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Os Deveres do Pais – Por J. C.

Ryle
Introdução
Uma das posições mais desafiadoras (e recompensadoras) na qual uma
pessoa pode se encontrar é a de um pai (ou mãe). Infelizmente, poucos
se preparam para esta grande responsabilidade, embora ela consista na
maior parte da vida de um pai. J. C. Ryle vem ao nosso resgate
novamente, com conselhos bíblicos e profundos, para nos
auxiliarem nesta importante tarefa.” (Trecho extraído da contracapa.)
O texto a seguir é uma tradução do livreto “The Duties of Parents”,
originalmente publicado no século XIX (1888), e extraído de uma série de
sermões sobre a criação de filhos proferidos pelo bispo Galês J. C.
Ryle. Eu suponho que o autor deste livro despensa introduções ou
comentários, visto que a maioria dos leitores provavelmente já possui
acesso a várias das suas outras obras tão conhecidas e reconhecidas no
meio cristão-reformado.
Esta postagem é a primeira de uma série de aproximadamente 20
postagens, cada uma contendo um dos seus preciosos e sábios conselhos
para a criação e o treinamento de filhos nos caminhos do Senhor. Os
princípios esboçados aqui não são simplesmente dicas instantâneas e
fáceis. A criação de filhos é uma tarefa dura, mas se você realmente levar
em consideração e colocar em prática os conselhos oferecidos aqui, os
seus filhos estarão sendo preparados para a eternidade.
“Treina a criança no caminho em que deve andar e, ainda quando for velho, não
se desviará dele.” (Prov. 23:6)
Eu suponho que a maioria dos cristãos professos estão bem familiarizados com o
texto que se encontra no cabeçalho desta página. O seu som é provavelmente
familiar aos seus ouvidos, como uma velha canção. É bem provável que você já
tenha ouvido, ou lido, ou falado sobre e citado este texto muitas vezes, não é
verdade?
Contudo, apesar de tudo isso, quão raramente a substância deste texto é
observada! A doutrina que ele contém parece ser escassamente conhecida, e o
dever colocado diante de nós por ele parece ser terrivelmente pouco praticado.
Leitor, eu não estou falando a verdade?
Não se pode dizer que o assunto é novo. O mundo é antigo, e nós temos a
experiência de cerca de seis mil anos para nos ajudar. Nós vivemos em dias em
que observamos um tremendo zelo pela educação em todos os cantos. Nós
ouvimos falar de novas escolas surgindo em todos os lados. Nos é dito sobre
novos sistemas, sobre novos livros para crianças de toda sorte e descrição. E
mesmo com tudo isso, a vasta maioria das crianças claramente não estão sendo
treinadas no caminho em que devem andar, pois quando se tornam adultas, elas
não andam com Deus.
Agora, como devemos considerar este estado de coisas? A pura verdade é que o
mandamento do Senhor no nosso texto não está sendo observado; e portanto, a
promessa do Senhor em nosso texto não está sendo cumprida.
Leitor, estas coisas deveriam suscitar uma grande sondagem de corações. Atente,
portanto, às palavras de exortação de um ministro sobre o correto treinamento
de filhos. Acredite, este assunto deveria ser familiar a toda consciência, e deveria
fazer com que qualquer um se perguntasse “será que eu estou fazendo tudo o
que está ao meu alcance nesta área?”
Este é um assunto que deveria ser da preocupação de quase todos. Dificilmente
haverá um lar que ele não toca. Pais, babás, professores, padrinhos, madrinhas,
tios tias, irmãos, irmãs – todos deveriam se interessar por ele. Poucos podem ser
encontrados, penso eu, que não possam influenciar algum pai ou mãe quanto à
administração da sua família, ou afetar o treinamento de alguma criança por
sugestão ou por conselho. Todos nós, eu suspeito, podemos fazer alguma coisa
nesta área, seja direta ou indiretamente, e eu desejo suscitar todos a gravar isto
em sua memória.
Este é um tema, também, com relação ao qual todos os seus interessados correm
grande perigo de se encontrarem em falta quanto às suas responsabilidades. Este
é preeminentemente um ponto acerca do qual as pessoas veem as falhas dos
seus próximos mais claramente do que veem as suas próprias. Elas muitas vezes
criarão os seus filhos nos mesmos caminhos que elas têm alertado aos seus
amigos como sendo perigosos. Eles verão pequenos ciscos em outras famílias,
mas não se atentarão às traves que existentes na sua própria família. Eles serão
atentos como as águias para detectar defeitos alheios, e ao mesmo tempo cegos
como morcegos para os erros fatais que diariamente ocorrem em seus lares. Eles
serão sábios com relação ao lar do seu irmão, mas tolos com relação à sua própria
carne e sangue. Se existe algum lugar em que nós devemos suspeitar dos nossos
próprios julgamentos, é este. Isto também, você fará bem se mantiver em mente.
Como ministro, eu não posso evitar a advertência de que dificilmente há qualquer
outro assunto sobre o qual as pessoas parecem ser tão obstinadas quanto com
relação aos seus próprios filhos. Eu tenho ficado perplexo, algumas vezes, ao ver
a dificuldade que sábios pais cristãos demonstram para admitir que os seus filhos
estão em falta ou para assumir que possuem culpa. Não são poucas as pessoas a
quem eu, sem dúvida, preferiria ter de falar sobre os seus próprios pecados, do
que dizer a eles que seus filhos fizeram qualquer coisa errada.
Venha agora, e deixe-me colocar diante de você algumas dicas sobre o
treinamento correto dos seus filhos. Que o Deus Pai, o Deus Filho e o Deus
Espírito Santo abençoe esta mensagem, e faça dela ‘palavras ditas a seu tempo’
a todos vocês. Não as rejeitem simplesmente por serem duras e simples; e não
as desprezem simplesmente por não conterem novidade alguma. Esteja certo, se
você deseja treinar os seus filhos para o céu, os conselhos que aqui seguem não
devem ser negligentemente deixados de lado.

Na próxima postagem, consideraremos o seu primeiro conselho: “Treine os seus


filhos no caminho em que devem andar, e não no caminho que eles
preferem.” Aguarde!
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle I

1. Primeiramente, portanto, se você deseja treinar os seus filhos corretamente,


treine-os no caminho em que devem andar, e não no caminho que eles
preferem.

Lembre-se que filhos já nascem com uma decidida tendência ao pecado, e


portanto, se você deixar que eles escolham por si mesmos, é certo que escolherão
mal.
Uma mãe não pode prever o que o seu bebezinho será quando crescer – alto ou
baixo, forte ou fraco sábio ou tolo, ele poderá ser qualquer uma dessas coisas ou
não – tudo é incerto. Mas uma coisa esta mãe pode dizer com certeza: ele terá
um coração corrupto e pecaminoso. É natural a nós fazer o que é mal. “A tolice”,
diz Salomão “está ligada ao coração da criança” (Prov. 22:15). “A criança deixada
a si mesma traz vergonha à sua mãe” (Prov. 24:15). Os nossos corações são como
a terra onde andamos; deixe-a à si mesma e é certo que ela produzirá ervas
daninhas.
Se você deseja, portanto, lidar de modo sábio com os seus filhos, você não deve
deixar que eles sejam guiados pela sua própria vontade. Pense por eles, julgue
por eles, aja por eles, assim como você faria por alguém que se encontra em
estado de fraqueza e de cegueira; mas pela misericórdia, nunca os entregue às
suas próprias vontades e inclinações rebeldes. Não são os seus gostos e desejos
que devem ser consultados. Eles ainda não sabem o que é bom para as suas
mentes e almas, assim como também não sabem o que é bom para os seus
corpos. Você não deixa que eles decidam o que vão comer, ou beber, ou como se
vestirão. Seja consistente, e lide com as suas mentes da mesma maneira. Treine-
os no caminho que é bíblico e correto, e não no caminho que eles imaginam e
desejam.
Se você está tendo dificuldade para se convencer deste primeiro princípio para o
treinamento cristão de filhos, é inútil que você leia o que será dito adiante. A
vontade-própria é quase sempre a primeira coisa a aparecer na mente de uma
criança; e o seu primeiro passo deve ser resistir a ela.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle II
2. Treine os seus filhos com todo o carinho, afeição e paciência.

