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O MENINO DO CAMPO

A vida é um desafio

Escrito por Paulo Gomes


Copyright © 2017 por Paulo Gomes
Publicado originalmente por TBI All New, São Luís – MA, Brasil.

Editora responsável: TBI All New


Capa: Canva/TBIAllNew

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Gomes, Paulo

O menino do campo – A vida é um desafio/ Paulo Gomes. São Luís:


TBI All New, 2009.
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O menino do campo – Volume I – A vida é um desafio


Ano 2009/ Edição 2017/ 1ª impressão
TBI All New representado por Paulo Gomes
http://www.tbiallnewblog.com/
São Luís – MA - Brasil
APRESENTAÇÃO

O MENINO DO CAMPO é um livro seriado que trata de


um jovem chamado Mateus que viciado em seu mundo
distante dos grandes centros urbanos se vê em uma
nova fase de sua vida, pois precisa decidir uma
profissão. O garoto não quer saber de faculdade e muito
menos de deixar sua cidade natal, pois é muito apegado
à vida no campo. Nesta primeira jornada, com o título A
VIDA É UM DESAFIO Mateus irá sair de sua cidade em
direção à faculdade e conhecer uma realidade que
poderá cativá-lo. Ele conhece Amanda por quem se
apaixona. Agora ele terá um motivo a mais para sair da
cidade que ama tanto.
SUMÁRIO

1. Uma reflexão sobre o futuro...........................p. 4

2. Tudo parece ser divino.................................p. 15

3. Incertezas, motivações e conflitos................p. 26

4. Liberdade, decisão, escolhas e sacrifícios...p. 35

5. Dores, oportunidades, realizações...............p. 45

6. A emboscada................................................p. 56

7. Dinheiro, ambição, amizade e verdade........p. 69

8. Corrigindo um erro........................................p. 78

9. Caos no jantar..............................................p. 87

10. Segredos......................................................p. 97

11. Não pode ser.............................................p. 109

12. Abrindo o coração.....................................p. 118

13. Tudo o que não se quer sentir...................p. 128

14. Tudo o que eu queria ouvir.........................p. 138

15. Eu posso contar com você sempre............p. 148


O menino do campo – A vida é um desafio

CAPÍTULO 1

INTRODUÇÃO

Não sabemos quem somos ou se sabemos temos sérias


dúvidas. Mas vivemos num mundo onde as coisas andam meio
loucas. As nossas incertezas nos fazem mergulhar numa grande e
quase interminável jornada na busca de respostas para que
possamos nos encontrar no meio de tanta gente. Até a gente se
encontrar, uma série de barreiras iremos enfrentar. Na verdade,
acredito que nós nos construímos dia após dia, mesmo que seja
lentamente ou não. Pode ser também em uma velocidade maior,
mas não podemos arriscar tanto, já que perigos poderão ocorrer.

UMA REFLEXÃO SOBRE O FUTURO

Era muito difícil entender aquele final de ano. Eu estava


acostumado em pensar no próximo ano como um novo começo,
um começo simples, algo que não requeresse tamanha atenção
dos meus pais. Mas eles estavam diferentes e me forçavam a
decidir uma profissão. Eu já tinha dito que não queria ir pra
faculdade. Não sabia o motivo pelo qual teria que me formar em
alguma profissão. Eu tinha tudo. Eu era o jovem mais rico da
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Paulo Gomes

minha cidade e meus pais eram muito bem-sucedidos. O que eu


queria mais? Do que mais eu precisava? Nada. E era justamente o
que não podia compreender. Meus pais queriam que eu
escolhesse uma faculdade do nosso país. Deram-me uma lista das
mais procuradas e das mais famosas. Eu os convenci que
escolheria alguma delas somente se fosse conhecê-las antes e
eles acabaram concordando, mas na verdade eu queria adiar
aquela decisão para cada vez mais longe, mesmo sabendo que eu
ia terminar o terceiro ano em menos de dois meses.
Era uma daquelas manhãs de sábado. Durante a semana
levanto bem cedo para ir à escola. Mas costumo acordar tarde aos
sábados, digo, nove da manhã pra mim é tarde. É que eu tenho
que ir até os animais e ajudar o pessoal, sabe, eu gosto daquilo.
Eu cuido da fazenda em alguns negócios. Meu pai controla toda a
produção e mamãe cuida dos investimentos. É muito legal. Eu não
trocaria minha fazenda por nada na vida, nem mesmo se me
comprassem toda a cidade Riqueza, a cidade mais bonita do
mundo, a gente a chama de Rich City. Como estava falando, era
uma daquelas manhãs de sempre e:

