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Abstract
Introduction: The sepsis is a grave systemic inflammatory syndrome, of infectious origin, on sterile
tissues, and that may determine dysfunction or failure of one or more organs, due to its intense
Unitermos: inflammatory activity and the activation of the coagulatory complex, manifesting itself in distinct
Sepse. Fatores imunológicos. Arginina. levels of gravity. Objective: The objective is to address the clinical and nutritional aspects of the
use of arginine in sepsis through a literature review, describing the syndrome and the characteristics
Key words: of the amino acid, checking the prevalence of sepsis in the world and in Brazil and addressing
Sepsis. Immunologic factors. Arginine. the potential benefits and the amount recommended that benefits the patient diagnosed with
the syndrome. Results: Despite the progress achieved in diagnosis and treatment, it continues
Endereço para correspondência: to be one of the great causes of morbimortality all over the world, around 30-80%. In 2001,
Maria Lúcia Diniz Araújo the International Conference for the Definition of sepsis chose to increase the list of signs and
Rua Ferreira Lops, 401, apt° 1501 – Parnamirim – symptoms, determining the diagnosis of the syndrome on a clinical exam. Some primary thera-
Recife, PE, Brasil – CEP 52060-200
peutic strategies are adopted, but the importance of an adequate nutritional therapy is clearly
E-mail: mldinizaraujo@hotmail.com
visible. The arginine, an imunomodulator nutrient, is a non-essential amino acid to the healthy
Submissão adult, but under certain clinical conditions it is classified as semi-essential, for its demand is even
16/11/2011 greater and its availability is reduced. Currently, there is a discussion if the supplementation of
arginine should or not be executed in cases of grave sepsis, since it may result in the increase
Aceito para publicação of the production of nitric oxide, leading the tissue damage, in a similar manner, there isn’t a
28/3/2012 consensus regarding the quantity supplied.
1. Graduada em nutrição pela Faculdade Maurício de Nassau (FMN), Recife, PE, Brasil.
2. Docente do curso de Nutrição da FMN, mestre pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife, PE, Brasil.
INTRODUÇÃO SEPSE
Na Grécia Antiga, o termo Pepse era atribuído ao A sepse é uma síndrome inflamatória sistêmica grave, de
método de fermentação do vinho e ao processo de digestão origem infecciosa, em tecidos estéreis, e que pode determinar
da comida, indicando vida e boa saúde. O termo Sepse, disfunção ou falência de um ou mais órgãos, devido a sua
por sua vez, foi aplicado aos casos onde havia putrefação, intensa atividade inflamatória (na fase aguda principalmente)
associando-se com morte e doença1. e ativação do complexo de coagulação. Manifesta-se em
níveis distintos de gravidade e, caso o diagnóstico não seja
Grandes progressos no conhecimento da fisiopatologia da
logo determinado, levando a demora do tratamento, pode
sepse apenas começaram a surgir após a II Guerra Mundial,
levar o indivíduo à morte. A sepse não está restrita apenas
onde pacientes com infecções graves morriam rapidamente,
à síndrome inflamatória sistêmica relacionada à infecção
pois os antibióticos estavam apenas começando a ser usados bacteriana, mas àquela resultante de qualquer microrga-
e aqueles com falência múltipla dos órgãos não podiam ser nismo (fungos ou vírus) e/ou suas toxinas4,11-13.
mantidos vivos. Foi quando Beecher publicou seus estudos
É uma condição aguda ocasionada pela liberação de
a respeito de estados hipovolêmicos, propondo a reposição mediadores inflamatórios associada a um fluxo sanguíneo
rápida do volume perdido como terapêutica1, 2. inadequado nos tecidos e ativação generalizada do endo-
O conhecimento da fisiopatologia continua crescendo, télio, gerando quebra da homeostase com comprometimento
mas ainda com muitas questões em aberto decisórias ao resul- e disfunção de órgãos distantes do foco primário, além da
tado final, pois a gravidade do quadro depende de fatores, depressão miocárdica, redução do volume intravascular
como: a virulência do organismo agressor e pontos-chave e metabolismo aumentado. É reflexo do grau de estresse
relacionados ao hospedeiro, dentre os quais idade, influência orgânico, podendo associar-se a diversas condições clínicas,
genética, sítio de infecção e presença de comorbidades3. como: trauma, queimaduras, pancreatite aguda grave (na
Apesar dos progressos no diagnóstico e no tratamento, ausência de uma identificação de origem infecciosa), inter-
venção cirúrgica, terapia transfusional e infecção4,13.
