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ATITUS EDUCAÇÃO

Escola de Saúde

Curso de Psicologia

Avaliação de G2 em Psicopatologia da Infância e Adolescência

Estudo de Caso Clínico: Anorexia Nervosa na Adolescência

Pedro Jardel da Silva Coppeti

Porto Alegre

2023
Estudo de Caso Clínico: Anorexia Nervosa na Adolescência

1. Introdução

Os transtornos alimentares têm como principal sintoma uma

perturbação persistente no comportamento alimentar e/ou em outros aspectos

relacionados à alimentação e fazem parte de um grupo de sofrimentos

psíquicos. Nesses casos, em decorrência de alterações na absorção ou no

consumo de alimentos, observa-se prejuízos significativos tanto psicossocial

quanto físico (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION [APA], 2023).

A incidência e a prevalência de transtornos alimentares

relacionados à distorção da imagem corporal vêm crescendo de maneira

exponencial em vários países ao redor do mundo (BOSI, NOGUEIRA,

YUMIUCHIMURA, LUIS, & GODOY, 2014) e caracterizam-se cada vez mais

como uma área de interesse de pesquisadores e de agentes da saúde. A

formulação de um padrão estético a ser seguido pela sociedade, mais

comumente em mulheres, é influenciada pela propagação da cultura de corpo

magro. Nessa direção, a difusão dos modelos de beleza construídos

socialmente é, em grande parte, protagonizada pelos meios de comunicação,

que oferecem maior espaço e ênfase à estética.

Os transtornos alimentares são quadros conhecidos por aspectos

como ingestão maciça de alimentos, redução voluntária do consumo

nutricional, o medo mórbido de engordar, seguida de uso abusivo de diuréticos

e/ou laxantes e de vômitos.


Caracterizam-se como patologias de prognóstico reservado e

graves que trazem aos pacientes altos níveis de letalidade e elevados prejuízos

biopsicossociais (CORDÁS, 2004). Por isso, os profissionais da saúde têm se

interessado cada vez mais pelos transtornos alimentares. Porém, há carência de

estudos brasileiros sobre o tratamento dessas patologias sob a visão das várias

abordagens psicoterápicas, incluída a Terapia Cognitivo-Comportamental.

Um dos principais transtornos mentais é a anorexia nervosa

(AN), que se caracteriza por uma grave restrição associada à magreza extrema,

distorção da imagem corporal e aversão em ganhar peso. Há dois subtipos para

tal transtorno: anorexia purgativa e restritiva. A anorexia purgativa é

classificada como a aversão ao ganho de peso acompanhada de

comportamentos compulsivos ou purgativos. Finger e Guedes (2017) apontam

que a AN consiste em assumir comportamentos que levam a deixar de serem

atendidas as necessidades básicas calóricas para manter o organismo

adequadamente ativo através de uma restrição da ingestão de calorias. Isso tem

como resultado a diminuição significativa do peso corporal, a ponto de ficar

inferior ao peso mínimo normal em relação ao desenvolvimento, saúde física,

gênero e à idade. Já a anorexia restritiva é descrita como aquela em que a perda

de peso é associada a jejuns prolongados, atividades físicas e/ou dietas, e não

ocorrem episódios de formas compensatórias ou de compulsão alimentar, como

o uso de laxantes e/ou indução de vômito.

Anoréxicos apresentam pouca habilidade para reconhecer e lidar

com os próprios sentimentos, discriminar sensações que correspondem a si e ao

outro, o que traz marcantes prejuízos emocionais e sociais. Possuem identidade

frágil, percepção perturbada das experiências corporais e pouca capacidade


para distinguir o que é força necessária para a vida e o que é destrutivo

(SILVA, 2003). Põem em xeque a vida: reconhecem os riscos, mas os

desconsideram totalmente (GIORDANI, 2006). Exibem com frequência humor

deprimido, retraimento social, grande preocupação sobre comer em público,

interesse diminuído por sexo, sentimento de inutilidade, necessidade de

controlar o ambiente, pensamento inflexível, espontaneidade social limitada,

iniciativa e expressão emocional reprimidas. Ao longo da vida podem manter o

papel materno mal elaborado, apresentando má adaptação conjugal e

profissional. Seu curso e desfecho variam, podendo ir desde a recuperação total

após episódio isolado, até padrão flutuante de ganho de peso seguido de

recaídas, ou tornar-se crônica e deteriorante (BALLONE, 2006).

