mais peculiar de research de
que temos conhecimento é a que foi feita por um cozinheiro de um grande
banco de investimentos norte-americano, perito na arte de preparar crepes
franceses. Sendo presença bem-vinda em toda sorte de recepções e festas da
empresa, ele preparava crepes e omeletes personalizados para os poderosos das
nanças, silenciosamente anotando os nomes das ações que eles comentavam.
Enquanto esperavam na la do crepe, analistas das maiores empresas de
investimento – numa tentativa compreensível de tentar impressionar os colegas
– descreviam uns para os outros suas ações favoritas, fornecendo desse modo
preciosas informações para o cozinheiro-investidor. Se você tivesse servido uma
média de cem crepes e omeletes por dia ao longo de trinta anos, enquanto
ouvia os melhores analistas e investidores do país – e tivesse comprado e
vendido ações com base nessas indicações precisas –, também poderia ter
acumulado um portfólio pessoal no valor de mais de 10 milhões de dólares5 –
enquanto cozinhava como uma segunda ocupação...
Mas se você não é cozinheiro do Goldman Sachs (ou do Credit Suisse, do
Morgan Stanley, do J.P. Morgan ou de qualquer uma das grandes instituições),
não tem problema: hoje em dia qualquer trader bem informado pode dizer
num instante quem está comprando ou vendendo qualquer ação, bastando
utilizar a ferramenta Times and Trades (ou Times and Sales). A gura 4.2 e a
gura 4.3 mostram os quatro conjuntos de informações fornecidos pelo Times
and Trades (versão Nelogica), respectivamente: saldo (composição integral dos
compradores e vendedores), negócios (horário, comprador, valor do negócio,
quantidade de ações negociadas, vendedor), compradores (grá co de pizza do
volume percentual de compra realizada pelas corretoras), vendedores (grá co
de pizza do volume percentual de venda realizada pelas corretoras).

Figura 4.2 – Exemplo Times and Trades (versão Nelogica).


Figura 4.3 – Exemplo Times and Trades (versão Nelogica).
Antigamente, a informação “fulano está comprando” tinha enorme valor,
porque fulano realmente movimentava o mercado. Se uma grande instituição
estivesse comprando em larga escala uma ação especí ca, era uma aposta quase
certa acompanhar a compra. Lógico que o investidor “leitor de coluna de
investimentos do jornal” jamais tinha acesso a esse tipo de informação (e não
tem até hoje).
Hoje em dia, essa informação é importante, mas já não é su ciente. Você terá
que trabalhar duro, porque não se trata mais de apenas seguir o líder. O
mercado mudou. Vamos citar dois exemplos de como uma visão simplista do
uxo de compra e de venda pode gerar prejuízos e um terceiro exemplo,
utilizando a ferramenta Times and Trades para gerar momentos de compra ou
venda.
No primeiro exemplo, temos o caso de uma amiga nossa – estudiosa voraz do
mercado – que, num dado momento, descobriu e se apaixonou pelo Times and
Trades. Então, lançaram no mercado as ações da Ecodiesel (ECOD3).
Ao ver que logo após o lançamento das ações o Citibank estava comprando
todos os dias, ela não se aguentou diante da evidência de que “um dos grandes
estava comprando rme” – e comprou também, na medida do seu capital. E a
ação, que até então oscilava sem rumo, começou a cair.
E continuou caindo nas semanas seguintes. Ela imprimia o Times and Trades
todos os dias, para se convencer a permanecer no trade – que agora já estava
cando para o longo prazo –, pois o Citibank continuava comprando.
Quando ela nalmente não suportou mais ver o preço caindo quase todos os
dias, vendeu, com um prejuízo superior a 20%. E então a ação começou a
subir... Subir... Subir... Até o ponto de entrada da nossa amiga. Depois que a
ação subiu até esse ponto, o Citibank começou a vender, com lucro, para
desespero de nossa amiga.
Moral da história:
Nunca se abrace a uma baleia para um mergulho: ela tem mais fôlego do que
você...
O segundo exemplo é o de alguém que reconhece quem são os grandes
players e tenta seguir seus passos no intraday. A diferença aqui é que ele não
ca posicionado ao longo dos dias, mas tenta acompanhar a compra dos
grandes na expectativa de uma alta ao longo do dia.
O pensamento é mais ou menos o seguinte: “Com esse volume de compra por
parte do Morgan Stanley, certamente a ação deve subir alguns pontos percentuais
hoje.” E o trader compra tal ação, na expectativa de retorno. Ainda brinca com
o assunto: “Se eu me ferrar, o Morgan se ferrou junto...”
Como dissemos agora há pouco, o mercado mudou. Evoluiu. Não atento ao
fato de que agora fazem parte do mainstream as operações market neutral ou
de arbitragem (cujo exemplo no caso de ações é a estratégia long/short ou de
pairs trading – operação de pares de ações que têm um elemento de
cointegração, na qual o player compra uma delas e vende a outra, para arbitrar
o spread), nosso trader no exemplo vai cegamente atrás de qualquer indicação
de compra e de venda dos grandes players.
O que ele não viu é que, enquanto comprava a ação que ele observava, o
mesmo player vendia outra ação, operando o par. Ou seja, nem toda compra
representa posicionamento no lado da compra: pode ser parte de uma
estratégia mais so sticada, cujos aspectos principais não são visíveis ao trader
comum. Há ainda a possibilidade de o player ter comprado a ação para zerar
uma venda a descoberto feita anteriormente!
Agora, vamos ilustrar um exemplo de como utilizar o Times and Trades de
forma estratégica.
1. Escolha uma ação especí ca – esse é um ponto importante: é muito
improvável que você (ou qualquer um) consiga virar expert em muitas
ações ou estratégias ao mesmo tempo.
2. Determine no grá co os principais pontos de in exão ao longo dos meses
(topos e fundos de curto prazo).
3. Pergunte (metaforicamente) ao Times and Trades: quem comprou logo
antes de o preço subir (isto é, no fundo)?
4. Pergunte (metaforicamente) ao Times and Trades: quem vendeu logo antes
de o preço cair (isto é, no topo)?
5. Pode haver um grupo de players que são habitués naquela ação.
6. Uma vez identi cados os habitués, comece a quanti car a atuação de cada
um deles: quem está correto a maior parte do tempo? Quem erra mais?
Existe alguma coalizão importante que se repita em mais de um caso (por
exemplo, quando mais de um player opera para o mesmo lado, ao mesmo
tempo, na mesma ação)?
7. Separe, no grá co, dias de alta, de queda e neutros e analise a informação
do Times and Trades desses dias. Nos dias de alta, havia algum player
importante posicionado fortemente na compra (o inverso para dias de
queda)? Nos dias neutros, havia alguma con guração especial, como um
player operando contra o outro?
8. Com essas informações, monte um grá co ou esquema de modo a poder
identi car posteriormente, em tempo real durante o pregão, se ocorre
alguma das situações que você estudou.
9. Você agora tem elementos su cientes para identi car o nível de relevância
das compras e vendas feitas pelos grandes players. Mas lembre-se sempre: o
mercado é dinâmico e dados passados não irão necessariamente se repetir
no futuro. Não há garantias.
Ainda algumas sugestões: procure observar se o player que está comprando
uma ação não está vendendo ao mesmo tempo outra (possível par
correspondente), preste atenção se dois ou mais players compram ou vendem a
mesma ação ao mesmo tempo e, para operações de mais de um dia, é
fundamental observar se os players habitués da ação chegaram posicionados ao
nal do pregão (às vezes, é possível eles comprarem de manhã e venderem tudo
de volta durante a tarde, o que signi ca que o comprometimento deles com a
possível alta era apenas para o intraday). Numa escala maior, é possível criar
um quadro comparativo e monitorar as posições de todos os grandes players ao
longo do tempo e num universo maior de ações.
Naturalmente, os verdadeiros players não são fáceis de localizar. Soros, já
citado anteriormente, costumava usar entre dez e 20 corretoras para espalhar
suas ordens de compra ou de venda. Além disso, muitas vezes começava uma
operação no lado inverso do pretendido, para testar o mercado. Por exemplo,
se o seu interesse fosse comprar, era possível ele começar primeiro vendendo,
por dois motivos: o primeiro, despistar quem o observava; o segundo, observar
como o mercado reagia às ordens de venda – havia compradores su cientes
para levantar o preço depois que ele tivesse comprado?

4.5.4 Vendendo o que não se tem


Uma das informações mais fáceis de descobrir, que nos impressiona muito por
permanecer ignorada pelo público em geral, é o fato de que na Bolsa se pode
ter lucro com a queda dos preços.
Se você ainda não é um trader, ou pelo menos um trader pro ssional, é
muito provável que até agora também ignorasse este conceito: é possível ganhar
dinheiro com a desvalorização das ações (e demais ativos do mercado).
Antes de entrarmos nos detalhes, vamos observar que isso é praticamente
impossível de ocorrer em qualquer outro lugar. Tome por exemplo a compra e
venda de automóveis: ninguém ganha com a desvalorização que ocorre ano
após ano; o mesmo com imóveis, com bens de consumo (lembra-se do preço
que pagou por seu primeiro computador ou telefone celular?) etc.
Quando tentamos explicar a alguém o funcionamento do que se chama
venda a descoberto (short selling), invariavelmente a primeira pergunta que
ouvimos é: “Mas como eu posso vender algo que não tenho?”
Temos um exemplo: imagine que você sabe que o preço dos relógios Mont
Blanc vai cair. Seu amigo Pedro possui um modelo que vale 10 mil reais e você
decide tomar emprestado por um mês. Você então vende o relógio para Paulo,
por 10 mil reais. Um mês decorre desde o momento da venda (na qual você
recebeu 10 mil reais) e você agora precisa comprar um relógio do mesmo
modelo para devolver a Pedro. Como você previa, o preço realmente baixou.
Você paga 8 mil reais por um relógio igual e devolve a Pedro. Então, você
recebeu 10 mil reais e desembolsou apenas 8 mil reais... Os 2 mil reais que
sobraram são o seu lucro na transação.
Da mesma forma, se você aluga uma ação (o equivalente a tomar
emprestado), você tem a sua custódia sem ter desembolsado o valor que seria
necessário para comprá-la. Se você olhar sua conta na corretora, a ação está lá,
esperando para ser movimentada (vendida). Você, porém, não teve que
comprá-la... Apenas a alugou por um determinado período, sabendo que
deveria devolvê-la depois. Então, você tem cem ações em sua conta e não teve
que comprá-las: quando você vende essas ações... Está realmente vendendo
algo que não tem.
A estratégia operacional aqui é inversa à da compra. Se ao comprar ações
nossa expectativa é de valorização ou alta em seu preço, quando operamos na
venda estamos convencidos de que o mercado enfrentará um período de queda.
Um dos motivos pelos quais esse tipo de operação não é muito divulgado ao
público pode estar relacionado ao fato de que os corretores de ações ganham
um bom dinheiro vendendo a descoberto, muitas vezes operando contra os
clientes. Mas se você ligar para a sua corretora e pedir informações sobre o
funcionamento desse tipo de operação, eles lhe fornecerão: são obrigados a isso
pela CVM e pela própria Bolsa.

4.5.5 O que o dono do restaurante está fazendo?


Larry Williams, ao falar sobre insider trading, dá um exemplo interessante: se
você vai a um restaurante e vê o próprio dono atravessando a rua para almoçar
no concorrente, há algo de errado com a comida.
O grá co da gura 4.4 nos mostra a venda de ações da Microsoft.
Figura 4.4 – Venda de ações da Microsoft.6
De acordo com o site www.insiderreview.com, esses são os pontos em que Bill
Gates vendeu suas ações da Microsoft. Historicamente, exatamente no topo,
que correspondeu ao topo das ações de tecnologia da Nasdaq. O timing não
poderia ser melhor – o que fez Larry Williams dizer que Gates era “o maior
trader de todos os tempos”.
Inside trading é quando os sócios ou diretores de uma empresa compram ou
vendem as ações da própria empresa, o que é uma ocorrência normal e prevista
pelos regulamentos da Bolsa.
Não confundir com inside information, na qual há um vazamento de
informações importantes e não públicas sobre a empresa – a regulamentação da
Bolsa exige que qualquer notícia relevante seja divulgada apropriadamente de
uma só vez para todos os participantes do mercado. Alguém que possui uma
informação que não foi divulgada para o público e age com base nela está
cometendo um crime (Lei 6385/76, artigo 4º, IV c.) de uso de informações
privilegiadas. A gura 4.5 mostra uma noticia a respeito do uso de informação
privilegiada.
Para uma visão interessante e hollywoodiana do insider information,
sugerimos assistir ao lme Wall Street – poder e cobiça, do qual o tema central é
justamente esse tipo de negociação.
Para fazer um contraponto, vamos citar o investidor mais conhecido (e rico)
do mundo:
“Com su ciente inside information e 1 milhão de dólares você pode ir à falência
em um ano.” – Warren Bu ett
Figura 4.5 – Notícia sobre o uso de informação privilegiada.7

