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Bluebook 21st ed.


Oswaldo Trigueiro, A Crise do Sistema Eleitoral Brasileiro, 6 Revista Brasileira
Estudos Politicos 102 (1959).

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Oswaldo Trigueiro, A Crise do Sistema Eleitoral Brasileiro, 6 Revista Brasileira
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Oswaldo Trigueiro, "A Crise do Sistema Eleitoral Brasileiro" (1959) 6 Revista
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Oswaldo Trigueiro, 'A Crise do Sistema Eleitoral Brasileiro' (1959) 6 Revista
Brasileira de Estudos Politicos 102

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Trigueiro, Oswaldo. "A Crise do Sistema Eleitoral Brasileiro." Revista Brasileira de
Estudos Politicos, 6, 1959, pp. 102-110. HeinOnline.

OSCOLA 4th ed.


Oswaldo Trigueiro, 'A Crise do Sistema Eleitoral Brasileiro' (1959) 6 Revista
Brasileira Estudos Politicos 102 Please note: citations are
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A crise do sistema eleitoral brasileiro
OswALDo TRiGuEmo

DESDE a Revolução de 1930 - que, entre outras cousas, nos


prometeu eleições livres e honestas - tivemos oito pleitos
nacionais realizados pelo voto secreto e sob o contrôle da jus-
tiça eleitoral. Em todos, salvo o de 1955, elegemos órgãos le-
gislativos, federais e estaduais, pelo sistema da representação
proporcional. Neste quarto de século, é incontestável que as
nossas eleições vêem melhorando gradualmente, graças a repe-
tidas reformas .na legislação e à experiência acumulada da
justiça eleitoral. As do ano passado foram muito melhores
que as de 1933. Elas se processaram após completa revisão do
alistamento e decorreram em perfeita normalidade. A bem
dizer, não se falou em violência, nem em fraude, salvo esporà-
dicamente e em áreas tão limitadas que a veracidade do pro-
nunciamento popular de nenhum modo foi afetada. A fôrça
federal quase não teve utilização e a pouca que teve foi simbó-
lica, pois, até em Alagôas, o pleito correu tranqüilamente.
As nossas eleições se processam por um método moroso,
complicado e caro, mas êste método nos oferece, sob o aspecto
formal, eleições realmente livres e honestas, tão boas quanto
as melhores da América Latina. Entretanto, ninguém se mos-
tra satisfeito com o estilo de nossas campanhas, e muito me-
nos com o resultado delas. Não é novidade falar-se em crise
das nossas instituições, porque nós nunca estamos satisfeitos
com o seu funcionamento. Mas a verdade é que elas passam
atualmente por uma crise multiforme - crise da federação,
crise do presidencialismo, crise financeira, crise dos partidos,
crise do sistema representativo - no sentido de que as cousas
A CRISE DO SISTEMA ELEITORAL BRASILEIRO

funcionam pior do que antes e chegaram a um ponto crucial,


de onde não sairemos sem modificações de certa profundidade.
Seria simplista, e mesmo errôneo, atribuir todos os nossos
males políticos a deficiências ou vícios no processo legal de
recrutamento dos governantes. Poucos duvidam, porém, que
no presente sistema eleitoral está o ponto mais vulnerável das
instituições e que, portanto, a crise dêste sistema é predomi-
nante. Sentimos todos que as eleições, apesar de honestas e
livres, não são genuínas e estão mesmo se transformando num
foco de infecção que pode reclamar tratamento cirúrgico.
A repetição dos pleitos, cada vez mais freqüentes por causa
da inco.ncidência dos mandatos, e a proliferação dos partidos,
cada vez mais enfraquecidos pela falta de disciplina e pela
babel das coligações, tornam difícil, senão impossível, todo
govêrno estável, coerente e construtivo. Sobretudo, corre di-
nheiro demais na política, o que está dando às nossas lutas
cívicas um clima de licenciosidade incompatível com a boa
reputação da República.
Êste problema não existe apenas na imaginação dos incon-
formados ou dos descontentes. Êle está sendo focalizado pelos
homens de maior responsabilidade do govêrno e na política -
governadores, ministros, chefes de partido - cuja autoridade
é insuspeitável para essa constatação. Ainda às vésperas do
último pleito, o Ministro da Justiça, em declarações à impren-
sa, afirmou que, em certos Estados, candidatos à deputação
gastaram quatro e cinco vêzes mais do que vão perceber em
subsídios no curso do mandato, na hipótese de serem eleitos.
, sab:do que em nenhuma parte do mundo se faz eleição
sem dinheiro. Além das despesas de caráter oficial, pagas
pelo erário, há as variadas despesas dos partidos, dos candi-
datos, das organizações cívicas, dos grupos de pressão. Mas,
entre nós, estas despesas são pràticamente ilimitadas e estão
assumindo proporções astronômicas. Não haverá exagêro em
dizer-se que as nossas eleições são, comparativamente, as mais
caras do mundo. Para demonstrá-lo basta considerar-se que,
num eleitorado de quinze milhões, cêrca de cinqüenta por cento
- particularmente nas áreas rurais dos Estados subdesenvol-
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vidos - têm que ser transportados, alimentados e às vêzes


