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2014 TCC Nmteixeira
2014 TCC Nmteixeira
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
CURSO DE PEDAGOGIA
FORTALEZA-CEARÁ
2014
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FORTALEZA-CEARÁ
2014
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A citação de qualquer trecho desta monografia é permitida, desde que seja feita em
conformidade com as normas da ética científica.
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Profª. Drª. Tania Vicente Viana (Orientadora)
Universidade Federal do Ceará
________________________________________________
Profª. Ms. Andréia Vieira de Mendonça
Associação Pestalozzi do Ceará
_____________________________________________
Profª. Ms. Marta Benevides Cavalcante Loureiro
Aluna do doutorado do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFC
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AGRADECIMENTOS
O que seria de nós sem essas pessoas? O que poderíamos fazer sem elas por perto?
Nem sempre temos a iniciativa de agradecer pela ajuda, contribuição e companheirismo das
pessoas que nos cercam. Mas, hoje, tenho em mãos uma linda oportunidade de agradecer por
uma caminhada longa em que várias dessas pessoas incríveis contribuíram para minha
felicidade e para conquista da minha formação no curso de Pedagogia.
Quanto a este trabalho monográfico, quero que minha professora orientadora Tania
Viana saiba que ela nunca será esquecida e que seu exemplo como docente me deixou grandes
marcas. Eu ainda não conheci uma professora melhor do que ela. Seu trabalho é realizado de
maneira bastante competente e ao mesmo tempo amorosa. Agradeço muito por ter
transformado minhas palavras de preocupação no resultado final deste trabalho, em palavras
de gratidão e alegria. A motivação que me deu ao longo desses meses foi fundamental para
que eu conseguisse prosseguir e concluir esta etapa. Não tenho palavras suficientes para
agradecê-la!
Agradeço bastante pelo apoio e motivação que recebi da minha família, especialmente
meus pais, João e Laura. Obrigada. Espero dar orgulho a vocês!
Agradeço aos meus irmãos, que tanto amo, Rafael e Alice, por terem sido uma das
minhas maiores motivações para a escolha do curso e por muitas vezes, ao longo desta
produção monográfica, terem compreendido minha ausência.
Pelo apoio e compreensão que recebi dos amigos que entendiam minha ausência como
parte de uma etapa importante para meu crescimento: Nivaldo, Renata, Rozilda, Tânia,
Tainah, meu pastor e sua esposa, Carlos e Kellen, obrigada, amo vocês.
De maneira especial, ao meu amor e amigo Luiz Fernando, na espera de um dia poder
dizer: ao meu marido. Agradeço por todo estímulo, cobrança, apoio e carinho que recebi
durante a construção deste trabalho. Sua ajuda e companhia foram fundamentais.
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Aos amigos que fiz ao longo do curso, que me motivaram e ensinaram bastante.
Compartilhamos vários momentos preciosos. Lembro-me dos trabalhos de equipe que
produzimos juntas, que foram uma rica oportunidade de troca e convivência. São pessoas
muito queridas que tive a felicidade de conhecer. Em especial, agradeço à Renara Gonçalves e
Rosiane Sousa, de quem recebi muita ajuda, conselhos e motivação ao longo do curso. À
Amanda Moura, Ana Beatriz Souza, Gabriela de Aguiar, Glaudênia Honório, Glesiane
Nogueira, Juliana Kramer, Sara Barbosa e Taiane Sales, pela amizade e carinho.
Aos que contribuíram para meu ingresso no curso, meus tios Alessandra, Nicanor e
Tânea, que me deram o apoio necessário para que eu chegasse até o Ensino Superior.
E por último, mas não por ordem importância, agradeço aquele que foi o responsável
por tudo que citei até aqui. Ao Autor e Dono da minha vida, ao meu Deus. Que todas as
conquistas que eu tiver sejam para o Louvor da Sua glória.
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RESUMO
Este trabalho monográfico tem como objetivo geral analisar a temática da indisciplina escolar.
Especificamente, intenciona: i) refletir sobre a ética e a construção do juízo moral; ii)
diferenciar os conceitos de indisciplina, violência, incivilidade e conflito; iii) apresentar
sugestões práticas para que o professor possa lidar melhor com a indisciplina em sala de aula
e na escola. Para esse propósito, foi realizado um estudo bibliográfico, sobre a indisciplina
escolar, um tema de grande interesse dos professores, nos dias de hoje, devido ao amplo
desrespeito observado, pelos mais jovens, às figuras de autoridade, dentre elas o professor,
quando comparados ao comportamento da juventude de épocas passadas. Justifica-se este
estudo também por causa da disseminação da violência, da ausência de limites verificada em
crianças e adolescentes na sociedade contemporânea e da falta de maior investimento dos pais
e professores na formação moral do aprendiz. O estudo sobre indisciplina comporta reflexões
mais amplas sobre ética, moral, violência, incivilidade e conflito. Exploramos a indisciplina
como uma atitude que está em desacordo com as regras estabelecidas e que pode ser
trabalhada pedagogicamente em prol da cidadania. Diferenciamos as noções de autoridade e
autoritarismo, assinalando a importância da autoridade nas interações sociais e no espaço da
sala de aula. O docente ocupa o papel de uma autoridade instituída socialmente no processo
formal de aprendizagem. Nesse sentido, o professor e a comunidade escolar podem intervir na
formação do aluno a fim de que este atinja uma consciência autônoma sobre a importância
que as regras e os princípios apresentam na qualidade das relações humanas e da vida em
sociedade. Uma Educação voltada para a moral e a ética, além dos conteúdos escolares,
colabora ativamente para o exercício pleno da cidadania, em que o educando se torna capaz
de tomar decisões e de agir visando ao bem comum e à qualidade das relações humanas.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO. ....................................................................................................................... 9
CONCLUSÃO................................................................................................................ .........46
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 47
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INTRODUÇÃO
Diante disso, vemos que, sobre essa instituição, o peso de sua responsabilidade tem
aumentado, visto que recebe crianças cada vez mais novas e que têm a necessidade de serem
educadas e cuidadas de maneira integral. A demanda já não é mais somente de uma formação
intelectual, mas também emocional, afetiva, social, política, dentre outras. O que exige um
alto grau comprometimento dos profissionais envolvidos, especialmente os professores, e, em
consequência, acarreta diversos desafios.
