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GUARULHOS – 2022
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
ESCOLA DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
GUARULHOS – 2022
Na qualidade de titular dos direitos autorais, em consonância com a Lei de direitos autorais nº
9610/98, autorizo a publicação livre e gratuita desse trabalho no Repositório Institucional da
UNIFESP ou em outro meio eletrônico da instituição, sem qualquer ressarcimento dos direitos
autorais para leitura, impressão e/ou download em meio eletrônico para fins de divulgação
intelectual, desde que citada a fonte.
__________________________________________
Orientadora: Profª Drª Claudia Panizzolo
Universidade Federal de São Paulo
__________________________________________
Titular: Profª Drª Patrícia Biotto
Universidade Nove de Julho
__________________________________________
Titular: Profª Drª Renata Marcílio Candido
Universidade Federal de São Paulo
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Suplente: Profª Drª Lucilene Rezende Alcanfor
Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira
Às professoras e crianças que construíram a história
das escolas e da educação municipal andreense.
AGRADECIMENTOS
À professora e orientadora Claudia Panizzolo, por tudo e tanto. A quem devo minha
eterna gratidão, porque durante a trajetória deste estudo, diante de todas as dificuldades da
pesquisa, e percalços da vida, sempre esteve ao meu lado, ensinando, direcionando,
fortalecendo e acreditando em mim, até mesmo quando eu mesma não mais acreditava.
À minha família nuclear, na figura de meu esposo Claudinei, minha filha Emanuelle,
meu filho Enricco, que desde o início aceitaram e incentivaram meu desejo de prosseguir os
estudos, compreendendo a ausência da esposa e da mãe.
À minha extensão familiar, representada por minha irmã Roseni e meu irmão Sérgio,
que não puderam ingressar na universidade após a conclusão do Ensino Médio e trilharam
caminhos distantes da formação acadêmica. E aos meus pais Benedito e Dirce, que descansam
no repouso eterno e, na simplicidade de suas vidas não reconheciam o valor da formação escolar
nem no ensino superior, mas ampararam e propiciaram condições para meus estudos na escola
pública. Tenho a convicção de que, “a caçulinha da família”, promove o apreço pelas conquistas
alcançadas na carreira acadêmico-profissional.
À Leila, minha parceira na escola onde leciono. Que tanto me auxiliou durante os
planejamentos escolares, organização das aulas e atividades aos alunos, num período que todos
os professores precisaram se adaptar às novas tecnologias a fim de ministrar aulas on-line,
devido à pandemia de Covid-19, que fechou todas as escolas e exigiu o isolamento social
durante aproximadamente dois anos. Enfim, com toda ajuda e parceria, além da calma,
delicadeza e palavras de incentivo, permitiu que me dedicasse aos estudos acadêmicos e
prosseguisse na pesquisa.
À minha terapeuta Aline que, durante os momentos intempestivos da vida que cruzaram
com a trajetória acadêmica, me amparou, dialogando e despertando o ânimo. Desse modo,
permitindo-me reestabelecer a autoconfiança, o equilíbrio e o empenho aos estudos.
Aos amigos que demonstraram paciência pra ouvir meus relatos empolgantes das
descobertas desta pesquisa, estimulando meus estudos e torcendo pelo sucesso da pesquisa.
E por fim, o mais importante, agradeço à Deus e à Nossa Senhora Aparecida, a quem
professo minha fé e devoção, consagrando a vida e meus estudos, acreditando nas bençãos
recebidas durante o percurso desta pesquisa.
RESUMO
The schools destined to accommodate little children, in the city of Santo André, were
organized over three decades. When, as a result of this industrialization, the development of the
city and the expansion of the population happened. The objective of this research is to
reconstruct the history of the first schools administered by the municipal public power, until the
composition of childhood education of the city of Santo André responsible for accommodate
children from 4 to 6 years old, between 1954 and 1982. Temporal delimitation is justified
because on 09/27/1954 was published the law of creation of the Department of Education of
Santo André, and, in 1982, the first public contest for the position of teacher was held, which
constituted the faculty to compose the Assistance and Recreation Educational Centers, called
CEAR. In this context, the research seeks to answer how public education was configured in the
city of Santo André to accommodate children from the first schools to the implementation of
CEAR. The sources will compose with administrative documents,newspapers,photographs,
interviews. As research methodology were used literature review, selection and analysis of
documents and eleven semi-structured interviews. In this study, are analyzed category, time
and space, were used from the perspective of Viñao Frago and Escolano (1998), who consider
space as a place and time as a social symbol resulting from the human learning process. From
the contributions of Certeau (2014), the category of analysis practice of everyday allowed us to
understand the logics that move everyday actions, considering the speech place of each
interviewee, the social role and function within schools. Finally, this study concludes that the
transformations that the city of Santo André went through during the 20th century, especially
after the 1950s, changed the characteristics of the population, housing, employment and,
consequently, school education. Consequently, over the course of thirty years, the municipal
government has expanded services to young children in public schools, following the legal
requirements established by the Federal Government and following the determinations of the
Government of the State of São Paulo.
Quadro 1 – Legislação para criação de escolas e vagas para professores em Santo André ..... 56
Quadro 2 – Legislação para desapropriação e construção dos CEAR ...................................... 83
Quadro 3 – Unidades do CEAR inauguradas entre as décadas de 1970 e 1980 ....................... 86
Quadro 4 – Ex-alunas entrevistadas ....................................................................................... 104
Quadro 5 – Ex-professoras entrevistadas ............................................................................... 105
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – População dos Municípios no Estado de São Paulo com acima de 50.000 habitantes
– Censo demográfico de 1º/07/1950 ......................................................................................... 39
Tabela 2 – Dados preliminares do Censo Industrial ................................................................. 40
Tabela 3 – Relação das cidades brasileiras com população superior a 90.000 habitantes ....... 41
Tabela 4 – Estado natal da maioria dos migrantes paulistas, em 1940 .................................... 43
Tabela 5 – Frequência de estudantes nas escolas do Estado de São Paulo ............................... 51
Tabela 6 – Número de alunos e unidades escolares no Ensino Pré-Primário, Primário e Não-
Primário (1945-1949) .............................................................................................................. 57
Tabela 7 – Unidades Escolares, segundo as categorias do ensino - São Paulo – 1949 ............ 60
Tabela 8 – Leis e Decretos para desapropriação de terrenos para construção e/ou ampliação de
Grupos Escolares, entre as décadas de 1950 e 1960 ................................................................. 61
Tabela 9 – Diferenças nos critérios para pagamento de gratificação entre as professoras das
escolas Primárias e escolas Pré-Primárias e Jardim da Infância ............................................... 75
Tabela 10 – Valores das Taxas de contribuição arrecadadas pela ACEAR Homero Thon ....... 94
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 16
INTRODUÇÃO
Fevereiro de 1982 iniciava o ano letivo para mais um grupo de alunos e alunas do Centro
Educacional, Assistencial e Recreativo – CEAR da Vila Pires, na cidade de Santo André. Para
a maioria das crianças era a primeira vez que se ausentariam ou permaneceriam longe do
convívio familiar. Destacava-se o olhar admirado com que observavam os espaços escolares: o
tamanho das salas de aula, as cores dos móveis e paredes, o pátio que ficava pequeno quando
todos os alunos se reuniam para ouvir histórias, e o parque com brinquedos coloridos e repleto
de árvores. As professoras também eram observadas com encantamento, apreciavam a maneira
como elas conversavam com as crianças, como se vestiam, como guardavam os materiais nos
armários construídos em alvenaria. No decorrer dos meses as crianças participariam das grandes
festas realizadas no CEAR e que ficariam registradas na memória, principalmente a festa junina
e a festa de encerramento do ano letivo. Dentre essas crianças estava a autora desta pesquisa
que três décadas depois formou-se professora e passou a lecionar na mesma rede ensino, e que
neste estudo pretende reconstituir a história da educação pública municipal, responsável por
acolher crianças pequenas na cidade de Santo André; considerando que, ao estudar memórias,
é importante refletir e ressignificar as lembranças e as memórias pessoais, no intuito de refinar
o fazer investigativo.
Esta pesquisa nasceu de indagações que se consolidaram a partir dos estudos no Grupo
de Estudos e Pesquisa: Infância, Cultura e História – GEPICH1, que, sob a coordenação da Profª
Drª Claudia Panizzolo, desenvolve pesquisas sobre a constituição da infância, em suas
dimensões históricas e socioculturais, e tem como objetivo estudar as práticas e os dispositivos
atuais e históricos de conformação da criança, entre os quais se incluem a escola, seus espaços,
tempos e agentes, bem como as concepções e as políticas públicas para a infância. Esta pesquisa
corrobora com os objetivos do GEPICH, ampliando as pesquisas sobre as escolas de educação
infantil paulistana e se insere na Linha 1 - Instituições voltadas às crianças e a modelação2.
Além disso, este estudo está vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Escola
1
O grupo está organizado em torno de quatro linhas de pesquisa: Linha 1 – Instituições voltadas às crianças e a
modelação da infância; Linha 2 – A arte de civilizar as crianças, o estudo de impressos para a leitura na/sobre a
escola da infância; Linha 3 – Escolas étnicas em São Paulo e a escolarização da infância; Linha 4 – as múltiplas
linguagens das crianças e a escola da infância: o estudo dos currículos, propostas e práticas pedagógicas.
Disponível em: https://sites.google.com/view/gepich.
2
Dentre as pesquisas desenvolvidas pelos membros dos GEPICH, se aproximam desta dissertação: Oliveira
(2019), que analisou a história da creche da Universidade Federal de São Paulo; Camaru (2019), que investigou o
atendimento e a proposta curricular da rede de creches diretas da cidade de São Paulo; e Santiago (2021), que
estudou a história das escolas de primeiras letras na cidade de São Bernardo do Campo.
17
Santo André é uma das cidades pertencentes à Região Metropolitana de São Paulo 3,
localizada a sudeste da capital. Integra a região do Grande ABC Paulista, composta por sete
municípios que são interligados por ruas e vias, a ponto de ser difícil definir as fronteiras
terrestres entre eles. Esses municípios são: Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano
do Sul, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, que compõem a região do
Grande ABC.
Santo André da Borda do Campo4, – que corresponde atualmente a toda a extensão do
ABC Paulista, tem como data de fundação o ano de 1553, mas, àquela época, a região era apenas
um local onde passavam as tropas com animais de cargas em direção à São Paulo.
3
Região Metropolitana de São Paulo, também conhecida como Grande São Paulo, é a denominação estabelecida
ao conjunto de 39 cidades localizadas ao redor da capital São Paulo. Atualmente vivem neste território quase 50%
da população do Estado. (Dados extraídos do site da Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano –
EMPLASA https://www.emplasa.sp.gov.br/)
4
Essa região foi povoada antes da fundação predicada como vila, por Martim Afonso de Sousa. Ele foi um nobre
português a quem o rei Dom João III atribuiu diversas tarefas. Dentre elas estava a de dar início à colonização das
terras do Brasil, que vinham sendo cada vez mais assediadas pelos franceses. Isso ocorreu por volta de 1530. Ele
foi donatário da capitania de São Vicente, que abarcava territórios que iam desde o Paraná até o Rio de Janeiro.
(Dados extraídos do site da Escola Britânica. https://escola.britannica.com.br/). Esse território foi ocupado,
primeiramente, pelos indígenas, em seguida pelos portugueses, que iniciaram a desbravação pelas terras do
planalto paulista. Quando Martim Afonso chegou à região, encontrou João Ramalho, um português que havia
18
Os documentos e livros5 que guardam a história referente aos trezentos primeiros anos
da região são raros e de difícil localização. Apesar disso, nos últimos anos, além dos
memorialistas, pesquisadores vêm ampliando estudos em que as cidades da região são temáticas
privilegiadas. Segundo Martins (1991), a história da região do Grande ABC não é fácil de contar
nem de escrever, devido à falta de documentação. No trecho seguinte o autor explica:
Parece fácil, portanto, reconstituir essa história, como se tratasse apenas de revelá-la,
desocultá-la. Entretanto, as coisas não são assim. A região do ABC só veio a constituir
uma unidade administrativa claramente delimitada, em 1889, com a criação da Vila
de S. Bernardo poucos meses antes da proclamação da República. Somente então
começou a ser produzida uma documentação específica e sistemática sobre o novo
município. Antes disso, porém, a coisa é muito complicada. Os documentos sobre a
região são avulsos e dispersos (MARTINS, 1991, p. 9).
estabelecido e organizado um povoamento junto às aldeias indígenas do local. A data de tal acontecimento,
conforme fragmentos históricos, foi 8 de abril de 1553 (GAIARSA, 1968, 1991). No ano seguinte, se deu a
fundação da Vila de São Paulo de Piratininga, localizada a cerca de 30 quilômetros de Santo André, com a presença
dos padres jesuítas Manoel da Nóbrega e José de Anchieta. Em seguida, no intuito de proteger a população recém-
estabelecida dos perigos dos indígenas que habitavam Santo André, por ordem do governador geral do Brasil,
Mem de Sá, todos os habitantes foram acolhidos em São Paulo, junto ao pátio do colégio (GAIARSA, 1968, 1991;
SILVA, 2008).
5
A obra do memorialista Octaviano Gaiarsa, A cidade que dormiu três séculos, Santo André da Borda do campo,
seus primórdios e sua evolução histórica (1553 – 1960), conta a história desta região, desde o descobrimento,
passando pelas transformações, até o ano que marca o IV centenário da fundação e as ações que marcaram o
progresso da cidade.
6
A construção da estrada de ferro São Paulo Railway e a instalação das usinas de eletricidade Light & Power
aconteceram, respectivamente, em 1860 e 1907. A estrada de ferro, partindo do porto de Santos, subindo a Serra
do Mar, parava na vila de Paranapiacaba (distrito andreense e primeiro patamar do planalto); continuando a linha
férrea, havia uma estação construída no centro da cidade de Santo André, depois seguia em direção a São Paulo e
cidades do interior. A ferrovia foi a importante via de escoamento do café produzido nas cidades do interior de
São Paulo em direção ao porto de Santos, bem como de toda a produção agrícola, comercial e industrial da época
(GAIARSA, 1968, 1991; ODALIA, 2010; SILVA, 2008).
19
com a ferrovia e com a capital do estado de São Paulo atraiu as diversas indústrias que se
instalaram em Santo André e foram os principais motores da economia local.
Médici (1990) relata que, no início do século XX, a população era formada por operários
e funcionários que trabalhavam nas indústrias instaladas ao redor da estação ferroviária, como
se lê abaixo:
A estação ferroviária mais do que o núcleo ao seu redor, atraiu as primeiras indústrias
de Santo André e determinaram [sic] a vocação industrial da cidade. Três fábricas se
destacaram: a Silva Seabra e Cia (apelidada de Ipiranguinha), a Kowarick e a
Companhia Streiff, todas em pleno funcionamento já na última década do século XIX.
Ipiranguinha e Kowarick dedicavam-se ao ramo têxtil. Sobreviveram até o início dos
anos 70 do século XX. A Streiff, fábrica de cadeiras explorava a madeira abundante
da região. Manteve serraria em Rio Grande (antiga estação hoje município de Rio
Grande da Serra). A Streiff teve dois endereços no centro de Santo André: primeiro
na Rua Coronel Oliveira Lima, depois na Av. Queiroz dos Santos, onde ainda estão
seus pavilhões, hoje ocupados pela cooperativa de abastecimento da Rhodia.
As primeiras indústrias atraíram levas de migrantes, com destaque para os moradores
da Vila de São Bernardo, na sua imensa maioria italianos e seus descendentes. O
mercado de trabalho era atrativo justamente em função da carência de mão de obra
(MÉDICI, 1990, p. 49).
