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© 2 0 1 5 Síkírü Sàlám l (K ing); R onilda lyakem i Ribeiro.

Revisão: Rodrigo Ribeiro Frias c Marilia Frias


ReJeitura critica da 2a Edição: Sérgio Victor
Chiancone eAntonia de Lourdes Satnões Chiancone

Revisão do iorubd: Yaya Abiotia


Capa: Uiltoti Breymaier

Foios: Viktor Juttcker

Diagratnação: Silvia Nair Rotnero Morales

Exu c a ordem do universo. Síkírü Sàláml (King); Ronilda lyakemi Ribeiro.

São Paulo: Editora Oduduwa, 2011.

ISBN: 978-85-85336*07-3

índice para Catálogo Sistemático:

1. Exu; 2. Orixás; 3. Iorubá (etnia); 4. Religião Tradicional Iorubá;


5. Corpus literário de Ifá

©2015
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A g ra d e c im e n to s

Numa jornada prolongada, de cerca de duas décadas, a m uitos conhe­


cemos e muitos caminham a nosso lado. Ocasiões de convívio, breve ou
prolongado, certamente proporcionam oportunidades de aprendizagem e de
enriquecim ento hum ano m útuo. D urante o tempo de produção desta obra
muito diálogo fecundo teve chance de ocorrer. A cada pessoa que, de um modo
ou outro, participou desse processo, expressamos nossa profunda gratidão.
Agradecemos com particular apreço aos nossos inform antes orais,
tradicionalistas da palavra sem os quais não disporíam os das informações
tão ricas aqui apresentadas, a começar pelo Babalaô Fábünmi Sówúnmí, pela
Ialorixá Òbímonúrç Àsàbí Díyàólú e pela C hief W úlèm çtu Àlàkç Çrínóçó
Sàlámi, nossos primeiros m entores espirituais, hoje cultuados por nós como
ancestrais veneráveis no Oduduw a Templo dos Orixás. Agradecemos ainda
aos babalaôs Líwòsi Igbórè, Lawál Rafiü, Fásçlá Adéyanjú e Olúwásçlá
A yélabplá, assim com o ao Prof. Dr. P. A. de Dçpámú. Cabe particular
agradecim ento a Rodrigo Ribeiro Frias e Marília Frias pelo m inucioso e
exigente trabalho de revisão desta obra em sua prim eira edição, e a Sérgio
Victor Chiancone e Antonia de Lourdes Samões C hiancone pela releitura
crítica da obra em sua segunda edição.
Que a Primeira Estrela a Ser Criada ilum ine os cam inhos de todos
os que colaboraram para a edificação deste texto. Que Exu Elegbara nos
conduza ao encontro do que legitim amente buscamos.
Exu Odara, nós som os seus devotos! A você, toda a nossa gratidão
pela alegria experimentada ao ver nosso trabalho chegando às mãos de quem
deseja conhecer tua natureza!
Babá Exu, abra nossos cam inhos e favoreça nosso encontro com as
pessoas que devemos conhecer para bem realizar o destino de nossos oris e
para prom overmos a Justiça e a Paz no coletivo a aue pertencem os.
(
(
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l

I
Sumári(

Prefácio à segunda edição em língua portu g u esa..................................... í


A presentação..................................................................................................... 1;
Introdução ....................................................................................................... 1

Parte I
Os iorubás: o hum ano, o divino e o código ético-moral

Capítulo 1 Noção iorubá de pessoa


e práticas m ágico-m edicinais......................................... 33
Capítulo 2 O divino na tradição de orixás. Teologia iorubá:
Eledunmare, orixás e ancestrais ................................... 53
Capítulo 3 Valores e virtudes:
o código ético-moral iorubá ....................................... 99
Parte II
Exu: aspectos teológicos e litúrgicos

Capítulo 4 Natureza e ação de Exu ................................................139


Capítulo 5 Exu e o destino hum ano ............................................... 155
Capítulo 6 A dinâmica estabelecida entre
ori e iwá e a ação de Exu ............................................... 171
Capítulo 7 Símbolos, rituais e oferendas ....................................... 185
Capítulo 8 (In)Compreensão de Exu no continente
de origem e em países da d iá s p o ra .............................. 211
Parte III
Presença de Exu no corpus da tradição oral iorubá

Capítulo 9 Transmissão oral de conhecim entos


Corpus literário e sistema divinatório de I f á ............. 225
Capítulo 10 Mitos de Exu nos odus de Ifá (iorubá) ......................237
Capítulo 11 M itos de Exu nos odus de Ifá (p o rtu g u ê s)................. 279
Capítulo 12 Oriki. àdúrà e ibà Èsú:
evocações, rezas e saudações de Exu ..........................329
Capítulo 13 Orin Èsú:.
Cantigas de Exu ...............................................................371
Glossário ................................................................................................... 405
Referências ...............................................................................................473
Prefácio à Segu nda Edição em
Língua Portu gu e sa

Na manhã de 1821 o iorubá Adjai, nascido em Oshogbô, com seus


prováveis onze, talvez doze anos de idade, tornou-se cativo e foi encar­
cerado em um navio, rapidamente lançado ao mar. O navio, interceptado
pela M arinha Britânica, levou Adjai a ser acolhido pela fé cristã e, batiza­
do com o protestante, ele passou a adotar o nome Samuel Crowthert. Em
1827, já ordenado pastor, iniciou sua carreira docente lecionando Língua
Inglesa c Teologia na Church Missionary Society, instituição protestante
que o amparou em Serra Leoa e o enviou a Abeokutá, onde reencontrou a
mãe depois de anos de separação. Em 1864 foi consagrado bispo. Alem de
suas atividades docentes, em função das quais traduziu conteúdos cristãos
para idiomas africanos, esforçou-se por educar iorubás, e desses esforços
resultaram produções lingüísticas' que, segundo consta, inauguraram uma
tradição iorubá escrita.
Na constituição dos Estados-Nação em territórios africanos, a disse­
minação falada e escrita da língua inglesa, em detrimento das línguas locais,
foi fruto em boa medida de esforços protestantes (LACOSTE, 2005).
Por quê relembrar Samuel Crowthert ao prefaciar a segunda edição
de Exu c a Ordem do Universo? Porque, apesar de com preender a condi-

1 CROWTHERT, Samuel. Vocabulary o f lhe Yorub:i Language, 10 wich are preflses llic grammatical
d e m e n ts ai ilie language. London: Church M issionary Society, 1843; CROWTHERT, Samuel. A
vocabular}' o f lhe yo m b a language. Introductorv remarks: Owcn Emeric Vida!. London: Church
Missionary House, 1852; CROWTHERT, Samuel. Grammar and vocabulary o f lhe nupc language.
London: Church Missionary House, 1864.

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ção histórica de Adjai, não se pode ignorar a carga ideológica presente no
vocabulário do Bispo Samuel, no qual Exu é o Diabo e há gnomos como
Á rònic fantasmas como Egúngún. Como tantos outros autores de sua épo­
ca, Samuel Crowthert expõe todo tipo de preconceitos travestidos de boas
intenções.
Em um contexto histórico no qual os africanos eram considerados
desprovidos de línguas estruturadas, Samuel Crowthert publicou a prim ei­
ra edição do Vocabulaiy o f thc Yolvba Language (1843) que, por tratar-
se de um vocabulário bilíngüe, dá a conhecer (equivocadam ente) que o
-aubslanúvo Dcus (God) corresponde a Olórun, Ohkh'imarè,-n o substantivo—
Diabo (Devil) corresponde a Angcli ti ochubu, Èsú. O adjetivo diabólico
(diabolical) corresponde a lèsú e, embora não conste do Vocabulário o ver­
bete inferno (hcll), há o substantivo céu (beaven), correspondendo a orun,
ibi-rere e çkç çrun.
Considerando que para libertar os africanos dos grilhões do Diabo
era preciso catequizar, o Bispo Samuel traduziu trechos da Bíblia Sagrada
para o iorubá, sendo interessante assinalar como algumas palavras do uni­
verso protestante foram registradas em seu vocabulário: heresia ( heresy, s.
àdámç, iyapa); herético ( lieretic, s. alàdámp); ídolo ( ido!. s. ére ti cnia nsin
li òrísà); idólatra ( ido/ater, s. asin cre, aborisa); idolatria ( idolatry, s. isin
ere, iborisa); Satã ( Satan, s. Èsú, ólori çrun àpadiy, satânico ( satanical/sata-
nic, a. bi Èsú); serafim ( seraphim, s. ópó angcli); santos ( saints, s. çni i ira
mimo) e bruxa ( witch, s. àjç obinrin).
Por outro lado, nota-se na seção de inglês-iorubá do vocabulário a
inexistência de muitas palavras indispensáveis do idioma iorubá, entre as
quais os nomes de muitos orixás. Com essa lacuna convive a presença de
estrangeirismos, como angcli, e a de termos ideologicamente alterados,
como os relacionados a Exu. Observa-se a m esma tendência na seção de
iorubá-inglês: nada se diz, por exemplo, de orixás tão importantes quanto
Obaluaiê e Nanã Buruku; nada se diz sobre os sistem as oraculares da etnia
iorubá; não se menciona o Corpus Literário de Ifá. Nesse vocabulário odú
é considerado companheiro de Ifá, deus das nozes de palma; ikin é história
ou tradição, Egúngún é som ente osso ou esqueleto; irókò é somente uma
espécie de árvore e iyálódc somente um título honorífico. Assim, enquanto
alguns vocábulos são, deliberadamente ou não, omitidos, o Bispo Samuel
parece haver empregado uma espécie de processo m etonímico, recortando
significados mais interessantes ao propósito de descarregar a carga sem ân­
tica original de muitos vocábulos.

10
Como na concepção protestante a noção de um Bem absoluto, per
sonificado pelo Rei da Glória, implica a noção de um Mal absoluto, perso
nificado pelo Inimigo, coube a Exu representar esse papel - no vocabulárii
do Bispo Samuel como nos livros de viagem de seus colegas de formação
Assim, cm relação ao orixá primordial mais importante, o reverendo apre
senta o seguinte verbete: “Èsú, s. devil, Satan, dernon, adversar}', fieno
- Èsú kò ni iwà ako ilè rç si ita, ‘A s t/ie devil lias no (kindliness of) dis
position, his liouse is made for him in the Street "(CRO W U TERT, 1843
p. 72-3): “(■•■) Como o diabo não possui disposição alguma (é desprovide
debondádê), sua casa é construída para ele na rua". O termo fiend pode
ser vertido ao português como malicioso , e também como besta, monstro
selvagem, alguém desprovido de bondade. Não se trata apenas, portanto
de uma criatura má entre tantas outras, de um pequeno dem ônio ou de un
adversário qualquer: Exu, associado ao Satã em pessoa, é, segundo esst
Vocabulário, o grande Inimigo, o próprio Adversário. O únicVcpíteto'dc
Exu registrado no livro é Elçgbárá, traduzido para o inglês com o “God o.
mischief, Satan ” (CROW HTERT 1843. p. 78): “ Deus da Malícia, Satã”.
Desse modo, o Bispo Samuel, originalm ente o iorubá Adjai, ofere­
ceu sua parcela de contribuição para reduzir elementos do corpo milenai
de conhecimentos de sua tradição de origem a um conjunto mal articulado
de fonemas. Indispensável dizer que sua ação integra um conjunto de ini­
ciativas que conduziram à degradação de elementos do Sagrado iorubá,
particularmente do orixá primordial Exu.
A obra aqui apresentada, agora em sua segunda edição em portu­
guês, constitui uma pequena porção do antídoto exigido para a correção
de equívocos construídos e preservados ao longo de séculos. O sucesso
alcançado em sua primeira edição demonstra tratar-se de uma obra indis­
pensável. Por isso sua reedição é bem vinda!

Rodrigo Ribeiro Frias


Graduado cm Letras c M estre ein Teoria Literária (U niversidade de Sào Paulo);
membro do Grupo dc Pesquisa Estudos Trunsdisciplinarcs da Herança Africana (U NIP-CN Pq),
do Instituto Guatambu dc Cultura - Canto das Águas e do O duduwa Tem plo dos O rixás. Atua
principalm ente nas seguintes áreas: Herança A fricana. Tradição Iorubá c Teoria Literária.

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Ap re se n ta ç ã o
Láaróyè! Entre o orun e o aiy e, o axé da palavra fecunda

Nós todos nós negros todos nós


Urdim os um fio na alvorada
Com o mais negro da noite
e o prim eiro beijo da aurora.
R u b e n s E d u a r d o F e r r e ira F ria s (1 9 9 6 )

Depois de 20 anos de árduo e apaixonante trabalho, temos, com a licença


de Exu, esta preciosidade de Síkírü Sàlámi (King) e de Ronilda Iyakcmi Ribeiro,
Exu ea ordem do universo, com a significativa viabilidade da Editora Oduduwa...
a partir da vivência no Oduduwa Templo dos Orixás (Mongaguá/SP) em que
King é babalorixá... e o mito se atualiza novamente. Oduduwa é o patriarca
mítico iorubá.
A saudação tem duplo significado: por um lado, nos ressentíamos
de um a publicação de fôlego, consistente, sistemática e resultado de inves­
tigações porm enorizadas, não apenas no âm bito acadêmico das referências
bibliográficas e seus labirintos à m aneira ocidental; mas tam bém no âmbito
das tradições orais, que nos indicam o caráter existencial de nossas buscas e
a benevolência do destino quando fazemos jus à com preensão profunda em
nossas jornadas. E, portanto, a publicação do livro vem em hora propícia e se
constitui em um presente epistemológico im portante para nossas lidas com
o reconhecim ento de nossas matrizes ancestrais africanas e sua apropriação,
diálogos e recriações para um devir de m últiplas facetas em nosso processo
identitário, brasileiro e latinoam ericano.
No Brasil, no âmbito educacional, em todo currículo escolar, sobretudo
nas áreas de educação artística, literatura e história brasileiras, temos no
horizonte a conquista representada pela Lei 10.639/2003, que determina a
obrigatoriedade do estudo da história e das culturas africanas e afro-brasileiras
nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos
e privados, e sua atualização pela Lei 11.645/2008, que passa a incluir a

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obrigatoriedade do estudo da história e das culturas de matriz indígena; venho
reafirmando em vários espaços que o período de “denúncia” da discriminação
e preconceito étnico-raciais já obteve seu auge (o que não quer dizer que não
se deva insistir nas denúncias quando dos casos particulares passíveis, agora,
de responsabilização criminal). Seguindo as reflexões de nosso mestre zen-
nordestino em sua m aturidade dos escritos como “conversas à sombra desta
mangueira”, “pedagogia da esperança” (relcitura da pedagogia do oprimido) e
“pedagogia da autonomia”; Paulo Freire insistia em que, à denúncia, deveria se
seguir um “anúncio”. Momento alvissareiro das alternativas, das possibilidades,
_ da criação que deve se seguir ao ultrapassaniento das opressões, injustiças e
noites escuras que subjugam nossas esperanças. Mas, “não há noites eternas”.
Nesse sentido, à conquista das leis no estrato im portante da educação
escolarizada (e relembramos que, contra qualquer escolacentrismo, o processo
já se espraia nos movimentos sociais, dc arte-educação c literatura “periférica”)
deveria seguir-se uma busca apaixonada pelas referências, obras de arte,
literatura, história dos povos africanos por eles mesmos, valorização da tradição
oral dos griôs. Portanto, temos como compromisso do “anúncio”, a produção
de uma massa crítica de informações, teorias, relatos de pesquisas, produção de
conhecimento sobre a matriz afro-brasileira em suas múltiplas formas, fontes e
desejos para alimentar o trabalho dos educadores que, tocados pela indignação
(e não pelo “modismo”) trabalhem no sentido de materializar a conquista das
leis no cotidiano de nossos novos reis, rainhas, príncipes e princesas, poetas e
guerreiros de estirpe negra. Agora, não mais subjugados pela condição espúria
de “escravos” por um a “civilização” menos nobre; mas ainda subjugados
pela discriminação étnico-racial, pelos processos de exclusão político-social
e interdição cultural de suas próprias raízes. Para com estes temos a “dívida”
ancestral de realização de nós mesmos, com as forças mobiiizadoras que
representam a memória, o am or e a criação (como dizia o anarquista religioso
russo, Nikolay Berdyaev [1874-1948], que muito me inspira).
E é, precisamente, pelas forças mobiiizadoras da m em ória (lem brar
do orixá), do am or (reverenciar o orixá, e por ele, o ori em cada pessoa) e da
criação (responder com a atitude apropriada aos desafios do m undo); que,
de outro lado, a saudação tem tam bém significado existencial.
King e Iyakemi são portadores de uma palavra fecunda. Curiosamente,
princípios masculino e fem inino para tentar dar conta da complexidade do
orixá Exu. King ou Síkírü Sàlámi, das jóias ofertadas em seu Cânticos dos
orixás africanos, 1992) e Iyakemi, expressão geledé, que já nos presenteou
com o célebre Alma africana no Brasil - os Iorubás (1996) e de que já tive o
prazer de com partilhar m om entos im portantes no cotidiano da universidade

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num a clave mais sagrada da docência, tem o com plem ento fem inino nest
investigação e livro, traduzindo sua luminosidade e sabedoria na escrita-ofer
tório, Ialorixá albina de olhos cor de mar. Parafraseando o clássico traballn
de Renato Ortiz (A morte branca do feiticeiro negro, 1978), eu diria que s
trata do “renascimento sagrado e negro da m estria branca”.
Como orixá dos cam inhos e da com unicação entre o orun (domínii
primordial dos começos e território espiritual dos orixás) e o aiye (domínii
terrestre das materializações c do hum ano como húm us da terra), Exu é ex
pressão sagrada de enorm e complexidade tanto no continente negro, no âm
bito iorubá, com o nas práticas religiosas e nas teologias afro-brasileiras.
A ele se pede licença para todas as em preitadas, para liberar e orienta
os caminhos, sob pena de confundir-se, perder-se e extraviar-se nos conflito
que desviam da senda principal. Neste sentido, é o prim eiro a ser saudade
lembrado e reverenciado. Ordem da conciliação dos contrários, habita todo
os princípios e, por isso, suas facetas m asculina e feminina. De um la d o ,;
presença simbólica da cabaça universal - princípio feminino da dialétic;
conteúdo/continente e da possibilidade de criação na geração da vida - c
de outro lado, o falo ereto - princípio m asculino fecundador.
É a junção de am bos os aspectos simbólicos que constituem a virtudi
com unicadora, o eixo central, o axis mundi, a árvore da vida, a ponte entn
o orun e o aiye. Por onde circula o axé.
De maneira análoga, o deus grego Hermes, também protetor dos cami
nhos e mensageiro entre os deuses e entre os deuses e mortais; também traquina
e zombeteiro, recebe seus ofertórios cm hermas, montículos de pedras ofertado:
na encruzilhada dos caminhos e também se manifesta como Hermes ictifalia
(com falo ereto), Hermes de múltiplos falos que se junta à deusa da aurora, E o í
raptora das almas leves e que, juntos, produzem as ereções matinais. O desejo d;
aurora de novos tempos, am or matinal no conhecimento de si mesmo, do Outrc
e do m undo nas conjunções carnais, epistemológicas e existenciais.
Em ambos os casos, a comunicação e os cam inhos são expressões d<
um a mesma religação, term o original na tradição ocidental para “religião
e que se esquece de m aneira sistemática sob as lógicas organizacionais da.
religiões institucionalizadas {locus da doutrina, dos regulamentos, dos dog
mas, das hierarquias, das disputas de poder que olvidam o Sagrado que, n;
origem, teria sido sua motivação prim eira).
O fato é que esta religação possibilita ainda um a releitura ( relegere
ou tro étim o que concorre com a form ação de “religião”). N ovam ente
com Paulo Freire, todas as possibilidades de releitura do m undo, a parti
de si m esm o, das relações com o O u tro e das relações com o m undo

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possibilitados pela religação com o p rim o rd ial, com a ancestralidade.
Deste âm bito sagrado é que a comunicação entre os m undos, hum ano
e sagrado (que se interpenetram ), manifesta sua eroticidade. Uma mística do
corpo se acopla a um a erótica da alma, diria M ahatm a Gandhi. É no dom ínio
da cabaça e do falo que se interpenetram , contrários e com plem entares, que
a fecundidade se espraia em todas as dim ensões existenciais.
A palavra não se restringe mais a apenas um signo arbitrário e convencio­
nal para a comunicação pragmática entre as pessoas ou para o registro técnico
em sua expressão gráfica sobre a face pálida de um papel ou tela de computador.
Ressurge em toda sua potencialidade como palavra-fecunda. Anuncia, mostra,
revela, exibe, arrebata, oculta, misteriza, profundiza, no movimento de vai-e-vém
copulativo dos sentidos - sentidos do campo perceptivo de uma corporeidade
como também sentidos atribuídos e/ou captados para a existência.
Aqui a palavra-fecunda cumpre seu papel no compartilhar sincero e
amoroso da construção do conhecimento na tradição africana. Compartilhar
os segredos com quem se ama. Segredos que são sempre secretações, pois eles se
escondem no corpo. Portanto, se exibem como secreções que, líquidas, escapam
pelo corpo conduzindo os segredos para o Outro. Dc maneira ancestral, são
cinco estes segredos escondidos no corpo e estão na saliva, na lágrima, no suor,
no fluxo menstruai e no sêmen. Compartilhar, então, respectivamente, a palavra,
os sentimentos, o esforço, a morte constante e a fecundidade para renascer.
Na expressão gráfica das palavras impressas na face pálida do livro,
Sàlámi e Iyakemi, falo e cabaça, sacerdotes do conhecim ento, fiéis a Exu,
nos trazem a palavra-fecunda nas com unicações entre as coisas do orun e
do aiye, renascendo das m ortes constantes no fluxo m enstruai dos obstá­
culos e empecilhos que o m undo nos interpõe, mas que o esforço insiste
cm continuar na suada busca, motivados pelo am or e pelo sentim ento de
pertença a um a tarefa que nos extrapola a pequena existência c de que somos
(se abençoados com o axé) portadores e que expressa sua gratidão num a
lágrima fugidia. E então, a palavra - que antes de grafada - fecunda a vida
salivando sua potência sagrada.
Que aqueles que se fecundarão na leitura da palavra-fecunda aqui mate­
rializada possam destrancar o caminho de Si para outros tantos e, juntos, engra­
videmos do tempo outro possível que se insinua na noite escura com o beijo da
aurora, barra crepuscular de outros tempos na profundidade do Ancestral.
Láaróyè!

Prof. Dr. M arcos Ferreira Santos


Professor de Mitologia e Livre-docente
da Universidade de São Paulo

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Introdução

Um longo cam inho foi percorrido até considerarm os apresentável


este conjunto de informações relativas ao orixá prim ordial Exu. Dezenas
dc viagens ao território iorubá, particularm ente à Nigéria, foram realizadas
-pelo autor principal desta obra, Síkírü Sàláml (King). O diálogo estabelecido
entre nós, autores, ao longo de quase três décadas, foi am adurecendo e sendo
enriquecido por experiências vividas no continente africano e em alguns
países nos quais a África se faz presente em práticas sociais e religiosas, par­
ticularmente no Brasil, em Cuba, nos Estados Unidos e, bem recentemente,
em alguns países europeus, entre os quais Espanha, Eslovênia, Itália, Sérvia
e Croácia. Este trabalho dem andou longos anos para a sua realização. E não
poderia ser diferente: é impossível discorrer sobre Exu sem um a vivência
intensa e prolongada com este orixá.
O impulso de escrever sobre Exu antecedeu a decisão de em preender
tarefa tão desafiadora. A consulta à bibliografia evidencia haver controvérsias
quanto à natureza deste orixá: ele é benevolente ou malévolo? Mais que isso:
muitos equívocos relativos a sua natureza e função decorreram do fato de Exu
haver sido interpretado com o a expressão iorubá dc Satã e do dem ônio das
tradições judaico-cristâ e islâmica e dc Príapo, o deus fálico greco-rom ano,
guardião de casas, praças, ruas, encruzilhadas, jardins e pom ares.
Assim sendo, um dos objetivos principais desta obra é contribuir
para rcssignificar Exu através da apresentação de seu lugar na teologia
iorubá. Recorremos para isto ao corpo da tradição oral, particularm ente
aos odus de Ifá e aos oriki (evocações), àdúrà (rezas), ibà (saudações) e orin

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(cantigas).' Essa tarefa se m ostra necessária e urgente. Entre outros motivos
porque um a imagem dissorcida de Exu, infiel a sua verdadeira natureza e
incum bências, vem se perpetuando em m uitos países da diáspora iorubá.
Os iorubás, com o outros grupos étnicos africanos, concebem um Ser
Suprem o que, apesar de dotado de atributos superlativos, apresenta certas
“insuficiências” e “necessidades”. Além disso, supõem a possibilidade de
conciliar a existência de Deus com a presença do mal no universo, o que
não ocorre no interior das religiões cristã e m uçulm ana. Alguns estudiosos
respeitáveis apresentaram Eledunmare como equivalente ao Deus cristão ou
ao Alá m uçulm ano e Exu com o Satanás ou o d e niônio. Tais in. ter p re ta çõ e s
equivocadas produziram conseqüências indesejáveis e geraram m al-enten-
didos que é preciso desfazer.
Sabemos que a mestiçagem biológica e cultural dos diversos povos e
etnias que constituem as culturas de síntese certam ente inclui a dim ensão
religiosa. Na América Latina e no Caribe, através de processos de transcul-
turação, a expressiva presença africana participou da m oldagem de formas
religiosas diversas que, com seus quadros de valores éticos e morais, p ro ­
duzem sentidos, regulam condutas e geram ideais. No caso brasileiro, por
exemplo, que formas religiosas entraram em interação?
Segundo Carvalho (1994), no Brasil a prim eira m atriz religiosa foi
plasmada a partir do encontro da religião dom inante - o catolicismo - com
religiões indígenas e africanas, mais a participação, em m enor grau, do p ro ­
testantism o e do judaísm o. Em um a etapa posterior, já na segunda m etade
do século XIX, o kardecismo conquistou um a expressiva aceitação nacional,
consolidando-se com o im portante tradição no pais. N um a terceira etapa,
entre o final do século XIX c o início do XX, algumas tradições esotéricas
vieram integrar esse quadro, entre elas o Círculo Esóterico da C om unhão
do Pensamento, a Rosacruz, a Teosofia e a Antroposofia. O utras práticas
religiosas foram surgindo, como, por exemplo, as da União do Vegetal e do
Santo Daime, a Pajelança e o Catimbó. No contexto das religiões brasileiras
de m atriz africana o Candom blé e a Um banda congregam o m aior núm ero
dc adeptos.
O term o candomblé , usado para designar tradições c cultos religio­
sos de nações do grupo sudanês, referia-se inicialm ente a danças religiosas
e profanas. Essa denom inação advém do term o kandombile, que significa
culto c oração. Desde o início da escravidão, africanos de distintas origens

1 Na últim a página desta Introdução o leitor encontrará referências às convenções adotadas para a
redação do texto.

18
étnicas uniam -se para realizar cultos religiosos e rituais mágicos. Porém,
somente por volta de 1S30 que surgiu oficialmente o Candom blé, na C í
Branca do Engenho Velho, terreiro fundado na Bahia p o r três mulhei
negras - Iyá Détá, lyá Kalá e Ivá Nassó (CARNEIRO, 1969).
Q uanto à Umbanda, considera-se Zélio Fernandino de Morais con
o marco zero de sua história. Em 1908, no Rio de Janeiro, ele anunciou es
modalidade religiosa, em bora houvesse, antes disso, m últiplas formas
culto, entre as quais o Catim bó, o Candom blé de Caboclos e as Macumb
Cariocas. Ao longo de sua história a U m banda foi reunindo ensinam ent
de distintas tradições religiosas indígenas e"'africanas, ás quais assocíarar
se elementos do hinduísm o, do budism o, do catolicisimo e do kardecisn:
Essa formidável mestiçagem religiosa propiciou um a convivência que mc
daria formas e formas religiosas, m uitas delas quase alienadas dos sistem
originários. Num altar ou congá encontram -se imagens cristãs, budist
e tradicionais africanas, além da representação de personagens com o í:
dios, pretos-velhos, m arinheiros, ciganos, crianças etc. As orações inclue
cânticos em português aos orixás e rezas cristãs com o o Pai Nosso e a A
Maria. Magnani (1986, p. 13) considera a Um banda com o resultante c
“um processo de reelaboração, em determ inada conjuntura histórica, c
ritos, mitos e símbolos que adquirem novos significados no interior de un
nova estrutura”, e não como “um a espécie de degeneração de antigos cult<
africanos ou do espiritismo kardecista”.
Nos últim os anos, com força crescente nas últim as duas décadas, ol
serva-se no Brasil o surgim ento de um novo espaço religioso: o de prática c
Religião Tradicional Iorubá. Este m ovim ento, que inclui a valorização d<
conhecim entos do sistema divinatório de Ifá, tem como principais aton
babalaôs, sacerdotes de O runm ilá. Nesse contexto destaca-se o Oduduw
Templo dos Orixás, situado em Mongaguá, litoral sul de São Paulo. Liderad
pelo Babalorixá Síkírü Sàlámi (King), o tem plo reúne lideranças de diverse
grupos religiosos de m atriz africana advindos desse e de outros m unicípio
de outros estados brasileiros e de outros países, para realizarem formaçã
ou aprim oram ento sacerdotal e para cultuarem O runm ilá, Iyami Oxoronç
e Egungun, além de outros orixás.
No im aginário brasileiro há um a verdadeira m u ltid ão de sert
espirituais, pertencentes a distintos universos religiosos, que conviver
com o podem: anjos, arcanjos e querubins, orixás, ancestrais das sete 1
nhas de U m banda, santos católicos e m ais tantos outros seres espirituai:
com pondo um extraordinário e com plexo universo. Neste universo d
representações simbólicas que lugar ficou reservado a Exu?

19
É fato sobejam ente conhecido que nos países de diáspora iorubá,
colonizados por europeus, os orixás, inclusive Exu, foram sincretizados com
santos católicos. O sincretism o foi entendido por alguns autores, entre os
quais Rehbein (1985), com o

um processo que procura resolver uma situação de conflito cultural-religioso.


Com a justaposição dos santos católicos aos orixás africanos, os negros, cul­
tuando suas próprias divindades associando-as externamente a determinados
santos, queriam enganar o branco e proteger-se da perseguição policial (...),
o que não nega ter havido certa miscigenação cultural/religiosa, uma mútua
influência. (REHBEIN, 1985, p. 85).

O utros autores, com o Damen (2003), reconhecem ser o sincretism o


um a via de mão dupla. Por um lado, ocorre o disfarce de práticas religio­
sas de expressão proibida: neste caso, a repressão às tradições religiosas
africanas, que im pedia o culto às divindades, obrigava os seus devotos a
ocultá-las por detrás dos santos católicos. Por outro lado, o processo de
influência m útua leva a um a fusão dc elem entos dos dois universos religio­
sos durante o contato, resultando disso um a prática nova, em inentem ente
inculturada.
Poderíamos pensar, com o muitos pensam , que Exu foi sincretizado
com o dem ônio ou interpretado como tal ao chegar a alguns países da
diáspora africana. No entanto, ainda na África, antes de ser seu culto trans­
portado aos países da diáspora, Exu já fora atribuído de identidades alheias
à sua natureza por europeus que lá estiveram.
Q uando Exu foi trazido ao Brasil, seus traços sofreram m etam orfo­
ses. Destas, talvez a mais im portante seja a assinalada por O rtiz (1978): sua
ligação com O runm ilá desapareceu, pois o tráfico desagregou a organização
sacerdotal iorubá, que tem na figura do babalaô, sacerdote deste orixá, um a
das principais referências. Interessante observar que na diáspora iorubá em
Cuba não ocorreu o mesmo, pois as famílias de babalaôs foram m antidas.
No Brasil o dilógún ( çríndílógúri), jogo de búzios, recurso oracular de baba-
lorixás e ialorixás, substituiu quase com pletam ente o uso do çpè/è, corrente
divinatória, recurso oracular dos babalaôs.
Nina Rodrigues registrou no Brasil, na Bahia do final do século xix,
a identificação de Exu, tam bém cham ado de Bará ou Elebará, com o santo
ou orixá confundido com o diabo, em bora o próprio pesquisador considere
que essa identificação tenha sido influenciada pelo ensino católico. Também
registrou a crença de que todos os “santos” (orixás) podem se servir de Exu
para tentar ou perseguir alguém. (RODRIG UES, 1935).

20

1
Cascudo (1988), ao pesquisar o tema “Exu no Brasil”, encontra este
orixá tem ido e respeitado, representando potências contrárias ao hom em .
Identifica que nenhum ritual é feito sem Exu, sendo ele quem recebe sem ­
pre as prim eiras oferendas e sendo a ele consagrados os prim eiros dias de
todas as festas e as prim eiras cerim ônias de todos os ritos. Observa que ele
é representado tam bém pelo falo, o que evidencia seu caráter fecundador.
O sincretismo o relaciona tam bém a diversos santos católicos, em distintas
regiões brasileiras. Por exemplo, São Jorge no Rio dc Janeiro, São Jerônim o
eSanto Antônio na Bahia, São Pedro e Santo A ntônio no Rio G rande do Sul.
Refere-se ao fato de que, apesar de ambivalente e controverso, Exu é conhe­
cido como guardião das casas e protetor das encruzilhadas, um a entidade
benévola, que incita o hom em ao desenvolvimento interior, m as tem ida em
sua grandeza misteriosa e am eaçadora, pelo desconhecim ento dos limites e
especificidades de seus dom ínios. Em suas investigações, Cascudo encontra
muitos docum entos nos quais Exu não é classificado com o dem ônio e onde
se enfatiza suas características de mensageiro dos deuses e de fecundador,
relacionado, pois, à fertilidade em geral.
Da interpretação equivocada que confunde Exu com o dem ônio da
tradição judaico-cristã decorrem , com o não poderia deixar de ser, inter­
pretações igualm ente equivocadas do sentido ritual das oferendas a essa
divindade. Assim sendo, para os ignorantes dos fundam entos da Religião
Tradicional Iorubá, os sacrifícios c as oferendas a Exu deixam de ser interpre­
tados com o condições rituais para a veiculação do axé, a força vital. Passam
a ser considerados com o recursos de apaziguam ento da ira e do ciúm e de
uma divindade por eles com preendida com o cruel e invejosa e que, para
vingar-se do esquecimento, interrom perá os atos litúrgicos e im pedirá o
bom andam ento dos rituais.
O rtiz (1978), ao estudar a Um banda, busca com preender com o a
sociedade brasileira reinterpreta elem entos de um a cultura afro-brasileira
no interior do pensam ento um bandista e quais as m etam orfoses sofridas
por Exu nesse contexto. Lembra que o papel de Exu com o interm ediário
entre deuses e hom ens foi suficientem ente estudado por Herskovits, que o
associa ao culto a Orunm ilá, e que Bastide, ao investigar o C andom blé nagô,
mostra que seu caráter trickstei2 decorre justam ente de sua qualidade de
mediador. Bastide (1971), ao estudar as religiões africanas no Brasil, busca
com preender com o o negro africano re in te rp reta seus valores religiosos
no in te rio r do catolicism o e do p ro testan tism o e reconhece que Exu é

: Tricksicr com o significado dc dissimulador, praticante dc truques.

21
(...) o regulador do cosmos, aquele que abre as barreiras, traça os caminhos e
se às vezes parece contrariar sua finalidade essencial (a ordem do universo),
introduzindo no mundo divino e humano a desordem, as querelas, as des­
venturas, trata-se sempre do reverso do equilíbrio, sobre o qual ele vela com
a maior atenção. (BASTIDE, 1973, apudORTIZ, 1978, p. 127).

Com o todos os orixás, Exu tam bém se situa fora do dualism o bem -
mal. No entanto, segundo Ortiz, o pensam ento um bandista reinterpreta a
tradição afro-brasileira segundo as categorias benéfico ou maléfico. E chama
atenção para um aspecto m uito im portante: com o a sociedade abrangente
opera segundo UíiTnYodélo racista, práticas religiosas de matriz negro-africa-
na são consideradas “coisas de negros” e as práticas de magia negra são tidas
como “magia de negros”. O rtiz assinala esse equívoco absurdo, que tanto vem
contribuindo para m anter o estereótipo negativo dessa divindade:

Nesse sentido podemos afirmar que os orixás da Umbanda são entidades


brancas, enquanto Exu é a única divindade que conserva ainda traços de seu
passado negro - sugestivamente ele se associa ao reino das trevas (...). Ele é o
que resta de negro, de afro-brasileiro, de tradicional, na moderna sociedade
brasileira. (ORTIZ, 1978, p. 134).

O rtiz lem bra, ainda, que na Umbanda ocorre um a espécie de fusão


__ entre_exus_e_ egiuis»_eSPÍritos dc pessoas falecidas: eguns m etam orfoseados
em exus são considerados “forcas da esquerda”, o que pode ser interpretado
-COmCLUm.indicador de inferioridade, pois à m ão direita são reservados todos
os privilégios e à m ão esquerda, os sortilégios. Os estudos de O rtiz sobre a
forma como Exu é compreendido na Umbanda o conduzem a três conceitos:
o de um a separação entre o bem e o mal, sendo o mal representado p o r
Exu e o bem pelos demais orixás; o de um a subordinação dos exus aos es­
píritos dc luz, o que implica num a vitória do ego superior sobre o inferior;
e, finalm ente, o de um a am bivalência. Com base nisso, a ética religiosa
im plícita tende a culm inar na prática de um a m oral repressiva.
Ortiz mostra que na Umbanda Exu sc distanciou-c m u ito -d a divindade
primordial. De tal modo que a divindade trickster transform ou-se em um
Exu-Santo Antonio, espírito em evolução, ao mesmo tempo em que guarda
um caráter ambíguo, o de Exu Pagão. (...). Submetido à dicotomia do bem
c do mal, Lcgbá transforma-se em espírito arrependido, obedecendo desta
forma ao apelo das entidades de luz. Ele é acorrentado às regras morais da
sociedade brasileira, e sc por acaso conserva seu caráter sexual, este só se ma­
nifesta sob a vigilância atenta dc Santo Antônio. (...). Uma última conclusão

22
se impõe: por detrás do simbolismo religioso se descortina ainda a noção d
ordem social. (ORTIZ, 1978, p. 148).

Textos como este denunciam o fato de haver grande confusão relativ


a Exu, e tal confusão sem dúvida contribui para tornar desprezíveis tanto
divindade quanto o contexto no qual ela se insere. Ocorre que, m esm o er
algumas casas de Um banda e em alguns segmentos do C andom blé, Ex
continua sendo com preendido com o o diabo.
Nosso objetivo 110 presente trabalho é o de nos aterm os ao mod
pelo qual o orixá Exu é considerado em seu continente de origem. Seguind
rum o a este objetivo recorrem os ao co^roydiTTKrdiçacriorubá para nos prc
servarmos da imposição de interpretações alheias a este contexto. Com issc
buscamos participar do processo de reavaliação da Religião Tradicion;
Iorubá, ao trazer para o palco de debates um tema que aborda questõe
fundam entais, com o a dos atributos do Ser Suprem o e a do problem a d
mal, entre outras.
Concordamos com Bçwàji (1985) quanto à necessidade de revisão dc
trabalhos dos primeiros teólogos africanos e de outros estudiosos, igualment
pioneiros, considerando-os como pontos de partida indispensáveis, porém nã
definitivamente conclusivos no que diz respeito a questões fundamentais, e muit
menos como revelações da verdade. Isto porque muitos desses trabalhos, apesí
de desenvolvidos por pesquisadores e estudiosos de competência indiscutíve
apresentam equívocos graves, em boa parte decorrentes do fato de estarem esst
estudiosos sujeitos a múltiplas determinações históricas e sociais.
Assim, por determ inação colonialista, interpretações próprias de 01:
tros contextos religiosos, entre os quais o judaico-cristão e o muçulman<
impõem-se durante a leitura das culturas e das crenças tradicionais africana
Por isso, os trabalhos pioneiros não podem ser considerados definitivo
dem andando questionam entos e revisão.
Como tratarem os do orixá prim ordial Exu em seu contexto de origen
mostra-se necessário retom ar inform ações já apresentadas em trabalhe
anteriores (SÀLÁMl, 1990, 1999; RIBEIRO, 1996), particularm ente algur
dados geográficos e m ítico-históricos a respeito dos iorubás, o que realiz;
mos nesta Introdução.

Dados m ítico-históricos
Àtàndá (1980) tem por hipótese que Oduduwa, o patriarca mítico d
povo iorubá, poderia ter sido originalm ente um cidadão do antigo Impéri
Egípcio ou ainda um nu ou um árabe que, m igrando para aquelas terra

23
teria encontrado inúm eros povoamentos. A narrativa ancestral, entretanto,
o apresenta como o prim eiro ocupante dc um a terra antes inabitada. O utra
versão menciona a ocorrência de guerras entre O duduw a e populações ali
preexistentes, conhecidas com o o povo ugboh. Diz-se ainda que Oduduwa,
tam bém chamado Oòduà, o Grandioso que criou a existência , e seu séquito
de desbravadores teriam sido os sobreviventes dc um dilúvio: daí serem
chamados pelos antigos de oóyè, os que foram salvos. As narrativas orais
não apresentam divergências relativas ao fato dc O duduw a e seus seguidores
haverem se estabelecido em Ilç-Ifç e triunfado nas disputas com Obatalá,
tam bém chamado Oxalá, tornando-se Oduduw a o prim eiro çpni, rei dc Ilè-
Ifç. No M onte Qrà, achados arqueológicos de artefatos do Neolítico parecem
com provar a hipótese de que essa terra já era habitada há m uito tempo.
Foi Oduduwa quem unificou as povoações num reino sediado em
Ilç-lfè, cidade até hoje reconhecida pelos iorubás com o sendo o local do
- início do m undo e sua pátria espiritual. Após a m orte desse patriarca o rei­
no foi dividido entre seus filhos, aos quais foi atribuída a criação dos vários
subgrupos iorubás. Assim, coube a Ogúnfúnminíre a fundação dc Lagos e a
Qmçnidç, mãe dos filhos de Oduduwa, a fundação de Abéòkúta. Caçadores de
Ilç-lfç fundaram Ijçbú-Igbó; Oçogbo foi fundada por um caçador cham ado
Timçhiit. O clã dos Idó fundou Çgbádò. A terra Ijèbú-Òdc foi fundada por
Ogbòròngà; a de Iwó, por Adékplá Tçlú, filho de um a governante m ulher;
Ibàdàn foi criada por um chefe guerreiro cham ado Lúgelú; Irágbiji foi fun­
dada pelo caçador Agbà e Ifç>n, por Qbalüfçn Ayédiyemore. Benin tem seu
rei descendente da união de Qránmiyàn com uma m ulher do local. As cidades
de Iré e Çfpn Alààyè foram fundadas por netos de Ogum , que cultuavam o
espírito de seu ancestral, de m odo que Ògun M éjèèje Irè, Ogum da cidade
de Iré, tornou-se um a expressão com um (FÁBÜNMI, 1985).
Mesmo sendo impossível precisar com exatidão a origem de Oduduwa
ou separar seus feitos míticos dos fatos históricos ou, ainda, saber se ele en­
controu as terras de Ilç-lfè previam ente povoadas ou não, todas as interpre­
tações iorubás o apontam com o o grande patriarca desse povo. Os reis locais,
que governam cada um dos subgrupos, creem ser seus descendentes diretos,
o que apenas por si constitui e legitima sua realeza, m antida através de um
sistema de sucessão imutável há vários séculos. A im portância dc Ilè-Ifç e de
seu florescimento cultural é atestada por suas famosas esculturas em bronze,
datadas dos séculos X e XI e produzidas com elevado grau de perfeição, que
m ostram , além do desenvolvimento artístico, quão bem estruturada estava
a sociedade iorubá já naquela época. O sistema m onárquico se manteve e
até hoje coexiste com o presidencialista, im plantado segundo o modelo

24
europeu, sem que tenham ocorrido rupturas significativas das formulações
que rem ontam ao patriarca Oduduwa.

O idiom a
O idioma iorubá é tonal. Faz uso de três tons simples e dois com pos­
tos. O acento agudo indica tom alto, o grave indica tom baixo e a ausência
de acento indica tom médio: esses são os tons simples. Os tons com postos
são constituídos pela combinação de agudo e grave (tom alto-descendente)
ou grave e agudo (tom m édio-descendente). O alfabeto possui vinte e cinco
letras, com sete vogais orais —a, e, e, i, o, ç, u - e cinco vogais nasais - an,
en. in, on, un:
A, 13, D, E, Ç, F, G, GB, H, I, J, K, L, M, N, O, O, P, R, S, S, T, U,
W, Y.
Com parando o alfabeto iorubá com o português, constatam os não
haver naquele as letras C, Q, V, X, Z e observam os a existência de letras
grafadas com um acento embaixo, determ inante de alteração da pronúncia:
E (e), Ç (é), O (o), 0 (ó), S (s), S (ch).

Sobre a organização desta obra


Em obras anteriores* sistematizamos inform ações relativas a práticas
socioculturais e religiosas dos iorubás a partir de dados advindos dé pes­
quisa bibliográfica e de campo. O material oferecido agora a pesquisadores,
estudiosos e devotos se constitui em torno da figura de Exu, orixá da ordem,
da disciplina e da organização. Convida os leitores à reflexão sobre o código
ético-moral desse povo a partir da leitura cuidadosa c atenta dc textos da
tradição oral, nos quais vibram e pulsam virtudes c valores que norteiam
atitudes e comportamentos e regulam, assim, a existência coletiva. Convida,
ainda, à reflexão sobre aspectos teológicos e litúrgicos das práticas religiosas
iorubás, intimamente relacionadas às dimensões psicológica e social dc suas
vidas. O livro está organizado cm três partes.
A Parte 1, intitulada Os iorubás: o humano, o divino e o código ctico-
moral, com preende três capítulos. Em Noção iorubá dc pessoa e práticas
mágico-mcdicinais (capítulo 1) discorremos sobre a noção de pessoa e sobre
as concepções de tem po, universo, saúde, doença, cura e práticas mágico-
medicinais desse grupo étnico. Em O divino na tradição de orixás. Teologia
iorubá: Eledunmare, orixás e ancestrais (capítulo 2) apresentam os dados da
teologia iorubá, com especial atenção a Eledunmare, aos orixás e aos ancestrais.

’ Sàlámi (1990, 1992,1999); Ribeiro (1996).


E em Valores e virtudes: o código ético-moral iombá (capítulo 3) reunimos
informações sobre os princípios éticos que regem a conduta hum ana no
interior desse grupo.
A Parte II, intitulada Exu - aspectos teológicos e litúrgicos, com preen­
de cinco capítulos: Natureza cação de Exu (capítulo 4); Exu e destino humano
(capítulo 5); A dinâmica estabelecida entre oríeiw á ca ação de Exu (capítulo
6); Exu: simbolos, rituais e oferendas (capítulo 7); e (In)Compreensão de
Exu no continente de origem e em países da diáspora (capítulo 8).
A Parte III, intitulada Presença de Exu no corpus da tradição oral
iorubá, com preende cinco capítulos: Transmissão ora! de conhecimentos.
Corpus literário c sistema divinatório de Ifá (capítulo 9); Mitos de Exu nos
odus de Ifá (iorubá) (capítulo 10); Mitos de Exu nos odus de Ifá (português)
(capítulo 11); Oríki, àdúrà e ibá Èsú: evocações, rezas e saudações a Exu
(capítulo 12); e Orin Èsú: Cantigas de Exu (capítulo 13). Seguem-se a estes
capítulos a sessão de Referências Bibliográficas e um pequeno Glossário.
Considerando a escassez de fontes bibliográficas fidedignas, da qual se
ressentem estudiosos e pesquisadores de temas relativos à África, bem como
os praticantes de religiões de matriz africana, nos propusem os a organizar
estas informações. Desejamos que este trabalho contribua para desfazer
estereótipos negativos sobre o orixá Exu, para um m elhor conhecim ento
das matrizes iorubás de práticas sociais religiosas desenvolvidas em países
da diáspora e para reflexões sobre teologias africanas e teologias de inspiração
africana.

Axé!
Láaróyè!

26
Convenções adotadas na redação do texto
Para a redação do texto estabelecemos as seguintes convenções:
1. Não grafar em iorubá palavras já integrantes do idioma português.
2. Não grafar em itálico nomes próprios iorubás.
3. M anter no Glossário os vocábulos iorubás que, em alguns casos
estão im ediatam ente seguidos de sua tradução para o português ao longe
do livro, por entender que tal redundância é justificável na m edida en'
que o Glossário apresenta relativa autonom ia em relação à presente obra
podendo servir de fonte de consulta e oferecer suporte à leitura de outros
textos relativos aos iorubás.
4. A tradução de alguns vocábulos iorubás para o português, no cor­
po do texto, é realizada som ente por ocasião da prim eira vez em que tai;
vocábulos são utilizados.
5. Não grafar em itálico os vocábulos iorubás de uso corrente no idio­
ma português e flexioná-los no emprego do plural sempre que estiverem nc
contexto deste idioma. Sujeitam-se a esse tratam ento alguns vocábulos, entn
os quais os seguintes: àbíkú. àdúrà, aiyé, éwç, Elcdúnmarè, ibà (saudação
evocação), igbá (cabaça), iyágbà, obi, odú, orí, oriki, orin, órógbó, çíç
çrun. Por exemplo, o vocábulo orí, quando cm contexto do idiom a iorubá
recebe um acento na letra i, o que não ocorre quando está no contexto dc
idioma português.
6 .0 leitor observará a ocorrência de redundância de inform ações ac
longo do texto. Considerando a finalidade didática deste livro, tal redundân­
cia serve aos propósitos de poupar m ovimentos de idas e vindas ao Glossáric
ou a outras páginas e de conceder relativa independência de cada capítulc
cm relação aos demais e à obra com o um todo.

27
Parte I
Os iorubás: o h u m a n o , o divino e

o código ético-m oral

C a p ítu lo 1 Noção iorubá dc pessoa e práticas


m ágico-medicinais
C a p ítu lo 2 O divino na tradição de orixás. Teologia iorubá:
Eledunm are, orixás e ancestrais
C a p ítu lo 3 Valores e virtudes:
o código ético-m oral iorubá
r
Capítulo 1

Noção iorubá de pessoa

e práticas mágico-m edicinais


Noção de pessoa; concepções de tem po, universo,
saúde, doença e cura; práticas mágico-medicinais

Noção io ru b á de pessoa
Referindo-se à concepção negro-africana de ser hum ano, Thom as
(1973) utiliza a expressão pluralismo coercnte da noção de pessoa. Nas diver­
sas etnias africanas há um sem -núm ero de exemplos de concepções a respeito
da constituição hum ana com o resultante de um a justaposição coercnte de
parles. A pessoa é tida como resultante da articulação de vários elem entos,
alguns estritam ente individuais e alguns outros sim bólicos. Os elementos
herdados situam -na em uma linhagem familiar c clánica, enquanto os ele­
mentos simbólicos a posicionam no am biente cósmico, mítico e social.
Os diversos componentes da pessoa estabelecem relações entre si e rela­
ções com forças cósmicas e naturais. Além disso, há relações particularmente
fortes entre pessoas, como por exemplo as estabelecidas entre gêmeos ou entre
um indivíduo e o sacerdote que o iniciou. Cada pessoa, enquanto organização
complexa, tem sua existência transcorrendo no tempo e, assim, sua unidade/
pluralidade passa por sucessivas etapas de desenvolvimento, estando todas as
dimensões deste ser sujeitas a transformações. Durante esse processo podem
ocorrer permutas, substituições parciais e metamorfoses, algumas de caráter
definitivo, como as associadas aos processos iniciáticos, outras de caráter pro­
visório, como as ocorridas durante certos rituais. Apesar de todas as mutações
a pessoa reconhece a si mesma e é reconhecida pelos outros como um sujeito
permanente, ou seja, sua identidade pessoal se conserva a despeito da pluralidade
d e elementos que a constituem enquanto sujeito e a despeito das muitas meta -
morfoses e dos diversos estados experienciados ao longo de sua história pessoal.

33
Através cios homens, ao longo de sucessivas gerações, a vida flui. O ciclo
da vida é circular: a criança vai se transform ando até chegar a adulto; este se
transform a até chegar a velho; este, por sua vez, se transform a até atravessar
o portal da morte; e o próprio antepassado poderá renascer como criança. O
antepassado, além disso, influencia seus descendentes.
Os iorubás consideram a pessoa constituída dos seguintes princípios
vitais: ará, òjiji, okàn. è m í e orí.'Arác o corpo físico; òjiji é a representação
visível da essência espiritual que acom panha o hom em d u ra nte toda a vida,
m orrendo junto com ará, em bora não sendo enterrado com ele. Okàn, cujo
significado é coração, possui profunHã relação com o sangue e é considerado
a sede da inteligência e do pensam ento intuitivo, a alma e a fonte originária
de toda ação. Èmí, princípio vital, sopro vital, é intim am ente relacionado
à respiração, mas não se reduz a ela, pois se diz por ocasião da m orte de
um a pessoa que èm í foi embora; significa tam bém espirito ou ser. Uma
das denom inações de Deus é Elçmí. Senhor dos Espíritos. Orí, literalm ente
cabeça, designa oríinú, a cabeça interior, a grande responsável pelo destino
pessoal, pelas oportunidades e dificuldades existenciais; e designa tam bém
a divindade pessoal, cultuada entre outras divindades, mas sendo, de fato, a
mais im portante de todas.2
Todo ori, em bora criado bom , acha-se sujeito a m udanças. Feiti­
ceiros, bruxas, hom ens m aus e a própria conduta de um a pessoa podem
transform ar negativamente seu ori, sendo sinal dessa transform ação uma
cadeia interminável de infelicidades na vida de um indivíduo, a despeito de
seus esforços para melhorar. Im portante é enfatizar que a qualidade do ori
de um hom em depende tam bém de aspectos biológicos e espirituais de sua
ancestralidade.
Segundo a narrativa mítica cada ser escolhe o próprio ori ou o recebe.
Como saber se a escolha do próprio ori foi boa ou má? Pode um hom em
conhecer as potencialidades da própria cabeça ou da cabeça de outrem ? O
jogo divinatório' de Ifá possibilita conhecer os desígnios do próprio ori,
saber qual é o orixá a ser cultuado e conhecer os próprios è\vç>.AOs ewós,
bastante conhecidos com o quizilas, são interdições relativas, por exemplo,
ao consum o de alimentos, ao uso de cores, à adoção de condutas, à prática
de virtudes.

1 Conforme já enunciado na Introdução, o leitor observará variações na grafia do vocábulo orí. Esclarecemos
que em iorubá esse vocábulo recebe um acento na letra i, o que náo ocorre em português.
: Essa questáo será melhor esclarecida no próximo capítulo.
Divinatório é o ato ou recurso de adivinhar.
4 O vocábulo cxxç tem seu uso consagrado no idioma português. Ao grafá-lo no contexto desse idioma
optam os por utilizara forma e iró e , quando necessário, flexioná-lo.

34
Como se crê que o ori dos pais traz boa fortuna aos filhos é com un
o oráculo recom endando que sejam feitas oferendas ao ori dos pais. S<
n u v ir

os pais estão vivos a oferenda pode ser um presente, por exemplo, ou um;
atenção especial de qualquer tipo. No caso de pais falecidos, antes da oferend;
é realizada uma consulta oracular com o objetivo de identificar se ela dever;
ser feita a Eégún-ilç ou a Eégún-igbàlè. Eégún-ilç possui caráter individual
ou seja, trata-se de um determ inado ancestral. Eégún-igbàlè, por sua vez
possui caráter coletivo. Assim sendo, oferendas a Eégún-ilç são realizada:
junto ao túm ulo do hom enageado e, no caso de haver dificuldade de acessc
a este túmulo, a oferenda é realizada na própria terra, invocando-se ness;
circunstância o nom e do ancestral. As oferendas a Eégún-igbàlç d em andam ;
realização de rituais com a incorporação de Egungun, ou seja, são realizada;
em homenagem ao coletivo de ancestrais veneráveis, visando obter benefício:
para aquele que realiza a oferenda. Disso se depreende a existência de ori:
individuais e de oris coletivos, relacionados, respectivamente, a destino*
individuais e a destinos de grupos.
Os pais, ao rezarem pelos filhos, apelam ao próprio ori, dizendo
Orí m i à sin ó Io - Possa meu ori ir com você ou Possa meu ori guiá-lo c
abençoá-lo. Analogamente, o ori de um a pessoa tem condições de protegei
e ajudar ou, por outro lado, de prejudicar a ela e a outras pessoas.
Todos nascem com um destino a cum prir, o que não implica numa
condição de mero joguete de forças inteiram ente determ inistas. O hom em
tem o direto e o poder de assenhorear-se da própria existência através da
busca contínua de conhecim entos, da ampliação da consciência e do desen­
volvimento disciplinado da vontade. O u seja, as realizações fundamentais
da existência dependem não apenas de inclinações naturais e/ou da sorte;
mas também de esforços pessoais que venham aliar-se aos desígnios do
destino. A consulta a Ifá possibilita conhecer tais desígnios, incluindo-se.
no conjunto de recomendações, as relativas aos ewós. A orientação trazida
através do jogo oracular favorece a realização de um bom destino, instrui a
respeito de alimentos e com portam entos que devem ser evitados e orienta
sobre decisões a serem tomadas. Isto porque nem todos os alimentos, atitudes,
com portamentos, cores ou amizades são energeticamente compatíveis com
cada pessoa. O jogo revela com patibilidades e incom patibilidades energé­
ticas, orientando quanto ao que deve ser evitado por ser energeticamente
inadequado ao desenvolvimento de cada destino hum ano. A noção de que
o destino é passível de ser alterado dentro de certos limites se evidencia, por
exemplo, nesse epiteto de O runm ilá: Ifá, Aquele que adia a data da morte.
Quando os conselhos são acatados, as recomendações obedecidas e os ewós

35
respeitados, torna-se possível veicular o axé de O runm ilá e de outros orixás,
decorrendo disso, necessariamente, m elhor qualidade de vida e prolonga­
m ento da existência (com o adiam ento da m orte).
Certam ente os esforços pessoais são mais efetivos quando desenvol­
vidos por um olóri rcre, isto é, por um a pessoa dotada de sorte, abençoada,
bendita. Para um olórí burúkú, entretanto, a exigência de esforços é bem
mais pesada, pois as barreiras são maiores e mais constantes. Olórí burúkú é
expressão que designa pessoas dotadas de pouca sorte, azaradas, “condenadas
à vida”, amaldiçoadas. O porTador de um destino adverso deve despender
m uito esforço para cada m ínima realização. Orí inú , cabeça interna, /ira,,
caráter, personalidade, atitude, cond u ta, com portam ento, e elçdá, destino
pessoal, acham-se, pois, intim am ente relacionados. Ou seja, na dinâm ica
estabelecida entre determ inism o e livre-arbítrio o sucesso da cam inhada na
existência depende de haver boas relações entre esses três elementos.

Concepção de tem po
A representação de indivíduo, grupo, com unidade e universo é ne­
cessariamente influenciada pela representação de tem po. C onsideram os
indispensável o conhecim ento da forma peculiar pela qual o tem po é vivido
pelos ne"gro-africanos das sociedades tradicionais para a melhor compreensão
destas outras representações. Segundo H am a e Ki-Zerbo:

O tempo africano tradicional engloba e integra a eternidade em todos os


sentidos. As gerações passadas não estão perdidas para o tempo presente. À
sua maneira, permanecem sempre contemporâneas e tão influentes, se não
mais, quanto o eram durante a época em que viviam. O sangue dos sacrifícios
de hoje reconforta os ancestrais de ontem. Tudo é onipresente nesse tempo
intemporal do pensamento animista, no qual a parte representa e pode sig-
, nificar o todo; como os cabelos e unhas que se impede de caírem nas mãos
dos inimigos por medo de que estes tenham poder sobre a pessoa. (HAMA;
KI-ZERBO, 1982, p. 62).

Os griots, tradicionalistas, cronistas, genealogistas e arautos in ­


cum bidos de transm itir oralm ente a tradição histórica, dificilm ente tra ­
balham com um a tram a cronológica, interessando-se mais “pelo hom em
apreendido em sua existência, condutor de valores e agindo na natureza
de m odo intem poral” (OBENGA, 1982, p. 101). Não se dispõem a fazer
a síntese dos diversos m om entos da história relatada, e pretendem , sim,
conceder a cada m om ento um sentido próprio sem relações precisas com
outros m om entos.

36
O gríot praticamente deixa de lado os afloramentos e emergências tempo­
rais, denominados em outros lugares “ciclo” (ideia de círculo), “período”
(ideia de lapso de tempo), “época” (ideia de momento marcado por algum
acontecimento importante), “idade” (ideia de duração, de passagem do
t e m p o ) , “série” (ideia de seqüência, sucessão),“momento” (ideia de instante,

circunstância, tempo presente) etc. É claro que ele não ignora nem o tempo
cósmico (estações, anos), nem o passado humano, já que o que ele relata é,
de fato, passado. (OBENGA, 1982, p. 101).

Ò tempo sagrado e o profano coexistem, e nas narrativas orais dados


históricos se mesclam a elementos míticos. Nas práticas rituais o mito tam ­
bém se faz presente. Eliade considera que

O mito conta uma história sagrada; relata um acontecimento ocorrido no


Tempo Primordial, o tempo fabuloso do “princípio”. Em outros termos, o
mito narra como uma realidade passou a existir graças às façanhas dos Entes
Sobrenaturais. Seja uma realidade total ou Cosmo, ou apenas um fragmento:
uma ilha, uma espécie vegetal, um comportamento humano, uma institui­
ção. É sempre, portanto, a narrativa de uma “criação”: relata de que modo
algo foi produzido e começou a ser. O mito fala apenas do que realmente
ocorreu, do que se manifestou plenamente. Os personagens dos mitos são
os Entes Sobrenaturais. Eles são conhecidos, sobretudo, pelo que realizaram
no tempo prestigioso dos “primórdios” (...). Em suma, os mitos descrevem
as diversas, e algumas vezes dramáticas, irrupções do sagrado no Mundo. É
essa irrupção do sagrado que realmente fundamenta o Mundo e o converte
no que é hoje. (ELIADE, 1972, p. 38).

Segundo essa concepção, o hom em atual resulta diretam ente daqueles


eventos míticos, ou seja, é constituído por aqueles eventos. O m ito narra as
histórias primordiais, o ocorrido nos tempos míticos. Tais acontecimentos
compõem uma História Sagrada, por serem seus atores os Entes Sobrena­
turais. O homem das sociedades arcaicas rem em ora a história m ítica de sua
tribo ea reatualiza, em grande parte, através dos ritos: conhecendo a origem
de um objeto, animal ou planta e repetindo os gestos criadores dos Entes
Sobrenaturais, busca reproduzir o poder mágico-religioso sobre o m undo,
através do retorno mágico à origem e da reiteração do Ato Criador.
Ao reatualizar os mitos através dos ritos, o hom em escapa do tempo
profano, cronológico, e penetra no tempo sagrado, sim ultaneam ente prim or­
dial e recuperável a qualquer m om ento e para sempre. Viver os mitos não
significa realizar uma com em oração de eventos míticos, e sim reiterá-los.

37
Ao invocar a presença dos personagens dos mitos, o indivíduo torna-se seu
contem porâneo, ou seja, deixa de existir exclusivamente no tem po cronoló­
gico e passa a viver, com eles, 110 Tempo Prim ordial, tempo forte, prodigioso,
sagrado, em que algo de novo, significativo e forte ocorreu pela prim eira vez.
Nesse contexto, alta im portância adquire o conhecim ento, entre outros, da
correta forma de realizar as evocações. Sendo a Tradição Oral o reservatório
dessas fórmulas, é a ela que se deve recorrer. A correta realização dos rituais e
o uso das palavras certas com põem o quadro de exigências básicas para que
se passe do tem po cronológico ao prim ordial. N um Ibà Sángó (Saudação a
Xangô), apresentado por Sàlámi (1990, p. S l), encontram os uma fórm ula
de evocação do Tempo:

M ojúbà àkçdá.
M ojúbà asçdá.
A tiy ç ojç.
Atiw ò oòrún.
Qkàniérúgba irúnmçlç.
B 'ckòkolo bájúba ilè.
llç á lanu fún-un.
Q/ó/ó òni.
Ibà rç o!

Eu saúdo os prim órdios da Existência.


Saúdo o Criador.
Saúdo o sol nascente.
Saúdo o sol poente.
Saúdo as duzentas e um a divindades.
Q uando a m inhoca saúda a terra
A terra se abre para que ela entre.
Oh, Senhor do Hoje,
Eu te saúdo!

Nas sociedades africanas a noção de anterioridade no tem po é ainda


mais carregada de sentido que cm outros lugares, pois nela baseiam-se os direitos
sociais, como o uso da palavra em público, o acesso a certas iguarias e os direitos
11a sucessão real, entre outros. O essencial, entretanto, não é a determinação
precisa das datas de nascimento das pessoas, mas a ordem em que ocorrem.
Ham a e Ki-Zerbo assinalam que entre os africanos a história vivida
pelo grupo acumula 11111 poder que é na m aior parte do tem po simbolizado e

38
concretizado num objeto transm itido pelo patriarca, chefe do clã ou rei ao sei
sucessor. Pode tratar-se, por exemplo, de uma bola de ouro conservada nun
tam bor de guerra. Um exemplo interessante é o dos sonianke, descendente:
de Sonni Ali, que possuem correntes de ouro, prata ou cobre, cada elo da:
quais representando um ancestral, simbolizando o conjunto, a descendênci;
dinástica até Sonni, o Grande. No decorrer de cerim ônias tais correntes sãc
regurgitadas em público. No m om ento da morte, o patriarca sonianke rcgur-
gita a corrente pela últim a vez e m orre tão logo o escolhido para sucessor;
engula pela outra extremidade. Esse testamento vivo ilustra com eloquênci.
n força da concepção africana de tem po mítico e social. Seria tal visão dc
processo histórico estática e estéril, na medida cm que coloca a perfeiçãc
no arquétipo do passado, na origem dos tempos? C onstituiria o ideal pari
o conjunto das gerações a repetição estereotipada dos gestos do ancestral:
Não. Para o africano o tem po é dinâm ico e o hom em não é prisioneiro dc
um mecânico retorno cíclico, podendo lutar sempre pelo desenvolvimente
de sua energia vital. Há, entre os songhai, um poem a significativo:

Não é da minha boca.


É da boca de A, que o deu a B, que o deu a C,
que o deu a D, que o deu a E,
que o deu a F, que o deu a mim.
Que esteja melhor na minha boca do que na boca dos que me antecederam.

A vontade constante de invocar o passado não significa im obilism o e


não contradiz a uma lei geral de acumulação das forças e do progresso. Daí
a frase: Que esteja melhor na minha boca do que na dos ancestrais. A viva
consciência do passado e de sua importância sobre o presente não anulam
o dinam ism o deste últim o, com o testem unham num erosos provérbios.
Os rituais cum prem a função essencial de articular o presente ao passado,
perpétuo e mítico.
Que a força do passado esteja em mim, no presente, para que eu possa
assumir compromisso integral com o grupo a que pertenço, participando
lado a lado com meus antepassados e contem porâneos da construção de
tempos melhores para os nossos descendentes.

Concepção de universo
Para o negro-africano o visível é uma manifestação do invisível. Para
além da aparência encontra-se a realidade, o sentido, o ser que, através dela, se
manifesta. Sob toda manifestação viva reside uma força vital: “de Deus a um grão

39
de areia, o universo africano é sem costura” (ERNY, 1968, p. 19). Neste universo
de analogias, correspondências e interações, o hom em e todos os demais seres
constituem uma única rede de forças.
O sagrado permeia de tal m odo todos os setores da vida africana que
se torna impossível realizar um a distinção formal entre sagrado e secular,
entre espiritual e material nas atividades do cotidiano. Uma força, poder ou
energia permeia tudo. Com o dizTempels (1949), o valor suprem o é “a vida,
a força, viver forte ou força vital”. Esta força não é exclusivamente física ou
corporal, mas é um a força do ser total, sendo que sua expressão inclui os
progressos de ordem material e o prestígio social. Felicidade é possuir muita
força e infelicidade decorre de sua privação. Toda doença, flagelo, fracasso e
adversidade indica a ausência de força; prole num erosa é um a expressão de
força. A força pode ser adquirida c transm itida, pode aum entar ou dim inuir
até o esgotam ento total, conform e as capacidades de preservação e aum ento
proporcionadas por alguns fatores, com o o m érito pessoal.
Situando-se entre as mais belas, completas e sucintas formas dc ex­
pressar a concepção de hom em e de cosmos, o mito cosmogônico da tradição
bam bara do Komo, um a das grandes escolas de iniciação do M ande, no
Mali, narra que Deus, denom inado Maa Ngala, tendo sentido falta de um
interlocutor, o criou. Ouçam os a narração bam bara da Gênese Primordial:

Não havia nada, senão um Ser.


Este Ser era um vazio vivo
a incubar potencialm ente
todas as existências possíveis.
O Tempo Infinito era a m orada desse Ser-Um.
O Ser-Um cham ou a si m esm o Maa-Ngala.
Então ele criou “Fan”,
um ovo m aravilhoso com nove divisões
no qual introduziu
os nove estados fundam entais da existência.
Q uando o Ovo Prim ordial chocou
dele nasceram vinte seres fabulosos
que constituiram a totalidade do universo,
a soma total das formas existentes
dc conhecim ento possível.
Mas, ai!
N enhum a dessas vinte prim eiras criaturas revelou-se apta a ser o
interlocutor que M aa-Ngala havia desejado para si.

40

J
Então, tom ando um a parcela de cada um a dessas vinte criaturas,
misturou-as.
E, insuflando na m istura um a centelha de seu hálito ígneo, criou
um novo ser - o Hom em - a quem deu parte de seu próprio nome:
Maa.
Assim, esse novo ser, por seu nom e e pela centelha divina nele intro­
duzida, continha algo do próprio Maa-Ngala.

Maa, simbiose de todas as coisas, recebeu algo que cada um a de suas


partes não recebera: o _sogro divino. Esta origem determ ina um vínculo
profundo do hom em com cada ser, com cada coisa existente no plano
material e, ainda, com os seres do plano cósmico. A tudo e a cada coisa o
homem se relaciona num a grande rede de participação. (HAMPATE BÂ,
1982, p. 184).
Erny refere-se ao universo africano como um a imensa teia de aranha:

Não se pode tocar o menor de seus elementos sem fazer vibrar o conjunto.
Tudo está ligado a tudo, solidária cada parte com o todo. Tudo contribui
para formar uma unidade. (ERNY, 1968, p. 21).

Sob este ponto de vista ganha sentido a preocupação com a ecologia


e com o bem-estar de outras pessoas. Somos interconectados e, por isso,
o sofrimento de qualquer pessoa é o sofrim ento de todos, e seu júbilo é o
júbilo de todos. A árvore abatida desnecessariamente e outros atos de cruel­
dade contra os m undos mineral, vegetal e animal constituem um a agressão
contra si mesmo.
A esta trama de relações associam-se o fenôm eno da sincronicidade
e o pensamento de tipo sincronístico, bastante distinto do pensam ento cau­
sai. Jung (1970) e von Franz (1980) discursam a respeito da diferença entre
essas formas de pensar, contrapondo ao pensam ento causai ou “linear” o
pensamento sincronístico ou “de cam po”, campo este cujo centro é o tempo.
Pensando linearmente, ao observarmos a seqüência de eventos A, B, C e D,
raciocinamos de trás para diante, perguntando-nos por quê D aparece em
conseqüência de C, este em conseqüência de B e este, por sua vez, em con­
seqüência de A. Como norm alm ente pensamos que a causa vem antes do
efeito, esta ideia de tem po é linear, com antes e depois, ocorrendo o efeito
sempre depois da causa. O pensam ento sincronístico, p o r sua vez, organiza
não linearmente, mas em campos. O centro do cam po é o m om ento preciso
em que os eventos A, B, C e D ocorrem. Ao invés dc por que tal coisa ocorre,
ou de que fator resultou tal efeito , pergunta-se: o que é provável que ocorra

-11
conjuntamente, de modo significativo, no mesmo momento? O interesse
prim ordial dirige-se, pois, à coincidência significativa. Jung diz:

Enquanto a mente ocidental examina cuidadosamente, pesa, seleciona,


classifica e isola, a visão chinesa do momento inclui tudo, até o menor e
mais absurdo detalhe, pois tudo compõe o momento observado... tudo que
acontece num determinado momento tem inevitavelmente a qualidade
peculiar àquele momento... Essa suposição envolve um certo princípio
curioso que denominei sincronicidade, conceito este que formula um ponto
de vista diametralmente oposto ao da causalidade. A causalidade enquanto
uma verdade meramente estatística não-absoluta é uma espécie de hipótese
de trabalho sobre como os acontecimentos surgem uns a partir dos outros,
enquanto que, para a sincronicidade, a coincidência dos acontecimentos,
no espaço e no tempo, significa algo mais que mero acaso, precisamente,
uma peculiar interdependência dc eventos objetivos entre si, assim como
dos estados subjetivos (psíquicos) do observador ou observadores. (JUNG,
1987, p. 16).

O utra característica do pensamento causai é a distinção que estabelece


entre eventos psíquicos e físicos (embora haja atualmente um a tendência cres­
cente ao questionamento a respeito das possíveis interações entre essas duas
cadeias de causalidades). O pensamento sincronístico, entretanto, não estabe­
lece igual distinção: tanto os fatos internos como os externos podem ocorrer
simultaneamente, formando um complexo de eventos físicos e psíquicos, cujo
elemento unificador é um determ inado m om ento crítico. Temos nesse caso,
com o pressuposto primordial básico, o seguinte: “tudo é um fluxo de energia
que obedece a certos ritm os numéricos básicos e periódicos. Em todas as áreas
de eventos, acabaríamos sem pre por chegar, ao final, a essa imagem especular,
o ritm o básico - um a matriz - do cosmo” (von FRANZ, 1980, p. 28). É o pen­
samento sincronístico que confere aos diversos recursos divinatórios seu lugar
de destaque: a queda dos búzios, do çpèiè, a corrente divinatória, ou dos ikin,
sementes de dendezeiro, define uma configuração específica, sincronicamente
relacionada a ocorrências físicas, psíquicas, em ocionais e sociais da vida do
consulente, de m odo que o sacerdote, ao olhar essa configuração, enxerga
a configuração existencial daquele que o procurou.

Concepções de saúde, doença e cura


Para m elhor com preender a dinâm ica da ação de Exu e outros
orixás convém retom arm os neste contexto os conceitos de saúde, doença

42
e cura, o que p or sua vez dem anda a retom ada dos conceitos de axé e dc
òòsún 5 e a apresentação de algum as noções relativas às práticas mágica:
e encantatórias.6

,4.ve - A xé
Toda manifestação viva pressupõe a presença de um a força vital
que constitui um valor suprem o e determ ina o ideal do viver íortc nos
planos material, social e espiritual. Enquanto energia, pode ser obtida ou
perdida, acum ulada ou esgotada, e tam bém transm itida. Seu acúm ulo
7nanifésta-sc físicíre socialm ente com o poder, e seu esgotam ento, como
doença física ou adversidades de toda ordem . Entre os iorubás tal força
recebe o nom e de axé.
Axé, a força vital, a energia que flui nos planos físico, social e espi­
ritual, constitui, pois, a força m áxima para se atingir um objetivo. Não há
força maior que essa. Toda e qualquer realização depende do axé. Se bem
administrado, ele aum enta com o passar do tem po e o acúm ulo de experi­
ência, proporcionando fertilidade, prosperidade e longevidade. Em outras
palavras, a aquisição gradual e contínua de conhecim entos sobre as formas
de adquiri-lo e de não desperdiçá-lo e o desenvolvimento da capacidade
de discernir c julgar com justiça e bom senso favorecem o acúm ulo de axé.
Distintos elementos possuem distintas qualidades de axé: cada orixá tem seu
axé específico e diferentes substâncias materiais possuem distintas qualidades
dc força vital.7
A transmissão do axé ocorre através do contato com os portadores
de força vital ou por sua ingestão. Só está vivo o que carrega axé. Os mais
velhos têm o cuidado de não transm itir indiscrim inadam ente tudo o que
sabem a respeito da veiculação dessa força através dc rituais.
São considerados portadores do axé os babalaôs, os babalorixás e as
ialorixás," sacerdotes e sacerdotizas; os çba, reis; os osóc as àjé, respectiva­
mente homens e mulheres que praticam as artes de feitiçaria e bruxaria;
e os çnisègún, conhecedores de òògún, práticas mágico-medicinais. Todo
iniciado adquire, através do processo iniciático, a condição de alásç, portador
do axé dc seu orixá. São recursos de obtenção de axé a iniciação, a prática
de òògún, a herança deixada de um indivíduo para outro, seja por vínculo

Adiante nos deteremos em questões relativas à prática de òògún. ‘' 6 '


Este tema foi anteriormente abordado por Ribeiro (1996) e por Sàlámi (1999a).
No próximo capítulo discorremos sobre o axé específico de cada orixá.
Lembramos que os babalaôs sáo sacerdotes de O runm ilá, enquanto os babalorixás e as ialorixás são
sacerdotes e sacerdotisas dos demais orixás.

43
consanguíneo ou por cm patia pessoal, e o bori, ritual de oferenda ao ori para
reverenciá-lo e fortalecê-lo. A aspiração de ser forte, de possuir prestígio e
poder, faz com que m uitas pessoas desejem ser alásç.
Cabe m encionar o fato de que a expressão a se possui o significado
de assim será (ocorrerá, acontecerá). Para a noção iorubá de tem po essa
predição de futuro supõe um a ocorrência que poderá seguir im ediatam ente
o m om ento presente. A ç ç afirma que, a qualquer m om ento, ocorrerá o que
está sendo afirmado.

Ò ògiin- práticas m ágico-m edicinais


Todos os aspectos da vida biológica e social se articulam para consti­
tuir um indivíduo e um grupo saudáveis. Assim sendo, as relações entre
medicina e organização social nos diversos grupos étnicos negro-africanos
incluem todos os aspectos da vida social e biológica. Em artigo inédito,
Dppámú (1989, p. 8) define medicina tradicional como “a arte e a ciência de
preservar ou restaurar a saúde, através de recursos e forças naturais”. Na
sociedade tradicional iorubá, medicina e magia recebem a m esma denom i­
nação, pois a intenção é que determ ina se os procedim entos adotados visam
a cura física ou a solução de problem as de outra natureza.
Como a medicina e a magia, conhecidas pelos mesmos nomes - òògún,
egbògi, isègún- utilizam recursos e forças naturais para preservar ou res­
taurar a saúde, ambas encontram -se sob o dom ínio da m esma divindade,
Ossaim; e ambas com partilham as convicções de que divindades e espíritos
auxiliam a cura e de que certas substâncias da natureza possuem qualidades
inerentes, de significado oculto. Na prática m ágico-medicinal cum prem
im portante papel os çfç, encantam entos. Recursos mágicos e medicinais
entrelaçam-se de tal m odo que, em certos rituais, é difícil estabelecer os li­
mites entre eles. Por exemplo, um a pessoa com fortes dores de cabeça po­
derá ser orientada a ingerir, em meio a rituais, uma medicação tam bém
preparada de modo ritualístico.
As moléstias são consideradas resultantes da concatenação de múltiplos
fatores de distintas ordens, como a ação de forças naturais ou físicas, de bruxas e
feiticeiros, de espíritos da natureza e de ancestrais. Em busca da cura recorre-se a
elementos do mundo mineral, vegetal e animal. Uma vez realizado o diagnóstico,
através de consulta ao mago-médico ou ao babalaô, são definidas as causas do
transtorno e sobre elas se intervirá: alguns tratamentos atuam simultaneamente
nos planos biológico e espiritual. O ritual nem sempre acompanha a adminis­
tração do medicamento, mas pode constituir um meio necessário à remoção de
causas de ordem espiritual, para que o remédio possa agir no plano biológico.

44
Magia
Frazer (1945; 1978) esclarece que a magia é um sistem a de pensa­
mento que pressupõe a ação regular da natureza, segundo leis dc simpatia
que, uma vez conhecidas, perm item a intervenção hum ana. Frazer postulou
dois tipos de relações sim páticas: as dc contiguidade e as de similaridade.
As relações de contiguidade são de tal ordem que as coisas, um a vez co­
locadas em contato, continuam unidas, isto é, podem agir um as sobre as
outras, mesmo depois de separadas. As relações de similaridade têm por
regra fundamental que o semelhante produz o semelhante , isto é, o efeito
e sua causa se parecem. Daí decorrem a magia de contágio , graças à qual o
mago busca atuar sobre um a pessoa agindo sobre algo que lhe pertenceu,
e a magia imitativa, graças à qual o mago procura conseguir certos efeitos
através de simulacros desses efeitos. Mauss (1974) acrescentou às duas
possibilidades de Frazer um a terceira, baseada não na sim patia, mas na
antipatia: o contrário age sobre seu contrário, isto é, excluído o sem elhante,
pode ser suscitado o seu contrário.
Como operam as leis form uladas por Frazer e M auss no campo da
magia? A lei da contiguidade, que possibilita a prática de magia por con­
tágio, afirma que cada parte eqüivale ao todo ao qual pertence. A distância
entre o todo e suas partes não anula a continuidade do todo, que pode ser
reconstituído ou suscitado através de qualquer um de seus elementos. Todo e
qualquer objeto ou ser, desde que tenha estado em contato, de um a maneira
ou de outra, com uma pessoa, passa a integrar sua totalidade. Assim, uma
pessoa ou coisa estabelece um núm ero praticam ente infinito de ligações
simpáticas. Através desses canais de energia é possível transm itir influxos
mágicos a curtas e a longas distâncias na cadeia de ligações.
A lei da similaridade serve à magia imitativa: dois elem entos seme­
lhantes são considerados capazes de influir um sobre o outro. A similaridade
icònica9 obedece a dois princípios fundam entais: o semelhante evoca o
semelhante e o semelhante age sobre o semelhante. A sem elhança aqui con­
siderada vai além da aparência, além da imagem. É bem mais abrangente que
isso, dado que a principal função de determ inado objeto é tornar presente a
pessoa desejada. O que im porta, pois, não é tanto o objeto escolhido, e sim
a sua possibilidade de representar determ inada pessoa.
A lei da contrariedade tem p o r fundam ento o contraste: a exclusão
do semelhante faz surgir o seu contrário. É o que ocorre no processo de

’ A prática, popularmente divulgada, dc espetar um alfinete num boneco para que a vítima sofra a
alfinetada constitui um tipo de magia icânica.

45
I

cura hom eopática, p or exemplo, quando o semelhante cura o semelhante,


através de sua exclusão e do estím ulo para que surja seu contrário.

O m ago-m édico
Magos e/ou médicos são indistintam ente cham ados de onísègún,
clégbògi, olçsányin e olóògún , em bora com distintas conotações de valor,
conform e assinala Dòpámú (1990). Os çnisègún adquirem seus conheci­
m entos no âm bito familiar, podendo ampliá-los através de contato com
seres espirituais. Ossaim, o orixá da essência do m undo vegetal, conhecedor
das possibilidades terapêuticas de todas as plantas, inclui entre seus mais
im portantes seguidores Aroni, ser dotado de um a única perna, com o as
plantas, e cabeça de cachorro. C om partilha-se a crença de que Aroni, gran­
de conhecedor das propriedades medicinais do m undo vegetal, seqüestra
pessoas talentosas e as leva para viver consigo na floresta, transm itindo-lhes
conhecim entos antes dc devolvê-las às suas casas. (SÀLÁMl, 1990).

Ofò, o encantam ento iorubá —poder oculto dos nom es


A força vital tem na palavra um de seus principais veículos. Cada ser,
objeto ou elemento é dotado de um poder natural ao qual se pode apelar,
desde que conhecido seu nume místico, de fundamento ou primordial.
Frequentem ente encontrados em fórmulas de encantam ento, os nomes de
fundamento permitem ao praticante agir sobre os seres invocados, controlan­
do-os. Dòpámú (1988, p. 13), que registrou na Nigéria um a série de fórmulas
encantatórias e teceu considerações sobre essa prática mágica, diz que çfò'" é
o term o genérico usado pelos iorubás para designar encantamento. Pode
ser definido com o “a palavra falada possuidora de força mágica ou capaz de
produzir efeitos mágicos quando recitada ou cantada sobre objetos mágicos
ou na ausência destes”. Os encantam entos são utilizados em todas as esferas
da atividade hum ana, em particular na prática médica.
Os ofós são de uso indispensável na prática de òògún. A força dos
enunciados orais é potencializada pelo uso dc àfçsç ou dc cpc. O àfçsç
(afoxé), preparado mágico para dar poder à fala, perm ite, por exemplo,
que um com ando verbal seja obedecido sem questionam entos. Assim, uma
pessoa pode ser levada a realizar ações que não desejaria em obediência às
ordens recebidas. Os ofós tam bém podem ser utilizados para orar e aben­
çoar. O èpc , preparado m ágico-medicinal, tam bém potencializa a força do
enunciado oral.

1 Daqui cm diante grafaremos oíóc flexionaremos o vocábulo quando cm contexto do idioma português.

46
Embora m uitos encantam entos dispensem o uso de objetos, em su
maioria são recitados sobre objetos mágicos ou m edicinais - iyçròsún, águ;
objetos indicados pelo próprio texto do encantam ento - para potencializa
sua força. Podem ser recitados após mastigação de sete ou nove obi", ou set
ou nove sementes de pim enta-da-costa, porque ataarea maa pa orô si cniyà
lénu - a pimenta-da-costa toma a boca potente como um veneno.
Para que o encantam ento seja eficaz deve ser recitado exatam ent
como da primeira vez, ou seja, exatam ente do m odo com o foi pronunciadi
no momento de sua criação. Os encantam entos registrados por Dçpám ú en
diversas regiões da Nigéria são recitados em diferentes dialetos, apresentande
muitas vezes, um a mesma palavra com significados distintos e distintas pa
lavras com o mesmo significado. A tradução nem sem pre é possível porqu
muitas das palavras usadas pertencem a textos herméticos, nos quais palavra
menos inteligíveis possuem m aior poder.
Por exemplo, no tratam ento de um hom em m ordido por serpent
será usado um encantam ento para a remoção do veneno, am eaçando-se <
ser da serpente12 de privação total de sua capacidade de envenenar, caso cl
não remova o veneno injetado.
Há muitos tipos de ofós: os pronunciados para potencializar a açãi
mágico-medicinal; os recitados após a mastigação de pim enta-da-costa 01
de obi, com finalidades específicas; os associados a libações em homenagen
a poderes espirituais; os utilizados em práticas do mal, tão potentes qu
determinam a necessidade de uso de outros ofós capazes de neutralizar o
efeitos deletérios produzidos no próprio praticante; os àyájó, com alusõe
míticas, geralmente recitados sobre o iyçròsún. Esses últim os, literalm ent
o dia em que as coisas aconteceram , narram histórias e mitos de origen
correspondentes a ocorrências do presente, e pretende-se, ao recitá-los, re
atualizar as forças prim ordiais atuantes no m om ento de criação.
O ofó pode ser pronunciado em voz alta, sussurrado ou resmungade
O im portante é que seja enunciado corretam ente e na seqüência exata, poi
a m enor variação poderá torná-lo ineficaz.
O conhecimento dos nomes da Morte e da Doença possibilita a longevidade

... (nome),
mo orúkç yin-in.
K i ç má bá m i tvi!

A O biéa noz de cola (COLA ACUM INATA), pequeno fruto de uso alim entar c sagrado. Daqui em diant
adotaremos a grafia o b ic o vocábulo será flexionado sempre que necessário.
I: Alma coletiva das serpentes.

47
... (nome).
sei seu nome.
Não me perturbe!

Uma divindade pode ter m uitos nomes secretos referentes a distintas


qualidades de força e, conform e o que se queira pedir 011 ordenar, deve-se
usar o nom e adequado à finalidade pretendida. As cham adas qualidades de
um orixá, por exemplo, podem ser m elhor com preendidas à luz deste co­
nhecim ento. Nesse sentido, ao invocarmos Oxum Qpàrá, ou Oxum Ipondà,
ou Oxum Ilobá, e assim por diante, estamos invocando um único orixá. A
diferença entre as formas de invocar depende do “apelo” que se queira fazer,
da evocação que se queira realizar de um a determ inada qualidade energética
do mesmo ser. Sabemos que as qualidades dos orixás referem-se a distintas
características de seu ser, reveladas por seus feitos e virtudes, manifestados
em distintos m om entos e distintos locais míticos por onde passaram.
Agentes de feitiço e bruxaria invocados por seus nomes, através de ofós
específicos, podem tornar-se inofensivos; desde que o praticante conheça
seus nomes, estará protegido de ataques:

... (rtome)
K i apá rç má ká mi!
K i çw ç rç má ràn m i!

...(nom e), „
Para que você não possa me dom inar com sua força!
Você não pode me afetar com sua força!

As partes do corpo hum ano tam bém possuem nomes dc fundamento


que, uma vez conhecidos, subm etem -se ao controle do encantador. O ofó
que facilita o parto, cham ado çfç-igbçbi , é o encantam ento utilizado por
parteiros e parteiras e inclui o cham ado de partes do corpo. Vejamos um
exemplo:

Adúdú-forí-sojú é com o cham am os o pênis (nom e de fundam ento)


Ita-a-fçnu-pçlçbçé como chamamos a vagina (nom e de fundamento)

Obòróé como cham am os o bebê (nom e dc fundam ento)


Edidi é como cham am os a placenta (nom e de fundam ento)
Nós nunca pegamos úbòró

48
deixando pra trás òdidi.
Tanto a placenta com o o bebê,
desçam im ediatamente!

Concluída a apresentação dc alguns elementos indispensáveis à com ­


preensão do que é o hum ano para os iorubás, considerarem os, a seguir, os
principais aspectos de sua concepção do sagrado.

-19
C a p ít u lo 2

0 divino na tradição de orixás. T e olog ia iorubá:


E le d u n m a r e , orixás e ancestrais

Hoje em dia, finalmente, tanto na África quanto fora dela não restam
dúvidas quanto à legitimidade das teologias africanas, que vêm recebendo,
em cada contexto e região, distintas denom inações, de acordo com suas
especificidades. E sempre que se aborda esse tema, com o em tudo o que diz
respeito à África, aos africanos e a seus descendentes, nos deparam os com o
desafio de lutar contra preconceitos, dada a prolongada história de dom ínio
político e econômico de alguns povos sobre outros.
Ao nos proporm os a estudar questões referentes ao conhecim ento
sobre o Divino entre os iorubás e sobre sua natureza, atributos e relações
com o m undo e com os hom ens, ingressamos no âm bito da teologia, c ao
nos propormos a estudar rituais e performances religiosas ingressamos no
âmbito da liturgia. Neste caso, ingressamos no âm bito de um a teologia e de
liturgias negro-africanas, fundadas sobre uma noção de pessoa e um a con­
cepção de tempo e de universo bastante distinta das conhecidas e praticadas
no mundo cristão.
O ingresso no pensamento negro-africano exige um esforço de caráter
lepistemológico, e sabem muito bem disso os estudiosos de africanidades cuja
instrução foi baseada em esquemas inferenciais, dedutivos ou demonstrativos
da lógica cartesiana e da teologia escolástica. Assim sendo, não podem os
desanimar se experim entarm os alguma dificuldade inicial no confronto
com a teologia e a liturgia aqui apresentadas, pois seus princípios, hipóteses,
lógica, métodos e resultados m ostram -se bastante distintos dos já familiares
aos indivíduos educados segundo modelos branco-ocidentais. Tentamos
reduzir essa dificuldade apresentando, no capítulo anterior, dados que nos
pareceram indispensáveis à formação de um “m odo africano” de olhar os
fenôm enos naturais, psicológicos e sociais para a m elhor apreensão do que
será apresentado a seguir.
No presente capítulo reunim os inform ações sobre Eledunm are, o Ser
Suprem o, sobre alguns orixás e sobre os ancestrais. Do panteão de orixás
elegemos alguns dos mais conhecidos e cultuados em países da diáspora.
Mais particularidades sobre Exu não foram incluídas neste capítulo por
haver os especialmente dedicados a esse orixá prim ordial.

E ledunm are - a respeito do Ser S uprem o1


O Ser Supremo possui muitos nomes. Os mais antigos são Olódúmarè,
Elédúnmarè e Edúmàrè. A palavra Olódúmarè resulta da contração de olV
oni {senhor de, dono de, parte principal, líder absoluto, chefe, autoridade);
òdü (muito grande, recipiente profundo, muito extenso, pleno): e màrè/mà
rè (aquele que permanece, aquele que sempre é). mò are (aquele que tem
autoridade absoluta sobre tudo o que há no céu e na terra e é incomparável)
ou maré (aquele que é absolutamente perfeito, o supremo em qualidades).
O u tro s nom es do Ser S uprem o são: Olçrun (contração de ol, s e ­
nhor, dono; e çrun, céu , significando Senhor do céu); Orisç (co n tração
de o ri. cabeça; e sç, origem, significando Fonte da qual se originam os
seres ou Fonte de todos os seres); Olçfin-Qrun (com binação de olólln,
rei, e çrun, céu, significando Senhor do céu); Olórí (contração de oni,
■•
senhor, e o ri. cabeça, significando Senhor de tudo o que é vivo). O Ser
Suprem o é único, criador, rei, o n ip o ten te, transcendente, juiz e eterno.
É co n siderado O yigiyigi Qta Aikú: a Poderosa. Durável, Inalterável
Rocha que nunca morre.

O rixás e ancestrais
Os seres veneráveis incluem divindades e ancestrais. Os orixás, d i­
vindades, ganham forma visível nos fenôm enos da natureza. Por exemplo,
lem anjá e Olokum , senhores do Mar, o anim am e através dele manifestam
o seu axé. Os orixás acham-se, pois, relacionados à natureza. São genitores
divinos que definem a pertença do ser hum ano à ordem cósmica. Assim
sendo, representam valores e forças de caráter universal e regulam as relações
com o sistema com o totalidade.

1 Segundo Awólàlú c Dypámú (1979). No capítulo 8, (InjComprccnsào dc E xu no contincntc dc origem


c cm paiscs da diáspora, apresentamos mais dados a respeito de Eledunmare.

54
Os ancestrais, por sua vez, acham -se relacionados à estru tu ra c
sociedade. Podem os dizer que os antepassados são genitores hum ane
que definem a pertença dos indivíduos a determ inadas estruturas sociai
R e p re se n ta m valores e forças próprios de determ inados grupos fam ilian
ou linhagens, determ inam e regulam as relações sociais, a ética e a disc
plina moral no interior desses grupos. Os ancestrais m asculinos têm su
instituição em diversas sociedades, entre as quais a EgbçEgúngún, a Egl
Igimmikó, a Egbç Òro e a Egbç Agemç. Os ancestrais fem ininos - iyagl
(íabás)- também têm sua instituição em diversas sociedades, entre as qua
a EgbçGèlèdé. iyagbàsi^niüca M ãeAnciátnv Verterá veíM neArteiã. ----
O culto aos orixás inclui a devoção diária e, de quando em quando,
realização dc obrigações individuais e coletivas, denom inadas pdiin e ç>sè. A
obrigações coletivas são realizadas em datas pré-estabelecidas, a intervalos qu
variam de três a noventa dias. Nessas ocasiões os devotos reúnem -se, limpar
o espaço sagrado, colocam água nos awç (potes sagrados) e preparam c
oferendas. Homens e divindades com partilham alimentos e festejam junto
dançando ao som de cantos e tambores. A data para a celebração coletiv
anual é definida através de consulta oracular. Outras obrigações e oferenda:
que tenham o objetivo dc m anter o ori das pessoas em equilíbrio, tam bém sã
realizadas por indicação oracular, por orientação recebida através de sonhos o
pelo desejo pessoal e espontâneo de agradar as divindades e os ancestrais.
Durante os rituais os m itos das divindades são reatualizados por seu
iniciados, que geralmente vestem roupas com as cores que as caracterizai!
carregam objetos simbólicos nas m ãos e realizam perform ances rememo
rativas de cenas das narrativas míticas. A possessão ocorre m uitas vezes
nessa circunstância a divindade associa-se intim am ente ao iniciado, chamadi
ç/çgún, que ao ser possuído torna-se seu representante, motivo pelo qur
passa a ser reverenciado por todos os presentes, incluindo sacerdotes.

Orixás
A palavra òrisà possui etim ologia obscura. Dentre as m uitas tentativa
de elucidação de seu significado inclui-se um m ito apresentado por ídòw
(1977), que transcrevemos a seguir:
Olódúmarè (Eledum are) designou Òrisà (Orixá) para vir ao mundi
com Qrúnmilà (O runm ilá, tam bém cham ado Ifá). Passado algum tempe
Orixá quis possuir um escravo e se dirigiu ao mercado de escravos em Èmúrt
onde comprou A tçw çdá.2 M ostrando-se prestativo e eficiente, Àtpwçd

• À tçu rfd àsignifica original, manufaturado.


logo conquistou seu senhor e, 110 terceiro dia de convivência, pediu a ele que
lhe cedesse um a porção de terra para cultivo próprio, no que foi atendido.
Tornou-se, assim, proprietário de terras na encosta da m ontanha que ficava
próxim a à casa de Orixá. Em apenas dois dias de trabalho limpou o mato,
construiu um a cabana e cultivou sua fazenda, deixando o amo m uito bem
impressionado.
Mas não havia bondade no coração de Atçnvpdá e nele germ inou o
desejo de destruir o amo. Procurando a m elhor maneira para realizar seu
intento, m aquinou um plano: havia na fazenda grandes pedras e um a delas
poderia, em m om ento oportuno, ser deslocada do alto da m ontanha, de
m odo a rolar m orro abaixo e cair sobre Orixá. Escolhida a pedra adequada,
preparou-a para que pudesse ser facilmente deslocada. Uma ou duas manhãs
depois, Orixá encam inhou-se para a fazenda. Atowçdá o espreitava sem
esforço, pois seu senhor vestia roupas brancas, destacando-se, nítido, na pai­
sagem verde. No m om ento oportuno, Atowçdá m ovimentou a pedra e Orixá,
entre surpreso e aterrorizado, não teve com o escapar e sucum biu sob aquele
peso, partido em m uitos pedaços, que se espalharam por toda parte.
A história não term ina aí: O runm ilá tom ou conhecim ento do ocor­
rido e, servindo-se de certas práticas ritualísticas, recolheu os pedaços de
Orixá num a cabaça. Daí a expressão Ohun-tí-a-rí-çà, o que foi encontrado
e reagrupado. Alguns pedaços foram levados a Irànje, lugar de origem da
divindade, e outros foram distribuídos por todas as partes do m undo. A
palavra òriçà seria, pois, contração de Ohun-tí-a-rí-sà, e esse teria sido o
início do culto cm todo o m undo. Este m ito sugere que originalm ente òrisà
era uma unidade da qual decorreram todas as divindades. Sugere tam bém
que o Uno manifesta-se no m últiplo e que aquilo que é dividido será um
dia reagrupado.
Segundo outra interpretação, a palavra òrisà seria uma corruptela
de òrísç, contração de Ibiti-ori-ti-sè, ou seja, origem ou fonte dos oris, de­
signação do Ser Supremo. Esta interpretação enfatiza a íntim a participação
das divindades na obra da Criação e a presença divina em cada ser hum ano.
Enfatiza também que ori encontra-se com os princípios da vida. Em outras
palavras, refere-se à fusão de ori com os princípios da natureza e a orixá
como possibilidade de sustentação da vida. De fato, um a compreensão plena
e precisa do que seja orixá furta-se à com preensão da m ente racional, dada
a sua natureza e complexidade.
Entre as divindades prim ordiais incluem -se Obàtálá, tam bém cham a­
do Orisànlá ou Osálá (Oxalá), m odelador dos corpos hum anos; Qrúnmilà
(O runm ilá), tam bém cham ado Ifá; Èsü (Exu) e O gún (O gum ). Sàngó

56
(Xangô), o quarto rei de Qyç>, ancestral hum ano, é identificado com Jàkúta,
a primitiva divindade dos raios, relâmpagos e trovões. M ilhares de espíri­
tos associados a m ontanhas, montes, rios, rochas, cavernas, árvores, lagos,
riachos e florestas personificam fenômenos e forças naturais. Um exemplo
é o monte rochoso Olúm ç, de Abçòkúta, a quem os çgbz? atribuem a ajuda
diariamente recebida.
Os orixás são designados por diversos nomes, entre os quais imalè,
palavra provavelmente originária da contração de çmç-tí-mbç-n'ílç , que
significa seres superiores na terra. Cada orixá possui atributos, qualidades
e características próprias. Por exemplo, Exu, orixá da ordem , da disciplina
e da organização, relaciona-se ao com portam ento hum ano e à ordem do
universo; Ogum representa a transform ação, o desenvolvimento, a divisão
do trabalho, a agricultura, a guerra e todos os enfrentam entos de desafios
da vida; Xangô simboliza a justiça; O.xum, o am or e a fertilidade; Obaluaiê,
o diagnóstico e a cura de doenças, a terra e a existência hum ana; Ossaim,
a medicina e a magia, bem com o o conhecim ento sobre a classificação e a
aplicação de folhas e outros elementos naturais; e O runm ilá, a sabedoria,
os valores morais, a predestinação e o poder de revelar. Cada orixá possui
ritualística própria no que se refere a alimentos, cores, roupas, símbolos,
cantos, toques de tam bor e ewós, que sãT) interdições alim entares e de con­
duta, entre outras.
Alguns nomes de orixás são descritivos, inform ando sobre sua natu­
reza, caráter e funções ou possibilidades. Por exemplo, Jàkúta , contração dc
já, romper, e òkúta, pedra, significa Aquele que rompe (utilizando) pedras, e
é a divindade do raio; Olokum (O lokün), contração de O I’, senhor, e okún.
mar,co Senhor (das profundezas) do mar, $ç>pç>nná (Xapanã/varíola), um dos
nomes de Obaluaiê, é a divindade que diagnostica e cura todo tipo de doença,
particularmente as doenças graves e aquelas que são próprias da pele.
Neste capítulo apresentamos as principais características e símbolos
dc alguns dos orixás que, juntam ente com Exu, compõem o panteão iorubá:
Oxalá, Orunmilá, Obaluaiê, Ogum, Xangô, Oxóssi, Ossaim, Logunedé, Oxu-
maré, Ori, Nanã Buruku, Iemanjá, Oxum, Oyá, Obá, Ajê, Erinlé, Ewa, Ibcji,
Iroko e Igunukô. De quantas divindades se compõe o panteão? Algumas fontes
orais se referem a um total de 201, outras a um total de 401,600, 1060, 1440
ou 1700. Para poder afirmar “eu sei o que é orixá”, nós teríamos que conhecer
todas as características de cada uma dessas divindades. Isso nos dá a entender a
impossibilidade de conhecer profundam ente o que é orixá cm sua essência.

’ Io rubis <lc Abçòkúta.

57
Poderíamos perguntar: Quais são os principais orixás e qual a hierar­
quia estabelecida entre eles? Sabemos que algumas divindades são cultuadas
por todo o território iorubá, enquanto outras são particularm ente reveren­
ciadas nesta ou naquela região. Assim, a divindade prioritariam ente cultuada
em determ inada lugar, com o por exemplo O xum em Osogbo, torna-se líder
do panteão local. Ou seja, em cada lugar o panteão é regido por um ou por
alguns orixás, dependendo das necessidades particulares daquele subgrupo
étnico em determ inado m om ento histórico. A divindade regente em cada
lugar é o ser espiritual mais im portante abaixo dc Eledunm are, destacando-
se das demais por suas ligações míticas com aquela região e com a história
daquela população em particular. Assim com o o culto a Oxum tem sua
origem na região da cidade de Osogbo, capital do estado de 0 ? u n > o culto a
Erinlé, divindade guerreira, patrona da m edicina, tem sua origem na região
da cidade dc Ilobu, estando seus mitos particularm ente associados à história
dos habitantes desse lugar.
Nos países da diáspora observa-se que, p o r fatores históricos, alguns
orixás são mais conhecidos e reverenciados do que outros.

Orísà-àlá - O xalá
Incum bido pelo ser suprem o de criar a terra sólida, de povoá-la e de
m odelar a forma física do hom em , Oxalá é frequentem ente descrito como
o representante de Eledunm are na terra. Alguns de seus designativos são:
Òrisànlá, Grande orixá; Orísà-àlá, Orixá da pureza; Obàtálá. contração de
Oba-ti-o-nlá, o Rei que é grande, ou Oba-ti-àlà, Rei em vestes brancas ou
Rei da pureza ; A-tç-rere-k-áyé, Aquele que se expande por toda a extensão
da terra; Elçdá, Criador; Alábaláse, Oráculo (nome dado a Oxalá devido
a seu papel de revelador de acontecimentos futuros); Ibikéji Edúmàrè,
Representante de Eledunmare; Adimúlà, Protetor, Aquele que nos dá se­
gurança; Çbàlúfçn, R ei dc Ifçn, Osàlúfçn. Orixá da paz do reino dc Ifçn;
Òrisà O/úfçn,Orixá protetor do povo de Ifçn; Qba Olúfçn, Rei do povo
de Ifçn; Ògiriyán, Aquele que se alimenta dc iyán (inham e pilado); Òrisà
funfun. Orixá branco. Orixá puro; Aládé sçsççfun, Rei cuja coroa é con­
feccionada coni sçséefun (miçangas brancas); Òrisà Ifè. Orixá da cidade
de Ifç; Òrisà-àlá, Orixá de vestes brancas, Orixá que aprecia a cor branca,
a pureza e a limpeza*
Orixá da criatividade, da paz e da tranqüilidade, neutraliza tu rb u lên ­
cias e torna seus devotos prósperos, desde que se esforcem para isso: Oxalá

* O branco não sc refere, evidentemente, à cor da pele, e sim à cor das vestes, indicando limpeza e pureza.

58
dá a seus filhos motivo para rir; e eles riem. Esse orixá é exigente em relaçãi
ao senso de m oralidade de seus cultuadores, que devem ser puros como
áeua da nascente. Exige que sejam corretos e bondosos:

A yé wçn á tòrò bi omi afàárò-pçn!


Suas vidas serão puras e límpidas como água apanhada na
nascente logo cedo pela manhã!

Qbàtálá adáni bó ti ri.


________ Qbatalá fez a pessoa do jeito que ela é._______________________

Òrisà tó dá abuké, ló se okun si arç ni idi.


Orixá é quem fez o corcunda e também fez o aleijado mancar.

Oba àjij ç igbin.


O rei que com e igbin logo cedo pela m anhã ( igbin com o
símbolo dc autocontrole, paciência e serenidade).

Há um mito segundo o qual Oxalá e O runm ilá foram os prim eiro


que chegaram à terra e, aqui chegando, foram diretam ente para Irànjc, cida
de nigeriana. Lá ficaram por m uito tempo, resolvendo problem as dos serc
humanos. Trabalharam juntos até o momento em que O runm ilá teve qu<
partir para a cidade de Ifç e iniciar seu trabalho oracular.
Os metais de Oxalá são o chum bo e a prata. Seus sím bolos são: çfui
(potente e sagrado cal natural); marfim; òjc (chum bo); àjà ou àdijà (sino)
cabaça branca; çpa òsoro (cctro); ikódide (pena vermelha da cauda d<
pássaro òdidç); um a estátua de m adeira ou de marfim que o representa
çta (pedra de assentamento); irúkçrç (cauda de animal que, após prepare
artesanal e mágico, é carregada por sacerdotes e reis com o sinal de realez;
e poder); búzios.
Sua cor é o branco. É frequentemente representado pela figura dc un
ancião com trajes e ornam entos brancos e todos os objetos a ele associados sãc
igualmente brancos, incluindo-se as roupas e os ornamentos de seus sacerdotes
sacerdotisas e devotos. As contas de seus colarcs são brancas ou de marfim.
As pessoas que nascem defeituosas e os albinos são cham adas En
Òrisà. Devotos do Orixá, e devem respeitar certos tabus alim entares. En
algumas regiões é costum e dizer-se a uma m ulher grávida: K i Òrisa ya 7.
're ko ni o, que significa possa Orixá realizar um belo trabalho de arte par.
você. Ouve-se dizer tam bém : K ií ‘se çjç eléyingan-n-gair. Òrisa I ’ó se c ti kt

59
11awç bò ó, que significa os dentuços não devem envergonhar-se: foi Orixá
quem os fez e não providenciou cobertura suficiente para seus dentes. Ditos
populares com o estes têm a finalidade de favorecer nas pessoas a autoaceita-
ção e autoconfiança, propiciando ainda, a elevação de sua autoestima.
Oxalá é cultuado por todo o territó rio iorubá. Segundo narra a
tradição, seu lar de origem é Igbó: Eniti nw çn bi / ' óde Igbó ti ó re j ' çba
l'óde Irànjé significa Ele, que nasceu em Igbó e foi reinar cm Irànjé. Em
llè-Ifè é cultuado, pelo menos, sob três nom es. Em Ifçm onde, segundo
algum as tradições, ele teria reinado, é cham ado O lúfçn; em ijàyè, Oriçà
Ijàyè; em Owu, Òrisà-Roowu; cm Oba, Ò risà Olpba, e assim por diante.
M ulheres estéreis pedem a benção de conceber e m ulheres grávidas bebem
água de seu santuário para terem filhos bonitos e saudáveis. Inválidos são
tratados com essa mesma água, colhida de m anhã bem cedo, devendo a
pessoa que vai apanhá-la perm anecer em silêncio total durante a realização
dessa tarefa. A água do santuário de Oxalá deve ser trocada todos os dias
para m anter-se pura.
Antigam ente apenas mulheres virgens ou sem atividade sexual e de
indiscutível reputação moral podiam apanhar água em sua nascente. D u­
rante todo o percurso dc ida à fonte e retorno, para evitar que lhe dirijam a
palavra, a pessoa que apanha a água faz soar continuam ente o agogo (sino),
inform ando tratar-se de um cortejo sagrado.

Òrúnmilà 5 - O runm ilá


Òrúnm ilà, Qrúnm ilà-Ifá ou Ifá, a divindade oracular dos iorubás,
é respeitado p o r sua sabedoria. A palavra Qrúnmilà designa a divindade,
enquanto a palavra Ifá designa, sim ultaneam ente, a divindade e o sistema
divinatório a ela associado. A palavra Qrúnmilà é form ada pela contração
de ç>run-l 'ó-mç-á-ti-Ià, Somente o céu conhece os meios de libertação;
resulta tam bém da contração de çrun-mç-çlà, Somente o céu pode liber­
tar. Ifá, p o r sua vez, tem por raiz fa, acumular, abraçar, conter, indicando
que todo o conhecim ento tradicional iorubá acha-se contido no corpus
literário de Ifá.
Antes de prosseguirmos cabe assinalar que Abim bçlá (1975; 1976),
um dos mais significativos expoentes nos estudos sobre a cultura iorubá, é
de opinião que o em penho em traçar rotas de origem de palavras antigas,
com o os nom es dos orixás, é tarefa inglória, dado que a estrutura dessas
palavras impossibilita uma análise autêntica.

5 Vide capitulo 9 - Transmissão orai de conhecimentos - corpus literário e sistema divinatório de Ifá.

60
Um dos orikis*’ de O ru n m ilá diz:

Òkitibiri, a-pa-çjç-ikú-dà.
O grande transform ador, que pode alterar a data da m orte.

Vejamos alguns de seus mitos:


Há um mito segundo o qual O runm ilá teve oito filhos e alguns dis­
cípulos, aos quais ensinou os mistérios da adivinhação. Todos os seus filhos
tornaram-se im portantes, espalhando-se por m uitas regiões do território
iorubá. De acordo com outro mito, Ifá, nascido em Ifé, em inente adivinha-
dor e grande terapeuta, após tornar-se famoso fundou um a cidade cham ada
Ipetu, dela tornando-se rei. Bastante popular e grande profeta, era procurado
por muitas pessoas desejosas de aprender a arte divinatória. Entre todos os
aspirantes ele selecionou dezesseis hom ens, cujos nom es são idênticos aos
dos odus, signos divinatórios.
O utro m ito narra que O runm ilá, em com panhia de outras divinda­
des primordiais, veio para a terra participar do processo de criação. Desceu
em Ifé, considerada o ponto de origem da espécie hum ana, pois recebera
de Eledunmare a incum bência de acom panhar e aconselhar O rixalá (O xa­
lá), seu senhor e superior hierárquico. Recebeu tam bém o privilégio dc
conhecer a origem de todos os orixás e de todos os seres, aí incluídos os
seres hum anos. Por isso é cham ado Izlérí-ipin, a Testemunha, que defende
e orienta os destinos hum anos. Presencia o nascim ento de todos os seres
no m om ento em que o destino de cada um é selado. Som ente O runm ilá,
conhecedor do ipín ori, o destino do ori, pode sondar adequadam ente o
futuro e orientar quem o procura. Por isso é consultado, através de jogo
oracular, nos m om entos fundam entais da existência, com o as iniciações,
a fundação de aldeias, o início da construção de casas, a realização de
contratos, negociações, o início e o térm ino de guerras, os casam entos e
os nascimentos.
No contexto oracular, Exu é um a divindade particularm ente im por­
tante, dada a sua relação de amizade estreita com O runm ilá, o que se revela
em milhares de narrativas míticas. Os odus Èji-Ogbè (7) e Ogbè-írçtç (9)7
são exemplos disso. Em algumas narrativas há referências à qualidade cal-

* Oríki é um vocábulo formado por ori, cabeça, e ki, saudar; oriki t, pois, uma forma dc saudar o scr,
referindo-se a sua origem, suas qualidades e seus ancestrais. Dessa forma sâo saudados os orixás, as pessoas
c os animais. Geralmente os orikis incluem descrições de características e feitos do scr saudado.
’ Vide capitulo 10 - M itos dc E xu nos odus dc Ifá (iorubá)e capítulo II - M itos dc Exu nos odus de tfá
(português). Os núm eros (7) e (9) referem-se à num eração dos odus nos referidos capítulos.

61
F

m ante dc O runm ilá, cm contraposição ao poder dc Exu. A narrativa mítica


apresentada a seguir ilustra um aspecto interessante da dinâm ica de relações
entre esses dois orixás:

Oótó bnlç ó ikà balç ó di yangi, o d ifá fún Èsú Odárá ó nlç si
ogun Ajàlé Eréwi.

A verdade caiu no chão c virou água. O maldoso caiu no chão e virou


yangi foi quem adivinhou para Exu O dara no dia em que ele partiria
______ para guerrear na terra de Àjàlé F.rémi.-------------------------------------------------

Q uando a cidade de Ajàlé Erémi entrou em guerra, Exu c O runm ilá


tom aram conhecim ento do fato c quiseram participar. Antes de saírem de
casa planejaram o que fariam nessa guerra. Disseram que fariam coisas
m irabolantes e inesquecíveis e foram se vangloriando, cada vez mais, até
estabelecerem rivalidade. Chegaram à conclusão de que deveriam ir para a
guerra e ver o que aconteceria. Na guerra lutaram c venceram, conquistando
m uitos escravos e propriedades. Q uando estavam retornando pararam para
descansar. Pediram permissão ao chefe de um povoado para pernoitarem ali, e
durante a noite Exu despertou seu com pínheiro para fazer demonstrações da
própria força. O runm ilá disse a Exu para não se esquecer do que ele afirm ara
antes: que faria algo inesquecível para qualquer hom em que presenciasse.
Então Exu o desafiou a dem onstrar que possuía poder m aior que o seu.
Ao saírem pela m anhã, Exu pegou um dos galos do chefe da casa, ar- ’
rancou sua cabeça e a guardou no bolso. Depois, cham ou O runm ilá e sugeriu
que seguissem viagem. Q uando os m oradores da casa despertaram , notaram
a falta do galo e começaram a procurar o ladrão, aos gritos. Um guerreiro
lhes disse: “Pela m anhã vi um de seus hóspedes perto do lugar onde os galos
ficam”. Perguntando pelos hóspedes não os encontraram , mas acharam seu
rastro. Q uando Exu viu que estavam sendo perseguidos, consciente de sua
ação, disse a O runm ilá: “Olhe para trás e veja a m ultidão furiosa que vem
vindo. Apressemo-nos!” O runm ilá ficou com m edo e perguntou: “Por que
você m atou o galo dos outros? Agora terá que sofrer as conseqüências”. Exu
respondeu:“Você está muito enganado. Você é quem sofrerá as conseqüências
pelo que eu fiz!” E O runm ilá disse: “A terra não morre. Pode apenas tornar-se
estéril. Sendo assim, tam bém não m orrerei”.
Com o Exu guardara a cabeça do galo no bolso, seu sangue deixou um
rastro no chão e isso serviu para nortear os perseguidores. Ao perceberem
que estavam sendo alcançados, e não tendo mais para onde fugir, subiram

62
numa árvore. Os habitantes da aldeia lhes disseram que estavam encurralado
Alguns foram buscar um m achado para derrubar a árvore enquanto outre
ficaram vigiando. Exu disse então a O runm ilá que chegara o m om ento d
dem onstrar o seu poder: faria algo extraordinário e ninguém conseguiri
apanhá-lo. E O runm ilá disse o mesmo, reafirm ando sua superioridadt
Quando a árvore estava sendo derrubada, Exu disse a O runm ilá que se pre
parasse para a queda. Ao caírem, O runm ilá se transform ou cm água e Exi
em yangi. As pessoas não encontraram nenhum dos dois. Os que beberan
água se refrescaram e se acalm aram c os que viram yangi ficaram nervoso;
com um brilho aterrorizado no olhar.
Observamos no final desta narrativa a referência feita à qualidade
calmante desse orixá funfun , 8 contraposta ao poder terrificante de Exu.
Os principais símbolos dc O runm ilá são: ikin (sementes dc dendezei
ro); Qta (pedra de assentam ento); ibò (instrum ento utilizado pelo babalac
para realizar consulta oracular confirmativa, ou seja, consulta de resposti
sim ou não); iríikèrè (cauda de anim al que, após preparo artesanal e mágico
é carregada por sacerdotes e reis como sinal de realeza e poder); òpçlç (cor­
rente divinatória); çpçn-Ifá (tabuleiro dc jogo divinatório); búzios; pedaçoí
de presa de elefante gravados, que ficam em um receptáculo colocado em
lugar alto, num canto ou no centro do côm odo. Seus colares e pulseiras sãc
confeccionados-alternando-se contas dc cor verde e m arrom .