Dentre estes desafios, discutiremos, ao longo deste trabalho, sobre o que é considerado
por Amos e Orem (1968) como a principal preocupação do futuro professor: a ordem e a (in)
disciplina na escola. Esse tema merece a atenção de educadores, dentre muitos fatores, porque
pode ser um empecilho para uma aprendizagem significativa dos alunos e motivo de estresse,
condições desfavoráveis de trabalho e favoráveis ao esgotamento mental dos professores.
Pensando nisso, elaboramos este trabalho a fim de que contribua para a discussão do
problema da indisciplina enfrentada na escola, especialmente por professores iniciantes, que
ainda não obtiveram a experiência e a reflexão necessária para enfrentar esse obstáculo
9
sabendo melhor do que se trata e como pode ser contornado. As contribuições deste texto são
dadas na expectativa de que o leitor sinta-se motivado a prosseguir com as pesquisas sobre a
indisciplina escolar, como também a uma atenção maior à formação moral das crianças, o que
exerceria grande impacto social. Ao invés de vermos professores esgotados por sua luta
contra a indisciplina de sua turma, poderemos chegar ao ponto de vermos educadores
engajados e comprometidos com o processor de formação da autonomia moral de seus alunos,
do mesmo modo como se dedicam ao ensino dos conteúdos, e testemunharmos uma sociedade
mais justa e ética, pautada pelo respeito, pelo diálogo e pela reciprocidade.
Este trabalho monográfico tem como objetivo geral analisar a temática da indisciplina
escolar. Especificamente, intenciona: i) refletir sobre a ética e a construção do juízo moral; ii)
diferenciar os conceitos de indisciplina, violência, incivilidade e conflito; iii) apresentar
sugestões práticas para que o professor possa lidar melhor com a indisciplina em sala de aula
e na escola. Para esse propósito, foi realizada uma pesquisa de natureza bibliográfica.
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No campo de investigações psicológicas sobre o desenvolvimento moral, o epistemólogo suíço Jean Piaget
(1932) foi pioneiro e inovador com suas ideias apresentadas no livro O Juízo Moral na Criança. Os resultados de
suas investigações possibilitaram a formulação de uma teoria psicogenética interacionista do desenvolvimento
moral que indica tendências evolutivas estruturais caracterizadas pelos estágios pré-moral (anomia), de
moralidade heterônoma (heteronomia) e de moralidade autônoma (autonomia) (VASCONCELOS, 2005).
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Desse modo, a lei ‘é proibido matar o próximo’, por mais que pareça
natural, é uma das regras constituintes da moral de nossa sociedade; já a
reflexão que se faz sobre ela relaciona-se à ética, como a sua transgressão
em determinadas situações que envolvem crimes hediondos (por exemplo,
homicídio ou latrocínio) (PEDRO-SILVA, 2010, p. 58-59).
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Um professor interessado no desenvolvimento moral dos seus alunos deve estar atento
às situações de conflito que ocorrem naturalmente no grupo e observar em quais momentos
uma reflexão sobre uma determinada atitude incoerente, que prejudica a qualidade das
relações interpessoais, deve ser discutida entre eles. Essa discussão pode levá-los a refletir
sobre quais valores são indispensáveis e devem, portanto, ser priorizados. Se em dada
situação, por exemplo, uma pessoa pondera sobre as virtudes que lhe são essenciais e depois
decide pelo que lhe trará um benefício imediato em detrimento da obediência a alguma
norma, esta atitude é caracterizada como culpável, por causa da transgressão à regra. Mas se a
mesma atitude for tomada com vistas à sobrevivência e/ou em legítima defesa, ainda se torna
digna de condenação? Observa-se, desse modo, que as reflexões sobre moral e ética envolvem
elementos atenuantes e agravantes, a serem considerados em cada caso.
Mas “Para que a ação seja moral, ela tem que estar racionalmente de acordo com um
princípio que o sujeito acredite ser universal” (ARAÚJO, 1996, p. 105). Essa ideia de
princípio universal é descrita na obra do filósofo iluminista Immanuel Kant2 (1724–1804)
denominada Fundamentos da metafísica dos costumes (1785), em que Piaget (1896–1980) se
baseou para utilizar em sua teoria. Trata-se de analisar as ações sob duas perspectivas:
categórica e hipotética. Para Kant, apenas o imperativo categórico tem valor moral, pois é
válido universalmente e independe de situações que a tornem moralmente aceitável. A ação,
nesse caso, deve ser feita não como um meio de se atingir um fim particular, ou um interesse
próprio, mas como um fim em si mesmo. Racionalmente, a ação é executada porque se tem
consciência de que é o correto a ser feito e que seu princípio é universal, sendo válido para
toda a humanidade. Podemos tratar a humanidade ou um indivíduo como um outro “eu”,
colocando-nos em seu lugar.
2
Em sua obra, o filósofo Immanuel Kant busca demonstrar que o homem deve ter um lugar de destaque na
natureza por ser dotado de uma capacidade racional que o diferencia dos demais membros, e que tem
fundamento na ideia da Liberdade, sendo esta última dada a conhecer pela própria Lei Moral (FERNANDES,
2007).
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por pressão externa (do outro e da sociedade) e que nos leva a agir por interesses próprios,
desejos ou inclinações pessoais, é chamado por Kant de heteronomia” (ARAÚJO, 1996, p.
106). Percebemos então que, se um sujeito acata regras por coação externa através do respeito
unilateral, com o propósito de preservar a relação de afeto com o outro ou por medo de
ameaças e sanções, suas ações não são, na verdade, morais, pois estaria obedecendo a tais
regras por motivações, com efeito, externas a ele.
As reflexões aqui expostas sobre moral e ética são tidas como uma relevante
ferramenta pedagógica e incentivadas pelos profissionais da Educação que elaboraram os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Esse documento também partilha da ideia de
distinção entre os termos moral e ética (BRASIL, 1997).