a sepse continua sendo uma das grandes causas de morbi-
mortalidade em todo o mundo, cerca de 30-80%. A sepse O termo sepse é empregado quando a resposta sistê-
é uma causa importante de hospitalização e a principal mica é clinicamente relevante, mas pode se manifestar
causa de morte em unidades de terapia intensiva (UTI)4-6. por uma variedade de situações, com uma complexidade
crescente (Tabela 1). Por essa variedade, os termos foram
Alguns nutrientes imunomoduladores, como os ácidos
sendo erroneamente utilizados, concretizando a falta de
graxos de cadeia média e curta, nucleotídeos e aminoá-
homogeneidade e dificultando comparações e investi-
cidos arginina e glutamina, têm a capacidade de interferir gações epidemiológicas. Não é mais considerada uma
tanto na resposta inflamatória quanto na resposta imune doença de definição específica, mas um grupo de doenças
e promover a redução da frequência de infecções e suas com base na predisposição do paciente, na gravidade do
complicações, além da diminuição no tempo de internação, insulto, na resposta fisiopatológica do hospedeiro e na
que também leva ao decréscimo do número de infecções7, 8. quantidade de órgãos envolvidos1, 3, 11, 14.
Atualmente, discute-se se a suplementação de arginina
deve ou não ser realizada em casos de sepse. De modo geral, EPIDEMIOLOGIA DA SEPSE
os benefícios são encontrados, porém alguns autores já não
acreditam nesses efeitos, demonstrando até aumento na taxa de Apesar dos progressos no diagnóstico e no trata-
mortalidade quando comparado ao uso de fórmula padrão9,10. mento, a sepse continua representando um pesado fardo
para os sistemas de saúde. A disfunção de múltiplos
O objetivo deste trabalho é abordar os aspectos clínicos
órgãos contempla parte da responsabilidade da elevada
e nutricionais do uso da arginina na sepse através de taxa de mortalidade, pois é o resultado dos distúrbios
uma revisão da literatura, descrevendo a síndrome e as cardiovasculares que comprometem a oferta de oxigênio
características do aminoácido, verificando a prevalência aos tecidos4- 6.
da sepse no mundo e no Brasil e abordando os possíveis
Nos Estados Unidos, é a causa de 2 a 11% de todas
benefícios e a quantidade recomendada que beneficie o
as admissões hospitalares e, em estudo epidemiológico no
paciente diagnosticado com a síndrome.
país, nos últimos 20 anos, a incidência da sepse aumentou
Dessa maneira, foi realizada uma revisão bibliográfica de 82,7 para 240,4 casos para cada 100 mil habitantes,
com ênfase nos últimos anos (no período entre os anos bem como as mortes relacionadas a ela, mesmo havendo
de 1993 e 2010), fundamentado nas fontes de dados redução da taxa de mortalidade geral entre os pacientes
LILACS, SciELO, Medline, PubMed, revistas indexadas e com sepse. Estudos feitos na Europa, Austrália e Nova
sites governamentais, com base nos seguintes descritores: Zelândia relataram que as taxas de prevalência de sepse
sepse, imunomoduladores e arginina. variavam de 5,1% a 30%3, 6, 11.
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Freire TC & Araújo MLD
TRATAMENTO DA SEPSE por via sistêmica. Para fins terapêuticos em hospitais, pode ser
Apesar das grandes iniciativas quanto a investigações e prescrita na forma de peptídeos, tripeptídeos ou ionizada21.