Maressa: Mateus acorda filho. Venha pra mesa.


Mateus: Mãe, que pressa. Tenho que tomar banho.
Maressa: Cuida. Temos uma surpresa.
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O menino do campo – A vida é um desafio

Mateus: Claro. Eu amo surpresas.

Eu não tinha ideia do que seria. É difícil eu receber alguma


surpresa em minha casa. A não ser que seja meu aniversário. É
claro, é claro. Era meu aniversário e eu nem estava me
importando. Eu não estava lembrado mesmo que estava ficando
mais velho.
É, eu estava completando 17 anos e agora teria que
lembrar que não era mais um jovem secundarista. Pelo menos até
novembro. Eu nunca fiz uma festa de aniversário, afinal de contas
eu não tinha amigos ali, a não ser o pessoal que trabalhava
comigo em casa. Eles eram verdadeiros amigos. Não eram da
minha idade, mas acredito que amizade não tem idade. Pelo
menos esse era o meu pensamento. O pessoal da escola para
mim era apenas o pessoal da escola.
Aquele dia foi especial como todo ano costumava ser.
Meus pais se dedicavam a mim o dia inteiro e me davam grandes
presentes. Não falo de coisas simples não. Falo de coisas
surpreendentes mesmo. Só para exemplificar, neste dia meu pai
me comprou um jatinho para eu viajar pra onde quisesse. Eu não
sabia pilotar, mas ganhei um piloto particular junto com o jatinho.
Minha mãe não foi tão longe, mas chegou perto. Ela comprou uma

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empresa só para abrir uma conta poupança pra mim. Ela me disse
que era pra eu investir na minha educação. E que quando eu
entrasse na faculdade usasse o dinheiro do lucro da empresa para
gastar com os estudos. Foram presentes maravilhosos, eu já
estava acostumado, já ganhei carro, cavalos, casas, hotéis e muito
mais, mas todos os presentes deste ano direcionavam para a
faculdade. A incerta faculdade, ou a forçada faculdade, ou mesmo
a faculdade que eu ainda não sabia se queria.
Eu tinha planos como todo mundo tem. Mas era para ser
do que jeito que eu imaginava ser. Pelo menos eu nunca tinha
contado para meus pais o que eu queria. No entanto meu desejo
era morar na cidade Fazenda para sempre, cuidar dos negócios
dos meus pais e continuar vivendo ali normalmente sem precisar
sair de casa. Ali era tudo o que conhecia, era tudo o que gostava,
era tudo o que me fazia ser feliz e tudo o que me prendia. Eu não
via o outro mundo por trás da modernidade e da avançada
tecnologia. Eu não me importava com isso. Eu não queria saber de
barulho de carros e aviões, eu não queria saber de barulho de
gente e nem de andar em multidões apressadas como se o tempo
fosse acabar logo. Não, eu não queria saber de grandes cidades,
de grandes faculdades e nem de trens, metrôs e shoppings. Não
queria saber de cinemas, de casas de shows e muito menos de