Este documento foi elaborado com a intenção de dar suporte aos educadores e
oferecer uma base para dirigir trabalhos nos níveis de ensino Infantil, Fundamental e Médio
sobre ética, um dos temas transversais trabalhados nos Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCNs) (BRASIL, 1997). Nesse material, professores e gestores encontram orientações
disponíveis, que contribuem para uma ação pedagógica embasada em reflexões sólidas sobre
a ética e a moral. O objetivo da moral é entendido como o de garantir a vida em sociedade.
Esse tema não é obrigatório ao currículo escolar, mas entendemos ser essencial
trabalhar questões sociais visando à formação integral do aluno e assim contribuindo para sua
participação cidadã na sociedade. É muito importante que as crianças tenham acesso, desde
cedo, ao conhecimento de que todos devem ter sua dignidade respeitada. “Os conteúdos
apresentados aqui estão referenciados no princípio da dignidade do ser humano, um dos
fundamentos da Constituição brasileira” (BRASIL, 1997, p. 69).
O material é bastante rico e oferece apoio aos professores, que o utilizam como fonte
para a pesquisa e discussão do tema. Sua linguagem é simples e engloba uma série de
informações contextualizadas e contemporâneas que norteiam o trabalho feito na escola,
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O conceito de ética, nesse documento, postula que: “A Ética diz respeito às reflexões
sobre as condutas humanas. A pergunta ética por excelência é: ‘Como agir perante os
outros?’ Verifica-se que tal pergunta é ampla, complexa e sua resposta implica tomadas de
posição valorativas” (BRASIL, 1997, p. 26).
Além de discussões com base em teorias sobre moral e ética, também encontramos,
nos PCNs, o incentivo ao uso do que reza a Constituição da República Federativa do Brasil,
promulgada em 1988, utilizando-a como fonte de pesquisa sobre cidadania, direitos e deveres
morais. Os trechos que discorrem sobre questões morais são mencionados com a intenção de
instruir os professores a fazerem uso também desse documento em sala de aula. Dessa
maneira, os alunos serão incentivados ao cumprimento de seus deveres, bem como à
observação de seus direitos, tomando como fundamento as determinações expressas na lei,
cujo objetivo maior é organizar a sociedade e sua conduta de maneira democrática. Exemplo
disso ocorre quando exigimos dos alunos que respeitem a todos, sem qualquer distinção de
origem, raça, sexo, cor, idade ou qualquer outra forma de discriminação; nesse caso, podemos
nos reportar ao Artigo 5º da Constituição Federal que resguarda essa exigência (BRASIL,
2007).
Certamente, há um peso maior para uma criança que tem a oportunidade de ter o
conhecimento de que existem regras que regem os atos das pessoas e o porquê dessa
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necessidade em comparação à criança que somente ouve de um adulto orientações sobre o que
não se deve fazer; por exemplo: não bater no colega mesmo que se tenha raiva dele no
momento, sem maiores explicações, sem a oportunidade de compreender o sentido dos
direitos e deveres para a convivência em sociedade.
Há uma carência na formação, tanto inicial quanto continuada, dos professores com
relação a estudos sobre questões morais, indisciplina e resolução de conflitos. Em geral, os
docentes reconhecem a necessidade de pesquisar sobre esses temas apenas quando se
encontram diante de situações conflituosas que os obrigam, apressadamente, a buscar o
conhecimento necessário para auxiliar na solução desses problemas. Ocorre que, com a
urgência do problema, de modo geral, professores acabam por recorrer ao senso comum.
Intervir em situações conflituosas e lidar com a indisciplina são questões que qualquer escola,
turma ou professor estão sujeitos e os educadores devem estar preparados para isso.
Concordamos que a formação moral guarda tamanha importância que deveria fazer parte do
currículo obrigatório dos cursos de formação pedagógica.
3
De gênese ou origem psicológica.
17
Para Jean Piaget, “[...] a moral diz respeito a um conjunto de regras e valores que têm
por função regular as relações entre as pessoas numa dada sociedade” (PEDRO-SILVA,
2010, p. 58). Da mesma maneira que a inteligência, a moral se desenvolve, sendo construída
pela ação do sujeito no meio. Piaget elaborou uma teoria sobre o desenvolvimento do juízo
moral da criança que se tornou referência para pesquisas e estudos sobre o tema. Constatou
que a moral se desenvolve em um percurso caracterizado por três fases: i) anomia, ii)
heteronomia e iii) autonomia (ARAÚJO, 1996).
Essas etapas são desenvolvidas a partir da interação com o mundo físico e social na
forma de experiências vividas pelo indivíduo que o fazem construir noções de respeito e
justiça. Nas relações em que as regras sociais são estabelecidas e nos ambientes onde a
criança interage com outros - como na família, comunidade, igreja e escola - essas noções vão
sendo construídas e aperfeiçoadas, até que o sujeito seja capaz de conceber as regras e agir de
acordo com elas, de tal modo que os outros sejam levados em consideração na decisão e
execução de uma ação moral.
4
PIAGET, J. O juízo moral na criança. São Paulo: Summus, 1994.
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suficientes que o possibilitem reconhecer qualquer regra. Não sabe o que é certo ou errado, o
que deve ou não ser feito. O sufixo “nomia” vem do grego “nomos” e significa regra. O
prefixo “a” se refere à negação ou ausência (LA TAILLE, 1992, 2003).
Nessa perspectiva:
Essa relação de que há obediência da criança ao adulto por coação ocorre devido ao
respeito unilateral. Apenas um dos lados, no caso o do adulto, detém as condições necessárias
e o domínio para a imposição das regras. A submissão das crianças é motivada pelo afeto que
se associa ao medo. O interesse da criança em obedecer, durante essa fase, está ou na ideia de
preservar a relação afetiva com o adulto, porque o admira, ou pelo medo das punições; na
verdade, por ambos, o que caracteriza uma moral de submissão.
A partir dos dois anos de idade, as crianças são introduzidas no mundo da moralidade
e passam, aos poucos, a reconhecer os valores, as regras, o que é certo e o que é errado. Nesse
estágio, as crianças apenas seguem as normas que lhes são impostas sem considerar seus
princípios, sem que haja uma maior reflexão das ações, assim como também não levam a
intencionalidade dos fatos em consideração. Deve-se cumprir o que é dito pelos pais ou
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adultos com quem a criança convive e nutre alguma relação afetiva por eles. Não há uma
necessidade de consciência ou reflexão: o certo é o cumprimento das regras (LA TAILLE,
1992, 2003).