4.5.6 Deception
Suponha que esteja lidando com um adversário que tenha as mesmas
qualidades estratégicas que você: acesso às mesmas informações, capacidade de
análise do mercado semelhante, su ciente poder de fogo, em suma, é um
adversário à altura. Como se poderá vencê-lo?
Pelo deception, você o engana.
Tomada literalmente, deception é “engano, engodo”, mas tem qualidades
especiais. Tem a ver com camu agem, fazer o outro acreditar em algo, criar
uma realidade ilusória etc.
Niederho er nos dá o exemplo de um general da Guerra Civil Americana
que solicitava abertamente informações sobre a melhor rota para um lugar
especí co, mandava preparar mapas, começava a construção de estradas para
que as tropas pudessem se movimentar – e, quando os boatos a respeito de suas
intenções já tinham se espalhado o su ciente, ele marchava calmamente na
direção oposta.
Jesse Livermore – considerado um dos maiores traders de todos os tempos –
cita em sua biogra a o exemplo de dois traders que se conheciam e se
respeitavam mutuamente por suas diversas façanhas na especulação com ações.
Certo dia, ao encontrarem-se na rua, um deles comenta “você precisa vender as
ações da empresa X” e arremata com um piscar de olhos “certamente vão cair uns
30%!”. (Nos dias e nas semanas seguintes, o preço da ação subiu disparado.)
Ao encontrarem-se novamente, um mês depois, aquele que deu a dica tentou
atravessar a rua, ngindo não ter visto o colega. Mas ele atravessou a rua
também e o abordou:
– Queria agradecer a dica que você me deu.
O primeiro retruca:
– Dica? Que dica? Eu não lhe dei dica nenhuma!
– Deu sim, você me aconselhou a vender a ação X... Ganhei bastante
dinheiro naquela operação.
Ele cou estupefato:
– O que você fez?
– Eu comprei!
Neste ponto, o que havia dado a sugestão sorriu e disse:
– Se eu tivesse metade da sua inteligência, seria um trader muito melhor!
O mercado é cheio de ocorrências de deception, e muitas de suas fórmulas
vêm descritas no livro atribuído a Livermore. Uma das mais interessantes
armadilhas é o chamado corner, no qual um ou mais participantes do mercado
são prensados (squeezed).
“Mas o livro foi escrito em 1923! Haveria alguma utilidade nos dias de hoje?”
Você pode estar se perguntando. Se analisarmos em retrospecto, não há nada
de novo no mercado de ações... No século passado já se fazia o mesmo...
Observe o caso relativamente recente (outubro de 2008) de short squeeze que
ocorreu no mercado europeu:
“‘Eu tenho gestores de fundos hedge literalmente em lágrimas no telefone’, disse
um analista baseado em Londres ontem. Outros disseram que a revelação feita pela
Porsche foi como ‘uma bomba nuclear explodindo na nossa cara’, descrevendo as
perdas resultantes como ‘um banho de sangue’. Nós sabíamos que o preço iria
disparar, aumentando a exposição de muitos hedge funds – eles estariam
oferecendo suas lhas em troca das ações, só para sair do aperto.”
Esse é um parágrafo da matéria do Telegraph8 sobre como alguns dos maiores
hedge funds do mundo tiveram prejuízos estratosféricos em razão de posições
de venda a descoberto nas ações da Volkswagen. Eis o que ocorreu: no auge da
crise (2008), foram proibidas as vendas a descoberto em ações de bancos na
Europa – então os fundos hedge viram a oportunidade de vender as ações da
VW, que acreditavam estarem sobrevalorizadas (overvalued). Abriram posições
de venda a descoberto no valor de bilhões de euros.
Então, a Porsche, numa tarde de domingo, publicou que silenciosamente
havia aumentado sua participação na VW de 35% para um total de 75%.
Somando essa participação da Porsche com a participação do estado alemão da
Baixa Saxônia na ordem de 20% nas ações da VW, restavam apenas 5% de
ações livres (free oat), disponíveis para os hedge funds comprarem e cobrirem
sua posição de venda a descoberto, que era superior a 10% do total de ações da
VW. Em suma: eles precisavam de mais ações para cobrir sua operação do que
as que estavam disponíveis no mercado.
Então ocorreu o squeeze (literalmente: aperto). As ações da VW que, valiam
cerca de 200 euros, subiram para 1.200 euros em poucos dias... E a Porsche
lucrou alguns bilhões de euros no processo!
Quando se trata de deception, não há uma separação de nós/eles entre
tubarões e sardinhas. É literalmente cada um por si e a Bolsa por todos...
Lucro, a nal de contas, pode se soletrar:
A.S.S.I.M.E.T.R.I.A.

1 Para simpli car a explicação, não estamos computando taxa de liquidação e custódia.
2 Mais detalhes em: http://en.wikipedia.org/wiki/Black_Wednesday e
http://en.wikipedia.org/wiki/George_Soros
3 Trading for a living, de Alexander Elder (traduzido no Brasil como Como se transformar em um operador
e investidor de sucesso).
4 Estimativas de Charles Ellis, em Winning the loser’s game.
5 Por mais incrível que pareça, esta é uma história verídica. O cozinheiro Rudy Stanish cou milionário
( e partnership – e making of Goldman Sachs, Charles Ellis).
6 Fonte: Larry Williams, em e right stock at the right time – prospering in the coming good years.
7 Fonte: http://economia.estadao.com.br/noticias/negocios+setor- nanceiro,uso-de-informacao-privilegiada-
vira-alvo-central-de-investigacoes-da-cvm,33546,0.htm.
8 Fonte: http://www.telegraph.co.uk/ nance/newsbysector/transport/3281537/Porsche-and-VW-share-row-
how-Germany-got-revenge-on-the-hedge-fund-locusts.html
CAPÍTULO 5
Qual é a sua estratégia operacional?

Segundo Francis M. Crinella – pesquisador e diretor do laboratório de


neuropsicologia da Universidade da Califórnia (Irvine) –, o cérebro
continuamente muda ou se remodela para aprimorar o funcionamento mental.
Nesse contexto, existe um fenômeno muito particular da mente humana com
implicações importantes na esfera de investimentos ou trading chamado
plasticidade neural, no qual ocorre o reforço de um dado conceito à medida
que o indivíduo é exposto a estímulos sobre o conceito – por meio de um
aumento do número de conexões entre os neurônios que reforçam o
aprendizado. Em outras palavras, nosso cérebro está con gurado de modo a
perpetuar relações cognitivas, uma vez que elas se estabeleçam: quando algo é
aprendido, há uma tendência natural a con rmar, reforçar e manter aquele
aprendizado.
Quando chega pela primeira vez ao mercado, o potencial investidor ou trader
se depara com algum dos tipos de análise que tentam explicar os fenômenos
com os quais ele toma contato. Da mesma forma que uma criança brasileira
aprende a dizer mesa e uma norte-americana aprende a dizer table, a linguagem
com a qual o futuro investidor ou trader se identi car primeiro passará a ser
sua língua mãe quando se trata de interpretar o mercado.
Isso tem consequências diretas em sua experiência futura, porque como
existem diversos tipos de análise, ao identi car-se com a primeira que toma
contato ele pode estar deixando de lado elementos importantes das outras,
ainda mais considerando que o mercado – fenômeno complexo e dinâmico –
pode gerar interpretações as mais diversas, cada uma ditada pelas premissas da
linha de análise que o investidor ou trader utiliza.
Por exemplo, se você for um fundamentalista, provavelmente interpretará as
informações disponíveis pela perspectiva das interações de valor que o mercado
deveria preci car. Isso signi ca que sua análise estará voltada aos fatores
econômicos com potencial de gerar acréscimo ou decréscimo no valor de
mercado de uma empresa, e utilizará a informação do preço corrente da ação
apenas para avaliar se o mercado já descontou ou não a nova realidade de valor.
Caso o preço da ação seja diferente do preço justo identi cado pela análise,
você se posicionará para antecipar a correção dessa anomalia, comprando as
ações que estiverem subvalorizadas e vendendo as que estiverem
supervalorizadas.
Se você for um técnico, utilizará quase que exclusivamente os padrões de
preço de uma ação, independentemente dos fundamentos da empresa. O preço
atual é visto então como o consenso entre os participantes do mercado num
dado momento e sua análise será uma tentativa de buscar, no grá co, uma
indicação do seu movimento futuro. Por exemplo, se você identi car que o
preço vem subindo de patamares ao longo de certo período de tempo (uma
tendência de alta), você se posicionará na compra em um ponto em que a
relação risco/retorno esteja dentro de seus parâmetros e permanecerá comprado
enquanto o preço estiver avançando para novas altas, mesmo que esse
movimento de preço contrarie as perspectivas de valor estabelecidas pela análise
fundamentalista e se constitua num movimento puramente especulativo.
No caso de você se quali car como um trader quantitativo (ou quant), você
estará interessado no desenvolvimento de estatísticas baseadas na série temporal
disponível, buscando, por meio de modelos matemáticos, uma recorrência de
fenômenos que possa ser aproveitada. Desse modo, o foco está em poder
quanti car ou transformar em realidades numéricas o histórico dos preços. O
trader quantitativo não acredita em padrões de preço que não possam ser
de nidos de forma mensurável, não levando em consideração, portanto, as
muitas guras de preço utilizadas pelo técnico.
Em cada um desses casos podemos dizer que os envolvidos decodi cam o
mesmo fenômeno (a realidade do mercado) de acordo com um alfabeto ou
código diferente, que não somente in uencia a sua interpretação dos dados,
mas também a escolha de quais dados serão considerados relevantes e quais não
serão. Aquele que utiliza um dos tipos de análise está convicto de que essa é a
forma mais e ciente de observar o fenômeno, interpretá-lo, tirar conclusões e
nela basear suas decisões de investimento ou trading.
A esse respeito, é importante observar que é muito difícil nos colocarmos
voluntariamente na posição de contestar as associações e os ensinamentos já
aprendidos. Em função disso, após aprofundar-se, ainda que um pouco, em
uma das formas de analisar o mercado, geralmente o indivíduo não busca
questionar ou testar se aquela forma de análise é mesmo válida, em muitas
situações. De certo modo, se ele observa que uma das a rmações da análise
funciona, ele tenderá a aceitar tacitamente que as outras a rmações também
funcionam – e que todo o conteúdo daquela forma de análise é válido, em
todos os casos. Mas, como veremos nas próximas páginas, questionar sempre
vale a pena, pois é possível descobrir que um aspecto da análise estudada pode
vir a não justi car ou validar os outros.

5.1 Análise fundamentalista: a busca pelo valor


Para o investidor, o histórico recente da ação negociada no mercado de capitais
não importa tanto quanto o valor correspondente à empresa que ela representa.
O investidor investe, ou seja, aloca seus recursos para o negócio gerido pela
companhia cuja ação ele comprou ou pretende comprar. Ele não está tão
preocupado com a liquidez ou a volatilidade, desde que possa identi car se o
negócio da empresa é sólido, produz bons resultados e poderá reproduzir esses
resultados no futuro. Ele con a que o mercado também identi ca esse valor e o
preci ca corretamente.
Ele possui a mentalidade empresarial. Investe em ideias, em perspectivas de
negócio. (Se você duvida desse ponto – investir em ideias –, leve em
consideração que existem empresas que foram para IPO e lançaram suas ações
na Bolsa tendo como patrimônio apenas o seu plano de negócios!)
A escola fundamentalista, portanto, acredita que os negócios reais, a
economia real, movimentam a valorização ou a desvalorização em Bolsa.
Acredita, também, que há uma relação direta entre os fundamentos de uma
empresa e a preci cação atual e futura de suas ações. Por meio de uma série de
métricas de avaliação, os fundamentalistas buscam de nir o valor das empresas.
Como já mencionamos, sua análise se baseia em identi car anomalias, isto é,
momentos em que o mercado não preci ca corretamente uma mudança de
valor da empresa. O investidor fundamentalista, então, se posiciona,
antecipando o futuro reconhecimento dessa alteração no valor –
reconhecimento este que se dá pela mudança do preço das ações para um
patamar mais elevado.
As principais medidas de avaliação dos fundamentos são os chamados:
1. Valor de mercado: Divide as ações em large caps, medium caps e small
caps; respectivamente, ações de empresas com grande capitalização, média e
pequena capitalização.
2. Valor versus crescimento: Geralmente, as empresas são divididas entre
essas duas classi cações, dependendo se é uma empresa de valor (ou seja, já
solidamente estabelecida e com um histórico de produzir valor ou
resultados consistentemente ao longo do tempo – exemplo: empresas de
utilidades, como infraestrutura), ou de crescimento (cujo negócio é
inovador e tem chances de valorização estratosférica se ela tiver os meios
necessários de fazer seu negócio amadurecer e prosperar – exemplo:
empresas de tecnologia).
3. Múltiplos: Fórmulas de medir a saúde da empresa combinando
informações. São exemplos: índice P/L (preço/lucro), EBITDA (na sigla
em inglês, lucro antes de impostos, juros, depreciação e amortização),
margem bruta, valor patrimonial da ação, preço por valor patrimonial da
ação, rentabilidade sobre o patrimônio, taxa de retorno, distribuição de
dividendos, índice de liquidez, índice de atividade, nível de endividamento,
entre outros.
A forma clássica de analisar o valor de uma empresa é atribuída ao livro
Secutity analysis, de Graham e Dodd. A partir dessa obra, o value investing,
como é chamado, foi crescendo em popularidade como uma forma inteligente
de investir.
O discípulo mais conhecido de Graham é, sem dúvida alguma, Warren
Bu ett. De fato, embora Graham seja conhecido como o pai do value
investing, foi Bu ett, sem dúvida, quem cou famoso por adotar e difundir
essa abordagem. Talvez o fato de ele já ter sido considerado o homem mais rico
do mundo tenha ajudado a criar sua fama. As histórias a esse respeito são
inúmeras: acionista de empresas como Coca-Cola e Washington Post, Bu ett é
conhecido por investir em negócios sólidos e manter seus investimentos para o
longo prazo.
“Meu período de tempo favorito para manter um investimento é para sempre.” –
Warren Bu ett
Diz a lenda que ele realmente ia a fundo na busca por informações sobre as
perspectivas das empresas que tinha em mira, a ponto, por exemplo, de
conferir na ferrovia quantos vagões de carga passavam com o logotipo de
determinada empresa, como uma medida do real uxo de vendas. Se passassem
poucos vagões, ele teria uma indicação de que as vendas não iam bem; se
passassem muitos, as vendas estavam num bom patamar.
Atualmente, a análise fundamentalista conta com inúmeros colaboradores e
se tornou matéria obrigatória nos círculos acadêmico e corporativo. Um
expoente moderno é o professor Aswath Damodaran, MBA e ph.D. pela
Universidade da Califórnia, em Los Angeles, que mantém um site1 muito útil
para quem busca informações fundamentalistas sobre empresas do mundo
todo.

