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Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro


Vigésima Sexta Câmara Cível

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0020506-78.2010.8.19.0054


APELANTE: RAIANE BRAGA DE OLIVEIRA
APELADA: PROCOSA PRODUTOS DE BELEZA LTDA
JUÍZO DE ORIGEM: 2ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE SÃO JOÃO DE
MERITI
RELATOR: DES. WILSON DO NASCIMENTO REIS

ACÓRDÃO

APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA SOB A ÉGIDE DO CPC DE 2015


AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL C/C REPARAÇÃO DE
DANO MATERIAL, MORAL E ESTÉTICO. RELAÇÃO DE
CONSUMO. UTILIZAÇÃO DO SHAMPOO GARNIER FRUCTIS DA
EMPRESA RÉ. EMBARAÇAMENTO E, POSTERIOR CORTE DO
CABELO. RESPONSABILIDADE CIVIL INCONTESTE. DEVER DE
INDENIZAR. SENTENÇA QUE SE REFORMA.
Ação indenizatória ajuizada em decorrência de danos sofridos pela
autora quando da utilização do shampoo garnier fructis. Autora narra
que após a utilização do referido produto o seu cabelo embolou,
ficando impossível de desembaraçar, acarretando o corte de seu
cabelo de 70 cm de comprimento na altura do ombro. Requere a
condenação da ré ao pagamento de danos materiais, morais e
estético. Sentença de improcedência do pedido inicial. Apelo autoral.
Conjunto probatório dos autos que permite concluir pela ocorrência
de falha na prestação do serviço por parte da ré, bem como pelo
consequente dever de indenizar. Isto porque, as fotografias e
demais documentos comprovam a ocorrência do dano, bem como a
prova testemunhal atesta o nexo de causalidade. Aplicação do
disposto no artigo 14, da Lei nº 8.078/90. Verba indenizatória a título
de danos materiais, na quantia de R$25,00, devidamente
comprovada nos autos. Dano moral que restou devidamente

_____________________________________________________________________________
Vigésima Sexta Câmara Cível - Consumidor
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Assinado em 08/06/2017 17:40:59


WILSON DO NASCIMENTO REIS:15629 Local: DES. WILSON DO NASCIMENTO REIS
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configurado, tanto em razão da dor física a que foi submetida a


autora no momento em que realizou o corte do seu cabelo de 70 cm
de comprimento na altura do ombro, além dos transtornos,
aborrecimentos e incômodos, sofridos posteriormente. Quantum
indenizatório a título de danos morais fixado em R$3.000,00, diante
do caso em tela, tratando-se de valor razoável e suficiente para
cumprir o caráter pedagógico-punitivo da indenização, sem que sirva
como fonte de enriquecimento sem causa da vítima. Dano estético
no valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais) em decorrência do corte de
seu cabelo de 70 cm de comprimento na altura do ombro.
Precedentes jurisprudenciais. Recurso ao qual se dá parcial
provimento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº


0020506-78.2010.8.19.0054, em que figura como apelante: RAIANE BRAGA DE
OLIVEIRA e apelada: PROCOSA PRODUTOS DE BELEZA LTDA.

ACORDAM os Desembargadores que integram a 26ª Câmara


Cível Especializada do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por
unanimidade de votos, em dar parcial provimento ao recurso, nos termos do
voto do relator.

Rio de Janeiro, na data da assinatura digital.

DES. WILSON DO NASCIMENTO REIS

Relator

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I – RELATÓRIO

O relatório já se encontra lançado no sistema E-Jud, o que


dispensa sua repetição, na forma regimental (art. 92, caput, do RITJRJ).

II – VOTO

Presentes as condições recursais (legitimidade, interesse e


possibilidade jurídica) e os pressupostos legais (órgão investido de jurisdição,
capacidade recursal das partes e regularidade formal - forma escrita,
fundamentação e tempestividade), a apelação deve ser conhecida.

Inicialmente, cabe ressaltar que a sentença foi prolatada sob a


égide do Código de Processo Civil de 2015.

A relação jurídica estabelecida entre as partes é de consumo,


inserindo-se a autora no conceito de consumidor previsto no artigo 2º da Lei nº
8.078/90, e a ré no conceito de fornecedor de serviços, nos termos do artigo 3º, §
2º, da mesma Lei nº 8.078/90. Dessa forma, sujeitam-se as partes à aplicação
das normas do Código de Defesa do Consumidor.

Aplica-se ao caso em tela o previsto no artigo 14, caput, do


Código de Defesa do Consumidor, que estabelece a responsabilidade objetiva do
fornecedor de serviços pela prestação do serviço de forma defeituosa.

Assim, basta que se verifique a existência do dano e do nexo


causal ligando este à conduta do fornecedor de serviços para que esteja
caracterizada a responsabilidade civil deste último, independentemente da
existência de culpa. É a adoção, pelo Direito Pátrio, da Teoria do Risco do
Empreendimento.