A moral é guiada pela percepção, pelo concreto, e não pela intencionalidade da ação.
A responsabilidade pelos atos depende das consequências diretas observadas, dos resultados,
mas não da motivação das ações. Se questionarmos uma criança heterônoma sobre alguma
situação de culpa, esta será avaliada pelo resultado concreto da ação e não por sua intenção.
Um exemplo dado por La Taille (2003) é o de que uma criança heterônoma considera mais
culpada uma pessoa que quebrou dez copos sem a intenção, do que outra que tenha quebrado
somente um copo, porém com a clara intenção de quebrá-lo.
Durante a moral heterônoma, a criança passa a refletir sobre o sentido das regras e
proibições, passando a compreender, aos poucos, sua necessidade e dando importância à
noção de justiça. No estágio seguinte, da autonomia, o sujeito começa a estabelecer relações
de respeito mútuo em que entende o valor das regras para a convivência social, sendo capaz
de decidir suas ações levando em consideração os outros, a partir de suas relações
interpessoais. Nessa ocasião, a coação dá lugar à cooperação, quando não há mais
necessidade de uma obediência pelo medo e a relação de respeito é mútua.
Assim sendo:
O caminho que a moral percorre em direção à autonomia será mais estimulado quanto
mais situações de respeito mútuo e cooperação existirem nas relações. Esse processo de
desenvolvimento da moral ocorre gradualmente, sendo proporcional à socialização, seja em
relação às pessoas adultas, seja em relação a outras crianças. Aos poucos, as relações deixam
de se basear na obediência e passam a ser baseadas na reciprocidade e no sentimento de
respeito mútuo que dá origem a uma moral de cooperação.
20
Na moral da autonomia, o sujeito já sabe que existem regras, mas não depende mais de
uma pressão externa para a compreensão de suas razões e seu consequente cumprimento. A
fonte das regras reside agora nele próprio, pois já desenvolveu um ideal interno que o orienta
a agir de maneira autônoma de acordo com o bem comum. Por isso o prefixo “auto”
(ARAÚJO, 1996).
5
Na teoria piagetiana, o conceito de egocentrismo se refere à incapacidade cognitiva de se colocar no ponto de
vista do outro, o que ocorre no estágio denominado pré-operacional, entre dois a sete anos de idade (PIAGET,
2001).
21
regime ditatorial e autoritário6 para a formação das crianças e dos jovens. Com o passar dos
anos, essa disciplina foi extinta, porém nenhuma disciplina a substituiu a fim de orientar os
alunos sobre questões relativas à sociedade sob uma ótica moral. Para La Taille (LA
TAILLE; PEDRO-SILVA; JUSTO, 2010, p. 14), isso demonstra que a moral é um valor que
não está ocupando o lugar devido em muitas escolas. Na hierarquia de valores, estão
deixando-a em um lugar de inferioridade, como se essa questão não tivesse a grande
importância que, na verdade, apresenta, evidenciada através dos problemas de ordem moral
que surgem nas escolas e do grande interesse dos professores sobre essa temática.
A moral diz respeito às relações sociais e estas estão naturalmente presentes na escola.
Por causa disso, de uma maneira ou de outra, as questões morais são sempre discutidas e
trabalhadas na instituição. O que ocorre é que, nesses casos, o assunto é tratado em situações
pontuais, utilizando-se das regras. Isso restringe a discussão e o conhecimento do tema
apenas a conversas circunstanciais, que nem sempre são eficientes.
La Taille (Op. cit.) faz uma comparação bastante interessante sobre as regras e os
princípios. O autor promove uma reflexão sobre as limitações das regras e como estas podem
ser superadas pelos princípios. Explica que as regras apresentam duas limitações, quais
sejam: não existem regras suficientes para normatizar todas as situações pelas quais podemos
passar; e a regra nos diz o que fazer, mas não o porquê de fazê-lo. A regra é uma formulação
verbal, que nos diz precisamente, e sem ambiguidades, o que devemos ou não fazer. Os
princípios, porém, nos permitem formular nossas próprias regras, fundamentados em
orientações gerais que não nos dizem como agir, mas “com base em quê” devemos agir.
Uma vez que uma situação conflitante não for reprovada por nenhuma regra
preestabelecida, podemos fazer uso dos princípios para julgá-la. Para esclarecer, utilizaremos
exemplos. Exemplos de regras: “não matar”, “não furtar”, “não agredir fisicamente”. Aqui
estão claras atitudes que não devem ser tomadas. Mas, por maior que seja a quantidade
existente de regras, não poderemos conceber ou preestabelecer todas as situações que podem
surgir nas relações interpessoais. Por outro lado, temos exemplos de princípios como:
“respeitar uns aos outros”, “ser honestos com todos”, que não nos dizem com exatidão o que
fazer, mas nos dão condições para elaborarmos nossas regras de acordo com a moral e a ética.
6
Golpe militar ocorrido no Brasil em abril de 1964. Os militares destituíram o presidente João Goulart e
ocuparam o poder, erguendo no país um poderoso sistema de repressão e controle (COUTO, 2003).
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Esse tipo de construção leva ao pleno desenvolvimento da moral da autonomia, pois incentiva
a elaboração interna de normas com vistas à qualidade das relações sociais.
Para La Taille, (Op. cit, p.14) “[...] o poder de convencimento da moral está nos
princípios e não nas regras”. A escola pode escolher seus próprios princípios, como justiça,
respeito, igualdade, dignidade e apresentá-los aos alunos, esclarecendo a importância que têm
para o convívio em grupo. Com base nesses valores, todos devem administrar suas decisões e
atitudes. Quando um dos princípios for ferido por um aluno, uma intervenção deve ser feita e,
posteriormente, pode haver uma conversa, debate ou reunião que decida pela necessidade de
criação de uma regra que contribua para a garantia de determinado princípio. Realizar um
trabalho como esse é contribuir para a autonomia moral dos estudantes.