vestidos, para poderem votar, tudo a expensas dos partidos.
Trata-se de uma verdadeira mobilização de seis ou sete milhões
de pessoas, a qual deve custar, sòmente no dia do pleito, um
bilhão de cruzeiros. No que diz respeito a despesas individuais
dos candidatos - propaganda pela televisão, pelo rádio, pela
imprensa, por meio de difusoras e de boletins, etc. - a esti-
mativa dos gastos não será menos surpreendente.
Em suma, o que se pode afirmar como certo é que hoje,
na quase totalidade dos Estados, a eleição de um senador, de
um deputado ou de um vereador, custa mais do que qualquer
dêles vai receber em subsídios. Êsse tremendo ônus é supor-
tado pelo próprio candidato, pela família, pelos amigos ricos,
pelas organizações econômicas a que êle pertence ou a que
está de algum modo vinculado. Apesar de absurdas, essas des-
pesas são geralmente tidas como lícitas e confessáveis, se bem
que os nossos partidos nunca divulguem a origem das contri-
buições que recebem. O pior, porém, é que, com o crescimento
do volume do dinheiro em circulação na política, começa a
gerar-se uma atmosfera de suspeita, em face de acusações de
que parte dêsse dinheiro provem de fontes públicas, de onde
sai por processos que não honram a prática da democracia.
Como se sabe, existe mesmo uma Comissão Parlamentar de
Inquérito incumbida de proceder à investigação de fatos sinto-
máticos dessa forma de corrupção. 2 possível que não pas-
semos do terreno da suspeita, mas esta, por si só, é capaz de
envenenar todo o ar que se respira em nossa vida pública.
Sem dúvida, êsse estado de cousas resulta de muitas cau-
sas, principalmente de natureza moral, ou decorrentes de limi-
tações de nossa formação cívica e de nosso atraso econômico.
2 inegável, porém, que essa conjuntura é em grande parte
fruto de um sistema eleitoral aceitável em teoria, mas compro-
metido na prática por demasias, falhas ou deturpações visíveis
a olho nú. Tal como entendida e praticada no Brasil, a repre-
sentação proporcional responde pela maior parte das culpas
por uma situação que ameaça a própria sobrevivência da
Constituição.
A CRISE DO SISTEMA ELEITORAL BRASILEIRO 105