7
Segundo o Vocabulario Portuguez & Latino, de Raphael Bluteau, vila é uma povoação de menor graduação que
a cidade e superior à aldeia, tem juiz, câmara e pelourinho.
https://digital.bbm.usp.br/view/?45000008423&bbm/5413#page/106/mode/2up
8
Para Bluteau, distrito é a extensão de terreno dentro de certos limites, sujeitos a certos magistrados, prelados,
juízes.https://digital.bbm.usp.br/view/?45000008422&bbm/5412#page/466/mode/2up
9
Segundo o decreto-lei nº 311, de 2 de março de 1938, os municípios compreenderão um ou mais distritos,
formando área contínua; a sede do município tem categoria de cidade e lhe dá o nome; o distrito se designará pelo
nome da respectiva sede e terá categoria de vila enquanto não for erigida em cidade; nenhum município se instalará
sem que o quadro urbano da sede abranja no mínimo duzentas moradias; e cada distrito, para ser instalado, deverá
ser composto por no mínimo trinta moradias. https://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1930-1939/decreto-lei-
311-2-marco-1938-351501-publicacaooriginal-1-pe.html
20
10
Em 1973, outro prédio mais amplo foi construído, noutro local da cidade, para atender à demanda de alunos. O
primeiro prédio foi desapropriado, vendido e demolido (GAIARSA, 1991).
11
Símbolos do 4º Centenário: erigir um monumento ao herói fundador da cidade, João Ramalho, dentre outros
vultos da história; organizar e realizar uma exposição com a indústria, comércio e lavoura; organizar o museu
histórico; realizar obra que contribua para a solenidade e brilhantismo das comemorações. Cartazes foram
distribuídos pela cidade e os jornais locais deram ampla cobertura ao aniversário. Medalha comemorativa contendo
o brasão e a efígie do fundador da cidade foi produzida e distribuída entre as autoridades locais e munícipes. O
projeto do museu não se efetivou em tempo, vindo a acontecer somente em 1990. O monumento a João Ramalho
foi inaugurado no dia do evento, num local que recebeu o nome de Praça IV Centenário. A Exposição Industrial e
Comercial e a Exposição Internacional de Arte Fotográfica são inauguradas com a presença do governador do
Estado, em 10 de maio do mesmo ano. Mas a maior obra foi a construção de um Centro Cívico, na praça IV
Centenário, onde aconteceu a Exposição Industrial (GAIARSA, 1968, 1991).
21
No decorrer dos anos, entre as décadas de 1950 e 1960, ações da prefeitura do município
incentivaram a elaboração dos símbolos municipais: brasão, bandeira, hino; e financiaram a
edificação de monumentos e estátuas dos fundadores da cidade; aprovaram a construção de
grandes prédios públicos, centros comerciais e empresariais (GAIARSA, 1968). Pode-se notar
que, dentre as inúmeras construções, não são citadas escolas nem prédios destinados para fins
educacionais, principalmente para crianças pequenas, embora o autor cite desfiles escolares na
celebração do aniversário da cidade, como se pode ler abaixo:
Consideramos, desse modo, que a história da cidade de Santo André é marcada por duas
fases: a primeira corresponde ao final do século XIX até a expansão da industrialização no
início da década de 1950, e a segunda de 1950 em diante quando a região tornou-se um dos
centros da industrialização brasileira. A ferrovia contribuiu com a crescente industrialização de
toda a região, nas duas fases. Saindo de Santos, cortando a Serra do Mar, passando por Santo
André e seguindo para São Paulo, facilitava o transporte e o deslocamento, proporcionando
rapidez e velocidade (MARTINS, 2008, p. 16).
Ao analisar o crescimento de Santo André, fica evidente que as indústrias instaladas na
região atraíram uma população de baixo poder aquisitivo e pouca instrução. A oferta de
emprego assentou essas pessoas na região: eram trabalhadores agrícolas procedentes das
fazendas de café do interior paulista e do estado de Minas Gerais, além de diversas cidades da
região nordeste do Brasil. Em sua grande maioria, homens eram contratados, mas as indústrias
também “absorviam a força de trabalho das mulheres e das crianças, para as quais pagavam
salários inferiores aos dos homens” (MORAES, 2003, p. 40).
Com a ampliação do trabalho feminino, aumenta a necessidade de um lugar onde as
crianças pudessem permanecer durante o horário de expediente da mãe. Durante a primeira fase
do crescimento de Santo André, há registros de escolas para atender às crianças da região. No
entanto, não há informações precisas quanto aos responsáveis administrativos por estas
instituições, se Estado ou Município. Relatos das pesquisas de Gaiarsa (1991) registram que em
Santo André as primeiras escolas foram construídas pelas indústrias que prosperavam no
município:
22
Granjo (2003) analisa a educação escolar deste período, a primeira fase da expansão de
Santo André, e explica que as indústrias criaram escolas e utilizavam da mão-de-obra dos
alunos em suas fábricas. Segundo a autora, “em todas as fábricas era comum o trabalho infantil”
(GRANJO, 2003, p. 46). Esclarece ainda que o I Grupo Escolar foi construído no ano de 1914
para atender a toda a região composta pelo município de Santo André e o distrito de São
Bernardo. O respectivo grupo escolar reuniu nove escolas isoladas do município de Santo
André, dentre as 26 existentes no extenso território. Observa-se, portanto, que há registro de
escolas primárias, para as crianças em fase de alfabetização. Mas, para as crianças pequenas,
não há menção.
Bevilacqua (1997) relata as dificuldades dos jovens andreenses em busca de formação
escolar e cita a existência apenas dos grupos escolares que ofereciam o curso primário,
conforme se lê:
Ao fim da década de 1940, Santo André contava com 16 grupos escolares que
acolhiam um total de 8268 alunos, 18 escolas isoladas com 684 alunos, 34 escolas
municipais e ainda 20 escolas particulares, o total chegava a 12.395. Havia ainda
escolas noturnas para os maiores de 14 anos (GRANJO, 2003, p. 56, grifo meu).
Uma década depois, em 1950, Granjo (2003) explica que existiam na cidade 122 escolas
primárias, cinco ginásios, dois cursos colegiais, duas escolas normais e três escolas
profissionais. E, mais uma vez, permanece não havendo indicação de instituições para acolher
as crianças pequenas.
No estudo de Granjo (2003), observa-se crescimento considerável dos grupos escolares
na cidade de Santo André, decerto porque as escolas isoladas paulistas, que eram muitas vezes
salas de aulas adaptadas na residência do professor, espaços cedidos pela igreja católica ou pelo
próprio poder público, no decorrer dos anos, foram se acomodando dentro dos grupos escolares
e deixando de existir individualmente. Os grupos escolares do Estado de São Paulo, construídos
a partir do final do século XIX e início do século XX, marcavam a modernidade, demonstravam
o crescimento das cidades e do país. Representavam as inovações no ensino e eram escolas
idealizadas para alfabetizar crianças e adultos; as crianças frequentavam-nos durante o dia e os
adultos em cursos noturnos. A respeito da criação dos grupos escolares paulistas, nos
reportamos a Souza (1998), que nomeia essas escolas como Templos de Civilização e explica
que a criação delas foi consequência da reforma no ensino escolar, em busca de “vantagens
pedagógicas e econômicas”, e explica que:
andreense; as primeiras reivindicações começaram nos anos de 1970. E relata que, depois da
primeira creche, mais duas unidades foram inauguradas em 1988, sendo essas três creches
vinculadas ao Serviço Social da cidade, não ao Departamento de Educação.
Em contraposição ao estudo de Schifino (2012), na legislação municipal de Santo
André, consta o Decreto nº 1.411, de 10 de janeiro de 1959, que decide sobre a gratificação
destinada a professoras dos cursos de jardim de infância e das classes pré-primárias, conforme
apontamento a seguir, evidenciando a suposta existência de turmas destinadas às crianças
pequenas, sob a responsabilidade do município, antes das inaugurações da década de 1980,
citadas pela autora como sendo as primeiras escolas dedicadas à educação da infância na cidade:
O Prefeito Municipal de Santo André, usando das atribuições que lhe conferem o
artigo 58, nº I, da Lei Estadual nº 1, de 18 de setembro de 1947, DECRETA:
Art. 1º - O artigo 3º do Decreto nº 1.253, de 26 de novembro de 1957, passa a ter a
seguinte redação: “Art. 3º - As [sic] professoras dos cursos do Jardim da Infância e
das classes pré-primárias será atribuída uma gratificação, quando nas exposições
finais do ano letivo, figurem com trabalhos próprios e selecionados, executados nas
respectivas classes e nas seguintes proporções: Cr$ 1.000,00 (um mil cruzeiros) para
classe de 15 a 20 crianças com 30 trabalhos; Cr$ 1.250,00 (um mil, duzentos e
cinqüenta cruzeiros) para classe de 20 a 25 crianças com 40 trabalhos; Cr$ 1.500,00
(um mil e quinhentos cruzeiros) para classe de 25 a 30 crianças com 50 trabalhos; Cr$
1.750,00 (um mil, setecentos e cinqüenta cruzeiros) para classe de 30 crianças com 60
trabalhos; Cr$ 2.000,00 (dois mil cruzeiros) para classe de 30 crianças com 80
trabalhos.” Parágrafo único – A seleção deverá ser feita por uma comissão designada
pelo Diretor do Departamento de Educação e Cultura, composta por três membros.
Art. 2º - Revogam-se as disposições em contrário.
PREFEITURA MUNICIPAL DE SANTO ANDRÉ, em 10 de janeiro de 1959.
PEDRO DELL’ANTONIA PREFEITO MUNICIPAL
Publicado na mesma data e afixado no lugar de costume.
ADELAIDE RIZZO ANGRINI DIRETOR DA SECRETARIA GERAL (SANTO
ANDRÉ, 1959).
Além disso, Martins (1990) recorda que, durante a década de 1950, na cidade de Santo
André, a Igreja Católica era a mantenedora de entidades para cuidar de crianças pequenas,
conforme o seguinte relato:
A Diocese foi criada em 13 de agosto de 1954. O primeiro bispo foi Dom Jorge
Marcos de Oliveira (...). Tomou posse em 12 de setembro de 1954 e trabalhou até 29
de dezembro de 1975 (...) deu ênfase na Pastoral como uma forma de relacionamento
com a classe operária. Também enfatizou a assistência à criança e à jovem mãe, com
a criação do Lar Menino Jesus (MARTINS, 1990, p. 114).
No livro de memórias escrito por Lima (2010), o autor menciona que as crianças
pequenas eram acolhidas em creches: “Na minha infância, a mais famosa benzedeira de Santo
André era a Dona Palmira Catalani (...). Morava bem perto de casa, na rua Padre Capra, quase
vizinha da creche, a primeira escolinha que frequentei” (LIMA, 2010, p. 13). No entanto,
25
nenhum dos dois autores esclarece quem contratava e custeava os profissionais que trabalhavam
nas referidas creches, se eram funcionários da prefeitura municipal de Santo André (conforme
lei citada acima) ou da igreja católica, que crescia na região.
As informações contraditórias, mencionadas anteriormente, apontam uma lacuna na
história da educação de Santo André e na organização das escolas municipais andreenses,
ratificando a importância e ineditismo desta pesquisa.
A legislação brasileira promulgada entre as décadas de 1960 e 1970 também apresenta
contradições no que se refere ao atendimento às crianças em idade pré escolar. Na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961),
inclui o atendimento às crianças menores de sete anos, conforme descrição:
Capítulo I
Da Educação Pré-Primária
Art. 23. A educação pré-primária destina-se aos menores até sete anos, e será
ministrada em escolas maternais ou jardins-de-infância.
Art. 24. As emprêsas [sic] que tenham a seu serviço mães de menores de sete
anos serão estimuladas a organizar e manter, por iniciativa própria ou em
cooperação com os poderes públicos, instituições de educação pré-primária
(BRASIL, 1961).
Uma década depois, foi promulgada uma nova versão da LDB (Lei nº 5.692, de 11 de
agosto de 1971), com a seguinte determinação:
Capítulo II
Do Ensino de 1º Grau
§2º Os sistemas de ensino velarão para que as crianças de idade inferior a sete
anos recebam conveniente educação em escolas maternais, jardins de infância
e instituições equivalentes (BRASIL, 1971).
No texto das duas LDB falta esclarecimento quanto ao atendimento às crianças entre 4
e 6 anos, não especificando qual ente da federação é responsável por manter o sistema de ensino
pré-escolar, deixando de garantir educação adequada às crianças pequenas.
A prefeitura de Santo André, no fim da década de 1970, inicia um projeto que visava o
atendimento pré-escolar, desapropriando de dezenas de terrenos para a construção dos Centros
Educacionais, Assistenciais e Recreativos (CEAR) voltados a atender crianças de 4 a 6 anos12.
12
Decretos do ano de 1978: nº 9246 - Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, área destinada à
construção de CEAR, nº 9319 - Dispõe que o imóvel declarado de utilidade pública, destinado à construção de
centro de integração comunitária, passa a destinar-se a construção do CEAR de Vila Sá, nº 9345 - Declara de
utilidade pública, para fins de desapropriação, área destinada à construção de CEAR de Vila Guarará. Decretos do
ano de 1979: nº 9692 - Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, área destinada à construção de
CEAR, nº 9693 - Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, área destinada à construção de CEAR,
26
nº 9694 - Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, área destinada à construção de CEAR, nº 9695
- Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, área destinada à construção de CEAR, nº 9696 - declara
de utilidade pública, para fins de desapropriação, área destinada à construção de CEAR. Decretos do ano de 1980,
nº 10071 - Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, área destinada à construção de CEAR. Decreto
do ano de 1982, nº 10440 - Dispõe sobre a atribuição da dirigente de pré-escola, administrador e presidente do
CEAR.
13
Decreto nº 10.428, de 04 de janeiro de 1982.
14
Decreto nº 11.583, de 28 de abril de 1987.
15
Decreto nº 14.146, de 27 de abril de 1998.
27
André, investiga, por meio de análise documental e entrevistas, a luta pelo direito das mulheres
operárias e suas crianças à creche pública de Santo André, cuja trajetória ganha destaque com
a efervescência dos movimentos sociais e sindicais, nas décadas de 1970 e 1980, no Brasil.
Costa (2020), em sua dissertação de mestrado: Gestão escolar democrática e o conselho mirim:
participação infantil e a aprendizagem política, analisa as possibilidade e limite do conselho
mirim como instrumento de implementação da gestão democrática, identificando as concepções
dos gestores das escolas, verificando se as práticas do conselho mirim caracterizavam-se como
protagonismo autônomo, de colaboração ou dependência, durante o ano de 2020. Gonçalves
(2020), em sua dissertação de mestrado: Os saberes necessários à formação e atuação das
professoras assessoras de educação inclusiva no município de Santo André, analisa as
atribuições das professoras assessoras de educação inclusiva, elenca os aspectos fundamentais
para a formação permanente dessas professoras e analisa as formações oferecidas pela rede
municipal de Santo André no ano de 2018. Casanova (2021), em sua dissertação de mestrado:
Gestão democrática e infância: o orçamento participativo criança em Santo André, verifica os
aspectos teórico-práticos que contribuíram para a gestão democrática, no período de 2013 a
2016.
No segundo eixo, as pesquisas referem-se à investigação de recursos financeiros
municipais destinados às escolas públicas. Silva (2008), em sua dissertação de mestrado:
Avanços e retrocessos no direito à educação em Santo André: um estudo de caso, estuda a
construção do direito à educação no município de Santo André, nas décadas de 1950 a 1970, a
partir da análise dos orçamentos municipais do período; e Silva (2013), em sua dissertação de
mestrado: A descentralização de recursos financeiros e a organização do trabalho pedagógico:
o caso de Santo André, analisa as mudanças propiciadas pela descentralização de recursos
financeiros nas relações de poder e na organização do trabalho pedagógico dos ciclos iniciais
do Ensino Fundamental.