O bahiw ayé- O baluaiê


Qbalúwayé, palavra decorrente da contração de Qba-'!u'aiyé , Rei
que e o Senhor cia Terra, é tam bém cham ado Ohíwa Aiyé, Senhor da Terra.
Pede-se licença a ele para o uso da terra. Por exemplo, quando um iorubá
vai jogar água no chão, norm alm ente diz: A gò o Oiódè! Com sua licença,
Olúdc! Olóde é palavra originária da contração de O I\ abreviação de Oni,
senhorou dono, c ode, espaço externo, terra, significando, pois, Senhor (ou
Dono) do espaço aberto. Senhor (ou Dono) da Terra. É tam bém cham ado
Hç-gbóná, Terra quente: Bàbá, Pai; e Sçpònná, Varíola.
Senhor da varíola e de todas as enferm idades, O baluaiê inspira terror
e respeito por seu poder de controle sobre as doenças. E associado à cura, à
justiça e à paz social. Sua energia é m anipulada para agradecer a terra pelo
que oferece às pessoas. Seu poder é usado na cura de todas as enferm idades,
particularmente as mais graves e as da pele.

Funfun: branco. Conforme já assinalado, a cor branca não se refere, evidentem ente, à cor da pele, e sim
às vestes, simbolizando limpeza c pureza.

63
Um de seus orikis diz:

A-sòro-'pc-Fçrún-ún (em situações de referência a Obaluaiê).


Aquele cujo nom e não deve ser pronunciado durante a estação
das secas.

Sua perm issão é solicitada em festas: Deixe-me obter a permissão


do Senhor da Terra, ver se ele nos permitirá dançar. Sua hospitalidade é
solicitada no cultivo da terra: o Fazendeiro poderia ser extraordinariamente
agradado. O algodão não queimaria. Não desagradaria o fazendeiro. O
fazendeiro poderia ser extraordinariamente agradado.
Estes são os seus símbolos: çta, pedra de assentamento; irúkèrè (cauda
de animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada por sacerdotes
e reis com o sinal de realeza e poder); búzios; çjúwèrç (instrum ento ritual
semelhante ao irúkçrè, feito de couro e, por vezes, enfeitado com búzios
ou miçangas); barro; yangi (pedra vulcânica, latcrita, sím bolo de Exu) e
agbada (pote de barro de boca larga)9. Suas cores são o branco, o preto e
o vermelho. Seus adereços são o lágidigbà, colar feito de contas pretas, de
casca de noz de palm eira ou chifre de búfalo; e o colar de contas brancas e
pretas alternadas. —
Obaluaiê é estreitam ente relacionado a Exu. Daí origina-se outro
de seus nomes: Alápadúpç, palavra que pode ser traduzida por Temos que
aceitar a inevitabilidade da morte. Alguns anciãos dizem que Obaluaiê é
irm ão de Xangô. De fato, o elemento fogo é com um a ambos: as febres de
Obaluaiê e o poder incendiador de Xangó.
Esta crença leva os devotos de Xangó a considerarem -se im unes à
fúria de Obaluaiê e vice-versa. Uma expressão disso é a seguinte: Não há
dano que o irmão mais velho possa infligir aos Filhos do irmão mais novo.
Esses orixás são tão familiares entre si que, segundo narrativas tradicionais,
Obaluaiê frequentem ente refere-se a Xangô em tom de brincadeira, dizen­
do, por exemplo, que quando Xangô vai destruir um a única pessoa faz um
enorm e alarde, com extraordinários efeitos de luz c som (relâmpagos e raios),
enquanto ele próprio destruirá centenas de pessoas silenciosamente.
Ele proíbe a m entira e o mau uso de magia. Usa roupa verm elha e
viaja quando o sol está bem quente. Por isso as pessoas são desaconselhadas a
usar roupa vermelha e andar sob o sol para não atraírem doenças. Cuidados
especiais devem ser tom ados durante a estação das secas, de m odo a não se

wNão confundir com ngbJdá, que significa manto, traje, roupa.

64
adotar nenhum procedim ento que possa ofender o orixá. Isto é com preen­
sível porque a varíola é mais freqüente e se espalha mais facilmente durante
esse período.

Ògún - O gum
Ogum, divindade do ferro, da guerra e da caça, é patrono de ferreiros,
caçadores, agricultores, guerreiros e todos os que lidam com ferro, aço e o u ­
tros metais, incluindo os profissionais que realizam tatuagens e circuncisões,
os policiais e os cirurgiões. É tam bém um orixá que defende os hom ens e
lhes dá o senso de autodefesa.
Escolhido por Eledunmare para abrir cam inho à civilização, Ogum ,
forte e poderoso, é o herói civilizador: trabalha sobre a natureza do ferro e
do fogo. Rege tam bém a m ineração, a m etalurgia e a agricultura, ligando-
se, assim, às questões do trabalho e da tecnologia. Desbravador, O gum abre
caminho para as realizações. Acha-se, por isso, estreitam ente relacionado
às Iyami Oxorongá.
Alguns de seus epítetos enfatizam a sua im portância no panteão de
orixás: Alakaaye , Aquele que é espalhado pelo mundo inteiro; Alásegbe,
Aquele que age sem se arrepender; Qlójç, Senhor do Dia.
Vejamos alguns de seus orikis:

Onilé owó. Olónà Olà.


Dono da morada do dinheiro. Dono do caminho da prosperidade.

Ògún Onirè, ohun gbogbo ayé ti Ògún ni.


Ògún kçlé, kò n i ilékún.
Oh! Ogum , rei de Ire, tudo o que há no m undo pertence a ele.
Oh! G rande Ogum, que construiu um a casa e nela não colocou
porta para que todos pudessem en trar e com partilhar do seu
progresso.

Ògún kò ni j ç ó si ewu Içnà ira.


Com a proteção de Ogum não haverá perigo em nosso cam inho.

Narra o mito que Eledunmare enviou quatro divindades para cria­


rem o mundo: Obatalá, m odelador dos corpos hum anos; Exu, inspetor dos
rituais e das oferendas feitas pelas divindades e pelos hom ens; O runm ilá,
divindade da sabedoria, conhecedor de todos os destinos; e Ogum , com seu
facão, para abrir cam inhos às outras divindades e aos hom ens. Chegando

65
à terra, as divindades tiveram dificuldades para penetrar na mata. Obatalá,
O runm ilá e Exu tentaram abrir passagem, porém fracassaram porque suas
ferramentas não eram resistentes. Ogum abriu facilmente o cam inho para
os demais com seu facão.
O utro m ito narra que O gum , prim eiro filho dc O duduw a, o p atria r­
ca dos iorubás, era um poderoso guerreiro, tem ido por todos e de quem
todos dependiam , pois protegia e ensinava. Ajudava seu pai nas expedições
de guerra e o acom panhava na luta contra os inimigos. Um dia O gum e
O duduw a foram a outra cidade para lutar e dem oraram para reto rn ar a
Ilè-Ifè. Na volta, O duduw a, m uito satisfeito com o desem penho do filho,
resolveu oferecer-lhe um presente: enviou-o à cidade de Ire, o n d e foi
coroado rei, passando a ser cham ado Ògún Onirè, Ogum. R ei de Irê ou
Ogum, Senhor de Irê.
Em m uitos mitos sua generosidade é exaltada: um deles narra que
o sucesso da colheita fez sua casa farta e seus vizinhos foram beneficiados
por sua grande generosidade. Com partilhava alim entos e conhecim entos,
ensinando a todos com o caçar, forjar, guerrear e plantar.
Seus metais são o ferro, o cobre, o carvão de pedra (m ineral) e todos
os metais forjados. Seus símbolos são: ótn (pedra de assentam ento); irúkèrç
(cauda de animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada por
sacerdotes e reis com o sinal de realeza e poder); búzios; a presa do elefante
ou sua cauda; àdá (facão); çbç (faca); nkc (enxó ou m achado sem cabo);
oká (enxada ou estribo); iyòsó (m artelo); ngogo (sino); èmú (pinça); omç
owú (pedaço de ferro que serve de apoio para a forja); akokoro (foice);
òghó (barra de ferro usada para o trabalho na forja); gbçnàgbénà (escultor);
màriwò (folha de palmeira, roupa usada por Ogum quando veio do orun
para o aiye);pèregún (DRACAENA FRAGRANS); ibon (espingarda); outros
objetos de ferro. Suas roupas e colares são confeccionados num a tonalidade
forte dc azul.
Ogum é considerado m uito ágil e feroz. Qualquer contrato ou ju ra ­
mento selado em seu nom e deve ser cumprido. Entre os costumes tradicionais
incluem-se beijar um pedaço de ferro ou m order um objeto de metal para
provar com prom isso com a verdade e a justiça, cm nom e de Ogum . Caso o
com prom isso não seja respeitado ou haja juram ento falso, considera-se que
o faltoso sofrerá sérias conseqüências.
Denomina-se Egbç Odèa sociedade de caçadores, agricultores, ferreiros,
mineradores e outros profissionais que têm Ogum por mentor. Os membros
dessa sociedade são guardiões do conhecimento trazido por Ogum c todas as
atividades profissionais por ele regidas são consideradas próprias dc hom ens de

66
personalidade forte. Para scr bom caçador, por exemplo, é preciso, entre outra
coisas, ter acesso a segredos da sabedoria de Ogum, o que inclui conhecimento
sobre a forma de tornar aceitável sua presença e atividades na floresta.

Òsòòsi - Oxóssi
Na África os caçadores são considerados guerreiros. Os prim eiro:
aprendizes de Ogum na arte da caça e da guerra foram Oxóssi e Erinlé
Qsççsiou Çsòwúsi, outra forma de escrever seu nom e em iorubá, é chamadc
A ia"iin. Vitorioso caçador e guerreiro; Ajagúnnà, o Estrategista que destró
o '»■')/ e que oferece boas ideias: Alákétu, Rei de Ketu. Patrono e p roteto.
do povo de Ketu; Odç. Caçador; Olóyè Mèji, llom cm dc honra portador cA
dois titulos (Rei de Kétu e Patrono dos Caçadores).
Associado à caça e à capacidade estratégica, possui intuição e percep­
ção aguçadas. Suas atividades de caçador incluem, além da caça de anim ais
todo tipo de conquista profissional e econômica. Ama a mata e conhece as
propriedades dos seres que ali vivem. Aprecia a vida ao ar livre e a música,
muito utilizada nas atividades de caça e guerra com a finalidade de atrair
a sorte e fazer do trabalho um a fonte de prazer. Protetor dos hum ilhados e
dos injustiçados, cultuado para atrair agilidade, traz sorte nos negócios e nas
atividades que envolvem dinheiro. Zela por assuntos familiares.
Uma de suas cantigas diz:

Ajagúnnà ode gbà m i o.


Ajagúnnà bi ikú nké lódè.
Bàbá o tó sádi, Ajagúnnà.

Ajagúnnà! Me acolha!
Se a morte e a doença estiverem cantando em m inha vida,
Buscarei refúgio em você, ó grande e poderoso,
que pode me defender.

Seu metal é o ferro. Seus símbolos são: óta (pedra de assentamento);


irúkèrè (cauda de animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada
por sacerdotes e reis como sinal de realeza e poder); búzios; ofà (arco e flecha);
ç/u/j (potente e sagrado cal natural); e osún (espécie de tintura vermelha de uso
ritualístico). Por ser OlóyèMóji, ou seja, detentor de dois títulos, a pintura de
seu ibá é feita em duas cores - m etade branco (com efuri) e m etade vermelho
(com osún). Durante o processo iniciático os seus devotos tam bém são pinta­
dos desse modo. Sua cor é o azul, na mesma tonalidade do azul de Ogum. Em

67
seus colares se utiliza exclusivamente o azul ou se alterna azul e branco, com
ou sem búzios. Suas pulseiras são de couro, com ou sem búzios.
As festas realizadas em sua hom enagem incluem a caça acom panhada
de cantos e tam bores e o animal caçado lhe é ofertado.

L ó g u n çd ç- Logunedé
Lógun, Guerreiro, Lógunçdç, Guerreiro da cidade de Edé (situada no
estado de Qsun, na Nigéria) ou Asiwájú Òrisà, Líder dos orixás, é filho mítico
e aprendiz de Oxóssi: acha-se associado à caça e à capacidade estratégica. De
intuição e percepção aguçadas, corajoso, poeta, protetor dos hum ilhados e
injustiçados, é cultuado para atrair agilidade e prosperidade, trazendo sorte
nos negócios e na obtenção de dinheiro.
Seus metais são ouro, latão am arelo e bronze. Seus sím bolos são:
çta (pedra de assentamento); irúkèrç (cauda de animal que, após preparo
artesanal e mágico, é carregada por sacerdotes e reis com o sinal de realeza
e poder); búzios; çfà (lança e espada de metal dourado). Suas cores são o
amarelo e o azul. Seus colares e pulseiras são elaborados intercalando-se
contas amarelas e azuis.
Em alguns grupos religiosos da diáspora iorubá nas Américas desen­
volveu-se a crença infundada de ser Logunedé um herm afrodita - masculino
durante seis meses e feminino nos outros seis meses do ano. Esta crença não
encontra fundam ento no Odi) Corpus.

S à n g ó - Xangô
Xangô, na natureza, é o Senhor dos raios, relâmpagos e trovões. En­
tre os hom ens é o Senhor da Justiça. Xangô, o quarto rei de Qyç>, teve seu
culto iniciado nessa cidade e rapidam ente expandido por todo o território
iorubá, vindo a ser um dos orixás mais cultuados. Considerado feroz, gene­
roso, provedor de filhos, dinheiro, curas e, especialmente, justiça, abom ina
falsidades, m entiras e roubo. Conform e já m encionado, é identificado com
o orixá Jàkúta, Aquele que rompe com pedras, a divindade prim itiva dos
raios, relâmpagos e trovões.
Vejamos alguns de seus orikis:

Sàngó Olúàso àkàtà yeriyeri.


Xangô, cujo poder está espalhado por toda parte.

Olúkòso, éégún ti n yoná Içnu.


Xangô, o dragão faiscante, a divindade que lança fogo pela boca.

68
Sàngó Olúàso.
Xangô, Aquele que reúne (também traduzido por dragão faiscanté).

Omo olómi ti njç Iyemçja.


Filho da Mãe d’Água que se chama Iemanjá.

Narra o m ito que Xangô, m em bro de um a família tem ida e respei­


tada, governava a cidade de Çyçp (Katunga). Filho de Q rànm íyàn, orixá da
çuerra, poderoso guerreiro, por sua vez filho de O duduw a, teve dezesseis
esposas, entre as quais Oyá, O xum e Obá. Destemido, poderoso e grande
conhecedor dc magia, gostava de exibir seu poder, por exemplo, lançando
labaredas de fogo pela boca ao falar. De índole irascível, seu procedim ento
o levou a perder o respeito dc seus conselheiros e do povo em geral. Ten­
do causado desentendim ento entre dois de seus conselheiros estim ulou
a discórdia gerada, provocando um a briga que culm inaria na m orte de
um deles. Esse fato repercutiu c ele passou a ser odiado por seus súditos.
Não podendo su p o rtar tal situação, fugiu da cidade de Qyç>, sem destino.
Andava a esmo acom panhado apenas p o r Oyá, O xum e Obá, pois seus
mensageiros, entre os quais encontravam -se O xum aré, Dada, Òrú e Timí,
já o tinham abandonado.
Ao chegar ao limite da cidade, antes de deixar 0yç>, voltou-se para
trás e viu que apenas Oyá o acompanhava. Sua tristeza aum entou e, sem
saber o que fazer, aproxim ou-se de uma árvore cham ada àyàn, plantada à
beira da estrada, e ali se enforcou. Esse lugar viria a ser cham ado Kòso, que
significa não se enforcou. O utras narrativas registram que ele desapareceu
engolido pela terra.
Após sua m orte, Oyá foi para a cidade de Irá e no cam inho transfor­
mou-se no rio que ficaria conhecido com o odò Oya, rio Oyá. Q u ando a
notícia de que o rei se enforcara chegou à cidade, o povo clamava: Ç)ba so!
Oba so! O rei se enforcou! O rei se enforcou! Este fato provocou irritação
nos amigos que haviam perm anecido fiéis ao rei, mas estes estavam em
m inoria e não podiam revidar. D irigiram -se então à cidade de Ibàribà,
aprenderam artes de magia e voltaram para vingar o nom e do amigo.
Capazes agora de provocar fogo espontâneo, com eçaram a incendiar as
casas dos ofensores. A situação tornava-se m ais grave q u an d o ao fogo
se associavam os vendavais, au m en tan d o o núm ero de casas destruídas.
Atemorizados e desejosos de apaziguar o furor de Xangô, os cidadãos de
Qyç> m udaram a expressão Çba so! O rei se enforcou! para Çba koso!
O rei não se enforcou!

69
Seus sím bolos são: uma gamela contendo machados com uns e de
pedra, cham ados çdun ara (pedras de raio), considerados os instrum entos
de punição; irúkçrç (cauda de animal que, após preparo artesanal e mágico,
é carregada por sacerdotes e reis com o sinal de realeza e poder); búzios. Em
suas roupas e colares utiliza-se o vermelho e o branco.
Somente os bàbá-mçgbá, sacerdotes de Xangó, ou as iyá-Sàngó, suas
sacerdotisas, podem responsabilizar-se pelos ritos fúnebres realizados para as
vítimas de raio. As punições de Xangô são consideradas nobres e as mortes
por raio não devem ser lamentadas. Sendo a casa atingida por um raio, seus
moradores-scafastam delatem porarianiente, cedendo lugar àüsbãbá-mçgbá_
para que ali realizem os rituais necessários.

Òsányin - Ossaim
As plantas, imprescindíveis à vida e ao culto aos orixás, são utilizadas'
como recurso litúrgico, mágico e medicinal. Ossaim, guardião do axé da
flora e seu patrono, detém a força de preservação do axé do m undo vegetal
e torna efetivo seu poder dc ação. Daí a necessidade de evocá-lo sem pre que
se colhem plantas. Narra o mito que Ossaim perdeu um a perna durante
uma disputa com Exulü.
É curandeiro m uito ágil na solução de problem as e no alívio de so­
frimentos. Seus sacerdotes, os çlçsányin, utilizam as forças do reino vegetal
- folhas, flores, frutos, sementes, raízes e cascas de árvores - e tornam -se
grandes praticantes de magia. Alguns desses sacerdotes recebem um a ini­
ciação especial e diferenciada, que os torna aptos a vivificar um a estátua de
Ossaim, de m odo que ela possa falar. O u seja, para conseguirem que o orixá
se expresse verbalm ente, utilizam um a estátua esculpida na m adeira de um a
árvore sagrada, própria para esta finalidade. Depois de esculpida, a estátua
é sacralizada e passa a integrar o assentam ento de Ossaim. Será usada como
recurso divinatório. D urante a consulta oracular o çlçsányin dialoga com
essa estátua: utilizando palavras rituais e o som do sèkèrè, o sacerdote in­
voca Ossaim, que responde como se estivesse assobiando. Em bora todos os
presentes ouçam o som em itido pela estátua, a linguagem é com preendida
apenas pelo çlçsányin que fez a invocação.
Os iniciados em Ossaim adquirem poder para m anipular folhas. Toda
pessoa que lida com o reino vegetal, independentem ente de scr iniciada ou
não, perm anece em contato com este orixá.

10 Essa narrativa mítica se encontra no odu Òtzúndá-Mcji, apresentado nos capítulos 10 - M itos dc Exu
nos odus dc ifá (iorubá) e 11 - M itos dc Exu nos odus dc Ifá (português).

70
í

Um de seus orikis diz:

Aldsç Ewé Òsányin!


Nibo ni Qrúnmilà nlo ti kò mú Esú dáni?
J\ribo ni Òrúnmilà nlo ti kò m ú Qsányin dáni?
Qmo ano n in sc òògún.

O portador do axé das folhas, Ossaim!


Para onde vai O runm ilá que não leve consigo Exu?
__Para onde vai O runm ilá que não leve consigo Ossaim ?
É o filho do awo, que pratica medicina e magia.

Seus principais símbolos são: çpa (bastão com dezesseis pássaros,


forjado em metal); sèkèrç (maracá); e <7dó (pequena cabaça utilizada para a
conservação de pós de uso mágico e medicinal).

È süniàrc- Exum arê


Exumarê é um sábio relacionado à estética e às ações de defesa pessoal.
Favorece a comunicação entre orun e aiye e a comunicação dos hom ens entre
si e destes com a natureza. Favorece as transform ações, pois confere poderes
mágicos a seus iniciados.
Seus metais são o ferro e o latão. Seu principal símbolo são as serpentes
forjadas nesses metais. Também é simbolizado por esculturas em m adeira que
representam uma figura hum ana rodeada por serpente(s). O utros símbolos
são búzios; cabaças; obi; orobô; çíun (potente e sagrado cal natural); osún
(espécie de tintura vermelha de uso ritualístico); çta (pedra de assentamento);
irúkçrç (cauda de animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada
por sacerdotes e reis com o sinal de realeza e poder). As cores de Exumarê
são o verde e o amarelo.

O r i- O ri"
Ori, a essência real do ser, divindade pessoal, guia e ajuda a pessoa
desde antes do nascimento, durante toda a vida e após a m orte. O sentido
literal de ori é cabcça física; e esta é o símbolo m áxim o dc ori inú, a cabeça

Como grafar em português a palavra ori? Deve iniciar com vogal maiúscula ou minúscula? O leitor
observará que cm alguns contextos o vocábulo ori designa cabcça física, cm outros contextos designa
a divindade pessoal e, cm outros contextos ainda, designa sim ultaneam ente essas duas instâncias do
ser. Convencionamos grafar sempre com a vogal inicial (o) em minúscula. Mais inform ações sobre ori
encontram-se 110 capítulo 1 - Noção iorubá dc pessoa c práticas mágico-mcdicinais.

71
interior. Deus é chamado, também, de Orisç, Fonte de origem dos oris. O
ori, entidade parcialm ente independente e considerada um a divindade por si
própria, é cultuado entre outras divindades, recebendo oferendas e orações.
Q uando ori inú está bem , o hom em está cm boas condições.
Ori, enquanto divindade pessoal, é a mais interessada de todas pelo
bem -estar de seu devoto. Neste sentido, pode-se dizer que ori é a mais im ­
portante das divindades do panteão iorubá pois, seja qual for o em penho
de outras divindades em favorecer determ inada pessoa, todo e qualquer
progresso dependerá sempre do que for sancionado por ori. Se o ori não
simpatiza com a causa de uma pessoa, nada poderá ser feito por outra divin­
dade. Assim sendo, mesm o que Eledunm are ou os orixás queiram conceder
benefícios a um a determ inada pessoa, ela não será beneficiada caso o seu
ori não sancione esta graça.
Num poem a do corpus literário de Ifá aprendem os que:

Somente ori pode seguir seu devoto a qualquer parte sem retornar.
Sc tenho dinheiro renderei graças a m eu ori.
Se tenho crianças é a meu ori que devo render graças.
Por todas as boas coisas que tenho na terra deverei render
graças a meu ori.
Ori, eu o saúdo!
Você que não esquece seus devotos,
Que os abençoa mais rapidam ente que as outras divindades.
N enhum a divindade abençoa um hom em sem o consentim ento
de seu ori.
Ori, eu o saúdo.
Você que possibilita que as crianças nasçam vivas.
Aquele cujo sacrifício for aceito por seu ori deve exultar
im ensam ente.
Verdadeiramente, revelarei a ori todos os desejos de meu coração.
O ori de um hom em é seu sim patizante.
Meu ori! Salva-me!
Você é meu simpatizante!

Para m elhor com preensão de ori, vejam os os dois m itos apresen­


tados a seguir.
Oxalá e Àjàlá, divindades modeladoras dos oris, têm suas peculiaridades.
Àjàlá, em bora habilidoso, não é m uito responsável e, por isso, muitas vezes
modela cabeças defeituosas: pode esquecer de colocar alguns acabamentos

72
ou detalhes necessários, assim como pode, ao levá-las ao forno para queimar,
deixá-las por tempo demasiado ou insuficiente. Tais cabeças tornam -se po­
tencialmente fracas, incapazes de em preender a longa jornada para a terra sem
prejuízos. Se, desafortunadamente, um hom em escolhe um a dessas cabeças
mal modeladas, estará destinado a fracassar na vida. D urante sua jornada para
a terra a cabeça que permaneceu por tem po insuficiente - ou demasiado - no
forno poderá não resistira ação de um a chuva forte e chegará mais danificada
ainda. Todo o esforço empreendido para obter sucesso na vida terrena terá
grande parte de seus frutos desviada para reparar tais estragos. Se, ao con­
trário, um homem tem a sorte de escolher um a das cabeças realmente boas,
tornar-se-á próspero e bem-sucedido na terra, uma vez que sua cabeça chega
intacta c seus esforços redundam em construção real de tudo aquilo que se
proponha a realizar. O trabalho árduo trará, ao hom em afortunado em sua
escolha, excelentes resultados, já que nada é necessário despender para reparar
a própria cabeça. Assim, para usufruir o sucesso potencial que a escolha de um
bom ori acarreta, o homem deve trabalhar arduamente. Entretanto, aqueles
que escolheram um mau ori, têm poucas esperanças de progresso, ainda que
realizem grandes esforços durante o tem po todo.
Outro mito narra que, ao atravessar o portal que conduz do céu à
terra, Onibodc Çrun, o Guardião do Céu, pede ao hom em que declare seu
destino. Este é então selado e, embora a lembrança disso se apague no homem,
ori retém integralmente a m em ória de tudo. Baseado nesse conhecim ento,
guia seus passos na terra. O runm ilá, a única testem unha desse encontro,
conhece todos os destinos e procura ajudar os hom ens a trilharem seus
verdadeiros caminhos. Nos m om entos de crise a consulta ao oráculo dc Ifá
permite acesso a instruções relativas aos procedim entos desejáveis, sendo
considerados bons procedim entos os que não entram em desacordo com
os propósitos de ori.
Os símbolos de Ori são: a cabeça; çta (pedra de assentamento); irúkçrç
(cauda de animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada por
sacerdotes e reis como sinal de realeza e poder); e búzios.

Nana B ürúkú- Nanã B uruku


Entre os ewe e os fon da República do Benin (Daom é) o Ser Supremo
é conhecido como Nana Bürúkü. Adotada pelos çgbá com o nom e Bürúkú,
veio a ser cultuada como divindade entre os iorubás. Em ewe e fon a expres­
são Nana Bürúkü é formada por Nana, velho ou antigo, e Bürúkú, o nom e
de Deus: desta maneira, a expressão Nana Búrúkú significa Deus Antigo.

73
O utra interpretação possível para o nom e Nana fundam enta-se no fato de
na, com raiz proto-sudânica ocidental, significar mãe.
A divindade foi levada para Abçòkúta, capital do estado de Ògún,
pelos sabe, um povo vizinho, mais especificamente por um a m ulher escrava.
Nanã é considerada m uito poderosa por ser filha do próprio Scr Supremo.
Por esta razão é cham ada tam bém de Omolú, palavra com posta de çmç,
filho, e Olúwa, Deus, com pondo o significado Filha de Deus. É interessante
assinalar que no Brasil Om olu e Obaluaiê são considerados com o sendo a
mesma divindade, masculina, enquanto Nanã Buruku é considerada um a
divindade feminina._________________________________________________
Tanto os ewe com o os çgbá a consideram um ser andrógino. E n­
tre os iorubás, o aspecto m asculino é cham ado Buruku, e o fem inino,
O m olu. C ultuada principalm ente p or m ulheres, suas formas ritualísticas
são sem elhantes às adotadas pelos ewe e pelos fon cm seus cultos a N anã
B uruku.
Divindade m uito exigente no que diz respeito à disciplina, é cultuada
para evitar misérias e adversidades e para alcançar poder. Na África somente
têm acesso a seu espaço sagrado aqueles que já passaram por todos os está­
gios de iniciação.
Nos festivais anuais as imagens esculpidas em madeira são retiradas
do espaço sagrado c carregadas em procissão. As mulheres que as carregam
permanecem o tem po todo em silêncio. Embora as imagens sejam m uito
pesadas, o axé de O m olu as torna leves o suficiente para que possam scr
carregadas sem esforço.
Seus símbolos são: o edan (imagem de metal contendo um casal); o
ibiri. que Nana carrega na mão direita e que simboliza o suceder das gerações;
imagens esculpidas em madeira, com distintos formatos, algumas represen­
tando homens, outras representando divindades, outras ainda representando
mulheres grávidas ou carregando bebês às costas, ou ainda, oferecendo o
seio ao filho. Também são seus símbolos o çta (pedra de assentamento); o
iríikçrç (cauda de animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada
por sacerdotes e reis como sinal de realeza e poder) e búzios.
Nanã Buruku simboliza a possibilidade de restituição, ou seja, de
surgim ento de novas vidas a partir das mortes. Precisa ser constantem ente
ressarcida para poder gerar novas vidas. Novos nascimentos som ente se tor­
nam possíveis porque Nanã recebe os m ortos em seu seio. A terra, igbá-níá,
a grande cabaça, recebe os corpos m ortos que lhe restituem a capacidade
genitora e tornam possíveis os novos nascimentos. Assim, todo nascim ento
e todo renascimento estão relacionados aos ancestrais. A restituição e o

, -”"74 •
renascimento estabelecem e preservam as relações entre orun e aiye, sendc
os ancestrais que garantem a continuidade da vida no aiye.

Yenioja - Iem anjá


Ycmçja, palavra constituída de Yc, mãe, orno, filho e çja, peixe, sig­
nifica Mãe dos fílhos-peixes. Relacionada ao poder genitor e à gestação, í
chamada A woyo, Elegante e Bela, Agradável aos olhos.
Iemanjá, Senhora de todas as águas, é associada à fertilidade e à pro-
criação. A bençoa os seus devotos con ced en d o-lh es fertilidade, lon gevid ad e
prosperidade, paciêneia-e-m otivação para lutar p ehrvidtn----------------
Um de seus orikis diz:

Diante da casa da Senhora dos barcos brota a prosperidade.


No quintal da Senhora dos barcos brotam pérolas.
Iemanjá de seios fartos, nós somos os filhos das águas.

Em alguns mitos Iemanjá é apresentada como mulher de Qrànmíyàn,


descendente de Oduduwa, fundador mítico dc Qyç> e de quem ela teria conce­
bido Xangó. É considerada mãe de muitos orixás, entre os quais Ogum c Oxum.
Vejamos uma narrativa mítica que a descreve como mãe de Oxum:
Não conseguindo engravidar, Iemanjá consultou O runm ilá, de quem
recebeu a recomendação de dirigir-se ao rio próxim o a sua casa antes do
alvorecer, a cada cinco dias, levando oferendas c carregando sobre a cabeça
um pote pintado de branco. Sempre acompanhada por um grupo de crian­
ças, ia para o rio cantando com elas em coro. As oferendas incluíam cgbo
(canjica branca), yanrín (serralha), ckuni (inham e cozido e am assado com
dendê), ç;À'ç)(mingau de milho branco), obi eorobô. Chegando ao rio enchia
o pote de água e retornava, sempre acompanhada pelo coro infantil. A água,
reservada num pote cham ado awé, servia para ser bebida no intervalo entre
as caminhadas e para banhos.
Após repetir esse ritual durante muito e m uito tem po, Iemanjá fi­
nalmente engravidou. Não interrom peu as práticas rituais, que foram se
tornando cada vez mais penosas à medida que a gestação progredia. Certa
manhã, logo depois de entregar as oferendas, sentiu um a dor forte e pediu
às crianças que se afastassem. Ajoelhou e logo ouviu o choro do bebê: nas­
cera Oxum! Cham ou as crianças e pediu a uma delas que levasse a notícia a
Orunm ilá que, m uito feliz, enviou um mensageiro para saudá-la.
Seu metal é a prata. Seus símbolos incluem o mar, as embarcações, o
coral, as conchas e estrelas do mar, os fósseis m arinhos; çta (pedra de assen-
tam ento); irúkçrç (cauda de anim al que, após preparo artesanal e mágico, é
carregada por sacerdotes e reis com o sinal de realeza e poder); búzios. Suas
cores são o branco e todas as tonalidades de azul. Seus colares são feitos de
contas brancas transparentes e azuis, em diferentes tons.

O s u n - O xum
Oxum é a Senhora dos rios, dos metais nobres, da fertilidade, da
prosperidade, da sensualidade, da sexualidade e do amor. M ulheres louvam
a fertilidade trazida por Oxum repetindo: Yèyé ò, ycyé ò, yèyé ò! Oh, gra­
ciosa Mãe, oh, graciosa Mãe, oh, graciosa Mãe! Alguns m itos referem-se
a ela com o Qsun Òsogbo, Oxum da cidade de Òsogbo, outros enfatizam
sua proxim idade com Logunedé, ora apresentado com o filho, ora com o
mensageiro dela, havendo tão estreita relação entre am bos que chegam a ser
considerados complementares. O utros mitos, ainda, se referem a ela com o
esposa de Ifá. E aqueles que a apresentam com o esposa de Xangô narram
que, ao tom ar conhecim ento da m orte do marido, desesperada, transfor-
mou-se num rio.
Essa Iyámi À kçkç, Mãe Ancestral Suprema, é bastante cultuada em
Òsogbo, sendo tam bém considerada a divindade protetora de Abçòkúta.
Seus devotos frequentem ente dedicam -lhe um córrego ou rio, cham ando-o
de odò Qsun ou rio de Oxum, ao lado do qual colocam um lugar de culto.
C ham ada de Mãe das crianças, zela pela fertilidade e pela prosperidade
de hom ens e mulheres. Oferece proteção contra acontecim entos adversos,
sendo invocada nas mais distintas circunstâncias, pois não há o que não
possa fazer para ajudar.
Vejamos alguns de seus orikis:

Oxum , Senhora das águas que fluem suavemente.


Oxum , graciosa mãe, plena de sabedoria!
Que enfeita seus filhos com bronze.
Que fica m uito tem po no fundo das águas gerando riquezas.
Que se recolhe ao rio para cuidar das crianças.
Que cava e cava a areia e nela enterra dinheiro.
M ulher poderosa que não pode ser atacada.

Com o vimos, há um m ito de Iemanjá que narra o nascim ento de


Oxum. D ando continuidade a essa narrativa, tem os que no terceiro dia
de vida o um bigo de O xum com eçou a sangrar e, a despeito dos cuidados
de Iemanjá, o sangue não estancava. Ifá foi consultado e m anifestou-se o

76
odu Òsç Orógbò:

A que possui um a gamela onde guarda dinheiro.


Graciosa mãe, dona de m uitos conhecimentos,
Que enfeita seus filhos com bronze.

Ifá aconselhou a realização de novos rituais, que incluíam um àgbo


tútu (banho frio). Por isso, crianças nascidas graças à ajuda de O xum são
chamadas olomi tútú (aquele que usa água fria) e devem banhar-se com
água fria. Quando Oxum estava apenas com seis dias de vida, ainda insegura
quanto à saúde da filha, Iemanjá pediu ajuda a Ogum; ele adentrou a mata
e, com a ajuda de Ossaim, apanhou folhas de yanrín e pim entas verdes e as
colocou inteiras num pote. Q uando a saúde da criança se estabilizou seu
nome foi revelado por Ogum: Qsç-n 'ibu omi, que significa Qsé nas profun­
dezas das águas.
Outro mito narra que no tem po da criação, quando O xum estava
vindo do orun, Eledunmare confiou-lhe o poder de zelar por cada um a das
crianças que nasceriam na terra. Oxum seria a provedora de crianças. Ela
deveria fazer com que as crianças permanecessem no ventre de suas mães,
assegurando-lhes m edicam entos e tratam entos apropriados para evitar
abortos e contratem pos antes do nascimento. Não deveria encolerizar-se
com ninguém para não cometer a injustiça dc recusar crianças a inimigos e
concedê-las apenas a amigos. Foi a prim eira Iyami Oxorongá encarregada
de ser Olútçjú àwçn omo. A que vela por todas as crianças, e Aláwóyè
çmç, A que cura crianças. Todo ano, por ocasião do festival realizado cm
sua homenagem, mulheres estéreis tom am água de seu santuário esperando
retornar no ano seguinte com os filhos por ela concedidos, para agradecer
a graça alcançada.
Seus símbolos são as tornozeleiras, os braceletes, diversos objetos de
bronze, ouro, latão e outros metais dourados, entre os quais se incluem a
espada, o leque, o pente e o espelho. São seus símbolos, ainda, çta (pedra
de assentamento); irúkçrç (cauda de animal que, após preparo artesanal e
mágico, é carregada por sacerdotes e reis como sinal de realeza e poder); b ú ­
zios; moedas;pèrègún; osún (espécie de tintura vermelha de uso ritualístico);
tecido branco; e estatuetas representando uma m ulher de cabelos trançados,
segurando um bebê ou am am entando. Sua cor é o am arelo e seus colares
são confeccionados com contas transparentes de cor âmbar, am arelo ouro,
amarelo claro e marfim. É com um encontrarm os os símbolos de Logunedé
associados aos de Oxum.

77
Oya - O yá (Iansã)
Oyá, orixá ágil, Senhora dos ventos e tem pestades, é parceira de
Xangô, Senhor dos raios, relâmpagos e trovões. Fortes ventos e tem pestades
são considerados expressões de seu descontentam ento.
Alguns de seus orikis dizem:

Oya Orírii, Çkún tí njç eu ó ata!

Oyá, tão linda, que não se consegue tirar os olhos de cima dela.
______ Leopardo-fêm ea-quexom e-pm ientacrua.--------------------- ----------------
Ela é grande o bastante para carregar o búfalo pelos chifres.
M ulher guerreira, m ulher caçadora.
Vendaval da Morte.
Q uando anda, sua vitalidade é com o a do cavalo que trota.
Eepa, Oyá, que tem nove filhos, eu te saúdo!
Oyá, orixá que apóia seu marido.
M ulher poderosa e forte que possui corpo perfeito.
Oyá, a charm osa e elegante, a m ulher bela.
O Grande Vendaval, que tam bém venta suavemente.

Vejamos alguns de seus mitos:


Oyá está associada à origem m ítica do rio Niger (odò Qya). Um odu
dc Ifá narra essa origem. Em tem pos de guerra, o rei nupe consultou o o rá­
culo para saber com o prevenir-se contra um a invasão. Ifá disse a ele que,
caso encurralado, oferecesse uma peça de tecido negro para ser rasgado por
uma virgem. Entre as virgens o rei elegeu sua p ró p ria filha. D iante do
pai, dos oráculos e dos chefes de guerra, a jovem rasgou o tecido negro:
O ya (Ela cortou). Em seguida, lançou ao chão as duas partes de tecido, sob
o olhar esperançoso do povo nupe. Os pedaços de pano transform aram -se
em negras águas que começaram a fluir, transform ando o núcleo do reino
num a ilha protegida.
O utro m ito n arra que Oyá era esposa de Ogum e lutava lado a lado
com o m arido, usando espadas forjadas por ele. Um dia, Xangô, elegante
e atraente, chegou à forja de Ogum . Envolveu-se em am ores com Oyá e,
ao surgir um a oportunidade, fugiram juntos enquanto Ogum estava co m ­
penetrado em seu trabalho. Mais tarde, ao dar-se conta do ocorrido, este
procurou a esposa por toda parte e term inou por encontrá-la na floresta.
G olpearam -se m utuam ente com as espadas, sendo O gum partido em sete,
e Oyá em nove partes. C onform e Sàlámi (1990, p. 61), “havia dezesse
rainhas rivais, com petindo pelo privilégio de ter a preferência de Xang'
Oyá foi a vitoriosa, graças a seu charm e, personalidade e elegância c
movimentos”.
Outro mito, ainda, a descreve como tendo nascido em Iwó. Essa versã
a apresenta como um a m ulher que vivia triste por não conseguir casament
e que, após peram bular pelas cidades a esmo, foi encontrada por sua famil:
em Irá. No retorno para casa encontraram Xangô acom panhado de Oxun
uma de suas esposas. Assim que ele viu Oyá, quis casar-se com ela e foi aceit
imediatamente.-Ela-veio a ser-sua-esposa predileta:—Entre os dezesseis orixí
femininos nas mãos de Xangô, Oyá se destacou por sua beleza, elegância
força” (SÀLÁMl, 1990, p. 62).
Seus símbolos são espadas; chifres de búfalo; pedras originárias d
rio Oyá; potes de barro; çta (pedra de assentam ento); irúkçrç (cauda d
animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada por sacerdotes
reis como sinal de realeza e poder); e búzios. Seus colares são feitos de conta
de cor marrom.

Obà —Obá
Essa iaba é calma, complacente, tolerante, dedicada, bondosa, generos
e maternal. Está intim am ente relacionada às Iyami Oxorongá e é dedicada
aspectos da estética feminina.
Narra o mito que, entre as esposas de Xangó, Obá ocupava o últimi
posto. Inferiorizada em relação às demais por julgar-se incom petente par
cozinhar e para trajar-se com elegância, de natureza delicada e dócil, po
demais condescendente, tolerava m uitas coisas que a desagradavam . Fo
a primeira esposa a abandoná-lo quando ele ficou desesperado p o r have
destruído com magia seus bens e parte de seu povo. Ao deixar a casa, sen
saber para onde ir, nem o que fazer, pós-se a chorar am argam ente, desfazen
do-se em lágrimas até transform ar-se por com pleto num rio, o odò Obà. C
grande estrondo verificado na confluência dos rios Oxum e Obá é atribuídc
à rivalidade entre ambas.
Seus metais são o ouro e o ferro. Seus símbolos são: rios; embarcações
çta (pedra de assentamento); irúkçrç (cauda de animal que, após prepan
artesanal e mágico, é carregada por sacerdotes e reis com o sinal de realez;
e poder); e búzios. Suas cores são o branco c o m ulticolorido. Seus colare.
são multicoloridos e suas pulseiras são de ouro e outros metais dourados
como o latão, por exemplo.

79
Ajé—Ajè
Ajé é o orixá do desenvolvimento, da prosperidade, do reconhecimento
dos esforços e do progresso econômico. Favorece o uso sábio e prudente
do dinheiro e da sorte e defende seus devotos da inveja e de outras forças
que possam im pedir seu desenvolvimento econômico como, por exemplo,
forças associadas a dinheiro advindo de pagamentos feitos com raiva ou
dc má vontade. Seus iniciados geralm ente são filhos tam bém de Iemanjá,
OlOktm e Oxum. Detendo o poder de tornar reconhecidos os feitos dos
orixás, é cultuada tam bém por eles. Por ser representante do dinheiro e do
sucesso, sempre teve que confrontar-se com os demais orixás para preservar
o próprio poder, am bicionado por todos.
A palavra .4/cpode ser traduzida com o Progresso para você, Succsso
para você e Que aquilo que você espera dc seu trabalho se concretize. A jé
Ògúgúlúsç significa Ajc, Senhora da morada da sorte c das realizações do
homem: A jé Saluga significa Ajé, Senhora do paraíso da riqueza.
Paciente, próspera, fértil, longeva, sábia, harmoniosa, generosa, to­
lerante, justa, protetora da riqueza do hom em em todos os sentidos, atrai
dinheiro, conform e podem os ver no seguinte oriki:

Iré wçlé wá!


A jé kóre dé.
Olórí Eni màmà ní.
A jé wçlé dé!
Iré wçlé bç.
Olówó ori eni màmà ni.

Q ue o bem e a prosperidade entrem em nosso lar!


Ajé chegou com a sorte.
Ela é senhora do nosso ori.
Ajé, entre em m inha casa!
Para que a sorte entre logo no m eu lar e na m inha vida.
Ela é a Senhora da Prosperidade que reina em minha vida.

Segundo alguns mitos, Ajé é filha de Iemanjá com OlOkün, senhores


do mar. Criada por Eledunmare para dar ao homem a noção de prosperidade,
progresso e uso adequado do dinheiro, a ela compete transmitir-ensinamentos
sobre isto e o próprio poder econômico.
Num a narrativa mítica encontram os Ifá e Exu cam inhando com Ajé
em busca de um lugar para ela. Nessa cam inhada chegam a um a cidade cm

80
guerra. Porém, como cra noite, tudo parecia calmo. Ifá perguntou a Ajé:
“Você vai permanecer com sua prosperidade aqui?” E ela respondeu: “Não
sei” Dirigiram-se ao rei da cidade e Exu discorreu sobre os poderes de Ajê e,
cm seguida, perguntou-lhe se ele gostaria de recebê-la com sua prosperidade.
O rei disse que sim, pois desejava a vitória na guerra. Ajê perguntou a Exu:
“Isso está certo, amigo Exu?” E ele respondeu: “Não, Ajé, eles não merecem
o progresso!”
Os três amigos continuaram andando e chegaram a um a segunda
cidade. Foram falar com o rei e Exu apresentou-lhe os poderes de Ajé, per-
guntando-lhe se gostaria de recebê-la com sua prosperidade. O rei respon­
deu que sim, pois desse m odo ninguém mais precisaria trabalhar. Ajê então
perguntou a Exu: “Isso está certo, amigo Exu?” E ele respondeu: “Não, Ajê,
eles não merecem o progresso!”
Os três amigos continuaram andando e chegaram a um a terceira
cidade. Forvn falar com o rei e Exu apresentou-lhe os poderes de Ajê e
perguntou se gostaria de recebê-la com sua prosperidade. O rei respondeu
que sim, pois desse modo o seu povo não precisaria mais guerrear e todos
poderiam alcançar progresso econôm ico e, com isso, obteriam tam bém o
reconhecimento dos outros povos. Ajê perguntou a Exu: “ Isso está certo,
amigo Exu?” E ele respondeu: “Não, Ajê, eles não merecem o progresso!”
Ajé acha-se associada ao poder de trabalho e à prosperidade que se pode
conquistar através de esforços no trabalho.
Os três orixás partiram e cam inharam até encontrar um a quarta
cidade. Procuraram o rei e Exu lhe apresentou os poderes de Ajê, pergun­
tando-lhe se gostaria de recebê-la com sua prosperidade. O rei disse que sim,
pois poderia com partilhar essa prosperidade com os demais e, além disso,
ele e seu povo se em penhariam bastante e com trabalho intenso para que a
cidade se tornasse conhecida pelo progresso conquistado. Exu então disse:
“Ajé, aqui é um bom lugar para você!”
São relacionados a Ajê todos os metais nobres. Seus sím bolos são
çta (pedra de assentamento); irúkçrç (cauda de animal que, após preparo
artesanal e mágico, é carregada por sacerdotes e reis com o sinal de realeza
e poder); ajé (conchas do mar); búzios; estrelas do mar; cabaças; c algodão.
Sua cor é o branco e seus colares e pulseiras são feitos de conchas pequenas
e búzios.

E r in lè - Erinlé
Essa iabá estabelece estreita relação com as Iyami Oxorongá e, através
do poder das Mães, atua com o o orixá fem inino da caça, da m edicina, da

81
magia e da sabedoria. Inclui-se entre os prim eiros aprendizes de Ogum nas
artes da caça e da guerra, sendo por isso guardiã dos caçadores. É orixá da
fertilidade. Possui intuição e percepção aguçadas e capacidade estratégica.
Protege os hum ilhados e injustiçados e é cultuada para atrair agilidade. Traz
sorte nos negócios e em assuntos relativos a dinheiro. Zela por assuntos
familiares. Aprecia a vida ao ar livre, ama a mata, conhece as propriedades
dos seres que ali vivem e é cultuada juntam ente com Ossaim.
Seus sím bolos são: çta (pedra de assentam ento); irúkçrç (cauda
de anim al que, após preparo artesanal e mágico, é carregada p o r sacer­
dotes e reis com o sinal de realeza e poder); ciúwcrç (in s tru m e n to riiiiaL
sem elhante ao irúkçrç , feito de couro e, p o r vezes, enfeitado com búzios
ou m içangas); búzios; çpa (bastão com dezesseis pássaros, forjado em
m etal); o sèkçrè (m aracá); e o àdó (pequena cabaça utilizada para a
conservação de pós de uso m ágico e m edicinal). Seu m etal é o ferro e
sua preferência são as roupas m ulticoloridas. as pulseilas dc prata ou as
confeccionadas com búzios e couro e os colares, tam bém confeccionados
com búzios e couro.
Suas festas, realizadas nos tem plos e rios a ela dedicados, iniciam
ju n tam en te com o ritual de Çlà (festa da prim eira colheita de inham e no
ano). O rito padrão de abertura é seguido de ritos de oferenda. Depois
de alguns dias os devotos retornam em cortejo ao rio, sem pre cantando
e dançando, cada um deles carregando a estátua de Erinlé d en tro de um a
cabaça grande e, ali chegando, veneram o rio e realizam novas oferendas.
Retornam depois para suas casas, sem pre cantando e dançando, e a festa
prossegue por vários dias.

Ewa—Ewá
Ewa ou Yewa, a Mãe que sempre existirá, M ãe Eterna , é um a
iabá fortem ente relacionada às Iyami Oxorongá. Guerreira, relacionada ao
fogo, detentora de poderes mágicos de cura e transform ação, é maternal
e acolhedora. Atenta ao sofrim ento hum ano, visa transform ar dores cm
alegrias. Aprecia atividades m anuais, sendo dotada de criatividade e senso
estético.
Seus símbolos são: çta (pedra de assentam ento); irúkçrè (cauda de
anim al que, após preparo artesanal e mágico, é carregada por sacerdotes e
reis com o sinal de realeza e poder); osún (espécie de tintura vermelha de uso
ritualístico); ikódidç (pena vermelha da cauda do pássaro ôdidç)\ búzios.
Tem preferência por roupas m ulticoloridas e seu colar é verde, am arelo e
m arrom .

82
Aráagbó, Egbé Aráagbó - E spíritos A m igos
Para melhor com preender o orixá Aráagbó convém retom ar os sic
nificados de ábikú e dc egbç.

Sobre os abikus
Episódios de aborto e m orte prematura de crianças, jovens e adultos pc
dem ser interpretados como resultantes da ação de ábikú, também chamado enn
ré, espíritos pertencentes à Egbç-Abíkú (Egbé Abiku ou Sociedade Abiku).
A palavra ábikú, com posta de a, bie Aw (nascido para m orrer) ou d
-rrb/-ó-A'ií(o-p;irimüse-ele m orreu), designa criançasoujovens q u em o rrer
antes de atingir a idade adulta, adultos que m orrem antes dos pais e adultc
que morrem antes dc com pletar seu ciclo existencial. Há dois tipos dc abi
kus: os àbikú-çmçdé, que m orrem ainda na infância, e os ábikú-ágbá, qu
morrem jovens ou adultos. Considera-se que os abikus estabelecem çjç o.
com a Egbé Abiku, ou seja, estabelecem um pacto de retornarem ao oru
ao atingirem determ inada idade.
Quando uma m ulher sofre sucessivas perdas de filhos, que m orrer
antes de nascer ou durante a infância, suspeita-se da ação de àbikú-çmçdt
Os episódios de perda de filhos, neste caso, são interrom pidos som ente s
forem tomadas providências para o rom pim ento do vínculo desses sere
espirituais com a com unidade à qual pertencem no orun.
Quanto aos ábikú-ágbá, o pacto por eles estabelecido com a sua socie
dade espiritual determ ina que o retorno ao orun ocorra em um moment<
muito significativo e im portante da vida: em um m om ento crítico, nun
período de sucesso como, por exemplo, em data próxim a à form atura, a<
casamento, ao nascimento de um filho desejado ou à realização de algum
conquista social notável.
Algumas manifestações possíveis dc um abiku são as seguintes: tei
mosia, processos de autodestruição - drogadicção, alcoolismo, depressãc
atração por atividades que expõem a riscos de vida —e episódios freqüente
de adoecimento. Os abikus costum am ser m uito intuitivos e dotados d
sensibilidade a fenômenos do m undo espiritual.

Sobre Egbé
Egbç (Egbé ou Sociedade) é a com unidade espiritual à qual pertenceu
os abikus no orun. É constituída de Egbç Aiyé, a Sociedade dc amigos d
mundo visível, e de Egbç Çrun, a Sociedade de amigos do mundo invisivt
ou Amigos Espirituais. Com o esses m undos são intim am ente relacionadoí
eles exercem influência m útua. Decorre disso o seguinte: para que um

83
pessoa possa viver feliz no aiye é preciso que esteja em harm onia com seus
amigos espirituais do orun.
A solução básica do problem a dos abikus implica em libertá-lo dos
compromissos para com esta sociedade. De fato, implica em tornar deter­
minado abiku indesejável para o seu grupo de pertença, de m odo que seus
pares no orun não queiram mais que retorne ao m undo espiritual na data
prevista para isso. Sendo os abikus poderosos, é preciso m uito conhecim ento
por parte dos sacerdotes que se propõem a lidar com eles. Alguns recursos são
utilizados para evitar a m orte de um filho abiku e para desligar este espírito
da sociedade à qual pertence. Através de rituais é estabelecido um jogo de
forças entre Egbé Aragbô e Egbé Abiku - forças de retenção do ser no aiye e
forças de resgate do ser no orun. Os cultos e as oferendas realizados para Egbé
Abiku com a finalidade de reter um abiku no aiye visam fazer com que os
mem bros desta sociedade percam o interesse p or ele. Sim ultaneam ente, são
realizados cultos c oferendas para Aráagbó , ou Èré igbó , para que os proteja
de serem reconduzidos à com panhia de seus pares no orun. Egbé atua com
Exu, dada a necessidade de m anter o equilíbrio entre aiye e orun.
Uma vez realizados esses esclarecim entos, vejam os o orixá Egbé
Aragbô.

Òrisà Egbé Aráagbó


Egbç significa, literalm ente, sociedade. Designa a Sociedade dos
Espíritos Amigos ou dos Amigos Espirituais e se refere, sim ultaneam ente, a
um orixá e a um a corporação de seres espirituais que vivem no orun,'num
âm bito paralelo ao físico. Os iorubás referem-se a^efuas sociedades que se
desenvolvem em paralelo - um egbé no orun e um egbé no aiye. E im por­
tante assinalar que há um a forte relação de m útua influência entre essas
duas sociedades, que se desenvolvem em paralelo. De tal m odo que todas
as ocorrências da vida hum ana podem ser m elhor com preendidas a partir
desse conhecimento, pois tudo o que ocorre no plano das relações hum anas
e todas as conquistas realizadas no plano do egbé no aiye possuem seu duplo
no plano do egbé no orun.
Èré igbó ou Aráagbó significa Habitante da floresta ou Habitante
do além. Este orixá, conform e assinalado anteriorm ente, protege da m orte
prem atura e acalma o sofrim ento material e espiritual de seus devotos.
Orienta o ori do abiku e dos demais devotos de m odo a criar condições para
as conquistas, dom ina recursos para promover cura e.bem-estar, interfere no
destino hum ano, removendo obstáculos da vida das pessoas, atrai progresso
econômico e desenvolvimento espiritual, harm oniza a vida m aterial com

84
a espiritual, proporciona fertilidade e sentim entos de paz, tranqüilidade,
serenidade e confiança. Transforma lágrimas em sorrisos.
Veiamos alguns excertos de cantigas de Egbé. Uma dessas cantigas diz:

Kçmç kó jçw ç.
Omç jòw ç!
Para que o filho faça um favor (de não m orrer).
Filho, por favor, ouça!

Outra cantiga diz:

Ikúyè. Ó lç ç . Qyçlç!
Àrún yç. Ò lç o. Qyçlç!
A m orte se desviou. Foi em bora. Vitória!
A m orte se desviou. Foi em bora. Vitória!

São símbolos de Egbé: çta (pedra de assentam ento); irúkçrç (cauda


de animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada p o r sacerdotes
e reis como sinal de realeza e poder); yangi , (pedra vulcânica, laterita,
símbolo de Exu); àtòri (vara sagrada); búzios; irókò (gam eleira branca,
árvore sagrada); bananeira; akòkò (árvore sagrada cujas folhas são usadas
na consagração de reis e em vários rituais de culto aos orixás); pèrègún
(dracena ou p a u -d ’água, planta sagrada de g ran d e v italidade); y è y é
(cajá-mirim, árvore sagrada). Sua preferência são as roupas e os colares
multicoloridos e suas pulseiras são feitas de m içangas de diversas cores
alternadas com búzios.
Anualmente são realizadas festas em sua hom enagem e, a intervalos
menores, são feitas oferendas, segundo orientação do próprio Egbé, obtida
através de jogo divinatório. Os sara - ofertas e com partilham ento alegre de
comida, bebida, música e dança - são realizados a intervalos regulares para
manter abikus no aiye e harm onizar suas relações com os Amigos Espirituais
do orun, bem com o para atrair todos os benefícios de Egbé.
Há uma relação im portante entre Egbé e Ibeji, orixá ligado à natureza
de modo geral e, de m odo particular, à floresta, m orada de Aragbô. Para
cultuar Ibeji é preciso cultuar tam bém Egbé.

I b é j i - Ibeji
Ibéji, palavra form ada a p artir de ibí (parir) e eji (dois), significa
■ Parir dois ou Gestação dupla, indicando, pois, o nascim ento de gêmeos. A

85
prim eira criança a nascer recebe o nom e de Táíwò , que significa Aquele que
vai conhecer a vida ou Primeiro a chegar: é a criança m ais nova, em bora
nasça prim eiro. A segunda criança a nascer recebe o nom e de Kéhindé, que
significa Segundo a chegar, é a criança mais velha, em bora nasça depois.
Isto é, a segunda criança a nascer é espiritualm ente m ais velha e, p o rtan to ,
hierarquicam ente superior à que nasceu antes dela. Se a m ãe dos gêm e­
os tiver outro parto, posteriorm ente a este, a terceira criança receberá o
nom e de Idòwúc, com o seu nom e indica, será considerada um elem ento
de equilíbrio das crianças ibeji.'2
--------- Ibeji-protege-da-morte-prematuraracnlma o sofrim cntoTnntcrial c x f
piritual de seus devotos, orienta o ori do abiku para que trilhe corretam ente
os seus caminhos, atrai progresso econôm ico e desenvolvim ento espiritual,
harm oniza os aspectos materiais e espirituais da existência, proporciona
sentim entos de paz, tranqüilidade, serenidade e confiança, favorece a fer­
tilidade e transform a lágrimas em sorrisos. É associado à duplicidade, por
exemplo, entre o existir e o não existir, o fazer e o não fazer. Ibeji é sedutor,
capaz de atrair condições para conquistas, dom ina recursos para prom over
cura e bem -estar, interfere no destino hum ano e remove obstáculos da vida
das pessoas, como denota este oriki:

Çkánlàwçn. igbcmjú, erclú çm ç nbã bí. nbá lã.


Criança nobre entre as demais, se tiver você, prosperarei.

E uma de suas cantigas traz o seguinte:

Omç méji ni Èjirç tó sp ilé a/ákisà di alásç.


Ejirç são duas crianças que fazem prosperar o lar do m al-suce-
dido.

Ibeji possui um a m anifestação dupla: através de sua própria sim bo-


logia e através de crianças gêmeas. Estas frequentem ente são m andadas para
a terra por Ibeji para aliviar o sofrim ento de um a família. O nascim ento de
gêmeos pode ser entendido pelos pais com o um a dificuldade. Porém , um
nascim ento duplo pode ser a possibilidade de superação de dificuldades,
dependendo do zelo que os pais tiverem para com os filhos. Convém que os
pais reverenciem os próprios filhos, considerados representantes da divinda-

i: No Brasil Ibeji é sincretizado com Cosm c c Damiuo, santos do panteão católico, sempre acom panhados
dc seu irmão menor, Doún, palavra que c corruptela de Idòw u(nom e atribuído pelos iorubás ao primeiro
filho nascido após um parto de gêmeos).

86
de Ibeji e, sim ultaneam ente, cultuem Ibeji para conservar a grande energ:
trazida para as suas vidas p o r ocasião do nascim ento destes filhos.
As pessoas adquirem determ inadas características ao cultuar Ibej
boa saúde, calma, alegria, jovialidade, sociabilidade, confiança, esperanç;
lealdade, comunicabilidade, versatilidade (tendência a abraçar diversas at
vidades ao mesmo tem po) e apreço por música e dança.
Quanto às próprias crianças ibeji (gêmeas), observa-se que, por maic
que seja sua semelhança física, têm expressivas diferenças quanto a seus or:
e destinos, sendo bastante com um haver disputa entre elas. Costum a ocorr<
que um dos irmãos-alcance suceas 0 „c_0 ,.0 uLr0-fracasse na-vida-e.-para-qu
esta diferença não chegue a extremos, é preciso equilibrar as energias dc
irmãos e cultuar Ibeji. Os macacos são considerados protetores dos gêmeo
conforme se vê no m ito apresentado a seguir.
Um velho sábio sem pre cultivava a terra e fazia, a m uito custo, su
plantação. Na época da colheita, entretanto, os macacos invadiam o camp
e comiam tudo. Por este motivo ele com eçou a m atá-los, mas sem pre havi
mais e mais macacos ali para com er tudo o que plantava. Além disso, sempr
que uma das esposas desse hom em engravidava a criança m orria. Perple»
com a presença de abiku em sua vida, o velho consultou um babalaô e soub
que seus problemas advinham do fato de ele m atar macacos. Foi aconselhadi
a fazer ebó e cultivar o cam po para proveito exclusivo dos anim ais. Acatoi
o conselho e, logo no prim eiro ano, teve filhos gêmeos que sobrevivcrair
Tornou-se muito feliz. Relacionou suas conquistas aos cuidados dedicado
aos macacos e esses anim ais passaram a ser considerados sagrados e prote
tores dos gêmeos.
Os símbolos de Ibeji são duas estátuas esculpidas em m adeira d
irókò- uma figura m asculina e outra feminina —representando gêmeo!
búzios; e a própria árvore irókò (gameleira branca, árvore sagrada) e su
madeira. As crianças gêmeas, consideradas um a representação física de Ibej
também são sagradas e, portanto, veneráveis.

Iró k ò - Iroko
Iroko é Olúwórc, o Senhor dos mistérios e da rapidez. Este orix
é representado pela árvore africana sagrada de mesmo nom e, irókò, ben
como pelas florestas e pelos parques e jardins. Tem por sím bolos o espaçc
o tempo, a terra, çta. irúkèrç (cauda de animal que, após preparo artesana
e mágico, é carregada por sacerdotes e reis como sinal de realeza e poder)
búzios. Iroko veste branco e seus colares são multicoloridos.

87
É cultuado para curar, preservar a paz, a harm onia social e a tra n ­
qüilidade e tam bém para obter fertilidade e poder espiritual e para atrair
e preservar o axé. Através do culto a Iroko pode-se hom enagear Aragbô,
Ossaim, Egungun, Gelcdé e Iyami Oxorongá, entre outros orixás. Favorece o
desenvolvimento do ori e da sensibilidade às energias sutis. O fato dc Iroko
favorecer o desenvolvimento do ori faz com que alivie estados de perturbação
mental e estimule firmeza e estabilidade pessoais, tornando a pessoa mais
forte e apta a enfrentar os desafios da vida. É cultuado em sinal de gratidão
à natureza, por tudo o que ela oferece ao hom em .
No Brasil, em lugar da árvore iroko se cultua a gameleira branca (FI-
CUS MÁXIMA, Moraceae; FICUS DOI.IARIA).

Igunnukó - Igunukô
Igunukô, protetor da agricultura, favorece o plantio e a colheita. Tra­
ta-se de um a força criadora e regeneradora. Integra os cultos a ancestrais
masculinos e femininos com a finalidade de m anter a conexão e a harm onia
com os antepassados, para que sua energia favoreça a boa colheita, a fertili­
dade, a cura, a prosperidade, a justiça nas relações e a paz social. Como nos
cultos a antepassados, o culto a Igunukô visa eliminar ou atenuar calamidades
públicas. Seus sím bolos são: potes de barro; tam bores; çta; irúkçrç (cauda
de animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada por sacerdotes
e reis como sinal de realeza e poder); e búzios. Sua preferência são as roupas
e os colares m ulticoloridos.
Tendo discorrido sobre estes orixás, com pletarem os este capítulo
trazendo algumas inform ações sobre Egungun e Iyami Oxorongá.

Ancestrais: E gúngún - Egungun


Poder A ncestral M asculino/P oder G enitor M asculino
Os termos Egúngún, Egún e Baba-Égún referem-se a antepassados já
idos, habitantes do orun, que se manifestam no aiye. Nos cultos a ancestrais
masculinos Egungun ocupa o lugar central.
Os ancestrais que já partiram para o orun perm anecem junto a seus
descendentes e interferem em todos os âm bitos da sua vida pessoal e fam i­
liar. Apaziguam hum ores, atenuam discórdias, estim ulam a solidariedade, o
espírito de unidade e a harm onia, renovam a energia exigida para o trabalho
e interferem cm questões de ameaça de desagregação familiar por motivo
de disputa ou de problem as de herança, entre outras possibilidades. Sua
palavra é aceita c respeitada.

88
O culto a Egungun possui, entre outros, o objetivo de corrigir efei­
tos de uma herança de caráter espiritual que se reflete em desequilíbrios
de toda ordem - física, em ocional, espiritual. C ada indivíduo recebe de
seus antepassados um a herança biológica e um a herança em ocional-
esp iritu al, ou seja, um a carga g enético-espiritual/em ocional. O c u lto a
E gungun possibilita agir retroativam ente no sentido de elim inar fatores
desfavoráveis ocorridos ao longo das sete gerações anteriores de um a
pessoa, dos quais decorreram dificuldades, doenças e problem as de toda
ordem em sua vida. Esse culto tam bém possibilita resolver conflitos
familiares vividos p o r pessoas das gerações passadas para restabelecer o
equilíbrio perturbado.
O princípio de senioridade determ ina que os mais velhos ocupem
postos hierárquicos superiores e sejam respeitados pelos mais jovens, por
sua experiência e sabedoria. A presença de Egungun na vida cotidiana de
seus descendentes m antém viva a relação de respeito e reverência aos mais
velhos. Com voz rouca ou utilizando tons agudos, trepidantes, sibilantes ou
nasais, os Egungun previnem e ordenam .
Suas festas são realizadas na época do plantio, mas, com o esta época
varia de lugar para lugar, as datas festivas tam bém variam , perdurando as
comemorações por cerca de quatro semanas. Todos os lugares de realização
dessas festas recebem m uitos cuidados, dada a sua im portância. Áreas de ro­
dovias e vilarejos, casas e armazéns são reform ados ou pintados para melhor
recepcionar os ancestrais, e algumas pessoas percorrem grandes distâncias
para poder participar das com em orações.
A realização dos rituais de Egungun exige a presença dc sacerdotes e
iniciados fortes, íntegros e bem preparados, capazes de m anipular as energias
próprias do m undo além -m orte. Os prim eiros atos rituais - igbàgan—são
realizados durante a m adrugada, na floresta sagrada - igbàlç ou igbó-Ègún
- enquanto as casas ainda estão fechadas e a m aioria das pessoas encontra-
se dormindo. O ritual tem início dentro do espaço sagrado, no local tido
como ponto de encontro entre orun e aiye. Ao anoitecer do prim eiro dia de
festividades os membros da Sociedade Egungun reúnem -se e pedem bênçãos
e proteção aos ancestrais.
Posteriormente, acom panhado pelos alúàgbáà c por sacerdotes subor­
dinados, Egungun dirige-se à casa do líder local, dançando continuam ente
ao som de tambores. Recebe m uitos presentes e prom ete apoiar a ele e à
sua comunidade. Após um período de alegres celebrações, que incluem a
entrega das oferendas, o com partilham ento de comida, bebida e danças
alegres, Egungun visita as pessoas em suas casas e, dentre as diversas ativi­

89
r
dades, traz recados dos parentes já falecidos, assinala condutas indesejáveis
adotadas pelas pessoas no ano anterior, reprovando-as, advertindo-as e, caso
necessário, punindo-as. Sempre com o objetivo de educar. Também orienta
a respeito das atitudes e posturas que devem ser adotadas. Toda festa inclui
danças e perform ances que culm inam em exibições acrobáticas e mágicas,
fascinando os presentes.
Os símbolos de Egungun são çta (pedra de assentam ento); irúkçrç
(cauda de animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada por
sacerdotes e reis com o sinal de realeza e poder); àtòri (vara sagrada); çdan
(im agem de metal contendo um casal); búzios; e estátuas de m adeira escul­
p id a s com sete cabeças, representando as sete gerações passadas. Suas vestes
e colares são multicoloridos.

Iyam i Ò sòròngà- Iyami O xorongá


Poder A ncestral F em inino/P oder G enitor Fem inino
Antes de discorrer sobre Iyami Oxorongá, é preciso fazer referência ao
fato de que os ancestrais femininos - Iyagbà ou Iyami Osòròngà —têm sua
instituição nas sociedades Egbç filçyç, Egbç Ògbóni e Egbç Gçlçdç, consi­
deradas secretas pelo fato de serem os seus conhecim entos com partilhados
no interior do grupo e transm itidos apenas a iniciados.
Popularm ente se diz que Egbç Çlçyç, a Sociedade das Senhoras dos
Pássaros, promove reuniões de mulheres iniciadas em Iyami Oxorongá em
encruzilhadas ou em copas de árvores, nas quais é perm itida som ente a
participação de m ulheres já capazes de transm utação (transform ação em
pássaros). Durante essas reuniões são compartilhados conhecimentos, depois
de firm ado um pacto de fidelidade absoluta que jam ais poderá ser rompido.
Caso uma pessoa, devido a um a circunstância qualquer, presencie o proces­
so de transm utação de um a m ulher em ave, o im pacto energético será tão
intenso que ela poderá perder um dos sentidos - visão, fala, audição - ou
m esm o morrer. Por isso, mulheres já dotadas desse poder não com partilham
seus aposentos de d orm ir com ninguém .
Egbç Ògbónié um a corporação que m antém e fiscaliza o culto às Iyami
Oxorongá e aos demais orixás e tem por regra principal o com prom isso que
cada integrante deve assum ir para com as Mães.
A Egbç Gçlçdç, integrada tanto por hom ens quanto p o r mulheres,
cultua as Iyami Oxorongá e tem por finalidades propiciar a expressão de
poderes místicos femininos, favorecer a fertilidade e a fecundidade, reiterar
norm as sociais de conduta e atrair o axé. A sociedade é dirigida pelas erelú,
m ulheres detentoras dos segredos e poderes de Iyami Oxorongá. Gueledé é

90
chamada Iva (Mãe), c tam bém Igi, pelo fato de serem as m áscaras rituai:
confeccionadas em m adeira dessa árvore sagrada.
O Festival de Gueledé, realizado anualmente por ocasião da colheití
de inhame, dura no m ínim o sete dias, durante os quais os participante:
caminham pelas ruas o dia todo acompanhando Gueledé que, incorporadí
em homens, recolhe-se som ente ao anoitecer. M uitas cantigas são entoadas
entre as quais as de èfç, que fazem referência, em tom de brincadeira, a com ­
portamentos indesejáveis dc hom ens, mulheres e crianças do grupo, duranU
o ano transcorrido entre um festival e outro, tornando-os de conhecimentc
públicorEssas cantigas cum prem , entre.outras. uuaaiunçãojieguladora» pois
através delas, veiculam-se norm as de conduta e regras éticas e morais, sot
a autoridade do poder ancestral feminino.
No terceiro e no últim o dia do festival, o Gueledé mais im portante
s u p e r i o r hierárquico do grupo, participa dos festejos. Dança continuam ente

acompanhado pelas pessoas, que tam bém dançam alegres ao seu redor. Nesse
culto aos ancestrais femininos, Gueledé incorpora nos hom ens ou menino:
que, por herança ancestral ou por recomendação de Ifá, são sacerdotes dc
culto ou estão sendo preparados para isso.
As Iyami Oxorongá representam aspectos coletivos do poder ancestra
feminino. Representam, pois, os poderes místicos da m ulher em seu duplc
aspecto: protetor c generoso; perigoso e destrutivo. Todos os orixás femininos
ou seja, todas as iabás, são detentoras desse poder. Por serem guardiãs do;
destinos e zeladoras da existência, sua boa vontade deve ser cultivada pari
a sobrevivência da vida e da sociedade.
As Iyami Oxorongá pertencem a um grupo dc seres espirituais deno­
minados ajogún, cuja função consiste cm carregar o ebó para se alimentai
dele. De forma figurada, pode-se dizer que o sofrim ento hum ano lhes se m
de alimento: elas o “com em ”, e com isso proporcionam alívio às pessoas
Ao processarem as energias dos ebós possibilitam a cura, a superação d<
dificuldades e a atração de bens necessários. Sua estreita relação com o:
poderes mágicos lhes perm ite neutralizar os efeitos negativos dc pensam en­
tos, palavras e ações destrutivas que uma pessoa dirija a outra ou contrí
si mesma. Assim sendo, enquanto guardiãs das oferendas, as protegem i
encaminham a seu destino, para que o homem se cure ou supere qualquei
problema, atraia para si o que necessita e obtenha a força necessária par;
superar qualquer tipo dc mal.
Como vimos, o grupo de devotos das Mães inclui a presença d<
homens. As mulheres do grupo são chamadas iyagbà ou iya aiye (mães d(
universo), e os hom ens são cham ados ç>só (bruxos, feiticeiros). Hom ens <

91
mulheres ficam atribuídos do poder de m anipular o destino hum ano através
dc rituais de consagração. A aquisição do poder das Iyami Oxorongá ocorre
pelo nascimento, por herança ou através de iniciação. Cabe observar que
mesmo os nascidos com esse poder e os que o recebem por herança precisam
submeter-se aos ritos iniciáticos para obter a proteção das Mães para si e
para familiares e amigos. Apenas as m ulheres são dotadas da possibilidade
de transm utação física, obtida num grau mais adiatando de iniciação.
A presença e a influência de Iyami O xorongá no jogo oracular é
grande: m anifestam -se em todos os odus e, sendo parceiras deles, têm
com o ajudá-los a com unicar-se entre si. Parceiras tam bém de Exu, indicam
os ebós necessários e, em parceria com ele, encam inham cada ebó ao seu
destino.
Algumas de suas denom inações são as seguintes: Ajç, mulher dotada
de poderes especiais, que podem praticar tanto o bem quanto o mal; Magas
Sábias; Feiticeiras; Bruxas; Grande poder existente na terra; Agbà, Anciã;
A wçn lyà mi, Minhas Mães ou Nossas Mães, Zcladoras-, Aiye, palavra que
designa ao mesmo tem po o universo, o planeta Terra, a hum anidade e a p ró ­
pria existência, indicando o poder das Mães em todos esses âmbitos; FAçye,
Senhoras do Pássaro da Noite ou Aquelas que voam ou, ainda, Aquelas que
se transformam em pássaros, nom e atribuído a elas por seu poder de trans­
mutação e utilizado particularm ente para designá-las quando se manifestam
nos humanos, após sua iniciação; lyagbà, Venerável Mãe Anciã, nom e que se
refere à ancestralidade feminina; iyam i Òsòròngà, Minhas Mães Oxorongá;
Ogbóni, Responsabilidade, Sabedoria espiritual, Longevidade.
Observemos que a grande m aioria dos nom es que designam este
orixá está no plural. Mesmo quando se usa o singular a referência remete à
pluralidade, por referir-se sem pre a um coletivo de seres, e não apenas a um
indivíduo. Ou seja, invocar as Mães implica em associar-se a um a coletividade
de energias que vivem em estreita relação com elem entos indispensáveis à
sobrevivência hum ana.
Iyami Oxorongá pode assum ir diferentes formas. São curandeiras e
detêm grande poder mágico. Intervém na vida hum ana, tanto no plano indi­
vidual - saúde física, psíquica e espiritual, casam ento e vida sexual - quanto
no plano social - trabalho e amizades. Protegem de enferm idades, cuidando
particularm ente do sangue, dos órgãos vitais e das vísceras. Apóiam as pessoas
na tarefa de organizar pensam entos e conhecim entos para m elhor atingir
objetivos. Atraem sorte e favorecem atividades comerciais e conquistas m a­
teriais. Promovem mudanças no plano emocional. Por exemplo, um hom em
nervoso torna-se calmo e um im paciente torna-se paciente. Intervém nos

92
destinos hum anos, protegend o de d anos p rod u zid os por in im ig o s ou falhas
róprias. H arm onizam relações entre pessoas, favorecen d o casam en tos.
Sendo portadoras de axé, favorecem a aquisição e a preservação da energia
vital Protetoras e zeladoras, orien tam as pessoas quanto à m elh or m aneira
de realizar o destino.
No aiye as À jç trabalham para colocar ordem no conhecim ento e na
sabedoria e realizam isso através de assentamentos, iniciações e constantes
oferendas e ebós. As A jé Funfun trabalham especialmente para o bem, cn-
auanto as Àjç Pupa trabalham especialmente p ara o mal.
A ação das Mães acha-se presente nas trocas energéticas efetuadas
entre o inundo visível e o invisível. Por isso, e pelo fato de pertencerem à
natureza, particularm ente à terra, através dos elem entos naturais - água, ar,
terra e fogo - se pode chegar a elas. Em outras palavras, podem os evocá-las
com água, obi e orobô e em rios, mares, encruzilhadas, estradas, ao pé de
um peregun, akokô, iroko, yeye, na mata ou no quintal de casa, entre tantos
locais possíveis.
Vejamos o que narram alguns mitos.
Quando Eledunmare pergunta a Iyami Oxorongá com o utilizará o
poder supremo dos pássaros para atender aos pedidos das pessoas, esta res­
ponde: quem não me escutar não terá vitalidade plena e a quem me escutar
concederei tudo o que necessita.
Um itan do odu Ogbc Qsá narra que, quando as lyámi-çleyç chegaram
ao aiye, pousaram sobre sete árvores, representando distintos tipos de ativida­
des: sobre três dessas árvores trabalharam para atenderao desejo humano de
praticar o bem; sobre outras três trabalharam para atenderao desejo humano
de praticar o mal; sobre a sétima árvore trabalharam para atenderao desejo
humano de praticar tanto o bem quanto o mal. É im portante enfatizar que
as noções de bem e mal possuem um sentido universal, ao qual se associam
formas particularidades de interpretação. Com o dependem do desejo e do
modo como cada pessoa interpreta o sentido de bem e de mal, um papel
importante fica reservado ao uso do livre-arbítrio nas ações humanas.
Muitos são os seus símbolos. Um símbolo im portante é o igbá-odú
ou igbádu, cabaça cuja metade inferior representa o aiye e a superior, o orun,
formando a unidade inseparável de dois níveis de existência, e em cujo interior
estão contidos elementos-símbolos. A metade superior da cabaça, representante
de orun, a dimensão espiritual, o princípio masculino, cobre a metade inferior,
representante do aiye, a dimensão material, o princípio feminino. Dentro dessa
cabaça vive $fè, o Pássaro-filho, símbolo do elemento gerado. Narra o mito que
na escuridão da noite Èfè sai do mato como se saísse do interior de igbá-nlá, a

93
grande cabaça, para assegurar a boa vontade das Iyami Oxorongá e estimular seu
poder de fecundação e gestação. Outros símbolos importantes são: irúkçrç (cauda
dc animal que, após preparo artesanal e mágico, é carregada por sacerdotes e reis
como sinal de realeza e poder); búzios; conchas; encruzilhadas; irókò (gameleira
branca, árvore sagrada); pèrègún (dracena ou pau-d’água, planta sagrada de
grande vitalidade); çdan (imagem de metal contendo um casal); o número nove;
o bastão das Iyami Oxorongá (feito de metal e adornado com diversas figuras);
imagens de madeira representando uma mulher ou uma figura metade mulher,
metade pássaro; pássaros; penas dos pássaros òdidè, álúkò, agbe c lékcléké. A
terra e a água - dos mares, rios, lagos c mananciais - também são símbe
importantes, por serem elementos de circulação do axé genitor feminino. Suas
cores são o vermelho, o preto e o multicolorido.
D urante o Festival de Gueledé alguns sím bolos são particularm ente
destacados, entre eles as grandes máscaras representativas de animais e as
roupas confeccionadas com os gèlè, turbantes femininos.
Vale enfatizar que o significado de Iyami Oxorongá foi deteriorado pelo
trabalho de pesquisadores estrangeiros, que a reduziram à condição de bruxa ou
feiticeira, no sentido pejorativo do termo. Despojada de sua função primordial
de geradora da vida, ficou reduzida à condição de força destrutiva.
Falar sobre Iyami Oxorongá exige cum plicidade entre quem fala e
quem ouve e m uita responsabilidade pessoal 110 que diz respeito ao uso da
palavra. Os devotos das Mães devem adotar um a postura m uito séria cm
relação a elas e educar-se na prática do silêncio. Pessoas indiscretas ou que
se vangloriam dos próprios poderes não devem cultuá-las.

94
T
(
(

.
Capítulo 3

Valores e virtu de s:
o código é íic o -m o ra l iorubá

No corpus literário dc Ifá, bem com o em outras form as da n arrati­


va oral iorubá, acha-se preservado o magnífico código ético-m oral desse
povo. Nunca é demais lem brar que este código é bastante distinto daquele
formulado no interior da tradição judaico-cristã, dadas as peculiaridades
das noções de bem e mal em cada um desses contextos. C onsidere-se, ain-
da, que no contexto iorubá é m uito valorizada a conduta que faz com que
uma pessoa seja celebrada ao chegar, e não apenas tolerada ou suportada.
Daí, a im portância da capacidade de reconhecer entre as pessoas aquelas
que são reverenciáveis, seja p o r sua idade cronológica, seja pela sabedo­
ria adquirida, seja pela posição hierárquica conquistada. Daí, tam bém ,
a importância de cultivar atitudes respeitosas e afáveis no trato com os
demais.
Entre os principais valores incluem -se a im portância atribuída à pa­
lavra; a responsabilidade; a devoção ante o dever; a honestidade na vida
pública e privada; o esforço continuam ente despendido para atingir os o b ­
jetivos; a ação resultante de pensam entos, ideias e intenções; a dedicação
ao trabalho; o em preendedorism o; a im portância atribuída ao coletivo, da
qual decorre o apreço dos indivíduos por seu grupo de pertença e a supre­
macia dos mais velhos sobre os mais novos, em obediência ao princípio
de senioridade ou ancianidade. Este princípio implica em itçríba , respeito
para com as pessoas cm geral e, especialmente, para com os mais velhos.
Pessoas jovens de reconhecida sabedoria são tratadas de m odo igualm en­
te respeitoso. Demanda-se, tam bém , disposição para acolher o conselho

99
recebido. Após tecer algumas considerações a respeito de cada um desses
valores, tratarem os de algumas virtudes a eles relacionadas.

Valores
1. Responsabilidade/devoção ante o dever. Honestidade na vida pú­
blica e privada. Suprem acia d os mais velhos sobre os mais novos.
Jovens de reconhecida sabedoria conquistam a condição de senio-
ridad.e.

O respeito devido às pessoas em geral é particularm ente dedicado aos


mais velhos. Grande im portância é atribuída à senioridade, à ancianidade
e à ancestralidade. Quem chegou prim eiro a este m undo tem mais direitos.
O respeito e a confiança depositados nos mais velhos fundam entam -se na
convicção de que a experiência de vida possibilita adquirir çgbçn, sabedo­
ria, e os ológbón, sábios, podem orientar a cam inhada dos mais novos. As­
sim, os mais velhos - m esm o que já-idos - são depositários da confiança è
do respeitosos mais novos e, quanto a seus conselhos, é recomendável que
sejam acolhidos e seguidos. C onform e já assinalado, jovens de reconheci­
da sabedoria integram o grupo de sábios e recebem todas as honras dessa
condição conquistada.
Relatos biográficos de mulheres iorubás1 denotam que a m orte não
destrói os laços familiares, pois, alcançada a condição de ancestral, per­
m anecem os já-idos no seio da família, cuidando dos interesses de seus
descendentes. Entre os iorubás a noção de corrente da vida torna a im orta­
lidade quase visível e palpável, de m odo análogo ao descrito pelo filósofo e
rom ancista chinês Yutang:

Cada avô, ao ver o neto que parte para a escola, sente que está vivendo outra
vez na vida do menino... Sua vida é apenas uma parte da vida familiar e da
grande corrente da vida, que flui sempre. Portanto, ele é feliz ao morrer.
(YUTANG, 1963, p. 157).

O culto aos ancestrais cum pre, entre outras, a função de preservar


relações entre os já-idos e os não-idos, ou seja, entre mortos-viventes e vi­
vos. Assim sendo, não é apenas o grupo que convive no tem po presente,
num a dimensão horizontal, que tem seu valor reconhecido. Também é re­
conhecida a im portância do grupo verticalmente constituído, ao longo do
suceder de gerações, pois o sistema de parentesco inclui os já-idos, faleci­

1Cf. Ribeiro (1987).

100
dos,e aqueles que ainda estão por nascer. Assim sendo, o grupo familiar ga­
nha a forma de um a árvore dc gerações, um organism o coletivo constituído
dos corpos de m uitos. Cada unidade individual desse corpo coletivo está
convencida de sua condição de elo de um a longa corrente geracional. Seja
na horizontalidade, seja na verticalidade, o ocorrido a um indivíduo ocorre
a seu grupo e o ocorrido ao grupo ocorre ao indivíduo.
O senso de pertença histórica e de sagrada obrigação para com os
antepassados é forte, bem com o o sentim ento advindo da percepção contí­
nua do fato de possuir, cada qual, profjm das raízes. Vínculos genealógicos
servem a propósitos sociais: citando-se a referência genealógica de alguém
é possível saber com o essa pessoa liga-se a outra(s) em determ inado gru­
po. Aos já-idos se oferece, respeitosam ente, comida, bebida e retificação de
ofensas, baseando-se na convicção de que permanecem interessados pelos
acontecimentos familiares, aconselhando, adm oestando, protegendo, p u ­
nindo, reivindicando m anifestações de carinho e amizade. Os já-idos au ­
xiliam na neutralização de conseqüências indesejáveis que a ação de m em ­
bros das gerações anteriores produzem sobre a vida de seus descendentes:
reduzem ou mesmo anulam problem as de todo tipo, cuja origem se encon­
tra no com portam ento de ancestrais, segundo um a dinâm ica que poderia
ser compreendida com o um processo de “herança genético-espiritual”.

Im portância do g ru p o de pertença
Dada a im periosa necessidade de pertencer a um grupo, grande im ­
portância é atribuída ao grupo de pertença: uma árvore sozinha não com­
põe uma floresta. O indivíduo não existe sem grupo e o grupo não existe
sem indivíduos. Fora do grupo o sujeito não pode se desenvolver, porém a
pertença grupai dem anda paciência e tolerância, entre outras virtudes. A
necessidade d e respeitar pacn.senacolhido é-reconhecida, sendo o respeito,
pois, considerado o com ponente fundam ental das relações.
A questão relativa às relações entre os indivíduos e seu grupo de
pertença acha-se bem expressa no dito africano sou porque som os c por
sennos sou. Ou seja: eu posso ser apenas se, enquanto grupo, nós somos.
Por outro lado, som ente som os enquanto grupo se cada um de nós é indivi­
dualmente, ao m esm o tem po em que integra um coletivo que com partilha
espaço e tempo.
Conforme m encionado no início deste capítulo, o magnífico código
ético-moral iorubá acha-se preservado no corpus literário de Ifá e em o u ­
tras formas da narrativa oral. R etom ando a ideia de que os valores passam
a ser virtudes quando m anifestos em ações, tratem os de considerar agora
algumas das principais virtudes.
101
2. Esforço continuam ente despendido para atingir objetivos. Pensa­
mentos, idéias e intenções que resultam em ação. Afinco no trabalho.
Em preendedorism o.

Eni maa j e çyin ori àpàta, k i nivo çnu àké.


Quem deseja com er o ovo da ave rara, cujo ninho está no topo da
m ontanha rochosa, não pode m edir esforços para alcançá-lo.

As conquistas decorrem da associação entre metas bem estabelecidas


e o esforço continuam ente despendido para alcançá-las. Qs-sucessos e-as-
conquistas dependem de sorte? Sim, porém a sorte, que é estática, somente
se torna dinâm ica quando ativada pelo poder do esforço contínuo. Sem ele
a sorte perm anece aleijada, sentada, deitada. As conquistas dependem , sem
dúvida, do potencial para a sua realização. Mas, com o o que vale não é o
que um a pessoa tem, e sim o que ela realiza com o que tem, sem esforço
qualquer potencial perm anece adormecido.
O potencial de realização - ou seja, a força disponível para a ação de
um a pessoa no m undo - precisa ser utilizado. Nos casos em que essa for­
ça permanece estagnada, seu congestionam ento acarretará conseqüências
indesejáveis em diversas instâncias, tanto nas dim ensões do biológico e do
psicológico quanto nos âm bitos social e espiritual. Força é axé, e nós pre­
cisamos de axé, dependem os da força. Por outro lado, para a força agir no
m undo, precisa de representantes qualificados. Observem os quanto esforço
é exigido daqueles que se propõem a aprender um ofício: ao longo de anos
têm que dedicar-se disciplinadamente aos aspectos teóricos e práticos do
ofício escolhido. Pois bem. Vale o m esm o para todos os que desejam atingir
objetivos: suas possibilidades de realização acham -se condicionadas a um
contínuo, persistente e disciplinado esforço.
Embora não caiba no presente contexto um a reflexão mais detalhada
sobre as relações entre, de um lado, o binômio esforços-ação e, de outro lado,
aspectos relativos à natureza e função do axé e das instâncias ori, okàn e iwá,
vale de qualquer modo lembrar que todos esses fatores acham-se intimamente
relacionados. De onde se conclui que os rituais - iniciáticos, entre outros —pos­
sibilitam realizar correções e ajustes na complexa dinâmica do ser no mundo.
Colocando em sintonia as diversas instâncias deste ser, os rituais favorecem a
ruptura da inércia e criam um impulso novo, um movimento de ações trans­
formadoras, conduzidas por ori e atuantes, tanto na pessoa quanto em seu en­
torno. Depois disso, através de esforços contínuos, realizados sem perder de
vista a meta estabelecida, as chances de vitória sem dúvida aum entam muito.

102
Virtudes
Para discorrer sobre as virtudes convém começar tratando da im por­
tância da fidelidade à palavra proferida. Tratemos, pois, da f id e lid a d e e da
lealdade, para abordarmos, em seguida, a questão da fidelidade à palavra.
Vejamos algum as palavras q ue design am fidelidade e lealdade em
iorubá. Daàisçtàn significa sinceridade, lealdade, franqueza, simplicidade;
àisèrú designa honestidade, lealdade, sinceridade; àisi. correção, exatidão;
àisiyèmcji, certeza, convicção absoluta (n o sentid o de não haver d u ali­
dade, e sim, unicidade, inteireza); á/só, firmeza, impermeabilidade, justeza;
-tfsògosigmhczsenwanglóriaou-jactância; áisojúsájú, honeiStidSdsrfêãldíF
dc, imparcialidade, ò d o d o , h on estid ad e, lealdade, fidelidade; olotç designa
o honesto, leal e verdadeiro; çrç-iyçré refere-se ao amigo íntimo c leal;
àtinúwá é o sincero, leal, cordial e espontâneo.
Como òdodo significa honestidade, lealdade c fidelidade, olòdodo
significa honesto, justo, leal e fiel.
Otç, òótç e òtitç significam verdade, sòtç e sòtítç significam ser fiel,
scr verdadeiro, ser honesto. As palavras sòtç e sòtítç são com postas de sò
e òótç ou òtitç. E o que significa .sò? Significa vigiar, tomar conta, ticar
de olho. De onde se conclui que a prática dessa virtude dem anda controle
consciente do pensamento, da fala, das atitudes e da conduta. Nada é intei­
ramente dado: cada atitude e cada conduta dem andam em penho pessoal e
vigilância contínua.
A ausência dessas virtudes é indicada pelos advérbios dc negação Mi,
que significa não, e alai, tam bém indicador de ausência ou negação, como
em àláibèrè, não-iniciado, ou aláibçrú-çlçrun , descrente, ímpio. Form am -
se, assim, os adjetivos que indicam ausência dessas virtudes: láilotç, infiel,
desleal, enganoso; aláisótç, injusto, desonesto, mentiroso, desleal; sàisòtç,
falso, incorreto, desleal; aláisòdodo, mau. desonesto, injusto, desleal, infiel.
A palavra aláyídàyídà, que significa mudança, alteração, significa também,
falso, desleal, camaleônico, "duas caras”.
Relativos, ainda, à ausência de virtudes, tem os os substantivos çdàlç
e idàlç, que significam perfídia, deslealdade, traição; àdàkàdékè, mentira,
perfídia, deslealdade-, àisòdodo e àisòtç5, maldade, injustiça, falsidade, in­
verdade, mentira; àisore, descortesia, maldade, indelicadeza; arékéreké,
àrékéndà, falsidade, hipocrisia, deslealdade, astúcia; àisetarà, desonesto,
desonestidade; àbòsí. decepção, desilusão, fraude, desonestidade, desle­
aldade, má fé. Este últim o vocábulo refere-se àquele que conhece a ver­
dade, porém a nega para favorecer alguém ou a si próprio, fazendo vista
grossa.

103
Em grande parte dos odus encontram os a presença da fidelidade e
da lealdade. Vemos 110 odu Èji-Ogbè (8)2 , por exemplo, am bas as virtudes
figurando como ingredientes básicos da am izade. Irm ãs da honestidade e
filhas da verdade, essas virtudes, no dizer de Com te-Sponville (1996, p. 25),
não são, apenas, alguns valores entre outros, algum as virtudes entre outras,
pois “a fidelidade é aquilo porque e para que há valores e virtudes”. Só há
justiça porque há hom ens justos, fiéis e leais, e só há paz por haver h o ­
mens pacíficos, fiéis, e leais. Fidelidade e lealdade têm por base o respeito, a
constância, a dedicação. Somente a fidelidade possibilita preservar relações
estabelecidas entre pessoas e seres d o jn u n d o natural e entre pessoas e seres
do inundo espiritual.

F id elid ad e à verd ad e e as lep ras da p alavra


Ser fiel à palavra é imprescindível, particularm ente nas sociedades
de tradição oral, onde ela é indispensável à sobrevivência do indivíduo, do
grupo e da história.
O vocábulo sç, traduzido por falar, dizer, contar, significa tam bém
brotar do solo ou brotar do tronco da ár\'ore. O verbo sçjádc significa falar
claro e, sim ultaneam ente, brotar, surgir. Atentem os para esses significados.
A metáfora que relaciona a fala a um produto do solo ou de um a árvore su ­
gere que a palavra brota do interior do ser e manifesta a sua natureza: pelo
fruto se conhece a árvore e pela palavra se conhece o hom em .
No verbo sçrç, falar; reúnem -se os vocábulos sç e rç. Sç, com o vi­
mos, significa falar, dizer, e rç significa contar, relatar, porém significa tam ­
bém, refletir, pensar com sabedoria, crer, imaginar, conceber e perambular.
A associação de significados dos vocábulos so e rç rem ete à noção de que
sçrç não é um a fala qualquer, e sim um a fala resultante de recolhim ento
interior, de imaginação e reflexão.
Sisç, traduzido por fala, expressão, discurso, significa tam bém lança­
mento, arremesso, associando, pois, o sentido do falar ao sentido do arrem es­
sar, com todas as implicações, efeitos e conseqüências possíveis destes atos.
Finalmente, ao relacionarm os os sentidos do verbo wí, falar, dizer,
relatar; do substantivo wiwi, fala, e do substantivo 117ira, existência, cons­
tatamos, mais um a vez, a íntim a relação estabelecida entre a fala e seu p o ­
der de criação: a palavra existência carrega, em sua própria estrutura, a
palavra falar, este falar que cria, conserva e transform a.

; Vide capítulo 10- M itos d e E xu nos odus de ffá (iorubd) c capitulo II - M ito s de E xu nos odus d e Ifá
(português). O núm ero (S) refere-se à numeração do odu nos referidos capítulos.

104
Hampate Bâ (1982) considera a fala um a m aterialização das vibrações
das forças, um a im agem da fala do Ser Supremo, que põe cm m ovim ento
as forças latentes nos seres. A fala, que conserva, cria ou destrói, tam bém
detém o poder de criar a paz ou destruí-la5. Tais considerações remetem
à questão básica das diferenças entre o hom em com um e o hom em que
b u s c a desenvolver sua consciência moral. Certam ente as responsabilidades

aumentam quando se escolhe cam inhar pela senda do C onhecim ento. Isto
é particularmente verdadeiro para aqueles que exercem cargos de liderança,
seja ela social, religiosa ou política, o que lhes exige a adoção de um modelo
irrepreensível de conduta.
Conforme o m encionado, a verdade é designada pelos vocábulos
otó, òótç e òtítç; c aquele que fala à vèrdade e age de m odo verdadeiro
é chamando olóòtç. Com o òtítç tam bém significa sensatez e fidelidade,
olótitó é o sensato, Hei, sincero, confiável por ser Fiel, previsível nos tratos
c contratos. Vemos, pois,.que a verdade acha-se estreitam ente relacionada
àjjdelidade e à confiabilidade. Tornam-se confiáveis as pessoas cujas de­
monstrações de responsabilidade social e espiritual não deixam margem a
dúvidas e incertezas. Nessa medida, a verdade associa-se à sinceridade que,
por sua vez, relaciona-se à honestidade.
Considera-se que há pessoas de palavra saudável e que há outras pes­
soas de palavra adoecida. Ifi çnu sátá, expressão que designa todo e qual­
quer uso depreciativo da fala (e dos atos), refere-se a esse adoecim ento. Na
ausência ou no afastam ento da verdade, ocorre o que poderíam os cham ar
de “lepras da palavra”: m entira, tagarelice, fofoca, maledicência, calúnia,
escárnio, xingamento e maldição, entre outras.
Mostra-se interessante a nossos propósitos observar a estrutura de
alguns vocábulos iorubás, tarefa que estamos realizando aqui, pois esse
método nos dá acesso a um a multiplicidade de sentidos possíveis e de as­
sociações sutis. Q uando tratam os da questão da m entira, por exemplo, ve­
rificamos que há m uitos designativos de m entira, a palavra que por uso
deliberado e voluntário falseia a verdade. M entira é irç. Òpúrçe aláiniòtítç
designam o mentiroso, falso, desprovido dc verdade, desleal, infiel, não
confiável. M elhor se com preende o sentido de aláini otitç ao observarm os
que essa expressão se com põe das palavras aláini, indigente, pobre, e òtítç,
verdade. Aláini òtítç é, pois, o pobre, miserável, indigente da verdade.
O vocábulo aláini indica, tam bém , um a falta ou ausência, com o se pode
ver em aláiníbábá, órfão de pai; aláinílári, pessoa inútil, que não prospera;

’ Por essa a fala é o grande agente ativo da magia africana.

105
aláinípò, pessoa de posição indefinida na sociedade; aláinirèti, pessoa sem
esperança ou desesperada; aláinise, desocupado, preguiçoso, vadio, desem­
pregado; aláinhvà, sem caráter, inútil; aláiniyè, pessoa de péssima memória.
A m entira é um a das mais freqüentes manifestações da falta de apre­
ço pela palavra. Um m entiroso, ao perder o crédito dos demais, perde tam ­
bém o respeito que lhe devotavam. Por isso se diz que a m entira mata:
prom ove m orte social por perda da credibilidade e da confiabilidade. Seu
efeito nocivo vai além disso: mata tam bém fisicamente, p o r acarretar perda
de vitalidade, pois, ao prom over o distanciam ento entre a pessoa e seu pró-
prio ori, a m entira dificulta ou m esm o im pede o fluxo do axé que^ndvindo—
da divindade pessoal - Ori - vitaliza ará e ojiji, corpos do hom em . y
A verdade é um com prom isso que se tem para com ori e para com os
demais orixás. Cada vez que um a pessoa utiliza a palavra de m odo adequa­
do, o seu ori se fortalece e ocorre um avanço em sua existência: a palavra
correta fortalece o hom em e lhe possibilita prosperar.
Os substantivos èké, eléke, iparç, ipurç, irç, irçpípa e òkóbó desig­
nam m entira e falsidade. O utros vocábulos agregam novos significados. Por
exemplo, ádàkàdèkè associa a esses sentidos os de perfídia e deslealdade;
àisòdodo agrega os significados de maldade e injustiça; e àliúsç-prç, além
de designar mentira, falsidade e perfídia, designa tam bém história falsa.
Q uanto aos adjetivos, èké. eléke e òpúrç, designam as qualidades dc falso
c mentiroso. O adjetivo òkòbó associa a essas qualidades a de fofoqueiro,
enquanto aláisótç associa, às qualidades de mentiroso e falso, as de injusto,
desonesto c desleal. Púrçé m entir e sèké é fofocar. Sòfófó associa os senti­
dos de mentir, revelar segredos e fo focar.
Caberia incluir nesta seção um tipo especial de m entiroso: o hom em
que não cum pre o que prom ete e, assim, não assum e com prom isso com a
palavra que profere. Poderíamos cham á-lo vulgarm ente de “boca frouxa”
pois sua palavra não é firme nem confiável. Neste grupo de pessoas inclui-se
aquele que, de m á fé, m ente deliberadam ente, prom etendo vantagens que,
de antem ão, sabe ser incapaz de oferecer. Inclui-se tam bém aquele outro
que não age de má-fé: é um a pessoa que não reconhece a si mesma como
m entirosa, pois, ao enunciar determ inado propósito, talvez esteja pessoal­
m ente convencida de que o cum prirá; talvez tenha dificuldade de avaliar os
próprios limites e possibilidades e, por isso, proponha-se a realizar tarefas
que de fato não realizará nunca.
Essa fraqueza da palavra, aparentem ente sem m aiores conseqüên­
cias, é de fato desastrosa. N ão apenas para a p ró p ria pessoa, p o r sua
perda de confiabilidade, m as, tam bém , pelos efeitos sociais desse com ­

106
portam ento, pois a sobrevivência do coletivo tam bém depende do com
promisso dc cada qual para com a própria palavra. Por isso, em distinto:
contextos sociais c culturais ouve-se o refrão: Não prometa nada sem .
certeza dc poder cumprir. M uitos daqueles que prom etem sem a intençãc
- ou a possibilidade - de cu m p rir o prometido, o fazem m ovidos pele
desejo de prom over a si m esmos, contando grandezas e enfatizando pos­
sibilidades inexistentes.

Respeite sua própria palavra: se não tem certeza de que estará dis-
posto a todos os esforços^para cum prir o que disse, então não diga!
Palavra sem valor, sociedade sem futuro.4

A tagarelice, outra lepra da palavra,caracteriza-se pelo falar excessi­


vo: o homem falante e verborrágico não exerce crítica sobre o que verbaliza:
fala de tudo e de todos, conta seus planos a quem quer que se apresente
diante dele. A tagarelice, em suas múltiplas formas, associa-se à difamação,
à bisbilhotice e à maledicência, entre outras. Denota irresponsabilidade e
falta dc compromisso para com a vida, poiso bom uso da palavra dem anda
consciência a respeito de sua natureza e função. A fala deve ser funcional,
ou seja, deve haver um a finalidade clara para o que está sendo enunciado e,
se alguém tem um problema ou necessidade, deve com unicá-los exclusiva­
mente a quem possa aconselhar ou ajudar. >■-
Tratamos aqui do hom em verborrágico, o cham ado “boca aberta”,
oue não reflete antes de fahir. jonnra se o seu interlocutor está interessa­
do no que diz, não observa se “sua vítima” tem condições de sobreviver a
seu bom bardeio de palavras. Via de regra trata-se de um a pessoa excessi­
vamente autocentrada, que tem dificuldade para perceber com nitidez o
seu entorno e aqueles com quem interage. O excessivo centram cnto em si,
geralmente associado a um alto nível de ansiedade, faz com que tais pessoas
se transform em em centros emissores de palavras, em lugar de com unica­
dores. Para essas pessoas não chega a fazer diferença quem lhes serve de
ouvinte, pois falam de tudo a todos e a qualquer um , de m odo indiscrim i­
nado e acrítico. Assim, saem por aí contando os seus planos mais íntim os, e
os planos alheios, ao prim eiro que encontram, indiferentes aos efeitos que
suas palavras produzem ou poderiam produzir.
O hom em falante é cham ado oniwórowòro, vocábulo expressivo,
porque oní, com o já vimos, é o prefixo que indica posse de um a qualidade

' Cf. Rickli (2005-2006).

107
positiva ou negativa, como, por exemplo, cm onísúíirú, dono da paciência,
pessoa paciente. Wórowòro (ou kórokòró) designa certas sinetas de bron­
ze colocadas no pescoço dos cavalos com o adorno. Da associação dessas
duas palavras decorre oniwórowòro , que remete à imagem de um hom em
produzindo sons incessantemente, com o um cavalo que fizesse soar as si­
netas de bronze que carrega como adorno enquanto cam inha. Um cavalo
não conduz a si próprio: é conduzido. E o som das sinetas, que apenas lhes
servem de adorno, anuncia sua passagem, mas nada mais com unica além
deste fato.
Alguns vocábulos sugerem apenas o ato verborrágico, o falar inces­
sante, sem que a emissão de palavras esteja necessariamente associada a
alguma intenção danosa. Por exemplo, os substantivos àwidákç, onírccgbè
e çsç, que designam conversa incessante, falação ininterrupta, tagarelice
e loquacidade; os adjetivos aláròyé, ircgbc, asçbótibòti e onírccgbè, que
designam falador, tagarela, palavrcador, palrador; o advérbio (de modo)
poroporo, que significa falando muito; e os verbos fórofôro, falar exces­
sivamente ou muito alto; sísàròyé, falar demais, tagarelar; wírégbè, falar
continuamente; e sçboto, falar muito.
Já o adjetivo çlçnu designa aquelas pessoas que, além de falar excessi­
vamente, são prepotentes, orgulhosas, jactantes c arrogantes. Elas apreciam
autoprom over-se, estar em destaque e recorrer à sedução como recurso para
obter vantagens. Sçbútibòti, sçsçkúsç e sisçsokúsç sãa verbos que acres­
centam, ao sentido da fala excessiva, o de falar bobagens ou ter conversa in-
fantilizada, im atura. Q uando a tagarelice se faz acom panhar da difamação
utiliza-se o vocábulo aláhesç ; quando se faz acom panhar da bisbilhotice e
do mexerico, o vocábulo onisçkúso ; e, quando se faz acom panhar da incli­
nação para a disputa e a discussão, utiliza-se o verbo sàròyé.
A fofoca é praticada por indivíduos incapazes de guardar confi­
dências e particu laridades da vida alheia. O lófòófóé o fofoqueiro; òfó-
fó , a fofoca, o mexerico; sò fó fó c fofocar, mentir, revelar segredos.5 A
im portância atrib u íd a à discrição acha-se bem expressa no dito Olófòó-
fó yçra. A fç sçrç awo , cuja tradução é: Fofoqueiro, tira teu corpo deste
lugar. Queremos tratar de assuntos de awo.6
O substantivo àròká, fofoca, bisbilhotice, mexerico, e o verbo
ròkáàkiri, espalhar notícias a respeito de alguém, fo focar, parecem não as­

5 Interessante observar que a palavra fofoca, do idioma português, tem origem no vocábulo iorubá òfófô.
6 w o é segredo, conhecim ento esotérico. Refere-se tam bém à boa utilização de informações, à seriedade
c à ética no uso de informações.

108
sociar outras qualidades indesejáveis à fofoca. O mesmo não ocorre com o
vocábulo agbódegbà, que designa, sim ultaneam ente, fofoqueiro e recep­
tador de furtos, o que sugere um a ação de furto do direito à privacidade
alheia, relacionada ao ato de fofocar. Com o já vimos, os vocábulos èké e
eléke designam, sim ultaneam ente, fofoca, mentira c falsidade. E lélini as-
socia os sentidos de fofoqueiro aos de caluniador e difamador, enquanto
feiiubà é o verbo que associa ao sentido de fofocar ou de tocar com a boca e
saborear, ou seja, aponta para o prazer que algumas pessoas experim entam
ao fofocar.
Xingam ento, escárnio, m aledicência e calúnia são algumas das
expressões da fala depreciativa. Isata, ato de criticar pessoas ou situações,
acha-se relacionado à inveja (ilara). As críticas e referências depreciativas
feitas a outras pessoas têm por raiz um sentim ento de inferioridade ou dc
incômodo provocado pelo sucesso ou pelo brilho alheio. Tal uso da palavra
deprecia o ori de quem fala, o conduz à perda da nobreza que lhe é própria
e reduz suas chances de sucesso social e econômico.7
Ebú significa abuso, insulto, xingamento, maledicência; igbàdúlúmo
significa calúnia, difamação, falsa imputação, maledicência; ajírçsç signifi­
ca, literalmente, ladrão de palavras; aláròká e asçrç-çni-lçhin significam de­
trator, murmurador, caluniador, malcdicente, difamador: tratam de pessoas
que falam dos outros pelas costas e revelam segredos a elas confiados.
Há vocábulos específicos para designar exclusivamente a calúnia as­
sociada à difamação: abanijç, aganni, agbàdúlúmò, elçgàn, elélini e onidú-
lúniç designam caluniador e difamador; os verbos bàlórúkçjç, borúkojé,
gbàdúlúmç e sátá significam caluniar e difamar, enquanto fàkúro associa a
esses sentidos os de desencaminhar, resumir e abreviar. Ou seja, associam
os sentidos de caluniar c difamar ao de distorcer a verdade.
A ironia é iyçsútisi, vocábulo que designa tam bém escárnio e me­
nosprezo. ránpç significa falar ironicamente.
A m aldição opõe-se à benção, à reza e à oração ( àdúrá). Epè designa
maldição, impropério, blasfêmia e praga, bem com o certo preparado má-
gico-medicinal que potencializa a força do enunciado oral. Os vocábulos

1 Uma curiosa expressão brasileira dessa dinâmica da inveja pode ser encontrada no poem a O vagalume
e o sapo (). RIBEIRO, a p u d C ASCUDO, 1961-62, p. 3 8 ),apresentado a seguir:
Entre o gramado do campo, modesto, cm p a z sc escondia
Pequeno pirilampo que, sem o saber, luzia.
Feio sapo repelente sai do córrego lodoso,
Cospe a baba dc repente sobre o inseto luminoso.
Pergunta-lhe o vagalume: "Porque m e vens maltratar?"
E o sapo com azedume: "Porque estás sempre a brilhar!".

109
irê1 e ègúif significam maldição, praga, imprecação. Alákóbá é aquele que
contamina os outros com o seu azar, seja por problem as da natureza de seu
próprio ori, seja pelo fato de haver sido alvo de um a maldição. Alákóbá traz
danos àqueles com quem interage, ao contam inar o outro com os efeitos
da maldição de que foi vítima. Fibú. fi gçgii-ún c gégún-ún são verbos que
enunciam as ações de amaldiçoar, maldizer e rogar praga.
Em meio a tantas possibilidades de uso indevido da palavra, impõe-
se, por vezes, a necessidade de fazer um juram ento, ibúra. Para assegurar a
veracidade do que verbalizam, as pessoas podem propor-se a perder a vida
_____ o u algO-queiLies é vitaL^Q-juramentO-é-um recurio utilizado-paxadai' peso à
própria palavra, particularm ente em m om entos de tom ada de decisão im ­
portante, prestando-se a preservar o respeito à transparência e à lealdade.
Existe, por exemplo, o já conhecido costum e de selar um contrato ou 11111
juram ento em nom e de Ogum , m ordendo-se um objeto de metal para de­
m onstrar a própria disposição de m orrer ou perder algo vital caso a palavra
esteja sendo falseada.
Assim, ibúra e arabibú são vocábulos que designam o juram ento ou
o ato de jurar. Imulê, tratado, pacto, acordo, convenção, tem por princípio
o mais fundam ental dos pactos, aquele estabelecido por todo ser vivo com
as Iyami Oxorongá, pois, literalmente, esta palavra significa enquanto você
existir transitará sobre a terra e não há forma alguma de quebrar o pacto
(com a terra) sem ser penalizado.
Tendo enfatizado aspectos relativos à fidelidade e ao uso leal da pa­
lavra, considerem os agora outras virtudes, iniciando por um a das cardeais:
a paciência.
Os iorubás incluem surú, a paciência, entre as virtudes cardeais e a
consideram o princípio prim ordial de todo bem-estar. Isto pode ser cons­
tatado, sem nenhum a margem de dúvida, no odu Ogbè-Ogúndá (1)'°, no
qual Eledunm are, pai de Igún, o herói da narrativa, procurando expressar
reconhecim ento e gratidão a O runm ilá, agente da cura de seu filho, manda
pedir a ele que escolha um entre quatro dons - Fertilidade, Longevidade,
Prosperidade e Paciência. Após solicitar o conselho das pessoas de sua con­
fiança, O runm ilá acolhe o conselho de Exu e escolhe Paciência. No entanto,
retornando ao orun para devolver a Eledunm are os dons restantes, Igún

* N ão co n fundir o vocábulo ire, que significa m aldição, com ir c { rcrc), designativo dc sorte.
9 Não confundir o vocábulo cgún, que significa maldição, com Egún, designativo do Poder Ancestral
M asculinno.
10 Vide capitulo 10 - M itos dc Exu nos odus dc Ifá (iorubá) e capítulo 11 - M itos dc E xu nos odus
d c lf;i (português). O n úm ero (1) refere-se à num eração do odu nos referidos capítulos.

110
constata que Prosperidade, Fertilidade e Longevidade retornaram para ass
ciar-se a Paciência, pois quem tiver paciência terá longevidade e fertilidac
procriará e viverá bem com o que procríar. E terá também prosperidade.
Ser paciente implica em exercer dom ínio sobre o tem po e contr
lar os m ovimentos, que sempre se realizam num continuum tem poral. S
paciente exige, pois, um relacionam ento pacífico e harm onioso com igl
o tempo, e com Qlç>jç>, o Senhor do Dia ou o Senhor do Tempo. Cert
mente a paciência acha-se intim am ente relacionada a serenidade, sensaU
ordem, disciplina e organização, sendo por isso que Exu, orixá da ordei
____ da-discipIiníLe^Í£Lorganização,recomenda-o4reino-constante dessa grant
virtude.
Exu, detentor da sabedoria, ensina que através da paciência pode-,
obter m uito na vida, conform e bem ilustra o odu Ogbè-Ògúndá. Ao apn
sentá-lo em obra anterior", Sàlámi tece com entários que vale a pena retc
mar neste contexto, em que se pretende dar a conhecer atributos do ori>
Exu. O autor chama atenção para o fato de que esse odu sugere ser precis
saber aproveitar as possibilidades naturais. Nele são enfatizadas as virtudt
da paciência, da justiça, da generosidade e da gratidão; os principais valore
dos iorubás - fertilidade, longevidade e prosperidade e a im portância d
esforço, do em penho e da responsabilidade pessoal na busca do bem -esta
lembramos que, no jogo entre determ inism o e livre-arbítrio, a livre escolh
cumpre relevante papel na constituição do destino pessoal.
Nessa narrativa, Exu enfatiza a necessidade de buscar conselho junt
a pessoas significativas - filhos, esposas, irmãos e amigos - e de ter discerni
mento ao eleger o conselheiro, que não deve ter interesse egoísta ao aconse
lhar. Refere-se às vantagens da longevidade paterna para os filhos, dado qu
ela aum enta as chances de alcançar a condição de ancestral; às vantagens d
fertilidade para as mulheres, dado que a m aternidade indica força pessoal
e às vantagens da paciência para todos, um a vez que esta virtude constitu
recurso indispensável para a consecução de objetivos.
Paciência, como vimos, é surú. Onisúiiru (ou onipamçra), literal
mente, dono da paciência, é a pessoa paciente, tolerante, calma. Àtêmçr,
também significa paciência e tolerância, aqui associadas a longanimidade
resistência e capacidade de aceitar circunstâncias e ocorrências adversas
O vocábulo âikanminú, designativo daquele estado de paciência que nãc
deixa lugar à ansiedade nem à angústia, carrega a noção de tratar-se de urr
estado anímico que economiza energia vital. Observemos que esse vocá-

" Sàlámi (1999).

