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Rio de Janeiro
2021
C2021 ESG
CDD – 341.733
Ao nosso senhor e salvador Jesus Cristo, por ter me dado forças para superar todo e
qualquer desafio.
À minha querida mãe Maria Teresa, pelo amor e apoio. Ao meu querido pai Luiz
Guilherme, pelo exemplo de patriotismo e pela ajuda inestimável na elaboração desta
monografia.
Às minhas irmãs Daniela e Débora, por acreditarem em mim.
À minha amada esposa Fernanda, e a nossas lindas filhas, Letícia e Luísa, pelo amor
incondicional e paciência.
Ao meu orientador, Coronel Ricardo Fayal, pelas orientações e tratamento cordial
sempre dispensado que viabilizaram esta monografia.
Aos meus queridos amigos galácticos da turma “Superação Nacional”, que
abrilhantaram o Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia da Escola Superior de Guerra,
do ano de 2021.
Nenhum homem livre pode ser privado do uso
de armas. (Thomas Jefferson)
RESUMO: A presente monografia teve por objetivo avaliar a política de controle de armas
no Brasil e sua relação com a segurança pública e a legítima defesa. A questão central é saber
se desarmamento civil é uma medida eficaz para assegurar ao indivíduo seu direito
fundamental à segurança. Tendo essa premissa, o estudo desenvolveu-se a partir de
análises de dados estatísticos e comparações, com foco na legislação adotada durante a
história do Brasil e em relação a outros países, em especial os Estados Unidos da América, o
Reino Unido e a Suíça, quanto aos resultados práticos que tais políticas produziram. Foi
levantado que, na formação do Estado, os indivíduos renunciaram a certos direitos
individuais, sem que isso importasse na renúncia ao direito de preservar a própria vida. O uso
da pesquisa bibliográfica foi relevante para o esclarecimento de questões relacionadas à
correta interpretação dos atos normativos apresentados, com suporte na doutrina, assim como
para a explicação dos dados estatísticos obtidos. A legítima defesa do indivíduo é, antes de
tudo, um direito natural, que deve ser reconhecido pelo Estado. Retirar o acesso a armas
legalizadas da população não se mostrou eficaz no combate à criminalidade. O reforço ao
Estado de Direito, com a certeza da aplicação da lei penal contra o agente do crime, é o ponto
central para reduzir os níveis de homicídios. Mais armas legalizadas não significam mais
crimes.
Sumário
1 INTRODUÇÃO.........................................................................................................9
2 HISTÓRICO DO CONTROLE DE ARMAMENTO................................................11
2.1 A EXPERIÊNCIA NO BRASIL...........................................................................................................11
2.1.1 BRASIL COLÔNIA....................................................................................................................................... 11
2.1.2 BRASIL IMPÉRIO........................................................................................................................................ 14
2.1.3 BRASIL REPÚBLICA................................................................................................................................... 16
2.2 A EXPERIÊNCIA DE OUTROS PAÍSES............................................................................................22
2.2.1 ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA........................................................................................................... 22
2.2.2 REINO UNIDO............................................................................................................................................. 26
2.2.3 SUÍÇA............................................................................................................................................................ 27
3 A SEGURANÇA PÚBLICA E A LIBERDADE INDIVIDUAL................................28
4 A LEGÍTIMA DEFESA E O DIREITO NATURAL.................................................37
5 POLÍTICAS PÚBLICAS........................................................................................48
5.1 RESULTADOS DO CONTROLE DE ARMAMENTO – MAIS ARMAS SIGNIFICAM MAIS CRIMES?
48
5.2 RESULTADOS DO CONTROLE DE ARMAMENTO – MAIS ARMAS SIGNIFICAM MAIS
ACIDENTES DOMÉSTICOS?..............................................................................................62
6 CONCLUSÕES......................................................................................................69
7 REFERÊNCIAS.....................................................................................................72
9
1 INTRODUÇÃO
O artigo 7º, 1, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José
da Costa Rica), de 1969, aplicável no Brasil por força do Decreto Presidencial n. 678, de 6 de
novembro de 1992, reconhece que a liberdade está associada à segurança pessoal dos
indivíduos, e que tais direitos decorrem da condição própria do ser humano, nos seguintes
termos:
A Constituição do Brasil, por sua vez, prevê o tratamento igual de todos perante a lei,
a inviolabilidade do direito à vida e à segurança (art. 5º, caput), sendo a segurança pública um
dever do Estado que deve ser exercido para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio (art. 144, caput).
1
TÍTULO LXXX
Das armas , que são defesas, e quando se devem perder
Defendemos que pessoa alguma, não traga em qualquer parte de nossos Reinos, pêla
de chumbo, nem de ferro, nem de pedra feitiça; e sendo achado com ella, seja preso,
estê na Cadêa hum mez, e pague quatro mil réis, e mais seja açoutado publicamente
com braço, e pregão pela Cidade, Villa, ou Lugar onde fòr achado.
E sendo pessoa de qualidade, em que não caiba açoutes, além das sobreditas penas,
será degradado para a Africa por dous anos.
Nem outrosi, possa trazer armas ofensivas, nem defensivas, de dia, nem de noite,
salvo de fôr spada, punhal, ou adaga, como abaixo diremos: sob pena de perder as
ditas armas, e pagar duzentos réis de pena da Cadêa, se fôr peão; porque sendo
Scudeiro, e dahi para cima, ou Mestre de Náo, ou de semelhante, ou maior condição,
ser-lhe-há coutada a arma, e pagará a dita pena sem ir à prisão. (ALMEIDA, 1870,
p. 1226)
1
[...] Durante o seu reinado, D. João III estabeleceu algumas regras relativas à
utilização da espada de maça (aquela cuja folha possuía cinco quartos), ficando
determinado que nenhuma pessoa, independentemente de seu estado, poderia portar
espada com mais de cinco palmos de vara, incluindo o punho e a maça. Já em 1565,
D. Sebastião mandou passar uma provisão na qual determinou que os cinco palmos
de comprimento não deveriam incluir o punho e a maça [...]. (SALES; ZANGELMI,
2010)
“CAPITULO XIV.
Para evitar os homicidios. ferimentos e brigas ; a que dá occasião o trazerem espada ,
ou espadim pessoas de baixa condição , ordeno que não possão trazer estas armas
apprendizes de officios mechanicos , lacaios , mochilas (I)
, marinheiros , barqueiros e grafateiros , negros e outras pessoas de igual ou inferior
condição , sob pena de perdimento da espada ou espadim , de dez mil reis , e de
prisão por tempo de dous mezes pela primeira transgressão ; e pela segunda pagarão
dobrado , e terão um anno de prisão (2).
As mesmas penas ficará sujeita toda a pessoa, que trouxer espada, ou
espadim , não sendo á cinta. Ainda que sejão Soldados.” (sic) (FREITAS; FRANÇA,
1819a, p. 540)
[...] está ligado aos setores da nobreza, grupo tradicionalmente conhecido como
aquele dedicado à defesa do Reino, atividade esta que obviamente estaria
relacionada a uma maior possibilidade de acesso às armas. (SALES; ZANGELMI,
2010, p. 5)
Essa legislação régia estabeleceu não só o local específico em que poderia ser
adquirido o armamento, mas também aqueles que poderiam adquirir. A distinção entre as
classes sociais entre aqueles que podiam ou não portar armas era evidente.
Mesmo assim, conforme registra Liana Reis, em 5 de fevereiro de 1722, foi editada
nova ordem régia, remetendo a uma de 1719, que manteve a determinação de restrição ao
acesso de armas de qualquer tipo só que, desta vez, ampliou a proibição a qualquer pessoa,
fosse ela negro, mulato, branco, pobre, senhor, escravo ou alforriado, conforme excerto assim
lançado:
“[...] que nenhuma pessoa de qualquer Estado, qualidade o condição que seja possa
trazer consigo faca, adaga, punhão, suvetão, ou estoque ainda que seja de marca,
thezoura grande, nem outra qualquer Arma, ou Instrumento se com a ponta se puder
fazer ferida penetrante, nem trazer pistolas, ou armas de fogo mais curtas de que a
Ley permite.” (sic) (apud REIS, 2004, p. 191)
1
É possível extrair desse primeiro registro histórico que o acesso ao armamento foi
considerando um privilégio concedido pela autoridade real, mediante uma disciplina restritiva
de porte e uso de armas pela sociedade.