No terceiro eixo encontram-se os estudos sobre as propostas curriculares e práticas
pedagógicas em escolas e creches municipais de Santo André. Silva (2018), em sua dissertação
de mestrado: A qualidade das práticas educativas em uma creche do município de Santo André
(SP), analisa a prática de quatro educadoras de sala de berçário e suas parcerias com as famílias,
a educação continuada das professoras e a organização dos espaços e tempos da creche. Soares
(2009), em sua dissertação de mestrado: A introdução da definição de raça nas propostas
curriculares brasileiras: a lente da nova lei e os olhos dos alunos, analisa a recepção das
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino
de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, divulgadas após a Lei 10.639/2003, em uma
28
escola de ensino básico no ABC paulista, e seu impacto nas aulas de História, uma das três
disciplinas incumbidas de implementar o conteúdo proposto pelas Diretrizes. Fernandez (2017),
na dissertação de mestrado: Planejamento na prática docente da Rede Municipal de Santo
André, reflete sobre o papel do planejamento na prática docente, e a importância do professor
como articulador de conhecimentos, enfatizando seu potencial para a transformação da
sociedade, no contexto da educação democrática. Coelho (2017), em sua dissertação de
mestrado: Uso da Provinha Brasil no planejamento escolar: interfaces, limites e proposições,
apresenta reflexões baseadas na pesquisa que investigou os usos dos resultados da Provinha
Brasil no planejamento das atividades de sala de aula, com a intenção de propor ações
pedagógicas a fim de potencializar o uso dos dados pela coordenação pedagógica e professores,
durante o ano de 2016.
E no quarto eixo estão importantes trabalhos de autores que se dedicaram a escrever
sobre a História de Santo André: Taunay (1968), Gaiarsa (1968; 1991), Bevilacqua (1997),
Lima (2010a; 2010b), Martins (2008) e Médici (1990). O livro de Taunay (1968): João
Ramalho e Santo André da Borda do Campo, conta a História de Santo André da Borda do
Campo, desde a fundação, no ano de 1553, até 1953. Trata-se uma monografia contratada pela
Prefeitura de Santo André e publicada em comemoração ao quarto centenário da cidade. Os
livros de Gaiarsa (1968): A cidade que dormiu três séculos: Santo André da Borda do Campo,
seus primórdios e sua evolução histórica: 1553-1960, e Gaiarsa (1991): Santo André: Ontem,
Hoje e Amanhã, também foram providos pela Prefeitura de Santo André e contam a História de
Santo André da Borda do Campo. O primeiro é o texto vencedor de um concurso de
monografias promovido pela prefeitura de Santo André, na data de aniversário de quatrocentos
anos da cidade. O segundo é a revisão do texto original, em que o autor reescreve e acrescenta
informações da cidade, até o ano de publicação da obra. Na obra E o nome dela? Crônicas reais
de um tempo em que Santo André também fabricava lança-perfume, Bevilacqua (1997) utiliza
76 crônicas para narrar fatos acontecidos com o autor, trazendo como cenário a cidade de Santo
André. Nos livros de Lima (2010a; 2010b), Santo André também é o palco para as crônicas.
Como se fosse hoje...! e Um Passado Sempre Presente são a narração da vida cotidiana numa
cidade que crescia em dimensões territoriais e populacionais. Martins (2008), na obra: A
aparição do demônio na fábrica, origens sociais do Eu dividido no subúrbio operário, reúne
de ensaios escritos na década de 1990, tendo como cenário, uma fábrica da região do ABC,
apresentando a realidade do subúrbio e como viviam os operários. E por fim, mas não menos
importante, Médici (1990), em: Migração, Urbanismo e Cidadania: a história de Santo André
contada por seus personagens, registra a história da cidade por meio de depoimentos de seus
29
moradores mais antigos, e apresenta dezenas de fotos de pessoas e lugares da região. O texto
foi dividido em 42 capítulos, e cada um deles resgata a história de um bairro ou região da cidade.
Além desse, Médici escreveu outros livros16 e diversos artigos17; e escreve diariamente no jornal
local Diário do Grande ABC uma coluna sobre as memórias da cidade.
Ao concluir o levantamento bibliográfico, constata-se que não há pesquisas que
enfoquem a história das escolas municipais da cidade de Santo André. As pesquisas abordam
diversos aspectos da escola, entretanto não investigam a história da educação pública municipal,
o que justifica a relevância deste estudo inédito no campo da História da Educação,
contribuindo com a historiografia da cidade de Santo André.
A delimitação temporal desta pesquisa abrange o período de 1954 a 1982, quando a
cidade de Santo André se constituía próxima às dimensões territoriais atuais. Tal delimitação
justifica-se porque, em 1954, por meio da promulgação da lei nº 929, de 27 de setembro, foi
criado o Departamento de Educação e Cultura, vinculado à Secretaria de Assuntos Jurídicos,
Internos e Culturais da cidade de Santo André. É a década também em que se consolida a
crescente industrialização da região, bem como o crescimento da cidade e do emprego. Como
consequência disso, tem-se por hipótese que emergiu a necessidade da oferta de vagas em
instituições municipais para acolher as crianças, filhos dos trabalhadores da indústria. Ao longo
de trinta anos, o desenvolvimento da cidade, o aumento da população e a expansão das escolas
resultou na proposta de organização do ensino municipal. Assim, no ano de 1982 foi realizado
o primeiro concurso público para o cargo de professor, que constituiu o corpo docente para
compor os CEAR e compor a rede de ensino municipal pré-escolar na cidade de Santo
André, antes disso as professoras eram contratas por meio do regime da Consolidação das Leis
do Trabalho - CLT. Em tese, o concurso público diminuiu o clientelismo e ampliou a rede de
ensino andreense.
Neste contexto, a pesquisa procura responder às seguintes questões:
a) Como foi criada e organizada a educação municipal, entre os anos de 1954 a 1982,
desde as primeiras escolas municipais até a implantação do CEAR? Como se deu o
16
No acervo da Biblioteca Digital de Santo André constam 17 publicações sobre a cidade. Fonte:
http://www.santoandre.sp.gov.br/pesquisa/con_geral.asp?cbo=todos&tit_material=LIVRO&vOrdem=ALFABE
TICA&Txtbusca=ademir+medici+santo+andr%E9&search.x=20&search.y=9&ScriptName=default.asp&tipo=e.
Acesso em 11 de maio de 2020.
17
No acervo da Biblioteca Digital de Santo André constam 365 artigos atribuídos ao município. Fonte:
http://www.santoandre.sp.gov.br/pesquisa/con_geral-COLUNA-MEMORIA.asp?cbo=todos&Txtbusca=
ademir+medici+santo+andr%E9&ScriptName=con_geral-COLUNA-MEMORIA.asp&search.x=24 &search .y
=12&tipo= e. Acesso em 11 de maio de 2020.
30
PROCEDIMENTOS DE PESQUISA
Reconstituir a história das primeiras escolas administradas pelo poder público municipal
que atendiam as crianças pequenas, até a composição da rede andreense de ensino, é um desafio
diante do histórico de constituição da cidade e de preservação de fontes. Almeja-se contribuir
com um estudo que ultrapasse os limites laudatórios e ufanistas.
Considerando a complexidade e especificidade da escrita da História da Educação, para
essa pesquisa alguns procedimentos foram adotados. Iniciamos pela revisão bibliográfica, mas,
ao investigar nos bancos de teses e dissertações de universidades brasileiras, não foi localizado
nenhum estudo referente à história da educação municipal andreense. A revisão bibliográfica
foi realizada por meio de busca no Catálogo de Teses e Dissertações da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e nos banco de dados das seguintes
instituições: Universidade de São Paulo, Universidade de Campinas, Universidade Federal do
31
ABC, Centro Universitário Fundação Santo André, Universidade Metodista de São Paulo,
Universidade Municipal de São Caetano do Sul, Universidade Federal de São Paulo e
Universidade do Estado de São Paulo; e nos anais dos Congressos Brasileiro de História da
Educação e Congressos de História da Região do Grande ABC, objetivando localizar as
pesquisas relevantes para subsidiar e nortear este trabalho. A palavra-chave utilizada para a
busca eletrônica nos bancos de dados foi: “Santo André”, depois os trabalhos localizados foram
selecionados por meio dos seguintes filtros eletrônicos: Grande Área do Conhecimento –
Ciências Humanas, Área do Conhecimento – Educação.
Após a revisão bibliográfica, o segundo procedimento foi recolher e analisar as fontes.
Com cautela e paciência, como ensina Farge (2009, p. 66), sendo necessário examinar os
detalhes e explorar as entrelinhas, porque o pesquisador pode encontrar dados que inicialmente
não são úteis, mas, no decorrer da pesquisa, esses mesmos dados podem fornecer informações
importantes para a análise. Segundo Kuhlmann (1998, p. 6-7), “a história, embora tratando do
passado, do que já aconteceu, é dinâmica e exige a ampla pesquisa e crítica das fontes, que
renova interpretações e exige procedimentos próprios de investigação e análise”.
Por este motivo, neste estudo, um amplo corpus documental foi analisado e organizado
em três grupos: documentos administrativos, jornais e fotografias. Tais fontes estão distribuídas
em diversos locais pela cidade de Santo André. A maior parte dos documentos mencionados a
seguir, e que serviram de fontes para esta pesquisa, está disponível aos pesquisadores
interessados e eles podem ser consultados exclusivamente por meio de pesquisa física, nos
acervos que apresento a seguir.
Os documentos administrativos, tais como normativas, decretos e leis, encontram-se
arquivados no banco de dados do Portal Digital da Câmara dos Vereadores de Santo André.
Outros documentos administrativos, englobando atas de reunião, registros de matrícula,
prontuários de professoras, entre outros, estão guardados nas Escolas Municipais de Santo
André. Este primeiro grupo de fontes, composto por documentos oficiais e documentos
administrativos, são analisados sob a lente de Foucault (2008, p. 155), que explica as normas
como sendo parte dos mecanismos das políticas de governabilidade, nas quais são dados os
limites do Estado, controlando os costumes, os hábitos, os modos de fazer e pensar.
Exemplares de jornais com notícias da cidade de Santo André estão conservados no
Centro de Arquivo e Pesquisa do jornal Diário do Grande ABC. Quanto aos jornais, segundo
grupo de fontes, Luca (2005, p. 140) indica aspectos metodológicos a serem utilizados para
análise, considerando os conteúdos e os idealizadores do jornal, observando o título da matéria,
32
O arquivo é uma brecha no tecido dos dias, a visão retraída de um fato inesperado.
Nele, tudo se focaliza e, alguns instantes de vida de personagens comuns, raramente
visitados pela história, a não ser que um dia decidam se unir em massa e construir
aquilo que mais tarde se chamará de história. O arquivo não escreve páginas de
história (FARGE, 2009, p. 15).
18
Pesquisa registrada na Plataforma Brasil e aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal
de São Paulo, sob o número do parecer 4.866.044, conforme Anexo 1.
33
PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE
ORGANIZAÇÃO DO TEXTO
oferecida, verificar os materiais didáticos utilizados pelas professoras e, por fim, analisar as
festas escolares organizadas pela escola e associação de pais. Este capítulo foi guiado pelas
questões que buscavam responder quem eram os profissionais que atuavam nas instituições,
como eram admitidos e o respectivo vínculo empregatício; quem eram as crianças atendidas e
quais os critérios para a seleção dos que frequentariam a instituição e, quais eram as propostas
de ensino e organização curricular nestas escolas.
Por fim, na Conclusão são apresentadas outras possibilidades de pesquisa sobre o
CEAR, analisando as fontes deste estudo e outras não localizadas. Bem como, outras
possibilidades de estudo das escolas instaladas no território andreense e região, indicando
arquivos, acervos e instituições com fontes não analisadas.
37
Motivados pela divulgação de moradias e pelo emprego, a região atraiu grande número
de operários e suas famílias. As indústrias atraíram primeiramente os imigrantes, depois pessoas
de todo o Brasil, que, segundo Médici (1990), buscavam “crescer na vida”19. A acessibilidade
proporcionada pela malha ferroviária, a permanência e instalação de novas indústrias nas
imediações, os incentivos fiscais do período promovidos pela prefeitura, a disponibilidade de
terrenos pouco acidentados e a disponibilidade de água proporcionaram o crescimento da
atividade econômica e o adensamento da população de toda Região do Grande ABC e de Santo
André.
Na segunda metade do século XX, a Região do Grande ABC tornou-se o principal polo
industrial brasileiro, pela implantação da indústria moderna do setor automobilístico, que teve
papel fundamental no crescimento econômico do país (MARTINS, 2008, p. 83). A região foi
privilegiada pela instalação de um parque industrial vigoroso e de relevância nacional.
Agregada à industrialização do setor automobilístico, e motivada por ela, se instalaram em São
Paulo, Santo André e cidades nas adjacências, pequenas indústrias, comércios e serviços. Com
19
Expressão utilizava nos depoimentos dos migrantes de todas as regiões do Brasil, que se mudaram para a região,
acreditando e apostando no futuro da cidade (Médici, 1990).
39
Lins 56.888
Franca 55.023
Taubaté 53.759
Bragança Paulista 52.177
Barretos 51.486
Fonte: Publicação do Conselho Nacional de Estatísticas (IBGE), Rio de Janeiro, 1953.
Santo André, que antes da década de 1950 era uma cidade basicamente formada por
sítios e chácaras, passou a receber loteamentos residenciais para abrigar o grande contingente
de trabalhadores e suas famílias. O adensamento da população consta do Anuário Estatístico
Brasileiro (1953), que situa Santo André na 14ª posição dentre as cidades brasileiras com
população superior a noventa mil habitantes, conforme a Tabela 3.
41
Tabela 3 – Relação das cidades brasileiras com população superior a 90.000 habitantes
População presente em
Posição Cidade Unidade da Federação
1º/07/1950
O sucesso das Exposições Industriais foi notável e em 1960 a prefeitura de Santo André
decreta lei instituindo o evento em conjunto com as comemorações do aniversário de fundação
da cidade, conforme se lê abaixo:
Pernambuco 62 745
Alagoas 56 788
Paraná 32 709
Ceará 29 054
Sergipe 25 033
Paraíba 10 712
Fonte: Reproduzida pela autora, com dados extraídos do Anuário Estatístico Brasileiro (1953), p.83.
No início do século XX, o governante local, Sr. Alfredo Luís Flaquer, empenhava-se
em adequar as escolas da região aos modelos escolares da capital paulista. Na época Santo
André era denominado bairro Estação, do município de São Bernardo. De acordo com o estudo
de Granjo (2003), no ano de 1902, na ata da 4ª sessão da Câmara Municipal, o então prefeito
44
Sr. Alfredo Luís Flaquer declara a necessidade da criação de um Grupo Escolar na região, haja
vista que quatro das escolas isoladas existentes na localidade contavam com considerável
quantidade de alunos. No mesmo documento, segundo a autora, consta que o prefeito oferece
ao Governo Estadual um prédio municipal para funcionamento da escola. No entanto, diferente
da solicitação do Sr. Flaquer, prefeito de Santo André, o primeiro grupo escolar da região foi
edificado em Santo André e não em São Bernardo, que na época era sede do município. No
Portal Digital da Câmara Municipal de Santo André encontra-se a Lei nº 119, de 8 de maio de
1912 que autoriza a construção do referido Grupo Escolar:
projetada num formato semelhante à letra U e, na parte interna, no meio dos pavimentos, existe
até os dias atuais um jardim, que naquela época servia de pátio para o recreio das crianças.
Ao visitar o local, um prédio que se mantém bem conservado nos dias atuais, e com as
principais características da época, observamos que, da sala do diretor, instalada num lugar
panóptico, ou seja, de onde é possível visualizar todo o interior da escola e controlar a sua
movimentação, é possível ver os dois pavimentos e o pátio central, sendo possível controlar o
cotidiano de todos os envolvidos na comunidade escolar: professores, alunos e funcionários. A
esse respeito nos reportamos a Escolano (1998, p. 24), que descreve a arquitetura dos prédios
escolares como construções inovadoras e fator importante de modernização do ensino; no
entanto mantinha diversas formas de conservadorismo quanto à organização dos espaços
escolares.
Antes da instalação do grupo escolar, os alunos frequentavam dezenas de escolas
isoladas espalhadas pela região. Gaiarsa (1991) menciona em seu livro que, nesta época, a
maioria dos alunos das escolas isoladas era descendente dos italianos 21 que povoaram a região,
20
O Grupo Escolar recebia o nome de São Bernardo porque tratava-se da denominação de toda região que
atualmente conhecemos como Grande ABC. Após o desmembramento entre os sete municípios, tal grupo ficou
no território de Santo André.
21
A respeito das escolas italianas instaladas em São Paulo, consultar os estudos de Panizzolo (2015, 2016, 2017,
2018, 2019, 2020, 2021).