111
!
bulo é form ado das palavras ài, não; ka, desgasta; inú, barriga, útero,
ventre, estômago, vísceras, dentro de, profundeza do ser. Refere-se,
p o rtan to , à possibilidade de preservar ou re cu p erar as energias físicas
e etéricas através do co n tato com o eu interior. Fçwçranú é o ato de
buscar equilíbrio emocional, acalmar-se, ter paciência, scr tolerante,
controlar-se. L iteralm ente, significa passar a m ão na barriga para acal­
mar a si mesmo.
ípamçra, tolerância, paciência, significa literalm ente passar uma coi­
sa 110 corpo para retirar o que está produzindo desagrado, deixar pra la.
Significa, pois, suportar desconfortos, resistir às adversidades. A expressão
passar uma coisa no corpo para retirar o que está produzindo desagrado
refere-se ao fato de que, sendo os desconfortos de toda natureza denuncia­
dos pelo corpo, inclusive os descontroles emocionais, a superação desses
desconfortos depende de exercícios de paciência e tolerância.
Por outro lado, àinisúúrú é impaciência, pressa, precipitação (é for­
mada de ài, não; oni, dono; surú. paciência). Aigbêjç significa inquietação,
impaciência, e tam bém o impaciente, obstinado, pertinaz, inquieto (é for­
mada de ài, não; gbé, viver; já, tranqüilidade), lwára e ixvànwara signifi­
cam ânsia, zelo, temeridade, impaciência. À isim i é impaciência, diligên­
cia, inquietação, impaciência c perseverança, no sentido de permanecer
em movimento; literalm ente, àisimi é não descansar. Do m esm o m odo,
aiáijòkó, literalm ente não consegue permanecer sentado, significa inquie­
tação e impaciência. Os advérbios correspondentes relacionam o modo
impaciente de ser a um estado de agitação, de continuo movimento: wán-
ranwànran, agitadamente, impacientemente, de modo perturbado; Jáifa-
rabalç, atrevidamente, irreflctidamente; e wàduwàdú, impacientemente,
apressadamente.
Observa-se, pois, que a paciência depende de equilíbrio emocional,
maturidade, tolerância e capacidade de discernir, porque para ser paciente
é preciso que se tenha boa noção a respeito da verdadeira im portância das
coisas e dos fatos. Em situações tum ultuadas, acaloradas, de algum lugar
deve advir a água refrescante. E a fonte de água fresca nas relações interpes­
soais brota da interioridade daqueles que são pacientes e têm discernim en­
to para distinguir os limites entre a própria loucura e a loucura dos outros,
sem se deixar arrastar por impulsos advindos da inquietação gerada por
pessoas do entorno.
A polidez, virtude puram ente formal, de função disciplinar, é bastante
desenvolvida no interior do grupo familiar iorubá, e através de seu cultivo as
novas gerações se exercitam na prática do respeito e do reconhecimento.

112
fiwú e wiwú são vocábulos que podem ser traduzidos p o r ama­
bilidade, prazer, encanto, gosto, sabor. Atàtà é o cortês, gentil, amável,
importante, excelente; dánmánrán, o polido, limpo, brilhante, suave, ex­
celente; làniyàn, o afável, sociável, generoso, simpático; lêkç, o polido,
cortês, educado, instruído; mèsç. o afável, cortês, educado, atencioso;
níwà. o afável, cortês, simpático, "bom c a r á te r As pessoas dotadas des­
sa qualidade são im portantes nos grupos a que pertencem , pois reúnem
habilidades para interm ediar relações de im passe ou de conflito. O fi­
lho nobre, gentil, distinto, nascido com bom comportamento, é cham ado
omolúwábí (omç, filho; iwà, caráter, personalidade, atitude, comporta­
mento; bi, nascido).
Alguns dos vocábulos iorubás que indicam a ausência dessa vir­
tude são os seguintes: àgbêlêgbundá, que significa pouco educado, não-
correto; bêjú, insolente, mal-educado, obsceno, descortês, imprudente;
láfojúdí, insolente, atrevido, impertinente, mal-educado; e láiscun. rude,
grosseiro, pouco amável, insensível, ingrato. Ausência de am abilidade,
má vontade e repugnância são aláifé, somota é o ato de ser m al-educado,
descortês, grosseiro.
A im portância atribuída ao com portam ento gentil acha-se bem ex­
pressa no vocábulo çrç, que significa, sim ultaneam ente, gentileza, suavida­
de, flexibilidade e antídoto (força que neutraliza outra), enunciando, pois,
que o com portam ento gentil tem o poder de neutralizar adversidades.
Polir é limpar, fazer brilhar, como quando tiram os as camadas que
estão sobre um mineral, supondo ter em mãos um a pepita de ouro. Polimos
para que o brilho do metal nobre possa manifestar-se. Polimos a pepita de
ouro eela revela seu brilho.
A polidez associa-se à sim patia pessoal e ao bom hum or. C om o uma
isca, captura a amizade e a confiança dos demais. Çyáyà, traduzido p or sim ­
patia, sociabilidade, animação, alegria, bom humor, vivacidade, é condição
indispensável do sucesso. Sorrisos, atitudes polidas, gestos de solidariedade,
amabilidade no trato e olhar atento e atraente são expressões próprias de
uma pessoa çlçyàyà (dona da simpatia) - sim pática, envolvente, m agnéti­
ca, carismática, capaz de atrair para si o que há de melhor.
Consideremos, no entanto, o seguinte: um a pessoa polida, cortês e
afável pode estar deixando transparecer sua beleza interior. A beleza exte­
rior constitui um atrativo, ocorrendo o m esm o com a interior, sendo esta
mais apreciável e de efeito mais duradouro. Por exemplo, diante da neces­
sidade de confiar um segredo ou um valor a alguém, a escolha será baseada
na estética física ou na beleza de caráter (otitç, honestidade)7.

113
O gesto polido não expressa, necessariamente, um bom caráter, pois
a hipocrisia tam bém existe. Como a polidez supõe a adoção de um a série
de com portam entos que podem ser aprendidos com a finalidade exclusiva
de obter vantagens através da sedução, um indivíduo extrem am ente cortês
pode estar agindo de má-fé. Como diz o adágio popular, nem tudo o que
reluz é ouro.
Sensatez é a virtude que propicia condições para o agir adequado,
correto, justo e responsável. Há sensatos e insensatos. Há, ainda, pessoas
que, apesar de sensatas, nem sempre agem orientadas pelo bom-senso. É
desejável que a sensatez se faça acom panhar da capacidade de.aftir cni con-
form idade com os ditam es do bom-senso. Pois não basta apenas ter bom-
senso: é preciso ter capacidade de aplicá-lo.
Da associação entre polidez e sensatez decorre ohún rere, a boa fala, fala
com doçura, fala serena, através da qual uma pessoa se dirige a outra(s) com
imparcialidade e coerência, de modo verdadeiro. Diz a sabedoria popular:

Ohún rere n í nmú obi làpó.


Através da fala doce e respeitosa (palavra sensata)
Pode-se convencer alguém a entregar o próprio obi.'2

O u seja, a pessoa oferece o que possui de m elhor ao ser tratada com


polidez e sensatez. Interessante observar que a sensatez acha-se intim am en­
te relacionada ao com prom isso e à responsabilidade, dado que o bom -sen­
so necessariamente conduz à ação com prom etida e responsável. E como
não pode haver exercício do com prom isso e da responsabilidade na au­
sência de disciplina, os julgam entos e os atos sensatos dem andam exercício
disciplinado da vontade.
O hom em ajuizado, sensato, de percepção aguçada, é cham ado
onílakàyè. O adjetivo g b çn designa o dotado de sensatez, associando-
se a essa qualidade as de inteligência, sabedoria e habilidade no trato com
os demais, ou seja, as boas maneiras.
O com portam ento desonesto, desleal, fraudulento, que relega a se­
gundo plano as determ inações do bom -senso, ou seja, o ato insensato, m o­
tivado p or razões de conveniência e não por impossibilidade de julgar, é
cham ado àbòsi, sendo alãbòsi o insensato, desajuizado, ignorante. Tolice,
asneira, estupidez e insensatez são designadas pelo vocábulo àigbçn (au­
sência de gbçn), sendo aláilçgbón o insensato, desprovido de bom-

E ntregar o próprio o bi no sentido de entregar o ouro, entregar o que se tem de mais precioso.

114
senso. Láiniyèninú , o sim ples ou imbecil, age de m odo insensato por nãc
perceber adequadam ente as situações.
Agç, wèrè e iwèrè designam insensatez , loucura, tolice e doidice,
ráuràu e réderède designam insensatez, bobagem, ausência ou indefiniçàc
de rumo; gbéregbère e wéréwère designam o agir insensato.
Tratemos da hum ildade, cham ando atenção ao fato de que essa pa­
lavra, no contexto iorubá, possui carga semântica distinta da conhecida nos
contextos da sociedade ocidental. Isto fica mais compreensível ao constatar­
mos que a expressão imç iwà ara eni, que se refere à noção de limite, designa
-a-possibilidade de i «conhecimento dos próprios limites. Considerando que
cada pessoa tem fronteiras próprias, que definem o que é possível e desejável
de ser atingido e, simultaneamente, estabelecem limites para além dos quais
não pode avançar, humildade é a capacidade de reconhecer essas fronteiras.
Esse reconhecimento dem anda autodisciplina, bom-senso, coerência, m ode­
ração e temperança —e esse conjunto dc fatores com põe o que os iorubás
denominam humildade. Humildade não significa submissão nem sujeição.
Não significa pobreza financeira, nem escassez de recursos intelectuais, nem
baixo status social, nem adoção de atitudes e com portam entos simplórios.
Nesse sentido, o humilde vive sabiamente, em conform idade com o princí­
pio segundo o qual a arrogância é sempre injustificável, sendo, além disso,
um bom passo para a derrota nos empreendim entos. No odu Ògúndá-Móji3
encontramos as seguintes expressões desta verdade:

O céu é imenso, mas nele não crescem plantas.


O sol não pode substituir a lua.

Essas metáforas ensinam que, por maiores e mais poderosos que sejam
os seres, sempre há limites a serem reconhecidos. (HERNÁNDEZ, 2003, p. 21).
Quando se recomenda aos iniciados que se “autoreiniciem ”, o que se
está aconselhando, entre outras coisas, é que revejam a própria noção de
limites. Mesmo porque pode ocorrer, e muitas vezes ocorre, que iniciados
suponham que o fato de receberem cuidados dos orixás os torna superpo-
derosos e capazes de contrariar o que é ditado pelo bom -senso, sem maiores
conseqüências. A participação dos orixás na vida hum ana é absolutam ente
incompatível com im prudência e insensatez. A sabedoria iorubá recom en­
da: se não souber nadar não se jogue no rio e se não dispuser de proteção

13 Vide capítulo 10 - M itos dc E xu nos odus dc Ifá (iorubá) c capítulo 11 - M ito s dc E xu nos odus
dc Ifá (português). O núm ero (2) refere-se à num eração do odu aqui m encionado.

115
para subir no alto de uma palmeira não suba, porque poderá cair e se m achu­
car. Orixá protege somente aqueles que protegem a si m esmos. Este princípio
é válido tam bém para as pessoas que usufruem de condições dc sorte ou de
prestígio e podem supor que esta sorte ou prestígio seja inesgotável.
Aigbéraga e irçlè são vocábulos designativos de hum ildade e m odés­
tia. Iparamó associa a esses significados os de senso dc autodefesa c senso
de autoproteção. Iwàtútú, vocábulo com posto de iwà, comportamento, e
tútú, frio, calmo , sereno, significa comportamento calmo, sereno, podendo
ser traduzido tam bém por humildade, modéstia, amabilidade. gentileza,
serenidade. Os sentidos de serenidade e tranqüilidade, associados aos de
humildade e modéstia, tam bém são encontrados em nirçlç e em çkàn-tútíi,
que significam mansidão e humildade, e nos advérbios búrúbúrú, humil­
demente, modestamente, reverentemente, e tirèlétirélç, modestamente, hu­
mildemente, tranquilamente, serenamente.
Alguns dos an tô n im o s de modéstia e humildade são os seguintes:
agbére, arrogância, orgulho; àilójúti, descaramento, sem-vergonhice,
cinismo, imprudência, falta dc modéstia; àinitijú, falta de modéstia, fal­
ta dc pudor . descaramento, imprudência; aláfojúdi, insolente, arrogan­
te, desrespeitador, descarado; çlénu, arrogante, prepotente, pessoa que
fala demais, "Ungua suja fuja e fúke, jactância, arrogância, gabolice;
ohalç, halèhalè, onihalç, fanfarrão, gabarola, arrogante; igbéraga, orgu­
lho, arrogância, vaidade, ufania, prepotência; irera, orgulho, arrogân­
cia, altivez, soberba, pompa; láinitijú, sem-vergonha, descarado, sem
modéstia, desavergonhado; nigbéraga, orgulhoso, arrogante, soberbo;
onirera, invejoso , pessoa jactanciosa, arrogante; çyájú, atrevido, orgu­
lhoso, arrogante.
M anifestações de autoprom oção garantem d errota individual.
Itçríba, o respeito, associado à hum ildade, torna possível reconhecer a
im portância do bom conselho.
A coragem , basicam ente a capacidade de superar o medo, a insegu­
rança e a falta de determ inação, acha-se relacionada à confiança em si mes­
mo e nas circunstâncias. Todos nos defrontam os com inimigos externos e
internos.
Inimigos externos estão por toda parte. Nós os encontram os em casa,
na escola, no trabalho, em todas as situações sociais. Há inimigos externos
de diversos tipos. Alguns ameaçam nossa integridade física ou nosso patri­
mônio, outros ameaçam nosso equilíbrio emocional, outros ainda, m atam
nossos sonhos. Há os que reduzem ou neutralizam com pletam ente a nossa
sorte, incluindo-se nesse grupo os praticantes do mal, quer sejam vivos,

116
q u e r sejam já-idos. Indisposições c m al-entendidos com familiares tam bém

podem determ inar condições de antipatia que m uitas vezes perpetuam -se
para além da m orte física.
Os inimigos internos são igualm ente temíveis e nem sem pre são re­
conhecidos como tal. M encionam os alguns: preguiça, medo, insegurança,
arrogância, covardia, desonestidade, falta de hum ildade (no sentido acima
m encionado), falta de intuição, falta de imaginação, ignorância, falta de ex­
periência de vida e outras fragilidades de formação, ausência ou dificuldade
de contato com o próprio ori. Os inimigos internos travam o progresso da
pessoa e seu avanço na vida.
A dificuldade de assum ir responsabilidade pelos próprios erros e
fracassos leva as pessoas, algumas vezes, a negarem a ação de seus inim i­
gos internos, buscando no entorno supostos responsáveis por seus erros e
fracassos.
A coragem é um a característica pessoal. Transform a-se em virtude
quando colocada a serviço de outras pessoas ou de um a causa. Surpreen­
de a quantidade de vocábulos iorubás designativos de coragem ou de atos
corajosos, o que sugere a grande im portância atribuída a essa virtude. A
coragem é m uito respeitada, entre outras razões, por se fazer acom panhar
sempre de altruísmo, generosidade e alguma form a de desinteresse. Vemos
em alguns odus, particularm ente no odu Ògúndá-Méji (2), que é preciso
coragem tanto para enfrentar desafios quanto para evitar perigos e grandes
riscos, pois a mesma tenacidade exigida para o com bate pode ser exigida
para a decisão de esquivar-se ou fugir. Neste odu constata-se que o bom
planejamento inclui um a avaliação de riscos, o que exige, além da coragem,
discernimento e prudência, pois a coragem para além dos limites se faz
temeridade ou imprudência.
Enquanto àiyà designa coragem (peito, coração), àiláya designa a au­
sência dessa virtude. Coragem, intrepidez, atrevimento, audácia e ousadia são
designados àifòyà, igbóiyà, igbójú, iláyà, ilçkàn, imójúkuku. O encorajamen­
to, estimulo à coragem, é chamado igbàniyànjú, imçkànle, isirí. iwúri, orísisí.
0 estimulador, encorajador (aquele que encoraja), é chamado onisirí, wúni-
lórí, fojúfún, gbojúfün, gbàniyanjú, múlóríyá. Segirí é encorajar a si mesmo,
animar-se, ficar alerta. O preparado mágico-medicinal que torna um a pessoa
mais corajosa denomina-se ilayà. SUáiyà é desencorajar, desalentar.
No peito repousam a autoconfiança e a capacidade para depositar
confiança nos outros. A ya significa peito e, tam bém , enfrentamento. ilayà
é coragem e layâ é ter coragem, ser corajoso. Aláiníbçrú, vocábulo que
designa destemido e corajoso, designa tam bém o desrespeitoso, mal-edu­

117
1

cado, ousado. É interessante lem brar que o respeito e o m edo integram a


dinâm ica da coragem e da bravura.
O herói, bravo, valente, corajoso, intrépido, destemido, audaz, é
cham ado àibèrú, aki, akin, akçni, aláifòyà, gbóiyà, gbójú, làyà, Içkàn,
ògbóyà, onigbóyà, çláiya, çlçkàn. A bravura e a capacidade de enfrenta-
m ento prom ovem segurança: os corajosos inspiram confiança e conquis­
tam o respeito das outras pessoas. Essa virtude, com o todas as demais, é
um a qualidade do ori e tem morada no peito, çkàn, lugar físico do conhe­
cim ento, da sabedoria por caminhos da intuição (percepção intuitiva) e do
-impulso-para-a-ação:------------------------------------------------------------------------------ -
A ação corajosa decorre de determ inação e disposição para enfrentar
situações de risco, um a vez que sem riscos não há progresso. Q uando se busca
melhor qualidade de vida, bons resultados somente são alcançados depois da
ação, e não antes dela, mas para agir é preciso ter coragem. Muitas pessoas
falham por não arriscar, por não tentar. Algumas falham por não ter coragem
de m anter a ação que conseguiram desencadear, outras falham por não ter
coragem de realizar do melhor modo possível a tarefa a que se propuseram
e outras, ainda, falham por não reconhecer o m om ento certo de suspender a
ação, ou seja, aquele m om ento em que ela perde o sentido ou se torna inade­
quada ou im portuna. Isto aponta para o fato de ser preciso ter coragem para
entrar e para sair dos jogos da vida. Ou seja, coragem para rom per a inércia
que antecede a ação e para rom per o fluxo da ação caso ela se prolongue “por
inércia”, apesar de haver perdido seu sentido original.
O discernim ento possibilitará perceber o final dos ciclos da existên­
cia, m om ento em que se exige coragem para suspender a ação e m udar de
postura. Há um itan que ilustra bem a questão do reconhecim ento de que
um ciclo existencial chegou ao fim.M Narra-se que certa vez Ogum, retor­
nando de uma guerra, chegou à entrada de Ire, cidade onde reinava, e en­
controu algumas pessoas sentadas, com partilhando çmu, vinho de palma,
sua bebida favorita. Não foi cum prim entado, nem convidado a participar
da reunião. A m oringa de çmu estava em pé e, portanto, cheia, pois se esti­
vesse vazia estaria de boca para baixo. Furioso com a indiferença com que
o receberam, O gum pegou a espada e começou a destruir tudo. Depois de
algum tem po recuperou a calma e, inconform ado, fincou sua espada no
solo e este se abriu. Ogum instruiu a todos que, quando houvesse guerra ou
qualquer dificuldade, seu povo poderia cham á-lo ali, naquele lugar onde
desapareceria. E desapareceu no interior da terra. Que motivos levaram

'* Cf. Sàlím i (1993).

118

i
Ogum a retirar-se para o orun? Ele teve discernim ento suficiente para per­
ceber que sua presença já não era necessária.
A coragem deve associar-se à prudência, tam bém presente em m ui­
tos odus. A prudência integra a ética da responsabilidade: apoiada nos
princípios das ações, volta-se para as conseqüências previsíveis dos atos,
pois é preciso scr responsável não apenas por intenções ou princípios, mas
também pelas conseqüências dos atos, na m edida em que possam scr pre­
vistas. A prudência possibilita deliberar a respeito do que é bom ou m au e
agir em conformidade com possíveis eventos futuros.
— Kikiycsára significa prudência, observação atenta, acuidade de ob-
senação, cuidado, cautela, circunspcção. Agbédc designa a prudência as­
sociada à inteligência, enquanto amòye e olóye designam o homem sábio,
prudente, dotado de acuidade perceptiva. Cuidado, prudência e delicadeza
são çsç, ação realizada passo a passo, com calma, em harm onia, serena­
mente. Quando o cuidado e a prudência associam-se à calma e à acuida­
de perceptiva temos ifarabalç, uma pessoa cautelosa, capaz de autocon-
trolar-se. O homem sábio, prudente, bom conselheiro, é cham ado olíimp,
olúmçràn, olóye, amòye. Com o òye significa percepção, discernimento,
olòye significa dono (ol) do discernimento (òye), c amòye significa aquele
que possui (am) percepção, discernimento (òye). Mèrò, ou mètèmèrò, é o
homem circunspecto, discreto, prudente, cauteloso.
Alguns dos vocábulos empregados para designar a ausência dessa vir­
tude são os seguintes: àilójúti, imprudência, descaramento, cinismo, falta de
modéstia, sem-vergonhice e àimòye, imprudência, ignorância, tolice, desa­
tino e asneira. O imprudente, insolente, mal-educado, obsceno, descortês,
é denominado bçjú. Láigbçn é o imprudente, indiscreto, inábil, ignorante;
láilóye e láimòyc designam o imprudente, néscio, indiscreto, imprevidente.
Alguns dos advérbios que indicam a ação im prudente ou irrefletida (sem
pensar) são jágbajàgba c láironú, o que evidencia a noção de que a prudência
depende da capacidade de avaliar criticamente, de refletir e de apreender o
sentido das situações para poder agir baseado no bom-senso.
A prudência relaciona-se ao discernim ento e à justiça: o exercício
da prudência depende da capacidade de reconhecer o que é justo e ade­
quado. Relaciona-se à capacidade de prever as conseqüências dos atos. Por
exemplo, um a pessoa que dirige seu carro a 160 km p o r hora age im p ru ­
dentemente por desprezar os princípios que regem a ação adequada. O utro
exemplo pode ser encontrado na situação oracular: ao buscar orientação
no jogo oracular a pessoa está agindo prudentem ente. Mas, se o conselho
não for ouvido e transform ado em ação, ou seja, se, ao deparar-se com a

119
verdade e receber o conselho, o hom em não seguir as recomendações do
jogo e não agir em conform idade com o conselho recebido, estará agindo
im prudentem ente.
M òye é um verbo intransitivo que pode ser traduzido por ser pru­
dente, discreto, sagaz c hábil. Baralè é ser prudente, acautelar-se, proceder
calmamente; e isora é o ato de proteger a si mesmo, de agir com prudência,
cautela, cuidado. Agir prudentem ente dem anda sensibilidade, intuição,
percepção aguçada dos limites, responsabilidade e bom -senso, qualidades
cujo desenvolvimento é favorecido pela ação de Exu. Uma expressão fre­
quentem ente utilizada é:

Sora e!
Tome cuidado! Não se arrisque! Cuide de si mesmo!

Não será demais considerar as conseqüências da im prudência no


âm bito das trocas energéticas entre as pessoas. Valem aqui as regras das
relações possíveis entre os oris das pessoas que entram em interação, con­
forme veremos adiante, ao tratar de questões relativas ao perdão. É preciso
considerar os efeitos que nossa ação pode provocar em outras pessoas. Ao se
agir de má-fé; por exemplo, pode-se provocar a ira do ori do ofendido, sendo
prudente, pois, evitar uma reação que seja desfavorável a nível energético.
Tratemos agora de esperança, confiança, fé e crença. Igbàgbç signi­
fica confiança, fé, crença, crédito, esperança, convicção absoluta e indiscu­
tível, fidelidade inabalável. Àigbàgbç significa incredulidade, infidelidade,
descrença, desesperança; àinígbékçlé, desconfiança; àifçkàntán, descon­
fiança, objeto não confiável. A fura é o desconfiado. Ifura e im éfò desig­
nam suspeita, desconfiança, dúvida e, ao m esm o tempo, pessoa desperta,
atenta, desconfiada.
Alguns dos vocábulos designativos de confiança e fé são os seguintes:
èkç, ifokànsç, igbçkèlé, igbiyèlé, igbçkànlé e igbékèlé-ara-çni. Este últim o
vocábulo refere-se à autoconfiança: som ente quem confia em si pode inspi­
rar confiança nos demais e m ostrar-se capaz de responder de m odo positi­
vo à confiança nele depositada. Evidentemente a autoconfiança depende de
autoimagem positiva e autoestim a elevada. Exu pode prover e aum entar a
capacidade de reconhecer qualidades positivas em si mesmo, bem com o a
capacidade de transform ar o próprio potencial em ação capaz de conduzir
à consecução dos objetivos.
Fokàntán e gbáralé indicam a ação de confiar- em si, nos ancestrais,
nos orixás, na vida. Fujii e fura indicam o oposto: suspeitar, descçnfiar,

120
e s ta r atento, desperto, com os sensores em estado dc alerta, estar vigilante,
sensível a possíveis ameaças e perigos, estar com “as antenas ligadas”.
Qbçkèlc e gbíyèlè indicam as ações de ter fé e confiar e, além disso, aguar­
dar auxílio e depender. Significam, pois, ter confiança e esperança nas vitó­
rias conquistadas por esforço próprio, ainda que o axé de algum a divindade
venha a potencializar a ação pessoal. Sàigbçkélé, p o r outro lado, o oposto
de gbáralé, significa desconfiar, recear, duvidar, não acreditar.
A concepção mais usual de fé encontrada no m undo ocidental supõe
unia espera passiva da ação divina. O devoto pede a proteção ou a ajuda
de um ser divino e espera passivamente por resposta. Para os iorubás a fé
supõe uma ação: promove o impulso, motiva a ação, é o m otor da ação:
p o r confiar acreditamos que será possível realizar determ inada ação e que
nosso ori nos apoiará nisso. Assim sendo, aos elementos fé c ação, une-se
um terceiro, igualmente importante:jo poder do próprio ori, A noção iorubá
de fé é, pois, distinta da noção cristã. Ter fé é ter convicção, é estar convencido
de que a ação será efetiva. Por isso, nesse contexto, e de acordo com essa con­
cepção, a fé é entendida como força motivacional, propulsora da ação. Não
implica nunca em atitude de espera passiva de uma intervenção divina.
Nígbçkélé, nídájú e gbígbçkçlé são adjetivos que designam os m e­
recedores de crédito e de confiança. Por outro lado, os não confiáveis são
chamados gàúngàun, láidájú, láidánilójú, láigbçkèlè. são pessoas que não
devemos seguir e de quem não podem os depender. Os desconfiados ou
receosos são chamados nífura, que significa fique esperto!
As implicações sociais de agbára, força, poder, capacidade, energia e
vigor físico, são indiscutíveis. Alagbára é o hom em dotado dessas qualida­
des. Çgbçn é a inteligência caracterizada p or sensatez e discernimento. Òye
é a percepção acurada, o entendimento agudo, a compreensão profunda,
expressões de sabedoria. Oran tam bém se refere à capacidade de com pre­
ender. Diz o provérbio:

Çní dúpé ore àná, á ri òmíràn gbà


Alagbára má m o érò, baba çlé.

Aquele que tem força, mas não tem discernimento,


Acha-se fadado ao fracasso.

Um hom em forte e trabalhador, que, no entanto, tenha pouco dis­


cernimento, poderá com portar-se com o um bàbá çlç, pai da preguiça, o
mais preguiçoso de todos. Km outras palavras, o trabalho, m esm o que exe­

121
cutado de m odo excessivo, não garante a prosperidade. As condições de
vida de um grande e esforçado trabalhador que não prospera assemelham-
se, e m uito, às condições de vida de um preguiçoso. A prosperidade não
depende apenas do esforço despendido no trabalho. Depende tam bém de
outros fatores, entre os quais incluem-se discernim ento, responsabilidade,
prudência, honestidade e sorte.
O discernim ento dem anda raciocínio, sim. Mas não apenas isso. De­
m anda reflexão a respeito do sentido da existência. O senso com um leva a
supor que recorrem mais à interferência divina aqueles cujo discernim ento
deixa a-desejar.-Mas-não-é-isso-o-que a firm am os-iorubás. Pelo-contrário:-
eles afirmam que a confiança, a crença e a fé dependem do desenvolvimen­
to da consciência individual, desenvolvimento esse que certam ente inclui a
capacidade de reconhecer limites e responsabilidades.
Para os iorubás igbàgbç , a convicção absoluta, depende de um movi­
m ento em dupla mão, ou seja, de um lado tem que haver um a pessoa capaz
de acreditar e confiar e, de outro lado, algo ou alguém confiável. A cren­
ça ou confiança é condicionada, pois, à ação confirm ativa da outra parte,
que deve ser confiável, e deve dem onstrar isso através de fatos claramente
identificáveis no cotidiano da existência. A fé não é, pois, abstrata. Ela se
concretiza e se confirma através das “graças” ou “d ons” propiciados pela
ação da própria pessoa, que deverá saber reconhecer quando surge uma
oportunidade para agarrá-la.
Assim sendo, vemos que a fé não possui conotação religiosa. O io-
rubá pensará: realizarei com apoio de orixá. Fará sua oferenda com fé, es­
perançoso de que os orixás o apoiarão. Fará tudo o que é hum anam ente
possível, adotando atitudes, tom ando decisões e realizando todas as ações
que pode realizar no âm bito hum ano. O divino agirá com plem entando os_
esforços pessoais. O crente age confiante no sucesso da própria ação. Tra­
ta-se, pois, de um a fé que poderíam os cham ar de concreta, pois serve de
combustível aos sonhos: ela cria e alim enta as aspirações.
Vejamos um exemplo disso no plano religioso: digamos que alguém
faça um a oferenda a Exu e, com toda a fé de que é capaz, expresse o que
espera com o concessão desse orixá: cam inhos abertos e condições existen­
ciais favoráveis. Bem, para pedir auxílio é preciso pelo menos um m ínim o
de consciência dos processos - subjetivos e circunstanciais - da própria
vida. Exu trabalhará sobre um a linha de base criada por seu devoto. Neste
exemplo simples identificamos o m ovim ento bilateral da fé: de um lado,
há uma pessoa que expressa a sua necessidade ou desejo e, de outro lado,
está o axé do orixá que responde à evocação. A fé envolvida nesse processo

122
supõe crença nas próprias possibilidades, bem como no potencial dc ajuda d
divindade a quem se recorre. Supõe, ainda, capacidade para entregar-se ac
cuidados do orixá: igbçkèlé significa depender; entregar-se confiantemente
Vejamos m elhor essa noção de entrega confiante. Os bens materiai
e não-materiais - casa, carro, poder - são considerados igbçkçlé, coisas na
quais confiamos. Igbçkèlé é, pois, todo e qualquer recurso material ou ima
terial que sustenta a crença e possibilita atingir os objetivos. Por exemplo, s
uma pessoa que não dispõe de carro chega à escola trazida pelo veículo d
outra pessoa, essa condução foi seu igbékçlé, elem ento do qual dependei
para concretizar a ação:
igbójúlé (igbé, aquele; ojú, olhos; le, por cima ) significa aquilo oi
aquele sobre o que se põe os olhos, se imagina, se deposita fé e confiança
é aquilo ou aquele de que se depende. Possui sentido análogo ao de igbçkè
lé. Igbçkànlé (igbé, aquele; kàn, mente; le, por cima) é aquiIo sobre o qu<
se deposita a mente, a imaginação. Em outras palavras, aquilo em que st
deposita fé e confiança.
A generosidade, presente em vários odus, constitui no dizer de Comte-
Sponville (1996) a virtude do dom: não consiste apenas em atribuir a cada
um o que lhe compete, mas, indo além, trata de oferecer a cada qual o que vai
além daquilo a que faz jus: trata de oferecer a cada um algo que lhe falta.
O ato generoso agrada ao próprio ori e ao ori de outros. Possui a
força de um grande ebó: atrai energias altamente favoráveis. A generosida­
de, juntamente com a bondade, propicia a hospitalidade; e os efeitos dessas
virtudes beneficiam sim ultaneam ente o seu praticante e as pessoas favore­
cidas: o generoso, benfeitor dos outros e de si mesmo, atrai bem -estar, boas
energias e tudo o que há de m elhor na vida —boas oportunidades e sim pa­
tia das pessoas, nas quais estim ula sentimentos de solidariedade. C om o diz
o provérbio:

Igbá olóorc ki n fç
A iro olóorc ki n fàya
Towó, tomç. ni n ya ilé olóore
A cabaça do benevolente não quebra,
O prato do benevolente não trinca.
Crianças, dinheiro e saúde
Fluem para dentro da casa do benevolente.

Entendida dc m odo mais profundo, a generosidade constitui um


formidável recurso do bem viver e quem a pratica de m odo am plo, geral e

123
irrestrito pode ser considerado tolo aos olhos dos demais, pois o com por­
tam ento do sábio muitas vezes assemelha-se ao do tolo.
Observemos que o gesto generoso dem anda disciplina e tem por trás
de si um a luta pessoal contra impulsos egoístas; e estes dois fatores con­
tribuem para a prom oção de serenidade e de tranqüilidade. Competência
para estragar e destruir todos nós temos; poucos são, entretanto, os capazes
de preservar, corrigir, restaurar e restabelecer. Tais virtudes podem , entre­
tanto, ser desenvolvidas, desde que haja em penho pessoal e disciplina.
O exercício da generosidade exige que se abra mão de parte das pró­
prias regalias ou vantagens em favor de outrem e as energias benéficas gera­
das por essa disposição para com partilhar e servir trazem benesses não ape­
nas para a vida do generoso, mas tam bém para a vida de seus descendentes,
de acordo com as leis que regem um a espécie de genética espiritual.
Uma das principais forças antagônicas à generosidade é a crueldade.
O hom em cruel, èniyàn burúkú, que age para provocar o sofrim ento dos
outros, é grandem ente prejudicado por seus atos mesquinhos. O miserável
não é miserável apenas no que diz respeito a bens m ateriais porque seus
atos provocam antipatia, o que produz um fluxo de energia contrário ao da
Criação, dado que toda a natureza anseia por servir.
À generosidade e à bondade se dá o nom e de ore, que tam bém signi­
fica presente, dom, gratuidade, vantagem, bônus, oblação. O adjetivo cor­
respondente é olore, que significa bondoso, generoso (dono da bondade).
Exploremos um pouco a formação dos vocábulos iorubás designativos
da generosidade e do ato generoso, para melhor alcance de seu sentido. Alguns
desses vocábulos têm em sua estrutura a palavra çwç, mão. llawç, que designa
generosidade e liberalidade, é composto de ila, abrir, e çwç, mão, constituindo
o sentido de abrira mão, e law çéo generoso, o liberal. ítúwçká, que significa
generosidade, mão aberta, ato de abrir as mãos que estavam fechadas, com-
põe-se de itú, desatar, abrir; çwç, mão; e ka, espalhar, expandir. Túwçká é o
liberal, generoso, franco, mão aberta. Estes dois últimos vocábulos encontram
o seu oposto em àitúwçká, em que o prefixo ài, indicador de ausência de um
determinado atributo, confere à palavra o sentido de mesquinhez, ausência de
generosidade, indicando o ato de não abrir a mão, de mantê-la fechada.15
O utros vocábulos relativos a sentim entos profundos carregam em
sua estrutura a palavra inú, que significa barriga, útero, ventre, estômago
( vísceras), interioridade. Vejamos alguns: inúbibí, cólera, zanga, ira, raiva;
inúbúburú, aversão, malevolência; inúdidún, prazer, contentamento, ale-

15 No Brasil usam -se as expressões mào dc vaca e m ào fechada, para referir-se à avareza.

124
°ria; inúdúdú, coração ruim, aversão, maldade; inúfunfun, coração puro,
bom coração. Inúrere (barriga boa, bom estofo, boa interioridade, boa es­
sência) é benevolência, bondade, amabilidade, generosidade; ninúrere (ter
barrina boa. bom estofo, boa interioridade) é o generoso, bondoso, benévo­
lo. ísenúrere é bondade, amabilidade, generosidade; lanú é compaixão, d e ­
mência. generosidade; c òsonú é o homem liberal, espontâneo, generoso. O
Ser Supremo é tam bém ch am ado Arínúróde, Aquele que vê o interior e o
exterior das pessoas, Aquele que vê em profundidade, Aquele que compre­
ende as coisas completa e profundamente.
Favorece a com preensão desses sen tid os lem brar o u tro s vocáb u los
que contêm a palavra inú: binú é zangar-se, enfadar-se, irritar-se; banújç .
é desgostar-se, ofender-se, descontentar-se, afligir-se; dinú é o intratável,
rabugento, mal-humorado, rixento, perverso, irritadiço, maldoso; ibanújçé
dor, tristeza, mágoa; ibinú é ira, fúria, raiva, cólera, zanga; ibinújéé triste­
za, dor, melancolia, mágoa, pesar, angústia; e imúninúdún c alegrar.
Para referir-se à generosidade tam bém en co n tram o s vocábulos
que contém cm sua estru tu ra a palavra ojú, olho, com o ojúrere ( olho
bom. olhar com bons olhos, olhar bondoso, enxergar a necessidade
alheia ou própria), que significa benevolência, ato de generosidade, fa­
vor; isájú ( isá, respeito, estima, honra; ojú, olho: olhar com respeito e
estima, estabelecer empa tia), que significa ato de generosidade, fineza,
favor. Esses vocábulos rem etem ao fato de que a necessidade alheia (ou
a própria) precisa ser inicialm ente vista, identificada, para que possa
então ocorrer o gesto generoso.
Interessante é o vocábulo onibú-ore, aquele que presenteia, gene­
roso. Este vocábulo contém a palavra ibú, designativa de profundeza das
águas, mar, barril grande e repleto. Os iorubás associam, pois, abundância,
fertilidade e prosperidade à generosidade.
Os vocábulos aqui reunidos evidentemente não esgotam o universo
de palavras designativas da generosidade, mas apontam para a im portância
dessa virtude no quadro iorubá de virtudes e valores. Constata-se que a ge­
nerosidade depende de enxergar a necessidade, acolhê-la e a ela responder. A
generosidade age em cooperação com a tolerância, a compreensão empática,
o altruísmo, a complacência, a disposição de não suprim ir a liberdade alheia
e de centrar-se nas necessidades e nos interesses dos outros. Fundam entada
nos princípios da sabedoria, o bem maior, tem o poder de retroalimentar-se.

Vide capitulo 10 - M itos de E xu nos odus de Ifá (iorubá) e capítulo 11 - M ito s d e E xu n o s odus
de Ifá (português). O núm ero (4) refere-se à num eração do odu aqui m encionado.

125
A verdadeira generosidade não dem anda agradecim entos nem an­
seia p o r retribuição. Mas é sempre bom agradecer. Por isso, vejamos agora
a virtude da gratidão.
1 A gratidão, estim ulada p«r algo que se recebeu - uma graça, um dom
ou um gesto de boiidade- é cham ada de ore, O ingrato, mal-agradecido, é
aláimore. A gratidão é bastante valorizada entre os iorubás, e no odu Iretç-
Ogbè (4)lfr temos um a excelente oportunidade de apreender o significado
dessa virtude. Retribuir é recomendável porque as expressões de gratidão
fortalecem o im pulso para o dom e tam bém por ser preciso restituir para
-restaurar-a-forçar-Por exem plo, se um a pessoa é frequentem ente convidada-
para com partilhar refeições na casa de um amigo e nunca o convdda. essa
atilude pode ofender o ori do nmiüo^
Os substantivos imore, opç e isçpé significam agradecimento, gra­
tidão; adúpç significa muito obrigado, grato, agradecido; os verbos sopé e
more significam scr grato-, e o advérbio tçpçtçpç significa de modo agrade-
Kcido. com gratidão.
A ingratidão é designada pelos vocábulos áidúpç, àisçpé e àjesé.
 jçsé significa come e nega que comeu, ou seja, ignora o bem recebi­
do. Em iorubá há m uitos vocábulos para designar o ingrato c o mal-
agradecido: àidúpé. aláidúpé, aláilçpç, aláimoré. alájçsç, jégúnm óyán,
kòmora. láilçpç e láimore, entre outros. O fato de haver tantos designa-
tivos sugere que à gratidão é atrib u íd a grande im p o rtân cia nesse c o n ­
texto cultural.
Há um adágio que diz: Aquele que agradece a graça recebida rece-
berá novas uraças (m anterá a porta aberta para a chegada dc novos favores
e graças). Q uando um a pessoa não reconhece o bem recebido dá a entender
que não precisava dele.
Q uanto à justiça, vejamos o odu Ò gúndá-Ò túrá (10)17, que nos con­
vida a refletir sobre essa virtude, cuja prática dem anda capacidade para dis­
cernir, liderar com sensatez, julgar e agir com im parcialidade. O prim eiro
verso desse odu diz: Se o filho do rei nasce dentuço. não pode tomar em ­
prestado os lábios do escravo para cobrir seus dentes. Porém , paradoxal­
mente, o desenrolar da tram a aponta noutra direção, pois serão m uitas as
prerrogativas do filho do rei ao longo da narrativa. O que é justo? Servir-se
da m esma norm a para todos? Ou reservar a cada um a sua parte, o seu lugar

,fc Vide capítulo 10 - M itos dc E xu nos odus dc Ifá (iorubá) c capítulo 11 - M ito s dc E xu nos odus
dc Ifá (português). O núm ero (4) refere-se à num eração do odu aqui m encionado.
Vide capitulo 10 - M itos dc E xu nos odus dc Ifá (iorubá) e capítulo 11 - M ito s dc E x u nos odus
dc Ifá (português). O n úm ero (10) refere-se ã num eração do odu aqui m encionado.

126
e a sua função, de m odo a preservar a harm onia hierarquizada do conjuntc
Seria justo dar a todos as mesmas coisas, sendo distintas as necessidades
distintos os méritos? Por outro lado, seria justo exigir de todos as mesma
coisas, sendo distintas as capacidades e distintos os encargos? Coloca-s<
assim, o dilema de com o m anter a igualdade entre hom ens desiguais.
A lei, justa ou injusta, é a lei. Enquanto valor e virtude, Lei e Justiç
são distintas uma da outra. Justo é o combate e justa é a desobediência
uma lei injusta. Este princípio rege o com portam ento de Exu no referid<
odu, que narra um a situação em que a escassez de líderes justos e compe
t e n t e s determina-o desrespeito-à-lei pré-estabclecidnrDiam e da difkulda

de, geralmente enfrentada por todos os grupos e com unidades, de teren


boas lideranças, não é possível pensar em desperdiçar um líder. Os lidere.
- de família, aldeia, povoado, cidade, estado, organizações religiosas, em
presariais e sociais —se responsabilizam pela vida do grupo, apoiados na:
recomendações oraculares e realizando os ebós necessários ao progresse
coletivo, sendo por isso denom inados olóri, donos dos oris.
Para além do ideal de justiça en con tram os a nobreza da co m p a ix ã o
Presente nos diversos con textos religiosos, tam bém figura em m u itos odus
Ter com paixão é sofrer com, experimentar simpatia por alguém, sintonizai
com o outro, com p artilh and o seus sentim en tos.
Alanú, vocábulo que significa aquele que é generoso, sente a dor dc
outro, com ele compartilha a sua dor, pode ser traduzido por compaixão,
benevolência; o benevolente é cham ado oniyçnú. Compaixão, piedade,
clemência e generosidade denom inam -se anú, irçnú-anú, inútitç, kikanú.
Fiwéra é a ação de simpatizar, colocar-se no lugar do outro e com­
preender seus sentimentos; bádárò indica, além das ações de simpatizar
e compadecer-se, a de solidarizar-se\ bákçdun é condoer-se, expressar
condolências, solidarizar, compadecer-se ; e kanú é ter compaixão, com­
padecer-se.
Para ouvir o outro é preciso ouvir antes a si m esm o. Vejamos um
exemplo. Consideremos o caso de um a pessoa nascida com osteogenesis
imperfecta, doença de origem genética caracterizada pela fragilidade dos
ossos, e por isso, conhecida com o a “doença dos ossos de cristal”. Seu prin­
cipal sintoma é a ocorrência de sucessivas, e norm alm ente espontâneas, fra­
turas, principalmente dos ossos longos. Suponhamos que um a pessoa de
ossatura saudável ouça o relato biográfico de um portador dessa doença:
Eu era recém-nascida e já trincava por dentro. Trinquei pela primeira vez
aos cinco dias de vida e dc lá para cá, eu já com vinte e três anos, sempre
trincando. Dói muito. Eu trincava e minha mãe ouvia.

127
Um relato desses poderá não encontrar a m ínim a ressonância em
determ inado ouvinte, porém estim ulará um forte sentim ento de com pai­
xão em outro. Um ouvinte empático, ao ouvir o relato, poderá reconhecer
que cada um de nós, de algum m odo, em alguma instância do próprio ser,
“trinca por dentro”. Cada um de nós tem seus pontos frágeis, tem algó den-
tro de si que pode trincar e que em certas circunstâncias trinca mesmo. E
o que mais desejamos ao “trincar por dentro"? Desejamos, e necessitamos,
que alguém ouça, com preenda nossa dor e busque m eios para aliviá-la: ne-
cessitamos da compaixão alheia.
O adjetivo lanú refere-se ao hom em compassivo, dem ente, g e ­
neroso; lunú, niyçnú e ronú são vocábulos que designam o compassivo,
meigo, terno. Sçsçnú é o benigno, bondoso, compassivo, dotado de bom
coração.
O advérbio tanútanú indica compassivamente, piedosamente, com
compaixãcr, e tçdüntèdún indica compassivamente, solidariamente, sentin­
do a dor ou tristeza do outro.
A ausência de compaixão é indicada pelos vocábulos àikanú, insensi­
bilidade, falta de compaixão; àiilajò, àilàniyàn, falta de compaixão, antipa­
tia-, e aláilajò, sem solidariedade, incompassivo, não-zeloso.
Finalmente, tratarem os do perdão, virtude de prática exigente, nem
sem pre fácil. O descontentam ento decorrente de um a razão subjetiva ou
objetiva pode levar um a pessoa ofendida por outra a m aldizê-la e mesmo a
agredi-la através de palavras, desejos 011 práticas mágicas. À praga ou mal­
dição se dá o nom e de abilu, enquanto ao ato de perdoar á dado o nome
foríji. O perdão é considerado um dos cam inhos para a liberdade, como
sugere a palavra idáríji, que reúne os sentidos de perdoar, remir e absolver
ao d e libertar. A associação dos sentidos de libertar e perdoar torna-se niãis
compreensível ao lem brarm os que as relações interpessoais não ocorrem
apenas num plano social, mas tam bém num plano sutil, de trocas energéti­
cas. Segundo essa representação, a ofensa, o agravo, a agressão, estabelecem
fortes elos entre ofensor e ofendido, aprisionando seus oris num vínculo
infeliz, penoso para am bos. O cam inho para a libertação m útua é o perdão,
que elimina tam bém a tristeza decorrente da ofensa. Assim sendo, o perdão
liberta o ori do ofensor e tam bém o ori do ofendido.
Lembremos que no contexto iorubá um a pessoa que faz mal a o utra
pode ser castigada pelo ori do ofendido (ou prejudicado), o que inverte a
direção do fluxo energético, digam os assim. O agredido passa a agressor,
ainda que não deseje isso, pois seu o ri, d ivindade pessoal, assum irá a frente_
em sua defesa e reagirá à agressão recebida. C ertam ente se estabelece, então,

128
um círculo vicioso de sucessivas agressões m útuas que som ente poderá ser
interrompido com o pedido de perdão e sua concessão.
Como vemos, perdoar é mais do que esquecer um a ocorrência desa­
gradável: é remover toda a culpa atribuída ao ofensor. Toro idáríji é pedir
perdão. Pode ocorrer que a mágoa provocada seja tão grande que perdoar
se torne impossível. Neste caso a m aior penalidade para o ofensor, o seu
Pi-ande castigo, advirá dos efeitos do ódio do ofendido, e tais efeitos serão
t3pm mais vigorosos quanto mais forte for o ori do prejudicado, com o su­
gerem as expressões a seguir:

Orí m i d mú e.
Meu ori vai te pegar (te castigar).

Quando um bondoso feiticeiro fica descontente


não pode ser responsabilizado pelo mal que acontece
a quem o provoca.
Porque em sua linhagem não é costume
Utilizar conhecim entos para prejudicar alguém.
Quando ele fica descontente sua magia briga por ele.

Independentemente das decisões tomadas ao nível consciente, seu


ori agirá penalizando ou beneficiando aqueles que lhe causaram prejuízos
ou benefícios. A ação do ori pode, inclusive, contrariar o desejo consciente
de alguém, ou seja, a pessoa poderá dispor-se a perdoar, enquanto seu o ri
opta por castigar. E im portante lem brar que o ori de um a pessoa é onis­
ciente e sabe quando alguém aue em seu prejuízo, m esm o se a ação for sor­
rateira a ponto de ela nunca vir a tom ar conhecim ento disso: ori conhece
cada fato e age em defesa de seu devoto.
Afçsçjinni é um vocábulo composto das palavras a, aquele que; çsç,
transgressão; ji. perdoar; e ni. do ser. Desta composição decorre afçsçjinni,
o benevolente, aquele que consegue, que c capaz de perdoar erros, ofensas c
tmngressôes. Àforiji, vocábulo composto de à, aquele; ori, ori cji, perdoar.
pode ser traduzido por Aquele cujo ori perdoa o ori do outro. Também é
traduzido simplesmente por perdão. O vocábulo fiji, traduzido por perdoar,
absolver, supõe a noção de deixar dc lado, ignorar, deixar pra Iá{ifi) a ofensa
recebida. Dáríji, também traduzido por perdoar, compõe-se de dá, conceder;
on, on;ji, perdão, perdoar; ou seja, conceder perdão ao ori de alguém. Idáríji,
perdão, remissão, absolvição, compõe-se de orí, ori; dá, concede; orí, ori: ji,
perdão. Ou seja, o ato de perdoar implica num a relação entre oris, em que
um determ inado ori perdoa outro. 7/7/7, perdão, remissão de pena , presente,
é vocábulo composto de if(i), o ato de deixar de lado, deixar "pra lá”; e ji]
perdoar. Ifçsçji, perdão de erros ou transgressões, com põem -se de if(i), o ato
de deixar dc lado. çsç, a transgressão e ji, perdoar.
Fica evidente que é preciso u m esforço enorm e/para perdoar urna
ofensa grave e, caso o ofendido se disponha a perdoar, terá que recorrer
a fontes de energia vital para o fortalecim ento da nobreza e da grandeza
de seu ori e obter, assim , a força necessária para p erd o ar e conviver com
as cicatrizes.aima vez que o p erdão não n e u traliza os e io j j Ízos causa-
_ ___çio^. Aquele que pede .perdão en c o n tra nesse gesto a o p o rtu n id ad e de
exercitar a hum ildade, com preendida aqui no sentido atrib u íd o pelos
iorubás a essa palavra, ou seja, associando-a a modéstia, reverência ç
responsabilidade.
Em países da diáspora iorubá pode ocorrer - c geralm ente ocor­
r e - a atribuição de um a carga sem ântica à palavra perdão, carga essa
alheia ao contexto cultural de origem . Sob a influência sim ultânea do
catolicism o, m uitos grupos religiosos de m atriz iorubá relacionam o
perdão à noção de pecado, interpretação esta alheia à concepção negro-
africana.
O utro fato interessante é que alguns vocábulos iorubás m ostram que
as transações hum anas que envolvem o pedido e a concessão de perdão dei­
xam de fora a ação das divindades e do Ser Supremo. O perdão é solicitado
e concedido, ou não, no âm bito das relações hum anas, sem envolver Ele-
dunm are ou os orixás. O assunto é tido com o assunto entre pessoas, numa
relação marcada por um gesto ofensivo, que determ inará um a interação
de oris, para além das relações estabelecidas no plano social. O perdão da
ofensa tam bém deve processar-se nesse âm bito sutil.
Para que essa noção fique mais clara, parece-nos interessante apre­
sentar um relato parcial da biografia de À ypká18, m ulher iorubá que trans­
grediu norm as da relação interpessoal estabelecida com sua irm ã e que foi,
depois, perdoada.
À yçká estava com 52 anos quando narrou sua história:

Sou a quinta filha de um a família de treze filhos —sete meninas


e seis meninos. M inha família era de Ibadan. Casei aos dezoito anos e
fui m orar em Lagos, onde nasceu meu primeiro filho. Separei de meu
marido aos vinte e um anos e vim m orar em Abeokutá, com uma de

11 T rata-se dc um dos relatos biográficos registrados por Ribeiro (1987). O nom e À ypká é fictício.

130
minhas irmãs, que era casada, porém não tinha filhos. Ela vendia b rin­
cos, pulseiras e colares e eu passei a trabalhar com ela. D urante quatro
anos vivemos na mesma casa. Ela, com seu m arido e seu filho, e eu
com o meu.
Aos vinte e-cinco anos casei de novo e tive um casal de gême­
os. Já não morava mais com m inha irmã, m as ainda trabalhávam os
juntas. Q uando eu estava com vinte e sete anos, m inha irm ã e meu
cunhado resolveram tentar a vida em Gana e deixaram toda sua m er­
cadoria sob meus cuidados. A mercadoria, de altíssim o valor, deveria
- s e r comercializada por m im e eu tinha que guardar o dinheiro até
eles voltarem.
Passados cinco anos eles retornaram. Logo me procuraram para
receber o dinheiro da m ercadoria que haviam deixado sob meus cui­
dados. De foto, eu vendera tudo, mas dinheiro não havia nenhum por­
que com os lucros dessa venda eu com prara um excelente terreno para
mim e já começara a construir uma bela casa. Estava com trinta e dois
anos e tinha um lugar na feira e era lá que eu vendia as jóias e bijute-
rias. Minha irmã me procurou na feira, pedindo para trabalhar comi­
go, mas não aceitei porque não queria dividir lucros com ninguém.
Ela ficou com um a raiva enorm e e naquele dia começou a guerra: fez
magia para im pedir o progresso de minha construção e a casa, que já
estava construída até a altura do telhado, parou ali mesmo. Passados
dez anos continuava assim, por mais que eu m e esforçasse.
Meu segundo m arido m orreu quando eu estava com trinta e
nove anos e eu quis continuar m orando com a família dele. Não ha­
via nenhum hom em de sua família que pudesse casar-se comigo e
eles concordaram que eu nam orasse outros hom ens, desde que fosse
com finalidades m atrim oniais. Enquanto isso, m inha irm ã não de­
sistia. Procurou apoio para suas reclamações em nossa família, mas
não encontrou. Então me atacou com mais força, querendo que eu
ficasse louca. Conseguiu. Perdi totalm ente a razão e m eus filhos fica­
ram desesperados. Conseguiram curar-m e graças à ajuda da m edi­
cina tradicional.
Casei de novo aos quarenta e três anos e tive m ais um filho.
Tinha sido curada da loucura, mas algum a coisa ficara. Comecei
a beber e fum ar m aconha. M esm o querendo m e controlar, não
conseguia. Bebia até cair, ficava caída horas e horas, até conseguir
andar de novo. Meus filhos foram m uitas vezes pedir ajuda para
minha irmã, mas ela recusava, dizendo: “Não sou irm ã dela. Não

131
temos o mesmo sangue. Não temos a m esma mãe nem o mesmo
pai”. Meus filhos ficavam desesperados.
Meu terceiro m arido não su portou viver comigo. Eu queria
me libertar dos vícios e não tinha força. Procurei um babalaô e
Ifá recom endou que eu pedisse perdão à m inha irm ã. Da prim eira
vez que pedi, ela não concedeu. De o u tra vez retornei à sua casa,
acom panhada de todos os meus filhos para pedir que me perdoasse.
Eu precisava do perdão dela pra poder me curar.
Q uando m inha irm ã foi procurada por todos nós juntos, final­
mente o seu coração abrandou. Foi então que eu melhorei, embora
não tenha me curado inteiramente.

Com essa narrativa encerram os a apresentação das principais virtu­


des praticadas pelos iorubás, cham ando atenção ao fato de estar bastante
desenvolvida a consciência coletiva deste grupo étnico no que diz respeito à
responsabilidade pessoal pela felicidade (ou infelicidade) individual e cole­
tiva. Com partilham , assim, de alguns preceitos universais: os de adotar uma
postura de não aceitação da vida tal como se apresenta, ou seja, de assumir
responsabilidade pelo próprio cam inho de vida e buscar m elhorá-lo mais e
mais. Convencidos de que a vida, tanto a nossa quanto a dos outros, pode
ser mais bela e mais feliz, furtam -se à tentadora interpretação de atribuir a
causa dos males ao destino, às divindades, aos ancestrais, a outras pessoas.
Na verdade, o grande responsável pelo bem -estar de um a pessoa é ela pró­
pria. O próprio homem: eu, você...
Aqui concluímos a Parte I desta obra. A Parte II versará sobre aspec­
tos teológicos e litúrgicos do culto a Exu e abordará a questão relativa aos
sérios equívocos relativos à natureza e função deste orixá primordial.

132
P a r t e II

Exu: aspectos teológicos e litúrgicos

C a p ítu lo 4 Natureza c ação de Exu


Ca pítu lo 5 Exu e o destino hum ano
Ca pítu lo 6 A dinâm ica estabelecida entre
ori e iwá e a ação de Exu
C a p ítu lo 7 Símbolos, rituais e oferendas
C a p ítu lo 8 (In) Com preensão de Exu no continente de
origem e em países da diáspora
C a p ít u lo <

Natureza e acão
& de E x l

A ordem surge do caos e a justiça, muilas vezes, é conquistada através


de lutas contra a injustiça. Exu, detentor dos princípios básicos da paz e da
harmonia, regula a ordem , a disciplina e a organização, opostos da desar­
monia, da desordem e da confusão.
Como vimos cm capítulos anteriores, os orixás, criados p o r Eledun-
mare, receberam cada qual um a determinada qualidade de axé, sendo que
cada uma dessas qualidades cum pre função específica. C om pete aos ho­
mens solicitarem aos orixás as forças específicas necessárias para a solu­
ção de problemas igualm ente específicos. Essas forças da natureza não são
boas e nem más em si mesmas: são forças neutras que podem sujeitar-se
à vontade hum ana, de m odo que os homens podem servir-se delas para
atingir seus objetivos, sejam eles benéficos ou não. Este é o contexto a ser
considerado quando nos propom os a debater a questão de ser Exu um ser
de natureza benevolente ou m alévola.1
Assim sendo, não é adequado nos referirmos aos orixás com o m a­
lévolos ou destrutivos, pois malévolos não são eles, e sim as pessoas que
utilizam o axé dessas divindades para atingir objetivos m esquinhos ou es­
cusos. Buscando isentar-se da culpa mobilizada por seus pensam entos e
sentimentos destrutivos, algumas pessoas atribuem aos orixás a responsa­
bilidade pelo mal realizado. O axé dos orixás é um a força neutra que opera
de acordo com a vontade hum ana.

1Os debates sobre a natureza benevolente 011 malévola de Exu são válidos para os dem ais orixás.

139
Exu, orixá capaz de m anifestar-se sob m ilhares de form as, é d o ­
tado de potencial para a realização dc atos m aléficos. A lgum as pessoas
servem -se desse potencial para causarem mal a o u tras e, ao atribuírem
a responsabilidade pelos próprios atos a Exu, isentam -se desta respon­
sabilidade.
Exu é personagem controversa, talvez a mais controversa dc todas as
divindades do panteão iorubá. Alguns o consideram exclusivamente mau,
outros o consideram capaz de atos benéficos e maléficos e outros, ainda,
enfatizam seus traços dc benevolência. Em grande parte da literatura dis­
ponível Exu é apresentado como um ser am bíguo, entidade neutra entre
o bem e o mal ou, ainda, com o sim ultaneam ente bom e mau. Há quem se
refira a ele como inimigo do hom em . Não é esta a posição adotada por nós.
Um provérbio iorubá elucida a respeito dessa atribuição feita ao orixá Exu:
Olóóótç ni çtá ayé - quem diz a verdade é inimigo dos seres.
As muitas faces da natureza de Exu acham-se apresentadas nos odus
e em outras formas dc narrativa oral iorubá: sua com petência com o estra­
tegista, sua inclinação para o lúdico, sua fidelidade à palavra e à verdade,
seu bom senso e ponderação, que propiciam sensatez e discernim ento para
julgar com justiça e sabedoria. Estas qualidades o tornam interessante e
atraente para alguns e indesejável para outros. Por quê?
Porque, de um lado, é sempre interessante para os indivíduos e os
grupos a possibilidade de ter em quem confiar, de poder contar com quem
cum pra fielmente os seus compromissos. Quem não deseja estabelecer par­
ceria com aqueles nos quais se possa confiar em qualquer circunstância?
Quem não quer ser parceiro daqueles que não faltam nem falham, silen­
ciam sobre segredos que lhes são confiados, zelam por bens materiais en­
tregues a seus cuidados e os restituem quando solicitados?
Por outro lado, porém , tais parceiros são necessariamente criteriosos,
exigentes, disciplinadores, o que pode ser bastante incôm odo para aqueles
que não optam pelo próprio desenvolvimento. Exu, disciplinador, exige or­
dem e organização.
Exu, o inspetor dos rituais, quando manifesta a verdade, nem sem­
pre agradável de ser ouvida, pode ser considerado um inimigo. Segundo
entendemos, Exu é um grande amigo e essa com preensão a respeito de sua
natureza encontra fundam ento em m uitos odus de Ifá, alguns dos quais
serão apresentados adiante.2

: Vide capitulo 10 - M itos de Exu n o s odus dc Ifá (iorubá) c capítulo 11 - M itos de £vu no s odus
d e Ifá (português).

140
Entretanto, um prim eiro contato com o coipus da tradição iorubá,
tendo em vista o objetivo de com partilhar conhecim entos sobre sua natu­
reza e responsabilidades no equilíbrio pessoal c cósmico, pode ser favore­
cido pela apresentação de alguns de seus epítetos e orikis.5 Cabe observar
que os iniciados e os devotos de Exu usufruem do privilégio de poder com ­
partilhar com esse orixá os seus inúm eros atributos: cada epíteto refere-se a
um axé específico. Iniciados e devotos podem com partilhar com Exu cada
uma dessas qualidades de seu axé.

Epítetos e orikis do orixá prim ordial Exu


Agúnbíadé: Esbelto, forte e firme como uma coroa real. Nom e que faz
referência a sua realeza. Seus devotos, quando iniciados, passam a
integrar sua linhagem real.
À jígidán-irin: Resistente e indestrutível. Nom e que faz referência à inven­
cibilidade de Exu, que não perde um a única disputa.
Alágógo-ijà: literalmente, Senhor do sino da discórdia. Remete à ideia de
que a ausência de seu axé favorece a ocorrência de desordem no âm ­
bito individual ou no coletivo. Q uando um a pessoa está agressiva,
fora de controle, causando confusão, ou quando há pessoas brigan­
do, se diz que Exu está tocando seu sino da discórdia nas proxim i­
dades. Nas orações a ele dirigidas pede-se que não toque seu sino no
lar dos que oram . A ausência de disciplina e de responsabilidade cria
condições desfavoráveis. Exu é prom otor da disciplina e da organi­
zação, associadas, evidentemente, a com prom isso e responsabilida­
de. Q uando esses elementos estão ausentes, as condições se tornam
desfavoráveis e propícias à confusão e aos m al-entendidos. Com o as
pessoas preferem atribuir a outros a responsabilidade pelos próprios
fracassos e sofrimentos, muitas vezes, e im propriam ente, atribuem
a causa das discórdias a essa divindade e não às próprias omissões e
falhas. Este equívoco a respeito das causas do sofrim ento e da infeli­
cidade favorece a interpretação de Exu como divindade ambígua. Na
realidade a desordem ocorre na ausência do axé de Exu.
A lágbára: Forte, Poderoso, Incansável; Aquele que influencia a vida das
pessoas para que sejam mais fortes.
A lákétu: Rei da cidade de Kétu. Refere-se à sua realeza.

’ A palavra oriki, com posta de ori, origem, c ki, saudar ou louvar, significa saudar ou louvar o ori
ou a origem daquele a quem se refere. Vide capitulo 12 - Oriki, àdúrà c ibà È fú. Evocações, rezas
e saudações a Exu.

141
À làm u lán iú -b à tá : nom e que denota o bom hum or de Exu e a alegria que
ele traz para a vida das pessoas. D urante suas festas, ao som do tam ­
bor bàtá, é insistentemente evocado através desse nom e, o que con­
duz seus iniciados ao transe.
A lán g ájígá: Aquele que apóia, dá suporte, protege; Aquele que traz vida;
Aquele que prom ove o crescimento hum ano.
A rá b á n d é : Aquele que chega com todo o vigor de sua natureza. Refere-se
ao vigor trazido pelo orixá ao corpo das pessoas.
A tçlé E lçdàá: Aquele que acom panha o hom em e lhe concede sorte e pros-
peridade;-Aquelequeatrai<ondições-para-a realização de unrdestino—
feliz; Aquele que não abandona o hom em nos m om entos difíceis;
Aquele que m ostra ao hom em o cam inho e protege o seu ori.
A tú k á-m àásesàá: Aquele que rom pe em fragmentos que ninguém poderá
reunir. Refere-se a seu poder de destruição com o parte do processo
de m utações contínuas do universo. É inimaginável um m undo sem
mutações, e com o toda m utação pressupõe fases de rom pim ento,
cisão e destruição, a Exu com pete a tarefa de prom over m etam or­
foses.
B ará: Aquele que age rapidam ente; Forte; Eternam ente Vigoroso.
E légbèjé A dó: Aquele que dom ina òògún * a arte mágico-medicinal; Pos­
suidor de inúm eros poderes de cura e de elim inação do sofrimento;
Feiticeiro; Dono de milhares de àdó?
E rú : O Grandioso.
È b ita O k u n riii: Hom em poderoso, habilidoso.
E légbà, L ççgbáa: Aquele cujo poder salva; Sábio; Potente; Poderoso; De­
fensor; Acolhedor; Aquele que concede poder ao hom em para que
seja bem-sucedido.
E légbàá-Ò gç: literalmente, Possuidor de centenas de porretes na nuca. já
que os porretes são usados por Exu na defesa contra inimigos que ata­
cam pelas costas. Refere-se ao fato de Exu possuir duas faces, podendo
enxergar na frente e atrás: qualquer que seja a sua posição, ele tem
dom ínio de tudo. Os porretes m encionados são recursos de defesa,
atuando como se fossem braços. Defender-se de inimigos que atacam
pelas costas tem duplo sentido: a defesa contra o que não se vê porque
ocorre atrás de nós e a defesa contra atos e fatos do passado, pois Exu,
como todos os demais orixás, pode agir sobre eventos passados.

* Vide capítulo 1 - Noção iorubã de pessoa c práticas m ágico-m edicinais.


5 Pequena cabaça utilizada para a conservação de pós de efeito m edicinal e mágico

142
Elcgbára: Aquele cujo poder salva; Sábio; Potente; Poderoso; Defenso
Acolhedor; Aquele que concede poder ao hom em para que seja ben
sucedido.
Igbá-K eji-E lédünm arè: Assistente de Eledunm are na terra; Presença c
Deus na terra. Refere-se à sua função de inspetor dos rituais e c
prom otor do fluxo de axé entre o m undo visível e o invisível.
Iràw ò-À kódá: Primeira estrela a ser criada; Prim eiro poder a ser criadc
Organizador do caos que precede a criação; Prim ogênito; Alicerc
de tudo o que existe; O Prim órdio; Aquele que vinga mais; Aquel
—qtie-é_m aior que os outros; Aquele que influencia os demais. Todã
essas ideias associam-se à ideia de prim ordial. Sendo a hierarquia ur
elemento fundam ental na sociedade iorubá, e cabendo a lideranç
aos mais velhos, a Exu com pete liderar os demais orixás, por su
senioridade, sua condição neutra e sua capacidade de prom over <
que é justo.
Fwà: Aquele que tem caráter e personalidade e influencia o caráter e a per
sonalidade das pessoas, através do fortalecim ento de suas virtudes.
Láafívàn: forma de evocar Exu para realizar pedidos especiais, desfaze
confusões, esclarecer dúvidas.
Láàlú: Famoso; Aquele que harm oniza a cidade ou a com unidade. Ess<
nom e denota seu poder organizador e sua popularidade entre as pes
soas e os demais orixás.
Láaróyè: Aquele que é louvável; Aquele cujo nom e é sem pre lembrado
Aquele que confere sentido à vida. Forma de saudar Exu, evocandc
seu poder de com unicação e sua função de com unicador.
L áarúm ò: Senhor da sabedoria e dos cam inhos da vida; Aquele que tem c
poder de unir.
Látoópa: Orixá da ordem e da disciplina, que conduzem à perfeição; Orixá
que zela pela obediência a princípios.
Lçégbáa, Élçgbà: Aquele cujo poder salva; Sábio; Potente; Poderoso; De­
fensor; Acolhedor; Aquele que concede poder ao hom em para que
seja bem-sucedido.
Légbara: Aquele cujo poder salva; Sábio; Potente; Poderoso; Defensor;
Acolhedor; Aquele que concede poder ao hom em para que seja bem-
sucedido.
Lóògçmo ò ru n : Indulgente filho de Eledunmare; Aquele que conhece a
dinâmica dos m undos visível e invisível e estabelece comunicação
entre esses m undos.
Olóògün-àjísà: Feiticeiro infalível; Poder confiável ao qual recorrem ini­

143
ciados c devotos para utilizá-lo visando alcançar seus objetivos. É
evocado pela m anhã para, com sua força, abençoar o dia que nasce e
para proteger e abençoar todos os com portam entos e todas as ocor­
rências desse dia. Com este mesmo sentido o epíteto Olóògún-àjisà
é utilizado no início de qualquer projeto ou jornada, para que haja
sucesso no em preendim ento. De um m odo geral, o sim bolism o re­
lativo ao início da m anhã aponta para a possibilidade de reatualizar
a força presente no m om ento da criação do universo. A referência a
ser evocado logo de manlul, ou logo pela manhã, diz respeito ao fato
de que no princípio da m anhã há mais energia disponível, o axé está
mais forte. Q uando se trata da existência hum ana, logo de manhã diz
respeito à juventude.
Olówó O risà: Orixá que traz dinheiro, fortuna c prosperidade para os se­
res hum anos e para os demais orixás.
O liilànà: Dono dos cam inhos abertos; Aquele que abre cam inhos para
quem recorre a ele em busca de alívio para dores e sofrimentos e
para resolver situações de confusão e desorientação; Aquele que
transm ite o conhecim ento e a sabedoria necessários à realização de
um bom destino. O epíteto sugere que as pessoas têm livre-arbítrio e
podem alterar os seus destinos graças à aquisição de conhecimentos
que favorecem m udanças em suas atitudes e condutas. É im portan­
te salientar que, segundo a concepção iorubá, as m udanças na vida
dependem principalm ente da própria pessoa, que deve ter, antes de
mais nada, disposição para mudar. Ao receber orientação do sacerdo­
te e seguir suas recomendações (de ebós e iniciações, por exemplo),
a pessoa promove alterações energéticas favoráveis à ampliação de
sua consciência, fator indispensável para a prom oção das mudanças
de atitudes e condutas necessárias. De m udanças pessoais decorre a
possibilidade de equacionar conflitos e aliviar sofrim entos.
O nílc-oríta: Guardião das casas, das cidades e dos espaços físicos; Divin­
dade que habita as encruzilhadas. Este nom e revela sua aliança com
Iyami Oxorongá, as Mães Ancestrais, sábias veneráveis, que com ele
com partilham os ebós e a responsabilidade de aliviar o sofrimento
hum ano. Nas encruzilhadas os cam inhos se cruzam dando lugar a
novas possibilidades. Nas encruzilhadas o orun encontra-se com o
aiye, o m undo espiritual encontra-se com o material e o invisível
encontra-se com o visível, am pliando as possibilidades de realizar
um bom destino.
O nínú Fufu: Temperam ental, de personalidade forte, que com bate a im­
rr. ■

paciência, a teimosia, a incom petência. C om o grande parte da ação


de Exu é exercida sobre o desenvolvimento das virtudes no hom em ,
e os hom ens, em geral, têm dificuldade para reconhecer as próprias
falhas, sua ação é m al-interpretada.
Òrisà-olómo: Orixá que traz filhos; Orixá que protege seus filhos (inicia­
dos e devotos). Refere-se à fertilidade favorecida por Exu, à vitória
sobre a esterilidade de qualquer natureza e à virilidade.
Obaàsin: Rei venerável.
Oba Siiúrú: Rei da paciência. Exu favorece os esforços hum anos de prática
da paciência, virtude capital.
Òdàrà: Benevolente; Bom; Belo; Razoável; Aquele que realiza o bem (e
promove estas qualidades nas pessoas).
Okünrin-gògòrò: H om em alto.
O kúnrin-kúkúrú: Hom em baixo. Este designativo, associado ao acima
apresentado, indica sua versatilidade e seu poder dc transformação:
ambos assinalam o fato de ele ser dotado de m últiplas possibilidades,
algumas das quais aparentem ente contraditórias.
Omo-Elçbo: Responsável pelo encam inham ento do ebó a seu destino.
Òséçtíirá: Aquele que remove a dor e harm oniza. Nome mítico referente à
amizade entre Exu e O runm ilá. D urante os rituais c evocado por esse
nome, tornando-se mais ágil no transporte do ebó.

Como vemos, o núm ero de epítetos de Exu é bastante expressivo,


sem equivalentes no panteão dc orixás.

Exu, o benevolente/Exu, o m alévolo


Quem é de fato o inim igo do Homem?
O divino e incom ensurável gera tem or e, ao m esm o tem po, recor­
re-se a ele como fonte de coragem e força. Entre os devotos de orixás, Exu
é considerado o mais poderoso por sua presença constante em todas as
ocorrências da vida. Sua presença indispensável, ju n to aos orixás e aos seres
humanos, o torna m uito atraente. Depois de term os apreciado seus epítetos
e orikis, vejamos alguns provérbios e rezas para m elhor apreenderm os sua
natureza e funções.
Alguns atos hum anos são interpretados com o sendo da responsabi­
lidade de Exu. Por exemplo, no dito popular:

Èsú á máa sc èniyàn lu omç çgbç rè.


Exu m anipula um a pessoa jogando-a contra outra.

145
Com o interpretar esse dito? As pessoas que não estão abençoadas pela
paciência incorrem em atitudes violentas. Há aqui um a referência ao fato
de haver interferência de Exu no processo de discórdia entre duas pessoas,
com o se Exu m anipulasse um a delas, atirando-a contra outra. Considere­
mos um fato frequentem ente observado: m uitas pessoas buscam isentar-
se de responsabilidade pelos próprios erros e fracassos. É com um vermos
pessoas atribuindo aos orixás a responsabilidade por atitudes e com porta­
m entos danosos que, de fato, são de inteira responsabilidade delas mesmas.
Então, cabe a pergunta: por que se atribui a Exu e não a outro orixá a ação
________ de-jogar uma-pessoa contra outra?-------------------------------- ----------------------
Por ser ele o guardião de todas as formas de personalidade, das fei­
ções boas e más da conduta hum ana. Por residirem nele todas as possibili­
dades da ação - de hum anos e de orixás. De fato, Exu é neutro e dotado de
extraordinária capacidade de discernir.
O provérbio em questão, referindo-se a um a situação de discórdia
prom ovida por impaciência, remete a Exu, Qba Súúrú, o Rei da paciência,
com o tendo sido o prom otor das desavenças, isentando assim as pessoas de
sua responsabilidade em adotarem a paciência com o critério de ação, parti­
cularm ente nas situações em que as relações se tornam mais tensas.

Çni Èsú bá nse kíi mò


bí ó bá fí olmn tirç sílè
hkan çni çlçni ni máa n wá kirí.

Quem está sob a influência de Exu


não percebe quando abandona sua propriedade
e invade a propriedade dos outros.

Esse provérbio faz referência a um a pessoa que, sob determ inada in­
fluência energética, fica desnorteada e, não percebendo os próprios limites,
com porta-se de m odo inconveniente. A energia de Exu pode, de fato, alte­
rar o estado de consciência de um a pessoa e torná-la inadequada. O que
questionam os aqui é a quem com pete a responsabilidade p o r esse efeito
danoso. Enfatizamos que essa responsabilidade é da pessoa que manipula
essa energia, e não da divindade propriam ente dita.

Èsú Io si ilé lágbájú


K i o máa lç fí ori akç
gbá ori abo

146
Exu, vá à casa da família de Fulano
e os induza a brigar.
Faça todos se desentenderem.

Neste provérbio observamos, novamente, que a responsabilidad<


pela promoção de discórdia não deve ser atribuída à divindade, e sim ;
pessoa que se serve dessa energia.

Èsú fún lágbájá Içmç


---------tTÕ~tâ~di
kí ó gbé çmo nlá irá

Exu! Dé fertilidade a Fulana.


Quando chegar o próxim o ano
que ela venha para a sua festa carregando um bebê grande.

Aqui, Exu é evocado com o Òrísà-çlçmç, Aquele que traz filhos. In­
teressante notar que, neste exemplo, busca-se através de oração a energia
da divindade para obtenção de um efeito benéfico. A responsabilidade poi
essa busca e pelo efeito decorrente é da pessoa que, tam bém neste caso.
recorre à energia específica de Exu em benefício de outros.

■•' Fún tra lówó o. Elçgbárã.


Pèsè fún \va o
K í á má rijàmbá ayé o.

Nos dé dinheiro, Elegbara.


Nos presenteie com tudo o que buscamos
para que o m undo não se volte contra nós.

Aqui Exu é evocado com o Olówó Orisà, o orixá que traz dinheiro
(fortuna e prosperidade) e a quem se pede a concessão de qualidades que
conduzam à obtenção de bens materiais.
Podemos constatar a partir desses provérbios e orações que tudo o
que se atribui a Exu resulta, de fato, de uma força neutra utilizada pelas
pessoas para o bem ou para o mal, cabendo a elas a responsabilidade por
seu uso. O mesmo vale para todos os orixás. Convém reconhecer que quem
realiza um pedido que acarreta algum mal a outrem está sem pre buscan­
do com íg s o a satisfação de um desejo ou necessidade pessoal. Temos um

147
bom exemplo disso nas situações competitivas, em que um indivíduo pede
a Exu (ou a outro orixá) que neutralize a força de seus concorrentes, ou
seja, busca utilizar a energia dos orixás para agir sobre outras pessoas de
m odo a lhes causar danos ou prejuízos. Nas situações de concorrência ou
competição, para que um seja beneficiado, sem pre haverá outros que serão
prejudicados.
O que estamos querendo enfatizar é que Exu não se apraz no mal,
nem é o inimigo do hom em . Inimigo do hom em é outro hom em que lhe
deseja o mal e que pode servir-se do axé da divindade para alcançar seus
objetivos. Inimigo do hom em é tam bém o próprio hom em que, servindo-
se do axé da divindade, age frequentem ente contra os próprios interesses,
em bora possa não se aperceber disso.
Q uando um a pessoa nutre pensam entos e sentim entos de antipatia,
ódio ou inveja por outra pessoa e serve-se da energia de Exu (ou de outro
orixá) para dirigir o mal a sua vítima, im ediatam ente o ori do receptor
ressente-se e a eficácia do mal será tanto m aior quanto mais indefeso esti­
ver este ori.” Se o receptor estiver protegido pelo axé de Exu (ou de outro
orixá) ou por algum recurso mágico, o mal a ele enviado será neutralizado.
Q uer o receptor esteja protegido ou não, o mal em itido retornará à sua
fonte. A mesma dinâm ica vale para o bem.
Toda pessoa é, em si, um m icrocosmo inserido num universo dinâ­
mico. Mais fácil é intuir do que alcançar por vias racionais a enorm e com­
plexidade do jogo dc forças biológicas, psicológicas, sociais, econômicas e
políticas, continuam ente carregadas de axé, cuja qualidade e cuja quantida­
de podem variar. E de fato variam.
Tomemos um exemplo para ilustrar. Considerem os alguns aspectos
da interação de um indivíduo com seu am biente social, apenas um a das
dim ensões envolvidas no complexo m encionado. Para brincar um pou­
co com aspectos parciais da complexidade da interação indivíduo-grupo,
vamos recortar dois aspectos do âm bito psicológico para considerar mais
atentamente: de um lado as principais necessidades possíveis de um a pes­
soa, e de outro lado as principais pressões possíveis de um ambiente.
Na maioria das sociedades as pessoas têm necessidade de (1) afiliar-
se, ou seja, de estabelecer associações afetivo-emocionais; (2) manifestar
impulsos agressivos e impulsos altruístas; (3) oferecer e receber apoio; (4)
adquirir bens, inclusive os materiais; (5) autodefender-se física e psicologi­
camente; (6) adquirir autonom ia e conhecim entos; (7) dom inar ambien-

* Para melhor compreensão dessa dinâmica dc forças, vide capítulo 2 - 0 divino na tradição dc orixás.

148
tes c pessoas; (8) entreter-se; (9) pertencer a grupos; (10) autoafirmar-se;
( 11 ) estabelecer ordem e organização; (12) realizar e autorealizar-se; (13)
reconhecer a si mesmas e ser reconhecidas; (14) recusar algo ou alguém
negativo; (15) reter algo ou alguém positivo; (16) experim entar prazeres
sensoriais.
Por outro lado, entre as principais pressões possíveis de um am ­
biente, na maioria das sociedades, poderíam os identificar as seguintes: (1)
ausência de apoio familiar devida a discordâncias culturais ou familiares,
a uma disciplina instável, à ausência, enferm idade ou m orte de um dos
genitores ou de m em bros significativos do grupo familiar, à pobreza, à au­
sência de um princípio familiar norteador; (2) perigo físico devido à au­
sência de proteção contra ameaças físicas e naturais; (3) faltas ou perdas de
alimentos, recursos, com panhia; (4) escassez ou ausência de possibilidades
de afiliação, seja de amizade ou de am or; (5) agressão física, psicológica,
social; (6) dominação por coerção, restrição, indução, sedução, proibição,
interdição; (7) inferioridade física, psicológica, social; (8) ausência de apoio
material e emocional; (9) decepções e traições; (10) ausência de deferências
e reconhecimento; (11) rejeição, desprezo; (12) com petição, rivalidade.
Construída essa listagem, evidentemente não exaustiva, de fatores de
ordem pessoal^ de ordem ambiental, poderíamos dizer: sim, mas cada pessoa
tem suas peculiaridades e reage de modo peculiar a cada situação. É fato. Assim
sendo, ao considerarmos as possibilidades de interação entre, de um lado, as
principais necessidades possíveis de uma pessoa e, de outro lado, as principais
pressões possíveis de um ambiente, convém lembrar que os estados subjetivos
também variam, pois sofrem influência de decepções, desilusões, depressão,
aflição, melancolia, mágoa, desespero, abatimento, alegria, felicidade, excitação,
amor, desconfiança. Isso sem falar dos conflitos que produzem oscilações entre
passividade e atividade, entre dependência e independência.
E esse exercício de listar fatores envolvidos na relação imediata de
uma pessoa com seu entorno mais próxim o pode nos rem eter à extrema
complexidade de relações entre cada pessoa, um microcosmo, e as m últi­
plas dimensões do cosmo por ela habitado (e que tam bém a habita). Esse
simples exercício, que tim idam ente nos sugere o quanto é complexa a di­
nâmica hom em -hom em e hom em -entorno, talvez possa favorecer nossa
reflexão a respeito da ação do orixá Exu.
Por exemplo: ao recorrerm os a Exu solicitando a destruição de nos­
sos inimigos, entre esses inimigos certam ente incluem -se os agentes res­
ponsáveis pelas principais pressões de nosso am biente externo. Mas não
apenas isso. Entre nossos inimigos incluem-se tam bém os agentes respon­

149
sáveis pela dificuldade ou impossibilidade de satisfação de nossas principais
necessidades e, com o sabemos, alguns de nossos estados subjetivos também
agem contra nós. Ou seja, há inimigos que nos habitam : ansiedade exces­
siva, insegurança, preguiça, indisposição, indolência, fraquezas de caráter,
falta de seriedade, de responsabilidade, de disciplina, decom prom isso, de
organização e_de_ordem mental, entre tantas outras possibilidades^ "
A partir destas considerações talvez possamos compreender melhor o
alcance da ação de Exu: ao ser invocado ele disponibiliza o axé necessário à des­
truição dos inimigos, quer sejam eles agentes externos, quer sejam habitantes
dc nossa interioridade. Ou *seja, Exu é inimigo de nossas fraquezas. Essa noção a
respeito do poder de ação do orixá poderá ir se fortalecendo ao longo da leitura
deste livro, particularmente durante a leitura dos odus, dos orins e de outras
formas narrativas da tradição oral iorubá, apresentados adiante.

Exu e o Espaço
A encruzilhada, a feira, o o ru n e o aiye
Exu pode ser evocado através de orins, orikis, aduras, ibás e oferen­
das. É particularm ente atuante nas encruzilhadas, na feira e nos locais em
que seu assentamento é colocado. Conform e já m encionado, a encruzilha­
da, não im porta o núm ero de ruas que a constituam , representa o ponto de
encontro de caminhos: de Exu, das Iyami Oxorongá, dos ajogún2, dc outros
orixás c dos hum anos. Simboliza tam bém , com o já vimos, o encontro entre
o invisível e o visível, o espiritual e o terreno.
O utro local de forte presença de Exu é a feira, espaço de trocas, de
com pra e venda, de elementos associados à riqueza, à fortuna e ao dinheiro
e sua carga energética. A feira é tam bém o local onde ocorrem negociações
e parcerias, onde se estabelecem relações de confiança e desconfiança, de
vantagens e desvantagens. Exu rege, pois, a feira e as relações que envolvem
dinheiro.

Exu na relação com hom ens e m ulheres


A influência desse orixá sobre os destinos, inclusive corrigindo ca­
m inhos cuja escolha foi determ inada por um m au ori, é possível, desde que
seus princípios sejam adotados e respeitados: ordem , organização e disci­
plina. Esses princípios manifestam-se através da prática de virtudes como
lealdade, respeito, coragem, perseverança e, principalm ente, paciência.

: Scrcs míticos que estabelecem a comunicação entre o aiye c o orun. Alimentam-se do ebó (absorvem as
energias indesejáveis associadas aos problemas) e transportam o axé dos orixás. Ou seja, sua ação é dc
mão dupla: levam as energias deletérias próprias dos problemas c trazem o axé dos orixás.

150
D iante de situações de sofrim en to ou insatisfação, o h o m e m que
p reten d e buscar o ap oio d o s orixás adotará c o m o p rim eiro p ro ced im en ­
to a busca de um sacerdote que possa realizar um jo g o d iv in a tó rio para
diagnóstico da estrutura e d in âm ica de suas co n d içõ e s existenciais. T o d a
consulta oracular inclui a recom en d ação de ebós, oferendas, e u m a o rien ­
tação relativa à necessária m ud ança de hábitos e co m p o rta m e n to s, para
que ocorra a cura ou a recuperação d o eq u ilíb rio abalado. P o r vezes é feita
a recom endação de in iciação em algu m orixá, para q u e a p essoa p ossa tor­
nar-se mais receptiva ao axé dessa divindade.
-A-iniciação-cm Exu e-as evocações e oferendas visam aproxim ar
as pessoas dos poderes m inistrados por esta divindade. A p artir do m o­
mento em que essa ligação se estabelece os hom ens adquirem m elhores
condições para atingir seus objetivos. A devoção a Exu, com preendido
este orixá segundo a sua verdadeira natureza, im plica na possibilidade
de desenvolver ou ap rim orar qualidades próprias dele: ordem , disciplina,
organização, paciência, perseverança, bom senso, discernim ento, respon­
sabilidade, confiança e com prom isso. Todo líder, para ser u m bom líder,
deve cultuaFExu, pois necessitará de todas essas qualidades para exercer
bem o seu papel.
É comum ouvirm os dizer que os orixás servem aos hom ens: de fato
eles servem. Mas convém nos determ os um pouco no sentido da palavra
servir, que pode lem brar o ato escravo de ser obrigado a obedecer cegam en­
te a um senhor. Em alguns países da diáspora iorubá, infelizm ente, ouve-se
referências a Exu como escravo dos orixás, bem com o há pessoas pouco
informadas fazendo referência ao fato de que ordenarão a seu Exu que des­
trua algo ou alguém. Esse equívoco é de fato bastante lamentável.
Os orixás servem ao hom em , sim, mas com a conotação do servir
como a mais nobre das ações exercidas por um ser em benefício de outros.
Não se trata, pois, de servir de um m odo subserviente, mas nobrem ente,
dado que as oportunidades de servir desencadeiam fluxos de energia que
beneficiam tanto o receptor com o o doador. A palavra iorubá irànlçwç,
cujo significado é auxiliar, ofcrcccr os braços e acolher, se com põe de iràn,
aIo de ajudar, e çwç>, palmas das mãos, representando, pois, o que se cons­
trói na vida com as próprias mãos, trabalhando, segurando, sustentando,
alimentando, acolhendo, unindo, oferecendo apoio. Esse vocábulo remete
ainda à ideia de que os orixás apóiam o hom em em sua busca de sentido
para a existência.
Tendo discorrido sobre a natureza e ação de Exu, tratam os a seguir
do tema rHativo às relações desse orixá com o Destino H um ano.

151
(
(
(
(
Capítulo 5

Exu e o destino h u m a n o

Discorrer sobre a participação de Exu no destino hum ano é, funda­


mentalmente, tratar das relações entre Ifá, Exu e Ori. Ifá, consultado pelos
homens, pelos seres da natureza (dos mais simples aos mais desenvolvidos),
por todos os orixás e pelo próprio Orunmilá, orienta na adoção de cam i­
nhos que os aproxim em da verdade e do equilíbrio harm onioso de forças.
O Itàn Ori apresentado a seguir exemplifica isso.

Itàn Ori-Òfúnkànràn
Narrador: Babaláwo Fábünm i Sówúnmí

Ojúmç ti mç,
Qlçkànràn ò dáde.
Ojúmç ti mç,
Olçkànràn ò fi òdigbà ilçkó sçrún.
Ojúmç ti mç,
Olçkànràn kò wç çwú idç k i ó máa dán-án,
Gbinringbinrin.
Olú ni wçn fi n sin olú,
Osin ni wçn fi nsin osin.
B i ègbçn bá Iç, a ti àbúrò sin-in.
Olá ni nmú nii ga,
Ori ti yòó dáidé.
Kò digbà ti ó gbórin.

155
Orún ti yòó wç òdigbà ilçkè, kò digbà tí ó gún.
Ara ti yòó irp asç idç, kó digbà ti ó ri borogidi.
Àw çn Ió d'ifá fún Oií,
N i ojç ti Orí nti isálú çrun bô wá si òdc ayé,
Ori sinà, ó Iç si çdç> Egúngún;
Orí sinà, ó Iç si çdç Orò.
Orí sinà, ó Io si çdç Orísà.
Ifá ni ó nla çnà han èdá,
Edá ní ó nmú ni dé ibi ire.
Eni tí ó maa \va iló ayé,
Tí ó ni òun fé sc rcre,
Ifá ni k í ó máa bi.
Èniyàn ti ó fç wá ilé ayé tí ó sç> wípé òun fç di éniyàn láyé,
K í ó máa fi ti çpç sçyin,
A i fíni, peni,
A i fèyàn péyàn.
A i béèrè çnà ní nmú nií sinà.
Orí sako ti ó se gélétce (Orí ti ó tóbi)
Òrisà wá pc Orí,
Ó ni iwçrkò gbçn,
iw ç kò m ç wípé o$ó ní nse yéyé osó.
À jç ni nse yéyé àjé,
Èniyàn ní nse omç éniyàn.
Eranko, ni nse ç>mç çranko.
Orí iwç ò m ç wípé tí eçinsin bá máa wá sílé ayé,
Ifá ni ó nbi.
Tí çyç oko bá fç wá sílé ayé, ifá ní ó nbi.
Ó ní iwç ò m ç wípé igi-oko ò wá sí ilé ayé Içyin, ifá,
Ewé oko, ò wá si ilé ayé Içyin ifá.
Sàngó fi çnà sç fún Orí wípé tí a bá fi
çnà sçrç fún éniyàn, tí çni náa ò bá gbç,
Òmúgç ni wçn npe Òlúwa rç.
Ori wo ise titi, Qrç Orí sú Orí.
K òyé, cyi ti à nwí,
Kò m ç èyí ti à nse,
Kò m ç èyí à nso.
Eni tí kò bíni lééré çrç çni,
Kò lè gbç çrç çni.
Ògún pc Ori,

156
ry^> '

Ó ni, sé o niç w/pé, iwç ni àgbà òrisà,


iw ç ni olórí àwçn òrisà ti ó kú.
Ori ni, òun ti rò çrç ara òun tití,
Qrç ara òun ti sú òun.
Ògún ni, òún mç.
Ògún tún ti çnà sçrç,
Ó ni çni ti a ba k ç Içgbçn ti ó gbçn,
Ògún ni, scbi çni ti a ba k ç Içgbçn ti o gbçn,
Igi oko ni a fi nwé,
Ó ni çni ti a bá kç ni òrç, ti ò m ç òrç;
Qpç oko ni a ti nwé.
Çni ti a kç ni òye,
Ti ò m ç òye;
Ó dàbi çni fara gbá igi.
Çni ti a fi çnà hàn,
Ti ò m ç çnà;
Ó dà bi çni sc igi Jóore.
Ògún ni òún ti fún ni çgbçn
K i ò wá çgbçn. kún çgbçn.
Ògún ni, òún ti kç e ni imò,
K i ò wã imç kún imç.
Ògún wà y i padà, ògun nlç.
B i a kç ni Içgbçn, á ti tara çni kún-un.
Çni tò gbçn,
Òun ni à npé ni çlçgbçn; çni tò mçràn,
Òun ni à npé ni olúmçràn.
Çni ti ò m ç òye,
Òun ni à npé ni olúmòye.
Orí ro çrç ara rç titi,
Òrç Orí sú Orí.
Orí wá tç Èsú Qdãrà Iç,
Orí n i iwo Çdàrà;
Láàlú ògiri òkò.
O ni, iwç ni mo wá báá o,
Orí ni òun rònu tití, Inú òun dí kòkó.
Ò ni, nipa çrç ara òun,
Ò ni k i È$ú Qdàrà mú òun wá silé ayé,
Èsú çdàrà ni k i ò Iç mú çéta owò wá.
Ò ni k i ò Iç m ú écje owò wá.

157
Ó ní k í ó Iç m ú àkúkç adie wâ,
Ó n i k í o Iç mú çpçlçpç epo \vá,
Ó ní k í o Iç mú çpçlçpç otí wá,
Ori Iç wá gbogbo rç wá fún Èsú,
Èsú çdárá ni scbi àibèèrè çnà, '
Òun ni nmú ni sinà.
Ó ní eni ti o bá ni owó nílc nyé
K í ó má sc ti ti Èsú sçyin,
Eni ti ó fç bímç, k i ó má se fi ti Èsú sçyin.
^Eni-LLáJçMÍ-çIá.MÍJJ(Lã}'é.Jcí-omáse-íiti-------------------------------------
Èsú sçyin.
Èsú ni iwç Ori. sé o m ç wípé,
Òun Èsú Çdárá;
N i iránsé Olódúnmnrò.
O ni, òun ni òun nse Ori sibálá sibolo.
Ori \vá yípadá. Ori nlç;
Èsú çdárá ni k í ó padá \vá bá òún.
Èsú çdárá ni ti èniyán
Bá bcrè çrç á dúró gbç ési rç.
Èsú ni k i Ori kálç.
Èsú \vá mú Ori Io si çdç Qrúnmilá:
Esú ni k i Ori sçrò si owó,
Ori. sçrç sii, ó fún Qrúnmilá;
Qrúnmilá dá Ifá.
Won ò ri ifá méji ju
wípé Ori ti sinà Iç.
Qrúnmilá ni Ori ò,
Ó ti sinà tití Io dé ilúmàdò.
Óni iyà ti je é tití Ori ç ti npá.
Qrúnmilá ní, o kiri titi. o ti dé çdç Sàngó.
Ó ni. o ti kiri tití. ó ti dé çdç Ògún.
O ni. wçn ti fi çnà bá ç sçrç tití iwç ò gbç.
Ó ni. eni keta òun tí nse Èsú Qdàrà,
N i ó mú e wá si òdò oún.
Qrúnmilá wa nso fún Ori wípé.
Iwç ò m ç wípé çnikan;
Kii nwá si ilé ayé léyin Ifá,
Ó ni çnikan kii nse hhkan léyin ipin é (Èdá),
Qrúnmilá n í iwç Ori k í o Io,

158

i
N iàw çn nkan wçnyi láti fi bç Ifá,
Eku méji olúwcré.
Eja méji, òlúgbàdà.
Ónlé adiç, a fi çdç gbçngbè.
Ewúré afàmú rçndénrçndçn.
Ègbinrçn obi,
Ègbinrçn orógbó;
Çwç eku,
Çwç Çja,
.ÇtLsèkçiç______________________________
Çrúnmilà sç fún Orí wípé
K i o Io ni A kúkç adiçgàràyin, gàràyin.
k i ó Iç fi bo È$ú,
Ki ó wá ni orógbó,
Obi ti o lá ádán méta,
Çtçré omi tútú, k i ó Iç fi bç Çlçdáá ré.
Orí ni gbogbo òun ti Çrúnmilà
ni k i o ni.
Ori bç Ifá, Ori bç Èsú,
Orí tún bo Elçdàá ré gçgé bi Çrúnmilà ti ivi fún-un.
wípé k i ó se.
Ifá wá dá lóhún wípé,
Egúngún, ó sc ç.
Òrisà, ó se ç,
Çwç Elçdàá ni çrç ç wà o.
B i á bá ni owó nílé ayé,
Orí çni ni k i á máa bç.
B í á bá ni olá ni ilé ayé,
Orí çni ni k i á máa bç.
Èdá çni ni k i á máa sin.
Nítorí Ori Içba, Èdá ni àgbà òrisà,
Çrúnmilà wá pe Èsú Çdàrà,
O ni Esú iwç ni k i o fi çnà han Orí,
Èsú Çdàrà wá dé ikóríta mçta ayé t ’òún orun,
Èsú Çdàrà wá fi çnà aiyé han Orí.
Ò ni k i ó gba ibç,
Çrúnmilà wá fi ohún sc ohún igbe.
O fi.ohún se ohún iyçrç,
Agbà ti ò gbó ifá, tí kò gbç iyçrç;

159
bí çni ra ilé ikin ni.
Qrúnmilà wá kç orin iyèrè, ó fi sin Ori,
O n í k í Ori máa wípé;
Qrç m i kò kan Egúngun,
Çrç m i kó kan Orisà,
Qrç m i kó kan Òrísà,
Çrç m i kó kan Egúngún,
Elçdàá m i ni çrç m i kàn an o o o.

Itàn Orí-Òfúnkànràn
Amanheceu. Olçkànràn não colocou sua coroa.
Amanheceu. Olçkànràn não colocou em seu pescoço o colar
grande, que revela a sua realeza.
Amanheceu. Qlçkànràn não vestiu roupa de ide para sair com brilho.
É com nobreza que se trata o nobre.
É com sabedoria que se trata o sábio.
Q uando o mais velho parte o mais novo fica em seu lugar.
É com prosperidade que se cresce na vida.
O ri' que será coroado não precisa ser grande.
O pescoço que ostentará o colar de nobreza não precisa ser grande
nem com prido.
O corpo que será vestido com roupa de ide não precisa ser grande.
Foram eles que fizeram um jogo divinatório para Ori no dia em
que ele estava vindo do orun para o aiye.
Ori perdeu-se e foi consultar Egungun.
Ori perdeu-se e foi consultar Oro.
Ori perdeu-se e foi consultar Ifá, que ó quem indica o cam inho aos
seres.
Eledá, o Destino, indica ao ser o bom lugar.
Aquele que vem para a terra e deseja ter sorte na vida deve
perguntar a Ifá.
O ser que vem para a terra e quer ser im portante deve deixar espaço
para fazer perguntas.
Não respeitar o conselho dos outros, não respeitar as pessoas que
podem orientar, deixar de perguntar pelo cam inho é o que faz o
hom em se perder.
Ori, o grande teimoso.

1 Ncstc odu grafamos a palavra orí iniciada por maiúscula por tratar-se de um personagem da narrativa.

160
Orixá cham ou Ori.
Ele diz que Ori não tem sabedoria.
- Você não sabe que Osó é o líder dos feiticeiros?
- Você não sabe que A jç é a líder das bruxas?
O ser é quem dá origem ao ser.
O animal é que dá origem ao animal.
Ori, você não sabe que a mosca, antes de vir para a terra, consulta
Ifá? E que quando o pássaro vem para a terra, antes de vir consulta
Ifá? Você não sabe que nem as árvores que estão na floresta vieram
para a terra sem antes consultar Ifá? E que as folhas tam bém não
vieram para a terra sem antes consultar Ifá?
Xangô diz que quando você fala com sabedoria a um a pessoa e ela
não entende, pode ser chamada de Não Sabe (ignorante).
Ori se cansou.
Ori pensou m uito c ficou cansado com seus problemas. Ele não
sabia o que falar. Não sabia o que fazer. Q uem não pergunta por
nossos problemas nada saberá de nossos problem as.
Ogum cham ou Ori:
- Você sabe que você é o mais velho entre os orixás?
- Que você é o líder dos orixás?
Ori diz que pensou m uito sobre sua vida e está cansado.
Ogum respondeu dizendo que já sabia desse problem a. Ogum falou
de novo com sabedoria, através de metáforas. Disse:
- Aquele para quem você se esforça para transm itir sabedoria e
não chega a ser sábio (não aprende) é com o um a árvore que não
responde.2
- Aquele para quem você se esforça para transm itir conhecim entos
e não chega a ter conhecim entos é com o um a palm eira num a
floresta.
- Aquele cuja sensibilidade você estim ula e não chega a ser sensível
é como uma árvore na qual se esbarra.
- Aquele a quem você indica o cam inho e não reconhece o cam inho
é como um a árvore a quem se prestasse um favor.
Ogum diz a Ori:
- Já te dei sabedoria. Agora, procure mais sabedoria e junte à que te
dei. Já te dei conhecim entos. Agora, procure mais conhecim ento e
junte ao que já te dei.

• Expressão equivalente a c surdo como unia porta.

161
Ogum foi em bora dizendo:
- Q uando a gente recebe sabedoria de um sábio deve acrescentar
a ela nossa própria sabedoria. Q uando a gente recebe sabedoria,
orienta.
Ori providenciou tudo. Exu lhe disse:
- Quem tiver prosperidade na terra tem que separar a parte de Exu.
Quem quiser procriar na terra não deve deixar Exu para trás. Quem
quiser longevidade na terra não deixe Exu para trás.
Exu perguntou a Ori:
- Você não sabe q ue sou o m ensagHrn.dp_Eledunmarc£-E-que sou —
eu que estou atrapalhando o seu caminho? Que sou eu que estou te
em purrando para todos os cantos?
O que tem sabedoria é chamado sábio. O que conhece as coisas é
cham ado conhecedor. O que tem sensibilidade é cham ado sensível.
Ori pensou a respeito de si próprio. Estava cansado de si m esm o:
Foi consultar Exu O dara e lhe disse:
- Você, Exu, famoso e generoso, é você que vim consultar.
Ori lhe disse que pensara tanto sobre os próprios problemas que
chegava a ponto de sentir um nó no intestino. Ori disse a Exu que
seu problema era consigo mesmo e pediu a ele que o conduzisse
para a terra.
Ori deu-lhe as costas e foi indo em bora. Exu o cham ou, para que
voltasse. Disse-lhe que, quando um a pessoa faz um a pergunta, deve
aguardar a resposta. Exu m andou que Ori o acompanhasse e o
levou à casa de O runm ilá.
Na casa de Ifá, Exu deu a Ori um búzio para que falasse nele os
seus problemas. Ori falou seus problem as no búzio e o entregou a
O runm ilá.
O runm ilá fez o jogo. O que apareceu era um símbolo de que Ori se
perdera no cam inho.
O runm ilá disse:
- Oh, Ori, você se perdeu m uito e foi parar no infinito. Sofreu tanto
que já está perdendo os cabelos.
O runm ilá disse:
- Você andou tanto que foi parar na casa de Xangô.
O runm ilá disse:
- Você andou tanto que foi parar na casa de Ogum. Falaram com
você por m etáforas e símbolos e você não entendeu. A terceira
pessoa, que é Exu, foi quem te trouxe aqui.
O runm ilá diz a Ori:
- Você não sabe que ninguém vem para a terra sem antes consultar
Ifá? E que ninguém faz nada se deixar para trás a im portância do
seu Ori? Ninguém faz nada sem pedir o consentim ento do seu
destino?
O runm ilá pediu a Ori que providenciasse os seguintes elem entos
para oferecer a Ifá: dois cam undongos, dois peixes, um galo ou
galinha grande, um a cabra com chifres grandes, obis e orobôs
grandes c sékété. O runm ilá disse para Ori oferecer a Exu um galo,
------------u m obi de três gom os e oferecer água fresca a-seu-Eledá.
Ori providenciou tudo e fez oferenda a O runm ilá, fez oferenda a
Exu e a seu Eledá, conform e instruído por Ifá.
Após realizar a oferenda, Ifá respondeu a Ori:
- O seu problem a não é nem com Egungun nem com Orixá. Seu
problema é com o seu Eledá.
Se o hom em tem prosperidade na vida, agradeça a seu ori. Sc o
homem tem progresso 11a vida, agradeça a seu ori. O hom em deve
venerar seu ori porque para cada hom em o seu ori é o prim ordial
entre os orixás.
Orunm ilá cham ou Exu e m andou que indicasse o cam inho a
Ori. Q uando Exu chegou às encruzilhadas que ligam o orun ao
aiye mostrou o cam inho que Ori deveria seguir para chegar a seu
destino. M andou-o seguir esse cam inho. Exu O rientou Ori a seguir
esse cam inho e ir entoando a seguinte cantiga:
- Meu problem a não é com Egungun.
- Meu problema não é com Orixá.
- Meu problema é com Eledá.

Observemos que neste itan Ori recebe ensinam entos de Exu, Ogum ,
Xangó e Orunm ilá. E convidado a reconhecer sua im portância enquanto
ser espiritual. Ouum alerta-o para o fato de que o esforço do m estre não
é suficiente pnrn desenvolver o discípulo: a sabedoria, o conhecim ento e_a
sensibilidade só podem ser desenvolvidos com o concurso sim ultâneo dos
esforços do mestre e de seu aprendiz e, quando o m estre conclui sua tarefa,
0 discípulo deve prosseguir porgsforço próprio 11a busca de mais conheci;
mentos. pois ele com petirá, posteriorm ente, a tarefa de esclarecer outras
pessoas.
Q uando Ori encontra Exu para receber ensinam entos, expõe a ele
sua necessidade. Revela estar desorientado e reconhece que seu problem a é

163
consigo mesmo. Exu recomenda um ebó e fala*sobre a necessidade, im pe­
riosa, de perguntar, cada qual, pelo próprio cam inho, e de reservar para Exu
parte de tudo o que se obtém. Neste itan fica implícito que um a das causas
da desorientação de Ori é o esquecim ento disso. Exu ensina, tam bém , que
aquele que pergunta deve aguardar a resposta. Assim, pode-se reconhecer,
até determ inado trecho desse enunciado de Ifá, duas necessidades: a de for­
m ular a pergunta e a de aguardar a resposta.
Q uando Ori finalmente encontra Ifá, recebe novos ensinam entos. O
jogo evidencia que ele de fato se perdera no cam inho. O runm ilá reconhe­
ce seu sofrim ento e seus esforços. C onstata que, orientado por metáforas,
aquele não soubera decifrá-las, e insiste no ensinam ento de que todos os
movimentos hum anos devem ser pautados pelos desígnios do próprio des­
tino. Associa-se agora às duas necessidades anteriores - form ular a pergun­
ta e aguardar a resposta - mais uma: a de seguir o conselho daquele que
sabe e orienta.
Tendo Ori reconhecido a origem de sua desorientação - ignorância
a respeito dos desígnios do próprio destino —e tendo obedecido à reco­
mendação de realizar oferendas a Ifá, Exu e Eledá, passa a refletir sobre a
im portância de Eledá em sua vida e a im portância de associar os próprios
esforços aos dele. Reorientado, retorna à terra e, enquanto caminha, repete
(para não esquecer) que seus problem as e as respectivas soluções residem
cm suas relações com Eledá, seu destino pessoal.
A consulta oracular, fundam entada no corpus literário e no sistema
divinatório de Ifá3, indica à pessoa o seu cam inho. A indicação poderá ser
acatada ou não, dependendo do nível de consciência do consulente e de
sua disposição para m udar a si mesmo. É preciso haver desejo de m udar e
coragem para realizar os esforços necessários para isso. Havendo o desejo
de esforçar-se para introduzir m udanças nas próprias atitudes e com por­
tam entos e o desejo de expandir a própria consciência, o em penho pessoal
necessário para que isso ocorra poderá receber suporte energético advindo
de O runm ilá, de Exu, de outras divindades e mesmo do ori do sacerdote
çi"-nprf».n função oracular.
Não é simples a dinâm ica de forças estabelecida durante um a con­
sulta oracular, pois nela interagem diversas energias, conform e o descrito
a seguir.
A estreita ligação entre Exu e O runm ilá com plem enta-se com a rela­
ção por eles estabelecida com as Iyami Oxorongá, as Mães Ancestrais que,

5 Vide Capítulo 9 - Transmissão onil dc conhecimentos - corpus literário c sistema divinatório de U3.

164
por sua vez, exercem influência sobre todos os odus do jogo oracular e so­
bre todos os ebós. O runm jlá conhece o passado, o presen te e o fu turo d as
ppssoas. e as Iyami Oxorongá são “donas da existência”, guardiãs do destino
jimriano. Ifá revela o destino e as Mães zelam por ele.___
Como Ossaim é o guardião do axé da flora e seu patrono, detentor
dos conhecimentos e da força necessários para ativar o poder contido nas
plantas, todas as recomendações de Ifá e de Exu dem andam sua participa­
ção. Não há prática ritual possível sem a presença de elem entos do m undo
vegetal. Assim sendo, as m udanças pretendidas dependem de seu axé.
Todos os orixás estão estreitam ente ligados ao tem po: as águas de
Oxum fluem continuam ente, o fogo e todas as demais expressões da n a­
tureza transm utam continuam ente num fluxo tem poral. Olojó, orixá do
Tempo, orixá do Dia e de cada um de seus m om entos, é a divindade que
se manifesta de múltiplas m aneiras, pois se individualiza para cada pessoa
segundo sua predestinação e interage particularm ente com o ori e com as
demais divindades, zelando pelos acontecim entos de cada dia. Ifá, conhe­
cedor de todos os destinos, Senhor do conjunto form ado por todos os dias,
interage com Olojó. Assim sendo, a força de Olojó interage, sim ultanea­
mente, com a força e a predestinação de cada ori, com o axé específico de
cada orixá, com o axé de Exu, guardião e fiscal de todo esse processo, e com
o axé das Iyami Oxorongá, base e sustentação de tudo o que se refere ao
humano.

Olçjç ôní ibà,


Ojúmç tí ó m ç mi!
Kí ó mç mi
S i àláfíà, owó, ayç>!

Saúdo o Senhor do Hoje


Neste dia que amanheceu!
Que amanheça também para m im,
Trazendo saúde, prosperidade e alegria!

Assim como é im portante a relação entre Ifá e Olojó, tam bém é de


grande im portância a relação entre Exu e Olojó, com o podem os observar
no odu Ogbè-Fú:

Àtànpàkò ni a fi pa bi Içgànjç
Ló d ’ifá fún Qrúnmilà

165
L ' çjç ti yóò tora ojç mçrçèrin Vçrú.
Orísàáiá ló kç5 mú ojç,
Orúnmilà mú si-keji.
Ògún mú si-kçta,
Sàngó mú si-kerin,
Èsú Láàlú ni ojç>gbogbo. tòun ni.

É com o dcdão que se parte o obi no ritual noturno


Foi quem adivinhou para O runm ilá
No dia em que ele ia com pranQ-uatro D ias para—
lhe servir de escravo.
Oxalá foi o prim eiro a escolher seu dia,
O runm ilá foi o segundo,
Ogum, o terceiro e
Xangô, o quarto.
Exu, o famoso, diz que todos os dias lhe pertencem .

Assim, todos os dias pertencem a Exu, todos os m om entos lhe per­


tencem, o que denota sua ascendência sobre os dem ais orixás e sua onipre­
sença. Além de conduzir o axé dos demais orixás, Exu está presente na vida
cotidiana do hom em , sendo nele que as pessoas encontram forças com-
plementares. Ele é grande, forte, bondoso, generoso e temido. Grande por
estar presente em tudo e em todos; forte por transm itir a seus devotos um
axé que os torna invencíveis; bondoso por conduzir o hom em ao sucesso e
bem -estar e por defendê-lo de injustiças; generoso por com partilhar com
o hom em tudo o que tem; tem ido por reunir todas as forças existentes e
possuir condições para realizar o que pretender sem pre que quiser.
_ Os aioguns, forças da natureza que se alim entam do sofrim ento hu-
inaao, seres dotados da capacidade de “beber as lágrimas” dns pessoas-*^
aliviá-las de sua carga negativa, acham-se associados à terra e à natureza e
são conhecidos com o “assistentes de Exu”. Ao se alim entarem do ebó, em
com unhão com Exu e as Ivami Oxorongá, carregam consigo os problemas
do ofertante. Têm dom ínio sobre dificuldades existenciais de qualquer na­
tureza e favorecem o reconhecim ento e a valorização do ori do ofertante
por parte de outras pessoas.
Tendo discorrido sobre elementos das relações de Exu com divinda­
des mais diretam ente relacionadas ao destino hum ano, apresentam os a se­
guir alguns nom es dados a pessoas em hom enagem a esse orixá, em virtude
do reconhecim ento da im portância dele em sua existência:

166
Èsúbánbí: Exu favoreceu a fertilidade de m inha mãe e propiciou aos meu;
pais condições para que eu nascesse.
Èsíibíyií: Exu deu condições para o nascimento e a existência deste ser.
Èsúdolá: Exu trouxe honra, progresso c respeitabilidade à m inha vida.
È sú f ú n n iik é : Exu trouxe este ser para eu cuidar (confiou em mim para isso).
È sú g b à m í: Exu me acolhe; Exu me acolheu; Exu me acolhe, m e liberta <
me livra do mal.
È sú k ú n lé : Exu preencheu m inha vida e me deu tudo que preciso para vi-
--------verberm-------------------------------------------------------------------------
Èsürçniílékún: Exu secou m inhas lágrimas (me livrou de tristezas e an­
gústias e me trouxe alegria).
Elésüdé: O devoto de Exu chegou trazendo o axé dessa divindade.
È sütóbi: O poder de Exu é grande, ilimitado e esta pessoa está sob os seu:
cuidados.
Èsütósin: O poder de Exu é venerável.
È s ü tú n b í: Exu me fez renascer. Renascido em Exu.
Èsíiwiinmí: Tudo o que Exu tem de bom me agrada. Exu me traz coisa
boas.

Tendo discorrido sobre o tem a relativo às relações de Exu com <


Destino Humano, apresentamos em seguida seus principais símbolos, ofe
rendas e rituais.