Na época do império foi editado o Código Criminal de 1830, que previa o crime de
usar armas de fogo ofensivas, que fossem proibidas, com a pena de prisão de quinze a
sessenta dias e multa. A definição das armas proibidas competia às câmaras municipais, com a
expressa atribuição de competência à autoridade pública, no caso o juiz de paz, para deferir a
licença para o porte, conforme a redação dos artigos 297, 298 e 299, assim lançados na sua
redação original:
Na regência de Diogo Antônio Feijó, em 1831, teve início a dissolução das milícias
com a formação de uma Guarda Nacional, que, conforme Costa Junior, se configurava em
uma força não profissional, com a missão de auxiliar o Exército quando fosse requisitado pelo
governo (COSTA JUNIOR, 2015, p. 10)
À Guarda Nacional cabiam também atividades de caráter policial, em especial “a
realização de rondas nas localidades para evitar agrupamentos ilegais, evitar conflitos e
auxiliar os juízes de paz nas diligências da justiça, praticamente as mesmas atividades
desempenhadas pelas milícias coloniais” (idem).
Bene Barbosa e Flávio Quintela apontam que, ciente de que as milícias
representavam o poder bélico nas mãos da população, o regente Feijó buscou transferir esse
poder ao Estado, para monopolizar o uso da força letal pela Guarda Nacional (QUINTELA;
BARBOSA, 2015, p. 31).
Com a criação da Guarda Nacional pela Lei de 18 de agosto de 1831, estabeleceu-se
que as armas utilizadas pelos integrantes da corporação seriam custeadas pelos cofres da
Nação, cabendo a cada guarda nacional conservar e manter o armamento, conforme o art. 66
da referida lei, nos seguintes termos
Art 66. As armas de guerra das Guardas Nacionaes, serão fornecidas a custa da
nação: e o recebimento das que forem entregues aos Guardas Nacionaes, constará de
registros por elles assignados, os quaes se farão pela maneira , que for prescripta
pelo Governo.
Os Guardas Nacionaes serão responsaveis pelas armas que houverem recebido, as
quaes serão sempre de prioridade da nação.
A conservação das armas e concertos, ficarão a cargo dos Guardas Nacionaes. As
armas serão marcadas e numeradas. (sic) (BRASIL, 1831)
de 100$000 réis anuais por bem de raiz, indústria, comércio ou emprego, e para as quatro
maiores cidades do império, a renda anual deveria ser de 200$000 réis (SILVA, 2010, p. 3).
A questão racial perdeu importância para o ingresso na Guarda, bastando a
comprovação da renda pelo cidadão, independentemente de ser branco, negro ou índio,
passando a distinção entre os cidadãos a se basear na renda.
Wellington Barbosa Silva registra que as elites preferiram, em lugar de um Exército
profissional forte e numeroso, criar a Guarda Nacional composta
[...] unicamente por cidadãos industriosos que se armavam com o intuito de defender
a sua própria liberdade, eram mais apropriadas para a manutenção da ordem interna
– cabendo ao Exército apenas a função de combater os inimigos externos. (SILVA,
2010, p. 4)
Registro que o artigo 145 da Constituição Imperial de 1824 atribuía o dever aos
brasileiros de pegar em armas para sustentar a independência, a integridade e a defesa do
Império contra os inimigos externos ou internos (BRASIL, 1824).
Fora dessa situação, contudo, continuava a vedação a que negros e índios
adquirissem armas, salvo se fossem capitães do mato. A seletividade de classes de pessoas ao
acesso às armas era a premissa básica da política de controle de armamento durante o império,
muito ligada à escravatura vigente na época (QUINTELA; BARBOSA, 2015, p. 215).
Com a república, a legislação brasileira sobre controle de armas inicia sua trajetória
sem maiores alterações em relação à legislação do império.
Não obstante, as grandes mudanças sobre a política do controle de armamento se
deram na Era Vargas (1930-1945), em especial pelo enfrentamento ao coronelismo e,
também, como consequência da Revolução Constitucionalista de 1932.
Barbosa Lima Sobrinho, ao prefaciar o clássico Coronelismo, Enxada e Voto, de
Vitor Nunes Leal, aponta que a origem da expressão “coronelismo” remonta à criação da
Guarda Nacional em 1831, que tinha na sua hierarquia a patente de coronel, a qual
correspondia ao comando municipal ou regional e, por sua vez,
1
Lampião estava muito grato com a atitude tomada pelo Major Távora, que
determinara o desarmamento geral dos sertanejos, vendo aí talvez uma solução para
o fim do cangaço. Lampião agradeceu “a bondosa colaboração” que lhe foi prestada,
porque poderia agir mais à vontade no sertão. (MACHADO, 1978, p. 82)
Mesmo com a derrota das forças paulistas, chamou a atenção de Vargas o fato de o
Estado de São Paulo possuir armamentos sofisticados e em paridade com as forças federais.
Vargas teria então chegado à conclusão de que as polícias estaduais não deveriam ter
armamento superior aos das Forças Armadas nacionais.
Dentro desse contexto, Getúlio Vargas edita o Decreto 24.602, de 1934, que
determinava em seu artigo 1º a proibição da instalação, no País, de fábricas civis destinadas ao
fabrico de armas e munições de guerra, as quais deveriam pedir autorização do Governo
Federal para o seu funcionamento e deveriam se submeter à fiscalização governamental
(artigo 1º, parágrafo único).
A regulamentação varguista restringiu não só a aquisição de armamento pelas forças
locais, bem como restringiu os calibres permitidos para os civis. Isso ficou estampado no
Decreto nº 1.246, de 11 de dezembro de 1936, conhecido por R-105 (Regulamento para a
fiscalização de produtos controlados pelo exército brasileiro), conforme constava do seu
artigo 137.
Outra inovação do R-105 no § 1º do seu artigo 137, foi condicionar a autorização
ao então Ministério da Guerra para a aquisição pelas forças de segurança estaduais de
armamento classificado como de guerra. Com isso, houve a centralização do controle de
armamento considerado proibido pelo Governo Federal. No ano de 1941 foi editada a Lei de
Contravenções penais, que no seu artigo
18 proibia a fabricação, a venda e o depósito de arma de fogo sem permissão legal, prevendo
uma pena de prisão simples de três meses a um ano. O artigo 19, por sua vez, proibia a
conduta de “trazer consigo” arma sem a permissão legal, com pena de prisão de quinze dias a
seis meses ou multa.
As penas das Lei de Contravenções penais são pequenas, de menor potencial
ofensivo, com uma estatura jurídica inferior às dos crimes.
Naquela época, o deferimento do registro e do porte da arma de fogo eram atribuição
do Delegado da Polícia Civil.
Em 1965 foi editado pelo presidente Castelo Branco o Decreto-Lei nº 55.649, de 28
de janeiro de 1965, que tornou ainda rígido mais o R-105.
Tal disciplina permaneceu até o ano de 1997, quando teve início uma política de
controle de armamento mais severa, com a edição da Lei Federal número 9.437, de 1997, que
criou o Sistema Nacional de Armas (SINARM), tendo sido transferida a atribuição do
registro de armas de fogo dos Delegados da Polícia Civil do Estados
1
para os Delegados da Polícia Federal, com a tipificação de crime de possuir e portar armas de
fogo sem autorização no seu artigo 10.
No ano de 2003 foi sancionada a Lei Federal n. 10.826, de 22 de dezembro de 2003,
logo apelidada de Estatuto do Desarmamento, que trouxe em seu bojo o grau mais elevado de
controle de acesso ao armamento, mantendo e elevando o grau de restrição em relação à Lei
n. 9.437, de 1997.
A Lei 10.826, de 2003, atribuiu ao sistema SINARM e à Polícia Federal as
competências para o registro e o trânsito das armas de fogo de calibres permitidos em geral. O
artigo 9º dessa lei conferiu ao Exército Brasileiro a competência para o registro e autorização
para o trânsito de armas de fogo de caçadores, atiradores e colecionadores, o que incluiu tanto
as armas de calibres permitidos quanto as de calibres restritos, e tudo o mais que se classifica
como Produto Controlado pelo Exército - PCE.
Cabe trazer a distinção entre o porte e a posse de armas, que foi bem explicada por
Danilo Atala nos seguintes termos: “Posse é ter a arma em âmbito de residência, comércio,
fazenda etc. Porte é poder transportar, de forma velada, a arma em via pública” (ATALA,
2021, 69).