diagnósticos precoces da sepse, a abordagem inicial continua Embora seja considerado um aminoácido não essencial ao
sendo o suporte clínico ao paciente. Caso nenhum outro rele- adulto saudável, havendo um equilíbrio no catabolismo e anabo-
vante evento não infeccioso seja detectado na suspeita de SRIS, lismo, a arginina tem importante participação durante as fases de
a conduta é orientada para sepse e outras medidas são tomadas crescimento (gestação, infância e adolescência), agindo por meio
de acordo com a gravidade da apresentação do quadro11. do ganho de massa muscular; no trauma (ganho de peso pós-
Algumas estratégias primárias são adotadas, como a trauma, com melhora da cicatrização de feridas pelo aumento
reperfusão tecidual e controle do foco infeccioso de forma na produção de colágeno e aumento na resistência cicatricial);
precoce, auxiliando na redução da mortalidade, apesar de síntese de poliaminas (cátions de baixo peso molecular impor-
na maioria dos casos ocorrer um atraso na determinação do tantes no crescimento celular) via ornitina; no sistema endócrino
diagnóstico da sepse, o que levaria a progressão de múltiplas (aumenta a liberação de GH, insulina e glucagon); no aumento
disfunções orgânicas e grave prognóstico do paciente13. da síntese protéica; biossíntese de outros aminoácidos; ciclo da
A terapia nutricional adequada durante a sepse e infecções ureia (desintoxicação da amônia) e na produção de óxido nítrico
graves é fundamental, pois desempenha um papel importante (NO). Além desses papeis, atua em situações clínicas especiais
na modulação da resposta inflamatória, manutenção da função (septicemia, trauma ou câncer), sendo, então, classificada como
imunológica, anulação do catabolismo muscular, cicatrização aminoácido semi-essencial, pois a demanda de arginina nesses
de feridas e manutenção da função da barreira mucosa14. casos é ainda maior e sua disponibilidade é reduzida, devido à
sua redução na ingestão alimentar, diminuição da síntese endó-
Inúmeros avanços no entendimento da fisiopatologia estão
gena da arginina, e aumento da sua utilização pelo organismo,
sendo determinados, aliados ao crescente potencial benéfico
principalmente para a produção de NO7,10,22,23.
de inúmeras alternativas terapêuticas como tratamento11.
A deficiência de arginina pode levar a sintomas como
astenia (sensação de fadiga e debilidade generalizada,
ARGININA: NUTRIENTE IMUNOMODULADOR
semelhantes à distrofia muscular) e diminuição da produção
A arginina, ou o ácido (L)-2-amino-5-guanidinovalérico, de insulina, alterando o metabolismo da glicose e do lipídeo
é um sólido de aspecto cristalino e branco, praticamente sem hepáticos. Por outro lado, sua toxicidade resulta em diarreia,
odor, de alto ponto de fusão, solúvel em água e sensível à luz dores estomacais e de cabeça, num nível de 50 a 500 vezes
(Figura 1). É mais bem metabolizada na forma hidrolisada a faixa de dose terapêutica, variando de acordo com o peso
por não necessitar de digestão, sendo absorvida diretamente do indivíduo e o grau de estresse orgânico21.
0,5 g/kg/dia) ou de 4% a 6% do VCT. Heyland et al.26 confiança = 0,1, 5,1; p = 0,04), e a permanência hospitalar
defendem uma dose diária de 2% do VCT, cerca de 30 (2,9 dias, intervalo de confiança = 1,4, 4,4; p = 0,0002) em
g/dia para um adulto de 70 kg. Já para doses acima de relação a dieta enteral padrão, porém não alterou a mortali-
4% do VCT, afirmam que levam a perda dos efeitos bené- dade, provavelmente devido à inclusão de populações muito
ficos (imunológicos, retenção nitrogenada, dentre outros), diferentes nos estudos31.
aumentando a mortalidade na sepse. Mas até o ano de Heyland & Samis32, na discussão de três estudos envol-
2004, o National Research Council’s Food and Nutrition vendo subgrupos de pacientes doentes críticos que aparen-
Board ainda não havia estabelecido a recomendação diária temente pioraram com o uso de dietas imunomoduladoras
ou o Requerimento Mínimo Diário (RDA – Recommended suplementadas com arginina, afirmam que esse nutriente seja
Dietary Allowance) de arginina, pois há necessidades dife- responsável pelos danos, capaz de promover um aumento na
rentes de doses suplementadas entre os indivíduos, afetadas produção de NO através do aumento na produção de óxido
pelo tipo de dieta, sexo e ambiente8, 21. nítrico sintetase podendo ter um efeito adverso nos pacientes
Lorente et al.27 avaliaram os benefícios da suplementação doentes críticos. Por estimulação de um desequilíbrio na libe-
da arginina isolada em sete pacientes com sepse, recebendo ração de NO, a arginina pode intensificar a inflamação sistê-
administração endovenosa de arginina isolada, numa dose mica nos pacientes sépticos e em outros grupos de pacientes
de 200 mg/kg/dia. Foi observada ação benéfica sistêmica, onde a óxido nítrico sintetase está acima do normal32.