Eu não quero dizer, com isso, que você deve mimar demais os seus filhos, mas o
que eu quero dizer é que você deve demonstrar claramente o seu amor por eles.
O amor deve ser o fio de ouro que se entremeia por toda a sua conduta. O
carinho, a gentileza, a longanimidade, o domínio-próprio, a paciência, a simpatia,
a disposição para dar atenção aos problemas da infância, a prontidão para
participar das alegrias da infância, – estas são as cordas pelas quais uma criança
pode ser guiada mais facilmente – e estas são as pistas que você deve seguir se
você deseja encontrar o caminho para o seu coração.
Há muito poucos, mesmo entre os adultos, que não serão mais facilmente
puxados do que dirigidos em certa direção. Há algo em nossas mentes que se
levanta contra qualquer tipo de compulsão; nós damos as costas e endurecemos
nossos pescoços contra qualquer ideia de uma obediência forçada. Nós somos
como jovens cavalos nas mãos de um domador: trate-os com gentileza e dê
grande valor a eles, e pouco a pouco você poderá guiá-los pelas correias; mas
use-os rudemente ou com violência, e muitos meses se passarão até que você
consiga adestrá-los.
Assim também, as mentes das crianças são moldadas no mesmo molde das
nossas próprias mentes. O rigor e a severidade das nossas ações só farão com que
elas se endureçam e deem as costas para nós. Isso fechará os seus corações e
você se desgastará para conseguir abrir novamente essa porta. Mas apenas deixe
que eles percebam quanto carinho você tem para com eles – e que você
realmente deseja o melhor para eles e deseja fazê-los felizes – que se você os
punir, é para o seu próprio proveito, e que, como o pelicano, você daria do seu
próprio sangue para nutrir as suas almas… apenas demonstre tudo isso a eles e
logo eles serão todos seus. Mas eles devem ser lisonjeados pela sua gentileza, se
é que você realmente deseja ganhar a sua atenção.
Certamente, a prática e a razão também poderão nos ensinar essas mesmas
lições. As crianças são criaturas frágeis e tenras e, como tais, elas precisam de um
tratamento paciente e atencioso. Nós precisamos lidar com elas delicadamente,
como objetos frágeis, ou o nosso manuseamento brusco pode vir a fazer mais mal
do que bem. Elas são como pequenas mudas de plantas que precisam ser aguadas
com cuidado – frequentemente, mas pouco a pouco.
Nós não podemos esperar tudo de uma vez. Nós temos de lembrar que crianças são
crianças para que possamos ensiná-las de acordo com o que elas conseguem suportar.
As suas mentes são como um bloco de metal – que não pode ser moldado e feito útil
de uma só vez, mas somente por uma sucessão de pequenas rajadas de fogo. Os seus
entendimentos são como vasos de pescoço estreito, nós devemos despejar o vinho do
conhecimento gradualmente neles, ou a maior parte derramará para fora e será
desperdiçada. “Linha após linha e preceito após preceito, um pouco aqui e um pouco
ali” essa deve ser a nossa regra. A pedra de amolar faz o seu trabalho lentamente, mas
o polimento frequente dará à faca uma afiada lâmina. Verdadeiramente, é necessário
grande paciência no treinamento de crianças, mas sem ela, nada poderá ser realizado.
Nada poderá compensar a ausência dessa ternura e amor. Um ministro pode
proclamar a verdade em Jesus Cristo de modo claro, impositivo e irrefutável; mas se
ele não a proclamar em amor, poucas almas serão ganhas. Assim também você pode
conferir deveres aos seus filhos – ordená-los, ameaçá-los, puni-los, argumentar com
eles -, mas se faltar afeição no seu tratamento para com eles, o seu trabalho será todo
em vão.
O amor é o maior segredo de um treinamento bem-sucedido. A ira e a austeridade
podem assustar, mas elas não irão persuadir a sua criança de que você está correto; e
se ela lhe ver frequentemente com temperamento alterado, logo ela deixará de lhe
respeitar. Um pai que fala a seu filho como Saul falava com Jonathan (1 Samuel 20:30),
não pode esperar manter a sua influência sobre a mente do seu filho.
Tente ao máximo conservar as afeições dos seus filhos para com você. É muito
perigoso provocar medo neles. Quase qualquer coisa é melhor do que manter reservas
e pressões entre você e seus filhos; e isso certamente virá como consequência do
medo provocado neles. O temor põe fim ao comportamento aberto e franco – o medo
leva à supressão e ao encobrimento – ele semeia a semente de muita hipocrisia, e leva
muitos à mentira. Há uma mina de verdade nas palavras do Apóstolo aos Colossenses:
“Pais, não irriteis os vossos filhos, para que não fiquem desanimados” (Colossenses
3:21). Nunca ignore este conselho.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle III
3. Treine os seus filhos com uma consciência constante de que muito depende de você.
A graça é a mais forte das doutrinas cristãs. Veja que revolução a graça efetua quando
ela adentra o coração de um velho pecador, como ela destrói as fortalezas de Satanás –
como ela derruba as montanhas e preenche os vales – endireita as veredas e os
caminhos, e renova completamente o homem. Verdadeiramente, nada é impossível
para a graça.
A nossa própria natureza pecaminosa, também, é muito forte. Veja como ela luta contra
as coisas do reino de Deus, – como ela combate contra cada tentativa que fazemos de
sermos mais santos; como ela mantém uma incessante batalha dentro de nós até o
último instante das nossas vidas. A natureza é, de fato, muito forte.
Mas depois da natureza e da graça, sem dúvida, não há nada mais poderoso do que a
educação. Hábitos criados na infância (se assim podemos chamá-los) nos constituem
por inteiro, embora estejam também sujeitos à vontade de Deus. Nós nos tornamos o
que somos pelo treinamento que recebemos. O nosso caráter toma a forma daquele
molde no qual os nossos primeiros anos são moldados.
“Aquele que não enxerga em todo lugar o efeito da educação nas opiniões e hábitos de
pensar humanos, tem uma visão muito limitada da vida. As crianças trazem do berçário
aquilo que se manifestará durante toda a sua vida.” (Cecil) Nós dependemos, em vasta
medida, daqueles que nos educam. Nós ‘pegamos’ deles uma cor, um gosto, uma
inclinação que se impregna em nós, mais ou menos, por toda a nossa vida. Nós
adquirimos a linguagem de nossas mães e babás, e aprendemos a falar esta mesma
língua quase sem nos notarmos, e inquestionavelmente, nós adquirimos alguma coisa
dos seus jeitos e dos seus modos de pensar e agir ao mesmo tempo. Apenas o tempo
poderá mostrar, eu suspeito, o quanto nós todos devemos às impressões infantis, e
quantas coisas em nós podem ser traçadas de volta às sementes semeadas nos dias da
nossa infância por aqueles que nos cercavam. Um Inglês muito culto Mr. Locke, chegou
até a dizer: “De todos os homens que nós encontramos, nove das dez partes que os
constituem são o que eles são, bons ou maus, úteis ou não, de acordo com a educação
que receberam.”
E tudo isso faz parte dos graciosos arranjos de Deus. Ele dá aos seus filhos uma mente
que receberá impressões como o barro maleável. Ele dá a eles uma disposição, logo na
linha de partida da vida, para acreditar naquilo que você diz, para assimilar aquilo a que
você os aconselha, e para confiar na sua palavra muito mais do que na palavra de um
estranho. Ele dá a você, em suma, uma oportunidade de ouro para fazer-lhes o bem.
Atente para que essa oportunidade não seja negligenciada e desperdiçada. Uma vez que
você deixar que ela escorregue, ela nunca mais voltará.
Cuidado com aquela ilusão miserável, na qual alguns têm caído, de que os pais não
podem fazer nada pelos seus filhos, de que você deve deixá-los e apenas sentar de
braços cruzados esperando pela graça de Deus sobre eles. Tais pessoas estão esperando
para os seus filhos os desejos de Balaão, eles gostariam que eles morressem a morte do
justo, mas eles não fazem nada para que eles possam viver a vida do justo. Eles desejam
muito e não possuem nada. E o Diabo se regozija em ver tal raciocínio, assim como ele
sempre se regozija em qualquer coisa que pareça desculpar o ócio, ou que encoraje a
negligência dos meios de graça.
Eu sei que você não pode converter a sua criança. Eu bem sei que aqueles que são
nascidos de novo, nasceram não pela vontade do homem, mas de Deus. Eu também sei
que Deus nos diz expressamente: “treina a criança no caminho em que deve andar” e
que Ele nunca impõe ao homem um mandamento que ele não dê juntamente a graça
para que possa observar. Sei também que o nosso dever não é ficar parado e disputar
com Deus, e sim seguir avante e obedecer. É apenas quando seguimos avante, que Deus
se encontrará conosco. O caminho da obediência é o modo pelo qual ele concede a Sua
bênção. Nós apenas temos de fazer como os servos foram ordenados na festa de
casamento em Canaã: encher os potes com água, e então confiantemente deixar ao
Senhor que transforme a água em vinho.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle IV
4. Treine os seus filhos sempre com a consciência de que o principal a ser levado em
consideração é a alma deles.

Preciosos, sem dúvida, são estes pequeninos aos seus olhos. Contudo, se você os ama,
pense continuamente nas suas almas. Nenhum interesse deveria pesar tanto aos seus
olhos quanto os seus interesses eternos. Nenhuma parte deles deveria ser tão preciosa
aos seus olhos quanto aquela parte que nunca morrerá. O mundo, com toda a sua glória,
passará; os montes derreterão; os céus serão enrolados como um pergaminho; o sol
cessará de dar o seu brilho. Mas o espírito que habita nessas pequenas criaturas, as
quais você ama tanto, sobreviverá a tudo isso. No entanto, se ele sobreviverá em
felicidade ou em miséria eterna, isso depende de você (humanamente falando).
Este é o pensamento que deveria vir em primeiro lugar na sua mente em tudo o que
você faz pelos seus filhos. A cada passo que você toma com relação a eles, a cada plano,
a cada método, e a cada arranjo que os envolve, não deixe de lado esta poderosa
questão: “como isto afetará as suas almas?”
O amor à alma é a alma de todo amor. Acariciar, mimar e ceder a todos os desejos da
sua criança, como se este mundo fosse tudo o que ela tivesse para almejar, e como se
esta vida fosse a única época para a felicidade – fazer isso não é amor verdadeiro, e sim
uma crueldade para com elas. É tratá-la como qualquer animal neste mundo, que não
possui mais do que esta vida para aproveitar, e nada após a morte. É esconder dela esta
grande verdade, a qual ela deve ser treinada a aprender desde a mais tenra infância –
de que o fim principal desta vida é a salvação da sua alma.
Um verdadeiro cristão não deve ser escravo da moda, se é que ele deseja treinar os seus
filhos para o céu. Ele não deve se contentar em fazer coisas meramente porque elas são
o costume deste mundo; ele não deve se contentar em ensiná-los e instruí-los de certa
maneira meramente porque todos fazem assim; ou em permitir que eles leiam livros de
questionável classificação, meramente porque todo mundo os lê; ou em deixar que eles
formem hábitos de tendência duvidosa, simplesmente porque eles são os hábitos da
época, ou que estão na moda. O verdadeiro cristão deve treinar os seus filhos com os
olhos fitos nas suas almas. Ele não deve sentir vergonha ao ouvir o seu treinamento
sendo acusado de estranho e esquisito. E daí se ele realmente for estranho? O tempo é
curto – a moda deste mundo passará. Aquele que tem treinado os seus filhos para o céu,
e não para a terra; para Deus, e não para o homem, este é o pai que será chamado sábio
afinal.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle V
5. Treine o seu filho ao conhecimento da Bíblia.