O chamado Estatuto do Desarmamento, previu no seu artigo 10, que o porte ilegal de
arma de fogo permitido passa a ter pena de reclusão de 2 a 4 anos, e multa; e, no caso de porte
ilegal de fogo de uso restrito, passou a ter a pena de três a seis anos de reclusão e multa.
Sobre a evolução das penas dos delitos relacionados a armas de fogo, cabe colacionar
a tabela elaborada por Alex Silveira Menezes a qual bem explicita o recrudescimento da
legislação penal:
Omissão de cautela Art. 19, § 2º, (c): pena Art. 10, § 1º, I: pena de Art. 13, caput, pena de
de prisão simples, de 15 detenção, de 1 a 2 anos, detenção de 1 a 2 anos, e
dias a 3 meses, ou e multa. multa.
multa
Porte ilegal de arma Art. 19, caput: pena de Art. 10, caput: pena de Art. 14, caput: pena de
de fogo permitido prisão simples, de 15 detenção, de 1 a 2 anos, reclusão, de 2 a 4 anos, e
dias a 6 meses, ou e multa. multa.
multa
Disparo de arma de Art. 28, caput: pena de Art. 10, § 1º, III: pena Art. 15, caput: pena de
fogo prisão simples, de 15 de detenção, de 1 a 2 reclusão, de 2 a 4 anos, e
dias a 6 meses, ou anos, e multa. multa.
multa.
Porte ilegal de arma de Igual à pena de porte Art. 10, § 2º, III: pena Art. 16, caput, pena de
fogo de uso restrito ilegal de arma de fogo de reclusão, de 2 a 4 reclusão, de 3 a 6
permitido. anos, e multa. anos, e multa.
Nos termos do artigo 4º da Lei n. 10.826, de 2003, para aquisição de arma de fogo o
requerente deverá demonstrar: a ausência de antecedentes criminais; ocupação lícita;
capacidade técnica e psicológica; e declarar a efetiva necessidade de aquisição do armamento.
A restrição mais radical do chamado Estatuto do Desarmamento foi a previsão, no
seu artigo 35, da completa proibição da comercialização de armas de fogo e munição em
território nacional, o que significaria o banimento total do comércio lícito de armamento no
Brasil. Tal vedação ficou condicionada, contudo, a referendo popular, o qual foi realizado no
ano de 2005, tendo 63,94% do eleitorado optado por manter a comercialização de armas
lícitas, conforme informações do Tribunal Superior Eleitoral:
Sim 33.333.045 -
36,06%
Não 59.109.265 -
63,94%
Votos em branco: 1.329.207
Votos nulos: 1.604.307
Eleitorado: 122.042.615
Comparecimento: 95.375.824
2
Abstenção: 26.666.791
Fonte: BRASIL. TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, [s.d.]
seguida por uma série de normas infralegais com o objetivo de diminuir a burocracia na
aquisição de armamento para defesa e para a prática do tiro desportivo, caça e colecionismo.
O Decreto 10.628, de 2021, alterou o Decreto nº 9.845, de 25 de junho de 2019, para
dispor sobre aquisição, cadastro, registro e posse de armas de fogo e de munição. Dentre
outros pontos, saliento a possibilidade de aquisição pelo cidadão comum de até seis armas de
fogo de uso permitido (com o Decreto 9.845, de 2019 era de quatro o limite).
Já o Decreto 10.629, de 2021, regulamentou o registro, o cadastro e a aquisição de
armas e de munições por caçadores, colecionadores e atiradores, e passou a prever, para fins
de comprovação de aptidão psicológica, de laudo elaborado por qualquer psicólogo com
registro profissional ativo em Conselho Regional de Psicologia, uma vez que antes se exigia
psicólogo do quadro da Polícia Federal ou por esta credenciado.
Por fim, o Decreto 10.630, de 2021 estabeleceu que o porte de arma de uso permitido
passa a ter validade em todo o território nacional. Importante alteração se deu no artigo 15 do
mencionado decreto, onde está estabelecido que o indeferimento de requerimento para porte
de arma de fogo deverá ser fundamentado pelo Delegado da Polícia Federal.
Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, todos os homens foram
criados iguais, e que lhe foram conferidos por Seu Criador certos Direitos
inalienáveis, dentre eles a vida, a liberdade e a busca pela felicidade. --Que, para
assegurar esses direitos, os governos são instituídos entre os homens, derivando seus
justos poderes do consentimento dos governados. --Sempre que qualquer forma de
governo se tornar destrutiva
2
para esses fins, é Direito do Povo alterar ou aboli-lo, e instituir um novo governo,
estabelecendo sua base em tais princípios e organizando seus poderes de tal forma,
de forma que pareça mais provável que efetue sua Segurança e Felicidade. (tradução
nossa) (NATIONAL ARCHIVES (United States), 1776)
Registra Jacob Hornberger o pensamento dos chamados pais fundadores dos Estados
Unidos, que vinculava a liberdade do cidadão com o seu direito de possuir e portar armas de
fogo, conforme falas atribuídas a James Madison, Thomas Jefferson, Richard Henry Lee e
Patrick Henry, nos seguintes termos:
EMENDA II
Sendo necessário à segurança de um Estado livre a existência de uma milícia bem
organizada, o direito do povo de possuir e usar armas não poderá ser impedido.
(tradução nossa) (NATIONAL ARCHIVES (United States), 1779)
[. ] proibir as armas de fogo, uma classe inteira de armas que são comumente
usadas para fins de proteção, e proibir as armas de fogo de serem mantidas aptas
para o uso em casa, uma área que tradicionalmente precisa de proteção, viola a
Segunda Emenda. (DISTRICT of Columbia v. Heller : 554 U.S. 570 (2008))
facilmente encontrada por um eventual invasor; é mais fácil de usar por quem não tem a força
física para utilizar uma arma longa; e pode ser apontada contra um ladrão com uma das mãos
enquanto a outra liga para a polícia (DISTRICT of Columbia v. Heller : 554 U.S. 570 (2008).
Em 2017 os Estados Unidos da América contavam com uma taxa de 5 homicídios
para cada 100 mil pessoas, e com uma média de 121 armas para cada 100 pessoas conforme
tabela elaborada pelo especialista Bene Barbosa:
Armas por
Homicídios por 100
País 10
mil habitantes²
habitantes¹
Iêmen 53 N.I.
Montenegro 39 2
Sérvia 39 1
Canadá 35 2
Uruguai 35 8
Chipre 34 1
Finlândia 32 1
Líbano 32 4
Islândia 32 1
Bósnia e Herzegovina 31 1
Áustria 30 1
Noruega 29 1
Malta 29 2
2
Suíça 28 1
Nova Zelândia 26 1
Kosovo 24 3
Suécia 23 1
Paquistão 22 4
Portugal 21 1
França 20 1
Alemanha 20 1
Iraque 20 N.I.
Luxemburgo 19 0
Apesar de os Estados União da América serem a nação com mais armas de posse de
civis, não é o país com maiores taxas de homicídio, conforme levantamento feito por Bene
Barbosa:
El Salvador 62 12
Jamaica 56 9
Venezuela 50 19
Honduras 41 14
Belize 38 10
África do Sul 36 10
2
Bahamas 32 19
Brasil 31 8
Santa Lúcia 29 3
Dominica 27 6
2.2.3 Suíça
2
[...] Foi afirmado o direito de cada um dos signatários escolher sua própria estrutura
doméstica e sua orientação religiosa, a salvo de qualquer tipo de intervenção,
enquanto novas cláusulas garantiam que seitas minoritárias poderiam praticar a sua
fé em paz, sem temer conversão forçada. Para além das exigências do momento,
começavam a ganhar corpo os princípios de um sistema de “relações
internacionais”, um processo pelo desejo comum de evitar a recorrência de uma
guerra total no continente. (KISSINGER, op. cit., p. 33-4)
Segundo Kissinger, Thomas Hobbes, em 1651, três anos após a Paz de Vestefália,
apresentou a teoria do contrato social, na qual a ausência de uma autoridade soberana gera o
risco de uma “guerra de todos contra todos”, e, para que não haja essa insegurança intolerável,
as pessoas delegaram seus direitos a um poder soberano em troca da garantia de segurança
para todos no interior das fronteiras do Estado (KISSINGER, op. cit., p. 38).
2
Com efeito, o monopólio do poder pelo Estado soberano, continua Kissinger, foi
estabelecido por Hobbes como a única maneira de superar o eterno medo da guerra e da morte
violenta (idem).