5.1.1 O outro lado do valor


Victor Niederho er é um gestor de fundos de commodities mundialmente
conhecido pelo seu histórico de lucratividade excepcional durante 15 anos
seguidos (levando-o a ser considerado em 1996 o melhor gestor de fundos
hedge do mundo), como também é conhecido pela sua estrondosa debacle em
1997, quando em um único dia seu fundo quebrou, em razão de apostas
alavancadas nos mercados mundiais (ele estava ao mesmo tempo alavancado na
compra do banco da Tailândia e vendido a descoberto em opções de venda do
S&P500 – durante a incrível queda do mercado no dia 27 de outubro de
1997). A partir daí, ele permaneceu alguns anos fora do mercado, para retornar
em 2001, na gestão do fundo Matador (Toureiro, em espanhol), criado para ele
por investidores institucionais europeus para operar somente o mercado norte-
americano. Em 2006, foi novamente nomeado o melhor gestor de fundos. Seu
primeiro livro foi e education of a speculator, publicado no início de 1997,
uma espécie de autobiogra a e lições sobre o mercado utilizando como
analogia tênis, squash, música clássica, biologia, xadrez, damas, corridas de
cavalo, ecologia... e até mesmo sexo. “Tudo está interligado”, ele a rma.
Em 2003, ele publicou com Laurel Kenner o livro Practical speculation, no
qual se dedica a desvendar alguns mitos existentes no mercado, bem como a
fazer novas comparações entre especulação, investimento e ciências
(computação, estatística, química, física, biotecnologia). Laurel é jornalista e
foi a editora-chefe da Bloomberg para o mercado de ações.
Practical especulation dedica dois importantes capítulos a desmisti car alguns
aspectos da análise fundamentalista do modo como é divulgada: Earnings
propaganda e Benjamin Graham: mythical market hero.
O primeiro, Earnings propaganda, trata da questão universalmente conhecida
para os pro ssionais do mercado (e até para os leigos, dizem Victor e Laurel),
da importância dos resultados de uma empresa. Earnings é o equivalente a
lucro, nesse contexto, em que o índice P/E (price/earnings) traduz-se como
índice preço-lucro (P/L).
Existem algumas inferências a respeito dos lucros de uma empresa com as
quais praticamente todos estão familiarizados:
a. Os lucros e o preço da ação andam para cima e para baixo em uníssono;
b. Quanto maior o aumento nos lucros, maior o retorno da ação;
c. Quando os lucros estão altos, é hora de comprar ações;
d. Quando os lucros estão baixos, é hora de vender;
e. Quando o índice P/L (preço/lucro) estiver alto, é hora de vender ações.
“Cada um desses axiomas é falso”, a rmam Victor e Laurel, após terem testado
em diversas empresas se as relações lucro/preço por ação se mantinham.
Segundo eles, esses axiomas não funcionam quando confrontados com os
dados empíricos. “Quase tudo que é ensinado aos investidores sobre a relação entre
lucros e retornos no mercado de ações... está errado.”
Após fazer essa a rmação bombástica, Victor e Laurel partem para a
demonstração do teste estatístico que realizaram para cada um dos axiomas que
refutam. A principal ferramenta que utilizaram para determinar a relação (ou a
falta dela) é o diagrama de dispersão. Em primeiro lugar, testaram o período de
um ano: as ações deveriam cair quando os lucros estão para baixo, certo? Mas,
na prática, o oposto acontece: quando a carteira de ações do S&P 500 (o
principal índice de ações norte-americano) tem um lucro positivo reportado no
ano, nesse mesmo ano o S&P 500 tende a mostrar um desempenho pior do
que a média; quando os lucros reportados caem no ano, o S&P 500 tende a
apresentar um resultado acima da média...
Eles estudaram um total de 65 anos, dos quais em 22 as empresas
apresentaram uma queda nos lucros. O retorno médio do S&P500 em cada
um desses anos de queda dos lucros foi uma alta de 14,2%, o que é incrível,
especialmente quando comparados com os anos de alta dos lucros, em que o
retorno foi de apenas 4,9%.
Após testar o resultado do S&P 500 versus os lucros reportados no período
de um ano, eles testaram as relações trimestre a trimestre. Uma vez que
encontraram retornos inesperados em anos de queda dos lucros, a pergunta que
surgiu era se as relações baseadas em números trimestrais apresentariam um
resultado diferente. A resposta é não. Se os lucros sobem em um trimestre, o
S&P tende a apresentar um desempenho abaixo da média no trimestre
seguinte. Se os lucros caem no trimestre, o S&P apresenta um desempenho
superior no trimestre seguinte...
Mas havia ainda mais elementos para testar. Em seguida, partem para o
ataque do índice preço/lucro, talvez o maior bastião dos fundamentalistas. A
primeira di culdade que tiveram foi a de eliminar as discrepâncias encontradas:
muitas companhias não reportam seus dados até a metade de abril – em função
disso, é difícil determinar se um número de P/L para a carteira do índice
(S&P500) re ete os últimos 12 meses de lucros ou os lucros do ano-calendário.
Outro problema é que os lucros podem ser revisados futuramente... E então os
dados originalmente reportados acabam muitas vezes sendo bem diferentes
daqueles que aparecem nas publicações, nos sumários, nos arquivos de preço e
na base de dados muitos anos depois.
Além disso, seus estudos revelaram que a relação P/L (preço/lucro) é, no
mínimo, nebulosa: os P/L de 30 que prevaleceram em 1929 são sempre citados
como indicativos de resultado inferior para os anos subsequentes, mas no início
de 1970, quando o P/L do S&P 500 era apenas 16, o retorno anualizado dos
cinco anos seguintes foi -6% ao ano. No início de 1994, o P/L era 21,3 – e o
retorno anualizado dos cinco anos seguintes foi de 21%!
Outro fator importante ao analisar a relação entre os lucros e o preço da ação
é a ocorrência da chamada “contabilidade criativa”, na qual a empresa
deliberadamente tenta colorir a pílula reportando resultados falsos.
No tópico Benjamin Graham: mythical market hero, Victor e Laurel tratam
nada mais, nada menos do que de Graham, autor dos livros Security analysis e
e intelligent investor, entre outros.
Benjamin Graham pregava que o segredo para ter sucesso nos investimentos
era comprar ações de empresas que estivessem aproximadamente 50% abaixo
de seu valor real de mercado (valor patrimonial). Aqui começam as
di culdades. Se isso fosse possível, os próprios diretores, o CEO, ou os
banqueiros da empresa a comprariam no ato e a liquidariam em seguida,
embolsando um signi cativo prêmio.
De acordo com Niederho er, poucas pessoas sabem que os fundos de
investimento que o próprio Graham gerenciava não tiveram um desempenho
condizente com sua teoria no período pós-1929. Após ter nalizado 1928 com
60% de retorno, ele perdeu 20% em 1929 e 50% em 1930. Em 1931, ele
perdeu 16% e, em 1932, 3%. Além disso, quando o índice Dow Jones subiu
para o patamar de 100 pontos, Graham cou desconfortável em investir num
mercado tão sobrevalorizado... Só que o Dow Jones nunca caiu abaixo de 100
pontos a partir de 1942, e isso o manteve permanentemente na defensiva.
Quando o índice atingiu 300 pontos, ele começou a se afastar paulatinamente
dos investimentos e a aconselhar seus estudantes contra investir em um
mercado tão alto. Em 1956, quando o Dow bateu em 500 pontos, Benjamim
Graham afastou-se de nitivamente do mercado. (Acreditando que o índice
Dow Jones estava muito caro a partir do patamar de 100 pontos, o que ele diria
se soubesse que em 2007 o índice alcançaria a máxima histórica de 14.198
pontos?)
Há também outra história interessante sobre os investimentos feitos por
Graham. Conforme ele mesmo escreveu, Geico foi um investimento que ele fez
sem seguir seus próprios métodos... O que se seguiu foi que essa empresa – que
ele depois vendeu a Warren Bu ett – foi responsável por uma parte generosa
de seus resultados de investimento (assim como permaneceu dando lucro
também a Bu ett, após sua compra).
Mas há outra forma de avaliar a aplicação completa das teorias de Benjamim
Graham nos dias de hoje. Como se sairia um fundo de investimento que
seguisse sua loso a de investimento? O exemplo mais próximo de que temos
referência é o fundo Rea-Graham, fundado em 1976 e extinto em 1998, com
um valor de apenas 3,6 milhões de dólares em ativos. No período nal de
apuração, o desempenho do índice S&P 500 ultrapassava o do fundo Rea-
Graham em mais de seis vezes.

5.1.2 Bu ett: muito mais do que Coca-Cola


Dizem que a bebida preferida de Warren Bu ett é a Cherry Coke (uma versão
da Coca-Cola com sabor de cereja que não pegou aqui no Brasil). A nal, sendo
um dos acionistas da empresa, ele dá o exemplo. Mas, assim como ele
naturalmente deve beber outras bebidas além da Cherry Coke, suas estratégias
de investimento incluem mais elementos do que ter comprado Coca-Cola para
segurar para sempre.
No livro Trade like Warren Bu ett, James Altucher revela um lado
praticamente desconhecido das estratégias operacionais do oráculo de Omaha.
“... eu não consigo pensar em ninguém que tenha operado e investido com um
grupo mais diverso de estratégias nos últimos cinquenta anos. (...) Muitas delas
seriam normalmente pensadas como sendo estratégias de “trading” ao invés do
investimento comprar-e-segurar pelo qual Bu ett é famoso.” – Altucher, James, em
Trade like Warren Bu ett.
E ele segue descrevendo as estratégias utilizadas por Bu ett, que são de uma
so sticação não acessível ao grande público, tais como a utilização do FED
Model, estratégias utilizando conversíveis (obrigações de débito que podem ser
convertidas em ações), arbitragem em fusões e aquisições, arbitragem de renda
xa etc. Tudo isso contraria a imagem pacata de um senhor que passa os dias
lendo relatórios anuais de empresas para identi car bons investimentos. Do
modo que é descrito por Altucher, Warren Bu ett está mais para um gestor de
hedge fund do que qualquer outra coisa.
Há quem defenda a ideia de que a análise fundamentalista funciona melhor –
ou talvez somente – nos períodos de alta do mercado, os chamados bull
markets. Se for esse realmente o caso, conforme o analista russo naturalizado
norte-americano Vitaly Katsenelson, o último mercado de alta começou em
1982 e foi encerrado em 2000 (auge da bolha da internet). A partir daí, ele
a rma, o mercado entrou em uma fase que chama de range-bound market, ou
mercado “lateral”, com períodos de alta sendo revezados com períodos de
queda.
Sua tese está exposta no livro Active value investing. O ativo do título (active)
demonstra sua abordagem de não acreditar na estratégia de “comprar e
segurar”. Como gestor de investimentos, ele prefere comprar uma ação quando
observar que está subvalorizada – mas livra-se dela logo que o valuation
demonstra que já alcançou o patamar de valorização considerado justo.
Ainda segundo ele, esse último “bull market”, que durou 18 anos, seria
seguido por um período mais ou menos longo (cerca de 12 a 17 anos) de
mercado lateral, no qual investir em valor não é su ciente – sendo preciso
também uma estratégia de timing para aproveitar os momentos de valorização
que ocorrem dentro do range ou limite do mercado. Em outras palavras, um
mercado “de lado” tem meses de alta e de queda – desse modo, além de
escolher adequadamente as empresas para investir (valor), é necessário também
saber quando e por quanto tempo (timing).
O grá co da gura 5.1 mostra que períodos longos de mercado lateral
(sinalizados pelos retângulos) não são uma raridade no mercado norte-
americano. As áreas indicadas possuem preços estagnados ao redor do mesmo
nível.