A representação proporcional tem merecido, por longo


tempo, as preferências da doutrina política e a opção dos re-
formadores, na Europa Ocidental e em alguns países da Amé-
rica Latina. Ela é em princípio um sistema ideal, porque en-
contra a maneira de distribuir a representação política equi-
tativamente, por todos os partidos, na medida da expressão
eleitoral de cada um. Mas as lições da experiência não abonam
nem confirmam as esperanças que o sistema à primeira vista
suscita.
Em primeiro lugar, porque ela infalivelmente conduz à
multiplicidade dos partidos. Em tese isso não é um mal e a
multiplicidade pode decorrer de contingências naturais da vida
política. Mas a verdade é que ainda não se descobriu o se-
grêdo do bom govêrno através de dez ou de vinte partidos.
Não é sem boas razões que os ingleses, inventores da repre-
sentação popular e criadores do govêrno partidário, são refra-
tários ao proporcionalismo. E não sômente os ingleses da
matriz britânica, e sim também os que criaram, em outras ter-
ras, novas democracias - Estados Unidos da América, Ca-
nadá, Austrália, Nova Zelândia - países onde o regime demo-
crático tem demonstrado maior estabilidade e onde tem obtido
êxito insuperável. Em nenhum dêles jamais se experimentou
a representação proporcional, não havendo a menor probabi-
lidade de que se venha a modificar o sistema tradicional de
círculos de representação uninominal majoritária.
A própria experiência da Europa não tem o valor que lhe
é atribuído. Não é pequeno o número dos que pensam, como
o professor HERMES, que ali a representação proporcional foi
o cavalo de Tróia da democracia. Em seu conhecido livro
"Democracia ou Anarquia", estudou êle detidamente a situação
da democracia européia, entre as duas grandes guerras, e ob-
servou que, até 1939, ela sobreviveu apenas em 8 pequenos
países (Irlanda, Bélgica, Países Baixos, Suíça, Dinamarca,
Suécia, Noruega e Finlândia), com um total de 40 milhões de
habitantes. Mas, em dez países que totalizavam 200 milhões
de habitantes (Itália, Alemanha, Áustria, Polônia, Letônia,
Lituânia, Estônia, Bulgária, Grécia, Iugoslávia e Checoslová-
quia) a democracia soçobrou devido, em grande parte, à
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decomposição dos partidos, gerada pela representação pro-


porcional. A êsse respeito convém lembrar a experiência da
França, que adotou a representação proporcional na Consti-
tuição de 1946. Uma das reformas anunciadas pelo novo re-
gime, nascido com o referendum de 28 de outubro, é o re-
tôrno à representação por distritos individuais, que predo-
minou na Terceira República, exatamente o regime político
de maior estabilidade e duração que a França teve desde
1789. O exemplo francês admite, assim, que a representação
proporcional foi um dos fatôres da anarquia partidária e da
desordem parlamentar, que provocaram a presente trans-
formação.
Quanto ao Brasil, conhecemos o primeiro fruto da repre-
sentação proporcional: num país de débil tradição partidária,
onde nem sequer havia partidos nacionais, ela de chôfre criou
uma dúzia dêles. Ora, sem falar no Partido Comunista, que
não tem existência legal, sômente o Partido Socialista apre-
senta uma nítida diversificação ideológica. Entre os demais
inexiste diferença fundamental de princípios ou do programa.
Os programas fàcilmente se confundem e de resto ninguém
os lê. De modo que, entre nós, a lei divide a representação
do povo entre grupos artificiais, que de nenhum modo repre-
sentam setores diferenciados de opinião, de pensamento ou
de aspirações políticas. Pode-se dizer que, de certo modo,
a nossa representação proporcional é uma máquina que tra-
balha no vácuo.
Agrava-se o problema entre nós porque a representação
proporcional teve os seus defeitos exacerbados por inovações
e deturpações que terminarão por anular tôdas as vantagens
que dela deveriam provir. Não é acertado dizer-se que o que
existe de sério e de bem em nosso sistema eleitoral se deve
à adoção do proporcionalismo. Nossas eleições são formal-
mente satisfatórias por causa do voto secreto e do contrôle
judiciário, cousas que não são exclusivas nem características
da representação proporcibnal. O que esta trouxe foi o gran-
de número de partidos, o que de boa fé ninguém pode con-
siderar como um benefício.
A CRISE DO SISTEMA ELEITORAL BRASILEIRO