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O menino do campo – A vida é um desafio

restaurantes lotados. Eu queria a minha paz, eu queria a minha


vida de sempre, a minha casa, os meus amigos, a minha terra, o
meu mundo. Mais nada, mais nada mesmo. Eu estava bem até ali
e não precisava de algo novo. Eu me conformava no meu mundo
já pronto e não me importava em procurar novidades ou construir
algo pra mim. Tudo estava ali, pronto pra mim.
Talvez eu fosse um pouco egoísta ou um pouco relaxado
ou os dois ao mesmo tempo. Mas era como eu era. Simplesmente
era aquilo e nada importava. Eu não sei. Quando eu olho pra tudo
aquilo parece ser tão estranho, mas aquele era eu, no meu mundo
fechado, no meu mundo feliz. Eu não me culpo e nem culpo
ninguém, apenas acho que temos estações. Quando somos mais
novos pensamos de um jeito, agimos de um jeito, gostamos das
coisas da nossa forma, dentro do padrão de nossa idade, de
nossa mentalidade, depois, começamos a mudar os nossos
pensamentos e agir de outra maneira e o que a gente achava
simplesmente maravilhoso quando éramos crianças passamos a
desprezar. Eu sempre acreditei na mudança das pessoas. Em
vários aspectos. É claro que algumas precisavam de terapias para
mudar, mas acho que cinco anos é tempo suficiente para que
mudemos. Em algum aspecto, mesmo que o menor possível.

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Paulo Gomes

Talvez foi o que aconteceu comigo. Mas eu precisei de alguma


“terapia”. Não a dos consultórios, mas a terapia da vida.
Em uma tarde muito quente naquele ano eu resolvi ir até a
cidade conhecer a faculdade de Rich City. Eu como sempre não
contei a ninguém. Não disse nada. Eu não sei o que deu na minha
cabeça. Eu não queria saber de estudar. Os meus colegas do
terceiro ano falavam em faculdades, mas eu pouco me
interessava. Um deles me falou que Rich City era a melhor
faculdade do país. Eu fiquei um pouco interessado na conversa
dele. Ele dizia que as pessoas famosas de nosso país estudaram
ali. Eu cheguei em casa depois da escola e fui direto ver a lista das
faculdades que meus pais tinham me dado. E ali estava o
endereço da Rich City. Eu não pensei duas vezes, me arrumei e
entrei no carro em direção a uma cidade rica e longe de casa
cerca de 15 horas. Eu sabia que não ia voltar no mesmo dia. Mas
quem quer conhecer uma faculdade deve passar vários dias ali.
Foi o que eu fiz. Não avisei ninguém até chegar em Rich City. Já
era noite e fui para um dos hotéis do meu pai. Eu teria um grande
trabalho no dia seguinte.
A cidade é maravilhosa. Poucas foram as vezes que a
visitei, mas já conhecia antes. Desta vez eu iria passar mais tempo
e ver no que dava. Eu estava animado com essa ideia de

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O menino do campo – A vida é um desafio

conhecer a cidade, mas ainda não me sentia seguro quanto ter


que escolher uma profissão e principalmente deixar a minha casa.
Eu sabia que não seria pra sempre, mas mesmo assim seria um
passo para um futuro incerto e quem sabe distante de minha
fazenda, de minha terra. Era isso que me assustava, o futuro, algo
que eu não conhecia. Eu liguei para a mamãe.

Mateus: Mãe, estou em Rich City.


Maressa: Filho. O que você faz aí? Eu esperei você para o jantar e
você não aparecia. Corri no seu quarto e você não estava. Achei que estava
fazendo algum trabalho da escola e por isso não me importei.
Mateus: Você já jantou? Está tudo bem comigo.
Maressa: Já filho. Tudo bem. Mas o que você faz aí?
Mateus: Vou conhecer a faculdade Rich City.
Maressa: Como estou orgulhosa de você Mateus. Eu pensei que você
não ia acordar para a vida.
Mateus: Mãe. Não diga isso. Mas agradeço por se orgulhar de mim.
Maressa: Eu te amo. Tenha uma boa noite.
Mateus: Eu te amo. Diga para o papai que eu o amo. Boa noite.