Figura 5.1 – DJI, grá co mensal desde 1929. Fonte: Pro t Chart.
Como a abordagem preferida dos fundamentalistas é a de “comprar e
segurar”, perguntamos: você estaria confortável em investir em uma ação ou
carteira de ações... e ter de esperar 19 anos até elas darem lucro? Pois foi o que
aconteceu do período de 1962 a 1981. O índice de mercado (Dow Jones
Industrial Average) oscilando para cima e para baixo ao longo de um eixo
horizontal. Ganhava-se num período, perdia-se no seguinte, ganhava-se de
novo, perdia-se de novo... E o mercado só foi sair dessa congestão a partir de
1982, dando origem ao bull market ou mercado de alta, que durou, segundo
Katsenelson, até o ano 2000.
Situação semelhante ocorreu também de 1935 a 1949, com os preços
oscilando de forma horizontal durante 14 anos.
Vitaly tem uma visão diferente da de Victor e Laurel, e inclui o índice P/L
em seus cálculos para estimar a chegada de um range-bound market. Ele
realmente acredita que, quando as ações que compõe os índices norte-
americanos cam caras demais, o mercado tenta corrigir essa anomalia...
Oscilando sem sair do lugar durante vários anos. Talvez ambos (Vitaly e
Victor) estejam olhando para o mesmo fenômeno a partir de ângulos
diferentes.
O problema relacionado a um mercado lateral é que, além de não produzir
lucro durante um longo período de tempo, seus movimentos de queda são
fortes o su ciente para quebrar investidores individuais e fundos de
investimento. Recentemente, tivemos essa ocorrência nos anos 2000, 2001,
2002 e 2008. Isso coloca os fundamentalistas diante do problema do timing:
não basta saber onde está o valor, é preciso identi car também o momento
adequado para investir.
Uma referência interessante nesse aspecto (além do próprio Katsenelson) é a
obra do gestor (e ph.D. em economia) Martin Zweig. Seu livro Winning on
Wall Street traz elementos importantes para o investidor aprender a se
posicionar em momentos do mercado que possam conduzir ao lucro mais
rapidamente. Ele utiliza um modo próprio de gerir recursos baseado não
somente em quais empresas se deve investir (onde está o valor), mas também
buscando o contexto de mercado adequado para isso, utilizando a combinação
de indicadores monetários e de momentum, os quais ele descreve no livro.
Zweig é talvez o primeiro dos fundamentalistas que advogou a necessidade de
não lutar contra o mercado – ao invés disso, demonstrou que é preciso
aguardar o momento mais propício em que a preci cação do valor pode
ocorrer.
A questão de buscar o momento adequado para iniciar ou reforçar
investimentos deve-se ao fato de que, num período de negatividade
generalizada (como na crise de imobiliária e de crédito que eclodiu em 2008),
praticamente todas as ações do mercado caem ao mesmo tempo, mesmo que
sejam de empresas sólidas, bem administradas, com negócios gerando lucro (ou
seja, empresas de valor).
O que causa uma queda generalizada do mercado? E por que as empresas que
mantêm seu valor têm suas ações desvalorizadas juntamente com as outras?
Essas podem certamente ter sido perguntas feitas por investidores
fundamentalistas no período de junho a outubro de 2008. A questão é que o
mercado, sendo um fenômeno complexo, leva em consideração muitas outras
variáveis além da valoração das empresas. Por exemplo, atualmente os mercados
mundiais estão conectados por meio de negociação eletrônica: podemos, do
Brasil, comprar e vender ações norte-americanas, alemãs, chinesas, e nas
diferentes Bolsas de todo o mundo. O inverso também é verdadeiro: o mundo
inteiro pode negociar no nosso mercado. Dado que isso acontece, é preciso
compreender que o “grande” dinheiro está espalhado pelo mundo inteiro, ou
seja, megainvestidores ou megaespeculadores operam ao mesmo tempo nos
principais mercados do mundo. Desse modo, é praticamente a regra que um
movimento importante que comece num dado mercado se espalhe
rapidamente para os outros, às vezes com diferença de poucos minutos.
A di culdade em aplicar a análise fundamentalista sem uma referência de
timing em um período de queda da Bolsa pode ser exempli cada de forma
dramática pela trajetória do chamado “Bu ett brasileiro”. Nascido na Coreia e
naturalizado no Brasil, Mu Hak You, após ter ocupado cargos de diretoria em
diversos bancos, abriu um negócio próprio e criou uma factoring em São
Paulo. O passo seguinte foi criar a GWI, uma gestora de investimentos cujos
fundos foram sucesso absoluto durante anos seguidos... Até quebrar em 2008.
A gura 5.2 destaca uma reportagem sobre Mu Hak You e a gura 5.3 sobre o
fechamento do GWI.
Figura 5.2 – Matéria da Exame sobre Mu Hak You (4/9/2008).
Figura 5.3 – Matérias (Fazenda Net e Folha Online) sobre o fechamento do GWI
(8/10/2008).
Os fundos GWI foram reabertos após um mês de fechamento e em 2011
foram novamente fechados para resgate. Em sete dias, o prejuízo foi notável:
seu patrimônio foi reduzido de 1,87 bilhão de reais para 114 milhões de reais2.
O caso mais grave é do GWI Private, que precisa de um aporte de capital dos
investidores de R$ 27 milhões para pagar suas dívidas no mercado, em especial
com três corretoras, que assumiram os débitos nas operações do fundo, segundo
comentários de analistas (...) Até sexta-feira, os cotistas do Private não haviam
cumprido a determinação de depositar os valores adicionais para cobrir o rombo
do fundo, que está inadimplente na BM&FBovespa. Se isso não ocorrer, será a
primeira vez que os investidores de um fundo poderão ser cobrados por via judicial
pelos credores (...) Mu Hak não poderá, porém, fazer resgates expressivos, pois isso
acabaria por pressionar demais o preço das ações que estão nas outras carteiras ou
levar o BNY Mellon a fechar de novo os fundos.
Valor online3

5.2 Se você não pode vencer o mercado, junte-se a ele...


É exatamente isso que prega Charles Ellis, em seu livro Winning the loser´s
game.
Analisando o histórico do mercado e das empresas gestoras de investimento,
ele chegou às seguintes conclusões:
a. Existe, no caso do mercado de ações, um upward drift ou um movimento
para cima no longo prazo, em razão de que somente permanecem com o
capital aberto as empresas que, obviamente, não faliram ou encerraram suas
atividades.
b. No caso do índice de ações (Ibovespa, no Brasil), que é representativo da
fatia mais “saudável” do mercado, esse movimento para cima no longo
prazo é mais provável de ser acompanhado do que se escolhêssemos uma
ação especí ca, a qual pode apresentar rentabilidade inferior à média do
mercado.
c. 85% dos gestores de fundos de ações que gerenciam ativamente suas
carteiras apresentam uma rentabilidade anual inferior ao índice do
mercado.
d. Os 15% que superam o mercado o fazem revezando-se nas primeiras
posições – o que signi ca que um gestor que teve um desempenho superior
nesse ano pode muito bem no ano seguinte (ou nos anos seguintes)
apresentar um rendimento inferior ao do índice.
Em função dessas constatações, ele advoga uma metodologia de investimento
muito simples, não somente para os leigos do mercado, mas também para os
gestores pro ssionais: simplesmente permanecer comprado no índice, para
longo prazo.
Isso signi ca deixar de lado quaisquer tentativas de escolher ações que
possam ter desempenho superior, ou tentar adivinhar em quais momentos
permanecer comprado e em quais permanecer de fora do mercado – pois ele
acredita que nenhum gestor consegue acertar sempre.
Para aqueles que desejam seguir essa metodologia, lembramos que o
investimento em índice futuro tem maior risco, dado que tem uma
alavancagem embutida (pois só se deposita o valor de margem) de
aproximadamente cinco vezes. Investindo em ações, se o mercado cai 20% e
você permanece na operação, quando ele retornar ao zero a zero, você não
perdeu nada. Em ações, o prejuízo só é efetivamente concretizado ao encerrar a
posição. Operando índice futuro é diferente, pois ele tem liquidação nanceira
diária, mesmo com a posição aberta (trade em andamento). Ou seja, todos os
dias o lucro ou o prejuízo são efetivamente compensados: se você ganhou, o
dinheiro entra na sua conta na manhã seguinte, se perdeu, sai dela na manhã
seguinte também. Soma-se a isso a alavancagem de cinco vezes, quando o
mercado cair 20%, seu capital evaporou... (20% negativos x 5 de alavancagem
= 100% negativos).
É por isso que Charles Ellis sugere que se invista no ETF (Exchanged Traded
Fund ou fundo negociado em Bolsa) do índice4. Pois o ETF é apenas uma
ação... É a ação do fundo cuja carteira se iguala à do índice. Nesse caso, basta
comprar essa e você estará comprando o equivalente à carteira completa do
índice (no nosso caso, o Ibovespa), sem ter que se preocupar em car
recalculando pesos e comprando as 65 ações que o compõem.

5.3 Análise técnica: utilizando o histórico visual do preço


A favorita dos chamados traders técnicos, essa forma de análise é também a
mais comumente encontrada e a mais acessível ao público, em virtude do farto
material encontrado na internet.
Enquanto a análise fundamentalista demanda um estudo detalhado das
condições nanceiras, contábeis, mercadológicas etc. de uma empresa ou setor,
e a análise quantitativa exige um conhecimento de matemática superior
(estatística ou econometria), a chamada análise técnica atrai o público por sua
simplicidade, seu fácil aprendizado e apelo visual.
Para darmos um exemplo, tente extrair algum signi cado da série temporal
(período diário, agosto a outubro de 2010) do Ibovespa futuro (Tabela 5.1):
Tabela 5.1 – Ibovespa futuro
Ano Mês Dia Abertura Máxima Mínima Fechamento
2010 8 4 70510 71250 70148 70992
2010 8 5 71069 71225 70557 71225
2010 8 6 71328 71328 70220 70779
2010 8 9 71038 71178 70241 70246
2010 8 10 69848 70055 69480 69822
2010 8 11 68947 69071 68067 68088
2010 8 12 68000 68471 67601 68305
2010 8 13 68119 69019 68057 68440
2010 8 16 68155 69294 68119 69227
2010 8 17 69615 70189 69361 70003
2010 8 18 69708 69942 69158 69769
2010 8 19 69743 69835 68833 68945
2010 8 20 68751 68970 68324 68874
2010 8 23 69204 69321 67902 67927
2010 8 24 67408 67581 66874 67200
2010 8 25 66971 67103 65969 66635
2010 8 26 66839 67108 65378 65434
2010 8 27 65572 67474 65572 67403
2010 8 30 67347 67347 65969 66035
2010 8 31 65475 67032 65475 66884
2010 9 1 67510 69026 67342 69006
2010 9 2 69077 69087 68156 68517
2010 9 3 68487 69545 68141 68182
2010 9 6 68578 68904 68065 68380
2010 9 8 67815 68151 67714 68151
2010 9 9 68263 68563 67998 68197
2010 9 10 68375 68619 68187 68619
2010 9 13 69392 69896 69026 69759
2010 9 14 69626 69952 69255 69413
2010 9 15 69291 69820 68741 69779
2010 9 16 69494 69647 69143 69377
2010 9 17 69555 69601 68609 68640
2010 9 20 68914 69962 68640 69911
2010 9 21 69901 69901 69108 69352
2010 9 22 69087 70227 68965 70196
2010 9 23 69647 71316 69515 70395
2010 9 24 71224 71499 69647 70044
2010 9 27 70206 70613 69555 70364
2010 9 28 70359 71107 70003 70924
2010 9 29 70939 71204 70476 70909
2010 9 30 70736 71422 70532 70847
2010 10 1 71214 71926 70644 71829
2010 10 4 71529 72084 71346 71738
2010 10 5 72018 72750 71941 72715
2010 10 6 72872 72994 71677 71885
2010 10 7 71987 72308 70552 71254
2010 10 8 70919 72170 70766 72068
2010 10 11 72048 72425 72043 72130
2010 10 13 72890 73320 72610 73050
2010 10 14 73180 73450 72445 72940
2010 10 15 73095 73540 72540 73150
2010 10 18 72875 73040 72490 72660
2010 10 19 72150 72150 70640 70690
2010 10 20 71035 71840 70850 71490
2010 10 21 71725 71980 69920 71050
2010 10 22 71050 71250 69715 70390
2010 10 25 70800 71145 70320 70600
2010 10 26 70350 71830 70050 71715
2010 10 27 71280 71830 70980 71350
2010 10 28 71670 72325 71070 71200
2010 10 29 71050 71730 71050 71550
Se você, num primeiro momento, achou difícil ou contraintuitivo entender
essa série de números, não que preocupado: você não está sozinho. Poucas
pessoas têm um raciocínio puramente matemático, no qual uma série de
números expressa imediatamente as relações que contém.
A grande maioria das pessoas tende a ser mais visual. Para entender o que isso
signi ca, observe a mesma série temporal da tabela 5.1 traduzida em forma de
grá co (Figura 5.4), no qual cada barra desenhada é uma das linhas acima ou
dia de negociação.
O resultado é que imediatamente compreendemos o que aconteceu: em
agosto, o preço do índice caiu durante o mês todo (observe como a última
barra de agosto está bem abaixo da primeira); em setembro, o preço subiu
durante todo o mês (aqui é o contrário: a última barra do mês está posicionada
acima da primeira) e; em outubro, o preço oscilou para cima e para baixo, mas
não saiu do lugar, permanecendo lateral (observe como a última barra está no
mesmo nível de preço da primeira do mês).
Figura 5.4 – Ibovespa futuro – grá co.
Em 1948, John Magee lançou o livro de referência Technical analysis of stock
trends, a chamada “Bíblia” da análise técnica. Praticamente todos os livros de
análise técnica que se seguiram constituíam-se de reapresentações, revisões e
comentários dessa obra.
Nele, Magee de ne diversos parâmetros de avaliação do mercado, de acordo
com a análise técnica. O primeiro ponto é a chamada teoria de Dow, que
estabelece que o mercado movimenta-se em tendências ou regimes prolongados
em que o preço se desloca de forma simétrica.
Para ilustrar o conceito, a gura 5.5 é o grá co diário do índice futuro, com
indicação de períodos de queda, mercado lateral e de alta. Enquanto uma
tendência de alta (linha ascendente à direita, no grá co) seria uma série de
preços com topos e fundos ascendentes, a tendência de baixa (linha
descendente à esquerda) seria o inverso: uma série de topos e fundos
descendentes. A tendência lateral (retângulo) ocorreria quando o mercado faz
topos e fundos numa perspectiva horizontal:

Figura 5.5 – Grá co diário do índice futuro.