Como disse o Professor HERMES LIMA, um dos mais lú-


cidos observadores de nossa vida política, a representação
proporcional entre nós conseguiu até piorar o presidencia-
lismo, o que não é dizer pouco. Porque, com efeito, o grande
número de agremiações partidárias, que produziu certa par-
lamentarização do regime, no pior sentido do têrmo, trou-
xe-nos a esta situação de perda de autoridade política e au-
sência de comando governamental, características do presi-
dencialismo fraco que estamos paradoxalmente experimen-
tando. Por outras palavras, a representação proporcional, pela
multiplicação dos partidos, agravou os defeitos do presiden-
cialismo e tornou inefetivas as suas poucas virtudes.
O maior mal do proporcionalismo brasileiro está no voto
preferencial. Na Europa continental predomina o sistema das
listas rígidas ou bloqueadas, graças ao qual os candidatos são
eleitos na ordem de inscrição pelos respectivos partidos.
Em outros países o eleitor vota apenas na legenda; a designa-
ção dos eleitos é feita depois pelos partidos. Entre nós, vo-
ta-se ao mesmo tempo na legenda e num candidato preferen-
cial, e os eleitos são os individualmente mais votados. nl um
sistema que leva ao enfraquecimento e à anulação dos par-
tidos, que apresentam candidatos mas não asseguram a elei-
ção de qualquer dêles. Daí têrmos uma política que se torna
cada vez menos partidária e cada vez mais individualista.
O candidato a mandato legislativo só precisa que o partido
lhe dê um lugar na chapa, o que é fácil quando há tantos par-
tidos e as chapas têm mais nomes do que mandatos a pre-
encher. Tudo o mais depende do voto individual, que nenhum
partido controla. Cada candidato cuida apenas de si, trabalha
apenas para obter votos para o seu nome e gasta, exclusiva-
mente, no interêsse de sua votação pessoal.
Em resumo, pois, a situação assim se apresenta: a repre-
sentação proporcional criou a multiplicidade partidária e o
voto preferencial anulou a ação dos partidos, cuja, influência
decresce todos os dias. As conseqüências resultantes são as
que vemos: o poder executivo debilita-se, porque êle só pode
ser conquistado por meio de alianças heterogêneas e só pode
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ser exercido ao preço de transigências prejudiciais à boa


administração. 0 poder legislativo também se ressente disso,
porque não obedece a qualquer comando político, nem do go-
vêrno nem dos partidos. O Congresso é um corpo de repre-
sentantes do povo, sem dúvida legitimamente eleitos e que
expressam, como sempre ocorreu, as qualidades e os defeitos
de nossa mentalidade política. Porém é um corpo legislativo
que perdeu os apoios tradicionais - do govêrno federal, dos
govêrnos estaduais, dos partidos - sem que em compensação
se tenha tornado mais forte no aprêço público. Por isso êle
se tornou mais vulnerável às influências demagógicas e aos
grupos de pressão. Não admira, assim, que o Congresso se
torne cada vez menos legislativo, no verdadeiro sentido, e cada
vez mais administrativo, dada a crescente ingerência parla-
mentar na área do govêrno, através da elaboração do orça-
mento, da distribuição de subvenções e auxílios, e de inicia-
tivas de tôda espécie no campo dos empreendimentos públicos.
De tal sorte que, hoje, o bom congressista já não é o que
critica ou o que defende a política do govêrno, o que se
dedica à elaboração das leis ou ao estudo dos problemas e
das reformas políticas. É, muito diversamente, o que controla
as nomeações de uma autarquia ou de um setor da adminis-
tração, o que distribui melhor os auxílios e as subvenções,
o que se revela mais eficiente em incluir no orçamento ver-
bas para serviços e melhoramentos em seu território parti-
dário. A administração federal vai assim tomando aspectos
de um grande condomínio, de que o Presidente não é mais
do que um síndico atribulado.
Diante dêste quadro, é explicável que todos - a come-
çar pelos políticos, que estão pagando muito caro o poder
que desfrutam - estejam insatisfeitos com o funcionamento
do regime e clamem por algumas reformas radicais. Em pri-
meiro lugar, existe um pensamento de reforma mais profunda
da própria Constituição, o que já foi mesmo objeto de ini-
ciativa governamental, aparentemente frustrada. No plano
eleitoral essa reforma deveria suprimir a representação pro-
porcional, substituindo-a pelo sistema dos círculos indivi-
A CRISE DO SISTEMA ELEITORAL BRASILEIRO

