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Estado do Rio de Janeiro Poder Judiciário

Tribunal de Justiça
Comarca de Itaperuna 230
Cartório da 2ª Vara
Rodovia Br-356 Km 01 CEP: 28300-000 - Itaperuna - RJ e-mail: itp02vara@tjrj.jus.br

fls.

Processo Eletrônico
Processo:0002731-56.2018.8.19.0026

Classe/Assunto: Procedimento Comum - Dano Material - Outros/ Indenização Por Dano


Material; Dano Moral Outros - Cdc <Réu (Tipicidade)|74|1>
Polo Ativo: Autor: ANDREA DE OLIVEIRA ROCHA MORAES
Polo Passivo: Réu: MUNICÍPIO DE ITAPERUNA e outros

Sentença

I - RELATÓRIO

Trata-se de ação de conhecimento proposta por ANDREA DE OLIVEIRA ROCHA MORAES


em face de MUNICÍPIO DE ITAPERUNA alegando que, no dia 06/01/2018, por volta de 13h,
passava pela Rua Pio Nascimento Soares, na altura do nº 272, deslocando-se à casa de uma
cliente, foi surpreendida com o abrupto afundamento das pedras da citada via pública e, em
decorrência, o pé esquerdo sofreu inúmeros ferimentos, sendo encaminhada a UPA, sendo o
pé imobilizado. Foi constatada a fratura de dois dedos e lesões musculares do pé esquerdo,
arcando com o pagamento de consulta com ortopedista e RX, além de sessões de fisioterapia.
Ficou impossibilidade de laborar até o dia 20 de fevereiro último, dedicando-se a venda de
pães caseiros e venda de cosméticos.

Requer:

a) Indenização por dano moral no valor de R$ 10.000,00.


b) Indenização por dano material relativa à despesas que suportou e que venha a
suportar decorrentes dos ferimentos sofridos pelo atuar do demandado.
c) Indenização por lucros cessantes referentes aos valores que recebia a título de
produção e comercialização de pães caseiros e venda de cosméticos, em média, um salário
mínimo e meio por mês, no período em que ficou afastada do trabalho.

Inicial de fls. 03/12 instruída com documentos de fls. 13/79.

JG concedida às fls. 124.

Contestação oferecida pelo demandado às fls. 129/139, instruída com documentos de fls.
140/144, apresentando as seguintes teses: preclusão das provas; inépcia da inicial diante da
irregularidade da representação processual; dúvida a respeito da foto do buraco diante da
dúvida pelos documentos fornecidos; ausência de retratação quanto a imagem de fls. 42;
ausência de demonstração de que a demandante trafegou pela via pública; ausência de
presunção de que a demandante trafegou pela via pública diante das imagens indicando as
condições precárias; buraco se encontra no meio da via pública e não está no curso previsível

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de um pedestre; demandante deveria estar trafegando na calçada e não no meio da via


pública; atividade laborativa desenvolvida pela demandante antes da data apontada no
atestado de fls. 27, afastando o pleito indenizatório e lucro cessante; ausência de
documentação sobre a renda com venda de pães; responsabilidade subjetiva do Estado por
atos omissivos; inexistência de nexo causal como excludente da responsabilidade da
Administração; ausência de lesão a integridade física da demandante; inexistência de dano
moral; culpa exclusiva da vítima.

Despacho às fls. 150.

Réplica às fls. 156.

Cota da demandante às fls. 160, pugnando pelas provas testemunhal, depoimento pessoal e
documental.

Petição do demandado às fls. 165, pugnando pela prova documental.

Ato ordinatório às fls. 167.

Cota do MP às fls. 171/172, deixando de intervir no feito.

Saneador às fls. 175, deferindo a prova documental.

Petição do demandado às fls. 187, instruída com documento de fls. 188.

Despacho às fls. 191.

Petição do demandado às fls. 200, instruída com documentos de fls. 201/206.

Despacho às fls. 209.

Cota da demandante às fls. 213.

Despacho às fls. 216.

Petição da demandante às fls. 223.

Remessa ao grupo de sentença às fls. 225.

É O RELATÓRIO. DECIDO.

II - FUNDAMENTAÇÃO

Impõe-se o julgamento do processo na fase em que se encontra, sendo dispensável a


produção de outras provas.