Conforme Hobbes, não havendo um governo soberano, cada homem acaba sendo
governado pela sua própria razão, vivendo em estado de natureza, dado que:
A condição do homem [...] é uma condição de guerra de todos contra todos, sendo,
neste caso, cada um governado por sua própria razão, e não havendo nada de que
possa lançar mão, que não possa servir-lhe de ajuda para a preservação de sua vida
contra seus inimigos, segue-se daqui que numa tal condição todo homem tem direito
a todas as coisas, incluindo os corpos dos outros. (HOBBES, 2020, p. 87).
No raciocínio de Hobbes, o pacto se justifica na medida em que não há nada pior que
o constante estado de guerra de todos contra todos.
No pacto, explica Danilo Atala, os indivíduos renunciam a parte dos seus direitos
naturais para que o Leviatã, que é o Estado soberano, mantenha a paz e a segurança, bem
como a defesa de ameaças estrangeiras, conservando, cada qual, os demais direitos naturais
não renunciados (ATALA, 2021, p. 61)
John Locke, por sua vez, defende que a formação do Estado está embasada no
consentimento de cada indivíduo e na vontade da maioria, uma vez que:
Se todos os homens são, como se tem dito, livres, iguais e independentes por
natureza, ninguém pode ser retirado deste estado e se sujeitar ao poder político de
outro sem o seu próprio consentimento. A única maneira pela qual alguém se
despoja de sua liberdade natural e se coloca dentro das limitações da sociedade civil
é através de acordo com outros homens para se associarem e se unirem em uma
comunidade para uma vida confortável, segura e pacífica uns com os outros,
desfrutando com segurança de suas
3
propriedades e melhor protegidos contra aqueles que não são daquela comunidade.
(LOCKE, 2020, p. 48)
[a] guerra e a ameaça de guerra são uma dessas restrições, junto com a pobreza, a
educação deficiente, a opressão política e assim por diante. Segurança e
emancipação são duas faces da mesma moeda. A emancipação, não o poder ou a
ordem, produz a verdadeira segurança. Emancipação, teoricamente, é segurança
(BOOTH, 1991, p. 319, tradução nossa)
Mariana Salvadori sustenta que a segurança humana é aquela que tem como objeto
referencial não mais o Estado, mas sim o indivíduo, segundo visões multidimensionais da
segurança, nos seguintes termos:
Tal pensamento está presente nas bases do conceito de segurança humana do United
Nations Development Programme (UNDP), constante do Relatório de Desenvolvimento
Humano de 1994, que analisou um novo conceito de segurança para os seres humanos, focado
não só em conflitos armados entre estados, mas, em especial, no desenvolvimento dos
indivíduos (SALVADORI, 2020, p. 28).
Segundo o relatório da UNDP:
Por muito tempo, o conceito de segurança foi definido pelo potencial de conflitos
entre estados. Por muito tempo, a segurança foi equiparada às ameaças às fronteiras
dos países. Por muito tempo, nações têm pegado em armas para proteger sua
segurança.
Para a maioria das pessoas, atualmente o sentimento de insegurança surge mais das
preocupações acerca do seu cotidiano do que do medo de um evento cataclísmico
mundial. Segurança laboral, segurança de renda, segurança de saúde, segurança
ambiental, segurança contra a criminalidade
– estas são as preocupações emergentes à segurança humana ao redor do mundo.
(UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME, 1994, p. 3, tradução
nossa)
Para o UNDP, a segurança humana ocorre quando o indivíduo está livre do medo
(freedom from fear) e livre das necessidades (freedom from want), sendo igualmente
relevantes tanto a segurança territorial do Estado como a segurança dos indivíduos nas suas
necessidades, como fome, doenças, crimes e repressão (UNITED NATIONS
DEVELOPMENT PROGRAMME, 1994, p. 3) (SALVADORI, 2020, p. 28).
3
Outro autor que destaca a posição do indivíduo nas questões envolvendo a política de
segurança é Barry Buzan. Para ele, a segurança individual deve ser vista como um problema
social, na medida em que as pessoas se encontram incorporadas em um ambiente humano
com inevitáveis consequências sociais, econômicas e políticas (BUZAN, 1983, p. 19).
As ameaças sociais aparecem de variadas formas, mas Buzan destaca
quatro:
motivo pelo qual a análise sobre a segurança nacional não pode deixar de levar em
consideração aspectos da segurança interna e em especial do papel dos indivíduos.
O pensamento da Escola Superior de Guerra vai ao encontro da doutrina de Barry
Buzan, ao defender que a segurança pública é a garantia que o Estado proporciona à Nação,
que se alcança pela ausência de prejuízo aos direitos do cidadão, com o eficiente
funcionamento dos órgãos do Estado, configurando a ordem pública (ESCOLA SUPERIOR
DE GUERRA (BRASIL), 2019, p. 152).
A ordem pública é caracterizada, na doutrina da Escola Superior de Guerra, pela
garantia do exercício dos direitos individuais e a manutenção da estabilidade das instituições,
e pelo bom funcionamento dos serviços públicos e o impedimento de danos sociais (idem)
Conforme consta da versão atual da Política Nacional de Defesa, a Segurança
Nacional é definida nos seguintes termos (BRASIL, 2020, p.11):
[...] o Homem se alça acima do Estado, uma vez que seus fins são superiores aos
do Estado. Cabe ao Estado e à sociedade proporcionar ao Homem as condições de
sua autorrealização. Por isso a liberdade do indivíduo constitui, em nossa
cultura, valor prioritário. (ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (BRASIL),
2019, p. 12)
Vale ressaltar que a liberdade do indivíduo, conforme Friedrich Hayek, deve ser
entendida como a ausência de coerção, sendo “o estado no qual o homem não está sujeito a
coerção pela vontade arbitrária de outrem” (HAYEK, 2020, p. 38)
Desse modo, conforme Hayek:
Na mesma toada, John Locke aponta que o direito do indivíduo se defender decorre
de uma lei fundamental da natureza, pois
[...] o ser humano deve ser preservado na medida do possível, se nem todos podem
ser preservados, deve-se dar preferência à segurança do inocente; você pode destruir
o homem que lhe faz guerra ou que se revelou inimigo de sua existência, pela mesma
razão que se pode matar um lobo ou leão: porque homens deste tipo escapam aos
laços da lei comum da razão, não seguem outra lei senão aquela da força e da
violência, e assim podem ser tratados como animais selvagens, criaturas perigosas e
nocivas que certamente o destruirão sempre o tiverem em seu poder. (LOCKE,
2007, pp. 10–11)
A teoria de Locke sustenta que o indivíduo que ameaça o outro ou tenta impor
violentamente a sua vontade pode ser destruído, pois encontra-se em estado de guerra,
entendido este como um estado de inimizade e de destruição que alguém, explicitamente ou
por seu modo de agir, declara fomentar de maneira consciente projetos contra a vida de outro
homem (LOCKE, 2020, p. 10)
Locke raciocinava que, se escapar da violência é a única garantia de preservação do
indivíduo, e como é impossível ao Estado proteger o cidadão o tempo todo, a este deveria ser
dado o direito de defesa contra eventual agressor, não cabendo ao Estado cercear este direito,
[...] porque a lei, estabelecida para garantir a minha preservação contra os atos de
violência, quando não pode agir de imediato para proteger minha vida, cuja perda é
irreparável, me dá o direito de me defender e assim o direito de guerra, ou seja, a
liberdade de matar o agressor; porque este não me deixa tempo para apelar para
nosso juiz comum e torna impossível qualquer decisão que permita uma solução
legal para remediar um caso em que o mal pode ser irreparável. (LOCKE, 2020, p.
12)
Interessante perceber que tanto Hobbes como Locke, teóricos que defendem a
submissão dos indivíduos ao Estado como forma de garantir a segurança e a paz, reconhecem
que o Estado não é infalível nem muito menos onipresente, motivo pelo qual não cabe negar
ao indivíduo o direito à autopreservação em face de violência contra a sua pessoa.