Diante do exposto, podemos concluir que a moral e a ética são aprendidas. São
compreensões que vão sendo construídas e que são de responsabilidade da sociedade e de
suas instituições, e não somente da escola. Contudo, duas instituições sociais sobressaem
nesse sentido: a família e a escola.
Para garantir a harmonia nas relações humanas é necessário que a moral e a ética
estejam presentes, pois estas regulam o comportamento orientado para o bem comum, para a
qualidade das interações sociais. A construção do juízo moral é também a conscientização
dessa importância. O respeito às regras é essencial para a convivência em sociedade. No
contexto escolar, os professores devem estar cientes de qual etapa da construção da moral
seus alunos se encontram e, a partir dessa observação, contribuir e mediar as situações que
ocorrem no interior da escola, com vistas ao avanço e progresso moral dos educandos.
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Concordamos com autores como Charlot (2002) e La Taille (2001), que diferenciam
os termos indisciplina e violência, além de nos apresentarem outro, denominado incivilidade;
os conceitos são caracterizados de maneira clara e coerente. O objetivo deste capítulo será
explorar essas concepções e oferecer esclarecimentos sobre os diferentes tipos de conflitos
aos quais a escola está sujeita.
Uma sala de aula é composta por indivíduos diferentes que se relacionam em certo
nível de convivência. As relações interpessoais passam, com frequência, por momentos de
tensão ou desarmonia. O sociólogo Durkheim (1858-1917)7 esclarece que atitudes que não
tomaríamos em particular são facilmente tomadas em grupo, devido à coerção externa que
ocorre quando estamos reunidos. Em todas as relações sociais, estamos sujeitos a esse poder
de coerção externa, ainda que de maneira inconsciente. Assim sendo, com frequência,
acreditamos ter desenvolvido alguma atitude que, na verdade, foi-nos imposta exteriormente.
7
DURKHEIM, E. As regras do método sociológico. São Paulo: Martin Claret, 2001.
25
Amos e Orem (1968, p. 30) definem a disciplina como um “[...] processo que procura
conseguir o domínio que cada um deve ter de si próprio e do ambiente circundante”. A
liberdade individual é assim demarcada, visto que não podemos ultrapassar certos limites que
são, com efeito, uma proteção para nós próprios. O autor advoga a importância do aluno
pensar sobre a autodisciplina, estimulando-o a se desenvolver moralmente. A pessoa
disciplinada é aquela que tem domínio de si própria e do meio circundante. Ao invés de estar
sempre sendo cobrada, ainda que acate as ordens, sua meta é alcançar um nível moral de
autonomia ou autodisciplina, em que o ideal interno ofereça condições para que o bem
comum seja privilegiado sobre seus interesses individuais.
o ambiente conflituoso e talvez caótico se o professor não souber lidar com a situação de
maneira equilibrada.
Camacho (2001, p. 128 apud ZECHI, 2008, p. 17), não concebe a dissociação entre a
violência e a indisciplina. “A violência se confunde, se interpenetra, se interrelaciona com a
agressão de modo geral e/ou com a indisciplina”.
Para esses autores, a violência é um ato de desrespeito, que pode ser gerado em
situações opressoras em que o outro se sente obrigado a agir de forma submissa à condição
que lhe foi imposta coercitivamente. Esse tipo de situação ultrapassa o limite das relações e
prejudica a convivência social e/ou interpessoal drasticamente (LA TAILLE; PEDRO-
SILVA; JUSTO, 2010; ZECHI, 2008).
Podemos, inclusive, destacar esse fato como um dos motivos que impedem que haja
uma fórmula ou receita para aniquilar o problema da indisciplina e da violência na escola.
Cada grupo é formado por sujeitos com seu modo próprio de pensar, que receberam uma
criação familiar particular, que vivenciaram experiências diferentes, ou seja, que detêm suas
particularidades. Estes formam uma comunidade heterogênea, que deve ser analisada e
investigada, considerando suas singularidades, se quisermos realizar um trabalho de formação
moral com o objetivo de amenizar as ocorrências indisciplinares ou violentas.
Na concepção de Chauí (1998, p. 33-34 apud ZECHI, 2008, p.18), a violência é assim
delimitada:
Violência vem do latim vis, força, e significa: 1. tudo o que abrange a força
para ir contra a natureza de algum ser; [...], violência é um ato de
brutalidade, sevícia e abuso físico e/ou psíquico contra alguém e caracteriza
relações intersubjetivas e sociais definidas pela opressão, intimidação, pelo
medo e pelo terror.
Charlot (2002, p. 28) apresenta a seguinte classificação sobre três diferentes níveis de
violência escolar:
Vemos que, para o autor, a violência está caracterizada pela presença de força, do
poder e da dominação. Já as incivilidades estão relacionadas a uma violência verbal, que gera
discussões que acabam por prejudicar a harmonia do grupo e o equilíbrio nas relações, mas
que podem ser classificadas como um tipo de violência mais leve, uma microviolência.
O conceito de incivilidade surgiu a partir das ideias do sociólogo alemão Nobert Elias
(1897–1990), que estudou o processo civilizatório e a violência escolar na França. De modo
geral, refere-se a atos indisciplinares que ocorrem no contexto escolar, de maneira que não se
confundam com atos criminosos ou delinquentes, ou a categorias de violência regidas pelo
código penal. São pequenas violências ou pequenas agressões que se repetem cotidianamente,
como a falta de civilidade, desrespeito ao outro, violações dos códigos de boas maneiras,
desordem, perturbação, falta de cooperação para a boa convivência do grupo, falta da ética de
reciprocidade. São entendidos como formas leves de violência e, dependendo da intensidade
e constância, podem transformar a instituição escolar num ambiente caótico. Costuma causar
um forte desgaste emocional nos professores que se veem diante dessa situação, muitas
vezes, fora de seu controle (ZECHI, 2008).
Com frequência, os atos de incivilidade não são mediados, sendo mesmo ignorados,
porque, em sua maioria, ocorrem entre os pares (pessoa de mesma idade), passando uma ideia
errônea de que respeito só se deve oferecer a algumas pessoas, com alguma autoridade ou
poder: no âmbito da escola, seriam os professores, gestores e funcionários em geral. A
indisciplina, nesse caso, surge quando as incivilidades afetam diretamente o conteúdo
estudado.
