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Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro 347

Segunda Câmara Civel

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004840-25.2017.8.19.0011


APELANTE: ESTADO DO RIO DE JANEIRO
APELADOS: FABIO SANTANA DA COSTA E OUTRO
RELATOR: DESEMBARGADOR ALEXANDRE FREITAS CÂMARA

Direito Administrativo. Responsabilidade civil do Estado.


Responsabilidade objetiva por omissão. Art. 37, § 6º, da CR.
Queda de motocicleta pelo apelado em razão de buracos na
via pública. Conjunto probatório que corrobora a dinâmica
dos fatos alegados pelo apelado. Dever do recorrente de
promover a manutenção das vias públicas. Dano material e
extrapatrimonial configurados. Existência de nexo de
causalidade entre a conduta omissiva e os danos. Valor do
dano material fixado em R$ 5.000,00 que é adequado para o
caso concreto e está em consonância com a jurisprudência
deste Tribunal. Recurso desprovido.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos do recurso em epígrafe.

ACORDAM, por unanimidade de votos, os Desembargadores que

compõem a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro

em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do Desembargador

Relator.

Des. ALEXANDRE FREITAS CÂMARA


Relator

Segunda Câmara Cível


Rua Dom Manuel, nº 37, sala 519, Lâmina III
Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP: 20010-010
Tel: + 55 21 3133-5178 – E-mail: 02cciv@tjrj.jus.br
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ALEXANDRE ANTONIO FRANCO FREITAS CAMARA:30745 Assinado em 09/08/2021 17:53:05
Local: GAB. DES ALEXANDRE FREITAS CAMARA
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Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou parcialmente

procedente o pleito autoral para condenar os réus, solidariamente, a pagarem

quinhentos e cinquenta reais à parte autora a título de danos materiais, corrigidos

monetariamente desde a data do desembolso e com juros de 1% ao mês a contar da

citação, bem como ao pagamento de cinco mil reais para compensar os danos

extrapatrimoniais sofridos pelo autor, acrescidos dos consectários legais.

Em seu recurso, o Estado alega não haver responsabilidade civil do

Estado pelos danos que o apelado alega ter sofrido. Afirma não haver comprovação de

que os fatos se deram exatamente como narrados pelo recorrido. Aduz que apenas a

apresentação de fotografias não é suficiente para caracterizar a veracidade das

alegações do apelado. Argumenta, ainda, ser inviável exigir do segundo réu que se

mantenha estradas de grande tráfego, principalmente de caminhões, sem buraco

algum, eis que estes aparecem de repente, mesmo com constante manutenção do

asfalto. Aduz que mesmo que se admita que o acidente se deu no local e do modo

descrito pelo apelado, o fato de ele ter perdido o controle da direção não induz à

responsabilidade civil do Estado pelos danos que ele sofreu. Defende não haver nexo

de causalidade entre o “dano sofrido” e qualquer facere ou non facere de ente público.

Afirma que a manutenção da condenação em dano extrapatrimonial configura

enriquecimento sem causa do recorrido. Com base na eventualidade, pleiteia a redução

do valor do dano extrapatrimonial arbitrado.

Foram apresentadas contrarrazões recursais pelo demandante

prestigiando o julgado.

O Município não apresentou contrarrazões recursais.

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A Procuradoria de Justiça informou não haver interesse ministerial que

justifique a sua intervenção no presente feito.

É o relatório. Passa-se ao voto.

Na sentença, condenou-se os réus ao pagamento de reparação por danos

material e extrapatrimonial devido ao acidente de motocicleta do autor em razão de

buracos existentes na rodovia, restando comprovada a falha na conservação da via

pública.

De início, é de se esclarecer que eventual responsabilidade civil do Estado

é objetiva, com base nos §§ 1º e 3º, do art. 1º, do CTB, verbis:

“Art. 1º O trânsito de qualquer natureza nas vias terrestres do território

nacional, abertas à circulação, rege-se por este Código.

§ 1º Considera-se trânsito a utilização das vias por pessoas, veículos e

animais, isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de

circulação, parada, estacionamento e operação de carga ou descarga.

§ 3º Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito

respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por

danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na

execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam

o exercício do direito do trânsito seguro. “ (sem grifos no original).

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De outro lado, bastaria invocar o disposto no art. 37, § 6º, da Constituição

da República, para que já se tivesse por objetiva a responsabilidade civil do Poder

Público.

Dessa forma, desnecessário aferir se o Estado tinha ciência dos buracos

na rua para que pudesse tomar as providências necessárias. Contudo, para a

configuração da responsabilidade civil objetiva, necessário se faz verificar a ocorrência

do dano e do nexo de causalidade com a conduta, omissiva ou comissiva, do apelante.

Assim, passa-se a analisar se estão presentes os requisitos para a

responsabilização civil do Estado.

Da análise das provas, verifica-se que foi colhido o testemunho de uma

vizinha que o socorreu no dia do acidente, pois passava no local no momento do

acidente. Ela relatou que o apelado caiu de sua motocicleta devido ao buraco na

estrada. Afirmou que a motocicleta ficou bastante danificada, não podendo ser utilizada

logo depois do acidente. Ela disse, também, que é comum a ocorrência de acidentes

no local em questão. Além disso, há fotos dos danos da motocicleta em razão do

acidente, bem como dos dois buracos na estrada onde ocorreu o acidente.

Dessa forma, apesar das alegações do demandado, o conjunto probatório

comprova que o acidente sofrido pela demandante decorreu do fato de ele ter se

desequilibrado ao passar no primeiro buraco, vindo a ocorrer a queda da motocicleta

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em razão do segundo buraco na Estrada do Guriri, no fim da tarde, em 09 de janeiro de

2017,

Além disso, o recorrente não demonstrou que o fato ocorreu por culpa da

vítima, não havendo como responsabilizar o apelado por isso. Aliás, sequer há

sinalização da existência de buraco na localidade do acidente.