Eu admito que você não pode forçar os seus filhos a amarem a Bíblia. Ninguém, senão o
Espírito Santo, pode nos dar um coração que se deleita na Palavra. Mas você pode fazer
com que os seus filhos sejam familiarizados com a Bíblia, e esteja certo de que eles
nunca serão familiarizados com ela cedo demais ou bem demais.
Um conhecimento abrangente da Bíblia é fundamental para uma visão clara sobre a
religião. Aquele que está bem estabelecido nela, de forma geral, não será encontrado
vacilante ou será facilmente levado por qualquer novo vento de doutrina. Qualquer
sistema de treinamento que não estabeleça como prioridade o conhecimento das
Escrituras é perigoso e falso.
Você precisa ser cuidadoso nesse ponto agora, pois o Diabo está atuando no mundo
afora e o erro é abundante. Alguns serão encontrados entre nós, os quais dão à Igreja a
honra devida somente a Jesus Cristo. Outros serão encontrados, os quais fazem dos
sacramentos os seus salvadores, como se fossem passaportes para a vida eterna. E da
mesma maneira, alguns serão encontrados, os quais honram um catecismo mais do que
a Bíblia, ou que enchem as mentes dos seus filhos com miseráveis livros de historinhas,
ao invés de o fazerem com as Escrituras da verdade. Mas se você realmente ama os seus
filhos, deixe simplesmente que a Bíblia seja tudo no treinamento das suas almas, e que
todos os outros livros se submetam e tomem o segundo lugar.
Não se esforce tanto para que eles sejam proficientes no catecismo, quanto para que
eles sejam proficientes e hábeis nas Escrituras. Este é o treinamento, creia em mim, que
Deus irá honrar. O salmista diz sobre Ele: “Pois magnificaste acima de tudo o teu nome
e a tua palavra”, e eu acredito que Ele concede uma bênção especial a todos aqueles
que a magnificam entre os homens.
Cuide para que os seus filhos leiam a Bíblia de modo reverente. Treine-os a olharem para
ela não como palavra de homens, mas como ela na verdade é: a Palavra de Deus, escrita
pelo próprio Espírito Santo – sendo totalmente verdadeira, eficaz e hábil para nos tornar
sábios para a salvação, por meio da fé que está em Cristo Jesus.
Cuide para que eles a leiam regularmente. Treine-os a considerá-la como o alimento
diário das suas almas – como algo essencial para a saúde diária das suas almas. Eu bem
sei que você não pode fazer com que isso seja nada a mais do que uma mera forma ou
hábito; mas é indizível o quanto esta mera forma, indiretamente, pode fazer com que o
pecado seja restringido.
Cuide para que eles a leiam completamente. Você não deve restringir nenhuma doutrina
a ser trazida diante deles. Você não precisa pensar que algumas das principais doutrinas
cristãs são coisas que crianças não conseguem compreender. As crianças entendem
muito mais da Bíblia do que nós imaginamos.
Fale a elas sobre o pecado, sobre a sua culpa, sobre as suas consequências, o seu poder,
a sua vileza: você verá que elas sempre podem entender alguma coisa sobre isso.
Fale a elas sobre o Senhor Jesus Cristo e a Sua obra para a nossa salvação – sobre a
expiação, sobre a cruz, sobre o sangue, o sacrifício e a intercessão: você descobrirá que
em tudo isso há algo que não está além das suas compreensões.
Fale a elas sobre a obra do Espírito Santo no coração do homem, como Ele transforma,
renova, santifica e purifica: você logo verá que em tudo isso elas podem lhe
acompanhar, até certo ponto. Em suma, eu suspeito que nós não fazemos ideia do
quanto as crianças pequenas podem assimilar do comprimento e da largura do glorioso
evangelho. Elas veem muito mais destas coisas do que nós supomos.
Quanto à idade na qual a instrução religiosa deve começar, não se pode estabelecer uma
regra geral. A mente parece se abrir, em algumas crianças, muito mais cedo do que em
outras. Dificilmente nós começamos cedo demais. Há maravilhosos exemplos
registrados acerca do que uma criança pode chegar a compreender, mesmo aos três
anos de idade.
Encha as suas mentes com as Escrituras. Deixe que a Palavra habite ricamente nelas.
Conceda-lhes a Bíblia, a Bíblia inteira, enquanto elas ainda são jovens.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle VI
6. Treine-as a possuírem o hábito de orar

A oração é o verdadeiro fôlego de vida da verdadeira religião. É uma das primeiras


evidências de que uma pessoa é nascida de novo. Pois como disse o Senhor de
Saulo, no dia em que enviou Ananias até ele: “Pois ele está orando.” (Atos 9:11)
Ele havia começado a orar e isto já era prova suficiente da obra que o Espírito
começou a realizar em seu coração.
A oração era a marca distintiva do povo do Senhor no dia em que começou a
haver separação entre eles e o mundo: “daí se começou a invocar o nome do
Senhor” (Gên. 4:26).
A oração é a peculiaridade de todos os verdadeiros cristãos agora. Eles oram, pois
eles contam a Deus as suas necessidades, os seus sentimentos, os seus desejos,
os seus medos, e o fazem com sinceridade. O cristão nominal pode repetir
orações, e até mesmo boas orações, mas ele não passa daí.
A oração é o ponto de virada na alma do homem. O nosso ministério não terá
proveito algum, e todo o nosso labor será em vão até que você seja trazido aos
seus joelhos. Até que isso aconteça, não podemos ter esperança alguma em você.
A oração é o grande segredo da prosperidade espiritual. Quando há muita
comunhão privada com Deus, a sua alma cresce como a grama após a chuva;
quando há pouca comunhão, tudo fica estancado e você mal pode manter a sua
alma com vida. Mostre-me um cristão crescendo na fé, um cristão seguindo
avante, um cristão forte e florescendo na fé, e com toda a certeza, ele será
alguém que fala constantemente com o seu Senhor. Ele pede muito, e assim tem
muito. Ele conta tudo a Jesus, e por isso ele sempre sabe como agir.
A oração é a ferramenta mais poderosa que Deus tem colocado em nossas mãos.
Ela é a melhor arma a ser utilizada em qualquer dificuldade, e o remédio mais
certo para qualquer problema. Ela é a chave para abrir o tesouro das promessas,
e a mão que se estende para receber graça e ajuda no tempo da necessidade. Ela
é a trombeta de prata que Deus nos ordena a tocar em toda a nossa necessidade,
e ela é o pranto que Ele prometeu sempre atender, assim como uma amorosa
mãe atende à voz do seu filho.
A oração é o meio mais simples que o homem pode fazer uso para se achegar a
Deus. Ela está ao alcance de todos – do doente, do idoso, do enfermo, do
paralítico, do cego, do pobre, do homem de pouco entendimento – todos podem
orar. De nada lhe adiantará clamar falta de memória, ou falta de conhecimento,
ou falta de livros, ou falta de escolaridade nesta questão. Desde que você tenha
uma língua para falar do estado da sua alma, você pode e deve orar. As seguintes
palavras: “nada tens, porque não o pedistes” (Tia. 4:2), serão uma temerosa
condenação para muitos no dia do julgamento.
Pais, se vocês amam aos seus filhos, faça tudo que está ao seu poder para treiná-
los ao hábito da oração. Mostre a eles como começar a orar. Diga a eles o que
dizer. Encoraje-os a perseverar. Lembre-os de que precisam orar, quando eles se
tornarem negligentes e descuidados nesta questão. Que não seja culpa sua, em
qualquer grau, se eles nunca chamarem pelo nome do Senhor.
Lembre-se, este é o primeiro passo da religião que uma criança é capaz de tomar.
Muito antes de ela poder começar a ler, você pode ensiná-la a se ajoelhar ao seu
lado e a repetir simples palavras de oração e de louvor que você coloca em sua
boca. E como os primeiros passos em qualquer tarefa são sempre os mais
importantes, assim também a maneira como os seus filhos oram deve ser um
ponto que merece a sua maior atenção.
Poucos parecem entender o quanto depende disso. Você deve ter cuidado para
que eles não venham a repetir as suas orações de um modo apressado,
descuidado ou irreverente. Você não deve delegar a vigilância quanto a isso a
servos ou babás, ou confiar demais que os seus filhos irão orar quando deixados
por si próprios. Eu não posso louvar uma mãe que nunca toma para si mesma a
supervisão sobre o aspecto mais importante da vida diária de seus filhos.
Certamente, se há algum hábito que a sua própria mão e os seus próprios olhos
devem ajudar a formar, este hábito é o da oração.
Acredite em mim, se você mesma nunca ouvir os seus filhos orarem, você se
encontra em grande culpa. Você é pouco mais sábia do que o pássaro descrito
em Jó: “Ele deixa os seus ovos na terra, e os aquenta no pó, e se esquece de que
algum pé os pode esmagar ou de que podem pisá-los os animais do campo. Trata
com dureza os seus filhos, como se não fossem seus; embora seja em vão o seu
trabalho, ele está tranquilo…” (Jó 39:14-16).
A oração é, dentre todos os hábitos, aquele do qual nós nos recordamos por mais
tempo. Muitos homens, já em suas cãs, poderão lhe contar como a sua mãe
costumava fazê-lo orar nos dias da sua infância. Muitas outras coisas talvez
tenham se esvaziado da sua memória: a igreja para a qual ele era levado ao culto,
o ministro que ele ouviu pregar, os companheiros com os quais costumava
brincar – tudo isso talvez possa ter saído da sua memória sem deixar marca
alguma. Mas você frequentemente verá que isso não acontece com as suas
primeiras orações. Muitas vezes, ele poderá lhe dizer onde se ajoelhava, e o que
era ensinado a dizer, e até mesmo como a sua mãe lhe parecia durante todo o
tempo. Tais coisas ressurgirão com tanto frescor diante da sua mente como se
tivessem ocorrido ontem.
Leitor, se você ama os seus filhos, eu o admoesto, não deixe que o momento de
semear o hábito da oração passe sem que você tome proveito dele. Se você
treinar os seus filhos a qualquer coisa, treine-os pelo menos ao hábito da oração.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle VII
7. Treine-os ao hábito da diligência e da regularidade no exercício dos meios de graça
públicos.