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De acordo com o § 3°, do artigo 14, do Código de Defesa do


Consumidor, só há a exclusão do nexo causal e, consequentemente, da
responsabilidade do fornecedor quando este provar que o defeito na prestação
do serviço inexistiu ou que houve culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, o
que não foi feito no caso em análise.

Na hipótese, a autora logrou êxito em comprovar que o corte do


seu cabelo se deu em virtude do seu citado cabelo ter embolado e ficado inviável
de desembaraçar, após o uso do shampoo fabricado pela empresa ré, conforme
fazem prova as fotos juntadas aos autos nos índices 000013 e 000097.

A testemunha da autora Maria da Gloria Manilha do Nascimento


da Silva prestou depoimento no índice 000146, afirmando que viu o cabelo da
autora todo embolado e inviável de desembaraçar, bem como que dias antes viu
o cabelo da autora bom e que o mesmo era bem tratado, além do que, após o
evento, a autora teve que cortar o seu cabelo.

A testemunha da empresa ré (indexador 000147/148) asseverou


que um lado do cabelo da autora/apelante estava embolado e impossível de
desembaraçar, sendo necessário realizar um corte, única solução para o caso da
demandante.

É indiscutível que cabia a empresa ré, com fulcro no disposto no


artigo 373, inciso II, do CPC de 2015 (antigo artigo 333, inciso II, do CPC/73),
comprovar que a necessidade do corte do cabelo da demandante não foi em
decorrência da utilização do shampoo garnier fructis, inclusive através de prova
pericial química, entretanto, desistiu da referida prova

Dessa forma, não há dúvidas quanto à configuração da


responsabilidade civil da ré, restando incontroversa a ocorrência do fato e do
dano, tendo sido verificada a existência do nexo causal por intermédio do
conjunto probatório carreado, de forma que resta evidente o dever da demandada
indenizar a autora pelos danos que ela sofreu.

Os danos morais se caracterizam pela dor, sofrimento e angústia


sofridos pela autora durante os momentos que sucederam a utilização do

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shampoo até que recompusesse sua aparência, bem como pelos transtornos de
saúde (quadro depressivo desenvolvido), incômodos e pela perda de tempo

Assim, não há que se cogitar de mero aborrecimento, já que a


demandante foi atingida na sua dignidade de consumidora, e, em última análise,
na sua dignidade de pessoa humana.

Destaque-se ainda que, no caso em tela, o dano moral carece de


comprovação, pois ocorre in re ipsa, ou seja, decorre da gravidade do ato ilícito
em si. Logo, uma vez demonstrado o fato ofensivo, também estará demonstrado
o dano moral, em razão de uma presunção natural.

No que toca ao quantum, a indenização do dano moral deve ser


fixada de acordo com os parâmetros impostos pelos princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade, observando os critérios que balizam seu
arbitramento, como a repercussão do dano e a possibilidade econômica do
ofensor e da vítima, de modo que se atenda ao caráter preventivo-pedagógico-
punitivo da reparação, mas não se permita o enriquecimento sem causa.

Assim, considerando as peculiaridades do caso em tela, impõe-


se a fixação do quantum indenizatório em R$ 3.000,00 (três mil reais), valor que
se encontra dentro da lógica do razoável e de acordo com a média adotada por
esta Colenda Corte de Justiça em casos análogos, como se verifica, por
exemplo, pelos julgados cujas ementas seguem transcritas:

0027703-28.2010.8.19.0202 – APELACAO - 1ª Ementa - DES.


ANDREA FORTUNA TEIXEIRA - Julgamento:02/03/2015 -
VIGESIMA QUINTA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR -
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E
MATERIAIS. TINTURA DE CABELO. PRODUTO
FORNECIDO PELA RÉ. AUTORA QUE APÓS O USO
APRESENTOU CABELO DE COR ROXA, COM POSTERIOR
COCEIRA E QUEDA. SENTENÇA DE PARCIAL
PROCEDENCIA. DANO MORAL ARBITRADO EM R$ 3.000
(TRÊS MIL REAIS). INCONFORMISMO DA RÉ. APLICAÇÃO

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DA TEORIA DO RISCO DO EMPREENDIMENTO.


RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL
CONFIGURADO. SENTENÇA QUE SE MANTÉM EM TODOS
OS SEUS TERMOS. RECURSO CONHECIDO E
DEPROVIDO, COM BASE NO ARTIGO 557