A anorexia nervosa (NA) prevalece no sexo feminino e vem

aumentando drasticamente nas últimas décadas (CASTRO; GOLDSTEIN,

1995), sendo que a incidência de novos casos em mulheres jovens (15 a 19

anos) pode chegar a 1,43 por 100 mil indivíduos por ano. Ocorre mais

frequentemente em jovens adultos e adolescentes do sexo feminino na

proporção de nove mulheres para um homem. A Anorexia geralmente inicia

durante a adolescência ou a adultez jovem. Em função de haver muitos casos

subdiagnosticados, acredita-se que a incidência seja maior.

A medida que se utiliza para determinar a normalidade do peso é

o índice de massa corporal. O IMC é calculado como o peso em quilogramas

dividido pela altura em metros quadrados. Sabe-se que, ao não distinguir massa

magra de gordura, o IMC apresenta falhas. Entretanto, permanece como um

bom índice de triagem para o ambiente clínico. Uma pessoa considerada com

um peso significativamente baixo corresponde a um IMC inferior a 17,0. Muito


embora não seja suficiente, este é um bom indicativo do preenchimento desse

critério de AN.

Na concepção cognitiva da NA, o esquema cognitivo da

“magreza” merece destaque, uma vez que, na visão dos pacientes é

fundamental para a resolução de seus problemas, pois as pessoas gordas seriam

malsucedidas e infelizes e as magras seriam bem-sucedidas. Desta maneira, o

sentimento de fracasso e vergonha e o humor deprimido associados aos

episódios do comer compulsivo ficam fáceis de compreender (FAIRBURN ET

AL., 1997).

O modelo cognitivo da AN, adaptado de Nunes (2006) e

Garfinkel e Garner (1982), aponta que a baixo estima do paciente, associada

com a preocupação exagerada com o peso, gera crenças distorcidas. O

desenvolvimento dos fatores que levam ao desenvolvimento podem ser de

caráter socioculturais, biológicos, culturais e familiares, ou seja, são

multifatoriais. Destarte, visto que os transtornos alimentares são cheios de

facetas e os pacientes comumente não aderem ao tratamento, é fundamental

uma avaliação criteriosa para que se chegue a um diagnóstico correto.

De outro lado, há grande dificuldade no tratamento da AN, em

função da resistência e da negação em mudar o comportamento quanto à perda

do peso. Anoréxicos regozijam-se com as restrições autoimpostas e não

desejam a cura. Não é incomum apresentar desconfiança com os médicos e

psicólogos e os verem como inimigos que querem realimentá-los e fazê-los

perder a vontade de controlar o peso.

Um dos caminhos para diminuir a estigmatização e

culpabilização associada à Anorexia Nervosa está em os profissionais de saúde


ressaltarem as causas genéticas e biológicas deste transtorno de natureza

alimentar.

Exposta esta breve introdução a respeito dos transtornos

alimentares, destacando-se a AN, passa-se ao relato de um caso clínico de uma

adolescente, extraído do Livro Psiquiatria da Infância e da Adolescência:

Casos Clínicos, cujo organizador é Francisco B. Assumpção Junior

(Organizador), objetivando verificar e explicar os principais aspectos do

transtorno, de acordo com o abordado na disciplina de Psicopatologia da

Infância e Adolescência, ministrada pela professora Francielle Machado Beria,

e com os elementos explicitados no introito, além de apontar possíveis

diagnósticos diferenciais e comorbidades, bem como fazer uma apreciação

sobre o processo de avaliação utilizado no livro.

2. Relato do Caso

Paciente L.S.F., adolescente, com 13 anos e 4 meses, sexo

feminino, natural de São Paulo, é filha primogênita de prole de dois (irmã com

11 anos), procura atendimento médico psiquiátrico com queixa principal de

perda de peso e recusa de alimentação, juntamente com humor deprimido.

