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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA METALÚRGICA E DE MATERIAIS
CURSO DE ENGENHARIA METALÚRGICA

ARTHUR ALEX NUNES SALES

UTILIZAÇÃO DA CALORIMETRIA EXPLORATÓRIA DIFERENCIAL PARA


CARACTERIZAÇÃO DE ESCÓRIA FLUXANTE CaO-Al2O3-B2O3

FORTALEZA
2017
ARTHUR ALEX NUNES SALES

UTILIZAÇÃO DA CALORIMETRIA EXPLORATÓRIA DIFERENCIAL PARA


CARACTERIZAÇÃO DE ESCÓRIA FLUXANTE CaO-Al2O3-B2O3

Monografia apresentada ao Departamento de


Engenharia Metalúrgica e de Materiais da
Universidade Federal do Ceará, como requisito
parcial à obtenção do título de Bacharel em
Engenharia Metalúrgica.

Orientador: Prof. Dr.-Ing. Jeferson Leandro


Klug
Coorientador: Prof. PhD. Qifeng Shu

FORTALEZA
2017
ARTHUR ALEX NUNES SALES

UTILIZAÇÃO DA CALORIMETRIA EXPLORATÓRIA DIFERENCIAL PARA


CARACTERIZAÇÃO DE ESCÓRIA FLUXANTE CaO-Al2O3-B2O3

Monografia apresentada ao Departamento de


Engenharia Metalúrgica e de Materiais da
Universidade Federal do Ceará, como requisito
parcial à obtenção do título de Bacharel em
Engenharia Metalúrgica.

Orientador: Prof. Dr.-Ing. Jeferson Leandro


Klug
Coorientador: Prof. PhD. Qifeng Shu

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________
Prof. Dr. –Ing. Jeferson Leandro Klug (Orientador)
Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________
MSc. Miguel Bentes
Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP)

_________________________________________
Prof.ª Dr.ªJanaína Gonçalves Maria da Silva Machado
Universidade Federal do Ceará (UFC)
À minha mãe e avó que sempre estiveram
presentes nos momentos mais difíceis. Aos
familiares que me deram apoio e suporte, e aos
amigos que tornaram a jornada mais agradável
de ser vivenciada.
AGRADECIMENTOS

À minha mãe Gizélia Maria e à minha avó Maria da Penha que sempre estiveram
comigo em todos os momentos e apesar de todas as dificuldades foram exemplos de mulheres
fortes na minha vida.

À minha irmã Aline pelo companheirismo e por estar ao meu lado quando precisei
de um ombro amigo ou de um abraço.

Ao meu pai Carlos por nos prover de forma honesta, ao meu tio George que
sempre acreditou em minha capacidade e contribuiu para a minha educação e aos meus outros
familiares que me ajudaram direta e indiretamente nessa caminhada: meu avô Tarcísio e tia
Gilmara.

Ao meu orientador Dr. Ing. Jefferson Leandro Klug, a quem tenho grande
respeito, por sua disponibilidade, paciência, acompanhamento e por me incentivar a trabalhar
em um tema tão relevante.

Ao meu coorientador Qifeng Shu, da University of Science and Technology


Beijing, pela gigantesca contribuição para a realização deste trabalho, sem ele provavelmente
o que aqui está escrito não seria possível.

Aos meus amigos de longa data Kayo Jonatha e Leandro Quirino pelos momentos de
descontração e por todos os anos de uma amizade que só aumenta, não sendo os únicos, mas
com toda certeza os mais presentes.

Aos meus amigos e companheiros da universidade e para a vida Josy Lima, Lucas
Kuchla, Adauto Santiago, Cindy Lima e João Vieira que apesar de serem de cursos
completamente diferentes, foram os primeiros e grandes exemplos de amigos que tive o
prazer de conhecer dentro do ambiente universitário e que me escolheram para ser parte
importante em suas vidas.

Aos meus amigos e colegas de trabalho Raquel Brito, Isabela Horácio, Igo
Albuquerque, Lara Lira, Bianca Bezerra, Deibyson Uchôa, Fábio Rabelo e Lucas Araújo por
me proporcionarem um ano maravilhoso dentro da universidade e por terem me ajudado a
evoluir como pessoa. Poucas vezes me senti tão querido em um grupo, o sentimento de
amizade e carinho que senti por parte de todos é inestimável.

A todos os professores e servidores do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de


Materiais que de alguma forma contribuíram para a minha formação pessoal e acadêmica.
“As pessoas... Na verdade, todo mundo tem
um mundo secreto dentro de si e é sério
quando falo “todo mundo”, cada pessoa no
planeta... Não importa quão tediosa e chata ela
seja por fora. Por dentro, todas têm mundos
inimagináveis, magníficos, maravilhosos,
idiotas e sensacionais.... Não só um. Centenas
de mundos, talvez milhares”.
Neil Gaiman
RESUMO

A utilização de pós fluxantes se mostra de grande importância no processo de lingotamento


contínuo de certos tipos de aços, no entanto, há a necessidade de estudos de seus efeitos no
processo e de suas propriedades de acordo com sua composição e condições termodinâmicas.
A análise térmica se faz presente como uma das mais importantes ferramentas para esse tipo
de estudo. O presente trabalho tem como objetivos centrais: (i) apresentar a calorimetria
exploratória diferencial como uma ferramenta para o estudo de pós fluxantes, assim como a
parte técnica referente à calibração e utilização do equipamento, e (ii) prover uma análise de
uma amostra de pó fluxante com base na composição CaO-Al2O3-B2O3 utilizando esse
método. A metodologia consiste na utilização de um analisador térmico, considerando todas
as suas particularidades, além da análise da amostra. Foi apresentado um bom panorama da
utilização da calorimetria exploratória diferencial, assim como um satisfatório estudo do
manejo e utilização do equipamento, também foi constatado por meio da calorimetria, que a
amostra de pó com composição CaO-Al2O3-B2O3 parece bastante promissora para a sua
utilização em aços com alto teor de Al em sua composição.

Palavras-chave: Pó fluxante. Análise Térmica. Calorimetria Exploratória Diferencial.


Lingotamento Contínuo.
ABSTRACT

The use of Mold Flux is of great importance in the process of continuous casting of certain
types of steels. However, it is necessary to study its effects on the process and its properties
according to its composition and thermodynamic conditions. The Thermal analysis is present
as one of the most important tools for this kind of study. The main objectives of this study are:
(I) to present the differential scanning calorimetry as a tool for the study of mold fluxes, as
well as the technical part regarding the calibration and use of the equipment, and (ii) to
provide an analysis of a sample of flowing powder based on the CaO- Al2O3-B2O3 using this
method. The methodology consists in the use of a thermal analyzer, considering all its
peculiarities, besides the analysis of the sample. A good overview of the use of differential
scanning calorimetry was presented, as well as a satisfactory study of the handling and use of
the equipment. Was also found through calorimetry that the powder sample with the
composition CaO-Al2O3-B2O3 seems very promising for its use in steels with high Al
content in their composition.

Keywords: Mold Flux. Thermal Analisys. Differential Scanning Calorimetry. Continuous


Casting.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1  Representação esquemática de formas de vazamento nos processos de


lingotamento convencional dos aços............................................................... 4

Figura 2  Representação esquemática de formas de vazamento nos processos de


lingotamento convencional dos aços. ............................................................. 5

Figura 3  Representação esquemática de uma máquina de lingotamento contínuo ...... 6

Figura 4  Representação esquemática da atuação do pó fluxante no molde.................. 8

Figura 5 – (a) Deslocamento, velocidade, aceleração e curvas de força; (b) deslocamento


instantâneo e curvas de força em um molde de lingotamento
contínuo.................................................................................................................................... 10

Figura 6  Diagrama ternário para uma escória do sistema CaO - SiO2 – Al2O3................. 13

Figura 7  Relação entre a Basicidade e o índice de Cristalização................................... 15

Figura 8  Gráfico de TG (vermelho) e sua derivada (Azul) ............................................. 19

Figura 9  Gráfico de DTA; a) Variação da capacidade calorífica b) Reação exotérmica c)


Reação endotérmica..................................................................................... 20

Figura 10 – Gráfico típico de DSC com o fluxo de calor em função da temperatura......... 21

Figura 11  Demonstração da diferença de energia calculada entre o cadinho com a


amostra e a referência. 22

Figura 12  Gráfico de cristalização a partir de uma amostra fundida obtida por DSC....... 24

Figura 13  Amostra granulada pronta para a análise............................................................. 26

Figura 14  Analisador Térmico STA 449 F3 Jupter utilizado para os experimentos.......... 26

Figura 15  Cadinhos de platina limpos utilizados no experimento..................................... 27

Figura 16  Termograma de DSC demonstrando as principais temperaturas de um pico.... 29

Figura 17  Sistema de banho térmico indicando a temperatura ideal de 27°C.................... 32

Figura 18  Sistema de válvulas e controle dos gases de entrada......................................... 33


Figura 19 Sistema de suporte da amostra (Haste de DSC e posicionamento dos
cadinhos).................................................................................................................. 34

Figura 20  Termograma de DSC para o Ag2SO4....................................................................36

Figura 21  Termograma DSC para o CsCl. ........................................................................... 37

Figura 22  Termograma DSC para o K2CrO4. .......................................................................37

Figura 23  Termograma DSC para o BaCO3. ....................................................................... 38

Figura 24  Gráfico referente à calibração de temperatura mostrando a relação entre


temperatura nominal esperada e a temperatura experimental............................ 39

Figura 25  Gráfico referente à calibração de sensitividade................................................. 40

Figura 26  Termograma da amostra de pó fluxante analisada................................................41

Figura 27  Termograma mostrando apenas as curvas de TG e a programação de


temperatura........................................................................................................... 42

Figura 28  Termograma mostrando apenas as curvas de DSC e a programação de


temperatura.......................................................................................................... 43
LISTA DE TABELAS

Tabela 1  Teores presentes na composição de pós fluxantes comerciais ...................... 12

Tabela 2  Efeitos de diferentes componentes obre as propriedades dos fluxantes......... 14

Tabela 3  Composição química da amostra utilizada (Massa%).................................... 25

Tabela 4  Propriedades da amostra de escória estudada................................................. 25

Tabela 5  Substâncias utilizadas para a calibração e suas respectivas programações


de temperatura................................................................................................ 30

Tabela 6  Dados de calibração obtidos experimentalmente........................................... 38

Tabela 7  Diferenças entre as temperaturas nominais e experimentais e suas


respectivas correções...................................................................................... 39

Tabela 8  Diferenças entre a sensitividade calculada e a esperada, assim como


valores de entalpia e de energia calculados.................................................... 40
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

TRIP Transformation Induced Plasticity


DSC Differential Scanning Calorimetry
DTA Differential Termal Analysis
TG Termogravimetria
STA Simultaneous Thermal Analysis
LISTA DE SÍMBOLOS