46
Figura 3 - Trecho da carta-denúncia redigida pelo sindicato dos operários, sem data
22
Gaiarsa (1991) nomeia alguns professores das escolas isoladas: Maria Polaca, Almeida Garret, Francisco Barone
e Santo Fattori (p. 178).
47
que comprovam algo que existiu. “A fotografia não fala (forçosamente) daquilo que não é mais,
mas apenas e com certeza daquilo que foi”. Não se trata de uma lembrança nostálgica, “a
essência da fotografia consiste em ratificar o que ela representa” (BARTHES, 1984, p. 128).
Ela comprova que, nas primeiras fábricas instaladas na cidade de Santo André, as crianças eram
incluídas como operárias.
condições de trabalho dos operários, apresentada na carta redigida pelo sindicato dos operários
(Figura 3). Nesse sentido, novamente nos reportamos a Kossoy (2001), que explica que o
contexto da produção e o autor da imagem precisam ser considerados na produção fotográfica,
ou seja, o fotógrafo é o filtro cultural da imagem registrada e o mediador da situação que
interfere no resultado da mensagem a ser transmitida.
Na Figura 6 vemos a imagem de outro grupo de alunos de Santo André, um registro de
1909, de uma escola isolada instalada na Rua Coronel Oliveira Lima, no centro da cidade, à
época uma rua pacata de terra batida do Bairro Estação, próximo à estação ferroviária.
Os quarenta e cinco alunos estão todos uniformizados, usando boinas, e os trajes são de
cores claras. Assim como na Figura 5, as crianças estão em postura ereta, organizados por
ordem de tamanho, e os meninos menores, sentados à frente, se posicionam com as mãos nos
joelhos. No quadrante inferior direito, logo à frente do professor, encontra-se um único menino
segurando um instrumento musical, possivelmente uma caixa de repique utilizada em fanfarras
50
Na época, São Bernardo era o primeiro entre os nove municípios do Estado de São Paulo
com maior frequência de estudantes, com 37,59 alunos por unidade escolar, conforme indica a
Tabela 5.
Guarulhos 36,21
Aparecida 35,16
Caçapava 34,5
Piracicaba 33,19
Piquete 33,06
Fonte: Reproduzida pela autora, com dados extraídos do
Anuário do Ensino do Estado de São Paulo (1936, p. 112).
A estrutura dos prédios também era diferente: a escola para as mulheres foi instalada
numa mansão e a escolas nos homens num pavilhão, uma divisão por gênero, mas que também
53
permite pressupor que seja pela classe social: escola para as filhas da elite e para os filhos dos
trabalhadores. As mulheres, em sua maioria, aprendiam na escola tarefas domésticas, já os
homens recebiam formação para ingressar no mercado de trabalho. A separação das salas de
aulas e dos prédios “reflete as tradições de uma sociologia e de uma pedagogia sexista”
(ESCOLANO, 1998, p. 39).
Depois, entre os anos de 1948-1951 essa escola foi transferida para um novo edifício,
construído em terreno amplo, na Rua Justino Paixão, também na região central, conforme
Figura 9, onde se mantém até os dias atuais. O novo prédio possui características semelhantes
aos grupos escolares construídos no período republicano, em lugares de destaque na cidade
(SOUZA, 1998, p. 130). O acesso se dava pelo centro do edifício, e a construção simétrica
possuía duas alas: masculina e feminina, indicando que o ensino se mantinha dividido por
gênero.
Em 8 de agosto de 1953, pela Lei nº 814, foi criada outra instituição construída e mantida
pela Prefeitura de Santo André: a Faculdade de Ciências Econômicas. Segundo Gaiarsa (1990),
inicialmente a faculdade foi instalada nas dependências da Exposição Industrial que celebrou o
54
4º Centenário da cidade, na região central. Anos mais tarde, com a criação da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras e do Centro de Processamento de Dados, todo o conjunto acadêmico
foi transferido para o Sítio Tangará, num terreno desapropriado pela Prefeitura de Santo André
(GAIARSA, 1990, p. 184). O centro universitário passou então para a denominação Fundação
Santo André. A Figura 10 mostra a fachada do prédio que possui arquitetura moderna, linha
retas, amplo vão livre na parte inferior e salas de aula no primeiro andar. O terreno é arborizado
e, na parte central, notamos um gramado.
De acordo com Silva (2008), a educação em Santo André foi ocupando espaço na
organização dos serviços municipais, tanto na aplicação de recursos quanto em estrutura,
concomitantemente ao contexto de crescimento econômico, populacional e urbanístico.
O município de Santo André, até 1950, possuía poucas funções públicas; basicamente
se restringia a receber impostos e cuidar dos cemitérios, de acordo com Silva (2008). A partir
da segunda metade do século XX, a cidade de Santo André inicia a organização da estrutura
municipal. A autora explica que foram criadas diferentes diretorias: Diretoria Geral
Administrativa, Diretoria de Obras e Serviços Públicos, Diretoria da Fazenda, Diretoria de
Água e Esgoto, Diretoria de Assistência Médico-Hospitalar e Procuradoria.
55
Além disso, em 29 de outubro de 1945, consta o decreto nº 100, que prevê a criação de
vagas para 30 professores e a seguinte orientação aos docentes:
56
Quadro 1 – Legislação para criação de escolas e vagas para professores em Santo André
Lei nº Data Destaque da descrição da Lei
Art. 1º - Ficam criadas no quadro de ensino primário 5 (cinco) escolas
mistas municipais.
389 18 de dezembro de 1947
Art. 2º - Ficam criadas na tabela II, [...], 5 (cinco) cargos de professor,
padrão “A”.
Art. 1º - Ficam criadas, no quadro de ensino primário municipal, mais 6
(seis) escolas mistas.
406 18 de fevereiro de 1948
Art. 2º - Ficam criadas na Tabela II, [...], mais 6 (seis) cargos de Professor,
padrão “C”.
Art. 1º - Ficam criadas, no quadro do ensino primário municipal, mais três
escolas mistas, que serão localizadas respectivamente, duas no Grupo
Escolar José Azevedo Antunes, 1º subdistrito de Santo André e uma, no
424 28 de abril de 1948
Grupo Escolar de Camilópolis, 3º subdistrito de Santo André.
Art. 2º - Ficam criados na Tabela II, anexa ao Decreto Lei nº 124, de 27 de
outubro de 1945, mais três cargos de Professor – Padrão “C”.
Art. 1º - Ficam criadas, no quadro do ensino primário municipal, mais 2
(duas) escolas mistas, que serão localizadas na Vila Gerthi – 2º subdistrito
460 25 de outubro de 1948 de Santo André.
Art. 2º - Ficam criados, na Tabela II, [...], mais dois cargos de Professor –
Padrão “C”.
Artigo 1º - Fica criada, no quadro do ensino primário municipal, mais uma
(1) escola mista, que será localizada no bairro Vila Alzira - 1º subdistrito
400 15 de fevereiro de 1949 de Santo André.
Artigo 2º - Fica criado na Tabela II, anexa ao decreto-lei nº 124, de 27 de
outubro de 1945, mais um (1) cargo de Professor, Padrão “F”.
Fonte: Elaborado pela autora, com dados do Portal Digital da Câmara de Vereadores de Santo André.
Vale lembrar que as escolas dessa época eram as escolas isoladas, ou seja, geralmente
uma sala de aula com crianças de várias idades e regida geralmente, por uma única professora.
A partir do ano 1910 as escolas isoladas começaram a ser reunidas em grupos escolares, mas
em Santo André a frequência escolar era baixa e o ensino em escolas isoladas se manteve até
os anos 1960.
57
Na Tabela 6, elaborada por Silva (2008) e baseada nos dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (1953), consta que, desde 1945, na cidade de Santo André, havia
unidades escolares no ensino pré-primário, fundamental, secundário e industrial, entre outros.
Nela também identificamos que, no decorrer dos anos, o ensino primário fundamental comum
se manteve em destaque, com maior número de unidades escolares e matrícula de alunos.
Quanto ao ensino pré-primário infantil, no decorrer dos anos, a quantidade de salas diminuiu;
entretanto, aumentou o número de crianças atendidas.
23
Decreto Municipal nº 43 de 13 de setembro de 1943.
24
Decreto-Lei nº 13.732, de 14 de dezembro de 1943.
59
Nesta lei é possível identificar os cursos oferecidos pela Escola Júlio de Mesquita, por
meio da especialidade dos cargos de professor, mestre etc., e compreender que a escola tinha
60
como objetivo a formação do trabalhador operário das indústrias da época, tanto masculino
quanto feminino. Aos homens, possivelmente, eram oferecidos cursos de mecânica, marcenaria,
tecelagem, desenho profissional e prática; e às mulheres cursos de corte e confecções, bordados
e roupas brancas, flores e artes, economia doméstica e química.
No Anuário Estatístico Brasileiro (1953) consta que, das 12.996 escolas do estado de
São Paulo, 774 eram da categoria industrial, abaixo somente das escolas primárias, conforme a
Tabela 7.
nº 3913, de 15/agosto
nº 3917, de214/agosto
nº 2824, de 4/dezembro
nº 2834, de 4/dezembro
nº 2859, de 27/dezembro
nº 4151, 1/fevereiro
nº 4152, 1/fevereiro
nº 4153, 1/fevereiro
nº 4154, 1/fevereiro
nº 4155, 1/fevereiro
nº 4156, 1/fevereiro
nº 4157, 1/fevereiro
1968 nº 4158, 1/fevereiro
nº 4159, 1/fevereiro
nº 4160, 1/fevereiro
nº 4161, 1/fevereiro
nº 4195, de 21/março
nº 2918, de 31/março
nº 4208, de 3/abril
nº 4356, de 25/julho
nº 5117, de 23/outubro
1970
nº 5116, de 23/outubro
Fonte: Elaborada pela autora, com dados extraídos do
Portal Digital da Câmara de Vereadores de Santo André.
No banco de dados do Portal Digital da Câmara dos Vereadores de Santo André constam
diversos decretos e leis informando que, dentro desses grupos escolares, havia salas de escolas
primárias municipais25.. Ou seja, algumas das escolas isoladas existentes no município foram
transferidas da casa do professor ou de casas alugadas para dentro dos grupos escolares.
Portanto, num mesmo prédio escolar havia professores funcionários do Governo do Estado de
São Paulo e servidores municipais de Santo André. A lei e os três decretos abaixo são exemplos
das transferências ocorridas entre os anos de 1948 e 1951.
25
Lei nº 406 de 28 de fevereiro de 1948; Lei nº 424 de 28 de abril de 1948; Lei nº 314 de 7 de março de 1949;
Decreto nº 315 de 9 de março de 1949; Decreto nº 334 de 05 de agosto de 1949; Decreto nº 481 de 17 de maio de
1951.
64
vinte e três escolas, duas delas referiam-se a escolas pré-primárias, instaladas num bairro de
casas populares e com crescente quantidade de famílias de operários das indústrias.
26
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, nº 5692/1971, está disponível no Portal Digital da Câmara
dos Deputados, no seguinte endereço: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1970-1979/lei-5692-11-agosto-
1971-357752-publicacaooriginal-1-pl.html
66
Na cidade de Santo André, antes da década de 1970, não havia instituições públicas
municipais específicas para acolher as crianças pequenas. Como lemos no capítulo anterior, as
crianças eram acolhidas em salas de aula dentro dos Grupos Escolares administrados pelo
Governo Estadual. Além dessas, nessa época as instituições que acolhiam as crianças entre 4 e
6 anos de idade eram escolas privadas ou instituições vinculadas à Igreja Católica e que
recebiam subvenção financeira da Prefeitura de Santo André.
Acervo – Arquivo do jornal Diário do Grande ABC – News Seller – publicado em 9 de fevereiro de 1969, 2º
caderno, p. 13.
Buscamos a obra de Campos et al. (2014), que nos ajuda a pensar por que os testes de
QI tornaram-se comuns no Brasil a partir década de 1930. As autoras, que estudaram a aplicação
de tais testes nas escolas de Belo Horizonte, lembram que:
O anúncio da escola Pequeno Príncipe, quando se refere ao teste de QI, utiliza o seguinte
argumento: “evitando problemas de ordem educacional futuros”; porém não indica a relação
entre o resultado do teste e os problemas de aprendizagem. Ao mesmo tempo, na propaganda
publicada no jornal, a escola declara que se responsabiliza pelo aproveitamento educacional do
aluno. Na mesma publicidade fica evidente que a escola pré-primária era uma espécie de curso
preparatório para os alunos ingressarem na escola primária, conforme indica a frase “há
necessidade de que o pré seja feito com antecedência mínima de 6 meses” para o ingresso ao
curso primário.
Acervo – Arquivo do jornal Diário do Grande ABC – News Seller – publicado em 8 de abril de 1969, 1º caderno,
p. 11.
Preparar as crianças para ingressar na escola primária foi uma proposta que se
evidenciou a partir das décadas de 1960 e 1970, porque, com a desaceleração da economia
brasileira, o aumento da inflação e o crescimento da dívida externa, consequentemente foi
ampliada a miséria entre a população mais pobre, refletindo no rendimento escolar das crianças.
Segundo Kishimoto (1990), no período entre 1969 e 1972, a repetência e a expulsão alcançaram
índices alarmantes, chegando a representar 67% dos alunos (KISHIMOTO, 1990, p. 64). A pré-
escola, então, emerge como solução para os problemas do sistema educativo e alternativa para
diminuir as desigualdades sociais.
70
Acervo – Arquivo do jornal Diário do Grande ABC – News Seller – publicado em 8 de abril de 1969, 1º caderno,
p. 11.
Identificamos nos anúncios das escolas Pequeno Príncipe e Saint Exupéry que as
instituições divulgavam receber crianças tanto para o atendimento pré-primário quanto para o
atendimento primário, como lemos no primeiro parágrafo da Figura 12 e na segunda linha do
título da Figura 13. Desse modo, concluímos que também não eram instituições de atendimento
específico às crianças pequenas, elas atendiam vários níveis de ensino, assim como as escolas
primárias mencionadas no Capítulo I.
Na década de 1960, a cidade de Santo André concedia subvenção financeira a 12
instituições assistenciais que acolhiam crianças pequenas: assim dispõe a Lei nº 2308, de 14 de
dezembro de 1964, disposta no banco de dados do Portal Digital da Câmara dos Vereadores de
Santo André. Abaixo seguem trechos da lei:
27
No mesmo endereço funciona atualmente uma Escola de Educação Infantil chamada Probei.
71
Nessa lei de 1964 observamos que o valor do orçamento municipal de Santo André
destinado às despesas para o pagamento de subvenções às instituições que acolhiam crianças
andreenses, era cerca de Cr$ 12.810.000,00 (doze milhões, oitocentos e dez mil cruzeiros).
A receita geral prevista para o ano de 1964 em Santo André, foi de Cr$ 5.295.170.000,00
(cinco bilhões, duzentos e noventa e cinco milhões e cento e setenta mil cruzeiros), de acordo
com a Lei nº 2.118, de 9 de dezembro de 1963. Portanto o custo com as subvenções
correspondia a aproximadamente 0,24% do orçamento, porcentagem pequena quando
comparada ao montante geral da arrecadação municipal.
72
2.2 Jardins de Infância e classes Pré-Primária: salas instaladas dentro dos Grupos
Escolares
I Cr$ 4.600,00
J Cr$ 5.000,00
K Cr$ 5.400,00
L Cr$ 5.800,00
(...)
Art. 44 - As professoras primárias, além de seus vencimentos, terão direito a
uma gratificação de Cr$ 1.000,00 (hum mil cruzeiros) a Cr$ 2.000,00 (dois mil
cruzeiros) anuais, se as respectivas classes alcançarem média de aprovação
superior a 50% (cinqüenta [sic] por cento), de conformidade com a
regulamentação que deverá ser expedida sobre o assunto.
(...)
ENSINO MUNICIPAL - CARGOS ISOLADOS DE PROVIMENTO
EFETIVO
TABELA V
Padrão [de
Nº de cargos Denominação do Cargo
vencimentos]
1 Secretário L
1 Orientador Educacional L
21 Professor G
24 Mestre G
2 Contra-Mestre [sic] F
34 Professor Primário F
1 Almoxarife da Escola E
Industrial “Júlio de
Mesquita”
1 Porteiro da Escola Industrial E
“Júlio de Mesquita”
1 Inspetor de Alunos C
2 Escriturário E
88
(SANTO ANDRÉ, 1954).