167
Capítulo i

A dinâmica estabelecida entri


ori e iwá e a acão de Exi

Com m uita frequência pode-se observar pessoas que, aspirando pc


uma vida harm oniosa, livre de sofrim entos, buscam recursos oferecidos pc
sacerdotes e outros agentes religiosos. Fundam entados nos livros sagradc
das religiões que professam e representam, esses agentes religiosos orier
tam a conduta daqueles que os procuram . No concernente aos sacerdote;
da religião tradicional iorubá e das religiões de m atriz iorubá que vicejara!
em países da diáspora africana, sabemos que os princípios de sabedori
acham-se reunidos nos milhares de odus do corpus literário de Ifá.
Pode-se observar que em todos os odus apresentados nesta obra é feit
alguma referência ao mal. Para designar o mal em iorubá o vocábulo ma
adequado é burúkú (buruku), que pode ser traduzido por mal; aquilo quem
é bom: aquilo que se afasta da virtude. Como o mal é considerado um a cor
dição para a ocorrência do bem, burúkú tam bém pode ser traduzido como
que pode vira ser. O adjetivo burú significa mau. penerso, malvado.
Sendo o bem entendido com o a neutralização do mal, na dinâm
ca estabelecida entre Bem e Mal desem penham papel fundam ental a vor
tade e a responsabilidade pessoal. Ou seja, o exercício do livre-arbítrio
considerado indispensável para a consecução dos objetivos existenciais. <
indivíduo escolhe abraçar a prática do mal ou trabalhar a favor de sua nei
tralizaçâo, e realiza essa escolha a partir de determ inações de seu orí (ori)
de seu iwà (iwá).
Conform e já enunciado, ori é a divindade pessoal que, cultuada enti
outras, é de fato a mais im p o rtan te do panteão iorubá pois, se ia o uai fc

171
o em penho de outras d ivindades em favorecer determ inada pessoa, todo
e qualquer progresso dependerá sem pre do que for sancionado por o ri.
Todos tem os ipin ori, (ipin ori, a sina do ori), um destino p o r realizar, o
que, no entanto, não significa que estejam os inteiram ente determ inados
por forças alheias à nossa vontade. O hom em tem o poder de tom ar em
suas m ãos as rédeas do curso da própria existência e participar de m odo
responsável de seu desenrolar, através da busca de am pliação da consci­
ência, do acúm ulo de conhecim entos e do desenvolvim ento disciplinado
da vontade, o que dem anda, entre outras coisas, expor-se a experiências
m últiplas e diversas.
Orí rcre designa o bom ori c olóri rere designa o dotado dc um bom
ori, aquele que é dono de um bom comportamento. Orí buríikú designa o
mau ori, e olóri burúkú, o desprovido de um bom ori. Pípê- palavra com ­
posta de pé (completo) e p i (ato de ser), significa ato de ser com pleto, e
denom ina-se orí pipé o ori equilibrado, que se reflete_ejm atitude» sensatas
e favorece um a percepção aguda e precisa, ou seja, favorece a capacidade de
perceber corretam ente, o que é garantido pela quantidade e qualidade do
axé (energia vital). Orípípé é, pois, um ori que, dotado da capacidade de
discernir, favorecerá a prática da justiça.
hvà é um conceito iorubá que reúne o que denom inam os caráter e
personalidade. Inclui atitudes, posturas, condutas, com portam entos, for­
mas de proceder, formas de reagir ao que se apresenta, na m edida em que
atitudes e com portam entos revelam a dinâm ica estabelecida entre a perso­
nalidade e o caráter. Tanto é assim que o ideal da educação é form ar çmç-
lúivàbí, pessoas cujo iwá esteja bem desenvolvido, o que iínplica, necessaria­
mente, na formação de indivíduos solidários. Í\và-pèjé. q ue é identificável
através de um a atitude reverente, serena, responsável, paciente, equilibrada
e harm oniosa, sugere a presença defuma pessoa de bom caráter, persona­
lidade bem equacionada, bondosa, gentil. Esse tipo de pessoa, cham ada de
alákòso, palavra que se pode traduzir por líder, diretor, superintendente,
presidente, responsável, guia, mentor, onde quer que esteja, favorece os
processos de união e nutre possibilidades para a realização e a ocorrência
de acontecim entos favoráveis. Diz o provérbio:

Iwà rç ni
ó nse é

1 Observemos a acentuação de pípc (ser completo) para nüo confundi-lo com pipe (chamada, convite).

172
Seu caráter é seu juiz
e profere sentença a seu favor (ou contra seus interesses).

Iwá determ inará a sentença a favor çni contra o praticante da ação.


Isto é, cada qual tem p oder de escolha e decisão nas encruzilhadas tão n u ­
merosas d o cam in h o existencial.

Í\và-pçlç/Íwà rere
Iwà rere ni çsç èniyàn
O bom com portam ento (boa postura e boas atitudes)
é a beleza do ser (beleza interior).

Iwà ni çba àwúre


O bom com portam ento (boa postura e boas atitudes)
é o rei de àwúre (amuleto, magia para atrair sorte).
(Quem tem bom iwá e tem boas virtudes terá sorte).

Ou seja, a atitude e o com portam ento, enquanto expressões da per­


sonalidade e do caráter, constituem os principais fatores atrativos da fortu­
na, trazendo a sorte, de maneira quase mágica, para junto da pessoa dotada
de iwà pçlç.
Iwà burúkú, pelo contrário, identificável por um a atitude irreveren­
te, inquieta, irresponsável, impaciente, desequilibrada, sugere tratar-se de
uma pessoa de m au caráter e personalidade perturbada. Esse tipo de pes­
soa, onde quer que esteja, favorece a ruptura, a desunião e a intriga. Uma
pessoa disruptiva, onde chega, provoca, no mínim o, desconfortos.

iwà rç ló nse ç
Bi o bá yá, wa ni wçn ò fçràn e.
Teu com portam ento te joga pra lá e pra cá.
Depois você reclama que não é amado.

Esses ensinam entos denotam que, m esm o para ser am ado e viver
o amor, é preciso ad otar com portam entos adequados. Sugerem a neces­
sidade de revisão das próprias posturas e da própria participação nas
diversas situações. Uma boa análise das atitudes e dos co m p o rtam en to s
favorece a percepção das responsabilidades pessoais pelos fracassos e
pode conduzir à m udança da percepção de si m esm o en q u a n to vítim a
das situações.

173
Quanto à dinâmica de relações possíveis entre ori e iwá consideremos
que ela resulta do fato de entrarem em jogo orí rcre 011 orí burúkú com hvà
pçlç ou hvà burúkú. Basta considerarmos o efeito das possíveis relações entre as
qualidades de ori e de iwá. Um olórí burúkú pode ser melhorado por um iwá
p ç lç isto é, uma pessoa “azarada” pode ter boas chances de progresso caso te­
nha bom caráter e discipline a si mesma no sentido de proceder corretamente.
Por outro lado, um olorírerc, ou seja, uma pessoa “sortuda”, poderá ver-se pre­
judicado pelo próprio caráter, caso tenha um hvà burí/kú, ou seja, pode estragar
as próprias oportunidades de progresso por suas ações incorretas. Um orírcreé
mantido e fortalecido por iwà pçlç. Assim sendo, iwà burúkú compromete ne-
—gativamente um ori, e afirmam õsiorubás que, para alcançar progresso na vida,
mais vale uma mudança de postura, de atitudes e de comportamentos do que
um bom ritual de bori. O bori pode gerar - e de fato gera - uma energia favo­
rável a essas mudanças, mas seu efeito será breve, caso não haja compromisso
de transformação pessoal e disciplina autoimposta, com vistas a promover as
necessárias mudanças de atitude e de conduta.
Olórí rcre ti ko Içsç rcre é um a expressão que se refere às pessoas
afortunadas que não têm bom passo, que não adotam um a boa postura
no m odo com o cam inham na vida. Pessoas que são olórí rcre, mas que
não adotam um cam inhar igualm ente rerc, favorável, term inam p o r per­
der a sorte original, pois seu com portam ento as afasta do que lhes seria
benéfico.
Com o vimos, orí rerc designa o bom ori e olórí rereo dotado de um
bom ori, aquele que é dono de um bom comportamento. É desse m odo que
as pessoas se referem a quem procede corretam ente. As pessoas de bom
com portam ento, boa postura e boas atitudes são afortunadas e a elas ocor-
rem fatos e fenômenos excepcionais.

Orí wo ibi rerc gbé m i dé


Çsè wo ibi rerc gbé m i gbà
Ori, procure um bom lugar para me levar
(m e conduza até a sorte).
Meus passos (m eu com portam ento, m inha postura, m inha atitu­
de) me encam inhem em direção de coisas boas.
(O com portam ento é a forma de cam inhar na vida).

Uma vida sem sentido, sem diretriz nem rum o, carregada de sofri­
m entos, carente da prática de virtudes, sugere a ausência de orirere. A uma
vida dessa natureza se dá o nom e de itàràkà.

174
y -

Não há com o escapar. Mesmo que um a pessoa realize todos os s


orifícios recomendados, por exemplo, para a obtenção de prosperidade,
não opera m udanças em seu iwá, nada nemminguénVpoderá trazer para .
sua vida as tão desejadas conquistas: prosperidade, fertilidade, longevidad
am or, harm onia, tranqüilidade, sucesso, vitória. .
Quanto aos erros ou desacertos das pessoas, não há sacrifício animí
nem ritual algum que as isente ou as livre de obedecer às regras do códig
ético-moral estabelecido. Assim sendo, cada qual tem que tratar de identif
car e de reconhecer os erros que comete, de buscar formas de não comet(
- l õ r e, ainda, de buscar recursos para snnaros efeitos de erres já com etido
Isto porque, com o diz o odu Üdí Méji, vorê pnde se—irre pender de at(
ronietidos no passado, mas o arrependim ento não o isenta de assum ir n
prpscnte as conseqüências desses atos.
Caso a pessoa não aprenda com os próprios erros, perm anecerá e:
tanque no nível que não conseguiu ultrapassar. E onde pode buscar apoi
e esclarecimentos? Nas instruções oraculares, pois o oráculo lhe possibi
litará (re)conhecer ipín orí,\a sina de seu on,)ou seja, o com prom isso pc
ela assumido antes de chegar ao plano terrestre. A leitura oracular trar
esclarecimentos sobre seu odu de nascim ento e sobre os ewós, interdiçõe:
recomendando a realização de alguns rituais. A leitura oracular traz a ener
gia de um odu à terra e quando isso ocorre a pessoa tem um a oportunidad
de remem orar as condições por ela escolhidas com o plano de existénci
terrena, ou seja, o seu ipín ori.
O conselho dado por Ifá poderá ser com preendido, acatado e segui
do. Ou não. Mas isso tam bém correrá por conta de quem busca a orienta
ção, pois sabemos que “o ensinam ento se dá de boca perfum ada a ouvido
dóceis e limpos”. Ou seja, a verdade de um bom conselho deverá ser acolhi
da em nom ejlo progresso. Certam ente, o conselho incluirá recomendaçõe
relativas a com portam entos e atitudes que devem ser m odificados para fa
vorecer a conquista de todos os bens.
Nessa dinâmica da situação em que uma pessoa aconselha outra é pre
ciso considerar com cuidado quem ,fala e quem ouve. A eficácia do conselhc
depende de alguns fatores. A boca perfumada do conselheiro só é perfumada si
o seu ori e sen iwá lhe conferem a condição de autoridade no melhor sentid(
da-k-rmo. íiU-sej.1 , se ele é capaz de pranjear a confiança, a crença e a fé dc_sci
interlocutor. A conquista da condição dc conselheiro exige ainda uma série d<
cuidados, entre os quais se incluem as iniciações, que propiciam condições nãc
apenas para ouvir e aconselhar, mas também para suportar a carga energétic;
que normalmente se associa às experiências existenciais de seus consulentes.

175
vi Por outro lado, ter ouvidos dóceis e limpos supõe que o ouvinte
> \ aqiiele-que escuta o conselho, tam bém tenha ori e_iwá favoráveis ;inc
de ouvir, com preender, acatar e se dispor a realizar o recom endado.. Vhl»
— considerar que há casos em que é justam ente a fraqueza do ori o que leva
a pessoa a não com preender o sentido do conselho ou a não acatá-lo para
poder continuar sofrendo ou para sofrer ainda mais.
Os enunciados de Ifá acham -se carregados de valores m orais e virtu­
des. O ideal de conduta se m ostra pelo exemplo da prática direta da virtude
ou pela apresentação de seu “avesso”, como se observa cm alguns odus nos
quais a t rapaça e a m entira o cupam lugar de honra. O Odu Corjjus preserva
e veicula ensinam entos a respeito do correto proceder, condição indispen­
sável para a coesão e a organização grupai. M uito frequentem ente se encon­
tra no Odú Corpus mensagens que deixam claro o fato de que a condição
positiva som ente é conquistada a partir d flje n f r e n ja m p n to e superação de
dificuldades e desafios, q ue muitas vezes incluem trapaças e m entiras.
Vimos que, entre todos os valores, ocupam lugar da mais relevante
im portância o conselho e o respeito pela sabedoria daquele que aconselha.
Este elemento perpassa absolutam ente todas as narrativas, sem exceção. É
fundamental buscar o conselho, com preender sua linguagem, por vezes
cifrada, acatá-lo e seguir as recom endações. Q uanto aos ebós, presentes
tam bém em todas as narrativas, vim os que sua eficácia dem anda, entre ou­
tras coisas, a prática de virtudes e a adoção de atitudes com o hum ildade,
generosidade, lealdade, gratidão, determ inação, perseverança e esforços,
entre outras.
Os iorubás buscam a felicidade no presente. Como a felicidade é ser
forte e ser forte é estar dotado de axé, a infelicidade é a privação dessa força
vital, que se manifesta com o doença, flagelo, fracasso e outras form as de
adversidade. Dessa força vital, que pode aum entar ou dim inuir até o es­
gotam ento total, dependem a fertilidade, a prosperidade e a longevidade,
condições da felicidade.
Todos os orixás zelam pelos valores éticos. O que com pete par­
ticularm ente a Exu nessa tarefa coletiva? Em Exu se reconhece o poder
de m elhorar o co m portam ento hum ano. Em bora outros orixás tam bém
realizem essa tarefa, é ele quem , p o r sua natureza e atributos, reúne m aio­
res condições para trabalhar no sentido de favorecer m udanças pessoais,
indispensáveis à prática dos valores e virtudes acima enunciados, visando
a conquista do bem -estar hum ano. Fortalece as pessoas para que possam
enfrentar as dificuldades da vida e se tornem capazes de prom over em si e
em seu entorno as m udanças necessárias. Todo aquele que se proponha a

176
w

definir nova rotina ou assum ir novas atitudes e com portam entos sabe das
dificuldades que enfrenta para dom inar hábitos arraigados e para vencer
a indolência. Exu apóia aquele que se dispõe a tornar-se m ais discipli­
nado e organizado e se propõe a m elhorar, sob todos os pontos de vista.
Apóia, sustenta e fortalece o em penho pessoal daquele que quer adquirir
ou desenvolver virtudes que o tornarão mais feliz e m ais solidário. Com o
o ideal iorubá é o de viver forte e feliz no aqui-e-agora, busca-se junto
a esse orixá a necessária cum plicidade para a conquista de um a vida de
qualidade.
Exu é especialmente atuante nos sacerdotes que, desem penhando as
funções de orientadores espirituais, terapeutas e educadores, necessitam
certamente de muita força e proteção para cuidar dos oris das pessoas que
neles confiam.
No odti Èji-Ogbè* a im portância de poder contar com a am izade de
Exu éenfatizada, dadas a sua lealdade e a sua generosidade e considerando-
se as graças que esse orixá pode ajudar a conquistar, desde que observados
seus três princípios: ordem , disciplina e organização.
Quando a afinidade com um amigo é grande, ele c considerado um
parente. Foi feito um jogo divinatório para Ifá no dia em que se tornaria o
melhor amigo de E f

Para o m elhor amigo de Exu não faltará prosperidade.


- Exu, eu vim para ser o seu m elhor amigo.
Não permita que me falte prosperidade.
Para o m elhor amigo de Exu não faltará sorte 110 amor.
- Exu, eu vim para ser o seu m elhor amigo.
Não perm ita que me falte sorte no amor.
Para o m elhor amigo de Exu não faltará fertilidade.
- Exu, eu vim para ser o seu m elhor amigo.
Não permita que me falte fertilidade.
Para o m elhor amigo de Exu não faltará nenhum tipo de sorte.
- Exu, eu vim para ser o seu m elhor amigo.
Não perm ita que me falte nenhum tipo de sorte.

Quem pode resolver os problem as de uma pessoa? Exu? Não. Com o


vimos anteriormente, à própria pessoa compete resolver os seus problem as,

Conforme apresentado no capitulo 10- M itos de E xu nos odus de Ifá (iorubá)-e no capítulo 11 -
dc Exu nos odus de Ifá (português).

177
com apoio do orixá. N unca será dem ais insistir no fato de que os devotos
de Exu e dc outros orixás (ju e id o ta m um a atitude de com odism õ^espe-
rando que as suas dificuldades sejam superadas graças à ação exclusiva das
divindades, ou que suas necessidades seiam plenam ente satisfeitas por essa
intervenção divina^çstãõ m uito equivocados)Para que alguém reconheça
o poder de intervenção de Exu em sua vida é preciso dar-se conta de que
há um âm bito estritam ente pessoal de ação, ou seja, um âm bito no qual
apenas o próprio interessado pode agir. Uma vez reconhecida esta fronteira
e realizado tudo o que é possível dentro desses limites é que se justifica re-
correr a Exu —ou a outro orixá - em busca de apoio. Os dotados de discer­
nim ento pedem a Exu o axé necessário para m elhorarem a si próprios, de
m odo a tornarem -se aptos para assum ir o com ando da própria existência.
Exu favorece a superação dos limites individuais.
Insistim os em alguns aspectos da prática religiosa de m atriz ioru­
bá em países da d iásp o ra. É com um em alguns desses países ouvirm os
um devoto de orixa dizendo que foi castigado por não haver realizado
oferendas ou p o r não haver respeitado determ in ad o ewó. Isto denota
equívocos na com preensão do que seja orixá, de com o se processa a sua
ação na vida h u m an a, e denota, além disso, um a confusão de contextos
decorrente da m estiçagem religiosa entre tradições africanas e tradições
cristãs nesses países.
O prim eiro equívoco reside na interpretação segundo a qual certas
omissões relativas a práticas religiosas africanas constituam “pecados”, pois a
noção de pecado não se faz presente no contexto negro-africano originário.
O utro equívoco, im ediatam ente decorrente deste e a ele associado, é o de que
os “pecados” devem ser “castigados”. Tal noção de pecado, bem como as de
culpa e castigo, tam bém são alheias a esse contexto, tendo sido im portadas da
—£> tradição judaico-cristã. Os ewós5são interdições, e não proibições, e as pesso­
as são instruídas a respeitá-los para obterem m elhor qualidade de vida e, caso
não os respeitem, os orixás, digamos assim, não têm nada a ver com isso. As
oferendas são atos propiciatórios, ou seja, abrem canais de (luxo energético,
possibilitando a circulação do axé dos orixás para os ofertantes. Caso uma
oferenda não seja realizada, ou caso seja realizada de m odo incorreto, mais
uma vez podem os dizer que orixá não tem nada a ver com isso, pois o que
de fato ocorre é a impossibilidade de estabelecer-se o necessário canal para
veiculação do axé do orixá para o ofertante. Nesses casos a questão situa-se
antes no campo da física do que no campo da religião.

' No Brasil, também designados quizihs.

178
O bservando a questão sob essa ótica constatam os a necessidad<
imperiosa de am pliação das consciências individuais, de desenvolvim en­
to pessoal, de busca de autoconliecim ento e de educação das virtude;
como condições para um a prática religiosa que, alem de trazer sereni­
dade, confiança, bem estar, m elhor qualidade de vida em todos os seus
aspectos, seja suficiente para to rn ar melhores as pessoas que as adotam . A
Religião Tradicional Iorubá com partilha com outras religiões o objetivo
de estim ular nas pessoas o desejo de serem m elhores a cada dia. M elho-
res ein que sentido? M ais solidárias, m ais bondosas, mais pacientes, mais
tolerantes, m ais amáveis, enfim , m ais capazes de m anifestar a nobreza de
seus oris e mais capazes de particip ar de um projeto coletivo de vida de
boa qualidade.
Babalorixás e ialorixás mais conscientes identificam entre os p rin ­
cipais motivos para a realização de processos iniciáticos o desejo ou a ne­
cessidade, expressos por aqueles que os procuram , de am pliar a própria
consciência. A ampliação da consciência é o que possibilita a m elhor com ­
preensão das relações estabelecidas nessa imensa teia que é o universo e o
reconhecimento do papel que com pete a cada um nesse conjunto. A cons­
ciência ampliada perm ite reconhecer o compromisso e a responsabilidade
de cada indivíduo para com o coletivo humano e para com a natureza.
Melhorar as condições de saúde, aum entar as chances dc trabalho ou de
felicidade no amor, entre tantas outras aspirações hum anas, deverão d e­
correr naturalm ente da aspiração autêntica e profunda de (re)conciliar-se
com o universo.
Os orixás, além de apoiarem o homem nessa busca, são fontes de axé
e servem de modelos identificatórios, na medida em que os hom ens podem
inspirar suas atitudes e com portam entos nas ações das divindades. Assim
sendo, quando a pessoa escolhe to rn ar melhor a própria vida, pode buscar
modelos de conduta nas narrativas míticas contidas nos odus de Ifá e, si­
multaneamente, realizar atos propiciatórios que canalizem para si as ener­
gias favoráveis à prom oção de metamorfoses, o que inclui alterações em seu
modo de estar no m undo. Esta é um a maneira de com preender orixá. Sem
fantasias mirabolantes, nem aspirações de soluções mágicas, fáceis e rápi­
das, que prescindam do esforço, diariam ente realizado, de trabalhar sobre
a própria individualidade. Feita essa escolha, daí sim se justifica recorrer ao
apoio das divindades em busca de forças para a realização de tarefa tão exi­
gente. Sem esquecer que, q uando um a pessoa realiza o que lhe com pete nas
responsabilidades próprias da vida, atrai para si o apoio dos orixás. Com o
enuncia uma cantiga de Exu:

179
Exu, que pode apoiar,
Exu, que pode alterar iwá,
Que pode m elhorar (corrigir) iwá,
Faça isso por mim!

Tendo considerado a ação de Exu na dinâm ica estabelecida entre ori


e iwá, reunirem os no capítulo seguinte informações relativas aos principais
símbolos de Exu e aos rituais religiosos a ele dedicados.

180
C a p ít u lo 7

Símbolos, rituais e oferendas

Iniciamos este capítulo apresentando os principais símbolos de Exu:


Agogo: instrum ento musical usado no culto a diversas divindades. Tem
também os sentidos de sinoe de relógio. Um dos dois instrum entos
musicais preferidos de Exu.
Asó, osü: tufo de cabelo deixado na nuca ao raspar a cabeça do iaò' d u ra n ­
te o processo iniciatico.
A59 dúdú: pano tingido de preto ou azul índigo. Tecido, roupa, traje, ves­
tuário preto ou azul índigo.
Aso dúdú táb í p u p a: pano preto, azul índigo ou vermelho.
Asç pupa: pano vermelho.
Aso wáji: batik, tecido natural tingido de azul índigo.
Atç Esii: peneira de palha, recoberta de couro vermelho. Após ser tratada
com folhas e é/e, sangue de sacrifício animal, a peneira é forrada com
couro vermelho e penas de pom bo branco. É usada para carregar
oferendas a Exu e, durante o transe, as pessoas presentes têm a opor­
tunidade de fazer suas ofertas ao orixá, colocando dinheiro e outros
objetos dentro dela, enquanto entoam cantigas, com o a seguinte:
Lààlú! Tare 1vá! Tare sàsà!
Tare ivá bá m i!
Legbára! Tare \vá! Tare sàsà!
Tare wá ba mi!
1 O vocábulo iorubá n .m ó. cuja tradução para o português é esposa, designa também a pessoa cm processo
iniciático. No contexto do idioma português, usa-se a forma iaò.

185
Òsçètúrá! Tare \vá! Tare sàsn!
Tare ira ba m i!
Lalú! Traga sorte! Sorte em abundância!
Traga sorte pra mim!
Legbará! Traga sorte! Sorte em abundância!
Traga sorte pra mim!
Òçéçtúrã!Traga sorte! Sorte cm abundância!
Traga sorte pra mim!
Awé Esü: pote de barro usado para colocar a água sagrada de Exu, que será
utilizada por seus devotos para banhos ou para ingestão. Colocado
ao lado do assentamento, esse pote contém água com poder terapêu­
tico e força para atrair sorte. O awé Esú é plantado na terra, através
de ritual análogo ao de seu assentamento.
B arro ou argila: simbolizam a terra, a origem.
B à tá : tam bor sagrado tocado com duas varinhas, usado no culto aos ori­
xás. Um dos instrum entos musicais preferidos de Exu.
Búzios: em quantidade variável. Em tem pos antigos os búzios eram utili­
zados como moeda. Assim sendo, entre os seus significados inclui-se
o de estar relacionado à prosperidade, inclusive a material e a eco­
nômica.
C ores de vestuário: vermelho e preto.
D isciplina: princípio que, uma vez respeitado, favorece as relações com
Exu.
È re Esú: imagem de Exu, feita de argila ou m adeira de árvores sagradas
com o o iroko. Uma característica com um na estética dessas escul­
turas é o çgç, um adorno conhecido com o “porrete”, localizado na
nuca da imagem, com o se fosse cabelo enfeitado de búzios. Con­
form e o m encionado an teriorm ente, um dos epítetos de Exu é
I-lçgbàá-Qgç, literalmente, Portador de centenas de porretes na nuca.
E, com o vimos, estes porretes são utilizados por Exu na defesa contra
inimigos que atacam pelas costas, com o defesa contra o que não se
vê porque ocorre atrás de nós e com o defesa contra atos do passado.
O ç>gç de Exu, que representa sua outra face, é esculpido na forma de
cabelo liso ou trançado, com detalhes em búzios ou não, e também
na forma de anim ais de várias espécies ou de diversas figuras huma­
nas ocupadas em m últiplas atividades. Cada tipo de escultura possui
simbologia própria. Assim sendo, a forma ideal de representação de
Exu para determ inada pessoa deve ser indicada pelo jogo divinatório.
Desde o ato de esculpir a m adeira já se procede a um ritual rigoroso,

1S6
que inclui evocações, rezas, cantigas, saudações, danças e oferendas
de m odo a venerar a m adeira a ser esculpida, para m elhor favorecei
a comunicação entre hum ano e o divino. Depois de esculpida, a im a­
gem será consagrada através de limpeza com folhas e èjç dc animais
apreciado pelo orixá. Será então param entada com colares próprios
do orixá. Essa escultura é considerada um assentam ento de Exu e
recebe os mesmos cuidados recebidos por yangí. O Ère Èsú, quando
modelado cm argila, a ela se m isturam m uitas folhas. Nesse caso, a
imagem poderá apresentar_Q,õ^acom detalhes em búzios brancos,
representando olhos, nariz, boca e orelhas.
Èjinvçrè: instrum ento ritual sem elhante ao irúkçré, com a diferença de que
é feito de couro e, por vezes, enfeitado com búzios ou miçangas.
Èròwó-Méta: trés búzios pequenos abertos, representando o dinheiro de Exu,
por ser ele o guardião da prosperidade e do progresso econômico.
Ikòkò Èsú: pote de barro. Q uando colocado ao lado do assentam ento de
Exu é posto com a boca para baixo. Sua base perfurada possibilita a
passagem da m ão para que, através deste orifício, seja possível ali­
m entar a terra. Nele são colocadas comidas e oferendas a Exu. Esse
pote é colocado na entrada dos templos, sendo que cm alguns deles
um a pedra ya n g í é depositada no interior do pote.
ilèkç Èsú: colar de contas vermelhas e pretas. Tanto o lágídígbâ quanto o
Hèkç Èsú possibilitam identificar um àwòrò Èsú (devoto de Exu).
Irukèrè: cauda de animal que, após preparo artesanal e mágico, é carrega­
da por sacerdotes e reis com o sinal de realeza e poder. Instrum ento
ritual confeccionado com crina de cavalos ou bois, utilizado com o
símbolo de poder religioso e político. Serve ainda para transm itir
axé da divindade para diversos fins. Seu cabo é enfeitado com contas
coloridas e/ou búzios brancos. Em alguns casos coloca-se carga m á­
gica no interior do cabo. Pode ocorrer que o portador desse objeto,
estando irado, exiba a ponta do cabo a um inimigo para maldizê-lo
ou, estando satisfeito, a um amigo para abençoá-lo.
Lágídígbâ Esü: colar em que sc acrescentam búzios às contas pretas e
vermelhas.
Obi: obi ou noz de cola (COLA ACUMINATA, Sterculiaceae). Pequeno
fruto de uso alim entar e sagrado. Um dos itens mais im portantes
do culto aos orixás, sendo indispensável cm qualquer ritual. E usado
em oferendas e com o recurso divinatório. O núm ero de gom os varia
conforme a espécie de obi. D etentor dc axé, pode ser com ido e ofe­
recido aos orixás.

187
Ò k ú ta: pedra de assentam ento sacralizada com folhas e çjè.
O rd em : princípio que, um a vez respeitado, favorece as relações com Exu.
O rg anização: princípio que, um a vez respeitado, favorece as relações
com Exu.
O ríta : encruzilhada. Não im porta o núm ero de ruas que as constituam , as
encruzilhadas representam o ponto de encontro de caminhos: os de
Exu, Iyami Oxorongá, os demais orixás, ajoguns, ancestrais e huma­
nos. A encruzilhada simboliza, tam bém , o ponto de encontro entre
invisível e visível, espiritual e terreno.
Ó rógbó: orobô (GARCINIA KOLA, Guttiferae). Amargosa noz de cola.
Bastante utilizada para mascar e tam bém com o elem ento indispen­
sável nos rituais sagrados.
O w ó-eyo-m çta: três búzios. Simbolizam dinheiro porque já foram moe­
das no passado. Nos assentamentos de Exu costum a-se colocar trés
búzios abertos.
Ò be Esii: faca com um ou, de preferência, com corte dos dois lados. É cos­
tum e reservar duas facas para Exu - um a pequena, que fica sobre o
assentamento, e outra grande, para uso ritual.
Ò go-íléw ó-Èsü: bastão confeccionado na m adeira sagrada iroko, de apro­
xim adam ente 20 ou 30 centím etros, com a imagem de Exu esculpi­
da, com çgo na nuca e, por vezes, um a figura hum ana, que pode ser
masculina ou feminina. Q uando se trata de um a imagem do sexo
feminino, a figura tem geralmente o cabelo trançado e por vezes car­
rega um a criança no colo, fazendo referência à fertilidade propiciada
por esse orixá. Q uando se trata de um a imagem do sexo masculino, a
figura representa muitas vezes um guerreiro. Esse bastão, preparado
para evocar a presença e a força de Exu, serve tam bém como elemen­
to para a identificação de seus devotos. Nos m om entos de dificulda­
de, o çgç é usado como defesa. Pode ser enriquecido com detalhes,
como, por exemplo, búzios abertos, ou ter seu cabo revestido com
contas brancas, vermelhas e pretas. C onstitui elem ento de identifi­
cação, símbolo de poder e recurso de defesa e de ataque, de benção
e de maldição. Durante os rituais, os iniciados carregam e ostentam
esse objeto sagrado.
O gójç owó-eyo: colar confeccionado com 160 búzios abertos e trançados
em forma de escamas.
Qj á: feira. Espaço de trocas, com pras e vendas, a feira reúne elementos
associados ao dinheiro e a seus dinam ism os. Exu protege a feira por­
que ela representa a organização da sociedade hum ana e simboliza o

188
próprio planeta terra. A feira, com o a vida, é um local de passagem
onde todos se encontram com o mesmo objetivo: sobreviver. Na feira
as pessoas param , realizam trocas e conquistas e depois vão em bora.
Óta: pedra sagrada utilizada cm assentamentos.
P o rrete: vide ère Esú.
P u nhal: vide çbe Èsú.
R e sp o n sa b ilid a d e : princípio que, respeitado, favorece as relações com
Exu.
Terra: vide çjá (feira).
Universo: vide çjá (feira).
Verdade: princípio que, uma vez respeitado, favorece as relações com Exu.
Yangí Ó ta: pedra sagrada de Exu. Laterita cm estado bruto. Uma vez en­
terrada obliquam ente no chão, sobre ela se coloca bastante dendê.
Os iniciados em Exu são cham ados tam bém de Oní Yangí {dono do
yangí) c são acalmados com dendê. Narra o m ito que Exu teria se
transform ado em yangí ao saber da m orte de O runm ilá, seu grande
amigo. O utro mito narra que certa vez O runm ilá pediu em prestado
o ori de Exu e com isso se tornou conhecido por todos. Passou a ser
querido, procurado e m uito falado. Um dia Exu resolveu pedir seu
ori de volta e O runm ilá pegou y a n g í e a colocou do lado de fora de
casa, dizendo:
Èsú Qdàrà sin Içhin mi.
Gborí gborí k ii gbori Iççmeji.
Exu Odara, pare de me perseguir, entreguei seu ori a você.
Quem recebe seu ori, não o recebe duas vezes.
Ao devolver yangí a Exu, O runm ilá estava devolvendo a ele o seu ori
e, até hoje, yangí é o sím bolo máxim o de Exu:.
Terminada essa apresentação dos principais símbolos de Exu, pas­
semos à descrição dos seguintes rituais: assentam ento, iniciação, ebó, osé
e festa anual.

Gígun E s ú - Rituais de A ssentam ento


Exu é assentado na entrada das casas, sejam elas residenciais, com er­
ciais ou religiosas, para neutralizar energias desfavoráveis e evitar efeitos
de qualquer ação malévola. Nas casas religiosas este assentam ento é abso­
lutamente indispensável. Uma vez assentado, o orixá age com o protetor e
guardião das pessoas e do am biente em todos os aspectos da vida. No caso

No capítulo 2 - 0 divino na tradição dc orixá s- há outra narrativa referente a yangí.

189
dc as pessoas estarem sujeitas à m udança de local, é recom endável que se
faça um assentam ento móvel, utilizando-se para isso um recipiente. Não
convém fazer o assentam ento diretam ente na terra, para que ele possa ser
deslocado se houver necessidade disso.
Os objetos sim bólicos indispensáveis para o assentam ento dc Exu
são os seguintes: crc Èsú (im agem ), pgç-JIcwç-Èçú (bastão); yangí çta
(pedra laterita); çrçwç-inçta (três búzios abertos); çbç Èsú (faca comum
ou, de preferência, com corte dos dois lados); asç dúdú (pano tingido de
azul índigo para cobrir o assentam ento); çgçjç owó-çyo (colar confec­
cionado com 160 búzios abertos e trançado em form a de escam as); àgbo;
obi e orobó.
R itual de assentam ento fixo. O ritual de assentam ento fixo é bas­
tante complexo. A seguir apresentam os alguns dos procedim entos que o
integram:
1 . O sacerdote utiliza obi e orobó para inform ar a terra de que o
ritual será realizado e consultá-la a respeito de detalhes do procedimento,
como, por exemplo, a quantidade de elementos a utilizar. Esse diálogo com
a terra, realizado através do jogo oracular, será m antido ao longo de todo
o processo, ou seja, a cada etapa concluída o sacerdote se dirige novamente
à terra para saber se o processo está sendo bem conduzido ou se é preciso
introduzir algum a alteração.
2. A terra é cavada para receber todos os elementos utilizados para
sacralizá-la e todos os símbolos sagrados. Enquanto a terra vai sendo cava­
da, o sacerdote de Exu entoa cantigas próprias desse ritual, evocando a di­
vindade para que presencie o ato c o abençoe com o seu axé. Essa evocação
perdura até o fim do ritual.
3. Estando cavada a terra, o sacerdote prepara o ctútú do assenta­
m ento: despeja no interior da cavidade os elementos de origem mineral
e vegetal - água, bebida destilada, banha de ori, sal, azeite de dendê, mel,
cana-de-açúcar, atarê (pim enta-da-costa), obi e orobó abertos, çko, èkuru-
funfun, èkuru-pupa e, por fim, sobre esses elementos, o àgbo das folhas de
Exu e dc outros orixás, previam ente maceradas em água. Acrescenta-se a
esses elementos um a carga mágica cujo preparo é de conhecim ento priva­
tivo de sacerdotes.
4. Isto realizado é feita a oferenda de anim ais: cabrito, galo, galinha-
d ’an gola, p o m b o branco e igbín. O sangue e a cabeça d o s a n im a is sacrifi­
cad os são d ep ositad os sobre os elem en to s m inerais e vegetais. Finalmente,
ali são colo ca d o s os seguin tes elem en tos: água, azeite d e d en d ê, m el, sal e
bebida destilada.

190
5. Cobre-sc tudo com a terra anteriorm ente retirada.
6 . O çta (yangí), ja sacralizado com àgbo, é colocado de m odo que
uma parte da pedra yangí fique em contato com o axé, e o restante, exposto.
7. A terra é consultada pela última vez para saber se o procedim ento
ritual foi satisfatório.
O àgbo utilizado para sacralizar os objetos do assentam ento é pre­
parado com as folhas ewé sànsáàrà, t i r e ina (folha de fogo), ewé çdúndún
(folha-da-costa/folha da fortuna) e ewé tètç (cauda de raposa, caruru, bre-
do), entre outras. Depois de socadas_DO pilão ou maceradas com as mãos, a
elas se m istura banha de ori, água e bebida destilada.
Esse ritual fortalece o chão da casa e esta irradia nas imediações.
Quanto mais bem feito tiver sido esse ritual, tanto m aior será o seu raio
de ação. Todos os freqüentadores desse espaço sagrado beneficiam -se des­
sa força.
A ssentam ento móvel em recipiente de cerâm ica. Caso haja necessi­
dade de realizar assentamentos removíveis utilizam-se recipientes de cerâ­
mica como, por exemplo, um alguidar, obedecendo-se ao seguinte procedi­
mento: o yangí óta e todos os demais objetos rituais são lavados com àgbo,
colocados no recipiente de- cerâmica e alimentados conform e o descrito
anteriormente.
A quantidade exata de elementos ofertados depende da orientação
advinda do jogo oracular e da condição econômica do devoto. Caso não
haja condições para realizar uma oferenda complexa ao orixá, o devoto
oferecerá o que está ao seu alcance e pedirá sua benção para poder realizar
uma oferenda mais generosa no futuro. A aceitação das oferendas por parte
dos orixás não obedece a padrões hum anos de valor. O mais im portante
não é a quantidade exagerada nem a diversidade de elem entos, e sim a leal­
dade e a fidelidade do devoto do orixá, bem como a sua obediência à moral
prescrita pela religião.

Ritual de iniciação em Exu


A iniciação em Exu, com o todo o processo iniciático, é um a o p o rtu ­
nidade de renascer sem m orrer fisicamente. Pode ser realizada de diversas
formas e envolve m uitas etapas e procedim entos, dependendo sua reali­
zação dos conhecimentos do sacerdote. O procedim ento aqui descrito é
apenas um dos procedim entos possíveis e pode sofrer variações, desde que
sejam respeitados princípios básicos, norteadores das iniciações em geral.
O espaço que receberá o iaô é sacralizado: sempre ao som das canti­
gas de Exu e dos tam bores e sem pre acom panhado de evocação à ancestra-

191
lidade espiritual do sacerdote, o chão é sacralizado com um a pintura feita
com çfun e osún. Terminada a pintura, em seu centro são colocados os se­
guintes elementos: água, bebida destilada, banha de ori, atarê (pimenta-da-
costa), obi c orobô abertos, çkç e folhas sagradas. Acresccnta-se a isso uma
carga mágica cujo preparo, realizado anteriorm ente e ao longo de meses, é
de conhecim ento exclusivo dos sacerdotes, que têm o dever de zelar por este
conhecim ento. Estando o espaço assim preparado, nele se coloca um àpóti
(banquinho) ou um pilão com a base voltada para cima.
Logo depois das oferendas à divindade, um a vez realizados os rituais
de ebó e de bori, o iaô é enrolado num lençol branco e conduzido ao espa­
ço já sacralizado, ao som de tam bores e cantigas de Exu, acom panhado de
dança e expressões de alegria. Sentado no pilão ou no àpóti, o iaô recebe um
bori com plem entar, realizado com ou sem çjè.
C onform e já descrito, Exu possui duas faces, podendo enxergar o que
está adiante e o que esta atrás ou olhar para o futuro e para o passado. Ou
seja, possui sabedoria ilimitada e visão expandida para todas as direções,
podendo proteger seus devotos de ataques adivinhos de qualquer ponto
- no espaço e no tem po - e a iniciação no orixá favorece o desenvolvimento
dessas habilidades nos iniciados.
Considerando isso, o ritual tem início com um bori realizado por
dois sacerdotes, que atuam sim ultaneam ente, e de m odo complementar,
um posicionado à frente e o outro às costas do iaô. Aquele que está posicio­
nado à frente evoca Exu e o ori do iaô, a quem oferece obis e orobôs abertos.
Depois, mastiga um pouco de cada um destes frutos e coloca a mistura
resultante em quatro pontos do corpo do iaô: na testa, na moleira, no peito
e no dedão do pé esquerdo (para estabelecer conexão entre ele e sua força
ancestral). O sacerdote que está posicionado atrás do iaô aguarda o término
desse ritual para proceder exatamente do m esm o m odo nas costas, tocando
especialmente a nuca, ponto onde se concentra o m aior axé de Exu.
Concluída essa prim eira etapa da iniciação, cada oficiante pega uma
galinha-d’angola e, enquanto o sacerdote posicionado à frente toca a testa
do iniciante com essa ave, o de trás toca, sim ultaneam ente, sua nuca com a
outra ave. Evocam Exu, abençoam o iniciante e, sim ultaneam ente, sacrifi­
cam esses animais a seu ori. O èjç de um a ave é colocado na testa, o da outra
ave é colocado na nuca e o de ambas é colocado no dedão do pé esquerdo.
O restante do çjç das galinhas-d’angola é colocado sobre o assentamento
de Exu.
O iaô recebe obi e o orobô e os come diante de Exu. Tem início então
um a nova fase do processo iniciático. O iaô é conduzido a outro local para

192
ser banhado. Não deve banhar a si mesmo, pois esse ritual é um processo
de renascimento. O banho de àgbo, que o lavará de todo o mal e consagrará
seu corpo a Exu, é preparado com várias folhas sagradas e dado por um a
pessoa iniciada, ao som de tambores e cantigas de Exu, com o a descrita
abaixo:

Orin Èsú
(cantiga entoada durante o banho)
Èsú wç m i rckcíc.
Wç m ii mç.
Wç m i rekete.
Wç m i niówó iãyc.
Èsú wç m i rckcte,
Wç m i nyè o.
Èsú wç m i rckcte.
Aiádé wç m i nláyç o.

Cantiga de iniação em Exu


Exu, me lave por inteiro para que eu me livre de todos os males.
Lave-me para que eu esteja limpo e protegido.
Exu, me lave por inteiro para que eu me livre de todos os males.
Lave-me para que eu prospere na vida.
Exu, me lave por inteiro para que eu me livre de todos os males.
Lave-me para que eu viva com saúde.
Exu, me lave por inteiro para que eu me livre de todos os males.
Oh, Exu! Rei! Senhor da Coroa! Lave-me para que eu tenha felicidade
e alegria.

Terminado o banho, o iaô retorna ao quarto sagrado enrolado num


lenço branco, com a cabeça coberta com tecido branco, e é sentado nova­
mente sobre o pilão ou àpóti. Sua cabeça é raspada, sim bolizando a aliança
estabelecida com o orixá através do ritual. O cabelo cortado é colocado
diante do assentamento de Exu como oferenda, o que expressa a entrega
pessoal e serve de recurso para fortalecer a conexão entre a divindade e seu
iniciado. Nos casos em que a pessoa se vê im pedida de raspar a cabeça, por
razão alheia a sua vontade, apenas uma pequena porção de cabelo é rem o­
vida e entregue simbolicamente à divindade.
Depois de raspar a cabeça o iaô é novam ente banhado com os mes­
mos rituais que acom panham o banho anterior. Reconduzido ao quarto, é

193
sentado sobre o pilão ou àpóti e sua cabeça é pintada com çíiin e osún. Em
seguida é levado novam ente para fora e sua cabeça é lavada com àgbo por
três vezes sucessivas.
Retornando ao interior do aposento pela terceira vez, seu corpo é
novam ente pintado. A pintura sacraliza o corpo e consagra o iaò a Exu. A
pintura do corpo evidencia a aliança estabelecida com o orixá e, simultane­
am ente, serve de proteção contra ao ataque de inimigos. Uma vez concluída
a pintura, o iaô recebe o tyède animais em seu ori.
A medida em que os sacrifícios vão sendo realizados, Exu é evocado
-ao-som deJam bores e-cantigas.-Após o-iaô-receber o è/è e sua cabeça-ser—
com pletam ente coberta com penas das aves, o sacerdote coloca sobre ela
um a cabaça repleta de distintos elementos carregados do axé deste e de
outros orixás, para o fortalecimento de seu ori e para sim bolizar o vínculo
da pessoa com o orixá e seu ingresso nesse universo espiritual.
A cabaça representa a união entre orun e aiye. A m etade de baixo
representa o aiye e a m etade de cima, o orun. Assim sendo, a cabaça tampa­
da e repleta de elementos simbólicos, contidos em seu interior, representa
a integração dos m undos mineral, vegetal, animal e hum ano, bem como
a relação dessa dim ensão com os seres do m undo espiritual - orixás e an­
cestrais. Pousar a cabaça assim constituída sobre o ori do iaô estabelece
um fluxo energético e promove a integração entre a pessoa que está sendo
iniciada e todas as forças do universo. Isto para que o iniciante adquira as
virtudes próprias do orixá no qual está sendo iniciado e as utilize para obter
bem -estar, poder, sucesso e vitória em sua cam inhada na vida.
D urante esse processo é bem possível que o iaô entre em transe, caso
cm que é levantado do pilão para dançar. Depois é conduzido a um a esteira
e, mais tarde, a um novo banho. Pode ocorrer que o iaô seja levado dire­
tam ente para um novo banho e depois para a esteira, dependendo de seu
estado de consciência. O tem po de perm anência na esteira tam bém varia de
acordo com seu estado físico e de consciência.
Procede-se agora à limpeza do chão com água e pano branco. Todos
os elementos já desnecessários são removidos e o pilão retorna à posição
norm al. Na m anhã do dia seguinte o iaô é banhado e depois pintado nova­
mente com çfun e osún.
O que deve ser feito nas etapas seguintes e a duração total do pro­
cesso iniciático vão depender do tem po disponível do iaô. Se dispuser de
sete dias será pintado diariam ente durante este período. Sendo possível,
no terceiro e/ou no sétimo dia realiza-se o ritual de oferenda de comida
a Exu. No ita (terceiro dia) e no ije (sétimo dia) são oferecidos diversos

194
tipos de comida, o que inclui èbà servido com m olho de carne e repartido
em pequenas porções, inham e, dendê, mel, comida preparada com feijão e
milho, entre outras. A comida é colocada em sete folhas de iyálóde (pinhão
paraguaio) ou em um a cabaça e levada pelo iaô para ser entregue no assen­
tamento de Exu, ao som de tam bores e cantigas com o a seguinte, entoada
no terceiro dia:

Onita! Yà ira gba ire o!


Oníta! Yà wá gba ire o!
--------- QdàrànioniTa!
Èsú Elègbàra ni onita!
Onita! Yà ira gba ire o!
Ki nlówó. k i nláyp!
Èsú Onile yà ira gbçbç o.

Oh, Senhor do Ita! Venha me trazer sorte!


Oh, Senhor do Ita! Venha m e trazer sorte!
Odara é o Senhor do Ita!
Exu Elebara é o Senhor do Ita!
Oh, Senhor do Ita! Venha me trazer sorte!
Para que eu progrida e seja feliz.
Exu! Senhor do Ita! Venha receber o ebó!

Ao final da iniciação é realizado o ritual de ije (sétim o dia): o iaô


senta sobre a esteira e é feito um jogo divinatório com búzios para o co­
nhecimento de seu odu de nascim ento no culto a Exu. Esse odu indicará
também qual ou quais orixás deverão ser cultuados juntam ente com Exu e
orientará o iaô a respeito do cam inho a trilhar, o que inclui o conhecim ento
de seus ewós, interdições relativas a atitudes e com portam entos, consum o
alimentar c uso de cores.
O ritual de iniciação em Exu estará concluído e o iaô inaugura agora
uma nova e promissora etapa em sua vida. Conservar e desenvolver o axé
obtido durante esse processo dependerá, em boa parte, do respeito que tiver
para com as interdições recomendadas e de atitudes de compromisso e leal­
dade para com o próprio ori e para com a divindade à qual foi consagrado.

R esponsabilidades dos iniciados cm Exu


Q uando uma pessoa é iniciada em Exu adquire a responsabilidade
de propagar sua energia. Tem a responsabilidade tam bém de adotar uma

195
postura coerente com o fato de ser devoto de tão nobre orixá. Suas atitudes e
com portamentos devem ser marcados pelas mesmas virtudes e característi­
cas dessa divindade: bondade, paciência, ordem, disciplina, organização, leal­
dade, fidelidade, solidariedade e compromisso com a verdade, entre outras.

Rituais de Ebó
Çbo (ebó), um dos recursos fundam entais de transform ação das
condições existenciais, sejam elas de ordem natural ou social, é um ato pro-
piciatório realizado a partir da orientação oracular, com vistas a prevenir o
mal ou atrair o bem , ou seja, com vistas a favorecer a superação de proble­
mas e a conquista do necessário para o desenvolvimento, seja ele de ordem
pessoal ou grupai. Há basicamente três tipos de ebó: o preventivo, que evita
um mal que está para ocorrer; o curativo, que afasta um mal já instalado; e
o atrativo, que atrai o bem . O ebó, ato litúrgico de com unhão entre habi­
tantes do aiye e habitantes do orun, inclui a oferta de com ida, o que, por si
só, já é um recurso valioso para evocar, criar ou atrair energias benéficas.
A m aioria dos ebós realizados a partir da recom endação de Ifá se­
gue rigorosamente a orientação contida nos enunciados do Odú Corpus.
Estes descrevem os problem as do consulente e as soluções possíveis a eles,
que incluem necessariamente os ebós, muitos dos quais são realizados pelo
babalaô na presença do consulente. Os ebós são preparados com diversos
itens materiais e oferecidos às divindades para a solução de problemas, que
podem ser individuais ou coletivos. Os ebós coletivos beneficiam grupos de
pequeno, médio e grande porte - um pequeno grupo familiar, por exemplo,
ou um a organização empresarial, um a cidade, um estado, um país. Desse
m odo, realizam-se ebós para afastar doenças, para au m en tar a produção
agrícola através de chuvas regulares, para proteger um a pessoa ou grupo
de pessoas em penhadas num a expedição de guerra, para favorecer o au­
m ento da lucratividade de um a associação ou de um espaço comercial, e
assim por diante.
Evidentemente, a form a de realizar os ebós não é criada pelo babalaô
a seu bel prazer. Também ela decorre de ensinam entos contidos nos enun­
ciados de Ifá, nos itans do odu que se manifestou durante a consulta. A
narrativa a respeito de com o a personagem dc um determ inado itan viveu,
que problemas enfrentou e com o os superou inclui a recom endação de um
ebó3. As vitórias alcançadas e as desventuras evitadas pela personagem mítica

’ Ê possível constatar isso lendo os enunciados iorubás, apresentados no capítulo 10 - M itos de Exu nos
odus de Ifá (iorubá) - e no capítulo 11 - M itos de Exu nos odus de Ifá (português).

196
desse itan serão reproduzidas na vida do consulente, desde que o conselho
seja solicitado, com preendido, acatado e obedecido, conform e recomenda
reiteradamente a sabedoria iorubá através de múltiplos enunciados orais.
Para a realização do ebó são indispensáveis os elem entos da natureza
- terra, água, ar e fogo —e a presença do sol ou da lua. Condições climáticas
com o chuva e sereno podem integrar sua fórmula.
Os itens m ateriais a serem utilizados incluem m uitas vezes água de
múltiplas origens (rios, lagos, mares, nascentes, orvalho, chuva), azeite de
dendê, mel, sal, cana-de-açúcar, obi, orobô, pim enta, peixe, punhados de
terra, ou seja, toda e qualquer espécie mineral, vegetal e anim al, tudo o que
a boca come ou que faz parte da vida hum ana. Cada elem ento possui seu
axé específico, cujo sentido pode ser apreendido através da exploração de
seu simbolismo. O m esm o vale para a com preensão do significado dos as­
tros nos rituais realizados durante o dia ou durante a noite, bem com o das
condições climáticas e do local de entrega do ebó.
A água, elem ento feminino e passivo, com sua propriedade de m an­
tenedora da vida, circula em toda a natureza, sob a forma de chuva, seiva,
leite ou sangue. Possui o poder de tornar sagrado o que se toca e de estabe­
lecer harmonia. Com o todo ser vivente procede das águas, os banhos favo­
recem, por analogia, a ocorrência de renascim entos rituais e prom ovem a
circulação de novas forças, que atualizam o potencial de vida dos indivíduos.
Transparentes, profundas, fecundas, correntes ou estancadas, doces ou sal­
gadas, tempestuosas ou calmas, atingem distintos objetivos rituais.
As águas “superiores”, das chuvas e do sereno, descem sobre a terra,
enquanto as “inferiores”, dos rios, dos lagos e dos mares, ascendem através
da evaporação. Em m ovim ento contínuo e ininterrupto, sem lutar, rom ­
pem as águas o que é d u ro e resistente. Dessas analogias serve-se a magia
simpática dos ebós.
O sal, elem ento de conservação, preservação e durabilidade, confere
formas e as sustenta. Suas associações com o aquecim ento e a esterilidade
(salgar o chão é condená-los à im produtividade) o recom endam com o um
dos principais elem entos neutralizadores de malefícios.
O elemento m ineral confere forma às coisas e as preserva, o vegetal
promove renovação de forças e reenergizaçâo e o anim al favorece a reposi­
ção de energias perdidas. Cada um dos m inerais, vegetais ou anim ais utili­
zados possui peculiaridades energéticas, atuando de m odo particular neste
ou naquele ponto específico, prom ovendo alívio de dores físicas, favore­
cendo a realização de negócios, facilitando intercursos am orosos e assim
por diante. Os anim ais podem absorver a doença de um hom em , em bora

197
a recíproca não seja verdadeira. Entretanto, entre os seres hum anos, uns
podem absorver a doença de outros. Não estam os nos referindo a moléstias
físicas, e sim a desequilíbrios energéticos, com o o azar, a falta de sucesso
am oroso, o desequilíbrio emocional.
Rituais realizados durante o dia, sob a luz do sol, diferentem ente de
outros, realizados durante a noite, à luz da lua e das estrelas, certamente
buscam estabelecer conexões com seres que, tanto num caso com o cm ou­
tro, possuem atributos favoráveis às trocas que se pretende estabelecer para
atingir as finalidades do ebó.
O local de realização ou entrega do ebó tam bém varia segundo a s "
instruções contidas nos odus: encruzilhada, m ontanha, mata, floresta, mar,
rio e copas de árvores, entre tantos os possíveis.
As encruzilhadas, lugares onde os caminhos se cruzam - oríta mçta
(confluência de três ruas ou encruzilhada em T) e oríta mçfa (confluência de
seis ruas) - são consideradas sagradas, pois nelas ocorre o encontro das forças
do orun com as forças do aiye. Nelas Exu e as Iyami Oxorongá recolhem o ebó
para transportá-lo, ou seja, são estes seres que conduzem o ebó a seu destino.
A m ontanha, por seus com ponentes essenciais - altura, verticalidade,
grandeza, quietude e estabilidade - favorece, analogicam ente, o crescimen­
to e a serenidade.-A imagem de ponto de união entre o céu c a terra sugere
as possibilidades hum anas de transcendência dos limites materiais.
A mata e a floresta, domínios de Ogum, Oxóssi, Ossaim, Aroni e Erin-
lé, são lugares dc abundante vida vegetal e animal, vida ainda não dominada
nem cultivada, lugares onde a luz do sol não penetra. São, portanto, potências
que se contra-opõem a ele. Simbolizam a terra e a natureza em sua qualidade
de devoradora, misteriosa e retentora de toda espécie de perigos, de inimigos
e de doenças. Simbolizam, simultaneamente, as múltiplas possibilidades de
proteção, defesa e crescimento. A floresta e, em m enor grau e intensidade,
a mata, favorecem, analogicamente, os acordos entre o hum ano e o natural
com trocas m utuam ente benéficas. Um bom exemplo disso encontram os no
odu Ogbè-Ògúndá, narrativa na qual Igún, filho de Eledunmare, é curado ao
ingerir os ebós realizados por Orunm ilá e entregues na mata.
O mar, dom ínio de Iemanjá, Senhora de todas as águas, Olokum , Se­
nhor das profundezas das águas salgadas, Qlosá, Senhora da água salobra,
e A jê\ Senhora da prosperidade, do poder e da riqueza, é o lugar sagrado
cujo sim bolism o inclui o poder das águas de levar para as profundezas,

4 A jc (cm português pronuncia-se Ajc) é Senhora da prosperidade, do poder c da riqueza. Não confundir
com A jç (Ajc) mulher dotada de poderes especiais que os utiliza para praticar tanto o bem quanto o mal.

198

L
para lugares que nem as m ãos nem os olhos podem alcançar. O mar, fontt
da vida, tem o atributo, com suas águas carregadas de sal, de favorecer í
limpeza de forças negativas que criam obstáculos ao desenvolvimento. A
existência hum ana estabelece analogias com o mar, pois am bos têm m ovi­
mento contínuo, ininterrupto, m uitas vezes violento. Os desejos hum anos
incluem o de firm ar porto, de possuir um porto firme, que sirva de referên­
cia para as partidas e para os retornos.
O rio é dom ínio de Iemanjá, O xum e outros orixás. Suas águas em
contínuo m ovimento simbolizam a força criadora da natureza e, portanto,
a fertilidade produzida pela irrigação dn tcrrn. Seu curso irrevérsívél sugere
possibilidades de abandono e esquecim ento e, analogicamente, determ ina
que as magias aí lançadas tenham efeito decisivo. Suas águas lavam o mal,
retiram azares.
As árvores, algumas sagradas, com o o çpè-Ifá (dendezeiro) e o iroko
(gameleira branca), muitas abrigando seres que presidem a vida das se­
mentes, a fecundação, a germinação, a conservação e a reprodução, são, elas
mesmas, objetos de rituais para hom enagens e súplicas. Sob suas raízes, sob
a sua som bra e em suas copas realizam-se entregas de ebós cuja finalidade
apropria-se dos sentidos analógicos aos aqui referidos.
Às vezes o procedim ento inclui a reconstituição, tam bém analógica,
de partes do mito. Um exemplo disso é a prática de pendurar a cabeça do
cabrito sacrificado na copa de um a árvore, ao ser realizado o ebó recom en­
dado pelo odu Èji-Ogbe5. Este ebó, utilizado para evitar suicídios, inclui o
procedimento dc pendurar a cabeça do animal na copa de um a árvore, re­
produzindo analogicamente o enforcam ento de Èsü Yàlàyàlà6, personagem
do mito que, para afastar a m orte, foi orientado a fazer ebó com um cabrito
e o seu próprio çjá (tira de pano usada para am arrar a roupa). Tendo sc re­
cusado a isso, termina servindo-se desse çjá para enforcar-se num a árvore. Esse
ebó é utilizado também em casos de pessoas que estão sob ameaças de morte
social, ou seja, pessoas que estão prestes a perder lugares sociais conquistados,
seja na família, seja no trabalho, seja em qualquer outro grupo ou situação.
Durante a realização do ebó o babalaô recita poemas integrantes de
determinados odus, poem as esses relativos à condição existencial do con­
sulente. Recita também poem as próprios para o acom panham ento de ebós
e que podem ser entoados apenas por esses sacerdotes.

5 Esse odu é apresentado no capítulo 10 - M itos dc c.xu nos odus dc Ifá (iorubá)c no capítulo 11 - M itos dc
Exu nos odus dc Ifá (português).
* Èsú Ysilàyàlàé uma planta dc grande fertilidade, que cresce e se espalha abundantemente. Não confundir
com Ê$ú (Exu).

199
O ebó pode ser oferecido a Exu, às Iyami Oxorongá, aos demais ori­
xás e aos ajoguns. Exu tem uma relação m uito especial com o ebó por ser
o guardião dos axés específicos das divindades, bem com o de todas as for­
ças, entre as quais se incluem as dos ancestrais e as dos ajoguns. Também
compete a Exu transportar o ebó e consum i-lo, tarefas que executa com a
participação de Iyami Oxorongá e dos ajoguns.
Durante o preparo do ebó é preciso que a pessoa a ser beneficiada se
m antenha concentrada nos objetivos pretendidos e peça incessantemente
o que deseja - falando ou pensando - para que o objetivo seja atingido. É
preciso, entretanto, ter clareza a respeito do que se vai pedir, pois a solução
dos problemas exige uma apresentação clara daquilo que se quer.
O ebó, através de dinam ism os próprios da magia simpática, esta­
belece uma relação profunda e íntim a entre as necessidades da pessoa e as
forças que podem supri-las. O ebó, carregado das dores e dos sofrimentos
da pessoa, não deve servir de alim ento a ninguém . Somente pode ser toca­
do por pessoas devidam ente preparadas e autorizadas. Isto para evitar que
outros se apropriem da infelicidade transportada para ele.
Conform e já enunciado, todo e qualquer ritual de orixá é iniciado
com saudações a Exu. Nos rituais de ebó é Exu quem propicia a energia
necessária a sua m anipulação e transporte c é a ele que com pete estabelecer
canais de comunicação entre a pessoa, o ebó e as divindades que o recebem
para aliviar o sofrim ento hum ano.

Ó nse çbo, ó mu tèsú mg, ó si /; 'fç k i çbo náà dà?


Você esta fazendo ebó sem dar nada para Exu e quer ser bem-
sucedido?

Em alguns países da diáspora africana a exigência ritual tem sido,


m uitas vezes, m al-interpretada, com o se houvesse um a condição de
privilégio ou um a situação de rivalidade e com petição entre Exu e os
outros orixás. Este equívoco talvez se deva à dificuldade de acesso dos
devotos de orixás nos países da diáspora aos conhecim entos tradicio­
nais contidos nas narrativas m íticas relativas à criação e à dinâm ica das
relações entre as divindades e à distribuição dos axés feita p o r Eledun-
m are aos orixás.
Assim sendo, a presença de Exu em todos os rituais não é exigida por
um “capricho” da divindade. Trata-se de um a lógica de fluxo de energias
estabelecida por Eledunmare. Tudo passa por Exu, dada a sua condição
de autoridade absoluta, que influi na vida do hom em e dos outros orixás,

200
e ninguém pode negar isso. Cultuá-lo é condição indispensável no culto a
todo e qualquer orixá.
Em todos os cultos aos orixás os sacerdotes reconhecem e aceitam a
superioridade hierárquica de Exu e a obrigatoriedade de fazer inicialmente
a oferenda e a louvação a ele. Assim sendo, ao realizar oferendas, ebós e
outros rituais, é preciso respeitar a regra de iniciá-los saudando essa divin­
dade. A desobediência acarreta bloqueio 110 fluxo de axé. O m esm o vale
para 0 culto aos ancestrais e às Ivami Oxorongá: é preciso louvar Exu antes
de entregar as oferendas a eles.

Láisi agbára Èsú, Obalúwayé, kò lê fa ilégbóná.


Sem Exu, Obaluaiê não poderia curar a varíola e outras enfermidades.

Láisi agbára Èsú, Sàngó Olúkòso kò lê ní agbára lati ti sán àrá.


Sem Exu, Xangô Olukoso não poderia m anipular a própria força
através do raio, nem agir em defesa dos injustiçados.

Estes provérbios m ostram que, sem a ação de Exu, nem Obaluaiê,


nem Xangô, nem qualquer outro orixá pode agir. Isso significa que o axé
das divindades é veiculado pela oferenda feita a Exu. Significa que o axé
de Exu dinamiza e conduz o axé dos outros orixás. A norm a de oferecer a
primeira parte de qualquer oferenda a ele encontra fundam ento na relação
profunda e complexa que ele m antém com as demais divindades.
Além de participar dos rituais em hom enagem aos demais orixás,
Exu tem os que lhe são próprios, alguns dos quais acham-se descritos no
presente capítulo. As oferendas a ele são feitas durante os ebós, em psçF ou,
ainda, nas festas anuais.
Veremos adiante algumas particularidades de cada uma dessas situações.
A Exu se oferecem elem entos de origem m ineral, vegetal e animal.
Os elementos m inerais e vegetais incluem água, am endoim , pim enta, azeite
de dendê, bananas, búzios, cana-de-açúcar, coco, çwá funíun (feijão fradi-
nho), çwá dudu (feijão preto), frutas, inham e baiano (cará), jiló, mel, milho
verde, oka tàbiàgbádo (espiga vigorosa de m ilho), milho torrado, obi, oro-
bô, tçtç (folha de caruru). As oferendas de origem animal incluem ôbúko
(bode, cabrito), carneiro, galinha-d’angola, galinha, àkúko-adíç (galo ou
frango), igbín, pom bo branco, porco ou porca.
As oferendas incluem alim entos preparados, entre os quais àkàrá,

O ()sç(osc) c uma oferenda realizada aos orixás a intervalos rcgulares.

201
banana da terra cozida, ék<?, èkuru-funfun, èkuru-pupa, feijão torrado,
inham e assado ou cozido, milho torrado, ofúJójú, òlóngbò e peixe defuma­
do. Toda oferenda é acom panhada de bebida destilada.
Conform e já foi dito, a quantidade e a diversidade do que é oferecido
dependem das possibilidades materiais do ofertante. Observam os nas nar­
rativas míticas que essa divindade nunca exigiu nada além do determinado
por Eledunm are como sendo necessário ao bom andam ento dos rituais de
culto aos orixás.

C ircunstâncias que lev am um a pessoa a fa z e r ebó p ara E x u ---------


As principais circunstâncias que levam um a pessoa a fazer ebó para
Exu são as seguintes: (1) um “encontro no cam inho” —àrinnàkò—', uma pes­
soa encontra outra e através dela recebe um a m ensagem de Exu alertando
para esta necessidade; ( 2 ) durante um a consulta oracular realizada por um
babalaô, ialorixá, babalorixá, onisègún ou olçsányin, a pessoa tom a conhe­
cimento de um problem a ou se evidencia a convivência de criar condições
propícias à realização de algo pretendido; (3) através de sonhos da própria
pessoa ou de outros que a conhecem; (4) por vontade própria.

Òsè de Exu
Os pspsão realizados em dias preestabelecidos, sendo seu intervalo
variável a cada sete, onze, vinte e um , trinta e três, ou m esm o noventa dias.
No dia do p íp d e Exu, pela m anhã bem cedo, o sacerdote pega obis, orobôs,
azeite de dendê e bebida destilada e aproxim a-se do assentam ento, acom­
panhado de iniciados.
Inicia o ritual saudando Onilê (a Mãe Terra), Iyami Oxorongá e Exu:
derrama na terra e no assentamento de Exu um pouco dc água e, depois, be­
bida destilada. A seguir faz a evocação de Exu, agradecendo os bens recebidos
e pedindo proteção para todos. Abre então os obis e os orobôs e os oferece.
Se a oferenda for aceita, o sacerdote os coloca no assentamento e sobre eles
derram a azeite de dendê. Por vezes, sacrifica-se algum animal. Também são
feitas as oferendas de èkç, èkuni-fimfun e èkuru-pupa, entre outras.
Realizadas as oferendas, consulta-se a divindade para saber se houve
aceitação: se, ao se jogar os obis, a m aior parte de seus gomos caírem volta­
dos para cima, isso assinala que houve aceitação. Assim sendo, a oferenda

' ( k ç é uma comida preparada com amido de milho branco, também chamada acaçá. í.k u n ié uma comida
preparada com fcij.io fradinho moído c cozido no vapor. O èktiru-fimfim não é acompanhado de molho,
enquanto o èkuru-pupa t acompanhado de um molho com azeite de dendê, pimenta e outros temperos.

202
terá sido aceita quando um obi de três gomos cai com dois ou três gome
voltados para cima e um obi de quatro gomos cai com dois, três ou quatr
gomos voltados para cima. Se a aceitação da oferenda é confirm ada todo
exclamam Láaróyè Èsú! E a festa tem início, com saudações e cantigas. Se >
orixá considera a oferenda incom pleta busca-se esclarecer através do jogo ■
que está falando e, gradualm ente, vai se oferecendo elem entos até torná-I
satisfatória.
Metade dos obis utilizados nesse jogo perm anece sobre o assenta
mento e é sobre eles que se faz o sacrifício. O restante é distribuído aos pre
sentes, estejam iniciados ou não, para que com am , se fortaleçam e tenhan
coragem para enfrentar as dificuldades e os desafios da vida.

Festa Anual de Exu


Na maioria das casas a festa anual é realizada na estação das secas. N«
Nigéria c em países vizinhos, como Benin e Togo, são realizadas entre novem­
bro e maio. A data da festa é definida durante um psçde Exu, através de joge
oracular, e nesse mesmo dia têm início o seu preparo e a sua divulgação.
Um animal poderá ser sacrificado no m om ento da indagação sobre
o dia da festa. Suas vísceras, cozidas e colocadas em um prato grande de
barro, com azeite dc dendê e acaçá (çkç), são entregues no ojúbç, local dc
culto, ou no assentam ento de Exu. Por vezes se espera até cinco dias após
esse ritual para pedir confirm ação da data, pois é preciso que Exu prescreva
com exatidão o dia adequado à realização da festa. Esse agendam ento exige
a definição da data mais favorável para a sua realização, pois há m om entos
particularmente propícios para isso. Cabe observar que se adota procedi­
mento análogo ao definir o m elhor m om ento para a realização de qualquer
ritual im portante, com o o de casamento, por exemplo.
Na noite anterior à festa, cham ada àrisún, todos os objetos necessá­
rios já estarão reservados. Na m anhã de àrisún um çlçgún , pessoa preparada
para incorporar a divindade através de um processo especial de iniciação,
vai à mata e colhe as ervas necessárias, entre as quais se incluem:

Alúpàyidà (SIDA LINIFOLIA, Malvaceae): Folha ou planta que confere


poder de prestidigitação.
Òdúndún (KALANCHOE CRENATA, Crassulaceae): Folha-da-costa. Uma
das plantas indispensáveis para a sacralização dos sím bolos dos ori­
xás. Atrai longevidade, sorte, equilíbrio e m uita energia vital.
Pèrègún, pòrògún (DRACAENA FRAGANS, Agavaceae): Dracena, Pau-
d ’água. Planta sagrada de grande poder vital dedicada a O gum e a

203
outros orixás. Muito resistente, é utilizada para lavar os elementos
simbólicos dos orixás.
T ètç (AMARANTHUS HYBR1DUS, A m aranthaceae): Bredo, caruru.caru-
ru-de-porco, cauda de raposa. Folha sagrada utilizada para sacralizar
símbolos de orixás. Também utilizada com o proteção contra forças
malignas que podem alterar o destino de um a pessoa. Seu axé favore­
ce a longevidade, evita situações de hum ilhação e traz nobreza à vida
da pessoa. Também de uso profano, é consum ida com o alimento.
T ètè-çgún, tçtèrçgún (COSTUS AFER, Costaceae): C aruru ou bredo com
espinho. Com a expressão tètè-ntè! realiza-se a saudação à essência
da folha tçtè, invocando-a para que traga nobreza à vida da pessoa.

As ervas são colhidas ao som de cânticos sagrados, enquanto Ossaim


é evocado para que se obtenha o m elhor axé das plantas. Todas as folhas co­
lhidas são colocadas num tecido branco ou no interior de um a cesta ou de
ou tro recipiente. Uma das regras para a coleta das folhas é a obediência ao
silêncio e ao jejum . Ao retornar, as folhas são recebidas por um dos àwòrò
mais velhos e colocadas num recipiente.
É preciso ativar o axé das folhas que serão utilizadas no ritual, c isso
dem anda processos ritualísticos. Ao som de cantigas, as folhas são alimen­
tadas, um a a uma, com obi, orobó, pim enta-da-costa, água e bebida desti­
lada. Uma cantiga diz:

Ewé àlújí gba obi re o


Ewé àiúji
Ewé àiúji gba órógbó rç o
Ewé àiúji
Ewé àiúji gba atarç o
Ewé àiúji
Ewé àiúji gba ow i rç o
Ewé àiúji
Ewé àiúji gba oti rç o
Ewé àiúji
Ewé àiúji m u àse wà o
Ewé àiúji

Folha, eu te invoco: desperta o teu axé, receba teu obi!


Folha, desperta!
Folha, eu te invoco: desperta o teu axé, receba teu orobó!

204
Folha, desperta!
Folha, eu te invoco: desperta o teu axé, receba tua pimenta-da-costa!
Folha, desperta!
Folha, eu te invoco: desperta o teu axé, receba tua água!
Folha, desperta!
Folha, eu te invoco: desperta o teu axé, receba tua bebida!
Folha, desperta!
Folha, eu te invoco: desperta o teu axé e o ofereça para nós!
Folha, desperta!

Concluído o despertar do axé das folhas, de sua essência vital, tem início
a maceração, que pode ser feita no pilão ou com as mãos. Acrescenta-se às fo­
lhas maceradas banha dc ori, azeite de dendê, sabão da costa, obi, orobô, água,
bebida destilada e um ígbin para promover a harmonia dessas energias.
Desse modo, se prepara o àgbo>que servirá para lavar todos os sím ­
bolos de Exu, exceto o yangí que, estando sem ienterrado, apenas receberá
um pouco do àgbo, despejado sobre ele. O yangí dos assentam entos re­
movíveis, que não está enterrado, tam bém é lavado. Essa lavagem não visa
retirar resíduos de antigos sacrifícios. Visa transm itir as energias do àgbo a
Exu, para potencializar seu poder de ação e prepará-lo para a festa.
Q uanto aos símbolos, para adorná-los esfrega-se neles osún , com
ajuda de aso wáji, tecido de algodão tingido de azul índigo.
A festa tem início à noite com um toque intenso de tam bores e o som
de cantigas e danças. Também são louvados os ancestrais e os demais orixás.
Ao am anhecer os devotos sc dirigem ao ojúbç de Exu e o sacerdote
oferece obis, colocando-os sobre o assentamento. Oferece, a seguir, água e
bebida destilada, colocando-as sobre a terra c sobre o assentam ento. Segue-
se o seguinte ritual:

O sacerdote invoca a terra por três vezes:


llè mo pé ç!
Terra, eu te chamo!

Os devotos respondem , repetindo por três vezes o seguinte:


À pè gbç>!
Ao te chamar, me ouvirás!

’ Agboé um preparado medicinal dc origem mineral, vegetal ou animal, cozido ou não, usado para beber
ou para banhar-se.

205
À pc jç !
Ao te chamar, respondérás!
À pc gbà!
Ao te chamar, aceitarás m inha oferenda!

O sacerdote evoca a presença de Exu três vezes:


Èsú Qdàrà, m o pè o!
Exu, o Benevolente, eu te chamo!

Os devotos respondem , repetindo por três vezes:


À pc gbç>!
À pc jç !
À pc gbà!
Ao te chamar, me ouvirás!
Ao te chamar, responderás!
Ao te chamar, aceitarás m inha oferenda!

Depois disso é feita um a saudação a Iyami Oxorongá:


Èyin. lyà-mi-Osòròngà. Ibà!
Nós saudam os vocês, Nossas Mães Oxorongá!

Seguem-se saudações a outros orixás e depois se coloca azeite de dendê,


mel e sal sobre o assentamento de Exu. Somente então é realizada a oferenda dc
animais. Peixe defumado também pode ser oferecido. Èko e cknni são oferta­
dos, sendo um prato com ckuru-funfun e outro com èkiiw-pupa.
A carne dos animais, depois de cozida, é com partilhada entre todos
os presentes. As vísceras (todos os órgãos internos) são cozidas em separado,
colocadas num prato dc cerâmica, cobertas com abundante azeite de dendê e
oferecidas a Onilê e Iyami Oxorongá, ao pé do assentamento de Exu. Depois
dessa oferenda o sacerdote toma os obis que estavam no assentamento e com
eles na mão toca o ori de todos os participantes para que lhes transmitam o
axé de Exu e, em seguida, lança os obis no chão para saber se a oferenda foi
aceita. Alguns dos presentes incorporam Exu e, ao som de tambores, saem em
procissão para visitar famílias envolvidas com o culto.
Todos os que encontram esse cortejo nas ruas vão colocando dinhei­
ro e presentes nas àtê Èsú , carregadas pelos çlçgún,'0 para beneficiarem-se
desse axé. Algumas festas duram sete dias, e nesse caso alguns çlçgún per-

1: Çlçgún é aquele que incorpora o orixá.

206
manecem possuídos durante todo esse tem po, sem ingerir alim ento algur
nem beber água.
No çjç ita, terceiro dia de festa, consulta-se o jogo divinatório pai
saber o que Exu deseja com o com plem ento. O m esm o ocorre no çjç ij>
sétimo dia de festa.
Concluída a apresentação dos símbolos, dos rituais e das oferenda
a Exu, tecemos a partir de agora algumas considerações a respeito da com
preensão que se tem deste orixá cm seu continente de origem c das incom
preensões de que foi - e continua sendo - alvo, quando colocado sob c
olhar de estranhos à cultura iorubá

207
v

Capítulo S

( in )C o m p r e e n s ã o de Exu no c o n tin e n te
de o rig em e em países da diáspora

Exu, cultuado c reverenciado nos rituais de m atriz iorubá em todos


os países da diáspora africana, é, com o dizíamos na Introdução desta obra,
personagem controversa. No presente capítulo discorrem os sobre o m odo
coníõ Exu foi visto pelos europeus, ainda na África, para, cm seguida, apre­
sentarmos o ponto de vista negro-africano.
Como vimos, Exu desem penha papel relevante em m uitos mitos,
frequentemente associado a O runm ilá. Orixá prim ordial, é um a das divin­
dades que participaram da criação do mundo e desem penha papel funda­
mental no jogo das forças cósmicas.
No entanto, entre os séculos XVIII e XIX, cristãos europeus, d o m i­
nados por estereótipos, ao terem contato com os cultos a essa divindade, a
interpretaram dc m odo eq uivocado. Pierre Verger (s./d.) narra haver sido
publicada, ainda em 1789, um a crônica de viagem de autoria de Pom m e-
gorge, na qual Exu é descrito com o sendo o deus Príapo, m oldado cm terra
e dotado de um falo enorm e. O olhar estrangeiro tam bém confundiu Exu
com o Demônio do cristianism o e do islamismo, fato esse ocorrido tanto
no continente africano quanto em países da diáspora.

N atureza do Ser Suprem o e dualism o bem -m al no universo


Eledunm are é Jeová? E ledunm are é Deus?
Q uando os livros sagrados das tradições cristã e islâmica foram tra ­
duzidos para o iorubá os vocábulos Satã, Demônio, Lúcifer. Belzebu, Ibiis
e Shaitan foram sum ária e im propriam ente traduzidos pelo vocábulo Exu.

211
Igualmente questionável é o fato de vocábulos designativos de Deus, no
contexto do cristianismo e do islamismo, serem traduzidos por Eledun-
mare, pois grande é a diferença entre esses seres e m uitas são as diferen­
ças entre seus contextos teológicos. Cabe observar que apenas os nomes de
Eledunm are, o Ser Supremo, e de Exu, a m ais im portante das divindades
do panteão iorubá, constam nas traduções iorubás dçsses livros sagrados.
Todos os demais personagens das narrativas bíblica e alcorâmica preserva­
ram seus nom es originais.
Essa tradução indevida e incorreta, q ue daria origem a tantos equí­
vocos. de fato cum priu um a fun ção estratégica m uito im portante no con-
junto de ações depreciativas contra a Religião Tradicional Iorubá e, parti-
cularm ente, contra a figura de Exu.
Eledunmare é descrito por alguns estudiosos como um ser que ocupa
u m lugar rem oto e de pouca im portância no sistema geral de ocorrências
n o universo. No dizer de Idòwú (1977), tal descrição provoca nos iorubás
um sentim ento de desconforto, pois se identifica haver algo, no m ínimo
inadequado, nessa noção de Ser Suprem o. Tal sentim ento de desconforto
levou o iorubá Bftvàji (1988 )1 a investigar cuidadosam ente esse tema e a
identificar que essa concepção equivocada decorre, com o tantas outras,.de
um a postura eurocêntrica e colonialista q u e, m enosprezando a cultura, a
religião, a organização política e os recursos de civilização dos chamados
povos primitivos, justifica seus atos de dom inação e apropriação. E a lógica
é simples. Parte-se dcTseguinte pressuposto: se os africanos supõem um
Ser Suprem o cuja natureza o situa um pouco acim a de qualquer outro ser,
ou o prim eiro e n tre iguais, necessariam ente eles são inferiores a outros
povos que concebem um Ser Suprem o situado acim a e além do nível de
todos os seres.
C onceber as divindades iorubás com o filhas do Ser Supremo é
im p o rta r um a lógica de relações utilizada pelos cristãos ao descreve­
rem o tipo de interação que Deus estabelece com os anjos e os santos,
p o n d era Bçwàji. E cham a atenção ao fato de que as divindades iorubás
são criaturas do Ser Suprem o, algum as das quais estiveram com ele e
ainda são suas mensageiras. Idòw ú, M biti, A w ólàlú, P arrinder e outros
autores apresentam contradições relativas a essa questão em seus tra­
balhos e, p o r serem autores clássicos, em cujas obras o u tro s estudiosos
e pesquisadores fundam entam as suas buscas, term inam por favorecer

' John Ayórúndé (Túndé) l$ç>lá Bçwàji, iorubá, professor de Filosofia da University o flh c West Indies,
M ona Campus, é doutor cm Filosofia pela Universidade de lbadan, Nigéria.

212
inuitos equívocos, pois seus erros de interpretação p erp etu aram -se e
persistem até hoje.
Os primeiros a escrever sobre a África, incluindo-se entre eles al­
guns africanos, não creditaram aos africanos e, no caso que nos interessa
no presente contexto, não creditaram aos iorubás qualquer conhecim ento
Ae Deus. Como há fatos irrefutáveis que negam tal possibilidade, term inou
por ser reconhecida a existência de ideias, de conceitos e atos de adoração
a Deus na África. Q uando o debate se desloca do tem a relativo à existên-
cia\ontoíógicajde Deus para o tem a relativo à concepção que as pessoas
têm dele, a pergunta passa a ser outra: se os africanos, e cm nosso caso
os iorubás, possuem um a Imago Dei, com o é ela? Diz Bçwàjí (1988, p.
8) ironizando: “por não haver M onte Sinai ou Horeb, nem pastos verde-
jantes, apenas florestas densas, som ente tornam -se possíveis as revelações
de divindades menores, relacionadas à fertilidade, às pedras enorm es e às
árvores!” E acrescenta:
Os colonizados precisam lutar em todos os planos para afirmar sua igualdade
humana com os colonizadores. As convicções cristãs introduzidas no terreno
religioso da África helenizaram e vestiram o Deus africano com trajes em­
prestados, como se Ele sempre tivesse estado nu! (BÇWÀJI, 1988, p. 8).

Daí a ênfase depositada p o r esse autor na necessidade de realizar es- ^


tudos e publicações que contribuam para reverter tal situação.
Bçwàjí observa que os africanos, ao estudarem teologia, têm discuti­
do os atributos de Deus deixando de lado o'problem a do mal. Idòwú (1973;
1977), ao abordar esse tema, inclui, entre os atributos do Ser Supremo, os -o ^
seguintes: único, real, controlador, criador, rei onipotente, onisciente, juiz, o .
imortal e santo. Mbiti (1970) acrescenta a esses atributos os de transcen-
dente, imanente, grande, dotado de poderes causais, de imaterialidade e d e \^ ^
mistério, eterno, plural, clemente, misericordioso, amoroso, fiel e bondoso.
Como com preender a existência do mal no m undo se o Ser Supremo
é dotado de todos esses poderes? Bçwàjí (1985) se propõe a exam inar este
problema filosófico tal com o ele se apresenta no cristianism o e verificar se
ele está presente tam bém na com preensão iorubá de Eledunm are. Lembra
que nas grandes religiões bíblicas, que têm como referência o cristianism o
e o islamismo, Deus tem sido conceituado de m odo a reunir todos os atri­
butos positivos em grau ilim itado e não possuir atributos negativos. Assim
sendo, o problema do mal para o teísta é o seguinte: se Deus possui tais
atributos, como explicar o mal? Deus causa o mal? Se Deus não causa o
mal, então quem o causa? Q uem criou a causa do mal? O criador do mal

213
conhecia passado, presente e futuro? Ou Deus seria realm ente todo-bom ,
todo-am or e todo-poderoso, porém incapaz de deter o mal? Ou Deus não
deseja elim inar o mal? Eis o dilema com o qual se confrontam o cristianis-
mo e outras religiões monoteístas: ao afirm arem que Deus não criou o mal
( afirm am não haver mal no m undo, o que é evidentem ente falso, a menos
, que haja um a recolocação de conceitos. Ao afirm arem que o mal foi criado
p or o u tro ser, afirm am que Deus não criou tudo. Ao afirm arem que Deus
não erradicou o mal, afirmam que não teve poder suficiente para realizar
isso ou não desejou fazê-lo, sendo, pois, sádico e malévolo.
O cristianism o e o islam ism o lidam com essa questão atribuindo a
Lúcifer, originalm ente m inistro de Deus ou seu anjo-assistente, a origem
dos males no universo. Lúcifer, anjo bom , dotado de m uitos poderes, ape­
nas inferiores aos de Deus, por vaidade e conspiração teria se tornado in­
teiram ente mal. Ou seja, sua aparente bondade original ocultava, de fato,
um a natureza diabólica.
Por outro lado, pondera Bçwàji (1988), um Deus onisciente e to­
talm ente bom não teria criado Satã ou Lúcifer. Se, por absurdo, errou ao
criá-lo, não lhe seria possível retificar o erro, aperfeiçoando sua criatura ou
destruindo-a? A menos que não fosse onipotente. Isto, no âm bito das tra­
dições bíblica e islâmica. No âm bito da Religião Tradicional Iorubá, vemos
que Eledunm are, com todos os atributos assinalados por Idòwú, Mbiti,
A w ólàlú, Dopamu e outros, é a origem do universo. Mas suas qualidades
não são idênticas às do Ser Supremo das tradições bíblica e islâmica. Num
itan dc Ifá encontram os Eledunm are recorrendo a O runm ilá, a divindade
oracular, cm busca de auxílio para discernir sobre certas situações do pas­
sado, do presente e do futuro; noutro itan, Eledunm are consulta o oráculo
para conhecer a data provável da própria m orte; em outro itan, ainda, envia
seu filho Igún para o aiye após fracassar em suas m últiplas tentativas de
curá-lo das enferm idades que o acometiam. Todos esses episódios denotam
que Eledunmare não é considerado onisciente, nem onipotente.
Essas narrativas m ostram que, em bora E ledunm are tenha a su­
prem acia de sabedoria, do to u outros seres de tarefas im p o rtan tes como
a adivinhação, a identificação das causas dos problem as e dos recursos
para a sua solução. E pensar essas questões sem sair do âm bito da própria
tradição, ou seja, aten tan d o exclusivam ente aos ensinam entos contidos
no corpus literário de Ifá, é o cam inho m etodológico recom endável, o
único cam inho, aliás, que evita erros de interpretação, erros inevitáveis
q u an d o a lógica e os pressupostos utilizados são alheios a essa tradição.
B çwàji considera que o grande m érito de A bím bólá (1976) reside no

214
fato dc ele haver se m antido fiel a esse corpus, enq u an to fonte e regis
da sabedoria de E ledunm are confiada a O ru n m ilá2. O m esm o propós
temos nós, os autores da presente obra. Por isso elegem os o m étodo
análise de itans e o u tras form as orais iorubás com o o único procei
m ento inequívoco de busca de com preensão de tudo o que diz respe
à cultura e à religião iorubás.
Se Eledunm are pode usar tanto o bem com o o mal para assegura
justiça, ele encontra em Exu um im portante auxiliar no cum prim ento
seus desígnios. Exu pode favorecer ou prejudicar alguém ,/dependendo
probidade m oral e da torça-vital do indiv fd u o em questão. Eled u n m are,
divindades, as forças da natureza; os antepassados e a sociedade formula
leis, e quando essas leis são desrespeitadas quem obriga à obediência é Ex
Assim sendo, a polaridade absoluta entre o bem e o mal, do m odo comc
... entendida no cristianism o e no islamismo, não faz sentido algum no co
texto religioso iorubá.
Bçwàjí (1988) pondera, ainda, que apesar de não haver nenhum a di
vida quanto ao fato de ser Eledunm are dotado de todos os atributos supe
lativos, os iorubás o concebem com o capaz, tam bém , de causar ou realiz.
o mal. Afinal, é concebível que um ser dotado de todos os atributos pos:
exercer tanto o bem quanto o mal, desde que a prioridade seja a realizaçÉ
de um bom governo do universo. Observamos, pois, que alguns atribuU
de Eledunmare são diam etralm ente opostos aos do Deus cristão e, por iss^
muitos dos problemas teóricos e doutrinais do cristianism o não fazem
m enor sentido para os iorubás. E vice-versa. Bçwàjí cita exemplos: o Dei
Cristão é sempre-misericordioso, lento para enfurecer-se e ágil para perdoa
pois não deseja a morte do pecador, e sim o seu arrependimento; e as fontes d
mal são criadas por Deus para ajudar a manter altos padrões morais.
Aliás, a noção dc pecado, inclusive a dc pecado origina!, é total
mente estranha ao contexto religioso iorubá. Não havendo pecado ori
ginal, nem juízo final, nem inferno, nem paraíso, nem prom essa de pa
raíso, e havendo, por outro lado, grande sem elhança entre a dinâm ic
das relações hum anas num plano social e a dinâm ica das relações da
divindades entre si no âm bito do m ito, o p anoram a é com pletam ent
distinto. Eledunm are im põe e exige justiça no presente, aqui na terrs
sem promessas para um futuro post-mortem. Nesse contexto teológicc
como ficam as relações entre Eledunm are e Exu?

: O mesmo mérito deve ser reconhecido nos trabalhos do iorubá Síkírü Sàláml, que vem publicand
registros da tradição oral iorubá em língua portuguesa, no Brasil, desde 1990.

215
Relações entre Eledunm are e Exu
Vimos cm capítulos anteriores que Exu é uma divindade capaz de
cum prir seus deveres para com Eledunm are, ocupando posição proemi­
nente entre as divindades. Q uando o cristianism o e o islamismo chegaram
à África, buscou-se uma equivalência para o Demônio e para Satã e foi
julgada conveniente, como vimos, a escolha de Exu. Tal escolha não deve
ser atribuída a um mero acaso. Exu é um dos pilares de sustentação da cos­
m ogonia e da teologia iorubás. E é a coluna principal do sistema religioso
iorubá, co m fortes implicações socioculturais, dado ser ele o inspetor das
condutas ético-morais. Destruir este pilar, ou mesmo abalar essa coluna.
foi, de fato, uma inteligente estratégia colonialista q ue, lam entavelm ente,
perdura ao longo de séculos nos países da diáspora. Vemos atualm ente no
BrãsilTpor exemplo," fõrtês e agressivas expressões neopentecostalistas de
intolerância religiosa relativa às religiões de m atriz africana, que elegem
com o alvo principal de seus ataques figuras caricaturizadas de Exu e dos
sacerdotes de orixás3.
Bçwàji (1988) considera que um a das principais razões da escolha
de Exu como alvo de ataques reside no fato de que todos aqueles que for­
çam as pessoas a fazerem as coisas certas são sem pre im populares (grifo
nosso). Com partilham os desta interpretação, conform e ficou abundante­
mente dem onstrado ao longo da presente obra.
E interessante considerar aqui a ótica de um sacerdote católico, Jean
Marc Ela (1998),'* africano de Cam arões, que discorre sobre as bases socioe-
conômicas da expansão das Igrejas na África e tece considerações a respeito
da presença de cristãos no continente africano. Suas reflexões m ostram -se
m uito úteis a nossos propósitos por propiciarem a oportunidade de apre­
ciar essa realidade sob o ponto de vista de um sacerdote católico em penha­
do em evitar um a perspectiva “eclesiocêntrica” na leitura da dinâm ica de
relações estabelecida na África por ocasião do encontro do cristianismo
com as religiões tradicionais.
Buscando realizar um a aproxim ação crítica aos problem as da fé a
partir das situações africanas, nas quais interferem os âm bitos da cultura,
da economia c da política, o autor aborda, entre outros, o tema das missões
católicas na África, no século XIX, adotando um ponto dc vista africano e

5 Encontramos uma cxcelcntc reunião de textos sobre esse assunto na obra organizada por Silva (2007).
* Jean Marc Ela, doutor cm Teologia, membro do Centro Internacional da Associação Ecumênica dc Teólogos
Africanos c da Conferência Internacional dc Sociologia das Religiões, possui muitas publicações, entre
as quais Ma foi d'African, Minha fé dc africano (1985) e Rcstitucr 1'Histoirc aux socictés africaincs,
Restituir a História às sociedades africanas (1994).

216
buscando explicitar contradições, posturas e implicações políticas das m is­
s õ e s . Vejamos, a seguir, a exposição de algumas ideias de Ela.

Esse autor parte da constatação de que 110 final do século XVII e,


sobretudo, durante o século XVIII, a necessidade de recrutar escravos para
as plantações americanas desenvolveu rapidam ente o com ércio africano.
Refere-se às viagens “triangulares”, organizadas em benefício dc seus em ­
preendedores: os navios partiam da Europa com m ercadorias que eram
trocadas na costa africana por escravos que, por sua vez, eram vendidos nas
ilhas das Américas; e os lucros auferidos possibilitavam a com pra dc açúcar
e tabaco para serem vendidos na Europa.
Prossegue lem brando que, durante o cham ado Século das Luzes (o
século XVI11), o continente africano viveu um período de trevas, sob o afã
de lucro dos europeus, cuja intenção era apenas a de dividi-lo e colonizá-
lo. Ecita Voltaire (s.d., p. 376, apud ELA, 1998, p. 29), segundo o qual “os
europeus apregoam sua religião, do Chile ao Japão, apenas para que as
pessoas sirvam à sua ganância”. A im agem da África construída para uso
europeu era, pois, a de um a terra de m orte, sob um clima m aldito, 110 qual
a febre constituía o grande pesadelo, e incluía a descrição dos a fricanos
como cruéis, an tro p ófagos. a n im a isJerozes. Esses eram os estereótipos
que iam povoando o im aginário coletivo e qtie serviam, entre outros fins,
para justificar as explorações que eram , frequentem ente, um prelúdio das
conquistas.
Nesse contexto, durante o século XIX, teve início a atividade m is­
sionária da Igreja, atividade esta inserida num processo de expansão cujas
causas prim eiras são de ordem econômica, política e cultural. Assim sendo,
nem sempre as missões puderam furtar-se a seus com prom issos com os es­
tados colonizadores, servindo de expressão das relações estabelecidas entre
poder político e organizações.
A imprensa missionária, pretendendo suscitar na cristandade um a
generosidade ativa e inesgotável, buscava despertar nos fiéis católicos euro­
peus uma grande piedade, e para isso apelava ao sentim ento de compaixão
para com o “pobre negro”, subm etido às enfermidades, às febres, à escravi­
dão e à ignorância.
Num contexto em que os brancos se consideravam m odelos perfei­
tos da espécie hum ana, tudo o que era prom ovido nas colônias, inclusive
a escolarização, tinha o objetivo de reform ar o negro para reconstruí-lo à
imagem do branco. Os europeus, considerando a si mesmos “guias e tu­
tores das raças inferiores” (BLET, 1950, pp. 56-57, apud ELA, 1998, p. 34),
praticavam o imperialismo da cultura ocidental, e por esta razão as missões

217
recebiam apoio de autoridades civis, gozavam de num erosas prerrogativas
e foram adquirindo um im enso poder para dar andam ento às suas obras.
Jean Marc Ela considera que o cristianism o do ocidente conquistador
chegou às savanas e aos bosques africanos não por um dinam ism o interno,
nem por “milagre”: as missões, cm grande m edida dependentes economi­
camente do poder colonial, foram um a das expressões da im plantação des­
se poder na África. Não há dúvida de que a expansão das Igrejas durante o
século XIX foi apenas um a das m uitas expressões da expansão do Ocidente
no m undo e, durante m uitas gerações, o cristianism o foi considerado unia
religião de brancos eb u sc o u prom over um estilo de ser cristão e s t r a n h o s —
alheio às culturas locais.
Vemos assim que um a análise das relações entre cristianism o e colo­
nização é indispensável para m elhor com preender o objeto que nos ocupa
na presente obra. A cristianizaçâo da África foi, segundo Ela, o instrum ento
ideológico do qual se serviu o capitalismo europeu em expansão. A teologia
da maldição da raça negra atribui a trem enda miséria dos povos negros não
aos danos causados pelo tráfico e pela colonização, e sim a um a maldição
divina que pesaria sobre ela. Essa interpretação, associada à mística do “po­
bre negro”, serviram de base ao escravismo, à colonização e às missões.
Tais ideias se expandiram na Europa a partir do século XVI entre
católicos e protestantes e levaram Liberm ann, conform e assinala GOyáux
(1948, t. II, p. 177, apud ELA, 1998, p. 38), a um a prática missionária base­
ada na mística do resgate pelas “dores unidas às de Jesus, capazes de expiar
os pecados em brutecedores próprios do povo negro, para lavar a maldição
de Deus”. As obras m issionárias receberam privilégios e apoio para estende­
rem-se pelo im pério colonial e a aliança entre missão civilizadora e evan-
gclização pressupunha a civilização branca e a barbárie negra, evidencian­
do o dom ínio exercido pelo imperialismo europeu sobre o cristianismo.
Na iconografia religiosa o Demônio, frequentem ente representado
com o negro, estigmatiza o corpo negro e sugere que Deus se identifica com
o universo do hom em branco. E talvez neste porm enor, aparentem ente ir­
relevante, resida parte das razões pelas quais Exu, o negro, tenha sido esco­
lhido para representar o papel do D em ônio ou de Satã ao serem traduzidos
a Bíblia c o Alcorão.
O cristianismo, enquanto recurso de “prom oção do bem dos coloni­
zados”, na medida em que levava a eles a civilização, se contrapôs às prá­
ticas sociais e religiosas tradicionais, confundindo sua tarefa de sacramen-
talização com a tarefa de lutar contra a bruxaria e a poligamia, fenômenos
considerados próprios de sociedades inferiores e pagãs. Vale enfatizar que

218
séculos dessa luta não foram suficientes para suprim ir as práticas sociais e
religiosas tradicionais, fato que surpreende o Ocidente e as Igrejas.
Nesse contato com o continente africano os europeus construíram
uma representação das sociedades tradicionais que as retrata com o confor­
mistas com o passado e necessitadas de contato com o O cidente para tor­
narem-se dinâmicas, críticas e históricas. Hegel afirm a que desde a Grécia
até nossos dias a encarnação do espírito se produziu na história européia,
tendo sido o Ocidente um a referência para com pletar o que falta às demais
sociedades. Ou seja, Hegel com partilha da opinião de que os brancos sal­
varão os negros.
Certam ente tais concepções servem de base ao racismo e servem
também para m ascarar o fato de que o subdesenvolvimento é um efeito
das estruturas de dom inação e dependência. Não é um a fatalidade da na­
tureza. Pois, com o afirma Ela, o problem a do hom em dom inado não está
em “desprimitivizar-se” ou em alcançar um certo nível de “civilização” para
ingressar na atual fase do desenvolvimento hum ano, mas cm escapar a toda
forma de alienação im posta pelo im perialism o m undial.
O ponto de vista desse sacerdote católico africano lança novas lu­
zes sobre determ inantes históricos e socioeconómicos dos m alentendidos
a respeito da natureza de Exu e nos leva a refletir sobre os riscos aos quais
estamos sujeitos, de com eter erros de interpretação im postos por fortes de­
terminações históricas, sociais e econômicas, capazes de tolher ou m ini­
mizar a ação de nossas consciências individuais. Reverter essa condição de
equívoco exige a participação de muitos, e vale aqui a sugestão de Bçwàjí,
que acolhemos com o o conselho de um sábio: é preciso retom ar os estudos
clássicos, que têm servido de alicerce para a construção de novos conhe­
cimentos sobre a África e os africanos, e rever esses textos com o espírito
crítico e a hum ildade necessária para identificar nossos equívocos, muitos
dos quais produzidos por determ inação histórica. É preciso realizar o es­
forço necessário para abordar a África-sujeito, superando a tendência de
abordá-la como África-objeto. Em outras palavras, é preciso que nos em ­
penhemos em (re)pensar essas questões, m antendo continuam ente alerta a
consciência de estarm os sujeitos às forças do poder colonizador, que atuam
continuamente sobre a estrutura e a dinâm ica de nossos pensam entos, sen­
timentos e ações.
Aqui encerram os a Parte II desta obra. A Parte III versará sobre a
presença dc Exu 110 corpus da tradição oral iorubá, particularm ente nos
odus de Ifá, em evocações, saudações, rezas e cantigas.
Parte III
Presença de Exu no

c o rp u sá à tradição oral iorubá

Ca pítu lo 9 Transmissão oral de conhecimentos.


Corpus literário e sistema divinatório de Ifá
Ca pítu lo 1 0 Mitos de Exu nos odus de Ifá (iorubá)
Ca pítu lo 1 1 Mitos de Exu nos odus de Ifá (português)
Ca pítu lo 1 2 Oríki, àdúrà e ibà Èsir.
evocações, rezas e saudações de Exu
Ca pítu lo 1 3 Orin ÈsCr.
Cantigas de Exu
Capítulo 9

Transmissão oral de c o n h e c im e n to s .

C o r p u s literário e sitema d iv in a tó rio de Ifá

O ralidade africana: h istó ria e arte


Para conhecer a natureza de Exu, bem como os desígnios de Eledun-
mare, o Ser Supremo, para este orixá, é preciso recorrer ao corpus literá­
rio de Ifá. Por essa razão apresentam os, no presente capítulo, um m ínim o
de informações indispensáveis sobre o Odú Corpus, que integra o am plo
contexto da tradição oral africana. Lembremos que a palavra Ifá designa,
simultaneamente, O runm ilá, orixá da sabedoria, e seu sistema divinatório.
O Odú Corpus cum pre função integradora no âm b ito da socieda­
de iorubá, p o r estabelecer as regras principais de inserção do indiv íd u o
em seu grupo. Esse riquíssim o con ju n to de conhecim entos esotéricos e
registros históricos da m ilenar tradição iorubá é m an tid o e tran sm itid o
pelos babaláwo (babalaôs, pais do segredo), sacerdotes de O ru n m ilá,
preparados desde a mais tenra infância para o c u m p rim en to de tão im ­
portante tarefa.
Para Obenga (1982), a oralidade desem penha papel fundam ental na
construção da história da África, contribuindo para a elaboração de do cu ­
mentos escritos, para a pesquisa arqueológica e para os estudos socioló­
gicos e antropológicos a respeito de diversas nações africanas. De acordo
com Leite (1992), sociedades africanas que optaram pela não utilização da
escrita para o registro e a transm issão de conhecim entos desenvolveram
mecanismos capazes de suprir tais necessidades. M uitos pesquisadores oci­
dentais consideram a ausência de escrita um sinônim o de analfabetism o. A
palavra em sociedades africanas é na verdade, ao contrário de tal perspecti­

225
va, um elemento vital na composição da personalidade individual e grupai
de tais povos, bem como de suas práticas sociais, sua história e sua cultura.
A oralidade africana baseia-se num a concepção específica de homem
e do lugar por este ocupado na sociedade. A palavra, tida como elemento de
origem divina e considerada uma força fundamental emanada do próprio Ser
Supremo, é instrumento de criação: materializa e exterioriza as forças vitais.
(...) a fala humana anima, coloca cm movimento c suscita as forças que estão
estáticas nas coisas. Mas, para que a fala produza um efeito total, as palavras
precisam ser entoadas ritmadamente, porque o movimento precisa de ritmo,
estando ele próprio fundamentado no segredo dos números. A fala deve re­
produzir o vai-vem que <í a essência do ritmo. (HAMPATE BÂ, 1982, p. 186).

A oralidade africana não pode ser com preendida com o sinônim o de


analfabetismo, falta de habilidade, restrição nas possibilidades de com u­
nicar-se ou atraso sociocultural. Com preendê-la desse m odo é um erro,
pois ela não consiste apenas num a ausência de escrita: reflete um a con­
cepção de universo no qual a palavra falada cum pre papel fundamental.
A fala possibilita a com unicação cotidiana, a apreensão e a transm issão de
conhecim entos, a perpetuação da sabedoria ancestral, a transm issão de tes­
tem unhos de uma geração às subsequentes, a realização das práticas sociais
e a m anutenção dos mecanismos civilizadores. Além dessas funções, à fala é
reservado um papel im portantíssim o nas práticas m ágico-m edicinais1.
Ham pate Bâ (1982) é de opinião que as concepções decorrentes de
um a visão equivocada a respeito da oralidade africana com eçaram a ruir
graças ao trabalho realizado por grandes etnólogos do m undo inteiro. A
oralidade africana não é apenas um conjunto de histórias, lendas e relatos,
mas a grande escola da vida, cm que o espiritual e o material não estão
dissociados e onde todo porm enor perm ite rem ontar sempre à Unidade
Prim ordial. Ela é, ao mesmo tem po, religião, ciência, arte, história, diverti­
m ento e recreação. É imprescindível realizar seu registro escrito por estar­
mos diante da
(...) última geração dos grandes depositários, desses últimos grandes m o­
numentos vivos da cultura africana, guardiões dos tesouros insubstituíveis
de uma educação peculiar, ao mesmo tempo material, psicológica e espi­
ritual, fundamentada no sentimento de unidade da vida e cujas fontes se
perdem na noite dos tempos. (HAMPATE BÂ, 1982, p. 217).

' Vide capftulo 1 - Noção iorubi dcpessoa c práticas mágico-medicinais, no qual sc aborda a questão dc
òògün.

226
Um texto oral deve ser ouvido com atenção, para que possa ocorrer a
devida apreensão de seus possíveis significados. Exige a presença física dos
envolvidos no diálogo e a observação do olhar, da gesticulação e das expres­
sões faciais de quem fala. A “m aneira africana” de com unicar e de expressar
demanda boa capacidade m nem ônica e um forte elo entre o hom em e a
palavra. A integridade individual e a coesão grupai dependem da palavra e
do respeito a ela devotado.
O valor moral da fala é atrelado ao seu caráter sagrado, pois, consi­
derada de origem divina, atribui-se a ela a qualidade de possibilitar a arti-
culação dinâm ica dê forças no interior de um sistema em que se associam
elementos espirituais e materiais. Por outro lado, elementos religiosos, m á­
gicos e sociais apóiam a preservação e a transmissão dos conhecim entos. A
palavra cum pre função im portante nos conselhos familiares e com unitá­
rios. A palavra ancestral, detentora da verdade e da sabedoria, associada à
im portância da senioridade e da ancianidade, invoca a jurisprudência dos
antepassados para a solução de problem as e de impasses.
Parte do que se com unica através da palavra é de dom ínio com um
a todas as pessoas e parte da tradição oral é de conhecim ento restrito de
iniciados. A m em ória de textos orais pode atingir os mais elevados níveis
de abstração, como ocorre no caso dos depositários da oralidade, pessoas
que são a “m em ória viva” da África e a sua melhor testem unha. Tais pes­
soas são reconhecidas pelo grupo com o dignas de participar da corrente
de transm issão dos conhecim entos. Não podem m entir nem utilizar a fala
im prudentem ente, pois do bom uso da palavra depende a conservação ou a
ruptura da harm onia individual e cósmica. O narrador é um a pessoa mais
velha, que conhece e transm ite o conhecimento, e o ato de n arrar estim ula
nos ouvintes o desejo de serem narradores no futuro.
A tradição oral pode repousar num testemunho ocular, num boato
ou num a nova criação. Pode estar baseada em distintos textos orais prévios
que, com binados e adaptados, contribuem para criar um a nova linguagem.
Inclui não apenas crônicas de um reino ou genealogias de um a socieda­
de segmentária, mas toda um a literatura oral que fornece detalhes sobre o
passado. Ela é tam bém , enquanto literatura, uma expressão cultural. Tudo
o que a sociedade considera im portante para o perfeito funcionam ento de
suas instituições dem anda cuidadosa transmissão, utilizando com o recurso
múltiplas e diversas formas narrativas.
Nesse contexto são igualm ente válidas as regras de respeito à palavra
e de conduta moral inquestionável. Para orientar os que o procuram , o ba-
balaô recorre ao Odu Coqms. As regras que deve obedecer incluem a de não

227
se aproveitar das próprias prerrogativas. Como possui am plos e profundos
conhecimentos, é procurado por m uitas pessoas, algum as em situação de
crise, fragilizadas pelas circunstâncias difíceis que enfrentam , mergulhadas
num sofrim ento do qual querem escapar, literalm ente, a qualquer preço.
Esta configuração favorece o abuso de poder. Entretanto, os sacerdotes re­
cebem a advertência de não agirem em benefício próprio, nem de recusa­
rem servir a quem não possa pagar. Se necessário, além de realizar o jogo
divinatório sem ónus para o consulente, devem lhe oferecer o necessário
para encam inhar a solução do problema. Entende-se que o grande privilé­
gio e a grande riqueza do sacerdote de O runm ilá residem na oportunidade
de estar a seu serviço. Atentemos para o fato de que Ifá pode compreender
todos os idiomas da terra, o que lhe possibilita aconselhar todos os seres
hum anos, seni exceção. O corpus literário de Ifá guarda a história da maio­
ria dos orixás. Guarda, ainda, o ensinam ento de curas através do uso de
ervas. Por isso seus sacerdotes devem conhecer, além da prática divinatória,
o preparo de remédios. O runm ilá tem por irm ão mais novo Ossaim, a di­
vindade da cura, de cujo auxílio serve-se há milhares de anos.
O corpus literário de Ifá reúne um total de 256 capítulos ou catego­
rias denom inadas Odú (odu) sendo 16 odus “m aiores”, cham ados Ojú Odú,
e 240 odus “m enores”, chaiftadoVp/np Odú ou Àm úlú Odú , com pondo um
total de 4.096 (16 x 16 x 16) poemas, que cum prem a função oracular, entre
outras. Cada um dos 256 odus - os 16 “m aiores” e os 240 “m enores” - se
com põe de narrativas de acontecim entos míticos e históricos, denom ina­
das itàn (itan). Essas, quando longas, recebem a denom inação de Ifá nlánlá
ou Itàn nlánlá.
Os Omç Odú, tam bém reconhecidos com o divindades, são consi­
derados, com o sugere a denom inação recebida, filhos dos odus maiores. A
denom inação Ainúlú Odú deve-se ao fato de seus nom es serem compostos
pelos nomes dos Ojú Odú e sugerirem a associação de características dos
“odus genitores”. Por exemplo, o primeiro deles é o Ogbèyèkú, decorrente da
combinação de Ogbè, o primeiro principal, com Qyçkú, o segundo principal.
Enquanto os odus são im portantíssim os no aspecto divinatório de
Ifá, os çsç, poemas geralmente breves, associados aos odú-Ifá, guardam co­
nhecim entos de história, geografia, religião, música, filosofia e de todas as
áreas do saber hum ano, constituindo os principais registros das normas
ideais de conduta social. Parâmetros éticos e morais, valores e virtudes en­
contram -se nos çsç, na maioria das vezes m etaforicam ente apresentados.
A esse magnífico corpus recorrem os sacerdotes de Ifá quando procura­
dos por alguém em busca de orientação. E quanto ao jogo propriamente dito?

228
O jogo oracular dc Ifá inclui-se entre os cham ados jogos geom ânti-
cos, que possibilitam adivinhar através da observação da superfície da terra
ou da disposição de objetos em relação aos pontos cardeais, bem com o
através do uso de dezesseis configurações de pontos, sementes, pedras ou
quaisquer outros elementos, m atem aticam ente interrelacionados. Q uando
o adivinho lança sementes, pedras, conchas ou outros objetos sobre o chão
obtém determ inadas configurações. Esse recurso divinatório, utilizado nos
continentes africano, europeu e asiático, tem com o regra fundam ental o
fato de que as configurações obtidas - figuras geomânticas - decorrem da
organização dos elementos em quatro linhas, com um ou dois pontos em
cada um a delas, de m odo que, um a vez com binadas as possibilidades de
arranjo, se obtenha 16 figuras. Realizando um a seqüência dc procedim en­
tos, o sacerdote obtém determ inado núm ero de figuras geomânticas. Na
Nigéria há equivalentes do jogo de Ifá no interior de outras etnias, entre as
quais os ibo, os nupe, os gvvari e_os ju k u n .^ ^
Nos diversos recursos de consulta a Ifá se definem, sem pre, confi­
gurações às quais correspondem metáforas ou parábolas sincrônicas com
a condição existencial do consulente, ou seja, narrativas que estabelecem
“coincidências” significativas com ocorrências da vida daquele que está
consultando. O conselho, sempre fundam ental nesse processo, emerge da
análise da situação e da conduta do(s) herói(s) da narrativa.
Os principais recursos de consulta a Ifá são o Qpèlç, os ikin, o ibò e
os búzios.
O çipçlè, corrente divinatória, é constituído de oito metades do fruto
da árvore de mesmo nom e, fruto este com duas faces —um a côncava e outra
convexa. Para realizar o jogo o sacerdote segura a corrente pelo seu ponto
central e a lança sobre um a superfície plana. Os elem entos que a com põem
exibirão sua face côncava ou convexa, de m odo que a com binação dos oito
elementos produzirá um a configuração, um padrão correspondente a de­
term inado odu.
Ikin é a semente do fruto sagrado da palm eira çpè-Ifá (dendezeiro).
Símbolo e instrum ento divinatório de grande im portância, esses coqui-
nhos são os representantes de Ifá na terra e um de seus mais im portantes
meios de comunicação com os hom ens. Para consultar com os ikins o ba-
balaô realiza, inicialmente, todas as saudações e orações que com põem o
ritual. Em seguida, coloca os ikins na mão esquerda, os lança no ar e tenta
apanhá-los com a mão direita. Dessa tentativa decorre um a das seguintes
possibilidades: ( 1 ) o babalaô consegue apanhar todos os ikins - nada regis­
tra no iyèròsún; (2 ) fica com apenas um ikin em sua m ão - registra dois

229
traços; (3) fica com dois ikins cm sua m ão —registra um traço; (4) fica com
mais de dois ikins em sua mão - nada registra no iyçròsún. O registro é
feito da direita para a esquerda e as combinações dos traços - um ou dois
- vão sendo organizadas em duas colunas de quatro linhas, dando origem
à representação gráfica dos odus.
Diante da necessidade de esclarecer algum ponto obscuro, Ifá é con­
sultado com ibò. Trata-se, pois, de um oráculo de resposta fechada, sim ou
não. Depois dc realizada a consulta com ikin ou çpèlè poderão ser form ula­
das, com o uso do ibò, questões cuja resposta seja afirmativa ou negativa.
Q uanto ao èrimlilógún, o jogo de 16 búzios, de prática com um êm"
diversos países da diáspora, não é utilizado pelos babalaôs, e sim pelos baba-
lorixás e pelas ialorixás, sacerdotes e sacerdotisas dos demais orixás. Através
dele respondem os mesmos odus, em bora sua seqüência não seja idêntica
à observada no jogo realizado com çpçlèe com ikin. Após jogar os búzios
o sacerdote ou a sacerdotisa observa o núm ero dc faces “abertas” e obtém
um núm ero entre 1 e 16. A cada núm ero desses, e nessa ordem ascendente,
corresponde um dos seguintes odus: Çkànràn, Èjiòkò, Ogbcyçmii. Irosún,
Qsé, Qbàrú, Odi, liji-Ogbc. Çsá. Òfíin. Qwçnrin, Èjiila-Asebçra, Iká, Òtú-
rúpçn, Òfú-çkànràn c Irçtò.
O jogo de Ifá é o mais im portante recurso divinatório da civilização
iorubá por estar relacionado ao corpo de saberes que constitui a síntese do
conhecim ento a respeito do conjunto da vida c da m orte e que, enquanto
processo vivo em si próprio, não tem contornos estanques. O Odú Corpus
é um sistema aberto, continuam ente am pliado, pois incorpora narrativas
de experiências dos indivíduos que com põem o grupo: ao ocorrerem fa­
tos significativos nas trajetórias biográficas, tais fatos passam a ser narra­
dos com o metáforas, integrando assim o conjunto dc narrativas. Aos odus,
como a tantas outras formas da narrativa oral, é conferida a im portante
tarefa de prom over a mediação entre norm as ancestrais e práticas sociais
do presente. Sendo o sistema constantem ente alim entado com ocorrências
significativas do acontecer histórico, as práticas sociais do presente cunham
novos exemplos para as gerações seguintes, ao relatar feitos e fatos daqueles
que são hoje os ancestrais de am anhã.
Desse m odo, m elhor dizemos se afirm am os que os odus, além de
preservarem e transm itirem a m em ória coletiva, cum prem , ainda, a função
de registrar e docum entar acontecim entos históricos. Em sum a, registram,
preservam e transm item : registram acontecim entos históricos; preservam
dados míticos e históricos e o quadro norm ativo de condutas a eles associa­
do; e, finalmente, veiculam tais conhecim entos.