Examinando os autos, verifico que a demandante sofreu uma queda em via pública, ocorrida no
dia 06/01/2018, por força de um buraco localizado na Rua Pio Nascimento Soares na altura do
nº272, conforme demonstram as fotos de fls. 17/28, 29/35, 36/39 e 40/41.

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Observo que o demandado não desconstituiu a alegação da demandante no sentido de que


sofreu queda em via pública municipal.

A demandante foi atendida perante a rede pública de saúde, conforme apontam os documentos
de fls. 17/19.

A tese de que a demandante deveria estar circulando pela calçada e não pela via pública deve
ser rejeitada, tendo em vista que é plenamente admissível a travessia realizada por um
pedestre de um lado para o outro da via pública, sendo necessário atravessar pela própria via
pública.

Destaco que o artigo 37, § 6º da CFRB/1988 abrange não apenas os atos comissivos como
também os atos omissivos, sendo certo que a responsabilidade objetiva oriunda a teoria do
risco administrativo incide nos casos de omissão específica, conforme lição de Guilherme
Couto de Castro e Sergio Cavalieri Filho.

Sergio Cavalieri Filho, em sua obra Programa de Responsabilidade Civil, 9ª ed., p. 240, assim
expõe o assunto:

"É preciso, ainda, distinguir omissão genérica do Estado (item 77) e omissão específica.
Observa o talentoso jurista Guilherme Couto de Castro, em excelente monografia com que
brindou o nosso mundo jurídico, "não ser correto dizer, sempre, que toda hipótese de dano
proveniente de omissão estatal será encarada, inevitavelmente, pelo ângulo subjetivo. Assim
será quando se tratar de omissão genérica. Não quando houver omissão específica, pois há
dever individualizado de agir (A responsabilidade objetiva no Direito Brasileiro, Forense, 1997,
p. 37). Mas, afinal de contas, qual a distinção entre omissão genérica e omissão específica?
Haverá omissão específica quando o Estado, por omissão sua, crie a situação propícia para a
ocorrência do evento em situação que tinha o dever de agir para impedi-lo. (...) Os nossos
Tribunais tem reconhecido a omissão específica do Estado quando a inércia administrativa é a
causa direta e imediata do não-impedimento do evento, como nos casos de morte de detento
em penitenciária e acidente com aluno de colégio público durante o período de aula. (...)"

Como cediço, para que se configure a obrigação de indenizar do ente público, ainda que por
ato omissivo, com base na teoria do risco administrativo, na forma do art. 37, § 6º, da
Constituição da República, faz-se necessária a demonstração do nexo causal entre a omissão
específica e o resultado danoso causado à vítima.

A hipótese dos autos revela a omissão específica do Município diante de seu dever de manter a
via pública adequadamente conservada para a circulação de pessoas. As fotos de fls. 40/41
comprovam a existência de um buraco no meio de uma via pública por onde transitam ciclistas,
pedestres, ao atravessar a via de um lado para outro, e veículos automotores.

O demandado é titular da obrigação decorrente do texto constitucional inerente à manutenção


das vias públicas municipais, incluindo os devidos reparos e substituição de equipamentos
deteriorados, eis que estamos diante de patrimônio público de uso comum do povo - artigo 30,
VIII, CRFB/1988.

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A existência de buraco, em local público, configura ato ilícito por ausência de conservação da
via pública pelo demandado.

Pelo artigo 37, §6º da CRFB/1988, o Município é objetivamente responsável por eventual
indenização decorrente de evento danoso ocorrido pela má conservação do patrimônio público,
como é o caso dos autos, sendo inerente a tal dever o reparo da tampa de um bueiro
quebrado.

Encontram-se demonstrados nos autos sua conduta omissiva, o nexo causal integrativo do
ilícito administrativo e os danos sofridos pela demandante.

A omissão capaz de gerar o dever de indenizar está relacionada com o descumprimento de um


dever jurídico de agir. Exigibilidade de conduta, examinada a partir do princípio da
proporcionalidade e das situações do caso concreto.

Assim, comprovada a existência de nexo causal entre os danos sofridos pela demandante e a
omissão da Municipalidade, impõe-se o dever de indenizar.

Com relação ao dano moral, é inegável o sofrimento da demandante diante da violação de sua
integridade física e psíquica por força de um bueiro cuja manutenção é de responsabilidade do
demandado. O dano moral está in re ipsa.