% Porcentagem
τ Tensão de cisalhamento
η Viscosidade
T Temperatura absoluta
K Kelvin
A Constante de Arhenius
R Constante universal dos gases
E Energia de ativação
Cp Capacidade Calorífica
µVs Micro Volt segundo
mW Miliwatt
mg Miligrama
Tg Temperatura de transição vítrea
Pa.S Pascal Segundo
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 1
1.1 Descrição do problema....................................................................................... 1
1.2 Motivação............................................................................................................ 1
2 OBJETIVOS....................................................................................................... 3
2.1 Objetivos Gerais................................................................................................. 3
2.2 Objetivos Específicos......................................................................................... 3
3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA.......................................................................... 4
3.1 Lingotamento Contínuo..................................................................................... 4
3.1.1 Histórico do Processo......................................................................................... 4
3.1.2 Síntese do Processo............................................................................................. 5
3.1.3 Lubrificação do Molde....................................................................................... 7
3.2 Pós fluxantes para Lingotamento Contínuo.................................................... 7
3.2.1 Funções dos Pós Fluxantes................................................................................ 8
3.2.1.1 Lubrificação....................................................................................................... 9
3.2.1.2 Transferência de Calor....................................................................................... 10
3.2.1.3 Isolamento Térmico........................................................................................... 11
3.2.1.4 Proteção contra Reoxidação.............................................................................. 11
3.2.1.5 Absorção de Inclusões........................................................................................ 11
3.2.2 Composição Química dos Pós Fluxantes.......................................................... 12
3.2.3 Viscosidade.......................................................................................................... 14
3.2.4 Temperatura de Cristalização........................................................................... 15
3.2.5 Comportamento de Fusão................................................................................. 16
3.2.6 Interações Termoquímicas entre os fluxantes e o aço..................................... 16
3.2.6 Problemas e Defeitos Relacionados aos Pós Fluxantes................................... 17
3.3 Análise Térmica................................................................................................. 18
3.3.1 Definição de Análise Térmica........................................................................... 18
3.3.2 Métodos de Análise Térmica............................................................................. 19
3.3.2.1 Termogravimetria (TG)..................................................................................... 19
3.3.2.2 Análise Térmica Diferencial (DTA).................................................................. 20
3.3.2.3 Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC)................................................. 21
3.3.3 Importância e Utilização da DSC na Caracterização de Pós Fluxantes........ 22
4 MATERIAIS E MÉTODOS.............................................................................. 25
4.1 Preparação da amostra de fluxante CaO-Al2O3-B2O3..................................25
4.2 Análise Térmica das amostras utilizando a DSC............................................ 26
4.2.1 Equipamento utilizado....................................................................................... 26
4.2.2 Calibração do Equipamento.............................................................................. 28
4.2.2.1 Calibração para cadinhos de Pt........................................................................ 28
4.2.2.2 Calibração para cadinhos de Al203..................................................................................................... 30
4.2.3 Análise da amostra preparada e utilização do equipamento......................... 31
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES...................................................................... 36
5.1 Resultados da calibração para o cadinho de Pt............................................... 36
5.2 Termograma DSC da amostra de escória fluxante CaO-Al2O3-B2O3......... 41
5.2.1 Interpretação do Termograma.......................................................................... 42
6 CONCLUSÃO.................................................................................................... 47
7 SUGESTÕES DE TRABALHOS FUTUROS................................................. 48
8 REFERÊNCIAS................................................................................................ 49
1

1. INTRODUÇÃO

1.1 Descrição do Problema


Com o crescimento na variedade de aços e de suas aplicações, há uma elevada
necessidade de otimização e melhoria dos processos de fabricação. A utilização e
desenvolvimento de pós fluxantes (também conhecidos como escórias sintéticas ou escórias
fluxantes) tem ganhado cada vez mais importância dentro da indústria quando falamos de
lingotamento contínuo dos aços.
Aços com alto teor de Al (como os aços TRIP - Transformation Induced Plasticity, por
exemplo) apresentam maiores dificuldades quando lingotados com pós fluxantes que
apresentem SiO2 em sua composição devido à sua reação com o Al presente no aço, mudando
continuamente a basicidade e as propriedades físico-químicas dos fluxos e consequentemente
interrompendo o lingotamento. A reação entre o alumínio e a sílica pode ser descrito através
da seguinte equação:
4 Al + 3(SiO2)slag = 3Si + 2(Al2O3)slag
Mudanças na composição química da escória podem causar variações de viscosidade,
break temperature, e formação de filme sólido cristalino durante o processo, gerando
problemas sérios, como o aumento de trincas, variações indesejadas na transferência de calor,
redução na lubrificação entre outros. Além de problemas financeiros, fluxantes comerciais
contêm flúor na sua composição, podendo formar compostos voláteis e solúveis em água,
como o SiF4, levando à poluição ambiental. (1,2).

1.2 Motivação
Tendo como base os problemas enfrentados na utilização de pós fluxantes tradicionais
em aços com alto teor de Al, se faz necessário um estudo para o desenvolvimento de novos
tipos de fluxantes que atendam a essas demandas específicas, assim como a busca de métodos
efetivos para esses estudos.
Para reduzir a reatividade do Al nos aços com alto teor desse metal durante o
lingotamento, foi sugerido substituir os pós fluxantes baseados em Cal-Sílica por outros com
base em Cal-Alumina, sendo o B2O3 um dos candidatos a substituir o SiO2 com a vantagem de
não necessitar de fluoretos em sua composição. Tentativas de se utilizar pós fluxantes
baseados no sistema CaO-Al2O3-B2O3 têm sido promissoras em comparação aos tradicionais
com sistema CaO-SiO2, melhorando assim a performance e diminuindo a ocorrência de
defeitos. (2,3).
2

Para a realização da análise do fluxante apresentado, foi utilizada a técnica de análise


térmica conhecida como DSC - Differential Scanning Calorimetry, que é comumente
traduzida como Calorimetria Exploratória Diferencial, uma ferramenta que ganha cada vez
mais destaque na análise e desenvolvimento de novas escórias fluxantes.
O presente trabalho se propõe a buscar informações a respeito do sistema CaO-Al2O3-
B2O3, considerando sua importância no desafio de lingotar aços com alto teor de alumínio e
prover uma explanação de como a análise DSC fornece informações termodinâmicas do
sistema em uma determinada faixa de aquecimento, resfriamento, temperatura e composição.
O presente trabalho pode prover uma base para o desenvolvimento de futuros pós fluxantes
cálcio-aluminatos não reativos utilizando de técnicas de análise térmica (2,3).
3

2. OBJETIVOS

2.1 Objetivos Gerais


Abranger a análise exploratória diferencial como método de caracterização de pós
fluxantes e com base nesse método buscar dados termodinâmicos para o sistema CaO-Al2O3-
B2O3 .

2.2 Objetivos Específicos


Demonstrar e explanar a técnica de DSC – Differential Scanning Calorimetry, como
ferramenta de caracterização de pós fluxantes, demonstrando a sua importância, e aspectos
mais técnicos de sua utilização.

Prover dados para uma amostra de pó fluxante com composição CaO-Al2O3-B2O3,


como suas principais temperaturas e energias de transição, para um maior entendimento do
comportamento do sistema em uma determinada condição de temperatura.
4

3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.1 Lingotamento Contínuo

3.1.1 Histórico do Processo


Para a transformação de aço líquido em produto sólido, tradicionalmente se utilizava o
processo de vazamento de metal líquido em lingoteiras de ferro-fundido, que evoluiu em
termos de tecnologia e rendimento em diferentes versões. O líquido é vazado em cada
lingoteira de forma independente, e após a etapa de resfriamento é feita a desmoldagem dos
lingotes para posterior reaquecimento e prosseguimento das etapas de conformação. (4).

Figura1 – Representação esquemática de formas de vazamento nos processos de lingotamento


convencional dos aços.

Fonte: RIZZO, 2006

Em meados do século XIX, as primeiras tentativas de dar um caráter contínuo ao


processo de lingotamento, foram idealizadas por George Sellers, J. Laing e H. Bessemer, com
uma iniciativa voltada a metais não ferrosos de baixo ponto de fusão. Apenas em 1887, R. M.
Daelen fez a primeira aplicação do processo na solidificação de aços, ainda que fosse uma
proposição tecnologicamente rudimentar, já apresentava partes essenciais e reconhecíveis nos
aparatos modernos de lingotamento contínuo, possuindo um sistema com molde resfriado a
água, aberto nas partes superior e inferior, sistema de resfriamento secundário, barra falsa,
rolos extratores e dispositivo para o corte do lingote. No entanto, já era detectada a
5

necessidade de um sistema de movimento relativo entre lingote e molde que só foi


solucionado em 1933 por S. Junghans, que patenteou o sistema de oscilação do molde,
alavancando em larga escala o processo de lingotamento contínuo de aços. (4).
A partir de 1963, o processo sofreu outro grande impulso, com a introdução das
máquinas curvas com moldes curvos. Anteriormente eram utilizados equipamentos verticais,
no entanto, os moldes curvos possuem uma menor altura total da instalação, maior facilidade
de construção, redução da pressão estática do metal líquido e prolongamento da zona de
resfriamento secundário. (4,5).

Figura 2 – Tipos de instalações de lingotamento contínuo e sua evolução, de A até c.

Fonte: PLESTCHIUTSCHNIGG, 1989

3.1.2 Síntese do Processo


O processo de lingotamento contínuo consiste essencialmente em um processo de
transferência de calor, onde ocorre a solidificação do metal líquido em produto semi-acabado.
É responsável por cerca de 90% de todo o aço semi-acabado produzido no mundo e também
largamente utilizado em outras ligas e metais não-ferrosos para a produção de chapas e tiras.
(4).
O resfriamento ocorre nas três seguintes etapas sequenciais: em um molde de cobre
(ou liga de cobre) refrigerado a água, em um conjunto de sprays de água (ou mistura de ar e
água) e no ar. (4,5).
6

Uma panela é responsável por transferir o aço líquido do processo anterior para o
distribuidor, que é um aparato responsável por alimentar o(s) molde(s) através de tubos de
imersão. Ao entrar em contato com o molde resfriado, o aço inicia a formação de uma casca
sólida na interface, que deve ser suficiente espessa na saída do molde, para suportar a pressão
metalostática do aço que ainda se encontra em estado líquido, caso contrário, ocorrerá ruptura
da camada sólida e interrupção do processo. Para evitar a adesão da camada solidificada ao
molde, são necessários um sistema de lubrificação e um sistema oscilatório do molde. Esses
dois princípios são de extrema importância para garantir que o processo seja realizado.
Após o lingote abandonar o contato com o molde, ele é resfriado diretamente na sua
superfície através de sprays com água ou a mistura de ar e água, ao longo de uma sequência
de zonas de resfriamento nas quais a capacidade de extração de calor vai diminuindo
progressivamente. O lingote passa a ser guiado por rolos de suporte, sendo alguns deles
também extratores de calor. A solidificação geralmente se completa nessa região, e o
resfriamento continua por radiação livre, culminando com o corte do lingote que será guiado
para os processos seguintes. (4,5).