Convém assinalar que os fatores que são analisados, para as definições de indisciplina
e violência são bastante diversificados, dependentes da relação e do contexto em que
29
Para a professora, pesquisadora e autora Izabel Galvão (2004), baseada nas ideias
Wallon (1879-1962)8, o conflito é inerente ao ser humano e necessário à vida psíquica. Ela
defende o papel dos conflitos na construção das relações com o meio social, porém esclarece
que este termo não deve ser confundido com violência. “Embora comumente encarado como
negativo e destruidor, o conflito é necessário à vida psíquica, como à dinâmica social”
(GALVÃO, 2004, p. 15).
Os conflitos são, na verdade, situações de oposição, que podem ser expressas por
diferentes condutas. Ocorrem de forma natural, cotidiana e inevitável nas relações
interpessoais. Mas o que deve ser ressaltado é a maneira como as condutas de oposição são
expressas. Estas devem se submeter a certos limites que a cerceiam; esses limites são as
regras e os princípios, que regulam a vida em sociedade. Um exemplo simples disso seria
quando deixamos claro pra uma criança que ela tem o direito de se opor e até de sentir raiva
de alguém, contudo lhe é proibido agredir (física, verbal ou moralmente) o sujeito alvo dessa
raiva, pois essa atitude fere a regra de violação da integridade física ou psíquica do sujeito
(CHARLOT, 2002; GALVÃO, 2004; LA TAILLE, 2001).
É válido esclarecer que os conflitos são naturais e inerentes ao ser humano no âmbito
das relações sociais e interpessoais. Podemos, inclusive, dizer que são necessários para o
8
Henri Wallon (1879-1962) foi médico, psicólogo e político, marxista convicto. Desenvolveu uma teoria
psicogenética que aborda a pessoa completa, em seus aspectos motores, afetivos e cognitivos. Acreditava que o
homem constrói sua identidade a partir das relações sociais em um movimento variável, conflituoso e
caracterizado por transformação mútua.
30
O convívio em grupo nos exige uma capacidade para lidar com objeções, obstáculos,
oposições e situações inesperadas em que devemos estar preparados para expressar nossa
opinião e decisão de maneira ética, respeitando o outro e as regras que nos são impostas. Essa
capacidade é inicialmente construída na infância, quando surgem os primeiros sinais de
oposição, porém tais situações são vivenciadas por toda a vida.
Vemos, na escola, um espaço apropriado para que a criança seja capaz de desenvolver
essa capacidade, com a finalidade de tornar-se um sujeito autônomo, capaz de resolver seus
próprios conflitos de maneira equilibrada dentro da moralidade estabelecida socialmente.
Assim:
Geralmente, as pessoas que têm essa habilidade para resolver conflitos são muito bem
vistas pela sociedade. Na escola, costuma-se destacar como bom profissional o professor que
tem o chamado “domínio da sala”, sabendo mediar os conflitos que surgem com seus alunos
de maneira idônea, conduzindo sua turma à disciplina (AMOS; OREM, 1968).
La Taille (2001, p. 96) nos apresenta uma pesquisa empírica feita com crianças de 6, 9
e 12 anos de idade que mostra, através dos dados coletados, que a falta de polidez, que é
associada à incivilidade, é vista pelas três faixas etárias como uma conduta de certa
gravidade. Define a polidez como “[...] formas de falar e/ou de agir convencionais, nas
relações sociais, como, por exemplo, falar ‘bom-dia’, ‘desculpe’, ‘obrigado’, sentar-se de
determinadas formas, etc.”. Destaca, ainda, que a polidez não é universal e depende da
cultura e dos costumes do grupo. Exemplo disso seriam os “palavrões”, que são muito mais
admitidos hoje do que décadas atrás, quando sua expressão em público era considerada
claramente como sinal de má educação.
Diante dos dados obtidos pelo autor a respeito das concepções das crianças sobre a
polidez, vê-se a necessidade de uma maior atenção psicológica e educacional para o tema da
civilidade no desenvolvimento moral da criança.
La Taille (2001, p. 96) acredita que a polidez se relaciona à moral no sentido de que
esta é uma demonstração de um mínimo respeito moral pelo outro. Acrescenta que o oposto,
ou seja, a falta de cortesia, o desprezo, a indiferença e o desrespeito são costumeiramente
entendidos como falta de uma boa educação. Associa, ainda, polidez à civilidade e sua
ausência à incivilidade (que é uma forma de violência).
32
Sob a perspectiva construtivista temos que, se a criança for educada nesse enfoque, se
a civilidade integrar o universo moral das crianças heterônomas, implicará, em parte, no
desenvolvimento da autonomia, visto que a superação da heteronomia pela autonomia “[...]
dependerá, inevitavelmente, de abstrações reflexivas e empíricas realizadas sobre as regras de
boa educação (e sobre as demais) e seus efeitos no meio social“ (LA TAILLE, 2001, p. 101).
Dentre os conflitos e oposições que ocorrem na escola, podemos dizer que a violência
recebe destaque quando se trata de quantidade de pesquisas realizadas em busca da
compreensão de sua origem e impacto social. E a instituição escolar tem se tornado,
ultimamente, um palco onde estas manifestações acontecem.
9
FREUD, S. Além do princípio do prazer (1925). Rio de Janeiro: Imago, 1998.
33
Justo (2010) aponta que a pulsão de morte - bem como a agressividade e o ódio - ao
contrário do que possa parecer, não é necessariamente negativa. Argumenta que a pulsão de
morte garante nossa defesa contra situações adversas e ameaças e, sem ela, viveríamos à
mercê do destino e de fatalidades, sobrevivendo passivamente. Através do ímpeto para
destruir, somos também capazes de nos defender ou agir de forma transformadora. O autor
defende essas forças, de direções opostas, que são a base do nosso aparelho psíquico, como
interdependentes e fundamentais, pois fazem parte da dialética da existência humana. Com
isso, demonstra-se que a intenção não é a de acabar com a agressividade ou o ódio
(expressões de violência), mas é a de se pensar em alternativas que conduzam os sujeitos a
aliarem esses sentimentos a seus projetos de vida, objetivando um mundo melhor.