Quando acordei na manhã seguinte estava com um


friozinho na barriga. Esse frio eu sei que é normal sentirmos
quando estamos diante de um desafio ou de uma realidade nova.
Mas não é muito legal senti-lo. Parece que eu ia ficar paralisado,
perder os movimentos, sei lá.
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Paulo Gomes

Eu peguei o meu carro e saí dali até o centro da cidade


onde a faculdade está localizada. A cidade Riqueza é muito linda,
os prédios são altos e luxuosos, as pessoas são rápidas e ágeis.
Andam na velocidade da luz. Todo o cenário político nacional está
assentado ali e o presidente do país mora na cidade, obviamente,
onde fica a sede do governo do meu país. Antes de passar na
faculdade eu conheci a casa do presidente. Realmente é muito
linda, mas o cheiro ou o mau-cheiro da política estava ali. Meu
país enfrenta sérios problemas de corrupção, inclusive o
presidente é alvo de vários escândalos. Mas ele é muito influente e
consegue se livrar de quase todos esses escândalos jogando a
responsabilidade de cada um deles em membros do governo de
inferior escalão. Acho que esse pessoal é subornado para admitir
a culpa, não sei, talvez o presidente dê dinheiro a eles para que
eles confessem algo que não cometeram. Mas eu prefiro ficar na
minha, como a maioria do pessoal do meu país, eu não me
interesso muito por política.
Eu cheguei no meu alvo. Parecia um sonho. Não
imaginava tamanha grandeza de uma universidade. Tantos jovens
chegando ali com seus livros e cadernos e eu no meu mundo
trancado sem conhecer o que é isso. Estacionei o meu carro e
fiquei ali por um bom tempo. Acho que estava com um pouco de

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O menino do campo – A vida é um desafio

medo ou não tinha coragem o suficiente para saber o que ia


acontecer comigo logo depois que eu entrasse ali. Eu não sou
fácil, mas quando algo consegue me cativar a coisa muda. Eu
tinha medo de mudar, eu tinha medo de mudar de ideia, eu estava
com medo de gostar, eu não queria gostar da faculdade, mas
parece que eu já estava gostando. Eu não queria estudar ali, eu só
queria conhecer. Era só para que meus pais não me deixassem
mais aflito. Mas eu mesmo estava me afligindo. Eu desci do carro,
depois de quase uma hora de aflição. Eu nem sei como eu
consegui sair dali. Mas eu sai.
Foram passos lentos até entrar pela porta principal da
Rich City. Aquele pessoal me assustava. Eles pareciam de outro
mundo, mas eram tão normais quanto eu ou eu era tão normal
quanto eles. Aquelas escadas, aquelas portas luxuosas, aquele
pessoal alegre, aquele pessoal com cara de preocupação, tudo
era muito legal, mas ao mesmo tempo um pouco assustador. Eu
fui até a recepção e perguntei onde conhecer os cursos da
faculdade. A moça que me atendeu era muito educada. Eu não
hesitei em elogiá-la pela educação e recepção. Ela abriu um
sorriso muito empolgante. Havia um salão aberto o dia todo na
faculdade com pessoas informando sobre os cursos e sobre a
faculdade no geral. Quando cheguei lá era grande o número de

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Paulo Gomes

pessoas a procura de uma profissão. Eu timidamente entrei no


salão e me perdi no meio de tanta gente. O salão não era
pequeno, era muito grande. Mas ainda assim a multidão superava.
Eu queria algo interessante e fui até o estande dos cursos de
negócios. Acho que era o que poderia me ajudar a conduzir a
fazenda dos meus pais e administrar as empresas deles. Arrisquei
conhecer medicina e engenharia, mas não era bem o que meu
coração pedia. Conversei com alguns estudantes do curso de
negócios e eles me motivaram e me convidaram a conhecer mais
profundamente o curso visitando a faculdade por mais alguns dias.
Naquele dia eu gastei um bom tempo lendo alguns folhetos do
curso, a história, os profissionais que já passaram ali e eram bem-
sucedidos no país. Descobri que o presidente corrupto de meu
país fez aquele curso. Não gosto disso, de chamar um político de
corrupto sem provas, mas ele parece ser corrupto e eu não tenho
culpa de tantos escândalos sobre ele. Enquanto não provarem que
ele não é corrupto continuarei acreditando nos escândalos.
Conversei com alguns professores disponíveis e com o diretor do
curso. Alguns alunos foram muito atenciosos comigo e eu
conversei com vários deles. Já era tarde e eu teria que voltar para
o hotel. No outro dia eu iria continuar com a minha jornada.
Parecia que eu estava mais confiante e tranquilo. Parecia que meu

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O menino do campo – A vida é um desafio

mundo fechado estava se abrindo. Não de uma forma milagrosa


ou mágica, mas de uma forma lenta e dolorosa. Eu ainda tentava
segurá-lo para não cair, mas eu não tinha mais forças para me
esconder de algo que agora eu via que poderia fazer muita
diferença no meu futuro.