Somente em um cenário distópico, com um Estado gigantesco que assume o controle
da vida de todas as pessoas, com a burocracia ocupando todos os espaços, inclusive o
familiar, é que poderia se cogitar onipresença estatal, gerando inexoravelmente a tirania
contra o indivíduo
Tal cenário é descrito por George Orwell, no seu clássico 1984, no qual o Estado
busca controlar o indivíduo desde os meandros da família, por meio da
3
Quase todas as crianças atualmente eram horríveis. O pior de tudo era que, com
auxílio de organizações como os Espiões, transformavam-se sistematicamente em
pequenos selvagens ingovernáveis e, no entanto, isso não produzia nelas tendência
alguma a se rebelar contra a disciplina do Partido. Pelo contrário, adoravam o
Partido e tudo relacionado a ele. As músicas, os desfiles, as bandeiras, as
caminhadas, os exercícios com espingardas de faz de conta, a adoração ao Grande
Irmão – tudo isso era uma espécie de brincadeira gloriosa para elas. Toda a sua
ferocidade era voltada para fora, contra os inimigos do Estado, contra os
estrangeiros, traidores, sabotadores, criminosos do pensamento. Era quase normal
que as pessoas de mais de trinta anos terem medo dos próprios filhos. (ORWELL,
2021, p. 37)
p. ex.) contra agressões injustas, até pelo fato de os agentes estatais não poderem estar em
todos os lugares, conforme já ressaltado.
Apesar de não haver uma previsão na Constituição do Brasil de 1988 nos mesmos
moldes da II Emenda à Constituição dos Estados Unidos da América, é possível extrair do
texto constitucional o direito natural do cidadão utilizar todos os meios cabíveis para a
legítima defesa de seus direitos, sem que haja uma exclusividade do Estado para tanto.
Com efeito, o artigo 5º da Constituição do Brasil declara garantidos a todos os
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, "a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade". O inciso X deste mesmo artigo assegura
que são "invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra".
No artigo 6º da Constituição do Brasil, o direito à segurança é elencado como um dos
direitos sociais.
Não se pode esquecer que a Constituição em seu artigo 1º, inciso III, eleva a
dignidade da pessoa humana a um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.
Na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, consta
expressamente no seu artigo 2º que a “finalidade de toda associação política é a conservação
dos direitos naturais e imprescritíveis do homem. Esses direitos são a liberdade, a propriedade
a segurança e a resistência à opressão” (DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO
HOMEM E DO CIDADÃO, 1789).
A preservação da própria vida e da integridade física é um dos mais básicos direitos
do cidadão. Não se pode negar o exercício do direito à legítima defesa sob o argumento de
que somente ao Estado cabe garantir ao cidadão a segurança pública.
Como bem destaca Cezar Bitencourt,
[...] a legítima defesa é um dos institutos jurídicos mais bem elaborados através dos
tempos, e representa uma forma abreviada de realização da justiça penal e da sua
sumária execução. E a legítima defesa representa uma verdade imanente à
consciência jurídica universal, que paira acima dos códigos, como conquista
da civilização. (BITTENCOURT, 2004, p. 317)
Contudo, nesta causa, senhores juízes, não me valerei do tribunado de Tito Ânio
nem de todos os seus feitos em prol da República para defendê-lo desta acusação; se
não tiverdes visto com vossos próprios olhos as armadilhas preparadas por Públio
Clódio contra Milão, não suplicaremos que sejamos absolvidos desta
acusação em virtude de tantos serviços notáveis prestados à República; e nem
pediremos, se a morte de Públio Clódio significou a vossa salvação, que a
atribuais antes ao valor de Milão do que à boa fortuna do povo romano. Mas, se as
insídias daquele forem mais claras do que a luz do dia, então, por fim, eu vos pedirei e
suplicarei, senhores juízes, que, se tudo o mais perdemos, ao menos nos seja deixado
o direito de defendermos impunemente nossa vida da audácia e das armas
dos inimigos. (apud BORGES, 2011, p. 37) (grifos originais)
[...] foi a legítima defesa reconhecida em sentenças de Gaio, afirmando que a razão
natural permite defender-se contra o perigo (“Nam adversus periculum
naturalis ratio permittit se defendere”, D. 9, 2, 25) e de Paulo no sentido de que
todas as leis e todos os direitos permitem defender-se da violência pelo uso
da violência (“Vim vi defendere omnes leges omniaque iura permittunt”, I, 45, § 4,
D.9.2). (DELMANTO et al., 2010, p. 176)
4
A legítima defesa pode ser empreendida para defender direito não só da vítima da
agressão, mas também em defesa de outras pessoas.
A legítima defesa de outrem, ou ajuda necessária, somente é válida se existe vontade
de defesa por parte do agredido, pois, como explica Juarez Cirino dos Santos, a
impossibilidade de defesa contra a vontade do agredido resulta do princípio da proteção
individual, tendo em vista agredido pode, por exemplo, ou não querer o uso de arma de fogo
contra o ladrão ou temer represálias (SANTOS, 2006, p. 238).
Cirino dos Santos explica que a vontade presumida do agredido autoriza a defesa de
direito de terceiro, independente da verificação negativa posterior (idem).
Quanto ao direito a ser protegido, qualquer bem jurídico pode ser legitimamente
defendido contra injusta agressão, não havendo na lei brasileira distinção entre os bens que
autorizam o exercício da legítima defesa, seja o bem a vida, o patrimônio, a liberdade, o pudor
ou a honra.
Sobre a defesa da honra conjugal, cabe registrar o entendimento do Supremo
Tribunal Federal ao julgar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental
n. 779, no sentido de não caber a legítima defesa da honra para justificar a agressão do
cônjuge ou companheiro para reprimir a traição ou adultério, pois, segundo a mais alta corte
de justiça do país, “[a] traição se encontra inserida no contexto das relações amorosas. Seu
desvalor reside no âmbito ético e moral, não havendo direito subjetivo de contra ela agir com
violência.” (BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2021b).
É necessário também que a agressão seja atual ou iminente, ou seja, o indivíduo
precisa estar sendo agredido ou em vias de ser agredido para a caracterização da legítima
defesa (SANTOS, op. cit., p. 229).
Havendo o encerramento da agressão, não há hipótese de legítima defesa, na medida
em que, com a cessação da conduta do agressor, ela não é mais atual e muito menos iminente.
Se a vítima agir contra seu antigo agressor por vingança ou por pura maldade não estará
abarcada pela legítima defesa.
Os meios necessários para repelir a agressão, por sua vez, devem ser
suficientes para preservar o direito lesado ou ameaçado de lesão, e, em caso de uma situação
extrema, é admissível que a defesa da vítima importe na morte do agressor. A lei penal
brasileira prevê que o meio utilizado para a legítima defesa seja o necessário para fazer
cessar a agressão, demandando que haja uma
proporcionalidade entre a conduta do agressor e a reação da vítima, e, se não houver
4
outros meios, poder ser considerado necessário o único meio disponível. Mas nessa hipótese,
pondera Cezar Bittencourt, a análise da moderação deverá ser mais exigente
(BITTENCOURT, 2004, p. 321) .
Dessa forma, a vítima da agressão deve utilizar dos meios que dispõe, podendo
chegar a utilizar até uma arma de fogo para se defender, se este for o meio disponível para ela.
Há que se levar em conta que é humanamente impossível em uma situação de perigo,
com a tensão própria do momento, se exigir uma reação refletida da vítima, tendo o artigo 25
do Código Penal Brasileiro previsto que os meios necessários são aqueles que o agente dispõe
no momento da agressão injusta.
A intenção do indivíduo de se proteger e a terceiros contra uma agressão injusta é o
efeito desejado, e não o de tirar a vida do agressor ou lhe causar alguma lesão. A morte ou
lesão do agressor é um efeito sempre indesejado, mas, muitas vezes, inevitável.
Essa é a teoria do duplo efeito de Santo Tomás de Aquino, a qual sustenta que para a
ação desejada do indivíduo se defender há possibilidade de um efeito indesejado, que é a
morte do agressor, desde que o meio empregado seja moderado, conforme lição do aquinate:
Nada impede que um mesmo ato tenha duplo efeito, dos quais só um está em nossa
intenção, estando o outro fora dela. [...] Ora, do ato de quem se defende pode
resultar um efeito duplo: um, a conservação da vida própria; outro, a morte do
atacante. Portanto, tal ato, enquanto visa a conservação da vida, não é, de natureza,
ilícito, pois, a cada um é natural conservar a existência, medida do possível. Um ato,
porém, embora procedente de uma boa intenção, pode tornar-se ilícito se não for
proporcionado ao fim. Portanto, age ilicitamente quem, para defender a vida própria,
empregar violência maior que a necessária. Mas, se repelir a violência
moderadamente, a defesa será lícita; pois, segundo o direito, repelir a força pela
força é lícito, com a moderação de uma defesa sem culpa. Nem é necessário, para a
salvação, deixarmos de praticar o ato da defesa moderada, para evitar a morte de
outrem; pois, estamos mais obrigados a cuidar da nossa vida que da alheia.