Figura 3 – Representação esquemática de uma máquina de lingotamento contínuo.

Fonte: Adaptado de RIZZO, 2005


7

3.1.3 A lubrificação do Molde


Em todos os processos de lingotamento há algum tipo de deslocamento relativo entre
as interfaces do metal solidificado e do molde. No lingotamento contínuo, o molde se desloca
na direção vertical com um movimento de oscilação, logo, se conclui que há um aumento
razoável do atrito em relação ao metal sólido. O atrito provoca muitos danos à superfície,
tanto para o produto final, como para o molde, introduzindo defeitos e potencializando o
desgaste do molde. (4).
A utilização de lubrificantes na interface metal/molde é essencial para a redução do
atrito e para impedir o agarramento (sticker) da pele solidificada ao molde.
Os lubrificantes podem ser óleos vegetais desidratados (óleos de amendoim, soja,
colza, dendê e algodão), ou materiais cerâmicos denominados pós fluxantes que passam para
o estado líquido ao serem aquecidos. (5).
Os óleos lubrificantes se decompõem ao serem aquecidos em contato com o aço
líquido, formando assim uma camada gasosa que evita a aderência das superfícies. O óleo é
reposto continuamente. Ressalta-se que o óleo ao se decompor, não pode gerar gases tóxicos,
formar grande quantidade de chamas ou aderir nas paredes de alguma das superfícies
formando depósitos de sujeira ou poros. (5).
Uma das principais desvantagens na utilização do óleo vegetal na atuação como
lubrificante em relação aos pós fluxantes cerâmicos, é o fato do óleo não absorver inclusões.
No entanto, a utilização de fluxantes cerâmicos em máquinas de lingotamento que operam
com jato aberto não é recomendada, pois o fluxo de aço em queda livre arrastaria o pó
fluxante provocando a formação de inclusões. (5).
Os mecanismos utilizados na aplicação de óleos lubrificantes diferem dos utilizados
para a adição de pós fluxantes. O mecanismo consiste em pequenos canais nas faces do
molde, no qual o fino filme de óleo é derramado na sua parede. (4).

3.2 Pós fluxantes para Lingotamento Contínuo


Pós fluxantes são escórias sintéticas utilizadas no processo de lingotamento contínuo.
Para o desempenho de suas funções, o fluxante é continuamente alimentado sobre a superfície
do aço líquido. Devido às altas temperaturas, o fluxante funde e flui, em sua forma líquida,
entre as paredes do molde e a casca de aço solidificado. O fluxante acima do aço fundido
(liquid pool) geralmente consiste em quatro camadas distintas que podem ser visualizadas na
figura 4.
8

Figura 4 – Representação esquemática da atuação do pó fluxante no molde.

Fonte: Adaptado de RIZZO, 2006

Um anel é formado pelo fluxante em contato com o molde resfriado a água ao nível do
menisco. Esse anel apresenta todas as diferentes fases de sólido a líquido. Esse incrustado
multifásico, dependendo de seu tamanho, pode exercer considerável influência nos processos
de transferência de calor que ocorrem no menisco. (6).
A camada de fluxante abaixo do menisco consiste em um filme sólido que se encontra
em contato direto com as paredes do molde e um filme líquido que está em contato com a
casca sólida do material lingotado. Não se sabe ao certo se a camada do fluxante cobre toda a
superfície das interfaces de forma contínua, ou se consiste em um fluxo mais intermitente,
onde o fluxo cobre apenas de forma parcial, deixando áreas sem a presença de fluxante. (6).

3.2.1 Funções dos pós fluxantes


Os pós fluxantes são de grande importância para o lingotamento contínuo dos aços,
pois são agentes essenciais para promover uma maior qualidade superficial dos aços
lingotados e até mesmo garantir que o processo possa acontecer da forma desejada. Para
alcançar tais objetivos, o fluxante deve satisfazer uma série de critérios que variam em grau
de importância de acordo com o tipo de aço a ser lingotado e seus requerimentos finais.
9

As principais funções dos pós fluxantes são:


 Lubrificar a superfície sólida do material lingotado;
 Redução na transferência horizontal de calor;
 Isolar termicamente a superfície superior do aço líquido (molten pool);
 Proteger o aço líquido contra a reoxidação;
 Absorver inclusões que se acumulam na superfície do material lingotado; (6,7).

3.2.1.1 Lubrificação
O pó fluxante atua na lubrificação formando um filme entre a casca sólida em
formação e o molde resfriado. Esse filme é importante para a redução do atrito que ocorre
nessa interface de contato. (8).
No molde temos dois mecanismos de atrito: (i) a lubrificação líquida, que consiste no
atrito entre a casca solidificada, o molde e o filme de escória liquida que exerce atrito por sua
viscosidade; (ii) atrito sólido, que ocorre devido ao movimento relativo entre a parede do
molde e a camada de escória sólida. (9). É necessário que ocorra a lubrificação líquida por
todo o veio, uma vez que uma série de problemas podem ocorrer se a escória líquida
cristalizar completamente. (10).
Uma baixa viscosidade e ponto de solidificação são essenciais para fornecer uma
melhor lubrificação, ajudando a prevenir problemas de agarramento (stiking) na parede do
molde.
Com base nos estudos de Guilles et al. (11) com dados obtidos em moldes
instrumentados com células de carga, foram caracterizados cinco diferentes pós fluxantes
baseados na análise dos perfis da força de atrito.
10

Figura 5 – (a) Deslocamento, velocidade, aceleração e curvas de força; (b) deslocamento instantâneo e curvas de
força em um molde de lingotamento contínuo.

Fonte: PINHEIRO, 1995

Pós com baixa temperatura de cristalização, E e B resultam em baixo atrito, indicando


uma prevalência da lubrificação líquida. O fluxante A com alta temperatura de cristalização (e
baixa viscosidade) resultou em atrito mais elevado com dominância do atrito sólido. Os pós C
e F, que possuem alta viscosidade e temperaturas de cristalização, também apresentaram
prevalecimento do atrito sólido.
Baseado nas curvas de Gilles et al. foi percebido que o atrito é mais uma função das
temperaturas de transição do que da viscosidade para o intervalo de variáveis estudado. Uma
baixa temperatura de cristalização indica que o fluxante se faz presente na fase líquida na
maior parte do comprimento do molde, melhorando assim a lubrificação líquida. (11).

3.2.1.2 Transferência de Calor


A transferência de calor juntamente com a lubrificação, podem ser classificadas como
funções críticas dos pós fluxantes. A transferência de calor que ocorre no molde de
lingotamento envolve uma série de fenômenos simultâneos e de grande complexidade que
afetam diretamente a qualidade do material produzido. Uma extração de calor muito severa
pode gerar tensões térmicas, dando origem a trincas longitudinais. Já uma extração de calor
insuficiente pode formar uma casca solidificada muito fina, sendo propensa ao abaulamento e
11

ao breakout. (12).
A condução do calor através da escória está diretamente relacionada à espessura e à
condutividade de suas camadas, que por sua vez, dependem de seu perfil de velocidade,
temperatura de cristalização, viscosidade e estado (vítreo, cristalino ou líquido). A
condutividade térmica da escória depende diretamente de sua cristalinidade. (13).

3.2.1.3 Isolamento Térmico


O isolamento térmico se dá principalmente por uma camada de pó fluxante não
fundido de certa espessura que fica sobre a camada de pó fundido. O fluxante deve prevenir a
solidificação parcial da superfície superior do aço no molde, particularmente no menisco
próximo das paredes do molde. Melhorando o isolamento térmico, a temperatura do menisco
aumenta, o que faz com que as marcas de oscilação sejam menos severas e possam reduzir os
efeitos subsuperficiais e aparecimento de porosidades abertas. (14).

3.2.1.4 Proteção contra a reoxidação


As camadas superficiais de aço lingotado são efetivamente protegidas de oxidação ao
serem isoladas da atmosfera. Os fluxantes geralmente possuem baixa concentração que óxidos
redutíveis, como Fe2O3 e MnO. A oxidação da superfície do aço também é prevenida por uma
concentração de escória líquida acima do menisco, pela concentração de partículas de carbono
nas camadas não sinterizadas e pela camada de pó não reagido. Camadas mais grossas
oferecem uma proteção mais eficiente contra a atmosfera. (15).

3.2.1.5 Absorção de inclusões


A escória atua ativamente na absorção de inclusões que, durante o processo, acabam
sofrendo flotação no aço líquido. Muitas propriedades dos aços são severamente alteradas de
acordo com o tipo e tamanho de inclusões que se fazem presentes, sendo assim, a absorção
imprescindível ao processo e uma das principais vantagens em relação aos óleos lubrificantes.
(10). A escória deve ser capaz de absorver e também dissolver as inclusões não metálicas que
emergem para a interface aço/pó, sem perder a propriedade de lubrificar a interface
lingote/molde. Uma das principais inclusões não-metálicas em aços acalmados ao alumínio é
a Al2O3 (Alumina), que também pode ser formada a partir da reação do Al dissolvido em aços
com alto teor desse elemento e óxidos redutíveis presentes na escória como o SiO2, FeO e
MnO. Muitos desses elementos se fazem presentes em pós fluxantes tradicionais, constituindo
assim um problema na sua utilização em aços com alto teor de Al, mas isso será discutido
12

posteriormente. (16).

3.2.2 Composição química dos pós fluxantes


Cada fluxante deve ser selecionado de acordo com a planta específica e o material a
ser lingotado, logo sua composição varia bastante, dependendo de que propriedades são
necessárias para o processo. (17).

Tabela 1 – Teores presentes na composição de pós fluxantes comerciais.

Fonte: PINHEIRO, 1994

Majoritariamente, os pós fluxantes são compostos por: CaO - SiO2 - Al2O3 – Na2O,
mas ao optarmos por uma visão mais generalizada sobre o assunto, podemos dizer que cerca
de 70% a 95% do teor mássico dos óxidos presentes se constituem de CaO + SiO2 + Al2O3 +
MgO. (17). Essa generalização se baseia na literatura, não levando em consideração a
infinidade de patentes de fluxantes protegidas por segredos industriais.
O carbono presente no fluxantes é adicionado (1 a 25%) como um agente exotérmico
utilizado para o controle da taxa de fusão do fluxantes.
A composição dos pós fluxantes pode estar sujeita a alterações, principalmente em
aços acalmados a alumínio ou com alto teor desse elemento, nesses casos o teor de alumina
pode ser elevado entre 3% e 15%. (18).
Dentre as matérias primas mais utilizadas na confecção de pós fluxantes, podemos
destacar a wollastonita, bauxita, cinzas volantes etc. Além disso podem ser adicionados
Fluorita CaF2 e carbonato de sódio Na2CO3, geralmente utilizados para diminuir a temperatura
liquidus e a viscosidade. (5).
13

Figura 6 – Diagrama ternário para uma escória do sistema CaO - SiO2 – Al2O3.