230
Tal recurso não pode ser utilizado sem a devida formação, pois Ifá
não deve ser consultado sem preparo im punem ente. Para consultá-lo é pre­
ciso ser um babalaô graduado, o que exige, em média, de doze a dezesseis
anos de formação.
Nos dois capítulos seguintes são apresentados 18 odus de Ifá, respec­
tivamente em iorubá e em português. Feita exceção ao odu Èji-Ogbè ( 8 ):,
coletado por Bascom (1969), todos os demais foram coletados por Sàlámi3 junto
a babalaôs e aprendizes dos seguintes grupos e subgrupos: egba (Abçòkú-
ta), ijèsà (Òsogbo), ijçbú (ijébú). ègbádò (Çgbádò) e ifç (lfç).
Em bora de m odo breve, abordam os neste capítulo a tem ática rela­
tiva à transm issão oral de conhecim entos, aí particularizado o corpus lite­
rário e o sistema divinatório de Ifá, com a finalidade de preparar o leitor
para um a melhor com preensão dos capítulos seguintes, onde serão apre­
sentados odus de Ifá e outras formas de preservação e transm issão oral de
elementos relativos ao orixá Exu.
Visando favorecer a leitura, a análise e a in terp retação desses
enunciados orais, adota-se aqui o recurso de ap resen tar os o dus orga­
nizados em dois conjuntos —o prim eiro deles reúne os enunciados em
iorubá e o segundo agrupa os enunciados já traduzidos p ara o p o rtu ­
guês. Os enunciados traduzidos são acom panhados de co m en tário s e
observações relativos às narrativas, para aum entar sua inteligibilidade,
explicitar valores e virtudes veiculados e m antidos p o r esse corpus li­
terário e, no presente contexto, favorecer a com preensão do orixá p ri­
m ordial Exu.
Veremos que nem todos os odus estão representados e, por outro
lado, alguns deles são apresentados cm mais de um a versão. C onform e o
mencionado, cada odu reúne um conjunto de çsç e de itans. Assim sendo,
encontraremos sob uma mesma denominação - por exemplo, Odú Èji-Ogbè
- distintos itans que são, sim ultaneam ente, poemas e m anifestações da di­
vindade de mesmo nome.
Nesse contexto em que o pensam ento analógico tece suas tram as a
mensagem dos sábios é transm itida através de metáforas e os ensinam entos
aí contidos fundam entam -se na convicção de que se deve alm ejar e lutar

* Vide capítulo 10 - M itos dc Exu nos odus dc Ifá (iorubá) e capítulo 11 - M itos dc E xu nos odus dc Ifá
(português). O número (8) refere-se à numeração do odu nos referidos capítulos.
} E retomada, na presente publicação, parte do material apresentado cm Sàlámi (1999). Esse material,
recolhido junto a babalaôs durante pesquisa de campo realizada na Nigéria cm diversas etapas de
permanência do pesquisador naquele país, inclui o registro de odus, a observação de práticas sociais, o
estudo dos critérios para a formação educacional dos babalaôs e da definição de seu statuse o prestígio
hierárquico no interior desse grupo dc sacerdotes.

231
por viver de m odo feliz. Reiteramos que para os iorubás a felicidade não é
um a aspiração de futuro: busca-se o bom viver aqui e agora.

Ówc nifá íipa


Olçgbçn n í ngbó
Qmçràn ní nm ç

Ifá fala através de metáforas.


Quem tem sabedoria ouve sua mensagem
E quem tem capacidade para com preender, com preende.

232
Capítulo 10

Mitos de Exu nos odus de Ifá


(iorubá)

1. Odú Ogbè-Ògúndá
Narrador: Bàbáláwo Fábünmi Sówunmí

GbengbcJckú dá nibi ti ó \vún-ún


A d ’ifá fún igún tin se àkçbí Elédúnmarè
Agòtún a téní çlá S ’éjí
Ó ntárún gbògbç
Ó n tajú àti dide
Elédúnmarè sa gbogbo agbára è,
Súgbón igún kò san.
Ó ira sílçkún ayé íún-un,
Wípe k i ó máa iç gbé òde ayé;
Tótó ibàrà òún ló sé Ifá fún Qrúnmilà,
Ifá nsunkún alái ri ire;
Njç òún lè ni owó,
K i òún róun tçju àwon çm ç ti òún bi;
Ki òún si tún kçlé.
N i ò tóri ç d'ifá
Aláwo rç ni k i ò rú obi adiè márún-ún,
Wipé ti ò bãdi çjó karíin ire ti o nw áyóò tò o içw ç
K i ò máa pá ni çkòòkan n i ojojúmç bç> elédáá rç
K i ó máa kò iwçrçkún rè sinú igbá
K i ò da cpo le ióri,

237
K l ó máa gbé lç sí orita mçta.
K i òún àiti àwçn ç b ísi m áajç adiç naà;
Ti ó bá ti ngbé iwçrçkún adiç y ií lç,
K i ó mda logun kçrin k i òún rire; k i òún rírc
Titi yóò fi dé orita.
Yóò sc cléyi fún ojç màrún-ún
Qrúnmilà se ètútú;
Báyii ni Qrúnmila se bçrç sí ni ríi çbç
Ti yóò si kó iwçrçkún rè,
JLç-orita,-íi-o-bá dé-oríta;---------------------
Yóò máa wá da epo sii.
Ti ó ba da epo síitan,
Yóò bèrç si ni gbàdúrà wípé. k i òún rire o,
Inú igbó ti ó \và níwãjú orita y ií ni;
Igún çm ç Elédúnmarè, ira,
B i Qrúnmilà se ngbé çbç sílè,
B i Çninniilà bá gbé çbç silç, a yipadà;
N í igún yóò bó síbè.
Ti yóò si kó çbç naà jç.
Igún oiiiç Elédúnmarè, àrím niárún-ún ira.
Ti ó nbá jà, ni ara. ori. apá, àyà, iké, çsè.
N í ojç kini, ti ó j ç çbç Qrúnmilà,
N í àrún y ií kó tún bá jà mç; enu yà á,
N i ojç keji Qrúnmilà tún gbé çbç y ii lç s í orita,
lái m ç wípé, çni kan njç çbç rè.
B i ó se yipadà ni igún bó síbç,
Ti ó j ç çbç Qrúnmilà,
Apá igún méjéèji ti kò se náà télè náà.
Nigbà ti ó j ç çbo y ií tán;
Nigbàtí ó dí ojç keta Qrúnmilà,
Tún gbe çbç y ií 1o sí orita.
B i o sc yípàdà ni igún bç síbç.
Ti o kó çbç Qrúnmila jç;
Ayà igún ti o \vú télç bá fçn,
Nigbà ti ó j ç çbç Qrúnmilà tán,
Nigbà ti ó di ojç kçrin;
Qrúnmilà tún gbé çbç rè Jç sí orita,
Ó n lçgun k i òún rire o. k i òún rire.

238
B i ó se gbçbp sílç tán,
N i Igún tún bp síbê. ti ó kó çbo jç.
Iké ti ó wà léyin Igún kúrò,
B i ó se j ç çbç y ií tán,
Nigbà ti ó di ojp karim-un
Qrúnmilâ tún gbe çbo rç Io si orita
0 n Içgun k i òún Qrúnmilâ ríre o,
B i ó se gbçbç sílç tán,
N i Igún tún bp sibç ti ó kó çbo jç;
Nigbà tf ilà çjó kçfàynáa^mó,-------------------------
Çsè igún méjèèji ti kò se rin náà;
Ó bçrç si ní rin, àrún ti ó n báa já parç,
Ó bá gbéra, Ó lç sóde pruri ní pdp Elédúnmarè;
Elédúnmarè ríi wipé, igún ti sàn,
Ó ira bèèrè lp\vp rç wipé, tani ó wò ç sàn?
Ó bá si, Ó kçjçt, Ó rò fún Elédúnmarè,
Ó ní. òún mp çni náà súgbpn Qrúnmilâ ni oríiko rç n jç.
À ti wipé bí ó se ngbébo lp sí orita ni ó n Ipgun.
k i òún ri ire o, k i òún ri ire o.
Elédúnmarè ni, òún yóò dá çni náa ni piá,
Elédúnmarè kó àdó mçrin fún igún;
Wipé, k i ó kó lp bá Qrúnmilâ lóde ayê,
Igún fún Elédúnmarè lési wipé;
Òún kò mó ilé Qrúnmilâ,
Elédúnmarè ní, ti igún bá ti délé ayé, k i ó béérè;

À won èniyàn yóò filè Qrúnmilâ han igún,


Ó wá sp fún igún wipé, çyp kan soso ninú
À wpn àdó mçrin yçn ni k i Qriinmilà mú,
K i Igún si kó éyí ti ó kú padà wá sóde prun.
A wpn àdó náà;
À dó owó, Àdó pmp;
À dó àríkú, àdó súúrú.
Igún si padà wá sóde ayé.
B i ó se délé ayé tán,
Ó gbá ilé Qrúnmilâ lp;
Nigbà ti ó délé Qrúnmilâ,
Ó kó àwpn àdó náà sílç fún Qrúnmilâ

239
(■nu ya Çrúnmilà.
Ó ránsépé àwçn omç ré,
Látígbá àmçràn nipa èyí tí ó tç.
K í ó mú nínú àwçn àdó mçrççrin.
À wçn çm ç Çrúnmilà ni k i ó mú àdó àríkú,
Nitorí wípé k i ó bà pé láyé.
Çrúnmilà tún si, O lç pé àwçn iyàwó rç;
Látí bá tún gbá àmçràn çnu won wò,
igbá ti àwçn iyàwç rç dé;
Wçn ni k i ó mú àdó çmç,
Nitorí wípé, k i àwçn bá bimç púpç;
Çrúnmilà tún si, O ni k í wçn lç pé àwçn àbúrò òún wá,
lati gbá àmçràn Içnu àwçn yen náà.
À won àbúrò rç ni k í ó mú àdó owó,
Nitorí wípé, tí ó bá sé béè, idílé àwçn kò n i kúsèè,
Çrúnmilà wá ní k í wçn lç pe çré òún wá,
Èsú si n i çrç rçyii, nígbá tí Èsú dé;
Ó kéjç, ó rò fún-un.
Ó wá béérè irú àdó tí ó y e k í òún mú,
Èsú wá bcéré lçw ç Çrúnmilà báyií wípé;
À wçn çm ç rç nkç?
Iríi àdó wo ni wçn n í k í o mú;
O ní àdó àríkú ni,
Èsú ní k í ó má mú.
Nitorí wípé kò síáw áyé ikú.
Èsú ní àwçn iyàwó rç nkç,
Adó kínni wçn ni k í ó mú?
C ní wçn n í k í òún mú àdó çmç,
Èsú ni k í ó má mú, nitorí ó tí bímo;
È$ú tún béérè lçw ç rç wípé,
À wçn àbúrò rç nkç?
Adó kini wçn ni k í ó mú,
Ç ni àdó owó ni.
Nitorí wípé ti òún bádi olówó,
Òún yóò y ó isç lára àwçn çbí òún,
Èsú ni k í ó má mú àdó owó,
Çrúnmilà wá bèèrè lçwç
Èsú irú àdó wó n í ó y ç k í òún mú;

2-10
Èsú dá lòhún wipé, k i ó m ú àdó süún),
Nitori wipé, súúrú Qrúnmilâ kò tó,
À ti wipé, ti ó bá mú àdó súúrú,
Gbogbo àdó ti ó kú yen tírç ni won yóò j ç
Qrúnmilâ bá gbá àmçràn Èsú,
Ó mú àdó súúrú;
Ó kó mçta èyi ti ó kú fún igún;
Inú àwçn çmç, iyàwò àti çm o Qrúnmilâ
Kò dún s i àdó ti ó mú,
Igún bá nkó àwçn àdó m ç ta y iió lç.
Nigbà ti igún rin diè,
Owó bèèrè Içwç rç wipe,
Nibo ní súúrú wà?
Igún dá a lóún wipé, ó wá nilé Qrúnmilâ,
Owo fún igún lési, wipé òún nlç bá súúrú.
Igún ni irç o,
À 11 k i ó bá m i dó çdç Elédúnmarè.
Owo dá igún lóún wipé,
Ibi ti súúrú bá wà ni òún náà máa nwa.
Nigbà ti igún máa ri,
Owo ti fò kúrò Içwç rç;
Ó ti lç bá súúrú nilé Qrúnmilâ
Omç náà tún si ó bècré súúni Içwç igún
Igún da lóún wipé, o wá nilé Qninmilà
Qmç ní, ibi ti súún) bá wá,
Ni òún náà máa nwà o;
Qmç sí ó lç bá súúrú nilé Qrúnmilâ.
Àrikú náà tún bèèrè Içwç igún,
Ó níníbo ni súúrú wà?
Igún dá lóún wipé, ó wá nilé Qrúnmilâ.
Àrikú s í ó 1o bá súúrú nilé Qrúnmilâ.
Nígbá ti igún dé çnin,
Elédúnmarè bèèrè Içwç rç;
À wçn mçta ti wçn kú.
Igún fún Elédúnmarè lési wipé,
N se n í òún ní k i óún wá so fún Elédúnmarè wipé;
Gbogbo wçn tí lç bá súúrú nilé Qrúnmilâ,
Súgbón òún fé lç kó wçn padà wá.

241
Elédúnmarè wá dá lóún báyií wípé;
Ení bá tí mú ádó súúrú,
N i ó ni àwçn tí ó kú o.
Ení bá n i súúrú, á ní;
Ire àikú, ire omç, ire owó.
A y é wá nyç Qrúnmilà,
Wçn múu, wçn Io fi joba nilé kétu.
Owó sún bç,
Ó n ’çla, Ó bímç.
Ó tún wá-fí àrikú-çeèrèje. ---------
Ó kç lé y ik á gbogbo ayé,
Ó wá gun çsin, Ó nkçrin báyií:
Mo tígba àdó owó o
M o gba tí omç
M o gbá tí àrikú
M o gbá tí súúrú o
Ó njó, ó nyç,
Ó nyin a/áwo rè;
Ó tún nyin a/áwo rè,
O tún nyin Èsú òró rè.

2. Odú Ò gúndâ-M éji


Narrador: Bàbáláwo Fábúnmi Sówúnmí

O gun ti a já, ti a mú olú;


Òún ní njç Ogun aye
Ogún ti a já tí a m ú çsin;
Òún ni njç Ogun çrun.
Olú Içba çsin, n í iwà.
Edà tí yóò jçba, k ií fi ojú di ení;
B i ojúmç bá mó,

Eyç aji,
Eye á sé.
B i ojúmç bá mç,
Eyç á silo o
B í irçlç bá rç;

242
J-yç á \vç.
Àw on ló d'ifá fún Èsú çdàrà
Nigbà tí ó ni òún yóò pa.
ígbá Irúnmalç ilé ayé,
Ògún ni irç ni Èsú npa,
Kò lê pa òún.
Nitorí náà, Èsú kò ni agbára láti pá òún.
Obálúfon ni irç ni Èsú npa kò !è pa òún,
Nitorí náà Èsú kò ni agbára látí pa òún.
Àrçnimajà (Çsányin) ní irç ni I:sú npa,
Kò lè pa òún.
Nitorí náà Èsú kò ní agbára látí pa òún.
Àrçnimajà wá tç àwçn awo ré lç.
Wçn ni k í àrçnimajà ó sçbç,
Nitorí ikú.
Wçn ni. nitorí alágbára ni Èsú çdàrà,
K í ò ma sc ti orí gbá orí pçlú Èsú.
Àrçnimajà ni tí ò bá se tóri Èsú çdàrà,
Òún kò ní rúbç.

Àrçnimajà ní sebi ogbón ni tí Èsú.


O ni òún àrçnimajà. sebi Ògún ni tòún.
Èsú ní k í wçn jo pàdé ní ikòrita mèta àwon ayé,
Èsú wá sç fún àrçnimajà;
Wípé scbí çni ti wçn bá pa láyé,
Ti kò kú;
Òún Èsú çdàrà n i npa.
Àrçnimajà ní. òún ni çgà:
Èsú ní òún ní çgá;
Wçn ja ara wçn níyàn títí.
Wçn wá ti ijà ko eta
Èsú çdàrà ló kç kç dán àrçnimajà wò,
Wçn wá kibç igi irókò.
Èsú çdàrà ni òún lé fi owç di igi mú
K í òún ni k i ó wó pa á.
Èsú çdàrà bá di çka igi mú,
igi sidií, ó wó lulç.
Kò ba àrçnimajà,
Èsú çdàrà n í çpá tí ó wà lçw ç òún y ií

2-13
Ó ní òún lè fí kan ç lára,
K i ó lá iná.
Èsú çdárà bá mú çpá,
O li kan àrçnimajà;
Èèfín ló jáde nínu çpá.
Àrçnimajà kò lá iná
Ó fún Èsú Icsi
Ó ní à j ç sára tòún niyçn

Inú wá bi Èsú çdárà.


ó ní iwç àrçnimajà,
Ibi tí ó wà yií, mo lè ni k i omi y í ç ká.
Èsú çdárà fi çpá rç lalç,
Omi rú y ç àrçnimajà bçrç si ní jáyà,
Ó ní agbára tí Èsú y iíp ç ju tòún lç ní tòótç;
Wçn kò s í ijà,
Àrçnimajà ni k i È$ú çdárà jçw ç,
K i Èsú fí òún silç;

Èsú ní òún kò ni fi silç,


Nítorí wípé. O tí yájú sí òún.
Èsú çdárà wá mú kúm ç çw ç rç,
Ó y ç m ç àrçnimajà Içsè,
f-sç àrçnimajà bá kán.

Ó subú lulè,
Èsú çdárà wá ní bi òún bá pa ç;
O, ò ní m o agbára òún,
Ó tún fí kúm ç çw ç rè na àrçnimajà lòrí;
Ó wá fí silç.

Àrçnimajà kò wá lè sçrç mç;


Láti ojç y ií ni Qsányin kò ti lè sçrç dáadáa mç.
Àrçnimajà wá tç àwon awo ré lç,
À won ni wçn sisç fún àrçnimajà,
Nijç tí ò tí nbç láàárín inira.

Ó wá sç fún àwçn awo rç wípé,


K i w ç n jç ç;

244
K i wçn se àánú òún.
K i àwçn awo òún wo òún sàn.
Wçn wa sç fún wipé,
Íwo àrçnimajà,
Ó ti Io bá Èsú fí ori gba ori.
Èsú òdàrà òún ni olòrigbogbo àwçn
Çkànlénigba imalè.
Wçn ní kò sí inmmalè tí ò lè se ako sí Èsú çdàrà,
Wçn ní kò sí àtúnse mç,
B i ò se wà náà, ni yóò se wà títí ojç ayé,
Wçn wá sç fún wipé,
R im çbo ni ngbe çni,
Àiríi k ií gbe èniyàn,
A tctc rú t ’èsú, a máa gbé çni.
À wçn awo rç wá bçrç si nw í báyií,
A wí wí wí çni ç ò gbç,

A sçrçsçrç çni è o gbà,


Igbà tí wçn ó bá gbà n í nda kokoko m ç wçn lára bí ota,
N i nda kokoko m ç wçn lára bí ota,
Káw í fún çni, ká gbç, òún n í ngbe çni.

3. Odú Òg ú n dá-M cji


Narrador: Bàbáláwo Líwòsi igbórè

Orç soore títití,


Orç kò léwé.
À fòm ç soore títití,
À fòm ç kò 11i egbò.
Tò bá dí ijòm ijçm i,
Kéni má tun-ún soore bçç mç,
A d'ifá fún çsç,
Çsó nsawo lç sóde kése;
Níbi tí agbe gbé nké pogún pogún,
Tí àlúkò nké pogbçn pogbçn.
Àgbçnrín inú çgàn,
Tí agbe bá nké pogún pogún;
Ògún èniyàn ló nkú,

245
Ti àlúkò bá nké pçgbçn pçgbçn,
Ogbçn èniyàn ló nkú,
Agbònrín igbógán.
O gbó gbógàn gbógàn
A dota èniyàn ló nkú,
Wçn wá lç pc çsç,
Wçn ni k í çsç wá bá àwçn sc awo.
Wípé nkan ti ó npa àwçn yií.
Báiwo ni çw ç àwçn máa sç tó o?
Qsç ní. òún a bá wçn se é
Nigbà ti çsç bá wçn se é
Ó pa agbe tí o nkc pogún pogún,
Qsç pa àlúko tí ó nké pçgbçn pogbòn,
Qsç pa àgbçnrín igbógán.
Tí npa àadota èniyàn,
O bá wçn pa àwon mçtéçta.
Òdc késc rç,
Èniyàn kò kú nibè mç,
Níbç ni Èsú wá lç bá;
À wçn ará òde késc.
O ni èyin ará òdé késc,
B i çsç se báyin seé tí ó pa
àwçn ti ó npa yín;
Bççni yóò se pa gbogbo yín.
Èsú wá n í k í wçn lé çsç jáde ní òdé kése,
Wçn bá kó igi wçn lé çsç jáde.
Wçn li iyà j e ç,
Qsç wá nlç sílé;
O wá nkígbe,
Ó pàdé Èsú lójú çnà;
Èsú ní, iw ç çsç,
Kiló se ç?
Ó ni òún báwçn sçgun lóde
Kése ni wçn tún fiyà j e òún,
Çsç kó m ç wípé,
Èsú ló nbá òún sçrç.
Èsú ní sebi wçn sç wípé; k í ó lç bç
Èsú k i ó tó lç si òde késc
Ó n i njç o bç ç?

246
Qsç ni, òún kò bo ç,
Èsú wá ní tí ó bá délé, k i ó lç bo Èsú.
Nígbá tí çsç délé,
Ó lo bo Èsú,
Obi òlójú mçta,
A kúko adiè,
Ç>sç wá 11 bá Èsú sçrç wípé,
íbití wçn tí fí iyá j e òún ni òdc kése.
kó bá òún ko iyá náà.
È súgbç—
Èsú wá lç sí òde kése,
Ó tún lo bá àwçn ará òde kése,
Ó nbéêrè çsç àwçn ará òde kése wá fún-un lési.
Wípé, àwçn tí lé e lç,
Èsú wá nbá àwçn ará òdé kése sçrç wípé;
Ç ò m ç oore ni o,
Qsç ti ò bá a yin-ín sçgun,
Òún ni ç lç lç.
Ti iyá miiiran bá tún m ú y in jç nkç?
Tani ç ò wà lç pç. wípé k i ó gbàyín silç.
À w çn ará òde kése wá niçkúnrin kúkúrú
Kàn lò n í ti àwçn kò bá lée
N i àwon bá fi le çsç jáde.
Èsú wá ní, à fi k i wçn lo ira
Qsç k i wçn pe mçra.
N í çjç náà ni àwon ará òdc
Kése wá çsç lo níyçn,
Wçn 11111 òsç dc òdc kése.
Wçn bçrç sii dá a lçlá.
Inú çsç wá dún,
Ó kó çrú, Ó ko çrú.
Ó wá nlç si ilé rç padà,
Qsç se çnu kótó,
Elédúnmarè fi orin awo sii Içnu:
Qsç nwipé oore gbèmi.
Ma si ma soore o.
À wçn ará òde kése dá çsç lçlá,
Oore sí gbèmi o.
Máa màa se oore.

2-17
T
4. Odu irètè-O gbè
Narrador: Bàbáláwo Fábúnmi Sówünmí

B í ó ndun çni,
À m ç pé ó ndun çni.
Bi kò dún çni,
A m ç pé kò dun çni
A difá fún Qrúnmilâ,
Ó nse awo lç silé çlçfín
Qrúnmilâ àwo ilé çlçfín,
Difá fún çlçfín.
Qiçfín nfçkún súnráhún gbogbo ire,
Níiúú çfín aja kò bi,
Agân kò towç âlâ bosún;
ílú kò tòrò,
Gbogbo àwçn tí wçn wá níiúú çfín,
Wçn kò rí omç bí.
Qjò kò rç, iri kò sç.

Oúnjç kò 50 lóko.
Qrúnmilâ se ifá fún wçn
Çni tí kò ri om ç bí
O bi
Çni tí kò ni àlááfíá,

Ó ní.
Fni nwá ire ajé,
ó ri ire ajé.
Qrúnmilâ kò n 'òwò içwç,
kó bimç

Kò kçlé;
Béçni, kò tún ní aya.
Ésú lààlú çrç Qninmilà ní
Èsú wá bcèrè Içwç
Qrúnmilâ báyii wipé:
Oiçfín ti ó se ifá fún-un,
Tí ílú rç tòrò.
Èsú bèèrè Içwç Qrúnmilâ,

248
Kini olçfin náà se fún ç?
Qrúnmilà dá a lóhún,
Óni, Kò se hhkankan fún òún
Èsú fún Çrúnmilà
Ni àmçràn bàyii;
Ò ní k i ó máa lç kó
Léyinkúlé ilé olçfin,
Çrúnmilà wá dá Èsú lóhún bàyii wípé;
Báwo ni òún se máa
Lç kó nílc çlçtin,
Nigbà ti ó j ç wípé òún
ni òún se Ifá fún çlçtin.
Ti ilú rç si tòrò.
Èsú ni ohun tí Çrúnmilà máa se
ti ó mà fí di eni çlá niyen.
Qrúnmilà si, Ó gbá ilé çlófin lç,
Ó nké báyií;
O ndún mi, ó ndún m i janjan.
Qrç owó o, ó ndún mijanjan.
Èrínmájò
Èsú pe çlçfin, ó n i k í ó lç wo aláwo rç.
Èsú so fún çlófin wípé;
Ojú kan Qninmilà nse çjè.
Ó n í bí çjè y í bá kán silç,
Ilú çfin á fç,
Ó ní ojú keji, Çrúnmilà nse omi,
Èsú sç fún wípé;
B í omi ojú Çrúnmilà bá kán sílè,
Oba ilú çfin á kú.
Olçfin wá bèèrè lçwç Èsú wípé.
Kini òún lé ?e tí çjç átí omi ojú
Qninmilà kò ni kán sílè
Èsú ní, k í ó lç ni igba çkç lçnà igba
owç çyç.
Wçn ru owó y ií lo si ita
Qrúnmilà, fún àimçye çjç.
Ita ni wçn kó owç y ií si.
Nitorí Qrúnmilà kò ni ilé
Èsú wá pé é, ó n í iwç Qninmilà;

249
Owó ti won kó j ç fún ç yií,
oló ni yó ò j í i lç m ç ç Içwç
Nitori ó kò n 'ilé li o máa kó si.
Èsú ní k i Qrúnmilà gba ilé çlçfin lç
K í ó tún máa lo ké.
Qrúnmilà tún sí. ó gba ilé çlçfin lç.
Ó tún bçrç sí ní ké báyií wípé;
Ó nclún m i o, ó ndún m i janjan;
Qrç ilé o.
Ó ndún m i janjan;
Èrinmàjò o.
Oba çlçfin n i k i wçn kçlé fún Qrúnmilà.
lyàrà mçrindínlógún
n í wçn y ç sí inú ilé náà.
O tún dí çjç kçta,
Èsú lo bá Qrúnmilà.
O ni iwç nikan soso
ní ó ndá gbé inú ilé,
O kò ní iyàwó.
Kíní ndú nínú rç,
O j ç lç bá çba çlçfin tí ó se oore fún,
Wípé k i ó fún ç n í iyàwó.
Qrúnmilà si, ó gbá ilé çlçfin lç,
O nké báyií wípé.
Ô ndún mí. ó ndún m i o;
Qrç iyàwó, ó ndún m í janjan;
Èrinmàjò.
Oba çlçfin fí,
O lu agogo yíká ilú.
Ó n í òún tí fún Qrúnmilà
n í owó, ilé, ó tún wá nsunkún iyàwó báyií,
Oba olçfm wá fún Qrúnmilà ní wúndíá mçjç.
Qba çlçfin tún fún Qrúnmilà ní adélébò mçjç;
ti Ogún ti pa oko wçn.
Báyií ní aya Qrúnmilà sc di mçrindínlógún.
Ó fi wçn sínú iyàrá kççkan.
Qrúnmilà dó wçn ti ti.
Wçn kò lóyún.
Qrúnmilà wá si, ó lç bá Èsú

250
Ó sç fün-un wipé, òún tí dó àwçn iyàwó òún títi.
Wçn kò lóyún.
Èsú ni, k i ó lç bá çba olçfin,
Èsú ni. k i ô lç ké ní èyin kúlé ré.
Qrúnmilâ wá sç fún Èsú wipé;
Òún ké, wçn fún òún ni owó,
Wçn fún òún n i ilé;
Wçn fún òún n í iyàwó,
Òún si ní, òún se ifá fún wçn;
Tí ilé iiu Wçn fí dçrç.
Èsú fún lési wipé, ti ó bá ké nilé
Qlófín tán,
Wçn á k ç ç ní ohun ti ó máa se;
Ti àwçn iyàwó rç fí máa ri omç bí.
Qrúnmilâ gbá ilé olófín lç. ó ke báyií wipé;
Ó ndún m i o, ó ndún m i o
Qrò çm ç o, ó ndún mijanjan;
Èrinmàjò.
N í çba olçfín bá sí, . ' _
ó Iu agogo kiri báyií wípéj
K í gbogbo ilú gbá òún,
Wipé Qrúnmilâ fe pa òún o.
A wçn ti fún-un ní ilé, owó, ati àyà
Q wá ntçrç omo nisinsinyi báyií
Oba çlçfín wá dá lóiiún wipé;
K i Qrúnmilâ lç bo Ifá.
Qrúnmilâ gbá ilé rç lç,
N i Èsú bá sç fún wipé,
Ohun tí ó máa se.
Ti àwon iyàwó re máa
Fí lóyún niyen
N i Qrúnmilâ wá se.
Olnin ti çlçfín wí fún-un.
Ó pá éwúrç bo ifá,
Ó se ewúrç fún àwon iyàwó rç jç,
Pçlú ewé Ifá,
Gbogbo wçn finú soyún.
Wçn fí èyin gbé çm ç pòn.
Qrúnmilâ wá di olçmo,

251
Gbogbo hhkan wá Sún-ún bç,
Ô njó, ó nyç, H fêik
Ò yín Èsú.

5. Odú Ò túrúpòn-M éji


Narrador: Bàbáláwo Fáççlá Adéyanjú

Ewé igbá, ní nfarajç igbá,


Ewó èmçn, ni nfara jo èmçn,
rçrç á fara j ç gbçrç;
Bi rçróngbçdç bá so,
A doríkidò, á máà wò isé Elédúnmarè.

Òún ló dífá fún Èsú çdàrà,


Tó ní òún yóò j ç olórí igba Irúnmalè.
Ògún Içba nilé arç,
Sàngó loba n í kòso.
Qya loba nílé irá,
Òòsà nlá lçba wçn lódc iránje
Ògiríyán loba wçn lóde efçn,
Ifá ni olótú wçn, nilé ifè,
Ifá ni Èsú çdàrà, irç lò npa,
Wçn ni ibo ló má fí àwçn çba si,

Tí ó má fí jçba Iórí wçn.


Wçn kó çjç wçn lç sçdç Elédúnmarè,
Tí nse bábá fún wçn.
Elédúnmarè ni Èsú çdàrà ni olórí,
A wçn Irúnmalè ní àwçn kò nígbà.
Wçn ní ó y á ,
K í wçn lç jà,
N í orita mçta ayé tòhun tçrun
nigbà náà ni wçn yóò wa m ç çba
Wçn wá fí çjç si èyin ifààní,
Ògún ló k ç kç lç kojú Èsú çdàrà,
Èsú gbe Ògún, ó da a mçlç,
Ògún bínú ó lç wçlè sílé aró.
Ò ní çni máa bç òún,
K i ó lo kó irin j ç pèlú màriwò.

252
Sàngó tún si,ó lo kojú Èsú çdàrà
È$ú gbé Sàngó, ó sán an mçlç.
Sàngó olúkòso bínú,
Ó lç wçlè ni kòso;
Ó ní eni bá má bo òún,
K í ó lç kó çdun-àrá jç .
Òòsa-nlá tún lo ko Esú çdàrà,

Èsú çdàrà tún gbé òòsa-nlá,


O da a mçlç,
Òòsa-nlá lç wçlè ni òde irànjé,
Ó ní eni bá má bç òún,
K í ó lç sa çta, pçlú çpá òsoro
K í ó pçn om i àrifçhún.

Qya òrírii tún lo ko Esú çdàrà


Èsú tún gbé çya,
Ó dá a mçlç,
Oya bínú ó Jç wçlç ni sílé irá.
Ó ní çni bá má bç òún,
K í ó lo sa çta pçlú owó çíçn

Ògiriyán tún lç ko Èsú çdàrà,


Èsú çdàrà tún gbé ògiriyán,
Ó dá a mçlç,
Ó bínu, ó lç wçlç si òkiti éfçn
Ó n i çni bá máa bç òún,
Kó ní òpçlçpç çta
Èsú çdàrà sí, ó lç bá Elédúnmarè.
Wípé, àwçn tíjá.
Òún Èsú çdàrà si tí ja, àjàségun.
Ó ní k í Elédúnmarè fún òún ni àsç,
Wípé, òún ni olórígbogbo àwçn Irúnmalè.

Elédúnmarè wá fún Èsú çdàrà Jáse,


Látí wá jçba gbogbo wçn.
Elédúnmarè fún-un Jáse,
Wípé, Irúnmalè tí kò bá fi tírç se;
Kò n i ri hhkan jç.
Báyií ni Èsú se j ç ba
Gbogbo àwçn Irúnmalè.

6. Odu Iwòrí-Ò túrúpòn


Narrador: Bàbáláwo Lawál RCifíú

Èkiti bábábá,
A d ’ifá fún Qrúnmilâ
Baba ntu owó çrújo lái wí fún Èsú,
Qrúnmilâ lç ra erú
Láti ba máa sin.
Léyin ojç kela ti Qrúnmilâ ra erú y ií
ti ó m ú délé,
N i çrú náà fò sánlè, ti ó kú.
Qninmilà àti gbogbo ilé rç fí igbe ta
Gbogbo wçn nsokún.
Irònú bá wçn. wçn kò mo èyi
à á mú se.
Igbà ti Èsú máa wolé Qrúnmilâ,
Ó bá gbogbo àwçn omo Qrúnmilâ àti
iyàwó ré, wçn nsunkún
Ó bèèrè Içwç Qrúnmilâ, ohun ti ó fa
t-kún wçn-on
Qrúnmilâ dá lóhún wipé;
Erú tí òún rà ni ijçta ló kú.
Èsú dá a lóhún wipé;
Tani ó so fún
K i ó tó Io ra çrú.
Esú bá ní k i ó lç mú cwúrç pèlú
aso funfun wá fún òún.
Báyií ni Qrúnmilâ se lç mú àwon hhkan
wçnyí wá ní çse kçsç.
Èsú wá gbé òkú erú Qrúnmilâ
Lo sílé ré,
O ire ç dáradára
Ó u o asç tí ó dára fún-un,
Ó si tún ta ori ç fún-un pèlú;
Lçyín tí ó múra fún-un tán,
Ó gbé òkú erú y ií lo si orita;

254
Ti ó wà n í çnà çjà.
Ó gbé e jókòó,
Ó ti orin sii Içnu;
Ó gbé àtetába síwájú rè,
Gçgç bi èniyàn tí o nta tábà
Ojç náà j ç ojç ojà
Tí gbogbo èniyán nlo s i çjà.
Bi àwçn èrò çjà
Sc nkçjá níwájú òkú yií,
N í wçn nki tí wçn nbèèrè iye
Owó tábá Içwç rç'.
B i kò se dáhun ni wçn sáré koja,
N i igbçyin n í ajé wá nkçjá lç sí ojà;
Pçlú àwon igba çrú, ti ma nru igbá ojà rç.
N i òún pçlú àwçn çrú rç bá yá dúrò
Láti ra tábà Içwç òkú yií.
Bí ajé se dc çdç òkú y ií láti ra tábà,
N i ó kii, títi iyçn kó da-a lóhún.
Ó tún bèèrè éló ni tábà Içwç rè, ?
Ókú y ií kò tún da-a lóhún bákannáà.
Inú wá bí ajé.
Ó gba igi kan Içwç a wçn çrú rè,
Ó fi na çrú yií.
Bí ó se na igi m ç òkú yií,
N í ó subú lulè.
Báyiíni Esú fó jáde
Ninú igbó tí o sápamç si,
Esú bá bu ogun ta,
Ó ni héèpà!
A jé ó pa çrú Qrúnmilà
Ajé wa bçrç sí bç Esú títi;
Súgbçn Èsú kò gbo çbç rç.
Ajé fi láti orí çrú kan
Títí o fi dé çkànlénigba bç Èsú,
Èsú kç, kò gba çbç ajé
Ó sç fún ajé wípé,
A fí ti ó bá fí ara rè pçlú gbogbo
A won çrú rç.
K í won j ç èjilénígba.

255
K i òún kó wçn
Fún Qrúnmilà.
N i òún yóò tó gba çbç.
Béçni ajépèlú àwçn
Qkànlénigba çrú rç,
Bá siwájú Èsú. Io sílè Qrúnmilà
Igbà tí Èsú délé Qrúnmilà,
Ópèé,
Ò sç fún Qrúnmilà;
Wípé òún ti ri çni
Tí ó pa çrú rç;
S i ç>nà çjà.
N i òún bá pinu láti kó wçn wá fún ç
K i ó kó wçn siló.
À tí ojç yiíni ajé ti nse çrú Qrúnmilà.
Qrúnmilà njó,
Ó nyç;
Ire gbogbo kúnlé rç.

7. Odú Èji-Ogbè
Narrador: Bàbáláwo Fábúnmi Çówünmí

Qwènrçnwçnrçn ni íjç orí eku


Qwçnrçnwçnrçn n í ijç orí çja
Qwènrçnwçnrçn n í ijç omi lóló igbín
Òún Io d'ifá fún ajé,
Qmç olókun sçm i ajé;
Òún ló d'ifá fún òkun,
Tí nsç çm ç oníràdà.
Òún náà ló tún d ’ifá fún ide;
Ti nsç çm ç onikanpa.
Òún náà ló d ’ifá fún Èésu Yàlàyàlà.
Ti nsé çmo oniràpà.
Gbogbo wçn n tí ikçlé çrun bç wá sí ikçlé ayé,
À w çn aláwo wçn ni k í àwçn mçrèèrin
Fi çjà rúbç, nitorí ikú
À wçn mçta péré, n í wçn íi ojà rúbç.
A jé fí çjá tirç ríibç,
Òkun fí çjá tirç rúbç,

256
TFT

Ide H çjá tírè náá rúbç,


Èésu Yálàyálà ni òún kò lè fí tòJmn rúbç.
Gbogbo wçn rú çjá kççkan pèlú òbúkç kççkan.
Ajé ni çgçta çrú tí wçn nsisé fún-un,
Okún ni çgçta çrú tí wçn nsisé fún-un,
ide ní çgçta erú ti wçn nsisç fún-un
Èésu Yàlàyàlá náá ni ogçta erú tí wçn nsisç fún-un
Mçrçrçpãtàki awo çgbà Vède
Ló d ’ ifá fún Qrúnmilâ,
Nigbà tí Ifá nsunkún ire mçrin láyé
Wçn ni k i ó rú eku,
Ki ò rú òbúko fún Èsú láàlú;
Pèlú çgçjç owó çyç,
Ki ó sç ogçjç owó çyç yen mçrún eku;
Qrúnmilâ kò se çtútú.
Nigbà ti àwçn ire mçrèçrin déle ayé,
À wçn ire mçrin náà ni
Èésu Yalàyàla, okún. ajé àti ide
Wçn nkórè lç sílé Qrúnmilâ
Ire owó, ire ajé àti çpçlçpç çrú.
Nigbà tí a wçn mçrèçrin délé ayé,
Wçn kò m ç çnà ilé Qrúnmilâ.
Wçn kò Èsú-Iáàlú ní orita mçta àjàláyé
Èsú bèèrè Içwç wçn wipé,
Ibo ní wçn n lo
Wçn ni ilé Qrúnmilâ ni a wçn nlç.
Èsú ri àwçn çrú tí wçn rú,
Qpòlçpç irepçlú àwçn mçrèçrin,
Èsú wá bèèrè wipé,
Gbogbo çrú ti wçn rú tçléyin nkç?
Nibo ni e nkó wçn lç
Wçn dá Èsú lóhún wipé,
Ilé Qrúnmilâ ni àwçn nkó o lç,
Èsú dá won lóhún wipé;
Ilé Qrúnmilâ ni òún ti nbç yií,
Qrúnmilâ si tí kú.
Àwçn çrú sogbogbo çrú won kalç,
won kò m ç ohun à á mú se.
Gbogbo won jókòó, iwájú kò sèé lo,

257
Béêni éyin kò se é padà sí.
Ogófà ojç n i won fí rín,
dó orita mçta àjàláyé;
Èsú tí Io,
Èésú yàlàyàlà so fún won wípé,
Sebí òún tí ni k í won ma fi ojà wçn rúbç.
Qrun kò se é padà sí,
Bççni iié ayé tí a wà.
Qrúnmilà tí a wá ba ti kú,
Pçlu irònú Èsú yàlàyà tí kò fi òjá tírç nibo;~
Bá mú òjá ré, ó pa okún so.
Ó bá kú.
Ó kú àwçn mçta, tí won fí òjá wçn rúbç,
Gbogbo wçn jókòó pó m ç çrú wçn.
Wçn nronú.
Nítorí wçn kò ní çjá tí wçn máa fí pá okún so.
Èsú wá paradà, ó di çniodé
Ó lç bá Qrúnmilà wípé, k i ó fún òún ní çgójç owó çyç;
Eku àtí òbúkç
K i ire mçrin tí o nbç lçna sí çdç rç lé to o Içwç.
Qrúnmilà ní òún kò ni fún-un ni hhkan kan.
Nítorí wípé kii se òní ti Èsú tí nbá òúnjçun;
Iyàwó Qrúnmilà tí ó mo iwà Èsú dáadáa,
Bá bínú, Ó fí oúnjç ti òún pçlú Qrúnmilà j ç njç silç
Ó sç fún çrúnmilà wípé:
Tí kó bá fún èsú ní ogçjo owó eyo, eku pçlú òbúkç yen,
Inú òún kò ní dún sii.
Qrúnmilà bá bínú, ó lo mú àwçn iiiikan;
tí èsú bèrè fún pçlú àkukç adiç.
O sçç lu èsú làyà
Èsú subú lulè, ó dide.
Ó wá nso wípé;
Òún a gbògbçrò ogojo,
Alámúlámú bata.
Òún a mú oko tçérçé gbà Içwç,
K ò jç ní wèçrçç kò sunwçn,
Èsú wá tún paradà, ó dí omodé.
Ò di omodé
Ó wá lç bá àwçn niétèèta

258
Tí ó puro fún tçlè wípé. çrúnmilà ti kú
Ó dc ibè, ó bá wçn lórí ijokòó.
Ó bèrè lçw ç won wípé,
Kini wçn íi se
Ó tó ojç mçta tí àwon tí wá níbè.
A ti wípé, bàbá kan wá sç fún won wípé;
Qrúnmilà tí àwçn wá bá tí kú.
Èsú ní kò ní dá a fún bàbá náà,
Nitorí wípé, ilé Qrúnmilà ni òún ti nbç.
Ari wípc. Qninmilà ní ó fiin òún ní ilçkèségi tí òún w$ y ií nísisinyí.
Èsú wá sç fún gbogbo wçn wípé; k i wçn tçlè òún,
Ó wá mú wçn lç silé Qrúnmilà.
Nigbà tí wçn dé ibè.
A jé n i ó k çkç wçlé,
Okún wolé sikcji;
Ide wá wolé siketa.
Èésú yàlàyàlà tí nse ikçrin won, tí binú kú.
Èsú ní k i wçn Io kó çrú won wçlé,
À im oye ojç ní won ti kó gbogbo çrú,
olá àti ire náà wçlé Qrúnmilà.
Gbogbo ilé Qrúnmilà kún fún ohun rere.
N í Èsú wá sç fún-un wípé. sebi mo sç fún ç
Wípé ire nlá kan nbç wá fún e.
Qrúnmilà wá bçrç si njó, ó nyç.
O se enu kótó Elédúnmarè ti obún awo si Içnu,
Ò sç wípé,
A jé wçlé dé,
Sébi òkun nbç.
À ti dé adé ide kò sòro;
A jé wçlé dé o
Sébi òkun nbç o.
À ti dc adé ide kò sòro.

8. Odú Èji-Ogbò
Fonte: William Bascom

Ponrinpçn sigidi ní nse awo inú igbó,


Qgçgòrç nii nse aw oyàm ç
B í çré bá dún ní àdúnjú

259
À dàibíyêkan çni,
À d'ifá fún Qrúnmilâ.
Ti nló bá Esú di olúkú.
À k ii ba Èsú di olúkú.
K i ojú owó ó pçn çni.
Èsú nse ní mo wá bá ç di olúkú
A k ii bá Èsú mu ilè
K í ojú aya ó pçn ni
A kii bá Èsú di olúkú
K í ojú omç ó pçn çni
Èsú nse n i mo wá bá ç di olúkú.
Má jç è ojú ire gbogbo ó pçn m i
Eni ti a d ’ifá y i fún
Yóò ni àkúkç adiç kan, pèlú igbin kan.
Yóò ti rúbç fún Èsú.
Ifá n i çni ti a d ’ifá fún y ií
Yóò ni çrç títun kan
Tí yóò se ni ánfàni.

9. Odú Ogbè-Iretç
Narrador: Bàbáláwo Lawál Rüfiíi

A díngbçnránkú
K í á se bí eni kú.
K í a m ç eni tí yóò sunkún çni
K í á rin iwòriwò wçlú,
K í á m ç eni tí ó lè dá asç rere bo çni lára.
K i á rin-rin-rín gbçnrén,
K í á fí esè kç ipá;
K í á mo eni tí yóò se çni pçlç.
A d ’ifá fún Qrúnmilâ,
Baba nlo m ç çtá è
Gbogbo òrisà çrç Qrúmilà ni wçn nse
Qrúnmilâ n í ó máa n difá fún wçn,
Ó nlç m ç çrç ç, Ifá ni k í ó kára nlè
Ebç ni k í ó yára se.
Qrúnmilâ pe àwon çm ç rç

260
Ó ní k i wçn gbé aago sita.
K í wçn máa lúú kiri wípé òún kú.
À wçn çm ç Qrúnmilà bçrç sí lu aago,
Wçn gbe aago déle òrisà n/á wípé Qrúnmilà kú.
Òrisà-nlá da àwçn çm ç Qrúnmilà lòhún wípé.
Gbogbo efun òún ti Qrúnmilà gbà, nigbà ti ó wà láyé,
Òún máa gbà á padà.
Wçn tún lu aàgo délé Sàngó wípé, Qrúnmilà kú.
Sàngó fún wçn lési wípé,
Nse ni òún rò wípé Qrúnmilà kò ní kú mç.
Ó wá sç fún àwçn çm ç Qninmilà,
Gbogbo çdun-àrá òún tí òún fún Qninmilà
Òún máa gbá á padà
Wçn tún sí wçn lu àago délé òsun.
Àw on çm ç Qrúnmilà nkçnrim báyi wípé,
Baba wá lç, baba wá lo nílèyío, baba wá lç.
Qrúnmilà agçbç Ifá se pé/ç baba wá lç, ó tán nú-um-ún

Qsun ní Qrúnmilà kú. Ó ni gbogbo ide òún tí Qrúnmilà gbá


Ò ní òún máa gbá á padá.
Àwon çm ç Qrúnmilà lú aago délé gbogbo àwçn òrisà,
A wçn çm ç Qrúnmilà wá bcèrè làárin ara wçn wípé
Ilé e tani ó kú kíi àwçn dé,
N í wçn wá rántí wípé, Ó ku ilé Èsú.
Wçn sí wçn gba ilé Èsú lo.
Nigbà ti wçn délé Èsú, wçn so fún-un wípé,
Qrúnmilà çrç rè ti kú.
Inú Èsú bàjç nigbá ti ó gbç èyí,
Wípé k í wçn bá òún fa orí òún
Nítorí wípé çrç òún tí kú
A tí wípé, Qrúnmilà ni ó nbà òún wá òúnjç
Súgbçn Èsú kò fá irun orí rè rí;
Wçn wá bçrç sí fá irun orí Èsú,
Ti apá çtún ní wçn k ç k ç fá, wçn wá bç sí apá òsin;
Èsú yá àwçn çm ç Qrúnmilà Tçnu,
Wçn sáre lç so fún baba wçn,
Wípé Èsú ti ní k í wçn bu om i sí òún lórí,
K í won bçrç sí fá irun orí òún, wçn si ti nfá irun orí rè.

261
N i Çrúnmilà wá sç fún àwon om ç rç wípé.
K i wçn iç sç t'ún Èsú wípé, òún kò kú
Wipé k i wçn ma bu om i si orí Èsú, Epo ni k í wçn máa bú si.

Nigbà ti àwçn omo Qrúnmilà máa délé Èsú,


íw ç ba irun ní ó kú s í ipàkç Èsú.
Báyiini Qrúnmilà wá pásç wipé, ohun kò ni bá àwçn òrisá
Ti ò kú se m ç nitorí wípé, çdàlè ni wçn

10. Odú Ò gúndá-Òtúrã


Narrador: Bàbáláwo Fábünmi Sówünmí

Omo olòwo kíi nfu eyin ganganrangan


k i á fí êtè iwçfa bò ò, a d'ifá fún çdún-çlà,
Ti ò máa dó iyàwó baba ré, tó máa sálç sóko
Qrúnmilà lobá wçn lótú ifç
Qrúnmilà sçfín nigbà ti òún dé orí oyé
E nikén tí ó bá dó iyàwó baba ré,
Wç>n ni láti pa eni náà ni
Òfín náà si tidí múlç nigbà tí ó tó bi àádçrin çjç
Qmç alára m ú iyàwó bábá rç ó dó o.
Wçn kó çjç to sçdç Qrúnmilà ni ààfín.
Qrúnmilà béérè wípé se òtítç ni ó dó iyàwó baba rç,
Qmç alára dáhún wipé òtítç ni
Qrúnmilà pásç wípé k í wçn lç paá,
Wçn mú wçn paá gçgç bii òfín se wi,
Nigbà ti ó yá,
Qmç ajerò náà tún m ú iyàwó baba rç, ó dó o.
Wçn tún sí, wçn kó çjç lç bá Qrúnmilà n i ààfín.
Qrúnmilà bèèrè lçw ç çm ç ajerò wípé.
Sé òtítç ni ó dó iyàwó baba rç,
Qmç ajerò jç w ç wipé, òtítç ni.
Wçn mú òún náà, wçn tún paá
Gçgç bi òfín se wi,
Qwá çràngún náà, omç rç mú iyàwó rç, ó dó o.
Wçn tún kó çjç lç bá Qrúnmilà ni ààfín,
Wçn pa çmo çwá-çràngún.
Wçn bèèrè lçw ç r ç , wípé se òtítç ni ó dó iyàwó bàbá rç,

262
Ó dáhún wipé. bççni,
Qrúnmilâ pàsç wipé. k í wçn lç paá.
Gégé bí òtin se wi, nigbà tí ó di àárç ojç kan.
Àw çn ijoyè Qrúnmilâ lo k ii n í ààfin;
Igbà ti wçn fé wo ààiin.
ibi tí ó y ç k í wçn gbà wçlé, kç ni wçn gbà.
N i wçn wá bá çm ç kan soso ti Qrúnmilâ bí,
Tí nse odún-çlà.
Nibi tí o gbé ndó wúndíá àrçwa iyàwó bábá ré,
Ti njç çsúfúnnláyç àgbonmirégún.
Wçn bá mú çdún çlà àti òsúfúnnláyç lç sçdç Qrúnmilâ,
Nigbà tí wçn dé ibè, wçn bá Èsú çdàrà, asoore sebi nibé
A wçn olóye Qrúnmilâ, wçn kó çjç wçn rò fún-un,
Qrúnmilâ bèèrè Içwç omo rç wipé,
Sé òtítç n í ó do iyàwó òún
Odún-çlà dàa lóhún wipé, òtítç ni.
Qrúnmilâ pàsç wipé. k í wçn lç pá çdún-èlà, çmo kan soso tí ó bí
Gégé bí òfín se wi.
Èsú wá mú àbá wá fún Qrúnmilâ àti àwçn olóyè rç,
Wipé. çni tí ó sç irú çsç báyiítí òtin si ni k í ç paá.
E j ç k í ó máa tó çjç móje k í ç tó máa pa wçn.
Won gba àmçràn ti Èsú mú wá fún wçn.
À wçn olóye Qrúnmilâ wá mú çdnn-çlà, wçn lç tçjú rç.
Òkiki kàn y i ilú ká.
Wipé. çm ç kan soso tí Qrúnmilâ bí;
Wçn máa paá, nítorí wipé, ó lò di s i òfín.
Ti wçn bá si pa çdún-èlà tán,
Kò si eni miiràn tí ó máa j ç çba
Lçyin ti Qrúnmilâ bá kú
Ílú òtú ifç kò gbçdç má nií çba
igbàtígbogbo àwçn olóyè kúrò nibi
Ti wçn tçjú çdún-çlà si
Èsú lo bá çdún-èla, ó so fún wipé.
Ti ó ba ti di çjç keji ti àwon
Olóyè çba bá wá bç é wò,
K i ó sç fún wçn wipé. ó fçyàgbç
Lçyin èyí Èsú tí gba èyin,
O lç sç fún àwon ijòyè Qrúnmilâ àti Qrúnmilâ wipé.

263
Çni tí ó bá se irú çsç ti çdún-çla só yen,
Kò gbçdç máa yàgbç sínú ilé, à fí sínú igbó.
Çdún-çlà wá só fún wçn wípé, òún fé yàgbç.
\Vç>n ní k i ó wç inú igbó lo.
K í ó lo yàgbç.
Çkan gbogbo wçn ti bàlç wípé, kò si ibi
Ti ó máa sálç.
Ti àwçn kò ni mç.
Èsú bá tçlé çdún-çlà wç inú igbó
Èsú fún ni çpçlopç imç àti òyc.
O tun fún çdún-çlà ni amçràn wípé.
K i ó sálç, k i ó ba máà kú ú.
Çdún-çlà bá si, O sálç sínú igbó
Kò wá sílé mç.
Ojç keji ni wçn tó m ç wípé. odún-çlà tí sá lo
Gbogbo wçn wá lo bèèrè Içwç Èsú wípé, çdún çlà nkç.
Èsú dá wçn lóhún wípé, òún kò ri i.
Èsú tún bèèrò Içwç wçn wípé. sé wçn
Fi òún sç çdún-çlà ni.
Èsú se çnú rç múrçn,
Kò so fún wçn;
Kò si j ç k i ó y o nínú iwà rç.
Wípé, òún ni; òún kç çdún-çlà wípé,
Kó sálç.
Lçyin çdún kcje ti çdún-çlà ti sálç.
N í Èsú bá pàidé è nínú igbó
Ti ó ti lç sodç.
irun tí hú si gbogbo ara ç,
Ó dàbi çranko;
Èsú pé odún-çlà wípé. k í ó bç
K í ó j ç k í àwçn lo sílé,
Çdún-çlà fún lési wípé òún kò lç,
A tí wípé, ti òún bá lç, wçn á ni k í
Wçn lo pa òún nítorí çsç tí òún sç.
Èsú dá lóhún wípé, wçn kò lè pa à.
Nítorí náà kó tçlé òún bç nílé.
Èsú tún sç fún wípé, láti ojç ti
Odún-çlà ti lo, bábà rè kò bímo miíràn.

264
À ti wípé, pàápàá pçlú tí èniyàn bá sç.
Èsè kan ní òtú-ifç, tí çlçsè náà bá sálç,
Lçyin çdún méje, nse ní wçn ndáriji çlçsè náà.
Èsú wá mú çdun-çlà lç sílè.
Igbà tí Èsú máa délé Qrúnmilà.
Èsú ní k i çdún-çlà dúró s i èyin òún
Òún wà níwájú.
Báyií ni çdún çlà nri bàbá rç,
Súgbçn Qrúnmilà kò ri çm ç rç lçyin Èsú.
Èsú wá Ianu kótó, Elédúnmarè fí ohún
A wo 5/7 Içnu, Ô ní.
Bâràpetu yé, má má, ko çbç
Bàràpctu y é mà má, kç çbç
Odún-çlà ló rán m i wá bç é o,
Bárànpetu yé, mà mà kç çbç.
Qrúnmilà lóri ilé, Ó dá Èsú lóhún báyií wipé.
Odún-çlà re kò seun o
Odún-çlà re kò seun o
Omç mélò ò ni èdú bí
Tó máa lé ikan sçnú o, çdún-çlà re kò seun.
Qrúnmilà ti idúnnú gba çm ç rç padà.
À wçn ará ilú otu-ifç bá pa òfín y ií ré.

11. Odú Òwónrin-Òtúrá


Narrador: Bàbáláwo Fábúnmi Sówúnmí

Atàmájúbáà gbé okó wá sí çjà látí tá,


Ó wá tó igbà meta, súgbçn kò tá hhkan-kan.
Ó wá lç difá Içdo àwçn aláwo rè
Wçn ní k í ó rúbç
K í ó tún bç Èsú
Lçyin igbà tó nibo tán. Ó gba ojà Io.
Bí ó se dó ojà, Èsú w áyçw ó lçw ç rè,
Egbàágba ni ó dá lé ojà.
Súgbçn Èsú yow ó ç, dé oókan
Súgbçn obinrin y ií kò binú.
Bí ó sé nyowó ojà yií, ní ó ni k í ó wá mú ojà náà.

265
Èsú bá mú çkç kan soso ni oókan. Ó ra á.
Ó bá ti ç lç.
Títi i/ç ç jç y ií fi sú. Obinrin kò ta Ohunkólnin mç.
O rçju, kò bínú, kò ronú.
Ó nrctí oià tire.
Gbàrà n i òwúro çjç keji,
Di Obinrin y ií se so erú kalç báyií
N í èsú dé idi igbá ré, ò kii káàárç
Èsú bá sç> báyií fún obirin y íi wipé,
Òún tí báa ra oià lánàá._______________ _________
Òún yóò si báa ta çjà lóníi.
Báyíi ni Èsú se biri ti ó jó kò ó tii
Obirin yií.
B í çnikan bá ti fé láti yçw ó ojá,
Èsú a dá wçn lóhún wipé. çgbççgbççdógún ni jálç.
Á wçn èniyàn tí wçn fç ra ojà y ií
Wçn kii n/òyçw ó è nítorí wipé,
Wçn ma nbçrú ojú Èsú.
Wçn a siyára dá owó sílç
Báyií ni Èsú se bá obinrin náà ta gbogbo
Ojà rç tán ní ojà
Nigbà tí obinrin y ií fç dúpç Içwç Èsú..
Èsú ní k í ó ma dúpç nítorí òún kò
Tii se ç lóore tán.
Ojà y i kan-àin-nàa n í ajé má nná.
Èsú kç obinrin y ií wipé k i ó lç ra
Obi wá Içdç ajé làísán owó
Nígbàtí obinrin y ií dé ibè ó ra obi.
Nigbà kíní làí sanwó.
Lçyin tí obinrin y ií dé çdç Èsú láti.
Fún-un n i àbç,
Wipé, òún tí ra çjà lái sanwó.
Èsú ní k í ó padà lo si çdç ajé
K í ó di i ní asç mú,
K í ó má a Içgun lé e lórí wipé,
F.rú bábá òún nií nsé
Èsú tún kç ç wipé ti ajé bá njiyàn,
Kó sç fún wipé, k í ó tú asç rç;
Wipé. ajé yóò ba ojú ogbé nlá kan

266
Nítan çtún obínrin yií.
Súgbçn idánilójú wà fún ajé wípé, òún
Kò n i iríi àpá bçè làra.
Ó wá sç fún obínrin y ií wípé,
Tí òún bá tú ara òún, tí ó bá bá
Ogbç y ií lára òún,
Òún yóò má bá a lç.
A jé tún sç fún obínrin náà wípé,
T ik ò bâ s í irú ogbç bçè lára òún.
Obínrin y ií dçrú òún.
A sç mçkànlénígba ni ajé rò wá sí ojà.
Ó bçrç sí tú u Içkççkan.
B i ò tí ku asç kan soso,
Bçè ni Esú náà àdó ogbé sii lára.
Àpá çgbç obinrin náà si ri mònrinmò
N í itán rç çtún.
Nigbà ti ó tú asç ikçbin ni gbogbo
Erò çjà ri àpá ogbç mçnrimç
N í itan çtún obinrin yií.
Gbogbo èrò çjà wó gè è, té e lórí.
Wípé. eríi, çrú atàmájúbáá ni o nse.
N í tóòtç.
Gbogbo wçn ni k i ajé máa ba
Olúwa rç lç.
Báyií ní lójú çsç atàmájúbáá kó igba
Ninu asç tí ajé ró,
Ó fí çkan soso tí ó ró silç fún-un.
Ó mú ajé se çkànkànlénigba çrú,
Nítorí wípé, ajé fún rara è j ç çlçlá àti olçlà.
Ó sii tún n í igba çrú
Atàmájúbá bá kó gbogbo owó tí ajé pa,
Ó gba gbogbo çlá ajé móra
Ó kó gbogbo rç rclé,
Ò njó, ó nyç,
Ó nyin àwçn awo rç,
O tún nyin Èsú.
Ó di olólá. ó di olçlà.
Gbogbo ire y ç atàmájúbá sii.

267
12. Odú Òkànràn-AIéji
Narrador: Bàbálávvo Líwòsi igbórc

Sç òdi çrò.
Kó gbç çdà çrç.
Á difá fún sákótó,
Ti ó nse awo lç sódc çwá.
Sàkótó awo wçn lódc çwá, d'ífá fún wçn lóde çwà.
Níbí ti iri kò sç tí àkèré omo odò nkó çrúngbe,
À w çn ará òde çwà.
Wçn ní njó àwçn lè ri omi mu,
Nitorí èyí ní wçn se dá Ifá,
Wçn wipé, k í wçn lç pe sàkótó,
Oun ni ó má bá wçn se é.
Wçn wá lç pe sàkótó,
Nigbà tí wçn dé çdç sàkótó;
Wçn ni kó wá lç
Bá àwçn se ti ilú won.
K í àwçn lé máa ri omi mu.
Sàkótó tún wá dá Ifá rç, òde çwà
Tí wçn wà pé òún y ií nkç?
Njé òún le se k i òjò rç,
Wçn n i òjò á rç,
Wçn ni k í ó ni àkúko mçta,
ígò epo mçta àti çkç kan soso,
K í ó mú çyç kan nínú
A diçyçn, k í o lç fí bç Èsú,
Kó ni àkàrà mçta,
K i ó fi se lànbòròki (fí pçn lójú) fún Èsú.
Sákótó se bçç fún Èsú,
Sàkótó j ç àkàrà ré fún ràra ré.
Nigbà tí ó j ç àkàrà y ií fún rara rè,
Ó wá gbéra. Ó nlç sóde çwà;
Ó wá pe Èsú ti ó fí àkàrà yán lójú,
Wípé, iwç Èsú òjò ló nrç lóde
Çwá tí wçn ní k í òún wá bá wçn dá o.
Ti òún bá dé ibç k í òjò náà dá.
Èsú wá ni òún máa dójú tii wípé,
Òjò yçn kò nii dá tití

268
O máa fí dé òdc çwà.
Nigbà tí sàkótó dé çnu odi ílú òjò nrç,
Èsú gba ipàkç rç pé;
Nigbà tí sàkótó dé çnu odi ilú òjò nrç.
Esú gbá ipàkç rç pé,
O na àdó òjò rç sí çwá;
Òjò wá pa sàkótó tití o fí dc òdc çwà.
Ó ní òún kéji dé èyin ará òdc çwà,
sàkótó awo ire ni,
Kò máa si aláwo bií sàkótó,
()jò náà ní çkàn àwon ará çwà baiç,
Ó ni, òún kéji dé o, ará òdc çwà.

3. Odu Òdi-M éji


Narrador: Bàbáláwo Olúwáççlá Ayclabplá

Òdí abíti, abiti


Òkò baiç ta bítibití,
A d'ifá fún Ayé,
Wçn bu çw ç kan fún Elédúnmarè.
Wçn ní k í ayé rúbç,
K í Elédúnmarè rúbç.
K i ogun má lè pa wçn,
Elédúnmarè ní, k í ni òún máa se tí
Ogun náà kò fí ni lè pá òún.
A y é rúbç,
Elédúnmarè nàá rúbç,
A won méjèéjí se ètútú.
Gbogbo ohun tí wçn ní k i wçn ní,
Gbogbo rç ní wçn ní,
Wçn kò gbogbo rç lç si orita mçta, tí nse orita Èsú.
Nigbà ti wçn j ç tán, ayé tí nse àbúrò Elédúnmarè tún sç çbç
tírè fún wçn látijç.
Nígba ti wçn j ç tan, tí wçn fç máa lç, Èsú wá y ç sí wçn;
Ó nbi wçn iéérè wipé, níbo ni ç nlo, Wçn ní àwçn fç Io fí Ogun ja
Elédúnmarè,
Èsú wá nbi wçn Iéèrè wipé, oúnjç tí e j ç nibíyí, njç çyin Içní?
Wçn n í k ii nse ti won.
Èsú n i njç e fí oyin j ç çbç ri?

269
Wçn ní rárá.
Èsú wá ni Elédúnmarè ni ó ni oúnjç li ç k ó k ó je yií.
Ti ayé àbúrò rç ni èkcji.
Èsúní nítorí idí eyi. a k ií njç oúnjç çni k í á tún pani.
Nínú k í ç padà nibí y ií tàbi k i e da oúnjç y ií padà,
Nibè ní wçn ti padà s i ibi tí wçn tí wá.
Orin li wçn kç padà ni:
lbi oyin Iamç, àwa kò lè bá çlçrunjá, ibi oyin lamò,
Ojç méèdógún ni wçn íi rin dé orita.
--------- Wçn tún fi ojç méèdógún rin padàró j ç ogbçn ojç.
Fún odidi ogbçn ojç y ií àwçn tí wçn fi silç ní òdc ayé kò jçun.
idí è y ín i wçn fi ngba ogbçn àwè.
Qrúnmilà ira fi wçn nse çlçyà nigbà ti wçn yç,
A wçn èniyàn wà sç wípé. àwçn tú çnu àwçn ni òní.
Wçn si jçun.
Àgbò dúdú Qrúnmilà 1o 11 bo Sàngó ni àiárç ojç náà,
Orin:
À fèké é é o. A fçra a a
A kiíngbç ikú Qlçrún
A kiíngbç ku Elédúnmarè è
A fckc e e o, A fçra a a
A kiíngbç kú Elédúnmarè è
Ibo lçtígbç ikú Elédúnmarè çyin imàlç. ç y c é gbààwè,
A fckc c c o. A fçra a a.
A kiíngbç ku Elédúnmarè è.

14. Odü Òsá-Mcji


Narrador: Bàbáláwo Fábúmni Sówünmí

Aporoko ò fi çyin ná lç,


A w o çdç, d'ifá fún çdç.
Odç nrc igbó jééjce tòún àlújú-èje.
Wçn ni k i ó rúbç. k i ó lè ri çran pa.
Odç ní. O digbà ti òún bá tigbó
Qde dé. k i òún tó wá rúbo.
ígbà ti ó dé ijú. àlújú-èje. ó pa àgbàrigbá,
Aporoko ó fi çyin lalç.
Ó d 'ifá fún wçn lódc igbçnná.

270
Wçn nsokún pé njó àwçn lé bimo,
Wçn ní, wç>n a bimo.
Wçn ni, k í wçn rúbo.
K í wçn ni çyelé àti acíiç,
Qpçlopò cpo.
Àgbàlagbà òbúkç,
ibó nbó osún (osún púpç)
Nigbà tí àwon ará òde igbónná rúbç tún,
Ode isiiwájú àgbàrigbà tí ó pa,
— Iwo kan soso náàJájii,______________ ____
Çjç ti ó pa àgbàrigbà.
Ojç náà ni wçn lç pé é nínú igbó
Wípé. ara omç rç kò yá nilé.
Nigbà tí ode dé ilé, Ó bá omo rç
Níbití inú nrun ti ó ndà á láàmú,
Odç gbe ojç méje nínú ilé,
Nigbà tí ó di ojç keje,
Ló ní òún nlç wó çran tí òún ti pa láiti ijeje.
Çran tí odç ti pa ti rà.
~ Nigbà tí ó rii wipé, çran tí rà.
Ó wá nlo,
È$ú ni çni àkçkó tí ó pàde Içnà,
Èsú n ikilò wágbé dáni yií,
Ó ni iwo àgbàrigbà çran tí òún pa ni.
Kò mç wípé Èsú ló nbèèrè çrò lçw ç òún.
Ó ni, se ó má tà á ni?
Odç ni òún máa tàá,
Ò ni, èló ni ó máa tà á.
Ó ni igba çkç àimçye.
Ode gbé e, ó di ode igbçnná
À wçn ará òde igbçnná rà
Iwo àgbàrigbà lçw ç odç ni igba kan,
Odç gbá owó.
Ó gbé iwó àgbàrigbà fún on igbçnná
Çde wá di çlçlá.
Ode ni owó lçwç,
Á wçn ará òde igbçnná
S í 11 sin iwo àgbàrigbà. wçn nbç ó,

271
T
À wçn ará òdc igbçná wá bçrç sí bímç.
Nigbà tí wçn nbç iwo àgbàrigbá,
Orno wçn pç.
Lçdodún lçdçdún ni wçn
Wá 11 boç pçlú nkç adiç, çpçTçpç osún,
Eni tí ó bá fí Osún inú iwo
Àgbàrigbá yen puni, á á bínio.
Láti igbà náà n i wón wá nkçrin báyií wipé:
O ni njó ròún, kini ó gbéwá?
Ogc ní gbè wá. tçm ç tçmo.

15. Odú Iwòri-Méji


Narrador: Bàbáláwo Fábímmi Sóuíinm í

Qkánlàbà kúlónbó àrún igbàido kò pçnm ç lá.


A d'ifá fún pçpçyç ti ò máa yçga çyç òrofórofó afíyç lagbà,
A d'ifá fún olôkun abàtàbútú. 01110 aláde nlògo oçni,
Eyí ti igbà iwà rç sçnú.
Igbà ti ó lç d'ifá, àwçn aláwo rç sç fún-un
Wipé. á ri igbà iwà rç tó sçnú.
Wçn ní k i olókun lo bç çrúnlójo çyç wipé
K i won bá òún wá igbá iwà òún
Gbogbo àwçn òrúnlójç eye bá olókun wá igbá iwà rç,
Súgbçn wçn kò ri i.
Nítorí gbogbo àwçn çyç ti wçn bá ti nw ç inú omi.
N se ní wçn máa nri.
Wçn á si kú.
Súgbón pçpçyç nikan lókú 11inú gbogbo wçn.
Ti kò ri ti u p inú omi láti lo
Ba olókun wá igbá iwà rç.
Esú wá p c pçpçyç, ó ni njç ó lè rúbç fún òún na.
Pçpçyç ni òún á rúbç fún Esú.
Esú ni k i pçpçyç ra òbúko kan pèlú bàtà.
IgbtL 'tipçpçyç rà á tán, Èsú ní k í ó tèlç òún.
Èsú bá mú pçpçyç lo sí çdç àwon aláwo,
Wçn d'ifá fun-un, wçn gbá iyçrosún
Sinú bàtà pçpçyç. Wçn ni. k i ó ti çsç bç ç.
Bàtà, bá wç inú çsç rç, kó se é bç mç.

272
Wçn bá pc pçpçyç wípé, àsikò tó fún-un láti wç
Inú omi lç bá olókun wá igbá iwá rè.
Pçpçy? fò bàràbàrà, Ó bç>sínú omi.
Ó bá bçrç si ni ti çsç rin lç gcrcgc lôrí omi.
Kò ri bí àwçn egbç rç ti ó kú sc ri.
Pçpçyç bá lo si àárin agbami, O ri igbá iwà olókun tí ó nwá
Pçpçyç bá ti orí gbé e, ó gbé c wá fún olókun.
Olókun wá fi pçpçyç j ç olórí çyç inú omi.

16. Odú Uvòri-Mcji


Narrador: Bàbáláwo Fábümni Sówünmi

Gbálúkçgún. gbàlúkçgún
ipàkç gúnnugún já, ó jçrú àwçn.
À won ló d'ifá fún éji kóko iwòri
Níjó ti ó nbç wá bá wçn kçtn odú nilé ayé,
Éji-ogbé n í òún kò n í j ç kó dúró,
Òyçkú-méji ní òún náà kò n ijç k i ó dúró.
iwòrí-méji wá lç àwon aláwo rç lo.
O béérò Içwç wçn, báwo ni òún se máa
Se é ti won máa j ç k í òún kçta odú láyé.
Wçn ni, k í ó lo ni ewé gbégbé, ewé tçtç, ewé èkúyà, eran àgbò
Pçlú iyà odó. pçlú iyá çlç, àwon aláwo rç bá d'ifá fún-un.
Àwon aláwo rç wá bèrè si ni pe igédc báyií wípé:
Ibi tí wçn ni k i gbégbé má gbé é. ibç n ií ngbé
Ibi wçn ní k i tçtç má té. ibç ní nté.
Ibi ti wçn 11i k i èkúyà má kú.
Ibç ló njókò ó tó ngbçn iwú orí è sí gbçrúgbçrú.
Wçn ní. scbi iji kó njà, kó gbé iyá odó,
Atégún kò n í jà kó gbé iyá çlç.
Aó j o tçlé y iii pç o. gburugburu
Aó j o tçlé y ií pç. o gburugburu
Ibi a 11i k i gbégbé má gbé. ibç ló ngbé, gburugburu
A ó j ç tçlé y ií pé o gburugburu
Ibi tí a ni k i tçtç má tè, ibç ní ó nté. gburugburu
A ó jo tçlé y ii pç o gburugburu
Ibi tí á ni k i èkúyà má fú,
Ibç ni njókòó tí gbon ewú orí rè silç. gburugburu

273
A ó j ç telç y ií pç o. gburugburu, cji k ii njà kó gbé iyá odó
Gburugburu a ó jo tçlè y ií p é o, gburugburu atçgún ki njà ko gbc
iya olç
Gburugburu a ó j ç tçlç y ií pç o, gburugburu

17. Odú Iw òrí-M éji


Narrador: Bàbáláwo Fábúnmi Sówíinmí

Mabítunlà bçrçrç
A d'ifá fún È sú om ç ará ilúlá.
Çmo aro wêrewèrc jáko.
Niijç ti nfi gbogbo çm ç se àbikú.
Nigbà tí Èsú kç délé ayé.
À wçn çm ç aráye npa çm ç Èsú.
Èsú wá tç àwçn aláwo rè Io.
O ni k í wçn bá òún bèèrè lçw ç Ifá,
N kan ti òún máa se,
Tí wçn ó nii pa òún Içm ç mç.
A won aláwo rç ní k í ó lç ni àdá kan,
Òbúko kan, pçlú kèrègbé omi.
Kó ó wá 17 rúbo, wçn rúbo fún-un tán,
Wçn ní k í ó lç b 'òsún,
Ó rúbç tán, O gbè fún Èsú.
Ifá ni àwon çmo aráye
ni ó npa àwon çm ç Èsú,
Nigbà tí Èsú rúbç tán. Èsú
Wá gbé kèrègbé omi tí Èsú li rúbç.
O dà á lé Èsú ti àwçn omo aráye ge,
B i Èsú se ndà á lé wçn lórí
n í wçn nsu y o Içjç kcjii.
Látí çjç y ií ni Esú
Kò tún bimo àbikú mó.
Èsú bá bèrè si ni kçrin. Ó ní:
Ma bimo là gçrèrç o,
À tún Ia pçrçrç
Èniyàn kò má íri àgán èsúúrú láyé o

274
j8. Odu Ofú-Òsç
Narrador: Bàbáláwo Fábíimni Sówúnmí

Çni tó bá púro,
Irç á pa á.
Çni ti ó bá scké,
Èké á ké wçn Içwç;
Á ké wçn lésè.
Á tí wçn sí gbúrugbúru çnà çrun.
— Á w çn ló d 'ifá fún àjàgúnmàlç----------------------------------------------
Tí nse olúwo lóde çrun.
Gbogbo eni ti ó bá
N ti súúrú pe súúrú
Àjàgúnmàlç Ifá
N í yóò já wçn sçrun.
Gbogbo çni ti ó bá
N ti súúrú pe súúni
Àjàgúnmàlç. Ifá n i yóò já wçn sçrun.
Ç má fí òkú pé à àyé.
Ç má ITaáye pe òkú.
Çni tí ó bá H òkú pc áàyé.
Çni tí ó bá ti ààyé pe òkú;
Àjàgúnmàlç Ifá n í yóò já wçn sçrun.
Àjàgúnmàlç
Ç má fí abiyamç pc àgàn.
Ç ma fí àgàn pc òyibí.
Çni tí ó bá fí abiyamo pe àgàn.
Ti ó fí àgàn pc òyibí
Àjàgúnmàlç, Ifá n í yóò já won sçrun.

No capítulo seguinte estes odus são apresentados em português.

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Capítulo 1 1

M itos de Exu nos odus de ífá


( p o rtu g u ê s )

1. Odú O gbè-Ò gúndá'


Narrador: Bàbáláwo Fábíjnini Sówúnmi

Gbengbelekú adivinhou onde quis foi quem realizou a consulta


oracular para Igúir, prim ogênito de Eledunmare, no dia cm que ele
adoeceu e a preocupação de seu pai era curá-lo.
Igún, prim ogênito de Eledunmare, que é Agçtún, Aquele que faz
da chuva uma fonte de riqueza.
Eledunm are fez pelo filho tudo o que póde, sem sucesso. C ansa­
do, abriu-lhe a porta do aiye para que ele fosse m orar lá.
Tótó Ibarà foi quem adivinhou para O runm iiá quando ele la­
mentava sua falta de sorte na vida. Ele foi consultar seu adivinho
para saber se teria dinheiro para ter um lar e criar seus filhos.

1 Observemos que as narrativas sempre trazem uma mensagem cm resposta à necessidade do consulcnte,
repetindo-sc, em muitas delas, a seguinte estrutura: (1) nome do babalaô, geralmente sob forma de uma
sentença; (2) nom e do consulcnte; (3) descrição da situação vivida pelo consulcnte; (4) apresentação
do conselho; (5) referência ao fato de haverem sido acatadas, ou não, as recomendações oraculares;
(6) descrição das conseqüências decorrentes de haverem sido, ou não, acatadas as recomendações; e
(7) apresentação de um último conselho, válido para todas as ocasiões em que esse odu se manifeste.
Sugerimos aos leitores que busquem sanar dúvidas relativas ao significado de palavras presentes neste
capitulo através de consulta ao glossário desta obra.
* Igúir. abutre, urubu.

279
Por essa razão foi consultar Ifá. Seus adivinhos o aconselharam a
fazer um ebó com cinco galinhas. Se fizesse esse cbó durante cinco
dias, 110 quinto dia toda a riqueza desejada chegaria às suas mãos.
As galinhas deveriam ser sacrificadas a seu Eledá, um a a uma,
diariamente, até com pletar cinco dias. As vísceras de cada galinha
sacrificada seriam retiradas, colocadas num a cabaça, cobertas com
azeite de dendê e levadas a um a encruzilhada. A carne da galinha
poderia ser consum ida por ele e sua família. A cam inho da encruzi­
lhada onde seria entregue a oferenda, O runm ilá deveria ir cantando
cm alto e bom tom: Que a sorte venha a mim! Que a sorte venha a
m im! Esse ritual deveria ser repetido nos cinco dias.
O runm ilá procedeu de acordo com a orientação e, assim, come­
çou a fazer o ebó. Sacrificava as galinhas e levava suas vísceras cober­
tas com azeite dc dendê para a encruzilhada. Lá chegando, depositava
a oferenda no chão e rezava pedindo que a sorte chegasse para ele.
Em frente à encruzilhada onde O runm ilá entregava as oferen­
das havia um m ato e era ali que vivia Igún, filho de Eledunmare.
Assim que O runm ilá deixava os ebós e saía dali, Igún ia lá e comia
a oferenda.
Igún, filho de Eledunmare, tinha cinco doenças: na cabeça, nos
braços, no peito, um a corcunda nas costas e aleijão nos pés.
No prim eiro dia em que com eu a oferenda de O runm ilá, Igún
ficou curado do problema que tinha na cabeça e surpreendeu-se. No
dia seguinte, O runm ilá levou novam ente seu ebó à encruzilhada, re­
petindo os mesmos rituais, sem saber que alguém comia sua oferen­
da. Assim que O runm ilá saiu da encruzilhada, Igún foi lá e comeu de
novo a oferenda e seus dois braços, que antes não esticavam, estica­
ram-se. No terceiro dia O runm ilá continuou o seu processo, levando
nova oferenda à encruzilhada. Mal term inara de colocar o ebó, Igún
foi lá e o comeu, e seu peito, que era inchado, desinchou assim que
ele acabou de comer. No quarto dia O runm ilá levou seu ebó à en­
cruzilhada, cantando: Que a sorte venha a m im ! Que a sorte venha a
mim! Mal term inara de colocar o ebó na terra, Igún foi lá novamente
e o comeu. Assim que acabou de comer, a corcunda que havia cm
suas costas desapareceu. No quinto dia O runm ilá levou sua oferenda
à encruzilhada para com pletar os rituais. No cam inho ia cantando o
m esm o refrão dos dias anteriores. Mal term inara de colocar o ebó na
terra, Igún foi lá novam ente e o com eu. Na m anhã do sexto dia seus
dois pés aleijados haviam adquirido vitalidade e ele passou a andar

280
sem dificuldade alguma, cam inhando agora por todo canto. E foi
assim que Igún se curou de todas as suas moléstias.
Impressionado com esses fatos, Igún se levantou e foi ao orun
para encontrar-se com Eledunmare, que logo percebeu que o filho
estava sadio e lhe perguntou quem o curara.
Igún relatou todo o ocorrido a Eledunmare. Disse-lhe que quem
entregava as oferendas era O runm ilá c acrescentou que este sem pre
realizava a oferenda entoando o refrão Que a sorte venlia a mim!
Que a sorte venha a mim!
Eledunmare disse a Igún que presentearia essa pessoa com rique­
zas. Pegou então quatro ádo' e os deu a Igún para que os levasse a
Orunm ilá, no aiye. Eram os adôs da prosperidade (riqueza, dinheiro),
da fertilidade, da longevidade e da paciência. Igún disse a Eledunm a­
re que não sabia chegar à casa de O runm ilá, mas o pai orientou-o di­
zendo que, assim que chegasse ao aiye, perguntasse às pessoas e elas
lhe indicariam o caminho. Antes de Igún sair do orun, Eledunm are
recomendou que O runm ilá poderia escolher apenas um dos quatro
adôs e que Igún deveria trazer de volta os três restantes.
Igún voltou para o aiye carregando os quatro adôs e ao chegar
foi diretam ente à casa de O runm ilá para m ostrá-los a ele. O runm ilá
surpreendeu-se muito. Perplexo, cm dúvida quanto à m elhor escolha
a ser feita, m andou cham ar os filhos para lhes pedir conselho sobre
qual dos quatro adôs deveria escolher. Os filhos aconselharam -no a
escolher o adô da longevidade, para que vivesse muito.
O runm ilá chamou então suas esposas a fim de ouvir o conselho
delas, e as esposas o aconselharam a escolher o adô da fertilidade,
para que pudessem ter m uitos filhos.
O runm ilá chamou seus irm ãos a fim de lhes pedir conselho sobre
qual dos quatro adôs deveria escolher e eles o aconselharam a esco­
lher o adô da prosperidade, para que pudessem ter m uita riqueza e
dinheiro.
Então, O runm ilá m andou cham ar seu m elhor amigo. Esse m e­
lhor amigo era Exu. Q uando Exu chegou à sua casa, O runm ilá re­
latou o ocorrido e lhe pediu conselho quanto à escolha que deveria
fazer. Exu, hom em hábil, fez as seguintes perguntas a O runm ilá:
- Teus filhos te aconselharam a escolher qual adô?
O runm ilá respondeu:

Adô são dons, graças. Adotaremos a grafia adô no contexto do idioma português.

281
- O da longevidade.
Exu lhe disse para não escolher esse adó porque não há uma úni­
ca pessoa que tenha vencido a m orte e lem brou que, por mais tempo
que se viva, um dia se morre.
Exu perguntou então:
- E luas esposas le aconselharam a escolher qual adô?
O runm ilá respondeu:
- O da fertilidade.
Exu lhe disse para não escolher esse adô porque O runm ilá já tive­
ra filhos. Perguntou-lhe de novo:--------------- --------------------------------
- E teus irmãos? Aconselharam a escolher qual adô?
O runm ilá respondeu:
- O da prosperidade.
Exu lhe disse para não escolher esse adô porque se ficasse rico
elim inaria a pobreza da família. E acrescentou que, se seus irmãos
quisessem prosperar, deveriam ir trabalhar.
Orunm ilá perguntou então a Exu qual dos adôs deveria escolher.
E Exu lhe disse para escolher o adó da paciência, porque sua paciência
era insuficiente para perm itir que chegasse onde desejava. Caso O run­
milá seguisse de fato esse conselho e escolhesse o adô da paciência,
todos os adôs restantes seriam seus. O runm ilá aceitou a orientação dc
Exu. Escolheu o adô da paciência e devolveu a Igún os três restantes.
Nem os filhos, nem as esposas, nem os irm ãos de O runm ilá fica­
ram felizes com sua escolha.
Igún iniciou sua viagem de volta ao orun, levando consigo os três
adôs restantes para devolvê-los a Eledunm are. Porém, mal andara
um pouco com eles, o adô da riqueza lhe perguntou:
- Onde está Paciência?
Igún respondeu que ela ficara na casa de O runm ilá.
Riqueza disse a Igún que voltaria para ficar com Paciência porque
só fica onde ela está. Igún lhe disse que isso era inaceitável e que
Riqueza deveria retornar com ele ao orun. Riqueza insistiu que só
fica onde há Paciência e que, por isso, não tinha porque retornar ao
orun. Em pouco tem po, desapareceu da m ão de Igún e foi juntar-se
à Paciência na casa de O runm ilá.
Fertilidade também perguntou a Igún por Paciência. Igún lhe res­
pondeu que ela estava na casa de Orunmilá. Fertilidade lhe disse que só
fica onde há Paciência. Assim, Fertilidade levantou-se e procurou estar,
em pouco tempo, junto com Paciência na casa de Orunmilá.

282
Longevidade tam bém perguntou a Igún onde estava Paciência.
Igún lhe respondeu que ela estava na casa de O runm ilá. Longevidade
tam bém foi se ju n tar a Paciência.
Q uando Igún chegou ao orun, Eledunm are lhe perguntou onde
estavam os três adôs restantes. Igún lhe respondeu que retornara
para contar a Eledunmare que todos os adôs haviam querido ficar
junto com Paciência na casa de O runm ilá. E que pretendia retor­
nar ao aiye para buscá-los e trazê-los de volta ao orun. Eledunm are
lhe disse que ele não precisava ir buscar os três adôs, pois, de fato,
todos pertcnccm a quem escolher Paciência.-Quem tiver paciência
terá Longevidade e Fertilidade: procriará e viverá bem com o que
procriar. E terá tam bém Prosperidade.
Assim, tudo transcorreu bem com O runm ilá e, com essas graças,
ele veio a ser rei de Kétu. Procriou e viveu bastante com esses adôs.
Teve tanta riqueza que construiu casas pelo m undo.
Feliz por suas conquistas m ontou em seu cavalo e cantou: - Rcccbi
o adô da prosperidade, recebi o adô da fertilidade, recebi o adô da lon­
gevidade, oh, reccbi o adô da paciência. Dançou e alegrou-se. Louvou
aos seus adivinhos e louvou tam bém a Exu, o seu amigo.

Algum as considerações sobre o odu O gbè-Ò gúndá


Nessa narrativa observa-se que, para quem busca prosperidade e
progresso, Exu aconselha o exercício da paciência em todos os âm bitos e
níveis. Todo o bem desejado depende do esforço para tornar-se paciente.
O odu Ogbè-Ògúndá apresenta duas situações de ocorrência sim ul­
tânea que, no desenrolar da história, term inarão por articular-se. Na pri­
meira delas Eledunmare consulta Ifá buscando orientação para curar Igún,
seu filho. Refere-se, pois, à busca de saúde e ao esforço por cum prir ade­
quadamente as funções paternas. Na outra situação, O runm ilá consulta Ifá
para obter sorte, dinheiro e boa vida familiar e é aconselhado a fazer ebó.
A articulação das duas situações da tram a ocorre na encruzilhada,
espaço privilegiado da ação de Exu, lugar de encontro do invisível (orun)
com o visível (aiye), lugar de escolhas e decisões. Nesse trecho da narrativa
há ensinam entos de ordem prática relativos aos procedim entos que devem
ser adotados para a cura de moléstias e deform ações ósseas, para p ro m o ­
ver curas, fortalecer a saúde, obter sorte, dinheiro e vida familiar dc boa
qualidade. Fala-se da im portância de entoar os pedidos de forma ritm ada.
Nota-se ênfase na ideia de que é preciso saber aproveitar as possibilidades
naturais e no valor da perseverança e da disciplina.

283
Esse odu descreve, ainda, o m odo pelo qual Igún, personagem prin­
cipal de um a das situações da narrativa, e O runm ilá, personagem principal
da outra, prestam benefício m útuo sem haverem se proposto a isso. Narra
portanto, a ocorrência de benefícios inadvertida ou involuntariam ente pro­
porcionados a outros. Através do ebó um a relação entre esses seres é esta­
belecida, de m odo a propiciar oportunidade de ajuda m útua: Igún é curado
com o ebó do qual se alimenta e O runm ilá alcança as graças solicitadas por
haver alim entado e curado Igún.
Nesta narrativa a sorte, antes de chegar a O runm ilá, que a pediu,
chega para Igún, que se alim enta do ebó. Mas, quando a sorte chega para
Igún, tam bém já se põe a cam inho para O runm ilá porque, logo que Igún
exibe a cura a seu pai, é aconselhado a expressar reconhecim ento e gratidão
pelo bem recebido.
Embora não tenha havido intencionalidade na ação benéfica, ainda
assim o pai de Igún providencia form as de expressar reconhecim ento e gra­
tidão ao benfeitor dele. Interessante, pois, notar o valor atribuído aos bene­
fícios recebidos. A gratidão se faz acom panhar de outras virtudes - justiça
e generosidade - e a demonstração de reconhecimento se dá através da oferta
de adôs, dons ou graças: fertilidade, longevidade, prosperidade e paciência.
Orunmilá é convidado a escolher apenas um entre os quatro dons, ten­
do assim uma oportunidade para exercer seu livre-arbítrio, ou seja, para fazer
uso do direito de livre escolha e participar da constituição do próprio destino.
Vê-se abordada aqui a temática do uso do livre-arbítrio e da responsabilidade
pessoal na busca do bem-estar. Notamos também que os quatro adós perten­
cem a distintas categorias - e, entre eles, apenas a paciência constitui uma vir­
tude passível de ser desenvolvida. Os demais expressam valores fundamentais
da sociedade iorubá: o homem forte é próspero, fértil c longevo.
O runm ilá busca conselho junto aos filhos, às esposas e aos irmãos,
e tam bém junto ao amigo. E com isso tocamos, agora, num dos valores
principais dos iorubás: a necessidade e a im portância do conselho. E há,
aqui, um conselho a respeito da própria busca de conselhos: é preciso dis­
cernim ento ao escolher o conselheiro, pois quem aconselha não deve ter, ao
aconselhar, nenhum interesse pessoal ou egoísta.
Os filhos de O runm ilá valorizam a longevidade, que lhes possibili­
tará usufruir a com panhia paterna por mais tem po e, além disso, garantirá
mais chances de conservar o pai na condição de ancestral, após a morte; as
esposas valorizam a fertilidade, que lhes proporcionará um núm ero maior
de filhos, expressão de seu axé e garantia de suporte familiar; os irm ãos va­
lorizam a prosperidade, que poderá tornar suas vidas mais fáceis. O amigo

284
r
- Exu - o aconselha, desinteressadam ente, a valorizar o exercício e o esfor­
ço na prática de um a virtude - a paciência - que term ina por beneficiar a
todos ao possibilitar grandes realizações. Sem esforço e em penho pessoal é
impossível prosperar e alcançar sucesso.
Igún viaja ao orun levando os adôs restantes para Eledunm are e
constata que Prosperidade, Fertilidade e Longevidade retornaram para as­
sociar-se à Paciência. Esta, de exercício possível a partir de um a tom ada de
decisão e de uma disciplina autoim posta, traz m uitos benefícios.
A narrativa é concluída com expressões de reconhecim ento e lou­
vor ao benfeitor, valores que apontam para a im portância do sentim ento
de gratidão, virtude de muitas expressões possíveis. Apenas sentir gratidão
não é suficiente: é preciso expressá-la e dela fazer alarde.
Vemos nesse odu a participação fundamental de Exu com o conse­
lheiro desinteressado e amigo sensato, fiel, leal e solidário. O principal con­
selho contido nesse odu diz respeito à paciência, a grande virtude dessa
divindade. O utras de suas virtudes tam bém se acham representadas: am i­
zade, lealdade, solidariedade, bom senso, discernimento. Podem -se identi­
ficar, ainda, outras funções desse orixá: ele aproxima e une pessoas, cura, fa­
vorece o encontro (entre O runm ilá e Igún), torna possível o aparentem ente
impossível (a cura de Igún) e age nas encruzilhadas, ajudando, inclusive, na
escolha de caminhos.

2. Odu Ògúndá-Méji
Narrador: Bàbáláwo Fábünmi Sówíinmí

A guerra em que lutam os e vencemos com vitalidade é cham ada


guerra da vida. A guerra em que lutam os e som os derrotados é cha­
mada guerra da morte.
Quem vence é líder.
O sábio tem o segredo do bom com portam ento, o ser nobre co­
roado como rei (líder) não desrespeita ninguém.
Para viver bem, o respeito pelos semelhantes é fundam ental.
Um líder não desrespeita ninguém.
Ao am anhecer o dia os pássaros despertam e cantam . Q uando
amanhece os pássaros voam.
Ao anoitecer os pássaros repousam nos ninhos e galhos.
Foi feito um jogo divinatório para Exu 110 dia em que ele resolveu
matar as outras 200 divindades. Foram esses os princípios de sabedoria
que se manifestaram no jogo que seus adivinhos realizaram para ele.

285
Ogum foi o prim eiro a desafiá-lo. Disse-lhe que seu intento era
impossível de realizar:
- Você mente, pois não consegue mc matar.
Oxalufon também desafiou Exu, dizendo-lhe que seu intento era
impossível cie realizar, já que Exu não teria força para destruí-lo, e disse:
- Você mente!
Ossaim cham ou Exu de prepotente e pretensioso. E lhe disse que
seu intento era impossível de realizar, já que Exu não teria força para
destruí-lo. Exu irritou-se com Ossaim e disse:
— —Sc-todos m c desafiam, redimirei você pela metade!
Ossaim foi consultar seus adivinhos por causa da ameaça de mor­
te. Foi aconselhado a fazer um ebó para afastar a m orte que o rode­
ava. E tam bém , por Exu ser m uito poderoso, foi aconselhado a não
lutar contra ele.
Ossaim respondeu a seus adivinhos:
- Sc for só por causa de Exu. não farei ebó!
Afirmou, ainda, que Exu tinha sabedoria, mas não tinha força
e que ele, Ossaim, era o senhor da magia, grande mago e poderoso
feiticeiro.
Exu solicitou a Ossaim que o encontrasse na encruzilhada. E lhe
disse:
- Uma pessoa que a humanidade tentou matar c não morreu, sou
eu, Exu. o forte, que dou fim às pessoas.
Ossaim disse que ele, sim, é que era o melhor. Exu insistiu que o
m elhor era ele próprio. Argum entaram assim por m uito tempo. H
depois com eçaram a lutar.
Exu foi o prim eiro a desafiar Ossaim e sua magia. Estavam debai­
xo de um a árvore iroko e Exu disse a Ossaim que, segurando o galho
dessa árvore com as mãos, poderia ordenar que ela caísse sobre ele.
Segurou o galho da árvore, ela desenterrou-se com raiz e tudo e tom­
bou. Mas não atingiu Ossaim porque ele tinha proteção.
Exu pegou então seu porrete e disse a Ossaim que se o tocasse
com o porrete ele pegaria fogo. Tocou Ossaim, mas só saiu fumaça, e
não fogo. Ossaim não pegou fogo c disse a Exu que essa era outra de
suas proteções. Exu, m uito irado, disse a Ossaim:
- A i onde você está posso fazer surgir um lago com muita água.
Bateu o porrete na terra e a água brotou cm abundância. .
Ossaim com eçou então a am edrontar-se, adm itindo que a força
de Exu era superior à sua, de verdade. C ontinuaram brigando. Os-

286
saim pediu a Exu que o perdoasse e o deixasse ir em bora em paz. Exu
disse que não o deixaria ir por ter sido desrespeitado.
Pegou seu porrete e o atirou na perna de Ossaim. Ela quebrou e
Ossaim caiu no chão. Exu disse:
- Se mato você agora, você não terá chance de conhecer toda a
minha força!
Exu atirou novam ente seu porrete, desta vez contra a cabeça de
Ossaim. Depois disso deixou-o seguir caminho. Ossaim perdeu a fala
para sempre, em decorrência da pancada que levara na cabeça. A
-------- partir desse dia nunca mais falou norm alm ente.----------------------------
Ossaim levantou e foi consultar seus adivinhos. E lhes pediu que
o livrassem dos sofrimentos. Pediu socorro a eles. Pediu que o curas­
sem. Foram eles que fizeram ebó a Ossaim no dia em que ele sofreu
dores.
Os adivinhos responderam:
- Você, Ossaim, foi lutar contra Exu Odara? Você não sabia que
Exu c o líder das 2 0 1 divindades? E que não existe sequer uma única
divindade que possa desafiá-lo? Em razão desse desafio feito a Exu.
nada podemos fazer por você. Você permanecerá assim para sem­
pre. sem voz c aleijado da perna. Olhe, Ossaim. somente quem faz
ebó recebe a proteção de Exu.

Algumas considerações sobre o odu Ò gúndá-M éji


Em situações existenciais carregadas de competições e confrontos é
prudente não entrar em disputa com ninguém , não expor a própria força
vital, m anter discrição a respeito das próprias potencialidades e controlar
reações que revelem as próprias possibilidades de vencer.
Nesse odu é abordada a tem ática da disputa c da rivalidade pela
liderança. D iscorrendo a respeito de vitórias e derrotas, riscos do en-
frentamento, arm adilhas nas disputas e rivalidades, ele lem bra que, ao
enfrentarm os um a situação de confronto e desafios, tanto podem os ven­
cer com o perder. Assim com o o confronto pode au m en tar a vitalidade,
a força e a tenacidade, ele tam bém pode d estru ir o com batente, parcial
ou totalm ente. P artindo dessas considerações, aconselha-se: em bora o
poder acom panhe a vitória é preciso d em o n strar respeito. Respeito do
vitorioso para com o derrotado, do líder para com os liderados e para
com todas as outras pessoas. Respeito, pois, do m aior para com o menor.
O odu reafirma a necessidade de reconhecim ento dos limites do pró­
prio poder e da eventual superioridade do adversário. Lembra que algumas

287
perdas são irreparáveis e recom enda que se procure o oráculo em busca de
conselhos e de reconhecim ento dos próprios limites e possibilidades. Afir­
ma tam bém que o m enor deve respeitar o maior.
Na seqüência narrativa cm que as divindades Ogum , Oxalufon
e Ossaim desafiam Exu e questionam seu poder ocorrem incidentes que
apontam para o que se considera contra-virtudes: prepotência, pretensão,
presunção, falta de hum ildade, desrespeito e desobediência à autoridade
do ancião e à sabedoria do oráculo. Dessa lista de contravirtudes se deduz
a de virtudes: bom senso, hum ildade, respeito, obediência à autoridade do
ancião e do sábio, responsabilidade e bom senso na avaliação das situações
e dos próprios limites. Valoriza-se tam bém a coragem de lutar m esm o que
não se alcance vitória, porque a disposição para enfrentar situações adver­
sas já é, em si, um a forma de vitória.
A recomendação de não enfrentar os mais fortes implica em reco­
nhecer os próprios limites. Assim sendo, é aceitável pedir clemência ao sen­
tir medo e reconhecer a superioridade do adversário. Nessa narrativa, Exu
não concede clemência ao ser desrespeitado para reafirm ar a im portância
do respeito à autoridade e à superioridade hierárquica.
O odu discorre sobre as necessidades de jovens e anciãos. Os jovens,
cuja vitalidade é transbordante, necessitam de m ovim ento e espaço para
manifestar sua alegria. Os idosos, por sua vez, dem andam repouso e tran­
qüilidade. Enfatiza a im portância das escolhas individuais e da participação
pessoal na constituição do próprio destino. Concluindo, apresentando um
jogo de valores e virtudes, nesse odu é enfatizada a im portância de buscar
conselhos, ouvi-los, com preender sua mensagem, muitas vezes cifrada, e,
finalmente, segui-los. Em outras palavras, é preciso possuir hum ildade para
perguntar, discernim ento para com preender a resposta e, finalmente, paci­
ência e perseverança para realizar o recom endado.

3. Odu Ògúndá-Mcji
Narrador: Bàbáláwo Liwòsi Igbórè

A án orc sagrada òro sempre íez o bem e por isso ficou sem folhas. A tre­
padeira sagrada àfòmç4 sempre fez o bem e por isso ficou sem folhas.
A ingratidão desestimula a prática do bem.
Foi feito um jogo divinatório para Q sç no dia em que ele ia

* Ò roé um tipo dc fruia comestível (manga selvagem). À fó m ç i uma planta parasita (visco).

288
adivinhar para o povo dc Kcesç. Ele foi aconselhado a fazer uma
oferenda para Exu, mas não acatou o conselho.
Kéesè é o lugar onde agbe, o pássaro sagrado, canta: Mata 20,
mata 20! Onde àlúkò, o pássaro sagrado, canta: Mata 30. mata 30!
Onde o crocodilo, dentro da água, canta: Mata 50, mata 50 ! Q uando
agbe canta Mata 20, mata 20!, vinte pessoas morrem na cidade de
Kéesç. Q uando àlúkò canta Mata 30. mata 30!, trinta pessoas m or­
rem na cidade de Kcesè. Q uando o crocodilo canta Mata 50. mala
50!, cinqüenta pessoas m orrem na cidade de Kéesç.
Foram então cham ar Òsó e lhe pediram que jogasse para saber
porque, quando esses anim ais cantavam, seus cantos resultavam em
morte. Queriam saber o que fazer para resolver esse problema.
Qsç prom eteu ajudar. Depois, resolveu esse problema: com sua
força destruiu o agbe que cantava Mata 20, mata 20!, cujo canto m a­
tava vinte pessoas; destruiu o àlúkò que cantava Mata 30, mata 30!,
cujo canto matava trinta pessoas; e destruiu também o crocodilo que
cantava Mata 50, mata 50!, cujo canto matava 50 pessoas. Ele des­
truiu essas três forças e, assim, tudo se acalmou na cidade de Kéesç e
ninguém mais m orreu dessa maneira.
Depois disso, Exu foi falar cCrm o povo de Kéesç e chamou sua
atenção para o seguinte:
- O mesmo poder usado por Qsç para destruir as forças que mata vam
as pessoas dessa cidade poderá ser utilizado para matar todos vocês.
Exu os aconselhou, então, a expulsarem Qsç da cidade.
Eles seguiram o seu conselho e Qsç foi expulso.
Fizeram Q.sç> sofrer muito. Ele seguiu para sua cidade natal, lamen­
tando o ocorrido. No caminho encontrou Exu, que lhe perguntou:
- Çsç, qual é o seu problema?
Qsç), sem saber que falava com Exu, respondeu que tinha ajudado
o povo de Kéesç a vencer seus inimigos e recebera ingratidão. Exu
o lembrou de que fora aconselhado por seus adivinhos a fazer uma
oferenda a Exu antes de partir para a cidade de Kéesè. F. então lhe
perguntou:
- Você fez a oferenda?
Òsó respondeu que não. Exu recomendou que a fizesse tão logo
chegasse a sua casa. Assim que chegou a sua casa, Òsó fez a oferenda
a Exu: um obi de três gomos e um galo. Enquanto fazia a oferenda ia
conversando com Exu, dizendo que na cidade de Kcesç haviam sido
ingratos com ele e pediu então a Exu que o defendesse.

289
Exu ouviu o pedido de Q sq e foi para a cidade de Kéesç pergun­
tar ao povo onde estava Qsç. O povo respondeu que fora expulso da
cidade. Exu, com olhar serio, cham ou esse povo de ingrato e disse o
seguinte:
- Qsç foi quem ajudou vocês a superar os problemas c vocês
tiveram a coragem de expulsá-lo?
Então, Exu lhes perguntou:
- E se vocês tiverem outro tipo de problema? A quem chamarão
para ajudá-los?
-------- As-pessoas d ^K éesè disseram a Exu:—
- Fomos orientadas por um homem baixinho e ele recomendou
que expulsássemos Qsç da cidade porque ele poderia nos matar, do
mesmo modo que destruiu as forças que nos matavam. Seguindo
essa orientação expulsamos Qsç da cidade.
Exu lhes disse que eles eram obrigados a sair à procura de Q sq
para pedir desculpas e reintegrá-lo à com unidade de Kéesç.
Foi nesse dia que o povo de Kéesç saiu à procura de Q sq. Ao
retornarem, já em sua com panhia, o presentearam . Qsç ficou muito
feliz e esse fato transform ou sua vida e fez dele um hom em próspero.
Começou então a cantar:
- A bondade mc foi favorável.
Praticarei sempre a bondade.
O povo dc Kcesç foi generoso com Qsç,
A bondade m c foi favorável.
Praticarei sempre a bondade.

Algumas considerações sobre o odu Ò gúndá-M éji


A narrativa apresenta uma situação existencial cm que a prática do
bem é desestimulada por ter havido ingratidão. Refere-se tam bém ao fato
de um benfeitor que não tenha sido reconhecido tornar-se insatisfeito e,
até mesmo, furioso. Aconselha os dadivosos a exercerem a generosidade,
cuidando para evitar problem as posteriores de ingratidão. Nesta dinâmica
as condições da força vital favorecem ou im pedem as realizações, e por isso
é recomendável utilizar recursos para preservar, aum entar e defender essa
força de m odo que a reação dos outros não venha a ser prejudicial. Quan­
to aos beneficiários da bondade alheia, estes devem exercer a gratidão e
expressar reconhecimento. Benfeitores e beneficiários são aconselhados a
cuidar sem pre de Exu e de si m esmos para terem seus esforços reconheci­
dos e recompensados.

290
A gratidão reflete o reconhecim ento de se haver sido beneficiado. A
ação de reconhecer o fato de se haver sido beneficiado valida o esforço do
benfeitor. Não se trata de estabelecer trocas, nem de retribuir na mesma
medida. Um mendigo, por exemplo, não podendo agradecer m aterialm en­
te, pode agradecer com palavras de benção.
O odu Ògúndá-M éji descreve um a situação em que a punição é des­
proporcional ao delito e a prática do bem se revela passível de tornar-se
desastrosa para o praticante, caso ocorra ingratidão. Aborda, pois, a tem á­
tica da prática do bem e de suas conseqüências: gratidão ou ingratidão do
beneficiário, riscos para o benfeitor, ampliação õu atrofia dessa práticãTde-
pendendo da reação das pessoas a ela. A decorrência disso em nível social é
que a gratidão estimula a prática do bem e a ingratidão a desestimula.
Mais facilmente m orre afogado o nadador do que aqueles que não
sabem nadar. É preciso aplicar adequadam ente a própria força, e Exu orien­
ta sobre isso. Os insensatos term inam vítimas de castigos desproporcionais
aos delitos cometidos, por incapacidade de avaliação dos poderes com os
quais se defrontam. Daí a recom endação implícita nesse odu que diz respei­
to à necessidade de cautela nas relações estabelecidas com os demais, com a
natureza c com as divindades. Ele alerta também para as possibilidades de
inversão das situações: o jogo pode virar e o salvador pode transform ar-se
numa ameaça potencial. Este poderá clamar por vingança caso não tenha
seu m érito reconhecido c não receba gratidão.
O odu convida a refletir sobre a gratidão e seu contraponto, a ingra­
tidão, enfatizando a im portância da preservação do amigo e de sua capa­
cidade potencial de ajuda, um a vez que sempre é possível a ocorrência de
novas situações de necessidade.
Fala a respeito da possibilidade de um gesto de ingratidão ser repara­
do. A reparação de erros é possível e um pedido de desculpas acom panha­
do do desejo de reaproximação pode ser bem-sucedido, e disso decorrerá
muita alegria. Temos aqui implícito o conselho de que se busque reparar
os gestos de ingratidão. Exalta a im portância da harm onia e da reconcilia­
ção: a superação dos desentendim entos e o reconhecim ento das próprias
responsabilidades nas relações conduzem à prosperidade. Exalta, ainda, a
bondade e a generosidade. O gesto de reconhecimento e gratidão expressa
a bondade de quem recebeu manifestações da bondade de outrem .
Nesta narrativa Exu m ostra-se ambivalente e ambíguo. Uma im por­
tante lição aqui contida diz respeito ao fato de ser imprescindível a reali­
zação do ebó sempre que recom endado. Não se deve entender o ebó como
um capricho da divindade, mas com o uma condição energética para a su-

291
peraçüo de dificuldades. A tem ática do conselho é mais um a vez abordada
aqui, lem brando que o conselho não acatado favorece a ação da morte e
acarreta perdas. Surgindo novas oportunidades de ouvir conselhos, estes
devem ser acolhidos com gratidão e acatados.
Q uanto aos confrontos, o odu afirma que a força vital do mais pode­
roso anula a dos adversários, o que prom ove “a m orte da m orte”, perm itin­
do que se recupere a paz e se afastem as ameaças.
Acha-se presente, tam bém , a noção dc que a prudência é necessária
tam bém nas situações de benefício, devendo ser praticada tanto pelo ben­
feitor com o pelo beneficiário.
Todas essas conquistas são favorecidas pelo ebó, processo energético
que ocorre sob a ação de Exu.

4. Odu Írçtç-Ogbè
Narrador: Bàbáláwo Fábúnmi Sówúnmí

Quando dói sabe-se que está doendo. Se não doer é porque não
está doendo.
Foi feito um jogo divinatório para O runm ilá
No dia cm que ele ia adivinhar para 01<?fin.
O runm ilá é o adivinho de Qlçfin. Adivinhou para ele quando
ele lamentava sua falta de sorte na vida. Na cidade de Ofin tudo era
m uito difícil: as mulheres não engravidavam e não havia paz nem
harm onia devido às dificuldades e necessidades. Todos os habitan­
tes dessa cidade não conseguiam procriar. Não chovia nem serenava.
Nas hortas não havia comida.
Orunm ilá então, com seu Ifá, adivinhou para eles e recomendou
um ebó para solucionar os problemas enfrentados pelos habitantes
de Ofin.
Quem desejava procriar. procriou. Os doentes ficaram saudáveis.
Os que procuravam sorte na vida a encontraram e progrediram.
Orunm ilá, que adivinhou e fez ebó para eles, era m uito pobre.
Não tinha filhos, nem casa, nem esposa. Exu, o famoso, era seu ami­
go íntim o e lhe perguntou:
- O Qlçfin para quem você adivinhou c fe z ebó e que, graças
ao seu trabalho, viu sua cidade tornar-se harmoniosa, o que fez
ele de bom para você?
O runm ilá lhe respondeu que nada recebera em reconhecimento
pelo realizado.

292
Exu o aconselhou a ir chorar no palácio de Qlç>fin. O runm ilá res­
pondeu:
- Como posso chorar no palácio dc Çlçfín, cu. que adivinhei c fiz
o ebó que tornou sua cidade harmoniosa?
Exu disse a O runm ilá que para tornar-se um a pessoa próspera
era exatamente isso o que ele deveria fazer. O bedecendo a essa orien­
tação, O runm ilá dirigiu-se ao palácio de Qlpíln. Lá chegando, com e­
çou a chorar conform e o orientado e dizia:
- Falta a mim e isso m e entristece. Falta-me dinheiro e isso me
entristece muito. Èrinmàjò.
Exu cham ou Qlç>fin para que fosse ver seu adivinho e disse:
- Um dos olhos de Orunmilá está lacrimejando sangue c se esse
sangue cair no chão dc uma cidade ela desaparecerá. O outro olho
dc Orunmilá está lacrimejando água c se essa água cair no chão dc
uma cidade seu rei morrerá.
OIÓfin, m uito preocupado, perguntou a Exu:
- O que posso fazer para evitar que o sangue e a água dos olhos
dc Orunmilá caiam no chão?
Exu orientou Qlófin para que providenciasse oito milhões dc bú­
zios (dinheiro) e os entregasse a Orunm ilá.
Os búzios foram levados a O runm ilá durante m uitos dias. Foram
deixados no tem po porque ele não tinha casa. Exu então chamou
O runm ilá novam ente e lhe disse:
- Essa grande quantia dc búzios que lhe foi entregue poderá ser
roubada de você por ladrões e você continuará pobre. Isto porque
você não tem casa para guardá-los.
Exu o orientou a voltar novamente ao palácio dc Olçfin e chorar
de novo. Orunm ilá, seguindo sua orientação, foi. Chegando lá, co­
meçou novam ente a chorar, dizendo o seguinte:
- Falta a mim c isso m e entristece. Falta-me uma casa e isso me
entristece muito. Èrinmàjò.
OIÓfin ordenou a seus conselheiros que construíssem um a casa
para Orunmilá. Nessa casa havia dezesseis quartos e, depois de três
dias, Orunm ilá já estava m orando ali. Exu foi falar novamente com ele.
Inconformado com o fato de Orunmilá m orar sozinho, disse a ele:
- Por que você mora sozinho numa casa desse tamanho? Você ê
solteiro, não tem esposa. Está feliz por quê? Volte a falar novamente
com Çlçfín, que muito o ajudou e que ainda lhe deve favores, para
que e/e arrume esposa para você.

293
Orunmilá foi ao palácio dc Qlófin c começou a chorar, dizendo:
- Falta a mim , e isso m e entristece. Falta-me uma esposa e isso
m e entristece muito. Èrinmàjò.
Qlófin levantou-se preocupado. Começou a tocar agogô por toda
a cidade, dizendo:
- Dei a Orunmilá dinheiro e casa. Agora chora porque quer uma
esposa.
Q lçfin deu oito m oças solteiras e jovens a O ru n m ilá para que
ele as levasse com o esposas. E tam bém lhe deu oito m ulheres vi-
tivas cujos m arid o s haviam m o rrid o n a guerra. Assim, O ru n n ip
lá ganhou dezesseis esposas e colocou cada um a nu m quarto da
casa.
D urante m uito tem po O runm ilá se relacionou sexualmente coni
elas, mas nenhum a engravidou. O runm ilá, m uito preocupado, vol­
tou a procurar Exu.
- Há muito tempo tenho relação sexual com minhas esposas e
nenhuma engravidou.
Exu novam ente o orientou a falar com Qlófin. Recomendou que
chorasse novam ente no palácio. O runm ilá lhe disse que tinha vergo­
nha, pois tendo chorado recebera muito dinheiro, um a casa grande e
16 esposas. Está certo que fora ele quem ajudara o povo daquela ci­
dade a conquistar a harm onia. Mas sentia-se envergonhado de pedir
tanto. Exu lhe respondeu:
- Depois de chorar no palácio de Olçfin ele lhe ensinará o que
fazer para que suas mulheres engravidem.
O runm ilá foi para o palácio de Qlófin dizendo o seguinte:
- Falta a mim, e isso m e entristece. Faltam-me fílhos e isso me
entristece muito. Èrinmàjò.
Qlófin levantou-se e com eçou a tocar agogô por toda a cidade
pedindo ajuda aos cidadãos que lá habitavam. Dizia-lhes que Orun­
milá estava querendo acabar com ele, pois já recebera dinheiro, casa
c esposas e agora queria filhos.
Qlófin aconselhou-o a venerar Ifá.
O runm ilá foi em bora para casa e Exu foi se encontrar com ele.
Aconselhou-o a acatar o conselho de Qlófin: para que suas mulheres
pudessem engravidar era preciso venerar Ifá. O runm ilá obedeceu às
instruções de Olçfin: ofereceu uma cabra a seu Ifá. Depois, cozinhou-
a com determ inadas folhas, conform e fora orientado pela divindade,
e deu às suas m ulheres para que comessem. Todas engravidaram e

29-1
procriaram. Assim, O runm ilá tornou-sc pai de m uitos filhos. Teve
tudo o que desejava.
Com m uita alegria dançava. E louvava Exu.