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Paulo Gomes

CAPÍTULO 2

INTRODUÇÃO

O nosso coração sempre nos mostra o caminho a seguir.


Apesar de não ser muito confiável acreditar em tudo o que
sentimos, muitas das vezes ele é nossa única saída. Boa parte da
minha vida foi seguir os meus sentimentos, mas aprendi que
também podemos seguir a razão, a lógica, a consciência
inteligente, a verdade que está acima de sentimentos enganosos.
Aprendi ainda que a fé é importante, pois nem tudo o que é razão
nos agrada e nos indica o que fazer. As vezes a razão não faz
sentido, as vezes não queremos acreditar no que vemos e que
vivemos, por isso a fé é importante, pois ele nos faz acreditar
naquilo que não estamos vendo, naquilo que está fora do alcance
da razão. Isso não é loucura. Pode parecer, mas não é. É
simplesmente fé.

TUDO PARECE SER DIVINO

Que cidade perfeita. Eu vim de carro justamente para


conhecê-la melhor. Ao sair da faculdade, já era quase noite. As

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O menino do campo – A vida é um desafio

luzes me chamavam a atenção e naquele momento eu lembrei o


quanto eu gostava da cidade Fazenda e o quanto eu não queria
abandoná-la. Parece que ao ser encantado pela beleza da Rich
City eu estava traindo a minha terra. Foi uma sensação chata e eu
não queria mais sentir aquilo. Aquele prédio, era uma empresa
famosa no meu país, não lembro o nome agora. Era maravilhoso.
Dizem que foi obra do maior arquiteto do mundo. Era encantador.
Tem mais de sessenta pisos, as luzes à noite, brilham em um
compasso perfeito, a mesma sensação que sentimos ao ouvir uma
bela música, a mesma sensação ao assistirmos um show de
música da banda que mais gostamos. Era o Rich Palace, onde
ficava a Fortune, a maior empresa financeira do mundo, lembrei.
Eu não hesitei e entrei num restaurante daquele prédio. Eu fiz
minha refeição ali, dei uma volta nos pisos da empresa e voltei pra
casa. Foi muito legal.
Quando cheguei no hotel meu pai estava no telefone da
recepção e queria falar comigo. Eu pedi que a ligação fosse
transferida para o meu apartamento.

Juan: Mateus, boa noite, filho.


Mateus: Oi, pai. Como você está?

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Paulo Gomes

Juan: Estou feliz. Meu filho está se interessando por uma profissão.
Agora eu posso ficar tranqüilo quanto ao futuro de nossos negócios e quanto ao
teu futuro naquilo que você decidir escolher.
Mateus: Que bom, pai. Eu tenho aproveitado muito estar aqui. Muita
coisa bonita e parece que eu nasci hoje e conheci o mundo hoje. Acho que
passei muito tempo distante da vida urbana.
Juan: Agora eu fico tranquilo. Mas você sempre teve oportunidades
para isso. Você apenas se fechava e isso me deixava preocupado. Eu e sua
mãe estamos muito alegres quanto a sua decisão. Você está precisando de
dinheiro, de alguma coisa?
Mateus: Não pai. Estou bem, eu tenho algumas economias em minha
conta. Não se preocupe com isso. Eu não estou gastando muito, estou em um
de nossos hotéis.
Juan: Boa noite, Mateus. Até a volta.
Mateus: Boa noite, pai. Eu volto no final de semana. Eu te amo, pai.
Juan: Também te amo, Mateus.