(AQUINO, 2016b, p. 419)
Apesar do confronto ser algo a ser evitado, não cabe exigir da vítima atitudes
covardes, muito menos que tolere atitudes ilícitas contra si. A reação à injusta agressão com
os meios que a vítima dispõe é um direito que não pode ser negado, nem mesmo pelo Estado.
O Catecismo da Igreja Católica orienta no sentido de que:
4
Nesse aspecto, privar o cidadão do direito de possuir e usar armas de fogo pode
ocasionar o desamparo dele em relação ao seu agressor, afastando a possibilidade de exercer
de maneira eficaz a defesa de seus direitos, em especial sua vida e integridade física, deixando
o cidadão à mercê do agressor criminoso.
Cumpre pontuar que, conforme a lição da Congregação para a Doutrina da Fé da
Igreja Católica, desde o momento em que uma lei positiva priva determinada categoria de
seres humanos da proteção que a legislação civil deve conceder-lhes, o Estado acaba por
negar a igualdade de todos perante a lei (CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ,
1988).
O direito de se defender, por ser um direito natural, não pode ser inviabilizado ou
aniquilado pelo Direito Positivo.
Devemos a Sófocles a introdução da discussão sobre a existência de leis universais
que integram o ordenamento jurídico de um país, mesmo que não sejam escritas, conforme
consta da célebre peça Antígona, datada do século V antes de Cristo.
O enredo da peça gira em torno do questionamento de Antígona, filha de Édipo Rei
com Jocasta, ao édito de Creonte, rei de Tebas, que havia proibido o sepultamento de
Polinice, irmão de Antígona. A obra traz importante crítica à adequação e validade de leis
outorgadas com base somente no arbítrio do governante, conforme o diálogo entre Antígona e
sua irmã Ismênia na parte I da mencionada tragédia grega:
ISMÊNIA – Mas, minha pobre irmã, em tais condições, em que te posso eu valer,
quer por palavras, quer por atos?
ANTÍGONA – Quererás auxiliar-me? Agirás de acordo comigo?
ISMÊNIA – A que perigos pensas arriscar-te ainda? Que pretendes fazer?
ANTÍGONA – Ajudarás estes meus braços a transportar o cadáver?
ISMÊNIA – Queres tu, realmente sepultá-lo, embora isso tenha sido vedado a toda a
cidade?
ANTÍGONA – Uma coisa é certa: Polinice era meu irmão, e eu também, embora
recuses o que eu te peço. Não poderei ser acusada de traição para com o meu dever.
ISMÊNIA – Infeliz! Apesar da proibição de Creonte?
ANTÍGONA – Ele não tem o direito de me coagir a abandonar os meus.
(SÓFOCLES, 2014)
complicador para o porte de armas de fogo que é a avaliação discricionária por parte da
Polícia Federal em relação à necessidade do requerente. Atribui-se ao juízo do agente público,
que examinará o pedido, a autorização para o porte de arma de fogo, segundo as orientações
do Ministério da Justiça, conforme previsto no artigo 6º da Lei 10.826, de 2003.
Em termos práticos, o delegado da Polícia Federal decide se o cidadão precisa ou não
de uma arma, uma vez que a Lei 10.826, de 2003, não define o que é a efetiva necessidade,
não especificando minimamente parâmetros para a avaliação a autoridade, conferindo, ao fim
e ao cabo, um juízo de valor extremamente abrangente para deferir a aquisição ou o porte de
arma de fogo.
A discricionariedade da autoridade pública torna o cidadão sujeito à vontade estatal,
uma vez que transfere à livre avaliação do administrador o que configuraria a atividade de
risco e, assim, decidir pela concessão ou não da aquisição e do porte de armas. É esta a fenda
por onde se esvai o direito do cidadão.
Considerando ser a legítima defesa um direito natural e fundamental, o Estado não
pode criar entraves para o exercício da autodefesa do cidadão, a ponto de transformar a
previsão da legítima defesa constante do art. 25 do Código Penal em uma promessa quase vã.
Não é fácil adquirir ou portar uma arma de fogo e munição legalmente, mesmo
depois dos decretos presidenciais editados a partir de 2019.
Com efeito, o interessado para ter uma arma registrada para sua defesa tem que
passar por um burocrático e custoso processo, no qual deverá demonstrar ter mais de 25
anos, aptidão tanto psicológica como prática para a emissão da autorização de compra de
arma de fogo, além de comprovar a ausência de antecedentes criminais, conforme requisitos
do art. 4º e 28 da Lei 10.826, de 2003. É o preço por querer estar de acordo com a lei.
O possuidor de arma de fogo, e em maior medida o portador de arma de fogo, sofrem
intensa fiscalização estatal, devendo manter sempre atualizados seus dados perante a Polícia
Federal, informando todos os dados pessoais e profissionais para as autoridades públicas.
O simples fato de o titular responder a um inquérito ou processo criminal por crime
doloso importa na cassação das autorizações de posse e de porte de arma de fogo, conforme
determina o art. 14, caput, do Decreto n. 9.847, de 2019.
4
Há ainda uma abordagem que não pode ser desconsiderada, que é a utilização do
desarmamento civil como instrumento de perseguição e controle de dissidentes políticos e de
minorias, conforme registra Stephen P. Halbrook (HALBROOK, 2017, p. 19).
Uma das características da tirania, como bem registra Aristóteles, é a desconfiança
contra o povo, e é por esse motivo que ela cuida de lhe tirar as armas (ARISTÓTELES, 2011,
p. 247).
4
O direito de portar armas tem sido sempre o privilégio distinto dos homens livres.
Além de qualquer necessidade de autoproteção para a pessoa, ele representa, entre
todas as nações o poder, juntamente com o exercício de certa jurisdição. Não seria
necessário que o direito de portar armas fosse concedido pela Constituição, pois ele
sempre existiu (DISTRICT of Columbia
v. Heller : 554 U.S. 570 (2008), tradução nossa)
5 POLÍTICAS PÚBLICAS
5.1 Resultados do controle de armamento – mais armas significam mais
crimes?
Contra a posse e o uso de armas de fogo, argumenta-se que, na verdade, as armas são
causadoras de violência, e que retirar o excesso de armas em circulação, legais ou ilegais,
reduz os homicídios entre cidadãos comuns, suicídios, acidentes, e, principalmente, roubos de
armas residenciais que, segundo alegam, é uma das maiores fontes de armamento da
criminalidade (BANDEIRA, 2019, p, 95)
Tal tipo de argumentação encontra eco nas mais altas esferas de poder do Brasil,
como se extrai da decisão cautelar tomada pela Ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal
Federal, nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 6675, que determinou a
suspensão de certos dispositivos dos Decretos Presidenciais nº 10.627/2021, nº 10.628/2021, e
nº 10.629/2021, ao sustentar que
[...] [a] comunidade científica, [...], com base em estudos independentes, nacionais e
internacionais, reconhece a existência de uma correlação inequívoca entre o
aumento da violência e a circulação de armas de fogo. (BRASIL. SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL, 2021a)
certa medida, o processo de aquisição e posse de armas de fogo, conforme consta da proposta
no Senado Federal de Projeto de Decreto Legislativo n° 74, de 2021, que tem a seguinte
ementa:
Interessante notar que muito desses argumentos focam no instrumento utilizado para
a prática do delito e não na pessoa do criminoso, além de não fazerem distinção entre armas
legalizadas e armas provenientes de ilícitos, em especial daquelas provenientes do tráfico de
armas.
Os pesquisadores Fabrício Rebelo e Bene Barbosa, por sua vez, apresentam como
contraponto à política de desarmamento dados estatísticos que comprovam a inexistência de
vinculação do número de armas registradas e o incremento, pois no período em que o Brasil
teve a maior quantidade de armas registradas os homicídios alcançaram o seu menor patamar,
além de colocar em risco o exercício da legítima defesa (REBELO, 2020) (BARBOSA, 2020,
p. 265).
A análise dos dados da violência com o número de homicídios por arma de fogo é
relevante para aferir a eficácia da política de controle de armas, assim como verificar se a
restrição ao acesso a armas legalizadas à população tem relação com o aumento da
criminalidade no Brasil.
