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Reitor
Pedro Fernandes Ribeiro Neto
Vice-Reitora
Fátima Raquel Rosado Morais
Diagramação
Isabelly Thayanne de Sousa Silva
Planejamento urbano e regional no Rio Grande do Norte: uma década de estudos e pesquisas.
[recurso eletrônico] / Rebeca Marota da Silva et al (Organizadores). – Mossoró, RN: EDUERN,
2020
283p.; 1 PDF
ISBN: 978-65-88660-32-4
1. Planejamento urbano - Rio Grande do Norte. 2. Planejamento regional - Rio Grande do Norte.
I. Leôncio, Érica Milena Carvalho Guimarães. II. Teixeira, Rylanneive Leonardo Pontes. III. Silva,
Samara Taiana de Lima. IV. Araújo, Kayck Danny Bezerra de. V. Medeiros, Sara Raquel Fernandes
Queiroz de. VI. Pessoa, Zoraide Souza. IV. Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. V.
Título.
Editora Filiada à:
MEUS AMIGOS E
MINHAS AMIGAS
Por essa razão, desde que assumimos o Governo do Rio Grande do Norte,
não medimos esforços para garantir o funcionamento da FAPERN. Para tanto,
tomamos uma série de medidas que tornaram possível oferecer reais condições de
trabalho. Inclusive, atendendo a uma necessidade real da instituição, viabilizamos
e solicitamos servidores de diversos outros órgãos para compor a equipe técnica.
Por fim, esta publicação que chega até o leitor faz parte de uma série de
medidas que se coadunam com o pensamento – e ações – de que os investimentos
em educação, ciência e tecnologia são investimentos que geram frutos e constroem
um presente, além, claro, de contribuírem para alicerçar um futuro mais justo e
mais inclusivo para todos e todas!
Fátima Bezerra
Governadora do
Rio Grande do Norte.
PA R C E R I A P E L O
D E S E N V O LV I M E N T O
DO RN
Este convênio também contempla a tradução para outros idiomas de sites de Programas
de Pós-Graduação (PPGs) das instituições de ensino superior do estado, apoio a periódicos
científicos e outras ações para a divulgação, popularização e internacionalização do conhecimento
científico produzido no Rio Grande do Norte. Ao final, a FAPERN terá investido R$ 100.000,00
(cem mil reais) oriundos do Fundo Estadual de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(FUNDET), captados via Programa de Estímulo ao Desenvolvimento Industrial do Rio
Grande do Norte (PROEDI), programa aprovado em dezembro de 2019 pela Assembleia
Legislativa na forma da Lei 10.640, sancionada pela governadora, professora Fátima Bezerra.
Agradecemos a cada autor(a) que dedica seu esforço na concretização das publicações
e a cada leitor(a) que nelas tem a oportunidade de incrementar seu conhecimento, objetivo
PA R T E I – D I N Â M IC A S U R B A N A S E R E G I O N A I S
1 - A habitação para além do morar: uma discussão do conceito da casa como ativo 17
- Os setores criativos presentes nos eventos “O Maior São João do Mundo”, 106
6 em Campina Grande/PB e “Mossoró Cidade Junina”, em Mossoró/RN, em 2014
e 2017
7
- Cidades Sustentáveis: discutindo desafios e alternativas para os problemas 124
socioambientais do desenvolvimento urbano e regional
PA R T E I I – GE S TÃO DE P OL Í T IC A S P Ú B L IC A S
Os alunos e professores que trabalharam para a publicação desta obra, dedicam este trabalho de forma
póstuma ao Professor Fernando Bastos, que deixou um importante legado no campo de públicas na
universidade e para as reflexões sobre o desenvolvimento regional do Rio Grande do Norte.
A PR ESEN TAÇÃO
O PPEUR inicia sua história, a partir de sua primeira turma de mestrado em 2010,
tendo alcançado em 2018 o início de um novo ciclo, com a obtenção de nota 4 na quadrienal e
aprovação do seu doutorado, com a primeira turma iniciando em 2019.1. Com isso, abre espaço
para o caminho de consolidação dos estudos e pesquisas desenvolvidos ao longo de sua primeira
década de existência enquanto Programa de Pós-Graduação.
O PPEUR também tem alargando sua inserção em redes de pesquisa nacional e inter-
nacional. Nesse sentido, destaca-se a inserção de seus docentes no INCT - Observatório das
Metrópoles, na rede de Pesquisa LabRural e no Observatório Eólica. Além disso, os docentes
têm vasta participação em grupos de pesquisas espalhados pelo o território nacional, consolidando a
parceria e integração entre pesquisas e outros Programas de Pós-Graduação.
O Capítulo 5, “Cidade Criativa e Lazer: uma reflexão sobre a Festa de Sant’Ana de Caicó/
RN”, apresentado por Wxlley Ragne de Lima Barreto, analisa os conceitos de cidade criativa e
lazer, a partir da produção cultural realizada durante a festa de Sant’Ana de Caicó, RN, entre os
de 2013 a 2015. Para a referida análise, o autor adotou por base teórico-metodológica o conceito
de cidade criativa e uma abordagem etnográfica para a análise do cotidiano e da cultura como
objetos de estudo. O trabalho é de grande relevância para o campo do planejamento urbano e
No Capítulo 6, “Os setores criativos presentes nos eventos ‘O maior São João do mundo’,
em Campina Grande/PB e ‘Mossoró Cidade Junina’, em Mossoró/RN, em 2014 e 2017”, Valéria
de Fátima Chaves Araújo analisa as variações ocorridas no cenário econômico e na participação
dos setores criativos identificados no “O Maior São João do Mundo” e no “Mossoró Cidade
Junina”, nos anos de 2014 e 2017, avaliando a dinamização das economias locais sob a ótica da
Economia Criativa em ambos os eventos.
No Capítulo 15, “A Economia das Eólicas no Rio Grande do Norte”, os autores Rebeca
Marota Da Silva e Fábio Fonseca Figueiredo discutem os principais limites e vicissitudes da
Energia Eólica com uma atividade econômica em uma região periférica como o Rio Grande do
Norte. Os autores destacam ainda os programas de incentivos locais ao desenvolvimento que
promoveram da economia das eólicas para integração regional e setorial.
Parte I
DINÂMICAS URBANAS
E REGIONAIS
CAPÍTULO 1
A habitação para além do morar: uma discussão do conceito da casa como ativo
Introdução
17
CAPÍTULO 1
das propriedades.
A moradia é, portanto, não só espaço de vida familiar, mas também espaço de trabalho,
principalmente para as mulheres, de qualquer camada social, que se ocupam tanto da atividade
doméstica quanto do trabalho informal remunerado, oferecendo inúmeros exemplos da riqueza
de possibilidades que as famílias [...] encontram para enfrentar um cotidiano que tem como
pano de fundo a recessão e o desemprego.
É nesse sentido que a habitação é identificada como ativo produtivo, por ser um bem
que dá suporte a atividades econômicas e sociais, que podem aumentar o bem-estar dos seus
moradores e promover sua inserção e reprodução na sociedade. É também por este motivo
que a propriedade aparece como o ativo mais importante para os pobres urbanos. Como
afirma Arantes e Fix (p. 6-7) ao compreender a realidade brasileira, a casa própria “[...]
A divisão do lote em outras parcelas para aninhar as famílias dos proprietários é uma
estratégia possível para obtenção de renda. Por mais que a aglomeração de indivíduos interfira
na receita familiar, normalmente de forma negativa, a questão aqui é diminuir a vulnerabilidade
dos familiares “aninhados” por meio da diminuição do gasto salarial relativo ao aluguel, e
assim remanejar esse custo para o suprimento de outras necessidades básicas (MOSER, 1998).
Entretanto, a coabitação familiar também ultrapassa a renda e está diretamente relacionada aos
laços de solidariedade entre as famílias, com a responsabilidade de oferecer ajuda e de diminuir
a vulnerabilidade daqueles parentes que estão em estado crítico. Como mostrado por Bank
(1980), a família é uma das estratégias da população pobre para sobreviver.
Nesse sentido, compreende-se que a casa pode ser utilizada de diversas formas, sendo
transformada naquilo em que mais se encaixe na necessidade de seus habitantes. Entretanto,
por trás da propriedade da habitação, há duas questões principais as quais não podem ser
esquecidas: o acesso a habitação, ou seja, o adquirir o bem casa, e o acesso a infraestruturas
Enquanto serviços sociais como educação garantem que as pessoas conquistem habilidades
e conhecimento, infraestruturas econômicas como água, transporte e eletricidade – em
conjunto a serviços de saúde – garantem que a população use de forma produtiva as habilidades
e conhecimentos adquiridos.
A habitação com acesso aos serviços públicos funciona como um salário indireto principal-
mente num contexto onde as famílias urbanas mais pobres ou não tem acesso a emprego ou
possuem baixos salários, diminuindo o gasto com produtos privados, aumenta a qualidade de
vida e possibilita os diferentes usos da casa. No organograma abaixo se expõe do lado esquerdo
a forma de acesso a casa e do lado direito as possibilidades de utilização da casa:
Fonte: Fontenele, 2019.
Conclusões
Referências
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estudo sobre as transformações em conjuntos populares. Arquitextos, n. 01, 2001.
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YUJNOVSKY, Oscar. Claves políticas del problema habitacional argentino, 1955-1981. Buenos
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Introdução
O Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), regulamentado por meio da Lei
11.977/2009, foi lançado em 2009 como uma estratégia para minimizar os efeitos da crise
econômica iniciada nos Estados Unidos da América, cujas proporções foram mundiais. O
programa objetivou, assim, dinamizar o setor da construção civil e promover habitação, dado
o considerável déficit habitacional brasileiro.
O PMCMV foi dividido em três faixas. Essas foram vinculadas aos níveis de renda
familiar, sendo a Faixa 1 para famílias com renda entre R$0,00 a R$1395,00, sendo necessário,
por parte das famílias com tal renda, o prévio cadastro nas prefeituras. A aquisição ocorre por
meio de sorteio realizado pela Caixa Econômica Federal.
3 Mestre em Estudos Urbanos e Regionais pelo Programa de Pós Graduação em Estudos Urbanos e Regionais
(PPEUR/UFRN). E-mail: carinabmchaves@gmail.com
27
C apítulo 2
Esse trabalho está dividido em quatro partes, além dessa introdução. O tópico a seguir
apresentará o Programa Minha Casa Minha Vida e os diagnósticos realizados pelos principais
autores sobre o tema em outras regiões do Brasil. Em seguida, será descrito o PMCMV na
Região Metropolitana de Natal e as peculiaridades que existem no local. O último tópico
desenvolve-se sobre Parnamirim e a distribuição do programa nesse município. Expõe o estudo
dos residenciais Nelson Monteiro e Waldemar Rolim, suas características e dinâmica. Por fim
seguem as considerações finais.
No ano de 2009 em meio a propagação da crise econômica iniciada nos Estados Unidos,
foi criado o Programa Minha Casa Minha Vida, que além de promover habitação teve o intuito
de dinamizar a economia nacional por meio do setor de construção civil (AMORE, 2015). O
programa foi dividido em três faixas atreladas às rendas das famílias conforme descrito no
quadro 1. Na terceira fase do programa mais uma faixa foi criada, a faixa 1,5.
O programa foi avaliado em cidades das cinco regiões brasileiras nos anos posteriores
em coletâneas destinadas ao estudo do PMCMV (CARDOSO, 2013; AMORE, SHIMBO e
RUFINO, 2015; CARDOSO, ARAGÃO e JAENISCH, 2017) e os empreendimentos destinados
à Faixa 1 que estão situados em áreas urbanas bem servidas de equipamentos urbanos, comércios
e serviços são minoria como por exemplo nas cidades de Santo André – SP (MARGUTI, 2013)
e Belém – PA (MERCÊS, 2013). Marguti (2013) enfatiza que a localização acessível das moradias
é importante pelos impactos diretos na renda real de seus habitantes.
Villaça (2011, p.37) destaca que as localizações das moradias são fatores que realçam a
“desigualdade econômica e desigualdade de poder político” e afeta diretamente no cotidiano da
população em seus deslocamentos para os locais de trabalho, consumo de serviços e produtos, dentre
outros. Assim, o autor salienta que, na maioria das cidades os bairros privilegiados detém a
maior parte dos serviços utilizados pela população como escolas, supermercados, academias,
shoppings e as estruturas urbanas. De modo contrário os bairros mais afastados, os que em sua
maioria abrigam a população mais pobre, carentes de infraestrutura urbana, estão distantes dos
locais de trabalho e de consumo das famílias que ali residem e essa disposição “cria um ônus
excepcional para os mais pobres e uma excepcional vantagem para os mais ricos” (VILLAÇA, 2011, p.56).
A RMN é composta por 14 municípios e destes, nove (9) foram contemplados pelo
programa com empreendimentos destinados a Faixa 1 até o ano de 2016, o que compreende
nas Fases I e II. Foram entregues 11.276 moradias distribuídas em 26 empreendimentos e estão
situados em 21 localidades como pode se observar na figura 1.
Figura 1 – Mapa das localizações dos empreendimentos Faixa 1 do Programa Minha Vida na
Região Metropolitana de Natal
Amarante, sendo que, nos municípios de Natal (a capital do estado) e de Parnamirim (segunda
maior cidade da RM de Natal), essa é a única tipologia presente (Quadro 1).
Parnamirim, município do litoral do Rio Grande do Norte (figura 2), é o segundo mais
populoso da Região Metropolitana de Natal, tendo uma população de 202.456 habitantes
segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (CIDADES, IBGE,
2010). Segundo Clementino e Ferreira (2015, p.34) o município possui alta integração com a
capital Natal com características acentuadas de tendência a elevar-se a alta integração com
Natal pois, segundo as autoras “integra com o polo (Natal) uma unidade física (pela conurbação)
e funcional”
A pesquisa buscou saber a satisfação dos moradores com a nova moradia. No conjunto
residencial Nelson Monteiro 88,0% dos moradores afirmam que de modo geral a forma de habitação
melhorou enquanto no conjunto residencial Waldemar Rolim esse percentual é de 92,1% (gráfico 1).
Quando questionados sobre a unidade habitacional, que diz respeito ao imóvel em que
receberam e comparando à moradia anterior, o índice de satisfação ainda é muito alto, sendo
91,7% no Nelson Monteiro e 84,2% no Waldemar Rolim. Já a melhora quanto ao tamanho do
imóvel tem percentuais um pouco mais baixos, mas ainda a maioria da população destaca que
houve uma evolução em relação ao imóvel antigo como pode ser visto no gráfico 3.
O motivo apontado por 36,7% da população para ter havido uma melhora na localização
da atual residência foi que os conjuntos possuem ao seu redor os comércios e serviços de que
eles necessitam, além de ter fácil acesso a transportes, tanto o transporte de uso coletivo, como
pontos de ônibus local e intermunicipal nas proximidades como ter a Rodovia BR-101 tão perto
que liga Parnamirim a Natal como a outras cidades do estado, assim como ao centro de Parnamirim.
A boa localização dos conjuntos residenciais Nelson Monteiro e Waldemar Rolim pode
ser observada através dos meios de locomoção e o tempo gasto para isso na rotina dos moradores. Na
locomoção diária dos adultos que trabalham, o transporte coletivo é utilizado por maior parte
da população residente nesses conjuntos para o trabalho (52,2%). Dos que utilizam esse meio
de transporte, 25,0% leva até 15 minutos na locomoção e 41,7% gastam de 16 a 30 minutos no
transporte. Os que se utilizam de veículos motorizados, que inclui carros e motos, perfazem
39,1% da população. No quadro 3, pode se observar que 88,9% dos que se locomovem de
veículos motorizados gastam no máximo 30 minutos para o translado casa – trabalho.
Para a ida e volta de escolas, 46,1% das crianças vão caminhando e o tempo utilizado
para 85,4% dessa população é de até 30 minutos como pode ser visto no quadro 4. O transporte
escolar fornecido pela Prefeitura de Parnamirim é o meio de transporte de 33,7% das crianças,
além do transporte coletivo (4,5%) e os veículos motorizados como carro e moto (15,7%). Vale
destacar que, independe do meio de locomoção das crianças até a escola, 49,4% chega ao
destino em até 15 minutos e 24,7% em até 30 minutos, o que realça a inserção urbana e a
proximidade com estruturas de serviços essenciais ao redor dos conjuntos.
A pesquisa também buscou saber quanto tempo e quais os meios de locomoção uti-
lizado pelos moradores para as idas ao supermercado que fazem a maior parte das compras
alimentícias do mês. Os meios mais utilizados são a caminhada (32,6%) e o carro (30,2%),
seguidos de moto e transporte coletivo com 18,6% cada. Sobre o tempo gasto para a viagem ao
supermercado, 62,8% gastam até 15 minutos e 32,6% fazem o percurso entre 16 e 30 minutos,
somados todos os meios de transportes. O quadro 5 mostra os meios de locomoção e o tempo
gasto em cada categoria para os percursos aos supermercados mais frequentados.
Qtd/ Meio de
Meio de Locomoção Tempo Qtd/ Total
Locomoção
Até 15 min 71,4% 23,3%
Caminhando
De 16 a 30 min 28,6% 9,3%
Até 15 min 76,9% 23,3%
Carro
De 16 a 30 min 23,1% 7,0%
Até 15 min 62,5% 11,6%
Moto De 16 a 30 min 25,0% 4,7%
De 46min a 1 hora 12,5% 2,3%
Até 15 min 25,0% 4,7%
Transporte Coletivo De 16 a 30 min 62,5% 11,6%
De 31 a 46 min 12,5% 2,3%
A pesquisa, por meio das respostas dos beneficiários do programa nos residenciais Nelson
Monteiro e Waldemar Rolim, demostrou que os moradores estão satisfeitos quanto a unidade
habitacional e a localização em que esses empreendimentos estão instalados. A localização
adequada desses conjuntos pôde ser verificada quando analisado o tempo e os meios de locomoção
utilizados pelos moradores para as atividades do dia-a-dia da população como percursos para
trabalho, escolas e mercados.
Considerações Finais
O Programa Minha Casa Minha Vida, desde o seu lançamento, tem sido alvo de estudos
que buscam avaliar as políticas habitacionais e a adequada moradia para a população brasileira.
É evidente a importância do programa, no que condiz a provisão da moradia para famílias que
não teriam condições de acessar a moradia adequada sem o subsídio estatal. No entanto, muitos
estudos realizados no Brasil verificaram que a localidade em que esses empreendimentos são
construídos são inadequados a dinâmica das famílias, deixando-as longe dos locais de trabalho,
escolas, serviços de saúde, comércios e de outros serviços urbanos necessários.
O programa, além de ter o objetivo de promover moradia a famílias de baixa renda, teve
também o intuito de amparar o setor da construção civil. Na busca de maiores lucros, as
localizações afastadas e desprovidas de acessos a infraestruturas urbanísticas são a opção mais
baratas para o aumento do lucro da unidade habitacional para as construtoras. No entanto, o
que esse trabalho verifica é que os empreendimentos do programa devem ser compreendidos
pelas particularidades da localidade em que está inserido e pelas dinâmicas urbanas regionais. Como
foi mostrado por Rodrigues (2018), dos 26 empreendimentos construídos na RMN, apenas sete
se encontram mal localizados e desconectados de redes de serviços e estruturas urbanas. Os
outros foram construídos em locais que já continham ao seu redor estruturas de serviços e
comércios ou a própria construção deles atraiu para a localidade esses serviços.
Referências
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2015 .
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Janeiro: Letra Capital, 2015.
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Introdução
Para tanto, se faz necessária uma legislação municipal específica que estabeleça sua
alíquota, base de cálculo, situações excepcionais, possíveis isenções etc. Essa legislação deve
obrigatoriamente estar de acordo com as disposições constitucionais, como o Código Tributário
Nacional (CTN) (BRASIL, 1966), o Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001) e o respectivo Plano
Diretor do Município, de forma a garantir que esse imposto cumpra todas as suas funções.
Além disso se faz necessária também uma gestão tributária moderna e em consonância com
as necessidades locais, para que o IPTU seja efetivado pelos municípios nos moldes da política
urbana brasileira.
45
CAPÍTULO 3
Ademais, ainda é tímida nas cidades brasileiras a aplicação efetiva de impostos como
o IPTU, sendo relevante entender os porquês da não efetivação, bem como o seu baixo
aproveitamento, o que impede a recuperação das mais-valias fundiárias na medida em que não
se cobra corretamente o referido imposto dos proprietários que possuem imóveis nas regiões
mais bem servidas de infraestrutura e serviços urbanos no município e, consequentemente,
mais valorizadas. No extremo oposto, as pessoas que vivem nas regiões mais longínquas da
cidade, sem acesso a tais equipamentos urbanos não têm seus imóveis incrementados por tal
valorização.
Diante disso, tem-se como objetivo investigar como a gestão do IPTU em Parnamirim
compreende e incorpora na legislação e na administração municipal a potencialidade do IPTU
de recapturar mais-valias urbanas. Para tanto, foi feito um estudo bibliográfico contemplando
as conceituações pertinentes e uma análise documental sobre a legislação do município; além
disso, foram feitas entrevistas com gestores municipais para entender como a gestão compreende
o papel do IPTU para dinâmica urbana local como um instrumento de política urbana com
potencial de recuperar as mais-valias urbanas recebidas pelos imóveis privados em prol da
coletividade5.
Em sua Tese, Cintia Fernandes (2016) mostra que os municípios, geralmente, somam
grandes prejuízos em razão da baixa arrecadação de impostos como IPTU e o ITBI/ITIV e da
Contribuição de Melhoria. Além disso, a autora aponta que uma grande dificuldade em gerir
os instrumentos previstos nos Planos Diretor “que poderiam ajudar a prevenir e minimizar os
prejuízos financeiros e decorrentes de um mau planejamento e gestão dos municípios”
(FERNANDES, 2016, p. 143).
Nesse sentido, Martim Smolka (2014) conceitua recuperação de mais-valias fundiárias, enten-
dendo que:
A noção da recuperação de mais valias fundiárias é a de mobilizar, em benefício
da comunidade, uma parte ou a totalidade dos incrementos de valor da terra (bene-
fícios indevidos ou mais-valias fundiárias) que tenham sido decorrentes de ações
alheias à dos proprietários de terras, tais como investimentos públicos em infraes-
trutura ou alterações administrativas nas normas e regulamentações de usos do solo
(SMOLKA, 2014, p. 02).
Pode-se afirmar que, de modo geral, é recente na história constitucional brasileira o
potencial tributário dos municípios, com a existência de impostos próprios, especialmente o
IPTU, com capacidade de fomentar uma maior atuação municipal na concretização dos objetivos
previstos pela política urbana, através da possibilidade de uma arrecadação mais eficaz que
5 O presente trabalho é fruto da dissertação de mestrado da autora com o título “O tributo da cidade: o IPTU
como instrumento de recuperação de mais-valias fundiárias em Parnamirim-RN” e foi realizado com apoio da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.
Esse imposto se destaca da maioria dos outros tributos em razão da sua extrafiscalidade, pois
está diretamente ligado à promoção do ordenamento territorial e do desenvolvimento urbano e
deve ser utilizado para “evitar a ociosidade da terra urbanizada, recuperar as mais-valias
produzidas por investimentos públicos, mitigar a informalidade, legitimar a posse quando viável e
universalizar a provisão de recursos públicos” (DE CESARE; FERNANDES; BAIMA, 2015, p. 18).
O fato gerador do IPTU é a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por
natureza ou por acessão física, localizado na zona urbana do Município. Para tanto, deve-se
considerar os conceitos trazidos na lei civil sobre bem imóvel. Machado (2013) assevera que
para o direito civil o termo prédio tem um significado ampliado, porém no direito tributário
esse termo designa apenas as edificações. Quanto à base de cálculo, o art. 33 do CTN determina
que será o valor venal do imóvel e, no seu parágrafo único, dispõe que os valores dos bens
móveis mantidos no imóvel não serão considerados na determinação da base de cálculo (BRASIL,
1966). O valor venal é conceituado por Machado como “aquele que o bem alcançaria se fosse
posto à venda, em condições normais (2013, p. 404).
No entanto, essa não é a prática comum nas cidades brasileiras, que muitas vezes
ignoram a previsão constitucional e a regulamentação dos instrumentos prevista no Estatuto da
Cidade. Nesse sentido, Fernanda Furtado (2005) afirma que concretamente o imposto predial
se mostra baixo e desatualizado na América latina, não conseguindo efetivamente ser um meio
adequado para se recuperar mais-valias fundiárias, porém não significa que não seja capaz de
recuperá-las.
Apesar disso, percebe-se que não existe um diálogo entre as gestões municipais e os
cidadãos em relação à possibilidade de utilização dos instrumentos capazes de recuperarem
mais-valias fundiárias em benefício da comunidade e, numa perspectiva mais ampla, garantirem
o direito à cidade para seus moradores.
Na teoria, o IPTU nasce como um tributo essencialmente justo, vez que visa a redistribuição
de riquezas, a preservação do mínimo existencial e a diminuição da especulação imobiliária.
Na prática, as municipalidades devem pautarem-se por tais parâmetros para que o IPTU cumpra
suas funções integralmente.
Dessa forma, mesmo o IPTU não sendo um imposto vinculado a uma determinada
finalidade, os municípios poderiam conseguir honrar com sua obrigação “moral” para com a
cidade, conseguindo prover receitas satisfatórias a partir da sua arrecadação, recuperando os
valores auferidos indevidamente pelos proprietários com a valorização dos seus imóveis gerada
pela iniciativa pública, bem como devolvendo para a população esses valores através da
implementação de infraestrutura, equipamentos e serviços públicos, servindo como um verdadeiro
instrumento tributário e urbanístico em prol da cidade.
Os dados do IBGE sobre o PIB per capita divulgados em 2016 demonstram que o PIB
per capita de é de R$ 20.201,24, sendo o segundo maior da Região Metropolitana, ficando
atrás apenas de Natal, com o PIB per capita de R$ 24.890,54 (IBGE, 2019). Além disso, os
estudos mais recentes mostram que Parnamirim é o município com maior integração em
relação à Natal, podendo ser considerada uma integração no nível “muito alto”, integrando com
Natal uma unidade física (pela conurbação) e funcional (CLEMENTINO, FERREIRA, 2015,
p. 34). A esse processo de conurbação, agrega-se o baixo custo do solo urbano de Parnamirim
em comparação com Natal, sendo um dos fatores que motivaram à população de renda média
a residir nos bairros de Parnamirim contíguos à Natal e diariamente deslocarem-se para Natal
(BENTES SOBRINHA; TINOCO; CLEMENTINO, 2009).
6 Informação colhida na Audiência Pública ocorrida na Câmara de Vereadores de Parnamirim-RN no dia 15 de
março de 2018, que discutiu sobre o aumento do IPTU.
Voltando às disposições relativas ao IPTU trazidas pela Lei 951/1997, tem-se a determi-
nação no art. 130 das alíquotas utilizadas, havendo duas possibilidades: 1% para os imóveis não
residenciais e 0,6% para os demais imóveis edificados (PARNAMIRIM, 1997). Além disso, o
art. 135 também determina alíquota de 1% para todos os imóveis considerados terrenos. A partir
da atribuição de alíquotas diferenciadas, verifica-se que a alíquota dos imóveis residenciais é
menor do que a alíquota dos imóveis com outras destinações ou não edificados, demonstrando,
ainda que timidamente, a intenção do legislador em reduzir o valor final do IPTU nos imóveis
com função de moradia.
Assim, pode-se afirmar que, mesmo havendo um movimento de crescimento da
arrecadação do IPTU de Parnamirim, essa ainda se mostra baixa em relação ao montante das
receitas arrecadadas no município, revelando que o IPTU ainda não representa uma fonte de
receita capaz de arcar com despesas importantes para o município, como, por exemplo, obras
de infraestrutura relevantes para o desenvolvimento urbano.
Enquanto isso, receitas como Fundo de Participação dos Municípios e outras transfe-
rências (transferências correntes) realizadas pelos demais entes federativos aparecem como
principais financiadoras dos investimentos públicos municipais, como pode-se verificar no
Gráfico 3, que mostra as fontes das receitas que compõem o orçamento municipal em 2017.
Buscando compreender melhor a gestão do IPTU pela SEMUT foi realizada uma
entrevista com um dos gestores da SEMUT (Entrevistado 1)7. De início lhe foi questionado
sobre como a SEMUT avalia o potencial do IPTU em Parnamirim, o qual respondeu que a
SEMUT considera que o IPTU tem um grande potencial de arrecadação, mostrando-se através
do aumento da arrecadação nos últimos anos e que isso deu devido ao aumento da fiscalização
e pela mudança na legislação, que, segundo ele, permitiu uma atualização mais eficaz da planta
genérica de valores. Porém, acredita que ainda há muito trabalho a ser feito para se alcançar
uma arrecadação mais próxima do ideal (Entrevistado 1, 2018).