Eu estava muito cansado naquela noite. Fazia muito


tempo que eu não viajava assim e pareceu minha primeira viajem.
Na verdade era minha primeira viajem sozinho em meu carro.
Antes eu viajava com meu motorista, claro, eu não tinha
habilitação. No meu país com dezesseis anos as pessoas já
podem dirigir carro. Faz um ano que tenho habilitação, mas nunca
tinha saído de minha cidade sozinho antes. O dia foi intenso, tão
intenso que quando me joguei na cama eu apaguei por completo e
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O menino do campo – A vida é um desafio

quando fui dar conta da vida já eram dez da manhã e eu já estava


atrasado para reiniciar a minha busca.
O caminho da faculdade já parecia familiar. A porta
principal parecia a porta de uma das empresas de meus pais e eu
entrei lá como se estivesse ali por muitos anos. Mas o frio na
barriga não saia de mim. Neste dia eu assisti algumas palestras
sobre o curso de negócios. Alguns professores falavam sobre
temas relacionados à gestão de empresas, à responsabilidade
social, lucros, investimentos e muita coisa que eu já tinha noção
na prática pela experiência com a administração da fazenda do
meu pai e coisas que simplesmente são rotineiras, fazem parte de
nossa vida. No intervalo das palestras eu fui ao restaurante da
faculdade para almoçar. Estava lotado e eu tive que sentar na
mesa com uma garota. Eu pedi licença e ela deixou que eu
sentasse com ela. Ainda não tinha reparado, mas ela era muito
bonita. Eu fui perceber isso quando ela perguntou o meu nome e o
que estava fazendo na Rich City. Eu disse que estava a procura
de informações sobre o curso de negócios e que estava
interessado em me inscrever para o primeiro ano. Ela disse que
era uma coincidência, pois no meio de tantas pessoas, nós dois
sentamos no mesmo lugar e que tínhamos interesses iguais.

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Paulo Gomes

Mateus: Como é seu nome?


Amanda: Eu me chamo Amanda. Amanda Matthew. Como o seu
nome. Só que o meu é sobrenome.
Mateus: Que legal. Quer dizer que seremos colegas de classe.
Amanda: Espero que sim. Estou ansiosa para o ano acabar.
Mateus: Amanda, na verdade eu estou ainda em dúvida. Eu não sei
se quero isso para mim.
Amanda: Porque não? Isso se trata de futuro. Você não pode ter
dúvidas, Mateus.
Mateus: Esse é o meu medo. O futuro.
Amanda: Realmente, o futuro sempre nos dá medo. Mas não
esquenta. Você vai mudar de ideia. Eu tenho certeza. Acho que ninguém
recusaria a Rich City.
Mateus: Você mora aqui mesmo?
Amanda: Claro. Eu sou daqui. Por acaso você é de outro lugar?
Mateus: Eu sou da cidade Fazenda.
Amanda: Incrível. Eu tenho alguns amigos lá. Mas é muito distante
daqui.
Mateus: Simplesmente é o fim do mundo.
Amanda: Nem tanto. A tua cidade é muito falada.
Mateus: Muito mal falada.
Amanda: Eu não vou mentir. Realmente a cidade Fazenda não é
agradável para seres urbanos como eu.
Mateus: Estou acostumado com essa conversa. Mas lá é meu doce lar
e não deixo por nada.
Amanda: Descobri o seu problema.
Mateus: É. Qual é?
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O menino do campo – A vida é um desafio

Amanda: Você parece ser daqueles caras apegados com fazendas,


com a vida rural. Estou certa?
Mateus: Absolutamente.
Amanda: É Mateus. A conversa está ótima, mas acho que temos que
voltar para as palestras.

Eu não sei o que sentia naquele momento, mas a Amanda


me fez sentir algo diferente. Ela parecia ser tão linda, tão perfeita e
tão atraente. Ela era tão popular, tão amigável e isso me deixava
tão empolgado para querer conhecê-la melhor. Fomos juntos até o
auditório onde estava acontecendo a palestra. Eu ia falar com ela
quando aparece um garoto em nossa direção e a beija. Eu não
acreditei no que via. Acho que não queria acreditar, mas a
Amanda tinha um namorado. Eu não sei qual era a razão de estar
pensando sobre isso, afinal de contas ela não era nada para mim
e eu muito menos para ela. Apenas tivemos uma conversa rápida,
momentânea, casual e circunstancial.