Cabe colacionar o Mapa da Violência fornecido pelo Ipea - Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada, nos seguintes termos:
Figura 3 – Evolução do número de homicídios por 100 mil habitantes de 1980 a 2016
1990 22,22
1991 20,94
1992 19,21
1993 20,2
1994 21,23
1995 23,84
1996 24,78
1997 25,39
1998 25,94
1999 26,2
2000 27,35
2001 27,86
2002 28,53
2003 29,14
2004 26,94
2005 26,13
2006 26,61
2007 26,2
2008 26,72
2009 27,18
2010 27,8
2011 27,45
2012 29,41
2013 28,55
2014 29,82
2015 28,89
2016 30,33
2017 31,59
Fonte: INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA, [s.d.]
Figura 4 - Taxa total de homicídios e homicídios com arma de fogo de 1999 a 2019.
5
Figura 5 - Número de armas registradas na Polícia Federal nos anos de 2017, 2019 e 2020.
750 armas por 100 mil habitantes). Entre as menores taxas de armas registradas, o Estado de
São Paulo tem menos de 150 armas por 100 mil habitantes. Em valores absolutos o maior
número está no Rio Grande do Sul (57,7 mil), e o menor em Tocantins, com cerca de 477
(BRASIL EM MAPAS, 2021), conforme figura abaixo:
(Obs. Homicídios: eixo à esquerda; Registros de Armas (SINARM): eixo à direita) Fonte:
REBELO, 2020.
o porte e a posse, mas com limites previstos na legislação. Nem a liberação completa, nem a
restrição total (BUENO et al., 2021).
Figura 12 - Opinião dos policiais e profissionais de segurança pública sobre o acesso a arma de fogo.
Informam Flávio Quintela e Bene Barbosa que “de acordo com uma pesquisa
extensa, realizada com apoio de organizações desarmamentistas como a Viva Rio, apenas
25,6% das armas apreendidas com criminosos, entre 1951 e 2003, eram armas legalmente
registradas que foram roubadas” (QUINTELA; BARBOSA, 2015, p. 68), ao passo que
“outros trabalhos feitos por órgãos estaduais de polícia resultam em números ligeiramente
menores, da ordem de 22%” (QUINTELA; BARBOSA, 2015,
p. 69). Ou seja, aproximadamente 75% das armas dos criminosos são ilícitas desde a sua
origem.
Não se pode olvidar o lucrativo mercado de tráfico de armas, conforme consta do
relatório anual (Annual Report) do ano de 2014 do Escritório das Nações Unidas para
Drogas e Crimes (UNODC), que destacou que o uso indevido, a fabricação e o tráfico de
armas de fogo ilícitas estão frequentemente ligados às mesmas organizações criminosas e
redes que as Nações Unidas trabalham para combater em outras áreas; com diferentes formas
de criminalidade frequentemente interligadas, os mesmos grupos que traficam pessoas e
drogas são aqueles envolvidos na movimentação de armas ilícitas (UNITED NATIONS
OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2014, p. 48, tradução nossa).
As armas ilícitas, ainda conforme relatório do UNODC, atuam como facilitadores de
crimes violentos, servindo de ferramentas de opressão e como mercadoria lucrativa do tráfico,
que serve para alimentar conflitos armados, crimes e insegurança (UNITED NATIONS
OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2014, p. 49,
tradução nossa).
O crime organizado, em especial o tráfico de drogas, tem íntima relação com o
comércio clandestino de armas, que causa violência e insegurança nas grandes cidades com o
enfraquecimento das leis e das instituições. Os grupos de narcotraficantes possuem suas
próprias tropas com armamentos extremamente modernos.
O Brasil é um mercado consumidor aquecido de armas ilícitas pela criminalidade
organizada, segundo consta da matéria do dia 25 de abril de 2021, assinada pelo Delegado da
Polícia Federal Victor Poubel, publicada no Jornal Extra, nos seguintes termos:
Necessitam de alto poder de fogo para proteção de suas bases, em sua maioria
localizadas em comunidades carentes, seja por causa das investidas policiais ou dos
ataques de quadrilhas rivais, bem como para apoiar a execução dos seus crimes e
incutir medo naqueles que se meterem no seu caminho.
O fuzil custa caro, em torno de R$ 60 mil no mercado paralelo, e a bandidagem paga
para formar o seu arsenal. Já faz tempo que os camburões conseguiam entrar nas
comunidades do Rio de Janeiro sem problemas. Hoje só com veículos blindados
para assegurar a integridade física dos policiais e a boa execução das operações. A
fartura de armas é tão grande que fizeram disso também um negócio, cobrando
aluguel dos ladrões de cargas e assaltantes em geral que usam em suas ações.
Ressalto que a bandidagem não tem arma legal, muitas entram pelas
fronteiras do país burlando as barreiras de fiscalização, lembrando que não
somos produtores de armas de grosso calibre. Elas adentram em solo
pátrio por ar, terra e mar, das mais variadas formas e dissimuladas,
aproveitando-se da imensidão das nossas fronteiras, cruzando
Estados, Municípios, passando pelas ruas dos bairros até terminar nas
favelas. Assim, a responsabilidade pela fiscalização é compartilhada, já que a
segurança pública é feita por camadas, não cabendo a atribuição de culpa a quem
quer que seja, mas sim a certeza que o trabalho deve melhorar. (g.n.) (POUBEL,
2021) .
Nesse contexto, a criminalidade organizada sabe como fazer sua atividade progredir
e render cada vez mais lucros. Um “negócio” utilizado pelos criminosos é o “aluguel de
armas de fogo”, pelo qual criminosos buscam o armamento ilícito com fornecedores
clandestinos para viabilizar a prática de crimes de latrocínio, assaltos e homicídios
relacionados ao tráfico de drogas (SISNANDO, 2015).
Trata-se de um expediente muito sofisticado utilizado pelas facções criminosas que
operam nas mais variadas regiões do país, dentre elas o temido Primeiro Comando da Capital
– PCC, que criou um serviço de logística para o empréstimo ou aluguel de armas, munição e
veículos para o cometimento dos mais variados delitos (CODAZZI, 2017).
Na esteira do apurado pelo Escritório das Nações Unidas para as Drogas e Crimes,
nenhuma região do mundo está isenta das consequências dramáticas da violência das armas de
fogo ilícitas, que cobre todo o espectro da segurança humana: de conflitos de grande escala
em que essas armas são responsáveis pela maioria das mortes, sejam nas ruas, nas gangues, na
violência doméstica, e de crimes em que as armas de fogo ilícitas representam uma ameaça
grave à vida humana e à segurança da comunidade (UNITED NATIONS OFFICE ON
DRUGS AND CRIME, 2014, p. 49,
tradução nossa).
No relatório constante do Global Study on Homicides de 2011, do UNODC, é
destacado que sob uma perspectiva global, a diferença entre as estimativas de
6
Armas de fogo, sem dúvida, aumentam os homicídios em certas regiões e onde são
utilizadas por membros de grupos criminosos organizados, que são frequentemente
aqueles que puxam o gatilho. (UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND
CRIME, 2011, p. 10, tradução nossa)
Desse modo, não faz sentido a argumentação que se volta unicamente contra as
armas de fogo, e não contra aqueles que fazem uso indevido delas, uma vez que os crimes são
necessariamente fruto de ações humanas, devendo o foco das ações estatais serem voltados
para o agente causador do ilícito, e não contra o instrumento utilizado por ele.
Provavelmente a principal conclusão do relatório da UNODC, de 2011, tenha sido,
conforme Alex Menezes, que não foi possível identificar uma relação causal entre a
disponibilidade de armas legalizadas e a prática de crimes com elas.