Além disso, lembra que a Lei Municipal nº 71/2013 permite a atualização do valor venal
dos imóveis com base na declaração feita pelo contribuinte no ato de lançamento do ITIV, ou
seja, quando o imóvel passa por transferência de proprietário. Porém sabe-se que a atualização
através desse instrumento legal atinge apenas uma parte dos imóveis, pois uma grande parcela
deles não chega a passar por processo de transferência, bem como muitos estão na informalidade.
Assim, somente com imagens de satélite atualizadas e um georreferenciamento completo a
gestão conseguirá cadastrar e atualizar todos os imóveis existentes no seu território (Entrevistado 1,
2018).
da arrecadação própria essa autonomia. Assim, acredita que em relação ao IPTU, isso será
possível com a melhoria das condições técnicas da SEMUT, com o aumento progressivo da
fiscalização e com o georreferenciamento do território municipal. Ele comenta também que até
recentemente havia poucos auditores fiscais e servidores capacitados, esse cenário melhorou
com a realização de um concurso público, possibilitando um trabalho mais intenso de identifi-
cação de imóveis edificados e não cadastrados ou desatualizados. Ao concluir, ele pondera que
a cidade cresce muito rápido e a gestão precisa acompanhar esse crescimento (Secretário de
Tributação de Parnamirim, 2018).
Diante desse cenário, percebe-se que a falta do conhecimento técnico sobre a tributação
do IPTU, associado a falta de investimento numa Planta Genérica de Valores que atualize o
cadastro imobiliário causam grandes distorções e, até mesmo, injustiças fiscais. Além disso,
dificultam ainda mais a possibilidade de se recuperar mais-valias fundiárias através desse
imposto. Assim, a gestão ao tentar buscar soluções que não passem pela atualização concreta
da PGV acaba prejudicando ainda mais sua arrecadação (devido a suspensão da cobrança do
IPTU dos contribuintes que reclamam de forma administrativa ou judicial), bem como causa
um descontentamento por parte da população, dificultando mais ainda à conscientização do
cidadãos à respeito da importância do IPTU para a cidade.
Algumas Conclusões
O solo urbano, visto como uma mercadoria especial e de grande importância para
o espaço capitalista, tem na normatização urbanística e tributária uma possibilidade de diminuição
das desigualdades existentes nas cidades brasileiras, compreendendo-se que a previsão cons-
titucional relativa à política urbana, o Estatuto da Cidade, os Planos Diretores e a legislação
tributária trazem importantes instrumentos voltados para a recaptura de mais-valias fundiárias.
Diante desse quadro, considera-se que Parnamirim ainda precisa avançar no que se
refere à gestão do IPTU para torná-lo mais efetivo e melhorar tanto em quantidade, arrecadando
valores mais significativos no montante da receita tributária municipal, como também
em qualidade, com uma atualização constante da planta genérica de valores, evitando discrepâncias
que resultem em injustiças fiscais. Além disso, deve também voltar-se para a efetivação de suas
funções extrafiscais para os imóveis que não cumprem sua função social.
Referências
BENTES SOBRINHA, Maria Dulce Picanço; TINOCO, Marcelo Bezerra de Melo; CLEMENTI-
NO, Maria do Livramento Miranda. Função Socioambiental como Estratégia do Crescimen-
to Sustentável da Região Metropolitana de Natal. Mercator – Revista de Geografia da UFC,
ano 8, n. 15, 2009.
_____. Lei nº 10.257 de 10 de julho de 2001 - Estatuto da Cidade. Brasília: Congresso Na-
cional. 2001. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br /ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm
> Acesso em: 20 abril 2018.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2012.
MACHADO, HUGO DE BRITO. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2013.
MATIJASCIC, Milko (Coord.). Política fiscal e justiça social no Brasil: o caso do IPTU.
Brasília: IPEA. Disponível em: <http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/5314/1/Comuni-
cado_n28_Pol%C3%ADtica.pdf>. Acesso em: 01 out 2016.
ROLNIK, Raquel. Instrumentos Urbanísticos – Concepção e Gestão (v. 1). Campinas: Oculum,
2000.
Introdução
De acordo com estudo realizado pelo Observatório das Metrópoles (2012) acerca dos
níveis de integração dos municípios brasileiros à dinâmica da metropolização, as cidades de
Extremoz, São Gonçalo do Amarante e Parnamirim são as que apresentam alto nível de
integração com Natal, Macaíba médio nível e os outros municípios componentes da RMNatal
possuem baixa integração com a cidade polo. Essa integração se dá também pela conurbação,
transbordamento ou proximidade entre algumas cidades integrantes da Região Metropolitana
e a cidade polo Natal, fato que contribui para o aumento dos deslocamentos intermunicipais
diários, levando à necessidade de infraestrutura física e de serviços à coletividade.
É correto afirmar que o MCMV Faixa 1 promoveu o acesso à casa própria para muitas
famílias pobres na RMNatal, mas também é razoável dizer que trouxe para estas famílias um
conjunto de desafios no que se refere ao direito à cidade, no que tange, principalmente à mobilidade,
devido à localização da moradia. A instalação dos novos conjuntos habitacionais se concentrou
58
CAPÍTULO 4
em áreas distantes das centralidades das cidades onde se encontravam estabelecidas as dinâmicas
urbanas: prestação de serviços, equipamentos de uso coletivo, oferta de ensino, saúde e de
transporte público coletivo, por exemplo.
Nesse contexto, para compreender os efeitos do morar longe no cotidiano urbano dos
beneficiários do MCMV Faixa 1, figura como referencial teórico, na busca por permitir possíveis
reflexões sobre a localização da moradia no contexto ‘centro versus periferia’, o pensamento
desenvolvido pelo geógrafo britânico David Harvey em sua obra intitulada “A Justiça Social e
a Cidade”, de 1980. Nela, se discute, entre outros temas, o processo de separação da habitação
de pobres e de ricos nos Estados Unidos (com suas cidades de capitalismo avançado).
Os moradores dos novos conjuntos habitacionais foram selecionados por faixa de renda.
As regras da seleção caracterizam uma forma antecipada de segregação social. Tal segregação,
estabelecida pelo programa aos habitantes de mais baixa renda, gera demandas e carências de
toda ordem. Esse conjunto de carências não atendidas, parte em razão da ausência do Estado,
pode ser compreendida a partir da definição de “Espoliação Urbana”, que o autor Kowarick
(1979, p. 59), define como sendo “o somatório de extorsões que se opera através da inexistência
ou precariedade de serviços de consumo coletivo que se apresentam como socialmente necessários
em relação aos níveis de subsistência”.
A espoliação urbana corrobora com a reflexão que Ribeiro (2005) faz sobre renda e
localização da moradia quando este salienta que os pobres segregados nas periferias estão
sujeitos ao isolamento frente ao restante da sociedade, tanto no plano social quanto no plano
cultural. Para ele, a condição de morador de periferia reduz as oportunidades de convivência e
interação informal entre estes e as outras classes sociais, tudo isso em razão da diminuição das
oportunidades de acesso ao emprego urbano nas redes econômicas hegemônicas das cidades.
Quanto custa morar longe para uma família de baixa renda? A noção de renda, para
Harvey (1980), não está associada apenas a uma medida monetária. Vários outros elementos
ajudam a formar a renda dos indivíduos na cidade, ou seja, é a conjunção de fatores econômicos
que determina o que Harvey trata como “renda real”. O autor diz que para a compreensão do
conceito, é fundamental para discutir a distribuição da renda real, ou seja, como as mudanças
na forma espacial da cidade e nos processos sociais que operam na cidade provocam mudanças
na renda do indivíduo? Dessa forma, verifica-se que o salário do indivíduo é apenas uma parte
considerada de sua renda real. Importa associar o salário à localização da moradia do indivíduo
na cidade, pois a localização possibilita notar a capacidade e a possibilidade de acesso aos
escassos recursos do espaço urbano.
Moradia e transporte
A mancha urbana das cidades vai se estendendo em razão dos novos conjuntos habita-
cionais não serem erguidos nos limites geográficos das centralidades urbanas. Observa-se nas
leituras feitas por Valença (2008) acerca do pensamento desenvolvido por Harvey, que esse
investimento na expansão urbana é apenas mais uma manifestação da reprodução do capital
na medida em que utiliza a estratégia de expandir o capital para áreas onde o capitalismo ainda
não havia se manifestado em larga escala, criando novos espaços reconfigurados para servir à
acumulação e reprodução do capital.
Para acessar o MCMV Faixa 1, o mercado adquiriu as terras mais baratas, ou seja,
aquelas mais distantes das centralidades urbanas e com maior precariedade de infraestrutura,
conduzindo a expansão urbana para as áreas periféricas. Para Kowarick (2000), todo esse
processo acirra as formas da segregação socioeconômica.
Por não ter as condições econômicas para adquirir um imóvel nas áreas com mais
infraestrutura (áreas nobres), a baixa renda aderiu ao MCMV Faixa 1 na RMNatal, adquirindo
suas moradias em áreas distantes das centralidades, ou seja, nas periferias urbanas. No caso
do Rio Grande do Norte na RMNatal, foram erguidos 32 empreendimentos do programa entregues
entre os anos de 2009 e 2012 à população de baixa renda em áreas periféricas das cidades de
Ceará-Mirim, Extremoz, Macaíba, Monte Alegre, Natal, Nísia Floresta, Parnamirim e São
Gonçalo do Amarante, atendendo aos interesses do mercado imobiliário.
Nesse contexto, foi articulada a expansão urbana nos citados municípios, o que
inevitavelmente, conduziu o poder público a se comprometer com o atendimento das demandas
que fossem surgindo. Demandas por iluminação pública, abastecimento de água e esgotamento
sanitário e transporte público coletivo, por exemplo. Foi a ausência de articulação da política
habitacional com a política urbana e a inexistência de exigências para que os entes públicos
utilizassem os instrumentos do Estatuto das Cidades na contratação dos empreendimentos do
MCMV Faixa 1, que permitiram que os novos conjuntos habitacionais na RMNatal fossem
viabilizados a partir da dinâmica de mercado.
Tabela 1 - Quantitativo da Frota ativa das empresas que operam SRT na RMNatal
Empresa Frota por dia útil Participação (%)
Barros 20 7
Campos 17 6
Dunas 32 11
Oceano 54 18
Riograndense 30 10
Santa Maria 15 5
Transflor 48 16
TransTV 80 27
Total 296 100
Tabela 2- Quantitativo da Frota ativa das empresas que operam o TOMP na RMNatal.
Município Frota por dia útil
Ceará-Mirim 11
Extremoz 07
Macaíba 07
Parnamirim 28
São Gonçalo do Amarante 17
Diversos 10
Fonte: Elaborado pela autora com dados da Coppetec, 2009.
Vale ressaltar que no estudo em Diversos foram contabilizadas as linhas que atendem
Nísia Floresta, São José do Mipibu e Barra de Tabatinga. Não há registro de TOMP em Monte
Alegre. Há registros de outras linhas de TOPM´s que alimentam apenas bairros específicos
em Parnamirim, a saber, Eucalipto e Nova Parnamirim que não são contabilizados aqui nesse
capítulo por serem conjuntos distantes das áreas onde foram erguidos os empreendimentos do
MCMV Faixa 1.
Além da maioria dos empreendimentos estarem cercados por vias vicinais, os pontos
de ônibus das linhas oficiais (legalizadas) são distantes dos empreendimentos. Os moradores
do Residencial Flora e Residencial Mar, ambos em Ceará-Mirim, encontram o ponto de ônibus
mais próximo a cerca de 1 (um) quilômetro. Em Parnamirim, os Residenciais Terras do Engenho
I e II, estão distantes do ponto de ônibus em pelo menos 2 quilômetros. No caso do Residencial
Jomar Alecrim em São Gonçalo do Amarante, os moradores precisam andar a pé cerca de 2
(dois) quilômetros até o ponto de embarque e desembarque do transporte público coletivo (SRT
ou TOMP) fixado na BR 160.
O sistema do referido meio de transporte coletivo possui uma malha ferroviária que
cruza parte da Região Metropolitana de norte a sul, atendendo os municípios de Ceará-Mirim,
Extremoz, Natal e Parnamirim, considerados parte da metrópole funcional (apresentam forte
integração com a cidade polo, à exceção de Ceará-Mirim). Possivelmente, a oferta desse modal
afetou as relações de conexão de Parnamirim e Extremoz com a capital potiguar.
No mapa acima se pode observar que as duas únicas estações de trem em Parnamirim,
município que tem alta integração com Natal, ficam distantes dos bairros onde se localizam
boa parte dos conjuntos do MCMV Faixa 1, fato que aponta para a necessidade da ação
governamental na promoção de integração entre o SRT (ônibus), o TOMP (opcional) e o Trem,
bem como para a criação de infraestrutura tais como a implantação de calçadas acessíveis,
de bicicletário, de linhas circulares de acesso a pontos mais centrais das localidades e de ruas
adequadas (pavimentadas) que atendam a população de baixa renda, com algum conforto, nos
caminhos percorridos até uma estação de trem ou ponto de ônibus. O uso diário do modal trem
pode atenuar os gastos das famílias com nos deslocamentos de ‘idas e vindas’.
Segundo a Coppetec (2009), em média os dois ramais transportam por dia 8.482 passageiros
e a operação ocorre somente de segunda a sábado. São realizadas aproximadamente 14 (quatorze)
viagens diárias, sendo sete no trecho Sul, com exceção dos dias de quarta-feira, que possui
uma viagem a mais, e sete no trecho norte. Esses dados denotam que o modal tem significativa
adesão dos usuários do transporte público coletivo.
O estudo (2008) concluiu, em seu relatório diagnóstico, que a população de baixa renda
dos municípios alimentados pelo sistema ferroviário utiliza significativamente esse modal pelo
fato da passagem custar R$ 0,50 (cinquenta centavos), preço em 2008 que perdurou até ano de
2017 quando a tarifa sofreu reajuste. Entretanto, o estudo pontua que é necessário investir na
melhoria da integração desse sistema com os outros meios de transportes.
Pelo exposto, observa-se que a inviável ou escassa oferta dos serviços de transportes
públicos coletivos seja por Trem, SRT ou TOMP, não somente representa um desafio para os
moradores dos conjuntos habitacionais do MCMV Faixa 1 na RMNatal, mas para o conjunto da
população de baixa renda usuária desse mesmo sistema nos respectivos municípios estudados.
10 Para o cálculo do grau de cobertura do transporte público coletivo intermunicipal foram considerados os se-
guintes critérios: uma faixa de trezentos metros para cada lado do eixo viário servido por pelo menos uma linha
de ônibus, e para a consideração da área urbanizada adotou-se uma faixa de cem metros a partir da malha viária
presente na base georeferenciada. Foram consideradas nesta analise as linhas intermunicipais regulares (STR) e
também as opcionais (TOMP).(COPPETEC, 2008).
entre bairros, áreas), fica por conta dos sistemas municipais. Verifica-se que nos municípios
pesquisados, esse serviço ofertado para o transporte interno é muito precário ou inexistente.
Outro problema enfrentado não só pelos beneficiários do MCMV Faixa 1, mas pela
população da RMNatal, diz respeito ao ato de fazer o sobe e desce(embarque e desembarque)
no perímetro urbano de Natal, pois, as vias por onde trafegam os veículos do transporte público são
as mesmas por onde trafegam os veículos particulares e os outros tantos modais, como o trans-
porte de cargas, o que cria grande conflito e filas de congestionamento em horários de pico.
Fonte: Elaborado pela autora com o auxílio da ferramenta Google Maps, 2013.
Fonte: Elaborado pela autora com o auxílio da ferramenta Google Maps, 2013.
As imagens evidenciam que o usuário tem seu desembarque em locais ainda distantes
do centro da capital, ou seja, o usuário não acessa o Alecrim, a Cidade Alta e a Ribeira,
considerados os bairros mais centrais da cidade do Natal. Essa realidade retratada no exemplo
de Parnamirim é vivenciada também pelos outros municípios aqui estudados. Algumas linhas
de TOMP vão apenas até o Shopping Midway, outras vão até o hospital Walfredo Gurgel,
outras até parte da Av. Romualdo Galvão. Entretanto, não se pode afirmar que essa desconti-
nuidade do sistema de transporte até as áreas do centro histórico de Natal seja um problema
relevante para o usuário desse sistema, pois hoje há novas configurações na dinâmica econômica da
cidade polo Natal que tem desenvolvido novos centros de aglomeração dos empregos e serviços
na citada cidade.
de uma tarifa. Por todas as informações disponibilizadas nesse capítulo, pode se considerar que
o número de pessoas que precisam se deslocar nos novos conjuntos habitacionais é expressivo?
Os movimentos de ‘idas e vindas’ é intraurbano ou intermunicipal? Para onde as pessoas se
dirigem? Quais atividades motivam seus deslocamentos? Os subtítulos seguintes lançam luz a
essas interrogações.
O PDTM (2008) identificou que ocorrem 2.082.711 (dois milhões, oitenta e dois mil e
setecentas e onze) viagens na RMNatal e que, aproximadamente, 42% são realizadas por
transporte não motorizado, ou seja, as pessoas se deslocam dentro de seus municípios a pé;
35% dos deslocamentos são realizados por transporte público coletivo e 23% por transporte
individual (particular). A tabela 3 apresenta a porcentagem desses modais por município da
RMNatal onde temos os conjuntos habitacionais do MCMV Faixa 1, com exceção apenas de
São José do Mipibu. Verifica-se que os municípios de alto e médio nível de integração com
Natal são os que apresentam maior volume de viagens por transporte coletivo.
O transporte público coletivo (modal motorizado) possibilita vencer com maior facilidade as
barreiras geográficas existentes (diminuir distâncias). Segundo o PDTM (2008), se destacam as
conexões realizadas entre Natal e Parnamirim, São Gonçalo do Amarante e Natal e Extremoz e
Natal, municípios de alta integração com a cidade polo. Os demais municípios juntos produzem
e atraem para Natal algo da ordem de 4,5% do total de viagens (consideradas apenas viagens
que tenham origem ou destino em Natal), valor inferior ao observado para as conexões acima
citadas das cidades de alta integração com Natal.
Esses dados indicam a necessidade de uma análise mais detalhada dessas conexões,
tanto no que concerne à infraestrutura viária disponível quanto ao serviço de transporte público
coletivo prestado. Para analisar os fluxos de viagens na RMNatal, o PDTM (2008) utilizou a
divisão de Regiões Administrativas estabelecida pelo Plano Diretor do Município do Natal.
Para os demais oito municípios restantes da Região Metropolitana considerou-se o limite
administrativo. A tabela 4 destaca os fluxos das viagens dos municípios da RMNatal beneficiados
pelo MCMV Faixa 1 com destino à Natal.
O perfil dos deslocamentos evidencia a relevância da análise dos dados dos desloca-
mentos pendulares entre Parnamirim, São Gonçalo do Amarante e Extremoz com a cidade
do Natal, que juntos conformam com maior significado a dinâmica da mobilidade urbana da
RMNatal. São os moradores dos conjuntos habitacionais do MCMV Faixa 1 dos municípios
citados, que vivenciam a situação de conurbação/transbordamento com a cidade polo Natal,
os mais impactados pelas dificuldades quanto às condições para realizar seus deslocamentos
diários. Quais os motivos dos deslocamentos? Qual o custo para a realização desses desloca-
mentos? As respostas a esses dois questionamentos podem ajudar a revelar o preço da
mobilidade pago pelo beneficiário do MCMV Faixa 1 na RMNatal por morar longe do conjunto
de elementos constituintes da vida urbana.
O deslocamento por motivo de trabalho gera em torno de 420.263 viagens daquele total
de mais de 2 mil viagens. Isso ocorre porque é em Natal que se encontra o maior contingente
de empregos, atingindo, no ano de 2007, parcela significativa do total de empregos gerados na
RMNatal. De acordo com o PDMT, o número total de empregos na RMN em 2007 foi estimado em
399 mil empregos. Só na capital potiguar, o número de empregos atingiu o montante de 308,2
mil empregos, o equivalente a 77,3% do total. A segunda cidade mais populosa da RMNatal,
Parnamirim, participou com a geração de 46,2 mil empregos, ou seja, 11,5% do total de empregos
existentes na RMNatal. Estes números demonstram a grande centralização das atividades
econômicas na cidade polo, pois, de acordo com o PDTM, dados de 2008, a cidade do Natal
concentrava 62% do contingente populacional da RMNatal e 77,3% dos empregos nesta. A
tabela 5 demonstra claramente essa concentração dos empregos na cidade polo.
Na RMNatal, em uma Carta Consulta11 elaborada em 2010 pela STTU verificou-se que
as atividades econômicas basilares em Natal podem ser divididas da seguinte maneira: setor
de serviços e comércio, turismo, atividades rurais e setores de produção industrial. O setor de
serviços e comércio está concentrado na cidade polo Natal e atrai significativamente a população das
cidades da RMNatal. Este setor se encontra dentro da cidade polo, nas regiões mais centrais,
com forte crescimento em direção à Zona Sul, onde se fixa a população de maior poder
aquisitivo. Entretanto, o avanço desse setor da economia também se alastra para as Zonas
Oeste e Norte que, apesar de apresentarem população com renda mais baixa, possui grande
concentração populacional.
De acordo com Silva (2010), o setor turismo está distribuído principalmente na costa
litorânea da RMNatal, com considerável movimentação nas praias do litoral Sul (Natal,
Parnamirim, Nísia Floresta e Tibau do Sul) e praias do litoral Norte (Natal, Extremoz,
Ceará-Mirim). O litoral da RMNatal atrai não só os turistas, mas toda uma gama de pessoas
vindas das cidades próximas envolvidas nessa atividade econômica, o mercado imobiliário,
bem como as pessoas residentes na referida região das praias que modificaram sua relação com
a habitação de ‘veraneio’ e se tornaram moradores permanentes a partir do processo de conformação
do território transformado pelo imobiliário-turístico, como explica Silva (2010).
O estudo do PDTM (2008) mostrou também que as atividades rurais na RMNatal são
interiorizadas, bem como apontou que essas áreas estão sendo exploradas para especulação
imobiliária, em virtude tanto das atividades turísticas quanto do próprio crescimento populacional,
que juntos acarretam o avanço do desenvolvimento do setor de serviços. Quanto às áreas de
produção industrial, o PDTM (2008) mostrou que essa atividade econômica se localiza entre
os eixos Macaíba/Natal especificamente no que diz respeito aos investimentos realizados no
11 A carta-consulta é o documento que descreve ações e custos previstos na execução dos projetos que se
pretende contratar com recursos externos e a contrapartida que é oferecida pelo mutuário pretendente.
como centro de prestação dos serviços educacionais e da produção de ciência e tecnologia foi
corroborada. De acordo com o estudo encomendado pelo PDTM em 2007, o número de matrículas
(tabela 7) na RMNatal era de aproximadamente 374 mil matrículas que representavam 0,296
matrículas por habitantes. A cidade polo Natal, concentrava quase 75% das matrículas da RMN
com um total de 279,6 mil matrículas. Parnamirim era o segundo maior município com maior
número de matrículas e alcançava apenas cerca de 12% das matrículas da RMNatal. No caso
de Natal, de acordo com a tabela abaixo, o número de matrículas dividido pelo número de
habitantes (censo IBGE 2000) é de 0,392. Para Parnamirim essa proporção, a saber, matrículas
por habitantes é de 0,356 também nos anos 2000. Ambos os resultados mostram a significada
superioridade das duas cidades mais populosas da RMNatal no que se refere a concentração da
oferta educacional.
das empresas prestadoras do serviço por STR e TOMP que de alguma forma dão acesso aos
empreendimentos do MCMV Faixa 1 nos municípios pesquisados. Além de identificá-las também
forneceram os preços das passagens, a frota por linha e por dias da semana. Essas informações
possibilitaram criar uma tabela identificando os gastos com a mobilidade, o que em outras
palavras, significa apontar o preço da mobilidade urbana para os moradores dos conjuntos
habitacionais do MCMV Faixa 1 na RMNatal.
No ano de 2014, observou-se que o preço para realizar apenas 02 (dois) deslocamentos
diários em 22 (vinte e dois) dias úteis, em nenhum dos municípios pesquisados, era menor do
que 10% do valor do salário mínimo vigente. Ou seja, o preço da mobilidade e consequente
acesso à cidade é significativo para os beneficiados pelo Programa. Os moradores de Nísia
Floresta, Ceará-Mirim e Monte Alegre chegavam a gastar com mobilidade (02 deslocamentos
diários) até 31% do salário mínimo. Natal e Parnamirim, que tinha as menores tarifas de transporte,
comprometiam 14% do salário-mínimo. Veja a tabela 8:
Fonte: Elaborado pela autora com dados fornecidos pelo Departamento de Estradas e Rodagens - DER/RN.
Nota: Valor do salário-mínimo vigente R$ 678,00 (dez, 2013).
Realizado um novo levantamento dos preços das tarifas de SRT em 2018 para os mesmos
municípios pesquisados em 2013, por meio de matérias jornalísticas e em contato com órgãos
do governo estadual, verificou-se que o custo com deslocamento não só aumentou como também
comprometeu ainda mais percentualmente o salário de parte dos moradores da RMNatal com
mobilidade. Em Natal, a tarifa variou de R$ de 2,20 para R$ 3,65. Em Nísia Floresta o aumento
foi ainda mais relevante, pois a tarifa saiu de R$ 4,80 para R$ 7,50. A tabela 9 apresenta as
variações nos preços das tarifas com destaque para os preços mais altos observados em
Ceará-Mirim, Monte Alegre e Nísia Floresta.
Constata-se, pois, que os gastos com deslocamento são significativos para o morador
que percebe uma renda mensal de 01 (um) salário mínimo, perfil de parte do beneficiário do
MCMV Faixa 1. É necessário observar que esse custo pode não ser tão significativo para aqueles que
percebem 02 (dois) ou 03 (três) salários-mínimos. Mas, inegavelmente é um gasto considerável
para aqueles que não possuem renda formal (zero salário) ou que têm renda inferior a 01
(salário-mínimo). Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos
(DIEESE), em dezembro de 2013 o valor do salário mínimo deveria ser de R$ 2.765,44, ou seja 4,08
vezes maior que o mínimo da época (R$ 678,00). A determinação constitucional estabelecida é de
que o salário mínimo deve ser suficiente para suprir as despesas de um trabalhador e sua família
com alimentação, moradia, transporte, saúde, educação, vestuário, higiene, lazer e previdência. De
acordo com o DIEESE, em janeiro de 2018, o salário mínimo ideal para sustentar uma família de
quatro pessoas deveria ter sido de R$ 3.752,65. O valor de R$ 954 é 3,93 vezes menor que o ideal
para sustentar uma família com quatro membros.
Importante explicar também que o cálculo dos gastos feitos para 2018 é para 02 (dois)
deslocamentos de apenas 01 (um) indivíduo com renda de R$ 954,00 (um salário-mínimo). Se
esse indivíduo tem ao menos um dependente que precisa se deslocar para ir ao médico, fazer
compras ou realizar alguma atividade de lazer, como ir ao cinema, esse custo com a mobilidade
certamente terá um peso ainda maior para essa família. Esse custo também recebe acréscimos
quando o destino final do usuário é acessar os bairros do Alecrim, da Ribeira ou Cidade Alta,
pois muitas linhas de SRT e TOMP realizam seus retornos em locais bem anteriores aos citados
bairros (ver figuras 4 e 5). Isso significa que têm que embarcar em outro ônibus e pagar mais
uma tarifa.
É verdade que em Natal há duas modalidades de Integração entre linhas de ônibus nas
quais o usuário paga apenas a tarifa do primeiro embarque. Uma integração se dá por meio
das Estações de transferência, um sistema de integração tarifária física, implantado na cidade
desde fevereiro de 2005, constituído de estações de transferência que permitem ao usuário do
serviço atingir os diversos pontos da cidade pagando apenas uma passagem e utilizando mais
de uma linha que faz transbordo em uma dessas estações. A outra se faz por meio do sistema
de integração tarifaria temporária em vigência na capital desde maio de 2009 que consiste na
permissão de uma ou mais integrações entre distintas linhas de ônibus durante o período de
uma hora, em qualquer ponto de embarque e desembarque localizado no percurso das linhas
ou ainda a partir das estações de transferência. Entretanto, segundo o DER/RN, não existe na
RMNatal nenhum terminal de integração que articule as linhas vindas da região metropolitana
com as da capital, o que torna o preço da mobilidade consideravelmente alto.