Cr$ 2.000,00 (dois mil cruzeiros) quando a média for superior à [sic] 90%.
§ Único – A gratificação de que trata este artigo será proporcional ao tempo de
efetivo exercício da professora nas classes que obtiverem a média de aprovação
aí estabelecida.
Art. 2º- Para os efeitos do disposto na disposição legal citada no artigo anterior,
consideram-se aprovados os alunos dos Jardins de Infância e das classes pré-
primárias que nas exposições finais do ano letivo figurem com trabalhos
próprios, executadas [sic] nas respectivas classes, com as menções “ÓTIMO”,
“BOM” ou “REGULAR”, apostos pelo Diretor de Departamento de Educação
e Cultura.
Art. 3º- Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as
disposições em contrário (SANTO ANDRÉ, 1954, grifo meu).
No decreto nº 901, de 13 de dezembro de 1954, lemos, em seu artigo 1º, que o critério
estabelecido para a atribuição de gratificação às professoras primárias e tal gratificação era
vinculada à média de aprovação dos alunos da classe. No artigo 2º do mesmo decreto aparece
o critério para gratificação às professoras das classes dos Jardins de Infância e das classes Pré-
Primárias, comprovando a existência de sala de aula para atendimento de crianças pequenas,
provida pelo município de Santo André.
Depois de quase três anos, um novo decreto foi publicado, modificando aquele de 1954.
A alteração mudou o artigo que se refere à gratificação das professoras das salas não-primárias.
O decreto nº 1253, de 26 de novembro de 1957, em seu artigo 3º, explica que as gratificações
das professoras dos cursos de jardim de infância e das classes pré-primárias passaram a ser
vinculadas às exposições de trabalhos realizadas no fim de cada ano letivo, conforme segue o
texto abaixo:
Analisando os dois decretos, notamos que a base de cálculo para o pagamento das
gratificações às professoras das escolas e pré-escolas municipais eram diferentes, devido ao
tipo de avaliação exigida dos alunos ao final de cada ano letivo, em cada modalidade de ensino.
A Tabela 9 sistematiza as informações e modificações dos decretos publicados nos anos de
1954 e 1957.
havia critério de proporções, apenas a menção de notas como ótimo, bom e regular, aplicadas
pelo Diretor de Departamento de Educação e Cultura de Santo André. Depois, em 1957, um
novo decreto foi publicado, revogando o decreto de 1954 e modificando o critério para o cálculo
da gratificação às professoras dos cursos de Jardim de Infância e das classes Pré-Primárias.
Nesse período, a cidade de Santo André se modernizava e a população crescia, em
consequência da industrialização, apresentada no Capítulo I deste estudo. Em três anos o corpo
docente das escolas municipais cresceu de 34 para 50 professores primários efetivos, é o que
indica a Lei nº 1197, de 2 de janeiro de 1957, disponível no banco de dados do Portal Digital
da Câmara Municipal de Santo André.
28
D. Teresa Cristófaro, era professora do Grupo Escolar Américo Brasiliense, onde ministrava aula às aulas do
curso normal (magistério).
77
que também era um complexo com piscina, ginásio poliesportivo e um prédio construído
especificamente para abrigar as salas de aulas das crianças29.
O projeto escolar para atender as crianças da cidade de Santo André nos remete ao
modelo dos Parques Infantis, implantados no início do século XX, na cidade de São Paulo. Os
29
O prédio foi tombado em 16/07/2019, sob processo 6505/2015, promovido pelo Conselho Municipal de
Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arquitetônico-Urbanístico e Paisagístico de Santo André –
COMDEPHAAPASA, devido ao valor arquitetônico da construção e importância histórica para a cidade.
78
Parques Infantis paulistas tiveram início na década de 1930, e em outras cidades do interior
foram implantados entre as décadas de 1940 e 1960, como: Araraquara, Santos, Marília, Pinhal,
Campinas, Jundiaí, Ibitinga, Pirajuí, Piracicaba, Itu, Mogi das Cruzes, Tremembé, São Vicente,
Franco da Rocha e Ribeirão Preto (FONSECA; FERREIRA; PRANDI, 2015).
Os Parques Infantis paulistanos, segundo Kuhlmann (2017), que funcionaram entre os
anos de 1935 e 1975, eram vinculados à Divisão de Educação, Assistência e Recreio, da
Secretaria de Educação e Cultura da cidade. Além das crianças, atendiam aos jovens e
adolescentes, oferecendo cursos de recreação e de Educação Física. Em Santo André, os Cursos
de Recreação Infantil também pertenciam à Secretaria de Educação e Cultura e estavam
vinculados à Divisão de Esportes e Administração (órgão equivalente à Divisão de Educação,
Assistência e Recreio da cidade de São Paulo), e promovia cursos esportivos para crianças e
jovens entre 6 e 16 anos, tal como acontecia nos Parques Infantis paulistanos.
A esse respeito, o estudo de Kuhlmann (2017) nos auxilia a pensar nas semelhanças
entre os projetos andreense e paulista, porque quando o autor analisa os Parques Infantis da
cidade de São Paulo, ele nota a influência dos profissionais de Educação Física nos modelos de
instituição de acolhimento às crianças, assim como ocorreu em Santo André. No seu estudo, o
autor alerta:
É evidente que a rede paulistana tornou-se uma referência para esses processos
de difusão da instituição. Mas, ao mesmo tempo, essa rede se realimentava
com a contribuição, seja do Departamento de Educação Física, seja de outras
experiências, nacionais e internacionais. (KUHLMANN, 2017, p. 171).
Fonseca (2015), em seu estudo sobre o Departamento de Educação Física de São Paulo
(DEF-SP) e os Parques Infantis da cidade de Ribeirão Preto, explica que a prefeitura da cidade
de São Paulo, durante a década de 1930, criou o Departamento de Educação Física (DEF-SP) e
o Serviço Municipal de Jogos e de Recreios. Mas esse serviço, no decorrer dos anos, mudou a
denominação para Serviço Municipal de Parques Infantis, órgão responsável pela organização
e orientação para instalação dos parques paulistanos.
Na cidade de São Paulo, ter a formação no curso de educação física infantil era a
exigência para admitir educadores destes parques paulistanos, e isso indica a forte presença de
79
expressão corporal nas atividades planejadas para as crianças destas instituições. Faria (1999a)
explica que “ao lado do folclore, jogos e brincadeiras eram as atividades principais do Parque
Infantil, fazendo com que as crianças participassem do projeto de construção da cultura
nacional” (FARIA, 1999a, p. 48).
A relação entre a área de Educação Física e o Curso de Recreação Infantil oferecido às
crianças de Santo André nos remete ao texto escrito por Kuhlmann (2017) e ao trecho
reproduzido a seguir:
Nilza tinha maior destaque na imprensa porque era cestinha do time da seleção
brasileira, conforme a Figura 16, extraída da reportagem do site Mulheres à cesta, especializado
na divulgação do basquetebol feminino brasileiro.
30
O site Mulheres à cesta está disponível em: https://mulheresacesta.com.br/2021/04/conheca-a-cestinha-da-
selecao-brasileira-no-mundial-de-1971/, consultado em 19/03/2022.
81
A professora Deise Maria Pio Martins, durante a entrevista, mencionou que, no início
do Curso de Recreação Infantil, as atletas se ausentavam e permaneciam vários dias viajando
com a seleção brasileira, dentro e fora do território nacional. Nesses períodos, as outras
professoras tinham que assumir as turmas, e por conta disso se fez necessário contratar outras
professoras. A partir de então as estudantes dos cursos de magistério passaram a integrar o
corpo docente do Curso de Recreação Infantil de Santo André.
Éricka Springmann e Cristina Frederico, são ex-alunas do Curso de Recreação Infantil
instalado na Vila Pires, nos anos de 1969 e 1973, respectivamente. Éricka foi aluna da
professora Nilza e Cristina da professora Maria Luiza Romani. As duas recordaram que as
professoras faltavam bastante porque eram atletas, e quando isso acontecia uma professora
substituta ficava com os alunos. Éricka disse que a professora dela representava a seleção
brasileira de basquete, junto com a professora Nadir. As duas chegavam a ficar mais de 15 dias
fora, e nesses dias as crianças ficavam aos cuidados de uma substituta. Cristina disse que se
lembra das faltas das professoras que também eram jogadoras de basquete; entretanto, a
professora dela não jogava basquete, mas era atleta de natação e também faltava quando tinha
competição.
Nos relatos, tanto da professora Deise quanto das ex-alunas Éricka e Cristina, notamos
que o fato das professoras-atletas se ausentarem da escola para participação em eventos
esportivos não causava desarranjo algum na rotina escolar. Nota-se que a unidade escolar se
organizava de modo que as crianças não fossem impedidas de ir à escola, porque havia
professoras substituindo as ausências das atletas.
Na unidade do Ginásio Pedro Dell’Antonia, denominada Curso de Recreação Infantil
Nair Veiga Lacerda31, conforme descrição da professora Denise Cattaruzzi, havia quatro
turmas. No período da manhã lecionavam a própria Denise e a professora Nadir Bazani, e nas
classes do período da tarde as professoras Nilza Monte Garcia e Maria Luiza Romani.
No arquivo pessoal das professoras Denise Cattaruzzi e Deise Pio foi localizada a
fotografia do corpo docente na primeira formatura dos alunos dos dois Centros de Recreação
Infantil, reunindo as professoras das duas unidades escolares: Vila Pires e Vila Alpina. As
professoras Denise e Deise não souberam dizer com precisão se a formatura aconteceu no final
31
Nair Veiga Lacerda nasceu na cidade de Santos em 18 de julho de 1903 e faleceu em Santo André em 29 de
agosto de 1996. Trabalhou como jornalista em jornais santistas e paulistanos, como tradutora em editora e para o
teatro, e como escritora de contos para adultos. Entre os anos de 1964 e 1969, exerceu o cargo de Secretária de
Educação, Cultura e Esportes da Prefeitura Municipal de Santo André, cabendo-lhe a estruturação da Secretaria,
como sua primeira titular. Na sua gestão instalou as Bibliotecas Municipais da cidade de Santo André. Em março
de 1987, a administração municipal homenageou-a conferindo-lhe o título de patrona da Biblioteca Municipal
Central que recebeu o nome de Biblioteca Nair Lacerda.
82
do ano de 1969 ou início do ano 1970. Na Figura 17, da esquerda para a direita, foram
identificadas as seguintes professoras: Denise Cattaruzzi, Nilza Monte Garcia, Nadir Bazani,
Maria Tereza Mello, Leila Maria Buffalo, Ivone, (?), Helena Zanotti e Maria Luiza Romani.
A proposta precursora de Santo André iniciou com quatro turmas de crianças entre cinco
e seis anos de idade; eram duas salas no período da manhã (das 8h às 12h) e duas no período
da tarde (das 13h às 17h), segundo a professora Denise Teixeira Cattaruzzi e a ex-aluna Cristina
Frederico.
Aluna da turma de 1973, Cristina Frederico contou que as salas de aula do Curso de
Recreação Infantil Nair Veiga Lacerda, na Vila Pires, foram adaptadas nos espaços localizados
embaixo das arquibancadas do Ginásio Municipal Pedro Dell’Antonia. Relatou que as salas não
eram muito grandes, mas isso não se tornava um problema, porque a maioria das atividades
eram realizadas nos ambientes externos. As crianças utilizavam todos os espaços do complexo
esportivo, tinham aulas de natação na piscina olímpica, atletismo no campo de futebol e
ginástica artística na quadra do ginásio. Cristina explica que no terreno vizinho ao complexo
esportivo havia um clube particular, que autorizava as crianças a utilizar o espaço do parque
com brinquedos infantis e a piscina infantil do balneário deste clube.
83
1978 Lei 5476 24/08/1978 Destina verba para construção do CEAR Vila Sá
Destina verba para construção dos CEAR Cata Preta, Jd.
1978 Lei 5471 24/10/1978 Alvorada, V. Alpina, Sta. Terezinha, V. Palmares, Pç.
Internacional, Pç. República, Pq. Erasmo e Jd. Maravilhas
Destina verba para desapropriação de terreno para fins de
1979 Decreto 9692 16/01/1979
construção do CEAR Vila Assunção
Elaborado pela autora baseada nas informações coletadas no banco de dados do
Portal Digital da Câmara dos Vereadores de Santo André
A política brasileira para a educação das crianças pequenas, ainda de acordo com
Kishimoto (1990), reverberou nos documentos oficiais emitidos durante o período que
compreende as décadas de 1960 e 1970, e todos os dispositivos legais tratam a educação infantil
acentuando o caráter não-educacional. Inclusive a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – LDB nº 5.692/71, ao priorizar o ensino do 2º grau, consequentemente, diminui a
86
Além das salas de aulas, a professora Marcia também relata que existiam outros espaços
dentro dos prédios do CEAR, onde as educadoras realizavam diferentes atividades com as
crianças:
Bom, tinha esse espaço de biblioteca. Eles tinham duas salas grandes
que em vários CEAR ela se tornou...
No mesmo lado, no final, tinha dois espaços bem grandes que a gente
chamava de sala nove, porque era um espaço maior. E cada CEAR
desenvolvia um trabalho ali. A gente fazia as vezes sala pra brincar,
além dos outros espaços de brincar, mas um brincar voltado pra uma...
o que a gente chama hoje de brinquedoteca. Um brincar mais
intencional, um brincar ali que você ia fazer uma outra atividade que
ia requerer espaço.
De repente você queria dar uma pintura toda pelo chão. Na sala era
pequeno para colocar os 32 [alunos] no chão. No pátio, as vezes o
pessoal estava usando, né?
(...)
A gente ia pra sala nove quando estava chovendo.
E do outro lado, no mesmo espaço configurativo da sala nove que a
gente chamava, pelo menos nas escolas que eu trabalhei, era a
biblioteca.
No mesmo espaço, em frente à sala nove, funcionava a diretoria do
CEAR (Marcia, ex-professora que lecionou nos CEAR Santo Alberto
e Vila Floresta).
As plantas baixas desses prédios não foram localizadas nos arquivos da Prefeitura
Municipal de Santão André; então a pesquisadora visitou os prédios dos CEAR Vila Humaitá,
CEAR Alto do Capuava/Jardim Santo Alberto, CEAR Cata Preta, CEAR Jardim Alvorada,
CEAR Jardim Estela, que atualmente se tornaram Escolas Municipais de Educação Infantil e
Ensino Fundamental. Algumas escolas sofreram alterações, em sua maioria foram reformadas
para ampliação de espaços, mas foi possível identificar a estrutura inicial dos prédios.
88
A partir das entrevistas e das visitas aos prédios, a pesquisadora esboçou um desenho
da possível planta baixa dos CEAR denominados “modelo padrão”, conforme a Figura 18.
Sala 9 Sala de aula Sala de aula Sala de aula Sala de aula Banheiro Vestiário
Diretoria
Pátio
Palco Refeitório Cozinha
Secretaria
Entrada e saída
Sala multiuso Sala de aula Sala de aula Sala de aula Sala de aula Banheiro Vestiário
Esboço da autora, baseado nas entrevistas com as professoras e ex-alunas e nas observações realizadas
ao visitar prédios do CEAR
O CEAR quando ele chegava numa comunidade, num bairro, ele era
... ela tinha assim ... era uma visão de algo muito promissor, de algo
muito inovador.
Ele vinha trazendo educação pré-escolar que era uma coisa, que era
um ganho para a população.
Como hoje eu acredito que estão sendo, mais ou menos, as
Universidades Federais acontecendo em Santo André.
Foi uma celebração!
(...)
Então a educação infantil tinha esse papel.
De novo mesmo, de uma conquista muito grande para aquela
comunidade (Marcia, ex-professora dos CEAR Vila Floresta e Parque
Capuava, entre outros).
32
Analisar o projeto arquitetônico do Modelo Padrão dos CEAR exigiria uma pesquisa mais ampla e sistemática
das fontes e que não cabe nos limites deste estudo.