Algumas considerações sobre o odu Iretè-O gbè


A narrativa traz um a situação existencial caracterizada pelo abuso da
exigência de expressões dc gratidão. Descreve um a dinâm ica em que uma
pessoa incapaz de usar sua sabedoria em benefício próprio favorece outros,
mas não supre a si mesma, sendo levada a buscar suprim ento para as pró­
prias necessidades através de múltiplas e sucessivas cobranças de reconhe­
cimento por parte daqueles a quem beneficia. Descreve, pois, um a pessoa
que, não sabendo servir-se da própria sabedoria, coloca-se na situação de
dependência de outros. Todas as orientações advindas devem sem pre ser
ouvidas e apreciadas com discernim ento.
Nesse odu O runm ilá consulta o oráculo de Ifá para superar sua p o ­
breza e solidão e Olófin, rei da cidade de Ofin, consulta O runm ilá porque
em seu reino há esterilidade total, fome, ausência de paz e de harm onia.
Buscando o bem -estar para seu povo, Qlpfin atende às recom endações de
Orunmilá e vê todos seus problem as resolvidos.
Entretanto, em sua intim idade, Orunm ilá sabe que ele próprio neces­
sita também de fertilidade, prosperidade, sorte, progresso e amor, ou seja, as
mesmas graças recebidas por Qlófin. Seu amigo Exu o aconselha a dirigir-se
a QlQfin e expressar suas necessidades para que sejam reconhecidas. Apesar
de envergonhado por expor-se a uma condição que considera hum ilhante,
Orunmilá segue o conselho de Exu e faz com que o beneficiário reconheça
os benefícios recebidos e dem onstre gratidão através de bens materiais e dc
outros bens, de ordem não-material, como esposas e fertilidade.
Diante de problemas com o esterilidade, fome, ausência de paz e har­
monia é preciso buscar solução e não perm anecer passivo em m eio às di­
ficuldades e carências. Nesse enfrentam ento das dificuldades o am igo que
acorre para ajudar a resolver graves problemas tam bém pode estar neces­
sitando de ajuda, às vezes da mesma natureza, e, em bora possa colaborar
na solução de problemas alheios, m uitas vezes é incapaz de resolver os seus
próprios. É aconselhável, então, expressar as próprias necessidades para
que sejam (re)conhecidas. Em bora a exposição de si m esm o a condições
humilhantes envergonhe, convém seguir o conselho. Nesta narrativa, Exu,
grande amigo de Ifá, reconhece - ainda m elhor que o interessado - as suas
carências, e o aconselha a expressar suas necessidades para aquele que, um a
vez beneficiado, deverá retribuir ajudando-o. Ainda que seja preciso, sem ­

295
pre envergonhado, recorrer m últiplas e sucessivas vezes à ajuda do benefi­
ciário, convém fazê-lo.
O reconhecimento, a gratidão e a exaltação do benfeitor devem se­
guir-se aos benefícios recebidos. O odu retom a a temática do reconheci­
m ento e da gratidão que, além de experim entada com o sentim ento, deve
ser expressa, e traz implícita a ideia de que a ingratidão gera decorrências
indesejáveis, ü reconhecim ento pelo bem recebido pode expressar-se de
diferentes formas: dinheiro, casa para morar, esposas e fertilidade, de modo
a favorecer a felicidade e o bem-estar. Enfatiza a im portância de acatar con­
selhos e de proceder dc acordo com a orientação recebida.
Exu, cuja amizade, lealdade e benevolência para com Orunm ilá são
ilimitadas, manifesta nesta narrativa a sua generosidade.

5. Odi) O túrúpòn-M éji


Narrador: Bàbáláwo Fásolá Adéyanjú

Folhas de igbá são semelhantes ao igbá.


Folhas de çmèn são as que se assemelham ao çwçn.
Folhas de /p /p são as que se assemelham ao gbçrç.
Quando a fruta rorçJigbodç nasce fica observando as obras divi­
nas de Eledunmare.
São estes os seres míticos que adivinharam para Exu 110 dia em
que ele afirm ou ser o líder dos orixás:
Ogum, rei da cidade de Aró,
Xangô, rei de Kòso,
Oyá, rainha de Irá,
Oxalá, rei de Irànjé,
Ogiriyan, rei de Òkiti Èfyn,
Orunm ilá, rei de Ifç.
Orunmilá desafiou Exu dizendo a ele que era mentira, que ele não
poderia ser o líder dos orixás. Perguntaram a Exu onde deixaria os orixás
que eram reis e como poderia proclamar a si mesmo o rei dos reis.
Reuniram-se todos e resolveram levar o caso a Eledunmare. Lá
chegando, Eledunm are confirmou que Exu é e sem pre será o líder de
todos os orixás.
Os orixás disseram que não o aceitariam com o líder e que luta­
riam, um a um , contra Exu, na encruzilhada que liga o orun ao aiye
para decidir a liderança através dessas lutas. Com binaram o dia do
início das contendas.

296
O prim eiro orixá a enfrentar Exu foi Ogum . Exu, com sua sabe­
doria e força, atirou Ogum ao chão. Envergonhado e irritado, Ogum
retirou-se para Aró e m ergulhou na terra. Antes de entrar na terra
disse a seus amigos que quem desejasse cultuá-lo deveria juntar m ui­
to ferro c inàríwo'.
O segundo a lutar contra Exu foi Xangô. Exu, com sua sabedoria
e força, atirou Xangó ao chão. Envergonhado e aborrecido, Xangô
retirou-se para Kòso e ali m ergulhou na terra. Antes de entrar na
terra disse a seus amigos que quem desejasse cultuá-lo deveria juntar
muitos çdun-ârâs.
O terceiro a lutar contra Exu foi Oxalá. Exu, com sua sabedoria
e força, pegou Oxalá e atirou-o ao chão. Envergonhado e irritado,
Oxalá seguiu para Irànjé e ali m ergulhou na terra. Antes de entrar
na terra disse a seus amigos que quem desejasse cultuá-lo deveria
providenciar çta, çpa òsoro c água àrííçlnin.
O quarto orixá a enfrentar Exu foi Oyá. Exu, com sua sabedoria
e força, pegou Oyá e atirou-a ao chão. Envergonhada e irritada, Oyá
seguiu para Irá e ali m ergulhou na terra. Antes de enterrar-se disse a
seus amigos que quem desejasse cultuá-la deveria providenciar çta c
chifre de búfalo.
O últim o orixá a enfrentar Exu foi Ogiriyan. Exu, com sua sabe­
doria e força, pegou Ogiriyan e atirou-o ao chão. Envergonhado e
irritado, Ogiriyan foi para Ókiti Èfòn e ali m ergulhou na terra. Antes
de se enterrar disse a seus amigos que quem desejasse cultuá-lo de­
veria providenciar çta.
Exu levantou-se e foi ao encontro de Eledunmare. Disse-lhe que
havia lutado com outros orixás para disputar a liderança e que vencera
a todos. Pediu então a Eledunmare que lhe entregasse o axé para que
fosse reconhecido como líder dos orixás. Eledunmare, atendendo a seu
pedido, entregou-lhe esse axé para que fosse respeitado por todos eles.
Disse, ainda, que o orixá que o desrespeitasse perderia o próprio axé.
Assim, Exu tornou-se líder de todos os orixás.

Algumas considerações sobre o odu Ò túrúpòn-M éji


Nesta situação existencial caracterizada por disputa e com petição é
aconselhável ter consciência do próprio poder para, no m om ento propício,

’ Xíòrínv: palmeira c palmas dc dendezeiro.


Edun-árx meteorito, pedra de raio; símbolo de Xangô.

297
dem onstrá-lo. O poder, que em muitas circunstâncias deve ser disfarçado
ou perm anecer oculto, em algumas situações deve ser exibido.
Esse odu aborda a temática da luta pela liderança, m ostrando que a
recusa de reconhecer a superioridade do adversário conduz à derrota e à
vergonha. Entretanto, com o o poder som ente é reconhecido após o con­
fronto, este se torna imprescindível.
Traz informações sobre as relações estabelecidas entre Exu, que se
afirma o líder dos orixás, e outras divindades - Ogurn, Xangô, Oyá, Oxalá,
Ògíriyán e O runm ilá. Apesar de ter sua liderança questionada, Exu termi­
na p o r vé-laTeconhccidn c confirm ada p o r Etedunmarc, de quem recebe o
axé. Depreende-se disso, tam bém , que qualquer orixá que desrespeite Exu
poderá perder o próprio axé. Retornando cada orixá à terra que rege, enter­
ra-se no chão c dá instruções de culto e de preparo do assentam ento. Disso
se extrai o conhecim ento sobre características e elementos de culto a cada
um deles.
Lembremos que o prim eiro orixá criado por Eledunm are foi Exu,
cham ado de Iràwç-Akçdá , O Primórdio, Primeira estrela a ser criada,
Primeiro a ser criado. O filho maior. Aquele que vinga mais ou que será
maior que os outros, Modelo para os demais. Lembremos tam bém que
Eledunm are atribuiu a Exu duas incumbências: favorecer o fluxo da força
dinâm ica dos demais orixás e inspecionar os rituais. Sem o seu axé torna-
se impossível o fluxo de axé de qualquer outro orixá. Ou seja, Exu detém o
poder de tornar possível, a cada orixá, a manifestação de seu axé específico.
Para m elhor com preender as relações entre Exu e os dem ais orixás
lem bremos que na sociedade iorubá a hierarquia é fundam ental, com petin­
do ao mais velho 7 conduzir os outros. O culto aos orixás, tam bém baseado
num sistema hierárquico bem definido, onde cada peça ocupa o seu lugar,
determ ina que Exu seja cultuado em prim eiro lugar.
C riado para ser o aláse, guardião, mensageiro, portador e transm is­
sor do axé dos orixás e dos ancestrais, Exu é responsável por sua perpetua­
ção. Por esse motivo, em todo ritual é necessário evocá-lo antes de qualquer
outra divindade, para que transm ita o axé da oferenda ao orixá que está
sendo cultuado.
O odu Otúrúppn-M éji fala a respeito de lutas travadas por Exu com
outras divindades, com a finalidade de conquistar e m anter a liderança.
Tendo vencido todas as contendas, ele tornou seu nom e ainda mais temido.

Cabe lem brar que “mais velho" não é apenas o que nasceu antes, pois são considerados “mais velhos”
também aqueles que sejam mais experientes ou tenham acumulado mais sabedoria.
£ interessante observar que Exu não se nega a transm itir o axé de orixáí
vencidos por ocasião de disputas, nem dc outros orixás contra os quais
tenha aparentes rivalidades. Observa-se tam bém , em m uitas narrativas, a
participação fundam ental de Exu nas conquistas de outros orixás.
Temos nesse odu, assim, além dos ensinam entos sobre práticas de
culto aos orixás, a reafirmação da im portância do conselho. As virtudes
mais im portantes aqui apresentadas são a prudência e a hum ildade para
reconhecer as próprias limitações. Acham-se presentes tam bém a coragem
e a tenacidade.
A posição de liderança de Exu no panteão" das divindades iorubás
fica bem representada nesse odu.

6. Odu Iwòrí-O túrúpòn


Narrador: Bàbáláwo Lawál Rúfiíi

Èkili bàbàda.
Foi feito um jogo divinatório para O runm ilá 110 dia em que ele
estava juntando dinheiro para com prar escravos sem contar nada a
Exu.
Orunm ilá com prou um a escrava para ser servido por ela. Depois
de três dias a escrava, que morava com ele, m orreu.
O runm ilá e sua família começaram a chorar de tristeza. Ficaram
todos profundam ente tristes, sem saber o que fazer.
Chegando à casa de O runm ilá, Exu encontrou a esposa e todos os
filhos dele m uito tristes, chorando. Perguntou a O runm ilá: Qual c o
motivo dc tanta choradeira? E soube da m orte da escrava.
Exu perguntou: A quem você pediu conselho antes de comprar
essa escrava? E pediu a O runm ilá que lhe arrum asse roupa branca e
um a cabra para poder resolver esse problema. O runm ilá providen­
ciou im ediatam ente o que estava sendo pedido.
Exu levou a escrava m orta e os itens materiais para sua casa. La-
vou-a m uito bem com folhas, vestiu-a com um a roupa m uito bonita
e colocou um turbante cm sua cabeça para que ficasse ainda mais
bonita. Depois, levou-a para a encruzilhada que ficava no cam inho
obrigatório da feira e colocou-a sentada ali. Em sua boca pós um
orin (palito de escovar dente), à sua frente m ontou um a cesta cheia
de fumo, como se ela estivesse ali para vender.
Nesse dia todos iam para a feira. As pessoas a cam inho da fei­
ra passavam diante da escrava m orta, cum prim entavam -na e per­

299
guntavam o preço do fumo. Ela não respondia e todos saíam dali
correndo.
Mais tarde, nesse mesmo dia, Ajé8 passou a cam inho da feira,
acom panhada de seus 200 escravos, que carregavam mercadorias
para vender.
Ajé e seus escravos pararam junto à escrava m orta com a intenção
de com prar fumo. Ajé aproxim ou-se da vendedora, cumprimentou-
a seguidamente, sem obter resposta. Perguntou o preço do fumo e
ficou sem resposta. Muito irritada, tom ou da m ão dc um de seus
escravos um a vara e com ela bateu na vendedora m orta. Assim que
recebeu o golpe a m orta tom bou ao chão.
Então Exu saiu do mato onde estava escondido e gritou:
- Heeepa! A jé! Você matou a cscrava dc Orunmilá!
Ajé pediu desculpas, mas Exu não aceitou. Ela ofereceu seus es­
cravos para reparar o prejuízo provocado p o rs e ii gesto. Foi ofere­
cendo, escravo após escravo, até chegar a 200. Exu recusou sua oferta
e disse-lhe o seguinte:
- Accito somente se você se reunir aos seus escravos. Juntos for­
marão 201 e eu os levarei a Orunmilá. Somente nessas condições
poderei aceitar seu pedido de perdão.
Assim, Ajé e os 200 escravos form aram um a fila e foram todos
para a casa de Orunm ilá, seguindo Exu. Lá chegando, Exu chamou
O runm ilá e lhe disse que havia encontrado a pessoa que matara sua
escrava no cam inho para a feira. Acrescentou que lhe trouxera essa
pessoa e seus escravos e sugeriu que os deixasse ali. Desde esse dia
Ajé tornou-se escrava de O runm ilá. Ele ficou feliz e sua casa ficou
carregada de sorte.

Algumas considerações sobre o odu Iw ò ri-Ò tú rú p ò n


Esta situação existencial é caracterizada por perdas materiais e au­
sência de prosperidade. M ostra ser recomendável ouvir conselhos e desen­
volver habilidades para negociar.
A m orte precoce de um a escrava ad q u irid a provoca tristeza e cho­
ro pela perda m aterial. O conselho recebido é o de fazer ebó para recu­
p erar o perdido.
Na tram a aqui arm ada encontram os a caracterização da trapaça, o

• Esseodu fa!ade/ty<^pronunda-se>iyéJ,orixüda riqueza e prosperidade. N3o confundir com pronuncia-


se Ajé), mulher doiada de poderes especiais que os utiliza para praticar tanto o bem quanto o mal.

300
preparo de situações de engodo e dc armadilhas para incautos. A mensagem
implícita é a de que desconfiança, descrédito e incredulidade são favoráveis
eni determinadas circunstâncias e podem constituir-se em expressões de
prudência.
A temática da confiança e da credibilidade versus a má-fé é abor­
dada nesse odu. Muitos sentim entos vêm à baila: m edo da estranheza de
certas situações, irritação, impulsos agressivos, am or-próprio ferido, res­
sentimentos e indignação, além da alegria decorrente do enriquecim ento
material. Constata-se ao longo da narrativa que um a arm adilha eficiente
pode inverter a situação, dando ao derrotado o lugar de vencedor.
Ajê, orixá da prosperidade e da riqueza, por tornar-se servidora de
quem a cultua, está recebendo nesse odu a designação de “escrava”. Exalta-
se o poder de negociação. As punições m ostram -se desproporcionais aos
delitos e a prática de ouvir conselhos é mais um a vez recom endada.
A aceitação e mesmo a recomendação do uso de contravirtudes, tais
como a trapaça, que envolve a m entira e o disfarce, sugerem um a dinâm i­
ca bastante interessante. No processo das relações interpessoais ocorrem
situações aparentem ente boas que, entretanto, guardam cm si um perigo
potencial de traição e deslealdade. Por isso a desconfiança e a incredulida­
de (ausência de boa-fé) m ostram -se favoráveis c constituem expressões de
prudência. Assim, o que seria um a virtude se analisada em estado absoluto,
fora do contexto das relações, como, por exemplo, a boa-fé ou a lealdade,
torna-se um a contravirtude ao servir de instrum ento de prejuízo ou perda.
0 inverso disso tam bém sc m ostra verdadeiro: a desconfiança é útil e é p ru ­
dente “confiar desconfiando”.
Ajê perde seus privilégios ao perder a paciência e dem onstrar indig­
nação, irritação e agressividade. Daí se deduz a im portância de conservar-
se paciente, sereno e tolerante em circunstâncias adversas ou em situações
sobre as quais não se tenha dom ínio total.
As possibilidades de desenvolvimento material e econôm ico acham-
se expressas m etaforicam ente na figura de Ajê, cujo sentido sagrado convém
explicitar para tornar inteligível tanto a descrição da configuração existen­
cial como a do conselho oferecido. Ajê é a iabá da riqueza e da prosperida­
de. Nesse sentido, todos a querem como servidora: por isso a denom inação
“escrava”, que sugere o desejo de dom inar a riqueza. Seus devotos também
se consideram escravos, estabelecendo com ela um a relação de m útua ser­
vidão. Ser escravo de Ajê implica em ter m uito trabalho para, através dele,
prosperar. Vê-se que o trabalho é pressuposto com o condição de progresso
nessa relação dc serviços m útuos que se estabelece entre Ajê e seus devotos.

301
Tê-la com o escrava significa, tam bém , ter o próprio trabalho reconhecido
e recom pensado.
A saudação Ajê, que eu tenha você para sempre! expressa a impor-
V tância atribuída a seu poder como garantia de progresso. A relação entre os
hom ens e Ajê não supõe um compromisso com a Religião Tradicional Ioru-
bá, isto é, todos os iorubás, seja qual for a sua devoção religiosa, ainda que
sejam cristãos ou muçulmanos, recorrem a ela. Isto se evidencia em diversas
circunstâncias sociais. Nos encontros casuais entre pessoas, particularmente
nos espaços de trocas comerciais, com o as feiras, por exemplo, utiliza-se a ex­
pressão Ajê! como forma de saudação, expressando o desejo de que as tran­
sações sejam bem-sucedidas. O próprio potencial de força vital depende da
posse de Ajê, força desejada por todos os seres hum anos por garantir o axé de
realização material. Ajê. que eu tcnlia você para conseguir tudo o que preciso
em minha vida! Esse orixá é representado por conchas do mar, inclusive os
búzios, usados como moeda no passado. A palavra owó, designativo original
dos búzios brancos, atualmente designa o dinheiro.

7. Odú Èji-Ogbò
Narrador: Bàbáláwo Fábúnmi Sówünmi

Qwçnrçmvçnrçn lori eku


Qwçnrçmvçnrçn ni ijç ori eku
Qwçnrçmvçnrçn ni ijç ori eja
Qwçnrçmvçnrçn ni ijç òmi lobo igbin
Foi ele quem adivinhou para Ajê, filha de Olokün.
Foi o mesmo que adivinhou para Okiin, filho de O níràdà.
Foi ele quem adivinhou para Ide, filho de O níkanpa.
Foi ele que adivinhou tam bém para Ecsu Y àlàyàlà, filho de
O níràpà, no dia em que eles vinham do orun para o aiye.
Todos eles foram aconselhados a fazer um ebó com (já' para evi­
tar a morte.
Dos quatro, som ente três fizeram o ebó com (já:
Ajê fez ebó com seu (já.
Okím fez ebó com seu (já.
Idç tam bém fez ebó com seu (já.
Todos fizeram ebó com os òjá e cabritos. M enos Hésu Yàlàyàlà,
que se recusou a fazer ebó com seu (já.

v Faixa de am arrar a roupa na cintura.

302
Ajê tin ha 60 escravos que trabalhavam para ela. O kün tam bén
tinha 60 escravos que trabalhavam para ele. ldç tam bém tinha 6(
escravos que trabalhavam para ele. Èésu Yàlàyàlà tam bém tinhc
60 escravos que trabalhavam para ele.
Mçrèrè, o grande adivinho de Eybàá, foi quem adivinhou pari
Orunm ilá quando ele lamentava a falta de quatro sortes na vida.
Ele foi aconselhado a fazer um a oferenda a Exu: preá, cabrito t
160 búzios. Tinha que am arrar os búzios no pescoço do preá.
O runm ilá não seguiu a orientação.
Q uando as quatro Sortes chcgãrãm ao aiye - Èésu Yàlàyàlà, Okún.
Ajê e Ide - procuraram pela casa de O runm ilá. Q uando as quatro
Sortes e os 60 escravos dc cada um a chegaram ao aiye não sabiam o
caminho para a casa de Orunm ilá.
Encontraram um velho na encruzilhada que une o m undo visí­
vel ao invisível. Era Exu, que lhes perguntou para onde iam e ficou
sabendo que eles estavam indo para a casa de O runm ilá. Exu viu os
escravos com as Sortes que os traziam e lhes perguntou:
- Para onde vocês c Iodas essas Sortes estão indo?
Os escravos responderam a Exu que estavam indo com todas essas
Sortes para a casa de Orunm ilá. Exu lhes disse que estava, exatamente
naquele instante, vindo da casa dc O runm ilá c que ele havia morrido.
Os escravos, que carregavam as coisas para suas donas, colocaram
toda a bagagem no chão. Tanto as Sortes quanto os escravos não sabiam
o que fazer. Ficaram sentados, pois não podiam prosseguir viagem, nem
voltar para trás. Tinham viajado 120 dias para chegar à encruzilhada que
liga o m undo visível ao invisível. Quanto a Exu, fora embora.
Èésu Yàlàyàlà disse aos com panheiros que os avisara de que não
deveriam fazer ebó com seus çjá.
- Agora não dá mais para voltar ao mundo invisível de onde parti­
mos e Orunmilá. que viemos encontr ar no mundo visível, já morreu.
M uito deprim ido, inconform ado, Èésu Yàlàyàlà, que não fizera
ebó com seu òjá, enforcou-se com ele. Assim m orreu.
Sobraram os três que haviam feito ebó com seus çjá. Ficaram
todos sentados ju n to a suas bagagens, pensando num a solução
para o problem a, já que não possuíam , com o o am igo, um çjá para
enforcar-se.
Exu transform ou-se em jovem e foi pedir a O runm ilá que lhe
desse preá, cabrito e 160 búzios, para que as Sortes que estavam a
cam inho de sua casa pudessem chegar.

303
O runm ilá disse que não lhe daria nada porque Exu sempre co­
mera com ele.
A esposa de O runm ilá, conhecendo bem a personalidade de Exu,
irritou-se. Estavam comendo. Ela parou de com er c disse ao marido
que ficaria infeliz se ele não desse a Exu os 160 búzios, o preá e o ca­
brito solicitados. Irritado, O runm ilá providenciou o que Exu pedira,
mais um galo, e jogou tudo nele.
Exu caiu e logo se levantou. E com eçou a cantar. Recebera 160
búzios c dançava alegremente ao som do tam bor bàtá:
- Farei uma Folha verde secar. Se eu não comer, não deixarei que
outro coma.
Exu se transform ou então num a criança e foi encontrar-se com
as Sortes e seus escravos, a quem mentira anteriormente, ao dizer que
Orunmilá tinha morrido. Li chegando, encontrou todos sentados e lhes
perguntou o que faziam. Responderam que estavam ali já há três dias
e que um hom em velho lhes dissera que Orunm ilá, a quem queriam
encontrar, havia morrido. Exu xingou o velho que dissera isso (sendo
ele mesmo este velho). Disse-lhes que estava vindo da casa de Orunmilá
e que acabara de ganhar de suas próprias mãos o colar que ostentava.
Pediu a todos que o seguissem e os levou à casa de Orunmilá.
Ao chegarem lá, Ajê foi a prim eira a entrar. Logo cm seguida en­
trou Okún e depois, Idç. A quarta Sorte que teria entrado seria Èésu
Yàlàvàlà que, entretanto, se suicidara. Exu pediu a todos que entras­
sem na casa de O runm ilá com tudo o que traziam .
Foram necessários vários dias para carregar e ajeitar ali tudo o
que haviam trazido. A casa de O runm ilá ficou repleta de coisas boas.
Exu lem brou a O runm ilá que o avisara de que a grande Sorte estava
a cam inho. O runm ilá alegrou-se e dançou de felicidade. Ao abrir a
boca, Eledunm are aí colocou a seguinte cantiga:
- A jê entrou na minha casa.
Okún veio atrás.
Usar uma coroa de ide não ê difícil.
•v7 Oh! A jê entrou!
Oh! Okún está a caminho!
Usar uma coroa dc idç não ó difícil.

Algum as considerações sobre o odu Èji-Ogbè


Nessa situação existencial, caracterizada por riscos de m orte e de­
sorientação pessoal, aconselha-se a ouvir a orientação e a realizar os ebós

301
recomendados. O odu prevê que a sorte do consulente virá de longe com
Ajê e, para poder chegar, é preciso que a pessoa realize um ebó para Exu e
ouça conselhos femininos (orientações dadas por mulheres).
Orunm ilá, após consultar o oráculo buscando orientação de proce­
dimentos para obter as quatro sortes que lhe faltam, não segue o conselho
(realizar oferta a Exu). Desse m odo, quando as Sortes e seus 240 escravos
chegam para encontrá-lo estabelece-se uma tram a interessante na qual a
mçntira ocupará posto im portante a serviço de um a causa justa: im pedir
o progresso a quem não acatou o conselho. Pode-se com preender tam bém
que o fato de não ter sido realizado o ebó impossibilita o fluxo do axé.
Do outro lado dessa situação estão as quatro Sortes e seus 240 escra­
vos que, tendo vindo ao encontro de Orunm ilá, e não o encontrando, ficam
totalmente desorientadas, sem poder retornar nem prosseguir. Estas perso­
nagens, que podem estar sim bolizando as quatro cabaças de Igbá-Odü e os
240 odus menores, estabelecem diálogo com Exu (velho).
O conselho principal nesse odu é o de que se faça um ebó para evitar
a morte. Três dos aconselhados o acatam (as sortes Ajê, Okiin e Ide), porém
um deles (a sorte Èésu Yàlàyàlà), não. O ebó inclui entre os itens para sua
realização o çjá, faixa usada para am arrar a roupa na cintura. Èésu Yàlàyàlà,
por não ter feito ebó com seu çjá, poderá dispor dele para o suicídio (a
recusa a fazer ebó determ inou que não estivesse protegido da m orte) no
momento do desespero, enquanto as três outras Sortes, por terem utilizado
seus çjá nos ebós, ficaram protegidas contra a m orte, já que não dispunham
mais dele para se matar.
Exu jovem vai à casa de O runm ilá pedir-lhe com ida para que as Sor­
tes possam chegar, estabelecendo-se aqui o jogo entre dar e receber. Esse
movimento de idas e vindas de Exu ilustra bem o seu papel de mensageiro,
a sua tarefa de estabelecer conexões entre os seres, articulando m ovimentos
que tornam possível o encontro para a satisfação m útua de necessidades e
desejos e para a realização de aspirações.
Quando Exu pede comida a Orunmilá este se recusa a atender esse pedi­
do. Não quer dar comida a Exu por entender que ele não necessita, mas é acon­
selhado pela esposa a atender ao pedido do amigo, ameaçando esta ficar infeliz
se o conselho não for seguido. Embora sob protesto, Orunmilá entrega o que lhe
é pedido. Mesmo contra a própria vontade, é favorável entregar o que é preciso.
Ao encontrar-se novamente com as Sortes e seus escravos, Exu arma-lhes
ardis. Estabelecem-se relações entre Exu criança e Exu velho e, posteriormente,
as três Sortes e os 240 escravos chegarão à presença de Orunm ilá, trazidos por
Exu, carregados de muita sorte. A alegria e felicidade expressam-se através de

305
danças. Orunmilá abre a boca, mas é Eledunmare quem coloca nela a cantiga,
ou seja, Orunmilá age como porta-voz da alegria de Eledunmare.

8. Odú Èji-Ogbè
Fonte: William 13ascom

Ponrinpon Sigidi é o adivinho da floresta.


Qgògçrò é o adivinho de ijám ç.
Q uando a afinidade com um amigo é grande, ele é considerado
urrrparente.
Foi feito um jogo divinatório para O runm ilá
No dia em que se tornaria o m elhor amigo de Exu.
Para o m elhor amigo de Exu não faltará prosperidade.
- Exu, eu vim para ser o seu melhor amigo. Não permita que mc
falte prosperidade.
Para o m elhor amigo de Exu não faltará sorte no amor.
- Exu. eu vim para ser o seu melhor amigo. Não permita que mc
falte sorte no amor.
Para o m elhor amigo de Exu não faltará fertilidade.
- Exu. eu vim para ser o seu melhor amigo. Não permita que mc
falte fertilidade.
Para o melhor amigo de Exu não faltará nenhum tipo de sorte.
- Exu. eu vim para ser o seu melhor amigo. Não permita que mc
falte nenhum tipo dc sorte.

Algum as considerações sobre o odu Èji-Ogbè


Nesta situação existencial a im portância da amizade é enfatizada. Fala-
se da conquista de um novo amigo que traz m uita sorte em todos os âmbitos
da vida e que traz também prosperidade. Aconselha-se a fazer um a oferenda
a Exu e a estar atento para reconhecer o amigo quando este surgir.
Nesse odu mais um a vez se enfatiza a lealdade, a am izade e a gene­
rosidade de Exu e os benefícios —prosperidade, sorte 110 am or e fertilidade
- que dele podem advir.

9. Odú O gbè-irçtè
Narrador: Bàbáláwo Lawál Rúfiú

Fingir-se dc doente, fingir-se de m orto, para saber quem lamen­


taria nossa morte.

306
A ndar nu pela cidade para saber quem teria a generosidade de
nos oferecer um a roupa.
Andar nu, com o um a pessoa desorientada, tropeçar num a corda,
para saber quem nos socorreria.
Foi feito um jogo divinatório para O runm ilá
No dia em que ele ia conhecer seus inimigos.
Todos os orixás eram am igos de O runm ilá. O ru n m ilá era adi­
vinho deles e queria saber quem , dentre eles, era de fato um am i­
go leal.
Ifá orientou O runm ilá: recom endou que fosse rápido e fizesse
um ebó o quanto antes. O runm ilá cham ou os filhos e pediu que
tocassem agogô pela cidade, anunciando, falsamente, a sua morte.
Os filhos de O runm ilá saíram tocando o agogô, conform e orienta­
dos pelo pai.
Foram prim eiram ente à casa de Oxalá para com unicar-lhe a m or­
te de O runm ilá. Oxalá lhes disse que desejava obter de volta todos os
çfun que oferecera a ele em vida.
Foram tam bém à casa de Xangô para com unicar a m orte de
O runm ilá. Xangô lhes disse:
- ÍIu achava qiic ele nunca morreria e que ficaria sempre 11a ter­
ra. Como morreu, quero de volta todos os çdun-àrá que lhe dei de
presente.
Os filhos de O runm ilá foram até a casa de O xum , cantando o
seguinte refrão:
- Nosso pai foi embora dessa terra, ele foi. Nós te saudámos,
Orunmilá, o divino homem que carrega ebó. Nosso pai foi embora.
Oxum, surpresa com a notícia da m orte de O runm ilá, referiu-se
aos ide que estavam com ele, pedindo aos filhos dele que os trouxes­
sem de volta para ela.
Os filhos de O runm ilá haviam tocado agogô perto da casa de to­
dos os orixás e com eçaram a se perguntar se haveria algum em cuja
casa ainda não tivessem ido. Lembraram, então, que faltava ir à casa
de Exu. E foram. Lá chegando, avisaram-no da m orte de Orunm ilá.
Exu ficou triste ao receber a notícia e pediu aos filhos de O ru n m i­
lá que raspassem a sua cabeça em homenagem ao amigo. Justificou
seu ato como m otivado pela morte do amigo, dizendo ainda que
Orunm ilá fora sua fonte de sobrevivência. Exu nunca havia raspado
a cabeça. Começaram então a raspagem. Rasparam prim eiro do lado
direito e depois começaram a raspar do lado esquerdo. Os filhos de

307
O runm ilá, que haviam presenciado tudo isso desde o início, surpre­
enderam -se com a firme atitude de Exu e voltaram correndo para
contar ao pai que Exu havia m andado m olhar seu cabelo e ordenara
que o raspassem e que já haviam com eçado a fazer isso. Orunmilá
pediu aos filhos que retornassem rapidam ente à casa de Exu para
contar que tudo não passava de uma brincadeira. Pediu-lhes, ainda,
que recomendassem, a quem estava raspando o cabelo de Exu, para
parar de jogar água em sua cabeça e jogar azeite de dendê para acal­
má-lo. Ao chegarem à casa de Exu, os filhos de O runm ilá viram que
só restava um pouco de cabelo em sua nuca.
A partir desse dia O runm ilá determ inou que não seria mais ami­
go dos orixás por serem eles desleais e que, por outro lado, seria sem­
pre amigo de Exu por ser ele o mais fiel e leal de todos os orixás.

Algumas considerações sobre o odu O g b è-Iretç


Esta narrativa m ostra uma situação existencial onde o tema predo­
m inante inclui a amizade, a lealdade e a fidelidade entre amigos. Aconselha
a procurar discernir quem é verdadeiram ente amigo entre as pessoas com
quem se convive. Recomenda estar atento ao fato de que pessoas considera­
das amigas podem estar de fato interessadas apenas nos benefícios materiais
que possam advir da relação. Recomenda identificar, entre tantos compa­
nheiros desleais, um (e único) que tenha condições de ser fiel e, ao localizá-
lo, dedicar-se a ele.
Criando uma situação falsa para testar a lealdade dos amigos, Orunmilá
tem por resposta a indiferença de Oxalá, Xangô e Oxum, que se revelam inte­
ressados pela recuperação dc bens materiais que a suposta morte do amigo lhes
proporcionaria, a tal ponto que não chegam a lamentar a perda. Exu, entretan­
to, manifesta grande dor diante da notícia da m orte do amigo e Orunmilá sen­
sibiliza-se com isso. A tristeza decorrente da constatação de que possuía amigos
desleais foi compensada pela alegria ante a fidelidade de Exu.
Vemos nesse odu mais uma vez confirm ados os estreitos vínculos
existentes entre esses dois orixás. Enfatiza o valor da amizade, que vale mais
que qualquer riqueza material, e o valor da amizade leal de Exu.

10. Odi) Ògúndá-Òtúrá


Narrador: Bàbáláwo Fábünmi Sówúnmí

Se o filho do rei nasce dentuço. não pode tomar emprestados os


lábios do escravo para cobrir seus dentes.

308
Foi feito um jogo divinatório para Odún-Llà
No dia em que ele teria relação sexual com um a esposa de seu pai
e fugiria, em seguida, para a floresta.
O runm ilá era rei de Ifè. Ao assumir o trono decretou a seguinte
lei: Todo homem que tiver relação sexual com uma das esposas de
seu pai será condenado á morte. Essa lei expandiu-se na com unidade
e era respeitada.
Passados 90 dias o filho de Alárá teve relação sexual com uma
esposa de seu pai. Foram ao palácio relatar a O runm ilá o ocorrido.
Orunm ilá o cham ou e perguntou se era verdade que tivera relação
sexual com uma esposa de seu pai. O filho de Alárá confirm ou e
Orunm ilá m andou executá-lo. M ataram o filho de Alárá conform e
ordenava a lei.
Depois de algum tem po o filho de Ajerò também teve relação se­
xual com uma esposa de seu pai. Foram ao palácio relatar a Orunmilá
o ocorrido. Orunm ilá o chamou e perguntou se era verdade que tivera
relação sexual com uma esposa de seu pai. O filho de Ajerò confirmou
e também foi condenado à morte, conforme determinava a lei.
O filho de Qwá Qràngún tam bém teve relação sexual com uma
esposa de seu pai. Foram ao palácio relatar a O runm ilá o ocorrido.
O runm ilá cham ou-o e perguntou se era verdade que tivera relação
sexual com um a das esposas de seu pai. O filho de Qwá Qràngún
confirm ou c O runm ilá ordenou que o executassem, conform e de­
terminava a lei.
Certa m anhã os conselheiros de O runm ilá foram, com o de cos­
tume, visitá-lo. Chegando ao palácio, cm vez de entrarem p o r um a
porta en traram p o r o u tra c, ao entrarem , en co n traram O dún-Èlà,
o único filho de O runm ilá, tendo relação sexual com Òsünmiláyp
Agbonmírégún, a jovem e linda nova esposa de seu pai.
Levaram Odún-Èlá e Òsúnmiláyç Agbonm írégún à presença de
Orunm ilá. Chegando ao local onde estava O runm ilá encontraram
Exu, o bondoso, que tanto faz o bem como o mal. Os conselheiros de
O runm ilá relataram a ele o fato ocorrido e O runm ilá perguntou ao
filho se de fato tivera relação sexual com sua esposa. Odún-Èlà res­
pondeu que o relatado era verdade. O runm ilá m andou m atar Odún-
Çlà, seu único filho, conform e determ inava a lei.
Naquele m om ento, Exu deu a seguinte sugestão a O runm ilá e
seus conselheiros:
- Quando uma norma dessa natureza ó transgredida e a lei ordena

309
T
a morte do transgressor vocês deveriam esperar sete dias antes de
executã-Io.
Todos aceitaram a sugestão de Exu. Os conselheiros de Orunmilá
levaram então Qdún-Çlá para ficar detido por sete dias.
Toda a cidade ficou sabendo do ocorrido. O único filho de
O ru n m ilá fora condenado por desrespeito à lei. Se fosse morto
não haveria o u tra pessoa para assum ir o tro n o após a m orte de
O runm ilá. E com o poderia a cidade de Ifè ficar sem rei?
Depois que os conselheiros de Orunm ilá sairam do local onde
Odún-Elá estava, Exu dirigiu-se a ele dizendo:
- Amanha, quando os conselheiros vierem falar com você. diga-
lhes que está precisando fazer suas necessidades.
Depois, Exu foi falar com O runm ilá e seus conselheiros e sugeriu
que todo transgressor da ordem , com o era o caso de Odún-Èlà, não
deveria fazer suas necessidades cm casa, e sim no mato.
Q uando Odún-Èlà foi visitado pelos conselheiros de Orunmilá
disse a eles que precisava fazer suas necessidades. Foi orientado a ir
para o mato. Estavam todos tranqüilos, pois acreditavam que Odún-
Èlà não fugiria por não ter para onde ir.
Sem que eles soubessem, sem que ninguém visse, Exu acompa­
nhou Odún-Èlà até o mato e deu-lhe m uita sabedoria e conhecimen­
to. Deu a ele, tam bém , o seguinte conselho:
- Fuja para evitar a morte.
Então, seguindo o conselho de Exu, Odún-Èlà foi para o mato e
não voltou mais para casa. Som ente no dia seguinte os conselhei­
ros de O runm ilá descobriram que ele fugira. Inconform ados, foram
perguntar a Exu sobre o paradeiro de Odún-Èlà. Exu respondeu que
não o vira e que, portanto, não sabia onde se encontrava. Invertendo
a situação, Exu lhes perguntou se por acaso ele recebera a incum bên­
cia de vigiar Qdún-Èlà. Depois disso, perm aneceu em silêncio. Nada
falou, nem deixou transparecer através de seu com portam ento que
fora ele quem aconselhara Odún-Èlà.
Passadas 84 luas novas, Exu encontrou Odún-Èlà caçando na
floresta. Seu corpo estava com pletam ente coberto de pelos. Tinha
a aparência de um animal selvagem. Exu convidou-o a segui-lo e o
convenceu a voltar para casa. Odún-Èlà respondeu que não queria
voltar porque seria m orto por haver transgredido a ordem.
Exu lhe disse que ele certam ente não seria m orto e que, por isso,
deveria acom panhá-lo. Disse tam bém que O runm ilá não tivera outro

310
filho que pudesse sucedê-lo no poder. Fortaleceu sua argum entação
acrescentando que na cidade de Ifç, quando um a pessoa transgride a
ordem e foge, será absolvida caso tenham se passado sete anos.
E assim, Exu levou Qdún-Èlà para a cidade de Ifç.
Ao chegarem à casa de O runm ilá, Exu pediu a Odún-Çlà para vir
andando atrás dele e foi entrando na frente. Assim, Odún-Çlà via o
pai, mas não era visto por ele.
Exu então abriu a boca e entoou a seguinte cantiga:
- Oh! Bárápetu não recuse o pedido de perdão!
- Oli! Bárápetu não recuse o pedido de perdão!
- Qdún-Èlà pediu a m im que viesse pedir perdão a você.
- Oh! Bárápetu não recuse o pedido de perdão!
Orunmilá, sentado em seu trono, respondeu a Exu o seguinte:
- Oh! Foi Odún-Èlà que não agiu corretamente e transgrediu a
ordem.
- Oh! Foi Odún-Èlà que não agiu corretamente e transgrediu a
ordem.
- Quantos filhos o Èdú teve, para, sem prejuízos, expulsar seu
filho ou condená-lo à morte?
- Oh! Foi Qdún-Èlà que não agiu corretamentc c transgrediu a
ordem.
Orunm ilá então recebeu o filho de volta.
Foi assim que a cidade de Ifç aboliu a lei de condenar à m orte o
hom em que tem relação sexual com a esposa de seu pai.

Algum as considerações sobre o odu Ò gúndá-Ò túrá


Este odu apresenta um a situação em que a liderança de um grupo
acha-se prestes a ser substituída e aconselha que se esteja atento à possibili­
dade de constituir-se em agente ou vítima de injustiça. Quem ocupa cargos
de liderança deve atentar para as regras e, sim ultaneam ente, procurar ser
menos rigoroso e fazer uso de discernim ento ao elaborar as norm as para
seu grupo. Enfatiza a questão da justiça e da igualdade de direitos no cu m ­
primento das leis. Com o para ser bom juiz é preciso prim eiram ente saber
julgar a si mesmo, aconselha-se as pessoas a realizarem autocrítica antes de
julgarem os demais. Com o a lei deve ser a mesma para todos, é recom en­
dável julgar com justiça: todos devem ser julgados a partir dos mesmos
princípios e pelas mesmas leis, independentem ente da posição social que
ocupam, já que na cidade de Ifè, quando o filho de O runm ilá transgride a
norma, é condenado à m orte com o todos os demais. Antes de criar as leis

311
é preciso refletir sobre seus possíveis efeitos e desdobram entos. Deve-se ter
cuidado para não criar normas impossíveis de obedecer, que exijam condutas
impraticáveis por demandarem esforços que estão além da capacidade huma­
na. Deve-se evitar estabelecer regras que possam vir a comprometer a sobrevi­
vência do grupo e, caso isso ocorra, é recomendável agir com menos rigor.
O odu é iniciado sugerindo a noção de que o filho do rei poderá ter
falta de sorte, apesar de sua origem nobre, enquanto o filho do escravo po­
derá ser, em alguns sentidos, mais feliz que o filho do senhor. No entanto,
a narrativa logo contradiz essa afirmação ao apresentar uma situação de
privilégios.
Fala a respeito da possibilidade que as pessoas têm de sofrer limita­
ções ou perdas, ainda que ocupem elevados postos sociais. Mas a narrativa
contradiz tam bém esta afirmação, ao apresentar a história da criação de
um a lei supostam ente válida para todos os hom ens. Os três prim eiros a
transgredi-la são executados, porém o filho de O runm ilá, apesar de infrin­
gir a mesma lei, conta com o apoio de Exu, que aconselha que a norma
penal seja modificada, em vista da criação de um impasse: se a lei for cum ­
prida à risca, o povo ficará sem líder.
Pode-se identificar a im portância do líder para a sobrevivência do
grupo. Aconselhando aqui e ali, Exu vai transform ando gradualm ente a
situação para solucioná-la com habilidade admirável. Isto chama a atenção
para a im portância da intervenção de um sábio nos processos legislativos e
políticos. Sugerindo pequenas alterações na legislação, alterações aparente­
mente insignificantes, e tendo suas sugestões acatadas, Exu m ostra-se um
grande e habilidoso estrategista. No caso, são criadas atenuantes da Lei Pe­
nal c o pedido de clemência encam inhado no m om ento oportuno alcança
o desejado perdão. Uma vez absolvido o filho do rei, se estabelecem as mu­
danças nas norm as penais que poderão estender-se, agora, em benefício de
outros possíveis infratores. As prerrogativas do poder são democratizadas e
as norm as sociais são alteradas.
Esse odu tem múltiplas possibilidades de leitura, o que o torna rico
em ensinam entos. Uma dessas leituras sugere que um ato de injustiça social
pode redundar, a curto ou médio prazo, cm m udanças im portantes das
norm as grupais, que poderão vir a ser legitimadas, caso se encam inhe a
questão com calma, paciência e discernim ento.
Apresentando situações em que ocorre a produção de efeitos secun­
dários que virão a ser, de fato, o principal produto da situação, tendo em
vista os interesses da justiça, esse odu estim ula a reflexão sobre a igualdade
e suas relações com a herança biológica e a concessão divina de dons, bens

312
I'

e oportunidades, independentem ente da posição social ocupada pelos indi­


víduos. A discussão a respeito dos privilégios do nobre em relação ao cida­
dão comum é atravessada pela problem ática da sucessão da liderança. Por
um lado, o candidato ao cargo deseja liderar. Por outro lado, a presença do
líder é de interesse do povo, m esm o porque pouquíssim os estão preparados
para o exercício dessa tarefa.
O texto elucida ainda a respeito das diferenças que existem entre a
capacidade para conhecer e a capacidade para aplicar os conhecim entos
na prática: há sábios que têm capacidade para conhecer os princípios, mas
não têm discernim ento para aplicá-los, enquanto há outros sábios que de­
monstram capacidade para aplicar o conhecim ento na prática e, com isso,
responder aos desafios do cotidiano.

11. Odu Òwónrín-Òtiirá


Narrador: Bàbáláwo Fábúnmi Sówímmi

Atàmájúbá levou sua m ercadoria à feira para vender. Foi à feira


três vezes, mas não conseguiu vender nada. Triste com isso foi con­
sultar seus adivinhos e eles a aconselharam a fazer ebó para m elhorar
seus negócios. Recom endaram , tam bém , que venerasse Exu.
Depois de fazer ebó e realizar a oferenda a Exu, Atàm ájúbà voltou
à feira. Lá chegando, Exu dirigiu-se a ela c perguntou o preço de sua
mercadoria. Ela inform ou o preço e ele, m ostrando-se insatisfeito,
pechinchou, pechinchou, até que o preço fosse reduzido a um único
búzio.
Atàmájúbà não se irritou com a absurda proposta de Exu. C on­
forme ele ia pechinchando ela aceitava receber o valor que ele se pro­
punha a pagar. Exu pagou apenas uma mercadoria nesse valor e foi
embora. Até o final daquele dia ela não conseguiu vender mais nada.
Manteve-se firme e não se irritou. Aguardava a chegada de sua sorte.
No dia seguinte bem cedinho, quando estava arrum ando a tenda
para expor sua m ercadoria, Exu aproxim ou-se e lhe deu bom dia.
Lembrou-lhe que havia com prado dela na véspera e que retornara
para ajudá-la a vender suas mercadorias. Sentou-se perto dela, como
vendedor. Assim que um a pessoa se aproximava da barraca para
comprar, Exu apresentava um preço bem superior ao valor real da
mercadoria, já avisando que não adiantaria nada pechinchar.
Os interessados em com prar ficavam com medo dele e, sem coragem
dc pedir desconto, rapidamente pagavam o preço estabelecido. Foi assim

313
que cie a ajudou a vender por bom preço toda a mercadoria nesse dia.
Maravilhada, Atàmájúbà agradeceu a Exu. Ele lhe disse para não
agradecer ainda, pois tinha mais benefícios para oferecer.
Essa m esma feira era freqüentada por Ajé. Exu disse para Atà-
májúbà ir com prar obi na barraca de Ajê sem pagar. Ela foi até lá,
com prou obi e não pagou. Retornou e disse a Exu que comprara
obi sem pagar, conform e orientada. Ele recom endou, então, que ela
fosse novam ente à barraca de Ajê e, lá chegando, segurasse sua roupa
e gritasse para todos ouvirem que Ajê era escrava de seu pai. Como
Ajê, na-realidade,-não-era-eserava-do-pai-de-Atàmájúbà,-certamen­
te contestaria, e Exu orientou-a sobre com o proceder quando isso
ocorresse: Atàmájúbà deveria dizer a Ajê que tirasse sua roupa e se,
ao tirá-la, se pudesse identificar um a marca em sua coxa direita, este
seria o sinal de que ela era, de fato, escrava do pai de Atàmájúbà.
Quando abordada por Atàmájúbà, Ajê, certa de não ser escrava e
de não ter nenhum sinal no corpo, respondeu: Caso eu tire a roupa e
encontre essa marca em minha coxa direita, vou em bora com você.
Assim, caso tivesse a tal marca na coxa direita, se tornaria sua escrava.
Com o Ajé era um a m ulher rica e vaidosa, ia à feira com 201 saias.
Começou a tir a r um a por um a para provar que não tinha a marca
alguma em sua coxa direita.
Q uando restava apenas um a saia, Exu pegou seu adô mágico,
causador de ferimentos, e apontou-o na direção da coxa direita e a
marcou. Assim, quando tirou a última saia todos os presentes viram
a marca em sua coxa direita e gritaram que ela era de fato escrava de
Atàmájúbà. Todos os presentes concordaram que Ajé era escrava de
Atàmájúbà e que devia, portanto, acom panhá-la.
Atàmájúbà pegou então as 200 saias de Ajê e a deixou somente
com a que restara em seu corpo. Pegou Ajê com o sua 201“(3>escrava
porque, sendo ela um a m ulher m uito próspera, Atàmájúbà possuía
200 escravos. Pegou lodo o dinheiro das m ercadorias vendidas por
Ajê, pegou toda a sua riqueza e levou tudo c todos para sua casa.
Atàmájúbà dançava ininterruptam ente, com m uita alegria.
Louvava seus adivinhos e louvava tam bém Exu. Ficou próspera.
Todas as qualidades de sorte ficaram com Atàmájúbà.

Algum as considerações sobre o odu Ò w ó n rín -Ò tú rá


Atàmájúbà significa “Aquele que negocia sem ter feito as devidas
saudações”. Esta narrativa refere-se a um a situação em que o centro das

314
preocupações é a questão dos negócios, do dinheiro e da prosperidade m a­
terial. Aconselha a confiar na própria sorte e no conselho de am igos leais. É
preciso ser arguto e hábil na condução das atividades comerciais e no trato
com o d inheiro10.
O odu Qwçnrin-Òtúrá trata do tema “sorte nos negócios”, dinheiro e
prosperidade. Aconselha a veneração a Exu e o conselho é acatado. Para que
se obtenha sorte em assuntos relativos a negócios, dinheiro e prosperidade
material é recomendável fazer um ebó. Exu recebe um a oferenda que muito
o agrada e se dispõe a ajudar. Procura as melhores maneiras para favorecer
o ofertante^D e fatora oferenda a Exu torna possível o fluxo das energias
pretendidas.
Temos aqui a mensagem de que a confiança no conselheiro e na pró­
pria sorte favorece os cam inhos que a desejada ajuda deverá percorrer. O
conceito cie que a gratidão renova a disposição para a ajuda reaparece nesse
contexto. A lealdade figura mais um a vez como virtude.

12. Odu Òkànràn-Méji


Narrador: Bàbáláwo Liwòsi Igbórè

Fala o mal se queres obter o mal como resposta.


Foi feito um jogo divinatório para Sàkótó
No dia em que ele ia adivinhar na cidade de Qwà.
Sàkótó, adivinho do povo de Qwà» adivinhou para eles cm sua
cidade.
Qwà, onde não chovia nem serenava. O povo da cidade de Qwà
não tinha água nem para beber. A seca era total, o milho e o inham e
não brotavam. O povo da cidade de Qwà foi consultar o adivinho
para saber se teriam água para beber. Foram orientados a procurar
Sàkótó para que ele adivinhasse para eles. Ele é quem resolveria o
problema desse povo.
Foram então cham ar Sàkótó para que ele atraísse a chuva com
seus conhecim entos e eles pudessem, assim, ter água.
Sàkótó consultou Ifá a respeito da viagem que faria à cidade de
Qwà e perguntou o que poderia fazer para que chovesse naquela ci­
dade. Ifá respondeu que a chuva cairia sobre a cidade de Qwà. Pediu-
lhe que providenciasse três galos, três garrafas de dendê e um acaçá.

lí Sugerimos que seja retomada a leitura das considerações a respeito do odu 6, iwòri-Òtúriipòn, dada a
posição o c u p a d a p o r A jê n essa n a rra tiv a .
O rientou-o a pegar um dos galos e oferecer a Exu. Deveria, também,
pegar três acarajés, oferecê-los a Exu e, quando Exu estivesse rece­
bendo esses acarajés, Sàkótó deveria tom á-los devolta para provocar
sua ira.
Sàkótó agiu conform e fora instruído. Pegou os três acarajés já
oferecidos a Exu e os comeu diante dele. Exu ficou irado com esse
com portam ento de Sàkótó.
Exu, irado, pegou seu adó mágico, apontou-o na direção de Qwà
e começou a chover sem parar. Os lagos secos sc encheram e o povo
ficou m uito alegre por ter água novam ente. Os milhos e inhames
plantados brotaram e nasceram grandes.
O povo de Qwà começou a cantar alegremente em louvor a Sàkótó,
dizendo o seguinte: Sàkótó c bom adivinho. Não há um adivinho que
seja melhor que Sàkótó. Sàkótó é o melhor adivinho que existe.
A partir desse dia, esse povo teve paz, harm onia e felicidade.

Algum as considerações sobre o odu O k à n rà n -M é ji


N um a situação de crise que envolva esterilidade em todos os senti­
dos e ameaça de destruição é aconselhável tom ar m uito cuidado para não
ser ludibriado. Lembrando que, por mais sabedoria que um a pessoa tenha,
isso não a livrará do risco de ser ludibriada, este odu aconselha a adoção de
um a atitude de alerta para evitar engodos. Esse conselho é especialmente
dirigido a pessoas dotadas de poder e conhecim entos, que podem ser leva­
das a crer na impossibilidade de serem enganadas e, por isso, desmontam
suas defesas e deixam flancos abertos. Aconselha a confiar na própria força
pessoal e enfrentar problemas aparentem ente impossíveis de superação.
Reforçando a noção de que o mal atrai o mal e que tam bém os con­
selheiros devem buscar conselhos para m elhor poderem aconselhar, nesse
odu é enfatizada a ideia de que a força vital de outros pode ser usada como
recurso para a solução de problemas ou dificuldades.
A afirmação que precede este odu reporta à necessidade dc busca
de um “bom ” procedim ento para benefício do indivíduo e de seu grupo.
O bem é apresentado como valor a ser cultivado, e o mal como força a
ser evitada. Esta noção é apresentada concom itante à ideia de que algumas
circunstâncias exigem o uso de trapaças, artim anhas e ardis como estraté­
gias de sobrevivência. Por exemplo, em circunstâncias de esterilidade, seca
e ameaça de destruição, define-se como objetivo principal a obtenção, a
qualquer custo, de água, decorrendo disso tudo o que a ela se associa: ferti­
lidade, prosperidade e longevidade.

316
Enfatiza a im portância de exaltar o benfeitor e dem onstrar gratidão
para assim conquistar paz, harm onia e felicidade. Acham-se im plícitas a
virtude da hum ildade de quem busca e as virtudes da generosidade, com ­
paixão e lealdade dc quem oferece ajuda.

13. Odu Òdi-Méji


Narrador: Bàbáláwo Ohiwásolá Ayélabólá

Foi feito um jogo divinatório para Aiye e para Eledunm are


No dia em que iriam confrontar-se com inimigos.
Eledunmare perguntou o que deveria fazer para não ser atingido.
Foi orientado a fazer ebó para afastar guerra e perseguição. Ifá fa­
lou que, antes de iniciar qualquer coisa para si, deveria providenciar
duas cabaças cheias de mel para o ebó. Aiye fez o ebó. E Eledunm are
também. Providenciaram todos os elem entos pedidos e foram levá-
los à encruzilhada de Exu.
Eledunmare foi o prim eiro a levar o ebó para a encruzilhada. De­
pois foi a vez de Aiye.
Q uando os inimigos chegaram à encruzilhada encontraram a
oferenda. Sentaram-se e com eram .
Depois de comerem o ebó, e já estando de partida, eis que surge
Exu. E lhes pergunta:
- Para onde voccs estão indo?
Responderam que estavam indo para um confronto com Eledun­
mare. Exu perguntou então:
- Aquela comida que vocês acabaram de comer pertencia a vocês?
Eles responderam que não. Exu perguntou:
- Por acaso vocês comeram algum ensopado preparado com mel?
Eles responderam que sim. Exu disse:
- Eledunmare é o dono da primeira comida que vocês comeram
e Aiye c dona da outra. Não se pode comer comida dc uma pessoa e
depois querer tirar-llie a vida. Ou vocês devolvem a comida, exata­
mente do modo que estava, ou voltem para trás.
Aí então, os inimigos refletiram e voltaram para trás entoando a
seguinte cantiga:
- Não conseguimos prosseguir em nossa viagem. Só chegamos
até onde havia mel.
D emoraram quinze dias para chegar à encruzilhada e outros tan ­
tos para retornar.

317
Algum as considerações sobre o odu Ò di-M éji
Num a situação que envolva disputa ou confronto, tão críticos que
possam conduzir à m orte ou à redução da vitalidade c à perda de tran­
qüilidade, c aconselhável a formação dc alianças familiares. Nesses casos é
recomendável que o irm ão mais novo da pessoa diretam ente envolvida na
referida situação de crise tam bém realize um ebó, idêntico ao recomendado
para essa pessoa, a fim de evitar contendas. Recomenda-se, ainda, que seja
respeitado o princípio de não agredir quem nos alim enta, incluindo-se en­
tre essas pessoas os pais, os patrões e outras pessoas que possibilitam nossa
subsistência. Sugere tam bém que se ofereça alim ento àqueles cuja força se
deseje neutralizar.
A temática abordada neste odu refere-se à traição, à guerra e à per­
seguição. Traz conselhos para o dia do confronto, o que inclui um a reco­
mendação de ebó para evitar conflitos. E lem bra que quando os conselhos
são acatados a gratidão se manifesta. Esta narrativa traz uma importante
concepção iorubá: alim entar-se da comida de alguém gera um a dívida de
tal ordem que nada autorizará o beneficiado a agredir seu benfeitor. As
virtudes da lealdade, da gratidão e do reconhecim ento acham-se aqui ex­
pressas. Essas virtudes m ostram -se relacionadas a diversos valores, entre os
quais, a paz e a harm onia.

14. O dú Òsá-Mcji
Narrador: Bàbáláwo Fábünmi Sówünmi

Foi feito um jogo divinatório para o caçador.


Ele foi aconselhado a fazer um ebó para obter caça farta.
Ele disse que só faria ebó após retornar da caçada.
O caçador m atou um animal de grande porte.
Foi feito um jogo para a cidade de ígbpnná, cujo problem a era
a esterilidade de suas m ulheres. O jogo disse que era preciso fazer
um ebó.
Para esse ebó deveriam ser providenciados os seguintes elementos:
pombo, galinha, cabrito, epo e osim. O ebó foi feito na cidade.
O caçador que caçara o grande animal e desm aiara na floresta foi
cham ado nesse dia para ver seu filho que estava doente.
Ao chegar encontrou o filho doente e foi obrigado a ficar com
ele durante sete dias. Ao final do sétimo dia lem brou-se do grande
animal que deixara na floresta.
Ao chegar lá o animal já havia apodrecido.

318
No caminho cie volta encontrou Exu Odara, que lhe perguntou:
- O que você tem na mão. caçador?
- Os chifres do animal que cacei.
Ele não sabia que estava falando com Exu. Exu perguntou se ele
pretendia vender os chifres e ele respondeu que sim. Exu perguntou
então quanto queria e ele respondeu que venderia por milhares de
cauris.
Logo depois, chegou à cidade e o rei achou os chifres m uito bo­
nitos e os com prou. Com o dinheiro recebido sua vida m elhorou,
-------- tornou-sc próspera.------------------------------------------------------------------
Então, o povo de Igbçnná começou a cultuar o chifre com o sagra­
do e, com isso, o problema de esterilidade das mulheres foi resolvido.
Como? Colocavam osim dentro do chifre e as mulheres o pegavam e
passavam no corpo para resolver o problema de esterilidade.

Algum as considerações sobre o odu Ò sá-M éji


Esse odu refere-se a um a condição de esterilidade feminina. Refe­
re-se tam bém a problem as de saúde do consulcnte ou de alguém de sua
família, à possibilidade de enfrentam ento de desafios maiores na vida pro­
fissional (o animal de grande porte) e à necessidade de responder de modo
equilibrado às dem andas simultâneas da vida, em seus aspectos dom éstico
e profissional. Aconselha o exercício de atividades profissionais de caça ou
de relação com a natureza para superar um a condição difícil e para obter
saúde, fertilidade, prosperidade e tranqüilidade.
Uma das principais temáticas abordadas é a da esterilidade. O b­
servamos que nesse odu o conselho de realizar ebó não foi acatado pelo
caçador. Ele foi para a floresta, m atou um grande animal e desm aiou em
seguida. Enquanto isso acontecia, na cidade de Igbónná, onde as mulheres
eram estéreis, estava sendo aconselhada a realização de um ebó para tornar
férteis os estéreis. Retomando a consciência e voltando para casa, o caçador
encontrou o filho doente e, preocupado com ele, se esqueceu da caça abati­
da e ela apodreceu, ficando aproveitáveis apenas os chifres. O rei com prou
os chifres e eles foram sacralizados. Depois disso, os chifres passaram a so­
lucionar problem as de esterilidade.
Temos, pois, nesse odu, valorizados a fertilidade, a profusão, a pros­
peridade, os cuidados para com a família, a boa saúde, a im portância do
diálogo e dos conselhos. Como virtudes, valorizam -se a lealdade e a com ­
paixão (empatia do amigo).

319
/5. Odu iw òrí-M óji
Narrador: Bàbãhhvo Fábünmi Sówúnmi

Qkanlàbà kólónbó àrírn igbàdo kò pçn wçlà adivinhou para o


pato que ele seria eleito o m elhor entre as aves.
Orofórotò a fiyçgbà adivinhou para O lokum , o rei das águas,
quando este perdeu a cabaça do com portam ento e consultou Ifá e
os adivinhos, buscando orientação a respeito de com o proceder para
achar o com portam ento perdido.
Os adivinhos de Olokum o orientaram a pedir ajuda às aves para
poder encontrar o com portam ento perdido. O lokum seguiu a orien­
tação. Pediu ajuda às aves, mas nenhum a conseguiu achar a cabaça
de com portam ento de Olokum. Isto porque cada ave, ao entrar na
água, não conseguia manter-se viva e m orria afogada.
Entre todas as aves apenas o pato ainda não tentara tão difícil
missão. Assim, ele foi cham ado para ajudar seu amigo Olokum a
procurar a cabaça de com portam ento perdida na água.
Exu, ao ver a situação, cham ou o pato e lhe perguntou se faria um
ebó sob sua orientação. O pato respondeu que sim. Exu pediu para
ele com prar um cabrito e sapatos.
Assim que ele com prou tudo o que Exu pedira, os dois levaram
esse material aos adivinhos do pato. Ao chegarem lá, os adivinhos
fizeram o ebó sob orientação de Exu e energizaram os sapatos com­
prados pelo pato.
Q uando o pato calçou os sapatos eles firm aram em seu pé de tal
modo que era impossível tirá-los. Então os adivinhos lhe disseram que
já estava na hora de entrar na água para cum prir a difícil missão.
Muito confiante em si, o pato entrou na água e, ao invés de se afo­
gar com o acontecera com seus amigos, conseguiu a proeza de nadar
na superfície das águas, não tendo, pois, o destino deles.
O pato foi para as profundezas das águas, achou a cabaça de com ­
portam ento de seu amigo O lokum e a trouxe para ele. Em reconhe­
cim ento a este fato, Olokum deu ao pato a soberania sobre todas as
aves, pois som ente ele conseguira nadar sem se afogar.

Algum as considerações sobre o odu Íw òri-M éji


Nesta narrativa temos um a pessoa dc personalidade forte, nascida
para liderar e ocupar altos postos hierárquicos, e que, contudo, encontra-se
em condição de enfraquecim ento da própria personalidade por haver ado­

320
tado atitudes grosseiras e não haver tido com postura. Ela aconselha sobre
a importância do diferenciar-se através de uma postura nobre c de não se
colocar apenas como “mais um ”, porque isso não seria condizente com a
real condição da pessoa. Recomenda tom ar banhos de m ar para reciclar a
própria energia e trabalhar 110 sentido de estabelecer relações de afinidade
com aquilo que se almeja e com as pessoas com quem se lida.
O odu Iwòri-Méji trata da perda da capacidade de com portar-se
bem. Traz o interessante elemento de que a busca de algo perdido em de­
terminado m om ento ou lugar - no caso, a água - é em preendida por seres
pertencentes a outro elemento —no caso, o ar e a terra. Q uando se perde a
capacidade de se com portar bem é preciso recuperá-la. Nessa busca é pre­
ciso respeitar um a regra básica: a solução para o problem a de um a pessoa
depende da afinidade existente entre ela e aquele que tem respostas para
oferecer. Se necessitamos buscar o que está na água e recorrem os às aves,
elemento do ar, não temos chance de sucesso. Entretanto, nos casos em que
essa afinidade não existe, ela poderá ser criada através de ebós. Ou seja,
indica a necessidade de realizar um ebó que dinamize a indispensável afini­
dade, capaz de prom over condições de empatia entre a pessoa que busca e
aquela que tem para oferecer. Assim se trabalha para o sucesso da em prei­
tada c, uma vez alcançada a vitória, devem a gratidão e o reconhecim ento
ter a sua vez.
O odu apresenta com o valor a preservação da capacidade de com -
portar-se bem , sugerindo a possibilidade de perda ou enfraquecim ento
dessa capacidade “n atu ra l”, e orienta a respeito de form as para recu­
perá-la. Inclui entre as virtudes gratidão, reconhecim ento, b o n d ad e e
compaixão.

16. Odú Íwòrí-M éji


Narrador: Bàbáláwo Fábiinmi Sówünmi

Gbálúkçgún. Gbàlúkogún
Ipàkçgúnugúnjà çrú àwçn
Foram eles que adivinharam para Èji Koko Iwòri
No dia em que ele vinha para a terra para ser o terceiro O du.
Èji-Ogbè lhe disse que não aceitava sua vinda e que não o deixa­
ria ficar.
Qyçkú-Mcji tam bém disse que não o deixaria ficar na terra.
Assustado com isso, Iwòri-Méji foi então co n su ltar seus a d i­
vinhos e lhes perguntou o que deveria fazer para que Èji-Ogbè e

321
Qyçkú-M éji o deixassem viver na terra.
Disseram a ele que providenciasse os seguintes elementos para
aum entar sua força: folha de gbégbé , folha dc tçtç, folha de èkúyà e
carneiro. Pediram que trouxesse tam bém um pilão de madeira e uma
pedra grande. Com tudo isso em mãos, os adivinhos começaram a
fazer o ebó para ele.
D urante o ritual de ebó os adivinhos entoavam encantamentos
para evocar os princípios vitais dos elem entos utilizados. Assim, eles
prosseguiam dizendo:
-----O-local em que não se quer que h íollia gbégbé brote é ali mes~
m o que ela brota e iiea.
- O local em que não se quer que a folha tçtç brote é ali mesmo
que ela brota c tica.
- O local em que não sc quer que a folha èkúyà brote é ali mesmo
que ela brota c tica até a morte.
A firm aram que, p o r mais forte que seja um vento, não con­
segue levantar um pilão, e que vento algum poderá levar uma
pedra.
Viveremos juntos nessa terra.
Busquei força vital para isso.
Viveremos juntos nessa terra.
Busquei força vital para isso.
É exatam ente no local em que não querem que a folha gbégbé
fique é ali que ela ficará. Busquei força vital para isso. Viveremos jun­
tos nessa terra.
É exatamente no local em que não querem que a folha tçtç fique
é ali que ela ficará. Busquei força vital para isso. Viveremos juntos
nessa terra.
É exatamente no local cm que não querem que a folha èkúyà fi­
que é ali que ela ficará. Busquei força vital para isso. Viveremos jun­
tos nessa terra.
N enhum vento consegue levantar um pilão. Viveremos juntos
nessa terra.
N enhum vento consegue levar um a pedra. Viveremos juntos
nessa terra.

Algum as considerações sobre o odu Iw òri-M éji


A configuração de elem entos nesta narrativa pode ser considerada
com o um indício de adversidades. Ela aconselha a observar a própria po­

322
sição nas relações hierárquicas e esforçar-se para perm anecer nos postos
alcançados, enfatizando que será preciso exercer força de resistência total
para poder preservar o poder alcançado.
Tratando da temática da competição, do ciúme e do egoísmo, este
odu refere-se à im portância da busca de orientação para que se saiba agir
em defesa própria e firm ar-se em meio às adversidades. Im por a própria
presença, ainda que contrariando o desejo de outros, constitui tarefa neces­
sária cuja realização tam bém dem anda força vital.
Afirma ser preciso opor resistência em situações adversas, e ainda
Tnairquando se possui firme convicção sobre os objcrivos a atingir. Lem-
bra que a força de resistência é tão im portante quanto a força de ataque,
ou seja, a capacidade para resistir às dificuldades e embates se alim enta da
mesma força vital que sustenta os processos de ação e transform ação. D ian­
te de um a situação de competição, ciúm e e egoísmo, é recomendável buscar
orientação para que se possa agir adequadam ente em defesa própria.

17. Odu hvòrí-M éji


Narrador: Bàbáláwo Fábúnmi Sówúnmi

Mabítunlà Bçrçrç adivinhou para Èésu", que vivia na mata, q u an ­


do ele sofria porque seus filhos m orriam precocemente.
Tão logo Èésu chegou à terra, as pessoas com eçaram a m atar seus
filhos. Preocupado com isso, foi consultar os adivinhos. Q ueria saber
o que fazer para que as pessoas parassem de m atar seus filhos.
Seus adivinhos o orientaram a fazer um ebó com um facão, um ca­
brito e um a moringa de cabaça cheia de água. Fizeram o ebó para ele e
o m andaram levar um a oferenda para Exu. Fie seguiu a orientação.
Durante a consulta Ifá disse a Èésu que as pessoas matavam seus
filhos por pura maldade. Assim que ele acabou de fazer o ebó levou
a m oringa com água para Exu. Exu pegou a m oringa e jogou a água
por cima das sementes de Èésu que as pessoas haviam cortado. A
medida em que Exu jogava água por cima das sementes elas iam ad ­
quirindo vitalidade e brotaram no dia seguinte. A partir daí nunca
mais um filho de Èésu teve m orte prematura.
Em reconhecim ento, Èésu começou a cantar dizendo:
- Meus filhos sobreviverão e prosperarão,
- A s pessoas nunca verão uni Èésu estéril.

" Inhamc.

323
Algumas considerações sobre o odu Iwòri-M éji
Esta narrativa sugere a presença de uma criança abiku na família em de”
corrência dc interferência mágica, 011 seja, sugere que alguém tenha feito magia
para que determ inado casal tivesse um filho abiku. Aconselha ser necessário
tom ar providências para garantir a longevidade dos filhos, para protegê-los
de modo que possam acompanhar os pais até o fim das vidas desses.
Como proceder para garantir a sobrevivência dos filhos? O odu
aconselha a realizar ebó e fazer oferenda a Exu. Lembra que, enquanto al­
gumas pessoas prom ovem destruição gratuita, por pura m aldade, outras
doam parte de sua força vital em benefício das necessidades de um amigo.
Enfatiza a im portância da gratidão e do reconhecim ento nas relações de
ajuda.
Valoriza a preservação do bem c do equilíbrio contra a destruição e
violência. M ostra com o a força vital dc um a pessoa pode ser posta a servi­
ço das necessidades dc outra. Retoma virtudes com o lealdade, compaixão
e hum ildade (para pedir) e traz im plícita a im portância da gratidão e do
reconhecim ento.

18. Odú Ofú-Òsé


Narrador: Bàbáláwo Fábíinmi Sówunmi

Aquele que mente será destruído pela mentira.


Aquele que provoca discórdia será destruído pela discórdia.
A falsidade despojará o falso da força vital de que dispõe. A fal­
sidade destruirá os falsos.
Foram eles que adivinharam para Àjàgünm àlè12, sábio supremo
no orun.
Todos aqueles que trocam a verdade pela mentira serão levados
para o orun por Àjàgünmàlè.
Não chamem o m orto de vivo, nem chamem o vivo de morto.
Quem chama o m orto de vivo ou chama o vivo de m orto será
levado para o orun por Àjàgünmàlè.
Não chamem um a m ulher fértil de estéril, nem cham em uma
m ulher estéril de fértil.
Quem chama um a m ulher fértil de estéril ou chama um a mulher
estéril de fértil será levado para o orun por Àjàgünmàlè.
Não chamem o preto de branco, nem chamem o branco de preto.

324
Quem chama o preto de branco ou chama o branco de preto será
levado para o orun por Àjàgünmàlè.
O runm ilá diz que prefere destruir o babalaô m entiroso, que en ­
gana a quem o procura em busca da verdade, e colocar em seu lugar
outro babalaô que, em bora não conheça tão bem a com plexa sabe­
doria de Ifá, seja um hom em leal.
O runm ilá diz que prefere um hom em que desconhece a sabedo­
ria de Ifá a outro que, em bora grande conhecedor desta sabedoria,
seja falso e mentiroso.

Algumas considerações sobre o odu O fú-Ò sç


Nesta narrativa é enfatizada a responsabilidade espiritual daqueles
que se propõem a guiar os outros. Ela aconselha babalaôs, babalorixás e
ialorixás a se m anterem próxim os da verdade para que as forças por eles
representadas ou m anipuladas não venham a agir contra eles. Recomenda
alguns cuidados que devem ser tom ados para que esses sacerdotes estejam
bem consigo próprios e possam preservar sua força vital.
A m entira destrói o m entiroso, a discórdia destrói quem a provoca,
a falsidade destrói o falso. Este odu trata da m entira, da discórdia e da fal­
sidade, que destroem os seus praticantes.~Afàstar-se da verdade determ ina
redução ou despojam ento do axé. Os que optam pela m entira sofrerão a
morte (m orte social). É im perioso não mentir. Vale mais um ignorante fiel
à própria palavra do que um sábio mentiroso. Vale mais um ignorante a
respeito da sabedoria de Ifá do que um homem que, em bora a conhecendo
bem, seja mentiroso.
O odu enfatiza a im portância de ser fiel à verdade. Num a sociedade
da oralidade, em que a palavra se associa fortemente à identidade pessoal e
ao caráter das pessoas, a infidelidade à própria palavra pode com prom eter
a sobrevivência do grupo, da história e da própria individualidade. Com o
virtude principal temos a lealdade aos valores originários e às pessoas.
Apresentados esses odus de Ifá, vejamos agora, no capítulo seguinte,
algumas saudações, evocações e rezas a Exu.

325
I
Capítulo 12

O r ík i, à d ú r à e ib à È s ú :

evocacões, rezas e saudações de Exu

Oríki - Evocações
A palavra oriki com põe-se de ori e ki. Ori significa origem e À/sig­
nifica evocar 011 louvar. Logo, 0/7Á7 significa evocar 011 louvar o ori ou a
origem daquele a quem se refere. Com o as palavras são portadoras de força,
os or/X/detcm força vital - axé - em si próprios.
Os orikis 1 são entoados por diversas razões. Q uando dirigidos a pes­
soas relatam seus feitos, virtudes, características e fraquezas, e sua entoação
emociona os homenageados. Q uando dirigidos a orixás narram episódios
em que suas bênçãos e ajuda foram solicitadas e obtidas e m encionam suas
qualidades e seus feitos, pois tais referências farão com que o cham ado seja in­
falivelmente ouvido e as oferendas, recebidas. Servem sim ultaneam ente para
louvar e para pedir auxílio ao orixá ou a outros entes, como elementos ou
fenômenos naturais. Q uando se faz referência aos orikis de alguns orixás usa-
se tanto a denominação oríki quanto a denominação pípè (chamado): oríki
Sango ou Sango pípè, oriki Èsú ou Èsú pípè ,; oríki Oya 011 Oya pípè. Para
outros orixás, entretanto, usa-se apenas a denominação oríki: oríki Yemoja,
oríki Ostin, oriki Oba. Estes são, evidentemente, apenas alguns exemplos.
Os orikis de Xangô incluem: Aláàfin Qyç> (Rei de Oyo); Alàdó (Aque­
le que racha o pilão); Alàgiri (Aquele que abre paredes); Asangiri (Aquele
que racha paredes); Ògirí-çkún (Leopardo Feroz); Olúkòso. Oba Kôso (o

1 Considerando que o termo oríki tem sido consagrado pelo uso, a partir daqui não o acentuaremos e
passaremos a flexioná-lo sempre que esse vocábulo figurar cm contexto do idioma português.

329
Rei não se enforcou). Os relativos a Oyá incluem: Oya urina bora bí asç
(Oyá vestida de fogo); Oya Òririi (Vendaval); Ti ndági lókèlókè (Aquela
que corta a copa das árvores). Os relativos a Oxum incluem: A Fidç Rçtnç
(Aquela que enfeita seus filhos com braceletes de bronze); O wáyanrín tra
yanrín kówó sí (Aquele que cava e cava a areia para esconder dinheiro);
Yeye Çsun (Graciosa Mãe O xum ). Os relativos a Obá incluem: O jow ú
obinrin (M ulher cium enta); Tó t'orí owú kçlá sí gbogbo ara (Aquela que
por ciúm e se cobriu de incisões ornam entais).
O uso dos orikis é considerado indispensável para atrair a presen­
ça dos orixás e dos ancestrais e sua entoação pode conduzir facilmente ao
transe. Os iniciados podem , mais facilmente, entrar em transe ao ouvir a
recitação dos orikis de seus orixás.
Oriki-orílè é a denom inação dc orikis referentes às linhagens.
Tanto podem ser dirigidos a um a família com o a um de seus integran­
tes, com a finalidade de louvar seus ancestrais, d em o n strar apreço ou
aplacar um a possível ira. Relatam fatos do passado dessa linhagem fa­
miliar, dando aos m em bros da família o conhecim ento de sua origem
e dos feitos de seus ancestrais. Sem pre que entoados provocam grande
em oção nos ouvintes. Enfatizam os que os orikis não são utilizados ape­
nas com a finalidade de provocar em oções em determ in ad a pessoa ou
n um g rupo dc pessoas pertencentes à m esm a família, e sim com o um
reconhecim ento de sua identidade, um a vez que fazem referências às
profissões, preferências alim entares e outras peculiaridades da pessoa
ou da família hom enageada.
Esta m odalidade de orikis ocupa im portante lugar na oralidade io-
rubá, sendo usada em m uitas situações sociais: em cerim ônias com o casa­
m entos e batizados, nas inaugurações de casas e nos ritos fúnebres, entre
tantas outras. Os conhecedores da história e dos orikis das linhagens são
convidados para que se possa prestar homenagem aos presentes, através da
recitação de seus oriki-orílè. Muitas vezes a hom enagem se completa pela
entoação dos oríki-àmútçrunwá, que fazem referência a circunstâncias de
nascim ento das pessoas. Crianças gêmeas, por exemplo, são saudadas atra­
vés do oriki-orílè de sua linhagem e do oríki-àmútçrunwá especialmente
dedicado aos gêmeos.
Nos ritos realizados por ocasião da m orte de anciãos, a homenagem
ao falecido inclui a entoação de oriki-orílè feita por mulheres da família.
Nos rituais de orò-ipá-odç, realizados por ocasião da m orte de caçadores,
ocorre o mesmo. Através da entoação do oriki-orílè pretende-se saudar o
falecido e atrair sua presença. Os familiares, sentindo a presença do faleci­

330
do, caem em prantos. Nas conquistas, os oríki-orílç são entoados para que
a pessoa, ouvindo os feitos dos ancestrais e sentindo-se protegida por eles
possa sentir-se mais forte e ter mais coragem para enfrentar dificuldade:
e riscos. Nas situações de perda são entoados para consolo e nas viagem
são entoados pelos anciãos para abençoar os que partem , relem brando sue
origem familiar, as profissões de sua linhagem e os ewós familiares. Nas re­
lações entre pais e filhos, os oríki-orílç e os oriki-àmútçrun ira são usados
para acalm ar a criança que está chorando, para pedir desculpas ou pari
transm itir força. Nos rituais de circuncisão são entoados pelos anciãos
para que os ancestrais, com sua presença, am enizem a dor ou a façarr
suportável.
Oríki-àmútçrunwá é, com o dissemos, o nom e dos orikis que rela­
tam ocorrências do nascim ento individual. Há, conform e o m encionado
orikis para saudar gêmeos, para saudar crianças nascidas logo após uir
parto de gêmeos (Idòw ú), para saudar crianças nascidas com o cordãc
umbilical à volta do pescoço (Àiná) ou nascidas com apresentação dos
pés (Igò).
Lembremos, por fim, que existe uma relação entre oríki-orílç e ilà-
ojú, as marcas faciais: am bos servem para identificar linhagens, consti­
tuindo, pois, sinais de identidade familiar e marcas de identidade pessoal
Quando uma pessoa que possui certas marcas faciais chega a um a cerim ô­
nia pode ser recebida com a entoação de seu oríki-orílç. observando suas
marcas faciais os presentes reconhecem a linhagem à qual ela pertence e
podem saudá-la com o oríki-orílç correspondente. Assim vemos que uma
pessoa pode ser identificada por sua marca facial, seu oríki-orílç, seu oriki-
àmútçrunwá e seu nome.
Animais, cidades, terras e povos também têm seus orikis. Por exemplo
o oriki do javali diz:

Àhúlçdçlcpn
Animal que cava o chão

Kókó b 'ojú jç
Animal de olhos remelcntos

Um dos orikis da cidade de Abçòkúta inform a sobre a geografia da


região - cidade cercada de pedras; outro traz inform ações sobre a história
- serviu de esconderijo em períodos de invasão; outro ainda, sobre aspectos
de ordem espiritual - está sob a proteção de Olumó:
Abçòkúta, i/ú $gbá.
Abeokutá, a cidade dos egbá.

ilú li gbogbo ilé s ’òkúta.


Cidade cercada de pedras.

Òkúta ò wçn n 'ilé wa.


As pedras são abundantes em nossa terra.

À wa I ’çmo Olúmç.
Somos filhos de Olumó.

A bç Olúmç, ibi á fí ori mo si.


Debaixo da pedra Olumó, onde nos escondemos
(nas épocas de invasão).

Os orikis são acompanhados, muitas vezes, pelo som dos tambores


falantes: bàtá, bçmbç, gángan, ògidigbó, igbin2 e gbçdu, entre outros. Con­
vém que façamos um a breve referência a esses tam bores. A seu respeito, diz
J. Ki-Zerbo:

Veículos da história falada, esses instrumentos são venerados e sagrados. Com


efeito, incorporam-se ao artista, e seu lugar é tão importante na mensagem
que, graças às línguas tonais, a música torna-se diretamente inteligível, trans­
formando-se o instrumento na voz do artista sem que este tenha necessidade
de articular uma só palavra. O tríplice ritmo, tonal, de intensidade e de dura­
ção, faz-se então, música significante. (...) Na verdade, a música encontra-se
de tal modo integrada à tradição que algumas narrativas somente podem ser
transmitidas sob a forma cantada. (Kl-ZERBO, 1982, p. 30).

O bàtá, tam b o r sagrado tocado com duas varinhas, é usado no


culto aos orixás, sendo o preferido de Xangô. O bçmbç , tocado com
um a ú nica varin h a, é o preferido de O xum . O gángan e o ògidigbó são
tam bores sagrados, sendo este últim o p en d u rad o no om bro e percuti-
do com um a vara para m arcar a cadência dos cantos rituais. O igbin
é usado para aco m p an h ar cantos em hom enagem a O batalá, o orixá
da criação, divindade que m odelou o hom em . O gbçdu é usado para
an u n ciar a m orte de reis.

: Não confundir com igbin, o caracol da terra.

332
F.ntoados com finalidade religiosa ou não, acom panhados ou não
pelos tambores falantes, os orikis sempre contam com a atitude de respeito
e de concentração dos presentes.
Além dos orikis, são utilizados os ibà' para saudar e evocar, entre
outros, orixás, ancestrais, mestres e anciãos. Antes de qualquer oferenda a
um orixá, por exemplo, antes m esm o da entoação de seus orikis, realizam-
se saudações cuja finalidade é obter auxílio e proteção para a realização do
destino humano. Espera-se, através desse gesto de respeito, favorecer o acesso
à força vital. Quando dirigidos aos mais velhos constituem sinal de respeito, e
quando dirigidos aos ancestrais solicitam permissão para iniciar algo.
Ainda com a intenção de favorecer a veiculação do axé e propiciar as
graças dos orixás, são realizadas orações - àdúrà. Sob a form a de súplica,
as orações são utilizadas para agradar os orixás, fazer pedidos, aplacar sua
ira. Também são dirigidas aos ancestrais para que afastem doenças, intrigas
e má sorte. Em cerimônias com o batizados e casamentos, são verbalizada
pelos anciãos. Com o o intuito é de atrair o axé, aos anciãos, sacerdotes e
pais fica reservado o principal papel de sua entoação. Enquanto o ancião
vai rezando, os presentes acom panham dizendo A se, expressão que signi­
fica assim será (assim ocorrerá, assim acontecerá), e cujo objetivo é o de
consagrar tudo o que for sendo dito.
Algumas vezes as rezas são acom panhadas pelo uso de água, de obi
ou de algum outro elemento. Q uando se utiliza água, ela é derram ada no
chão logo após o térm ino da reza, todos os presentes a tocam e, em seguida,
tocam a própria testa e o próprio umbigo, estabelecendo, assim, um a liga­
ção física com os elementos transm issores de axé. No caso do uso de obi,
este é repartido entre os presentes para que todos com am um pedaço.
Vejamos alguns orikis, aduras e ibás de Exu, apresentados em iorubá
e, logo em seguida, em português. C om entários elucidativos, grafados em
letras de tam anho m enor e com recuo maior, acom panham o texto trad u ­
zido para o português.

Oríki Èsú (1)


Èsú çta òrisà.
Osççtúrã ni orúko bàbá m ç ç>-
Alágógo ijà ni orúko iyá npè ç,
Èsú Çdàrà, omçkúnrín idç>lç>fin,

3 Considerando que o vocábulo ibà vem sendo consagrado pelo uso. a partir daqui passaremos a acentuá-
lo de x o rd o com seu som em português - ibà - e a flexioná-lo sempre que figurar em contexto desse
idionu.Valc o mesmo para o vocábulo àduni que no contexto do idioma português será grafado atlum

333
O lé sónsó sí órí çsç çlçsè. 5
K ò jç k í çni njç gbc mi.
A kii lówó lái mú ti Esú kúrò,
A kii Iáyç lái mú ti Esú kúrò,
Asçntún sc òsi lái ni iijú.
Esú àpáta sçm ç olçm ç lénu, 10
O fí òkútn dipò iyç
Lóògçmç çrun, a n/a kálú,
Páàipa-wàrá. a túká másesà,
Esú máse mi. omo e/òmiràn ni o sc.

Evocação dc Exu (1)


Exu, o temido dos orixás.
Tem ido por exercer a função dc fiscalizador dos rituais.
Osççtúrá c o nome pelo qual você é chamado por seu pai.
Ochéturá é um nom e m ítico que explicita a am izade entre Exu e Orunm ilá. E tam­
bém o nom e sagrado pelo qual é evocado durante a realização dc ebós, para que seja
ágil no transporte e na condução do ebó ao seu destino. .
Alágógo-íjà é o nom e pelo qual você é chamado por sua mãe.
Al.tgogô-ijá significa Dono do sino da discórdia. A ausência dc seu axé favorece a
desordem no plano individual e social. Q uando um a pessoa está agressiva, fora de
controle, causando confusão, ou quando pessoas estão brigando, se diz que Exu está
tocando seu sino da discórdia nas proximidades. Nas orações dirigidas a Exu pede-
se que não toque esse sino no lar dos que oram.
Exu Òdàrà, homem forte dc Ídç>Iól1n.
Odara: O Benevolente; Aquele que faz o bem.
Exu, que senta no pé dos outros. 5
Senta nos pés dos outros para im pedir seu m ovim ento.
Que não come e impede aos que estão comendo que engulam o alimento.
Q uem não tem im pede os que têm de usufruir seus bens. Se não com e, não permite
que outro coma.
Quem tem dinheiro, reserva para Exu a sua parte.
Reservar a Exu a parte que lhe com pete é condição para obter sua proteção e receber
dele a sabedoria necessária à preservação do que sc tem.
Quem tem felicidade, reserva para Exu a sua parte.
Reservar a Exu a parte que lhe com pete é condição para obter sua proteção e receber
dele a sabedoria necessária à preservação do que se tem.
Exu, que joga nos dois times sem constrangimento.
Refere-se à qualidade que Exu tem de ser mediador.

334
Exu, que faz uma pessoa dizer o que não quer (revelar segredos). 1>
Exu tem o poder de agir sobre a vontade das pessoas c de interferir posilivam ent
cm seus pensam entos.
Exu, que tem pera com pedra em vez de sal.
Dem onstra seu poder de transform ação. No caso, tem o poder de fazer com qu
uma pedra substitua a função do sal. Graças a seu poder uma pedra pode conferi
aos alim entos o sabor do sal.
Exu, o indulgente filho de E ledunm are, cuja grandeza se m anifesta po
toda parte.
Exu, o apressado, o inesperado, q u e rom pe-em fragm entos que não s
poderá reunir.
A força desagregadora de Exu, força de ruptura e destruição, se manifesta quand
sua ira é provocada. Essa ira, difícil de aplacar, é provocada quando as leis da naturc
za são infringidas. N ão há barreiras para a sua ação (rc)organizadora.
Exu, não me deixe desprovido do seu axé. Deixe desprovido o filho d
outra pessoa.
Se alguém deve ficar desprovido do axé de Exu que não seja eu, e sim o filho de outr
pessoa. Q ue eu não fique desprovido das virtudes de Exu - ordem , disciplina, orga
nização, paciência... Se alguém deve ficar desprovido dessas virtudes, que não sej
eu, e sim o meu oponente. A expressão filho de outra pessoa reporta á ideia de qu
outra pessoa sempre é filha de alguém e pertence, portanto, a uma determ inada li
nhagem familiar. Esta afirm ação carrega a intenção de atingir a força vital do adver
sário em sua raiz, dado que a fonte de força vital de alguém é a sua ancestralidade.

Oríki Èsú (2)


Esú Láàlú,
Okirí òkò
Èbitá çkúnrin,
A bá ni wçràn,
Bi à ò ri dá, !
Olçpa Eicdúnmarè láéláé.
Ó sán sòkòtò pénpé,
Onibodc Olçnm.
Ó sún nilc fògç ti kún.
Èsú lóji. 11
Qgo kòji.
Ebora ti njé Látççpa.
O bá çlçkun sunkún.
Kçrú â ba çlçkún.

335
plçkún n sunkún, 15
Láaróyè n snn èjç.
Ò bá onimími mí,
Kçrú ó ba onimími.
Onimími n fim ú mi,
Láaróyè n fi gbogbo ara m i bi Àjére, 20
Èsú má sc mí, onio çlòmirán ni o se,
Nítorí eni Esú bá nse kií mç.
Di o bá fi ohun, tirç silè,
Ohun olólnm nií máa wá kiri.
Èsú Çdàrà, 25
Orí m í kò ni jç k i j ç k i cm i ri ibínú rç.

Evocação dc Exu (2 )
Exu Lalú .. •-
Lalú: O Famoso; Aquele que harm oniza a cidade ou a com unidade e é popular entre
as pessoas e os demais orixás.
Òkiri Òkò
Guardião da cidade e das hortas (guardião do alim ento); Guardião da zona urbana
e da zona rural.
Èbità Çkúnrin
Homem forte, invencível, intocável.
Exu, que traz problemas ao hom em
Quando o hom em não tem problemas. ■" 5
A força de Exu pode influenciar negativamente a vida humana, quando alguém a
manipula contra um adversário. Também sc considera com o influência negativa de
Exu a ausência de seu axé c dc suas virtudes na vida de uma pessoa.
O inspetor dos rituais de Eledunmare, desde os prim órdios.
Exu am arrou um pedaço de pano na cintura.
Amarrar uni pano na cintura significa estar sempre de prontidão para agir.
Guardião do portal de Eledunmare.
Guardião dc todas as portas e portais, inclusive os do próprio Eledunmare.
Ele dorm e em casa e tranca a porta com seu porrete.
Lembremos que o porrete de Exu, em sua nuca, lhe confere visão do que está loca­
lizado atrás e do que foi vivido no passado. Protege de ataques feitos tam bém pelas
costas c age sobre ocorrências passadas. A o trancar a porta com seu porrete defende-
se dc possíveis ataques, o que evidencia sua capacidade de antever acontecim entos c
o fato dc ser precavido, cauteloso, prudente.
É Exu quem acordou. 10

336
f

Exu está desperto, de vigília.


Seu porrete continua adormecido.
O seu porrete fica com o um a brasa coberta: basta soprar para que a cham a seja
avivada. Seu poder de defesa e ataque c mantido em sigilo, o que evidencia outra de
suas virtudes.
O venerável que é cham ado Latopá.
Latopá, Aquele que tem força para matar.
Ele, que chora com a vítima
A ponto dela se surpreender com a sua preocupação.
A preocupação de Exu com o problem a de alguém que está sofrendo é tão grande
que chega a surpreender. Exu vive intensam ente os problem as dc seus devotos e age
incessantemente pra solucioná-los.
A vítima está derram ando lágrimas. 15
Laroiê está derram ando lágrimas de sangue.
I.aroiê: Aquele que é louvável; Aquele cujo nom e é sem pre lem brado; Aquele que
traz sentido à vida. Q u an do Exu estabelece empatia com alguém que sofre, em pe­
nha-se mais que a própria vítim a para solucionar o problema.
Ele, que respira junto com a vítima
A ponto dela se surpreender com a sua preocupação.
Assum e de m odo surpreendente o problem a de uma pessoa. Respira junto, com par­
tilhando intim am ente esse sofrim ento, até reunir condições de superação.
A vítima está respirando pelas narinas
Laroiê está respirando pelo corpo inteiro, com o um a peneira. 20
Enquanto a vítim a observa o seu problema sob determ inado ângulo, Exu explora
todas as possibilidades de entendim ento do problema e todas as possíveis soluções.
Exu, não me conduza ao mal. Conduza ao mal os meus inimigos.
Pede-se o axé de Exu para não ocorrerem desvios no cam inho da vida. Sc alguém
tem que se desviar ou se perder que não seja eu, e sim o meu inim igo. Entendendo-
se por inim igo não apenas um a pessoa, mas qualquer circunstância adversa.
Pois quem está sendo conduzido ao mal por Exu não sabe disso.
Q uem estiver privado do axé de Exu fica desnorteado sem perceber a causa dc sua
desorientação.
Quando ele deixa os próprios interesses
Vai cuidar de interesses alheios.
Exu chega a abandonar os próprios interesses para cuidar de interesse alheio.
Exu Odara, 25
Qdara: O Benevolente.
Meu ori não vai perm itir que eu fique desprovido do teu axé, nem experi­
mente a tua fúria.

337
M eu ori vai m e proteger para que eu não perca a tua proteção, nem deixe de
p artilh ar con tigo as tuas virtudes. A perda da proteção de Exu acarreta uma
d içã o de v u ln erab ilidade a ataques inim igos.

O rík i È su (3 ) m*' '


Èsú o. Èsú Çdàrà
Èsú Láàlú ògiri òkò
A jçngçlç çkúnrín ogun
Agó-n-gó çgç
Bàrà ti n jç Látoçpa
A ló ju nítç tí im ú sunkún 5
Abáni lálcjò bi ogun dó tini.
A báni wçran bá ò ri dá
Ò gbégi sòòsò bojú owó
Ò kçsç çlçsè bç sçòlç
10
Jçjç lelékún ri sunkún
Láaróyè dé bç ó n sun èjè
Jçjç lonínú ri su nú
Láaróyè dé Ibç ó n sú fun.
Jç jç lonijà n jà (
Láaróyè dé bç ó y o çbç
Èsú láàlú ókiri òkò
Láaróyè (Sbçra tí n j ç Látççpa
Çkúnrín kúkúrú. okúnrin gôgòrò -- •
Çkúnrín pékç bi òrí àtàná '“ Hí r ^
A y i kçndú si çyin çlçyin
Ó sçrç àná dçní
K i ojúmç ó tóó m ç
Tàkúté kakaka
Èbiti kakaka
$biti ti ó gbójú ò lè pa igbin
Pàtákò çkún kakaka nii ta ajá Içnu
Èsú má se m i o
Çm ç elòmii ni o se o.

Evocação dc Exu (3)


Oh! Exu Odara!
Odara: O Benevolente; Aquele que faz o bem.
Exu Lalú, o forte.

338
T
Lalú: Forlc, Famoso, Popular.
O hom em poderoso que se transform a. O homem da guerra.
O forte cuja força traz vitória.
Bará que se chama Latopá. 5
Bará: Aquele que age rapidam ente; Forte; Eternamente Vigoroso.
Latopá: Aquele que tem força para matar. Refere-se á ausência de princípios, o qui
destrói o hom em , pois quando uma pessoa não segue os prin cípios fundam entai;
para o progresso das relações hum anas fica exposta à m orte (não apenas 110 sentide
físico).
------ E xu, que-não deixa suas lágrimas correrem pelos olhos, e sim pelas narinas.
Essa expressão denota a capacidade que Exu tem de disfarçar-se. D enota também
tratar-se de um ser com m anifestações próprias, distintas das m anifestações de o u ­
tras divindades.
O visitante que chega como um a guerra.
Visitante ágil, rápido, de atitudes intempestivas. Um visitante que chega co m o uma
guerra porque chega para resolver problemas ou para criá-los, dependendo de quem
manipula a sua força. Suas características, por não serem com preendidas, podem
atemorizar.
Ele, que arrum a problem as quando não há problemas.
Arruma problemas desde que alguém manipule o seu axé com essa finalidade. O utro
sentido dessa expressão é o de que Exu, por assinalar as deficiências e os erros das
pessoas, explicita problemas que não haviam sido reconhecidos antes. Q u an do uma
pessoa se dá conta dos problem as que tem é com o se eles passassem a existir no
m om ento em que ocorre a tom ada de consciência.
Ele, que conhece os obstáculos à conquista de prosperidade.
Pode criar obstáculos à conquista de prosperidade se o seu axé for m anipulado com
esse objetivo, do m esm o m odo que pode remover tais obstáculos.
Ele, que cria problemas 11a vida das pessoas e os resolve. 10
Sua ação depende de quem m anipula o seu axé: cria problem as ou os soluciona.
O u tro sentido dessa expressão é o assinalado acima: quando uma pessoa se dá conta
dos problemas que tem é com o se eles passassem a existir no m om en to em que
ocorre a tomada de consciência. Logo após a tomada de consciência, Exu ajuda a
resolver esses problemas.
Quando a vítima está chorando em seu canto,
Laroiê se aproxima e derram a lágrimas de sangue (chora por ela).
Estabelece empatia com quem está sofrendo c se em penha mais que a própria viti­
ma para solucionar os problem as. Exu dirige-sc ao encontro da vitim a que, em seu
canto, não está fazendo m ovim entos para superar as adversidades.
A vítima está com dor de barriga

339
Laroiê sc aproxim a e fica com dcsinteria.
A emp.it ia estabelecida com quem está sofrendo faz com que Exu com preenda pro­
fundamente o sofrim ento, suas causas c conseqüências e sofra junto com a vítima
sofrendo até mais que ela própria. Exu realiza o m ovim en to de ir ao encontro de
quem sofre.
As pessoas estavam brigando num cánto, 15
Laroiê chegou e puxou a faca.
Exu intervém a favor de quem lhe pede auxilio. A faca possibilita o sacrifício, que é
apaziguador e leva à vitória. Puxou a faca c uma metáfora que remete ao significado
do sacrifício ritual com o recurso de apaziguam ento ou de conquista da vitória.
Exu Lalú, o hom em forte.
Lalú: o Famoso; o Popular; Aquele que harm oniza a cidade ou a com unidade.
Laroiê, o venerável, que se chama Latopá.
Hom em baixo, hom em alto.
Esses designativos referem-se a seu poder de transform ação. Assinalam o fato dc ele
ser dotado de múltiplas possibilidades, inclusive algum as que são aparentemente
contraditórias. Refere-se tam bém à sua versatilidade e ao fato de ele poder estar
simultaneam ente em mais de um lugar.
Hom em hábil que se m ovim enta como o vento. 20
E pousa nas costas dos outros.
Exu acom panha as pessoas, protegendo-as. Realiza isso com agilidade e precisão
admiráveis.
Que traz acontecim entos do passado para o presente.
Invisível, com m ovim entos rápidos, Exu age ás costas das pessoas (costas tanto no
sentido daquilo que está situado atrás e não se pode ver com o no sentido dc ocor­
rências do passado). Ativa as memórias do passado e atualiza inform ações no pre­
sente. C orrige erros e deficiências do passado para sanar dificuldades do presente.
Antes de amanhecer
Ele se m ovim enta com todo o seu poder.
Enquanto as pessoas ainda estão dorm indo ele já se põe em ação. Toma iniciativas
antes mesm o de as pessoas despertarem para os próprios problemas. Percebe anteci­
padamente os acontecimentos, graças à sua relação com Qloj(>, e atua no sentido de
prevenir ocorrências desfavoráveis. Manifesta o seu poder antes do início de novos
ciclos, antes das iniciações, antes do início de uma nova fase na vida dc seus devotos.
H om em grande, que ocu p a todo o espaço, esten d en d o -se com o im en­
sa arm ad ilh a. 25
Permanece sempre de prontidão para reagir ao m ínim o ataque, com o se fosse uma
armadilha estendida por todo o espaço, e que reage ao m enor m ovim en to agressivo
vindo de fora. Sua ação de defesa é ilimitada e eficiente.

3-10
]

Uma arm adilha frágil não caça igbin.


É preciso sabedoria para com preender Exu, isto é, para apreender (intuir) a sua
natureza. C om o o anim al de referência aqui utilizado é o igbin , com preende-se que
nesta evocação é feita uma referência á serenidade de Exu durante sua ação.
Quando a patada do leopardo atinge a boca do cão, sua dor se expande por
todo o corpo.
A reação de Exu a um a agressão é feita de m odo a atingir estrategicam ente a princi­
pal fonte de força do adversário. Assim o inim igo é desarm ado, tem sua força esva­
ziada e é sim ultaneam ente im obilizado pela dor.
Exu, não me deixe desprovido do seu axé.
Deixe desprovido o meu inimigo.
Se alguém deve ficar desprovido do axé de Exu, que não seja eu, e sim o meu ini­
migo. Q ue eu não fique desprovido das virtudes de Exu - ordem , disciplina, orga­
nização, paciência... Sc alguém deve ficar desprovido dessas virtudes, que não seja
eu, e sim o meu oponente. Lembramos que se entende por inim igo não apenas uma
pessoa, mas qualquer circunstância adversa ou, ainda, a própria pessoa que, por
vezes, é inimiga de si mesma, dadas as suas fraquezas pessoais. D esprovido do axé
de Exu, o adversário enfraquece. Essa afirm ação carrega a intenção de atingir a força
vital do adversário em sua raiz.

Oríki Èsú (4)


Èsú Òdàrà
Òti balúwè gun esin wçlé
Arábándé olóko idi óró
Bàrà, olówó ni í mçbç
Tabiri gbçngbçn, a bá oníjà ira kúm ç 5
Èsú má sc mi. çlá ni ó se
Eni Èsú bá nsc k ii m ç
Bó o fowó tíè sílè
Owó olówó n i máa nwá kiri
Eni ti Èsú bá nse kii mç 10
Bó faso tiè sílè
A so aláso niim áa nwá kiri
Láaróyè má se m i
Qtá, çtá m i ni o se
Èsú ò re ibi ijá, ó ríi súsúsú 15
Eni ó péw e Èsú Qdárà ni da ti è nú.
Èsú Qdárà mo péw e rç,
Èsú Òdàrà gbè mi. má j ç temi ó dànú

1
Evocação de Exu (4)
Exu Odara,
Odara: O Benevolente; Aquele que faz o bein.
Que vai do banheiro pra dentro de casa m ontado num cavalo.
Esteja 110 pon to em que estiver, Exu pode sc deslocar para qualquer outro lugar com
nobreza, força e agilidade, de m odo criativo, original, não convencional. Para Exu
não há barreiras intransponíveis.
Arábándé, proprietário de um a horta repleta de árvores frutíferas.
Arábándé: Aquele que chega com todo o vigor de seu corpo. A expressão proprie-
lano de uma horta repleta de arvores frutíferas refere-se a seu poder dc propiciar
fecundidade e alim ento às pessoas.
Bará, quem tem dinheiro para fazer ebó é que sabe o seu valor.
Bará: Aquele que age rapidamente; A quele que é forte c eternam ente vigoroso. So­
m ente quem dispõe dc recursos para realizar o ebó é que poderá conhecer os bene­
fícios desse ritual. Associa-se a esse significado o seguinte; quem tem sabedoria para
reconhecer o valor do ebó o realiza.
O hom em que está sempre alerta e ajuda quem está brigando a achar uma
força de defesa. 5
Exu, sempre alerta, ajuda o hom em que está cm litígio a se defender, tanto das agres­
sões que chegam pela frente (ou estão no presente), com o daquelas que chegam
pelas costas (ou vêm do passado).
Exu, não me deixe desprovido do seu axé: deixe desprovidos os meus ini­
migos. tié
Se alguém deve ficar desprovido do axé de Exu, que não seja eu, e sim o meu ini­
migo. Q ue eu não fique desprovido das virtudes de Exu - ordem , disciplina, orga­
nização, paciência... Sc alguém deve ficar desprovido dessas virtudes, que não seja
eu e sim o meu oponente. Lembramos que se entende por inim igo não apenas uma
pessoa, mas qualquer circunstância adversa ou, ainda, a própria pessoa que por ve­
zes é inimiga de si mesm a, dadas as suas fraquezas pessoais. D esprovido do axé de
Exu, o adversário enfraquece. Esta afirm ativa carrega a intenção de atingir a fSrça
vital do adversário em sua raiz.
A pessoa que está desprovida do axé de Exu nem sem pre sabe disso.
Estando desprovida do axé de Exu, a pessoa deixa a própria prosperidade
E sai em busca da prosperidade alheia.
Desprovida do axé de Exu, a pessoa perde o bom -senso e, em vez de cultivar as
próprias possibilidades, fica invejando as conquistas alheias: deixa de viver a própria
vida para ficar assistindo e invejando a boa vida dos outros.
A pessoa que está desprovida do axé de Exu nem sem pre sabe disso. 10
Estando desprovida do axé de Exu, a pessoa deixa a própria roupa

342
E sai cm busca da roupa dos outros.
Desprovida do axé de Exu a pessoa perde o bom -scnso e. cm vez d c cuidar dc si
mesma, fica invejando os cuidados que outros proporcionam a si. Em vez de dedicar
atenção a si mesma e valorizar o próprio ori, fica com sua atenção voltada para os
cuidados que outros proporcionam a si mesmos.
Laroiê, não me deixe desprovido do seu axé.
Deixe desprovidos os meus inimigos.
Exu que vai ao local da briga e, ali chegando, luta vigorosam ente. 15
Quem não louva Exu põe a perder a própria sorte.
Exu ©da ra, eu-te-Iouvo;----------------------------------------------------------
Proteja-me para que eu não perca a m inha sorte.

Oríki È su (5)
Çkúnrín gbirigidi lorúko Èsú Çdárà
Èsú alápo ikú
Èsú Olófà àrún
Èsú tí ó fi àiri ilé gbé
Tó mú ilé ré sójú òde gbangba 5
Ikóríta ni t 'Ayé
ikórita ni t ' Èsú-
Çni a kàn mçlç tapo si
Èsú tó dààmú onilé dààmú àlcjò

Evocação de Exu (5)


Homem forte e bondoso é o que significa a expressão Exu Odara.
Exu, que tem poder sobre a m orada da Morte.
Exu tem o poder de dialogar com a M orte e im pedir que ela atue. Exu transita no
m undo dos mortos e age cm seu auxílio. Também favorece a relação entrevivos e
monos. Por com preenderm os que a m orte ocorre não apenas com as pessoas, mas
tam bém com situações, com ciclos, com estágios, constatam os que a referência ao
fato de que a ação de Exu incide sobre a morada da Morte pode ser entendida com o
relativa a seu poder de ação sobre fatos, circunstâncias, estágios e ciclos m ortos ou
em processo dc morte.
Exu, que tem arm a dc combate às doenças.
Exu tem o poder dc livrar as pessoas de doenças e adiar a data da morte.
Exu, que não querendo fixar sua m orada em qualquer lugar
Decidiu fixá-la na frente da casa, da feira e da cidade, para ser guardião
desses lugares. 5
Exu é o guardião de tudo o que ocorre em casa, na feira e na cidade, ou seja, zela

343
por todos os espaços, processos e m ovim entos (interações e trocas) e por tudo o
que acontece nesses locais, especialmente nos lugares de passagem de um espaço a
outro.
As encruzilhadas pertencem às Iyami Oxorongá.
As encruzilhadas tam bém pertencem a Exu.
As encruzilhadas são o local dc m orada, de encontro e de interação com Exu e com
as Iyami Oxorongá.
O Venerável, que é assentado na terra, c sobre ele se coloca dendê.
C om o o dendê neutraliza energias negativas e acalma ânim os, favorece a apreensão
do significado dos acontecim entos. Exu, ao receber dendê, adquire condições para
neutralizar as energias negativas, revigorar as positivas c favorecer a apreensão do
sentido das ocorrências, ou seja, propicia condições para que a pessoa julgue com
discernimento.
É ele que influencia tanto o dono da casa como o seu hóspede.
Exu age com imparcialidade.

Oríki Èsu (6)


Èsú Láàlú
O kiri òkò
libitn Okúnrin
O sún sile fí ògo ti Jçkún
Akógo 5
Arógo
Asúngbçrútçmçlo nínú oko
Bàrà ti o lóògún ikà,
Tó sç ilé :ina rç dalioro
Bónimi bá n sum i 10
Láaróyè a máa sú fim
Èsú má se mi, dúró ti m i

Evocação de Exu (6)


Exu, o famoso.
O venerável Senhor das Hortas.
A expressão Scnlior d;is Hortas indica o seu poder de proporcionar alim ento e ga­
rantir a sobrevivência.
O hom em venerável,
Que dorm e em casa e tranca a porta com seu porrete.
Lembremos que o porrete de Exu, em sua nuca, lhe confere visão do que está loca­

3-14
lizado atrás e do que foi vivido no passado. Protege de ataques feitos tam bém pelas
costas e age sobre ocorrências passadas. Ao trancar a porta com seu porrete defende-
se de possíveis ataques, o que evidencia sua capacidade de antever acontecim entos e
o fato de ser precavido, cauteloso, prudente.
Ele, que traz a vitória. 5
Ele, que exulta com a vitória alheia.
Ele, que dorm e tranquilam ente nas hortas e nas florestas.
Exu permanece sereno e tranqüilo em qualquer local e em qualquer circunstância.
Essa evocação enfatiza sua relação com a terra c tudo o que ela produz.
O Bará que não utiliza a magia do mal,
Mas, mesmo assim, esvaziou a casa dos parentes de sua esposa.
O poder de Exu é neutro. No contexto dos parentescos por afinidade é enfatizado
que o seu princípio vital pode ser utilizado para arruinar uma estrutura fam iliar (ou
qualquer outra estrutura).
Quando alguém que Exu ajuda a respirar tem dor de barriga 10
Exu defeca por ele.
Exu é solidário com quem sofre e absorve o sofrim ento físico de seu protegido. O b ­
servemos que a expressão utilizada é Exu defeca p o r ele, e não Exu defeca com ele.
Exu, não me atrapalhe, fique comigo.
A ausência ou o afastam ento de Exu dificultam o andam ento da vida das pessoas.

Oríki Èsú (7)


Èsú Láálú
Atóbájayé elcgbèjc àdó
Oroko níjç çbç> le
Èbita çkúnrin nlç ninú çpa oko
ípàkç rç nhàn Urina, òpç wípé omç ga 5
Èsú olófçç asòtún se òsin
Às eni báni dárò
Èsú má se mi, àwon m ii ni o Io. se o
Íirp tó o se èniyàn ti wçn fí yç> ó lóyè
Sebi iwç náa ló se e ti wçn tún fi padá sidií oyè náà, 10
Láálú má jçç olá temi, ó bó lçw ç m i o
Asçrç lògo
Sòrò çdá dayç
láná owó, áláátiá áti ire gbogbo kó m i
Èsú iwo ló se èniyàn ti ó fi binú so kú 15
iwo náà ló se igi inú igbó
ti inú ti jó o pa.

345
Iw ç ló se èniyàn ti kò li mo iwà In).
Iw ç náà ló tún se çni ti ó di olóri re,
Iwç náà ló tún se èniyàn ti ó di aláànúú 20
lsé dáadáa ni fún mio ó se mí
Èsú Çdàrà gbé /çyin m í o
Èsú láàlú Elçgba adô
Ajibá òwúrú
Àjisà òògún 25
Òrisà ti ó ri bàitá ti njó bámúbámú
—K ir iilú
Olúwa m i àlàmú lamú bàtà
Iwájú iwájú ni k í o máa se çni re kánrin kánrin sí
Èsú kò ni oln '111 rád Içjà 30
Láàlú gbònà ojà Iç>
Esú kò tà míJÕf .*'*'''
Bççni kò mú owó Içwç
A ní jú agbára ní ngun (zlçgbara
Ààpòn ni ó nwa kiri 35
Ògiri òkò
Èbita çkúnrín
Ebora tí njç Látççpa
Ó sán sòkòtò pénpé
Onibodè Elédúnmarè 40
iràwç àkçdá, çm ç Elédúmarè
Ò sún sílé li ògo t 'çkún
À ká rúgúdú kalè 1'orúkç ayè
Okúnrín gbirigidi Iorúko Èsú
Èsú Çdàrà alápo ikú 45
Èsú ç/ófà orita
Láàlú onílé orita
Ikóríta mçtà ni t 'èsú
Olóko idí òró
Omo Elédúnmarè 50
Ó re ibi baba rç wá ba lóòjó
Ó gbayé gbçm n sawo
Tabiri gbçngbçn a bá onija wá kúm ç
Èsú j e orí m i ó gbè m i o
Láàlú má j e won rídií m i 55
Èsú. orí çni ni iise eni.

346
Ti ó ti nláya tirç
Tí ó ti ni isè tirç
È sújç ori m i ó gbè m í o
K i nláya temi 60
K i nsisç temi
È$ú Çdàrà Içgçmç çrun.
Páápá wárá atúká má se sáá
A gbé lçyin olódodo
Gbè lçyin m i o 65

Evocação dc Exu (7)


Exu Lalú
Lalú: O Famoso; Aquele que harm oniza a cidade ou a com unidade e é popular entre
as pessoas e entre os dem ais orixás.
Aquele que tem força suficiente para nos dar vida, o dono dos 1400 adôs
carregadíssimos de magia e poder dc cura.
Adô é um preparado m ágico-m edicinal que fica guardado num a cabaça pequena
em formato de m oringa, m uito usada para esta finalidade. O núm ero 1400 resulta
de 7 vezes 200 , ou seja, sete vezes o núm ero (sim bólico) de divindades. Refere-se,
pois, a um poder total de magia e cura.
Ele que é lembrado e a quem se recorre nos m om entos difíceis.
O hom em forte e alto que, quando estava andando em meio à floresta,
Sua nuca foi avistada de longe. 5
Sua presença, sua im portância e sua energia destacam-se em m eio às energias dos
orixás. Seu poder é percebido e reconhecido à distância, onde quer que esteja e onde
quer que estejam falando dele.
Exu, o flautista, que está sem pre dos dois lados.
Exu, o flautista: Aquele que com unica de m odo harm onioso. Possui a qualidade de
um árbitro que julga com im parcialidade e age de m odo harm onioso, contem plan­
do a necessidade das duas partes e dando a elas forças para que cada uma cum pra
as suas obrigações.
Ao praticar o mal Exu chora junto com a vítima.
Refere-se à pessoa maldosa que, servindo-se da força de Exu, pratica o mal e depois sc
faz de inocente, fingindo solidariedade. Refere-se também , com o no verso anterior, ao
fato de Exu ser um árbitro imparcial que, durante uma contenda, age dos dois lados,
simultaneamente, para que cada uma das partes assuma as suas responsabilidades.
Exu, não faça mal a mim, e sim aos m eus inimigos.
Se alguém deve ficar desprovido do axé de Exu, qu e não seja eu, e sim o meu
inim igo. Q u e eu não fique d esprovido das virtudes de Exu - ordem , disciplina.