0003270-48.2009.8.19.0087 – APELAÇÃO - 1ª Ementa -


Des(a). MYRIAM MEDEIROS DA FONSECA COSTA -
Julgamento: 09/01/2014 - VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL
CONSUMIDORAPELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO
CONSUMIDOR. INCIDÊNCIA DA LEI 8.078/90. AÇÃO
INDENIZATÓRIA. SALÃO DE BELEZA. QUEDA ACENTUADA
DE CABELO APÓS A REALIZAÇÃO DO TRATAMENTO
CAPILAR DENOMINADO RELAXAMENTO. INSTITUTO DE
BELEZA QUE NÃO NEGA O OCORRIDO. SENTENÇA QUE
JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO PARA
CONDENAR A RÉ AO PAGAMENTO DE IDENIZAÇÃO POR
DANOS MORAIS NO VALOR DE R$ 3.000,00 (TRÊS MIL
REAIS). RECURSO EXCLUSIVO DA CONSUMIDORA.
VERBA REPARATÓRIA QUE FICA MANTIDA.
OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E
DA PROPORCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE CABIMENTO
PARA A FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA,
UMA VEZ QUE SOMENTE UM DOS PEDIDOS INICIAIS FOI
ACOLHIDO. ARTIGO 21 DO CPC. DESPROVIMENTO DO
RECURSO.

0011628-45.2009.8.19.0202 – APELAÇÃO - 1ª Ementa -


Des(a). JAIME DIAS PINHEIRO FILHO - Julgamento:
17/10/2013 - SÉTIMA CÂMARA CÍVEL - APELAÇÃO CÍVEL.
INDENIZATÓRIA. DANO MORAL E MATERIAL.
TRATAMENTO CAPILAR DENOMINADO "ESCOVA
DEFINITIVA". FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.

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QUEDA DE CABELOS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.


APELAÇÃO CÍVEL INTERPOSTA PELA DEMANDANTE.
RELAÇÃO DE CONSUMO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA
DO FORNECEDOR. TESE AUTORAL QUE RELATA
HIPÓTESE QUE SE AMOLDA AO PREVISTO NO ART. 14,
DO CDC. INVERSÃO DO ÔNUS PROBANDI QUE SE OPERA
OPE LEGIS, CONFORME O § 3º DO REFERIDO
DISPOSITIVO LEGAL, NÃO TENDO A RECORRIDA
PRODUZIDO PROVA CAPAZ DE AFASTAR O NEXO DE
CAUSALIDADE. DANO DESCRITO NA INICIAL
DEVIDAMENTE COMPROVADO NOS AUTOS.
EVIDENCIADA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO, BEM
COMO DO DEVER DE INDENIZAR. DANO MATERIAL
COMPROVADO NO VALOR DE R$949,30 E DANO MORAL
CONFIGURADO E EM ATENÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA
RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE, ASSIM
COMO ÀS PECULIARIDADES DO CASO SUB EXAMEN,
ORA FIXADO EM R$2.000,00. PRECEDENTES DESTA
CORTE. APLICABILIDADE DO DISPOSTO NO ART. 557, §
1º-A, DO CPC. CONHEÇO DO RECURSO E A ELE DOU
PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO PARA,
REFORMANDO A SENTENÇA, JULGAR PROCEDENTE EM
PARTE O PEDIDO DA AUTORA.

No tocante aos danos materiais, estes merecem provimento, uma


vez que a autora conseguiu comprovar, através de nota fiscal (indexador
000013), que realizou o pagamento de uma consulta médica na Casa de Saúde e
Maternidade São Francisco de Paula, no valor de R$ 25,00 (vinte e cinco reais).

Alerte-se que, a autora juntou aos autos uma nota fiscal (fls. 23 -
indexador 000013) totalmente ilegível, não servindo como prova do dano material
sofrido pela demandante.

Quanto aos danos estéticos, estes procedem parcialmente, já


que a apelante possuía um cabelo com 70 cm de comprimento e teve que cortar

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o mesmo na altura do ombro, em decorrência da utilização do shampoo da


empresa ré, conforme se vê nas fotos de fls.16/19 (indexador 000013).

Por fim, em consequência da reforma da sentença inverto os


ônus sucumbenciais.

Por tais fundamentos, voto no sentido de dar parcial provimento


ao recurso para julgar procedente o pedido da inicial e condenar a empresa ré:

1) ao pagamento da quantia de R$ 25,00 (vinte e cinco reais) a


título de dano material em favor da autora, importância que deve ser corrigida
monetariamente a partir do ajuizamento e acrescida de juros de mora de 1% ao
mês a contar da citação;
2) ao pagamento de indenização por danos estéticos no valor
de R$ 1.000,00 (hum mil reais), corrigida monetariamente a partir da presente
data e acrescida de juros de mora de 1% ao mês, contados da data da citação
3) ao pagamento de indenização por danos morais no valor de
R$3.000,00 (três mil reais), corrigida monetariamente a partir da presente data e
acrescida de juros de mora de 1% ao mês, contados da data da citação e;
4) inverter os ônus sucumbenciais, condenando a ré ao
pagamento das despesas processuais e de honorários advocatícios do patrono
da demandante, que se fixa em 10% do valor da condenação, nos termos do
artigo 85, § 2º, do CPC de 2015.

Rio de Janeiro, na data da assinatura digital.

DES. WILSON DO NASCIMENTO REIS

Relator

Apelação nº 0020506-78.2010.8.19.0054 - Acórdão - Pág. 8

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