John Magee descreveu também padrões de preço (as chamadas guras de
análise técnica) que, segundo ele, estariam por trás de importantes movimentos
do mercado. Eles atendem por nomes bastante peculiares: pivô de alta, pivô de
baixa, ombro-cabeça-ombro (não esquecendo o ombro-cabeça-ombro-
invertido!), triângulo (com suas variações ascendente e descendente), cunha,
bandeira (e a menorzinha, chamada âmula) etc. Alguns exemplos de guras
( âmula, ombro-cabeça-ombro e pivô de alta) estão ilustrados na gura 5.6.
Figura 5.6 – Figuras padrão da análise técnica.

5.3.1 “La media è mobile...”


Possivelmente, a primeira ferramenta que um analista técnico aprende a utilizar
é a média móvel. De fácil compreensão e manejo, elas proporcionam ao trader
iniciante muitas possibilidades de uso. Basicamente, a média móvel é um
indicador derivado do próprio preço, no qual a média dos preços de certo
período (escolhido pelo trader) é desenhada no grá co para proporcionar
comparação quanto à posição do preço atual em relação ao seu histórico
recente. Observe o grá co da gura 5.7 somente com os preços (acima, na
gura) e depois observe o mesmo grá co com uma média móvel (abaixo, na
gura). Perceba a diferença entre os dois:

Figura 5.7 – Ibovespa futuro com e sem média móvel aritmética de 15 períodos.
O que se observa é que imediatamente os preços caem em duas categorias:
acima da média móvel e abaixo dela. A primeira conclusão disponível é a de
que:
1. Os preços permanecem em um movimento ascendente ou de valorização
enquanto estiverem acima da média móvel;
2. Os preços permanecem em movimento descendente ou de desvalorização
enquanto permanecerem abaixo da média móvel.
O analista técnico iniciante logo imagina que, para aproveitar a valorização
dos preços e evitar ser pego por sua desvalorização, bastaria comprar quando o
preço casse acima da média móvel e vender quando ele caísse abaixo dela.
(Ah, o poder!)
E ele começa a fazer justamente isso, sem nem mesmo testar essa estratégia
nos períodos anteriores, porque a lógica é evidente.
Então, os problemas começam... Ele faz alguns trades muito bons, mas, em
seguida, o mercado entra em um novo ciclo e as próximas operações começam
a dar errado, levando embora o lucro inicial. Ele começa a ser pego em
movimentos de mercado nos quais a entrada e a saída – baseadas na média
móvel – passam a gerar um stop atrás do outro, pois a entrada acima dela e
saída abaixo passam a gerar rendimento negativo. Na gura 5.8, os retângulos
representam momentos em que operar com a média móvel levaria a entradas e
saídas malsucedidas em sequência.

Figura 5.8 – Entradas e saídas usando a média móvel.


Nesse momento, o técnico começa a considerar que talvez fosse melhor fazer
um estudo histórico do desempenho dessa média móvel.
Ele logo descobre que essa periodicidade não funciona em toda a série de
preços: em certos momentos, a média não proporcionava bons trades porque
sua periodicidade não estava adequada ao momento. Era preciso ajustar uma
periodicidade diferente para captar o movimento daquela ocasião.
Lá vai o técnico ajustar a média móvel e testá-la no período em que teve
problemas com a média original. Em vez da periodicidade de 15, passa a usar a
de 5, mais rápida. O resultado se vê no grá co da gura 5.9: entradas e saídas
mais justas ou rápidas em razão do uso de uma média móvel com
periodicidade menor (cinco períodos).

Figura 5.9 – Entradas e saídas mais justas ou rápidas.


Agora, sim! Bastava uma média mais curta para entrar e sair das operações
mais agressivamente e evitar ser mastigado pelo movimento lateral do
mercado...
O técnico ca imensamente feliz com sua capacidade de adaptação e desfruta
vários trades bem-sucedidos em sequência.
Até que algo impensável acontece: a mesma média móvel que permitiu a ele
se adaptar tão bem ao mercado, agora, gera o seguinte problema – ele sai da
operação muito cedo, no zero a zero ou até com prejuízo, justamente em trades
que seriam mais longos, com possibilidade de grande lucro. A gura 5.10
mostra como o uso da média mais curta gera mais entradas e saídas e deixa o
trader de fora dos movimentos mais longos.
Figura 5.10 – O uso da média mais curta.
O que percebemos aqui é que, após a compra em março, a melhor política
seria a de segurar rme, até o nal de junho. No entanto, o uso de uma média
móvel mais curta, gerando uma abordagem mais agressiva, fez com que
houvesse diversas operações em que a saída estava muito próxima da entrada,
em termos de tempo, e com valor abaixo do valor da entrada, gerando prejuízo.
O técnico se vê aqui diante de um novo problema de otimização da estratégia
de médias móveis, de modo que volta ao quadro-negro, por assim dizer, para
formular uma estratégia mais adequada.
Então ele descobre que o verdadeiro modo de operar com médias móveis é
usar a combinação de duas (ou mais), para criar um ltro adicional, conforme
podemos ver no exemplo da gura 5.11:
Figura 5.11 – Grá co com o uso de duas médias móveis (5 e 30 períodos).
Novamente, o técnico ca surpreso com sua capacidade de raciocínio e
adaptação, e inicia uma busca frenética pela combinação ideal de médias
móveis para compor o seu sistema:
1. Quantas ele deve utilizar?
2. Duas são su cientes ou seriam necessárias mais?
3. Qual a periodicidade ideal para cada uma?
4. Elas devem ser aritméticas, exponenciais, com peso?
5. Deslocadas ou não deslocadas?
6. Quais devem ser as regras de entrada e saída?
7. E quando as médias estiverem em uma con guração “X” e o preço realizar
um movimento acima ou abaixo?
8. O preço em termos absolutos ou o preço de fechamento do dia?
9. E se a entrada e a saída devessem ser ditadas pelo cruzamento das médias?
10. Usa-se, nesse caso, o cruzamento “puro” ou vinculado a algum padrão de
preço?
11. De novo, preço absoluto ou preço de fechamento do dia?
O que o analista técnico terá di culdade em perceber é que existem in nitas
combinações possíveis e que o santo graal estará sempre na próxima combinação
– jamais ao alcance dele. Mas esse, para ele, é o aspecto positivo.
O aspecto negativo é descobrir que o uso de médias móveis simplesmente
não funciona...
Na verdade, já descobriram isso: em 1969, Larry Williams preparou um
estudo para o seu newsletter “ e Williams reports”, sobre trading utilizando
médias móveis. Seus resultados, na mesma linha dos produzidos pela
Universidade de Chicago, demonstraram ser impossível fazer dinheiro
operando cruzamento de médias móveis.
Em fevereiro de 1979, foi a vez de o banco de investimentos Merrill Lynch
realizar um estudo extenso sobre médias móveis, bem como seu derivado, o
chamado canal de preços. Além de estudar médias móveis simples
(aritméticas), eles estudaram as exponenciais, com peso, bem como
cruzamento de médias. Em um dos estudos, foi analisado o cruzamento da
média de três períodos contra a de 26. O resultado pode ser visualizado na
tabela 5.2 e é bastante impressionante: lucro em todas as commodities testadas.
Tabela 5.2 – Resultado da pesquisa
Resultado
Commodity Número de Trades Número de Trades Positivos
(em dólares)
Prata 100,790.00 661 262
Soja 286,440.00 311 148
Porco 13,124.00 226 100
Gado 147,540.00 792 337
Porém, utilizando os mesmos parâmetros, o resultado no período seguinte foi
decepcionante, com prejuízo em todas elas (vide tabela 5.3).
Tabela 5.3 – Resultado da pesquisa
Commodity Resultado Número de Trades Número de Trades Positivos
(em dólares)
Prata -7,800.00 173 88
Soja -2,300.00 119 43
Porco -760 78 42
Gado -230 18 11
No Brasil, vários instrutores de análise técnica despejam em seus alunos a
proposição de que o uso de médias móveis leva a resultados lucrativos. Se esse
for o seu caso, sugerimos discutir de modo mais aprofundado esses tópicos
com seu instrutor antes de colocar seu capital em risco. Quanto dinheiro seu
instrutor lucrou nos últimos três meses utilizando para si tais métodos? Qual
foi seu desempenho no último ano? Ou, ainda, proponha pagar pelo curso
com uma porcentagem do lucro que você obtiver na utilização do método...
Niederho er coloca uma pedra sobre o assunto:
“Sem mencionar que é extremamente espúrio e perigoso para a sua carteira ver
ciclos em médias móveis. Isso é devido ao Efeito Slutsky-Yule, uma consequência
do retorno à média, criando falsos ciclos.”
O e Oxford dictionary of statistical terms de ne o Efeito Slutsky-Yule da
seguinte forma:
“Um efeito na geração de médias em séries aleatórias estudado de forma
independente por Slutsky e por Yule. Se uma média móvel é aplicada a tais séries,
elas contêm ondulações de forma aparentemente sistemática.”
Para sermos exatos, análise técnica tem muito mais elementos do que vimos
até aqui. Suas teorias se multiplicam: teoria das ondas de Elliot; ângulos de
Gann; retrações e extensões de Fibonacci; Fibonacci no tempo; padrão xícara;
fundos arredondados; topos arredondados; Andrew’s pitchfork; bandas de
Bollinger; Keltner channels; oscilador estocástico; oscilador índice de força
relativa; suas rami cações são legião.

5.3.2 Um duro golpe


Não saiu nos noticiários, mas o que se vê hoje em dia em livros, publicações
diversas, websites, cursos e palestras com o nome de “análise técnica” levou um
golpe forte após Larry Williams – em seu livro Long term secrets to short-term
trading – ter apresentado uma falha no raciocínio de que padrões gra stas
indicam relações de oferta e demanda.
Relembrando alguns conceitos básicos de análise técnica, temos:
1. A teoria de que o preço desconta tudo, portanto o preço (ou melhor, seu
grá co) seria a única ferramenta realmente indispensável ao trader;
2. O preço deixa padrões recorrentes impressos no grá co, geralmente com
forma de guras geométricas ou simétricas (triângulo, cunha, âmula,
ombro-cabeça-ombro);
3. Esses padrões indicam oferta e demanda, sendo, portanto, preditivos ou
possibilitando estimar mais ou menos precisamente o movimento imediato
futuro dos preços.
Os dois primeiros conceitos são claros. Concordamos que os preços são a
verdade nal do mercado (porque são o somatório de todas as interações
humanas que ocorrem nele) e, também, deixam no grá co padrões recorrentes,
passíveis de observação.
O que Larry Williams apresentou é que os padrões de preço não são
necessariamente indicativos de oferta e demanda. Reconstituindo sua linha de
raciocínio, se observarmos o grá co da gura 5.12, vemos um belo exemplar
do padrão ombro-cabeça-ombro.
Figura 5.12 – Grá co gerando um padrão ombro-cabeça-ombro.5
Mas tal grá co (Figura 5.12) não é de uma ação... É do jogo de cara ou coroa
(série aleatória)...
Já na gura 5.13, temos um ombro-cabeça-ombro logo no início (à
esquerda), seguido por um movimento de queda, uma reversão (martelo),
seguida de uma tendência de alta, uma âmula, um rompimento para cima e
uma reversão em “M” gerando queda, novamente um martelo causando
reversão e um movimento de congestão lateral.
Esse grá co (Figura 5.13) pertence a alguma ação ou índice de mercado?
Não... É o grá co da temperatura diária (máxima e mínima diária) da cidade
de São Francisco, na Califórnia.