Fonte: RIZZO, 2006

Os pós fluxantes geralmente se encontram disponíveis nas seguintes formas: pós a


base de cinzas volantes, pós sintéticos, fluxantes pré-fundidos e fluxantes granulados. Pós a
base de cinzas volantes são misturas homogêneas no qual cinzas volantes pulverizadas são
componentes da mistura. Pós sintéticos não misturas mecânicas de finos pulverizados feitas
com um misturado de alto cisalhamento. Fluxantes pré-fundidos, como o próprio nome
revela, são constituídos por uma grande quantidade de material pré-fundido classificado pelo
tamanho. Fluxantes granulados são formados por grânulos esféricos ou extrudados com uma
mínima concentração de finos e um comportamento de fusão uniforme. (17).
O efeito que cada componente do pó fluxante exerce sobre as suas propriedades físicas
está resumida na Tabela 2.
14

Tabela 2 – Efeitos de diferentes componentes obre as propriedades dos


fluxantes.

Fonte: MILLS, 2005

3.2.3 Viscosidade
Viscosidade pode ser definida como a resistência ao escoamento apresentada por um
fluido quando submetida a uma força externa. Newton propôs que a tensão de cisalhamento
(τ) gerada pelo resultado do movimento relativo de duas camadas adjacentes em um líquido, é
proporcional ao gradiente de velocidade perpendicular à força aplicada. O fator de
proporcionalidade η dessa relação é a viscosidade do fluido, como é destacado na Equação 2.

τ = η(dv/dx) (2)

A grande maioria dos pós fluxantes vítreos obedecem à Equação 1, e por isso são
considerados como fluidos newtonianos. Naturalmente um fluxante mais viscoso precisa de
mais força para atingir um dado gradiente de velocidade. (19).
A viscosidade é uma propriedade crítica para o desempenho dos pós fluxantes pois
tem influência direta sobre três principais aspectos: (i) homogeneidade da infiltração líquida
entre o molde e o aço; (ii) lubrificação da casca em metálica em decorrência do consumo de
pó; (iii) aprisionamento da escória (relacionada ao aumento da sua viscosidade). A
composição química exerce um papel fundamental na viscosidade do fluxante juntamente
com a sua temperatura, como podemos ver na Equação 3:

η =A.exp(E/RT) (3)

Onde A= constante de Arrhenius; E=energia de ativação; R= constante universal dos


gases; T= temperatura absoluta (K). (19).
Considerando a composição química, podemos dizer que a sílica é o maior fator
determinante da viscosidade do pó, mas ela também pode aumentar com o acréscimo do teor
de alumina. (19).
15

3.2.4 Temperatura de Cristalização


Quando o fluxante é resfriado abaixo da temperatura liquidus ele pode ou não
cristalizar, dependendo da sua composição química e ciclo térmico. Fluxantes ricos em sílica
podem ser resfriados facilmente em uma forma vítrea dentro de uma faixa de temperatura
onde eles cristalizam em condições de equilíbrio. No entanto, escórias ricas em CaO são
extremamente difíceis de se resfriar em formas vítreas. Cristais começam a aparecer no
líquido a temperaturas levemente mais baixas que a da linha liquidus. (20).
Na formação de uma camada cristalina, encontramos a presença de pequenos poros,
nos quais se acreditam serem os maiores responsáveis por uma maior resistência à
transferência de calor para fluxantes com alto índice de cristalização. Acredita-se que uma
baixa taxa de transferência de calor é responsável por uma menor ocorrência de trincas
longitudinais e uma alta freqüência de breakouts causados por agarramento.
Para as medidas das temperaturas de cristalização, utilizamos técnicas de análise
térmica como o DSC e o DTA (Differential Thermal Analysis). Utilizando a DSC podemos ver
a variação de energia quando a amostra é submetida a uma transformação endotérmica ou
exotérmica ao ser aquecida a uma taxa fixa. No DTA temos a defasagem ou o avanço da
temperatura dadas as mesmas condições termodinâmicas listadas para a DSC. Técnicas de
difração de raios-x também podem ser utilizadas para a formação de fases cristalinas. (20).
Assim como a viscosidade, a temperatura de cristalização é fortemente dependente da
composição química do fluxante. A figura 7 de Kyoden et al. Mostra a influência da relação
Cal/Sílica na taxa de cristalização. Onde, visto que, os pós com uma maior taxa Cal/Sílica
possuem índices de cristalização mais altos. (20).

Figura 7 – Relação entre a Basicidade e o índice de Cristalização.

Fonte: PINHEIRO, 1995


16

3.2.6 Comportamento de Fusão


O pó fluxante que se encontra na região do menisco consiste em quatro camadas: uma
camada de pó não fundida e que não reagiu no topo; uma camada semi-reagida sinterizada,
uma zona pastosa (mushy zone) onde o pó está fundido; e uma camada de escória líquida
diretamente sobre o aço líquido (vide figura 4) (5).
De acordo com Nakano ET al. (21), foram estabelecidos os seguintes estágios de fusão
do pó fluxante durante o processo de lingotamento:
Primeiro estágio: o pó tem sua temperatura aumentada pelo aquecimento, no entanto,
não sofre alteração em sua estrutura.
Segundo estágio: com o aumento da temperatura, ocorre a queima do carbono e os
grãos de óxidos começam a entrar em contato, iniciando a sinterização.
Terceiro estágio: a temperatura continua crescente, logo o carbono entra em
combustão e a sinterização se completa.
Quarto estágio: a temperatura finalmente favorece a fusão do material sinterizado que
começa a coalescer e forma uma poça líquida.
O carbono livre que é utilizado na formulação dos fluxantes é o responsável pelo
controle da taxa de fusão, pois suas partículas atuam como barreira física, separando as
partículas e reduzindo a sinterização do pó e sua taxa de fusão. (22).
Uma taxa de fusão adequada é determinante para garantir uma camada escória líquida
suficiente, na interface, para assegurar a continuidade do processo.

3.2.6 Interações Termoquímicas entre os fluxantes e o aço


Ao entrar em contato com o aço líquido a escória tende a fundir e com o passar do
tempo, passa a sofrer alterações em sua composição durante o processo, seja pela absorção de
inclusões que flotam do aço líquido, pelo contato com o ar ou por reações que ocorrem na
interface aço/escória.
A variação da composição química do pó fluxante pode levar a uma série de
problemas, visto que muitas de suas propriedades críticas são diretamente dependentes dessa
composição. O fluxante pode então apresentar variações em sua viscosidade, comportamento
de cristalização, aumento de freqüência de trincas, alteração nas taxas de transferência de
calor, redução na lubrificação etc.
Durante o processo de lingotamento, o pó fluxante acaba recendo uma grande
quantidade de elementos desoxidantes fortes, como o alumínio e o titânio, o que configura em
um grande problema para aços acalmados em alumínio, onde o pó é enriquecido
17

principalmente com Al2O3, pois como já foi mencionado anteriormente, há uma reação do
alumínio presente no aço com a sílica do fluxante, que podemos representar na Equação 4,
genérica abaixo. (23).

Al +MxOx = Al2O3 + xM (4)

Onde MxOx representa o óxido presente na escória.


Ao considerarmos os aços TRIP (aços que adquirem maior plasticidade através de
transformação de fase induzida por deformação e que possuem teores altos de Al), o problema
se torna ainda mais pertinente, pois a concentração de alumínio presente é 20 vezes superior à
concentração em aços acalmados a alumínio. O alumínio dos TRIP está apto a reagir com
óxidos, tais como o SiO2 tendo alumina como produto incorporado à escória, como podemos
ver na Equação 5 abaixo.

4 Al + 3(SiO2)slag = 3Si + 2(Al2O3)slag (5)

Como podemos perceber, a produção de pós fluxantes quimicamente compatíveis para


aplicação em aços com alto teor de alumínio é um desafio para os metalurgistas.
A alumina influencia no comportamento de cristalização de duas formas diferentes: (i)
uma vez que o Al2O3 atua como formador de rede, ela atua inibindo a cristalização, ou seja,
diminuindo a temperatura que a escória começa a cristalizar; (ii) ocorre uma variação de sua
fase cristalina formada durante o resfriamento. (24).

3.2.7 Problemas e defeitos relacionados aos pós fluxantes


No processo de lingotamento contínuo dos aços, os pós fluxantes são constituídos de
uma grande quantidade de diferentes componentes, sendo que um dos principais é a fluorita
(CaF2). A fluorita exerce funções importantes no processo como a redução da temperatura
liquidus e a viscosidade no sistema CaO – SiO2 – Al2O3, aumentar a tendência à cristalização e
diminuir a tendência à reações de óxirredução entre o aço e o pó, além de um bom
comportamento quanto à absorção de inclusões não metálicas, no entanto, apesar dos
benefícios do seu uso, ele gera alguns inconvenientes ambientais.
A emissão de fluorita se configura como um dos principais problemas ambientais, já
que escórias que possuem CaF2 emitem gases HF, SiF4, NaF etc. na atmosfera contribuído
para a formação de chuva ácida; lixiviação de aterros para lençóis freáticos; corrosão de
18

equipamentos e influenciando negativamente na saúde dos operadores. (26).


Em relação aos defeitos relacionados ao pó fluxante, podemos destacar:
Trinca longitudinal (longitudinal cracking) e trinca longitudinal de canto (longitudinal
corner cracking) onde a tensão responsável por suas propagações pode ser reduzida pode ser
minimizada pela manutenção de uma casca fina, sólida e uniforme de fluxante por meio da
redução das flutuações de calor. (26).
Rompimento de agarramento (sticker breakout): Breakouts no qual o aço líquido flui
em direção à parte inferior do molde causando distúrbios na produção. (65). O agarramento é
causado principalmente pela falta de lubrificação. Aços baixo carbono estão sujeitos ao sticker
breakout devido à baixa resistência da casca na região do menisco. Embora relacionado à falta
de lubrificação, o problema pode ser resolvido com o aumento da espessura da casca metálica
através do aumento de fluxo de calor horizontal. (26).
Star cracking (Fendas estrela) e spongy cracking, também causados pela falta de
lubrificação líquida, podendo ser resolvidas deixando a temperatura da parte inferior do molde
abaixo da break temperature.
Aprisionamento de gás na escória é causado pelo fluxo turbulento do aço líquido, logo
a maneira mais eficiente de reduzir o aprisionamento seria a diminuição da turbulência, mas
na prática o problema é resolvido através do aumento da viscosidade do pó fluxante.
Marcas de oscilação são marcas horizontais que ocorrem em intervalos regulares
devido o sistema oscilatório do molde no processo e devem ser removidas por meio de
esmerilhamento. (26).