347
organização, paciência... Se alguém deve ficar desprovido dessas virtudes, que não
seja eu, c sim o meu oponente. Lem bram os que sc entende por inimigo não apenas
uma pessoa, mas qualquer circunstância adversa ou, ainda, a própria pessoa que,
por vezes, é inimiga de si mesma, dadas as suas fraquezas pessoais. Desprovido do
axé de Exu, o adversário enfraquece.
Foi você que fez mal àquele que perdeu seu posto.
Exu é evocado para m elhorar o caráter das pessoas, favorecer nelas o cultivo das vir­
tudes c, assim, lhes conferir nobreza. A ausência de Exu, e tudo o que ele representa,
faz uma pessoa perder seu posto, ou seja, quando uma pessoa fica desprovida do axé
(e das virtudes) de Exu ela perde sua nobreza, seu posto, seu trono.
Você recolocou a pessoa em seu posto. 10
Através do cultivo das virtudes e das m udanças de caráter e de conduta conquista­
das por esforço pessoal torna-se possível receber o apoio de Exu e reconquistar a
nobreza e o posto perdido.
Lalú, me ajude para eu não perder o progresso conquistado.
Você, que possibilita a conquista da vitória
E faz a vida do hom em repleta de alegria e felicidade,
Abra os meus caminhos para a prosperidade, a saúde e tudo o que há de
bom.
A ausência da proteção de Exu e da prática dc suas virtudes favísrece a perda de vita­
lidade, o desequilíbrio mental ou espiritual e o desinteresse pela vida.
Exu, a falta de tua proteção fez uma pessoa perder o sentido da vida. 15
Exu, a falta de tua proteção à árvore da floresta
a deixou vulnerável à ação do fogo.
A ausência de seu axé e dc sua proteção torna o ser vulnerável. Arvore da florestai
uma metáfora da pessoa em seu grupo social.
A falta dc tua proteção e de tua sabedoria im pede a ação sensata do ho­
mem.
A ausência da sabedoria dc Exu na vida de uma pessoa faz com que lhe seja impos­
sível alcançar a condição dc discernir e de julgar com sensatez. Na vida daqueles já
dotados dessa capacidade, a ausência da sabedoria de Exu os leva a perder o discer­
nim ento c a sc com portar de m odo inadequado.
Foi seu axc que trouxe sorte ao hom em .
Foi seu axé que favoreceu o sentim ento de compaixão no hom em . 20
Faça-me bondoso e completo.
Com pleto no sentido dc reunir todas as qualidades e virtudes necessárias a uma
vida nobre e digna, tanto nas conquistas pessoais quanto no m odo de ser e de se
conduzir.
Oh! Exu Odara! Apóie-me e me acompanhe!

348
Exu Lalú, o dono dos 1400 adôs carregados de magia.
Vòcêé como o dia que amanhece: com esta certeza se pode contar.
Exu é digno de confiança total. Nele se pode confiar coni toda a certeza e dele p o ­
demos receber, sem dúvida algum a, tudo o que necessitamos. D o m esm o m odo
que podemos contar, com certeza absoluta, com o nascim ento do sol a cada manhã,
assim podem os contar com Exu.
Você é o mago poderoso, cujo axé m anipulam os para realizar mudanças. 25
Orixá alegre, que dança ao som do bàtá
Por toda a cidade.
Protetor do meu ori que dança alegremente ao som do bàtá.
Você, que faz crescer quem é seu amigo.
Exu, que não tinha nada pra com prar na feira 30
Mas mesmo assim foi para lá.
Ele, que não tinha nada pra com prar nem pra vender,
Foi para a feira sem levar nem um tostão.
Refere-se à incum bência que Exu tem de colocar ordem nas coisas. Inclui uma reco­
mendação relativa à conduta pessoal: quem não tem dinheiro, não precisa com prar
nem vender, não tem o que fazer na feira, local onde os desejos de consum o são esti­
mulados. Aconselha as pessoas a não avançarem para além de suas possibilidades.
Um intenso dinam ismo move Elegbara.
Isso o faz assertivo. 35
O homem forte.
O homem venerável.
O venerável que se chama Latopá.
Latopá, aquele que tem força para matar.
Que veste calça curta para facilitar seus m ovimentos.
Guardião do Portal de Eledunmare. 40
Primeira estrela a ser criada. Filho de Eledunmare.
Primeiro orixá a ser criado, condição que lhe confere grande autoridade na estrutu­
ra hieráquica dos orixás, dado o princípio da senoridade.
Que dorme dentro de casa e tranca a porta com o seu porrete.
Lembremos que o porrete de Exu, em sua nuca, lhe confere visão do que está loca­
lizado atrás e do que foi vivido 110 passado. Protege de ataques feitos tam bém pelas
costas e age sobre ocorrências passadas. Ao trancar a porta com seu porrete defende-
se de possíveis ataques, o que evidencia sua capacidade de antever acontecim entos e
o fato de ser precavido, cauteloso, prudente.
O nome de aiye é Àká rúgúdú kalç.
Aká rúgúdú kalé refere-se a uma situação na terra que está dem andando ordem,
disciplina e organização. Refere-se a uma situação caótica vivida pelo hom em e que

349
dem anda restabelecimento da ordem.
Hom em Poderoso, que coloca ordem , disciplina e organização, é o nome
pelo qual Exu é chamado.
Exu Odara, o dono da m orada da Morte. 45
Exu tem o poder de dialogar com a M orte e im pedir que ela atue. Exu transita no
m undo dos m ortos e age em seu auxílio. Também favorece a relação entre vivos c
mortos. Por com preenderm os que a m orte ocorre não apenas com as pessoas, mas
tam bém com situações, com ciclos, com estágios, constatam os que a referência ao
fato de que a ação de Exu incide sobre a morada da Morte pode ser entendida como
rtlâliVâ a seu poder de ação sobre fatos, circunstâncias, estágios e ciclos m ortos ou
em processo de morte.
Exu, dono do arco que dispara a flecha e que, estando nas encruzilhadas,
destrói a m orte, a doença e outros inimigos do hom em .
A flecha é aqui considerada um sím bolo de ataque e defesa, e o arco é o elemento
indispensável para o seu disparo. O arco é o impulso, a energia e a flecha, a ação
decorrente. O u seja, Exu detém poder sobre os elem entos que possibilitam o ataque
e a defesa.
Lalú, que m ora fora da casa, na encruzilhada.
Exu é o guardião da casa.
Pertencem a Exu as enrruzilhadas cm T (encontro de três cam inhos).
Senhor das hortas férteis e fecundas.
Filho de Eledunmare. 50
Que rapidam ente vai onde está Eledunmare, seu pai, e rapidam ente volta.
Exu transita entre o m undo fisico e o espiritual com grande agilidade. Refere-se ao
fato de Exu (com o as demais divindades) ser filho do Ser Supremo.
Que faz o seu awó tanto no m undo visível quanto no m undo invisível.
Awô, neste contexto, refere-se a poderes cujos fundam entos são secretos e que po­
dem ser usados em beneficio das pessoas. Exu faz o seu awô tanto no mundo visível
quanto no mundo invisivel, ou seja, transita entre esses m undos para realizar o que
é preciso.
Exu que dá força e poder ao seu iniciado para que ele seja vitorioso nas
brigas.
Exu! Ajude-me para que meu ori me seja favorável!
Lalú! Proteja-me para que ninguém veja o meu fracasso! 55
Que ninguém veja significa Que os fracassos não ocorram.
Exu, é o ori da pessoa que a conduz
Ao encontro de quem está destinado a ser seu com panheiro.
E ao encontro do trabalho que lhe trará sorte e prosperidade.
Não é qualquer com panheiro que traz sorte e satisfação e não é qualquer trabalho

350
que traz sorte e prosperidade. Para a conquista de uma boa relação, seja de que tipo
for, e dc um trabalho realmente satisfatório, é preciso respeitar as leis de predestina­
ção, com petindo ao ori guiar a pessoa nessa busca.
Exu! Ajude-me para que meu ori me seja favorável e me favoreça para que
cu cum pra o meu destino.
Para que eu tcnlia a pessoa a mim destinada (realização sentim ental). 60
Para que cu tenha o trabalho a mim predestinado.
Exu Odara, o poderoso, que tam bém vive no m undo espiritual,
Você, cuja ação rápida e inesperada rom pe em fragmentos que não se po­
derá reunir.-------------------------------------------------------------------------------------
Exu, que apóia o honesto e sincero e sempre lhe dá suporte,
Me apóie e me dê suporte. 65

Oríki Es it (8)
Esú Láàlú, Esú Çdàrà
Èsú Elçgbara o o
Elépo Içnu, pèrò
Láànimç agóngó ósú
Èsú okúnrín çnà. çlçfà ore
Çkúnrín kúkúrú, oríta
Okúnrín gògòrò
Onilé oríta mçta,
A won lyám i òsòròngà
Osççtúrá Òjisé ifá 10
Láàlú ògiri òkò aláse
Fún gbogbo òrisà
Láaróyè o!
Páàpá - wàrà a túká má se sáà.
Ò fí òkúta dípò iyò 15
A fí òògún na olóògún
A kç má gbçbç èké rú,
Láàlú, ma se òtitó gbebo temi rú o
K í nrçlá gbà. k í nrí avç gbà,
K í m i çm ç gbà. k í nrí ire gbogbo gbà: 20
Láti çdç òrisà m i o
Kójé. bççni kó si j ç k i çdalç ti njç gbé e mi.
Èsú Çdàrà a m ç ç o, wípé,
A kíi ni owó lái mú tire kúrò.
A k í luíyç lái mú tirç kúrò.
Ówó çbo rç rèé o, Èsú Qdàrà.
K í o j ç á ní ówó wá pç o,
K í o j ç á ni ayç wa pç o;
Lógemo çrun a n/a ka lu
Èsú Láà/ú a ni ègún lóde çrun
Èsú ní, à a k í ni
A sa pónpó ti opó
Oun náá ni a a k í ni
A fí ipàkç opó ti opó
Opó tí kò gbçràn
Èsú ni e tà a lé Içwç
Èsú 11i 11bá çnikan soso jà,
Tí ó wç inú ilé rç,
Ti ó fí çw ç gún gbogbo ilé nímú
Alágada cvc
Alágbára òrisà ó bá çkànlénirinwó òrisà jà papç
Alágbára nínú gbogbo imalç
Akokolúkç imalç. tí njç láaróyé
Èsú ló sc-babaláwo çjç mçtàdinlógún lógbé /çdç Oya
Èsú F./çgbara náá ló sc Oya
Tí o fí lé babaláwo lái dúró kó ita
Má sc m i o. má lé m i o
Èsú òlàfçé aseni-báni dárò
Láàlú bàbá m i ko sc é dúró dc,
Láàlú bàbá mi. kò sc é sálo fún
Èsú F.lçgbara. a to tisç çbo rán
Láaróyc o!
Olúlànà àwçn ayé
Bàbá mi,
Àjísin
Alásç mi.
Ajímúlò,
Alágbára tilç nínú igbó
Pèlú çpçlçpç imalç
Ògò Baba dé yo gbangba
Èsú Qdàrà bàbá m i gbà m i o
Nítorí baba onio ló lè gba omç o
Ti Èsú òdàrà bá bínú

352
A mu ç>go rç, a ti t 'çkún
A sçç rç a maa io gbogbo ilu. 65

Evocação de Exu (8)


Exu Lalú! Exu Odara!
Lalú: O Famoso; Aquele que harm oniza a cidade ou a com unidade e é popular entre
as pessoas c entre os demais orixás.
Odara: O Benevolente; Aquele que faz o bem.
Oh! Exu Elegbara!
F.legbara: Aquele cujo poder salva; Potente; Poderoso; Aquele que concede poder ao
homem para que seja bem -sucedido.
Que tem dendê na boca para harm onizar as coisas.
Lãàrúmç agóngú ósú,
homem dos cam inhos que dispara flechas de bondade. 5
Homem da estrada por estar sempre nos cam inhos das pessoas, a quem beneficia
disparando flechas de bondade, ou seja, transm itindo profundos sentim entos de
bondade a elas.
Homem baixo das encruzilhadas.
Homem alto,
Estes designativos referem-se a seu poder de transform ação. Assinalam o fato de ele
ser dotado de m últiplas possibilidades, inclusive algum as que são aparentemente
contraditórias. Refere-se também à sua versatilidade e ao fato de ele poder estar
simultaneamente em mais de um lugar.
Dono das encruzilhadas cm T (encontro de três cam inhos)
Que também pertencem às lyami Oxorongá.
Òsçètúrá, mensageiro de Ifá. 10
Òsççtúrá é um nom e m ítico que explicita a am izade entre Exu e O runm ilá. f. tam ­
bém o nom e sagrado pelo qual é evocado durante a realização de ebós, para que seja
ágil no transporte e na condução do ebó ao seu destino.
Lalú, o forte, o Senhor do axé.
Guardião do axé de todos os orixás.
Oh! Laroiê,
Laroié: Aquele que é louvável; Aquele cujo nom e é sem pre lem brado; Aquele que
traz sentido à vida. Q u an do Exu estabelece em patia com alguém que sofre, em pe­
nha-se mais que a própria vitim a para solucionar o problem a.
Rápido como o vento, rom pe em fragm entos que não se poderá reunir.
Refere-se à sua força de ruptura e destruição. Sua ira, uma vez provocada, é difícil
de aplacar.
Que utiliza pedra em vez de sal. 15

353
D em onstra seu poder de transform ação. N o cãso, tem o pod er de fazer com que
uma pedra substitua a função do sal. Graças a seu poder, um a pedra pode conferir
aos alim entos o sabor do sal.
Exu usa a magia preparada pelo feiticeiro contra o próprio feiticeiro.
Faz justiça: faz com que o feitiço vire contra o feiticeiro.
Ele que se recusa a levar o ebó do hom em falso.
Refere-se ã lealdade de Exu.
Oh! Lalú, eu serei sincero, leve o meu ebó.
Para que eu receba prosperidade e felicidade.
E_que_eu_reeeba_tada_sorte-----------------------------------------------------------20"
Vinda do m eu orixá.
Ele que não com e e não deixa o traidor engulir o que está com endo.
Exu não perm ite que o traidor conclua a sua obra, ou seja, interrom pe sua ação
m aldosa e desonesta.
Exu bondoso, nós o conhecemos
Sabemos que não se pode ter dinheiro sem antes separar a sua parte.
Não se poder ter felicidade sem antes separar a sua parte. 25
Exu Odara, aqui está o dinheiro que lhe compete.
Está se referindo ao dinheiro do ebó, ou seja, a parte de dinheiro que com pete a Exu
e que, sendo recebida pelo sacerdote, deverá ser com partilhada com outras pessoas,
de preferências as mais necessitadas.
Para que tenham os dinheiro sempre.
Para que tenham os felicidade sempre.
Exu, o Venerável, cujo nom e é levado para todos os cantos.
Exu Lalú, cujo poder mágico advém do orun. 30
Exu, o louvável,
Que pune o maldoso com sua própria maldade.
Faz com que o venenoso m orra do p róprio veneno.
Ele é o louvável
Q ue faz o maldoso sofrer com a própria maldade.
Q ue o maldoso, que não teme ninguém , 35
Seja entregue na m ão de Exu.
Enfatiza-se, aqui, a sua característica de disciplinador.
Exu briga com um a única pessoa
E, ao entrar na casa dessa pessoa,
Coloca o dedo na ponta do nariz de cada um que encontra para admoestá-lo.
Refere-se ao fato dc ser impossível praticar o mal im punem ente. Significa também
que um mal com etido por determ inada pessoa acarreta conseqüências negativas

354
para aqueles que convivem com ela. Significa, ainda, que Exu interfere para corrigir
erros e adm oestar os faltosos, p or ser um orixá disciplinador.
Ele, que com os seus m odos, encanta a todos. 40
Orixá velho que luta com 401 divindades ao mesmo tempo.
Poderoso entre o s orixás.
O venerável imbatível que se cham a Laroiê.
Foi ele que influenciou o babalaô c o levou a passar 17 dias na casa de Oyá.
Refere-se a um odu de Ifá.
Foi esse m esm o Exu que influenciou Oyá 45
Pra que ela expulsasse o babalaô dc sua casa.untcs de cleTecolher o seu Ifá.
Refere-se a uma narrativa do Odu Corpux em que o babalaô leva sabedoria à casa
de O yá c ela, depois de usufruir o benefício dc seus conselhos, vale-se da astúcia
concedida por Exu para expulsá-lo.
Exu, não me deixe desprovido do seu axé e não m e prive do m eu equilíbrio.
Você, que é dono do apito e chora junto com a vítima,
Oh! Meu pai Lalú, não sc pode experim entar a sua fúria.
Oh! Meu pai Lalú, não se pode ficar privado da sua proteção. 50
Exu Elcgbara, sábio designado por Eledunmare para conduzir o ebó.
N ão se pode experim entar a fúria dc Exu, nem ficar privado de sua proteção, por ser
ele o designado para a condução do ebó.
Oh! Laroiê!
Que abre caminhos às Iyami Oxorongá.
Meu pai,
Venerável, o prim eiro a ser reverenciado pela manhã. 55
Oh! Meu Alaxé!
A laxe): Portador do axé.
A quem se recorre em busca de auxílio.
O poderoso andava pela floresta
Junto com outras divindades
E o seu porrete se destacou em meio ao poder delas. 60
Refere-se ao fato de Exu destacar-se entre todos os orixás.
Exu O dara, meu pai, me apóie!
Porque é obrigação do pai apoiar o filho.
Quando Exu Odara se irrita
Ele tranca a porta com o seu porrete
E sua fala dentro de casa faz a cidade tremer. 65

355
A d tírà - Reza

À d ú rà Èsú
Kò n iijç tiwa o
Qrç ti aò m çw ç mesè
Kò ní j ç tiwa
N í olá Qdàrà kò n í j ç tiwa
Qdàrà má j ç á rçrü 5
Çlçrú ni ò gbé e
Pere ni aó máa y ç
Elçrú ni ó gbé e
Èsú Láàlú o!
Láàlú ológun òdc 10
Olçgo amoyin
Bara olçgç amoyin
Má sc m i lu èniyàn
Má se èniyàn lú m í
Çni tí ó nsc iwájú wájú ní k í ó máa 15
Kó tirç lç

Reza de Exu
Não virão para nós
Os problemas dos outros.
Não virão para nós.
Não virão para nós, com a proteção de Odara.
Odara, não permita que venha para nós o azar dos outros. 5
Se alguém tem um problema, que o carregue.
Cada um deve arcar com os próprios problemas, dificuldades e falta dc sorlc. Deve
também responsabilizar-se p or isso. Não permita que venha para nós o azar dos ou­
tros é um pedido dc proteção para não ser contam inado pela falta de sorte daqueles
com quem convivem os. Lem brem os que o azar, assim com o a sorte, é contagioso.
Sairemos sempre ilesos.
Se alguém tem problema, que o carregue.
Oh! Exu, o famoso!
Lalú, o guerreiro-feiticeiro! 10
Oh! Senhor dos espaços! D ono do poderoso porrete!
Oh! Bará! Não me jogue contra ninguém,
Trata-se dc um pedido de ajuda para a preservação do p róp rio equilíbrio, sem o qual
a pessoa fica exposta a desentendim entos, brigas c disputas.

356
Nem jogue ninguém contra mim.
Trata-se de um pedido de ajuda para que o equilíbrio dos outros seja preservado e
isso nos poupe de desentendim entos, brigas c disputas.
Aquele que estiver d esp rovid o do teu axé e, por isso, m anifestar co m p o rta ­
m ento irresponsável, lev e-o para lon ge de m im .
E que ele siga o seu cam inho, levando a sua carga. 15
Quem tem problemas que os carregue.

Para encerrar este capítulo, apresentam os um iba, saudação a Exu.

Ibà - Saudação

llè çgçré, ibà


Í\vç náà ni a ó k çkç té,
K í á tó tç omi,
Èsú Qdárà. ibà
Ibà ògànjç 5
Ibà àsèsèyç òòrím
Ibà iwç òòrún
ibà akçdá,
ibà asçdá,
Ti nsc çbora ayé 10
Ibà Èsú ni à njú,
K í á tó bo Òrisà,
M o dúró, mo júbà, Èsú
M o bçrç. mo júbà, Èsú
Mo dçbálç, mo júbà, Èsú 15
Mo júbà çkúnrin
Mo júbà obinrin,
Mo júbà omodé,
Mo júbà àgbà
Ibà gbogbo y ín k í nto m ú awo se 20
Mo wá láti wá júbà rç, Èsú
Alágbára aláse çm o Elèdúomarè
Ibà ni tirç Elçgbara
ibà ni tirç o, Èsú
Á ! iwo Elçgbara 25
Ebçra Olówó ijà

357
Asçtún, sôsi,
Lái ní itijú
Esú Qdàrà j ç òwúrç m i ó sàn mi.
Èsú Qdàrà j ç alç m i ó sàn m i 30
Èsú Qdàrà ti njç Látççpa
Elépo lçnu
Qdàrà ti njç Í-Jçgbàrà
A y i kçndú s í çyin, elçyin
Qkünrín çnà, 35
Okirnrin ogun
Onííé orita
Agbà òrisà a sçrç àná di òmiràn
Láaróyè o!
Omi Içrç iná 40
Epo Içrç Èsú
Iba m i náà fún èyin iyá m i òsòròngà
Apani rnáyçda;
Olókiki òru
Ikòrita mçta àyé tòun çrun, ibà 45
Eyin ayé, ç má da ilç m i o
Nkò ní dá ti yín náà o
Eni bá dalç. k i ilç mú loo o
Èsú A láse òrisà
Ou/i ló se alákòso wá 50
Létí odò çdálebcru
Lçgbçyèyé àtipèrègún
Omi odò náà re o,
Kò tii gbç o
Yèyé eti odò náá re o 55
Kò tii gbç o
Pèrègún eti odò nàá re o
Kò tii gbç o
Ewé ori wçn- on kò ti wo eirc o,
Èsú má j ç ori mi. Elçdàá m i 60
O siri m i sílç o.
Mo tún nfíbà fún àwçn çkànlènígba imalç.
Ti wçn nse òjísé Elédúnmarè.
Ibà Èsú Láàlú
Eni ti ç ngba àsç Içwç rè 65

358
jrawç àkçda
Omo Elédúnmarè
Iwo ló pa okç sínú iná
O pa àlè si idi àrò
O tún wá pa iyàwó si çyin ilé
Ibà rç, Èbiti çkúnrín
Má pa mi.
Má si pa èniyàn, sim i Içrún o,
Esú Láàlú. mo vilè
Çrú rç bà mi.
Iwç çbora. olówó ç/ç.
Mo júbà rç o,
Qba àwon imalç
Eni ti kò m ç ç
N í npè ç, ní onikúmo,
Èm i ní orígbémilékè,
Omç Èsú Qdàrà.
K í ohun buríikú ó paradà láyé m i o
Çyin çkànlènigba çbora inú ayé
ibà yín o
M o tún júbà ogànjç,
Ti nsc çm ç iyá òru
Qlçjç òni ibà.
Èsú, gànràngànràn
Ti mo nwò y ií
Ti nsc aya ojú, ibà
Èsú Qdàrà iràwç àkçdá
Scbí iwç ló ni,
À sç çbç Içwç
B í nbá rúbç nkç o?
Jç çbç m i ó dà o
A jçbç. j ç çbç m i ó dà. a jçbo
Mo tún njúbà òórún
Èyí tí nse aya òwúrç kútú
Ori m i
Elédàá m i
ibà rç o
Igi hu nínú igbó
Ori ilç ni
À dá nsisç, ori iiè ni,
Okç nsisç ori ilç ni
Àyànwç) nàá nkç> o,
Ori ilç nàá ni
Lçgbara m o júbà rç o
Má j è ilç y ii óyo,
M ôq m i lçsç o,
Agbada nii ngbç olnin àkàrà,
Légbara wá gbç olwn m i o
Ibà om i n i à njú, k í á tó pa çja
Ibà igbó ni à njú, k í á tó sodç
Ibà náà ni à njú, k í á tó pa çyç
B i çmodé ba dé ibi óró,
Láijuba. àwon lyá-mógún
A won lyá-mógún
Pçlú àse Èsú Qdárà
Wçn a ti ori ç tçlè àpó
Èsú Láálú mo júba rç o
Mo tún júbà çyin iyá m i Òsòròngà
Òpiki elçsç osún
A jçfunjçdç
Èsú, má jç ç àwon iyá-mógún
Fi ori m i tçlè àpó
K í nlè gbó, bí ogbó
K í ntç
K í ojó ayó m i ó dalç o,
Èyin çkànlénirinwó imalè náà nkó q ?
Ibà ni m o njç
Isç kç ni mo rán yín
B í mo tilç rán yin
F má se ài kò j ç m i o
F má gbàigbè m i o,
Àgbàdo k í pa omo kó gbàgbè irúkçrè
Èsú Láálú, ibà rç o
Jç ilé ayé m i ó sàn m i
K í o tú m i nçgçnnègçn
B i omi ódò afòwúrç pon o
Èsú Qdárà kásè nlè,
K i nríbi lo,
Èm i loino àrç gidigbà 145
Ti nbò lónà.
Láàlú, m ájokòó ló m i
K i o má tunjokòó Ic om ç m i
Èsú okirnrin kúkúrú.
Ti n bç I 'çnà ojà 150
Èsú má sc mi, omo çlòmiràn ni o se,
Èsú Láàlú mo júbà rç o
ibà àyé o, ibà Èsú.

Saudação a Exu
Terra, cujo poder sc espalha por todo o universo, cu te saúdo!
É sobre você que se cam inha prim eiro,
Antes de se entrar na água.
Exu Odara, eu te saúdo!
Eu saúdo a madrugada! 5
Saúdo o Sol nascente!
Saúdo o Sol poente!
Saúdo os prim órdios da existência!-
Saúdo os criadores da existência!
Eles são os veneráveis do universo. 10
Eu saúdo Exu, que deve ser louvado
Antes dos demais orixás.
Em pé, cu saúdo Exu.
Agachado, eu saúdo Exu.
Prostrado no chão (dando idçbálç), eu saúdo Exu. 15
Eu saúdo a força vital masculina!
Saúdo a força vital feminina!
Saúdo a força vital das crianças!
Saúdo a força vital dos anciãos sábios!
Saúdo a todos vocês antes de iniciar o awô! 20
Antes de iniciar os rituais.
Venho especialmente saudar você, Exu,
O poderoso, Senhor do Axé, filho de Eledunmare.
Esta saudação é para você, Elegbara!
Oh! Esta saudação é para você, Exu!
Ah! Você, Elegbara, 25
O venerável, que detém em suas mãos o poder de gerar e apaziguar discórdias,

361
Q ue joga tanto do lado direito quanto do esquerdo,
Sem nenhum constrangim ento.
Exu, que está sem pre presente, com imparcialidade, dos dois lados. Tanto do lado do
-•
vencedor quanto do lado do derrotado. £rotege o agressor e a vítim a.
Exu Odara, faça com que m inha m anhã me seja favorável!
Minha manhã: refere-se à ju v en tu d e ou ao in ício de um trab alh o ou de uma
jornada.
Exu Odara, faça com que m inha noite me seja favorável! 30
Minha noite: refere-se à velhice ou à conclusão de um trabalho ou de uma jornada.
— D cnota haver eonseiéncia-e-contato diário com o-fato de a vida ser-organizada em—
ciclos e de ser a m orte um a certeza.
Exu Odara, que se cham a Latopá!
Q ue come dendê.
O dendê neutraliza energias negativas e acalma ânim os, favorecendo, assim, a apre­
ensão dos acontecim entos. Exu, ao receber dendê, adquire condições para neutra­
lizar as energias negativas, revigorar as positivas e favorecer a apreensão do sentido
das coisas, ou seja, cria condições para que a pessoa julgue com discernim ento.
O dara, que se chama Legbára,
Q ue pousa nas costas dos outros.
Pousa nas costas dos outros: expressão cujo sentido é o de acom panhar para indicar
os cam inhos e para defender.
O hom em dos cam inhos. 35
O hom em da guerra,
Guerra, neste contexto, significa todo e qualquer desafio da existência.
Q ue zela pelo tem po e pelo espaço, cuida das casas e das encruzilhadas.
O rixá velho que altera os acontecim entos do passado.
Exu altera acontecim entos do passado, isto e, favorece a recuperação do que foi per­
dido e transforma tristezas em alegrias.
Oh! I.aroiê!
E o poder da água que acalma o fogo. 40
E o poder do dendê que harm oniza e equilibra a força advinda de Exu.
M inhas saudações tam bém a vocês, Iyami Oxorongá,
Q ue m atam sem usar armas.
Refere-se ao poder que as M ães têm sobre a vitalidade das pessoas. As Mães, deten­
toras da vitalidade, da seiva das plantas c do sangue dos anim ais e dos homens, são
detentoras, portanto, de poder sobre a vida e a morte.
São vocês as donas da m adrugada.
Eu saúdo as encruzilhadas, que ligam o m undo visível ao m undo invisível!
M inhas saudações a vocês! 45

362
Iyami Oxorongá, não me abandonem .
Eu tam bém não abandonarei m inha devoção a vocês, nem faltarei com ;
minha responsabilidade.
Aquele que trai a terra, que a terra o leve embora.
Exu, senhor do axé dos orixás,
É quem firmou nosso pacto de fidelidade com a terra 5(
À beira do rio Qdàlçberíi,
Refere-se ao fato de haver sido Exu quem firm ou um pacto das pessoas com as Iya
mi Oxorongá à beira de um rio denom inado Q dàlçbcrü, que significa O traidor si
atemoriza, sugerindo, pois, que todos os que romperem o pacto trem erão de mede
das conseqüências dessa ruptura.
Junto às árvores sagradas y èyé e pèrègún ,
Refere-se ao fato de Exu haver firm ado esse pacto das pessoas com as Iyami O x o ro n ­
gá também na proxim idade das árvores sagradas yèyé c pèrègún. Yèyé c pèrègút.
são árvores sagradas, de grande vitalidade, consagradas às Iyami O xorongá (e a o u ­
tros orixás). São árvores dotadas dc axé de longevidade e fertilidade.
Vejam as águas desse rio:
Ele está vivo, ainda não secou.
Refere-se ao fato de que o pacto perdura.
Vejam a árvore sagrada y èyé plantada à beira desse rio: 55
Ela continua viva.
Refere-se à fertilidade e vitalidade do rio e da árvore. Essa vitalidade perdura graças
ao fato de o pacto não ter sido rom pido.
Vejam a árvore sagrada pèrègún plantada à beira desse rio:
Essa continua viva.
As folhas dessas árvores não caíram . Estão vivas e vicejantes.
Exu, dê forças a meu ori e a meu Eledá 60
Para que não me abandonem .
Eu saúdo as 201 divindades,
Mensageiras de Eledunmare.
Saúdo Exu, o famoso,
Dc cujas mãos as divindades recebem o axé. 65
Legbará!
Primeira estrela a ser criada,
Filho de Eledunmare,
Foi você quem fez o m arido cair dentro do fogo,
Fez o am ante da esposa cair ao lado da fogueira 70
E fez a esposa cair m orta no quintal de casa.
Exu é imparcial. Q u an do sc estabelece uma situação de discórdia ele age com im-

363
parcialidade c todos os envolvidos nessa situação podem term inar destruindo a si
m esm os. Em meio à confusão e á desordem nas relações a destruição pode ser múl­
tipla, e não apenas física.
Saudação a você, hom em dinâm ico e forte!
Não me prive do teu axé
E não permita que aquele que estiver privado do teu axé tombe perto de
mim.
Oh! Exu, o famoso, eu te saúdo! 75
Sinto tem or e respeito por você.
Você, o venerável,
F.u te saúdo!
Oh! Rei dos veneráveis!
Somente quem não conhece todo o teu potencial de ação 80
É que te chama o homem do porrete.
Q uem não conhece a verdadeira natureza de Exu refere-se a ele de m odo redutivo,
de forma restrita ou m esm o pejorativa, ao m encionar apenas o fato de ele ser 0
homem do porrete.
Eu tenho um ori que me protege dos inimigos e me conduz à vitória.
Sou filho de Exu, o generoso
E peço que as adversidades desapareçam da m inha vida.
Vocês, 201 Divindades, Veneráveis do Universo, 85
Eu as saúdo!
Saúdo novam ente o dia,
Q ue tem parentesco com a madrugada!
Oh! Senhor do Hoje! Eu te saúdo!
Ah! Exu, esse infinito 90
Para onde dirijo o meu olhar,
Refere-se ao olhar voltado para o futuro, confiante no que o futuro trará de bom.
Esse infinito que, iluminado pelo teu olhar, a meus olhos se carrega de espe­
ranças.
Exu Odara, Prim eira Estrela a ser criada,
Pertence a você
O axé dos ebós. 95
Q uando eu fizer ebó,
Permita que ele tenha axé e seja bem aceito.
Você que se alimenta do ebó, perm ita que meu ebó seja aceito.
Eu saúdo o sol nascente,
Que é esposo da manhã! >00
Meu ori,

364
Meu Eledá,
Eu os saúdo!
A árvore nascida na floresta
Está sobre o ori da Terra 105
Observem os que a expressão Está sobre o orí da T em indica que tudo o que ocorre,
ocorre sobre a Terra e relaciona-se à essência do planeta.
O facão, trabalhando na terra, trabalha sobre o ori da Terra.
O facão contribui para que a hum anidade realize o seu destino. Refere-se à ação de
O gum , o herói civilizador, Senhor dos Metais e da Forja. Nesse sentido, o facão tra­
balhando constitui uma imagem dc construção civilizatória graças ao uso do ferro
forjado.
A enxada, trabalhando na terra, trabalha sobre o ori da Terra.
E o destino do homem?
Também é sobre o ori da Terra que trabalha o ori dos hom ens.
Os destinos individuais acham -se articulados ao destino coletivo da hum anidade.
Legbará, cu te saúdo! 110
Que eu não escorregue sobre a terra.
Que ela não estremeça debaixo dos meus pés.
Q ue seja abençoado o meu caminhar. Esse cam inhar que é orientado por m eu desti­
no individual que, por sua vez, integra um destino coletivo - o destino do planeta.
O dendê quente e quem ouve a voz do àkàrà.
Para termos um àkàrà de boa qualidade é preciso que o dendê esteja bem quente.
O u seja, cada ser necessita de condições favoráveis para a sua m elhor manifestação
c completa formação.
Legbará, venha me ouvir!
A água é o primeiro elemento a ser saudado antes do início da pesca 115
A floresta é a primeira a ser saudada antes do início da caça.
Deve-se saudar a floresta antes de apanhar os pássaros.
Está se referindo, particularm ente, aos pássaros sagrados utilizados cm rituais e prá­
ticas dc òògún.
Quando uma pessoa chega próxim o à árvore òro para apanhar seus frutos
Òro é uma das árvores sagradas de Iyami Oxorongá.
E não saúda
As Iyami Oxorongá, 120
Servindo-se do axé de Exu,
As Mães pegam o ori dessa pessoa e o guardam em sua bolsa.
Q uando uma pessoa apanha os frutos da árvore òro sem saudar as M ães (e pedir sua
licença), elas guardam o ori dessa pessoa, o que lhe acarreta perda de vitalidade, em
função de não receber o seu axé.

365
Exu, eu tc saúdo!
Saúdo tam bém m inhas Mães Oxorongá!
As louváveis, que pintam seus pés com osún 125
E se alim entam de fígado e intestino.
Alimentar-se de fígado e intestino significa absorver todos os problem as das pesso­
as. Significa tam bém repor energias perdidas.
Exu, me proteja para que as Ivá-mògún
Não guardem meu ori em sua bolsa.
Q u an do as Iyami O xorongá guardam o ori de uma pessoa cm sua bolsa, a pessoa fica
desorientada, desnorteada, sem ru m o e sem a proteção das Mães.
Para que eu viva p o r m u ito tem po, alcance m a tu rid a d e , desenvolva
sabedoria
E seja grande o suficiente para que as coisas realizadas p o r m im perdu­
rem . 130
Para que eu viva por m uito tem po, envelheça e cum pra a m inha missão na
vida.
E tam bém vocês, 401 Divindades,
Eu as saúdo!
Não estou lhes dando ordens.
Mas, ainda que eu esteja lhes dando ordens, visando um objetivo, 135
Não deixem de me atender.
Não esqueçam de mim.
Porque a espiga do milho, ao nascer, não esquece de exibir o seu pendão.
O axé dos orixás é o elem ento que não pode faltar. A espiga de m ilho nunca nasce
sem o seu pendão: são os cabelos do milho. O axé que faz o m ilho existir é o seu
pendão, intim am ente ligado a ele. O axé dos orixás acha-se tão preso à vida dos
seres, quanto preso ao m ilho está o seu cabelo.
Oh! Famoso Exu, eu te saúdo!
Para que tudo em m inha vida seja favorável. 140
Q ue em m inha vida tudo seja tão perfeitam ente harm onioso
Q uanto a água cristalina apanhada na fonte logo cedo pela manhã!
Exu Odara, remova os obstáculos
Para eu poder passar.
Eu sou filho do Poderoso Venerável, 145
Que está a caminho.
Lalú, não m onte em mim,
Nem m onte sobre o meu filho.
Refere-se à possibilidade de transm issão geracional de problemas.
Exu, hom em baixinho, de m últipla personalidade,

366
Que fica no cam inho da feira, 15
Exu, não me deixe desprovido do teu axé. Deixe o u tra pessoa.
Sc alguém deve ficar desprovido do axé dc Exu que não seja eu, e sim o filho dc out
pessoa. Q u e cu não fique desprovido das virtudes de Exu - ordem , disciplina, org
nização, paciência... Se alguém deve ficar desprovido dessas virtudes, que não sc
eu, e sim o meu oponente. A expressão filho dc outra pessoa reporta à ideia de qi
outra pessoa sempre é filha dc alguém e pertence, portanto, a um a determ inada I
nhagem familiar. Esta afirm ação carrega a intenção de atingir a força vital do advc
sário cm sua raiz, dado que a fonte de força vital dc alguém é a sua ancestraiidade.
Exu, o famoso, eu te saúdo!
Para que as saudações sejam aceitas, oh! Exu, saudações!

367
Capítulo 1 3

Orin Èsú:
Cantigas de Exu

Orin - C antigas
Os orins 1 são formas brandas de louvação em pregadas cm festas
c celebrações aos orixás. Carregam parte da carga inform ativa dos orikis
(evocações) e representam um ponto interm ediário entre a exortação dos
poderes do orixá contidos nos aduras (rezas) c a m usicalidade dos orikis.
Podem ser entoados oralm ente ou por tam bores falantes. Possuem,
como os orikis, valor docum ental, por fazerem registro histórico dos m o ­
dos de vida profano e sagrado dos iorubás. Veiculam ensinam entos através
do canto (sempre acom panhado pelo som de tam bores falantes) dos mes-
tres-m úsicos-historiadores - à yà n - pertencentes às linhagens responsáveis
por essa profissão. Revelam am ores e ódios.
Em celebrações, tais como casamentos, batizados, ritos fúnebres de
anciãos, colheitas e festas do inhame, são usados dois ritmos: kete c ògódó.
Ambos são obtidos através da percussão do tambor bàtà e acom panham dan­
ças acrobáticas realizadas por especialistas, chamados de oníkete. As pessoas
presentes também dançam , imitando-os. A diferença entre kctc c ògódó re­
side nos movimentos da dança. Tanto o kctc como o ògódó louvam as pes­
soas presentes c é freqüente a ocorrência de associação dessa forma poética
a orikis. Por exemplo, se um orin está sendo entoado num a festa e ocorre a
chegada de determ inada pessoa, a entoação de seu oriki permeará a do orin.

1 Lembramos haver convencionado grafar a palavra orin sem uso do itálico e dc flexioná-la no emprego
do plural, sempre que esse vocábulo estiver cm contexto do idioma português.
A m orte de pessoas ilustres é anunciada por orins entoados p or tam ­
bores falantes e outros instrum entos musicais, sem acom panham ento da
voz hum ana, a de um rei, pelo toque do gbçdu e a de sacerdotes, pelo toque
do tam bor preferido de seu orixá.
Há cantigas denom inadas orin-ewi-çsà, entoadas cm homenagem
aos ancestrais masculinos, Egungun. Geralm ente entoadas pelos olçjç, no­
táveis que conhecem os segredos do culto aos ancestrais m asculinos, são
acom panhadas pelo coro de mulheres e pelo som de tam bores falantes e de
outros instrum entos musicais, além das danças. Sua peculiaridade reside
no fato de hom enagearem um ancestral. Q uando entoadas incluem a cita­
ção do oriki do homenageado. Um dos principais objetivos do orin-ewi-çsà
é o de solicitar a bênção e atrair a ajuda dos ancestrais.
O utras cantigas, denom inadas orin-èfç , são entoadas em hom ena­
gem a Geledé, os ancestrais femininos. Adultos e crianças de am bos os sexos
cantam orin-èfç nas festividades anualm ente realizadas em hom enagem a
Geledé, que perduram por sete dias e sete noites. Orin-èfç significa, literal­
mente, cantigas dc dcboche. Acompanhadas pelo toque de tam bores falan­
tes e por danças, são usadas para tornar públicas as transgressões cometidas
durante todo o ano, entre um período de festividades e o período seguinte.
Os cultuadores de Geledé observam durante todo o ano, atentam ente, as
transgressões das norm as com unitárias para elaborar os orin-èfç. A tarefa
não é tão fácil com o parece à prim eira vista, pois é preciso escolher o me­
lhor m om ento para dar a conhecer transgressões com etidas durante o ano
e, sim ultaneam ente, louvar os ancestrais femininos.
Há ainda, cantigas entoadas em hom enagem aos orixás, entre os
quais Exu. Das cantigas de Exu, utilizadas nessa e em outras ocasiões, sele­
cionamos algumas para apresentar no presente contexto.

Orin Èsú (1)


(Entoada 110 m om ento da entrega do ebó)
Irúnmalç e se ojú dè o
Qrò, çrç nlç o. çrç,
Igba imàlç ç se ojú dc o
Orç, çrç nlç o, çrç>.
Osó ilé ç sc ojú dé o 5
Orç. çrç> nlç o, çrç.
A jç ilé, ç se ojú dé o,
Qrç, çrç nlç o, çrç.
Olóògún ikà ç se ojú dé o,

372
!

Qrç, çrç 11lç o. çrç. 10


A bínú çni e se ojú dé o.
Orç. çrç nlç o, çrç.
Aba tçnijç e se ojú dé o,
Orç. çrç nlç o, ç>rç.
Gbogbo ibi. e se ojú dé o, 15
Qrç, çrç nlç o, çrç.
Gbogbo yín. ç paradà,
ebo, çbç nbo o, çbç.

C antiga de Exu (1)


(Entoada no m om ento da entrega do ebó)
Todas as divindades olhem para o ritual que está sendo realizado.
Qrç, Qrç está passando, Qrç.
Oh! 200 Divindades! Olhem para o ritual que está sendo realizado.
Qrç. Qrç está passando, Qrç.
Todos os feiticeiros olhem para o ritual que está sendo realizado. 5
Çrç é o conjunto de problemas que estão sendo elim inados através dos rituais dc
oferendas às divindades.
Qrç, Qrç está passando, Qrç.
Todas as feiticeiras olhem para o ritual que está sendo realizado.
Qrç, Qrç está passando, Qrç.
Todos os praticantes de òôgún olhem para o ritual que está sendo realizado.
Qrç, Qrç está passando, Qrç. 10
Òôgún: prática mágico-medicinal iorubá que associa recursos m ágicos e medicinais.
Todos os maldosos olhem para o ritual que está sendo realizado.
Qrç, Qrç está passando, Qrç.
Todos os invejosos e antipatizantes, que praticam o mal, olhem para o ritu ­
al que está sendo realizado.
Qrç, Qrç está passando, Qrç.
Todo tipo de mal olhe para o ritual que está sendo realizado. 15
A intenção é neutralizar o efeito da negatividade dos m aldosos, evitanto que sua
influência prejudique o ritual que está sendo realizado c, sim ultaneam ente, atacar
a força inimiga.
Qrç, Qrç está passando, Qrç.
Todas as energias do mal desapareçam! Todas as energias benéficas desper­
tem para me acompanhar!
O ebó, o ebó está passando, o ebó.
O ebó eslá passando: Está sendo realizado o ritual de ebó.

373
Orin Esú (2)
Ba bálórísà/Iyálórísà: Esú gbé. Esú gbé o.
Eni s 'çbo l'óre o.
Égbè: Eçú gbc.
Eni s 'çbç I 'órc o.
Esú gbé o. 5
Babálórísà/Iyálórisà: Bàrà a dúró ko kíkà.
Égbè: Qdàrà ò j ç àdin.
Èsú gbé.
---------- E n i s ’çbç Eóre o.
Babálórísà/Iyálórisà: Epo kété nidi òro. ]o
Èsú gbé,
Eni s 'çbo I 'órc o.
Égbc: Orita lo wà ti o gbé nsawo.
Èsú gbé.
Eni s 'çbo / 'órc o. 15
Babálórísà/Iyálórisà: Odàrà tí ò jé àdin.
Èsú gbé.
E n is ’çbo l'órc o,
Égbc: Mo gbé epo re idi yangí.
Èsú gbé. 20
Eni s 'ebo I 'órc o.
Babálórísà/Iyálórisà: Lálúpon. mo gbé ebo re idi Èsú.
Èsú gbé. .
Eni s 'çbo 1’órc o.
Egbè: Omi ní ‘nporó iná. 25
Èsú gbé,
E nis'çbç l ’óre o.
Babálórísà/Iyálórisà: Epo I 'çrç Èsú.
Èsú ni yóó gba çbç wa.
Égbè:Taniyóó gba çbç? 30
Babálórísà/Iyálórisà: Èsú n iyó o g b a çbç wa.

C antiga de Exu (2)


Sacerdote/sacerdotisa: Exu nos apóie, defenda, proteja!
Apóie, defenda e proteja
Aquele que fez o ebó bem feito.
Coro: Exu apóie, defenda e proteja
Aquele que fez o ebó bem feito. Que Exu o apóie, defenda e proteja. 5

37*1
A proteção de Exu é solicitada em benefício dos que acataram o conselho
e obedeceram as prescrições para a realização correta do ebó e buscaram ,
assim, obter a graça dc solucionar os seus problemas.
Sacerdote/sacerdotisa: Bará, que está sempre de prontidão para receber o
ebó e atender a quem o procura.
Coro: Odara, que não come àdin.
Àdin é o óleo extraído do fruto do dendezeiro que, ao ser colocado no as
sentamento de Exu. provoca a sua ira.
Exu apóie, defenda e proteja
Aquele que fez o ebó bem feito.
Sacerdote/sacerdotisa: O azeite de dendê é colocado 110 assentam ento dc
Exu, o Poderoso, para trazer paz e serenidade. 10
Exu apóie, defenda e proteja
Aquele que fez o ebó bem feito.
Coro: É na encruzilhada que você realiza os seus trabalhos.
Exu apóie, defenda e proteja
Aquele que fez o ebó bem feito. 15
Sacerdote/sacerdotisa: Odara, que não come àdín.
Exu apóie, defenda e proteja
Aquele que fez o ebó bem feito.
Coro: Levei o azeite de dendê para colocar na pedra yangi.
Exu apóie, defenda e proteja 20
Aquele que fez o ebó bem feito.
Sacerdote/sacerdotisa: Oh Lalupón, entreguei o ebó para você, Exu.
Exu apóie, defenda e proteja
Aquele que fez o ebó bem feito.
Coro: A água acalma a fúria do fogo. 25
Essa analogia da ação de Exu com a água que acalma a fúria do fogo d iz res­
peito à sua ação de serenar c acalm ar ânim os cm m eio às desavenças do dia a
dia. Lem bram os que é dc responsabilidade hum ana o uso do axé de Exu.
Exu apóie, defenda e proteja
Aquele que fez o ebó bem feito.
Sacerdote/sacerdotisa: O azeite de dendê acalma a fúria do axé dc Exu.
Exu é quem receberá o nosso ebó.
Coro: Quem receberá o nosso ebó? 30
Sacerdote/sacerdotisa: Exu é quem receberá o nosso ebó.

Orin Èsú (3)


(Entoada durante todo o ritual de ebó)
Èsú bç>, wá bá wa rè ikóríta,

375
Èsú bç, wá bá wa rè ikóríta,
Èsú bç, wá bá wa rè ikóríta.
Èsú gbà.
A gbè çbç rè ikóríta, 5
Èsú gba o.
Lègbàrà a gbè çbç rè ikóríta,
Esú gbá.
A gbc çbç rè ikóríta
Èsú gbá. ]Q
Oba ló ni ópó,
Èsú çdàrá ló ni ikóríta meta,
Èsú gbá.
A gbè ebo rè ikóríta
Èsú gbà. 15
Jç a m ú àse bç ikóríta,
Esú gbà, Jç a mú àse bç ikóríta
Èsú gbà,
Èsú gbà. Jç a mú àse bç> ikóríta o,
Èsú gbà. 20

C antiga de Exu (3)


(Entoada durante todo o ritual de ebó)
Exu! Venha e nos acompanhe até a encruzilhada.
Exu! Venha e nos acompanhe até a encruzilhada.
Exu! Venha e nos acompanhe até a encruzilhada.
Exu! Receba!
Levamos o ebó até a encruzilhada. 5
Solicita-se a Exu que acom panhe as pessoas no cam inho que conduz ao loca! de en­
trega do ebó. A encruzilhada não é apenas um local físico, mas o ponto dc encontro
da pessoa com a solução dc seu problem a.
Exu! Receba!
Legbará, levamos o ebó até a encruzilhada.
Exu! Receba!
Levamos o ebó até a encruzilhada. - •
Exu! Receba! 10
Ao rei pertence o trono,
A Exu O dara pertencem as encruzilhadas.
Exu! Receba o ebó! Levamos o ebó até a encruzilhada.
Exu! Receba! 15

376
Permita que voltemos da encruzilhada com axé.
Exu! Receba o ebó e perm ita que voltemos da encruzilhada com axé.
Exu! Receba o ebó!
Exu! Receba o ebó e perm ita que voltemos da encruzilhada com axé.
Exu! Receba o ebó! 20
Solicita-se a Exu o axé necessário para solucionar os problemas.

Orin Èsú (4)


(Entoada após o sacrifício, no m om ento em que está sendo entregue
a oferenda a Exu. M enciona-se o nom e lyá-mògún para que as Mães
venham com partilhar dessa oferenda e abençoar a vida do ofertante
trazendo ire, sorte e bem -estar)
Èsú fí ire bò ira o.
Èlà fí ire bò wá yà yà.
Èsú gbé ire ajé kò wá o.
Èlà fí ire bò w áyàyà.
lyá-mògún fí ire bò wá o. 5
Çlà fí ire bò wá yà yà.

Cantiga de Exu (4)


(Entoada após o sacrifício, no m om ento em que está sendo entregue
a oferenda a Exu. M enciona-se o nom e lyá-mògún para que as Mães
venham com partilhar dessa oferenda e abençoar a vida do ofertante
trazendo ire. sorte e bem -estar)
Exu! Faça com que nossa vida fique repleta de coisas boas.
Èlá! Traga sorte e bem estar às nossas vidas.
Exu! Traga sorte e progresso às nossas vidas.
Èlá! Traga m uita sorte às nossas vidas.
lyá-mògún! Faça com que nossa vida fique repleta de coisas boas. 5
Çlá! Traga m uita sorte às nossas vidas.
Èlá é divindade associada à agricultura e à adivinhação.

Orin Èsú (5)


(Entoada no m om ento do sacrifício)
Èsú Láàlú maa nmu eran to o
Èsú Láàlú ti mu eran lç o
Çbç sárá lòòréré
Èsú Làálu ti mú çran lç o
Èjé nsàn lo tààrà lòòréré 5

377
niçmpsó ti mu çran Iç o,
Epo §àn Io tààrà lóòrérè
Esú Láálú nw ç çran Iç
Çkún kii pa çran ài \vç>gçrçrç

C antiga de Exu (5)


(Entoada no m om ento do sacrifício)
Oh! Exu, o Famoso, leve em bora o animal.
Oh! Exu, o Famoso, já levou o animal.
A faca de sacrifício prom ove o bem-estar.
Oh! Exu, o Famoso, já levou embora o animal.
O sangue está escorrendo para o infinito. 5
Rcfcre-sc à energia cio anim al, que está sendo conduzida do aiyc para o orun c revi­
talizando o ofertante. A energia animal absorve os problem as do ofertante, neutrali­
za as energias negativas e potencializa as positivas. Carregando o animal tem o sen­
tido de estarem sendo absorvidos os problem as do ofertante ao serem neutralizadas
as energias negativas e potencializadas as positivas. Refere-se ao fato dc que Exu vê
os problemas e, atendendo à solicitação do ofertante, os carrega para longe. Ele é o
forte que arrasta para longe os problemas.
Oh! O Venerável já levou em bora o animal.
O sangue sagrado escorre para o infinito.
Oh! Exu, o famoso, está carregando o animal.
O leão quando caça carrega a sua presa.

Orín Èsú (6)


Esú gbé iwájú
Ko má má gbçyin o
Esú gbc iwájú
Kó má má gbçyin o
Olóri ebo kii gbçyin o 5
Èsú gbé iwájú
Kó má má gbçyin
Èsú gbé iwájú
Kó má má gbçyin o
Olóri çni kii gbçyin o

C antiga de Exu (6)


Exu, fique na nossa frente e nos proteja.
Não fique atrás de nós, não nos abandone.
Exu, fique na nossa frente e nos proteja.

378
Não fique atrás de nós, não nos abandone.
Quem transporta o ebó não fica atrás. 5
Não fique atrás de nós tem o sentido de que Exu não abandona quem recorre a ele
em busca dc auxilio.
Exu, fique na nossa frente e nos proteja.
Não fique atrás de nós, não nos abandone.
Exu, fique na nossa frente e nos proteja.
Não fique atrás de nós, não nos abandone.
Líder sábio, protetor do nosso ori, salva o hom em , e por isso nunca fica
atrás. 10

Orin Èsú (7)


Bàrà ti njç Látççpa
Èsú mú se mi
Omo elòmirdn ni o sc
Esú láàlú.
A j i b 'orin dc, 5
Qdàrà tii jè látoçpa
Èsú gbé m i o.
Èsú gbé iyúà mi,
Èsú gbé m i o,
Èsú gbé bàtbáà mi, 10
Èsú gbé m i o,
Èsú gbé çm ç mi,
K í o gbé wá o,
Èsú òdàrà gbé çbi wá o.

Cantiga de Exu (7)


Oh! Poderoso Bará, que se chama Latopá!
Não me deixe sem o teu axé!
Que outra pessoa fique sem o teu axé!
Exu, o famoso da vida!
Nuo me deixe sem o teu axé! Que outra pessoa fique sem o teu axé! Significa: se
alguém deve ficar desprovido do axé de Exu que não seja cu, e sim o filho de outra
pessoa. Q u e eu não fique desprovido das virtudes de Exu - ordem , disciplina, orga­
nização, paciência... Se alguém deve ficar desprovido dessas virtudes, que não seja
cu, e sim o meu oponente.
O forte que chega como um elefante. 5
O forte que chega como um elefante significa que durante a possessão Exu dc-

379
monstra a grandeza, a nobreza e o vigor dc um elefante.
Odara, o Bondoso que se chama Latopá!
Exu! Apóia-me em tudo.
Exu! Apóia m inha mãe em tudo o que ela faz.
Exu! Apóia-me em tudo o que faço.
Exu! Apóia meu pai em tudo o que ele faz. 10
Observa-se nestes versos o apelo à força ancestral. Lem brem os que todo grupo fa­
m iliar inclui os já-idos.
Exu! Apóia-me em tudo.
Exu! Apóia meu filho em tudo na vida.
Apóia a nós todos, em cada m om ento de nossas vidas.
Oh! Exu, o Bondoso, apóia a nossa família em tudo o que fazemos.

Orin Èsú (8)


Kíni o gbé c o?
Èsú ni o gbc iyá mí,
Kíni o gbé e o?
Èsú ni o gbé iyá mi,
Èsú onílé owó, 5
Èsú ni o gbé e iyá mi,
Èsú Qlçnà çlà,
Èsú ni ó gbé iyá mi.

Cantiga de Exu (8 )
Quem vai apoiar?
Exu é quem apoiará a m inha mãe.
Quem vai apoiar?
Exu é quem apoiará a m inha mãe.
Exu, o dono da m orada do dinheiro. 5
Refere-se a Exu com o dono da fonte de riqueza.
Exu é quem apoiará a m inha mãe.
Exu apoiará m inha mãe com dinheiro.
Exu, guardião do cam inho da prosperidade.
Exu é quem apoiará a m inha mãe.

Orin Èsú (9)


Èsú ta m i Içre
M o siré àgbé r'òde o
Èsú ta m í Içrç

380
Mo s 'iré àgbé r'òdc o
Çkúnrin kúkúrú ti nbe lónà ojà o. 5
Èsú ta m i I 'çre. çgbçn
Mo siré àgbc r'òdc
Èsú ta m i i 'çre. súúrú
Olçjç o, ta m i Içre, àmúmóra
Mo siré àgbé ròde o. 10
Orèré ti ndú ori elémèrè
Bàbá, m i ta m i I 'çre, ç/à
Mo siré àgbé ròde o
Qdàrà ta mi1'òre, òye
Mo siré àgbé ròde. 15
Imalé ta m i içre o. owo
Mo siré àgbé r'òde
Irúnmaiè, gbogbo e ta m i I'ç>re. gbogbo
Mo siré Èsú ròde.

Cantiga de Exu (9)


Exu! Abençoa-me com sorte e bem-estar.
Saí para propagar a tua sabedoria.
Exu! Abençoa-me com sorte e bem-estar.
Saí para propagar a tua sabedoria.
Você, homem baixinho que fica no cam inho da feira. 5
Homem baixinho, expressão que com um cnte é associada a homem alto, enfatiza a
versatilidade de Exu. Caminho da feira refere-se ao cam inho que con d u z ao local
onde ocorrem as trocas c o progresso, local onde circula o dinheiro.
Exu! Abençoa-me com sabedoria.
Fui propagar a tua sabedoria entre as pessoas.
Exu! Abençoa-me com o dom da paciência.
Oh! Olojó! Senhor do Tempo! Abençoa-m e com o dom da tolerância.
Saí para propagar o teu conhecim ento. 10
Olojó é o Senhor do Tem po, o do n o de cada dia.
Oh! Bondoso, que melhora o ori dos emerês*.
Exu prolonga a vida do abikus, sempre que seu apoio í solicitado.
Oh! Meu pai! Presenteia-me com prosperidade.
Fui propagar a tua sabedoria entre as pessoas.
Oh! Famoso! Presenteia-me com sensibilidade e discernim ento.

2 Emcrê c outro designativo para abiku.

381
Fui propagar a tua sabedoria. 15
Oh! Venerável! Presenteia-m e com a tua proteção.
Fui propagar a tua sabedoria.
Todas as divindades venham me presentear com tudo o que há de
Fui propagar a sabedoria de Exu entre as pessoas.

Orin Èsú (10)


Babalórisà/Iyálórisà: Elégbára
a gbé ikú danú
_______ L óJbU n i__________________________
Egbè: Esú a gbá Çbo dà
ló bi mi, Èsú
Babalórisà/Iyálórisà: Esú a ré ikú dànú lára wá.
Èsú á ré àrún lóri wá o,
Egbè: Èsú á ré ibànújé dànú lóri wá o,
Babalórisà/Iyálórisà: Çdàrà. á gbé cjç dànú lóri wá
Çdàrà, á gbé ófó dànú lóri wá o 10
Egbè: Èsú láàlú
Çdàrà ti njç látççpa
Babalórisà/Iyálórisà: Çdàrà ti ó j c àdin.
Egbè: Èsú. a gbé çbç dà ló bí mi
Babalórisà/Iyálórisà: Elçgbara ré ikú dànú lóri wá
Egbè: Èsú ré ikú dànú lóri wá o.

C antiga de Exu (10)


Sacerdote/sacerdotisa: Elegbara,
Que afasta a m orte,
É meu pai, que me trouxe para a vida.
C oro: Exu, que conduz o ebó a seu destino,
É meu pai, que m e trouxe para a vida. 5
Sacerdote/sacerdotisa: Exu afastará de nossa vida a m orte.
Exu afastará de nosso destino a doença.
Coro: Exu afastará de nossa vida a tristeza.
Sacerdote/sacerdotisa: Exu, Bondoso e nobre, afastará de nossa vida as
intrigas e as injustiças.
Exu, o Benevolente, afastará de nosso destino o fracasso. 10
Coro: Oh! Exu, o Famoso,
Odara, que é evocado pelo nom e Latopá.
Sacerdote/sacerdotisa: E o m esm o Odara que não se alim enta de àdin.
Coro: Exu, que leva o ebó a seu destino, é m eu pai, que me trouxe para a vida.
382
Sacerdote/sacerdotisa: Oh! Legbára! Afaste de nosso ori a m orte. 15
Coro:_Oh! Exu! Afaste de nosso çri a morte.

- ».«-■ O rin E sú (II)


"•'"rJ2í (Entoada durante e após A iniciação)
~^ Babalórísà/Iyjálórísà: Èsú. a gbé Ebo dà ló bí ç
Légbara, a gbé çbo dà ló bí ç
Elçgbára, a gbé çbo dà ló bí e
Alágbára, a gbé ebo dá ló bí e
Qsççtúrá, a gbé ebo dá ló bí ç 5
Egbè: Èsú, a gbé çbç dà ló bí ç
Légbara, a gbé ebo dà ló ni ori e
Elégbara, a gbé çbo dà ló ni ori e
Alágbára, a gbé çbo dà ló ni ori e
Qsççtúrá, a gbé çbo da ló n i ori e 10
Babalórisà/Iyálórisâ ati Egbè: Èsú, a gbé Ebo da ló bí wá
Elégbara, a gbé çbç dà ló bi wá o
Légbara, a gbé çbo dà ló bi wá
Alágbárà, a gbé çbç dà ló bi wá o
Qsççtúrá. a gbé çbç dà ló bi wá o. 15

Cantiga de Exu (11)


(Entoada durante e após a iniciação)
Sacerdote/sacerdotisa: Exu, condutor do ebó, foi quem te trouxe para a vida.
Légbara, condutor do ebó, é teu pai, que te trouxe para a vida.
Elegbara, condutor do ebó, é teu pai, que te trouxe para a vida.
Alagbara, condutor do ebó, é teu pai, que te trouxe para a vida.
Oseètúrá, condutor do ebó, é teu pai. 5
Exu é quem te fez renascer (através da iniciação).
Légbara: Aquele cujo poder salva; o Poderoso.
Elegbara: Aquele cujo poder salva; Potente; Poderoso; Aquele que concede
poder ao hom em para ser bem -sucedido.
Alagbara: Poderoso; Incansável; Aquele que influencia a vida das pessoas.
Qsççlúnr. nom e que faz referência à amizade de Exu com Ifá. Nos rituais dc
ebó, evocado por esse nom e, transporta o ebó agilm ente.
Coro: Exu, condutor do ebó, é teu pai.
Légbara, condutor do ebó, é dono do teu ori.
Elegbara, condutor do ebó, é Senhor do teu ori.
Alagbara, condutor do ebó, é Senhor do teu ori.

383
1

Qseçtúrá, condutor do ebó, é Senhor do teu ori. 20


Sacerdote/sacerdotisa e coro: Exu, condutor do ebó, é nosso pai.
Elegbara, condutor do ebó, é nosso pai.
Legbara, condutor do ebó, é nosso pai.
Alagbara, condutor do ebó, é nosso pai.
Qseçtúrá, condutor do ebó, é nosso pai. 15

Orin È s ú ( 12)
(Entoada durante o banho que faz parte do ritual de iniciação. É acompanhada dc
palmas e do toque de bàtá e fçkçrç)
Èsú láàlú
Wè rckcte o,
Wè ç o mó, kó yè
Wè ç rckcte.
Èsú Qdárà olçgç çjç 5
Wè ç rckcte,
K í ó má ma j ç ó rçjó,
Wè é rckcle.
K í ó má mú à múbó
Èsú Qdárà olçgo ikú, ----- 10
Wç ç rckctc,
O M ájç ikú ó 'pa á o.
Wè ç rckcte,
Èsú Qdárà çlçgo àrún,
Wè ç rckcte, 15
O má j ç ó ri àrún kankan o,
Wè ç rckcte.
Èsú olúlànà olúsolá
Lànà fim o. k i o bun ni olá
Wè ç mó o 20
Wç ç rcketc, k í ó náyò láyé.

C antiga de Exu (12)


(Entoada durante o banho que faz parte do ritual de iniciação. É acom panhada de
palmas e do toque de bàtá e fçkçrç)
Exu, o Famoso,
Lave com pletam ente (este iniciado)
Para ele poder superar qualquer problema.
Lave com pletam ente (este iniciado),

384
Exu Odara, dono do porrete das intrigas. 5
Odarj: Benevolente; Aquele que realiza o bem . Lembremos o sim bolism o do porrete
de Exu que, localizado em sua nuca, lhe confere visão do que está atrás d c si e no
passado, protegendo contra qualquer ataque feito pelas costas. Neste caso, trata-se
de uma evocação para proteger do efeito de intrigas, para que o iniciado cum pra o
seu destino e que sua vida tenha sentido c seus esforços sejam recom pensados. Q ue
a m orte e as doenças sejam afastadas de seu cantinho.

Lave completamente (este iniciado)


Para ele não sofrer injustiças, nem ser alvo de intrigas.
Lave completamente (este iniciado)
Para que a vida dele não transcorra em vão.
Exu, o Bondoso dono do porrete da m orte, 10
Lave completam ente (este iniciado)
Para que a morte não o leve em bora.
Lave completamente (este iniciado).
Exu, o Bondoso, dono do porrete da cura,
Lave completam ente (este iniciado). 15
Para que nenhum a doença o atinja.
Lave completam ente (este iniciado).
Exu, que abre caminhos c atrai prosperidade,
Venha abrir o cam inho dele e o abençoe com prosperidade.
Lave completam ente (este iniciado) 20
Para que ele tenha muita felicidade na vida.

Orin Èsú (13)


(Entoada quando o iaò retorna do banho e entra cm casa andando dc costas)
Çyin la li nkó ayç wãlé o
Çyin
Èsú Çdàrà fí uhún rcre balé o
Çyin la fí kó ire wálé o
Çyin 5
Orno Èsú çm ç gbogbo imalè, fí èyin ru ayç Èsú wálé o.
Çyin.
Èyin ni iyàwó òrisà I fíi ko iyi wálé o.
Èyin.
Èyin ni iyàwó òrisà I fíi k 'ówó wálé o, 10
Èyin.
Èyin n i iyàwò òrisà / fíi kçlá wálé o,
Èyin.

385
Èyin ni iyàwó òrisà 1 tii ko alaáfià wálé o
Èyin

Cantiga de Exu (13) ^


(Entoada quando o iaô retorna do banho e entra em casa andando de costas)
Foi andando de costas que carregamos a felicidade para dentro de casa.
Foi andando de costas
Que Exu, o Benevolente, manifestou sua bondade através de um a boa mensa­
gem.
Foi andando de costas que carregamos a felicidade para dentro de casa.
Foi andando de costas 5
Que o iniciado, filho de Exu (com o axé de todas as divindades), trouxe felici­
dade para dentro de casa.
Entrar cm casa andando de costas i deixar de fora a má sorte e as infelicidades e le­
var a felicidade para dentro. A ndar de costas significa deixar os problem as para trás,
afastar-se dos problem as e trazer alegria c felicidade para a própria vida.
Foi andando de costas
Que o iniciado trouxe honra para dentro de casa.
Foi andando dc costas
Que o iniciado trouxe riqueza e prosperidade para dentro de casa. 10
Foi andando de costas
Que o iniciado trouxe nobreza e prosperidade para dentro de casa.
Foi andando de costas
Que o iniciado trouxe saúde e bem estar para dentro dc casa.
15

Orin Èsú (14)


(Entoada durante a iniciação, no m om ento eni que o iniciado é consagrado a Exu, a
quem se pede que lhe conceda sorte)
Èsú ori clirc o,
Gba y i o
Baba mi, a sikà,
Asikà biàparò nko!
Olúlànà ba délé 5
Iwo tó pa idàçmi ni ipa Èésú
Tani a ti ara riri. nti ojú di?
Èsú, ó dirc gbà y i o.
Baba m i alàkétu

386
Omo irejàju èpè. 10
Ka ló Kétu Iç gbire Içwç alákctu,
Èsú. ó d ire gbà vi o
Esú wá gbç isç ori rán.
Esú. ó d ire gbà y i o
Esú wá gbo ohun çlçda /}wi. 15
Esú. ó dirc gbà y i o.
Olówó ori mi,
A íibé ra ori o o
Èsú wá gbá ori y i o.
Baba m i alákétu. 20
Esú. ó d ire gbà y i o.
A ti ló Kétu,
Lo gbá àse,
Esú. ó dir.e sjbà y i o,
n "
Ebçra ti n/é látççpa. 25
Èsú, èbiti okúnrin,
Ti nbe Içnà çjà,
Èsú. ó dire gbà y i o
Onilé orita ti njé láaróyè
Esú. ó dire gbà y i o. 30
OIóógún-Ajisà
Olóri gbogbo irúnmalè
Èsú. ó dirc gbà y i o
Láaróyè li nii gbogbo ara m i
Èsú, ó dire gbà y i o. 35
A ti rc Kétu Içç gba àse
Èsú. ó dire gbà y i o

C antiga de Exu (14)


(Entoada durante a iniciação, no m om ento em que o iniciado é consagrado a Exu, a
quem se pede que lhe conceda sorte)
F.xu, o ori dele agora tem m uita sorte.
Venha receber o iniciado.
Meu pai! Olhe para o malévolo.
Onde esta aquele que pratica o mal, como o pássaro sagrado àparó?
Você que abre caminhos, acom panhe o iniciado ao longo de seu destino. 5
Foi você que sem nenhum esforço m atou Idàçmi.

387
Idàçmi: referência a um determ inado adversário.
A quem o desrespeitoso estará desafiando?
Exu, o ori dele agora tem muita sorte. Venha recebê-lo.
Oh! Meu pai! Rei de Kétu,
O nde o bem pode mais que o mal. 10
Iremos a Kétu receber axé das mãos do Rei.
Exu, o ori dele agora tem muita sorte. Venha recebê-lo.
Exu, venha ouvir o que o destino reserva para ele.
Exu, o ori dele agora tem muita sorte. Venha recebê-lo.
Exu, venha ouvir o que o Eledá dele está dizendo. 15
Solicita-se a Exu que escute, testemunhe e torne realidade essas predições.
Exu, o ori dele agora tem m uita sorte. Venha recebê-lo.
Senhor do meu ori,
Grande o suficiente para que nos iniciemos nele.
Exu, venha receber este ori!
Meu pai, rei dc Kétu. 20
O ori dele é agora um ori de m uita sorte. Venha recebê-lo.
Já fomos a Kétu
Receber o axé de Exu.
Exu, o ori dele agora tem muita sorte. Venha recebê-lo.
O venerável que se cham a I.atopá. 25
O hom em forte
Que sc encontra no cam inho da feira,
Exu, o ori dele agora tem muita sorte. Venha recebê-lo.
O hom em das encruzilhadas que se chama Laroiê.
Exu, o ori dele agora tem muita sorte. Venha recebê-lo. 30
Mago poderoso cuja magia pode ser usada com toda a confiança.
O líder de todas as divindades.
Exu, o ori dele agora tem muita sorte. Venha recebê-lo.
Laroiê, que respira e transpira por todo o corpo.
Exu, o ori dele agora tem m uita sorte. Venha recebê-lo. 35
(á fomos a Kétu receber axé.
Exu, o ori dele agora tem muita sorte. Venha recebê-lo.

Orin Èsú (15)


(Itá é o terceiro dia de um ritual. Esta cantiga é entoada no terceiro dia da iniciação
ou da festa anual com o objetivo dc convidar o Senhor dc itá, a divindade que rege
esse dia, para, juntam ente com Exu, receber as oferendas).
Onita yà wá gbá ita o.

388
Èsú plçgbara, wá gbá ita
Ebçra, ti njç látççpa
Çbo ita re o
Wá gbá çbç re o. 5
Èsú, iwo ni onita o.
Yà wá o,
K í o wá gbá ita re,
Èsú onilé orita yà wá o,
K í o wá gbá iré çtxf, 10
Nilé òrisà wá, a r ’ohun fún Èsú
Onílé orita. Èsú òdârú
Èsú elépo Içnu
Esú çkúnrin
Qkúnrin kúkúrú, qkúnrin gògòrò 15
Èsú, a báni wá çràn bí a ò rídá
A lé ténté sí éyin eléyin
Èsú láàlú
iw ç ni onita
Yà wá gbá iré rç o, Èsú 20

C antiga de Exu (15)


(Itá é o terceiro dia de um ritual. Esta cantiga t1 entoada no terceiro dia da iniciação
ou da festa anual com o objetivo de convidar o Senhor dc itá, a divindade que rege
esse dia, para, juntam ente com Exu, receber as oferendas).
Oh! Senhor dc Itá! Venha receber o ebó!
Exu Elegbara, venha receber o itá!
O venerável que se chama Latopá!
Oh! Aqui estão as oferendas do Itá!
Venha receber o seu ebó. 5
Solicita-se a Exu que durante sua cam inhada venha até onde estam os e que inclua,
entre as suas múltiplas atribuições, vir e perm anecer conosco.
Exu, você é o dono de Itá,
Venha para cá
Receber o seu ebó de Itá.
Exu, Senhor das Encruzilhadas!
Venha receber este presente, venha receber o que há de m elhor no ebó. 10
É oferecido a Exu o que há dc melhor no ebó e se solicita a ele que retribua, dando o
que há dc m elhor na vida à pessoa que realiza a oferenda.
Em nossa casa de axé temos presentes para Exu.

389
O Senhor das Encruzilhadas é Exu, o Forte.
Exu, que saboreia o azeite de dendê em sua boca.
Hom em dos caminhos,
Hom em baixo, Hom em alto. 15
Okúnrin-kúkúrú, Homem baixo, e Qkúnrin-gògórò. Homem alto. indicam o poder
de transform ação de Exu e denotam ser ele dotado de m últiplas possibilidades, al­
gum as das quais aparentem ente contraditórias.
Exu, que arruma problemas para os homens mesmo quando não há problemas.
E pousa nas costas das pessoas imobilizando-as.
Exuro Famoso,
Você é o Senhor de Itá!
Oh! Exu! Venha receber este presente. Venha receber tu d o o que há de
m elhor. 20
Exu pousa nas costas das pessoas imobilizando-as. Imobiliza, portanto, os inimigos (en­
tendendo-se por inimigo não apenas uma pessoa, mas qualquer circunstância adversa).

Orin Èsú (16)


(Entoada no m om ento da entrega do ebó na encruzilhada ou em outro local)
Esú bç. wá bá wá rè 'kóríta
Èsú bç. wá bá wá rè'kóríta
Esu bò. wá bá wá rè'kóríta
Esú gbá.
A gbé çbç re ikóríta 5
Esú gbà o
Lçgbara, a gbè çbç rè'kóríta.
Esú gbà
A gbè çbç rè 'kóríta
Èsú gbà 10
Oba íó ni òpó
Èsú çdàrà ló ni ikóríta mçta,
Èsú gbà.
A gbé çbç rè 'kóríta
Èsú gbà 15
Jç a mú àsç bç ikóríta.
Èsú gbà.
Jç á mú àsç bç ikóríta
Èsú gbà.
Je á mú àsç bç ikóríta o 20
Èsú nbà.

390
C antiga de Exu (16)
(Entoada no m om ento da entrega do ebó na encruzilhada ou em outro local)
Exu! Venha e nos acom panhe até a encruzilhada.
Exu! Venha c nos acom panhe até a encruzilhada.
Exu! Venha e nos acom panhe até a encruzilhada.
Exu! Receba!
Levamos o ebó até a encruzilhada.
Exu! Receba!
Legbara, levamos o ebó até a encruzilhada.
Kxu! Receba!
Levamos o ebó até a encruzilhada.
Exu! Receba!
Ao Rei pertence o trono,
A Exu pertence ikóríta mçta.
ikóríta: encruzilhada.
ikóríta mçta: encruzilhada em T ou Y; encontro de três ruas ou estradas.
Exu! Receba o ebó!
Levamos o ebó até a encruzilhada.
Exu! Receba!
Exu, perm ita que voltemos da encruzilhada com axé.
Exu! Receba o ebó!
Permita que voltemos da encruzilhada com axé.
Exu! Receba o ebó!
Permita que voltemos da encruzilhada com axé.
Exu! Receba o ebó!

Orin Èsú (17)


(Entoada para fortalecer a fala antes dc expressar os desejos ao orixá Exu)
Babalórisà: B i agbc bá kc nínú igbó.
gbogbo çyç oko, ni ngbç ohún agbe.
Egbè: Èsú çdárá wá gbç ohún wá o.
Babalórisà: B í àlúkò ba kó nínú igbó.
gbogbo çyç oko, ni ngbç ohún àlúkò.
Egbè: Èsú çdàrà wá gbç ohún wá o.
Babalórisà: B i awo bá íç. awo ni ngbç ohún awo.
Egbè: Awa ni omç awo, Èsú òdàrà, wá gbç iwúre wá.
Babalórisà: Èsú a dc o
Wá gbç ohún awo o.
Egbè: Èsú a dc o
Wá gbé ohún awo o.
Babalórisà: Qrúnmilâ ni ivgbç ohún çpçiç,
Egbè: Esú Qdàrà ní ngbç ohún çbo.
Babalórisà: Esú çdàrà wá gbç iwúrc wa o. Esú. 15

C antiga de Exu (17)


(Entoada para fortalecer a fala antes de expressar os desejos ao orixá Exu)
Sacerdote: Q uando o pássaro sagrado agbe canta na floresta
Todos os demais pássaros silenciam para ouvir o seu canto.
Coro: Exu! Venha nos ouvir!
Sacerdote: Q uando o pássaro sagrado alukó canta na floresta
Todos os pássaros silenciam para ouvir o seu canto. 5
Pronunciar os nom es agbe e àlúkò atrai a energia vital desses pássaros, o que
possibilita ser ouvido mais facilm ente por Exu.
Coro: Exu! Venha nos ouvir!
Sacerdote: Q uando um awô fala som ente outro awô pode
com preender o que diz.
Coro: Somos os awô, Exu Odara, venha ouvir nossas preces.
Sacerdote: Exu, nós chegamos.
• Venha ouvir a voz do awô. 10
A w ô significa segredo ou iniciado no segredo. O significado dc uma m en­
sagem secreta pode ser entendido som ente por outro iniciado no segredo:
trata-se de uma com unicação cifrada c hermética. A irò, portanto, é o inicia­
do no segredo preparado para sc com unicar com Exu.
Coro: Exu, nós chegamos.
Venha ouvir a voz do awô.
Sacerdote: O runm ilá é quem ouve e com preende a mensagem do opelé.
Coro: Exu e quem ouve e com preende a mensagem do ebó.
Sacerdote: Exu! Venha ouvir os nossos pedidos. 15
O runm ilá é o único que pode com preender as mensagens do jogo oracular
feito com opelé. Exu, grande am igo de O runm ilá, é quem m elhor com pre­
ende a mensagem do ebó. Refere-se ao fato de que Exu pode com preender o
sentido do ebó e a intenção do ofertante, que realiza a oferenda para alterar a
própria vida. O jogo, associado ao ebó, (5odc' alterar um destino.

Orin Èsú (18)


(Entoada no m om ento do sacrifício)
ÈsúOògbé
È súo ògbé

392
Èsú o òl:bè
A gún ‘wá
A gún 'wá 5
A gún ‘wá
A tun iwá se ibini
Ògbirígidi, a já / 'ódò, má fi ara pa.
A dé ibi siré;
Qkunrún çnà 10
K í o dé ibi.
K í o si iré silç báyi o.

C antiga dc Exu (18)


(Entoada no m om ento do sacrifício)
Exu, aquele que pode apoiar.
Exu, aquele que pode apoiar.
Exu, aquele que pode apoiar.
Exu, aquele que pode alterar iwá.
Exu, aquele que pode alterar iwá. 5
Exu pode alterar iwá (síntese de personalidade e caráter, expressos cm atitudes e
com portam entos). Exu pode alterar iwá para m elhor ou para pior, dependendo de
a pessoa estar sob a sua proteção ou não.
Exu, aquele que pode alterar iwá.
Aquele que m elhora (corrige) iwá.
O Poderoso que não sabe nadar e mesmo assim guerreou dentro do rio sem
sofrer danos.
Aquele que evita o mal e proporciona o bem.
Oh! Hom em dos caminhos! 10
Feche os caminhos do mal
E abra os caminhos do bem agora!
Exu fecha os cam inhos do mal e abre os cam inhos do bem .

O rin Èsú (19)


(Entoada 110 m om ento do sacrifício)
Èjç roro
n i m 'ògún, lóri Èsú o
Asónsó abc, èjç
Asónsó abe. èjç
Láàlú kò ni ori çrú 5
Asónsó abe, çjç lori Èsú

393
Qdárà, ko ni ori çríi o
Asónsó :ibe. çjç lórí Esú.

C antiga de Exu (19)


(Entoada no m om ento do sacrifício)
O sangue, elem ento vital
Atraído pela força de Ogum , é ofertado a Exu.
O poder da faca trazendo o sangue.
O poder da faca trazendo o sangue.
Lalú é leal porque ao receber a oferenda realiza o que lhe é solicitado____ §■
M enciona-se a força dc O gum , presente no metal da faca do sacrifício.
O poder da faca trazendo sangue a Exu.
Odara não tem cabeça para carregar nada.
O poder da faca trazendo sangue a Exu.
Refere-se ao fato de Exu Odara não carregar nada sobre a própria cabeça. Carregar
tem aqui o sentido de neutralizar forças negativas sem estar fisicam ente presente.
Implica também em tirar o peso das cabeças, não deixar nada sem solução.

Orin Èsíi (20)


(Entoada após o sacrifício, enquanto as penas da ave são retiradas e colocadas sobre
o sím bolo de Exu. M enciona-se o nom e lyá-mògún para que as M ães venham com ­
partilhar da oferenda)
Esú fl iré bo wá o
Èià fi iré bo wá yà yà
Èsú gbé iré ajé ko wá o,
Èlá ít iré bo wá yà yà,
Iyá-mògún ti iré bo wá o 5
Èlá fi iré bo wá yà yà.

C antiga de Exu (20)


(Entoada após o sacrifício, enquanto as penas da ave são retiradas e colocadas sobre
o sím bolo de Exu. M enciona-se o n om e lyá-m ògún para que as M ães venham com ­
partilhar a oferenda)
Exu! Traga m uita sorte para nós e faça nossas vidas repletas de coisas boas.
Elá! Traga m uita sorte às nossas vidas.
Exu! Traga sorte e progresso às nossas vidas.
Elá! Traga muita sorte às nossas vidas.
lyá-m ògún, traga m uita sorte para nós e faça nossas vidas repletas de coisas
boas. 5

394
Refere-se às boas coisas que o ofertante está pedindo a Exu.
Elá! Traga muita sorte às nossas vidas.

Orin Èsú (21)


(Entoada ao colocar três búzios abertos no assentamento de Exu e por ocasião d
louvação a ele)
Eèlô lówó rç o
Láaróyc, écló lowó
Bàrà baba Alá
A gbé 01110 tún çmo gbé
Baba çlçbç i
Eçta lowó rç o, Èsú
Eçta rç o.
Qdàrà, baba awo.

C antiga de Exu (21)


(Entoada ao colocar três búzios abertos no assentamento de Exu e por ocasião d;
louvação a ele)
Qual é o valor do seu dinheiro?
Laroiê, qual é o valor do seu dinheiro?
Bará, Senhor do axé,
Que apóia um ser por incontáveis vezes.
Senhor do ebó. í
Essa pergunta poderia ser form ulada assim: Quantos búzios devemos colocar cn
seu assentamento?
Três é o valor do seu dinheiro.
Aqui estão os três búzios,
Odara, dono do segredo.
A pergunta é respondida: É preciso (neste caso) colocar três búzios no assentamente
de Exu. C om o é sabido, durante m uito tem po os búzios foram utilizados com o m o­
eda corrente. A oferenda de três búzios tem os seguintes significados: (1) o númere
três sim boliza Exu; (2) o valor sagrado do que Exu prom ove de bom na vida da;
pessoas é aqui sim bolizado pelo dinheiro, através d o qual se realizam trocas e st
estimula a gratidão das pessoas beneficiadas.

Orin Èsú (22)


(Entoada ao ser colocado um determ inado valor em búzios abertos no assentamen­
to de Exu - 1 búzio, 3 búzios, colar de 160 búzios ou, ainda, um valor indeterm ina­
do. Entoada também por ocasião da louvação a Exu)
Eéèló lowó rç o Látççpa
Eéèló lowó rç o Qdàrà ti o njç adi
Oókan çyo lowó rç o, Esú
Eççta çyo lowó rç o, Èsú Qdàrà
Lçgbara baba awo 5
Qpò lowó rç o.

C antiga dc Exu (22)


(Entoada ao ser colocado uni determ inado valor em búzios abertos no assentamen­
to de Exu - 1 búzio, 3 búzios, colar de 160 búzios ou, ainda, um valor indeterm ina­
do. Entoada tam bém por ocasião da louvação a Exu)
Latopá, qual é o valor do seu dinheiro?
Qual é o valor do seu dinheiro, Odara, que não com e adiç?
O valor do seu dinheiro é um búzio, Exu.
O valor do seu dinheiro são três búzios, Exu Odara.
Legbará, dono do segredo, 5
O valor do seu dinheiro são m uitos búzios.

Orin Èsú (23)


Orí m í
Jç nkó ire Èsú dele
Elçda mí, j ç nko iré Èsú láyé
Èsú Qdàrà, j e nríjç, k i nrímu Láyé temi
Èsú, j e èm í o rijç 5

C antiga de Exu (23)


Oh! Meu Ori!
Seja favorável a mim, para que eu volte para casa com a sorte dada por Exu.
Meu Eledá! Ajude-me a encontrar proteção, sorte e bênçãos de Exu em meu
caminho.
Exu Odara! Abençoa-me para que eu tenha sem pre o que com er e beber na
minha vida.
Exu! Atraia para mim o que comer. 5
Minha casa refere-se, aqui, a meu ritmo de vida. minha rotina cotidiana. Solicita-se
a Exu que proporcione oportunidades de lutar pela sobrevivência.

Orin Èsú (24)


(Entoada no m om ento do sacrifício)
Èjç balç, K i ara ró

396
1

Èsú saara sóró


Èjç balç, K í ara rç
Èsú saara sóró.
Eje balç, k i ara %>. 5

Cantiga dc Exu (24)


(Entoada no m om ento do sacrifício)
Que caia o sangue para que a vida se harmonize.
Exu harmoniza o corpo e a vida.
Que caia o sangue para que a vida se harmonize.
Exu harmoniza o corpo e a vida.
Que caia o sangue para que a vida se harmonize. 5
Refere-se ao fato de Exu harm onizar a pessoa e o seu entorno.

Orin Èsú (25)


(Entoada para solicitar apoio a Exu cm iniciativas e em preendim entos)
Babalorisa: Alángàjigá
Èsú á gbà m i o
Elégbèjè àdó,
Egbc: A lángàjigá
Babalorisa: Qdàrà. a gbè wá o 5
Elégbèjé àdó,
Alásç
Egbè: A lángàjigá

Cantiga de Exu (25)


(Entoada para solicitar apoio a Exu em iniciativas e em preendim entos)
Sacerdote: Alángájígá!
Exu me apoiará.
O mago que possui 1400 adòs carregados de magias de todo tipo.
Coro: Alángájígá!
Sacerdote: Odara nos apoiará. 5
Adô: preparado m ágico-m edicinal que fica guardado num a cabaça pequena em
form ato de moringa.
Alángájígá: Aquele que apóia, dá suporte, protege, traz vida.
Odara: o Benevolente: Aquele que realiza o bem.
O mago que possui 1400 adòs carregados dc magias de todo tipo.
Senhor do Axé.
Coro: Alángájígá!

397

i
O rin Èsíi (26)
(Entoada ao sc ofcrecer obi a Exu em agradecim ento pela proteção recebida e como
ato de celebração da vida e da alegria trazida à pessoa por bondade dc Exu)
Jó kò m i o, kó o gbobi o
A wo rerc
Jó kó m i o. kó gbobi o
A w o rcrc
Èsú jó kò m i o, kó gbobi o 5
A wo rerc
Jó kò m i o. k ó gbobi o
A wo rcrc.

C antiga de Exu (26)


(Entoada ao se oferecer obi a Exu em agradecim ento pela proteção recebida e com o
ato dc celebração da vida c da alegria trazida à pessoa por bondade de Exu)
Venha alegremente a meu encontro e receba o obi que eu quero te oferecer.
Oh! Bom awô!
Awô, neste contexto, significa dono do segredo.
Venha alegrem ente a meu enco n tro e receba o obi que eu quero te ofe­
recer.
Oh! Bom awô!
Exu, venha alegremente a meu encontro e receba o obi que eu quero te
oferecer. 5
Oh! Bom awô!
Venha alegremente a meu encontro e receba o obi que eu quero te oferecer.
Oh! Bom awô!

Orin Èsu (27)


(Entoada durante oferendas e ebós)
Bubalorisa: Èsú. sçw ç dçdçrç;
gbçbç y ií o
Sowç dçdçrç.
Egbe: Èsú, sçw ç dçdçrç
gbçbç y ií o 5
sçw ç dçdçrç

C antiga de Exu (27)


(Entoada durante oferendas e ebós)
Sacerdote: Exu! Venha generosamente receber o seu ebó. Acolha nossa oferenda.

398
Rcceba este ebó!
Venha generosamente receber o seu ebó. Acolha a nossa oferenda.
C oro: Exu! Venha generosam ente receber o seu ebó. Acolha a nossa ofe­
renda.
Receba este ebó! 5
Venha generosam ente receber o seu ebó. Acolha a nossa oferenda.

Orin Èsú (28)


(Entoada para que a pessoa esteja sempre sob a proteção de Exu)
Babalorisa: Qdàrà dim í mu
K í o má yún m í nú o.
Iwèrè ara igi K iín w ç nú o.
Egbe: Esú dimí mú
K í o má yún m í nú o 5
Iwèrè ara igi kií nw ç nú o.

Cantiga dc Exu (28)


(Entoada para que a pessoa esteja sempre sob a proteção de Exu)
Sacerdote: Odara! Me segure!
Não me solte! ~
Porque as folhas que brotam no tronco da árvore nunca caem.
Coro: Exu! Me segure!
Não me solte! 5
Porque as folhas que brotam no tronco da árvore nunca caem.
Pede-se a Exu que não nos abandone e que seu axé esteja sempre em nossa vida.

Orin Èsú (29)


Bara olçgo
Bara çlçgç amoyin
Elèsú dé Láaróyè ti njó búkenkç
Èsú ló y ç k í a kókó k í
Onilé orita 5
Èsú ló yç k í a k ç kç k í
Èsú má gbòdc ira lç
Onilé oríta o
Èsú ma gbòdc wa lç 10
Èsú máa sc wá rara
Èsú má sc m í yakata
Onilé oríta

399
C antiga dc Exu (29)
Bará, que tem um porrete.
Bará, que tem um porrete e a quem se pede proteção para se obter doçura.
Aqui está o devoto de Laroiê dançando em sua hom enagem .
Exu é o prim eiro a ser louvado.
É ele o Senhor das encruzilhadas. 5
Nesta cantiga solicita-se a Exu que não fique indiferente em relação a nós.
Bará: Aquele que age rapidamente; Forte; eternam ente Vigoroso.
Laroiê: Aquele que é louvável; Aquele cujo nom e é sempre lem brado e confere sen­
tido à vida.
Exu é o prim eiro a ser louvado.
Exu, não passe por nossa casa sem nos deixar o seu axé e a sua benção.
Oh! Senhor das encruzilhadas!
Exu, não passe por nossa casa sem nos deixar o seu axé c a sua benção.
Exu, não nos faça sofrer (com sua ausência ou indiferença). 10
Exu, não deixe que a m inha vida transcorra cm vão e eu venha a me enver-
jonhar perante a sociedade.
Dh! Senhor das encruzilhadas!

Orin Èsú (30)


Èsú yóò gbèm i o
Elésúdé ti njç láaróyè
Ti njó búkçnkç
Èsú yóò gbè m i o
Ò gb é çm ç lún çm ç gbé. 5

Zantiga de Exu (30)


Exu me dará todo apoio.
\qui está o devoto de Exu Laroiê.
üom os seus passos de dança sagrada
;xu me dará todo apoio.
i ele que apóia repetidas vezes, incansavelmente. 5

Orin Èsú (31)


Èsú ò naa çm ç ni lágbà ná Çmç
Èsú má ná m i o
Èsú má siwájú m i
K i o má si lún gbçyin m i
Èsú kó o lá m i o 5

-100
Èsú Láaróyè
Arògbó, Agúnbiadé
N i yóò sé o
Èsú ni yóò s 'çtá à m i
N i yóò mú u o 10
Èsú ni yóò mú çtá à m i
Gbàké olówó çyá
Èsú çlànà ki ibi re

Cantiga dc Exu (31)


Exu équem ensina o hom em a disciplinar-se e lhe indica o cam inho.
Exu, não se ausente de m inha vida e não deixe de me disciplinar.
Exu, não fique na m inha frente,
Nem fique atrás.
Exu! Enriqueça a m inha vida. 5
M uitas ações são necessárias para realizarm os o que deve ser realizado. Nesta cantiga
solicita-se a Exu que nos proteja antes e depois de cada ação.
Nem tique atrás se refere a questões do passado que perm anecem na m em ória
- fatos que ficaram para trás.
Exu Laroiê! Imortal, grande, firme, belo, rico e nobre com o um a coroa.
É ele quem confundirá os meus inimigos.
É Exu quem m anipulará os meus inimigos.
É ele quem castigará. 10
Exu équem castigará os meus inimigos.
Forte como um machado, próspero dono dos búzios.
Exu, que abre caminhos, abra o cam inho da sorte pra mim.

Orin Èsú (32)


Èsú sàn m i o
Mo délé, mo rúbo o
Èsú sàn m i o
Mo rúbo k i nségun çtá
Èsú sàn m i o. 5
Mo rúbç k í nlówó
È sú sà n m i o
Mo rúbç k i n 'áyò
Èsú sàn m i o
Mo rúbç k i niyi ati àláafià. 10
Èsú sàn m í o.

•101
C antiga dc Exu (32)
Exu! Faça com que tudo mc seja favorável.
Eu fiz ebó.
Exu! Seja favorável a mim.
Fiz ebó para vencer o inimigo e o mal.
Exu! Seja favorável a mim. 5
Fiz ebó para prosperar na vida.
Exu! Seja favorável a mim.
Fiz ebó para ter felicidade 11a vida.
Exu! Seja favorável a mim.
Fiz ebó para ser respeitado e ter saúde. 10
Exu! Seja favorável a mim.

Orin Èsú (33)


Látççpa, Esú gengçn, Èsú
O gún iyán
Ó fún m i je, Èsú
Látççpa Èsú. gengçn, Èsú
Onídà 5
Ó b ú n m iÈ sú
Látççpa Èsú
Olúgbçn ni nmúra, k í Èsú gbe òini
Èsú, olówó çyç
Arçsà n í nimúra k í Èsú ó má se ôun 10
Èsú kò ni se wá n ilé y ií o
Esú a gbè wá n ilé y ií o

Cantiga de Exu (33)


Latopá, Exu, é sábio.
Ele preparou comida
E me deu de com er
Latopá, Exu, é sábio.
Ele tem prosperidade 5
Lntopá: Aquele que tem força para matar.
E me deu parte dessa prosperidade.
Com Latopá se obtém vantagens de todo tipo.
Sábio é aquele que realiza oferenda a Exu, solicitando o seu apoio.
Exu, o próspero, o dono dos búzios.

•102
Inteligente é aquele que realiza o que lhe com pete para não p erd er o
apoio dc Exu. 10
Nesta cantiga é feita referência ao fato de Exu haver garantido a subsistência e não
haver desam parado aqueles que a ele recorreram.
Exu não nos atrapalhará nesta jornada.
Exu nos dará proteção nesta jornada.

403
V
Glossário

A pronJadv. Aquele que, aquela que.


"A pronJadv. Aquele, aquela.

A Fidç Remo int. Aquela que enfeita seus filhos com braceletcs de bronze. Epíteto
de Oxum; evocação desse orixá.

Abanijé, aganni, agbàdülüm ò, çlçgàn, eleliní, onídiilúm » s. Caluniador, difa-


mador.

Abéòkúla s. Abeokutá, literalmente Cidade sob pedras. Uma das cidades que com ­
põem o reino iorubá. Capita! do estado de Ogum.

Àbíkú s. Abiku. A palavra àbikú, composta de a bi ku (nascido para morrer) ou de


a bi o ku (o parimos e ele morreu), designa crianças ou jovens que morrem
antes de atingir a idade adulta, adultos que morrem antes dos pais e adul­
tos que morrem antes de completar seu ciclo existencial. Há dois tipos de
àbikú: os àbikú-omçdé, que morrem ainda na infância, e os àbikú-àgbà. que
morrem jovens ou adultos. Considera-se que os abikus estabelecem çjç ori
com a Sociedade Abiku, ou seja, o pacto de retornarem ao orun ao atingir
determinada idade.

Àbilü 5. Praga, maldição.

A bòsí s: Decepção, desilusão; fraude, desonestidade, deslealdade, má fé.

•105
A bòsi s./adj. Pobreza; pobre, esfarrapado, miserável.

Adá s. Cutelo, facão.

A dàkàdèkè s. Mentira, perfídia, deslealdade.

Adíç s. Galinha.

A dim úlà 5. Protetor; Aquele que nos dá segurança (que é suficientemente forte
para nos dar segurança). Epíteto de Oxalá.

Adín, àdí .s'. Óleo extraído do fruto do dendezeiro. Ao ser colocado no assentamento
de Exu provoca a sua ira. Também utilizado para fins medicinais.

Ado s. Adô. Dom , graça.

Adó 5. Pequena cabaça utilizada para a conservação de pós de uso mágico e me­
dicinal.

Adósíi s. Iniciado.
Adtíghò s. Vizinhança, proximidade, bairro.
A dúpç int. Muito obrigado, grato, agradecido.

Adúrà s. Adura. Oração, súplica, petição, reza. Expressão de algo que se deseja obter
ou de um objetivo que se pretende alcançar, considerada excelente veículo do
axé, o poder de realização. Visa propiciar as graças dos orixás e dirige-se aos
elementos por eles dominados. Através de seu uso são feitos pedidos a um
orixá e procura-se agradá-lo, aplacar sua ira ou pedir-lhe que volte sua fúria
contra inimigos. Dirigida também aos ancestrais, para que afastem da com u­
nidade as doenças, as intrigas e a má sorte. Em cerimônias com o batizados c
casamentos, é verbalizada pelos anciãos. Como o intuito é de atrair o axé, aos
anciãos, sacerdotes e pais fica reservado o principal papel de sua entoação.

À fòm ç s. TAPINANTHUS, Loranthaccae. Planta parasita, visco.

Afçsèjinni s. O benevolente: aquele capaz de perdoar erros, ofensas e transgressões.

A foríji s. Aquele cujo ori perdoa o ori do outro: pessoa capaz de perdoar.

Afòse, ofò s. Afoxé, ofó. Poção mágica que confere poder à fala. Quando usado
pode impossibilitar a ação lógica de uma pessoa, levando-a obedecer a toda e
qualquer ordem. Esse poder da fala é utilizado para abençoar ou para amaldi­
çoar. No Brasil o termo afoxé adquiriu sentidos adicionais, com o o de cortejo
cama i alesco de negros que cantam canções de candomblé em nagô ou iorubá-,
e o de candomblé de qualidade inferior.

-106
Afura 5 . Desconfiado.
Àgan s. Ritual com que é iniciada a festividade de Egúngún.
Àgàn .v. Mulher estéril.

Agçinç s. Unia das sociedades de culto aos ancestrais masculinos.

À»ó s. Espécie cie rato listrado, rato do mato. Muito utilizado para fins mágicos e
medicinais, dado seu vigor, rapidez e precisão: é usado, por exemplo, em tra­
balhos realizados para uma criança que ainda não esteja falando ou andando,
embora já tenha idade para isso.

À^ò 5. Gaiola para aves; pedido de licença para entrar cm casa.

Àgò o Olódè int. Expressão de reverência a Obaluaiê. Significa Com sua licença,
Olodé!
A gogo, ago s. Sino; instrum ento m usical utilizado 110 culto a diversas divinda­
des, um dos preferidos de Exu; relógio. Agogo melo? significa Que horas
são?
Agogo òjé s. Sino de chumbo usado para evocar Oxalá; um de seus símbolos.
Agò, wèrè, iwèrè s. Insensatez, loucura, tolice, doidice.

Agòtún s. Aquele que faz da chuva uma fonte dc riqueza. Epíteto de Eledunmare.
A gúnbíadc s. Esbelto, forte e firme como uma coroa real. Epíteto de Exu: nome
que faz referência a sua realeza. Seus devotos, quando iniciados, passam a
integrar sua linhagem real.

Agütàn s. Ovelha.

Àjjbà s. Anciã. Epíteto de Iyami Oxorongá.

Agbada s. Vasilha enorme usada para torrar a mandioca na preparação da farinha;


frigideira; pote de barro de boca larga que, cm assentamentos, repousa sobre
um montículo de terra, ao lado do qual fica uma vassoura feita de çsç pòtú
(SIDA CORYMBOSA, Malvaceae) e untada com osún.

Agbádá 5. Manto, traje, roupa; estilo dc roupa usada pelos iorubás.

Agbàdo, igbàdo s. Milho; cereal.


Agbára s. Força, poder, capacidade, energia, autoridade, vigor, vigor físico.

Agbe s. Pássaro sagrado de plumagem azul. Suas penas são usadas para atrair sorte;
símbolo dc Oxóssi.

•107
A gbêdè s. Prutlcncia associada à inteligência.
A gbêlègbundà s. Pouco educado; não correto.
Agbênigi s. A expressão agbênigi. óromú adie abidi sonso, que se traduz como
agbênigi. o pintinho que possui cloaca pontuda, comia de algumas fórmulas
de encantamento; refere-se a algo de tamanho diminuto. Designa também
um nome mítico de Ossaim.

A gbére s. Arrogância, orgulho.


À gbède s. Forja.
Agbòdçdolá a'. Nome dado a devotos de Ogum. Significa A forja transformou minha
vida em prosperidade.
Agbò s. Carneiro.

Agbo s. Preparado medicinal de origem mineral, vegetal ou animal, cozido ou não,


usado para beber 011 para banhar-se.

Agbo tútii s. Agbo preparado com água fria, banho frio.


A gbo-ilé, agbolc s. Estilo tradicional nigeriano de moradia, com várias casas agru­
padas; conjunto de casas no mesmo bairro. —

A gbódcgbà .s\ Fofoqueiro; receptador dc furtos.

Agbon s. COCOS NUCIFERA, Palmae. Coqueiro, coco; cocada preparada com mel.

Agbónmircgún s. F.piteto de Orunmilá.


Ahalè, halçhalç, onílialç adj. Fanfarrão, gabarola, arrogante.
Àhíiso-òrò s. Mentira, falsidade, perfídia; história falsa.
\i adv./pref. Não; como prefixo indica a ausência de algo.
Vibçrü, aki, akin, akoni, aláifòyà, gbóiyà, gbójú, láyà, lókàn, ògbóyà, onígbóyà,
òláiya. olókàn s. Herói, bravo, valente, corajoso, intrépido, destemido, au­
daz.

Vidúpê, àisopé, àjçsç, àjçso s. Ingratidão. Àjçsç significa, literalmente, come e


nega que comeu (ignora o bem recebido).
Vifòyà, igbóiyà, igbójú, iláyà, ilókàn, im ójúkuku s. Coragem, intrepidez, atre­
vimento, audácia, ousadia.

Vifokàntán s. Desconfiança; objeto não confiável.

•108
1

À igbàgbó Incredulidade, infidelidade, descrença, desesperança.

A igbéjé s./adj. Inquietação, impaciência, ausência de tranqüilidade; impaciente,


obstinado, pertinaz, inquieto.

Àigberaga, irèlè s. Humildade, modéstia.


Aigbón .v. Tolice, asneira, estupidez, insensatez.

Aikanm inú s. listado anímico de paciência que não deixa lugar à ansiedade nem à
angústia, economizando energia vital.

Aikanú s. Insensibilidade, falta de compaixão.


Àilajò, àilàniyàn s. Falta de compaixão; antipatia.
Ailávà 5 . Falta de coragem.

Àilójúti s. Descaramento, sem-vergonhice, cinismo, imprudência, falta de m o ­


déstia.

Aim òyc s. Imprudência, ignorância, tolice, desatino, asneira.


Ainá 5. Nome pessoal dado à criança nascida com o cordão umbilical à volta do
pescoço.

Àinígbêkèlc s. Desconfiança.
Àinísuúrü s. Impaciência; pressa, precipitação.
Àinitijú s. Falta de modéstia, falta de pudor, descaramento; imprudência.
Aiscrú s. Honestidade, lealdade, sinceridade.
Aisetarà s./adj. Desonestidade; desonesto.
Aisi s. Correção, exatidão.
Aisimi s./v. Impaciência, diligência; ato de portar-se com impaciência, inquie­
tação, diligência, perseverância; ato de permanecer em m ovimento, de não
descansar.

Àisiycm eji s. Certeza, convicção absoluta (no sentido de não haver dualidade, e
sim unicidade, inteireza).

Aisó s. Firmeza, impermeabilidade, justeza.


Aisògo 5. Sem vangloria ou jactãncia.

Àisojtísájú 5 . Honestidade, lealdade, imparcialidade.

409
Àisòdodo, àisòtó .•?. Maldade, injustiça; falsidade, inverdade, mentira.
Àisore s. Descortesia, indelicadeza; maldade.
Aitúwóká s. Mesquinhez, ausência de generosidade; indica o ato dc não abrir a
mão, de mantê-la fechada.
Aiyà s. Peito, coração; coragem.
Aivé s. Aiye. Mundo, universo; globo terrestre, espaço terrestre, planeta terra;
dimensão física da existência; humanidade. Refere-se também aos bruxos, às
____ bruxas e.àsJontcs-dexonhccimen to do-sagrado________________________
Ajá s. Cão, cachorro; ciclone, vendaval. Epíteto de Aroni.
Àjà, àdíjà 5. Instrumento musical forjado cm ferro, em formato de sino, usado
como símbolo de Oxalá, por ser um de seus prediletos. É tocado no acompa­
nhamento de mulheres que seguem a caminho do rio para apanhar água para
este orixá c também para invocá-lo.
Àjàgünmàlè s. Epíteto de Ifá. Orixá com poder para fazer o homem alcançar seus
objetivos e estabelecer vínculos com todas as forças da natureza, tanto no
orun quanto no aye.
Ajagun s. Vitorioso caçador cguerreiro. Epíteto de Oxóssi.
Ajagünnà s. Estrategista que destrói o mal e que oferece boas ideias. Epíteto de
Oxóssi.
Ajàlá s. Orixá responsável, ao lado de Oxalá, por modelar os oris dos seres.
Ajàlé Erémi s. Cidade mítica iorubá.
Ajé s. Ajé. Dinheiro; concha; Orixá da riqueza e da prosperidade. A palavra Ajé pode
ser traduzida como Progresso para você. Sucesso para vocêe Que aquilo que
você espera dc seu trabalho sc concretize.
Ajé Ògúgúlúsò s. Ajê, Senhora da morada da sorte e das realizações do homem.
Epíteto de Ajê.
Ajé Saluga s. Aje, Senhora do paraíso da riqueza. Epíteto de Ajê.
Ajç 5. Mulher iniciada no culto a Iyami Oxorongá; mulher dotada de poderes es­
peciais que os utiliza para praticar tanto o bem quanto o mal. As Ajé Funfun
trabalham especialmente para o bem, enquanto as Ajç Pupa trabalham espe­
cialmente para o mal. Epíteto de Iyami Oxorongá.
Ajígidán-irin s. Resistente c indestrutível. Epíteto de Exu que faz referência a sua

410
invencibilidade, pois ele nunca perde uma disputa.
Ajíróba s. Literalmente, Aquele que vê o rei ao amanhecer. Designa o grupo de
conselheiros do rei.
Ajíròso s. Literalmente, ladrão dc palavras; refere-se a pessoa que fala dos outros
pelas costas e revela segredos a ela confiados.
Ajogún s. Seres míticos que estabelecem a comunicação entre os mundos visível,
aiyc, e invisível, çrun. Alimentam-se do ebó, absorvendo as energias indese­
jáveis associadas aos problemas, e transportam o axé dos orixás. Sua ação é
de mão dupla: levam as energias deletérias próprias dos problemas e trazem
o axé dos orixás.
Ajo. ijo s. Assembléia, reunião, congresso, junta, congregação. Organização co­
operativa em que a coleta de dinheiro reverte cm beneficio dc uma pessoa
ou grupo necessitado ou de uma poupança coletiva, um fundo comum que
se destina a cada integrante do grupo, num sistema de rodízio, até que todos
sejam beneficiados.
Àkàrà s. Acarajé. Bolinho frito preparado com feijão fradinho, cebola e sal e ofere­
cido às divindades como sinal de abundância e multiplicidade.
Aké s. Machado, machadinho, enxó.
Akòkò s. NEWBOULDIA LAEVIS, Bignoniaceae. Árvore sagrada cujas folhas são
usadas na consagração de reis e cm vários rituais de culto aos orixás.
Akokoro s. Foice; dor de dente.
Akosèjayé s. Primeiro jogo divinatório realizado logo após o nascimento dc uma
criança para o conhecimento de seu destino. Através desse jogo os pais ficam sa­
bendo quais são as energias favoráveis e as desfavoráveis e recebem orientações
a respeito de como proceder para que ela tenha uma vida bem-aventurada.
Akiiko, àkíiko-adíç s. Galo.
Aláàfin Òvó s. Rei de Qvç: Dono do palácio dc Qyç. Título do rei dc Qyó. cidade
onde Xangó reinou. Epíteto de Xangô; evocação desse orixá.
Aláàgbáà s. Sacerdotes de F.gungun.
Alábaláse s. Oráculo. Regente que empunha o cetro (símbolo da autoridade di­
vina). Epíteto de Oxalá, a ele conferido devido a seu papel dc revelador de
acontecimentos futuros.

411
Alábe s. Homem da navalha; dono da navalha. Artesão que inscreve as marcas
faciais para identificação da família à qjaal o indivíduo pertence. Essas
marcas são de suma importância na sociedade iorubá. É ele que faz
também, circuncisões, incisões e sacrifícios rituais.
Alábòsí s. Hipócrita, enganador, dissimulador, impostor; insensato, desajuizado.
A ládé s. Aquele que foi escolhido para ser coroado; rei, príncipe.
Aládé séséçfim s. Rei cuja coroa é confeccionada com sçççefun (miçangas brancas);
Dono da coroa feita de cauris c contas brancas, um dos símbolos mais impor­
tantes de Oxalá. Um de seus epítetos e uma das formas de saudá-lo.
Alàdó s. Aquele que racha o pilão. Epíteto de Xangô; evocação desse orixá.
Aláfíà s. Paz, saúde, felicidade, ventura.
Aláfojúdi s./adj. Insolência, arrogância, desrespeito, descaramento; insolente, ar­
rogante, desrespeitador, descarado.
Alàgirl s. Aquele que abre paredes. Evocação de Xangô; louvação dirigida a esse orixá.
Alágógo-ijà s. Senhor do sino da discórdia. Epíteto de Exu; remete à ideia de que a
ausência de seu axé favorece a ocorrência de desordem no âmbito individual
ou no coletivo. Quando uma pessoa está agressiva, fora de controle, causando
confusão, ou quando há pessoas brigando.se diz que Exu está tocando seu sino
da discórdia nas proximidades. Nas orações a ele dirigidas pede-se que não to­
que seu sino no lar dos que oram. A ausência de disciplina e de responsabilidade
cria condições desfavoráveis. Exu é promotor da disciplina e da organização,
associadas, evidentemente, a compromisso e responsabilidade. Quando esses
elementos estão ausentes, as condições se tornam desfavoráveis e propícias à
confusão e aos mal-entendidos. Como as pessoas preferem atribuir a outros
a responsabilidade pelos próprios fracassos e sofrimentos, muitas vezes, e
impropriamente, atribuem a causa das discórdias a essa divindade, e não às
próprias omissões e falhas. Esse equívoco a respeito das causas do sofrimento
e da infelicidade favorece a interpretação de Exu como divindade ambígua.
Na realidade a desordem ocorre na ausência do axé de Exu.
A lágbára 5. Forte; Poderoso; Incansável; Aquele que influencia a vida das pessoas
para que sejam mais fortes. Epíteto de Exu. Designa também a pessoa dotada
de força, poder, capacidade, energia, autoridade, vigor, vigor físico.
Aláheso s./adj. Tagalerice associada à difamação; tagarela.
Alái, lái adv. Não. Advérbio utilizado para indicar a negação ou a ausência de algo.

412
1

Àláiberç s. Não iniciado.


Aláibçríi-olórun s./adj. Descreça, impiedade; descrente, ímpio.
Aláidúpn, aláilópo, aláimoré, alájçsç, jègúnmóyán, kòmora, láilópo, láimore
adj. Ingrato.
Aláife s. Ausência de amabilidade, má vontade; repugnância.
Aláifo, somota s. Ato dc ser mal-educado, descortés, grosseiro.
Aláijòkó s. Inquietação, impaciência. Literalmente, não consegue permanecer
sentado.
Aláilajò s. Sem solidariedade, incompreensivo, incompassivo, não zeloso.
Aláilógbón s. Insensato, desprovido de bom-senso.
Aláimoré s. Ingrato, mal-agradecido.
Aláiní s./adj. Indigência, pobreza, falta ou ausência; indigente, pobre.
Aláiníbàbá s. Órfão de pai.
Aláiníbèrü adj. Destemido, corajoso; desrespeitoso, mal-educado, ousado.
Aláinílárí s. Pessoa inútil, que não prospera.
Aláiní òtító s./adj. Mentira, falsidade, ausência de verdade, deslealdade, infidelidade;
mentiroso, falso, desprovido de verdade, desleal, infiel, não confiável.
Aláinípò s. Pessoa de posição indefinida na sociedade.
Aláinírètí s. Pessoa sem esperança ou desesperada.
Aláinisç adj. Desocupado, preguiçoso, vadio, desempregado.
Aláinnvà adj. Sem caráter, inútil.
Aláiníyè s. Pessoa de péssima memória.
Aláisòdodo s./adj. Maldade,desonestidade, injustiça, deslealdade, infidelidade; mau,
desonesto, injusto, desleal, infiel.
Aláisótó s./adj. Injustiça, desonestidade, mentira, deslealdade, falsidade; injusto,
desonesto, mentiroso, desleal, falso.
Alákáayé s. Aquele que c espalhado pelo inundo inteiro. Epíteto de Ogum.
Alákétu s. Rei da cidade de Kétu; Patrono e protetor do povo de Kétu. Epíteto de
Exu, referindo-se a sua realeza. Epíteto também de Oxóssi.

•113
Alákòbáá 5. Aquele que contamina os outros com o seu azar. Traz dano àqueles
com quem interage, ao contaminá-los com os efeitos da maldição dc que foi
vítima.
Alákòso s. Diretor, superintendente, presidente.
Àlàm ulániú-bàtá s. Epíteto de Exu, que denota seu bom humor e a alegria que
ele traz para a vida das pessoas. Durante suas festas, ao som do tambor bàtá,
é insistentemente evocado através desse nome, o que conduz seus iniciados
ao transe.
Alángájígá s. Aquele que apóia, dá suporte, protege: Aquele que traz vida; Aquele
que promove o crescimento humano. Epíteto de Exu.
Alnnú s. Aquele que é generoso; Aquele que sente a dor do outro (que com ele
compartilha a sua dor). Este vocábulo pode ser traduzido por compaixão,
benevolência.
A láàrúm ò agóngó ósü s. Homem da estrada que dispara flechas de bondade.
Epíteto de Exu.
Aiápadúpé s. Temos que aceitara inevitabilidade da morte. Epíteto de Obaluaiê.
A láròká, asòrò-eni-Iéhin adj. Detrator, murmurador, caluniador, maledicente,
difamador.
Aláròyé, irégbè, asobótibòti, oníréègbè adj. Falador, tagarela, palavreador, pal-
rador.
Alásegbé a-. Aquele que age sem sc arrepender. Epíteto de Ogum.
Alásç s. Portador do axé; Guardião do Axé. Ancestrais, babalaôs, babalorixás, ialo­
rixás, çba. osó. àjçe onifçgiin são chamados de alásç. Todo iniciado adquire,
através do processo iniciático, a condição de portador do axé de seu orixá.
Aláw óyè orno s. A que cura crianças. Epíteto das Iyami Oxorongá, especialmente
de Oxum.
Aláyídàyídà s./adj. Mudança, alteração; falso, desleal, camaleônico, duas caras.
Àlúkò s. Pássaro sagrado de plumagem vermelha. Suas penas são usadas para que
a pessoa encontre a própria sorte. Suas penas são muito usadas nos rituais
de orixás.
À lúpàyidà SIDA LINIFOI.1A, Malvaceae. Folha ou planta com poder de conferir
prestidigitação.