Salienta-se, ainda, que o acidente com a motocicleta em via pública

extrapola o mero aborrecimento do cotidiano. Ressalta-se, ainda, que resultou na

impossibilidade de trabalhar até o conserto do veículo automotor, pois o utilizava para

o trabalho. Assim, configurado o dano extrapatrimonial. Ressalta-se que o dano material

com o conserto da motocicleta também resta demonstrado por meio da prova

documental (pasta eletrônica nº 49).

Frisa-se que o primeiro precedente apontado pelo recorrido afastou a

responsabilidade do Estado por atropelamento em rodovia por responsabilidade

exclusiva do condutor que dirigia em excesso de velocidade e sem atenção na

condução. Isso não restou comprovado no presente caso. Já o outro precedente se

refere a atropelamento decorrente de animais na pista, o que não é o caso. Frisa-se ser

hipótese distinta haver animais na pista (evento absolutamente episódico) da existência

de buracos na pista.

Logo, como é dever do recorrente a manutenção das vias públicas, isto é,

manter a estrada em bom estado de conservação, resta configurada a sua omissão

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devido aos buracos na estrada onde ocorreu o acidente. Por conseguinte, preenchidos

os requisitos para a responsabilização civil do Estado, isto é, a sua conduta omissiva,

o dano, material e extrapatrimonial, e o nexo de causalidade entre os dois.

Neste sentido:

AGRAVO INTERNO. RESPONSABILIDADE CIVIL. MUNICÍPIO. BURACO

EM VIA PÚBLICA SEM SINALIZAÇÃO. ART.37, §6º, DA CRFB.

OMISSÃO. FALTA DO SERVIÇO. CULPA ADMINISTRATIVA. DANO

MORAL CONFIGURADO. QUANTUM COMPENSATÓRIO

ADEQUADAMENTE FIXADO. TAXA JUDICIÁRIA. CONDENAÇÃO. Direito

de submeter a decisão ao colegiado. Decisum que deu parcial provimento

ao recurso, na forma do art. 557, §1º-A, do CPC. Verifica-se que a

dogmática administrativa acolhe a teoria da culpa administrativa, cuja

responsabilidade ostenta projeção processual, resultando a exoneração de

possível responsabilidade estatal pelo cumprimento da inversão do ônus

probatório, incumbindo ao Poder Público a produção de prova no sentido

da ocorrência do fato lesivo por culpa da vítima. Mister consignar que, ainda

nesse sentido, a doutrina e a jurisprudência diferenciam a omissão

específica da genérica, sendo que aquela ocorre quando a inércia

administrativa é a causa direta e imediata do não-impedimento do evento,

devendo responder objetivamente por não ter obtido a eficácia que lhe seria

exigida em obstar o resultado danoso. Do contexto probatório, verifica-se

existência de omissão genérica, estando plenamente demonstrado o nexo

causal entre a omissão do Município e o evento danoso, tendo em vista a

má conservação da rua, fato que levou a ocasionar o acidente. As fotos

acostadas pelas autoras às fls. 23/27 e 38, demonstram a precariedade da


pavimentação da estrada em que ocorreu o acidente, na qual se verifica

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quase uma impossibilidade de trânsito de veículos, diante dos inúmeros

buracos na via de rolamento, logo, inafastável a responsabilização do

Município. Dano moral in re ipsa. É evidente que o acidente provocou nas

autoras abalos de natureza moral que devem ser indenizados. Toda a

angústia e tensão vividas pelas apeladas pós acidente, ao ser

encaminhadas ao hospital, configuram sentimentos que ultrapassam a

esfera do mero aborrecimento. Assim, não assiste razão ao Poder Público

quando rechaça a sua existência ou pleiteia a redução da verba

compensatória. Finalmente, deve-se considerar para fins de fixação do

dano moral, a intensidade da lesão, as condições socioeconômicas do

ofendido e de quem deve suportar o pagamento dessa verba

compensatória. É de ser considerado que a imposição dessa verba tem

como fundamentos o princípio da mitigação da dor, e do sentido didático

da condenação, mostrando-se razoável, portanto, o valor de R$ 8.000,00

(oito mil reais) arbitrado na sentença ora guerreada. Custas e taxa

Judiciária. Quanto às custas, face à isenção legal, fica isento o Município

do seu pagamento, ressalvada a taxa judiciária, a qual deve ser paga por

ambas as partes. Inteligência do Verbete nº 145, do TJRJ e do Enunciado

nº 42 do FETJ. Desprovimento do recurso.

(0018579-44.2013.8.19.0031 - APELAÇÃO. Des(a). RENATA MACHADO

COTTA - Julgamento: 18/03/2015 - TERCEIRA CÂMARA CÍVEL)

Dessa forma, há de se reconhecer a responsabilidade civil do Estado.

Ademais, a compensação por dano extrapatrimonial fixada em cinco mil

reais em razão do acidente com a motocicleta pelo recorrido mostra-se adequada e em

consonância com a jurisprudência deste Tribunal. A título de exemplo, no precedente

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análogo acima, o dano extrapatrimonial foi fixado em oito mil reais.

Pelo exposto, VOTA-SE POR NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO,

deixando-se de majorar os honorários de sucumbência, pois estes já foram arbitrados

em 20% sobre o valor da condenação.

Rio de Janeiro, na data da assinatura eletrônica.

Des. ALEXANDRE FREITAS CÂMARA


Relator

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