Considerações finais
O capítulo refletiu sobre as condições da mobilidade urbana dos moradores dos conjuntos
habitacionais do MCMV Faixa 1 na RMNatal. Nele, o diálogo estabelecido entre a localização
dos empreendimentos e a oferta do transporte público coletivo revelou a falta de articulação
entre a política habitacional e a política urbana, bem como a observação de que a contratação
dos empreendimentos do MCMV Faixa 1 na RMNatal privilegiou a dinâmica de mercado,
afetando o desenho das cidades que tiveram sua mancha urbana estendida, distanciando os
moradores das centralidades urbanas e acarretando a necessidade de deslocamentos motorizados,
por exemplo. Foi demonstrado que para realizar os deslocamentos os moradores dos novos
conjuntos habitacionais do MCMV Faixa 1 se utilizam do transporte público coletivo legalizado
pelo poder público como o ônibus (SRT), o alternativo (TOMP) ou o trem para vencer as
distâncias mais consideráveis, bem como se valem das soluções caseiras não legalizadaspara
os deslocamentos intraurbanos tais como o moto-táxi. O capítulo avaliou que os citados modais
não atuam de forma integrada; que os usuários do sistema em sua maioria são de baixa renda
(48%) e que as frotas dos citados modais são insuficientes para a demanda diária.
Como afirmam Harvey (1980) e Ribeiro (2005), o salário é apenas parte de sua renda
real. A leitura de Harvey (1980), auxiliou na compreensão dessa situação ao asseverar que a
localização da casa, além de exercer seu significado distributivo (renda), contribui para uma
evidente condição de vida muito frágil. Esse significado distributivo, no estudo aqui efetivado,
diz respeito às condições financeiras dos beneficiários do MCMV Faixa 1 no que se refere ao
custo da mobilidade urbana. É imperioso agregar ao salário a localização do indivíduo
na cidade; as suas condições de acesso aos recursos do espaço urbano. Só assim, as perdas na
renda real dos beneficiários do MCMV Faixa 1 podem ser compreendidas a partir dos gastos
excessivos com a mobilidade. Nesse sentido, o capítulo demonstrou que os custos com
deslocamentos comprometem sobremaneira as condições econômicas dos moradores dos novos
conjuntos. Nos municípios com maior nível de integração com Natal, os gastos da população
de baixa renda com mobilidade urbana (transporte público coletivo) chegam a uma média de
20% do salário mínimo, salário este que, segundo análises do DIEESE, já não é suficiente para
garantir as condições ideais de sobrevivência dos assalariados. Essa fragilidade econômica
(somatório de extorsões) identificada no capítulo permite associar os gastos com transporte
público com a espoliação urbana conceituada por Kowarick (1979).
Considera-se que uma das formas de minimizar as perdas financeiras dos moradores
dos novos conjuntos habitacionais é promover ajustes às suas necessidades criando infraestruturas
físicas como calçadas acessíveis, bicicletários, adicionar linhas circulares para o acesso aos
pontos mais centrais das cidades que atendam a população de baixa renda promovendo algum
conforto nos trajetos percorridos até um ponto de ônibus ou uma estação de trem. Avalia-se
que o uso diário do modal trem pode atenuar os gastos das famílias com nos deslocamentos de
‘idas e vindas’, visto que sua tarifa custa bem menos que aquelas praticadas por SRT (ônibus) e
TOMP (opcional). Também é razoável pensar que a melhoria ou adequação das vias de acesso
aos novos conjuntos habitacionais pode tornar o sistema de ônibus mais atrativo e rentável para
os empresários, bem como concorrerá para a instalação de pontos de embarque e desembarque
mais próximos dos referidos conjuntos.
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CAPÍTULO 5
Introdução
O presente trabalho intitulado “Cidade Criativa e Lazer: uma reflexão sobre a sobre a
Festa de Sant’Ana de Caicó-RN” tem como objetivo analisar os conceitos de cidade criativa e
lazer, a partir da produção cultural realizada durante a festa de Sant’Ana de Caicó/RN, entre os
de 2013 a 2015.
Celebrada há mais de 260 anos, a Festa de Sant’Ana destaca-se entre as múltiplas festas
de padroeiro por revivificar os laços de solidariedade e acionar registros específicos da cultura
seridoense. Essa festa [...] torna-se relevante do ponto de vista cultural, histórico e social, pois
é um dos principais veículos da memória e da identidade coletiva, em especial os relacionados
com as expressões ligadas à fé católica (BRASIL, 2010, p. 6).
Neste contexto, percebemos que a Festa de Sant’Ana possui uma identidade cultural,
cujas relações sociais e patrimônios simbólicos historicamente compartilhados estabelecendo a
comunhão de valores entre os membros de sua sociedade. Com isso, a identidade emerge nesta
manifestação que envolve um amplo número de situações que vão desde a fala até a participação
em certos eventos.
RN, na atualidade. Isso se concretizará através dos objetivos específicos, tais quais: debater os
elementos da cidade criativa; discutir os aspectos e teorias sobre o lazer no Brasil e, por último,
relacionar os lugares do lazer com os elementos da Cidade Criativa.
Por ser um festejo de grande relevância – tanto na região do Seridó, quanto no Estado
– com implicações na organização do espaço público e no cotidiano da cidade, surge algumas
questões centrais acerca da criatividade e do lazer desta festividade alusiva a Nossa Senhora
Sant’Ana. Os principais questionamentos são: Onde está o lazer e como ele é utilizado na cidade
de Caicó-RN? Qual a relação da cidade criativa e o lazer na cidade contemporânea? Qual a
função do lazer no cotidiano festivo da cidade criativa? Essas reflexões direcionarão as vielas
da pesquisa, com a finalidade de responder às inquietações iniciais.
Desse modo, o estudo sobre a festa da padroeira de Caicó – auxiliados pelas técnicas e
métodos de pesquisa – se fez importante para que se possa, a partir da cultura e de seus atrativos,
observar as dinâmicas urbanas da cidade, vislumbrando as transformações socioespaciais que
ocorrem nesse período, a partir do (re)desenho e da (re)utilização dos espaços públicos relacionados
aos aspectos da Cidade Criativa e do Lazer a serem observadas durante esse momento festivo.
O capítulo está estruturado em três seções, além desta introdução. Na primeira seção,
abordamos a Cidade Criativa e identificamos seus principais elementos constitutivos como
espaço fundamental para o desenvolvimento dos criativos. Assim, na cidade criativa debatemos
os referencias teórico e a sua afinidade com a área cultural. Na seção seguinte, debatemos as
reflexões acerca dos conceitos de Lazer e sua importância para a contemporaneidade. Por último,
apresentamos os resultados da pesquisa qualitativa da Festa de Sant’Ana, no município de
Caicó – RN, relacionando a Cidade Criativa com a Cultura e o Lazer daquela realidade. Neste,
incluímos ainda uma descrição dos principais eventos culturais e espaços desta festividade
através da visão da representação religiosa e poder público municipal e dos empreendedores
É nesse contexto que surgem variadas discussões e reflexões sobre cidades criativas.
Para alguns, como Landry (2011) o conceito de contornos fluídos revela a efervescência do que
é produzido criativamente no espaço urbano e seu potencial econômico. Para outros, como
Seixas e Costa (2011) e Reis e Urani (2011), o enfoque da produção se translada à prevalência
de um ambiente capaz de gerar, capacitar, atrair e reter talentos que sustentem essa criatividade
e seu valor econômico agregado. E ainda outros, como Florida (2011) que veem a essência da
cidade criativa na confluência entre capacidade de geração tecnológica, formação de uma
mentalidade aberta e tolerante e atração de talentos. Tais abordagens não são conflitantes e nem
exclusivas, direcionando, porém, o olhar a ângulos específicos da questão.
É com base nesse pensamento que Landry (2011), a partir de seus estudos analíticos
sobre o tema, apresentou pela primeira vez na década de 1990, um conceito de cidade criativa.
Intrigado pelo fato de algumas cidades prosperarem e outras não, o autor concluiu que a cidade
criativa é uma ferramenta para a inovação urbana.
A cidade criativa é “[...], portanto, uma mensagem clara para estimular a abertura
mental, a imaginação e a participação pública. Isso tem um impacto enorme na cultura
organizacional” (LANDRY, 2011, p. 10). Desse modo, são novas formas de organização que
provocam o surgimento de novidades categóricas de pensamento, planejamento e atuação na
resolução das dificuldades urbanas. Para Cruz (2014), todas as cidades podem ser classificadas
como criativas - umas em maior grau e, outras, em menor grau. Para tanto, uma infraestrutura
criativa deve ser um mix de “[...] hard e soft, incluindo a infraestrutura mental, o modo como
a cidade lida com oportunidades e problemas, as condições ambientais que ela cria para gerar
um ambiente e os dispositivos que fomenta para isso, por meio de incentivos e estruturas
regulatórias” (LANDRY, 2011, p. 14).
Entretanto, para Rotem (2011, 139-140), a criatividade humana não pode ser pesada
ou medida. Provavelmente não há um nível único de criatividade, a partir do qual uma pessoa
poderia pertencer a essa classe criativa. Assim, deve possibilitar o surgimento de ambientes
instigantes para todos os indivíduos e não apenas a uma pequena parcela populacional. Dessa
forma, “[...] o espaço público não deve ser pensado em função dos criativos, mas como um
lócus para fomentar a criatividade de todos” (CRUZ, 2014, p. 29).
Outra perspectiva sobre a cidade criativa é delineada por Reis e Urani (2011) que
abordam a diversidade e a efervescência do que é produzido criativamente no espaço urbano,
cujo ambiente gera, capacita, atrai e retém talentos que sustentam a criatividade e os valores
econômicos agregados. Assim, afirmam que uma Cidade Criativa – independentemente de sua
escala, de seu contexto socioeconômico ou de seu histórico – apresenta três características
básicas: “[...] primeira dela são inovações; a segunda característica são as conexões; e, a terceira
é cultura” (REIS; URANI, 2011, p. 33).
Percebemos que o incentivo às áreas de cultura e criatividade são – ou devem ser – prioridades
no planejamento urbano das cidades. Hoje, elas partem do princípio de que os centros criativos
em atividade contribuem bastante para que uma cidade seja considerada atraente ou bem-sucedida.
Isso não é novidade, pois artistas e agentes culturais sempre marcaram de maneira duradoura
os espaços urbanos. A novidade é que as pessoas criativas estão passando a ser vistas também
como potencial econômico para o desenvolvimento urbano. E isso não se dá por acaso. Com
isso, os espaços prósperos têm atrativos para pessoas de diferentes grupos etários. Na compreensão
de Vivant (2012), a cidade criativa privilegia a revalorização dos espaços urbanos, mas correndo
sempre o risco de se tornar uma cidade dual, ao rejeitar seus concidadãos de baixa condição
econômica (VIVANT, 2012, p. 23-24).
Portanto, a cidade criativa não é aquela que apenas congrega artistas, mas que esti-
mula a criatividade e/ou inovação em todos os campos, acolhendo a diversidade como um rico
ecossistema, propiciando o maior número de trocas e interações entre seus habitantes e todos
os seus usuários.
Lazer
Com isso, percebe-se que os espaços têm o poder de atrair e surpreender as pessoas.
E, desta forma, não se deve apenas entender, é necessário enxergar que a cidade possui
compassos distintos. Para Cruz (2011, p. 27), o estudo e o diagnóstico do espaço urbano são
fundamentais uma vez que evidenciam acontecimentos históricos, sociais e espaciais, além de
estar composto pela existência de afinidades sociais, construções urbanas e ainda usos,
sentidos imagens e construções mentais que precisam ser analisadas e associadas.
Assim, a vida da cidade moderna apresenta uma funcionalidade através das novas
relações do homem com o mercado e, deste modo, a vida passa a direcionar-se por meio
da novidade e da possibilidade ou sonho de uma condição de viver melhor, de bem-estar e satisfação.
Com isso, passar a produzir formas específicas de se relacionar, que possibilita o surgimento de
tecido de sociabilidade. A partir disso, a cidade disponibiliza também momentos e lugares de
prazer, diversão, exaltação, distração e euforia. E para isso, é necessário tempo para desfrutar o
espaço que oferece atratividade (RHODEN; MARTINS; PINHEIRO, 2013, p. 118-121).
Há, no entanto, que distinguir tempo livre, ócio e lazer na contemporaneidade, por
causa das confusões de entendimento em relações a esses três conceitos no Brasil. Entretanto,
no objetivo aqui é discutir o conceito de lazer que é interesse do nosso trabalho. Assim, o termo
tempo livre se opõe ao trabalho e sugere o tempo de reposição da energia para o trabalho, na
dialética dos atributos do capitalismo (AQUINO; MARTINS, 2007, p. 484).
Outro autor que discuti o lazer é Renato Requixa. Ele entende o lazer como “[...] uma
ocupação não obrigatória, de livre escolha do indivíduo que a vivencia e cujos valores propiciam
condições de recuperação e de desenvolvimento pessoal e social” (REQUIXA, 1977, p. 11). Na
sua interpretação, apresenta que o espaço urbano industrial consentiu que o trabalhador fosse
tivesse um tempo livre, com o intuito a aumenta-lo, que ocasionaria o consumo. Sua análise é
importante sobre o entendimento do lazer no Brasil, por nortear a compreensão de que o tempo
liberado é um fator imprescindível para a ampliação do lazer e do indivíduo.
Portanto, o lazer passa, aos poucos, a integrar outra parte do sistema produtivo capitalista.
Assim, na cidade contemporânea o lazer se expande e se configura em lugares que não apenas
elevam o consumo, mas que promove a sociabilidade através de atrativos lúdicos e culturais
que servem para valorizar a cidade e as tradições e, sendo ainda, de distração no intuído de
reduzir preocupações e refugiar-se do cotidiano.
Com isso, podemos afirmar que Caicó é uma cidade criativa, aonde a cultura e o lazer
vêm desempenhando um papel fundamental em seu desenvolvimento. Como sabemos, a cidade
criativa se desenvolve numa vertente do capitalismo e se a cultura integra essa mesma lógica,
qual o espaço do lazer? De que maneira, se desenvolvem o lazer perante a as promoções culturais
contemporâneas? Viajemos agora por alguns casos da cidade do Caicó-RN.
Fazendo com que a cultura seja preservada né, na cidade de Caicó, no sertão,
procuramos fazer com as apresentações culturais, elas possam trazer realmente uma
mensagem que possa ajudar na interação social, do povo que tá participando
do Pavilhão Cultural de Sant’Ana e fazer com que realmente haja essa integração
de quem está em Caicó, quem vem de longe e as pessoas que passam o ano todo
esperando esse momento para estar presente. Então, assim o Pavilhão Cultural tem
o objetivo de atrair e unir pessoas, e que num clima familiar e cultural possamos
festejar e dialogar, e aí tendo como ponto marcante o reencontro entre amigos, familiar e
visitante que é típico do seridoense, mantendo e fortalecendo os laços afetivos
(Alcivan Araújo, Pároco da Catedral de Sant’Ana).
degustam as iguarias locais. Nesse espaço, há uma conexão interessante entre a música, gastro-
nomia, cultura e sociabilidade que integram e encantam o público presente, fazendo com que
permaneçam e retornem a esse ambiente sacro profano.
Esse espaço além de ter sido palco das relações econômicas e revoltas locais, foi também
espaço tanto da comercialização de escravos quanto marco da liberdade dos mesmos. Sendo
esse espaço um marco do movimento abolicionista em Caicó, no qual os seus integrantes se
reuniam e concediam cartas de alforria, libertando os cativos. Dessa forma, as modificações na
estrutura física da praça continuaram. O coreto de madeira foi substituído por um de alvenaria
em 1931, permanecendo até 1943, quando foi substituído pelo que existe até hoje. O nome Praça
da Liberdade permaneceu assim até o final da década de 1990 quando foi modificado para o
atual: Praça Senador Dinarte Mariz. Entretanto, continua a ser chamada na memória do povo
de Praça da Liberdade.
[...] o Coreto Musical é um projeto que busca valorizar nossa cultura de raiz. E aí, a
prefeitura e a gente disponibiliza e organiza a estrutura física que auxilia na promoção
desse projeto importante para a cidade e para cultura né. Entramos em contato com
as prefeituras por meio de telefone e ofício convidando a participar do evento. As
atrações são as Bandas Filarmônicas da região do Seridó, que apresentam seus ma-
teriais musicais e que abrilhantam as dez noites da festa da padroeira. Sim, também
a centenária Banda Filarmônica Recreio Caicoense, abrilhanta os festejos religiosos
e culturais de festa de Sant’Ana, e ela apresenta-se tanto no início quanto no final do
projeto. Todo dia após a apresentação de uma Filarmônica, tem um cantor da terra
se apresentando e contribuindo para o engrandecimento do evento (Edcarlos Soares,
Coordenador do Departamento de Cultura da Secretaria Municipal de Educação,
Cultura e Esportes).
Assim, o Projeto Coreto Musical (figura 3) tem por objetivo revitalizar o espaço e ponto
cultural, “O Coreto da Praça da Liberdade”, oferecendo à população e ao público da festa um
ambiente acolhedor, romântico e saudável, através de músicas de boa qualidade e tornando-se
num ambiente de sociabilidade, reunindo várias gerações e famílias nesse espaço público. No
palco, a Filarmônica José Raimundo Cavalcante do Município de Jardim de Piranhas, que
Várias histórias transcorreram durante décadas nessa praça, que modificaram e identificam o
cotidiano caicoense. Essas rupturas e continuidades são importantes para que os lugares
possam ser identificados ou não, e que sejam consumidos pelos frequentadores dos espaços.
Antes identificado como lugar de comercialização de produtos e escravos e, posteriormente,
ambiente para a sociabilidade durante os festejos sociorreligiosos da cidade. Observamos essas
transformações no uso do espaço durante o tempo, passando a ser na atualidade um ponto de
lazer e entretenimento na cidade. A mais ou menos duas décadas, na Praça da Liberdade, as
atrações musicais da Festa de Sant’Ana se apresentavam no alto do coreto e, atualmente é
anexado uma estrutura metálica (palco) que serve agora para as apresentações das Filarmônicas
e para os músicos locais. Além disso, “o espaço é constituído por tendas e cadeiras para que os
participantes da festa possam consumir o espaço de maneira organizada e agradável” (Diário
de Campo, 29 de julho de 2015). Esta passa a representar um novo modo de releitura do
passado, utilizando a temática da musicalidade para simular uma história, um período áureo da
cidade.
Outro espaço público utilizado pela prefeitura para a organização e promoção de eventos
durante a festa da padroeira - identificado a partir do relato de Eliana da Nóbrega como o principal
espaço de realização da Festa - é o Complexo Turístico Ilha de Sant’Ana, mas que a festividade
Mas existem só esses lugares, a cidade tem outros espaços que acontecem eventos
que não são de nossa responsabilidade, falado da gestão municipal. A gente pode
citar como exemplo, o Largo da Matriz, que acontece vários eventos religioso e
social, tem também a Praça de Alimentação que são vendidos vários tipos de comida
típica e de outras comuns. Temos que lembrar né, da Casa de Cultura e da Casa de
Pedra Coletivo de Arte, espaço importante da nossa cultura, além de ruas e bares
como o Bar do Ferreirinha, que é ponto de encontro de artistas e poetas locais que
promovem a festa e a cultura daqui (Edcarlos Soares, Coordenador do Departamento
de Cultura, da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Esportes).
O Complexo Turístico Ilha de Sant’Ana (figura 4) é uma praça pública construída sobre
uma ilha localizada no rio Seridó, no centro da cidade de Caicó-RN. O nome foi escolhido em
homenagem à padroeira da cidade e a proximidade com a catedral. Seu objetivo é incrementar
o turismo de eventos na região. Esse complexo está nas imediações do centro histórico-cultural,
comercial e religioso do município. Sua área urbanizada compreende um espaço de aproximadamen-
te de 147 mil metros quadrados, com toda a infraestrutura de suporte ao complexo como
estacionamento, pontes, avenidas, parques, passarelas, praça de alimentação (quiosques), anfiteatro
e banheiros. A partir da imagem, observa-se que o complexo é um parque temático em que a
diversão e o lazer são os carros-chefes desse espaço público, auxiliados por uma infraestrutura
que possibilita ao frequentador consumir vários serviços como alimentação, diversão, artesanato,
dentre outros.
13 Eivado pelo imaginário mestiço da região, o Poço de Santa’Ana foi por muitos anos a principal fonte de abaste-
cimento de água para a cidade, fosse para fins domésticos ou de construção. O lugar decantou também a enérgica
resistência popular quando em Caicó um grupo de pessoas, na revolta “Quebra-Quilos”, em 1873, contra a adoção
do sistema métrico-decimal no Império, atirou ao poço quilos de pesos metálicos.
14 A Feira de Artesanato do Seridó (FAMUSE) é uma feira que reúne expositores e artesãos da região do Seridó
Potiguar e é realizada durante a Festa de Sant’Ana. Esse evento compõe os atrativos da Feirinha de Sant’Ana. Em
2015, a FAMUSE foi aberta na noite do dia 29 de julho, com a participação de estandes de várias regiões do Brasil.
Na sua 32ª edição, O tema escolhido para este ano foi “Chuva de Talentos no Sertão do Seridó”, que tem um sig-
nificado especial, com o sofrimento de uma grande estiagem, os talentos serão explicitados no bordado, na palha,
argila dentre outros produtos feitos pelas mãos talentosas dos artesãos.
[...] um espaço importante na promoção de eventos, por causa do seu grande espaço
e infraestrutura existente que ajuda na realização dos eventos, e aí os quiosques são
exemplos onde nós podemos encontrar a gastronomia local como a tradicional carne
sol e a paçoca, acompanhadas pelo arroz de leite, macaxeira e vinagrete. Mais hoje
a gente vê que tem outros tipos de comidas que não são da nossa cultura, mas que
já estão incorporados no nosso dia a dia como a pizza, o filé à parmegiana, né, bem
conhecido aqui, além de panquecas, camarão e outros tipos. A venda gastronômica
e os eventos contribuem na geração de emprego e renda. Durante a Festa, o principal
evento da Ilha é a FAMUSE, que objetiva divulgar, promover e comercializar o
artesanato da nossa região do Seridó. Como também, são realizados alguns eventos
de entretenimento como shows musicais, aberto ao público (Edcarlos Soares,
Coordenador do Departamento de Cultura da Secretaria Municipal de Educação,
Cultura e Esportes).
Assim, o salão do evento da FAMUSE é composto por vários estandes, nos quais, é
possível encontrar os mais variados tipos de artesanato e arte, em diversos tamanhos, formatos,
estilos, cores e materiais. Durante os dias de realização do evento, centenas de pessoas passam
pelos corredores prestigiando, observando e consumindo os bens culturais disponibilizados
nesse espaço de produção da arte e cultura.
O Sobrado do Padre Guerra (figura 6) teve sua construção iniciada em 1810 e ficou
concluído no ano de 1811 e sua edificação assobradada revolucionou as técnicas de construção
até então vigentes na região - pelo formato em que a casa tem um piso térreo e um andar encima
-, sendo um marco para a época e impulsionando o desenvolvimento urbano de Caicó. Ainda
hoje, apresenta-se como um lugar de memória evocativo da relação de Brito Guerra com a cidade,
isso se deve, não necessariamente ao fato do referido sobrado está soerguido, mas também as
histórias que povoam a memória dos seridoenses. Hoje, esse sobrado se tornou na Casa de Cul-
tura Popular, sendo “um cenário para atrativos e atividades culturais e de lazer, que reconta a
história sertaneja através dos utensílios, móveis domésticos e arte sacra por meio do seu museu”
(Diário de Campo, 31 de julho de 2015). Além disso, existe o espaço para demonstração da
arte caicoense e a direção da Casa de Cultura Popular em conjunto com a Associação União do
Sobrado organiza, desenvolve e promove atividades e eventos de cunho artístico-cultural que
potencializa os atrativos locais, servindo para mesclar o passado de glória com um presente
efêmero que valoriza as tradições e raízes da cidade.
Dessa maneira, a Casa de Cultura Popular funciona nesse prédio - que fica ao lado da
Catedral -, e mantém uma parceria com a Associação União do Sobrado, a qual desenvolve
atividades através do Ponto de Cultura Sobrando Arte no Sobrado. Através da imagem,
verifica-se uma mescla na tematização do espaço, utilizando aspectos modernos – o grafite na
personalização das paredes - e tradicionais, com a customização das mesas com tecido típico
da região sertaneja conhecida como “chitão” e o espaço antigo de referência da história local.
Nesse espaço, a atratividade é composta através da musicalidade local e comercialização de
comidas típicas e bebidas tanto alcoólicas como não alcoólicas.
15 A Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte foi instalada em 2 de fevereiro de 1835. O primeiro Presiden-
te da Casa foi o Padre Francisco de Brito Guerra. Coube ao prelado a missão para instalar e presidir o Legislativo,
numa época de crise política e institucional que tomou conta do Brasil nos primeiros anos após a Independência.
Considerações finais
Assim, compreende-se que os eventos estudados fazem parte das dinâmicas culturais,
sociais e econômicas locais, verificando que esses atrativos articulam várias representações de
empreendedores culturais para a promoção da festa e da cidade. Por outro lado, o lazer ampara
tantas possibilidades e, sobretudo no nosso contexto cultural contemporâneo, que está voltado
à ideia de entretenimento, diversão e consumo dos produtos da indústria cultural, sendo que,
é tomado como tempo liberado. Nesse viés, podemos relacionar o lazer e a Cidade Criativa a
partir da promoção cultural e do seu consumo, que se concretiza por meio da busca de
experiências e vivências que estão relacionados à concentração de atrativos lúdicos e criativos
nos espaços da cidade.
Dessa forma, em Caicó-RN a relação entre a criatividade e lazer durante os festejos alusivos
à santa padroeira, pode ser identificada através da produção cultural que engloba atrativos de
diversão, distração, entretenimento e tempo livre que é consumido tanto pelos residentes quanto
por visitantes e turistas. Essa produção cultural e lúdica concentra-se no “corredor cultural
da festa”16, especialmente nos espaços da Praça do Coreto (musicalidade), Praça da Matriz
(musicalidade e gastronomia), Casa de Cultura (musicalidade, gastronomia, arte e memória),
Complexo Turístico Ilha de Sant’Ana (musicalidade, gastronomia, arte, paisagem, turismo,
entretenimento e diversão). Com isso, cria-se um lugar adequado à produção e ao consumo da
cultura que contribui para a dinamização dos espaços e da cidade. Além disso, ressalta-se que,
a criatividade nessa cidade é permanente, não estando condicionada apenas a esse momento
festivo.
16 O Corredor Cultura da Festa de Sant’Ana está concentrado da Avenida Seridó que é a principal via de acesso
a Catedral de Sant’Ana.
dois aspectos: ambiente criativo (que envolve planejamento e apoio público, espaço e classe
criativa) e os atrativos culturais.
Referências
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VIVANT, Elsa. O que é uma cidade criativa? São Paulo: Editora SENAC, São Paulo, 2012.
O estudo da economia mundial, por seu dinamismo, comporta várias ramificações, cada
uma voltada para um segmento produtivo, seja na área de produção, consumo, industrialização ou
outros. Dentre as várias ramificações em que se divide, uma das mais recentes é a chamada
Economia Criativa, que estuda os novos elementos econômicos em destaque na atualidade,
como elementos culturais, tecnológicos e sociais, que tem como principal impulsora do
desenvolvimento a criatividade, levando em conta os novos componentes que até então integravam
outros contextos econômicos e que passam a ser protagonistas das pesquisas econômicas com
o desenvolvimento os estudos sobre a Economia Criativa.
[...] aqueles cujas atividades produtivas têm como processo principal um ato criativo
gerador de um produto, bem ou serviço, cuja dimensão simbólica é determinante do
seu valor, resultando em produção de riqueza cultural, econômica e social (BRASIL,
2012, p. 22).
[...] tem como matéria prima o conhecimento aliado à criatividade. E o valor de seus
produtos e serviços guarda estrita relação com a capacidade criativa e inovativa de
seus produtores. Esta é sua especificidade e sua força. Este novo conceito engloba
atividades antigas como o artesanato, a produção de filmes ou de música, a produção
de artes cênicas e visuais, entre outras.... Mas inclui atividades contemporâneas
(em geral usando tecnologias emergentes) como a produção de softwares de
entretenimento, a produção para televisão, a propaganda, a arquitetura criativa, o
design de moda, a produção das mídias eletrônicas, a produção de áudio visual, entre
outras (BACELAR, 2012, p.112).