Amanda: Oi meu amor. Já sabe o que vai fazer?


Malcon: Ainda não, Amanda. Mas logo, logo vou descobrir.
Amanda: Olha só quem conheci. O Mateus é da cidade Fazenda. Ele
está com dúvidas, mas pelo menos já escolheu um curso.

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Paulo Gomes

Malcon: Oi Mateus. Um prazer enorme falar com você. Eu conheço


um pessoal de lá. Eu visitei a cidade há menos de uma semana. Meu pai é dono
de umas fazendas por lá. Eu me chamo Malcon.
Mateus: O prazer é meu Malcon. Acho que no meio de tantos cursos é
normal ter dúvidas.
Malcon: Mas eu vou me achar. Não esquenta. Entrem que o professor
ali já está discursando.
Amanda: Até logo Malcon. Não esquece que eu vou com você.
Malcon: Ta meu amor. Até logo Mateus.
Mateus: Até logo.

Os dois pareciam ser levemente felizes em sua relação.


Mas algo me incomodava neles. Não sei dizer o que era. Mas, o
que mais me incomodava é que em tão pouco tempo eu estava
gostando de Amanda e não fazia o menor sentido. Acho que não
fazia mesmo. Ela era de Rich City, era popular, era extrovertida e
eu era um caipira, tímido e cheio de dúvidas. E o pior, ela tinha um
namorado. Ele parecia ser o inverso de mim, apesar de estar em
dúvida quanto ao que fazer. Ela jamais deixaria o Malcon por mim,
jamais olharia pra mim como ela olhava pra ele. Eu não sei quais
eram as razões que estes pensamentos habitavam a minha
mente, mas eram perturbadores. Eu me sentei perto dela. Nós não
demos uma palavra até o fim da palestra. Quando a palestra
terminou, eu disse a ela que poderíamos nos encontrar no outro
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O menino do campo – A vida é um desafio

dia. Ela concordou de uma forma tão simples e tão acolhedora que
o meu coração confiou que as coisas poderiam dar certo entre nós
dois. Não para um namoro impossível, mas para uma amizade
promissora.
A Amanda foi algo imprevisível que aconteceu comigo.
Mas ela me transformou de uma certa forma. Eu não sei explicar,
mas foi divino. Eu jamais havia conhecido alguém tão especial. Eu
jamais havia pensado que na busca de um curso eu poderia me
deparar com um sentimento como o que estava se passando
dentro de mim. Se por um lado eu não queria entrar na faculdade
para não deixar minha vida pacata e tranqüila, por outro eu queria
conhecer Amanda mais de perto e para isso eu teria que me
inscrever no curso.
Eu voltei para o hotel naquela tarde, mas ainda havia
dúvidas no meu coração. O que eu poderia fazer era pouco, era
apenas me inscrever. Mas esse pouco era muito pra mim naquele
momento. Eu não fui até Rich City para sair mais cheio de dúvidas,
eu fui apenas para aliviar minha aflição. Meus pensamentos me
deixavam aflito naquela tarde. O que eu fiz. Eu deixei minha
cidade na procura de uma faculdade que eu não queria a principio.
Será certo o que fiz? Eu traí o meu próprio eu? Eu traí a minha

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Paulo Gomes

vida, a vida que estava acostumado a viver? Era complicado pra


mim.
Eu não aguentei e dormi o final da tarde. Eu acordei era
quase meia noite, mas eu precisava me alimentar. Eu desci até o
restaurante e comi um pouco. Eu não acreditei no que estava
vendo naquela hora da noite. No restaurante do meu pai. Era a
Amanda e o Malcon. Eles estavam sorrindo e conversando. Eu
não tive coragem de me aproximar, mas a Amanda me viu de
longe e veio até a minha mesa.

Amanda (Sorrindo): Você está me seguindo?