3.3 Análise térmica

3.3.1 Definição de Análise Térmica


Análise térmica é um termo utilizado para abranger um grupo de técnicas nas quais
podemos monitorar as propriedades físicas e químicas de uma substância, ou de seus produtos
de reação. Tal monitoramento é feito em função do tempo, ou da temperatura, enquanto a
temperatura da amostra é submetida a uma programação controlada em atmosfera específica.
Existem vários métodos de análise térmica, diferindo de acordo com as propriedades a
serem monitoradas e na programação da temperatura. Esses métodos encontram um grande
campo de aplicações, como no controle de qualidade e pesquisas industriais.
Os principais métodos incluem a termogravimetria, análise térmica diferencial e a
calorimetria exploratória diferencial. Sendo que muitas vezes é necessária a utilização de mais
19

de uma técnica para a resolução de um problema específico. (27).

3.3.2 Métodos de Análise Térmica

3.3.2.1 Termogravimetria (TG)


Em uma análise termogravimétrica, monitoramos continuamente as alterações de
massa da amostra em função da variação de temperatura em uma atmosfera controlada,
geralmente a temperatura aumenta linearmente com o tempo. O gráfico gerado a partir desse
monitoramento é chamado Termograma ou Curva de Decomposição Térmica, como podemos
ver na Figura 8. (27).

Figura 8 – Gráfico de TGA (vermelho) e sua derivada (Azul).

Fonte: SEGOVIA; EMMERICH, 2009

As informações obtidas na termogravimetria são mais limitadas que as obtidas pelos


outros dois métodos térmicos, pois com esse gráfico temos apenas as variações de massa da
amostra em relação à temperatura, logo, o método se restringe a reações de decomposição,
oxidação e a processos físicos como vaporização, sublimação e desorção.
Podemos destacar a aplicação do método na área de estudo dos polímeros, oferecendo
informações de mecanismos de decomposição para diferentes tipos de polímeros. (27).

Dentre suas principais aplicações podemos destacar:


 Corrosão de materiais em atmosferas variadas;
 Curvas de adsorção e desadsorção;
20

 Desenvolvimento de processos analíticos gravimétricos;


 Pirólise ou decomposição térmica de materiais biológicos, orgânicos e
inorgânicos;
 Destilação e evaporação;
 Determinação da umidade, volatilidade e composição de cinzas, além da
cinética das reações envolvidas;
 Identificação de polímeros novos, conhecidos e intermediários. (27).

3.3.2.3 Análise Térmica Diferencial (DTA)


A sigla DTA vem originalmente de Differential Thermal Analysis, nesta técnica
medimos a diferença de temperatura entre a amostra e um material de referência em função de
uma temperatura programada. A amostra e o material de referência são mantidos exatamente à
mesma programação de temperatura e são monitorados por termopares, a referência pode ser
alumina ou simplesmente o cadinho vazio.
À medida que a programação de temperatura avança, percebemos que a temperatura
da amostra e da referência permanecem iguais até que haja alguma alteração física ou química
na amostra. Se a reação for exotérmica, a amostra libera calor ficando por um curto período
de tempo com a temperatura maior que a da referência, logo se a reação for endotérmica, a
temperatura da amostra será temporariamente menor que a da referência.
Mudanças que ocorrem na amostra tais como fusão, cristalização e solidificação são
registradas como picos, sendo a variação da capacidade calorífica da amostra registrada na
forma de deslocamento da linha base como podemos ver na figura 9. (27).

Figura 9 – a) Variação da capacidade calorífica b) Reação exotérmica c) Reação endotérmica.

Fonte: SEGOVIA; EMMERICH, 2009


21

A principal utilização da DTA é detectar a temperatura inicial de processos térmicos e


caracterizá-los como endotérmicos ou exotérmicos, reversíveis ou irreversíveis, tipo de
transição, etc. Esse tipo de informação faz desse método muito importante para a
determinação de diagramas de fase.

Dentre as várias aplicações da DTA podemos destacar:


 Capacidade Calorífica;
 Diagrama de Fase;
 Entalpia das Transições;
 Estabilidade Térmica e Oxidativa;
 Intervalo de Fusão;
 Transição Vítrea;
 Taxas de Cristalização e Reações. (27).

3.3.2.3 Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC)


DSC é a sigla para Differential Scanning Calorimetry, que se diferencia da DTA por
analisar as diferenças de fluxo de calor, e não da temperatura, entre a amostra e o material de
referência, enquanto as duas estão submetidas a um programa de temperatura controlada.
Logo, percebemos que a principal diferença entre os métodos é que a DSC mede diferenças
de energia, e a DTA, temperatura.

Figura 10 – Gráfico típico de DSC com o fluxo de calor em função da temperatura.

Fonte: CAMPOMANES, 2009


22

Os experimentos utilizando a técnica de DSC são normalmente realizados em modo de


varredura de temperatura, mas também são feitos experimentos isotérmicos. (27).
Apesar das diferenças em relação à DTA, as técnicas de DSC possuem praticamente as
mesmas aplicações.

Figura 11 – Demonstração da diferença de energia calculada entre o cadinho com a amostra e a


referência.

Fonte: NETZSCH, 2016

3.3.3 Importância e Utilização da DSC na Caracterização de Pós Fluxantes


Utilizando a análise de DSC, podemos medir as variações de energia que ocorrem
quando a amostra é aquecida, resfriada ou mantida em uma isoterma, juntamente com as
temperaturas nas quais essas variações ocorrem.
As variações de energia nos possibilitam encontrar e medir as transições que ocorrem
na amostra de forma quantitativa, e como foi dito, também podemos encontrar as exatas
temperaturas em que essas transformações ocorrem. Uma das grandes vantagens da DSC, é
que as amostras podem ser facilmente encapsuladas, geralmente com pouca ou nenhuma
preparação, logo as medidas podem ser feitas de forma fácil e rápida. (28).
A principal propriedade das medidas de DSC é o fluxo de calor, ou seja, o fluxo de
energia na amostra em função da temperatura ou do tempo, normalmente mostrada em
unidades de mW (miliwatts) ou µVs (microvolt segundo) no eixo y. Sendo mW o equivalente
a mJ/s (milijoules por segundo), temos literalmente o fluxo de energia por unidade de tempo.
O valor do fluxo térmico na DSC não é um valor absoluto e depende dos seus efeitos na
amostra de referência.
Além do fluxo de calor, utilizando a DSC somos capazes de determinar a Cp
23

(capacidade calorífica) de um material, que também pode ser medida quantitativamente desde
que os valores sejam obtidos a pressão constante. Tradicionalmente a sua medida é feita a
partir da subtração da linha de base a partir da curva de calor. Também podemos determinar a
entalpia de um material e a energia necessária para aquecer esse material até uma dada
temperatura. (28).
Como foi dito anteriormente, essas medidas nos permitem encontrar e medir as
transições que podem ocorrer na amostra, mais especificamente, as chamadas transições de
primeira ordem que são caracterizadas por apresentarem variações de entalpia (endotérmicas
ou exotérmicas) dando origem a formação de picos nos gráficos gerados.
Como exemplos de eventos endotérmicos, podemos citar:
 Fusão;
 Perda de massa da amostra;
 Dessorção;
 Reações de Redução.

Se tratando de eventos exotérmicos, temos:


 Cristalização;
 Reações de polimerização;
 Cura, oxidação;
 Degradação oxidativa;
 Adsorção;
 Entre outros.

E também, a DSC pode ser utilizada na identificação e análise das chamadas


transições de segunda ordem, que se caracterizam pela variação de capacidade calorífica,
porém sem variação na entalpia. Nesses casos, essas transições não apresentam formação de
picos, mas como um deslocamento da linha de base em forma de S. São exemplos dessas
transições:
 Transição vítrea;
 Relaxações de tensões térmicas da cadeia polimérica. (28).
24

Figura 12 – Gráfico de cristalização a partir de uma amostra fundida obtida por DSC.

FONTE: Campomanes, 2009

Os métodos de análise térmica são ferramentas poderosas para a obtenção de


informações sobre o comportamento do fluxante. Com a exceção da TG que é mais focada em
reações e flutuações de massa da amostra, tanto a DTA como a DSC podem ser utilizadas para
a determinação de temperaturas onde as transformações alotrópicas acontecem, as energias
dessas transformações, transições vítreas e taxas de cristalização. A análise térmica
(juntamente com outras técnicas de caracterização) permite montar diagramas de fase
detalhados dos mais variados tipos de compostos utilizados na confecção de pós fluxantes.
Com base nos dados obtidos na análise térmica, podemos prever o comportamento
termodinâmico do fluxante, assim como seu comportamento em contato com o material
líquido lingotado para que possamos estimar a probabilidade de falhas, ou se o fluxante em
questão é uma boa alternativa como lubrificante, atuando na transferência de calor, na
absorção de inclusões ou em outras propriedades já citadas no tópico referente aos fluxantes.
25

4. MATERIAIS E MÉTODOS

4.1 Preparação da amostra de fluxante CaO-Al2O3-B2O3


Devido à necessidade de um forno específico, a preparação e coleta de dados da
amostra foram realizadas nos laboratórios da University of Science and Technology Beijing.
A preparação consiste na calcinação dos componentes listados na Tabela 3 em um
forno de mufla para a retirada de umidade e de impurezas. Os compostos foram fundidos a
uma temperatura de cerca de 1350 °C por um período de 2 horas para a obtenção de um
fluxante fundido homogêneo. Em seguida, o material fundido é rapidamente solidificado em
água formando uma estrutura vítrea amorfa.

Tabela 3 – Composição química da amostra utilizada (Massa%).

CaO/Al2O3 CaO Al2O3 B2O3 Na2O Li2O


1 38 38 8 8 8

Fonte: Elaborada pelo autor

As temperaturas foram obtidas com microscopia de aquecimento e a viscosidade foi


determinada utilizando um viscosímetro rotativo.

Tabela 4 – Propriedades da amostra de escória estudada.

Tfusão(°C) Tlíquidus(°C) Viscosidade (1300°C, Pa.s)

1163 1183 0,292

Fonte: Elaborada pelo autor

Depois de solidificado, o material é novamente analisado por fluorescência para a


obtenção de sua composição exata.
Após a pesagem em uma balança de precisão, o material é pulverizado em um
almofariz de ágata com etanol como meio de mistura para assegurar a completa
homogeneização.
A amostra se encontra pronta para ser adicionada ao cadinho de platina para a análise
DSC.
26

Figura 13 – Amostra granulada pronta para a análise.