Fale aos seus filhos sobre o dever e o privilégio que temos de ir à casa do Senhor e de nos
unirmos às orações da congregação. Diga a eles que onde quer que o povo do Senhor se reúne,
ali está presente o próprio Senhor Jesus de uma maneira especial, e que aqueles que se
ausentam desse lugar devem esperar, como aconteceu com o Apóstolo Thomas, perder uma
grande bênção. Conte a eles sobre a importância de ouvir a Palavra de Deus pregada, já que ela
é a ordenança divina para a conversão, santificação e edificação das almas dos homens. Fale a
eles como o Apóstolo Paulo nos admoesta a que “não deixemos de congregar-nos, como é
costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que o dia se
aproxima” (Heb. 10:25).

Eu considero uma cena muito triste na igreja quando ninguém se dispõe a participar da ceia do
Senhor senão as pessoas idosas, enquanto a maioria dos jovens se ausenta dela. Mas eu
considero uma cena ainda mais triste quando eu não vejo praticamente criança alguma na igreja,
senão aquelas que vieram para a Escola Dominical e são obrigadas a permanecer ali. Que
nenhuma desta culpa repouse sobre a sua cabeça. Há muitos meninos e meninas em cada
comunidade, além daqueles que vêm à escola, e vocês que são seus pais e amigos devem cuidar
para que eles sejam levados à igreja juntamente com vocês.

Não permita que eles cresçam com o hábito de inventar vãs desculpas para não virem à igreja.
Faça com que eles compreendam claramente que enquanto estiverem debaixo do seu teto, a
regra da casa é que todos aqueles com saúde devem atender a casa do Senhor no dia do Senhor,
e que você considera aquele que não guarda o sábado como um assassino da sua própria alma.

Certifique-se também, se assim for possível, de que os seus filhos compareçam à igreja
juntamente com você e que sentem ao seu lado enquanto você estiver ali. Ir à igreja é uma coisa,
mas se comportar corretamente na igreja é outra coisa bem diferente. E acredite em mim, não
há melhor segurança para o bom comportamento dos seus filhos do que mantê-los debaixo dos
seus próprios olhos.

A mente das crianças é facilmente desviada e a sua atenção facilmente se perde, e você deve
fazer tudo o que estiver ao seu alcance para combater isso. Eu não gosto de ver crianças sozinhas
na igreja – elas normalmente se ajuntam com más companhias e aprendem mais mal no dia do
Senhor do que no resto da semana. Outra coisa que eu não gosto de ver é um “cantinho de
jovens” na igreja. Eles normalmente adquirem hábitos de falta de atenção e de irreverência ali
que levarão anos para serem desaprendidos, se é que um dia eles os desaprenderão. O que eu
me alegro em ver é uma família inteira sentada juntamente, jovens e velhos, lado a lado –
homens, mulheres e crianças, servindo a Deus em família.

Contudo, eu sei que muitos dizem ser inútil requerer que as crianças participem dos meios de
graça, já que eles não os podem compreender. Eu os aconselho a nunca darem ouvidos a tal
raciocínio. Eu não encontro doutrina alguma que justifique tal raciocínio no Antigo Testamento.
Quando Moisés se encontrou perante faraó (Ex. 10: 9), eu vejo que ele diz: “havemos de ir com
os nossos jovens, e com nossos velhos, e com os filhos e com as filhas… porque temos de
celebrar festa ao Senhor”. Quando Josué leu a lei, eu devo observar, “palavra alguma houve de
tudo o que Moisés ordenara, que Josué não lesse para toda a congregação de Israel, e para as
mulheres, e os meninos, e os estrangeiros que andavam no meio deles”. “Três vezes no ano”,
diz Ex. 34:23, “todo homem [incluindo mulheres e crianças] deve vir perante o Senhor Deus, o
Deus de Israel”. E quando eu vou ao Novo Testamento, encontro menção de crianças
participando em atos religiosos públicos também juntamente com os adultos. Quando o
apóstolo Paulo estava deixando os discípulos em Tiro pela última vez, eu o encontro dizendo
(Atos 21:5): “passados aqueles dias, tendo-nos retirado, prosseguimos viagem, acompanhados
por todos, cada um com sua mulher e filhos, até fora da cidade; e ajoelhados na praia, oramos”.

Samuel, nos dias da sua infância, parece ter ministrado ao Senhor alguma vez antes de
realmente vir a conhecê-LO: “Porém Samuel ainda não conhecia o Senhor e ainda não lhe tinha
sido manifestada a palavra do Senhor.” (1 Sam. 3:7). Os próprios Apóstolos não parecem ter
compreendido tudo o que o nosso Senhor disse na época em que foi dito: “Seus discípulos a
princípio não compreenderam isto: quando porém, Jesus foi glorificado, então, eles se
lembraram de que estas cousas estavam escritas a respeito dele” (João 12:16).

Pais, confortem as suas mentes com estes exemplos. Não se desanimem ao ver que os seus
filhos ainda não compreendem todo o valor dos meios de graça. Simplesmente treine-os a
possuírem o hábito de praticá-los com regularidade. Faça com eles venham a enxergar tais
práticas como um dever santo, elevado e solene; e creia em mim, logo chegará o dia quando
eles provavelmente lhe bendirão por aquilo que você fez a eles.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle VIII
8. Treine-os ao hábito da fé.

O que eu quero dizer com isso é que você deve treinar os seus filhos a acreditarem no que você
diz. Você deve tentar fazer com que eles confiem nos seus julgamentos, e respeitem as suas
opiniões como melhores do que as suas próprias. Você deve acostumá-los a pensarem assim;
quando você diz que algo é ruim para eles, eles podem ter certeza de que aquilo é ruim; e
quando você diz que algo é bom a eles, eles podem ter certeza de que é bom. Que eles possam
confiar no seu conhecimento como sendo, em suma, melhor do que o deles mesmos, e que eles
possam crer e se basear sempre na sua palavra. Treine-os a sentir que aquilo que eles ainda não
sabem agora, eles provavelmente saberão um dia, e que eles fiquem satisfeitos sabendo que há
uma razão e um motivo para tudo o que você requer deles.

Quem pode descrever a bem-aventurança de se possuir um verdadeiro espírito de fé? Ou mais


ainda, quem pode falar sobre a miséria que a falta de fé tem trazido ao mundo? A incredulidade
fez com que Eva comesse do fruto proibido – ela duvidou da veracidade da palavra de Deus:
“certamente morrerás”. A incredulidade fez com que o mundo antigo rejeitasse os avisos de
Noé, de modo que pereceu em pecado. A Incredulidade manteve o povo de Israel no deserto –
ela foi a grade que lhes barrou a entrada na terra prometida. A incredulidade fez com que os
Judeus crucificassem o Senhor da Glória – eles não creram na voz de Moisés e dos profetas,
embora eles as lesses todos os dias. E a incredulidade é o pecado predominante no coração
humano até agora: a falta de fé nas promessas de Deus; falta de fé nas ameaças de Deus; falta
de fé na nossa própria pecaminosidade; falta de fé no perigo que corremos; falta de fé em tudo
o que vai de encontro ao orgulho e ao mundanismo dos nossos próprios corações. Leitor, você
estará treinando os seus filhos sem propósito algum se você não os treinar a um hábito de fé
implícita: fé na palavra dos seus pais e confiança de que o que os seus pais dizem deve estar
correto.

Eu tenho ouvido alguns dizerem que você não deve requerer das crianças algo que eles não
conseguem compreender, que você deve explicar e dar uma razão a tudo o que você quiser que
elas façam. Eu os admoesto solenemente contra esta noção. Eu lhes digo claramente: este
princípio é mau e não é sadio. É claro que seria um absurdo você deixar como mistério tudo o
que você faz, e há muitas coisas que devem sim ser explicadas às crianças, de modo que elas
possam entender aquilo que é razoável e sábio. Mas criá-las com a noção de que elas não
precisam confiar em nada e de que elas, com os seus entendimentos fracos e imperfeitos,
devem ser esclarecidas sobre o “porque” e o “portanto” de todas as coisas, a cada passo que
tomarem, este é realmente um temeroso erro, e bem provavelmente terá o pior dos efeitos em
suas mentes.

Argumente com o seu filho se você estiver disposto a fazê-lo, em certos momentos, mas não
esqueça de manter na mente do seu filho (se você de fato o ama) que ele é apenas uma criança
no final das contas: ele pensa como uma criança, ele age como uma criança, e portanto ele não
deve esperar conhecer o motivo de todas as coisas de uma só vez.

Coloque diante dele o exemplo de Isaque, no dia em que Abraão o levou para ser oferecido no
Monte Moriá (Gen. 22). Ele perguntou ao seu pai aquela única questão: “onde está o cordeiro
para o sacrifício?”, e ele recebeu apenas a simples resposta: “Deus proverá a Si mesmo um
cordeiro”. Como, ou onde, ou quando, ou de que maneira: nada disso foi dito a Isaque, mas
aquela resposta foi suficiente. Ele creu que tudo ficaria bem porque o seu pai assim lhe dissera,
e ele se contentou.

Diga aos seus filhos, também, que todos nós devemos ir aprendendo aos poucos; que há um
alfabeto a ser memorizado em cada tipo de conhecimento – que até mesmo o melhor cavalo do
mundo teve de ser domado um dia – e que chegará o dia em que eles enxergarão a sabedoria
de todo o seu treinamento. Mas enquanto isso, se você disser que algo é correto, isso deve ser
suficiente para eles; eles devem crer em você e se contentar com isso.