Uma das principais características das Indústrias Criativas são os valores e natureza
variáveis ligados, sobretudo, à natureza dos mesmos, o que significa que podem ser bens de
natureza material (peças de artesanato, por exemplo, cujo valor pode ser medido pela comparação
com produtos semelhantes) ou de natureza imaterial (como as obras de arte, que ao valor
material é agregado o valor artístico subjetivo da peça). Santos-Duisenberg (2012, p. 77), ao
falar sobre a importância da Economia Criativa na economia brasileira, afirma que ela dinami-
za o crescimento econômico, gerando empregos e divisas e contribuindo para “[...] a redução
da pobreza e a inserção de excluídos e minorias”, o que facilita as [...] interações entre o setor
público e o privado, associando negócios, fundações, ONGs e filantropia” (SANTOS-DUI-
SENBERG, 2012, p.77).
A Secretaria da Economia Criativa (SEC) foi criada no Brasil em 2012, tendo como
principais atribuições planejar, promover, formular, efetivar e sistematizar: ações para o
desenvolvimento e fortalecimento econômico das expressões culturais brasileiras em todos os
segmentos da cadeia produtiva; ações de promoção dos bens e serviços culturais no Brasil e no
exterior; ferramentas e modelos de negócio sustentáveis para empreendimentos culturais; po-
líticas de amplo acesso ao livro e à leitura; oferecer linhas de financiamento para empreendimentos
culturais; fortalecer o acesso à leitura por meio de bibliotecas públicas; e articular e conduzir
o mapeamento da economia da cultura brasileira. A criação da SEC ampliou os horizontes de
pesquisa na área ao estimular o estudo integrado da economia e da criatividade de forma mais
sistemática, assim como das políticas públicas voltadas para esse segmento econômico. Esse foi
um passo importante na busca por políticas que levassem à dinamização econômica de setores
ligados à criatividade, que até então eram considerados pouco relevantes economicamente,
assim como criou um direcionamento não apenas somente das políticas públicas voltadas para
os setores criativos, mas também possibilitou o estudo da aplicabilidade desses novos conceitos
na economia brasileira.
tem como matéria-prima a criatividade mas que possuem, em seus quadros, profissionais que
não trabalham essencialmente com a criatividade, assim como empresas que não se situam nos
setores criativos, nem tem profissionais criativos, mas cuja atividade é essencial para a existência
dos empreendimentos criativos. Essas empresas e profissionais foram avaliados independentemente
da atividade econômica que desenvolvem e onde a desenvolvem, porém, todas elas estão, de
alguma maneira, ligadas à Indústria Criativa.
O Mapeamento da FIRJAN é realizado desde 2004, tendo sua mais recente atualização
em 2019, mantendo sempre a proposta de identificar o comportamento da Indústria Criativa no
Brasil, ressaltando as diferenças entre os diversos setores da economia, assim como avaliando o
desempenho da Indústria Criativa na série histórica iniciada em 2013 (FIRJAN, 2019, online)18
O cenário recessivo dos últimos anos causou uma estabilização na participação do PIB
Criativo no PIB brasileiro quando visto sob a ótica da Produção, fazendo com que essa participação
fique em torno de 2,62%, com pequenas oscilações desde o início do Mapeamento. Em 2017 o
PIB Criativo respondeu por R$ 171,5 bilhões do PIB nacional, equivalente a 2,61% de toda a
riqueza gerada no país. A análise do Mercado de Trabalho formal na Indústria Criativa mostra
a existência de 837,2 mil profissionais formalmente empregados em 2017, contra os 892.519
profissionais criativos listados na pesquisa de 2014 (decréscimo de -3,9% no número de
profissionais criativos atuantes em relação à pesquisa publicada em 2015). Nesse mesmo período
(2015-2017), o Brasil teve cerca de 1,7 milhão de postos de trabalho encerrados e pode-se
observar um aumento na busca por profissões criativas, especialmente as ligadas aos segmentos
de Biotecnologia, TIC e P&D.
Segundo a FIRJAN (2019, online), a Economia Criativa, que era considerada como um
nicho de mercado “[...] passou a ser parte essencial da cadeia produtiva, um insumo tão relevante
quanto o capital, o trabalho e as matérias-primas para uma quantidade cada vez maior de
setores”. De acordo com o Mapeamento da FIRJAN (2019, online) a remuneração em todas as
quatro grandes Áreas Criativas da Indústria Criativa se manteve superior à média da economia,
apesar da crise. O estudo afirma ainda que, em 2017, o rendimento mensal médio do trabalhador
brasileiro foi de R$ 2.777,00, enquanto rendimento dos profissionais criativos atingiu o valor
de R$ 6.801,00, ou seja, 2,45 vezes superior. Foi observado também crescimento salarial nos
segmentos criativos com menores níveis salariais, o que reduziu a desigualdade da renda na
Indústria Criativa.
A principal área criativa ainda é a de Consumo, que responde por 43,8% dos trabalhadores
formalmente empregados, mesmo com uma retração de 4,2% nos empregos na área. O segmento de
Publicidade & Marketing foi o que registrou maior avanço com relação aos vínculos formais,
com um aumento de 9,5% em relação ao mapeamento anterior de todos os 13 segmentos criativos
analisados pela FIRJAN. Também houve o registro de diminuição no número de trabalhadores
nos setores criativos de Arquitetura, Moda e Design, sendo a queda no segmento da Arquitetura foi o
mais intenso entre todos os segmentos criativos, estando diretamente relacionado à diminuição
no poder de compra das famílias e, consequentemente, nos investimentos, o que também afetou
a Construção Civil (FIRJAN, 2019, online).
Outros setores que também registraram crescimento foram os de Design e Moda, com
destaque para os segmentos ligados às transformações digitais e customização, especialmente
nas profissões de Designers de Produtos, Designers Gráficos e Designers de Moda. Finalmente,
o segmento de Mídias manteve a tendência de retração (-8,5%) especialmente no segmento
Editorial (Jornalismo), porém, com certo crescimento nos segmentos ligados ao relacionamen-
to com os clientes, sobressaindo-se as profissões de Editor de Mídia Eletrônica e Assessor de
Imprensa. Essa tendência foi observada também no setor de audiovisual, no qual profissões
ligadas a mídias tradicionais, como Montadores de Filmes, Locutores de Rádio e Televisão
e Fotógrafos Profissionais tiveram queda significativa, ao contrário das ligadas ao segmento
digital, que apresentaram ligeira ascensão (FIRJAN, 2019, online).
De acordo com o IBGE (2020, online), o salário médio mensal em Campina Grande em
2018 era de 2,2 salários-mínimos e a proporção de pessoas ocupadas em relação à população
total era de 27,0%. Considerando domicílios com rendimentos mensais de até meio salário-mínimo
por pessoa, Campina Grande tinha 39,5% da população nessas condições, o que a colocava na
posição 220 de 223 dentre as cidades do estado e na posição 2.810 de 5.570 entre as cidades
do Brasil (IBGE, 2020, online). O PIB per capita em 2017 era de R$ 21.077,30 e o Índice de
Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) em 2010 era de 0,720.
diferentes naturezas, tais como o Encontro da Nova Consciência, o Alterna Vida, o Festival de
Inverno e o mais famoso deles, “O Maior São João do Mundo”, que acontece na cidade desde
1983 (PREFEITURA, 2020, online)20.
Eventos como “O Maior São João do Mundo”, por suas características próprias, leva
a uma reflexão sobre como as novas formas de expressão cultural assumem novas identidades
quanto à lógica de consumo e às mudanças culturais nas quais se encontram inseridos. O
caráter tradicional da festa, cujo escopo eram os costumes tradicionais arraigados dentro da
comunidade, foi substituído pelo caráter multilocal e globalizado, no qual as tradições agregam
novas tendências em vários setores, sejam eles culturais ou não, e acabam por projetar uma
nova imagem da cidade a partir do evento. Os setores criativos presentes no evento, especialmente os
ligados à cultura, fazem com que o evento se renove a cada ano, tanto pela mudança anual do
tema escolhido para a festa, como pela inovação nas criações artísticas, nos materiais utilizados
para a formatação do evento e nas relações econômicas envolvidas.
Mossoró se destaca por diversos fatos históricos, como a abolição dos escravos em 1883
(cinco anos antes do resto do país), o Motim das Mulheres, em 1875, o primeiro voto feminino,
em 1928 e a resistência ao bando de Lampião, em 1927. Tais eventos ajudaram a formatar as
características turísticas da cidade, o que acabou por estimular a melhoria da infraestrutura
turística local, somada aos fatores culturais já existentes e desenvolveu um grande potencial
para eventos festivos, tais como o Mossoró Cidade Junina (MCJ), que se desenvolve ao unir o
festejo junino à cultura local, desenvolvendo o potencial turístico local.
O evento Mossoró Cidade Junina, tal como seu principal concorrente, o Maior São João
do Mundo, em Campina Grande, tem duração de 30 dias, acontecendo anualmente entre os meses de
junho e julho. O evento agrega uma variedade de atrações culturais, tais como grandes shows
de artistas nacionais, festival de quadrilhas juninas e mais de trinta projetos culturais espalhados
por todo corredor cultural (Prefeitura Municipal de Mossoró, 2020, online). Dentre os atrativos
do Mossoró Cidade Junina, destacam-se: Pingo da Mei Dia (bloco junino que promove a abertura
oficial do evento); Circo do Forró (espaço voltado para o tradicional forró pé de serra com trios
de sanfoneiros); Cidadela (rua cenográfica que reproduz as antigas cidades de interior e que
inclui o palco da apresentação cultural principal, a praça de alimentação, botecos e bodega
para venda de artesanato); Memorial da Resistência (ambiente com apresentações culturais e
shows de músicas instrumental); Burro-taxi (carroças que fazem o percurso nas mediações do
corredor cultural); Pau de Arara Eletrônico (resgatando a tradição de moradores da zona rural
que utilizavam esse transporte para se locomover das comunidades para a cidade, o carro é
ornamentado de acordo com as características juninas); Projeto Brinquedos e Brincadeiras
Populares (resgatam a tradição dos brinquedos artesanais e as brincadeiras antigas); Projeto
Botando Boneco (apresentação de mamulengos); Festival de Pífaros e Cabaçais (instrumentos
utilizados pelo sertanejo); Jegódromo (projeto que busca resgatar a importância do jumento
através de uma competição de corrida); Chuva de bala no país de Mossoró (representação teatral e
musical que mostra a invasão e expulsão do bando de Virgulino Ferreira, o Lampião na cidade),
dentre outros eventos que acontecem no período (SILVA; BRITO, 2016, online).
A análise dos dados referentes aos setores criativos que se destacam no “O Maior São
João do Mundo” e no “Mossoró Cidade Junina” está no fato de que esses eventos têm grande
importância para a economia local, embora sejam sazonais e tenham natureza predominantemen-
te imaterial. Os segmentos criativos “Cultura” e “Consumo”, juntamente com as atividades
relacionadas a esses segmentos e as atividades de apoio, destacam-se antes, durante e após o
evento na dinamização da economia local. Porém, nossa pesquisa revelou que essa importante
participação não está presente nos números do Mapeamento da FIRJAN porque grande parte
dos profissionais que atuam nos setores criativos identificados nesses eventos encontram-se na
informalidade, ou seja, não há registros deles nos órgãos oficiais e, por isso, não entram nas
estatísticas nem do IBGE, nem da FIRJAN, seja em relação aos dados referentes aos municípios
pesquisados, seja em relação à economia brasileira como um todo. Ainda assim, os dados do
IBGE e da FIRJAN são muito importantes para as pesquisas sobre Economia Criativa no Brasil
por serem as únicas fontes de dados concretos sobre os profissionais e os Setores Criativos no
país. Além disso, esses dados também são apresentados por estado e município, o que facilita
a análise da contribuição econômica dos Setores Criativos nos três níveis (federal, estadual e
municipal), bem como a comparação entre eles.
Junina” revela a importância desses setores na dinamização da economia local, pois envolvem
toda a cadeia produtiva (matéria-prima, produto final, mão-de-obra e serviços especializados,
entre outros).
21 Ver Quadro 1
22 https://www.firjan.com.br/economiacriativa/pages/default.aspx Acesso em 04 out 2020
Conclusão
Uma percepção a partir dessa pesquisa é que os números de profissionais atuantes nos
segmentos criativos e na remuneração destes continuam não refletindo nem o número real
nem a remuneração dos mesmos e isso leva à uma reflexão sobre quais os motivos que levam
os institutos de pesquisa oficiais não implementarem pesquisas com o mercado informal, tão
importante para a economia do país. Além disso, deve-se levar em consideração que os tra-
balhadores informais têm a percepção de que a formalização ainda é considerada como muito
burocrático e caro, assim como pode-se inferir que esses profissionais talvez atuem em outras
áreas formalmente, tendo o trabalho artístico como segunda ocupação ou hobby e por isso não
se encontram devidamente registrados.
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VIVANT, Elsa. O que é uma cidade criativa? São Paulo: Editora SENAC São Paulo. 2012.
Introdução
23 Mestra em Estudos Urbanos e Regionais pelo Programa de Pós Graduação em Estudos Urbanos e Regionais
(PPEUR/UFRN). E-mail:araujo.acba@gmail.com
PAIVA; BRANT, 2016), evidenciando a necessidade da busca por alternativas que superem os
desafios impostos pelos problemas do desenvolvimento urbano e regional.
Nesse sentido, o objetivo deste capítulo é discutir como as propostas de cidades sustentáveis
(CS) podem ser consideradas alternativas aos impactos socioambientais do desenvolvimento
urbano e regional. Considerando como princípios básicos para agendas dessas propostas tornar
as dinâmicas urbanas e regionais (no caso de cidades metropolitanas) mais sustentáveis,
resilientes e adaptáveis às mudanças climáticas, e, na maior parte das propostas, visando aliar
o desenvolvimento urbano e regional com dinâmicas socioambientalmente e economicamente
sustentáveis.
Por isso, é crescente a busca por modelos urbanos que sanem os problemas da insus-
tentabilidade do desenvolvimento, trazendo alternativas para o planejamento e a gestão
de arranjos urbano-regionais, como as regiões metropolitanas (aqui compatíveis com a
discussão de cidades metropolitanas de Manuel Castells e Jordi Borja). Nos fóruns, congressos,
discussões acadêmicas e conferências políticas internacional, as propostas mais aceitas como
para sanar os problemas socioambientais, na atualidade, implicam em propostas como as das
cidades sustentáveis.
Dentre várias propostas para a sustentabilidade urbana como cidades verdes, ecológicas,
saudáveis, adaptáveis, inteligentes, entre outras, nas últimas décadas ocorreu a popularização
das soluções propostas pelas Nações Unidas (ONU) baseadas no contraditório discurso de
desenvolvimento sustentável (DS), segundo explicam PESSOA (2012) e PRADO (2015).
Por isso, a leitura dos resultados dos IDRUCS aborda uma questão reflexiva sobre o
próprio modelo capitalista de desenvolvimento, de forma que compreende-se que sem a
mudança de paradigma do desenvolvimento capitalista para uma racionalidade ambiental, não
há possibilidades de internalização dos princípios de CS. Assim, considera-se também aqui
que as CS são alternativas aos problemas do desenvolvimento urbano e regional ao seguirem a
definição de Araújo (2019, p. 71), que entende as CS como um modelo baseado na racionalidade
ambiental que define diretrizes para gestão e planejamento urbanos e se norteia nos princípios
de sustentabilidade urbana, resiliência urbana e adaptação às mudanças climáticas.
Concorda-se com Priori Jr (2015, p. 108) no sentido de que: “o desafio, para o futuro, é
tornar as cidades social e economicamente mais resilientes, de modo aceitável e viável”. Neste
mundo onde mais da metade da população humana reside em áreas urbanas, com previsões
para contínuo crescimento nos anos vindouros (ONU-BR, 2016), é preciso compreender o
crescimento dessas cidades e de suas demandas com o aumento das necessidades ambientais e
sociais para a promoção desse desenvolvimento urbano.
Nesse contexto, o autor Almeida (2012) faz uma relação entre a importância dos estudos
sobre a vulnerabilidade com os estudos dos riscos e perigos, tão presentes no cotidiano urbano,
conforme trecho a seguir:
Dessas interações sociais dentro das dinâmicas socio ocupacionais e espaciais no meio
urbano, são geradas as condições de vulnerabilidades e de fenômenos de segregação nas
cidades. Ainda analisando essas dinâmicas, recorre-se aqui ao material sobre a segregação
nas cidades do autor Vasconcelos (2013, p. 18), em que ele reforça que estas transformações se
processam a partir de artifícios “originários das mudanças atuais sobrepostas às inércias do
passado. [...], modificaram as formas das cidades, criando [...] novas desigualdades, sem eliminar os
conflitos raciais, religiosos e políticos existentes”.
Do ponto de vista social, Almeida (2012, p. 25), entende-se que o desenvolvimento das
cidades na atualidade convive intimamente com as condições de risco, que compreende-se no
texto a seguir:
O risco é um constructo eminentemente social, ou seja, é uma percepção humana.
Risco é a percepção de um indivíduo ou grupo de indivíduos da probabilidade de
ocorrência de um evento potencialmente perigoso e causador de danos, cujas
consequências são uma função da vulnerabilidade intrínseca desse indivíduo ou
grupo (ALMEIDA, 2012, p. 25).
Almeida (2012) explica que o risco é uma construção da sociedade, então, assim como
o desenvolvimento urbano, os riscos estão em todos os aspectos das cidades e regiões.
Consequentemente, o desenvolvimento urbano caracteriza-se por ser carregado de vulnerabilidades,
riscos, perigos e ameaças a desastres. Nesse caso, definem-se riscos, perigos e desastres a partir
das palavras da autora Furtado (2015) que também utiliza as definições de Almeida e do Painel
Intergovernamental de Mudanças Climática:
Partindo dessa afirmação, infere-se que, sem políticas habitacionais socialmente inclusivas,
as populações vulneráveis são frequentemente relegadas à ocupação de áreas de risco – como
encostas íngremes, topos de morros, baixadas e áreas alagáveis e margens de corpos d’água
(COELHO NETTO, 2005 apud HERZOG; ROSA, 2010, p. 94) – tornando-se ainda mais
vulneráveis na dimensão socioambiental.
Uma interpretação dessa citação de Priori Jr. (2015, p. 131) conduz à associação dos pro-
blemas urbano-metropolitanos com os problemas decorrentes dos efeitos das mudanças climáticas e
dos impactos, riscos e vulnerabilidades decorrentes das dinâmicas desse desenvolvimento.
Furtado (2015, p. 19) categoricamente afirma que “as cidades são o lócus da vulnerabilidade
aos efeitos das mudanças climáticas” e, paralelamente, Freitas e Ximenes (2015, p. 238)
corroboram com essa visão, explicando que a urbanização se percebe “[...] também no aumento
das emissões que vem contribuindo para as mudanças climáticas e seus efeitos através de eventos
meteorológicos, hidrológicos e climatológicos”.
O desconhecimento dos reais efeitos que as mudanças climáticas exercem nas cidades
fazem com que a dimensão climática da vulnerabilidade seja ainda subestimada dentro da
perspectivas de problemas ambientais mais do que dimensões de disponibilidade hídrica, segurança
alimentar, entre outras, tendo em vista a compreensão da vulnerabilidade socioclimática ser
uma abordagem considerada ainda recente. De acordo com os estudos de Darela Filho et al.
(2016), pode-se afirmar que a vulnerabilidade socioclimática seria aquela em que as condições
sociais são intrinsecamente relacionadas às condições climáticas locais, à exemplo de áreas do
semiárido brasileiro que sofrem com as secas intensas e, aliado a esse fato as precariedades
socioeconômicas, ilustram o que seria esse vulnerabilidade socioclimática.
Finalmente, nessa linha de pensamento, pode-se então afirmar que as mudanças climáticas
exercem efeito intensificado nas cidades metropolitanas, e seja com a adoção da proposta de
CS ou de outras alternativas, é preciso que estas estejam preparadas para reduzir seus impactos,
trabalhando em medidas mitigadoras e adaptativas visando minimizar as condições de
vulnerabilidades socioambientais e os riscos a desastres, a partir de alternativas que usem da
sustentabilidade e resiliência como soluções urbanas.
Considerações finais
Como consequência dessa conjuntura, além do ambiente e da vida natural ser afetada,
a própria sociedade urbana é a primeira atingida pelos impactos negativos do desenvolvimento,
agravando as questões de riscos e vulnerabilidades socioambientais nas cidades e, principalmente,
nos arranjos urbano-regionais como as regiões metropolitanas.
Nessa perspectiva, promover um modelo de Cidades Sustentáveis que não tenha como
premissa uma racionalidade ambiental em detrimento da racionalidade econômica implicaria
na manutenção das desigualdades socioeconômicas inerentes à formação espacial das cidades.
São gigantes os desafios que a adoção de uma proposta de CS tem para reverter a degradação
e abismos sociais que os processos de urbanização, metropolização e desenvolvimento econômico
provocam.
Referências
ALMEIDA, Lutiane Queiroz de. Riscos ambientais e vulnerabilidades nas cidades brasileiras:
Conceitos, metodologias e aplicações. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2012. 215 p.
contexto das regiões metropolitanas nordestinas. Orientadora: Zoraide Souza Pessoa. 2019.
167 f. Dissertação (Mestrado em Estudos Urbanos e Regionais) - Centro de Ciências Humanas,
Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2019.
FREITAS, Carlos Machado de; XIMENES, Elisa Francioli. Cidades e desastres naturais – da
Vulnerabilidade à resiliência. In: FURTADO, Fátima; PRIORI, Luiz; ALCÂNTARA, Ednéa
(Org.). Mudanças climáticas e resiliência de cidades. Recife: Pickimagem, 2015. p. 235-253
PORTO-GONÇALVES, Carlos Walter. O desafio ambiental. 3ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2012.
PRIORI JR, Luiz. Mudanças climáticas e resiliência da infraestrutura urbana. In: FURTADO,
Fátima; PRIORI, Luiz; ALCÂNTARA, Ednéa (Org.). Mudanças climáticas e resiliência de
cidades. Recife: Pickimagem, 2015. p.107-132.
SIEBERT, Cláudia. Resiliência Urbana: Planejando as Cidades para Conviver com Fenômenos
Climáticos Extremos. 2012. Belém, VI Encontro Nacional da ANPPAS. 17p
VEIGA, José Eli da. Desenvolvimento Sustentável: o desafio do século XXI. São Paulo: Garamond,
2005.
136
CAPÍTULO 8
Introdução
O Programa do Leite foi instituído pela primeira vez a nível estadual no ano de 1986,
pelo governador Geraldo Melo, iniciando sua primeira fase no período 1986/89. Interessa notar
que é uma iniciativa de caráter estadual, que financia a compra e o beneficiamento do produto
in natura, cabendo aos municípios a operacionalização no plano local (seleção das famílias
beneficiarias e distribuição do produto). Com a mudança de governo em 1990 e ascensão de
José Agripino (opositor ao grupo do antigo governador), o programa foi suspenso até o final do
seu mandato, desencadeando uma série crise no setor leiteiro do Rio Grande do Norte, tanto
por parte dos produtores/fornecedores de leite, quanto no seio das famílias que se beneficiavam
do produto.
Além disto, o trabalho contou com a formulação de dados primários, por meio de
metodologias qualitativas, que tornam o exercício permanente e cuidadoso, reforçando a
importância de interação com deduções realizadas a partir dos dados e informações secundárias,
pois, possuem papel fundamental para o teste dos pressupostos de pesquisa e para a construção
de um resultado consistente.
A Emater era o órgão encarregado pela prestação de assistência técnica aos agricultores
familiares fornecedores de leite ao programa.
Segundo o relatório da CPI do Leite (2007), das vinte e cinco indústrias de lacticínios
existentes, beneficiadoras de leite bovino e caprino, apenas quatro delas eram estruturadas
coletivamente com agricultores familiares, o que explica as mudanças de objetivos durante o
processo de institucionalização do PAA – Leite que deveria se incorporar ao Programa do Leite
já existente.
138 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
Por outro viés de análise, a partir desse propósito outros objetivos são traçados e atingidos,
estes com uma perspectiva econômica, tais como: o desenvolvimento da bacia leiteira do estado,
assim como a melhoria das condições higiênicas e de produtividade dos rebanhos leiteiros, e
ademais, a ocupação do homem do campo, que atrelava a nova atividade às que já desempenhava,
como a agricultura, a pesca e a mineração.
Estes novos arranjos davam aos produtores aparatos que viabilizassem a saída do seu
produto final in natura a um preço estável e na maioria das vezes acima dos preços de mercado,
através das ações de compra direta.
Mesmo com os valores pagos pelo programa estadual estando acima dos valores de
mercado, em quatro anos ainda eram observadas defasagens nos preços da aquisição do leite
do programa, fazendo com que os produtores ao invés de dar prioridade ao fornecimento para
a venda direta, preferissem fazer a venda para outros atores envolvidos na comercialização do
produto (intermediários, queijeiros locais, etc.).
139 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
Ainda com base no viés econômico da atuação do Programa do Leite no Rio Grande do
Norte, um dos problemas notórios do segundo período do programa, e que originou as investigações
da “CPI do Leite” tem a ver com o fornecimento do produto por determinadas usinas, sendo
estas compras realizadas sem atender os requisitos de licitação, como citado por Mineiro (2007, p. 7):
Esse procedimento veio reforçar uma situação que já vinha sendo denunciada por
Mineiro (2007) e por entidades representativas dos ‘pecuaristas de leite familiares’, como um
limitante à participação desses produtores de menor porte, fazendo com que os agricultores
familiares continuassem a ter uma tímida atuação no programa, haja vista que o novo arranjo
reforçava a condição do conjunto de beneficiadoras no RN de principal responsável pela opera-
cionalização do Programa do Leite no RN, como citam Bastos e Vieira (2009, p. 5):
140 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
Estando estes critérios estabelecidos, a Lei que instituiu o PAA, agiu como elemento
desburocratizador do processo de aquisição dos produtos provenientes da agricultura fami-
liar, tornando mais acessíveis os programas públicos, dispensando, neste caso, a necessidade
realização de pregões licitatórios requeridos pela Lei nº 8.666/93, criando, assim um aparato
jurídico, o que ensejou a participação mais efetiva do estado nos processos de comercialização
desenvolvidos por agricultores familiares.
O PAA – Leite funciona baseado na compra direta da agricultura familiar, possibilitando aos
agricultores a venda de alimentos para o estado, a preços de referência, calculados por metodologia
própria desenvolvida pela Comissão Nacional de Abastecimento (CONAB), com o intuito de
apoiar a agricultura familiar e manter estoques estratégicos de alimentos.
Como citado por Mineiro (2007), desde quando o estado do Rio Grande do Norte já
possuía o Programa do Leite, só seriam necessárias adequações do programa local às condições do
PAA – Leite. A instalação do PAA – Leite no RN sofreu resistência e distorções no público alvo
para o qual seria direcionado, levando mais dois anos para ser desenvolvido no estado. Esse
141 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
atraso teve como principal alegação a falácia de que no estado do Rio Grande do Norte não
havia agricultores familiares produzindo leite comercialmente.
Este discurso era defendido por uma classe bem articulada e com poderio político, a dos
bovinocultores, médios e grandes produtores de leite, que em sua maioria compunham o
Consórcio de Leite Potiguar, que pretendiam apropriar-se dos recursos do PAA – Leite/Segurança
Alimentar direcionados pelo MDS, de forma incorreta, haja vista que esses produtores tinham
forte inserção no mercado e, portanto, sem necessidade de apoio de um mercado institucional.
Assim, seguindo os moldes do que foi feito com o Programa do Leite anteriormente,
em 2008, em uma licitação realizada para o PAA – Leite, o Consórcio de Leite participou com
outro nome fantasia, desta vez utilizando-se da denominação Consórcio União, saindo como
vencedores.
A partir desta audiência originou-se a Rede de Controle Social, formada por entidades
governamentais e da sociedade civil organizada, com o intuito de traçar meios para efetivar o
PAA – Leite no estado do Rio Grande do Norte. A criação da Rede de Controle Social fez com
que nos encontros realizados por suas entidades membros fossem constatadas que a maneira
como era gerido o programa no estado não desagradava apenas agricultores familiares excluídos do
processo.
142 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
Diante deste panorama, houve uma prorrogação do convênio firmado de 2005 a 2007
por mais um ano, ou seja, até 2008, tendo como propósito iniciar de fato as ações do PAA –
Leite no RN, incorporando de maneira efetiva os agricultores familiares, como designado no
escopo do programa federal.
Novas leituras foram feitas a partir da criação da Rede de Controle Social com o
propósito de analisar as possibilidades de a agricultura familiar participar do PAA – Leite, no
início de suas operações no RN.
