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DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO - RESENHA CRÍTICA

Discente: Guilherme Rodrigues da Silva Matrícula: 15-35211


Docente: Poliana Ribeiro dos Santos

O sofrimento inenarrável vivenciado por milhões de criaturas humanas que


sobreviveram à grande catástrofe do século XX – a Segunda Guerra Mundial (que ceifou a
vida de cinquenta milhões de pessoas) – levou as Nações Unidas a elaborar a Convenção que
regula a situação jurídica dos refugiados, aprovada pela Assembleia Geral da ONU em 28 de
julho de 1951, vigendo a partir de 21 de abril de 1954.
Segundo dados mais recentes divulgados pela Agência da ONU para Refugiados
(ACNUR), o número de pessoas fugindo de guerras, perseguições e conflitos superou em
2018 a marca de 70 milhões. O noticiário mundial não raras vezes apresenta cenas tocantes de
famílias, homens, mulheres e crianças em barcos rumo a um destino desconhecido. Sem
vislumbrar um horizonte positivo, as previsões ainda indicam que o número de pessoas
desesperadas por um lugar onde sejam tratadas com dignidade vai aumentar ainda mais.
Tendo como enredo o drama dos refugiados, “Estado Zero”, minissérie da Netflix é
uma história baseada em fatos reais, que oferece ao espectador um olhar sensível aos anseios
das pessoas que, por algum motivo, encontram-se em situação de exílio. Nota, ainda, a
apreensão e inquietação daqueles que servem ao sistema. Escrita por Tony Ayres e Elise
McCredie, e co-produzida por Cate Blanchett - que faz uma pequena, mas magnética,
participação na obra, esta produção audiovisual australiana acompanha a trajetória de quatro
pessoas dentro do fictício Centro de Detenção Barton para imigrantes.
Após deixar o Afeganistão com a família, Ameer (Fayssal Bazzi) vai parar em Barton,
em busca de abrigo, após uma fuga mal sucedida. A fim de buscar uma vida melhor para sua
esposa e filhos, Cam Sandford (Jai Courtney) aceita uma vaga de emprego na Korvo, um
grupo que presta segurança no Centro de Detenção Barton. Quem também chega a Barton é
Clare Kowitz (Asher Keddie), que possui a responsabilidade de gerenciar crises internas e
administrar a liberação dos vistos de proteção aos refugiados. Outra dos três protagonistas é
Sofie Werner (Yvonne Strahovski), jovem aeromoça levada ao Centro após ser pega
utilizando-se de uma identidade falsa.
Nesse ponto, apreendemos que a história parte de um conflito contemporâneo de
extrema relevância ao Direito Internacional Privado, que envolve um dos grupos sociais mais
vulneráveis em âmbito mundial: os refugiados. É a partir deles que a minissérie constrói uma
estrutura de narração envolvente, seguindo os passos de cada uma das personagens principais.
Ao longo de seus seis episódios, “Estado Zero” forma e instiga o desejo de seus
telespectadores pelo momento em que os caminhos dessas três vidas irão se entrelaçar. Ayres
e McCredie não estão preocupados apenas com uma dinâmica entre seus protagonistas, mas
atentos principalmente às individualidades deles.
Observar a transformação de Ameer, Cam, Claire e Sofie durante a estadia na prisão é
um dos trunfos da produção, já que o roteiro desenha personagens cheios de nuances,
assimiladas de maneira orgânica pelos atores que conferem ainda mais autenticidade aos seus
papéis.
Embora conte com excelentes atuações, dramas convincentes e que o espectador,
naturalmente, pode vir a se sensibilizar com uma narrativa mais do que a outra, é impossível
deixar de notar que a série oferece a Sofie um protagonismo maior. Primeiro porque ela
desfruta de mais tempo em cena e, como consequência disso, seus conflitos são abordados de
forma mais ampla.
Segundo, porque a trajetória dela é levemente inspirada na biografia de Cornelia Raul,
jovem residente permanente australiana que foi detida ilegalmente pelo programa de detenção
obrigatório do governo australiano. Não seria um problema se não fosse uma distração. Sem
menosprezar o trauma que a leva a Barton (e é tudo muito grave), ao focalizar no incidente de
uma legítima cidadã australiana, a narrativa automaticamente diminui a história de Cam,
Claire e Ameer, estes realmente afetados pelo drama dos refugiados.
Além do trabalho primoroso do elenco, impulsionado por Emma Freeman e Jocelyn
Moorhouse, que se revezaram na direção dos seis episódios, “Estado Zero” se destaca também
pelo olhar cuidadoso aos coadjuvantes que englobam os núcleos principais. Dos refugiados
que protestam em cima do telhado por melhores condições até o homem que não perde as
esperanças de estar reunido com sua família novamente. Da senhora que, há anos esperando
pelo seu visto, foi capaz de – simbolicamente – criar raízes em Barton através de uma
plantação, até o senhor que ao lado de sua maleta jamais se move também a espera do dia em
será um cidadão. E por que não os seguranças que vivem constantemente pressionados pelo
sistema enquanto outros se aceitam como subservientes. “Estado Zero” é uma minissérie para
ver e refletir. Para se emocionar e sofrer com o descaso do ser humano em relação a ele
próprio.

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