A indenização deve se aproximar, vez que, o reparo total é impossível, de uma compensação
capaz de minimizar o sofrimento experimentado, sem que isso possa corresponder à
inidoneidade de sua percepção, com aspecto de enriquecimento sem causa.

Dessa forma, entendo que o valor de R$ 10.000,00, além de prudente e razoável as


peculiaridades do caso concreto, denota a real extensão dos agravos psicofísicos ocorridos e o
caráter punitivo-pedagógico da reparação.

No que se refere ao dano material, constato que a demandante desenvolvia atividade


empresarial consistente na venda de cosméticos Natura (docs. fls. 43/79), inexistindo
elementos probatórios demonstrando o comércio inerente à venda de pães caseiros.

Dessa forma, deve o demandado arcar com o pagamento dos lucros cessantes inerentes ao
período em que ficou impossibilitada de desenvolver sua atividade empresarial, a ser apurado
em fase de liquidação de sentença por arbitramento mediante a realização de provas pericial
médica (número de dias de incapacidade) e contábil (média de vendas realizadas mensalmente
com a comercialização de cosméticos).

A demandante demonstrou que suportou gastos com medicamentos, exames e consultas


médicas, cabendo ao demandado restituir tais despesas, à luz dos documentos de fls. 20, 23,
25, 26 e 28.

III - DISPOSITIVO

Posto isso, JULGA-SE:

a) PROCEDENTE O PEDIDO para condenar o demandado ao pagamento de R$

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10.000,00 (dez mil reais) a título de compensação por dano moral, acrescido de correção
monetária a partir desta data, de acordo com o IPCA-E, e juros de mora, calculados com base
no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, na forma
do art. 1.º-F, da Lei n.º 9.494/1997, modificado pela Lei 11.960/2009, desde o evento danoso
(súmula nº 54, do STJ).
b) PROCEDENTE O PEDIDO para condenar o demandado ao ressarcimento dos
valores gastos pela demandante com tratamento médico, consultas, exames e medicamentos,
observando-se os comprovantes fornecidos de fls. 20, 23, 25, 26 e 28, a serem apurados em
fase de cumprimento de sentença, nos termos do artigo 509, § 2º do CPC, acrescidos de
correção monetária a partir desta data, de acordo com o IPCA-E, e juros de mora, calculados
com base no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança,
na forma do art. 1.º-F, da Lei n.º 9.494/1997, modificado pela Lei 11.960/2009, desde o evento
danoso (súmula nº 54, do STJ).
c) PROCEDENTE O PEDIDO para condenar o demandado ao pagamento de
indenização a título de lucros cessantes a serem apurados em fase de liquidação de sentença
por arbitramento. A quantia será corrigida monetariamente a partir desta data, de acordo com o
IPCA-E, e juros de mora, calculados com base no índice oficial de remuneração básica e juros
aplicados à caderneta de poupança, na forma do art. 1.º-F, da Lei n.º 9.494/1997, modificado
pela Lei 11.960/2009, desde o evento danoso (súmula nº 54, do STJ).

Por consequência, RESOLVE-SE O MÉRITO, na forma do art. 487, I, CPC.

Condeno o demandado ao pagamento das custas e despesas processuais. O percentual dos


honorários advocatícios será estabelecido após a liquidação do julgado, nos termos do artigo
85, §4º, II do CPC.

Atenda-se ao disposto na Súmula 145 do TJRJ no que se refere à isenção legal da qual goza a
Fazenda Pública.

Sujeita a sentença ao duplo grau de jurisdição, processados eventuais recursos voluntários,


subam os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça para o reexame necessário, de acordo com o
disposto no art. 496, I, CPC.

Registrada eletronicamente. Publique-se e intimem-se, inclusive nos termos do art. 229-A, § 1º,
I, da CNCGJ.

Itaperuna, 29/06/2021.

Carlos Sergio dos Santos Saraiva - Juiz de Direito

Código de Autenticação: 46SK.SWDY.5Z7Z.SK23


Este código pode ser verificado em: www.tjrj.jus.br – Serviços – Validação de documentos
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752 CARLOSSARAIVA

CARLOS SERGIO DOS SANTOS SARAIVA:26174 Assinado em 29/06/2021 19:24:13


Local: TJ-RJ

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