RELATÓRIO DO FILME “MENINO 23, INFÂNCIAS PERDIDAS NO BRASIL”
O “Menino 23” é um documentário baseado na tese de doutorado do
professor Sydney Aguilar Filho e que foi produzido pelo diretor Belisario Franco.
Lançado no ano de 2016 - ganhou o Grande Prêmio do Cinema
Brasileiro na categoria longa-metragem documentário, no ano seguinte -, a película remonta alguns pontos da década de 30 do século XIX no Brasil, caracterizado por um passado eugenista recente no País. Além disso, demostra como entidades filantrópicas realizam a escravidão no Brasil pós-abolição e que esse pensamento está intimamente ligado a grupos nazistas.
Ele demonstra, depois de aproximadamente 40 anos da abolição da
escravidão, como o ranço do racismo era forte e presente na sociedade brasileira. Em síntese, o filme relata a vida de crianças órfãs negras que eram trazidas do Rio de Janeiro para uma fazenda no interior de São Paulo. Contudo, essa propriedade escondia o culto a ideologia nazista e os rastros da escravidão.
O documentário se desenrola expondo a história de três crianças que
foram levadas para a fazenda Cruzeiro do Sul, no município de Campina do Monte Alegre, interior de São Paulo, propriedade da família Rocha Miranda. Logo que chegam, essas três crianças negras enfrentam a falta de liberdade de ir e vir, são colocadas de frente com a falta de educação formal e com a imposição do trabalho forçado. Trabalhavam duramente apenas em troca de um prato de comida e sofriam duras punições. Passado um tempo, os seus nomes deram lugar aos números pelos quais seriam chamados. É desse fato que nasce o nome do documentário, “Menino 23”, já que Aloiso da Silva teve o nome substituído por esse número, e assim ficou conhecido na fazenda da família Rocha Miranda.
O primeiro ponto importante e que o filme aborda foi como o nazismo
fez parte da cultura brasileira, já que não há relatos de grandes repercussões do culto ao nazismo e de uma sociedade eugênica. Esse pensamento – que tinha grande repercussão nas décadas de 30 e 40 do século passado e contava com bastante seguidores – foi esquecido por envergonhar a história recente brasileira. Entretanto, as falas demonstram pouco ou quase nenhum conhecimento dessa situação ter acontecido em território nacional, uma vez que, ao pensarmos em nazismo, sempre é com o pensamento além- mar.
Nesse âmbito, o documentário acentua como a população brasileira e
como parte da elite tinha um pensamento de embranquecer a sociedade brasileira (processo de embranquecimento) e estava ligada ao culto ao nazismo. Além de notar esse branqueamento, é necessário abordar o fato de famílias estarem reproduzindo os modos escravocratas, já que essas traziam crianças negras para escravizá-las e desumanizá-las. Essa falta de humanidade não pode jamais ser esquecida, uma vez que se nota que no Brasil não há um culto aos direitos humanos e aqueles que os defendem são considerados pessoas de pensamento não tradicional.
Sob este prisma, o documentário denunciou a cor negra como marca
racial da discriminação e, também, como parte da elite brasileira estava ligada a regimes autoritários de extrema direita. Essa produção faz todos relembrar como o racismo ainda impera no nosso País.
Como um imenso soco no estômago, Menino 23 desnuda práticas
silenciosas da sociedade brasileira, que repercutem até os dias atuais pelo desinteresse na integração racial e econômica aqueles menos favorecidos e pela falta de oportunidades. Um filme contundente e necessário para entender o quanto o racismo está entranhado no jeito de ser brasileiro e na própria história de nosso País, potencializado pela trilha sonora pesarosa e o cuidado estético nas sequências de transição entre as imagens de época e os depoimentos gravados.