33
A Represa Billings é um dos maiores reservatórios de água da Região Metropolitana de São Paulo e contribui
para o abastecimento das cidades de Santo André, São Bernardo, Diadema e São Paulo. Disponível em:
https://site.sabesp.com.br/.
90
Dentro das salas de aula, o chão era de tábuas de madeira e as grandes janelas
proporcionavam boa iluminação, conforme podemos visualizar na Figura 20. Ainda na parte
interna da sala, ficavam aparentes as vigas instaladas vertical e diagonalmente para sustentar as
tábuas das paredes.
Embora o Curso de Recreação Infantil fosse oferecido pelo governo municipal de Santo
André, havia cobrança de mensalidade daqueles que o frequentavam, conforme indica o decreto
publicado em 1974:
O decreto acima foi revogado em 04 de agosto de 1978, quando foi publicado o decreto
nº 9.392 que instituía a Associação Comunitária, Educacional, Assistencial e Recreativa –
ACEAR. As explicações quanto à finalidade e atribuições da ACEAR serão abordadas no
decorrer do texto.
A taxa para frequentar o Curso de Recreação Infantil não deixou de ser cobrada, mas
foi padronizada pelo Estatuto Padrão da ACEAR, baseando-se em percentuais do salário-
92
34
A tabela de salário-mínimo foi aprovada pelo Decreto nº 73.935, de 29 de abril de 1974, e publicada no Diário
Oficial da União em 30 de abril de 1974. Disponível em: https://www.camara.leg.br/
35
No Apêndice 3 consta uma tabela com o valor do salário-mínimo vigente, entre os anos de 1971 e 1983.
93
Nas atas de reuniões da ACEAR, redigidas entre os anos de 1979 e 1982, menciona-se
que anualmente os membros da Associação se reuniam, normalmente entre os meses de
novembro e dezembro, para decidir coletivamente o valor da mensalidade a ser cobrada no ano
seguinte. As famílias dos alunos deveriam efetuar o pagamento no ato da matrícula, mas em
alguns anos os valores foram divididos em duas parcelas.
Para os alunos carentes o valor era dividido em mais parcelas, ou as famílias eram
isentas. Entretanto, nos documentos pesquisados e nas entrevistas realizadas não há informação
quanto aos critérios para classificar tais famílias como carentes.
A Tabela 10 apresenta os valores estipulados nas reuniões da ACEAR Homero Thon e
registrados no livro ata da associação.
94
De acordo com o depoimento de todas as pessoas entrevistadas para esta pesquisa, e nos
registros das atas de reuniões da ACEAR Homero Thon, além da contribuição financeira ao
CEAR, era de responsabilidade das famílias o custo da compra dos materiais escolares e
uniformes utilizados pelas crianças.
Em contrapartida, identificamos que, no Estatuto Padrão da ACEAR, há a descrição de
que os recursos financeiros arrecadados poderiam ser aplicados na aquisição de material escolar
e didático, conforme trecho abaixo:
A ACEAR arrecadava das famílias uma contribuição financeira anual, e esse dinheiro
era utilizado para custear a manutenção dos prédios escolares, compra de materiais e assistir os
alunos carentes. Tais atribuições estavam previstas no capítulo III do Estatuto:
CAPÍTULO III
DAS FONTES DE RECEITA E DO PATRIMÔNIO
Art. 3º – Para o desenvolvimento de suas atividades, Associação
Comunitária, Educacional, Assistencial e Recreativa, contará com o
patrimônio e recursos próprios provenientes de:
I – contribuições de associados;
II – auxílios e subvenções diversos;
III – doações e legados;
IV – resultados provenientes de campanhas e promoções.
95
36
Durante o período da ditadura militar os repasses do Governo Federal às escolas eram escassos, principalmente
àquelas que atendiam as crianças pequenas, visto que não eram consideradas parte da educação básica.
Possivelmente esse seja o principal motivo do CEAR solicitar contribuição financeira às famílias. Com a
promulgação da Constituição de 1988, a educação passou a ser considerada como direito social, incluindo as
escolas que acolhiam crianças entre 0 e 6 anos de idade, e por consequência, recebeu maiores investimentos
financeiros do Estado.
96
Divergências entre os documentos escritos e as ações das pessoas nos remetem a Viñao
Frago e Escolano (2001), que explicam as contradições nas organizações escolares:
37
O jornal da Sociedade Amigos de Bairros de Santo André – SAB, conforme descrição no editorial da edição
pesquisada, era um órgão da Federação Municipal das Sociedades Amigos de Bairros de Santo Amaro, que tinha
como papel principal difundir a função da SAB de São Paulo e de outras cidades do entorno, além de divulgar a
própria Federação. A SAB era uma entidade organizadora da população para encaminhamento das necessidades
coletivas, e o jornal tinha a finalidade de fortalecer e divulgar as ações realizadas pelas SAB.
97
Em cada unidade do CEAR de Santo André havia uma associação de pais e mestres
denominada Associação Comunitária, Educacional, Assistencial e Recreativa (ACEAR) que
compunha um Conselho Deliberativo constituído por professores, gestores e pais de alunos. A
ACEAR tinha atribuições diversas, dentre elas, arrecadar e administrar o dinheiro referente à
contribuição das famílias e, deliberar e definir por consenso sobre as festas escolares que
aconteciam durante o ano letivo.
A ACEAR era considerada um órgão complementar da administração do CEAR,
conforme decreto municipal:
CAPÍTULO I
DA CONSTITUIÇÃO
Art. 1º – A Associação Comunitária, Educacional, Assistencial e
Recreativa (A.C.E.A.R.), é uma sociedade civil, constituída de acordo com as
leis do país, com personalidade jurídica própria, prazo indeterminado de
duração, sem fins lucrativos e com sede e foro, no Município e Comarca de
Santo André, localizada em dependência especialmente cedida, pelo Centro
Educacional, Assistencial e Recreativo da Prefeitura do Município de Santo
André (SANTO ANDRÉ, 1978).
Thon, utilizado entre os anos de 1979 e 1982. Conforme o Termo de Abertura apresentado na
Figura 24, nele é possível consultar os registros das reuniões da ACEAR Homero Thon, desde
a posse dos membros da Associação até as reuniões para decisão de festejos escolares.
De acordo com os registros nas atas deste livro, no início de cada ano letivo, a dirigente
escolar do CEAR realizava uma reunião com a presença das professoras e pais dos alunos. Nessa
reunião se realizava a leitura do Estatuto Padrão da ACEAR e a dirigente explicava as
atribuições dos membros participantes. Na mesma reunião ocorria a eleição para escolher os
membros para compor a ACEAR daquela instituição.
A Associação era organizada em três grupos: Conselho Deliberativo, Diretoria
Executiva e Conselho Fiscal, sendo composta por onze membros, que se subdividiam entre as
seguintes funções:
a) Diretoria Executiva:
1. Presidente (função desempenhada por pais de alunos)
2. Vice-presidente (função desempenhada por pais de alunos)
3. Secretário Geral
4. Tesoureiro Geral (função desempenhada por pais de alunos)
5. Diretores de Departamento
6. Vogais
b) Conselho Deliberativo
c) Conselho Fiscal: três representantes, sendo dois pais de alunos e um professor
100
CAPÍTULO II
DO OBJETO
Art. 2º – São objetivos principais da Associação Comunitária,
Educacional, Assistencial e Recreativa:
I – Auxiliar a direção do Centro Educacional, Assistencial e
Recreativo na consecução dos seus objetivos educacionais;
II – Representar, junto à direção do Centro, as aspirações da
comunidade;
III – Participar de comemorações cívicas, de campanhas comunitárias,
de promoções de natureza cultural, esportiva, assistencial e de outras
atividades em que se empenhe o centro;
IV – Realizar campanhas destinadas a melhorar as condições de
funcionamento do centro;
V – Auxiliar os alunos carentes de recursos, na aquisição de uniforme,
material didático e esportivo de uso nos cursos existentes no Centro
Educacional, Assistencial e Recreativo;
101
A ACEAR tem a função de cuidar e preservar o CEAR, nos seus aspectos físicos e
sociais, conforme indica os incisos IV, V e VI; além de divulgar e promover as atividades
realizadas no espaço do CEAR, assim como indicam os incisos VII e VIII.
Embora no Estatuto Padrão da Associação Comunitária, Educacional, Assistencial e
Recreativa conste dezenas de atribuições para os membros da Associação, no Livro Ata do
CEAR Homero Thon notamos que a maioria das reuniões era convocada para decisões relativas
aos festejos escolares. Participar das atividades escolares também era um objetivo da ACEAR,
contribuindo nas festas, eventos e campanhas promovidas no CEAR, conforme inciso III do
Estatuto Padrão da ACEAR.
A cada reunião da ACEAR era realizado um registro em livro de atas especificamente
destinado a esse fim. No livro de atas do CEAR Homero Thon, consta registros desde a posse
dos membros da Associação até as reuniões para decisão dos festejos escolares que aconteciam
durante todos o ano letivo. Foram analisadas 20 atas de reunião da ACEAR Homero Thon e, em
9 delas, o principal assunto da pauta se referia às festas escolares. Em 6 reuniões a pauta era
sobre eleição ou reposição dos membros da ACEAR, e em 5 reuniões foi decidido sobre a taxa
de contribuição mensal e anual. Desse modo, podemos identificar a importância dos festejos
escolares promovidos pelos CEAR da cidade de Santo André, visto que a Associação do CEAR
Homero Thon se reunia mais de uma vez ao mês para discutir, definir e organizar as festas.
Ao analisar atas de reuniões nos reportamos às contribuições de Esquinsani (2007) que
discute a questão da neutralidade na escrita dos documentos, afirmando que as atas de reuniões
são criadas para desempenhar função pré-determinada e demonstram formas de influências no
processo educacional. São textos objetivos e sucintos, demonstrando um protocolo de registro.
Mas, apesar disso, a autora afirma que utilizar atas de reuniões como fonte de pesquisa, permite
identificar a percepção histórica do ambiente educacional pesquisado.
Os registros nas atas de reunião da ACEAR Homero Thon apontam discussões entre os
participantes, divisão de tarefas entre os membros da Associação, e definições coletivas na
maior parte dos documentos analisados.
102
Cotidiano é a palavra que usamos para referirmos à rotina, às ações diárias, à vida de
todo dia. Cotidiano são as práticas, os fazeres, os sentidos que vão se atribuindo e articulando,
criando redes de conhecimento, de significados e de relações interpessoais e materiais,
constituindo a subjetividade das ações, orientando-as. Cotidiano, enfim, é a produção de
conhecimento, valores e existência. Certeau (2014) nos faz refletir quando explica que as
práticas cotidianas estão no cerne da constituição social, não são detalhes na constituição das
ações diárias. O estudo das “artes de fazer” ou práticas cotidianas, para Certeau (2014), implica
questionar as relações que os usuários fazem das produções coletivas, buscando compreender
o que fabricam e como as usam.
Nessa perspectiva, o cotidiano nas e das escolas, remetem às dimensões da vida nas
instituições escolares, a dinâmica de circulação do conhecimento, os modos de existência da
criação. Cotidiano escolar, portanto, remete aos fazeres diários, ao contexto social de produção
de conhecimento, o papel social e função de ensinar e aprender.
A rotina diária nas e das escolas municipais de Santo André, desde 1969 até 1982
variava entre as atividades esportivas, as atividades culturais, as atividades higiênicas e as
atividades motoras-educacionais. Para compreensão dessas atividades, se faz necessário
analisar os materiais e os discursos produzidos pelos usuários das escolas: crianças e adultos.
Para Certeau (1994), o cotidiano são “maneiras de fazer”, e essas ações explicam a
organização escolar
Fui aluna do CEAR38 com 6 anos, porque naquela época só tinha a turminha,
quando eu fiz, de 6 anos, era só prontidão mesmo para a alfabetização. Era só
um ano porque não tinha quantidade. Nós éramos, se não me engano, duas
salas de manhã e duas a tarde ou três, no máximo, entendeu? E a gente não
tinha muitas crianças. Tinha poucas vagas. Tinha bastante criança, mas não
tinha muita vaga. Então, naquela época tinha esse [o CEAR Vila Pires], o do
Homero Thon que era ali onde é o shopping agora, onde construíram. Tinha
acho o do Alpina, também tinha, mas eram poucos (Cristina, ex-aluna do Curso
de Recreação Infantil Vila Pires, em 1969).
38
Notamos divergência na informação compartilhada pela ex-aluna, no que refere à nomenclatura da instituição.
Na data em que essa aluna frequentou a escola, o nome correto era Curso de Recreação Infantil, localizado na Vila
Pires.
107
CEAR Cata Preta, mas seu primo que morava mais distante também frequentou o CEAR Cata
Preta porque não conseguiu vaga no CEAR Vila Linda, que ficava próximo à casa dele.
Durante as entrevistas realizadas com ex-alunas do Curso de Recreação Infantil e dos
CEAR, os dados referentes às vagas e matrículas, se revelou impreciso. Algumas ex-alunas
alegaram dificuldades para conseguir a vaga, outras mencionaram facilidade porque as famílias
utilizaram de influência política, amizades ou prestígio para assegurar a vaga e matrícula. A
contradição entre quantidade de vagas e número de crianças atendidas, evidencia que as escolas
não eram suficientes, nem todos eram atendidos, e pode explicar a denúncia mencionada no
capítulo anterior, na Figura 22.
Um exemplo é o relato das ex-alunas Éricka e Claudia, que conseguiram a vaga na
escola por meio de indicação. Seguem as transcrições:
Ela [a professora Nilza] era amiga do meu pai, meu pai foi jogador de basquete,
né? Então tinha até uma ligação muito forte [Nilza era jogadora de basquete].
(...)
Foi uma escolha mesmo por ser perto [matricular-se no Curso de Recreação
Infantil da Vila Pires].
E também, assim, meu pai tinha um certo conhecimento também.
Porque não era todo mundo que, a gente sabe que a educação sempre foi
excludente, né?
Não era todo mundo que, na minha idade, hoje com 58 anos, pôde fazer uma
educação infantil, uma pré-escola.
Era meio que …
Você tinha alguns amigos, alguns conhecidos, você conseguia e vaga.
Era tudo assim (Éricka, ex-aluna do Curso de Recreação Infantil na Vila Pires,
em 1969).
A professora Marcia narrou uma situação que ocorreu nas escolas em que lecionou,
conforme relato:
Não era uma coisa comum, deflagrada: então vamos pôr todo mundo!
Mas eu vi acontecer (Marcia, ex-professora que lecionou nos CEAR Santo
Alberto e Vila Floresta).
Eu morava mais perto do Homero Thon, mas eu queria..., minha mãe me pôs
lá porque lá tinha mais esportes. Eu gostava muito, era muito maria moleque,
então eu gostava muito de coisas. Lá tinha um espaço maior, né? O Homero
Thon era um espaço mais restrito, a escola, o CEAR.
(..)
Eu tinha vizinhos que tinham ido lá e era muito bem falada já (Cristina, ex-
aluna do Curso de Recreação Infantil na Vila Pires, em 1969).
Cristina explica que não se recorda plenamente, mas lembra que foi necessário que sua
mãe fizesse uma inscrição e aguardasse a resposta positiva quanto à conquista da vaga para o
curso.
Roseni, ex-aluna da professora Neli no Curso de Recreação Infantil Vila Pires, contou
que sua mãe escolheu a respectiva unidade porque era considerada a melhor da cidade e ficava
perto da residência da família, e completou dizendo que havia outras unidades, mas a mãe dela
insistiu pela vaga na unidade instalada na Vila Pires.
Observando as duas entrevistas com as ex-alunas Cristina e Roseni, notamos
divergências quanto aos nomes que se referiam à escola. Cristina utiliza sempre a sigla CEAR,
mas Roseni menciona apenas o bairro onde a instituição estava localizada, e em outros
momentos da entrevista refere-se à escola apenas com as palavras pré ou prézinho. Roseni
frequentou a instituição durante somente um ano e se transferiu para a escola primária. Cristina,
além de ex-aluna, é professora – atualmente aposentada – e lecionou nos CEAR, nas EMEI e
nas EMEIEF de Santo André, e por esse motivo se recorda e utiliza a sigla da instituição. Talvez
tenha se confundido, pelo tempo que passou ou por conviver profissionalmente no local.