FONTE: Elaborada pelo autor

4.2 Análise Térmica das amostras utilizando a DSC

4.2.1 Equipamento utilizado


Para a análise de DSC das amostras foi utilizada um analisador térmico simultâneo de
modelo STA 449 F3 Jupter da marca NETZSCH.

Figura 14 - Analisador Térmico STA 449 F3 JUPITER utilizado para os experimentos.

FONTE: Elaborada pelo autor


27

O analisador térmico utilizado possui um forno de Ródio resfriado a ar, e permite a


medição de mudanças em massa e de efeitos térmicos em temperaturas entre a temperatura
ambiente e 1650 °C. Sua resolução de DSC é inferior a 1 μW com duas válvulas comutadoras
para gases de purga e uma para o gás de proteção.
Para gases de purga, foram utilizados nitrogênio e argônio de alta pureza, sendo que o
último também foi utilizado como gás de proteção. A pressão das válvulas para a entrada dos
gases deve estar a 0,5 Bar.
São utilizados dois cadinhos, um de platina para a análise, (esse tipo de cadinho é
recomendado para a análise de materiais cerâmicos e óxidos) onde será colocada a amostra e
um cadinho de alumina funcionando como referência e que ficará vazio. A limpeza do
cadinho após a sua utilização, dependerá do material que foi fundido anteriormente. A limpeza
pode ser feita apenas com água no ponto de fervura ou em banho ultrassônico para compostos
que se dissolvem fácil em água, ou utilizando ácido clorídrico (HCL) em temperatura de
ebulição, para a retirada de compostos mais difíceis. A utilização de HCl em alta temperatura
por um tempo de 20 minutos se mostrou bastante eficiente para todos os casos. Após a
limpeza, o cadinho deve ser secado com a utilização de álcool e um secador. É de grande
importância manipular os cadinhos de platina com delicadeza e menor pressão possível ao
utilizar uma pinça, pois o metal é bastante maleável e uma pressão maior pode acabar
deformando o cadinho.

Figura 15 – Cadinhos de platina limpos utilizados no experimento.

Fonte: Elaborada pelo autor


28

4.2.2 Calibração do Equipamento


A calibração do equipamento é uma etapa imprescindível para a obtenção de
resultados precisos. A calibração de temperatura e de sensitividade deve ser realizada a cada 6
meses, também é necessária a calibração da balança que por ser um processo bem mais
simples e automático deve ser executada com maior frequência.
O processo consiste na análise térmica de compostos padronizados, que geralmente
acompanham o equipamento na sua compra, para a criação de uma baseline, ou seja, uma
correção que será utilizada para ajustar os dados em uma determinada condição ambiental
anulando os desvios naturais que podem ocorrer com o tempo e utilização constante do
equipamento. Basicamente, podemos dizer que a calibração fará um comparativo entre os
dados conhecidos (já que os compostos são padronizados) e os dados obtidos da análise,
calculando os possíveis desvios.
Para cada tipo de cadinho e faixa de temperatura há uma sequência de compostos a
serem utilizados na calibração. Como a análise central deste trabalho foi feita em um cadinho
de platina, a sua calibração será mais detalhada, no entanto, vale citar a calibração para os
cadinhos de alumina, utilizados principalmente na análise térmica de metais.
É importante ressaltar que existem cadinhos dos mais variados formatos e
composições, não sendo restritos apenas à platina e alumina.

4.2.2.1 Calibração para cadinhos de Pt


A Platina possui baixa reatividade e um ponto de fusão de 1768°C, sendo assim um
cadinho ideal para a análise térmica dos pós fluxantes, assim como outros óxidos e materiais
cerâmicos.
Para fins de calibração e análise, são recomendados entre 10 e 20mg de massa de cada
um dos compostos para a análise, no entanto, há uma grande tolerância nesse quesito, pois
não há influência direta da massa nos resultados relevantes ao nosso propósito.
Cada composto padrão gerará um gráfico, com picos que representam eventos
térmicos, para a nossa finalidade, são calculadas as áreas de picos específicos que
correspondem à energia e a temperatura de início desse evento térmico, a onset temperature,
que corresponde à intercessão das tangentes do pico com a baseline extrapoladas. As áreas
representam as energias dos eventos térmicos, e serão utilizadas para a calibração da
sensitividade, as temperaturas de início ou onset temperatures serão utilizadas para a
calibração de temperatura.
A programação de temperaturas para cada um dos elementos está disponível no
29

manual de calibração do equipamento e são baseadas nas temperaturas onde ocorrem


transformações de fase.

Figura 16 – Termograma de DSC demonstrando as principais temperaturas de um pico.

Fonte: http://www.hydrateweb.org/dsc

Para essa calibração, foram utilizados quatro elementos padrão de propriedades e


transformações térmicas conhecidas a uma taxa de aquecimento e resfriamento de 20K/min,
são eles:

1. Sulfato de Prata (Ag2SO4)


O Sulfato de Prata deve ser submetido a um único aquecimento de 20°C a 600°C,
gerando assim apenas um pico no qual teremos a área e a onset temperature.

2. Cloreto de Césio (CsCl)


O Cloreto de Césio deve ser submetido a um aquecimento de 50°C a 600°C,
seguido de um resfriamento até 350°C onde permanece em isoterma por 30min até ser
aquecido novamente até 600°C, resfriado novamente até 350°C onde repete a isoterma
e finalmente aquecido novamente até 600°C. Esse procedimento irá gerar três picos de
aquecimento. Será feita a média das áreas e temperaturas do segundo e terceiro pico.

3. Cromato de Potássio (K2CrO4)


O Cromato de Potássio deve ser submetido a um aquecimento de 50°C a 800°C
30

seguido de um resfriamento até 580°C, novamente aquecido até 800°C, então


resfriado e aquecido mais uma vez. Esse procedimento irá gerar três picos de
aquecimento. Será feita a média das áreas e temperaturas do segundo e terceiro pico.

4. Carbonato de Bário (BaCO3)


O Carbonato de Bário deve ser submetido a um aquecimento de 50°C a 920°C
seguido de um resfriamento até 700°C, novamente aquecido até 920°C, então
resfriado e aquecido mais uma vez. Esse procedimento irá gerar três picos de
aquecimento. Será feita a média das áreas e temperaturas do segundo e terceiro pico.

A partir dos dados obtidos para os compostos padronizados, a calibração será realizada
utilizando o software do equipamento, no caso, o TemperatureCalibration para a calibração
de temperatura e o SensitivityCalibration para a sensitividade, ambos fazem do pacote
Proteus disponibilizado pela NETZSCH.
Em ambos os softwares, o processo de cálculo é semelhante, devemos eliminar as
entradas com compostos que não utilizamos, definir as condições de aquecimento e gases
utilizados para então inserirmos os dados obtidos. O objetivo final de cada software é gerar
um gráfico (para a calibração o TemperatureCalibration irá gerar o referente à temperatura e o
SensitivityCalibration referente à sensitividade), comparativo entre os resultados encontrados
em experimento e os esperados, calculando o ajuste necessário da calibração.

4.2.2.2 Calibração para cadinhos de Al203


O processo é exatamente o mesmo do realizado para os cadinhos de platina, sendo que
o único diferencial são os compostos utilizados (que são metais) e suas respectivas
programações de aquecimento e resfriamento. Como sua calibração não é de grande foco para
o trabalho aqui apresentado, vale citar os compostos utilizados e a sequência de análise dos
mesmos. Podemos ver resumidamente na Tabela 5:

Tabela 5 – Substâncias utilizadas para a calibração e suas respectivas


programações de temperatura.
Substância Ponto de Fusão Programação
Aquecimento 20 a 260°C
156,6°C
Índio (In) Resfriamento 260 a 50°C
Aquecimento 50 a 260°C
31

Resfriamento 260 a 50°C


Aquecimento 50 a 260°C

Aquecimento 20 a 340°C
Resfriamento 340 a 130°C
231,9°C
Estanho (Sn) Aquecimento 130 a 340°C
Resfriamento 340 a 130°C
Aquecimento 130 a 340°C
Aquecimento 20 a 380°C
Resfriamento 380 a 170°C
271,4°C
Bismuto (Bi) Aquecimento 170 a 380°C
Resfriamento 380 a 170°C
Aquecimento 170 a 380°C
Aquecimento 20 a 480°C
Resfriamento 480 a 320°C
419,6°C
Zinco (Zn) Aquecimento 320 a 480°C
Resfriamento 480 a 320°C
Aquecimento 320 a 480°C
Aquecimento 20 a 760°C
Resfriamento 760 a 560°C
660,6°C
Alumínio (Al) Aquecimento 560 a 760°C
Resfriamento 760 a 560°C
Aquecimento 560 a 760°C
Aquecimento 20 a 1150°C
Resfriamento 1150 a 950°C
1064,4°C
Ouro (Al) Aquecimento 950 a 1150°C
Resfriamento 1150 a 950°C
Aquecimento 950 a 1150°C

Fonte: Elaborada pelo autor

4.2.3 Análise da amostra preparada e utilização do equipamento.


Ambos os cadinhos vazios são colocados no sistema de suporte de amostras onde é
realizada a medição de correção. A medição de correção gera uma curva para o sistema sem a
amostra a ser analisada e deverá ser subtraída posteriormente da curva gerada com a análise
da amostra. O processo de medição com e sem a amostra é praticamente o mesmo.

A medição é realizada de acordo com os seguintes passos:


1. Caso o equipamento esteja desligado, é recomendada a sua utilização apenas depois de
32

2 horas após o mesmo ser religado.

2. Limpeza do equipamento e da bancada com álcool. Manter a bancada limpa e


organizada.

3. Manter a temperatura do banho térmico entre 2°C e 3°C acima da temperatura


ambiente. O mostrador de temperatura está representado na Figura 17.
Obs.: Caso o sistema de banho térmico tenha sido desligado, é recomendado esperar
um tempo de duas horas após a temperatura ser atingida antes de se fazer uma análise.

Figura 17 – Sistema de banho térmico indicando a temperatura ideal de 27°C.

FONTE: Elaborada pelo autor

4. Ligar os gases de Purga 1 e 2 (gases do forno) e o gás de proteção a uma pressão de


0,5 Bar. A pressão e o fluxo devem ser ajustados diretamente no sistema de válvulas
mostrado na Figura 18.
Obs.: No nosso caso, para gases de purga, foram utilizados nitrogênio e argônio de
alta pureza, sendo que o último também foi utilizado como gás de proteção.
33

Figura 18 – Sistema de válvulas e controle dos gases de entrada.