duais, que permitiria mais justa distrbuição geográfica da


representação popular - cousa de grande importância num
país da extensão continental e das desigualdades sociais do
Brasil - e que poderia dar às nossas instituições raízes tão
sólidas quanto as que sustentam o govêrno popular no mundo
anglo-saxão.
Em segundo lugar, há uma corrente reformista mais
moderada e cautelosa, que acha não ser preciso tocar na Cons-
tituição, nem abolir a representação proporcional, que não
deve responder por todos os defeitos da nossa imaturidade
política. Segundo esta, a prática do regime melhoraria con-
sideràvelmente se adotássemos algumas providências de legis-
lação ordinária, como a proibição das alianças partidárias e
a supressão do voto preferencial. A primeira tornaria a re-
presentação proporcional mais genuína e mais conforme ao
espírito da Constituição, livrando-a da prática de coligações
que a opinião pública vê com desfavor e que, afinal de con-
tas, falseiam o próprio princípio da proporcionalidade. A se-
gunda teria o mérito de tornar as eleições muito mais baratas,
pela eliminação da propaganda individual. Os eleitores vo-
tariam apenas nas legendas e as eleições teriam a função
de distribuir os mandatos pelos partidos. Mas a êstes ca-
beria escolher, dentre os seus correligionários, os que deve-
riam exercer os mandatos conquistados. Essa escolha seria
feita pelas convenções, sob o contrôle da justiça eleitoral, com
as mesmas cautelas usadas atualmente no processo das elei-
ções. Quando êsse método não suprimisse por completo as
possibilidades de corrupção, parece certo que êle não só daria
aos partidos a disciplina indispensável ao papel que a Cons-
tituição lhes atribui, como reduziria enormemente a influên-
cia do dinheiro nas campanhas eleitorais.
Estas reformas são evidentemente necessárias e, quer
numa quer noutra hipótese, poderiam ser levadas a efeito
sem dificuldades de técnica jurídica, e sem resistências da
opinião pública. Em tese nada se opõe ao seu êxito e já
ninguém discute a sua oportunidade. Infelizmente, porém, não
pudemos ter muitas ilusões quanto à viabilidade de iniciativa
dessa natureza, porque na prática ela é extremamente difícil.
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A reforma constitucional é quase impossível porque de-


penderia do acôrdo de todos os partidos, cousa irrealizável
em relação a pontos fundamentais, neoessàriamente contro-
vertidos. A reforma aprovada sob o Govêrno Bernardes só
foi conseguida a duras penas, apesar do estado de sítio e
da disciplina parlamentar do Congresso, onde havia apenas
oito oposicionistas improvisados. Em 1935 a reforma só foi
possível porque representou uma reação imediata à revolta
comunista e o Congresso deliberou naturalmente em função
da conjuntura militar.
A simples modificação da lei eleitoral, por sua vez, não
oferece grandes probabilidades. Tudo faz crer que o Govêrno,
já em declínio para o ocaso, terá menor influência na pró-
xima legislatura do que teve na atual. Isoladamente nenhum
partido está em condições de promover qualquer reforma.
Resta a hipótese de um acôrdo entre os maiores partidos. Mas
êste acôrdo encontraria resistências irredutíveis, principal-
mente dos pequenos partidos que, até por instinto de con-
servação, combateriam qualquer inovação que pudessem sa-
crificá-los.
Em conclusão, as reformas em vista apresentam o ab-
surdo de serem tão indispensáveis quanto impossíveis. Dêste
impasse o que infelizmente resulta é esta situação de desen-
canto e desesperança, que vai solapando as instituições na
estima do povo. Sem dúvida é preciso reformar, mas ninguém
acredita numa reforma prudente, normal e de cunho jurídico,
que seria um motivo de glória para a nossa democracia.
Então, a tendência é para nos entregarmos a êsse fatalismo
latino-americano, que infelizmente prefere esperar as solu-
ções salvadoras, que não sabemos obter sem sacrifício da
ordem democrática.

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