143 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
Na ocasião, vinte e duas empresas faziam parte do grupo, atualmente, o número reduziu
para quatorze empresas, que se sagraram vencedores novamente de um processo licitatório
realizado no ano de 2010 para permanecer processando o leite destinado ao programa estadual,
que atende todos os municípios do estado. Ocorreram problemas por parte das gestões municipais
com a operação da Emater no acordo de cooperação firmado, resultando na ‘fuga’ de treze
municípios, que não quiseram assinar o termo de compromisso.
Isso, posto, para que não houvessem prejuízos aos beneficiários finais do programa, o
órgão estadual se articulou diretamente com outros segmentos, religiosos ou de associativismo,
para que pudessem se responsabilizar pelo recebimento do leite das industrias e pela distribuição à
população.
Direcionando o assunto para o PAA – Leite (nível federal), de acordo com os dados
apresentados, cerca de 1.142 agricultores familiares estão inseridos atualmente no programa, o
total de participantes é o segundo maior nos últimos cinco anos de registro, atrás apenas do ano
de 2011. O total de agricultores está demonstrado no gráfico a seguir:
144 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
No entanto, como se pode observar, nessa ‘redução’ do preço do litro de leite quem
paga a conta de fato é o agricultor familiar, que teve reduzida a sua remuneração em R$ 0,06
centavos no leite bovino e teve inalterado seu valor no leite caprino, meio aos crescentes custos
de produção, enquanto nos dois casos (bovino e caprino) a indústria teve um ganho de R$ 0,06
centavos por litro.
145 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
Por mais que o objetivo traçado fosse de 100% de distribuição realizada para as
entidades, o que não foi alcançado até o presente momento, o órgão trabalha com o mínimo
estabelecido pelo programa – 30%, com um arranjo diferente do utilizado pelo Programa do
Leite – RN, no caso, incorporando o leite pasteurizado nos cardápios nutricionais escolares e
de instituições prestadoras de serviços assistenciais.
Dessa forma, no estado do Rio Grande do Norte, os outros 70% de leite adquiridos
para distribuição é repassado diretamente às famílias, diferente da orientação do Ministério
do Desenvolvimento Social, findam gerando certa confusão do que é produto do Programa do
Leite e do que é do PAA – Leite.
Desde o início das atividades do PAA – Leite, no estado do Rio Grande do Norte
foram realizados três convênios entre o MDS e entidades prestadoras de serviços, o primeiro
realizado em dezembro de 2005, sem processo licitatório.
No novo arranjo que entrou em vigor, foi retomada a divisão de funções no processo
de execução do Programa do Leite, no caso, a Emater será responsável pela parte de operacionaliza-
ção do programa e a SETHAS pela distribuição.
146 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
Informações e números do PAA – leite e o PLP no Rio Grande Do Norte no ano de 2020
Por fim, causada pelo rompimento político entre a gestão do ex-governador Robinson
Faria (2014 – 2018) e membros do Partido dos Trabalhadores (PT), fruto do apoio dado pelo
governador e seu filho, deputado Fábio Faria, ao processo de impeachment da ex-presidente
Dilma Roussef, a equipe que compunha o aparato técnico da instituição no referido período
analisado foi substituída no ano de 2016.
Nos anos seguintes, atrelada ao rigoroso período de escassez de água que perdurou no
estado do Rio Grande do Norte, o PAA – Leite não conseguiu lograr êxito em sua implementação,
deixando a desejar em seus vieses econômico e social, incidindo diretamente na vida da
população rural que possuía atividades vinculadas à produção familiar.
O governo estadual reajustou os valores pagos pelo litro do leite bovino e caprino que
são adquiridos pelo PLP, depois de quatro anos de negociações. O reajuste firmado foi de 11,1%
e começou a ser pago na segunda quinzena de setembro de 2020, ou seja, o litro do leite bovino
passou a custar R$ 2,40 ao governo, deste valor R$ 1,50 serão repassados aos produtores e R$
0,90 às empresas de beneficiamento de lacticínios. O leite caprino também sofreu reajuste e
passou a ser adquirido por R$ 3,00 (SEPLAN, 2020).
Considerações finais
147 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
Neste debate do “que muda” e “quem ganha” com os novos discursos de desenvolvimento de
Políticas Públicas para o meio rural, notamos que, o PAA – Leite, por mais que em seus
escopos deem primazia a inserção de Agricultores Familiares nos Mercados Institucionais, compra
direta, as leis por si só não conseguiam tornar plena a atuação do programa, que enfrentava
resistências maciça por parte dos produtores de leite do estado.
Novos arcabouços jurídicos foram criados a partir do ano de 2015 para garantir aos
Agricultores Familiares o direito de fornecer o leite sem que pudessem ser suprimidos pelos
grandes produtores, porém, o novo decreto, apesar de aprovado, ainda padecia de resistências
para ser implementado.
Em contraponto, o Programa do Leite Potiguar – PLP, com dados de 2019, seguiu suas
atividades com recursos estaduais, com investimentos na casa R$ 41 milhões de reais, que
adquiriram 19,4 milhões de litros de leite e atenderam um total de 70 mil famílias potiguares.
Assim, o programa se consolidou como o maior programa de aquisição e distribuição de leite
do país (SEPLAN, 2020).
Referências
BASTOS, Fernando. VIEIRA, Denis. Limites e potencialidades para inserção dos agricul-
tores familiares no PAA/Leite do RN. 47º Congresso da SOBER – 2009.
FLÁVIO, Francisco. Entrevista I. [maio 2015]. Entrevistador: Fernando Bastos. Natal, 2015. 1
arquivo .mp3 (1h, 28 min).
SEPLAN. Produção de leite aumenta no Rio Grande do Norte. Disponível em: 05/10/2020,
< http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/produa-a-o-de-leite-aumenta-no-rio-grande-do-
-norte/489149>
148 Kayck Danny Bezerra de Araújo | Fernando Bastos Costa | Vinícius Klause da Silva
CAPÍTULO 9
“Cultura como tudo aquilo que, no uso de qualquer coisa, se manifesta para além
do mero valor de uso. Cultura como aquilo que, em cada objeto que produzimos,
transcende o meramente técnico. Cultura como usina de símbolos de um povo. Cultura
como conjunto de signos de cada comunidade e de toda a nação. Cultura como o
sentido de nossos atos, a soma de nossos gestos, o senso de nossos jeitos.” (Discurso
de posse do Senhor Ministro da Cultura Brasileira, Gilberto Gil, jan./2003)
Introdução
Neste sentido, este capítulo teve por objetivo analisar a implementação das políticas
públicas setoriais direcionadas à produção cultural no Estado do Rio Grande do Norte entre os
anos de 2012 e 2015, examinando a relação existente entre seus alcances e os impactos econômicos
ocasionados pela política de financiamento indireto majoritariamente estabelecida por intermédio
das leis de incentivo à cultura. Neste sentido, a crítica central repousa na insuficiência deste
modelo de fomento que, baseado em concessões de benefícios fiscais e disposição de patrocínios,
acaba excluindo boa parte da cadeia produtiva cultural que não dispõe de assessorias especializadas
para lidar com a burocracia existente no processo de habilitação nos editais e chamadas públicas.
renúncia fiscal em âmbito estadual30, bem como a captação de patrocínio perante a iniciativa
privada para o financiamento dos projetos aprovados.
Igualmente à Lei Rouanet, a Câmara Cascudo trouxe em seu rol de partes integrantes
da relação jurídica as figuras do proponente e do patrocinador, considerando-se o primeiro
como a “pessoa física ou jurídica, domiciliada no País, diretamente responsável pelo projeto
cultural a ser beneficiado pelo incentivo” (RN, 1999), e o segundo enquanto o “estabelecimento
inscrito no Cadastro de Contribuintes do Imposto sobre operações Relativas à Circulação de
Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação do Estado do RN, que venha a patrocinar projetos culturais aprovados pela
Comissão Estadual de Cultura” (RN, 1999). Para que seja possível a execução deste patrocínio,
o patrocinador deve obrigatoriamente ser pessoa jurídica geradora do Imposto Sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS), sobre o qual será deduzido o valor de 2%, a título de patrocínio.
Neste sentido, destaca a lei:
Art. 14. O Patrocinador que apoiar financeiramente projetos aprovados pela Comissão
Gerenciadora poderá abater até o equivalente a 2% (dois por cento) do valor do
ICMS a recolher, num período único ou em períodos sucessivos, até atingir o limite
máximo de 80% (oitenta por cento) do valor dos recursos transferidos. (RN, 1999, p. 9).
No que tange o rol de possíveis grupos e iniciativas culturais beneficiados pelos incenti-
vos fiscais que são regulamentados pela lei, o legislador foi taxativo quando dispôs que as áreas
de abrangência seriam as expostas adiante:
I - a promoção do incentivo ao estudo, à edição de obras e à produção das atividades
artístico-culturais nas seguintes áreas:
b) cinema e vídeo;
c) fotografia;
d) literatura;
e) música;
g) museus;
h) bibliotecas e arquivos;
30 Mediante deduções tributárias concedidas a contribuintes do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS) que optarem por patrocinar os projetos culturais previamente habilitados.
O Programa Cultural Câmara Cascudo é uma política que, segundo o seu artigo 2°
inciso XII, foi desenvolvida com a finalidade de promover o incentivo à pesquisa, ao estudo,
à edição de obras e à produção das atividades artístico-culturais; aquisição, manutenção, con-
servação, restauração, produção e construção de bens móveis e imóveis de relevante interesse
artístico, histórico e cultural, campanhas de conscientização, difusão, preservação e utilização
de bens culturais e instituição de prêmios em diversas categorias. Seu organograma determina
a seguinte estrutura:
Após a divulgação da listagem dos projetos aprovados na Lei, através do Diário Oficial
do Estado, o proponente está apto a retirar junto à Fundação José Augusto (FJA) o seu Certificado
A lei prevê ainda uma série de vedações aos possíveis patrocinadores culturais. Assim,
é proibida a habilitação do patrocínio quando o contribuinte – pessoa jurídica – se encontra em
situação de irregularidade perante o fisco estadual (RN, 1999, p. 10). Para efeitos da lei, considera-se
a situação irregular quando observadas as seguintes hipóteses:
Quando executado o projeto, a lei exige prestação de contas, dentro do prazo de 30 (trinta)
dias, podendo ser parcial ou global, que deverá ser apresentada à Comissão da lei, constando
a discriminação detalhada dos recursos recebidos e dispensados para o projeto, de modo que
inclua a totalidade dos recursos transferidos. A prestação de contas deverá ser entregue em
formulário próprio da lei, disponível no site da Fundação José Augusto. Devem ser anexados,
além da comprovação do material de divulgação utilizado, “resumos jornalísticos, os comprovantes
originais de notas fiscais ou recibos de cada pagamento efetuado, extrato bancário demonstrando
as movimentações financeiras, demonstrativos das receitas e despesas, indicando a natureza e
origem destas e comprovante de encerramento da conta corrente” (RN, 1999, p. 12). Nos casos
em que o valor utilizado no projeto seja inferior ao depositado em conta pelo patrocinador,
deverá o proponente devolver ao Estado a diferença do valor, sob pena de figurar na lista de
inadimplentes do Estado, resultando no recebimento do processo por parte da Controladoria do
Estado e, posteriormente, do Tribunal de Contas.
A burocratização que a lei em comento exige – que apenas copia o modelo da legislação
principal da qual se inspirou – é um dos pontos pelos quais se observa uma quantidade tão
vultuosa de projetos inscritos e não habilitados, ou habilitados e não captados, ou ainda captados e
executados, mas com as contas reprovadas pela tríade Fundação José Augusto, Secretaria de
Tributação e Controladoria do Estado, tendo em vista que, na maioria dos casos, os grupos
culturais não contratam um serviço especializado para a elaboração e captação de seus projetos.
Desta feita, percebe-se o aumento da adesão do discurso de que as políticas de fomento à
cultura, seja em nível federal, estadual ou municipal, servem muito mais como instrumento de
medo por parte dos grupos que a utilizam do que propriamente como um mecanismo responsável
pelo aumento da produção, fruição e consumo do produto cultural nacional. Este é um dos
pontos fortes da discussão atual que exige, principalmente por parte dos setores culturais e
artísticos, uma série de mudanças nos escopos das leis culturais, tendo em vista que a burocratização
do acesso a estas se encontra cada vez maior, além de que os percentuais de renúncia fiscal
disponibilizados para o investimento no setor da cultura há muito não correspondem à realidade
da crescente produção cultural atual.
A Lei Câmara Cascudo teve sua promulgação no ano de 1999 e passou a vigorar a partir
dos anos 2000. Desde então, é considerada o principal mecanismo responsável por fomentar
a produção cultural e artística em âmbito estadual. Esta pesquisa se dedicou em levantar os
dados relacionados à execução da lei entre os anos de 2012 e 2015, cujos números podem ser
acompanhados a seguir:
Cosern, Telemar,
Natal,
Três Corações R$ R$
2015 Parnamirim, 34 27
Alimentos S/A, 5.100.000,00 3.763.880,00
Mossoró.
Claro Telefonia.
e executados, como foi o caso do Oratório de Santa Luzia e o Festival de Teatro da Comunidade
Católica Shallom. Pode se perceber ainda que, em comparação com os anos anteriormente
estudados, as empresas que patrocinam esse tipo de projeto são as mesmas, com atenção
especial para a maior aderência da Três Corações Alimentos S/A e a Alesat Combustíveis. Mais
uma vez, a Cosern Neoenergia ocupa o posto de principal financiadora cultural do RN, tendo
patrocinado a quantia recorde de dezenove projetos, em um montante financeiro estimado em
aproximadamente R$ 3 milhões.
No âmbito do Município de Natal, os setores culturais contam com a Lei Djalma Maranhão
(n° 4.838/97) para fomentar suas atividades, que forneceu a normativa necessária para que
fosse implementado o Programa Municipal de Cultura. Instituído pelo Decreto n° 6.906 de 20
de fevereiro de 2002, o Programa Municipal de Incentivos Fiscais a Projetos Culturais Djalma
Maranhão teve sua origem na lei homônima, que inaugurou a negociação de troca de descontos em
impostos pelo financiamento cultural por parte das pessoas jurídicas contribuintes de IPTU e
ISS. A utilização dos recursos da lei, por parte de pessoas físicas ou jurídicas, será o equivalente a
até 20% dos débitos tributários de ISS e IPTU a vencer, e ainda de até 25% dos débitos já
vencidos referentes a esses tributos. No que tange as modalidades de financiamento anteriormente
descritas, as mesmas foram dispostas em lei da seguinte maneira:
habilitados pelo Cadastro Municipal de Entidades Culturais (CMEC) há pelo menos seis meses,
e quatro indicados e nomeados pelo Prefeito, sendo um representante da Secretaria Municipal
de Tributação (SET), a Secretária Executiva da lei, um Servidor Especializado e o Presidente
da Fundação Cultural Capitania das Artes (FUNCARTE). O Programa de Incentivo tem por
objetivo propor o financiamento por meio do modelo de renúncia fiscal para os seguintes eixos
ligados à produção e circulação de bens e serviços culturais:
a) Música e dança;
d) Literatura e cartum;
j) Relíquias e antiguidades;
l) Pesquisa e mapeamento.
A Lei Djalma Maranhão foi promulgada no ano de 2002. Desde então, é tida como a
base do financiamento cultural produzida na cidade do Natal. Desta feita, levantamos também
para este tópico os dados relacionados aos últimos 04 (quatro) anos de exercício fiscal, com
atenção especial para o aumento do valor disponibilizado pela Prefeitura de Natal para compor
a renúncia fiscal, em detrimento do percentual de arrecadação cada vez menor, sempre oscilando
entre 30 e 35% do valor do teto da renúncia. Assim, o recorte temporal que aqui propomos
passa também se dá entre os anos de 2012 e 2015. É importante lembrar que a listagem das
empresas patrocinadoras dos projetos em âmbito municipal não é disponibilizada pela Funcarte,
órgão gestor da política cultural no âmbito do município, para fins de consulta e/ou pesquisa.
R$ R$
2012 47 44 03
4.891.080,00 1.826.201,00
R$ R$
2013 48 45 03
5.418.100,00 2.129.805,00
R$ R$
2014 104 91 13
6.058.780,00 2.954.234,00
R$ R$
2015 91 85 06
8.019.220,00 1.115.274,00
Música 17 14 31 31
Eventos 09 12 20 23
Literatura 06 06 13 06
Artes Integradas 04 08 15 15
Artes Visuais 02 02 06 03
O balanço do ano de 2012 para lei municipal pode ser traduzido como um ponto positivo,
uma vez que houve uma quantidade muito pequena de projetos indeferidos, o que significa
um aprimoramento na qualidade dos projetos. A quantidade de projetos ligados à música, no
âmbito municipal, é sempre superior às demais linguagens artísticas, todavia o valor captado é
muito discrepante quando comparado ao valor total disponibilizado, este primeiro nunca
ultrapassando a média de 30-35% de captação.
O ano de 2013 também é marcado por uma quantidade muito pequena de projetos
indeferidos pela lei, o que pode ser traduzido como um avanço na qualificação dos proponentes
culturais. Mais uma vez, a quantidade de projetos relacionados à música é superior às demais
linguagens artísticas contempladas, sendo o setor das artes visuais historicamente o menos
contemplado, todavia vale levar em consideração a pouca procura pelo financiamento público
por parte dos artistas ligados a essa área. Notadamente, a quantidade do valor total captado é
muito inferior ao valor total subsidiado pelo município para o financiamento cultural, fenômeno
que se dá em consequência da postura fechada das empresas no que diz respeito às questões
relacionadas ao financiamento cultural.
Muito embora a Fundação Cultural Capitania das Artes não tenha disponibilizado a
listagem em que constem as empresas que mais patrocinaram a produção cultural no âmbito
do município entre os anos de 2012 e 2015, recorte de análise desta pesquisa, há que se levar
em consideração as informações contidas nos arquivos digitais da empresa Unimed Natal, uma
vez que esta vem desenvolvendo uma cultura de financiamento cultural considerável no âmbito
do município, inclusive contando com edital próprio, seguindo os moldes da Cosern Neonergia
que, conforme já citado anteriormente, atua como a principal pessoa jurídica patrocinadora do
Por fim, o ano de 2015 não apresenta grandes diferenças no que tange à quantidade de
projetos inscritos, aprovados e indeferidos com relação aos demais anos estudados. Mais uma
vez, o número de projetos contemplados dentro do segmento musical é maior que as demais
linguagens cultuais, ao passo que as artes visuais continuam ocupando a menor quantidade de
projetos habilitados. Para 2015, o valor total captado foi inferior aos demais anos, sobretudo
quando comparado ao maior valor disponibilizado para a renúncia nos anos estudados. Um
teto de R$8 milhões comparado a uma captação de pouco mais de 1 milhão de reais representa
uma deficiência manifesta no modelo de financiamento eleito para servir como base do fomento
cultural de um município.
Considerações finais
Via de regra, as empresas somente vinculam seus nomes àqueles projetos que lhe darão
a certeza de um retorno de marketing eficiente. Desta maneira, há uma limitação das possibili-
dades dos projetos culturais de pequeno e médio porte, ou até mesmo os que sejam comprometidos
com o resgate da dimensão antropológica da cultura, terem suas propostas patrocinadas, tendo
em consideração que as empresas tenderão a apoiar aqueles projetos de porte maior e que já se
encontram consolidados no cenário artístico e cultural e que, acima de tudo, tenham um alcance
Em 26 de dezembro de 2020, a Lei Rouanet completa seus vinte e nove anos de vigência.
Durante este período, a referida, que serviu de inspiração para que os estados e municípios
passassem a legislar propriamente sobre a causa cultural, foi responsável por operar uma série
de transformações – positivas, mas também negativas -, no setor cultural brasileiro, bem como
nos grupos diretamente interessados pela correta gestão dos recursos legais. A Lei Rouanet
ficou, portanto, marcada pela implementação do mecanismo de financiamento que serve como
base para a manutenção do setor cultural no país, ponto que serviu como objeto principal desta
pesquisa. Este mecanismo, popularmente chamado de Renúncia Fiscal, muito embora tenha se
apresentado como o núcleo financeiro da produção cultural nacional, não foi capaz de suprir a
deficiência deixada pelos outros dois principais mecanismos de financiamento cultural disponíveis
no país, que são os Fundos de Investimento Cultural e Artístico – FICART e o Fundo Nacional
de Cultura – FNC.
Por esta razão, compreende-se por quais razões os projetos culturais locais não são
nunca– ou quase nunca – contemplados pela Lei Rouanet, tendo em conta que as grandes
empresas e potenciais patrocinadoras dos projetos culturais por ela habilitados encontram-se
instaladas nas grandes metrópoles do Brasil, ou seja, no eixo Rio-São Paulo. Neste sentido,
para além das deficiências observadas na gestão do financiamento cultural local, ressalte-se
também a disparidade concorrencial observada nos projetos culturais das regiões menos
favorecidas para com aquelas onde se concentra o capital mais central do país. Desta maneira,
restou à produção cultural mais periférica contar basicamente com o financiamento público
local. Para as localidades que contam com legislação cultural própria, como é o caso do estado
do Rio Grande do Norte e de sua capital, Natal, a produção cultural fica um tanto menos
comprometida quando levado em consideração o fato de que em algumas outras localidades
não há sequer uma lei de incentivo à cultura.
Todavia, a existência de uma lei própria não significa que, para a realidade da produção
cultural daquela localidade, seus problemas estarão resolvidos. A falta e o atraso dos repasses
das verbas e a postura fechada dos grupos empresariais para com a causa do patrocínio cultural
configuram apenas alguns dos vários gargalos que a produção cultural atravessa em nível
federal, estadual e municipal. No Estado do Rio Grande do Norte, praticamente uma única
empresa, a Cosern Neoenergia, atua como principal patrocinadora cultural local, ressaltando
que também é a única empresa que conta com um edital próprio de fomento à produção cultural,
direcionado aos projetos já habilitados pelas leis de incentivo locais.
No Estado do Rio Grande do Norte, a política analisada foi implementada anos mais
tarde, em 1999, com a promulgação da Lei Câmara Cascudo, e na cidade de Natal, em 1997 por
intermédio da Lei Djalma Maranhão. Levando-se em consideração que este modelo de finan-
ciamento, conforme já mencionado, surgiu no Brasil na década de 1980, podemos considerar
que a gestão pública local caminhou a passos lentos, quando quase duas décadas depois tratou
de legislar sobre o tema. No estado do RN, a Lei Câmara Cascudo funciona até os dias atuais
como a base do financiamento cultural estadual, todavia há que se levar em consideração a
insuficiência da política que, na maioria das vezes, não supre as necessidades dos grupos aos
quais é destinada. Em conformidade com os dados levantados, historicamente a relação entre
os valores disponibilizados e os efetivamente captados pelos projetos culturais é muito
discrepante, tendo em conta que na maioria das vezes o percentual de captação não chega nem
à marca dos 30%. Vale salientar que, nos dias atuais, o patrocínio cultural em âmbito estadual
se deve basicamente a uma única empresa, a Cosern Neoenergia, responsável pelo patrocínio
dos principais projetos culturais que hoje são executados no estado. A Cosern abre anualmente
o seu edital de patrocínio, no qual podem se inscrever os projetos habilitados pela lei estadual
e, em menor proporção, alguns projetos aprovados na Lei Rouanet também são habilitados para
concorrer ao mesmo.
Referências
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de incentivo fiscal para o financiamento de projetos culturais no âmbito do Estado do
Rio Grande do Norte, e dá outras providências. Diário Oficial do Estado do RN, Natal, 30
de dezembro de 1999. Disponível em: < http://www.set.rn.gov.br/contentProducao/aplicacao/
set_v2/legislacao/enviados/listagem_filtro.asp?assunto=11&assuntoEsp=15>. Acesso em 03 de
outubro de 2020.
_______________. Fundação José Augusto (FJA). Natal. Disponível em: < www.cultura.
rn.gov.br >. Acesso em: 03 de outubro de 2020.
Introdução
Não apenas do ponto de vista social, mas também do biológico e ético, a SA é importante
para o avanço da sociedade e para a redução da desigualdade social. A alimentação é um dos
direitos humanos essenciais à vida, portanto deveria estar resguardado sob a proteção das
sociedades e dos governos. No entanto, a Insegurança Alimentar (IA), ainda persistente entre
as populações pobres, demonstra que esse direito segue sendo violado.
Sendo assim, o objetivo deste estudo piloto consistiu em verificar se o Programa Bolsa
Família (PBF) promoveu impacto sobre a SA de beneficiários no município de Natal/RN. Como
resposta inicial ao questionamento central deste trabalho, a hipótese levantada é que o programa,
através da distribuição de renda, considerando previamente que os recursos financeiros são
utilizados pelas famílias principalmente para a compra de alimentos ― independentemente da
qualidade nutricional destes alimentos ― permite que as famílias beneficiadas alcancem
melhoria no nível de SA, distanciando as crianças e os adultos do quadro de fome absoluta.
Acredita-se que esta pesquisa permite olhar especificamente para grupos sociais mais
vulneráveis e observar o impacto que o programa teria propiciado na SA de beneficiários.
Médias nacionais indicam as condições da população em geral ― ricos, pobres e miseráveis ―
mas, analisar grupos específicos permite focalizar um problema social que não é característico da
população geral e sim de grupos sociais mais vulneráveis. Neste estudo piloto é mais fortemente
abordado o acesso aos alimentos, mas isso não implica que não se possa tecer comentários a
respeito dos demais.
31 Mestra em Estudos Urbanos e Regionais (PPEUR/UFRN). E-mail: kaliane.barbosa@yahoo.com.br
32 Professor Colaborador do Programa de Pós-Graduação em Estudos Urbanos e Regionais (PPEUR/UFRN).
E-mail: robs@uol.com.br
A literatura sobre welfare state mostra que as políticas sociais, em qualquer lugar do
mundo, têm o seu surgimento baseado não apenas no apoio fundamental à manutenção e ao
desenvolvimento do capitalismo, mas também na tentativa de correção dos efeitos nocivos de
uma economia de mercado.
Esping-Andersen (1991) mostra que, no início do século XX, os seguros sociais que
já existiam na Alemanha foram expandidos para a Europa e a cobertura estendida para outras
categorias profissionais. Somente após a II Guerra Mundial a política de proteção social foi
ampliada a todos os integrantes da sociedade que necessitassem de apoio do Estado. Esse é o
momento histórico em que a literatura considera a configuração do que veio a se chamar
Welfare State nos moldes de seu sentido original.
O sistema brasileiro de políticas sociais começou a ser delineado entre os anos 1920
e 1930. Para Gomes (2006), alguns fatores são importantes para tal afirmação, um deles é a
ampliação da atuação do Estado. Alguns exemplos de cobertura seriam: previdenciários,
assistenciais, trabalhistas, saúde e educação. No século XX, houve muitos avanços, como a
criação de leis trabalhistas e de instituições públicas, mas o fato particularmente marcante foi
a responsabilização do Estado pelo bem-estar da sociedade.
No mundo todo se observou uma série de mudanças nas orientações dos governos.
No Brasil, ainda que com certo atraso, a introdução ou chegada dos novos discursos liberais
também ocorreu, como já acontecia ao redor do mundo. Trevisan e Van Bellen (2008) apontam
que, como decorrência da crise econômica, política e social iniciada no final da década de 70,
entre os anos 1980 e 1990 houve uma explosão de pesquisas em políticas públicas que buscavam
avaliar e questionar a eficiência das políticas sociais adotadas pelo Estado
Nesse sentido, o diminuto sucesso do sistema brasileiro de proteção social e a sua não
classificação como um Welfare State deve-se exatamente a esses fatos, mas também a outros.
Costa (2006) cita que o Brasil possui três problemas de ordem sócio-política que dificultaram a
construção do sistema: o patrimonialismo, o personalismo e a fragilidade na democracia, como
consequência de medidas autoritárias, clientelistas e mandonistas.
É consenso geral que o Brasil, no período que compreende a entrada do século XXI
até 2011, viveu um momento de fortalecimento da economia, associado à redução das desigualdades
sociais. Deve-se reconhecer que muito do que foi conquistado nesse período foi fruto das ações
do Estado a partir de políticas de combate à pobreza, de promoção da habitação, de acesso aos
centros universitários, de melhores taxas de consumo interno dentre outras ações. Entretanto,
como afirma Rolnik e Klink (2011), apesar de o país ter aumentado os gastos sociais e com a
infraestrutura urbana, as cidades ainda são caracterizadas pelas disparidades socioespaciais.
Para Burlandy (2009), a trajetória política da SAN tem em sua história momentos de
conquista, descaso e de políticas fragmentadas e em consequência disso, muitas iniciativas com
fraca expressão. Em 2006, foi sancionada a Lei Orgânica da Segurança Alimentar e Nutricional
(Losan), que consagrou o princípio do direito humano à alimentação e instituiu o Sistema
Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), o braço operacional da Losan (BURITY
et al, 2010). Entretanto, a Losan não definiu um orçamento específico e sua existência não foi
suficiente para efetivar esse direito.