Fonte: Elaborada pelo autor

5. Ligar o lifting device para subir o forno e expor as hastes onde serão colocados os
cadinhos. Há um botão de segurança na lateral do equipamento que deve ser
pressionado ao mesmo tempo dos botões de descida e subida do forno.
Obs 1.: Caso seja necessária uma medição de DTA a haste deve ser trocada, no
entanto, como isso nunca foi necessário, a haste utilizada para DSC já se encontra no
local apropriado.
Obs 2.: A haste deve estar centralizada em relação ao radiation shield , como mostra a
Figura 19. Caso a haste esteja tocando o radiation shield ou pendendo para um lado,
ela deve ser delicadamente centralizada com uma pinça ou utilizando luvas.

6. Colocar de 10 a 20mg da amostra no cadinho de platina.

7. Colocar os cadinhos da referência e o da amostra na haste, sempre utilizando luvas de


silicone e pinças para a manipulação.
Obs.: Para a nossa análise, utilizamos o cadinho de platina para amostra e o cadinho de
Al2O3 vazio como cadinho de referência.
34

Figura 19 – Sistema de suporte da amostra (Haste de DSC e posicionamento dos cadinhos).

FONTE: NETZSCH, 2012

8. Baixar o forno utilizando os botões de lifting. (Observar tópico 5)


Obs.: Se a haste não estiver centralizada o forno pode se chocar com a mesma no
momento em que ele baixa, é importante descer o forno com calma sempre
verificando se não haverá choque com a haste.

9. Verificar se há o fluxo de gases para o equipamento


Obs.: Caso os gases estejam entrando normalmente, deixar que o fluxo continue por 2
minutos antes de iniciar a análise para garantir que o gás preencha as cavidades do
equipamento e garanta a proteção da amostra.

10. É inicializado o programa de medidas STA 449F3 ® que acompanha o equipamento.


Inicialmente preenchemos o “cabeçalho” com dados do operador e da amostra, em
seguida são feitas as programações de temperaturas inicial e final, isotermas e tempo.
35

Obs.: A programação utilizada para a nossa amostra de pó fluxante foi de um único


aquecimento de 20°C a 1350°C, seguido de um resfriamento até 600°C. Utilizamos
uma taxa de aquecimento e resfriamento padrão de 20K/min. A definição da
temperatura e taxa de aquecimento é baseada no conhecimento das características
físicas e químicas da amostra.

11. Com todas as informações e programações feitas corretamente, iniciamos a liberação


dos gases, esperamos um tempo de 2 minutos e damos início à análise clicando start.
A plotagem terá início, demorando um tempo que varia bastante de acordo com a
programação da temperatura.
Obs.: É importante deixar o equipamento o mais longe possível de vibrações ou
impactos durante a análise devido a sua sensibilidade, evitando assim grandes erros na
plotagem dos gráficos.

12. Ao final da análise utilizando o software Proteus Analysis ® para a avaliação do


gráfico de DSC da amostra analisada. Nessa parte é possível mudar os eixos e eliminar
isotermas, caso necessário. Com o software podemos calcular todas as temperaturas e
energias necessárias, obtendo assim os resultados termodinâmicos referentes à amostra
analisada.
36

5. RESULTADOS E DISCUSSÕES

5.1 Resultados da calibração para o cadinho de Pt


Aqui são apresentados os gráficos e resultados experimentais das análises de DSC
dos compostos utilizados para a calibração do equipamento.
A linha pontilhada vermelha corresponde à programação de temperatura do
equipamento, cada composto tem a sua programação padrão. Observando essa linha
podemos ver os aquecimentos, resfriamentos e isotermas.
A linha verde representa a análise termogravimétrica (TG) simultânea a DSC. Ela
indica a variação da massa do composto durante as variações de temperatura, entretanto,
como foi dito anteriormente, os dados de TG tem pouca relevância para a calibração.
A curva azul representa a análise DSC propriamente dita, de onde iremos retirar as
informações para a calibração, como foi descrito detalhadamente no item 4.2.2.1.
Seguem abaixo os gráficos dos compostos utilizados na calibração do
equipamento:

1. Sulfato de Prata (Ag2SO4)

Figura 20 – Termograma DSC para o Ag2SO4.

Fonte: Elaborada pelo autor


37

2. Cloreto de Césio (CsCl)

Figura 21 – Termograma DSC para o CsCl.

Fonte: Elaborada pelo autor

3. Cromato de Potássio (K2CrO4)

Figura 22 – Termograma DSC para o K2CrO4.

Fonte: Elaborada pelo autor


38

4. Carbonato de Bário (BaCO3)

Figura 23 – Termograma DSC para o BaCO3.

Fonte: Elaborada pelo autor

Na Tabela 6 temos os dados que foram extraídos dos gráficos previamente plotados
para os quatro compostos. Como foi dito no item 4.2.2.1, para o CsCl, K2CrO4 e BaCO3, os
valores de energia e de temperatura, são uma média dos valores encontrados no segundo e
terceiro pico de aquecimento em seus respectivos gráficos.

Tabela 6 – Dados de calibração obtidos experimentalmente

Composto Área do Pico (Energia) (µVs/mg) Onset Temperature (°C)


Ag2SO4 - 33,27 422,7
CsCl - 9,75 472,45
K2CrO4 - 17,87 664,4
BaCO3 - 33,96 805,1

Fonte: Elaborada pelo autor


39

Após inserir as temperaturas experimentais no software TemperatureCalibration é


gerado o gráfico da calibração de temperatura para a avaliação.

Figura 24 – Gráfico referente à calibração de temperatura mostrando a relação entre temperatura nominal
esperada e a temperatura experimental.

Fonte: Elaborada pelo autor

O gráfico apresenta uma reta de tolerância em um gráfico onde o eixo x mostra as


temperaturas encontradas e o eixo y, as diferenças esperadas (temperatura nominal
(padronizada) – temperatura experimental (nossa medição)). Podemos ver que os pontos se
aproximam da reta. Apesar do ponto correspondente ao K2CrO4 se encontrar um pouco mais
afastado, essa margem de erro é considerada aceitável para o nosso propósito.

Tabela 7 – Diferenças entre as temperaturas nominais e experimentais e suas respectivas correções.


Composto Temp. nominal (°C) Temp. Experimental (°C) Correção (°C)

Ag2SO4 426,4 422,7 426,6


CsCl 476 472,45 476,1
K2CrO4 668 664,4 667,7
BaCO3 808 805,1 808,2

Fonte: Elaborada pelo autor

Em seguida, inserimos as áreas (energias) experimentais no software


40

SensitivityCalibration para a geração do gráfico da calibração de sensitividade a ser avaliado.

Figura 25 – Gráfico referente à calibração de sensitividade.

Fonte: Elaborada pelo autor

Nesse gráfico, temos uma curva que passa pelos pontos de sensitividade esperada para
cada temperatura, ou seja, no eixo y temos a sensitividade para cada temperatura encontrada
no eixo x. A sensitividade consiste na relação entre a área do pico (energia calculada
experimentalmente) e a entalpia esperada para aquele determinado evento termodinâmico
representado pelo pico.

Sensitividade = Entalpia/Área do Pico (para um mesmo evento termodinâmico)

Tabela 8 – Diferenças entre a sensitividade calculada e a esperada, assim como valores de entalpia e de energia
calculados.
Sensitividade Sensitividade
Temp. nominal Área do Pico
Composto Entalpia (J/g) Experimental Calculada
(°C) (µVs/mg)
(µV/mW) (µV/mW)

Ag2SO4 426,4 -51,9 - 33,27 0,641 0,608


CsCl 476 -17,2 - 9,75 0,567 0,604
K2CrO4 668 -37 - 17,87 0,483 0,487
BaCO3 808 -94,9 - 33,96 0,358 0,346
Fonte: Elaborada pelo autor
Novamente, podemos verificar uma pequena margem de erro, principalmente para os
41

compostos Ag2SO4 e do CsCl, no entanto, esse erro também é esperado e não afeta
significativamente o nosso propósito.
Com ambas as calibrações feitas e gráficos avaliados, salvamos os arquivos com os
dados de temperatura e sensitividade e finalizamos a calibração. Os arquivos contendo os
dados serão carregados a cada medição posterior, logo, o equipamento já se encontra
apropriado para futuras medições e análises até a necessidade de realização de uma nova
calibração.

5.2 Termograma DSC da amostra de escória fluxante CaO-Al2O3-B2O3


Após a realização da medição descrita no tópico 4.2.3, temos a plotagem do gráfico
referente à amostra de pó fluxante preparada. A análise com dados de energia e temperatura
são calculados após a plotagem no software NETZCH Proteus Analisys. O resultado pode ser
visualizado na Figura 26.

Figura 26 – Termograma da amostra de pó fluxante analisada

Fonte: Elaborada pelo autor


42

5.2.1 Interpretação do Termograma


No gráfico mostrado na Figura 27, podemos ver a linha pontilhada vermelha
representando a programação de aquecimento da amostra variando de 20°C até 1350°C,
seguido de um resfriamento até a temperatura de 600°C. O tempo total da análise e plotagem
foram de 110 min.

Figura 27 – Termograma mostrando apenas as curvas de TG e a programação de temperatura.

Fonte: Elaborada pelo autor

A linha verde representa a análise de TG (termogravimétrica), ou seja, calcula a


variação de massa da amostra durante a programação de temperatura. Percebemos no início
da plotagem que há uma queda seguida de uma estabilização da linha de TG. Isso ocorreu com
todas as amostras submetidas ao equipamento, e provavelmente é decorrente de uma
desestabilização inicial da balança devido à presença dos gases. No entanto, podemos
perceber uma queda de massa mais significativa quando a amostra chega a uma temperatura
de aproximadamente 1165°C, há um declive no gráfico que representa uma perda de 2,19% da
massa da amostra. Podemos observar, que durante e perda de massa não há a presença de
picos no gráfico DSC que indiquem algum tipo de reação, ou seja, não há picos que indiquem
variação de entalpia próprias de uma reação química sobreposta à variação da massa, logo
43

podemos concluir que essa perda de massa está simplesmente relacionada à evaporação de
óxidos como o Na2O e B2O3 ao chegarem a uma temperatura crítica.
Na Figura 28 temos as curvas de DSC, representadas pela linha azul. Percebemos uma
linha de base (baseline) praticamente paralela ao eixo x, que corresponde ao estado onde não
há variação de energia e do Cp, logo cada elevação, diminuição ou pico, representa uma
variação de energia da amostra em detrimento de algum evento termodinâmico. Como
podemos observar no termograma representado na Figura 28, esses eventos podem ser
exotérmicos ou endotérmicos no gráfico em questão, os eventos exotérmicos são
representados no sentido negativo do eixo y, enquanto os endotérmicos estão representados no
sentido positivo. Temos os picos nos quais podemos calcular a sua área para saber a energia
que foi absorvida ou transferida em um determinado evento térmico (caracterizando eventos
de primeira ordem) e variações na “altura” da baseline que representam a variação do Cp
(evento de segunda ordem, ver item 3.3.3).

Figura 28 - Termograma mostrando apenas as curvas de DSC e a programação de temperatura.