A ineficácia da política de desarmamento não é uma constatação nova, e foi
reconhecida por Cesare Beccaria, em seu livro "Dos Delitos e Das Penas", de 1764, que
deixou clara a pouca utilidade de leis que retiram o direito ao cidadão honesto de possuir e
portar armas para legítima defesa, conforme excerto que merece ser colacionado:
10 a 14 anos 47 42 41 37
Total 3.213 3.157 3.506 3.876
Menor de 1 ano 128 113 139 179
1 a 4 anos 1.148 1.145 1.317 1.390
Intoxicações
5 a 9 anos 896 910 1.066 1.093
10 a 14 anos 1.041 989 984 1.214
Total 21.390 20.535 20.605 21.023
Menor de 1 ano 941 978 1.103 1.334
2 a 4 anos 6.026 6.086 6.038 6.128
Queimaduras
5 a 9 anos 7.133 6.517 6.652 6.766
10 a 14 anos 7.290 6.954 6.812 6.795
Total 133 151 118 85
Menor de 1 ano 4 8 5 1
1 a 4 anos 7 18 14 16
Armas de fogo
5 a 9 anos 24 18 15 13
10 a 14 anos 98 107 84 55
Total 54.258 51.316 51.374 52.613
Menor de 1 ano 2.483 2.535 2.701 2.768
2 a 4 anos 11.310 10.813 11.037 11.403
Quedas
5 a 9 anos 20.265 18.960 18.703 19.840
10 a 14 anos 20.200 19.008 18.933 18.602
Total 25.593 26.854 24.221 23.546
Menor de 1 ano 1.217 1.308 985 1.057
1 a 4 anos 6.987 7.408 6.726 6.593
Outros
5 a 9 anos 8.313 8.846 8.073 8.001
10 a 14 anos 9.076 9.292 8.437 7.895
Total 117.577 113.358 111.555 112.643
Menor de 1 ano 5.148 5.205 5.310 5.695
1 a 4 anos 27.882 27.553 27.410 27.761
Total
5 a 9 anos 40.824 38.711 38.195 39.489
10 a 14 anos 43.723 41.755 40.640 39.698
violentos inconclusos (BRUM, 2018). Isso significa que a chance de um homicida nunca ser
identificado é de cerca de 92%.
Esses dados são apenas sobre a identificação do autor do crime, e não sobre a
conclusão do inquérito e muito menos das prisões.
Abstraindo a rara identificação dos autores do homicídio, na hipótese de serem
identificados e confirmada a autoria do crime, o tempo do processo criminal e o de
cumprimento da pena a ser aplicada aos criminosos não geram um cenário animador.
Supondo que os autores sejam todos maiores de idade, o crime será julgado perante o
tribunal do júri.
No tribunal do júri o procedimento é bem mais longo, sendo constituído de duas
fases: (i) a primeira é a pronúncia ou fase de formação da culpa, pela qual o juiz decide se há
elementos mínimos do cometimento de um crime doloso contra a vida, e autoriza o
encaminhamento para julgamento no plenário do júri (arts. 406 a 412, Código de Processo
Penal); (ii) a segunda é o plenário, que é a sessão realizada perante o conselho de sentença
(sete jurados), com debates orais entre acusação e defesa, em que há o efetivo julgamento da
acusação do crime doloso contra a vida (art. 422, Código de Processo Penal).
Seguindo o rito do júri em todas as suas fases, considerando os prazos legais, e sendo
muito otimista, o tempo médio de cada fase é de cerca de 10 meses, levando, assim, quase 2
anos para o encerramento do processo em 1a instância.
Os dados divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça no Diagnóstico das Ações
Penais de Competência do Tribunal do Júri, mostram a dura realidade do processo dos crimes
contra vida, com uma tramitação que leva muitos anos:
Durante sua odisseia de crimes, o criminoso Lázaro foi confrontado em pelo menos
uma situação por um cidadão armado, que conseguiu afugentá-lo (DIOGO, 2021).
6
O desfecho trágico de Lázaro se deu com sua morte após confronto com policiais
militares de Goiás, no dia 28 de junho de 2021, em Águas Lindas de Goiás, Estado de Goiás
(LÁZARO Barbosa é capturado e morto em Goiás, 2021).
Todas essas constatações demonstram que o Estado brasileiro falha em
providenciar segurança para os indivíduos contra criminosos, e que políticas de
segurança pública voltadas no mero desarmamento da população serve apenas para expor
ainda mais as vítimas, sem que haja uma melhora na segurança da população.
Não obstante a notória falha do Estado em garantir a segurança e proteção dos
indivíduos, as vítimas de crimes praticados por fugitivos do sistema prisional não são
indenizadas pela omissão estatal, ao argumento de que não há nexo causal direto entre o
momento da fuga e a conduta praticada pelo foragido, conforme entendimento do Supremo
Tribunal Federal (BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 2020).
Tal entendimento jurisprudencial só reforça a ideia de que a segurança de cada
indivíduo não é da responsabilidade do Estado.
Com a ineficácia da aplicação da lei penal para garantir a segurança dos brasileiros,
com criminosos impunes soltos, restou ao cidadão brasileiro, relegado à insegurança e ao
desamparo, recorrer, quando pode, a cercas elétricas, muros, grades, arames farpados,
seguros, seguranças particulares, blindagem veicular, num nível de que seria impensável ao
cidadão médio norte-americano, mas que, como bem pontua Alex Menezes, se tornou lugar
comum para os brasileiros (MENEZES, 2020, p. 71).
Reforçar o Estado de Direito (Rule of Law) com a aplicação da lei é considerado
pela Organização das Nações Unidas o ponto central para reduzir os níveis de homicídios
(UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2019, p. 31).
Com efeito, o Estado de Direito significa que todos são governados por leis
publicamente promulgadas, igualmente fiscalizadas e aplicadas por um judiciário
independente e imparcial, sendo elas consistentes com os padrões e normas internacionais de
direitos humanos (MENEZES, 2020, p. 70).
O principal indicador de um Estado de Direito forte, conforme o mencionado
relatório Global Study on Homicide do ano de 2019, é o desenvolvimento de um judiciário
independente, que pode ajudar a aumentar a legitimidade das instituições governamentais,
fornecendo mecanismos de resolução de disputas que desencorajam o recurso à violência e
tranquilize os cidadãos de que seus direitos
6
individuais serão protegidos. Nos países em desenvolvimento, em que uma parte substancial
da população é empobrecida, um sistema de justiça criminal que funcione também é essencial
para proteger os pobres da violência (UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND
CRIME, 2019, p. 31, tradução nossa).
As medidas de fortalecimento do Estado de Direito não excluem nem se contrapõem
ao direito do indivíduo poder exercer o seu direito de autodefesa, segundo a lição precisa do
professor Celso Antônio Bandeira de Mello:
Em face da Lei Magna do País, o cidadão jamais poderá ser proibido de tentar
defender sua vida, seu patrimônio, sua honra, sua dignidade ou a incolumidade
física de sua mulher e filhos a fim de impedir que sejam atemorizados, agredidos,
eventualmente vilipendiados e assassinados, desde que se valha de meios
proporcionais aos utilizados por quem busque submetê-los a estes sofrimentos,
humilhações ou eliminação de suas existências. (MELLO, 2005)
6 CONCLUSÕES
que haja uma correlação direta entre tal aumento e o número de homicídios por arma de fogo.
Ficou evidente pelo levantamento feito no presente trabalho que o Estado brasileiro
falha em prover segurança para os indivíduos contra criminosos, e que políticas de segurança
pública voltadas para o mero desarmamento da população servem apenas para expor ainda
mais as vítimas, sem surtir efeito significativo no nível de segurança da população.
Conforme apurado no presente trabalho, os criminosos não são atingidos pelas leis de
desarmamento civil, mas sim os donos de armas legais, que nada têm a ver com criminalidade
que avança em nossa sociedade.
O crime organizado, em especial o tráfico de drogas, possui íntima relação com o
comércio clandestino de armas de fogo, que causa violência e insegurança nas cidades e até
no campo, com o enfraquecimento das leis e das instituições. Os grupos de narcotraficantes
possuem suas próprias tropas com armamentos extremamente modernos, que passam ao largo
de qualquer controle estatal.
O foco das ações estatais para prevenir o aumento da criminalidade deve ser voltado
para os agentes causadores dos ilícitos, uma vez que as condutas ilícitas são necessariamente
condutas humanas, e não responsabilizar as armas de fogo como se fossem seres com vontade
própria.
O meio mais eficiente para a redução dos índices de criminalidade é o fortalecimento
do sistema de justiça criminal, com a certeza da aplicação da pena para aqueles que cometam
crimes, de forma independente e imparcial, com o reforço do Estado de Direito (Rule of
Law), sendo ineficaz desarmar o cidadão comum e cumpridor da lei com o propósito de
redução de crimes violentos.
As medidas de fortalecimento do Estado de Direito, todavia, não excluem nem se
contrapõem ao direito de o indivíduo poder exercer o seu direito de autodefesa pelos meios
necessários, até mesmo pelo uso de arma de fogo contra seu agressor, uma vez que o Estado
não responde pela segurança pessoal dos indivíduos.
Mais armas legalizadas nas mãos de pessoas honestas e cumpridoras das leis não
importa em aumento dos crimes violentos.
A proteção da própria vida e da liberdade é o verdadeiro núcleo essencial do direito
de possuir e portar armas legalizadas pelo indivíduo.
7
7 REFERÊNCIAS
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