Estar livre da desnutrição, da fome e acessar uma alimentação adequada são direitos
que já eram reconhecidos desde o Pacto Internacional dos Direitos Humanos, Econômicos,
Sociais e Culturais, bem como na Declaração Universal dos Direitos Humanos. No Brasil, esse
direito só passou a ser garantido via Constituição Federal em 2010, quando da aprovação da
PEC 47/2003.
O PBF, que foi criado em 2004, nasceu com o objetivo de promover alívio imediato
para as condições de miséria e pobreza, reduzir desigualdades, minimizar as injustiças sociais,
melhorar os parâmetros educacionais do Brasil e promover saúde e inclusão.
Metodologia
O instrumento de coleta de dados utilizado foi uma entrevista, guiada por questionário
do tipo formulário, contendo 48 perguntas abertas e fechadas, que foram preenchidas pelo
entrevistador. O questionário foi dividido em três partes. Na primeira parte, as perguntas
Caracterização socioeconômica
Com base nos dados do Ministério da cidadania, dos quase 14 milhões de famílias
incluídas no programa, mais de 11 milhões possuem titulares com faixa etária entre 21 e 60
anos. Aqui, ao dividir os participantes de acordo com a faixa etária verificou-se maior participação
de responsáveis com idade entre 25 e 44 anos, em um total de 59% de questionários aplicados,
sendo a menor participação daqueles com idade entre 55 e 64 anos.
Quando perguntados sobre o estado conjugal, 69,5% dos indivíduos pesquisados declararam
estar solteiros no momento da entrevista. Já os que declararam ter companheiro correspondem
a 32%, estes, integram os casados e aqueles em união estável. Em relação a quantidade de filhos
por titular, mais da metade dos entrevistados tem entre 0 e 2 filhos, já os titulares com mais de
5 filhos são a minoria deste estudo, indicando que a redução da taxa de fecundidade também
ocorre entre os entrevistados.
Quando buscou-se traçar uma relação entre a média do número de filhos por escolari-
dade do titular, ficou revelado que a baixa escolaridade e o analfabetismo são fatores que pre-
dispõem o aumento do número de filhos. Esse dado permite algumas reflexões sobre as críticas
feitas aos titulares do PBF.
Sobre a escolarização dos voluntários, verificou-se que a maioria dos entrevistados não
chegou à conclusão do ensino fundamental e que apenas 20% concluíram o ensino médio,
confirmando a relação que existe entre a baixa escolaridade, a pobreza e o desemprego. Esse
resultado é parecido com a média do estado, em que 56,4% não concluíram o ensino fundamental.
A renda é importante ferramenta para inclusão social e também para permitir, em uma
sociedade capitalista, a aquisição de alimentos. A baixa renda das famílias inviabiliza o acesso
a uma alimentação adequada em energia e com qualidade nutricional, com isso, essa população
carente vive sob o risco das carências nutricionais e da IA. Sobre os rendimentos per capita,
99,1% dos indivíduos pesquisados vivem com menos de meio salário mínimo por pessoa, o que
era esperado por ser uma condição de entrada no programa.
O motivo para preocupar-se com a IA deve passar primeiramente pelo respeito ao ser
humano, respeito ao direito a vida e depois pelas repercussões que esse fenômeno provoca na
sociedade, na economia, na educação e, sobretudo na saúde, algumas dessas complicações são:
retardo do crescimento, baixo peso, déficit no desenvolvimento cognitivo, evasão escolar, faltas
no trabalho, susceptibilidade às infecções virais e bacterianas, desânimo, fraqueza muscular,
sonolência. Veja o que Sawaya diz sobre o consumo inadequado de alimentos:
A autora faz a conexão entre o estresse de sobreviver com pouco e as implicações para
a vida. Ela informa que o marcador do cortisol, que é liberado na corrente sanguínea e está
presente na saliva ao acordar, fica alterado em situações inadequadas de alimentação. Esse
fenômeno é uma das implicações para o aparecimento de doenças crônicas degenerativas na
vida adulta.
Nesta pesquisa, foi possível observar, conforme demonstrado na Figura 1, que apenas
0,9% dos participantes, ou seja, um único entrevistado encontrava-se em Segurança Alimentar
no período da pesquisa. Enquanto isso, 99% de toda a amostra analisada encontrava-se em
algum grau de IA, sobretudo de IA moderada que representou 51,4% do público alvo.
Agora, para avançar nas análises, é preciso relacionar esses dados com as características
socioeconômicas da população, para traçar os principais determinantes para o alto índice de IA
identificado na população estudada. Observe a Figura 2.
A primeira relação apresentada foi com a escolaridade dos titulares. Assim, ao verificar
a condição de IA dos domicílios relacionando com o nível educacional dos titulares, é possível
afirmar que quanto menor for o grau de instrução maior será IA. A Figura 2 confirma essa
vertente ao mostrar que os analfabetos têm a pior condição, principalmente em relação à
insegurança severa.
Como é possível notar, os domicílios com até ¼ de salário mínimo por pessoa tem altas
taxas de insegurança dos tipos moderada e severa, mais de 80% dos domicílios desse estrato
sofrem as duas piores condições de acesso aos alimentos. Os indivíduos moradores de domicílios
com rendimentos per capita de ¼ até ½ salário mínimo também transitam predominantemente
entre a insegurança dos tipos moderada e severa, porém em menor proporção, 73%. Já as pessoas
que moram nos domicílios em que os rendimentos variam entre ½ e um salário mínimo têm
melhor condição no acesso aos alimentos visto que a insegurança mais predominante é a do
tipo leve, onde foi encontrada mais de 50% de seus integrantes.
Considerações finais
Os sistemas de proteção social têm como preceito o direito social, a justiça e a cidadania. O
PBF é fruto do contexto mundial da criação de políticas de seguridade social sendo considerado
como a maior arma no controle dos efeitos perversos de uma economia capitalista, altamente
concentradora de renda, a exemplo do Brasil. Contudo, ainda que possua cobertura nacional
o PBF tem efeito limitado. Isso pode ser explicado através da compreensão de que princípios
universalistas voltados para a inclusão social e maior equidade na distribuição dos benefícios
do programa, característicos do Welfare State, não encontram abrigo no sistema de seguridade
social brasileiro. Este se caracteriza por ações focalizadas, fragmentadas e não orientadas por
um viés de inclusão social, ou seja, o programa não tem porta de saída.
Essa perspectiva focalizada e fragmentada das ações não objetiva atingir resultados
de longo prazo. O reconhecimento da assistência social como parte integrante de ações que
visam a seguridade social foi um grande avanço, mas a efetividade dos direitos sociais ainda
não está garantida.
Alguns especialistas afirmam que o Brasil necessita fazer reformas estruturais funda-
mentais, como por exemplo, as reformas agrária e tributária. Isso, apesar de enfrentar uma forte
oposição por parte das elites que veem seus interesses afetados, é fundamental para alcançar
uma sociedade menos desigual. O sistema tributário brasileiro é regressivo, funcionando como
um Robin Wood às avessas, penalizando, através da tributação sobre o consumo, aqueles com
menor capacidade de renda, que são os mais atingidos pelo sistema e transferindo grande parte
dessa arrecadação aos ricos, que proporcionalmente pagam menos impostos que os pobres.
Nesse sentido, o PBF é muito importante para combater esses efeitos, pois atende em
média cerca de 50 milhões de pessoas em todo Brasil, e em 2021 prevê investimento de R$ 34
bilhões. Acredita-se que a extinção do programa levaria os beneficiários a degradação social,
o que não é desejável, além disso, os próprios beneficiários revelam que mesmo que o recurso
seja insuficiente é muito útil à família. O fato é que, somente a família pode avaliar suas necessidades
primárias, sejam elas de alimentos, medicamentos ou pagar o aluguel. Como julgar o que deve
ser de primeira necessidade para outrem?
Novos estudos com esta população, que venham a analisar o consumo alimentar e o
estado nutricional seria muito importante para verificar mais detalhadamente o impacto desse
programa.
Referências
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n. 3, p. 529-550, 2008.
Introdução
33 Esse capítulo foi derivado do trabalho apresentado no XVIII Encontro Nacional da Associação Nacional de
Pós-Graduação e Planejamento Urbano e Regional, realizado em 2019, com melhorias a partir das contribuições
do evento.
34 Mestre em Estudos Urbanos e Regionais (PPEUR/UFRN). E-mail: marcosaureliojunior@gmail.com
35 Professora do Programa de Pós-Graduação em Estudos Urbanos e Regionais (PPEUR/UFRN). E-mail:
joanatereza@gmail.com
coletivo dos militantes engajados em três movimentos na cidade de Natal, Rio Grande do Norte
(RN): União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), Pastoral da Juventude (PJ) e
Levante Popular da Juventude (LPJ).
Para atender ao nosso objetivo, selecionamos três diferentes entidades que buscam
defender os interesses da juventude a nível nacional e que contam com representação em Natal,
RN: UBES, PJ e LPJ. Buscamos através das trajetórias e das falas dessas lideranças entender como
eles produzem discursos, reordenam enunciados, nomeiam aspirações difusas ou as articulam,
possibilitando aos indivíduos que dele fazem parte reconhecerem-se nesses novos significados
(GOMES, 2011).
182 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
No Brasil, a percepção do jovem enquanto ator político e social adveio – dentre outros
fatores, mas principalmente – da atuação da juventude em processos históricos, onde os jovens
tiveram papel fundamental na condução de ações importantes, como foi o caso da organização
do movimento estudantil durante os anos de regime militar, na qual os jovens estudantes secun-
daristas e universitários organizaram passeatas, protestos e outras mobilizações contestatórias
ao regime da época.
Com a redemocratização do país em 1988, o jovem enquanto ator social, que antes
era invisível aos olhos do Estado, passa a adquirir maior visibilidade no que tange às políticas
públicas sociais, estudantis e de trabalho. Essa visibilidade conquistada através do engajamento
e participação social nos anos antecessores da redemocratização do Brasil em conjunto com
a expansão nos estudos acadêmicos sobre a categoria possibilitou que o Estado e a sociedade
passassem a ver o jovem como sujeito de direitos.
Mas é a partir dos anos 2000, que o acúmulo desse processo de organização política
e social da juventude passa a ter impacto direto na agenda governamental, mas também no
processo de construção e consolidação das identidades juvenis. A criação da Secretaria Nacional
de Juventude (SNJ) e do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) em 2005, somado ao
surgimento de políticas públicas e outros avanços institucionais possibilitaram a consolidação
da juventude enquanto categoria política no Brasil.
Esses fatores possibilitaram que a juventude passasse a ser reconhecida como categoria
política fundamental. Vasquez e Cozachcow (2017) afirmam que esse reconhecimento pode
ser compreendido também como um “regresso à política”, dada a aproximação dos jovens com
partidos políticos e espaços institucionais do campo político, e também, de movimentos sociais.
Bourdieu (2011, p. 201) afirma que os jovens passaram a ser “agentes que podiam considerar-se,
ou ser considerados, como expectadores do campo político [e] tornaram-se agentes em primeira
pessoa”.
183 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
A abordagem clássica sobre movimentos sociais surgida nos Estados Unidos tinha
como objetivo principal, segundo Gohn (1997), compreender os comportamentos coletivos
através da teoria da ação social, os quais eram resultados de tensões sociais. A abordagem
tradicional acerca dos movimentos sociais foi substituída pela teoria dos Novos Movimentos
Sociais, devido a necessidade de compreender a atuação dos movimentos sociais dentro de um
contexto social altamente plural.
A teoria dos Novos Movimentos Sociais é ambígua - alguns partem de premissas to-
talmente distintas do marxismo (como Melucci), outros fazem uma ruptura na forma
de abordagem, mas trabalham com as macroestruturas societais (caso de Touraine),
outros ainda questionam a validade da utilização de alguns prognósticos realizados
por Marx, argüindo pela necessidade de sua atualização - dando as transformações
históricas -, sem negar a validade das categorias básicas (caso de Offe) (GOHN,
1997, p. 120).
A expressiva articulação e atuação dos movimentos sociais para além de seus espaços
auto organizados, perpassando canais institucionais, configuram uma dinâmica não tão
presente nos movimentos até pouco tempo. Segundo Moura (2018), a entrada de militantes para
o Governo, em secretarias, ministérios etc., constitui também uma estratégia fundamental na
alteração das narrativas e das formas de atuação desses novos movimentos sociais.
184 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
Argumentamos que o uso da narrativa faz parte de uma estratégia utilizada pelos
movimentos sociais buscando legitimar-se, ressignificar-se e constituir-se como elemento central no
campo político. Sendo assim, cabe questionarmos quais são os argumentos utilizados pelos
movimentos de juventude para que haja aglutinação de interesses que gere um olhar do poder
público, das instituições e da sociedade para suas pautas. Acreditamos que através das narrativas
entendemos os processos através dos quais os limites do político são constantemente feitos
e refeitos, num contexto emocional e material. Ou, conforme ressalta Gould (2009), precisa-
mos prestar atenção aos fatores emocionais dos dos discursos que afetam o fazer a política.
“Emoção deve ser vista como um significado crucial em que os seres humanos entendem eles
próprios e o seu contexto, seus interesses e suas necessidades” (GOULD, 2009, p.17). Na seção
seguinte, trataremos acerca desses três movimentos e seus discursos e narrativas que afetam o
fazer a política.
Referencial metodológico
A fim de obter o discurso dos três movimentos sociais selecionados por parte de
seus próprios militantes, tomamos como metodologia analítica o Discurso do Sujeito Coletivo
(DSC), uma técnica com viés quantitativo e qualitativo idealizado por Fernando Lefevre e Ana
Maria Lefevre (2003; 2014), que tem como objetivo construir um discurso coletivo com base
em discursos individuais de uma mesma categoria ou grupo.
185 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
um discurso coletivo dos sujeitos participantes, representando a partir de pontos importantes nas
salas individuais, um pensamento coletivo acerca dos questionamentos levantados. Os discursos
coletivos se relacionam com os valores, conhecimentos e práticas que direcionam comportamentos e
relações sociais que se expressam através de sentimentos, atitudes, palavras e expressões.
O método do DSC nos permite fazer uma construção do discurso através das respostas
obtidas, fornecendo assim, uma dimensão coletiva a partir das percepções de uma dimensão
individual desses militantes. O DSC possibilita identificar nas opiniões individuais represen-
tações sociais de indivíduos e suas práticas na sociedade. O diferencial da metodologia do
DSC é que a cada categoria estão associados os conteúdos das opiniões de sentido semelhante
presentes em diferentes depoimentos, de modo a formar com tais conteúdos um depoimento
síntese, redigido na primeira pessoa do singular, como se tratasse de uma coletividade falando
na pessoa de um indivíduo (LEFEVRE; LEFEVRE, 2014, p. 503).
[...] um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando a obter, por proce-
dimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indica-
dores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos
às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BAR-
DIN, 2011, p. 47).
A escolha pela análise de conteúdo se dá pelo fato de ser uma técnica de ampla validação
em pesquisas qualitativas (MOZZATO e GRZYBOVSKI, 2011)e pela capacidade de captar,
de maneira qualificada, percepções acerca do processo de consolidação da juventude rural no
campo político, no que tange às disputas, estratégias e ações.
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UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
A partir dos títulos das últimas vinte notícias e artigos retirados do site oficial do
movimento, filtramos palavras chaves e sistematizamos em forma de chuva de palavras a fim
de visualizarmos quais são os discursos mais recentes do Levante Popular da Juventude:
187 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
O processo político no qual o Brasil passou em 2016 resultou num discurso de enfren-
tamento ao processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, o qual o movimento
classifica como “golpe”, sendo a palavra mais citada. A emissora de televisão Rede Globo também
aparece como um dos principais temas abordados pelo site do movimento, que segundo os
artigos e enunciados do site do movimento, teve papel fundamental na condução dos processos
políticos do país.
Pastoral da Juventude
A ala da Igreja Católica que combateu o regime militar com uma forte organicidade,
fez surgir entre sua juventude nos anos 70 a Pastoral da Juventude através da Ação Católica
Especializada 3. A PJ representa hoje a união de jovens cristãos que decidem incidir na política,
exercer sua cidadania e participação social em busca de uma sociedade igualitária, baseados na
Teologia da Libertação e na Pedagogia do Oprimido 4 a fim de sanar as demandas da juventude
brasileira.
188 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
189 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
valores morais e religiosos, característica marcante da PJ. Ainda de acordo com o “Somos Igreja
Jovem” a PJ pretende:
190 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
petróleo e 50% do Fundo Social do Pré-Sal para a educação, a criação do Estatuto da Juventude,
o Passe Livre, entre outras.
Pela chuva de palavras é possível perceber o forte engajamento político que a entidade
mantém, palavras como “voto”, “deputados”, “urnas”, “eleitoral”, “senador” em um ano eleitoral
reflete a atuação que a UBES tem desde sua fundação nos importantes processos políticos
do país. As palavras mais recorrentes: “estudantes”, “democracia” e “juventude” em conjunto
com aspectos políticos revelam que o discurso do movimento não se reduz apenas demandas
estudantis secundaristas, mas colabora para uma ampliação de importantes temas atuais, rela-
cionando-os com as bandeiras da juventude.
191 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
192 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
Por ser um movimento social de juventude, a partir dos discursos percebemos que o
coletivo reproduz a necessidade de inserção nas diversas esferas da sociedade em que se encontram
os jovens: questões de trabalho, gênero, reforma agrária. O discurso aqui criado remete as
diretrizes anteriormente detalhadas que são encontradas em documentos e sites oficiais do mo-
vimento. Dessa forma, percebemos um alinhamento no discurso das lideranças nacionais com
as locais, construindo assim, um discurso coeso daquilo que o movimento defende.
Pastoral da Juventude
A identificação inicial com as pautas da Pastoral da Juventude por parte dos jovens e
futuros militantes foi imprescindível para a adesão do movimento. No caso da PJ, destaca-se o
quanto a identidade do movimento é expressa pelo discurso coletivo, os militantes possuem um
vínculo identitário consistente com o movimento. A atuação histórica da PJ ao lado de classes
menos favorecidas constitui um valor simbólico para os jovens que decidem ingressar no grupo.
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PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
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UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
Considerações finais
195 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL NO RN:
A aproximação da narrativa dos discursos por parte dos militantes e por parte dos
movimentos contribui para a identificação e engajamento nesses espaços de construção política e
participação. Observamos que os discursos por parte dos movimentos são direcionados
e fortemente influenciados pela conjuntura política e pelos problemas sociais existentes em
determinados momentos, influenciando assim, o rumo de suas narrativas. Apesar de distintos
em suas construções e trajetórias, os três movimentos- um estudantil, um religioso e outro com
cunho social-, dada a conjuntura política do Brasil, alinharam seus discursos na narrativa em
torno da garantia de direitos, igualdade política e democracia.
Percebemos a partir dos discursos que a conjuntura política constitui fator determinante
para o ingresso dos militantes nos três movimentos, onde os jovens veem nos agrupamentos
juvenis um horizonte de possibilidade para mudanças locais e estruturais na sociedade. A imersão
nesses discursos nos fez compreender que a importância do aspecto cultural na definição dos
movimentos de juventude e a apropriação de símbolos permitem que a luta política se torne
cada vez mais consolidada no cenário político.
Referências
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GOHN, Maria da Glória. Teoria dos movimentos sociais: paradigmas clássicos e contempo-
râneos. São Paulo: Edições Loyola, 1997.
196 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
UMA DÉCADA DE ESTUDOS E PESQUISAS
GOULD, Deborah B. Moving politics: emotion and AC US´s fight against AIDS. Universityof
Chicago Press, 2009.
LEFEVRE, Fernando; LEFEVRE, Ana Maria Cavalcanti; TEIXEIRA, Jorge Juarez Vieira.
O discurso do sujeito coletivo: uma nova abordagem metodológica em pesquisa qualitativa.
Caxias do Sul: EDUCS, 2000.
MOURA, Joana Tereza Vaz de. Dinâmicas dos Movimentos Sociais: Reflexões sobre Cultura
e Oportunidades Políticas. Mediações – Revista de Ciências Sociais, v. 23, p. 390-411, 2018.
POLLETTA; Francesca; GARDNER, Beth G. Narrative and Social movements. In: DELLA
PORTA, D; DIANI, M. The Oxford Handbook of Social Movements. Oxônia: Oxford Press, 2015.
197 Marcos Aurélio Freire da Silva Júnior | Joana Tereza Vaz de Moura
CA PÍ T U LO 12
Karoline de Oliveira36
Matheus Oliveira de Santana37
Introdução
Este estudo foi realizado com base em análise descritiva de dados secundários provenientes
do Censo Escolar da Educação Básica (2017), selecionando os municípios integrantes da Região
Metropolitana de Natal e utilizando variáveis ligadas a infraestrutura escolar, a exemplo da
dependência administrativa, tipo de localização e infraestrutura com base no número de
equipamentos e espaços existentes dentro das unidades escolares. Para fins de análise,
buscamos identificar apenas os recursos pedagógicos, como, por exemplo, a presença ou não
de laboratório de informática nas escolas. Além disso, foram utilizados dados populacionais e
socioeconômicos do Censo Populacional de 2010.
Este capítulo está estruturado em quatro seções além desta introdução. A primeira
seção discute as desigualdades educacionais e os diferentes fatores que podem contribuir para
aumentar ou reduzir o acesso às oportunidades educacionais, considerando especialmente o
debate sobre a infraestrutura escolar e a equidade. A seção seguinte apresenta uma caracterização da
Região Metropolitana de Natal com base na revisão da literatura e evidências apresentadas por
indicadores populacionais e socioeconômicos. A terceira seção trata da análise da infraestrutura das
escolas nos municípios que compõem a RMN. Por fim, a última seção apresenta a conclusão
desta pesquisa.
Nos últimos anos os estudos sobre segregação urbana e desigualdades escolares têm
ganhado grande impulso em diversas áreas, como a sociologia, planejamento urbano, a
geografia e a ciência política. Esta agenda de pesquisa cresce no debate internacional e nacional
com a união dos estudos da sociologia urbana com a sociologia da educação na tentativa de
explicar como são distribuídas as oportunidades educacionais a partir da presença e qualidade
do serviço ofertado em diferentes espacialidades. Parte-se do pressuposto de que a oferta desigual
das políticas pode ser um dos fatores que contribui para aumentar ou reduzir os acessos às
oportunidades educacionais38 (RIBEIRO e KAZTMAN, 2014).
Nesse sentido, as pesquisas relatam que no Brasil a segregação residencial das camadas
de alta renda tem produzido nas cidades um auto isolamento que exclui as camadas populares e
que gera desigualdades urbanas que evoluem, apresentando novos problemas. Segundo Ribeiro
(2015, p. 17) a evolução das desigualdades urbanas se dá com “[...] o aumento generalizado de
acesso aos serviços sociais (saneamento básico, educação etc.) simultaneamente ao aparecimento
de uma nova frente de desigualdade no que concerne a qualidade desses mesmos serviços”.
Segundo pesquisa de Rothwell e Massey (2015), a mobilidade de renda entre gerações pode ser
intrinsecamente associada a influências geográficas e a condições da vizinhança, especialmente
o alto acesso a uma educação de qualidade.
Este Relatório foi proposto pelo governo dos Estados Unidos em sintonia com a Lei dos
Direitos Civis de 1964 e consistiu na elaboração de um imenso banco de dados cujas informações
foram determinantes para a construção do perfil das escolas espalhadas pelo país além do perfil
do alunado presente. Com base nos achados, a equipe responsável identificou aspectos relacionados à
distribuição espacial das escolas, a forma de como os serviços educacionais eram organizados
e, não menos importante, as disparidades sociais, como a segregação espacial em relação ao
ambiente urbano e não-urbano. Diante das situações apresentadas, o governo americano pôde
propor medidas com vistas ao menos mitigar as disparidades identificadas (HILL, 2017).
por exemplo, os aspectos socioculturais. Portanto, essas pesquisas evidenciam fatores internos
ao funcionamento dos estabelecimentos de ensino como os currículos acadêmicos, a gestão
escolar, a infraestrutura e materiais (CASASSUS, 2002).
As políticas educacionais das duas últimas décadas no Brasil tiveram como objetivo
universalizar o acesso ao ensino fundamental a partir de disposições legais presentes na
Constituição Federal de 1988, bem como ampliar o acesso ao ensino médio e infantil. Como
resultado desses esforços, o país praticamente universalizou na década de 2000 o atendimen-
to escolar da população de 7 a 14 anos para o ensino fundamental. No entanto, os sistemas
educacionais de avaliação do ensino como o SAEB e IDEB – índice de Desenvolvimento da
Educação Básica - revelam uma face oposta dessa universalização: a baixa qualidade do ensino
público, que embora tenha sido universalizado, não promoveu a redução das desigualdades
educacionais (SOARES e ALVES, 2003).
da área de localização na performance dos alunos pode ser explicada pela escolaridade dos pais
e outras características socioeconômicas da família (BARROS et al, 2001). Outros ressaltam
a importância do contexto propriamente escolar na aprendizagem, como a oferta dos insumos
escolares, a heterogeneidade social dos alunos que frequentam uma escola, a turma que o aluno
estuda e a motivação dos professores (CASASSUS, 2002; TORRES et al, 2008).
ofertado deveria apresentar, pelo menos, um padrão mínimo em todas as escolas. Nesse sentido,
o conceito de equidade na educação pode ser definido como o desenvolvimento de ações que
logrem garantir oportunidades educacionais iguais à população em idade escolar. É possível,
ainda, ir além, promovendo políticas de discriminação positiva. Isso significa atuar na perspectiva
redistributiva, privilegiando áreas vulneráveis e ofertando mais recursos pedagógicos e
financeiros para aqueles que possuem menos oportunidades sociais e econômicas (SILVA e
BARBOSA, 2012; CALLEGARI, 2020).
A aglomeração urbana de Natal não pode ser assumida como propriamente metropolitana,
mas é caracterizada como em processo de metropolização, ou seja, tem área de influência no
âmbito regional. Esse processo é definido por dois elementos: por um lado a expansão física
da malha urbana e por outro, a expansão socioeconômica e político-administrativa - produção,
consumo, habitação, serviços, turismo e comunicações. (CLEMENTINO e FERREIRA, 2014).
40 Em 2019 o município de Bom Jesus foi incluído na lista. Entretanto, por esta pesquisa já estar em andamento
na época, este município não compõe as análises aqui realizadas.
Para Clementino e Ferreira (2014), existe um distanciamento entre o que deveria ser a
RM funcional e aquela institucionalizada em Natal, pois apresenta uma ausência de governança
compartilhada entre os municípios. Assim:
No que tange aos outros municípios que compõem a RMN, São José de Mipibu,
Nísia Floresta, Monte Alegre e Vera Cruz ainda apresentam população rural superior a urbana.
Depois de Natal, os municípios de maior Produto Interno Bruto (PIB) per capita da RMN são
Arês, Parnamirim, Macaíba e São José do Mipibu. Os municípios que apresentam menor PIB
per capta, são também aqueles que apresentam baixas taxas de alfabetização e IDHM, sendo
eles Ielmo Marinho, Maxaranguape, Monte Alegre e Vera Cruz. No caso de Macaíba e São
José do Mipibu, possuir um alto PIB per capita parece não produzir efeitos positivos sobre o
IDHM como mostra a tabela 1.
Tabela 1. População residente total, Taxa de alfabetização, PIB per capita e IDHM da
RMN
Indicadores
População
Municípios Taxa de Alfabe- PIB per capita
Residente IDHM (2010)
tização (2010) (2017)
(2017)
Arês 14.307 76.3 25.320,79 0,606
Ceará-Mirim 73.850 79,5 10.949,67 0,616
Extremoz 28.331 83,7 13.667,37 0,66
Goianinha 26.068 86,9 13.764,41 0,545
Ielmo Marinho 13.714 74,2 7.543,2 0,555
Macaíba 78.031 81,0 18.483,39 0,640
Maxaranguape 12.224 80,2 8.919,17 0,608
Monte Alegre 22.463 73,1 9.276,54 0,609
Natal 885.178 92,0 26.497,08 0,763
Nísia Floresta 27.372 79,3 13.041,45 0,622
Parnamirim 254.707 92,4 19.720,13 0,766
São Gonçalo do Amarante 101.492 86,1 13.935,05 0,661
São José do Mipibu 43.995 77,1 17.329,36 0,611
Vera Cruz 12.372 71,0 8.627,61 0,587
Fonte: IBGE (2010; 2017).