Fonte: Elaborada pelo autor


44

No início do tempo temos uma elevação natural da baseline seguida da estabilização


da mesma. Aproximadamente no minuto 23 temos uma pequena elevação de Cp, indicado no
gráfico pelo “slope” ou “rampa” caracterizando uma transição de segunda ordem, no caso,
essa transição corresponde à transição vítrea, nesse intervalo de temperatura acontece o
processo reversível do material cristalino para um estado conhecido como líquido super-
resfriado acompanhado de uma diminuição do volume e um grande aumento da viscosidade, a
temperatura de vitrificação (Tg de glass temperature) é determinada a partir da intercessão
entre as retas prolongadas da descontinuidade. O termograma nos forneceu a temperatura Tg
exata de 520,2°C, temperatura essa onde a vitrificação da amostra acontece em caso de super-
resfriamento, nesse ponto a viscosidade chega à ordem de 1012 Pa.S.

Vidros podem ser definidos como sólidos não cristalinos que sofrem transição vítrea
durante a sua preparação. O super-resfriamento do líquido faz com que ele não sofra a
cristalização e se torne vítreo. Abaixo da temperatura de vitrificação a viscosidade é tão alta
que a estrutura atômica “congela”. Se o resfriamento é rápido o suficiente para evitar a
nucleação do cristal e seu crescimento, ao atingir a Tg os átomos permanecem “congelados”
em posições fixas e o vidro é formado. Se o material vítreo for termicamente tratado por um
longo período de tempo para tender a uma situação de equilíbrio em uma temperatura acima
da Tg, a desvitrificação iniciará, dando início a uma posterior nucleação. (31). O estágio de
vitrificação é encontrado em regiões do molde onde a taxa de transferência de calor é muito
alta.

Entre 29,8 e 37,2 min temos dois picos exotérmicos que indicam cristalização
(transição de primeira ordem). No primeiro pico pudemos calcular uma temperatura de
cristalização de 625,3°C, onde foi necessário despender uma energia de 9,237 mW/mg. O
segundo pico acontece em uma temperatura de 772,8°C despendendo uma energia
consideravelmente menor que o primeiro pico, 0,4196 mW/mg. Cada pico corresponde a uma
fase precipitada durante o aquecimento, entretanto, é necessária a identificação das mesmas
utilizando outros métodos de caracterização.

O último e maior pico registrado no aquecimento se inicia após os 50 min,


correspondendo a um evento de primeira ordem e endotérmico (sentido positivo do eixo y),
claramente esse pico representa a energia total para que o fluxante se torne completamente
líquido. Podemos perceber que esse pico é formado por três picos de tamanhos decrescentes,
as energias vão gradativamente diminuindo até se atingir o equilíbrio termodinâmico, logo
consideramos a onset temperature do último pico como a temperatura liquidus, onde o
45

fluxante foi completamente fundido e se encontra em equilíbrio (56,8 min). A temperatura


liquidus encontrada foi de 1164,5°C, um pouco acima da temperatura de fusão mostrada na
Tabela 4: 1163°C (como era de se esperar).

A determinação da temperatura liquidos é imprescindível para a criação de um


diagrama de fases da escória fluxante, obviamente, para essa determinação seriam necessárias
outras amostras com variados teores de B2O3, para a plotagem da linha liquidus. A partir de
1164,5°C, a nossa amostra com 8% de B2O3 se torna completamente líquida diminuindo a sua
viscosidade e obtendo uma maior homogeneidade de infiltração entre o molde e o aço líquido.
Uma temperatura perfeitamente viável e bem abaixo da temperatura do aço que será
lingotado.

A baseline continua crescendo até o ponto em que a temperatura para de aumentar e se


inicia o resfriamento, o que explica sua queda brusca no ponto onde a temperatura atinge os
1350°C.

Logo após a queda da linha de base, no início do resfriamento, há uma pequena


instabilidade que não deve ser confundida com um pico, é algo inerente à analise e não tem
influencia significativa.

Por volta dos 80,2 minutos temos um evento de primeira ordem exotérmico
representado por dois picos “unidos”. Esse evento corresponde à energia necessária para a
cristalização do cristal, no caso, cada pico representa a energia de cristalização de uma
determinada fase formada pelo resfriamento do fluxante. Pudemos calcular a energia e a
temperatura de cristalização para cada uma das fases precipitadas. No primeiro precipitado
cristalino foi necessário despender uma energia de 5,792 mW/mg, possuindo temperatura de
cristalização de 1065,9°C (80,2 min). No segundo precipitado (segundo pico aos 81,1min)
registramos uma energia despendida de 20,17 mW/mg e uma temperatura de cristalização de
1048,9°C para o segundo precipitado cristalino.

Como já foi mencionado anteriormente, a presença de cristais tem efeito decisivo na


lubrificação e na transferência de calor. As espessuras das camadas vítreas e cristalinas
dependem basicamente da composição do pó fluxante e das diferentes condições de
resfriamento. O controle da transferência de calor entre o molde e o metal que também é
determinada por essa camada cristalina é fundamental para evitar defeitos superficiais e
trincas longitudinais. A cristalização da escória fluxante reduz a transferência de calor
horizontal, além de absorver algum calor da solidificação do aço líquido, reaquecendo o
46

fluxante e levando à cristalização do filme vítreo próximo às paredes do molde de cobre,


afetando drasticamente a lubrificação. (29)

Uma vez que o fluxante é fundido e se infiltra entre o molde e a superfície do metal, a
escória líquida será exposta a diferentes resfriamentos, e cada um dele irá colaborar ou não
com a cristalização. (30)

A temperatura de cristalização de uma fase corresponde à temperatura na qual a


cristalização se inicia em um processo não isotérmico e pode ser determinada a partir das
temperaturas onset dos picos exotérmicos encontrados durante o resfriamento. De acordo com
nossa análise, encontramos duas temperaturas nas quais a cristalização de fases acontece, o
primeiro a 1065,9°C e o segundo a 1048,9°C, sempre consideramos a temperatura do primeiro
cristal a precipitar como a temperatura de cristalização do pó fluxante em si, logo, para nossa
amostra, a temperatura de cristalização encontrada foi de 1065,9°C.

De acordo com QIFENG, Shu, o pico inicial mostra a precipitação de cristais de


Ca3Al2O6, seguido assim pela precipitação de LiAlO2. Para encontrar essas fases, foi
necessária a utilização de outra amostra de mesma composição e maior massa sujeita às
mesmas condições de temperatura e em seguida é realizada a difração de raios X nessa
amostra. (31).

Vale ressaltar que a temperatura de cristalização do pico exotérmico depende


diretamente da faixa de resfriamento, e decresce com o aumento dessa taxa. Quanto mais
rápida for a transferência de calor, menor será a temperatura de cristalização. No entanto,
como vimos anteriormente, taxas de resfriamento demasiadamente elevadas provocam a
vitrificação. É comum que haja a formação de fases vítreas em regiões do molde com taxas
mais elevadas de transferência de calor e ã cristalização aconteça em regiões onde a taxa é
mais baixa.

Com a análise realizada, pudemos obter dados relativos às transformações do fluxante,


como sua temperatura liquidus, transição vítrea e cristalização.
47

6. CONCLUSÃO

Neste trabalho, ainda em desenvolvimento, pode-se concluir a grande oportunidade de


se utilizar as técnicas de calorimetria exploratória diferencial como ferramenta poderosa na
caracterização de escórias fluxantes. O estudo da técnica nos permitiu descrever
detalhadamente o processo de calibração do equipamento e como devemos proceder ao
realizar a análise térmica de um determinado composto, logicamente, focando na análise de
pós fluxantes e suas particularidades levadas em consideração no momento da escolha de
certos parâmetros da análise e do equipamento. Constatamos a viabilidade do método para a
caracterização de propriedades físicas cruciais no desenvolvimento e análise de novos tipos de
escórias fluxantes, no entanto, a ferramenta deve ser utilizada em conjunto com outros
métodos como a difração de raios x, técnicas de medição de viscosidade e outros métodos
para cálculo de temperaturas para assim prover uma análise mais completa do objeto de
estudo.
Baseados nos resultados já conhecidos e nos obtidos no termograma, podemos
concluir que o sistema CaO-Al2O3-B2O3 parece bastante promissor como candidato a
fluxantes livres de fluoretos e como pós a serem utilizados no lingotamento de aços com alto
teor de Al, no entanto, a quantidade de informação fornecida para uma única amostra é
insuficiente para uma análise mais aprofundada em uma conclusão mais assertiva, é
necessário que se utilizem várias amostras com variações de proporção do sistema
apresentado para um estudo da influência de cada componente nas propriedades físicas e
químicas do fluxante, assim como a um estudo comparativo relativo às diferentes taxas de
resfriamento e variações de temperatura que podem ocorrer no molde, há também a
necessidade da utilização de outras técnicas para uma caracterização mais eficiente das fases
formadas, da cinética de cristalização, viscosidade, lubrificação, transferência de calor e entre
outras propriedades relevantes na seleção de um pó fluxante.
Tendo como base o aparato bibliográfico, o conhecimento prático e a experiência
adquirida na elaboração deste trabalho, conclui-se que a DSC é uma técnica eficiente para a
caracterização de fluxantes, no entanto, somente uma sequência de análises com outras
variações de composição e de temperaturas, juntamente com outras ferramentas de
caracterização poderão fornecer conclusões precisas.
48

7. SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS


Para prosseguimento dos estudos realizados, sugerem-se como oportunidades os
seguintes trabalhos:

1. Análise DSC para mais amostras com variadas proporções nos teores de CaO,
Al2O3 e B2O3, fazendo assim um estudo comparativo da influência da composição.

2. Variar as programações e taxas de resfriamento das amostras de escórias fluxantes


propostas para estudo do comportamento de cristalização em diferentes áreas de
transferência de calor.

3. Utilização de técnicas de Difração de Raios X nas amostras de pós fluxantes para


uma precisa caracterização das fases em diferentes condições de temperatura,
assim como a porcentagem de vitrificação e cristalização das fases.

4. Criação de um diagrama de fases mais completo para o sistema CaO- Al2O3- B2O3,
determinando a linha liquidus para um espectro de composição, variando o teor de
B2O3.

5. Estudar fatores externos que possam influenciar na precisão da calibração, e


consequentemente nos resultados fornecidos pelo equipamento de análise térmica.

6. Estudar a influência do tamanho de grão da amostra nos resultados obtidos pela


análise térmica.

7. Analisar amostras mantendo o teor de B2O3 e variando a relação CaO/Al2O3,


buscando variações na cristalização.

8. Fazer um estudo da viscosidade para as variações do sistema CaO- Al2O3- B2O3.

9. Realizar uma calibração mais detalhada utilizando o máximo de compostos padrão


para uma melhor adaptação às curvas de temperatura e sensitividade.
49

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