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Disciplina: Questões Étnico-Raciais

Professora: Claudia Furlanetto


Aluno: Pedro Jardel da Silva Coppeti

RELATÓRIO SOBRE A PALESTRA DA KEYLA LOPES A RESPEITO DAS


QUESTÕES E PAUTAS INDÍGENAS

Keila Lopes, índia Kaingang, pedagoga, com 25 anos de idade, é


solteira, não tem filhos, e possui como maior sonho “fazer valer a pena a luta que seus
avós tiveram”, ou seja, preservar as suas conquistas. Inicia a fala a respeito das
distorções históricas relativas ao descobrimento do Brasil, sobre as informações
equivocadas, especialmente aquelas que são divulgadas nas Escolas. Na realidade, em
suas palavras, disse que o que aconteceu foi uma invasão, uma vez que os povos
indígenas já existiam aqui no País.

Relata sobre a ocupação dos espaços por parte do seu povo Kaingang,
explanando sobre a história dos povos indígenas, destacando que o maior tronco
linguístico é o Tupi Guarani. No Brasil, segundo a palestrante, são faladas quase
duzentas (200) línguas, com aproximadamente 300 tribos. Muitos povos foram
obrigados a falar a língua portuguesa por imposição, porque eles não tinham condições
de sobrevivência e era considerado um povo pagão.

O branco chegou no Brasil esforçando-se para que os indígenas


perdessem sua cultura, sua língua e algumas práticas também, como a das ervas
medicinais. Assevera que, ao ver o indígena falar a língua portuguesa, também há uma
luta de resistência, tipo “o português indigenizado”.

Esclarece sobre a sua trajetória acadêmica, considerando-a uma luta


pessoal, uma conquista de seu povo, de sua coletividade. Aduz que ingressou em 2015,
com muita dificuldade, em uma Universidade Federal Pública. Seu pai, que tem muito
orgulho, trilhou e abriu este caminho, inclusive para seus outros seis irmãos, que
também ingressaram na Universidade e, inclusive, alguns já se formaram. Isso é motivo
de muito orgulho para sua comunidade. Estão fazendo isto com o intuito de regressar a
comunidade e devolver o conhecimento e tudo o que aprendeu através do ensino.

Hoje em dia os indígenas estão ocupando muito os espaços na


Universidade, na Escola e também na sociedade em geral. Tem orgulho disso como
pessoa e como mulher, acrescentando que a maioria das acadêmicas são mulheres.

Exterioriza que algumas colocações equivocadas são divulgadas na


sociedade brasileira, inverídicas, tipo “os índios estão perdendo a sua cultura”, pois os
índios já não estão mais nas aldeias, pintados, fazendo a dança da chuva. Para rebater
estas inverdades apresenta uma frase que anota “eu posso ser quem tu és sem deixar de
ser quem eu sou”, dito de outro modo, eu posso morar fora da minha aldeia, mas eu não
vou deixar de ser o que eu sou, a minha cultura, a minha origem, o meu povo.

O próprio termo índio para a palestrante já é pejorativo. Alerta que o


certo é ser chamado de indígena, refutando a comemoração do dia 19 de abril, “o dia do
índio”. Há necessidade de refletir sobre isso. Não é porque o indígena usa celular ou
anda de carro que não cultua mais os seus ancestrais e o seu povo. Essas tecnologias
também são usadas como meios de resistência, como meios para espalhar a “nossa voz,
os nossos conhecimentos”, são maneiras de divulgar a nossa história.

Esclarece ser uma questão de conscientização, pois a cultura não está


em um cocar apenas. Os indígenas são os povos originários. A importância do
apagamento, diante da gente não ter consciência da representatividade e da cultura
indígena. O adoecimento da população no sentido psicológico e isso está refletindo no
povo indígena. O preconceito e a discriminação acaba intervindo no dia-a-dia.
Infelizmente está ocorrendo o suicídio nas comunidades indígenas, não só pelo
apagamento, mas também em função da ausência da prática da religiosidade.

Exemplifica a religiosidade no fato de o Pagé ser considerado um


médico, que faz as práticas com as ervas medicinais, Deus da Natureza, a gente vê Deus
em tudo. O Pagé tem o total conhecimento desta prática para repassar aos demais. Hoje
em função dos desmatamentos, dos agrotóxicos, as ervas medicinais estão escassas. A
prática do Kuiã era muito forte, e hje está prática não está mais acontecendo, o que
colabora para as doenças psicológicas e para os suicídios entre o povo indígena.

Trata também das questões que envolvem a tutela indígena, a Justiça,


a incapacidade, as bebidas alcoólicas, sobre os indígenas ser preguiçosos e não gostarem
de trabalhar. Explica o funcionamento das leis indígenas que são aplicadas na
comunidade, leis internas, em relação ao casamento, conflitos familiares, existem regras
em cada situação, até mesmo a troca de cacicado, que é passado de geração a geração.
Quem executa os casos de violência, tipo a Lei Maria da Penha, por exemplo, é uma
comissão/conselho e o cacique. Explica sobre o castigo do tronco para quem cometeu
atos de violência contra a mulher. Também existe a prática da cadeia. Também na
separação é dado trinta (30) dias para se separar. O homem cometeu um adultério, saiu
da sua casa, a mulher tem direito a casa e a seus bens. Estas decisões são respeitadas por
todos. E com relação a leis dos brancos, sua aplicação?!. Tem uma questão cultural que
envolve isso. O indígena homem pode se relacionar com uma mulher branca e levá-la
para morar na tribo, na aldeia. Já o branco não tem direito de morar na aldeia junto com
a indígena, para evitar que dissemine sua cultura, uma vez que o sistema é patriarcal, o
homem é quem comanda, é o cabeça da casa e da comunidade. A palestrante admite que
esta cultura é machista, mas embora a questione, ela a respeita, “mas isso não me
diminui como mulher”. Em relação ao Pagé, ele é considerado o braço direito do
cacique. Com relação aos privilégios do cacique, ele tem sim, ele que julga, ele que dá a
palavra final de tudo o que acontece. Faz um relato sobre a aplicação da lei branca em
indígenas, especialmente sobre a entrada da cultura não indígena nas comunidades.