Mateus (Sorrindo): Claro que não. Mas seria um grande prazer te
seguir.
Amanda: Venha. Sente-se comigo e com o Malcon. Ele não fica bravo.
Mateus: Não quero incomodar vocês.
Amanda: Que nada, Mateus. Vem, a gente precisa conversar mais. A
gente precisa se conhecer. Afinal seremos amigos.

Eu não me atrevi a rejeitar o convite e timidamente a


acompanhei até a mesa em que estavam. O Malcon não me olhou
como eu pensava que me olharia, mas foi extremamente educado
a ponto de se levantar e apertar a minha mão. Ele parecia aquele
cara que não tem ciúmes da namorada. Pelo menos ele parecia.

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O menino do campo – A vida é um desafio

Malcon (Sorrindo): Mateus. O que você faz a essas horas fora de


casa? Você é só uma criança.
Mateus: Não estou fora de casa na verdade. Este hotel é do meu pai e
estou aqui até amanhã. No sábado eu volto pra casa. E vocês, são tão crianças
quanto eu. Já é quase meia noite e estão num restaurante para adultos ricos.
Amanda: Não se preocupe, estamos seguros. Temos um guarda-
costas nos protegendo.
Malcon: Não pense mal de mim, Mateus. O guarda-costas é só para a
Amanda. A mãe dela não confia em mim.
Amanda: Não seja tão certo no que você fala, Malcon. A minha mãe
não concorda que namoremos, mas não quer dizer que ela não confie em você.
Malcon: Se não fosse o Juan Matthew, eu não teria essa linda garota
ao meu lado, Mateus.
Mateus: Seu pai é Juan. O meu também se chama Juan.
Amanda: Temos mais uma coisa em comum. Que legal.
Mateus: E você já decidiu o que fazer?
Malcon: Eu estava pensando e acho que vou fazer o que a minha
namorada escolher.
Mateus: Ótimo. Estou feliz por ter se decidido. Eu estou um pouco
aflito ainda. Não sei se vou ter coragem de deixar a minha cidade.
Malcon: Você é rico. Com certeza tem um jatinho particular e pode ir e
vir, sem necessidade de morar aqui.
Mateus: Não faria sentido. Não seria a mesma coisa. Eu teria que sair
de lá do mesmo jeito e ficaria cansado de tanta viajem.
Amanda: Mas você tem mesmo um jatinho particular?
Mateus: Parece que não, mas tenho um. Acabei de ganhar do meu pai
como presente de aniversário.
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Paulo Gomes

Amanda: Meu pai nunca me deu um presente como esse. Que


sensacional.
Mateus: Quando ganhei eu já sabia que era pra vir pra cá. Mas caso
eu decida mesmo, eu não vou ir e vir de jatinho. Eu vou morar aqui.
Malcon: É uma ótima ideia. Quer dizer, caso você decida.
Amanda: Seria muito legal sermos amigos. Não é verdade Malcon?
Malcon: Claro, Mateus. Você é gente boa.
Mateus: Obrigado, pessoal. Vocês são muito gentis. Mas agora tenho
que ir. Estou morrendo de sono. Amanhã a gente se vê por lá.
Amanda: Até amanhã.
Malcon: Até amanhã.

Eu achei demais conversar com eles. Mas achei melhor


ainda estar ao lado da Amanda e poder sentir o cheiro do seu
perfume. Quando ouvi que a mãe dela não concordava com o
namoro dos dois eu me reanimei. Não que eu torcesse para que o
namoro deles acabasse, mas aquilo de uma certa forma me trouxe
esperança. De alguma forma eu achava que eles não nasceram
um para o outro e talvez eu fosse o cara certo pra ela. Eu dormi
mais tranqüilo, porém, alguma coisa me incomodava, talvez o fato
de vê-la apaixonada pelo Malcon e eu começando a gostar dela.

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O menino do campo – A vida é um desafio

O MENINO DO CAMPO
A vida é um desafio
Vol. I
2009

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Edição 2017

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Paulo Gomes

27
O menino do campo – A vida é um desafio

28

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