As estratégias para intervenção devem ser pensadas de acordo com a dimensão que a
problemática exige. Para isso, as situações devem ser identificadas e analisadas, como vimos
anteriormente, na forma de conflito, indisciplina, incivilidade ou violência10. Por exemplo,
uma determinada escola pode ter como barreira, para as relações pessoais com a turma e a
condição necessária à aprendizagem dos alunos, situações de incivilidade como: falta de
ordem, confusão, bagunça, agitação e uso de palavrões. Nesse cenário, o professor é
10
Esses conceitos foram definidos e discutidos no capítulo 2.
35
Uma vez esclarecido o fato de que a extensão desse problema não é a mesma em todas
as escolas, pretendemos contemplar, nesse capítulo, estratégias que possam contribuir para o
trabalho de professores que enfrentam situações que variam da indisciplina à violência escolar
(GALVÃO, 2004; LA TAILLE, 1999; NOVAIS, 2004; OLIVEIRA, 2005).
Esse poder deve ser exercido pelo professor de maneira respeitosa e consciente, com a
finalidade de garantir as condições básicas de organização do ambiente e das relações
humanas presentes visando a um espaço apropriado para aprendizagem e desenvolvimento. A
autoridade é necessária para um desenvolvimento psicológico saudável da criança e do
adolescente. Nesse sentido, “[...] a autoridade é uma garantia da estabilidade do mundo que os
cerca, já que essa mantém um ambiente que tranquiliza a criança (ou o adolescente) e garante
o objetivo da ação pedagógica” (FURTER, 1979, p. 17, apud NOVAIS, 2004, p.18).
36
Para Davis e Luna (1991, apud OLIVEIRA, 2005, p. 78) dois tipos de autoridade são
reconhecidos: a autoridade autoritária que é “[...] entendida como ‘aquela que serve do poder
e da astúcia de que dispõe, para subordinar os outros a seus fins particulares’. E a autoridade
liberal, que “faz uso do poder e da habilidade que possui, ligando sua sorte à dos mesmos e
perseguindo um fim comum”.
Richard Sennett apresenta a noção de autoridade “[...] como um laço afetivo e social,
como uma expressão emocional do poder, um vínculo entre pessoas desiguais, como ‘uma
tentativa de interpretar as condições de poder, de dar sentido às condições de controle e
influência, definindo uma imagem de força’” (SENNETT, 2001, p. 33). A relação que o
professor constrói com seus alunos e sua postura para com eles são passos fundamentais para
que esse laço afetivo e social seja formado a fim de que, assim, as crianças passem a respeitá-
lo como a autoridade presente em sala de aula. Além disso, os próprios pais e responsáveis
das crianças têm grande participação na relação professor-aluno, pois são estes que permitem
que o professor exerça a autoridade sobre seus filhos.
a autoridade que lhe cabe ante a indisciplina, seja no desrespeito pela autoridade” (SIMON,
2009, p. 4659).
Diante do exposto, pode-se concluir que a autoridade pode ser exercida de duas
maneiras distintas: pelo domínio ou poder institucionalizado ou pelo prestígio e admiração da
competência daquele que a exerce. Nenhuma das duas formas inibe o surgimento de conflitos
na relação professor-aluno. No entanto, no autoritarismo, ocorre um grande desgaste em
ambas as partes “[...] por se traduzir em uma disputa de poder constante entre educador e
educando” (OLIVEIRA, 2005, p. 79).
Essa discussão sobre a autoridade exercida pelo professor nos remete ao processo de
formação do juízo moral infantil, especialmente na primeira manifestação da moralidade, que
é a heteronomia, conforme explicado no primeiro capítulo desse trabalho. Como vimos, essa
fase é caracterizada pelo início da consciência de que existem regras, o certo e o errado, o que
deve ou não ser feito; mas quem impõe essas limitações são os outros (os adultos próximos –
pais, professores), pois é um período da infância (2 a 7 anos de idade) em que a criança ainda
não tem a condição psíquica de decidir sozinha o que deve ou não ser feito de maneira
correta, recíproca e coerente.
inicialmente no meio escolar e, posteriormente, em outros espaços sociais que a criança venha
a participar.
As punições não precisam ser abolidas, até porque toda atitude traz consigo
consequências, por vezes consequências prejudiciais ao próprio sujeito e a outras pessoas. Em
entrevista à revista Nova Escola11, Yves de La Taille (2008) mostra a possibilidade do
professor perder o posto de autoridade ao lançar para o grupo a responsabilidade pelas
sanções que o acordo combinado pode gerar. Ressalta a atenção que se deve ter para que a
criança não substitua a figura do adulto. Ela precisa dessa referência de autoridade, de
proteção, de confiança. É um processo em que a turma vai tomando consciência e refletindo
sobre estas questões morais e, gradativamente, o grupo passa a assumir essa referência.
A abordagem educacional que afirma que a disciplina ocorrerá num ambiente escolar
democrático, um ambiente propício à construção da autonomia das crianças, não entende que
as sanções e a intervenção do adulto devam ser anuladas; acredita que a criança se submete às
regras mais facilmente, porque contribui com o processo de formulação e reformulação das
regras e sanções. Assim sendo, a indisciplina é vista como um “[...] acto de rebelião contra a
regra de vida colectiva e contra o grupo” (ESTRELA, 1992, p. 23).
11
POLATO, A. Entrevista a Yves de La Taille: Nossos alunos precisam de princípios, e não só de regras. Nova
Escola, São Paulo, edição 213, 2008. Disponível em: < http://revistaescola.abril.com.br/formacao/fala-mestre-
yves-la-taille-466838.shtml>. Acesso em: 28 out. 2014.
40
Esse tópico tem o objetivo de orientar educadores em pontos que podem contribuir
para melhor lidar com a indisciplina na sala de aula e na escola. São sugestões mais práticas
que, algumas vezes, podem estar sendo esquecidas ou passando despercebidas pelo professor,
mas que fazem muita diferença no desenvolvimento da autonomia moral dos estudantes. Estas
propostas não são a garantia do fim da indisciplina, mas podem colaborar bastante ao levar o
professor à reflexão da sua prática pedagógica nesse sentido.