Pollak (1992) aponta a memória como uma construção do passado, realizada no
presente. É um fenômeno que envolve escolha, sendo essa seletiva e parcial; “sofre flutuações”
de acordo com o momento em que é conectada. É um “elemento constituinte do sentimento de
109
identidade”, importante para o sentimento que uma pessoa reflete de si ou frente a um grupo.
Para o autor, o indivíduo é capaz de acessar memórias quando participa de recordações
coletivas, envolve não apenas experiências vividas diretamente, mas também transmitidas por
outros indivíduos, herdadas ou aprendidas durante o processo de socialização.
As entrevistadas nesta pesquisa demonstraram em seus depoimentos que suas memórias
estavam entrelaçadas pelas lembranças das experiências do decorrer de suas vidas, não
correspondendo fielmente à realidade. Algumas mencionavam diferenças entre as escolas e a
educação do final dos anos 1900 e início dos anos 2000, comparando de modo, negativo ou
positivo, suas experiências como alunas, professoras, mães, envolvidas no processo de
educação escolar.
Porque até antes da minha turma, a condição para você entrar era ser indicado
por um vereador, um político, uma personalidade no município de força
política.
Eu tenho até uma história hilária sobre isso (risos).
Uma amiga nossa, que entrou antes da gente, uma turma antes da gente, quando
era só com indicação, não tinha outro meio pra você entrar. Ela foi na cara
dura pedir uma indicação.
Primeiro vereador que eu encontrar eu vou implorar, ela falou. Eu vou ajoelhar
e vou implorar.
E quando ela entrou, ela falou assim: eu vim pedir uma carta de indicação.
E essa carta tinha..., vinha um padrão, a moça datilografava seu nome na hora,
e como o vereador tinha deixado avisado que viria uma pessoa, a assessora
pensou que ela fosse essa pessoa.
Então na hora ela falou que era Fulana de tal e ela entrou (risos) (Marcia, ex-
professora que lecionou nos CEAR Santo Alberto e Vila Floresta, grifo meu).
39
No decorrer desta pesquisa algumas ex-professoras foram indicadas pelas colegas entrevistadas, procuraram a
pesquisadora e solicitaram que seus depoimentos fossem colhidos. Uma dessas foi a ex-professora Silmara que
ingressou na Prefeitura de Santo no ano de 1986, período superior a delimitação temporal da pesquisa. Seus relatos
revelam importantes informações a respeito do critério de seleção das professoras e por este motivo segue a
descrição: “Naquela época não tinha concurso público, não tinha concurso público! Os cargos eram, de professoras
de rede municipal, era destinado aos vereadores. Os cargos eram divididos entre os vereadores, entre os cargos de
comissão do governo. Não tinha concurso público. E pra minha sorte naquele momento, a minha mãe era amiga
de infância de um vereador, que na época era do PTB, minha mãe era amiga de infância dele: do Bezerra, como
que era o nome dele? acho que era Bezerra, lá do Parque Erasmo. Aí ela foi lá e pediu um cargo pra mim. Eu
estava saindo do magistério”.
40
A ex-professora explicou que foi aprovada no processo seletivo e pode assumir o cargo quando foi chamada.
Negociou com a Prefeitura e deslocada para o final da lista das funcionárias aprovadas.
41
O prefeito Lincoln Grillo governou a cidade de Santo André entre os anos de 1977 e 1983. Disponível em:
https://www2.santoandre.sp.gov.br/index.php/cidade-de-santo-andre/prefeitos
42
O prefeito Newton da Costa Brandão governou a cidade de Santo André durante três mandatos, de 1969 a
1973, depois de 1983 a 1988, e o último de 1993 a 1996. Disponível em:
https://www2.santoandre.sp.gov.br/index.php/cidade-de-santo-andre/prefeitos
111
Mas eu nunca tive essa sorte! (Anice, ex-professora que lecionou nos CEAR
Homero Thon, CEAR Ouro Verde, entre outros).
A partir das fotografias coletadas, foi possível estimar o número de crianças atendidas
em cada turma do Curso de Recreação Infantil e do CEAR, variando entre 25 e 36 alunos por
sala, desde o início do atendimento em 1969 até a efetivação das unidades escolares na década
de 1980.
Aramaçan, um clube particular, mas onde as professoras desta unidade escolar levavam as
crianças para brincar, conforme relato da professora Denise: “Havia, na época, um acordo entre
Prefeitura e o Aramaçan. Portanto utilizávamos as dependências do clube: piscinas, parquinho,
campos de futebol. Quantos piqueniques fizemos naqueles campos!”, conclui a professora,
demonstrando satisfação ao relembrar dos acontecimentos daquela época.
Na Figura 25, chama-nos a atenção, a professora Nadir estar atrás das crianças, quase
escondida, devido a elevada estatura da professora-atleta seu rosto pode aparecer na foto. No
quadrante oposto da fotografia, as mães aparecem ao lado ou quase à frente dos alunos. Seria
timidez da professora ou porque era a única mulher negra na foto? Não seria possível posicionar
uma professora de cada lado da foto? Era intenção que somente as crianças se destacassem na
foto? Se sim, porque algumas mães aparecem? De certo o fotógrafo tinha um propósito, mas
não sabemos responder tais perguntas. A professora Denise não se recordou quem foi o
fotógrafo desse registro.
De acordo com Barthes (2009) o fotógrafo tem intenções específicas e cabe aos
observadores entrar em harmonia com a imagem, aprovar, desaprovar, compreender e discutir,
porque as fotografias tem funções criadas a partir do olhar do fotógrafo. “Essas funções são:
informar, representar, surpreender, fazer significar, dar vontade” (BARTHES, 2009, p.49).
Quem observa a fotografia pode apreciar ou não a imagem.
Na Figura 26 vemos a turma da professora Denise, em 1969. Era um grupo com 28
crianças de 5 anos de idade e, segundo a professora, foi sua primeira turma no Curso de
Recreação Infantil, na Vila Pires. Esta imagem foi registrada dentro do Complexo Esportivo
Pedro Dell’Antonia, e ao fundo observamos residências e uma fábrica.
114
As turmas dos anos 1970 também eram numerosas, compostas por mais de 20 crianças,
conforme as Figuras 27, 28, 29 e 30, disponibilizadas pelas professoras e ex-alunas
entrevistadas, e em diferentes CEAR.
E nos anos 1980, mesmo com o aumento de unidades escolares, as turmas se mantiveram
numerosas, conforme as Figuras 29 e 30 e relatos das entrevistadas.
De acordo com as fotos, as turmas reuniam de 20 a 30 crianças. Esse aumento na
quantidade de crianças por sala comprova a hipótese da industrialização e urbanização, que
trouxeram crescimento à cidade de Santo André, concomitantemente ao movimento paulista de
expansão da pré-escola.
115
Nas Figuras 27, 28, 29 e 30 o enquadramento das crianças é igual, sempre sentadas num
banco da escola, no chão ou agachadas; todas posicionadas lado a lado e com a presença da
professora; as meninas normalmente à frente dos meninos, que ficavam ao fundo. Além do
enquadramento, notamos que nessas fotos as crianças vestem uniformes, inclusive o tênis, que
117
também era igual para todos. As professoras comumente se posicionavam no quadrante direito
da foto, embora em outras fotografias apareciam professoras sentadas no meio dos alunos.
Todas as ex-alunas e todas as professoras mencionaram durante as entrevistas que,
quando estudaram no Curso de Recreação Infantil ou no CEAR, o material escolar e o uniforme
das crianças eram adquiridos pelas famílias. O uso do uniforme era obrigatório. E quanto ao
material escolar, no início do ano letivo a mãe recebia uma lista com os itens que deveriam ser
adquiridos.
Algumas recordam com detalhes as características dos uniformes, lembram dos tecidos
das roupas, das cores, das estampas, dos bordados.
Tinha uniforme, a gente já tinha o uniforme do CEAR. Ele era azul marinho,
com a gola em V e tinha a camisetinha branca com as letrinhas.
Minha mãe comprou. Eu lembro que ela comprou. E até depois ela precisou de
mais e daí a gente ia no Bazar Ângela, né, que ainda tem. Era comprado
(Claudia, ex-aluna do CEAR Homero Thon, em 1979).
Algumas ex-alunas possuem memória olfativa dos cheiros dos materiais. Todas se
recordam dos itens do material e como eles eram organizados na escola.
Mas o que a gente usava pra desenhar, escrever, era naquela folha que
embrulhava o filão de pão.
A minha irmã fez lá [frequentou o CEAR Vila Pires], ela foi alfabetizada lá.
Alfabetizada, leitura, tudo na folhinha de pão.
Me lembro perfeitamente!
Eu tenho uma memória de duas coisas muito forte: que era o cheiro da
massinha que me remete até hoje à lembrança da minha educação infantil.
Daquele espaço.
Até vejo as mesas, agora falando pra você, era de fórmica, baixinhas, azul, azul
clarinho de fórmica, de madeira, tudo de madeira, azul clarinho de fórmica
(Éricka, ex-aluna do Curso de Recreação Infantil na Vila Pires, em 1969).
Giz de cera, sulfite massinha, lápis de cor, lápis, caderno de caligrafia para a
turma de 6 anos.
Caderno comum, régua pra algumas, algumas escolas pediam, nas minhas
pediam régua.
Tinta guache.
E tinha o material de uso coletivo que a gente mandava na lista. Uma sala pedia
papel crepom, uma sala pediu cartolina, uma sala pedia papel laminado, tinha
escola que fazia o seguinte, não fazia isso.
Porque a gente entregava a lista de material, se não me engano, na matrícula e
elas [as mães] traziam na primeira reunião.
E na época algumas escolas pediam papel higiênico, álcool para mimeógrafo.
Algumas escolas pediam assim: uma folha de color set, uma de papel espelho,
que eram os papéis que mais pediam.
A nossa briga é que os pais traziam tudo enrolado, e a gente tinha de desenrolar
tudo e colocar na papeleira. Porque ficava tudo na papeleira (Marcia, ex-
professora dos CEAR Santo Alberto e CEAR Vila Floresta).
O desempenho dos membros da ACEAR era importante para garantir que todas as
crianças portassem o material escolar e o uniforme. A ex-aluna Melissa disse que a mãe dela
era membro da ACEAR Cata Preta e se recorda que alguns alunos ganhavam material e
uniforme comprados pela escola.
A professora Marcia relatou que, no início do ano letivo, antes de começar as aulas, as
professoras, além de fazer as matrículas, preenchiam uma ficha com o perfil de cada aluno. Por
119
meio dessa ficha era traçado o perfil socioeconômico de cada família. Com isso, aquelas
famílias que não tinham condições financeiras para adquirir o uniforme e o material, a escola
fornecia. Completa dizendo que a prefeitura de Santo André passou a fornecer material escolar
e uniforme para todas as crianças somente na década de 1990.
Acervo: arquivo pessoal da aluna Claudia Rebeca, confeccionada e personalizada pela mãe da aluna.
A ex-aluna Claudia possui ainda a “sacolinha” que ela levava para a escola (Figura 31).
Conta que todas as crianças tinham esse objeto e dentro dele as crianças levavam à escola uma
escova de dentes, um tubo de creme dental e uma toalhinha higiênica que serviam tanto para
forrar a mesa do refeitório durante o horário da merenda quanto para se secar após a escovação
diária dos dentes.
Esses últimos objetos dirigiram nossa reflexão para o modelo escolar de higienização
dos costumes, prática discursiva apresentada durante a proliferação da pedagogia da escola
nova e presente nos contextos escolares nos anos finais do século XX, conforme indica a
utilização de tais objetos. Não se trata da pedagogia assistencialista, difundida durante o
movimento de lutas por creches, que afirmava que as instituições responsáveis por acolher as
crianças pequenas representariam o papel assistencial de cuidar e não educar (KUHLMANN
JR, 1998, p.200).
Quando nos referimos à higienização, lembramos do movimento higienista que interviu
na educação da sociedade moderna, definindo novos padrões de saúde e asseio. A higiene
aparece como parte integrante da rotina e do currículo escolar. Segundo Carvalho (1997),
120
[...] boa parte de nossos arquivos guardam (ou não) e “são mandados
guardar” informação a partir da lógica e do interesse da administração
estatal. Não é raro surpreender-se com políticas de arquivo que
estabelecem seus limites e possibilidades, segundo a pergunta: o que
interessa à administração pública guardar? O que fazer com o que não
é interesse da administração, muitas vezes apenas burocrática, do
Estado? (FARIA FILHO, 1998, p. 95).
Mas no acervo pessoal da professora Deise P. tivemos acesso a um livro produzido pela
Prefeitura Municipal de Santo André e distribuído às professoras, com a finalidade de orientar
o trabalho pedagógico, conforme a Figura 32.
121
Contou a professora Deise P. que o livro foi utilizado por vários anos e norteava o
currículo escolar do Curso de Recreação Infantil e, posteriormente, do CEAR. O livro é
composto por 140 páginas, divididas em seis sessões com as seguintes temáticas: Jogos,
Danças, Música, Arte, Dramatização e Aula Historiada. A paginação não segue uma ordem
sequenciada, demonstrando que o material foi produzido reunindo várias apostilas diferentes,
de acordo com determinada temática.
43
O livro foi doado pela professora Deise à pesquisadora.
122
JUSTIFICATIVA
Este documento é fruto de uma pesquisa de campo e bibliografica
[sic] realizada pela equipe do Setor Regional de Orientação
Pedagógica.
É o início de uma atividade realmente nova para todos e, portanto,
[sic] solicitamos, embora o referido trabalho tenha sido feito com
bases científicas, cooperação dos senhores professores quanto a
sugestão para melhoria ou mesmo para enriquecimento do próprio
documento.
As atividades são apresentadas respeitando faixas etárias, o que
não impede que o professor se utilize das sugestões que mais lhe
convier [sic].
Segundo a professora Deise P., o livro foi produzido pelas primeiras professoras do
Curso de Recreação Infantil que, alguns anos depois da implantação do projeto inicial,
deixaram de ministrar aulas e foram promovidas para um setor de orientação pedagógica. Neste
setor a equipe preparava material e organizava o trabalho pedagógico de todas as unidades
escolares. A professora também relatou que a equipe ministrava cursos para todas as professoras
dos Centros de Recreação Infantil e dos CEAR.
É um material dedicado especificamente a publicar sugestões e orientações para o
trabalho pedagógico. Na sessão sobre Jogos, há 32 páginas com a descrição de 135 atividades
para realizar com as crianças, em algumas consta somente a explicação do jogo; em outras
aparece maior detalhamento, com indicação do material a ser utilizado, a posição para formação
das crianças no início do jogo, como desenvolver a brincadeira e o objetivo a ser alcançado,
conforme podemos verificar nas Figuras 33 e 34.
123
Na sessão sobre Danças, o conteúdo está organizado com indicação de origem da dança,
ou seja, se é uma dança junina, se de algum estado brasileiro ou típica de algum país específico.
Há seis danças de diferentes estados brasileiros, quatro danças juninas e vinte danças de outros
países (Figura 35). Completando a sessão, há 16 páginas com partituras das músicas referentes
às respectivas danças (Figura 36). E nas páginas finais, três laudas descrevem o enredo para um
locutor de dança de quadrilha junina.
No livro são apresentadas 31 músicas infantis, com letra e partitura, descritas em 19
páginas. As letras das músicas remetem a brinquedos e brincadeiras infantis, ensinam
lateralidade como direita e esquerda, e ritmo, homenageiam o dia das mães e o dia dos pais e a
pátria.
/
Acervo: arquivo pessoal da professora Deise Maria Pio
130
======================================
=========
AULA HISTORIADA
“Chapeuzinho Vermelho”
A menina deu uns saltos (saltar) para o chão. Com isso o cestinho
saltou de sua mão e foi cair no chão.
O lobo mau foi muito amavel [sic] e ajudou chapeuzinho vermelho
levantar o cesto do chão e carrega-lo [sic] pelo bosque. (levantar e transportar).
A pobre menina não pensou que era tão perigoso conversar com o lobo. E ele
lhe perguntou:
- onde você vai? O que leva neste cesto?
A tolinha respondeu:
- Vou ver minha vovó que está doente, levar-lhe um bolo e um
pratinho de manteiga.