Figura 5.13 – Grá co gerando diversos padrões de análise técnica.6


Essa é uma constatação e tanto! Signi ca que, como esses padrões são
encontrados também em séries aleatórias, não sujeitas às leis de oferta e
demanda, não podem representar necessariamente condições preditivas de
preço.
Sim, você está entendendo corretamente: quando o preço da ação sobe após
um triângulo, pode ter sido pura coincidência...
Mas a mente humana é hábil em defender suas crenças – nas ocorrências em
que o padrão falha (no exemplo, o preço caindo após a aparição de um
triângulo), um gra sta pode rapidamente vestir um manto de sabedoria da
humildade e dizer: “Mas não existe nada que funcione sempre!”
A questão não é funcionar ou não sempre. Existem relações reais, preditivas,
que não funcionam todas as vezes. Isso, além de um fato, é uma obviedade.
Os padrões grá cos, como demonstrado por Larry Williams, não indicam
necessariamente oferta e demanda. Portanto, qualquer con rmação deles pelo
movimento seguinte de preço é enviesada. Entendemos que as a rmações
anteriores são possivelmente contraintuitivas, especialmente para quem já viu
os padrões funcionarem.
Entendemos também que é difícil acreditar em algo que, à primeira vista, é
contraintuitivo, assim como também é difícil não acreditar em algo que parece
fazer sentido. Isso ocorre porque nossa mente está con gurada, por assim dizer,
para encontrar signi cado mesmo onde ele não existe. Assim como,
parafraseando Spinoza, a natureza detesta o vácuo, também nossa mente
detesta a falta de signi cado ou o vácuo conceitual.
Para darmos um exemplo da capacidade humana de encontrar signi cado
onde não existe nenhum, chamamos à roda um teste psicológico bastante
conhecido: o teste de Rorschach.
O teste de Rorschach é um teste projetivo. Ou seja, é dada ao paciente uma
série de desenhos (mais parecem manchas de tinta), sem signi cado algum, e
pede-se que ele os interprete. A gura 5.14 é um exemplo de prancha utilizada
nesse teste.
Figura 5.14 – Exemplo de prancha utilizada no teste de Rorschach.
Dado que as manchas não têm signi cado, qualquer interpretação
necessariamente manifesta conteúdos psíquicos e cognitivos do próprio
paciente. Conforme a Wikipédia7:
“O teste de Rorschach, como todos os testes projetivos, baseia-se na chamada
hipótese projetiva. De acordo com essa hipótese, a pessoa a ser testada, ao procurar
organizar uma informação ambígua (ou seja, sem um signi cado claro, como as
pranchas do teste de Rorschach), projeta aspectos de sua própria personalidade.”
No caso da análise de padrões grá cos, não iríamos tão longe a ponto de
dizer que o gra sta projeta aspectos de sua própria personalidade, porém,
certamente é induzido a crer que este ou aquele padrão signi cam indicação de
compra ou de venda, especialmente se essa indicação estiver alinhada com sua
própria expectativa ou seu desejo.
Em outras palavras, se o indivíduo quer comprar uma ação, ele poderá ltrar
as informações do mercado de modo a con rmarem seu desejo de compra. Da
mesma forma, se o indivíduo, por algum motivo, estiver apreensivo ou com
medo – e posicionado na compra – e, portanto, desejando vender, ele
possivelmente ltrará os dados fornecidos pelo mercado para justi car seu
anseio de sair do trade.
Mas, e quando os padrões funcionam? Nassim Nicholas Taleb alerta: “Não dê
para as pessoas um mapa errado, porque elas vão usar!”, citando uma anedota em
que um pelotão do exército suíço se vê perdido nos Alpes e, quando nalmente
conseguem chegar à base, alguém os faz ver que o mapa que estavam usando
não era dos Alpes, mas dos Pireneus!
Além disso, tendo se tornado tão universalmente acessível (existem cursos
gratuitos de análise técnica na internet), a análise técnica pode ser utilizada
como instrumento de fading por parte dos grandes players.
Fading signi ca operar contra o sinal que se apresenta. É o mesmo conceito
de fazer o oposto do instinto de manada. Dando um exemplo, quando um
padrão muito claro de análise técnica aparece no grá co, algum player pode
utilizá-lo para operar contra o público.
Existem momentos em que a oportunidade de fading é simplesmente
perfeita, porém não é possível discernir entre um fading real e uma operação
normal de um player (ou um conjunto de operações de seus clientes) que
coincidiu com um fading. Para exempli car esse aspecto, vamos analisar um
caso de operação contrária a um sinal, nesse caso, de VALE5 (Vale do Rio
Doce ou, simplesmente, Vale).
No período de 12 a 18 de agosto de 2010, o banco de investimentos BTG
Pactual não havia se posicionado em VALE5 o su ciente para constar na
análise intitulada “saldo” do Times and Trades (Figura 5.15).
Figura 5.15 – Saldo das transações em VALE5. Fonte: Pro tChart.
No dia seguinte, conforme podemos veri car na gura 5.16, o BTG Pactual
aparece no saldo como vendedor.

Figura 5.16 – Saldo das transações em VALE5. Fonte: Pro tChart.


Do ponto de vista da análise técnica, os ângulos desenhados no grá co
(Figura 5.16, à direita) indicam a presença de um fundo (primeiro ângulo, à
esquerda, abaixo), um topo (segundo ângulo, à esquerda, acima), e um novo
fundo (terceiro ângulo desenhado, à direita).
Essa combinação fundo-topo-novo fundo (acima do fundo anterior)
con gura o setup “pivô de alta”, conforme exemplo na gura 5.17.

Figura 5.17 – Relembrando o sinal “pivô de alta”.


À direita, na gura 5.18, vemos a linha do topo anterior sendo rompida pela
atividade do preço no dia, caracterizando, assim, um rompimento do topo, no
intraday, ou seja, um sinal de compra para analistas técnicos, embora o BTG
Pactual tenha se posicionado na venda nesse dia.
Figura 5.18 – Saldo das transações em VALE5. Fonte: Pro tChart.
O que seguiu foi uma queda do mercado nos dias seguintes (de 19 a 31 de
agosto). Durante esse período, o BTG Pactual acumulou, conforme o saldo no
Times and Trades, uma posição de venda da ordem de 2.950.600 de ações
(Figura 5.19).

Figura 5.19 – Saldo das transações em VALE5 (19 a 31 de agosto de 2010). Fonte:
Pro tChart.
Quando, em 1º de setembro, a ação começa a se recuperar (iniciando uma
alta), o BTG Pactual já não gurava mais no saldo do Times and Trades
(Figura 5.20).

Figura 5.20 – Saldo das transações em VALE5 (19 a 31 de agosto de 2010). Fonte:
Pro tChart.
Entendemos que um modo de zerar um saldo negativo (ou de venda) é
realizando a operação contrária, nesse caso, uma compra. E é exatamente isso
que observamos quando ajustamos o foco do Times and Trades para o dia 1º
de setembro, exclusivamente (ilustrado na gura 5.21). O BTG Pactual aparece
como o maior comprador do dia.
Figura 5.21 – Saldo das transações em VALE5 (1º de setembro de 2010). Fonte: Pro tChart.
Embora para os traders mais ousados possa parecer que o BTG Pactual
deveria ter recomprado a posição mais embaixo (supondo-se que se tratasse
realmente das duas pontas de um mesmo trade, e não mera coincidência), ou
nos últimos dias de agosto, em vez de tê-la recomprado mais acima,
praticamente no meio da distância entre o início e o m da queda (que ao todo
durou nove dias), convém lembrar que para operar em volume, como diz Paul
Tudor Jones, “só se consegue sair onde o mercado permite, não onde se quer”.
De qualquer modo, parece ter sido uma operação bastante lucrativa. E contra
um pivô de alta...

5.3.3 Operando sem sinal?


Além do discutido até o momento, vale a pena destacar que muitos players
operam quantias signi cativas mesmo sem nenhum tipo de sinal da análise
técnica. O exemplo a seguir ilustra esse aspecto.
O contexto: reta nal de 2008, ano tumultuado por severos prejuízos aos
investidores, com quedas de preço expressivas em poucos meses. PETR4 estava
fazendo a nova mínima do ano (Figura 5.22).
Figura 5.22 – PETR4 em queda, fazendo a mínima do ano até outubro (2008). Fonte:
Pro tChart.
Logo em seguida, ela retoma o movimento de alta, subindo espetacularmente
e valorizando-se 42% em apenas cinco dias! Essa subida forte pode ser
visualizada na gura 5.23.

Figura 5.23 – PETR4 em subida forte (42%), após a mínima do ano (2008). Fonte:
Pro tChart.
Mas o timing de comprar nesse fundo não era visível com os setups
disponíveis na análise técnica.
O dia 27 de outubro de 2008 foi um dia de forte queda. O banco Merrill
Lynch começou a comprar PETR4 (168.700 ações a um preço médio de R$
16,50 signi ca uma posição de aproximadamente 2,78 milhões de reais).
No dia seguinte, sua posição se acumulou ainda mais. A gura 5.24 mostra o
saldo acumulado de Merrill Lynch em PETR4 no período de 27 a 28 de
outubro (2008).
Aqui vemos (Figura 5.24, à esquerda) que a posição de compra se elevou para
545 mil ações... A um preço médio de R$ 16,50, equivale a aproximadamente
9 milhões de reais. Para resumir a história, vamos avançar alguns dias, até o
nal do mês de outubro (Figura 5.25).

Figura 5.24 – Saldo acumulado de Merrill Lynch em PETR4. Fonte: Pro tChart.
Figura 5.25 – Saldo acumulado de Merrill Lynch em PETR4. Fonte: Pro tChart.
A posição do Merrill Lynch aumentou para 2.628.000 ações, o equivalente a
46,6 milhões de reais a um preço médio de R$ 18,50. Nos dias seguintes,
porém (de 3 a 11 de novembro), Merril Lynch vende 2.491.000 ações (Figura
5.26), se desfazendo de quase toda a sua posição!

Figura 5.26 – Saldo acumulado de Merrill Lynch em PETR4. Fonte: Pro tChart.
Certamente, deveria haver um motivo para que Merrill Lynch comprasse
uma posição tamanha naquele ponto que ainda era de queda livre. Embora
tenhamos algumas hipóteses a respeito, nenhuma delas inclui o uso de análise
técnica, em razão da ausência de qualquer sinal.
Não encontramos na teoria clássica de análise técnica nem nos seus diversos
indicadores nenhuma previsão de que o momento citado seria propício para
uma virada do mercado (além disso, a alta da Petrobras coincidiu com a de
outras ações também).
Vale sempre re etir nas sábias palavras de Niederho er:
“Você acha que o mercado é tão bonzinho a ponto de lhe dar dinheiro porque você
sabe desenhar uma linha reta?” – Victor Niederho er, em Practical speculation.

5.4 Análise quantitativa: a matemática dos resultados


A análise quantitativa está bastante em voga atualmente nos altos círculos
nanceiros – geralmente restrita ao departamento de research dos grandes
bancos de investimento, a empresas de asset management e a investidores
quali cados que operem com um viés mais cientí co.
Especialmente com a entrada em cena do trading puramente matemático,
cuja expressão mais recente e famosa é o high-frequency trading (trading de
alta frequência, no qual ordens de compra e venda são geradas em
milissegundos), os “quants”, como são chamados os analistas quantitativos,
alçaram voo para postos mais importantes – e maiores salários – no mundo
nanceiro.
Como vimos no capítulo 4, o mercado não é como a maior parte das áreas de
conhecimento. A fama e o reconhecimento em medicina, por exemplo, passam
pelo caminho do aval público: quem faz uma descoberta importante a traz para
o público em congressos especí cos. Em muitos casos, descobertas relevantes
são batizadas com o nome de seus reveladores.
Não no mercado.
Quem descobre uma estratégia, teoria ou metodologia que funcione, gerando
resultados positivos consistentes, procura manter essa descoberta inacessível aos
outros players o maior tempo possível. Fora dos círculos acadêmicos (onde se
encontra o mesmo fenômeno da medicina, no qual os “scholars” gostam de ter
teorias batizadas com seus nomes), ou seja, na prática cotidiana de mercado, os
players tornam realidade as palavras de Ovídio: “Vive bem quem bem se
esconde.”
Por isso é natural que, dentre as formas de análise disponíveis, a quantitativa,
em virtude de seu caráter de vanguarda, seja a mais nebulosa e de difícil acesso
para o público.
No entanto, Victor Niederho er, na década de 1960, revolucionou a análise
de mercado ao utilizar estatística na sua tese de ph.D. em Economia pela
Universidade de Chicago. Como toda novidade, seus esforços não foram bem
recebidos por seus colegas e professores na comunidade acadêmica: ele foi
vaiado durante a apresentação, ameaçado pelos colegas e alguns professores
exigiram que se retratasse. O fato é que ele estava atacando um dos pilares
acadêmicos no momento, qual seja, a teoria de random walk ou passeio
aleatório, defendida pelos economistas como sendo a verdade última do
mercado, que acreditavam ser e ciente. A sua abordagem era, em suas próprias
palavras:
“Baseada em correlações, comovimentos, efeitos não estocásticos e quanti cação de
vieses psicológicos persistentes.”
Se ele foi vaiado na apresentação de sua tese, depois a indústria de
investimentos passou a utilizar cada vez mais o método quantitativo ou
estatístico: “É estranho ver que você foi vaiado por algo que hoje é o mainstream e
tornou-se a base da análise moderna de investimentos.”
Vamos, então, olhar mais de perto essa forma de análise que vem
conquistando cada vez mais espaço no mercado.