Esclareça, no início do ano, sobre o que se pretende conseguir nas aulas. Nesse
ponto, os autores ressaltam a importância de, logo no início do período letivo, esclarecer aos
alunos os objetivos das aulas, o que se espera do comportamento da turma, a maneira de
tratamento entre os alunos e entre os alunos e o professor. Transmita todas essas direções logo
nos primeiros dias, com convicção e de maneira segura. “A ordem do primeiro dia vale pela
do ano todo” (AMOS; OREM, 1968, p. 69)
Elaborar o plano e manter-se dentro do que foi traçado. O professor não deve perder
a noção do que vai fazer e não deve deixar que seus alunos fiquem ociosos. Convém procurar
atrair o interesse dos alunos para as atividades pedagógicas, o que constitui uma ótima
41
Ter sempre uma atitude coerente ante os alunos. De modo geral, os alunos estão
sempre atentos para captar e tirar vantagem de qualquer fraqueza ou ingenuidade que o
professor possa demonstrar. Qualquer comportamento de desrespeito ao professor, nesse
sentido, não deve passar despercebido; antes, deve ser tratado imediatamente, com punições
coerentes à gravidade do fato ocorrido. Deve-se dialogar e ouvir de maneira calma – pois os
alunos testam a paciência do professor – a fim de que, pelo exemplo, a turma veja que
situações como essas não serão admitidas na escola. Vale lembrar que o respeito deve dirigir-
se aos colegas também. Citamos o professor, pelo contexto das instruções que estão sendo
dadas. Os estudantes “[...] costumam observar até que ponto exige as coisas à risca” (Op. cit.,
p. 94).
Pedro-Silva (2010), cujas reflexões são mais atuais, sugere treze pontos com o
objetivo de equacionar o problema da indisciplina na escola. Destacamos dois pontos mais
práticos, os quais julgamos mais comumente percebidos nas escolas e mais relevantes no
contexto desse trabalho.
Pedro-Silva (2010) observa que acusar os pais não contribui em nada para resolver o
problema, além de ser uma atitude de natureza perversa contra as famílias, que já sofrem todo
tipo de acusação pelas adversidades sociais que vivenciam, como a violência e a pobreza.
Utiliza, como exemplo, as reuniões de pais e mestres, em que os pais, frequentemente, só
escutam reclamações de seus filhos e, ao tentarem pôr em prática as orientações dos
professores, acabam desistindo de participar das reuniões.
O segundo ponto seria substituir o uso de punições expiatórias pelas sanções por
reciprocidade. O autor afirma que esse passo é fundamental para a diminuição da
indisciplina: a utilização de punições por reciprocidade no lugar das expiatórias. Ou seja, a
punição deve ser conforme a proporção da atitude indisciplinar cometida. O exemplo utilizado
foi o de um aluno que recebe como punição, por ter “bagunçado” durante a aula, a retirada de
ponto de sua nota conseguida com esforço nas avaliações. Nesse caso, a punição recebida não
é proporcional à conduta que o aluno teve. Esse tipo de punição apresenta um grande valor
coercitivo e não contribui para o desenvolvimento cognitivo, afetivo e, sobretudo, moral do
aluno. “Qualquer uma destas punições – sejam as expiatórias ou as por reciprocidade –
provocam sofrimento. Todavia só as últimas – por reciprocidade – levam ao desenvolvimento
intelectual, afetivo e moral daqueles que estão submetidos a elas” (PEDRO-SILVA, 2010, p.
74).
Ressaltamos que:
Dessa maneira, ele estará procurando fazer com que seu aluno se sinta respeitado, com
que ele exista como um ser civilizado, pois, ao respeitar o aluno, contribui-se para que ele
“[...] internalize regras e valores, de tal sorte que possa transformar-se num ser capaz de viver
na companhia dos outros, resolvendo e administrando seus conflitos por meio de regras
construídas coletivamente” (Op. cit., p.91).
O professor pode e deve colaborar para a formação moral dos seus alunos,
contribuindo assim para a transformação de uma sociedade mais ética, com valores como:
respeito, justiça, diálogo, generosidade. “Pensamos que o mundo e, especialmente a
instituição escolar, está precisando cultivar tais valores” (PEDRO-SILVA, 2010, p. 93).
44
A intervenção do professor em sala de aula pode sair dos limites da escola e atingir a
sociedade, uma vez que o trabalho pedagógico voltado para a formação moral das crianças
resultará em sujeitos conscientes de seu papel no exercício da cidadania. A indisciplina se
torna assim uma oportunidade de formação ética dos alunos (AMOS; OREM, 1968; LA
TAILLE, 1999; PEDRO-SILVA, 2010).
45
CONCLUSÃO
As situações indisciplinares que ocorrem na escola podem surgir por vários fatores,
internos e/ou externos à instituição de ensino. A interação da criança e do adolescente com
diversos ambientes sociais, com seus pares e com adultos, apresentará valores, princípios e
regras morais que colaborarão para a formação de sua própria moral. Há diferenças
expressivas, contudo, relacionadas aos conceitos de indisciplina, violência, incivilidade e
conflito. Nas ocorrências cotidianas da escola, a atuação do professor contra a indisciplina
escolar deve ser em conformidade com a proporção ou gravidade da conduta.
REFERÊNCIAS
GALVÃO, I. Cenas do cotidiano escolar: conflito sim, violência não. Petrópolis, RJ: Vozes,
2004.
LA TAILLE, Y. de. Jean Piaget. Coleção Grandes Educadores. Direção: Régis Horta. São
Paulo: Paulus, 2003. 1 DVD.
NOVAIS, E. L. É possível ter autoridade em sala de aula sem ser autoritário? Linguagem e
Ensino, v. 7, n. 1, p. 15-51, 2004.
______. O juízo moral na criança. São Paulo: Summus, 1932/1994. In: PEDRO-SILVA, N.
Ética, (In)disciplina e a relação professor-aluno. In: LA TAILLE, Y. de; PEDRO-SILVA, N;
JUSTO, J. S. Indisciplina/disciplina: ética, moral e ação do professor. Porto Alegre:
Mediação, 2010, p. 55 - 93.