Pais, se qualquer ponto sobre o treinamento dos seus filhos deve ser considerado importante,
tenha certeza de que este é um deles. Eu os admoesto, em nome da afeição que você tem para
com os seus filhos: use todos os meios possíveis para treiná-los ao hábito da fé.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle IX
9. Treine-os ao hábito da obediência

Este é um objeto digno de todo o nosso labor (esforço, trabalho árduo). Hábito algum, eu
suspeito, tem maior influência em nossas vidas do que este. Pais, sejam determinados em fazer
com que os seus filhos lhes obedeçam, ainda que isso lhe custe o maior dos problemas, e cause
a eles muitas lágrimas. Que não venha a haver nenhum questionamento, ou discussão, ou
disputa, ou demora, ou constantes repetições. Quando você lhes dá uma ordem, deixe-os
perceber claramente que você fará com que ela seja cumprida.

A obediência é a única realidade. Ela é a fé visível, a fé em ação, e a fé encarnada. Ela é o teste


de verdadeiro discipulado entre o povo do Senhor: “Vós sois meus amigos, se fazeis o que vos
mando” (João 15:14). Esta deve ser a marca de filhos bem treinados, que eles fazem aquilo que
os seus pais ordenam. Onde, de fato, está a honra que o quinto mandamento ordena, se os pais
e mães não são obedecidos alegremente, sinceramente e sem demora?

Esta obediência desde cedo tem toda a Escritura ao seu lado. Ela está presente na honra
conferida a Abraão: não somente ele treinará a sua família, mas “ele ordenará a seus filhos e a
sua casa depois dele” (Gen. 18:19). E nos é dito sobre o próprio Senhor Jesus Cristo que, quando
jovem, “ele lhes era submisso” [a Maria e José] (Lucas 2:51).

Observe o quão implicitamente José obedeceu à ordem do seu pai Jacó (Gen. 37:13). Veja como
Isaías diz que será algo tão terrível quando “o menino se atreverá contra o ancião…” (Isa. 3:5).
Note como o apóstolo Paulo aponta para a desobediência aos pais como um dos maus sinais
dos últimos tempos (2 Tim. 3:2). Veja como ele destaca a graça de requerer a obediência dos
seus filhos como sendo uma das marcas que deve adornar um ministro cristão: “que governe
bem a sua própria casa, criando os filhos sob disciplina, com todo o respeito”. E novamente:
“que o diácono… governe bem os seus filhos e a própria casa” (1 Tim. 3:4,12). E ainda, ele diz
que o presbítero deve ter: “filhos crentes, que não são acusados de dissolução, nem são
insubordinados” (Tito 1: 6).

Pais, vocês desejam ver os seus filhos felizes? Cuide, então, para que você os treine a
obedecerem quando uma ordem lhes é dada, a fazerem o que é requerido deles. Creia em mim,
nós não fomos criados para sermos totalmente independentes – nós não somos capazes disso.
Até mesmo aqueles que possuem liberdade em Cristo ainda usam um jugo: eles servem ao
Senhor Jesus Cristo (Col. 3:24). Nunca será cedo demais para as crianças aprenderem que, neste
mundo, nem todos são destinados a governar, e que nós nunca estaremos em nosso correto
lugar até que aprendamos a como obedecer aos nossos superiores. Ensine-os a obedecer
enquanto são jovens, ou eles se irritarão contra Deus por toda a sua vida, e se desgastarão com
a vã ideia de serem independentes do Seu controle.

Leitor, este conselho não poderia ser mais necessário. Você verá muitos pais, em nossos dias,
permitindo que os seus filhos pensem e escolham por si mesmos muito antes de serem capazes
de fazê-lo, de modo que até arranjam desculpas para a desobediência deles, como se eles não
fossem culpados disso. Aos meus olhos, um pai que sempre cede, e uma criança que sempre
tem tudo do seu próprio jeito é uma cena muito dolorosa – dolorosa, pois eu vejo a ordem de
Deus para as coisas sendo invertida e virada de cabeça para baixo; e dolorosa, porque eu tenho
certeza de que a consequência para o caráter daquela criança, no final, será a vontade própria,
o orgulho e a arrogância. Você não deve estranhar que os homens recusem a obedecer ao seu
Pai celestial, se você os permite, enquanto são crianças, que desobedeçam ao seu pai terreno.
Pais, se você ama aos seus filhos, faça com que a obediência seja a palavra-chave e o lema
contínuo diante dos seus olhos.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle X
10. Treine-os ao hábito de sempre dizer a verdade

A veracidade é muito menos comum no mundo do que nós estamos dispostos a pensar à
primeira vista. “A verdade completa e nada além da verdade” é uma regra de ouro que muitos
fariam bem se a mantivessem sempre em mente. A mentira e a prevaricação são pecados muito
antigos. O Diabo foi o pai deles: ele enganou Eva com uma ousada mentira e desde a queda este
é um pecado contra o qual todos os filhos de Eva precisam sempre vigiar.

Pense somente em quanta falsidade e engano existem no mundo! Quanto exagero! Quantas
adições são feitas a uma simples história! Quantas coisas são deixadas de fora ou omitidas por
não servirem ao interesse daquele que a está contando! Quão poucos há entre nós acerca dos
quais podemos dizer que depositamos toda a nossa confiança nas suas palavras, sem hesitar!
De fato, os Persas eram sábios em sua geração: um ponto crucial na educação dos seus filhos
era que eles deveriam aprender a falar sempre a verdade. Que prova terrível da pecaminosidade
humana é o fato de até mesmo ser necessário que mencionemos este ponto!

Leitor, eu gostaria de ressaltar a você o quão frequentemente Deus é chamado, no Antigo


Testamento, de O Deus da Verdade. A verdade parece ser especialmente colocada diante de nós
como um traço fundamental do caráter Daquele com quem nós nos identificamos. Ele nunca se
desvia do reto caminho. Ele abomina a mentira e a hipocrisia. Procure manter estas coisas
continuamente diante da mente dos seus filhos. Enfatize a eles, a cada momento, que qualquer
coisa a menos do que a verdade é mentira, e que o “fugir do assunto”, o “inventar desculpas” e
o exagero são como meio caminho andado na direção do que é falso, e devem ser evitados.
Encoraje-os a serem sempre diretos em todas as circunstâncias, e a falarem sempre a verdade,
custe o que custar.

Eu realço que você dê toda a atenção a este assunto não somente pelo bem do caráter dos seus
filhos neste mundo (embora eu dê o maior valor a isto), mas eu lhe encorajo a ser firme nesta
questão principalmente para o seu próprio conforto e assistência em todo o seu relacionamento
com eles. Você verá quão grande ajuda é, de fato, poder sempre confiar nas suas palavras. Isso
servirá até mesmo para prevenir aquele hábito do encobrimento que, infelizmente, às vezes
prevalece entre as crianças. O caráter franco e honesto depende muito do tratamento que os
pais dão a esta questão nos dias da sua infância.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle XI
11. Treine-os ao hábito de sempre remir o tempo

A ociosidade é a melhor amiga do Diabo. Ela é o modo mais certo de darmos oportunidade a ele
para nos fazer mal. Uma mente vazia é como uma porta aberta, e se Satanás não entrar por ela
por si mesmo, é certo que ele jogará por ela algo que levantará maus pensamentos em nossas
almas.

Nenhum ser foi criado para ser ocioso. O serviço e o trabalho são a porção designada para cada
criatura de Deus. Os anjos no céu trabalham – eles são os servos ministradores do Senhor,
sempre fazendo a Sua vontade. Adão, no paraíso, tinha trabalho – ele foi designado para manter
e guardar o jardim do Édem. Os santos redimidos na glória também terão trabalho: “eles não
descansam dia e noite, cantando louvores e dando glória Àquele que os comprou.” E assim
também nós, homens fracos e pecadores, precisamos ter algo para fazer ou nossas almas logo
entrarão em um estado doentio. Nós precisamos ter as nossas mãos cheias e as nossas mentes
ocupadas com alguma coisa, ou então as nossas imaginações logo fermentarão e conceberão
maldade.

E o que é verdadeiro com relação a nós, também é verdadeiro com relação aos nossos filhos. De
fato, ai do homem que não tem nada para fazer! Os Judeus viam a ociosidade praticamente
como um pecado: era uma lei entre eles que cada homem deveria criar o seu filho para algum
negócio útil; e eles estavam certos! Eles conheciam o coração do homem mais do que alguns de
nós parecem conhecer hoje.

A ociosidade fez de Sodoma o que ela era: “Eis que esta foi a iniquidade de Sodoma, tua irmã:
soberba, fartura de pão, e próspera tranquilidade [ociosidade] teve ela e suas filhas.” (Ez. 16:49)
A ociosidade teve muito a ver com o terrível pecado de Davi com a esposa de Urias. Eu vejo, em
II Sam. 11, que Joabe foi para a guerra contra Amom, “porém Davi ficou em Jerusalém”. Não foi
isso ociosidade? E foi então que ele viu Bate-Seba, e o próximo passo que lemos é o da sua
terrível e miserável queda.

De fato, eu penso que a ociosidade tem levado a mais pecados do que quase qualquer outro
hábito que possamos mencionar. Eu suspeito que ela é a mãe de muitas obras da carne: a mãe
do adultério, da fornicação, da embriaguez e de muitos outros atos praticados na escuridão, os
quais eu não tenho tempo para mencionar. Deixe que a sua própria consciência lhe diga se eu
não estou contando a verdade. Quando você se encontrou desocupado, logo o Diabo bateu em
sua porta e entrou.