com vasodilatação pulmonar com consequente aumento no Bertolini et al.33, em análise íntegra de 39 pacientes com
consumo de oxigênio e rendimento cardíaco28. septicemia, de um subgrupo analisado de um grande estudo
No entanto, a suplementação de arginina isolada não é em 237 pacientes, que fizeram uso de uma dieta imuno-
comum na prática clínica, sendo mais ofertada em combi- moduladora específica (IED), suplementada com arginina
nação com outros nutrientes na configuração de fórmula e ω-3, de forma precoce, observaram que a mortalidade
imunomoduladora. Galbán et al.29, em estudo clínico, em UTI foi significativamente maior no grupo que fez uso
prospectivo, randomizado e multicêntrico, utilizaram 181 de IED (44,4% x 23,8%; p = 0,179). Devido ao excesso de
pacientes com sepse admitidos em UTIs de seis hospitais mortalidade nesse grupo, o recrutamento de pacientes com
espanhóis, ofertando nutrição enteral imunomoduladora sepse foi prematuramente suspenso33.
precoce (iniciada 36 horas após o diagnóstico de sepse) Em pacientes com sepse, o uso de pacotes imunomo-
enriquecida com arginina, RNA (ácido ribonucléico) e ácido duladores com arginina pode ser benéfico, contando com
graxo ω-3 para 89 pacientes, e formaram o grupo controle poucos estudos a esse respeito. Mas há outros estudos que
com os 87 restantes. Os autores observaram redução na continuam a apontar os riscos da suplementação desse
mortalidade no grupo com dieta enteral imunomoduladora aminoácido e recomendam com critério o seu uso até que
(19%) em relação ao grupo controle (32%) (p < 0,05), estejam disponíveis maiores esclarecimentos28.
redução no número de pacientes com bactericemia (7,8%
Alguns autores afirmam observar benefícios da suplemen-
contra 21,8%; p = 0,01) e redução do número de pacientes
tação da arginina em pacientes cirúrgicos, com redução na
que apresentaram mais de uma infecção nosocomial (5,6%
taxa de mortalidade e rápida cicatrização das feridas. Porém,
contra 19,5%; p = 0,01)28.
quando é analisada uma população específica de pacientes
Em contrapartida, Heyland et al.26, em metanálise de 22 com sepse, há o aumento da mortalidade, comparados ao
estudos randomizados, incluindo 2.419 pacientes críticos ou grupo que fez uso de fórmulas padrão. Explica-se pelo fato da
submetidos a cirurgias eletivas, observaram que a nutrição enteral arginina aumentar a liberação de citocinas pró-inflamatórias
contendo arginina, glutamina, nucleotídeos e ácidos graxos ω-3, e NO, com aumento da resposta inflamatória, resultando
em relação à dieta padrão, diminuiu a infecção bacteriana (risco em hipotensão temporária, aumento do débito cardíaco,
relativo = 0,66; intervalo de confiança = 0,54, 0,80), mas não diminuição na resistência vascular e pulmonar sistêmica e,
alterou a mortalidade desses pacientes. Os autores sugerem além disso, maior custo. Devido a esse risco potencial, seu
que os resultados na evolução de doentes que sofreram cirurgia uso não é recomendado nesses pacientes9, 26.
eletiva não devem ser analisados juntamente com os de pacientes
críticos, porque o efeito do tratamento com dieta imunomodu-
ladora varia de acordo com a população de pacientes, a inter- CONSIDERAÇÕES FINAIS
venção e a qualidade da metodologia do estudo30. Apesar dos grandes avanços tecnológicos na área da
Resultados semelhantes foram encontrados por Beale et al.30, saúde, nos cuidados com os pacientes, principalmente os
na qual foram inclusos 12 estudos randomizados e controlados, graves em cuidados intensivos, e do vasto saber sobre as
que contaram com a participação de 1482 pacientes críticos. diferentes doenças que acometem esses pacientes, os dados
A dieta enteral imunomoduladora reduziu o índice de infecções epidemiológicos mostraram a alta incidência da morbimortali-
(risco relativo = 0,67, intervalo de confiança = 0,50, 0,89; p = dade daqueles que são diagnosticados com sepse ou alguma
0,006), o tempo de ventilação mecânica (2,6 dias, intervalo de de suas derivações (SRIS, sepse grave ou choque séptico).
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (1): 36-42
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Freire TC & Araújo MLD
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