Ressalta que na atualidade têm ocorrido vários fatos, vários crimes,


especialmente contra os costumes de natureza sexual na comunidade indígena. E muitas
vezes o povo indígena tem que recorrer a Justiça do homem branco para a punição ou
para o auxílio das lideranças, especialmente quando acontece estes fatos tristes e
chocantes.

Como é a cultura do trabalho?!. Há uma mentira que ronda o homem


branco, que diz que o índio não trabalha. O trabalho é um modo de sobrevivência, e as
principais práticas do povo indígena era a caça e a pesca. É uma pecha equivocada. A
venda de artesanato é uma forma de cultura, de trabalho e de sobrevivência. Aduz que a
comunidade tem algumas pessoas que vão trabalhar na coleta de maças e de uvas. Tem
também alguns indígenas que trabalham nas escolas e nos postos de saúde. Assevera ser
um exemplo disso, no seu último estágio teve uma oportunidade para exercer o
magistério.

Alerta que o fato é que as comunidades trabalham para a


sobrevivência. É o descanso que é mal visto, porque os brancos, que vivem no mundo
capitalista, é que trabalham muito só para alcançar um patamar econômico alto. E não
laboram apenas pela sobrevivência como o índio. Nós vivemos neste turbilhão de
capital, de sociedade do consumo, de alto desempenho. Atender as necessidades não é
trabalhar insanamente. O significado de trabalho para o indígena é diferente do branco.

Com relação às ervas medicinais, há uma apropriação cultural em


relação a isso, sem dar a verdadeira origem. A origem destes remédios é indígena e isso
deve ser estudado, este conhecimento, este saber, deve ser destacado e atribuído a quem
tem esta sabedoria. O próprio Kuiã é considerado como um médico, faz testes,
aplicações das ervas medicinais.

Os principais desafios que a comunidade indígena enxerga hoje, as


maiores demandas, o que é importante para o povo são as formações das novas
gerações, como vamos revitalizar, rejuvenescer, trazer de volta a nossa cultura, através
das lutas, de ir em busca dos conhecimentos, de reinvindicações, não só de terras, mas
também cultural. Temos vários apoios das lideranças, das famílias, para ocupar espaços
nas Universidades, é um direito nosso também, a gente está com o intuito de depois de
formado voltar para a tribo e ensinar a eles o que aprendemos. Formo o meu plano de
aula através da minha realidade, dos desafios que me apresentam, do que os meus
alunos desejam aprender. Fazer estudos sobre as comidas típicas, pesquisas em relação
aos alimentos naturais, aprender o modo adequado do preparo das comidas típicas. Tudo
é uma questão cultural que é passada de geração a geração. Temos que aliar a parte do
conhecimento popular com o estudo científico. Assim, eu posso trazer estes
conhecimentos para os meus alunos.

O momento de alfabetização infantil das crianças indígenas, muda de


comunidade para comunidade. Na minha, é feita a partir das séries iniciais, a partir da
educação infantil, conhecida como pré-zinho. Hoje em dia é obrigatório estar
matriculado já a partir dos quatro (4) anos. Aprende a língua Kaingang primeiro, através
da oralidade e da escrita. E depois faz toda a relação da nossa língua com a língua
portuguesa. Em relação à faculdade, a maior dificuldade que eu senti, é que quando
ingressei foi muito desafiador, eu tive que me adaptar à Universidade. Eu me
perguntava porque a Universidade não se adaptava ao povo indígena também, a respeito
de saber a cultura indígena, de respeitá-la. Senti ainda dificuldade na parte da
tecnologia, embora soubesse de algumas coisas mais. Acredita que as universidades,
que tem o objetivo de formar profissionais e também seres humanos, tem que também
reconhecer, estudar, aprofundar-se sobre os assuntos e a cultura indígena.

Com base nos estudos eu quero, além de passar o que apreendi na


Universidade, ser diretora, lutando por uma educação diferenciada, voltada para os
nossos objetivos. A educação como um todo é muito importante, especialmente a
educação básica. Diz que é autora de sua própria história. É o autorrelato, nada melhor
do que nós mesmos para falarmos sobre as nossas lutas; por isso, esta oportunidade e
este espaço é muito importante.

Trouxe sua trajetória acadêmica. Sendo que seu primeiro professor e


que a alfabetizou foi o seu pai. Até a oitava série fez na aldeia, na comunidade indígena.
Por não ter o ensino médio na comunidade indígena teve que ir para a cidade, foi um
dos primeiros desafios que enfrentou. A captação dos conteúdos era difícil, pois seus
professores eram brancos. Talvez se os professores fossem indígenas seria mais fácil,
iria ajudá-la muito na sua adaptação e nos seus saberes. Sofreu racismo e também
preconceito.

No fim faz um apelo para que apoiemos o povo indígena e pede para
que sejamos mais humanos e que respeitemos a história, a cultura, a hospitalidade e os
costumes de seu povo.

Refere que não há nada escrito sobre as leis, disse que é mais cultural
e passada de geração a geração, com muito respeito. Isso se perpetua através das
conversas com os mais velhos, com as lideranças, através da coletividade, fazer destas
práticas uma atividade diária, para que isso não se perca.
Hoje a mulher indígena tem bastante destaque. É protagonista, não só
no caciqado (caciqua)

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