5.4.1 Finança quantitativa ou trading quantitativo?


O primeiro ponto a observar é a distinção nem sempre aparente entre nança
quantitativa e trading quantitativo. À primeira vista, os dois termos parecem
ser equivalentes. Mas eles representam linhas distintas de atuação com
nalidades e objetivos particulares.
• Finança quantitativa: É a aplicação da análise estatística para o
desenvolvimento de modelos de mercado (market models), com a
nalidade de produzir alpha ou retorno acima do benchmark. Basicamente,
procura a aplicação prática de teorias e modelos matemáticos no mercado.
• Trading quantitativo: Não está necessariamente vinculado à comprovação
de teorias matemáticas (embora tenha caráter quantitativo), podendo partir
de uma premissa empírica – uma ideia de trading – e a partir daí seguir
para o desenvolvimento de uma estratégia operacional.
De certa forma, a nança quantitativa parte de modelos ou teoremas
matemáticos e econômicos e busca sua aplicabilidade no mercado; enquanto o
trading quantitativo parte de dados empíricos – observação do mercado –,
retirando daí ideias de trading para parametrização e validação estatística.
Dentre as teorias utilizadas pelas nanças quantitativas, temos:
“Análise de portfólio (Modern Portfolio eory, Capital Asset Pricing Model),
hedge, alavancagem, preci cação (de derivativos), teoria de arbitragem,
aplicabilidade da estatística ao mercado, análise de correlação, cointegração, análise
de risco (VaR – Value at Risk), de performance, simulação de Monte Carlo,
modelos econométricos, modelo Blach-Scholes (para opções), distribuição log-
normal, cópula, cálculo estocástico, modelo binomial, yield curve tting etc.” –
Paul Wilmott, em Frequently asked questions in quantitative nance.
Uma lista mais completa dos modelos utilizados em análise quantitativa pode
ser encontrada em: Statistical Models and Methods For Financial Markets, de Tze
Leung Lai e Haipeng Xing.
Apesar da complexidade que o tema alcança (especialmente ao incorporarem-
se modelos econométricos), a nança quantitativa abrange principalmente estas
quatro áreas:
• Gestão de portfólio
• Preci cação de derivativos
• Gestão de risco
• Previsão de volatilidade
Já em trading quantitativo é comum encontrarmos, segundo Robert Pardo,
os seguintes dados: parâmetros matemáticos de trading, regras para entrada,
ltros para essas mesmas regras, estratégias ou regras de saída de operação,
position sizing ou manejo de posição, de nições para aumento ou diminuição
da exposição, medidas de performance e operacionalidade (adequação às
realidades de liquidez do mercado e e cácia da execução de ordens), de nição
objetiva da estratégia operacional, teste preliminar, otimização, testes reais,
avaliação da performance real, medidas para melhoria do sistema, entre outros.
Uma lista mais completa pode ser encontrada em Inside the black box: the
simple truth about quantitative trading, de Rishi K. Narang.
O trading quantitativo pode ser resumido nos seguintes aspectos:
• ESTRATÉGIA
• Desenvolvimento
• Teste de mesa
• Teste em condições reais
• Otimização
• EXECUÇÃO
• Con guração operacional
• Condições de liquidez
• Condições de execução das ordens
Vamos examinar mais de perto cada um desses pontos.
ESTRATÉGIA – Desenvolvimento:
Todo o esforço do trader quantitativo gira em torno do desenvolvimento de
uma estratégia sólida. O primeiro passo é de nir o nicho que ele pretende
abordar e a partir daí buscar uma ideia válida de como aproveitar as
oportunidades desse nicho.
De modo geral, as oportunidades de trading são identi cadas por:
1. Natureza:
a. Direcional
b. Não direcional
2. Tempo:
a. Day trading (início e término no mesmo dia)
b. Swing trading ou multi-day trading (início e término em dias diferentes)
A escolha de uma modalidade especí ca dependerá do per l do trader, além
da otimização das oportunidades que a classe de ativo escolhida (ações, opções
ou contratos futuros) apresentar.
• Trade “direcional”: Signi ca que o trade necessita que o preço se mova em
uma direção especí ca (para cima ou para baixo), para que a operação
funcione. Nesse sentido, uma operação de compra precisa de que o preço se
valorize para produzir lucro, assim como uma operação de venda conta
com a desvalorização do preço para dar resultado. Exemplo: trades de
compra ou de venda a descoberto.
• Trade “não direcional”: Nesse caso, a direção nal do mercado não
interessa, importando apenas a relação observada pelo spread. Uma
abordagem não direcional só é possível com a utilização de dois ou mais
ativos de uma mesma classe ou de classes diferentes, tendo-se um operando
contra o outro. Exemplos: pairs trading, hedge, spread trading (pairs
trading com um único ativo, mas utilizando vencimentos diferentes),
compra ou venda de volatilidade, arbitragem etc.
• Swing trading: Busca aproveitar movimentos de alguns dias no mercado, o
que implica posição overnight, aumentando o risco da operação em virtude
da possibilidade de aberturas contrárias (quando algum dos dias seguintes
tem seu preço de abertura contra a posição).
• Day trading: Operações que duram de minutos a horas, aproveitando
variações menores de preço. Pode ser day trade clássico ou direcional, como
pode ser high-frequency trading, explorando aspectos não direcionais como
market making.
Dentro dessas quatro possibilidades principais, o desenvolvimento de
estratégias se torna uma questão de identi car oportunidades que justi quem a
alocação de recursos e apresentem possibilidade de lucro.
ESTRATÉGIA – Teste de mesa
Após escolher o nicho que vai explorar e de nir a ideia central por trás da
estratégia, a primeira providência que o trader quantitativo toma é fazer um
backtesting ou “teste de mesa” para ltrar a ideia preliminarmente. Se a
estratégia não passa pelo teste inicial, é um sinal de que precisa ser re nada ou
alterada antes que se possa passar para um teste em campo ou em condições
reais. Eis algumas ferramentas que podem ser utilizadas para o teste de mesa:
a. Análise percentual do histórico de resultados: Veri car quantas vezes a
estratégia geraria operações com base na série temporal disponível para
backtesting, identi cando o número de ocorrências com resultado positivo
versus o número de resultados negativos, observando também a pontuação
acumulada pela série de trades teóricos. Se a pontuação for negativa,
interromper o processo e rever a ideia central da estratégia ou seus
parâmetros de entrada/saída.
b. Teste t8: É uma forma de determinar se os resultados encontrados na
análise percentual poderiam ocorrer por chance. Se for esse o caso, volta-se
a rever a ideia central. Se a amostragem passar no teste t, pode-se passar
para a etapa seguinte.
c. Optimal F: Desenvolvido por Ralph Vince, autor de Portfolio management
formulas, e mathematics of money management, e leverage space trading
model, o conceito de Optimal F (o “F” vem de “fraction”) busca determinar
qual a fração ideal do seu capital que deveria ser colocada em risco –
colocar no trade é colocar em risco –, de acordo com os parâmetros da sua
estratégia, de modo a otimizar a lucratividade com o máximo possível de
gerenciamento de risco. Optimal F seria o ponto ótimo de alavancagem,
abaixo do qual você estaria subaproveitando o poder de sua estratégia e
acima do qual você estaria correndo um risco maior do que o necessário.
ESTRATÉGIA – Teste em condições reais
Apesar de ter realizado a análise em teoria, somente um teste em condições
reais poderá validar a estratégia, revelando se os seus parâmetros mostram um
bom desempenho em situações fora da amostragem. De certa forma, o teste de
mesa mostra se a estratégia funcionou no passado, enquanto o teste em
condições reais revela realmente se a ideia central possui consistência e
operacionalidade, considerando as condições de liquidez, a qualidade de
execução de ordens e os custos envolvidos.
ESTRATÉGIA – Otimização
Caso os resultados não sejam satisfatórios, sempre é possível rever a estratégia
em busca do elemento ou dos elementos que possam estar causando uma
underperformance. Uma vez identi cados, é possível alterar a estratégia para
então submetê-la novamente aos testes com a função de validá-la.
EXECUÇÃO – Con guração operacional
Muitas vezes a teoria por trás da estratégia, ou sua ideia central, é válida, ou
seja, as relações que ela propunha identi car se mostram reais – mas para se
tornar um trading system ela precisa ainda ser testada quanto a sua
possibilidade de execução de acordo com os parâmetros propostos.
EXECUÇÃO – Condições de liquidez
Liquidez é um fator essencial para a execução de uma estratégia. Em muitos
casos, abre-se mão de um trading system que, em teoria, apresenta resultados
superiores – mas que na prática é inoperável em razão da falta de liquidez – em
prol de outro com resultados menos atraentes, porém com maior robustez em
termos de possibilidade de alocação de capital.
EXECUÇÃO – Condições de execução das ordens
“Slippage” é o termo utilizado para indicar a diferença entre o preço que a
estratégia sugeria para a entrada ou saída da operação e o preço efetivamente
executado, dadas as condições do mercado. Essa diferença pode variar em
função da liquidez, da volatilidade, do spread entre oferta de compra e a oferta
de venda, do tamanho da exposição ou das condições adversas durante o
pregão.

5.4.2 Você quer ser um quant?


Quando Wall Street passou a contratar matemáticos, estatísticos e... físicos, em
vez dos tradicionais economistas e administradores de empresas para cargos de
estrategistas, algo estava mudando.
Existem ondas ou fenômenos que surgem e desaparecem nos Estados Unidos
e não chegam ao mesmo tempo no Brasil. Por exemplo, o cargo de “quant” ou
“quantitative researcher” não é muito comum por aqui. Isso pode signi car
uma vantagem para os “quants” brasileiros que se adiantarem em procurar
nossas instituições. Atualmente, os maiores mercados para “quants” são: Nova
Iorque, Londres e Singapura9.
No livro Heard on the street – quantitative questions from Wall Street job
interviewers, o autor Timothy Falcon Crack revela uma série de questões
obrigatórias para as quais você deveria estar preparado ao procurar uma
entrevista de emprego como “quant”, indo desde os testes matemáticos,
lógicos, probabilísticos, estatísticos até perguntas sobre a natureza do mercado,
asset classes etc.

5.4.3 Modelos fora de controle


Mas há também outro lado da análise quantitativa ao qual devemos estar
atentos, ainda que seja pela advertência que Mark Twain gostava de fazer:
“Existem mentiras, mentiras deslavadas, e estatística.”
Sim, é possível mentir usando estatística, mas também é possível enganar-se
por meio de correlações espúrias e outras falhas no procedimento de análise.
Em seu livro Fooled by randomness (Iludidos pelo acaso), Nassim Nicholas
Taleb nos adverte quanto aos perigos de se usar os métodos quantitativos sem
uma compreensão profunda:
a. De suas limitações;
b. Do tema ao quais as ferramentas de análise serão aplicadas.
Taleb descreve uma inferência estatística malsucedida – mas bem-humorada
–, na qual declara que o presidente Bush era “imortal, com um alto grau de
signi cância estatística”, pois na série temporal analisada (o número de dias de
sua vida), “ele não havia morrido nem uma vez”!
Por que é evidente, nesse caso, o erro da conclusão baseada em estatística?
Porque sabemos que todos nós somos mortais, e se alguém não morreu ainda,
morrerá certamente algum dia. Mas observe: essa informação – de que todos
nós morreremos um dia – não estava contida na série temporal analisada.
O fato é que existem relações menos evidentes, especialmente quando se está
analisando de forma mais abstrata, e é bem possível que um erro de análise
como esse ocorra sem que percebamos. Algumas vezes, o dano por uma análise
mal dirigida gera prejuízo apenas para o trader que a concebeu. Em casos mais
graves, o equívoco em uma estratégia ou em um modelo gera um efeito cascata
e vem a impactar em todo o mercado.
Isso pode ocorrer porque, como os algoritmos interagem uns com os outros –
ao marcar sua presença, entre outras coisas, no livro de ofertas do ativo operado
e porque buscam todos no mercado os inputs necessários à sua operação, tais
como: último negócio, spread entre ordem de compra e de venda, market
depth ou liquidez, volatilidade do movimento recente etc. –, pode ocorrer que,
se um deles ca “desregulado” ou não se adapta às condições atuais do
mercado, sua atuação “desregulada” pode provocar instantaneamente uma
corrida ou disparada por parte dos outros algoritmos. Por exemplo, um
movimento vende-vende-vende, que pode ocasionar um crash ou uma queda
forte do preço de um ativo. Se você possui volume operacional su ciente para
mexer com o mercado, seu algoritmo pode afetar muito mais do que seu
próprio retorno nanceiro.
Como exemplo, temos o crash da Bolsa norte-americana, em outubro de
1987 (com os programas de trading automatizado ainda em sua infância), o
ash-crash ocorrido em maio de 2010 (que iniciou na Bolsa norte-americana e
se estendeu por todos os mercados, em menos de um minuto) e o objeto
mesmo da crise imobiliária e de crédito norte-americanas, o modelo de
preci cação de derivativos exóticos das obrigações de crédito colateral
(synthetic collateral debt obligations). A gura 5.27 ilustra o crash de 1987,
supostamente motivado por programas automáticos de trading que entraram
em modo de “venda”, sem limite. Na gura 5.28, destacamos a crise do
subprime, motivada principalmente por erros no sistema de preci cação de
derivativos exóticos, vinculados a obrigações de hipotecas. Já na gura 5.29,
podemos observar o ash-crash de 2010 com o Ibovespa futuro, re etindo o
movimento originado nos índices Dow Jones e S&P 500.
Uma vez que o trader esteja atento à possibilidade de erro oculto em sua
estratégia quantitativa, ele pode seguir com suas análises e modelagens sabendo
de que dispõe de um edge muito importante em relação aos outros players.
Desde que seu sistema de risco preveja a necessidade de proteção contra riscos
sistêmicos (como os exemplos anteriores).