Notamos alguns erros ortográficos e gramaticais, mas optamos por manter o texto
idêntico, assim como consta na fonte.
Durante entrevista, a professora Denise explicou que o corpo docente dos dois Centros
de Recreação Infantil, no início da década de 1970, fez o referido curso de especialização e o
material foi reproduzido para as professoras e compilado no exemplar encadernado. Nessa
sessão há nove histórias divididas em 17 páginas, intituladas como: Chapeuzinho Vermelho,
Quando os brinquedos falam, Um passeio na caverna, A dança das doze princesas, O
casamento da Dona Baratinha, Pedro e Manuelzinho, O barão de Xiquexique, Mozart e as
borboletas brancas e Os músicos de Bremen. Nessa sessão, além do texto com a história, há o
roteiro para o professor, indicando quando deve pausar a leitura e fazer uma pergunta às
crianças, um momento de respiração, ou outra ação a fim de que haja interação entre os ouvintes
e o leitor.
O livro é um exemplar que auxiliava o docente durante o planejamento e atuação com
as crianças, principalmente se a professora tivesse pouca experiência profissional. Por isso,
talvez, tenha sido utilizado por anos entre os docentes do Curso de Recreação Infantil e do
CEAR. Um material didático redigido com escrita simples, detalhadamente explicativo e com
ilustrações manuais.
Durante as entrevistas as professoras disseram que o impresso era orientador para o
trabalho pedagógico com as crianças, mas não havia exigência ou obrigatoriedade no uso,
porque cada educadora tinha liberdade para planejar suas aulas e desenvolver suas “práticas
cotidianas”. De acordo com Certeau (2014) as práticas cotidianas são construções, maneiras de
fazer que podem não ser ditas, mas que são colocadas em ação. Ou seja, a rotina e o desempenho
da professora com as crianças é que estabelecia o aprendizado.
As atividades em ambientes externos e envolvendo a expressão corporal, eram práticas
rotineiras tanto no Curso de Recreação Infantil quanto nos CEAR. De acordo com o depoimento
da ex-aluna Cristina, as crianças pouco se mantinham dentro da sala de aula e a maioria das
atividades eram realizadas foram da classe. Como a aluna frequentou a unidade escolar
instalada dentro do Complexo Esportivo da cidade, as crianças contavam com a quadra do
132
Falando ainda sobre Recreação Infantil, curso que iniciamos lá nos anos
sessenta e nove, setenta, e assim por diante.
Como eu disse anteriormente, uma das características do nosso curso era muita
atividade fora de classe, atividade esportiva também.
Tudo aquilo que nós fazíamos na classe, vocês já conhecem, vocês já trabalham
com isso. Toda parte de coordenação motora, aprendizado de cores, formas, eu
não vou me alongar nisso.
Nós desenvolvíamos todos os aspectos da educação infantil, e além, a parte
física.
A princípio nós utilizávamos as piscinas do clube Aramaçan, clube Atlético
Aramaçan. Eles tinham uma piscina rasinha, pra criança pequena e uma que
eles chamavam de média, um pouquinho maior.
Então nós atravessávamos [a pé, ao lado] a piscina nossa, olímpica, e íamos
para o clube. E ali nós dávamos as aulas de natação.
Na Figura 40 observamos que todas vestem traje de banho igual, as crianças que
aparecem em primeiro plano, são meninas porque vestem maiô, atrás aparecem alguns meninos
e provavelmente usam sunga. Chama-nos a atenção que, dentre as vinte e duas crianças da
turma, há apenas uma negra. E assim nos interrogamos, porque essa menina foi posicionada no
canto da foto? Era escassa a quantidade de crianças negras na escola? Para essas perguntam não
recebemos respostas. Mas ao menos nessa imagem ela aparece na frente, não como a professora
da Figura 25, que ficou ao fundo, atrás dos alunos, quase imperceptível.
Outro evento que as crianças participavam era o festival de atletismo. A ex-professora
Denise explica que as crianças se apresentavam no Estádio Municipal e o evento era aberto a
fim de que as famílias assistissem as apresentações, conforme a Figura 41. Na fotografia
observamos um grupo de crianças no centro e outro grupo ao fundo. A imagem possui pouco
nitidez, no entanto calculamos cerca de 50 crianças no centro, o que nos fez concluir de que se
trata somente do grupo de alunos do CEAR Vila Pires, divididos por faixa etária para a disputa.
O festival de atletismo, embora fosse realizado somente com as crianças de uma única
unidade escolar, havia premiação para os melhores colocados. A Figura 42 registra o momento
da premiação de três crianças. Denise explica que ao lado esquerdo da foto aparece professora
Dona Teresa Cristófaro, professora idealizadora do Curso de Recreação Infantil, e à direita a
professora Nilza Monte Garcia, coordenadora, conforme descrição no Capítulo II deste estudo.
135
O lanche não era servido não, a escola não servia. Eu lembro que minha mãe
prepara meu lanche e a gente levava lancheirinha pra escola (Éricka, ex-aluna
do Curso de Recreação Infantil na Vila Pires, em 1969).
Não. Lanche só quando deixavam levar, mas tinha uma merenda já. Eu lembro
que tinha sopa, tinha tipo um mingau. A gente recebia também banana, uma
frutinha, alguma coisa assim, mas já tinha o lanche (Claudia, ex-aluna do
CEAR Homero Thon, em 1979).
A ex-professora Denise explicou com maiores detalhes como foi planejado e organizado
o momento de alimentação das crianças, no decorrer dos anos, conforme descrição do relato
abaixo:
Concluímos então que, assim como a organização dos prédios escolares, a alimentação
escolar se modificou no decorrer dos anos, desde os Cursos de Recreação Infantil até o CEAR,
adaptando-se a comunidade escolar e à quantidade de crianças atendidas em cada unidade, mas,
principalmente, conforme o Departamento de Educação, Cultura e Esportes da Prefeitura de
Santo André se estruturava e estabelecia diretrizes ao ensino infantil.
Enfim, as atividades desenvolvidas pelas crianças aconteciam em diversos lugares da
escola. Sobre isso nos reportamos a Frago (1998) que define a escola como “lugar”, mas além
137
disso, nas palavras do autor: “Ali, onde se aprende e se ensina, sempre é um lugar, cria-se um
lugar. (...) A escola peripatética44 não precisa de um lugar específico. Em outras palavras, nela
os lugares variam em função dos objetivos, usuários e matérias” (FRAGO, 1998, p.66).
Portanto, seja na sala de aula, no pátio, no parque, nos espaços de práticas esportivas, no
refeitório, as atividades que as crianças realizavam no CEAR constituíam a escola e todos esses
espaços são lugares de ensino.
44
A palavra peripatética relaciona-se ao pensamento aristotélico, e pode ser interpretada como a escola em
movimento, que ensina andando passeando, como o costume do filósofo grego Aristóteles.
138
De acordo com Lima (2021), que pesquisou as festas escolares no Parques Infantis da
cidade de Sorocaba, a realização dos rituais cívicos era regulamentada e obrigatória pelos
dispositivos legais. Além de estar presente na memória da comunidade escolar, era uma prática
institucionalizada pelas escolas. A obrigatoriedade das atividades escolares de natureza cívica
foi implantada a partir do Decreto nº 50.505, de 26 de abril de 1961, e mantida pelos governos
militares, durante o período da ditadura militar brasileira, implantado de 1º de abril de 1964 até
15 de março de 1985 (LIMA, 2021, p. 123).
As festas escolares promovidas pelos CEAR envolviam a escola como um todo,
aconteciam em dia e horário agendado com antecedência e contemplavam toda a comunidade
escolar. Nestes dias a rotina escolar se modificava, os professores assumiam atribuições na
organização do espaço e os alunos circulavam livremente, auxiliando no preparo da festa.
Os desfiles e as festas eram oportunidades de divulgar os cursos, as escolas e o
atendimento público para a crianças da cidade. Nesse sentido nos remetemos à Candido (2012)
que compreende as festas escolares como “momentos específicos para a aproximação
harmônica e profícua da escola e da sociedade, trazendo a família para a escola e demonstrando
os avanços alcançados na educação de cada criança” (CANDIDO 2012, p. 174).
A ex-aluna Roseni relatou que o ensaio para a festa de encerramento era realizado numa
praça próxima ao Ginásio Municipal Pedro D’Antônia, onde funcionava o Curso de Recreação
Infantil da Vila Pires. Roseni disponibilizou uma fotografia do seu acervo pessoal (Figura 44)
e explicou:
140
Ensaio da festa escolar sendo realizado numa praça pública, pode representar mais uma
forma de divulgação do evento e promoção das atividades realizada na escola pública
municipal.
O encerramento do ano letivo era comemorado com uma apresentação que reunia todos
as unidades escolares do CEAR da cidade de Santo André, no Ginásio Municipal de Esportes
Pedro Dell’Antonia. A ex-professora Marcia relata com apreço e humor, sobre a organização
da festa:
No CEAR Homero Thon, segundo as Atas das Reuniões analisadas, anualmente eram
promovidas quatro festas escolares: em abril a festa da Páscoa, em junho a festa junina, em
setembro a festa da primavera ou festa do sorvete e em dezembro a festa de encerramento do
ano letivo. Além das homenagens no Dia das Mães e no Dia dos Pais. E em algumas unidades
havia a festa de formatura.
A primeira era a Festa da Páscoa, momento em que todas as crianças e funcionários
ganhavam ovos de chocolate adquiridos e oferecidos pela ACEAR, conforme a Figura 47. A
145
compra dos doces era realizada com o dinheiro arrecadado em festas de anos anteriores ou com
a contribuição financeira das famílias dos alunos.
No mês de junho acontecia a Festa Junina, um evento com apresentação de danças das
crianças paras as famílias. Neste dia havia montagem de barracas para venda de alimentos e
brincadeiras típicas, arrecadando fundos em prol do CEAR. Nas atas de reuniões da ACEAR
(Figura 48) localizamos registros de que os membros decidiam coletivamente o custo de cada
item comercializado na festa. Além disso, as famílias das crianças contribuíam com doações de
alimentos e itens para venda nas barracas típicas.
146
Outra forma de arrecadação financeira acontecia através da venda de rifas; nesse caso,
eram entregues talões numéricos aos alunos para vender às famílias; o casal de crianças que
147
alcançasse a maior quantidade de talões vendidos era premiado com o título de rei e rainha da
pipoca. De acordo com a necessidade financeira da escola, em cada ano era eleito uma
quantidade de casal caipira. Na figura 49, ata redigida no ano de 1981, lemos que seriam três
casais.
CONCLUSÕES
nos mesmos locais de instalação ou aos redores, são elas: Educandário Santo Antônio, Instituto
Sagrado Coração de Jesus, Casa da Criança de Santo André (atualmente Colégio São José).
Estas escolas utilizam fotos e dados de seus acervos para divulgar a história das instituições e
tradição na cidade, entretanto não foram localizados estudos acadêmicos que tenham utilizado
esses acervos.
Ao enumerar tais possibilidades de estudo e pesquisa, as palavras de Escolano (1998)
nos permite compreender a amplitude do tema, porque “a escola, como qualquer outro tipo de
habitação, incluída a própria casa, é uma criação cultural sujeita a mudanças históricas”
(ESCOLANO, 1998, p.45). Além disso, “a escola, em suas diferentes concretizações, é um
produto de cada tempo, e suas formas construtivas são, além dos suportes da memória coletiva
cultural, a expressão simbólica dos valores dominantes nas diferentes épocas” (ESCOLANO,
1998, p.47).
Enfim, este estudo conclui que as transformações pelas quais a cidade de Santo André
atravessou durante o século XX, principalmente após a década de 1950, modificaram as
características da população, das moradias, do emprego e da educação escolar.
Consequentemente, ao longo de trinta anos, a prefeitura municipal ampliou o atendimento às
crianças pequenas em escolas públicas, acompanhando as exigências legais estabelecidas pelo
Governo Federal e seguindo as determinações do Governo do Estado de São Paulo.
Ao encerrar essa dissertação, outros desdobramentos se amplificam, e esse é o início da
escrita da História da Educação de Santo André, pressupondo continuidade nas pesquisas e
profícuas descobertas.
152
FONTES
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Santo André, 1991. 143p.
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161
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1998. p. 254-279.
APÊNDICE 1
Data da
Nome Vínculo Escolarização Percurso profissional
Entrevista
Cursou Magistério
na Escola, em 1900
5 de julho de
1 Anice Naum Professora formou- se
2022
Pedagogia pela XX
em 1900
Cursou Magistério
na Escola, em 1900
Denise 29 de julho de
2 Professora formou- se
Cattarruzzi 2022
Pedagogia pela XX
em 1900
Cursou Magistério
na Escola, em 1900
Deise Maria 4 de agosto de
3 Professora formou- se
Pio 2022
Pedagogia pela XX
em 1900
Cursou Magistério
na Escola, em 1900
4 de agosto de
4 Deise Ferreira Professora formou- se
2022
Pedagogia pela XX
em 1900
Cursou Magistério
na Escola, em 1900
8 de outubro
5 Marcia Tobias Professora formou- se
de 2021
Pedagogia pela XX
em 1900
Cursou Magistério
na Escola, em 1900
25 de julho de
6 Katia Professora formou- se
2022
Pedagogia pela XX
em 1900
Cursou Magistério
na Escola, em 1900
21 de julho de
7 Claudia Rebeca Aluna formou- se
2022
Pedagogia pela XX
em 1900
Cursou Magistério
na Escola, em 1900
Cristina 8 de outubro
8 Aluna formou- se
Frederico de 2021
Pedagogia pela XX
em 1900
Cursou Magistério
na Escola, em 1900
Éricka 28 de julho de
9 Aluna formou- se
Springman 2022
Pedagogia pela XX
em 1900
163
Cursou Magistério
na Escola, em 1900
Melissa 19 de julho de
10 Aluna formou- se
Magalhães 2022
Pedagogia pela XX
em 1900
Frequentou o curso Trabalhou na área
Roseni Gisela colegial e formou-se administrativa de 12 de outubro
11 Aluna
Galvão Silva no ano de 1900. clinicas e hospitais até o de 2021
ano 2000
164
APÊNDICE 2
Prezada,
Sou Luciane Galvão Candido, mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal de São Paulo e sob orientação da Profª. Drª. Claudia Panizzolo.
Você está sendo convidada a participar da pesquisa que tem por objetivo reconstituir a
história das primeiras escolas administradas pelo poder público municipal até a composição da
rede andreense de ensino, responsável por acolher as crianças de 4 a 6 anos na cidade de Santo
André entre os anos de 1954 até 1982.
Anexo, segue o Termo de Consentimento Livre Esclarecido, documento que contém
mais informações sobre a pesquisa.
As informações obtidas através dessa pesquisa serão confidenciais e asseguro o sigilo
sobre sua participação nesse estudo.
Atenciosamente,
Luciane Galvão Candido
165
APÊNDICE 3
7. Qual a quantidade de salas de aula que havia na escola onde você estudou?
8. Havia aproximadamente quantas crianças por sala?
9. Quantas horas você ficava na escola?
10. Havia outros espaços para atividades, além das salas de aula? Quais?
11. A escola oferecia algum tipo de alimentação aos alunos ou as crianças levavam lanche?
12. As crianças usavam uniformes? Se sim, como era este uniforme? Era comprado pelos pais
ou fornecido pela escola?
13. As crianças tinham material escolar? Se sim, como era este material? Era comprado pelos
pais ou fornecido pela escola?
14. Havia algum tipo de material didático para utilizar nas aulas? Todos os alunos possuíam?
Era comprado pelos pais ou fornecido pela escola?
15. Havia momentos para brincadeiras? Era livre ou direcionada pela professora?
16. Havia festas? Quais? Se sim, havia participação das famílias?
17. Como era a relação entre professora e aluno?
18. Quais atividades você fazia na escola?
19. Quais aprendizados você considera que adquiriu neste período da infância nesta escola?
20. Quais recordações você tem daquela época?
21. Você possui fotos, roupas ou outra recordação material daquela época?
167
APÊNDICE 4
Evolução do salário mínimo nominal
ANEXO 1
ANEXO 2
179
180