E na realidade, isso não é de se estranhar: tudo no mundo ao nosso redor parece nos ensinar a
mesma lição. É a água parada que se torna estagnada e impura: os riachos de água corrente
estão sempre limpos. Se você possui uma maquina a vapor, você precisa funcioná-la, ou então
ela logo deixará de funcionar. Se você tem um cavalo, você precisa exercitá-lo. Ele nunca estará
tão bem do que quando ele exerce um trabalho regular. Se você mesmo deseja ter boa saúde
física, você precisa se exercitar. Se você ficar sempre sentado e parado, mais cedo ou mais tarde,
é certo que o seu corpo reclamará. E assim também é com a alma. A mente ativa e movimentada
é um alvo difícil para o Diabo acertar com os seus tiros. Tente se encher sempre de serviços úteis
e assim o seu inimigo achará difícil encontrar lugar para semear ervas daninhas. Leitor, eu peço
que você exponha estas coisas diante da mente dos seus filhos. Ensine a eles o valor do tempo,
e tente fazer com que eles aprendam desde cedo o hábito de utilizá-lo bem. Dói-me ao ver
crianças enrolando com algo que eles têm nas mãos para fazer, seja o que for. Eu amo vê-las
ativas e diligentes, e se dando com todo o coração a tudo o que fazem: dedicando-se com todo
o coração às suas lições, quando precisam aprender; e se dedicando com todo o coração até
mesmo às suas brincadeiras, quando saem para brincar.

Mas se você realmente as ama, faça com que a ociosidade seja contada como um pecado em
sua família.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle XII
12. Treine-os a um constante temor da indulgência (consentimento) em prazeres

Dentre tudo o que eu tenho dito, este é o ponto sobre o qual você tem a maior necessidade de
estar sempre se vigiando. É natural que sejamos gentis e carinhosos com relação à nossa própria
carne e sangue, mas é o excesso desta mesma gentileza e afeição que você deve temer. Cuide
para que isso não lhe torne cego quanto às faltas dos seus filhos e surdo para todos os conselhos
que lhe são dados sobre eles. Cuide para que isso não lhe faça passar a mão sobre a má conduta
deles, ao invés de tomar para si a dor de infligir o castigo e a correção.

Eu bem sei que a punição e a correção são coisas muito desagradáveis. Nada é mais desagradável
do que causar dor àqueles a quem nós amamos, ou provocar as suas lágrimas. Mas enquanto os
corações são o que são, é vão supor, como regra geral, que as crianças possam ser educadas
sem correção.

O termo “mimar” ou “estragar” é muito expressivo e, infelizmente, cheio de significado. Agora


a maneira mais fácil de se “estragar” uma criança é deixar que ela tenha tudo sempre do seu
próprio jeito – é permitir que ela faça o que é errado sem corrigi-la por causa disso. Creia em
mim, não faça isso, custe o que custar a você, a menos que você queira estragar as almas dos
seus filhos.

Você não pode argumentar que a Bíblia não é clara quanto a este assunto: “O que retém a vara
aborrece a seu filho, mas o que o ama, cedo, o disciplina.” (Pv. 13:24) “Castiga a teu filho,
enquanto há esperança, mas não te excedas a ponto de matá-lo.” (Pv. 19:18) “A estultícia está
ligada ao coração da criança, mas a vara da disciplina a afastará dela.” (Pv. 22:15) “Não retires
da criança a disciplina, pois, se a fustigares com a vara, não morrerá. Tu a fustigarás com a vara
e livrarás a sua alma do inferno.” (Pv. 23:13-14) “A vara e a disciplina dão sabedoria, mas a
criança entregue a si mesma vem a envergonhar a sua mãe.” “Corrige o teu filho, e ele te dará
descanso, dará delícias à tua alma.” (Pv. 29:15,17).

Quão fortes e impetuosos são estes textos! Quão melancólico é o fato de que em muitas famílias
cristãs, eles parecem ser praticamente desconhecidos! Os seus filhos precisam da repreensão,
mas ela praticamente não é exercida. Eles precisam da correção, mas ela dificilmente é
empregada. E ainda assim, este livro de Provérbios não é obsoleto ou inadequado para os
cristãos. Ele foi dado por inspiração Divina e é útil. Ele foi dado para o nosso aprendizado, assim
como as epístolas aos Romanos ou aos Efésios. Certamente, o cristão que cria os seus filhos sem
dar atenção ao seu conselho, está se julgando mais sábio do que aquilo que está escrito, e erra
grandemente.

Pais e mães, eu lhes digo simplesmente, se você nunca punir os seus filhos quando eles estão
em falta, vocês estão fazendo a eles um grave mal. Eu lhes admoesto, esta é uma pedra na qual
os santos de Deus, em todas as épocas, têm muito frequentemente naufragado. Eu me sinto
obrigado a tentar persuadi-lo a ser sábio a seu tempo, e a manter isso bem claro em sua mente.
Veja o caso de Eli. Os seus filhos, Hofni e Fineias, “se fizeram vis, e ele não os repreendeu”. Ele
não lhes deu nada a mais do que uma repreensão mansa e morna, quando ele deveria ter lhes
censurado com severidade. Em suma, ele honrou os seus filhos mais do que a Deus. E qual foi o
fim destas coisas? Ele viveu para ouvir sobre a morte de ambos os seus filhos na batalha e os
seus próprios cabelos brancos foram trazidos com sofrimento para a sepultura (1 Sam. 2:22-29,
3:13).
Veja, também, o caso de Davi. Quem pode ler, sem sentir dor, a história dos seus filhos e de seus
pecados? O incesto de Ammon, o assassinato e a pura rebelião de Absalão, a conspiração
ambiciosa de Adonias: de fato estas foram dolorosas feridas para o “homem segundo o coração
de Deus” receber em sua própria casa. Mas será que não houve falta da sua parte? Temo eu
que, sem dúvida, houve. Eu encontro uma pista sobre tudo isso no relato sobre Adonias em 1
Reis 1:6: “Jamais seu pai o contrariou, dizendo: Por que procedes assim?” Esta foi a base de todo
o problema. Davi foi um pai super indulgente – um pai que deixava com que os seus filhos
fizessem tudo do jeito que bem quisessem, e ele colheu de acordo com aquilo que tinha
plantado.

Pais, eu lhes suplico, pelo bem dos seus filhos, tenha cuidado com o mimo exacerbado. Eu lhes
trago à lembrança, o seu dever principal é consultar as suas reais necessidades, e não os seus
próprios gostos ou desejos. O seu dever é treiná-los, e não simplesmente entretê-los; é
beneficiá-los, e não simplesmente agradá-los.

Você não deve ceder à toda vontade e capricho da mente do seu filho, por mais que você o ame.
Você não deve deixar que ele venha a supor que a sua vontade é tudo, e que ele só precisa
desejar algo, para que isso lhe seja feito. Eu lhe suplico, não faça dos seus filhos os seus ídolos,
para que o Senhor não venha a tomá-los de você, e quebrar o seu ídolo, a fim de lhe convencer
da sua tolice.

Aprenda a dizer “não” aos seus filhos. Mostre a eles que você é capaz de recusar tudo aquilo
que você pensa não ser bom para eles. Mostre a eles que você está pronto para punir a
desobediência e que quando você fala de punição, você não está simplesmente pronto para
ameaçar, mas também para executá-la. Não ameace demais. Povos ameaçados e faltas
ameaçadas têm longa vida. Castigue poucas vezes, mas realmente, e com seriedade. A punição
leve e frequente é, de fato, um miserável sistema.

Cuidado ao deixar que pequenas faltas passem despercebidas sob a ideia de que “é apenas uma
pequena falta”. Não há nada pequeno quando o assunto é criação de filhos; tudo é importante.
Pequenas ervas daninhas precisam ser arrancadas tanto quanto as outras. Deixe que elas
fiquem, e elas logo ficarão grandes. Leitor, se há qualquer ponto que merece a sua atenção,
creia em mim, este é um deles. Eu sei que isso lhe trará muito trabalho e preocupação. Mas se
você não se der ao trabalho de disciplinar os seus filhos enquanto são jovens, eles lhe darão
maior trabalho e preocupação quando estiverem mais velhos. Escolha o que você preferir.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle XIII
13. Treine-os tendo sempre em mente (se lembrando) como Deus treina os Seus filhos.

A Bíblia nos diz que Deus tem um povo eleito – uma família neste mundo. Todos os pobres
pecadores que foram convencidos dos seus pecados, e foram a Jesus para obter a paz, formam
esta família. Todos nós que realmente cremos em Cristo para a nossa salvação somos membros
dela. Agora Deus, o Pai, está sempre treinando os membros desta família para a sua eterna
habitação com Ele no céu. Ele age como um lavrador podando as suas vinhas para que produzam
mais frutos. Ele conhece o caráter de cada um de nós – os pecados que nos assediam, as nossas
fraquezas, as nossas enfermidades peculiares, as nossas necessidades especiais. Ele conhece o
nosso trabalho e onde nós moramos, quem são os nossos companheiros nesta vida, e quais são
as nossas provações, as nossas tentações e os nossos privilégios. Ele sabe todas estas coisas e
está sempre ordenando tudo isso para o nosso bem. Ele destina a cada um de nós, na Sua
providência, aquelas mesmas coisas de que nós precisamos, a fim de que possamos produzir
mais frutos – o máximo de sol que possamos suportar, e o máximo de chuva. O tanto de coisas
amargas que possamos suportar, e o tanto de coisas doces. Leitor, se você deseja treinar os seus
filhos sabiamente, veja bem como o Deus Pai treina os Seus filhos. Ele sempre faz o que é bom;
o plano que Ele adota tem de ser o correto.

Veja, então, quantas coisas há que Deus retém dos seus filhos. Poucos podem ser encontrados,
eu suspeito, dentre aqueles que nunca tiveram desejos que não aprouve a Ele atender. Sempre
houve aquela uma coisa que eles desejavam obter, contudo sempre houveram barreiras que o
impedissem de alcança-la. Tem sido como se Deus estivesse colocando esta determinada coisa
acima do nosso alcance, e dizendo: “Isto não é bom para você; você não pode ter isso.” Moisés
extremamente desejava cruzar o Jordão para ver a boa terra prometida, mas você lembrará que
o seu desejo nunca lhe foi concedido.