Figura 5.27 – Crash de 21 de outubro de 1987.


Figura 5.28 – Em 2008, estourou a crise do subprime.
A análise quantitativa chama a atenção justamente pelo seu potencial de gerar
resultados, a despeito dos riscos. Vinculada a uma boa teoria de mercado, ela se
torna uma ferramenta poderosa na obtenção de retornos consistentes.

Figura 5.29 – O “ ash-crash” do dia 6 de maio de 2010.


1 http://pages.stern.nyu.edu/~adamodar/. O link para acesso a planilhas com dados sobre empresas
brasileiras é: “Updated data”.
2 Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/959001-crise-faz-gestora-de-recursos-gwi-fechar-fundos-para-
resgates.shtml
3 Fonte: http://www.valor.com.br/ nancas/991646/bny-mellon-autoriza-reabertura-de-fundos-da-gwi
4 O ETF que corresponde ao Ibovespa é o BOVA11.
5 Fonte: Larry Williams, em Long term secrets to short term trading.
6 Fonte: Larry Williams, em Long term secrets to short term trading.
7 http://pt.wikipedia.org/wiki/Teste_de_Rorschach
8 http://en.wikipedia.org/wiki/Student’s_t-test
9 Fonte: Hedge Fund Jobs Digest (http://www.jobsearchdigest.com/hedge_fund_jobs).
CAPÍTULO 6
Palavras nais

Acreditamos ter contribuído para que o leitor não que preso a uma única
forma de ver o mercado e disponha de mais elementos para conduzir sua
atuação como investidor ou trader. Ressaltamos que as opiniões contidas neste
livro são sujeitas à interpretação de cada leitor e não são, em hipótese alguma,
garantia de quaisquer resultados – a Bolsa é um fenômeno muito dinâmico
para que você possa ter lucro utilizando um único exemplo ou conceito. Você é
livre para operar ou investir como quiser, é o seu próprio gestor de carteiras e
capitão do seu barco – uma tarefa estimulante e desa adora, pela qual somente
você será responsável, sempre.
Nosso intento, ao escrever este livro, não foi criar um manual de trading ou
de investimentos, tais como os que se encontram disponíveis no mercado. A
intenção era justamente fazer o caminho inverso: ajudar o leitor a descobrir o
que não fazer na Bolsa, ou melhor, o que evitar e como tirar partido das
armadilhas do caminho.
Entendemos que esse é o passo principal, a partir do qual o resto (a de nição
de uma estratégia de trading ou investimento) é construído. Realmente, não
adianta começar escolhendo uma estratégia, por exemplo, sem ter tido acesso
às falhas que ela apresenta, e sem saber em quais momentos os grandes players
estariam operando contra ela.
Desse modo, cada ponto que abordamos se reveste de importância, pois
procurou exempli car ao leitor o modo como funciona a arena de
investimentos que é o mercado de capitais. E, numa arena, vence quem tem
mais conhecimento, força e habilidades.
Começamos indicando o fato simples, mas muito desconsiderado, de que
para que alguém ganhe na Bolsa, outro tem que perder. Desse modo, como
disse John Carter, em Mastering the trade: “Você não opera ações, você opera
outros traders.” Se um banco de investimentos está no lado contrário da sua
operação, você deveria ter dupla cautela e certi car-se de que realmente está
fazendo o trade certo. Só para garantir.
Observando os bastidores do mercado, cou claro que o interesse por trás das
ações de seus participantes (tanto agentes autônomos como analistas,
departamento de back-o ce etc.) nem sempre é isento de motivação pessoal,
de modo que a Bolsa é um dos ambientes em que o cliente deve primeiro
ponderar o que diz o especialista, e não simplesmente aceitar de imediato.
Na Bolsa, conhecimento vale dinheiro, pois é capaz de produzir dinheiro. No
entanto, ainda existem muitos pseudotraders e investidores que acham que
primeiro deveriam ganhar (bastante) dinheiro para depois procurar um
treinamento ou curso especializado. Transferindo essa mentalidade para outro
contexto – no qual ca evidente o absurdo da ideia –, é como se alguém
quisesse primeiro ganhar muito dinheiro como médico... Para então nanciar
seu estudo em uma faculdade de medicina... As consequências desse tipo de
pensamento ocorrem todos os dias na Bolsa, em casos chocantes como o do
nosso exemplo em que o indivíduo perdeu tudo o que tinha em três dias,
operando opções.
Dado que há uma disputa entre quem ganha e quem perde no mercado, salta
aos olhos a importância de se avaliar a assimetria: quem possui mais
conhecimento, você ou aquele que está no lado contrário da sua operação?
Quem possui melhor equipamento, informações, staying power? Quem é o elo
mais fraco da corrente? Vale a pena fazer esse trade nas condições atuais? Como
vimos, não basta apenas avaliar o grá co e achar que a ação vai subir...
Envolvendo todos esses conceitos, está a necessidade de utilizar uma
metodologia ou estratégia. Por exemplo, seria difícil ter uma abordagem de
investimentos consistente sem estar atento a certas fragilidades do value
investing, e não observar os momentos em que os tubarões o jogam pela janela
e lucram operando contra os demais players – ainda que a teoria estivesse
válida. Na Bolsa, não importa quem está com a razão: importa quem lucra no
processo.
Da mesma forma, é importante observar que padrões de preço muitas vezes
indicam apenas o que ocorreu no passado – pois todo negócio realizado
pertence ao passado – e não necessariamente contêm alguma indicação da
direção futura dos preços.
A necessidade de se avaliar quantitativamente uma ideia também foi
abordada, por ser a pedra fundamental da validação da estratégia, tendo-se
como premissa que o investidor e o trader realmente desejem estabelecer sua
atuação de forma pro ssional, e não como “gamblers”. Em qualquer pro ssão
ou negócio é importante ter procedimentos de avaliação e controle.
Também como foi destacado, observando as informações do livro de ofertas
não é possível discernir entre as operações de uma instituição e as operações de
múltiplos clientes da instituição (incluindo também suas operações
proprietárias) executadas de modo independente e sincronizado. A diferença
entre um conjunto de coincidências e uma ação coordenada e consistente ao
longo de um período de tempo não é algo trivial de ser identi cado. Optamos
por não realizar inferências e deixaremos a cargo do leitor avaliar cada caso e
tirar suas próprias conclusões.
As instituições, empresas e ativos que foram citados nos exemplos deste livro
tiveram apenas efeito didático, tendo sido escolhidos aleatoriamente. Isso
signi ca que não temos qualquer relação de ganho ou interesse pessoal na
citação de quaisquer deles. Com certeza, existem muitos outros exemplos
possíveis que não foram mencionados. Desse modo, ressaltamos que em
nenhum momento tivemos como objetivo recomendar ou deixar de
recomendar instituições, empresas e ativos – mesmo que indiretamente – e
tampouco induzir o leitor em sua escolha ou rejeição.
Esclarecemos que de nenhuma forma quisemos estimulá-lo a operar mais ou
desestimulá-lo para que opere menos. Entendemos que nosso papel é de
fornecer mais informações para seu aprendizado e conhecimento sobre a
dinâmica de investimentos em Bolsa e não de atuar como interferente em seu
per l de risco ou decisões de alocação de recursos. Nossa ideia foi fornecer
elementos su cientes para que você:
• Identi que alguns erros comuns cometidos no mercado;
• Preste atenção a situações-chave em que os grandes players têm
oportunidade de lucrar contra você;
• Busque evitar ter prejuízo nos dois itens anteriores, além de tentar
aproveitá-los para obter lucro;
• Conheça algumas fragilidades das formas de análise existentes, por meio de
informações nem sempre de fácil acesso para o leigo (como, por exemplo, a
de que o fundo utilizando estritamente os ensinamentos de Benjamin
Graham teve sequencialmente um desempenho inferior ao S&P 500, ou
que Warren Bu ett faz trading, sim senhor!);
• Seja capaz de juntar todas essas informações e, com base nelas, realizar um
exame de consciência para identi car seus pontos fortes e fracos como
trader ou investidor, a m de tirar maior proveito de suas qualidades,
eliminando da sua prática aquilo que não contribui para o seu sucesso.
Como bem disse nosso mentor Larry Williams: “Todo dinheiro é sempre dado
em troca de valor. No mercado, o dinheiro é dado em troca de horas de estudo.”
Seguindo essa perspectiva, desejamos que as horas investidas na leitura deste
livro se revertam em lucros para você.
Referências

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2005.
CARTER, John F. Mastering the Trade: Proven Techniques for Pro ting from
Intraday and Swing Trading Setups. New York: McGraw Hill, 2006.
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Wall Street Job Interviewers. 9 ed. New York: Timothy Falcon Crack, 2004.
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DRAKOLN, Noble. Winning the Trading Game: Why 95% of Traders Lose and
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EDWARDS, Robert D.; MAGEE, John. Technical Analysis of Stock Trends. 8
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ELDER, Alexander. Como Se Transformar em um Operador e Investidor de
Sucesso. São Paulo: Elsevier Editora Ltda, 2004.
ELLIS, Charles D. e Partnership: e Making Of Goldman Sachs. New York:
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KATSENELSON, Vitaly N. Active Value Investing: Making Money in Range-
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NARANG, Rishi K. Inside the Black Box: e Simple Truth About Quantitative
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NIEDERHOFFER, Victor; KENNER, Laurel. Practical Speculation.
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PARDO, Robert. e Evaluation and Optimization of Trading Strategies. 2 ed.
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TALEB, Nassim Nicholas. Fooled by randomness. New York: e Random
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VINCE, Ralph. Portfolio Management Formulas: Mathematical Trading Methods
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VINCE, Ralph. e Leverage Space Trading Model: Reconciling Portfolio
Management Strategies and Economic eory. Hoboken: John Wiley & Sons,
2009.
VINCE, Ralph. e Mathematics of Money Management: Risk Analysis
Techniques for Traders. New York: John Wiley & Sons, 1992.
WILLIAMS, Larry. Long-Term Secrets to Short-Term Trading. New York: John
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WILLIAMS, Larry. e De ninive Guide To Futures Trading. Vols. I,
II.Brightwaters, New York: Windsor Books, 1989.
WILLIAMS, Larry. The Right Stock at the Right Time: Prospering In the Coming
Good Years. New York: John Wiley & Sons, 2003.
WILMOTT, Paul. Frequently Asked Questions in Quantitative Finance.
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WILMOTT, Paul. Paul Wilmott on Quantitative Finance. 2 ed. Chichester:
John Wiley & Sons, 2006.
ZWEIG, Martin. Martin Zweig’s Winning On Wall Street: How to Spot Market
Trends Early,Wich Stocks to Pick, and When to Buy and Sell for Peak Pro ts and
Minimum Risk. 4 ed. New York: Warner Books, 1997.
Avaliando Empresas, Investindo em Ações
Debastiani, Carlos Alberto
9788575225974
224 páginas

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Avaliando Empresas, Investindo em Ações é um livro destinado a


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análise que integram a linha de trabalho da escola fundamentalista,
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Padrões para Kubernetes
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executam software mudou significativamente com a evolução dos
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Candlestick
Debastiani, Carlos Alberto
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fácil assimilação, mesmo para leigos. Cada padrão de análise
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Manual de Análise Técnica
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- os conceitos clássicos da Análise Técnica de forma diferenciada,
de maneira que assimile não só os princípios, mas que desenvolva
o raciocínio necessário para utilizar os gráficos como meio de
interpretar os movimentos da massa de investidores do mercado; -
identificar oportunidades para lucrar na bolsa de valores, a longo e
curto prazo, até mesmo em mercados baixistas; um sistema de
investimentos completo com estratégias para abrir, conduzir e fechar
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