Frequenta escola regular; no último ano, seu rendimento acadêmico diminuiu, e

paciente apresenta certo retraimento, recusando-se a participar de eventos

sociais. Muito embora apresente perda de peso e falta de percepção corporal,

queixando-se de que está acima do peso, recusa alimentos. Apresenta humor

deprimido.
Com relação à gestação e parto, a gravidez da mãe da paciente

não apresentou anormalidades, pré-natal sem intercorrências, parto normal, 36

semanas; Apgar 8/9, peso de nascimento 3.200g, alta com dois dias de vida,

exames normais.

Sob o aspecto do desenvolvimento neuropsicomotor importa

anotar que a paciente sustentou a cabeça com 3 meses, sentou-se sem apoio aos

6 meses, andou com 1 ano e 3 meses, pronunciou suas primeiras palavras aos

11 meses, falou corretamente aos 2 anos e 8 meses e o controle de esfíncter

ocorreu com 2 anos.

Observa-se, no contexto familiar, falta de limites entre os

membros que compõe a família da paciente, uma vez que não há respeito à

identidade individual. O genitor é às vezes ausente no âmago familiar. Em

relação a preocupações estéticas existem tendências perfeccionistas; os padrões

alimentares apresentam-se com o estabelecimento de regras e pseudoconceitos

nutricionais, não coincidindo com as reais necessidades.

Nada digno de nota com relação aos antecedentes familiares. O

exame neurológico não aponta anormalidades e o exame psíquico realizado

atesta um bom estado geral, com memória conservada, atenta, vigil, contato

pobre, vestes compostas, fácies atípica, bem emagrecida; o pensamento tem

curso normal, embora seja prevalente sua preocupação com seu peso e com sua

alimentação, referindo sempre estar acima do peso e não entendendo o porquê

da preocupação com seu atual estado. Orientada. Linguagem verbal expressiva.

Inteligência normal. Pragmatismo diminuído. Ansiosa e com humor deprimido.

Alteração na percepção de seu corpo, que considera obeso.


Sua avaliação psicológica aponta para um QI total = 112, ou

seja, nível intelectual médio. O estudo da personalidade mostra uma

personalidade infantilizada com tendência a teatralização e pano de fundo

depressivo. Observam-se excesso de disciplina, inflexibilidade e rigidez,

revelando insegurança e tendência a atividades do tipo ritualístico. Já os

exames complementares, hemograma, eletrocardiograma, urina I, ureia e

creatinina, provas de função tireoidiana e eletrencefalograma, todos dentro da

normalidade.

3. Hipótese Diagnóstica

A estrutura diagnóstica que consta para o caso clínico exposto

no Livro Psiquiatria da Infância e da Adolescência: Casos Clínicos, foi

elencada através de Eixos, a seguir discriminados:

Eixo I – Transtorno de Alimentação

Eixo II – Inteligência preservada

Eixo III – Nada digno de Nota

Eixo IV – Família estável, dinâmica satisfatória

Eixo V – Prejuízo na funcionalidade social esperada para a

idade

A forma como se chegou a essa estrutura diagnóstica também

foi demonstrada, com uma série de passos (9 ao total), e que incluem o exame

da queixa, a pesquisa e exame da paciente quanto aos aspectos médicos, ao seu

funcionamento cognitivo, as funções eventualmente alteradas e que apresentam

sintomatologia e as reflexões a respeito dos 5 Eixos.


4. Discussão: Critérios Diagnósticos e Diagnóstico

Diferencial

A paciente do caso clínico não é diferente da maioria das

pessoas que vivenciam os transtornos alimentares (seja a bulimia ou a anorexia

nervosa), uma vez que possui resistência sobre a gravidade de seus sintomas e

a necessidade de tratamento. Apesar de que na AN a dificuldade em fazer

contato com as perdas vivenciadas em decorrência do problema seja mais

prevalente.