Esses dados mostram que Natal se destaca no cenário metropolitano nos indicadores
de natureza econômica como PIB e nos indicadores populacionais, mas o município de Parnami-
rim possui os melhores indicadores de natureza social. Nos demais municípios os índices de
IDHM, PIB per capita e escolaridade são muito distintos, constituindo assim, um território
desigual. Além disso, a cidade de Natal apresenta elevados índices de pobreza e desigualdade
social, como por exemplo a distribuição de renda. Apesar de possuir o maior PIB da RMN, a
cidade apresenta alta concentração de renda, sendo que mais de 50% desta é apropriada pelos
10% mais ricos:
Tais dados demonstram que, embora sendo mais rica, Natal também é o município
mais desigual internamente, já que apresenta visíveis condições de marginalização
de sua sociedade, como bolsões de pobreza, poluição de seu meio ambiente e falta de
infraestrutura urbana em grande parte de seu território.(GOMES et al, 2014, p. 62).
A análise sobre a oferta de infraestrutura das escolas da RMN tem por interesse
identificara distribuição dos equipamentos e serviços urbanos de modo a compreender se este
seria um dos fatores que contribui para a hegemonia do núcleo da aglomeração urbana na oferta
da infraestrutura escolar, bem como para compreender se padrões de desigualdades entre os
municípios corroboram com as outras variáveis apresentadas nesta seção.
Resultados e discussões
A análise se limitou a analisar escolas públicas, pois são estas que atendem o mais vasto
número de matrículas na educação básica. Os resultados mostram que a oferta das escolas é
muito diversa, tanto pelo número de unidades nos diferentes municípios, como pelo número
entre as diferentes dependências administrativas (estadual e municipal).
Nesse sentido, reforçamos que a presença de estruturas básicas entre as escolas dos
municípios pode contribuir reduzir desigualdades advindas da trajetória individual dos alunos
ou reproduzi-las. Bezerra (2017) aponta que existe uma correlação entre a existência de
Uma das formas de mitigar o efeito de infraestrutura precária nas escolas seria oferecer
melhores insumos. Esses insumos podem ser caracterizados como: ampliação do quadro de
funcionários, e; os equipamentos disponíveis nas escolas. A Tabela 4 apresenta o percentual de
escolas nos municípios da RMN que possuem: Copiadora; impressora; equipamento de
multimídia; número total de computadores na escola; acesso à internet, e; acesso à banda larga.
melhorar o desempenho médio dos alunos nas avaliações nacionais estão abaixo do esperado
para garantia de padrões equânimes de oferta educacional. Os municípios que possuem os
piores resultados gerais nesta análise são Arês e Maxaranguape. Estes municípios também
apresentaram os piores resultados em infraestrutura.
Esses resultados revelam que as escolas destes municípios possuem uma realidade
mais contingente no que se refere à infraestrutura e a oferta de equipamentos nas escolas. Essas
realidades distintas no território intrametropolitano revelam que as desigualdades entre a oferta
dos serviços educacionais podem reduzir as oportunidades no acesso à educação.
É possível observar nos dados analisados que existe na RMN uma hegemonia do
núcleo, mais precisamente dos municípios de Natal e Parnamirim, pois se destacam, em alguns
indicadores mais e em outros menos, dos outros municípios de média e baixa integração, que
no geral, apresentam resultados preocupantes. Além do núcleo possuir a melhor infraestrutura
escolar, seus municípios também são aqueles que se destacam nos índices econômicos e
nos indicadores sociais. Como evidenciado, Natal possui um número de escolas muito mais
significativo do que os outros municípios da RMN. Essa concentração pode ser um dos fatores
que explicam os movimentos pendulares em direção à Natal, para além da capacidade deste
município oferecer boas condições de acesso à infraestrutura.
Conclusões
Essa realidade pode ser observada nos resultados do IDEB, já que nenhum dos municípios
atingiram a projeção para 2017 que era a meta de 4,0 pontos para os anos finais do ensino
fundamental. Assim, a desigualdade de oferta de estruturas básicas nas escolas pode ser um
dos fatores que contribuem para os diferentes acessos às oportunidades educacionais e
consequentemente a reprodução das desigualdades escolares intra e inter municípios.
Referências
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educacionais: condições desiguais para a efetivação de uma política de avaliação educacio-
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SOARES, J.F; ALVES, M.T.G. Desigualdades raciais no sistema brasileiro de educação básica.
Educação e Pesquisa, 29 São Paulo, v.29, n.1, p. 147-165, jan/jun. 2003.
Introdução
Para enfrentar problemas como estes, a gestão urbana precisa articular o que as cidades
têm colocado em prática no sentido de evitar a ocorrência ou intensificação de eventos adversos.
Especificamente no que diz respeito ao gerenciamento dos riscos no cenário brasileiro, Almeida
e Pascoalino (2009) assinalam que a gestão de riscos não consiste em temática prioritária na
agenda de governo em virtude de existirem problemas muito mais preocupantes ou simplesmente a
cultura de risco e, consequentemente, sua gestão diferirem de maneira sensível. De acordo com
estes autores, a gestão de riscos no país tem se preocupado com as gestões de urgência e crise,
ou seja, a adoção de políticas públicas ou ações produzidas depois da ocorrência de um possível
evento adverso.
41 Doutorando e mestre em Estudos Urbanos e Regionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(PPEUR/UFRN). E-mail: pontesrylanneive@gmail.com
42 Professora e vice-coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Estudos Urbanos e Regionais (PPEUR/
UFRN). E-mail: zoraidesp@gmail.com
capítulo, analisar a gestão de riscos da cidade do Natal a partir de 2008 quando foi finalizado
o PMRR de Natal, buscando investigar o atual panorama de internalização do tema na agenda
urbana municipal. Para tanto, a metodologia segue as orientações de uma pesquisa com abordagem
qualitativa, em que se utiliza de um conjunto de instrumentos que possibilita o alcance dos
resultados.
Metodologia
que define o mapeamento das áreas de riscos da cidade; e a Lei Complementar nº 124/2011, que
estabelece a criação do Plano Diretor de Drenagem e Manejo de Águas Pluviais (PDDMA) da
cidade. A pesquisa documental é importante para este capítulo em função de ser um procedimento
metodológico que permite perceber o que a gestão urbana de Natal, em termos de legislações
ou políticas públicas, apresenta para lidar com os riscos de eventos adversos na cidade.
Departamento de Defesa
Entrevistado 1 Chefe de operações 21 de agosto de 2017
Civil e Ações Preventivas
Secretaria Municipal de
Entrevistado 2 Meio Ambiente e Urbanis- Ex-secretário adjunto 22 de agosto de 2017
mo de Natal
Secretaria Municipal de
Entrevistado 3 Segurança Pública e Defesa Secretário 22 de agosto de 2017
Social de Natal
Secretaria Municipal de Técnica municipal de
Entrevistado 4 Meio Ambiente e Urbanis- licenciamento e fiscali- 12 de setembro de 2017
mo de Natal zação ambiental
(i) analisar o contexto de risco; (ii) avaliar o risco de acordo com esse contexto, por
meio da identificação das ameaças, vulnerabilidades e consequências do impacto no
sistema de produção familiar; (iii) identificar como os chefes de unidade produtiva e
as instituições de extensão técnica, bancos, cooperativas etc., respondem aos riscos;
e (iv) monitorar a evolução ao risco ao longo do tempo (LITRE; BURSZTYN, 2015),
p. 58).
Na busca para melhor entender a empiria do que está estabelecido através da Lei nº
12.608 e de outros dispositivos legais, há o Plano Nacional de Gestão de Riscos e Resposta
a Desastres Naturais (PNGRRDN). Esse plano consiste em uma política pública do governo
federal, aprovada no ano de 2012 e monitorada pela Casa Civil da Presidência da República,
objetivando proteger a vida das pessoas, garantir a segurança delas, diminuir os danos resultantes
de desastres e preservar o meio ambiente (BERTONE; MARINHO, 2013), por meio de ações
divididas em quatro eixos de atuação (BRASIL, 2012):
43 Área de risco é aquela “passível de ser atingida por fenômenos ou processos naturais e/ou induzidos que
causem efeito adverso. As pessoas que habitam essas áreas estão sujeitas a danos à integridade física, perdas
materiais e patrimoniais. Normalmente, no contexto das cidades brasileiras, essas áreas correspondem a núcleos
habitacionais de baixa renda (assentamentos precários)” (BRASIL e IPT, 2007, p. 26).
Posto que, no Brasil, existe todo um conjunto de instrumentos, legislações etc. direcionado
ao gerenciamento dos riscos nas cidades, buscando reduzir as situações de vulnerabilidade e
risco socioambientais, analisamos e discutimos em sequência acerca de um caso do país no que
cerne à internalização da gestão de riscos enquanto estratégia de agenda urbana.
O lócus (local) de pesquisa deste capítulo é a cidade do Natal, a qual é estudada sob a
perspectiva da gestão de riscos no viés de compreensão do atual panorama de internalização do
tema na agenda urbana municipal. Nesse contexto, constatamos que o último mapeamento das
áreas de risco da cidade em análise ocorreu em 2008, quando a Secretaria Municipal de Meio
Ambiente e Urbanismo (SEMURB) em parceria com a Prefeitura Municipal elaborou o PMRR
de Natal, cujo objetivo foi realizar:
Dentro do atual processo de revisão do plano diretor municipal, esse mapeamento ainda
se encontra em andamento, sofrendo atualizações a partir de contribuições tanto do corpo
técnico da gestão municipal quanto de instituições de ensino e da sociedade civil44. O mapeamento
das áreas de riscos contribui para a cidade do Natal e suas populações na medida em que busca
44 Informação coletada a partir dos dois primeiros autores deste capítulo, que fazem parte do processo de revisão
do plano diretor vigente de Natal por meio da participação e colaboração com o subgrupo “Áreas de Risco” do
Grupo de Trabalho de Áreas Especiais, conforme mencionado no momento dos procedimentos metodológicos.
porque se a gente consegue mapear quais são as áreas mais vulneráveis da cidade,
se a gente consegue saber o que está chegando e que vai atingir determinadas áreas
e tendo as pessoas é:: com a informação do que fazer e como fazer é que o negócio
flui, então eu entendo que parte de uma coisa que precisa ainda ser definida a::: o
tipo de gestão que vai ser feita e a equipe que vai fazer (ENTREVISTADO 4, 2017).
Para autores como Reis et al. (2014) e Medeiros e Souza (2016), o mapeamento das áreas
de vulnerabilidade e risco socioambientais é fundamental para a formulação e implementação
de ações de proteção e defesa civil na medida em que permite propor e planejar um conjunto de
políticas públicas e/ou ações de gestão de riscos que seja capaz de reduzir situações de riscos de
desastres. Reis et al. (2014), especificamente, definem o mapeamento da vulnerabilidade como
“uma importante medida não estrutural” (p. 2).
Como ferramenta que proporcione menor vulnerabilidade tanto ambiental quanto so-
cioeconômica, a cidade do Natal conta com sistema de alertas de desastres, fruto de parcerias com
o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN), do
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). O sistema de alertas, caracterizado
como uma medida não estrutural do Estado, visa o que o CEMADEN prevê enquanto uma de
suas missões: reduzir a ocorrência de desastres como inundações.
Sobre isso, especificamente em relação aos riscos de eventos adversos resultantes das
mudanças no sistema climático, observamos que a gestão municipal de Natal tem acesso à
informações climáticas por meio dos oito pluviômetros instalados na cidade, permitindo o
acompanhamento das chuvas em todas as regiões administrativas do município e, em casos de
probabilidade de ocorrência de desastres, o Departamento de Defesa Civil e Ações Preventivas
da SEMDES de Natalé alertada para atuação (priorizada de acordo com a magnitude do risco).
A respeito dessa rede de pluviômetros existente na cidade, o chefe de operações desse Departamento
aponta:
nós temos um sistema aqui de monitoramento... que nós temos oito pluviômetros
automáticos espalhados pela cidade... que é um convênio com o CEMADEN, certo?
E nós ficamos acompanhando a... a chuva em todas as regiões... nós espalhamos
pluviômetros nas quatro regiões da nossa cidade e ficamos acompanhando a chuva
(ENTREVISTADO 1, 2017).
[...] projetos de microdrenagem que tão atrasados, mas que, em tese, poderiam ajudar,
por exemplo, tirando a água ali do Arena das Dunas e jogando para o rio. Então,
tem algumas ações de engenharia... pouca ação que eu vejo da parte mais da área de
inteligência, ou seja, as redes de proteção, sinalização ou até mesmo pesquisas na
área... Então, eu vejo ainda muito a engenharia presente, embora com projetos muito
localizados -- e pouco dos outros efeitos... mais preventivo que poderia ocorrer
(ENTREVISTADO 8, 2018).
[...]Em Natal, tá sendo feito uma grande obra de saneamento, né? Mas o sistema de
drenagem, como eu disse aqui no início, não acompanhou realmente o crescimento,
então grande número de ocorrências nossas é de crateras que se abrem por causa
de rompimento de tubulações, né? Então, existe um sistema precário que, se fosse
feita essa grande obra minimizaria nossos, nossas áreas de risco... diminuiria muito
nossas áreas de risco (ENTREVISTADO 2, 2017).
Conclusões
Nessa ótica, observamos que o objetivo proposto no momento da introdução deste capítulo
foi alcançado na medida em que foi possível investigar o atual panorama de incorporação do
tema da gestão de riscos na agenda urbana municipal de Natal a partir, em especial, da análise
do plano diretor municipal em vigência, do PMRR de Natal e do plano de drenagem urbana
municipal.
Agradecimentos
Referências
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YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos / Robert K. Yin; trad. Daniel Grassi
- 2.ed. - Porto Alegre: Bookman, 2010.
Introdução
O presente texto busca após reflexão acadêmica durante o “XXXI Congreso ALAS”,
expandir o estudo e a visão sobre a gestão de resíduos em cidades brasileiras.
Dessa forma, reconhece-se que as iniciativas desses atores foram poucas frente a esta
questão, e o ministério do meio ambiente é quem regulamenta e faz o chamamento para acordos
setorial. Mas, no cenário atual poucos acordos foram firmados, os que já foram firmados não
assumem regularidade como a solução única e suficiente para diminuir a chegada de resíduos
as unidades de processamento de resíduos sólidos domiciliares. Assim, o que significaria a
abertura de novas possibilidades para o alcance mínimo de sustentabilidade, perpassa por
outros debates como o da prorrogação constante dos prazos para efetivação da PNRS.
No mundo, a estimativa de geração de REEE em 2014 foi de (41,900 KT) mais de quarenta
e um milhões de toneladas, dentre os quais destacam-se os resíduos de pequeno porte com
pequena expectativa de tempo de uso e influência da obsolescência em suas diferentes formas.
Nas cidades brasileiras, a realidade ainda não adquiriu grandes proporções dada a
oportunidade que esses resíduos oferecem aos sucateiros e novos empreendedores da reciclagem,
mas não torna diferente a realidade de catadores e das cooperativas e associações (DEMAJOVOVIC
et al, 2016; XAVIER, 2010, 2014).
Nesse sentido cabe enfatizar que alguns modelos de logística reversa são implementados
com êxito em países centrais que possuem regulamentações específicas, nesse sentido cabe a
ênfase de que a infraestrutura e coesão social são fatores importantes para execução de
diretrizes dessa dimensão.
Com relação à porcentagem de posse de algum tipo de telefone, a PNAD 2014 aponta
que, nas unidades domiciliares, foi de 93,46%. No que se refere à posse somente de telefone
móvel celular, o percentual foi de 56,3% da amostra dos domicílios. De acordo com o IBGE,
houve aumento quanto à existência de algum tipo telefone em 0,9%. Esses aumentos são em
comparação com a pesquisa no ano anterior (2013).
A presença dos telefones celulares nos domicílios brasileiros em 2003 era de 11,19%.
No período de dez anos, esse percentual chegou a 53,97%, demonstra também que o acesso
a outros tipos de equipamentos eletroeletrônicos, como no caso de computadores e celulares,
estava se estabelecendo. No entanto, destaca-se uma mudança substancial dessa realidade nos
dados da PNAD visto que em 2018 o percentual dos que tinham telefone móvel celular foi de
(93,2%) e permaneceu inalterado desde 2017.
É importante ressaltar que o uso de Internet no Brasil passou a ser uma categoria de
pesquisa do IBGE somente a partir de 2005, e, nesse ano, 31,9 milhões de pessoas declararam
ter utilizado internet no período de referência das entrevistas. Em 2008 foram 55,9 milhões,
em 2009 os números cresceram para 67,9 milhões, em 2011 foram 77,7 milhões de pessoas a
acessar a internet, e, por fim, em 2014, aproximadamente 95,4 milhões. A Internet, no ano de
2017, era utilizada em 74,9% dos domicílios do Brasil, e este percentual subiu para 79,1%, no
ano de 2018.
Em 2017, o microcomputador era usado para acessar a Internet em 52,4% dos domicílios,
em 2018 este percentual estava em 48,1% dos domicílios no País, em que havia utilização desta
rede. Observa-se também o uso de novas ferramentas para acesso a internet, como a televisão,
o tablet e o celular. Por isso destacou-se como relevante que no País, que em 2017, o percentual
dos domicílios em que havia utilização da Internet através do telefone móvel celular era de
98,7%, em 2018, foi de 99,2%. Na área rural o percentual de domicílios chegou a 99,4%.
Esses dados indicam que houve uma mudança nas formas de uso da internet, princi-
palmente um acelerado crescimento do uso de telefones celulares no Brasil, especialmente nas
áreas rurais. O que pode estar atrelado ao preço desses equipamentos ser menor que o preço de
um computador.
Esse sistema que prevê responsabilidades específicas aos atores, encarrega o Estado de
regulamentar as ações de estruturação do modelo nacional de retorno de resíduos. Destaca-se
que os estados e prefeituras deviam organizar planos que contemplassem satisfatoriamente os
meios possíveis a serem utilizados para implementar e operacionalizar os instrumentos dessa
política em período determinado nos acordos setoriais, dessa forma os municípios a depender
de fatores econômicos e populacionais devem implementar postos de recolhimento dos REEE.
A princípio é uma pequena parcela desses municípios que deve organizar seus sistemas, em
conformidade com as metas anuais do governo federal outras estruturas serão solicitadas.
Deve-se considerar que os 5.570 municípios brasileiros têm que organizar seus
orçamentos para a efetivação do que prevê a Política Nacional de Resíduos Sólidos. O destino
dos repasses provenientes da União e dos estados precisarão passar adequação para essas
novas despesas. No entanto, deve-se considerar ainda que, a dinâmica socioeconômica é o fator
determinante das quantidades de resíduos gerados e a destinação de recursos está condicionada
ao fluxo de gerenciamento e aos aspectos de composição dos resíduos em qualquer dimensão
de município.
Metodologia
A pesquisa foi fundamentada a partir da percepção de que Natal e outras cidades brasileiras
– a partir da pesquisa bibliográfica e da pesquisa de campo – enfrentam atualmente problemas
característicos do acúmulo dos resíduos eletroeletrônicos. Para melhor aprofundamento desse
debate, foi utilizada a técnica de entrevistas semiestruturadas, as quais foram realizadas com
representantes das instituições mais relevantes naquele município no tocante a gestão de resíduos,
a Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal (SEMURB), Companhia de Serviços
Urbanos de Natal (URBANA), visitas a Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis do
Rio Grande do Norte (COOCAMAR) e a Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis
da Cidade do Natal/RN (COOPCICLA). Estas foram esclarecedoras da atuação do Estado,
mercado e sobre as expectativas dessas instituições para com a sociedade.
Em Natal, a gestão de resíduos torna-se mais desafiadora a medida dos anos. O processo
de transição nessa cidade ocorreu com a transformação institucional do antigo lixão do bairro
de Cidade Nova em projeto de estação de transbordo. Trata-se nesses termos visto que o que
poderia vir a ser um espaço de gerenciamento de resíduos, torna-se com o passar dos anos um
monte de lixo cada vez mais alto.
Esteve claro durante a pesquisa de campo que os paradigmas existentes com relação
ao tema dos resíduos – que são expostos pela literatura do tema – são confirmadores da
necessidade de mudança das estruturas de gerenciamento e gestão dos resíduos. Tal afirmativa
é verificável diante da triangulação de informações apresentadas nas entrevistas na SEMURB,
URBANA e duas empresas que compõem o sistema de recebimento de REEE na cidade de
Natal.
No caso em questão, essas ações são descritas por ambos os setores das mencionadas
instituições como ações de conscientização e educação ambiental.
No que diz respeito ao gerenciamento, essa única prática realizada no município, não
atende os setores e zonas da cidade por inteiro. Haja vista a falta de periodicidade, ausência de
clareza nas campanhas, falta de finalidade das mesmas e articulação territorial inadequada. Em
Natal as campanhas, ocorrem em poucos bairros da cidade, destaca-se que na zona norte que é
a mais populosa da cidade essa campanha foi realizada menos vezes.
Esse material pode chegar aos aterros sanitários quando não garante ao empresário
retorno significativo pela sua estocagem ou envio a empresas recicladoras, ou seja, quando
não representa um lucro significativo as expectativas ele pode vir a receber outra destinação
ambientalmente adequada.
As instituições de fiscalização relatam essa prática como fato comum, algo que não
podem coibir diante do pouco efetivo de fiscais, quando é possível aplicam sanções legais,
desde notificações até multas. Esses atores do setor público, ressaltam que os geradores de
resíduo em grande escala e os trabalhadores informais do setor de consertos são exemplos de
agentes notificados por essas práticas, mas que as secretarias atuam por meio de denúncias que
a população local faz e que geralmente os proprietários de áreas que estejam nessa situação é
que respondem pelo ocorrido.
É possível constatar que não existe uma articulação entre as instituições e os agentes
diretos da cadeia produtiva. Inexiste a integração das instituições púbicas no âmbito das ações
municipais, assim como também não há uma integração do entendimento a respeito da gestão
de resíduos. As empresas privadas que comercializam os REEE não têm parcerias com as
cooperativas de catadores de materiais recicláveis em Natal, nem há a inclusão
Considerações Finais
No âmbito dessa cadeia de reciclagem de REEE, que é global, ainda são as cooperativas
e os catadores de materiais recicláveis em Natal que se constituem como elo frágil desse
processo. As dinâmicas locais que envolvem esse processo estão centradas em duas empresas
do município que concentram o recebimento desses resíduos a partir de parcerias com lojas
de conserto e que vendem os resíduos que tem valor significativo a empresas nacionais que
exportam esses componentes.
Compete destacar que embora a PNRS oriente e o Estado planeje, não é possível
visualizar a integração desses atores sociais com essas instituições como essa norma previa
anteriormente. Constatamos que ainda ocorre a culpabilização da população pelo cenário
urbano, o catador no discurso dos representantes das instituições de governo e das empresas
permanece estigmatizada no argumento da ausência de capacidade técnica no trato dos REEE.
embora moderna, está distante de atingir as previsões legais da PNRS. Esse cenário de ausência
de articulação, coordenação, integração em 2020 se configura como indicador da inexistência
de uma gestão compartilhada como foi previsto dez anos atrás na PNRS.
Referências
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altera a Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 e dá outras providências. Diário Oficial da
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YIN, ROBERT K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Trad. Daniel Grassi - 2.ed. Porto
Alegre: Bookman, 2001.
A economia das eólicas se instala no Rio Grande do Norte a partir da urgência nacional
em resolver a questão da crise energética elétrica. O desafio de quem pensa o setor como estratégia
de desenvolvimento é observar se as políticas escolhidas, propiciaram a formação de setor
autônomo e independente. Nessa perspectiva, o presente capítulo objetiva identificar a como os
programas de incentivos locais ao desenvolvimento promoveram da economia das eólicas para
integração regional e setorial.
Para atender ao objetivo do trabalho em tela, dividiu-se o texto em três seções, além
desta introdução e das considerações finais: 1) Desenvolvimento e economia das eólicas – que
trata das potencialidades da economia das eólicas para o desenvolvimento; 2) Políticas Locais
de Incentivo à Economia das Eólicas – como o RN atuou na promoção do setor; 3) Economia
das Eólicas e integração regional: os papéis de Natal e Mossoró – a importância das principais
cidades do RN para o fortalecimento do setor eólico.
A produção de energia eólica é uma atividade econômica com uma complexa cadeia
produtiva, que possui três etapas fundamentais: 1) tecnologia – P&D (Pesquisa e Desenvolvimento
como busca pela viabilidade econômica e pelo aumento progressivo da confiabilidade da tecnologia),
estudos de viabilidade (programas demonstrativos e testes de campo com análise da viabili-
dade técnica, econômica e comercial), centros de pesquisa e estações de testes (realização e
gerenciamento das atividades de P&D, ponto focal na intervenção entre os atores da indústria);
2) indústria – Máquinas e equipamentos (Fabricação do maquinário e dos equipamentos para
a produção de energia eólica), Construção, Transporte e conexão com a rede elétrica (infraestrutura
para implantação dos parques eólicos); e 3) mercado – distribuição (distribuição da produção
ao sistema elétrico), Operação de manutenção (técnicos, conhecimento e peças de reposição
para a manutenção do equipamento de geração de energia eólica), Monitoramento da produção
e vendas (manutenção e busca por novos mercados).
Não se trata de afirmar que o PROINFA não trouxe resultados positivos para o setor
eólico brasileiro. A criação de um mercado tornou viável a produção de energia eólica no Brasil.
A crítica aqui construída é que, apesar do Brasil apresentar-se com grande potencial de produção
de energia eólica no mundo, a sua indústria eólica é dependente tecnologicamente de outros
países. Portanto, o seu potencial é limitado ao mercado enquanto consumidor de máquinas e
equipamentos eólicos e geração de energia.
Dessa forma, ao importar tecnologias e equipamentos, os países periféricos devem atentar para
o fato de como essa tecnologia chegou em seus territórios. A forma como os países absorvem
essas tecnologias irá determinar o grau de independência e competitividade no setor.
A garantia de mercado é feita atualmente por meio de leilões50 para a fonte eólica.
Contudo, segundo o anuário Cenários (2015), para os investidores esta política é limitada e
precisa ser ampliada. Quanto ao mercado de energia eólica nacional, ocorre a necessidade da
criação de um calendário definido de leilões e ampliação da quantidade mínima (400 MW) de
energia eólica prescrita para o governo comprar.
49 A respeito de Políticas de Incentivo de Inovação à energia eólica ver Camillo (2013), e sobre as diversas políticas de
incentivos à energia eólica brasileira ver detalhes em Macedo (2015).
50 Acerca do histórico dos leilões no Brasil, ver detalhes no Capítulo 3 da tese de Macedo (2015)
O problema central das vias marítimas é a estrutura portuária. No caso do Rio Grande do
Norte, a infraestrutura portuária é composta por três portos. O primeiro é o Terminal Portuário
de Natal, situado na capital potiguar, à margem direita do Rio Potengi, a 3Km de sua foz. O terminal
é administrado pela Companhia Docas do Rio Grande do Norte (CODERN), destacando-se
na exportação de frutas e outras cargas refrigeradas, as quais perfazem cerca de 30% da
movimentação do escoadouro, além de rochas (quartzitos) e cabotagem de cargas em contêiner.
A questão das rodovias parece ser tão problemática quanto a marítima. Macedo (2015)
aponta que as principais vicissitudes das rodovias são:
• Escala na demanda: ausência de sincronização entre entrega das cargas realizada pelos caminhões nos
portos e a ancoragem dos navios, que acarreta risco de equipamentos parados;
• Limite de transporte diário: são permitidas no máximo duas carretas por dia e não é permitido
o tráfego noturno nas BR’s, além da demanda de licença para o fechamento de alguns trechos do
percurso. Elevando assim a demora no transporte dos equipamentos e encarecimento da operação.
51 As fábricas de torres encontraram uma solução para evitar o transporte para longas distâncias sendo construídas e
operando de forma temporária perto dos parques eólicos em construção, evitando assim as dificuldades e custos
de cabotagem.
Segundo o documento ‘Mais RN’, a solução para esse caso seria a criação de um corredor logístico,
com infraestrutura que permita que os equipamentos cheguem sem barreiras aos locais de destino;
• Autorização Especial de Transporte (AET): para realizar a viagem desses equipamentos é necessária
solicitar autorização ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), elevando o
prazo para a entrega dos equipamentos;
• Manutenção das rodovias: devido ao valor agregado dos equipamentos, as condições das rodovias
representam uma preocupação e cuidado maior com o seu transporte.
Para melhorar a situação delicada dos transportes de equipamentos por via rodoviária,
encontraram-se dois tipos de parcerias institucionais: uma promovida pela ABEEÓLICA, que
criou o GT Logística, e a outra pelo CERNE, organizando um mapeamento de um corredor de
passagem.