Veja, também, o quão frequentemente Deus guia o seu povo por caminhos que parecem escuros
e misteriosos aos nossos olhos. Nós não conseguimos ver o significado de todas as maneiras
como Ele lida conosco; nós não conseguimos ver a razoabilidade da trilha na qual os nossos pés
estão pisando. Às vezes, tantas provações nos têm assaltado – tantas dificuldades nos têm
cercado – que nós não temos podido descobrir a razão de tudo isso. Tem sido como se o nosso
Pai estivesse nos guiando pela mão por dentro de um lugar escuro e dizendo: “não pergunte
nada, apenas Me siga”. Havia uma estrada direta do Egito para Canaã, contudo Israel não foi
guiado por ela, mas ao redor dela, por meio do deserto. E isso foi difícil para eles naquela época.
“o povo”, nos é dito, “se tornou impaciente no caminho” (Ex. 13:17; Num.21:4).

Veja, também, o quão frequentemente Deus castiga o seu povo com provações e aflições. Ele
os envia cruzes e desapontamentos. Ele os aflige com doenças. Ele retira deles as suas
propriedades e os seus amigos; Ele os coloca em diferentes posições; Ele os visita com as coisas
mais difíceis para a nossa carne e sangue; e alguns de nós têm praticamente desmaiado debaixo
dos fardos que têm sido colocados sobre nós. Nós temos nos sentido pressionados além das
nossas forças; e temos ficado quase prontos para murmurar contra a mão Daquele que nos
castiga. O apóstolo Paulo tinha um espinho na carne que foi designado para ele, uma amarga
tentação corporal, sem dúvida, embora nós não saibamos exatamente do que se tratava. Mas
uma coisa nós sabemos: ele três vezes suplicou ao Senhor para que aquilo lhe fosse retirado,
mas o Senhor não o fez (2 Cor. 12:8-9).
Agora, leitor, apesar de todas estas coisas, você já ouviu sequer um filho de Deus dizer que acha
que o seu Pai não o tratou sabiamente? Não, eu tenho certeza de que você nunca ouviu isso. Os
filhos de Deus sempre lhe contarão, a longo prazo, que foi uma bênção eles não terem tudo
como queriam, e que Deus tem feito, de longe, melhor para eles do que eles poderiam ter feito
para si próprios. Sim! E eles poderiam lhe dizer também que o lidar de Deus tem lhes
providenciado muito mais alegria do que eles poderiam pensar obter por si mesmos, e que o
Seu caminho, embora às vezes seja escuro, foi o caminho da alegria e a estrada da paz.

Eu peço que você guarde em seu coração a lição que o modo como Deus lida com o Seu povo
quer lhe ensinar. Não tema reter da sua criança tudo o que você pensa não ser bom para ela,
sejam quais forem os seus próprios desejos. Este é o plano de Deus.

Não deixe de castigar e corrigir os seus filhos sempre que você ver que a saúde das suas almas
requer disciplina, não importa o quão doloroso isso pode ser para os seus sentimentos; e lembre
sempre que os remédios para a mente não devem ser rejeitados simplesmente por serem
amargos. Este é o plano de Deus.

E não tema, acima de tudo, que tal plano de treinamento deixará a sua criança infeliz. Eu lhe
admoesto contra esta ilusão. Dependa disto: não há um caminho mais seguro para a infelicidade
do que sempre ter tudo do seu próprio jeito. Ter as nossas necessidades conferidas e negadas é
uma bênção para nós; isso faz com que possamos gozar melhor dos prazeres quando eles vêm
a nós. Ter sempre os nossos desejos atendidos é o melhor jeito de nos tornar egoístas. E creia
em mim, pessoas egoístas, assim como crianças mimadas, dificilmente são felizes.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle XIV
14. Treine-os (tendo sempre em mente) lembrando-se continuamente da influência do
seu exemplo.

Toda a sua instrução, conselho e mandamentos serão de pouco proveito se os seus filhos não
tiverem o respaldo do padrão da sua própria vida. Os seus filhos nunca acreditarão que você
está falando sério, e que você realmente quer que eles lhe obedeçam, quando as suas ações
contradizem a sua conduta. O Bispo Tillotson fez uma sábia colocação quando disse: “Ao dar aos
seus filhos uma boa instrução e um mau exemplo, é como se você estivesse apontando a eles
com a sua cabeça o caminho para o céu, ao mesmo tempo em que você os pega pela mão e os
guia no caminho para o inferno.”

Nós pouco sabemos sobre a força e o poder do exemplo que damos. Ninguém pode viver para
si mesmo nesse mundo; nós estamos sempre influenciando aqueles que nos cercam de um
modo ou de outro, seja para o bem ou para o mal, para Deus ou para o pecado. Eles veem os
nossos caminhos, eles marcam a nossa conduta, eles observam o nosso comportamento e aquilo
que eles nos veem praticar, isso eles podem justamente supor que é o que nós vemos como
correto. E nunca, creio eu, esse exemplo fala tão poderosamente quanto no caso de pais para
com os seus filhos.

Pais e mães, nunca se esqueçam de que os seus filhos aprendem mais com os olhos do que com
os ouvidos. Nenhuma escola deixará marcas tão profundas no caráter das crianças do que o seu
próprio lar. O melhor dos mestres não imprimirá nas suas mentes tanto quanto eles assimilarão
sentados ao redor da sua lareira, com você. A imitação é um princípio muito mais forte do que
a memória no caso das crianças. Aquilo que eles veem tem um efeito muito mais forte em suas
mentes do que aquilo que eles ouvem de nós.

Tome cuidado, portanto, com o que você faz em frente a uma criança. É um verdadeiro
provérbio o que diz: “Aquele que peca diante de uma criança, peca em dobro.” Antes, esforce-
se para ser uma epístola viva de Cristo, de tal forma que a sua família o possa assim ler, e tão
claramente também. Seja um exemplo de reverência pela Palavra de Deus, de reverência na
oração, reverência pelos meios de graça, reverência pelo dia do Senhor. Seja um exemplo em
palavras, no temperamento, na diligência, na temperança, na fé, no amor, na bondade e na
humildade. Não pense que os seus filhos poderão praticar aquilo que eles não veem em você.
Você é o seu modelo, e eles copiarão o que você é. O seu raciocínio e as suas palestras, os seus
sábios mandamentos e o seu bom conselho, tudo isso eles podem não entender; mas eles
podem entender muito bem a sua vida.

As crianças são sutis observadoras, muito ágeis em ver certos tipos de hipocrisia, muito ágeis
em descobrir aquilo que você realmente pensa ou sente, muito ágeis em adotar todos os seus
jeitos e opiniões. Você frequentemente verá que tal como o pai é, assim também é o filho.

Lembre-se das palavras que o conquistador César sempre dizia aos seus soldados nas batalhas:
Ele não dizia “Sigam avante”, e sim: “Venham comigo”! Assim deve ser com você no treinamento
dos seus filhos. Eles dificilmente aprenderão hábitos que eles veem você desprezar ou a andar
em caminhos que você mesmo não anda. Aquele que prega aos seus filhos sobre algo que ele
mesmo não pratica está fazendo um trabalho que não avança nunca. É como a antiga fábula da
teia de Penélope, que teava o dia inteiro, para depois desfazer tudo durante a noite. Assim
também, o pai que tenta treinar os seus filhos sem dar a eles um bom exemplo está construindo
com uma mão e derrubando com a outra.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle XV
15. Treine-os lembrando-se (tendo sempre em mente) continuamente do poder do
pecado.

Eu mencionarei isto brevemente, para guardá-lo contra expectativas que não são biblicamente
fundamentadas. Você não deve esperar que as mentes dos seus filhos sejam uma página de
papel branca e pura, e que você não terá problema algum desde que use dos meios corretos. Eu
lhe aviso claramente: você verá que as coisas não são assim.

É doloroso ver quanta corrupção e maldade existe no coração de uma pequena criança, e o quão
cedo isso começa a gerar frutos. Temperamentos violentos, vontade-própria, orgulho, inveja,
ressentimento, ira, preguiça, egoísmo, engano, esperteza, falsidade, hipocrisia, uma terrível
tendência para aprender o que é mal, uma dolorosa lentidão para aprender o que é bom, uma
disposição para fingir ou inventar qualquer coisa a fim de se conseguir aquilo que se quer – todas
estas coisas, ou algumas delas, você deve estar preparado para ver, até mesmo naqueles que
são da sua própria carne e sangue. Em pequenas formas, estas coisas aparecerão ainda em uma
idade muito tenra; é quase atemorizante observar o quão naturalmente tais coisas parecem
brotar. As crianças não precisam de lição alguma para aprender a pecar.

Mas você não deve ficar desencorajado e desanimado pelo que você vê. Você não deve pensar
ser algo estranho ou incomum que pequenos corações possam ser tão cheios de pecado. Este é
o único legado que o nosso pai Adão nos deixou; é aquela natureza caída com a qual nós viemos
ao mundo, é a herança que pertence a todos nós. Ao invés, que isso lhe faça ainda mais diligente
para utilizar de todos os meios que lhe parecem mais apropriados, pelas bênçãos de Deus, para
agir contra o erro. Que isso lhe torne mais e mais cuidadoso, naquilo que lhe cabe fazer, para
manter os seus filhos longe do caminho da tentação.

Nunca dê ouvidos àqueles que dizem que os seus filhos são tão bonzinhos, e bem-educados, e
dignos de confiança. Ao contrário, pense que os seus corações são sempre como uma substância
inflamável. No melhor dos casos, eles só querem uma faísca para incendiar as suas corrupções.
Os pais dificilmente são cuidadosos demais. Lembre-se da depravação natural dos seus filhos, e
fique alerta.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle XVI
16. Treine-os lembrando-se continuamente das promessas das Escrituras

Eu menciono isso também brevemente, para guardá-lo contra o desânimo. Você possui uma
clara promessa ao seu lado: “Treina a criança no caminho em que deve andar, e ainda quando
for velho, não se desviará dele” (Pr. 22:6). Pense no que consiste ter uma promessa como esta.
As promessas eram a única lamparina de esperança que encorajava o coração dos patriarcas
antes da Bíblia ser escrita. Enoque, Noé, Abraão, Isaque Jacó, José, – todos estes viveram com
base em algumas promessas, e prosperaram em suas almas. As promessas são as bebidas
medicinais que em todas as épocas, têm apoiado e fortalecido os crentes. Aquele que tem um
simples texto ao seu lado, nunca precisará desanimar. Pais e mães, quando os seus corações
estiverem desapontados e prestes a estancar, olhem paras as palavras deste texto e sejam
confortados.