414
Am s./pron. Aquele que possui.
Àniàlà 5. Amalá. Comida predileta de Xangô, preparada com farinha de inhame,
às vezes substituída por farinha de mandioca.
Amòye, olóye s. Aquele que possui percepção, discernimento; homem sábio, pru­
dente, dotado de acuidade perceptiva.
Àmúlíi Odü, Omo Odíi s. Odus Menores. O corpus literário de Ifá é composto
de 16 odus maiores ou principais - Ojú Odú - e 240 odus menores - Çmç
Odü ou Amúlú Odú - que, somados aos maiores, perfazem um total de 256
conjuntos de poemas. Os Çmç Odú, literalmente, criança/filho do Odu, são
considerados filhos dos odus maiores, sendo seus nomes compostos pelos
nomes dos principais, dos quais “herdam” características. Os odus, sejam
maiores ou menores, são considerados divindades.
Anú, irnnú-anú, inútítç, kíkanií a-.Compaixão, piedade, clemência, generosidade.
Aparò s. Perdiz.
Apótí 5. Caixote, arca, caixa grande, banquinho. Banquinho de madeira sobre o
qual o iniciado senta durante os rituais iniciáticos.
Ará s. Corpo, membro, tronco, substância, casco de navio; trovão, raio.
Aráagbó, Egbç, Egbç-Aráagbó, Eré igbó .s\ Egbé Aragbó. Habitante da floresta;
Habitante do além; Sociedade dos Espíritos Amigos; Sociedade dos Amigos
Espirituais. Designa, ao mesmo tempo, um orixá e uma corporação de seres
espirituais. Esta irmandade é constituída pelos çgbç aiye, amigos do mundo
visivcl. e pelos çgbç orun, amigos do mundo invisível, também chamados de
amigos espirituais. Orixá protetor dos abikus, cultuado para que não tenham
morte precoce ou violenta. A floresta é sua morada. As pessoas costumam se
referir a eles dizendo Çgbç mi. Minha Sociedade ou Meus Companheiros.
Arábándé s. Aquele que chega com todo o vigor de sua natureza. Epíteto de Exu;
refere-se ao vigor trazido pelo orixá ao corpo das pessoas.
Arabíbú, ibúra s./v. Juramento; ato dc jurar.
Arékcrekè, àrckcndà s. Falsidade, hipocrisia, deslealdade; astúcia.
Arinnàkò s. Literalmente, encontro no caminho. Como os jogos oraculares, é um
canal de comunicação estabelecido entre o orixá e o seu devoto. Em um local
qualquer, este pode receber mensagens das divindades, pela boca de pessoas
conhecidas ou desconhecidas, que podem incluir recomendações e conselhos,

415
'

por exemplo, sobre a necessidade de realizar oferendas a determinado orixá.


irínúróde s. Aquele que vê o interior e o exterior das pessoas: Aquele que vê cm
profundidade {que compreende as coisas completa c profundamente). Epíteto
de Eledunmare.

.risün s. Festa anual de um ou mais orixás. Sua data e composição são definidas
através de consulta oracular durante os osés dedicados a esse(s) orixá(s).
ró 5. Cidade sobre a qual Ogum reinou.
ròká s. Fofoca, bisbilhotice, mexerico.
ròni 5. Orixá que possui cabeça semelhante à de um cachorro e uma única perna.
Mestre que viaja no ciclone, seqüestra seres humanos talentosos e os faz viver
consigo na floresta escura para depois trazê-los de volta, com grande conheci­
mento a respeito da prática de òògímc do valor medicinal das plantas. Epíteto
dc Ossaim, orixá das plantas.
sángiri s. Aquele que racha paredes. Epíteto de Xangô; evocação desse orixá.
je, A se s. Axé. Poder de realização; força vital, valor supremo, determinante do
ideal dc viver forte no plano material e social. Enquanto energia, pode ser ob­
tida ou perdida, acumulada ou esgotada, bem como transmitida. Seu acúmulo
manifesta-se física e socialmente como poder, e seu esgotamento como doença
física ou adversidades de toda ordem. A expressão A sç significa assim seja.
o que está sendo afirmado ocorrerá, acontecerá, assim será.
,iwájú Òrisà s. Lider dos orixás. Epíteto de Logunedé.
o 5. Tecido, roupa, traje, vestuário, vestido.
o dúdú s. Pano preto ou azul índigo; batik, tecido natural tingido em uma dessas
cores; tecido, roupa, traje, vestuário, vestido preto ou azul índigo.
o dúdú tábí pupa s. Pano preto, azul índigo ou vermelho; batik, tecido natural
tingido em uma dessas cores; tecido, roupa, traje, vestuário, vestido preto.
o funfun s. Pano branco; batik, tecido natural tingido de branco; tecido, roupa,
traje, vestuário, vestido branco.
n pupa s. Pano vermelho; batik, tecido natural tingido de vermelho; tecido, roupa,
traje, vestuário, vestido vermelho.
» wáji s. Pano azul índigo; batik, tecido natural tingido de azul índigo; tecido,
roupa, traje, vestuário, vestido vermelho.

416
:

A só, òsú 5.Tufo de cabelo deixado na nuca ao se raspar a cabeça do iaô durante o
processo iniciático cm Exu.
Apò s. Saco, bolso, mochila.
Apò Ifá 5. Bolsa de pano na qual o babalaô carrega a parafernália do jogo divina­
tório de Ifá.
Ata s. Pimenta.
Ataare s. XILOPIA AETHIOP1CA, Anonaceae. Pimenta-da-costa. Muito utilizada
nos rituais do culto aos orixás, é considerada um elemento potente para con­
ferir força vital à palavra, quando mascada antes ou durante a fala.
Atàmájúbà s. Aquele que negocia sem ter feito as devidas saudações.
Atàtà adj. Cortês, gentil, amável, importante, excelente.
Àtç s. Bandeja para exposição dc mercadorias; espécie de peneira usada para jogar
búzios.
Ate Èsú s. Peneira de palha, recoberta de couro vermelho. Após ser tratada com
folhas e çjç. a peneira é forrada de couro vermelho e penas de pombo branco.
É usada para carregar oferendas a Exu e, durante o transe, as pessoas presentes
têm a oportunidade de fazer suas ofertas ao orixá, ali colocando dinheiro e
outros objetos, enquanto entoam cantigas.
Atçlé Elçdàá s. Aquele que acompanha o homem e lhe concede sorte e prosperi­
dade; Aquele que atrai condições para a realização de um destino feliz; Aquele
que não abandona o homem nos momentos difíceis; Aquele que mostra ao
homem o caminho e protege o seu ori.
Atòmóra s./adj. Paciência e tolerância, associadas a longanimidade, resistência e
capacidade de aceitar circunstâncias e ocorrências adversas; paciente e tole­
rante, pessoa capaz de aceitar circunstâncias e ocorrências adversas.
Atçrçrekáyé s. Aquele que sc expande por toda a extensão da terra. Epíteto de Oxalá.
Atinúwá sJadj. Sinceridade, lealdade, cordialidade, espontaneidade; sincero, leal,
cordial, espontâneo.
Àtòri s. GLYPIIAEA BREVIS.TILIACEAE. Planta cuja vara é usada na confecção
de arco e flecha. Vara sagrada indispensável nos cultos a Egúngún, Egbé Aragbo
e Obaluaiê, entre outros orixás.
Àtowódá 5. Original, manufaturado.

417
Atúká-màásesàá s. Aquele que rompe em fragmentos que ninguém poderá reunir.
Epíteto de Exu: refere-se a seu poder de destruição como parte do processo de
mutações contínuas do universo. É inimaginável um mundo sem mutações e,
como toda mutação pressupõe fases de rompimento, cisão e destruição, a Exu
compete a tarefa de promover metamorfoses.
Awç s. Pote de barro usado para colocar a água sagrada dos orixás, que será utilizada
pelos devotos para beber ou para banhar-se. Colocado ao lado do assentamento,
esse pote contém água com poder terapêutico e força para atrair a sorte.
Awé Èsú s. Pote de barro usado para colocar a água sagrada de.Exu, queserá-
utilizada por seus devotos para beber ou para banhar-se. Colocado ao lado
do assentamento, esse pote contém água com poder terapêutico e força para
atrair a sorte. O awç Esú é plantado na terra, através de ritual análogo ao de
seu assentamento.
Awídãkç, oníréègbè, òso s. Conversa incessante, falação ininterrupta, tagarelice,
loquacidade.
Awo s. Ardil, mistério, segredo; pessoa versada cm mistérios, iniciado.
Awòrò s. Devoto dc orixá.
Awòrò Èsíi s. Devoto de Exu.
Awòyó s. Elegante c bela; Agradável aos olhos. Epíteto de Iemanjá.
Àwon Iyámi s. Minhas Mães, Nossas Mães; Zeladoras. Epíteto de Iyami Oxorongá.
Com um prononie pessoal, pode ser traduzida como as minhas Mães, ou
as nossas Mães; dependendo do caso o devoto deve saudá-las por todos ou
apenas por si mesmo.
Awíire 5. Boa sorte; amuleto para atrair boa sorte.
Aya s. Peito; enfrentamento.
Ayájç s. Encantamento proferido para potencializar a ação mágico-medicinal de
elementos. Literalmente o dia cm que as coisas aconteceram, narra histórias
e mitos dc origem correspondentes a ocorrências do presente; pretende-se, ao
recitá-los, reatualizar as forças primordiais atuantes no momento de criação
de tais ocorrências.
Àyàn s. D1STEMONANTHUS BENTHAMIANUS, Leguminosae. Árvore em que
Xangô teria se enforcado. Designa também os mestres-músicos-historiadores,
tradicionalistas da palavra oral.

418
Bàbá s. Pai; mestre; sacerdote de orixá. Uni dos nomes de Obaluaié.
Bnbamogbà s. Sacerdote de Xangô.
Babaláwo s. Babalaò. Literalmente, Senhor do segredo. Sacerdote de Orunmilá,
divindade iorubá da Sabedoria. Sacerdote que tem conhecimento e autoridade
para realizar o jogo oracular de Ifá. Para tornar-se babalaô são necessários,
pelo menos, de doze a dezesseis anos de estudos intensos. Não confundir com
babalorixá, nome atribuído ao sacerdote dos demais orixás.
Bàbálórisà, bàbálósà s. Babalorixá. Sacerdote de orixá (de todos os orixás, exceto
Orunmilá).
Bàbáiilá 5. Avô, grande pai.

Bàbáodii s. Sacerdote de igbá-odir.; babalaô.


Bàbá «lç s. Pai da preguiça; o mais preguiçoso dc todos. A expressão designa pessoas
muito preguiçosas.
Bádárò c. Simpatizar, compadecer-se, solidarizar-se.

Bákédiin v. Condoer-se, expressar condolências, solidarizar, compadecer-se.

Balè s. Governador, chefe de aldeia ou cidade, zelador (guardião); líder de um


agbole, fundador do clã eni torno do qual se desenvolveu o povoado, sendo
esse poder transmitido hereditariamente.
Bsilógun s. Capitão, chefe, comandante de guerra.
Bàlórúkojé, borúkojç, gbàdúlúm ò, sátá r. Caluniar, difamar.

Bará s. Aquele que age rapidamente.; Forte; Eternamente Vigoroso. Epíteto de


Exu.
Baralç r. Ser prudente, acautelar-se, proceder calmamente.

Bàtá s. Tambor sagrado, tocado com duas varinhas, usado 110 culto aos orixás.
Instrumento preferido de Xangô e um dos preferidos dc Exu. É um dos tam­
bores falantes, “veículos da história falada, esses instrumentos são venerados
e sagrados. Com efeito, incorporam-se ao artista, e seu lugar é tão importante
na mensagem que, graças às línguas tonais, a música torna-se diretamente in­
teligível, transformando-se o instrumento na voz do artista sem que este tenha
necessidade de articular uma só palavra. O tríplice ritmo tonal, de intensidade e
de duração, faz-se então, música significante. Na verdade, a música encontra-se

419
de tal modo integrada à tradição que algumas narrativas somente podem ser
transmitidas sob a forma cantada”. (KI-ZERBO, 1982, p. 91).

ú adj. Insolente, mal-educado, obsceno, descortés, imprudente.


nbç s. Tambor falante, tocado com uma única varinha, muito usado nos rituais
de Egúngún e de outros orixás. Um dos instrumentos preferidos de Oxum.
:. Nascido.
ú v. Zangar-se, enfadar-se, irritar-se.
újó v. Desgostar-se, ofender-se, descontentar-se, afligir-se.
í, borí s./v. Bori. Ritual de alimentar o ori, essência vital que responde pelo
destino humano. Ritual de busca de equilíbrio realizado para que as pessoas
tenham mais sorte e bem estar na vida.
ú, burúkú adj. Mau, perverso, malvado; o que pode vir a ser.
ibúrú adv. Humildemente, modestamente, reverentemente.

. Conceder.
sètàn s. Sinceridade, lealdade, franqueza, simplicidade.
t 5. Nome pessoal dado à criança que nasce com os cabelos encaracolados;
mensageiro de Xangô.
itánrnn adj. Polido, limpo, brilhante; suave, excelente,

i v. Perdoar.

adj. Intratável, rabugento, mal-humorado, rixento, perverso, irritadiço,


maldoso.

. Abuso, insulto, xingamento, maledicência.


Ilêyi! int. Saudação a Oyá (Iansâ).
i-ilé s. Determinado ancestral: o ancestral específico de um indivíduo.

420
Eégún-igbàlç s. Uni grupo de ancestrais (de caráter coletivo): trata-se do conjunto
dos ancestrais veneráveis de um indivíduo ou dc um grupo dc indivíduos.
Écgún, cgungun, s. Osso, esqueleto.

F.gúngún, Egiin, Eégún, Bàbá-Egún s. Egungun. Designa ao mesmo tempo um


orixá c uma corporação de seres espirituais, assim como o culto aos ancestrais
masculinos e sua instituição mais importante. Uma vez por ano, ou em oca­
siões especiais, cada família deles devota os evoca e eles caminham pelas ruas
da cidade, abençoando as pessoas e recebendo presentes. Também participam
dos rituais de iniciação em alguns orixás.
Egbé 5. Preparado mágico que transporta a pessoa de uma localidade para outra sem
que ela caminhe com os próprios pés. Magia muito usada por caçadores.
Ègbo s. Espécie de pudim dc milho; canjica branca, que pode ser regada com mel,
dependendo da finalidade ritual.
Egbògi, isègíin, òògíin s. Prática terapêutica que associa recursos de medicina e
de magia.
Ééji num. Dois.
Èjiila-Àsçbóra s. Odu dêTfá na prática do jogo dc búzios.

Èji-Ogbè s. Odu de Ifá.

Èjiòkò s. Odu de Ifá na prática do jogo dc búzios.

Èjirç, ibéji s. Gêmeos.

Èjirç òkín s. Expressão utilizada para comparar a beleza de possuir gêmeos à beleza
do pavão (pela combinação entre cjirç, irmãos e òkín, pavão).
Èké, cléke, iparó, ipuró, iró, irópípa, òkóbó s. Mentira, falsidade; fofoca.

Èké, eléke, òpiiró adj. Falso, mentiroso; fofoqueiro.

Èkéje num. Sétimo.

Èkuru, kúdíirú s. Comida feita de feijão fradinho moído e cozido no vapor. Também
é uma comida preparada com inhame cozido c amassado com dendê.
Èkuru-funfun s. Èkuru sem acompanhamento de molho.

Èkuru olóyin s. Massa de abará. Depois de cozida e esfarelada recebe mel.

Èkuru-pupa s. Èkuru acompanhado de molho preparado com azeite de dendê,


pimenta e outros temperos.

421
Èkúyà s. CLEOME GYNANDRA, Cappareceae. Muçambé-cor-de-rosa, muçambê-
dc-cinco-folhas.
Elédúnm arè, Elédúnm arè. Elcdíim nrc, Edúmàrè, O lódim m arè. Olódüm arè,
O lúwa, Olórí; O lórun, Olófín, O lófin-O run c Orísé. s. Eledunmare, o Ser
Supremo, o Pré-Existente.
Elégbèjé A dó s. Aquele que domina òôgún, a arte mágico-medicinal; Possuidor
de inúmeros poderes de cura c de eliminação do sofrimento; Feiticeiro; Dono
de milhares de adôs. Epíteto de Exu.
Eléjjbògi s. Curandeiro, conhecedor das plantas medicinais.

Eléliní 5. Palavra que associa os sentidos de fofoqueiro aos de caluniador e difa-


mador.
Elésúdé s. O devoto de Exu chegou trazendo o axé dessa divindade. Nome pessoal
em homenagem a Exu.
Emèrè s. Seres pertencentes á Egbç Abiku.
Èniyàn burúkú s. Homem cruel.

Epè s. Maldição, impropério, blasfêmia, praga; preparado mágico-medicinal que


potencializa a força do enunciado oral.
Epo s. Óleo de dendê ou qualquer lipo de óleo.

Eré, aré, iré s. Brincadeira; qualquer tipo de jogo.

Ere s. Imagem, ídolo, estátua.

Ere Esú s. Imagem de Exu, feita dc argila ou madeira de árvores sagradas como o
iroko. Uma característica comum na estética dessas esculturas é o pgç, um
adorno conhecido como “porrete”, localizado na nuca da imagem, como se
fosse cabelo enfeitado de búzios. Conforme o mencionado anteriormente,
um dos epítetos de Exu é Elógbàá-Qgç, literalmente, Portador dc centenas
dc porretes na nuca. E, como vimos, estes porretes são utilizados por Exu na
defesa contra inimigos que atacam pelas costas, como defesa contra o que não
se vê porque ocorre atrás de nós e como defesa contra atos do passado. O ògç
de Exu, que representa sua outra face, é esculpido na forma de cabelo liso ou
trançado, com detalhes em búzios ou não, e também na forma de animais
de várias espécies ou de diversas figuras humanas ocupadas em múltiplas
atividades. Cada tipo dc escultura possui simbologia própria. Assim sendo, a
forma ideal de representação de Exu para determinada pessoa deve ser indi­

422
cada pelo jogo divinatório. Desde o ato de esculpir a madeira já se proccde a
um ritual rigoroso, que inclui evocações, rezas, cantigas, saudações, danças e
oferendas, dc modo a venerar a madeira a ser esculpida, para melhor favorecer
a comunicação entre humano e o divino. Depois de esculpida, a imagem será
consagrada através de limpeza com folhas e çjç de animais apreciado pelo
orixá. Será então paramentada com colares próprios do orixá. Essa escultura é
considerada um assentamento de Exu e recebe os mesmos cuidados recebidos
por yangí. O Ère Èsú. quando modelado em argila, a ela se misturam muitas
folhas. Nesse caso, a imagem poderá apresentar o ògç com detalhes em búzios
— brancosrrepresentando olhos, nariz, boca e orelhas.___________

Èré igbó, Aráagbó, Egbç, Egbç A ráagbó s. Egbé Aragbô. Habitante da floresta;
Habitante do além; Sociedade dos Espíritos Amigos; Sociedade dos Amigos
Espirituais. Designa, ao mesmo tempo, um orixá e uma corporação de seres
espirituais. Orixá protetor dos abikus, cultuado para que não tenham morte
precoce ou violenta. A floresta é sua morada. As pessoas costumam se referir
a eles dizendo Egbç mi, Minha Sociedade ou Meus Companheiros.

Erelú s. Mulheres portadoras do axé de Iyami Oxorongá que dirigem a Sociedade


Geledé.

Erinlç s. Erinlé. Orixá feminino da caça, da medicina, da magia, da sabedoria e


da fertilidade, que zela por assuntos familiares. Inclui-se entre os primeiros
aprendizes de Ogum nas artes da caça e da guerra. É cultuada juntamente com
Ossaim, partilhando o mesmo assentamento que ele.

Erú s. O Grandioso. Epíteto de Exu.


Eso s. Frutas.
Eesíi 5. Inhame.

Eésíi yàlàyàlà s. Planta de grande fertilidade que cresce e sc espalha abundante­


mente.

Esit s. Exu. Um dos orixás primordiais. Orixá da ordem, da disciplina e da organiza­


ção. Mensageiro dos orixás e veiculador do axé das divindades. Sendo o inspetor
dos rituais, recebe atenções antes do início de todo ritual. Em grande parte da
literatura disponível Exu é apresentado como um ser ambíguo, entidade neutra
entre o bem e o mal ou, ainda, com o simultaneamente bom e mau. Caracte­
rizado como grande estrategista, com inclinação para o lúdico, sua fidelidade
à palavra e à verdade, seu bom senso, sua ponderação e seu discernimento lhe
conferem a capacidade de julgar com justiça e sabedoria.

423
jb án b í s. Exu favoreceu a fertilidade de minha mãe e propiciou aos meus pais
condições para que eu nascesse. Nome pessoal em homenagem a Exu.

ib íyií s. Exu deu condições para o nascimento e a existência deste ser. Nome
pessoal em homenagem a Exu.

ídolá s. Exu trouxe honra, progresso e respeitabilidade à minha vida. Nome


pessoal em homenagem a Exu.

ifúnmiké s. Exu trouxe este ser para eu cuidar (confiou em mim para isso).
Nome pessoal em homenagem a Exu.

ígbàm í s. Exu me acolhe; Exu me acolheu. N om e pessoal em homenagem a


Exu.

ikúnlc s. Exu preencheu minha vida e me deu tudo que preciso para viver bem.
Nome pessoal em homenagem a Exu.

i Lnàlú s. Exu, o Famoso. Epíteto de Exu.


imàrè, Òsíim àrè 5. Exumarê. Orixá que, sendo patrono destas áreas, favorece as
comunicações, as transformações, a estética, a defesa pessoal e a magia.

irèinílçkún s. Exu secou minhas lágrimas (me livrou de tristezas e angústias e


me trouxe alegria). Nome pessoal cm homenagem a Exu.

itóbi 5. O poder de Exu é grande, ilimitado, e esta pessoa está sob os seus cuida­
dos. Nome pessoal em homenagem a Exu.

itósin s. O poder de Exu é venerável. Nom e pessoal em homenagem a Exu.


itúnbí s. Exu me fez renascer; Renascido em Exu. Nome pessoal em homenagem
a Exu.

iwíinmí s. Tudo o que Exu tem de bom me agrada; Exu me traz coisas boas.
Nome pessoal em homenagem a Exu.

itii s. Propiciação, expiação, ritual.

a, Yewa s. Ewá. Esta labá. Mãe Anciã ou Mãe Idosa e Respeitável, é diretamente
relacionada às Iyami Oxorongá. Guerreira, detentora de poderes mágicos e de
poderes de cura e de transformação. Maternal e acolhedora, possui ouvido
atento ao sofrimento humano, visando transformar dores em alegrias. Volta­
da para as atividades manuais, dotada de muita criatividade e grande senso
estético, também é chamada de Yewa, a Mãe que sempre existirá.
e s. Subgrupo étnico iorubá.
Ewé s. Folha, folhagem.
Ewé ina, ewé inón s. CLIDEMIA HIRTA.Melastomataceae. Folha urticante, folha
de fogo. Brilha quando se toca nela c só pode ser colhida com uma pinça.

Ewé òdúndún s. BRYOPMYLLUM PINNATUM, Crassulaceae. Folha-da-costa,


folha da fortuna. Também Abamçda.
Ewé sánsáàrá s. Folha empregada no culto aos orixás.
Ewé tètè s. AMARANTHUS VIR1DIS, Amaranthaceae. Bredo, caruru, caruru-dc-
porco, cauda de raposa. Folha sagrada utilizada na sacralizaçâo dos símbolos
dos orixás e para atrair longevidade. Também utilizada com o proteção contra
forças malignas que podem alterar o destino de uma pessoa.

Ewé tútii s. Folha fresca, folha fria. Folhas de grande frescor.


Èèwò s. Ewó. O que é interdito, interdição, quizila (de quijila, vocábulo banto).
As interdições são relativas, entre outros elementos, à alimentação, a cores dc
vestuário e a condutas. Os babalaós dizem Èwç ki n puni, nse lo npan ni laso,
que significa ewó não mata. mas rasga a roupa (não mata, mas atrasa a vida).
Algumas recomendações de ewó são definitivas e outras, temporárias.

E m irç s. Cabra.
Eyeo s. Katunga, uma das cidades míticas dos iorubás.

E
Èbà s. Pirão típico iorubá, preparado com farinha de mandioca e água quente, cujo
consumo é acompanhado de molho.

Èbità Okíinrin s. Homem poderoso, habilidoso; Homem forte, invencível, into­


cável. Epíteto de Exu.

Ebo s. Ebó. Oferenda ou sacrifício cujo objetivo é remover ocorrências indesejáveis, preve­
nir contra tais ocorrências e atrair o bem-estar. Designa também atos litúrgicos.

Edç s. Cidade situada no estado de Oxum, na Nigéria.


Edan s. Imagem dc um casal, feita em metal,símbolo de Iyami Oxorongá; símbolo
dc resistência.

F.chi n s. Gêmeo; macaco.


Edun àrá s. Meteorito, pedra de raio utilizada para assentar Xangô; sím bolo
deste orixá.

425
Ediin s. Machado, machadinha.
Efè s. Cantigas entoadas no Festival de Geledé; o Pássaro-filho, símbolo do ele­
mento gerado.

Efòn s. Búfalo, bisão.


Èfüfíi s. Brisa, vento, fôlego, ventania, vento forte, tempestade.

Èfiifü I-ele 5. O Grande Vendaval. Epíteto de Oyá (lansã).


Efun s. Potente e sagrado cal natural. Giz branco usado para pintar o iniciado e
_____ como oferenda a Oxalá.----------------------------------------------------------------
Èfún s. Encantamento, sortilégio, feitiço, amuleto.
Egbá, Egbàá s. Subgrupo étnico iorubá concentrado na cidade de Abeokutá.
Ègbádò 5. Subgrupo étnico iorubá concentrado na cidade de Égbádo.
Egbç s. Companhia, reunião, partido, grupo, festa, coro, sociedade, corporação,
grêmio, associação, fraternidade, camarada, igual. Epíteto de Egbé Aragbò.

Egbç-Aráagbó, Aráagbó, Egbç, Èré igbó s. Egbç Aragbô. Habitante da flo­


resta; Habitante do além; Sociedade dos Espíritos Amigos; Sociedade dos
Amigos Espirituais. Designa, ao m esm o tempo, um orixá e uma corporação
Egbç aiyc, amigos
de seres espirituais. Esta irmandade é constituída pelos
do mundo visível, e pelos Egbç orun. amigos do mundo invisível, também
chamados de amigos espirituais. Orixá protetor dos abikus, cultuado para
que não tenham morte precoce ou violenta. A floresta é sua morada. As
pessoas costumam se referir a eles dizendo Egbç mi. Minha Sociedade ou
Meus Companheiros.
Egbç Egúngún s. Sociedade Egungun. Instituição dedicada ao culto aos ancestrais
masculinos.

Egbç Elçyç, s. Sociedade das Senhoras dos Pássaros. Promove reuniões de inicia­
das em Iyami Oxorongá em encruzilhadas ou em copas de árvores nas quais
é permitida somente a participação de mulheres capazes de transmutação.
Nelas são compartilhados conhecimentos, depois de estabelecido um pacto
de fidelidade absoluta que não poderá ser quebrado jamais.

Egbç Gçlçdç, s. Sociedade Geledé. Integrada tanto por homens quanto por m u­
lheres, cultua as Iabás ou Iyami Oxorongá e os aspectos coletivos do poder
ancestral feminino. Tem com o finalidades propiciar a expressão de poderes
místicos femininos, favorecer a fertilidade e a fecundidade, reiterar normas

426
sociais dc conduta e atrair o axé. A sociedade é dirigida pelas erelú, mulheres
detentoras dos segredos e poderes de Iyami Oxorongá.

Egbé Igúnnukó s. Sociedade Igunukô. Instituição dedicada ao culto aos ancestrais


masculinos.

Egbé Ogbóni s. Sociedade Ogboni. Corporação que mantém e fiscaliza o culto às


Iyami Oxorongá e tem por regra principal o compromisso que cada integrante
deve assumir para com elas.

Ivgbé Orò s. Sociedade Oró. Instituição dedicada ao culto aos ancestrais masculinos.
Egbé Odç 5. A sociedade de caçadores, agricultores, ferreiros, mineradores e outros
profissionais que têm Ogum por mentor.

Eiyç s. Ave, pássaro.

Eiyelé s. Pombo.
Eiyçlé funfun s. Pombo branco.
Eive çtú 5. Galinha-d’angola.
Eja s. Peixe.
Eja yiyan s. Peixe defumado.
Èjç s. Sangue.
Èjinvçrç s. Instrumento ritual semelhante ao iriikèrç, com a diferença de que é feito
de couro e, por vezes, enfeitado com búzios ou miçangas.

Èkç, ifokànso, igbçkçié, igbiyèlé, igbókànlé e igbçkçlé-ara-eni s. Confiança,


fé.

Èkçta, kçta num. Terceiro.


Èko, àgidi s. Tipo de comida preparada com amido de milho branco (maizena);
acaçá. Usado como oferenda a diversas divindades. Pode se acrescentar mel
e/ou epo (azeite de dendê), dependendo da finalidade.
Èlà s./ini. Orixá protetor da adivinhação; as festividades de Orunmilá, bem como
os rituais dc colheita do inhame, são iniciados com ritos em homenagem a
essa divindade, epíteto de Orunmilá; expressão de alegria pelo fato de uma
oferenda haver sido aceita.

Elçdá, Elçdàá s. Eledá. Essência vital do homem, responsável por seu destino; desti­
no pessoal, intimamente relacionado a ori inú (a cabeça interiorou essência).

427
Epíteto de Eledunmare: significa Criador. ScrSupremo, Pré-Existente. Epíteto
também de Oxalá: significa Criador.

Jç s. Porco ou porca.

*bà, Lççgbàa s. Aquele cujo poder salvar, Sábio: Potente, Poderoso; Defensor;
Acolhedor; Aquele que concede poder ao homem para que seja bem-sucedi­
do. Epíteto de Exu.
>bàá-Ògo s. Epíteto de Exu. Literalmente, Possuidor de centenas de porretes
na nuca, já que os porretes são usados por Exu na defesa contra inimigos que
atacam pelas costas. Refere-se ao fato de Exu possuir duas faces, podendo
enxergar na frente e atrás: qualquer que seja a sua posição ele tem domínio
de tudo. Os porretes mencionados são recursos de defesa, atuando com o se
fossem braços. Defender-se de inimigos que atacam pelas costas tem duplo
sentido: a defesa contra o que não se vê porque ocorre atrás de nós e a defesa
contra atos e fatos do passado, pois Exu, com o todos os demais orixás, pode
agir sobre eventos passados.

bárá s. Elegbara. Aquele cujo poder salva: Sábio; Potente, Poderoso; Defensor;
Acolhedor; Aquele que concede poder ao homem para que seja bem-sucedi­
do. Epíteto de Exu. -----

iin s. Aquele que incorpora o orixá.


íí s. Senhor dos espíritos. Um dos nomes de Eledunmare.
u adj. Arrogante, prepotente; pessoa que fala demais,“língua suja”. Este vocábulo
designa pessoas que, além de falar excessivamente, são prepotentes, orgulhosas,
jactantes e arrogantes. Elas apreciam autopromover-se, estar em destaque e
recorrer à sedução como recurso para obter vantagens.

s. Testemunha, testemunha ocular.


-ipín s. A Testemunha (testemunha da escolha humana de destino). Epíteto
de Orunmilá.

: s. Éléié. Senhoras do Pássaro da Noite-, Aquelas que voam; Aquelas que se


transformam em pássaros. Epíteto de Iyami Oxorongá.

1 s. Um tipo de planta.

s. Vida, fôlego, espírito, alma, sopro vital. Intimamente relacionado à respi­


ração, não se reduz a ela. Por ocasião da morte de uma pessoa se diz que çmi
se foi.

428
Emu s. Vinho dc palmeira; vinho branco extraído do dcndezeiro; bebida predileta
de Ogum. Não pode ser oferecido nem a Oxalá, nem a iniciados nesse orixá.

Emú s. Pinça.
Eni Òrisà s. Devotos do Orixá. Pessoas que nascem defeituosas ou albinas. Assim
chamadas em referência a Oxalá, que modelou seus corpos dessa maneira.
Devem respeitar certos tabus alimentares.

Enire s. Diminutivo dc fznirerc.


Enirere s. Pessoa boa ou digna. Epíteto de Orunmilá.
Epà s. Amendoim.
Eran s. Carne, bicho, besta, animal.
Eran-àgútàn s. Carne de ovelha.
Eran-ebo s. Carne de animal sacrificado durante os rituais de orixá.
Eran-çlçdè s. Carne de porco.
Eran ewúrç s. Carne de cabra.
Eranko s. Animal, besta, bicho; animal de caça.
Erigi a bo là int. Saudação a Orunmilá.
Erindílógún num./s. Dezesseis; designativo do jogo de búzios, bastante utilizado
pelos iorubás e em países da diáspora. A queda dos cauris define um número
entre 1 e 16, correspondendo a cada 11111 desses números um odu.

F>9 s. Àgbo. Banho preparado com elem entos minerais, vegetais e animais e
guardado em potes. Usado durante a iniciação, também serve para acalmar
pessoas incorporadas.

Èrç Gentileza, suavidade, flexibilidade. Significa também antídoto (força que neu­
traliza outra), enunciando, pois, que o comportamento gentil tem o poder dc
neutralizar adversidades.

Èròwó-Mçta s. Três búzios pequenos abertos, representando o dinheiro de Exu,


por ser ele o guardião da prosperidade e do progresso econômico.

Èrú s. O Grandioso. Epíteto dc Exu.


Èse s. Poemas, geralmente breves, associados aos odu-Ifá; fila, fileira, ordem, se­
qüência.

429
Èsç .9. Transgressão.

Iísò v. Ação realizada passo a passo, com calma, em harmonia, serenamente.


Èsun-isu s. Inhamc baiano (cará) assado.
Etü s. Galinha-d’angola; um tipo de pano com pintas.
Èwà 5. V1GNA UNGUICULATA, Leguminosae Papilionoidae. Feijão; cereal cozido.

Èwà àti à gbà do s. Feijão fradinho cozido juntamente com milho verde, acrescido
de camarão e temperado com dendê, cebola e sal.

Èwà dúdú s. VIGNA UNGUICULATA, Leguminosae Papilionoidae. Feijão preto.


Èwà èyan s. Feijão torrado.
Èwà funfun s. VIGNA UNGUICULATA, Leguminosae Papilionoidae. Feijão fra­
dinho.

Èwà Ibeji s. Feijão fradinho (símbolo de multiplicação) cozido até secar e ficar
com os grãos bem soltinhos. Acompanhado de um m olho - bem apurado
- de camarão, peixe, tomate, dendê, cebolas e sal.

Èwà Òsòòsò 5. Qualidade de feijão oferecido a Oxóssi.

Ewü, wíwíi s. Amabilidade, prazer, encanto; gosto, sabor.


Èyan-àgbàdo 5. Milho torrado.
Eyç-ayé 5. A beleza da vida.
Eyin s. Ovo.
Èyò s./int. Prática muito comum de culto aos ancestrais em Lagos, Nigéria. Ex­
pressão usada no culto a Omolu, para demonstrar alegria pela aceitação das
oferendas.

Fàdakà s. Prata.
Fàkúro v. Caluniar, difamar, distorcer a verdade; desencaminhar; resumir, abre­
viar.

Fenubà v. Fofocar prazeirosamente.


Fibú, fi gégíi-ün. gégiin-ún v. Amaldiçoar, maldizer, rogar praga.
Fiji Perdoar, absolver.

430
Fiwcra v. Simpatizar, colocar-se no lugar do outro e compreender seus sentimentos.
Foríji v. Perdoar.

Fórofòro v. Falar excessivamente ou muito alto.


Fowóranú v. Ato de buscar equilíbrio emocional, acalmar-se, ter paciência, ser
tolerante, controlar-se. Literalmente, significa passar a mão na barriga para
acalmar a si mesmo.
Fokàntán, gbáralc v. Ato de confiar - cm si, nos ancestrais, nos orixás, na vida.
Fuja, fíike v. Jactância, arrogância, gabolice.
Fujú, fura v. Suspeitar, desconfiar; estar atento, desperto, com os sensores em
estado de alerta; estar vigilante, sensível a possíveis ameaças e perigos; estar
“com as antenas ligadas”.

Funfun, fifun adj. Branco.

Gángan s. Tambor sagrado tocado para todos os orixás; tambor falante. Pendu­
rado no ombro, é percutido com uma vara que marca a cadência dos cantos
rituais.

Gàiingàíin, láidájú, láidánilójú, láigbékçlé adj. Não confiável (pessoa a quem


não se deve seguir e de quem não se deve depender).

Gèlc s. Turbantes femininos.


Gçlèdç s. Gueledé. Designa ao mesmo tempo um orixá e uma corporação de seres
espirituais, assim com o o culto aos ancestrais femininos e sua instituição. A
Sociedade Gueledé, integrada tanto por homens quanto por mulheres, cul­
tua Iyami Oxorongá e tem por finalidades propiciar a expressão de poderes
místicos femininos, favorecer a fertilidade e a fecundidade, reiterar normas
sociais de conduta e atrair axé. A sociedade é dirigida pelas crelú, mulheres
detentoras dos segredos e poderes de Iyami. Gueledé é chamada Iyá (Mãe), e
também Igi, pelo fato de serem as máscaras de uso ritualístico confeccionadas
em madeira desta árvore sagrada.

Gígún Èsú s. Rituais de Assentamento de Exu. Exu é assentado na entrada das ca­
sas, sejam elas residenciais, comerciais ou religiosas, para neutralizar energias
desfavoráveis e evitar efeitos de qualquer ação malévola. Nas casas religiosas

431
este assentamento é absolutamente indispensável. Uma vez assentado, o orixá
age com o protetor e guardião das pessoas e do ambiente em todos os aspectos
da vida.

•i 5. Etnia presente na Nigéria.

ale r. Confiar, não recear nem duvidar, acreditar.

Viver.

bé s. ICACINA TRICHANTHA, Icacinaceae. Um tipo dc planta,


u s. Tambor usado para anunciar a morte de reis.
çlé, gbíyèlé v. Ter fé, confiar; aguardar auxílio, depender,
igbénà s. Escultor.
•gbêre, wérewère v. Agir insensatamente.
s/adj. Sensatez, inteligência, sabedoria, habilidade no trato com os demais,
>oas maneiras; sensato, inteligente, sábio, hábil no trato com os demais, do­
ado de boas maneiras.

i, roro, rorongbodo s. Um tipo de planta.

! im. Expressão usada para saudar algumas divindades, entre as quais Oyá.

iaudação, evocação. Forma de saudação orixás, ancestrais, mestres e anciãos,


ntes dc qualquer oferenda a um orixá, por exemplo, antes m esm o da ento-
;ão de seus orikis, realizam-se as saudações. Têm por finalidade a obtenção
e auxílio e proteção de forças para realização do destino humano. Espera-se,
ravés desse gesto de respeito, favorecer o acesso à força vital. Quando di-
gidas aos mais velhos constituem sinal de respeito, e quando dirigidos aos
icestrais solicitam permissão para iniciar algo.

ígó s. Saudação a Xangô.

l
432
Ibmiújç s. Dor, tristeza, mágoa.
Ihàribà .v. Cidade iorubá.
íbéji, Èjirç s. Crianças gêmeas; orixá que protege essas crianças. Ibéji. palavra
formada a partir de ibi (parir) e eji (dois), significa Parir dois ou Gestação
dupla, indicando, pois, o nascimento de gêmeos. A primeira criança a nascer
recebe o nome de Táiwò, Aquele que vai conhecer a vida ou Primeiro a
chegar: é a criança mais nova. A segunda criança a nascer recebe o nom e de
Kçhindc, Segundo a chegar, é a criança mais velha. Isto é, a segunda criança
a nascer é espiritualmente mais velha e, portanto, hierarquicamente superior
à que nasceu antes dela. Se a mãe dos gêmeos tiver um parto posterior a este,
a terceira criança receberá o nome de Idòwú. No Brasil Ibeji é sincretizado
com Cosrne e Damião.

Ibi r. s. Parir, placenta.

Ibikcji Èdúmàrè s. Representante de Eledunmare. Epíteto de Oxalá.


Ibínú 5. Ira, fúria, raiva, cólera, zanga.
ibiniijé s. Tristeza, dor, melancolia, mágoa, pesar, angústia

Ibiri s. Símbolo de Nanã Buruku. Representa o suceder dc gerações.

íbò s. Etnia presente na Nigéria.

ibò s. Voto. Pergunta - de resposta afirmativa ou negativa - que o sacerdote foz


quando consulta o jogo divinatório de Ifo. fi também o instrumento utilizado
pelo sacerdote quando este foz consultas de resposta sim ou não e um de seus
símbolos.

Ibon s. Espingarda.
Ibú s. Profundeza das águas, mar; barril grande e repleto.
íhiira, arabibú v. Jurar, fazer um juramento.
Idàòmi s. Referência a um determinado adversário.
Idáríji s. Perdão, remissão, absolvição.

Idç s. Latão, bracelete, bronze, ouro. Metais dourados, símbolo de Oxum. Designa
também a pulseira usada no pulso esquerdo pelas esposas dos babalaós, con­
sideradas mulheres veneráveis. No culto a Oxum esses metais são utilizados
como representantes do ouro.

Idòwú s. Nome dado à criança nascida logo após um parto de gêmeos. Significa

433
Equilíbrio das crianças Ibcji.
id òb álè s./v. Prostração; ato dc estendcr-se 110 chão em sinal de reverência 011
saudação.

Ifá 5. Orunmilá; Orunmilá-Ifá, divindade iorubá da sabedoria. A palavra Ifá desig­


na também o jogo divinatório dc Ifá, realizado exclusivamente por babalaôs,
sacerdotes desse orixá. A raiz fa (acumular. abraçar, conter), indica que todo
o conhecimento tradicional iorubá acha-se contido no corpus literário de ifá,
(Odú Coqtus), estreitamente relacionado ao jogo.

Ifá rílátílá, Ifárílárílá, itàn rílárílás. Extensos poemas do corpus literário de Ifá7“
ifnrabnlç s. Pessoa cautelosa, capaz de autocontrolar-se.
Ifè, Ilç-Ifè 5. Cidade sagrada da Nigéria, lugar de origem da humanidade, segundo
os iorubás; subgrupo étnico iorubá que habita esta cidade; cidade governada
por Ifá.

Ifèsèji s. Perdão de erros ou transgressões.


111 r. Ato de deixar de lado, deixar “pra lá”.

Ifi çnu sátá 5. Expressão que designa todo e qualquer uso depreciativo da fala e
dos atos.

Ifiji S. Perdão, remissão de pena; presente.

Ifón 5. Cidade sobre a qual Oxalá reinou.

Ifura, iniéfò .v. Suspeita, desconfiança, dúvida; pessoa atenta, desconfiada.

I"ò s. Nom e dado à criança que nasce com a apresentação dos pés. N o momento do
parto, os pés são a primeira parte do corpo a sair do ventre materno.

Igi 5. Arvore sagrada utilizada para confeccionar as máscaras dc Gueledé. Epíteto


de Gueledé, relacionado a essas máscaras.

Igún, gúnnugún, gúrugú s. Abutre, urubu.


igúnnukó s. Igunukó. Orixá patrono da agricultura; uma das instituições de culto
aos ancestrais, sejam os masculinos, sejam os femininos.

Igba s. Jiló.

Igbà s. Tempo, época, período de vida de uma pessoa.


Igbá s. Cabaça.

434
Igbá-ajè, igbájç s. Cabaça grande.
igbàdo, àgbàdo s. ZEA MAYS, Graminae. Milho, cereal.
igbàdúlúmo s. Calúnia, difamação, imputação falsa, maledicência.
Igbàgan s. Atos rituais dedicados a Egungun, realizados durante a madrugada na
floresta sagrada onde Egungun é cultuado.
Igbàgbó s. Crença, fé, convicção absoluta, fidelidade inabalável.
Igbá-Keji-Elédíinmarè s. Assistente de Eledunmare na terra; Presença de Deus
na terra. Epíteto de Exu. Refere-se às suas funções de inspetor dos rituais e de
responsável pelo fluxo de axé entre o mundo visível e o invisível.
Igbàlç, igbó-Ègún s. Floresta sagrada onde se cultua Egungun.
igbànívànjú, imókànlc, isírí, iwúrí, orísísí s. Encorajamento.
Igbá-iílá 5. Grande cabaça; Grande existência humana; símbolo da união do céu
com a terra; símbolo de Iyami Oxorongá.
Igbá-Odfi, Igbádü s. Etimologicamente, cabaça do odu. O nome designa uma
divindade - Igbá-Odü, Aquela que reúne o axé (força vital) de todos os Odus.
É simbolizada por uma ou várias cabaças que contêm abjetos sagrados. Di­
vindade temida, símbolo do céu e da terra em sua união fecunda e detentora
suprema do conhecimento de Orunmilá.
Igbé pron. Aquele.
igbçkèlé r. Depender; entregar-se confiantemente.
igbéraga s. Orgulho, arrogância, vaidade, ufania, prepotência.
ígbin s. Tambor falante usado para acompanhar cantos em homenagem a Oxalá,
orixá da criação, divindade que modelou o homem.
Ígbin s. Grande caracol comestível cujo sangue (branco) é usado como elemento
harmonizador em banhos. Caracol da terra, carne sagrada com a qual apenas
os velhos se alimentam: Ajijçgbin bi ti òrisà nlá, tàbi òrisà ;i pàgbin jç lçyin
karaun significa Comeu caracol ccdo pela manhã, como sc íosse um grande
orixà ou Orixá que comeu caracol sem casca.
Igbó s. Lar de origem de Oxalá.
Igbójúlé s. Aquilo ou aquele de que se depende.
igbókànlé s. Aquilo cm que se deposita fé e confiança.

435
ná 5. Cidade iorubá.

s. Cantiga de júbilo entoada para Ogum para demonstrar alegria por alguma
conquista. São entoadas por seus devotos em ocasiões felizes.

i s. Localidade iorubá.

s. Local ein que Oxalá reinou.

Ritual realizado no sétimo dia de festividade dos orixás.

s. Subgrupo étnico iorubá concentrado em Ijçbú.


s. Subgrupo étnico iorubá concentrado em Osogbo.
jó s. Dia.

; s. Ritual realizado no sétimo dia dc festividade dos orixás.

òjòyè 5. Chefe dc tribo ou cidade, líder comunitário; conselheiro do rei, sábio.


São porta-vozes do rei, cada qual com seu papel. São eles que escolhem, no
âmbito da família real, o sucessor do rei falecido.

Odu de Ifá.

ja s. Peixe defumado.
s. Semente do fruto sagrado da palmeira çpç-Ifá (dendezeiro). Símbolo e
instrumento divinatório de grande importância, esses coquinhos são os re­
presentantes de Orunmilá na terra e um de seus mais importantes m eios de
comunicação com os homens.

tç s. Demonstração que os aprendizes dc Ifá fazem do domínio adquirido


sobre os 256 odus.

de s. Pena vermelha da cauda do pássaro sagrado údidç. de uso indispensável


nos rituais de bori e de iniciação em orixás; muito freqüente cm preparados
mágicos c medicinais, é um sím bolo sagrado de vários orixás.

i a *.Pote, panela.

) Esú s. Pote de barro colocado sobre a terra com a boca para baixo, ao lado do
assentamento de Exu. Sua base perfurada possibilita a passagem da mão para
que, através deste orifício, seja possível alimentar a terra. Nele são colocadas
comidas e oferendas a Exu. Esse pote é colocado na entrada dos templos, sendo
que cm alguns deles uma pedra yangié depositada no interior do pote.

ta s. Rua, encruzilhada, estrada transversal.

436
Ikóríta mçfa s. Encruzilhada. Ponto de encontro de seis ruas ou estradas.
Ikóríta mçta s. Encruzilhada cm T ou Y. Ponto de encontro de três ruas ou estra­
das. Também Orita.
Ila »'. Abrir.
llà s. Tatuagem, linha, marca, circuncisão, marca tribal.
Ilà-ojú s. Marcas faciais que conferem identidade familiar e pessoal. Quando uma
pessoa chega a uma cerimônia é identificada por essas marcas e pode ser re­
cepcionada pela entoação de seu oriki-orilç. observando suas marcas faciais os
presentes reconhecem a linhagem à qual ela pertence e podem saudá-la com
o oriki-orilç dc sua linhagem.
Iktra s. Inveja.
Ilawó sJv. Generosidade, liberalidade; ato dc ser generoso, de abrir a mão.
Ilàyà s. Coragem; preparado mágico-medicinal que torna uma pessoa mais cora­
josa.
Ilé s. Casa, lar, residência, domicilio.
llé-awo s. Casa dc culto aos orixás.
Ilétli s. Casa de Culto às Iyami Oxorongá e dos membros da Sociedade Ogbòni.
Local onde se reúnem os devotos para a realização de cultos e os anciãos para
a resolução de conflitos interpessoais e problemas sociais.
Ilé-Òrisà s. Casa de culto aos orixás.
Ilç-gbóná s. Terra quente. Epíteto de Obaluaiê.
Ilç s. Terra, solo, terreno, planeta, universo.
Ilè-Ifç, Ifç s. Cidade sagrada da Nigéria, lugar de origem da humanidade, segundo
os iorubás; subgrupo étnico iorubá que habita essa cidade; cidade governada
por Ifá.
Ilçkç s. Colar, contas de colar, pérolas.
ilçkè Esú s. Colar de contas vermelhas e pretas. Tanto o lágidigbà quanto o ilçkç
Esú possibilitam identificar um àwòrò Esú, ou devoto de Exu.
Mçkç-iyún s. Contas de coral, colar dc coral.
Ilçkç sésççfun s. Contas brancas; colar de contas brancas, símbolo de Oxalá.

437
11ii s. Tambor.
Imalè s. Seres veneráveis, divindades, orixás. Palavra provavelmente originária da
contração de çmç-ti-mbç-n 'ilç. que significa seres superiores na terra. Cada
orixá possui atributos, qualidades e características próprias.
Imorc, opé, ísopé s. Agradecimento, gratidão.
Imò hvà ara eni s. Noção de limite.
Imulç s. Tratado, pacto, acordo, convenção. Pacto estabelecido por todo ser vivo
com as Iyami Oxorongá: significa enquanto você existir transitará sobre a terra
e não há forma alguma de quebrar o pacto sem ser penalizado.
im iínínúdiin v. Alegrar.
Inú s. Barriga, útero, ventre, estômago, vísceras, dentro de, profundeza do ser,
interioridade.
Inúbíbí .s'. Cólera, zanga, ira, raiva;
Inúbúburú s. Aversão; malevolência.
Imklídtin s. Prazer,contentamento,alegria.
Inúdúdú s. Coração ruim; aversão, maldade.
Inúfunfun s. Coração puro, bom coração.
Inú-mi-dun int. Estou feliz. Literalmente, estou com a barriga doce ou estou
com todo o meu interior doce (minha felicidade é profunda, liab*ita minha
interioridade).
Inúrcre s. Barriga boa, bom estofo, boa interioridade, boa essência; benevolência,
bondade, amabilidade, generosidade.
Ipamóra s. Tolerância, paciência. Este vocábulo significa, literalmente, passar uma
coisa no corpo para retirar o que está produzindo desagrado ou deixar pra lá.
Significa, pois, suportar desconfortos. resistir às adversidades.
Iparamó s. Humildade, modéstia; senso de autodefesa, senso dc autoproteção.
Ipín ori s. Destino: a sina do ori.
Ipetu s. Cidade fundada por Orunmilá.
Irá s. Cidade nigeriana. Segundo alguns mitos, cidade natal de Oyá.
Iràn v. Ajudar.

•138
irànjc s. Cidade sobre a qual Oxalá reinou.
Irànlówó v. Auxiliar, oferecer os braços, acolher.
Iràwò-Akódá s. Primeira estrela a ser eriada: Primeiro poder a scr criado: Orga­
nizador do caos que precede a criação: Primogênito: Alicerce dc tudo o que
existe: Primórdio: A quele que vinga mais: Aquele que c maior que os demais:
Aquele que influencia os demais. Epíteto de Exu. Todas essas idéias associam-
se à ideia de primordial. Sendo a hierarquia um elemento fundamental na
sociedade iorubá, e cabendo a liderança aos mais velhos, a Exu compete liderar
os demais orixás, por sua senioridade, sua condição neutra e sua capacidade
dc promover o que é justo.
Ire s. Cidade sagrada onde Ogum reinou; sorte; bem-estar.
Ire o! int. Boa sorte!
Ire, Ègún s. Maldição, praga, imprccação.
Irèké s. Cana-de-açúcar.
Irèmòjé s. Cantiga de lamento entoado por devotos de Ogum, especialmente os
caçadores, para expressar a dor da perda de um companheiro caçador, igual­
mente-devoto deste orixá.
Irera s. Orgulho, arrogância, altivez, soberba, pompa.
iretç s. Odu de Ifá.
iretç-Ogbè s. Odu de Ifá.
Iró 5. Mentira.
Irókò s. Iroko, gameleira branca. FICUS MÁXIMA,Moraceae; FICUS DOLIARIA.
Loco para os jeje e Catendc ou Tempo para osbantos. Árvore sagrada cujas fo­
lhas são utilizadas no preparo de àgbò. Orixá da resistência e da harmonia.
irostm s. Odu de Ifá. PETROCARPUS OSÜN, Leguminosae Papilonoidae. Árvore
sagrada.
I rókç s. Representação, em marfim ou madeira, de uma pessoa - homem ou mulher
- dc cabeça oblonga, ajoelhada em respeito ao oráculo. Sua cabeça oblonga
significa a presença do ori do consulente durante o processo divinatório.
Iríikèrè, irüke s. Cauda de animal que, após um preparo artesanal e mágico, é
carregada por sacerdotes e reis como sinal de realeza e poder; bandeira ou
borla do milho; vassourinha; espanador. Instrumento ritual confeccionado

439
com crina de cavalos ou bois, utilizado como símbolo de poder religioso e
político. Serve também para transmitir o axé da divindade para diversos fins.
Seu cabo é enfeitado com contas coloridas e/ou búzios brancos. Em alguns
casos coloca-se carga mágica no interior do cabo. Pode ocorrer que o portador
desse objeto, estando irado, exiba a ponta do cabo a um inimigo para maldizê-
lo ou, estando satisfeito, a um amigo para abençoá-lo.
malè, Irúnlè s. As inúmeras forças veneráveis da terra; os orixás. Ver imalç.
Respeito, estima, honra.
i v. Ato de generosidade, de fineza.
i v. Ato de criticar pessoas ou situações por inveja.
a v. Ato de proteger a si mesmo, de agir com prudência, cautela, cuidado.
c s. Preparo medicinal usado para fortalecer, ativar e aumentar a capacidade
de memorização.
in, egbògi, òôgún s. Prática terapêutica que associa recursos de medicina e
de magia.
úrere s. Bondade, amabilidade, generosidade,
i s. Benevolência, bondade, boa vontade.
) s. Tirania.
•. DISCOREA sp., Discoreaceae. Inhame ou cará.
ikàrà s. Pão; bolinho de acarajé.
. Ritual realizado no terceiro dia de festividade dos orixás.
s. Itan. Lenda, história, conto, narração, mitologia. Os itans são narrativas de
acontecimentos míticos e históricos que integram os odus de Ifá.
O rí s. Itan dedicado ao orixá Ori ou ao ori dos seres.
àtowódówó 5. Ver itàn.
lánlá, Ifánlánlú s. Itan extenso; extensa narrativa do corpus literário de Ifá.
i s. Zelo, fervor, ardor.
kà s. Pessoa perdida, desorientada.
aa s. Mesura, submissão, respeito; respeito às pessoas em geral, especialmente
aos mais velhos.

-1-10
ítú r. Desatar, abrir.
itúwóká s./v. Generosidade; pessoa generosa, “mão aberta”; ato de abrir as mãos
que estavam fechadas.
iwà s. Aquele que tem caráter epersonalidade (e influencia o caráter e a personali­
dade das pessoas através do fortalecimento dc suas virtudes). F.píteto de Exu.
Designa também caráter, conduta, personalidade, atitude, comportamento,
disposição, procedimento.
Iwà-àgbà s. Conduta de adulto.
iwà-àgbèrè s. Prostituição.
Iwà-àimó s. Falta de asseio; má-conduta, imoralidade,
iwàbí-olórun s. Piedade, devoção.
iwà-búburú, iwà burúkú s. Maldade, perversidade, iniqüidade; pessoa de mau
caráter e personalidade perturbada.
iwàdi s. Exame, investigação, inquérito.
iwà-çdá s. Natureza, caráter.
iwà-ètó s. Jogo limpo, conduta justa, retidão, honestidade.
Íwà-ikà s. Crueldade,
iwn-ipá s. Violência.
iwàje, irawolè s. Plantas para o preparo dc remédio para crianças.
Iwájú s. Fronte, testa, cara, presença, frente,
iwàkún s. Gonzo, articulação.
Iwàláiyé 5. Vida, existência; meio de vida.
iwalç s./v. Escavação; ato dc cavar a terra,
íwaná, iwoná s. Atiçador.
Iwànwara, iwára s. Ânsia, zelo, temeridade, impaciência.
Iwà-òbün s. Imundície, porcaria, sordidez, sujidade,
iwà-òrun s. Virtude, probidade, retidão,
iwà-òtò 5. Peculiaridade, particularidade,
iwà-pèlé s. Bondade, gentileza.

•111
Iwára, hvànwara s. Ânsia, zelo, temeridade, impaciência.
Iwàrere s. Boa conduta.
íwára, hvànwara s. Ansia, zelo; temeridade, impaciência.
iwàrçfà s. Camareiro (em palácio), servidor.
Iwáriri s. Tremor, estremecimento, trepidação, receio.
Iwasú s. Pregação, discurso religioso.
Iwàtító s. Probidade, retidão.
Iwàtíitíi s. Humildade, modéstia; amabilidade, gentileza, serenidade; o comporta­
mento calmo, sereno.
Iwó .s'. Cidade em que Oyá teria nascido.
Iwòri-Mcji s. Odu de Ifá.
iwòri-Òtúriípòn .s'. Odu dc Ifá.
Iyá, yèyc 5. Mãe.
Iya-àgan s. Mulher iniciada nos segredos do culto a Egungun; sacerdotisa do culto
a Egungun.
Iyá-Agbà, Iyagbà s. Iabá, Mãe(s) Anciâ(s), Venerãvel(is) Mãe(s) Anciã(s). Epíteto
dc Iyami Oxorongá. Refere-se à ancestralidade feminina. Grupo de mulheres
dedicadas às Iyami; matrona, mulher idosa, avó, sábia anciã.
Iya Aiyé 5. Mãe(s) do Universo. Epíteto de Ivami Oxorongá. Grupo de mulheres
dedicadas às Iyami.
Iyá-çgbé s. Mulher presidente dc uma associação; sacerdotisa do culto a F.gbé.
lyálàse s. Matrona; cozinheira-chefe, a responsável pelas comidas feitas aos orixás.
Iyálóde s. JATROPHA CURCAS, Euphorbiaceae. Pinhão branco, pinhão paraguaio.
Senhora da alta sociedade, primeira-dama de uma cidade ou de um vilarejo.
Epíteto de Oyá.
Iyálórisà s. Ialorixá. Sacerdotisa do culto aos orixás.
Iyámi s. O mesmo que Ajé e Iyami Oxorongá. Mãe Ancestral, Mães Feiticeiras;
Epíteto de Ajé.
Iyámi Akókó s. Mãe Ancestral Suprema. Epíteto dc Iyami Oxorongá e de outras
iabás, como Oxum.

•142
iyámi Òsòròngà s. Iyami Oxorongá. Minha(s) Mãe(s) ou Zeladora(s); Minha(s)
Mâe(s) Oxorongá; Mães Feiticeiras; Poder Ancestral Feminino; Poder Geni­
tor Feminino. Todos os ancestrais femininos, as lyagbá ou Iyámi, têm sua
instituição em sociedades como F.gbç Elçyç. Fgbç Ògbóni e Hghç Gçlçdç,
consideradas secretas pelo fato de os seus conhecimentos serem compar­
tilhados 110 interior do grupo e transmitidos apenas a iniciados. As Iyami
Oxorongá representam o poder ancestral feminino e os elementos místicos
da mulher em seu duplo aspecto: protetor e generoso, perigoso e destrutivo.
Todos os orixás femininos são detentores deste poder. Símbolo feminino por
excelência, representam a força mais antiga da terra e já existiam muito antes
do surgimento da própria humanidade. Essas matriarcas sagradas e veneráveis,
guardiãs da força vital do homem, fazem parte do universo dos orixás de tal
modo que não se pode cultuá-los sem sua presença. As mulheres são o grande
símbolo de Iyami Oxorongá.
lyá-mògún s. Forma de referência às Iyami Oxorongá.
Iván s. K1GEI.IA AFRICANA, Bignoniaccae. Inhame ou cará. Pirão de inhame ou
cará; bolinhos de inhame branco, de preferência o inhame grande conhecido
como inhame baiano. O inhame é descascado, cozido somente em água sem
tempero algum. Depois, é pilado e dessa massa se preparam os bolinhos. Pode
ser adicionado mel. Apreciado por todos os orixás, particularmente os orixás
funfun Orunmilá, Obatalá e Ajê.
Iyánifá s. Mulher iniciada em Orunmilá; esposa de babalaô, preparada para mani­
pular o jogo e acompanhar os rituais.
Iyánlá 5. Avó.
Iyá-Sàngó s. Ialorixá ou sacerdotiza de Xangó.
Iyàwó s. Esposa. No culto aos orixás designa a pessoa, de ambos os sexos, cm pro­
cesso de iniciação.
Iyàwó-àbísílç s. Menina prometida em casamento desde o seu nascimento.
Iyè s. Tempero.
Iyèré s. Cantigas de dor e júbilo dedicados a Ifá, entoados ao fim dos jogos divina­
tórios, durante os rituais de ebó e também nas festas dos babalaôs.
lyçròsún s. Pó amarelo oriundo da árvore irosún. Utilizado 110 culto a Orunmilá.
Iyòsó s. Martelo.
Iyo s. Sal.

•143
íitisí s. Ironia, escárnio, menosprezo.
i s. Coral marinho; conta sagrada de cor marrom usada por sacerdotes.

./v. Tranqüilidade; ato de romper.


>ajàgba, láironú adv. Irrefletidamente, impensadamente, imprudentemente,
íta 5. A primitiva divindade dos raios, relâmpagos e trovões.
A'. Perdão; ato de perdoar.

in Osó int. Forma de louvar Iemanjá.


un 5. Etnia presente na Nigéria.

Desgastar; espalhar, expandir.

íyèsí 5. Saudação ao rei: Vossa Majestade. Expressão utilizada para saudar


Xangó e alguns outros orixás.
v. Mente.
ú r. Ter compaixão, compadecer-se.
; o!, Kare o Yèyé! int. Saudação a Oxum.
;ç s. Povoado iorubá.
erc adj. Pequeno, júnior, mais novo.
eré-awo s. O pequeno que conhece o segredo. Nome dado aos aprendizes de
Ifá. Também chamados çmç-awo, filhos do segredo.
írènke int. Saudação usada durante as evocações e cantigas cm homenagem
a Ogum.

i>bérí int. Expressão usada nas cantigas de Ibeji confirmando os pedidos que
estão sendo realizados.
s. Dança acrobática tradicional; ritmo usado em celebrações e rituais, obtido
através da percussão do tambor bàtá, para acompanhar danças acrobáticas
realizadas pelos onikete.

444
Kêtu s. Cidade sagrada que integra a dinastia iorubá na África, onde reinaram
divindades como Exu e Oxóssi.
Kçhindé s. Nome dado ao caçula dos gêmeos. Entre os gêmeos este irmão, que nasce
em segundo lugar, é o espírito mais velho. Vemos nos versos que Táyé Lolú
( Táiwò) segue na frente e Kçhindc, devagarinho, vem atrás. Táiwò, o irnião
mais novo, significa literalmente Vai experimentar a vida e Kçhindé, o mais
velho, é literalmente O último a chegar.
Ki s. Saudar, louvar.
Kikíyèsára s. Prudência, observação atenta, acuidade de observação, cuidado,
cautela, circunspeção.
Kóláwolè s. Traz riqueza para dentro dc casa. Nome pessoal.
Kòso s. Literalmente, não sc enforcou. Xangô é saudado com a expressão Qbá Kòso!
devido a uma narrativa mítica. Segundo essa narrativa, Xangó enforcou-se num
momento de desespero e, quando essa notícia chegou à cidade onde era rei, seu
povo, atemorizado, clamava pelas ruas: Qbá so! Obá so! O rei sc enforcou! O
rei sc enforcou! Esse clamor provocou forte reação dos amigos fiéis de Xangô
que, para se defenderem, pasaram a clamar Qbá Kòso! Obá Kòso! O rei não
sc enforcou! O rei não sc enforcou!

Láafíyàn s. Forma de evocar Exu para realizar pedidos especiais, desfazer confusões
e esclarecer dúvidas. Epíteto de Exu.
Láàlú s. Famoso; Aquele que harmoniza a cidade ou a comunidade. Epíteto de
Exu que denota seu poder organizador e sua popularidade entre as pessoas e
entre os demais orixás.
Láaróyè s. Aquele que c louvável, cujo nome c sempre lembrado e confere sentido
à vida. Epíteto de Exu; forma de saudá-lo evocando seu poder de comunicação
e sua função dc comunicador.
Láàrúmò s. Senhor dos caminhos da vida: Aquele que tem o poder dc unir. Epíteto
de Exu.
Láfojúdi s. Insolente, atrevido, impertinente, mal-educado.
Lágidigbà s. Um tipo de conta de colar preta, feita de casca de noz de palmeira ou
chifre de búfalo. Esse colar é usado como símbolo de Obaluaiê e de Exu.

-145
Lágídígbà Èsíi s. Colar dedicado a Exu em que sc acrescentam búzios a contas
pretas e vermelhas.
Láifarabalç adv. Atrevidamente, irrefletidamente.
Láigbón adj. Imprudente, indiscreto, inábil, ignorante.
Láilotó adj. Infiel, desleal, enganoso.
Láilóye, láimòye adj. Imprudente, néscio, indiscreto, imprevidente.
Láinitijú adj. Sem-vergonha, descarado, sem modéstia, desavergonhado.
Láiscun adj. Rude, grosseiro, pouco amável, insensível, ingrato.
Làníyàn adj. Afável, sociável, generoso, simpático.
Láiníycnínú adj. Simples; imbecil.
Lalúpnn s. Epíteto de Exu.
Lanú s./adj. Compaixão, clemência, generosidade; compassivo, clemente, generoso.
Látoópa s. Orixá da ordem e da disciplina, que conduzem à perfeição; Orixá que
zela pela obediência a princípios. Epíteto de Exu.
I.awó adj. Generoso, liberal.
Layà v. Ter coragem, ser corajoso.
Le adv. Por cima.
Lékéléké s. Grou.
Léégbáa. Élçgbà s. Aquele cujo poder salva'. Sábio, Potente; Poderoso; Defensor;
Acolhedor; Aquele que concede poder ao homem para que seja bem-sucedido.
Epíteto de Exu.
Lçgbára s. Aquele cujo poder salva; Sábio, Potente; Poderoso; Defensor;
Acolhedor; Aquele que concede poder ao homem para que seja bem-suce­
dido. Epíteto de Exu.
Lékó adj. Polido, cortês, educado, instruído.
Lógun, Lógunçde s. Logunedé. Guerreiro; Guerreiro da cidade dc Edé (situada no
estado de Oxum, na Nigéria). Orixá da caça e da capacidade estratégica.
Lóògçmo orun s. Indulgente filho de Eledunmare; Aquele que conhece a dinâmica
dos mundos vis!vel e invisivcl e estabelece comunicação entre esses mundos.
Epíteto de Exu.

446
M

Malíi. çranlá s. Vaca, boi, touro, bovino.


Màriwò s. ELAEIS GUINEENSIS, Palmac. Palmeira, dendezeiro, palmas dc den-
dezeiro. Segundo os mitos, era o que Orunmilá, Ogum e alguns outros orixás
vestiam quando viviam na terra. Um dos símbolos de Ogum, essas palmas são
usadas como roupa e colocadas em seu assentamento.
Màriwò Pako s. Determinada qualidade de palmeira utilizada no culto a Ogum
c a Oxóssi.
Merénsélú s. Cidade mítica. Também um epíteto de Orunmilá.
Mcrò, nictcmèrò s./adj. circunspecção, discrição, prudência, cautela; circunspecto,
discreto, prudente, cauteloso.
Mçsò adj. Afável, cortês, educado, atencioso.
Mçta num. Três.
Mòye v. Ser prudente, discreto, sagaz e hábil.

Nana Biirúkíi s. Nanã Buruku. Deus, entre os ewe e os fon da República do Benin
(Daomé); este nome, em sua origem, significa Deus Antigo. Entre os iorubás,
considerada particularmente poderosa por ser filha do próprio Ser Supremo,
é chamada também de Omçlú. contração de Omo (filho) e Oluwa (Deus), o
que significa Filho dc Deus. Na, raiz proto-sudânica ocidental, significa mãe.
Adotada pelos çgba sob o nome Buruku. veio a ser cultuada pelos iorubás
como divindade, e não como o Ser Supremo; entre eles o aspecto masculino
do orixá é chamado Buruku e o aspecto feminino é chamado Omolu.
Ni adv. Do ser.
Nífura s./int. Fique esperto! A expressão designa a pessoa desconfiada ou receosa.
Nígbéraga s. Orgulhoso, arrogante, soberbo.
Nígbçkçle, nídájú, nígbokçlc, gbígbékèlé adj. Merecedor de crédito e confiança;
pessoa confiável.
Nínúrcrc s. Barriga boa, bom estofo, boa interioridade; generoso, bondoso, be­
névolo.

447
çlç, okàn-tútíi s. Mansidão, humildade,
à adj. O afável, cortês, simpático, “bom caráter”.
>e s. Etnia presente na Nigéria.

s. COLA ACUMINATA, Sterculiaceae. Obi, noz de cola. Pequeno fruto de uso


alimentar e sagrado. Um dos itens mais importantes do culto aos orixás, sen­
do indispensável em qualquer ritual. É usado em oferendas e como recurso
divinatório. Uma de suas espécies é o obi àbàlà. que geralmente possui três
ou quatro gomos e, raramente, seis gomos. Detentor de axé, pode ser comido
e oferecido aos orixás. Outra espécie é o obigbànja, com apenas dois gomos,
não utilizado em oferendas.
nrin s. Mulher, esposa, fêmea.
ko s. Bode, cabrito.
bò int. Adeus! Até logo! Até o reencontro! Tchau!
s_Odu de Ifá na prática do jogo dc búzios. '
•Méji s. Odu de Ifá.
do s. Verdade, justiça, direito, equidade.
Oya s. Rio sagrado dedicado a Oyá (Iansã).
Odu. O corpus literário dc Ifá sc compõe de um total de 236 odus, classifica­
dos cm 16 odus maiores, Ojú Odú, e 2-10 menores, Omo Odi) ou Amúlú Odú,
compondo um total de 4.096 (16 x 16 x 16) poemas que servem de suporte
para a interpretação oracular. Os odus são, simultaneamente, divindades que
estabelecem relações hierárquicas entre si. Por ocasião do processo iniciático
o babalaô, através do jogo divinatório, procura conhecer o odu de nascimento
do iaô, que passará a cultuar também o orixá relativo a esse odu, respeitando
os eirp (quizilas, interdições) por ele prescritos. O odu de nascimento orienta
o iaô quanto ao seu destino, nos mais diversos âmbitos.
Corpus s. Corpus literário de Ifá.
-Ifá s. Odu de Ifá. O mesmo que odu.
tlmvn, Oduà s. Oduduwa. Criador, Senhor da justiça. Considerado o Pai das
dinastias iorubás, o Patriarca dos iorubás.

448
Òfófó 5. Fofoca, mexerico.

Ofúlójú s. Èkuru acompanhado de um molho preparado com peixe ou camarão, to­


mates, pimenta, dendê, cebola e sal. Um dos alimentos prediletos de Aragbô.
Òfún s. Odu de Ifá.
Òfú-òkànràn .s\ Odu dc Ifá.
Ògidigbó s. Tipo de tambor muito grande, tocado para os reis e nas festas de Oxalá.
Ògiri-ekún s. Leopardo Feroz. Epíteto de Xangô; evocação desse orixá.
Ògiriyán 5. Aquele que sc alimenta de iyán (inhame pilado). Epíteto de Oxalá.

Ògodó s. Ritmo usado em celebrações c rituais. Obtido através da percussão do


tambor bata, acompanha danças acrobáticas realizadas pelos onikete.
Ògún 5. Ogum, divindade civilizatória associada à guerra, à caça, à agricultura, à
forja c à generosidade.
Ògún Méjècje ire s. Ogum da cidade de Iré. Epíteto de Ogum.
Ògún, òôgún s. Medicina, veneno; fetiche, amuleto; encantamento.
Ògún Onírè s. Epíteto dc Ogum. Literalmente, Ogum. o rei de Irê.
Ògúndi-Méji s. Odu de Ifá.
Ògúndá-Otúrá s. Odu de Ifá.
Ogbè s. Odu de Ifá.
Ogbè-Fú s. Odu dc Ifá.
Ogbè-Ògúndá s. Odu de Ifá.
Ogbè-iretè s. Odu de Ifá.
Ogbèyèkú s. Odu de Ifá.
Ogbèyónú s. Odu dc Ifá.
Ògbó s. Barra dc ferro utilizada na forja.
Ògbóni s. Responsabilidade; Sabedoria Espiritual; Longevidade. Epíteto dc Ivami
Oxorongá; uma das instituições reguladoras do culto a este orixá.
Ohún rcre s. Esta expressão designa a boa fala, a fala com doçura, serena, através
da qual uma pessoa se dirige a outra(s) com imparcialidade e coerência e de
modo verdadeiro.

449
Òj és. Chumbo.
Ojiji 5. Sombra, lugar sombreado. Representação visívd da essência espiritual;
acompanha o homem durante toda sua vida e morre junto com ara, o corpo
físico, embora não seja enterrado com ele.
Ojísç s. Mensageiro, serviçal, criado.
Òjísç-Oba s. Mensageiro do rei.
Ojowú obinrin int. Mulher ciumenta. Epíteto de Qbá; evocação desse orixá.
Ojú y. Olho, orifício, cara,Tosto; gume da faca::—
Ojú Odú s. Odus principais, odus maiores.
O júrere s./v. Olho bom; olhar com bons olhos, olhar bondoso, enxergar a neces­
sidade alheia ou própria, o que significa um ato de benevolência, de genero­
sidade, um favor.
Ojúbo s. Meio de evasão, subterfúgio; parte de uma casa reservada como santuário
para o culto aos orixás c aos ancestrais, casa reservada para culto aos orixás;
local dc culto, assentamento de orixá.
Ojúoró, epo-òwcrè, ojú-oró s. PISTIA STRATOIDES, Araceae. Limo; algas verdes
que cobrem a superfície da água; erva-de-santa-luzia; alface-d’água. Suas folhas
são empregadas no preparo de ebós de proteção.
Okété s. Espécie de preá grande; ratão do mato.
Òkiri òkò s. Guardião da cidade e das hortas; Guardião do alimento; Guardião da
zona urbana c da zona rural. Epíteto dc Exu.
Òkiti Èfòn s. Cidade nigeriana.
Okòbó adj. Falso, mentiroso; fofoqueiro; impotente.
0 kú ilédè int. Saudação feita a familiares ou amigos dc um conhecido que partiu
em viagem; expressão de tristeza pela ausência dessa pessoa.
Okún s. Mar; profundezas do mar.
Okúta s. Pedra; pedra de assentamento sacralizada com folhas e èjç.
01 s. Dono, senhor.
Olíwà yç sènsçn int. Forma de invocar Oxalá.
Olóde s. Olodé. Senhor (ou Dono) da terra. Senhor (ou Dono) do espaço aberto.
Designa um orixá, e ao mesmo tempo é um dos epítetos de Obaluaiê.

•150
Olòdodo adj. Honesto, justo, leal, fiel.
Olódúmnrc .s. Uni dos nomes do Ser Supremo.
Olófòúío s. Fofoqueiro.
Ológun-çdç òpòròlikà int. Saudação feita a Logunedé.
Ológun-kin int. Saudação feita a Logunedé.
Olókun s. Senhor das profundezas das águas salgadas. Orixá do mar, mais parti­
cularmente associado a suas profundezas; associado também à prosperidade
------- e-Trriquezn;--------------------------------------------------------------------------------
Olómi tútii s. Aquele que usa água fria. Forma pela qual são chamadas as crianças
nascidas graças à ajuda de Oxum.
Òlòngbò s. Acaçá, èko. simples ou dissolvido na água e temperado com mel e/ou
dendê.
Olóògiin 5. O mago-médico: aquele que manipula úògún. Médico tradicionalista,
conhecedor dos recursos terapêuticos da natureza e dos encantamentos, que
associa conhecimentos de magia aos de medicina.
Olóògün-àjísà s. Fciticciro infalivcl. Poder confiável ao qual recorrem iniciados
e devotos para utilizá-lo visando alcançar seus objetivos. Epíteto de Exu.
Este orixá é evocado por esse epíteto logo cedo pela manhã para, com
sua força, abençoar o dia que nasce e para proteger e abençoar todos os
comportamentos e todas as ocorrências desse dia. Com esse mesmo sen­
tido o epíteto Olóòuún-àjísú é utilizado no inicio de qualquer projeto ou
jornada, para que haja sucesso no empreendimento. De um modo geral,
o simbolismo relativo ao início da manhã aponta para a possibilidade
de reatualizar a força presente no momento da criação do universo. A
referência a ser evocado logo de manhã, ou logo pela manhã, diz respeito
ao fato de que no princípio da manhã há mais energia disponível, o axé
está mais forte. Quando se trata da existência humana, logo dc manhã diz
respeito à juventude.
Olóri s. Líder de um grupo. Literalmente, dono dos oris, senhor dos oris. Senhor de
tudo o que é vivo. Um dos nomes do Ser Supremo. O vocábulo designa líderes,
que se responsabilizam pela vida de grupos, apoiados nas recomendações
oraculares e realizando os ebós necessários ao progresso coletivo.
Olóri búburú, olóri burúkú s. Infeliz, azarado, desgraçado, maldito; desprovido
de um bom ori.
•ikin s. Essência divina do ikin. O ori do ikin.

•Ogím s. General ou chefe de exército; chefe dos guerreiros.


•Ode s. Chefe dos caçadores.
rerc s. Feliz, sortudo, abençoado, bendito; o dotado dc um bom ori, dono de
ítn bom comportamento.
ó adj. Sensato, fiel, sincero, confiável por ser fiel, previsível nos contratos.
, olóòtó. adj. Honesto, leal, verdadeiro.
i Òrisà s. Orixá que traz dinheiro, fortuna e prosperidade para humanos c
lara os demais orixás. Epíteto de Exu.
s. Homem de honra ou título; líder de um agrupamento equivalente a um
>airro, geralmente um ancião que representa a comunidade e transmite ao
ei os anseios do grupo.
Mcji 5. Homem de honra portador de dois títulos (Rei de Kétu e Patrono dos
Zaçadores). Epíteto de Oxóssi.
, amòye s. Homem sábio e prudente; aquele que possui percepção, discerni-
nento; dono do discernimento.
je 5. Comensal, aquele que come junto.
mbí-àfònjà s. Epíteto de Xangó.
ãlà 5. Salvador, libertador. Aquele que é divino e que, por ser divino, defende
i homem e o acolhe.
so, Oba Kòso s. O Rei não se enforcou. Evocação ou epíteto de Xangó. Vide
íòso.
íà s. Dono dos caminhos abertos; Aquele que abre caminhos para quem recorre
ele cm busca de alívio para dores e sofrimentos e para resolver situações de
onfusão e desorientação; Aquele que transmite o conhecimento e a sabedoria
lecessários à realização de um bom destino. Epíteto de Exu; sugere que as pessoas
im livre-arbítrio e podem alterar os seus destinos graças à aquisição de conhe-
imentos que favorecem mudanças em suas atitudes e condutas. É importante
alientar que, segundo a concepção iorubá, as mudanças na vida dependem
•rincipalmente da própria pessoa, que deve ter, antes de mais nada, disposição
ara mudar. Ao receber orientação do sacerdote e seguir suas recomendações
de ebós e iniciações, por exemplo) a pessoa promove alterações energéticas
ivoráveis á ampliação de sua consciência, fator indispensável para a promoção

452
das mudanças de atitudes e condutas necessárias. De mudanças pessoais decorre
a possibilidade de equacionar conflitos e aliviar sofrimentos.
Olúmòkí s. Grande divindade. Epíteto de Ogum.
Olúrno s. Olumó. Monte rochoso de Abeokutá, cultuado como orixá pelos egbá
(iorubás de Abeokutá).
Olúmò, olíimòràn, olóye, aniòve adj. Sábio, prudente, bom conselheiro.
Olú-ogbó s. Animal sagrado que vive por muito tempo.
Olú-odç s. Caçador velho, caçador ancestral.
Oliitójú àwon orno s. A que vela por todas as crianças. Epíteto de Oxum.
Olúwa s. Um dos nomes do Ser Supremo.
Olúwa Aiyé s. Scnlior da Terra. Epíteto de Obaluaiê.
Olúwéré s. Senhor dos mistérios c da rapidez. Epíteto de Iroko.
O Iú h o 5. Titulo na Sociedade Ògbóni; sacerdote supremo de Orunmilá; adminis­
trador de um bairro ou aldeia.
Omi s. Água. —-
Oní sJprcf. Dono, Senhor. Como prefixo é utilizado para indicar a posse de alguma
qualidade ou defeito; por exemplo, onisuru. dono da paciência, designa uma
pessoa paciente.
Oníbodè s. Funcionário de alfândega ou de fronteira; carregador que atua na entrada
de uma cidade; porteiro, supervisor.
Oníbodè Òrun 5. Guardião do Céu. Orixá que pergunta a cada ser que deixa o orun
em direção ao aiye o seu destino.
Oníbú-ore adj. Aquele que presenteia, o generoso.
Oníjàláá 5. Músico-historiador que entoa ijálá, cantigas de júbilo dedicadas a
Ogum.
Oníjáw é Èsíimàrè int. Expressão utilizada no culto a Omolu, para saudar a pessoa
cujo odu dc nascimento nesse culto remete a Exurnarê.
Onijáwé Fèrçji int. Expressão utilizada como forma de saudação entre os iniciados
no culto a Omolu.
Oníkete s. Especialista em danças acrobáticas, apresentadas em celebrações diversas;

•153
t
(

dança músicas em dois ritmos, kctc c ògódó, ambos ao som do tambor bàtà.
Onílakàyè adj. Ajuizado, sensato, dotado de percepção aguçada.
Onílç, Onílíi s. Senhora do Espaço, Senhora da Terra.Mãe Terra, orixá do globo
terrestre, da dimensão física da existência, do espaço físico. Proprietário de
alguma terra.
Onílè-oríta s. Guardião das casas, das cidades e dos espaços físicos; Divindade que
habita as encruzilhadas. Epíteto de Exu. Este nome revela sua aliança com Iyami
Oxorongá, as Mães Ancestrais, sábias veneráveis que com ele compartilham os
ebós e a responsabilidade de aliviar o sofrimento humano. Nas encruzilhadas
os caminhos se cruzam dando lugar a novas possibilidades. Nas encruzilha­
das o orun encontra-se com o aiye, o mundo espiritual encontra-se com o
material e o invisível encontra-se com o visível, ampliando as possibilidades
dc realizar um bom destino.
Onílú s. Músico; percussionista de tambores falantes. . (
Onírní Fíifti s. Temperamental, dc personalidade forte, que combate a impaciência,
a teimosia, a incompetência. Epíteto de Exu. Como grande parte da ação de
Exu se exerce sobre o desenvolvimento das virtudes no homem e os homens,
em geral, têm dificuldade para reconhecer as próprias falhas, sua ação é mal-
interpretada.
Onírè int. Epíteto de Ogum e saudação a este orixá. Significa, literalmente, O Senhor
da cidadc dc Ire, local onde Ogum reinou.
Onírera s. Invejoso; pessoa jactanciosa, arrogante.
Onírèmòjé s. Músico-historiador que entoa irètnçjé, cantigas de lamento dedicadas
a Ogum.
Oiiístiúrú, onípatnóra s./adj. Pessoa paciente, tolerante, calma: o dono da paci­
ência.
Onísègün s. Médico; praticante de òògún, médico tradicionalista.
Oiiisègün-esin s. Fcrrador; veterinário.
Onísírí, wúnilórí, fojúfún, gbojúfún, gbànívanjú, ntúlórívá 5. Estimulador,
encorajador, aquele que encoraja.
Onísokúso s. Tagarelice, bisbilhotice, mexerico.
Oníwórowòro adj. Tagarela.

454
Oníyónú adj. Benevolente.
Òògún, egbògi, isègún s. Prática terapêutica que associa recursos de medicina e
de magia.
Oóyc s. Os que foram salvos. Expressão que, cm uma narrativa mítica, designa
Oduduwa e seu séquito de desbravadores.
Òpiiró. aláiní òtító adj. Mentiroso, falso, desprovido de verdade, desleal, infiel,
não confiável.
Ore s. Gratidão. __ __
Ori s. Banha de origem vegetal muito usada nos rituais de orixá para atrair equi­
líbrio. É também alimento de alguns orixás, entre os quais Oxalá e Ajê. Em
preparados medicinais é usada como calmante.
Orí s. Ori. Cabeça, origem. Designa, ao mesmo tempo, um orixá e a cabeça física
dos seres, símbolo de orí inu, que constitui a essência de cada ser. Divindade
pessoal, cultuada entre outras, Ori é, de fato, o mais importante dos orixás do
panteão iorubá, pois seja qual for o empenho de outras divindades em favor
de determinada pessoa, ela somente receberá o que for sancionado por seu ori.
Predestinação; essência humana responsável pelo caráter e pela personalidade;
capítulo de livro.
Orí burúkú s. O mau ori.
Orí inú s. Cabeça interior. A grande responsável pelo destino pessoal, tanto pelas
oportunidades quanto pelas dificuldades existenciais.
Orí pípé s. O orí equilibrado: ori que, dotado da capacidade dc discernir, favorecerá
a prática da justiça.
Orí rcrc s. O bom ori.
Oríki, oki s. Composto de orí, cabeça, e ki, saudir, o vocábulo oriki é uma saudação
ao ser, uma evocação, que faz referência à origem desse ser, suas qualidades e
seus ancestrais. Dessa forma são saudados os orixás, as pessoas e os animais.
Geralmente os orikis incluem descrições dc características e feitos do ser
saudado.
Oríki-àmútòrunwá 5. Evocação natural de origem pessoal que narra características
do nascimento da pessoa.
Oríki Èsú, Èsú pipè s. Saudação a Exu; evocação dc Exu.

455
ilè s. Oriki familiar que faz referência a antepassados e a linhagens. Tanto
deni ser dirigidos a uma família como a algum de seus integrantes, com a
alidade de louvar seus ancestrais, demonstrar apreço ou aplacar uma possível
. Relatam fatos do passado de uma linhagem familiar particular, dando a
s membros o conhecimento a respeito da própria origem e dos feitos de seus
.estrais. Sempre que entoados provocam grande emoção nos ouvintes.
ta, Oya pípè s. Saudação a Oyá; evocação de Oyá.
ngo, Sango pípè s. Saudação a Xangó; evocação dc Xangô.
\'ome de família, sobrenome.
'alito de escovar dentes.
'antiga. Formas brandas de louvação, empregadas nas festas e celebrações
izadas em homenagem aos orixás. Carregam parte da carga informativa
oríki (evocações) e representam um ponto intermediário entre a exortação
poderes do orixá contidos nos àdúrà (rezas) e a musicalidade dos orikis.
Icm ser entoados oralmente ou por tambores falantes. Possuem, como os
;is, valor documental por registrarem aspectos profanos e sagrados da vida
iorubás. Veiculam ensinamentos através do canto, sempre acompanhado
) som de tambores falantes.
, orin-òfò 5. Cantiga de lamento, canção fúnebre.
s. Cantiga entoada em homenagem aos ancestrais femininos, Gueledé.
ralmente cantiga dc dcbochc, é empregada para apontar desvios à norma
onduta cm uma comunidade.
, orin-ewi-çsà s. Cantiga em homenagem aos ancestrais. São entoadas
inte as festas de Egungun.
írcre s. Sorte, boa sorte; bom ori.
)rixá. O termo designa todas as divindades iorubás.
i, Orisà-àlá Orixá de vestes brancas (orixá que aprecia a cor branca, a
rza e a limpeza). Epíteto de Oxalá.
ifun 5. Orixá branco. Orixá puro. Epíteto de Oxalá.
n s. Epíteto de Oxalá.
s. Orixá da cidade dc IIc. Epíteto de Oxalá,
sà s. Qualquer orixá.

•156
Ò risànlá, Òrisà-àlá, Òrisàlá ,s'. Grande Orixá, Orixá da Pureza. Epíteto dc
Oxalá.
Òrisà Olíifòn s. Orixá protetor do povo de líçn. Epíteto de Oxalá.
Òrisà Olóba s. Orixá Rei de Oba. Epíteto de Oxalá.
Òrisà-olómo s. Orixá que traz fílhos, Orixá que protege seus fílhos (iniciados e
devotos). Epíteto de Exu. Refere-se à fertilidade favorecida por Exu, à vitória
promovida por ele sobre a esterilidade de qualquer natureza e à virilidade.
Orisà-Roowu s. Epíteto de Oxalá.
Orísç s. Fonte de origem dos oris (fonte da qual se originam os seres; origem de
todos os seres). Epíteto dc Eledunmare.
Oríta s. Encruzilhada.
Oríta mçfa s. Encruzilhada (confluência de seis ruas).
Orita mçta s. Encruzilhada (confluência de três ruas ou encruzilhada cm T).
Òro s. 1RVINGIA GABONENSIS, Ixonanthaceae. Manga selvagem; mangueira,
árvore sagrada.
Orò-ipá-odç s. Ritual fúnebre em homenagem a um caçador ou a um devoto de
Ogum.
Òrógbó ,s\ GARCINIA KOLA, Guttiferac. Orobô. Amargosa noz de cola. Bastante
utilizada para mascar, e também como elemento indispensável nos rituais
sagrados.
Òrú s. Mensageiro de Xangô.
Orúko, oko s. Nome.
Orúko-Àbiso s. Nome atribuído a uma criança em função de características fami­
liares: sua ancestralidade, orixás cultuados pela família, profissões exercidas
por esse grupo familiar.
Osún 5. BIXA OREI.I.ANA, Bixaceae. Uma das árvores mais empregadas no culto
aos orixás. Espécie de tintura vermelha usada em rituais; produto derivado
da madeira dessa árvore.
Osálá, Òrisànlá s. Oxalá, orixá primordial, modelador dos corpos humanos.
Osàlúfòn s. Orixá da paz do reino de Ifón. Epíteto dc Oxalá.
Òsó s. Bruxo, feiticeiro; homem iniciado no culto a Iyami Oxorongá.

457
Òsogbo s. Cidade dc origem do culto a Oxum.
Osòròngà s. Oxorongá. Forma de referência às Iyami, cujo poder e conhecimento
as fazem respeitadas e veneradas.
Osòròngà-çlçsè-osàn s. Epíteto das Ajê, que alude à sua feminilidade, vaidade e
r elegância. Expressão que reporta ao hábito das Ajé de pintarem os calcanhares
com osún, para ficarem mais elegantes.
Osósó òwòwò s. Alimento preparado com milho branco ou amarelo cozido, ao qual
se acrescenta coco picado em pedaços miúdos.
Òsiimàrè, Èsúm àrè s. Exumarê. Orixá que, sendo patrono destas áreas, favorece as
comunicações, as transformações, a estética, a defesa pessoal e a magia.
Otitó, òóto, otó 5. Honestidade; verdade.
Otó, òtító òótó s. Verdade.
Òtúrúpòn s. Décimo-quarto odu de Ifá na hierarquia do jogo dc-búzios.'
Òtúrúpòn-Méji s. Odu de Ifá.
Ò wá yanrin wa yanrin ków ó sí int. Aquela que cava e cava a areia para esconder
( dinheiro. Epíteto de Oxum; evocação desse orixá.

c Owó s. Dinheiro.
( Owó-eyo s. Búzio. Antigamente utilizado como moeda corrente.
Owó-eyo-niéta s. Três búzios. Simbolizam dinheiro porque já foram moedas 110
passado. Nos assentamentos de Exu costuma-se colocar três búzios abertos.
Owu s. Localidade onde Oxalá é cultuado com o nome Orifà-Roowu.
Owú s. Martelo, primeira ferramenta forjada por Ogum.
Oye .v. Entendimento, inteligência, compreensão, percepção acurada, sabedoria.
^ Oyin s. Mel.
Òvingbò s. Cidade mítica.

O
Oba s. Rei, monarca, soberano; orixá; localidade iorubá onde sc cultua Oxalá.
Obaàsin s. Rei venerável. Epíteto de Exu.
Ò bàrà s. Sexto odu de Ifá na hierarquia do jogo de búzios.

-158
Oba Kòso s. O Rei não se enforcou. Epíteto de Xangô; evocação desse orixá. Vi<
Kòso.
Obàliifçn, Oba Olíifòn s. Oxalufon. Orixá da paz. Rei dc Ifon. Epíteto dc Oxal
Obalíiwayé s. Obaluaiê, orixá da enfermidade e da cura; orixá da terra e de tudo
que há nela. Contração de Oba-olúwa-aivé. Rei que c o Senhor da Terra.
Oba Süúrú s. Rei da paciência. Epíteto de Exu. Exu favorece os esforços human
de prática da paciência, virtude capital.
Obàtálá. Òrisánlá s. Obatalá, Orixalá, dois dos nomes de Oxalá, o modelador d
corpos humanos. Òrisánlá significa O Grande Orixá. Obàtálá c contração >
Qba-ti-o-nlá, O Rei que c grande. ou de Qba-ti-àlà. Rei cm vestes branc
ou Rei da Pureza.
Obàyigbò int. A grande divindade. Saudação a Oxalá.
Obe 5. Faca, canivete.
Obe Èsú s. Faca comum ou, de preferência, com corte dos dois lados, dedicad;
Exu. É costume reservar duas facas para Exu - uma pequena, que fica sobrt
assentamento, e outra grande, para uso ritual.
Obè ilá s. Molho dc quiabo. Depois de cozido em água o quiabo é misturade
dendê e sal.
Òdàlç, idàlç s. Perfídia, deslealdade, traição.
Òtlàlèberíi s. Nome do rio mítico cm que Exu e Iyami Oxorongá estabelecera
um pacto; significa O traidor se atemoriza.
Òdàrà s. Benevolente, Bom, Belo, Razoável; Aquele que realiza o bem epromo
essas qualidades nas pessoas. Epíteto de Exu.
Odç, (idídçrç, òdidè s. Papagaio da qual se retira a pena sagrada ikõdidç.
Odè s. Caçador. Epíteto de Oxóssi, divindade da caça.
Odédolá s. O caçador trouxe fortuna (progresso) para a minha vida. Nome dad<
uma pessoa em louvor de Ogum, Oxóssi e Logunedé.
Odiin .s\ Dia dedicado às oferendas cíclicas aos orixás.
Òdúndún s. KALANCHOE CRENATA, Crassulaceae. Folha-da-costa. Uma c
plantas indispensáveis para a sacralização dos símbolos dos orixás. Atrai lc
gevidade, sorte, equilíbrio e muita energia vital.

459
lecha, seta; arco e flecha, símbolos de Oxóssi; lança e espada de metal dou-
lo, símbolos de Logunedé; penhor, garantia.
'ovoado iorubá.

ícantamento; palavra utilizada com finalidade mágica; evocação cuja finali-


ie é transferir para o beneficiado o poder terapêutico, atrativo e preventivo
>seres e elementos evocados.
;bí s. Ofó que facilita o parto; encantamento utilizado por parteiros e
teiras.
MUSA SAP1ENT1UM, Musaccae. Banana.
gbàgbà 5. MUSA SAPIF.NTIUM, Musaccae. Banana da terra.
Forma de referência a algo delicado. A expressão ògçgç igi àgúnlà faz
réncia à importância dc iniciar-se em Orunmilá.
;queno bastão para defesa pessoal; porrete, o símbolo de Exu.
•ó-Esíi s. Bastão confeccionado na madeira sagrada iroko, de aproxima-
íentc 20 ou 30 centímetros, com a imagem de Exu esculpida, com ç>gç na
a e, por vezes, uma figura humana, que pode ser masculina ou feminina,
indo sc trata de uma imagem do sexo feminino, a figura tem geralmente o
.'lo trançado e por vezes carrega uma criança no colo, fazendo referência à
ilidade propiciada por esse orixá. Quando se trata de uma imagem do sexo
culino, a figura representa muitas vezes um guerreiro. Esse bastão, prepa-
) para evocar a presença e a força de Exu, serve também como elemento
i a identificação de seus devotos. Nos momentos de dificuldade, o ç>gç é
lo como defesa. Pode ser enriquecido com detalhes, como, por exemplo,
os abertos, ou ter seu cabo revestido com contas brancas, vermelhas e
as. Constitui elemento de identificação, símbolo de poder e recurso de
sa e de ataque, de benção e de maldição. Durante os rituais, os iniciados
sgam e ostentam esse objeto sagrado.
m. Cento c sessenta.
ó-çyo 5. Colar de Exu confeccionado com 160 búzios abertos e trançados
òrma de escamas.
Não-iniciado.
Senso, arte, esperteza, astúcia, sabedoria; sensatez, discernimento.
■.Além, mais longe, acolá, para lá.

•160
Ojá s. Feira. Espaço dc trocas, compras c vendas, a feira reúne elementos associados
ao dinheiro e a seus dinamismos. Exu protege a feira porque ela representa a
organização da sociedade humana e simboliza o próprio planeta terra. A feira,
como a vida, é um local de passagem onde todos se encontram com o mesmo
objetivo: sobreviver. Na feira as pessoas param, realizam trocas e conquistas
e depois vão embora.

Ojá s. Faixa, cinto, cinta, banda, lenço de cabeça, tira de pano utilizada para amarrar
a roupa.

Òjò s. Sacerdote do culto a Egungun.


Òjébòdc s. O culto aos ancestrais trouxe essa graça; Egungun traz fertilidade;
Egungun abençoa seus tllhos com fertilidade e cura. Nom e pessoal dado em
louvor de Egungun.

Ojó s. Dia, data, tempo, ciclo, fase.


Ojó ijcjL Sétimo dia da festa de Exu. Neste dia consulta-se o jogo divinatório para
saber o que Exu deseja com o complemento aos rituais.

Ojó Ita s. Terceiro dia da festa de Exu. Neste dia consulta-se o jogo divinatório para
saber o que Exu deseja como complemento aos rituais.

Ojó ori s. Pacto que os abikus estabelecem com a Sociedade Abiku para retornarem
ao céu ao atingirem determinada idade.

Okà s. ZF.A MAYS, GRAMINEAE, GERMINEAE. Milho; comida feita de farinha


deinhame, cará, mandioca ou outra farinha.

Okà tàbí àgbàdo s. Espiga vigorosa de milho.


Okàn sl Alma, espírito, consciência; o coração, considerado a sede da inteligência
e do pensamento intuitivo e a fonte de toda ação.

Okánlànón s. Epíteto de lbeji.


Okànlcnigba num. Duzentos e um.
Okànrãa s. Primeiro odu dc Ifá na hierarquia do jogo de búzios.
Òkànrà«-Méji s. Odu de Ifá.
Oko s. .Níarido.
Okó s. Enxada ou estribo.

Okünrin s. Homem; macho.


'"‘kúnrin-gògòrò s. Homem alto. Epíteto de Exu. Indica sua versatilidade, seu poder
de transformação, e assinala o fato de ele ser dotado de múltiplas possibilidades,
algumas das quais aparentemente contraditórias. ' .

v-KÜnrin-kúkúrú s. Homem baixo. Epíteto de Exu. Indica sua vcrsaUJ^jÉS^seii _


poder de transformação, e assinala o fato de ele ser dotado de múmpiãS pôsr . __ ;
sibilidades, algumas das quais aparentemente contraditórias.

’è. m óin-m óin, òlélç s. Alimento preparado com feijão fradinho moído, tempe­
rado com azeite de dendê, peixe, cebola, sal e demais temperos, embrulhado
em folhas de bananeira e cozido no vapor.

U lófin, O lófin-O run s. Rei; Senhor do Céu. Um dos nomes do Ser Supremo.

O lógbòn s. Homem sábio; pessoa dotada de discernimento, bom senso, astúcia e


sabedoria.

u lõ jç s. Homem que conhece os segredos do culto a Egungun; sacerdote supremo .


deste culto; notável que conhece os segredos do culto aos ancestrais mascu-" *
linos.

'ójó s. Senhor do Dia: Senhor do Tempo; Senhor da Vida. Designa um orixá e,


ao mesmo tempo, é um dos epítetos de Ogum.

'''ó jó ahídê sçséefun s. Senhor do Dia: Aquele que possui uma coroa feita decauris
e contas brancas. Essa coroa é um dos símbolos mais importantes de Oxalá.
Epíteto de Oxalá; uma das formas de saudá-lo.

ç/lókàn s. Pessoa corajosa, valente.

O lókàn-líle s. Pessoa de coração duro.


(* ’
O lókàn-tútíi s. Pessoa meiga.

O lókàn-w íw ó s. Pessoa perversa.

f'lóre adj. Bondoso, generoso: dono da bondade.

^ 'ó ru n Senhor do Céu. Um dos nomes do Ser Supremo.

^',ósà s. Orixá das águas salobras.

'ósányin s. Sacerdote de Ossaim.

ótà s. Chefe mítico do povoado Qtã.

óyàyà s. Dono da simpatia: pessoa alegre, bem humorada, vivaz, animada, sim ­
pática, sociável.

462
Omo s. Criança, prole, progénie; servidor; caroço de fruto; semente.

Omo-awo s. Filho do segredo. Nome ciado aos aprehdizcs de Ifá, também chamados
'• kékeré-uwo, o pequeno que domina o segredo.
- " ' . Omo-KIél>o 5. Responsável pelo encaminhamento do ebó a seu destino. Epíteto
de Exu.

Omo-jobí int. Expressão denotativa da alegria dc possuir Ibeji.


Omó-Kéhindé-Ejiré int. Forma dc saudar Kçhinde.
Omohhvàbí s. O filho nobre, gentil, distinto, nascido com bom comportamento;
pessoas cujo iwá (caráter e personalidade) está bem desenvolvido.

O 1119 Odü, Anuílü Odü s. Odus Menores. Literalmente, Filhos dos Odus (Maio­
res).
Omo-ode s. Caçador principiante. Literalmente, Filho do Caçador. Refere-se aos
iniciados em Oxóssi.

Omo owú s. Pedaço de ferro que serve de apoio para a forja.


Omolú s. Nome de Nanã Buruku que faz referência a seus aspectos femininos.
Omolúwàbí .<>. Cavalheiro, pessoa educada ou distinta.
Onísègün s. Conhecedor de òògún, práticas mágico-medicinais.
Òòni s. Rei de 1fé; governante.
Òpá s. Bastão, bordão.
Òpá òsoro s. Cetro dedicado a alguns orixás.
Òpç 5. Palmeira.
Òpè-Ifá s. Dendczciro; palmeira que produz os ikins.
Òpèlç s. Mensageiro dc Ifá. Corrente divinatória confeccionada em metal ou com
fio grosso de algodão. Reúne oito elementos, frutos da árvore çpç/è, também
consagrada a Ifá. Cada fruto possui uma face côncava e outra convexa que,
na queda da corrente, define determinada configuração e esta, remete ao
odu correspondente. Encontram-se correntes em que os frutos do òpçlç são
substituídos por peças de metal.

Òpèlç-kàràgbá s. Feito de cabaça sem importância litúrgica, imita o opelé autên­


tico. Usado pelos aprendizes de Ifá para o treino das habilidades exigidas pelo
jogo de Ifá.

463
s. Bacia, gamela, tina, tabuleiro.
•Ifá s. Tabuleiro com superfície de aproximadamente trinta centímetros de
liãmctro, sempre de madeira, em forma retangular, circular ou semicircular,
.obre o qual o sacerdote coloca o iyçròsún, para nele registrar as caídas do
ipelé ou dos ikins durante o jogo oracular. Suas margens são trabalhadas em
laixo ou alto relevo, sendo que, em sua parte superior, frequentemente aclia-
•e esculpida a face de Exu.

5. Percepção, entendimento, compreensão.

tiíyàn, Òràníyàn Oraniyan. Orixá da guerra. Filho de Oduduwa e pai de


<angô.

Símbolo de Orunmilá.

Amigo; bondade, generosidade.

re s. Presente, dom, gratuidade, vantagem, bônus, oblação; presente,


nú 5. Esmola, donativo, ato de caridade,

tinúwá s. Oferta de livre e espontânea vontade.


. órç s. Amigo íntimo, amigo leal.

Espírito que habita o interior de árvores e pedras. A mesma expressão é usada


lara referir-se à força que está sendo adquirida pela pessoa que está fazendo
im ebó ou realizando algum outro ritual sagrado. Assim, no momento em que
:sta palavra é pronunciada, a pessoa torna-se intocável a forças negativas.

. Riqueza, prosperidade, tesouro, opulência; rituais dc oferenda às divinda-


les.

. Os problemas que estão sendo eliminados através dos rituais de oferendas


is divindades.

s. Plano suprassensível; firmamento, céu.


uilà s. Orunmilá. Contração de Orun-1 'o-mo-a-ti-la, Somente o eeu conhece
is meios cie libertação, ou Orun-mo-ola, Somente o ccupode libertar. Divin-
lade primordial, oráculo divino, divindade da sabedoria. Orixá primordial
Qrúnmilâ e
]ue trouxe para a terra o sistema divinatório de Ifá. As palavras
Ç)rúnmilà-Ifã designam a divindade, enquanto Ifá designa, simultaneamente,
i divindade e o sistema divinatório a ela associado.

Nono odu de Ifá na hierarquia do jogo de búzios.

•164
Òsá-.Mcji s. O d u d e Ifá.

Òsányin s. Ossaim. Orixá do reino vegetal que tem domínio sobre a magia, a me­
dicina e a cura com plantas. Orixá da essência do mundo vegetal. Como Exu,
**'é eompanhia indispensável de Orunmilá. Assim com o as plantas, possui uma
única perna. O bastão de ferro forjado que lhe pertence, com a representação
de galhos e pássaros, não pode ser guardado em posição horizontal, nem
pode cair.

Osç s: Sabão.

Osç s. Dia consagrado às divindades; feriado; período entre um dia santo e o outro;
semana; dia dedicado à oferenda realizada aos orixás a intervalos regulares.

Òsç s. Quinto odu de Ifá na hierarquia do jogo de búzios.

Osç-n'íbu omi s. Oché nas profundezas das águas. Epíteto de Oxum.

Oséètürá s. Epíteto de Exu; nome mítico referente à amizade de Exu com Orunmilá.
Significa Aquele que remove a dor e harmoniza. Durante os rituais é evocado
por esse nome, tornando-se mais ágil no transporte do ebó.

Osínsin 5. Sopa deliciosa. Dessa palavra originou-se o tradicional “xinxim de gali­


nha”, prato do cardápio baiano.

Òsonú 5. Homem liberal, espontâneo, generoso.

Osòosi, Osòwiisí s. Oxóssi, orixá da caça, da guerra e da estratégia, patrono dos


caçadores. Filho e aprendiz dc Ogum nas artes da caça e da guerra.

Òsun 5. Oxum, orixá dos rios e das águas doces, do amor, dos metais nobres, da
fertilidade e da prosperidade.

Ota s. Pedra; pedra sagrada usada em assentamentos de orixás.


Otí 5. Bebida alcoólica; bebida destilada.

Owà i Cidade iorubá.


Owó s. Mão.
Owó s. Palmas das mãos.

Owónrin s. Décimo-primeiro odu de Ifá na hierarquia do jogo de búzios.

Òwónrin-Otúrá s. Odu de Ifá.

Oya s. Oyá. Esposa de Xangô a quem o Rio Niger foi dedicado; orixá dos ventos, das
tempestades, da coragem, da ousadia. Iansã. A palavra lansã talvez derive da

465
expressão Oya Mesan (Oyá das nove partes). O número nove está intimamente
ligado a ela, com o se pode constatar em seus m itosr -

Oya arm a bora bí aso int. Oyá vestida de fogo. Epíteto de Oyá; evocação desse
orixá.

Òyájú adj. Atrevido, orgulhoso, arrogante.

Oya Orírií int. Vcndaval. Epíteto de Oyá; evocação desse orixá.


Òyàyà s. Alegria, bom humor, vivacidade, animação, simpatia, sociabilidade.
Òyèlaí s. Odu de Ifá:—
Òyó s. Cidade na qual Xangó reinou.

Pákí, gbágúdá s. MANIHOT ESCULENTA, Euphorbiaceae. Mandioca.


Pàkití s. Esteira grossa.
Pé s. Completo.
Pèrègún, pòrò”ún s. DRACAENA FRAGANS, Agavaceae. Dracena, Pau-d’água.
Planta sagrada de grande poder vital dedicada a Ogum e a outros orixás. Muito
resistente, é utilizada para lavar os elementos simbólicos dos orixás.

Pèlé 5. Palavra usada com o saudação solidária a uma pessoa ferida ou que esteja
sofrendo.

Pèlç, pélçpèlç adv. Moderadamente, cautelosamente, precavidamente.


Pçpéiye s. Pato ou pata. Pçpçiyç funfun: pato branco.
Pçtékí s. Feijão fradinho cozido e temperado, ao qual se acrescentam ovos cozidos.
Tutu de feijão.

Pí v. Ser.
Pípé adj. Perfeito, completo.
Pípè s. Chamada, convite.
Poroporo adv. Falando muito.
Pupa s. Cor vermelha.
Pupa adj. Vermelho, escarlate.
P iiró i. Mentir.

R
Ránpò v. Falar ironicamente.

Ráuràu, rcderède s. Insensatez, bobagem; ausência ou indefinição de rumo.


Rere adj. Bom, honesto.
Réré adv. Perto, próximo.
Ròkáàkiri r. Espalhar notícias a respeito de algucm, fofocar.
Rò v. Contar, relatar; refletir, pensar com sabedoria, crer, imaginar, conceber, pe-
rambular.

Ròrò, gbòrò, ròròn gbòdò s. Um tipo dc planta.

Sara s. Oferta e compartilhamento alegre de comida, bebida, música e danças,


realizada a intervalos regularcs, para manter os abikus no aiye, harmonizar
suas relações com os Amigos Espirituais do orun e atrair todos os benefícios
deles ao ofertante.

Sèjji s. Preciosa variedade de contas de colar de cor azul, símbolo de Oxalá e de


Orunmilá.

Siso s. Fala, expressão, discurso; lançamento, arremesso.


So v. Falar, dizer, contar; brotar do solo ou brotar do tronco da árvore.
Sobótibòti, sòsokúso, sísòsokúso v. Falar excessivamente de bobagens, ter uma
conversa infantilizada, imatura.

Sobótò r. Falar muito.


Sòfófó r. Verbo que associa os atos de mentir, revelar segredos e fofocar.

Sojáde v. Falar claro; brotar, surgir.

Som ota r. Ato dc ser mal-educado, descortés, grosseiro.

Surú s. Paciência.

•167
.bçkçlé v. Desconfiar, recear, duvidar, não acreditar,
òtó s. Falso, incorreto, desleal.

’ó 5. Xangó, orixá dos raios e trovões, divindade da justiça.

tia s. Alimento cozido no vapor, preparado com milho verde moldo, temperado
com pimenta, azeite de dendê morno, sal, cebola, ao qual se acrescenta peixe.
Embrulhado cm folha de bananeira e cozido 110 vapor ou cm banho-maria,
retem o calor por muito tempo. Pamonha.

>vé s. Tagarelice inclinada a a disputa e a discussão.

rí v. Encorajar a si mesmo, animar-se; ficar alerta.

• v. Fofocar.

■rç s. Maracá.

•té, otí-àgbàdo s. Cerveja feita de milho. Bebida de Oxum.


li s. Imagem feita de barro que propicia proteção, vingança e ataque.
yà v. Desencorajar, desalentar.
•òyé v. Falar demais, tagarelar.
Vigiar, tomar conta, ficar de olho.

gbade int. Com prosperidade, recebe a coroa. Saudação a Iemanjá.


, more r. Ser grato.

nná s. Xapanã. Sarampo, varíola; um dos nomes dc Obaluaiê, orixá da varíola,


das doenças e da cura.

, s./v. Fala resultante de recolhimento interior, imaginação e reflexão; ato de


falar.

nú s. Benigno, bondoso, compassivo, dotado dc bom coração,

sòtító v. Ser fiel, ser verdadeiro, ser honesto.

conj. Ou. Exemplo: O gbç tàbi o kò gbç? Você está ouvindo ou não?
ò 5. Nome dado á primeira das crianças gêmeas a nascer. Táiwò, literalmente

468
Vai experimentar a vicia, é o espírito mais novo, que chega primeiro à terra
para abrir caminho a seu irmão espiritualmente mais velho e, portanto, mais
respeitável. Táyô Lo/ú ia à frente e Kçhindc. devagarzinho, atrás. Kçhindc.
literalmente, o último a chegar, c d espírito mais velho, que nasce como ca­
çula dos gêmeos.
Tanútanú adv. Compassivamente, piedosamente, com compaixão.
Táyc-Ejiré, Táyc-Lolii, Távé-Lolú Èjiré s. Epíteto de Ibeji; forma de saudar
Ibeji.
Tèdúntçdún adv. Compassivamente, solidariamente, sentindo a dor ou tristeza
do outro.
Tètè s. AMARANTHUS HYBRIDUS, Amaranthaceae. Bredo, caruru, caruru-de-
porco, cauda de raposa. Folha sagrada utilizada para sacralizar símbolos de
orixás, entre os quais Aragbò. Também utilizada como proteção contra forças
malignas que podem alterar o destino de uma pessoa. Seu axé favorece a
longevidade, evita situações de humilhação e traz nobreza à vida da pessoa.
Também de uso profano, é consumida como alimento.
Tètè-çgún, tètèrçgún s. COSTUS AFER, Costaceae. Caruru ou bredo com espi­
nho.
Tètç-ntç int. Saudação à essência da folha tçtç, invocando-a para que traga nobreza
à vida da pessoa.
Tí ndági lókclóke int. Aquela que corta a copa das árvores. Epíteto de Oyá; evo­
cação desse orixá.
Timí 5. Mensageiro de Xangô.
Tirçlçtirèlç adv. Modestamente, humildemente, tranquilamente, serenamente.
Tó t'orí owú kólá sí gbogbo ara int. Aquela que por ciúme se cobriu dc incisões
ornamentais. Epíteto de Obá; evocação desse orixá.
Topétopç adv. De modo agradecido, com gratidão, gratamente.
Toro v. Requerer, pedir, solicitar.
Toroidáriji v. Pedir perdão.
Tunú, nívónú, ronú s. Compassivo, meigo, terno.
Tútü s. Frio; calmo, sereno.
Túwóká s. Liberal, generoso, franco, mão aberta.

469
w
Wàdíiwàdíi adv. Impacientemente, apressadamente.
Wáji s. Tinta azul. Utilizada para tingir panos (batik) e em rituais.
W ánranwànran adv. Agitadamente, impacientemente, de modo perturbado.
Wi v. Falar, dizer, relatar.
Wírégbè v. Falar continuamente.
—_\YiwiLs.-Existêntia------------------------------------------------------------------------------
YVíwí s. Fala.
Wórowòro, kórokòro s. Sinetas de bronze colocadas no pescoço dos cavalos como
adorno; pessoa verborrágica, que fala demais.

Yálayàla adv. Em trapos.


Yangí s. Pedra vulcânica (laterita), símbolo dc Exu. Pedra na qual, segundo a narra­
tiva mítica, Exu se transformou e que constitui o seu símbolo mais importante.
Çta de Exu. Yangi Çta é a pedra sagrada de Exu. Laterita em estado bruto.
Uma vez enterrada obliquamente 110 chão, sobre ela se coloca bastante dendê.
Os iniciados cm Exu são chamados também de Oni Yangi (dono do yangi) e
são acalmados com dendê.
Yánkannírè s. Reiinvcncivcl dc Ire. Epíteto dc Ogum.
Yanrin s. LAUNAEA TARAXACIFOI.IA. Serralha. Depois dc cozida é oferecida
a Oxum.
Ye, iyá s. Mãe.
Yemoja 5. Iemanjá. Em alguns mitos apresentada como esposa dc Oranvan, des­
cendente dc Oduduwa e fundador mítico de Oyó, de quem teria concebido
Xangó, é considerada mãe dc muitos outros orixás, entre os quais Ogum e
Oxum. Seu nome, constituído de W(Mãe), çnio (Filho) e çja (peixe), significa
Mãe dos fílhos peixes. Iemanjá, mais relacionada ao poder genitor do que à
gestação, é também chamada Awoyo, Elegante e Bela. Agradável aos olhos.
Senhora de todas as águas, é associada à fertilidade, à procriação e ao poder
das Iyami Oxorongá.

•170
Yèvc s. SPONDIAS MOMBIN. Árvore sagrada dedicada a Ogum. Cajá-mirim.
Yeye Òsun s. Graciosa Mac Oxum. Epíteto de Oxum; evocação desse orixá.
Yòrübá s. Iorubá. Grupo étnico da África ocidental, constituído de aproximada­
mente trinta milhões de pessoas, cuja origein se deu em Ifé, Nigéria. Embora
ocupando parte do Togo e da República do Benin (antiga Daomé), sua grande
maioria permanece no local de origem;.idioma falado por esse grupo étnico.
Os iorubás são identificados também pelo designativo nagô.

471
Referências

Fontes im pressas e virtuais


ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS. Vocabulário Ortográfico da Língua Por­
tuguesa. 5. ed. São Paulo: Global, 2009.
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