Por meio das políticas de incentivo à produção de energia eólica, houve uma elevação
da demanda industrial, ou seja, de máquinas e equipamentos para a geração energética.
Entretanto, quando se iniciou a corrida nacional pela ampliação da matriz energética, a indústria
nacional era incipiente e foi necessária a importação de máquinas e equipamentos.
Do início da inserção eólica no país, nos anos 2000, ao período que finaliza a análise
do presente capítulo, em 2017, a cadeia produtiva da indústria eólica conseguiu avançar no
sentido de consolidar-se no setor. Todavia, ainda é dependente da tecnologia e dos principais
componentes dos equipamentos eólicos de origem externa. Este foi o resultado das políticas
nacionais para a expansão energética que priorizou os incentivos à criação do mercado,
negligenciando os eixos industriais e tecnológicos (CAMILLO, 2013).
Além do crédito a juros baixos, outra via de estímulo à industrialização são as políticas
locais de desenvolvimento industrial. As principais medidas que a gestão local pode adotar
para promover a indústria eólica são: infraestrutura - obras viárias, água, esgoto, energia e
telefonia –, incentivos fiscais – por meio da isenção de impostos – e promoção de qualificação
de mão de obra e de Centros de Pesquisa e Desenvolvimento.
52 PROADI é regido pela Lei 7.075, de 17/11/1997 e o Decreto 13.723, de 24/12/1997. Detalhes sobre a participa-
ção do PROADI no desenvolvimento industrial potiguar ver o Capítulo 3 do Livro de Araújo (2010).
• Estabelecer, no Rio Grande do Norte, um Parque Tecnológico que articule áreas estra-
tégicas de desenvolvimento de empresas de base tecnológica com foco na geração de
emprego de alta qualificação e renda para o estado;
• Incentivar a implantação de parques eólicos no estado por meio da cessão dos terrenos
públicos com alta incidência de vento para a instalação desses empreendimentos;
concessão de benefícios fiscais para compra de equipamentos e de incentivos para
produção de equipamentos e insumos no Estado do RN.
METAS
OBJETIVO INDICADOR V0
Aumentar o conteúdo Participação dos setores 38% (2013) 38% 40% 48% 50%
tecnológico da produ- de média e alta inten-
ção do Estado sidade tecnológica na
produção da indústria de
transformação do RN
Fonte: PIA-Empresas/
IBGE
Ampliar e melhorar % Km Construídos 3000 Km 5% 10% 10% 10%
a qualidade da malha (100%)
rodoviária Fonte: DER
% Km Recuperados 3000 Km 20% 40% 60% 60%
(100%)
Fonte: DER
% de rodovias com con- 41,3% 85,4%
ceito “bom” ou “ótimo” (2015)
no estado geral na Pes-
quisa CNT
Ampliar e diversificar Produção de energia 2,3 GW - - 4,7 7,0 12,1 13,9 GW
a matriz energética eólica no RN Fonte: (2015) GW
com foco em fontes ANEEL/CERNE
renováveis Produção de energia 1 (2015) - - 122 322 800 2000MW
solar no RN MW
Fonte: ANEEL (2015)
e projetos Bionenergy,
Braxenergy e PETRO-
BRÁS
Fonte: SEPLAN (2016). SILVA (2017).
Natal é a capital do Rio Grande do Norte e em 2010 o censo registrou que a cidade
possuía 803.739 habitantes, com a população 100% urbanizada. Em Natal está a prestação dos
serviços mais sofisticados do estado, a presença de Universidades, Institutos Técnicos, Centros
de Pesquisa, Unidades Hospitalares de Alta Complexidade, diversos serviços de Engenharia
etc, além de a cidade possuir a presença do Terminal Portuário de Natal, centralizando a distribuição
dos principais produtos importados e exportados pelo estado.
Com relação ao objeto desse trabalho, Economia das Eólicas, os principais setores que
possuem relação com as eólicas – Indústria de Transformação, Produção e Distribuição de
energia elétrica e Construção – representam juntos, em Natal, 13% do emprego formal municipal e,
em Mossoró, 17% do emprego formal municipal. Apesar da participação no emprego formal
da capital ser menor do que em Mossoró, em números absolutos Natal é bem superior, com
37.698 empregos nos três setores mencionados. Em seguida vem Mossoró, com 11.650 empregos
gerados.
A Tabela 2 apresenta o número de empregos formais nas divisões dos segmentos sele-
cionados, a fim de identificar a importância de Natal e Mossoró frente ao setor eólico potiguar.
Em que pese a pujança das economias de Natal e Mossoró em comparação com outras
cidades do estado, a análise da estrutura produtiva desses municípios mostra que elas atuam de
forma tangencial à economia das eólicas. Por serem polos regionais, atraem demandas por
serviços especializados que as microrregiões eólicas não são capazes de oferecer. A relação desses
polos com as microrregiões serve exatamente para evidenciar o grau de integração regional
entre esses territórios através de um setor econômico. Mas essa integração evidência também o
grau de dependência das microrregiões eólicas aos serviços oferecidos pelos polos.
Considerações Finais
Em que pese essas ações paliativas que o poder local pode adotar, para ocorrer um
desenvolvimento local integrado ao desenvolvimento geral – que os empreendimentos eólicos
poderiam ser capazes de conferir maior dinamicidade –, faz-se importante a existência de um
programa nacional de desenvolvimento regional ativo. Esse programa deveria valer-se das
especificidades de cada localidade, sendo capaz de oferecer opções de integração local/global,
a partir da construção de redes, da articulação local de fornecedores e de pontos centrais de
fluxo de informação.
Nesse sentido, a microrregião com mão de obra de baixa qualificação, sem desenvolvimento
tecnológico e sem infraestrutura logística, possui um relacionamento tangencial com a
economia das eólicas. Uma importante vantagem para essas microrregiões é a oportunida-
de de modernização de seu equipamento urbano, dado que empreendimentos no período
de construção realizam parceria para a melhoria de rodovias e até mesmo serviços públicos
como saúde (suporte e melhorias de postos de saúde) e educação (treinamento de mão de obra
local). Destaca-se como desvantagem a perda de oportunidade de absorver para o longo prazo
a dinâmica temporária do período de construção dos parques. Por isso, se faz urgente que os
gestores locais coloquem em prática políticas e parcerias que gerem uma efetiva modernização
da dinâmica socioeconômica local.
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Introdução
Com isso, o presente subcapítulo tem como objetivo apresentar o que são os Bancos
Comunitários de Desenvolvimento e como se apresentam como tecnologias sociais que podem
além de fortalecer organização comunitária local, possibilitar emancipação econômica e social
para as comunidades rurais e periféricas excluídas do acesso a crédito, e outros serviços essenciais,
para essas populações se desenvolverem de seu modo auto-organizado.
Para tanto, essa análise se inicia em seu primeiro tópico realizando um resgate do que é
a economia solidária no contexto brasileiro, para no segundo tópico, revelar como se organizam
seus empreendimentos econômicos solidários. No terceiro, apresenta as Finanças Solidárias em
seus arranjos socioeconômicos. O quarto tópico se preocupa em expor o que são os Bancos
Comunitários. E no quinto tópico, discutir o que são essas experiências de Bancos Comunitários
de Desenvolvimento como tecnologias sociais. Para ao final, fazer breves considerações em
torno do reconhecimento dessas práticas.
Em uma perspectiva histórica das lutas sociais no Brasil, Maurício S. de Faria e Fábio
Sanchez (2011) sugerem que o campo heterogêneo de experiências que é a economia solidária
é consequência do processo de democratização da sociedade brasileira, enquanto movimento
54 Para saber mais sobre essas experiências e a inspiração delas para a Economia Solidária, acessar textos de
Cláudio Nascimento <<https://claudioautogestao.com.br/>>. Acesso em: 30.abr.2020.
que possui como pilares centrais a defesa da participação da sociedade organizada nos rumos
do país. Segundo os autores, “a base concreta desse movimento resulta de um processo de
confluência de várias vertentes autonomistas ou comunitaristas, como um vale para o qual
convergem várias afluentes até formarem um rio” (p.414). Dentre essas vertentes, Faria e Sanchez
(2011) destacam:
Ainda assim, não há unidade nessa discussão, nem mesmo caminha para um consenso.
Há uma discordância sobre o fenômeno da economia solidária. Há quem a compreenda como
assistencialista; como um mecanismo capitalista de adaptação a crise econômico-social; como
forma precária e desprotegida de relações de trabalho informal; como modo de produção
substitutivo ao capitalismo, e, por último, como modo de produção coexistente ao capitalismo
sendo divergente das práticas deste (CUNHA, 2007 e EID, 2003). Com isso, a expressão econômica
solidária vem ganhando diferentes significados a partir dos seus contextos, e perspectivas, que
colocam em evidência a singularidade dessas experiências.
Com isso, entendemos que esse conceito representa um sentido de que para termos uma
sociedade que predomine a equidade entre todos os seus membros, é preciso que a economia
seja voltada para solidariedade, em vez da competição (SINGER, 2002). Nesse sentido, concebemos
a estruturação da economia solidária não como um sistema opositor ao capitalista, negando as
práticas econômicas proveniente dessa estrutura, mas se desenvolvendo dentro desse arranjo,
resinificando os preceitos deste sob a base da autogestão. A partir das características inerentes
aos seus arranjos econômicos, os Empreendimentos Econômicos Solidários são concebidos
para dar conta dessa proposta coletiva. Para compreender melhor como isso é realizado,
precisamos entender o que são esses Empreendimentos Econômicos Solidários, que é o conceito
utilizado para caracterizar a forma organização econômica que norteia a construção desse fenômeno.
55 Até o momento foram realizadas quatro Conferências Nacionais de Economia Solidária (CONAES) e cinco
plenárias do Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES), onde o 1º CONAES (2006) que formulou as defi-
nições norteadoras de Economia Solidária e dos Empreendimentos Econômicos Solidários (NESOL-USP, 2015).
EMPREENDIMENTO COOPERATIVAS
SOLIDÁRIO TRADICIONAIS EMPRESAS CAPITALISTAS
Os autores reforçam ainda que a luta pela realização de um marco legal que possibilite
um maior respaldo institucional às atividades desenvolvidas pelos EES, em todo Brasil, vem
sendo construído com um amplo processo de debate, resultado de mobilizações em todo o
país (BALTHAZAR e CARDOSO, 2016). Consequência disso, foi o Projeto de Lei (PL) de nº
137/2017 no Senado Federal que caracterizou os Empreendimentos Econômicos Solidários para
reconhecimento beneficiário da Política Nacional de Economia Solidária em seu Art. 4º.
Enquanto em 2007 havia 43,5% (9.386) dos EES do país concentrados na região, em
2013 identificou 40,8% (8.040), revelando em ambos os mapeamentos realizados até então, a
maior concentração das iniciativas de Empreendimentos Econômicos Solidários na região
nordeste do país. Além destes dados, ainda de acordo com o último levantamento feito pela
SIES em 2013, mais da metade dos EES atuam predominantemente em áreas rurais, 54,8%,
contra 34,8% que atuam em áreas urbanas e 10,4% que se identificaram com a atuação simultâneas
tanto em áreas rurais quanto urbanas. Esses números são bem próximos dos obtidos no
primeiro mapeamento em 2007, que já havia identificado a predominância de empreendimentos
coletivos no meio rural, muito em função da agricultura familiar que buscam diferentes estratégias
associativas de beneficiamento e comercialização de sua produção (SILVA e CARNEIRO, 2016).
Silva e Carneiro (2016), baseados no banco de dados do SIES (2013), apontam também
que os Empreendimentos rurais estão localizados em sua maioria na região Nordeste (72%),
Centro-Oeste (54%) e Norte (50%), enquanto a atuações predominantemente urbanas são maioria no
Sudeste (61%). No tocante a atividade, os autores trazem que o meio rural destaca-se também
pela alta proporção dos EES que desenvolvem atividades de Consumo (85%), Trocas Solidárias
(65%), Finanças Solidárias(62%) e Produção (52%), enquanto que o meio urbano, apresenta
maior proporção entre os EES de Prestação de Serviços (64%) e de Comercialização (48%).
Vieira (2015) afirma ainda que existem grupos de reciclagem, de compras coletivas, de educação
popular, e iniciativas de agricultura familiar espalhadas em ambos os espaços urbanos e rurais,
em todo o território nacional.
Considerando que o sistema financeiro tradicional opera sob uma dinâmica social e
territorialmente excludente, uma parcela da sociedade mundial residente em áreas periféricas
urbanas e rurais têm buscado estabelecer outros circuitos para suprir as suas necessidades
locais, principalmente no tocante ao crédito para o consumo e para operar suas atividades pro-
dutivas (RIGO et al., 2015). Como vimos nos tópicos anteriores, a ressignificação de práticas
econômicas no final do século XX vem aliado a disseminação da economia solidária. Aliado
a isso, podemos dizer que no Brasil o segmento das Finanças Solidárias é uma aglutinação
dos conceitos de microcrédito e microfinanças no mundo (COELHO, 2003; PASSOS, 2007 e
CARVALHO, 2016).
A partir desta iniciativa, o campo das microfinanças surgem como uma inovação
urgente no sul da Ásia, resolvendo problemas de acesso a crédito, poupança, entre outras ações
que governos e instituições financeiras convencionais não resolviam naquele contexto. As
microfinanças além do serviço de crédito, oferecem poupanças, transferências e seguros, onde
o microcrédito é somente um dos seus produtos (PASSOS, 2007; CARVALHO, 2016). Assim,
as microfinanças, em particular o microcrédito, surgem como alternativa para a população excluída
do sistema bancário e financeiro tradicional, oportunizando acesso a crédito de baixo valor, a
juros zero ou quase zero, que atendam a necessidade desta população (COELHO, 2003). Por
isso, muitas vezes, os conceitos de microfinanças e microcréditos são tratados como sinônimos
posto que as práticas, de fato, são próximas, mas se diferem pela sua estrutura em conjunto
(ABRAMOVAY, 2003).
Para a Passos (2007), cumpre notar que a maioria das experiências no mundo estão
articuladas em rede, disponibilizando acesso a crédito individual e coletivo. Coelho (2003) ressalta
que as Finanças Solidárias se inserem nessa perspectiva, resgatando e ampliando a ideia inicial
das microfinanças, com formas de democratização do sistema financeiro que priorize as populações
excluídas do sistema bancário convencional, contribuindo principalmente para o desenvolvimento
humano integrado e sustentável. Assim, existe um entendimento comum de que o conceito de
finanças solidárias se constitui como uma ampliação das microfinanças (PASSOS, 2007). No
entanto, a diferenciação desses conceitos é um tanto “nebulosa”, pois muitas vezes se confundem.
56 Ver tese de Carvalho (2008) onde retrata minuciosamente o histórico embrionário dessas iniciativas.
Silva Júnior (2016) na sua tese em torno dessa tecnologia social que são as Finanças
Solidárias, chama a atenção que, embora essa “bancarização dos mais pobres” fomentada por
essa “indústria do microcrédito” passe a exercer forte influência no campo das microfinanças, não
encerra a totalidade de tais práticas e, ainda, invisibiliza o olhar sobre as finanças de proximidade
que ampliaram o universo das microfinanças dentro do contexto das finanças solidárias. Para o
autor, as finanças de proximidade se baseiam em critérios de relação econômica, onde “o laço
financeiro encontra-se submerso em relações de confiança e solidariedade” (SILVA JÚNIOR,
2016, p.125).
Esta é a razão pela qual o conceito de finanças solidárias está também intimamente
ligado às finanças de proximidade57, pois ambas constituem-se de práticas enraizadas territo-
rialmente e comunitariamente. Essa proximidade afetiva e moral entre o agente que concede
crédito e o candidato ao empréstimo tem duas funções:
Silva (2017, p.23) enfatiza que é importante ressaltar que as finanças solidárias no Brasil
transcendem esse aspecto de concessão de crédito somente, pois “dirigem sua forma de atuação
buscando atingir um sistema de serviços e produtos financeiros mais diversificado e ajustado
às realidades do público que objetiva envolver”. Por isso, enquanto os organismos de microcrédito
visam oferecer um serviço segmentado, voltado a uma atividade específica e de natureza
produtiva, as finanças solidárias, a partir das técnicas da relação de proximidade, estão atentas
às dinâmicas de sobrevivência das famílias, cuja fronteira entre consumo e investimento não é
simples de ser estabelecida, ainda mais pelo fato de essas famílias estarem suscetíveis às
dificuldades para garantir a própria satisfação de suas necessidades básicas, dada a instabilidade
de renda (SILVA, 2017).
Neste caso, a finalidade das finanças solidárias segue no sentido de construir um sistema
no qual o crédito se integre a um conjunto variado de serviços financeiros necessários para
as famílias, buscando garantir tanto a oferta de serviços, como recursos suficientes para
sustentabilidade dessas organizações voltadas a este fim, baseando sua existência no incen-
tivo local que recebem pela adesão de seus participantes (ABRAMOVAY, 2004). Junqueira
e Abramovay (2005) trazem que essas experiências de finanças solidárias são compostas por
iniciativas que valorizam o potencial de mobilização de investimentos locais, o financiamento
conjunto das unidades de consumo, de produção e as redes de relações sociais entre indivíduos,
como modalidade não-patrimonial de garantia e controle dos recursos locais.
57 Ver Sandro P. Silva (2017) - “Economia Solidária e Finanças de Proximidade: Realidade Social e Principais
Características dos Empreendimentos de Finanças Solidárias No Brasil”.
Os Fundos Rotativos Solidários (FRS) podem ser considerados embriões das experiências
de finanças solidárias no Brasil. Se iniciam em meados de 1980 no Nordeste, e em pouco
tempo, se espalham até o Sul do país (NESOL-USP, 2015; SILVA, 2020). Bertucci e Silva
(2003) identificou que os primeiros Fundos Rotativos foram de apoio aos projetos alternativos
comunitários, criados para contribuir com a melhoria das condições de vida de homens e
mulheres excluídos do campo e da cidade por meio de iniciativas produtivas e de infraestrutura
comunitária. Cada experiência possui sua especificidade e modo de organização de acordo
com as condições e contextos histórico-culturais em que se encontram58. Em linhas gerais, os
FRS preveem que seus beneficiários tenham à disposição certa quantia de recursos – que pode
ser não-monetária, como pequenos animais ou equipamentos específicos, por exemplo – e que,
após um período predeterminado e acordado entre as partes, deve ser devolvida ao Fundo para
que possam ser emprestados para outros tomadores (SILVA, 2020).
58 Para uma análise profunda sobre características de Fundos Rotativos Solidários no Brasil, ver Barreto (2016).
Os Clubes de Troca, embora não tenham hoje a mesma expressão que outras iniciativas
das finanças solidárias por todo o Brasil, é uma experiência constituidora dessas iniciativas.
São muito conhecidos pela utilização das moedas-sociais, que é utilizada em determinado
espaço e tempo definidos, onde produtores e consumidores se reúnem para trocar produtos e/
ou serviços em determinado horário e local (NESOL-USP, 2015). As experiências pioneiras
surgem no Canadá em 1983 com os Lets- Local Exchange Trading System59 (Sistema de
Negociação de Câmbio Local, tradução nossa) e depois essa prática é disseminada para outros
países. Na América Latina, a experiência se inicia na Argentina em 1995 na cidade de Bernal e
no final da década de 90 nos outros países vizinhos. No Brasil, a primeira iniciativa foi em São
Paulo, no bairro de Santa Terezinha e, logo depois, se expande a outras comunidades no Rio de
Janeiro, Porto Alegre e outros estados (ARKEL et al., 2002)
No último levantamento realizado pelo SIES (2013) onde tivemos 19.708 Empreendi-
mentos Econômicos Solidários visitados, 328 deles são enquadrados na categoria de “Finanças
Sociais” – correspondente às Finanças Solidárias – o que representa 1,7% do total pesquisado.
Atualmente, dos tipos mais comuns de Empreendimentos Econômicos Solidários caracterizados
nessa categoria Finanças são: banco comunitário, cooperativa de crédito e fundo rotativo
(SILVA, 2020).
59 Traduzido do inglês - É um sistema de negociação de câmbio local, onde uma empresa comunitária sem fins
lucrativos, organizada localmente, democraticamente, fornece um serviço de informações da comunidade e registra
transações de membros que trocam bens e serviços usando a moeda criada localmente.
Os BCD também se caracterizam por estar situados em comunidades com baixo Índice
de Desenvolvimento Humano (IDH). As experiências com práticas metodológicas iniciadas
pelo Banco Palmas, pioneiro e referência nacional e internacional da temática, se atendo a um
recorte das iniciativas brasileiras onde as comunidades apropriadas com bancos comunitários
possuem peculiaridades, diferentes histórias, conhecimentos e aprendizagens próprias nas suas
experiências, de maneira que é importante perceber as múltiplas estratégias e metodologias que
essas iniciativas podem assumir, com suas moedas-sociais, em distintos contextos e regiões do
país. As experiências se apoiam em uma série de ferramentas para gerar e ampliar a renda no
território.
difícil missão de tentar viabilizar uma forma de economia local para a auto-organização comu-
nitária, mediada pela Associação de Moradores do Conjunto Palmeiras (ASMOCONP). Para
tanto, a comunidade realizou o seu mapeamento de consumo e produção, como estratégia de
tentar essa reorganização socioeconômica reunindo moradores e comerciantes locais. Aliado
a isso, o objetivo do projeto Banco Palmas é garantir acesso a microcréditos para população
poder produzir e consumir localmente, a juros baixos, sem exigência de consultas cadastrais
externas, comprovação de renda ou fiador. O cadastro formal a concessão de crédito exige
um levantamento da vida pessoal do tomador do empréstimo na comunidade, realizado pelo
Agente de Crédito e avaliado segundo o Comitê de Avaliação de Crédito (CAC), compostos por
representações da comunidade que juntos compõem o Conselho Gestor do BCD (FRANÇA
FILHO, 2012).
Silva Júnior (2016) reforçam ainda que diferentemente das práticas de microfinanças
convencionais que estão orientadas para pessoas físicas ou jurídicas individuais, um BCD
visualiza um caráter mais amplo de alcance no instante do empréstimo, mesmo que seja concedido
a um empreendimento/empreendedor individual, essas concessões procuram ter o acompa-
nhamento do beneficiário para que possam atuar na capacidade de produção, de geração de
serviços e de consumo de acordo com a necessidade da comunidade, fortalecendo a rede de
“prossumidores” (produtores e consumidores).
alguns serviços financeiros adequados à sua localidade, em pouco tempo ganham o Brasil onde
podemos dividir em três tipos que se interligam mas caracterizam experiências próprias, os
BCD: I) Criados pelas próprias comunidades; II) Fomentados por incubadoras universitárias,
e; III) Incentivados por auxílio do poder público.
Segundo dados da Rede Brasileira (2006), estes possuem características diferentes das
que encontramos em instituições que atuam com microcrédito como a Sociedade de Crédito
ao Microempresário, a Cooperativa de Crédito, o Banco do Povo e até mesmo os Fundos
Rotativos. De acordo com o documento elaborado pela Rede (2006), sintetizamos aqui quatro
características fundamentais que diferenciam os BCD das demais instituições:
I) A coordenação do Banco e gestão dos recursos são efetuados por uma organização
comunitária: os próprios moradores de uma comunidade se organizam em forma de associação
para gerir o empreendimento solidário;
II) A utilização de linhas de microcrédito para a produção e o consumo local com juros
justos que possibilitam a geração de renda e oportunidades de trabalho em toda a comunidade;
III) A concessão e cobrança dos empréstimos são baseadas nas relações de vizinhança
e domesticidade, impondo um controle que é muito mais social que econômico;
para resolver problemas locais (LIMA e RIOS, 2016), é consenso que essas experiências são
tecnologias sociais. Mas, afinal, o que são tecnologias sociais?
O Instituto de Tecnologia Social (ITS, 2007) reforça que são um “conjunto de técnicas
e metodologias transformadoras, desenvolvidas e/ou aplicadas na interação com a população
e apropriadas por ela, que representam soluções para inclusão social e melhoria das condições
de vida” (p. 29). Ou ainda, que compreende “produtos, técnicas e/ou metodologias reaplicáveis,
desenvolvidas na interação com a comunidade e que representem efetivas soluções de transformação
social” (DAGNINO, 2009, p. 08).
Para tanto, baseado em uma revisão da literatura sobre as tecnologias sociais, Rodrigues e
Barbieri (2008) fornecem parâmetros para que essas possam se consolidar ao longo do tempo,
é necessário:
Deste modo, tomando por base essas conceituações, compreendemos que uma tecnologia
social não se prende somente aos aspectos econômicos, mas que torna realidade a satisfação
das necessidades sociais, políticas, culturais e ambientais das pessoas envolvidas, que permeia
diretamente o objetivo dos Bancos Comunitários de Desenvolvimento. Conforme o relatório
de avaliação do projeto de apoio aos bancos comunitários apontam, essas tecnologias sociais
dos bancos comunitários podem no período de seis meses a um ano ser totalmente apropriado
as dinâmicas da comunidade local, sem a necessidade de assessoramento contínuo posterior
(LIEGS, 2006).
Conclusão
Deste modo, consideramos que o presente estudo atingiu seu objetivo por apresentar,
com detalhes, como ocorrem essas experiências de economia solidária por meio dos Bancos
Comunitários de Desenvolvimento como tecnologias sociais nas comunidades, mas não
somente. A exposição em torno do que são essas Finanças Solidárias, viabilizam formas de
auto-organização que podem se replicadas em todo o Brasil.
de problemas locais.
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Doutorando e mestre em Estudos Urbanos e Regionais pela Universidade Federal do Rio Grande do
Norte (PPEUR/UFRN). Graduado (2015) em Gestão de Políticas Públicas pela mesma instituição,
com mobilidade acadêmica internacional (2014-2015) no curso de Administração Pública na
Universidade de Aveiro, na Cidade de Aveiro/Portugal. Revisor de periódicos científicos. Orga-
nizador do dossiê temático Ambiente e Sociedade da Revista Abordagens (UFPB). Atualmente,
é pesquisador integrante do Laboratório Interdisciplinar Sociedades, Ambientes e Territórios
(LISAT/UFRN) e colaborador do Núcleo Natal do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia
281
Observatório das Metrópoles (INCT-OM) e do Núcleo de Apoio à Pesquisa em Mudanças
Climáticas (INCLINE/USP). Tem experiência nas áreas de Políticas Públicas e Planejamento
Urbano e Regional, atuando sobretudo em estudos com ênfase nas seguintes temáticas: meio
ambiente, sustentabilidade e políticas públicas; cidades e meio ambiente; vulnerabilidade e risco
socioambientais; vulnerabilidade, riscos e gestão de riscos; território e sociedade; população
e meio ambiente; planejamento urbano e agenda climática; cidades, adaptação e capacidade
adaptativa climática; energias renováveis, descarbonização e política climática na América
Latina; acordos internacionais e ação climática. Além disso, tem interesse na área de Metodologia
Científica.
Bacharel em Gestão de Políticas Públicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN). Mestre em Estudos Urbanos e Regionais pela Universidade Federal do Rio Grande
do Norte (UFRN). Atua como Gestor de Políticas Públicas na Secretaria de Estado do Meio
Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH). Desenvolve trabalhos
voltados para as áreas de Desenvolvimento Territorial, Políticas Públicas, Instituições, Recursos
Hídricos e Sociologia do Trabalho, como membro do Laboratório de Estudos Rurais (LabRural/
UFRN).
282
Zoraide Souza Pessoa
Doutora em Ambiente e Sociedade pela Unicamp (2012), Mestre (2003) e Graduada (2000) em
Ciências Sociais e Especialização em Demografia (2005) pela UFRN. Atualmente é professora
adjunta do Departamento de Políticas Públicas e do Programa de Pós-Graduação em Estudos
Urbanos e Regionais da UFRN. Coordena o Laboratório Interdisciplinar Sociedades, Ambientes
e Territórios (LISAT) na UFRN. É pesquisadora da Rede Observatório das Metrópoles -
Núcleo RMNATAL, do Grupo de Pesquisa Estado e Políticas Públicas UFRN), do Núcleo de
Estudos Socioambientais e Territoriais (UERN) e do Grupo de Estudos em Gestão Ambiental
(UERN). Desenvolve pesquisas com foco em questões socioambientais contemporâneas, de
sustentabilidade, políticas públicas, planejamento regional e governança ambiental. Territórios,
riscos, vulnerabilidades, resiliência, mudanças climáticas e adaptação. Cidades e Metrópoles.
Alternativas Energética e Hídrica. Identidade e Percepção socioambientais. Participação e
Movimentos socioambientais. População e Meio Ambiente.
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