Pense em quem é que está nos prometendo. Esta não é palavra de homem, que pode mentir ou
se arrepender; esta é palavra do Rei dos Reis, que nunca muda. Se Ele disse alguma coisa, Ele
não a cumprirá? Ou se Ele falou algo, Ele não o fará para o bem? E nem é coisa alguma difícil
demais para que Ele a execute. As coisas que são impossíveis para o homem, são possíveis para
Deus. Leitor, se nós não recebermos os benefícios da promessa sobre a qual estamos
dependendo, a culpa não está Nele, mas em nós mesmos.

Pense, também, no que essa promessa contém antes de se recusar a ser encorajado por ela. Ela
fala de um certo momento em que o bom treinamento especialmente produzirá fruto – “quando
[a criança] for velha”. Certamente, há conforto nisso. Você poderá até não ver com os seus
próprios olhos o resultado de um treinamento cuidadoso, mas você não sabe que benditos
frutos poderão brotar disso, até mesmo bem depois de você morrer. Não é o modo de Deus nos
dar tudo de uma só vez. “O porvir” é muitas vezes o tempo que Ele escolhe para trabalhar tanto
nas coisas da natureza, quanto nas coisas da graça. “O porvir” é a estação quando as aflições
produzem o fruto pacífico da justiça (Heb. 12:11). O “porvir” foi o tempo em que o filho que
havia se recusado a trabalhar na vinha do seu pai se arrependeu e retornou (Mt. 21:29). E o
“porvir” é o tempo para o qual os pais devem olhar se eles não veem sucesso no seu próprio
tempo. Você deve semear na esperança e plantar na esperança.

“Lança o teu pão sobre as águas”, diz o Espírito, “porque depois de muitos dias, o acharás.” (Ec.
11:1). Muitos filhos, eu não duvido, se levantarão no dia do juízo e bendirão aos seus pais pelo
bom treinamento recebido, os quais nunca mostraram sinal algum de terem tirado proveito dele
durante toda a vida dos seus pais. Siga avante, portanto, em fé, e esteja certo de que o seu labor
não será totalmente desperdiçado. Por três vezes Elias teve de se reclinar sobre o filho da viúva
antes que ele revivesse. Siga o seu exemplo, e persevere.
Os Deveres do Pais – Por J. C. Ryle XVII
17. Treine-os, finalmente, em contínua oração pela bênção divina em tudo o que você
fizer.

Sem a bênção do Senhor, os seus maiores esforços não farão bem algum. Ele tem os corações
de todos os homens em Suas mãos e, a não ser que Ele toque o coração dos seus filhos pelo Seu
Espírito, você se desgastará sem propósito algum. Regue, portanto, a semente que você tem
semeado nas suas mentes com incessante oração. O Senhor está muito mais disposto a ouvir do
que nós estamos para orar; muito mais pronto para conceder bênçãos do que nós estamos para
pedi-las, mas Ele ama ser implorado por elas. E eu coloco esta questão da oração diante de você
como a pedra de acabamento e o selo de tudo o que você faz. Eu suspeito que o filho de muitas
orações dificilmente será lançado fora.

Olhe para os seus filhos como Jacó olhou para os seus; ele diz a Esaú que eles eram “os filhos
com que Deus agraciou ao seu servo” (Gn. 33:5). Olhe para eles como José olhou para os seus;
ele disse ao seu pai: “estes são os meus filhos, que Deus me deu aqui” (Gn. 48:9). Conte-os,
juntamente com o salmista, que disse: “Herança do Senhor são os filhos; o fruto do ventre, seu
galardão” (Sl. 127:3). E então peça ao Senhor, com santa ousadia, que seja gracioso e
misericordioso para com as Suas próprias dádivas. Veja como Abraão intercede por Ismael,
porque ele o amava: “Oh, que Ismael viva diante de Ti” (Gn. 17:18). Veja como Manoá fala ao
Anjo sobre Sansão: “Como governaremos esta criança e o que devemos fazer para com ele?”
(Jz. 13:12). Observe o quão ternamente Jó cuidava das almas dos seus filhos: “Ele oferecia
holocaustos de acordo com o número de todos eles, pois dizia: talvez tenham pecado os meus
filhos e blasfemado contra Deus em seu coração. Assim o fazia Jó continuamente.” (Jó. 1:5). Pais,
se vocês amam aos seus filhos, vão e façam do mesmo modo. Você nunca poderá mencionar os
seus nomes diante do trono da misericórdia de Deus com demasiada frequência.

Conclusão

E agora, leitor, em conclusão, deixe-me enfatizar novamente a necessidade e a importância de


utilizar-se de absolutamente todos os meios ao seu alcance, se é que você deseja treinar os seus
filhos para o céu.

Eu bem sei que Deus é um Deus soberano, e que faz todas as coisas de acordo com o conselho
da Sua própria vontade. Eu sei que Roboão era filho de Salomão, e Manassés, o filho de Ezequias
e que nem sempre você vê pais piedosos terem uma semente piedosa. Mas eu também sei que
Deus é um Deus que age por Seus meios, e eu estou certo, se você menosprezar os meios que
eu tenho mencionado, os seus filhos dificilmente se tornarão bons cristãos.

Pais e mães, vocês podem levar os seus filhos para serem batizados, e tê-los na lista de membros
da Igreja de Cristo – vocês podem conseguir padrinhos piedosos para responder por eles e lhe
ajudar com as suas orações; você pode enviá-los para a melhor das escolas, e dar a eles Bíblias
e Livros de Oração, e encher as suas mentes de conhecimento, mas se durante todo esse tempo,
não houver um treinamento regular em casa, eu lhe digo claramente: eu temo que haverá muita
dificuldade, no final, quanto às almas dos seus filhos. O lar é o lugar em que os hábitos são
formados; o lar é o lugar em que as fundações do caráter são lançadas; o lar é que dá direção
aos nossos gostos, e preferências, e opiniões. Veja, portanto, eu lhe suplico, para que haja um
cuidadoso treinamento em casa. Feliz, de fato, é o homem que pode dizer como Bolton disse,
no seu leito de morte, aos seus filhos: “Eu creio, sim, que nenhum de vocês ousará me encontrar
diante do tribunal de Cristo em um estado não-regenerado”.
Pais e mães, eu lhes admoesto solenemente diante de Deus e do Senhor Jesus Cristo, tome para
si todas as dores necessárias para treinar os seus filhos no caminho em que devem andar. Eu
lhes admoesto não somente pelo bom estado das almas dos seus filhos; eu lhes admoesto pelo
bem do seu próprio conforto e paz futura. Verdadeiramente, é do seu interesse que você faça
isso. Verdadeiramente, a sua própria felicidade, em grande medida, depende disso. Os filhos
sempre foram o arco do qual as mais afiadas flechas foram lançadas para penetrar o coração
dos homens.

Os filhos têm preparado as taças mais amargas que o homem já pôde beber. Os filhos tem
causado as lágrimas mais tristes que o homem já pôde derramar. Adão poderia lhe dizer isso;
Jacó poderia lhe dizer isso, e Davi poderia lhe dizer isso. Não há outro sofrimento na terra, como
aquele que filhos têm trazido sobre os seus pais. Oh, tome cuidado, para que a sua própria
negligência não venha a produzir miséria para você na sua velhice. Cuidado, para que você não
venha a chorar debaixo do mal tratamento de um filho mal-agradecido; nos dias em que os seus
olhos estiverem fracos, e a sua força natural, abatida.

Se você já desejou que os seus filhos sejam os restauradores da sua vida, e os nutridores da sua
velhice; se você quer ter para eles bênçãos e não maldições – alegrias, e não sofrimentos – Judás
e não Rúbens – Rutes e não Orfas – se você não quer, como Noé, ser envergonhado pelos seus
atos, e, como Rebeca, ter a sua vida fatigada por eles: se este é o seu desejo, lembre-se do meu
conselho continuamente: treine-os, enquanto jovens, no caminho correto.

E quanto a mim, eu concluirei dedicando a minha oração a Deus por todos aqueles que leem
este livro, que todos vocês possam ser ensinados por Deus a sentir o valor das suas próprias
almas. Esta é uma razão pela qual o batismo é, muitas vezes, uma mera forma, e o treinamento
cristão é desprezado e menosprezado. `Muitas vezes os pais não sentem nem por si mesmos, e
portanto, eles também não sentem pelos seus filhos. Eles não percebem a tremenda diferença
entre o estado natural e o estado da graça, e portanto, eles estão contentes em deixá-los em
paz.

Agora que o Senhor ensine a todos vocês que o pecado é aquela coisa abominável que Deus
odeia. Então eu sei que você pranteará pelos pecados dos seus filhos e se esforçará para arrancá-
los como o ferro do fogo.

Que o Senhor ensine a todos vocês o quão precioso é Cristo, e que majestosa e completa é a
obra que Ele realizou para a nossa salvação. Então, eu tenho confiança de que você utilizará de
todos os meios para trazer os seus filhos a Jesus, para que eles vivam por Ele. Que o Senhor
ensine a todos vocês a sua necessidade do Espírito Santo, para renovar, para santificar, e para
despertar as suas almas. Então, eu tenho certeza de que você encorajará os seus filhos a orarem
a Ele sem cessar, e a nunca descansar, até que Ele tenha descido aos seus corações com poder,
e feito deles novas criaturas.

Que o Senhor conceda isso, e então eu tenho boa esperança de que você treinará bem os seus
filhos – treinará bem para essa vida, e treinará bem para a vida porvir; treinará bem para a terra,
e treinará bem para o céu; treinará para Deus, para Cristo e para a eternidade.

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