Na hipótese em exame são apresentados sintomas que

preenchem critérios para diagnóstico de anorexia nervosa conforme o Manual

Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais, o DSM 5 - TR. A categoria

AN possui três critérios diagnósticos. A restrição da ingesta calórica em

relação às necessidades, levando a um peso corporal significativamente baixo

no contexto de idade, gênero, trajetória do desenvolvimento e saúde física

(definido como um peso inferior ao peso mínimo). Há medo intenso de ganhar

peso ou de engordar, ou comportamento persistente que interfere no ganho de

peso, mesmo estando com baixo peso e, a perturbação no modo como o próprio

peso ou a forma corporal são vivenciados influencia indevidamente a

autoavaliação do indivíduo ou há ausência persistente de reconhecimento da

gravidade do baixo peso corporal atual (Critérios A, B e C).

No caso clínico em análise, consoante já referido, a adolescente

apresenta claramente as três características essenciais da Anorexia Nervosa:

restrição persistente da ingesta calórica; medo intenso de ganhar peso ou de


engordar e perturbação na percepção do próprio peso ou da própria forma. A

paciente mantém seu peso corporal abaixo do minimamente normal para a

idade, gênero, trajetória do desenvolvimento e saúde física (Critério A). Não

obstante pelo exame psíquico realizado o pensamento da paciente apresente

curso normal, há uma preocupação prevalente e constante com o seu peso e

com sua alimentação, referindo sempre estar acima do peso e não entendendo o

porquê da preocupação com seu atual estado (Critério B). Também se observa

que a vivência e a significância do peso e da forma corporal são distorcidas na

adolescente, porquanto possui alteração na percepção de seu corpo, que

considera obeso (Critério C).

É muito provável que o contexto familiar e ambiental que

envolve a adolescente tenha contribuído para o prognóstico, tornando-se,

inclusive, um fator de risco importante para o nascimento da anorexia nervosa

na adolescente. O fato de a figura do pai ser às vezes ausente no âmago

familiar e ter participação afetiva muito discreta, aliado a falta de limites entre

os membros familiares, a ausência de respeito à identidade individual e,

especialmente, a existência de tendências perfeccionistas em relação a

preocupações estéticas são fatores possíveis de associação com este transtorno

alimentar.

Outrossim, outras características essenciais que estão associadas

à AN são o peso gravemente baixo e a apresentação de sinais e sintomas

depressivos, como humor deprimido, isolamento social e certo retraimento,

todas elas descritas no caso clínico.

De outro lado, não há indicação de que a paciente, nos últimos

três meses, tenha apresentado episódios recorrentes de compulsão alimentar ou


comportamento purgativo, e deste modo, seu quadro é compatível com o tipo

restritivo, aquele em que o indivíduo não se envolveu em episódios recorrentes

de compulsão alimentar. As alterações cognitivas comumente encontradas na

AN referem-se a grande concentração do paciente em seu peso corporal, com

grande frequência na verificação do peso e demonstração de grande

preocupação com a variação deste (mesmo que a variação seja mínima). Esses

pacientes possuem grande preocupação com a forma corporal, checando

repetidas vezes o próprio corpo em busca de mudanças (quase sempre nas

coxas, barriga e braços), além disso, há comparação do próprio corpo com o de

outras pessoas, concluindo que são menos atraentes. Em decorrência da

autocrítica em relação à própria aparência, esses pacientes possuem

dificuldades nas relações sociais (FAIRBURN, 2008).

No transtorno alimentar ora em exame são comuns determinadas

comorbidades. Nesse âmbito, pontua o Manual Diagnóstico e Estatístico de

Transtornos Mentais, DSM-5-TR, que os transtornos bipolares, depressivos e

de ansiedade em geral ocorrem concomitantemente com anorexia nervosa.

Muitos indivíduos com AN relatam a presença de transtorno de ansiedade ou

de sintomas de ansiedade antes do início do transtorno alimentar. O transtorno

obsessivo-compulsivo (TOC) é descrito em alguns indivíduos com anorexia

nervosa, especialmente naqueles com o tipo restritivo. O transtorno por uso de

álcool e outras substâncias pode também ser comórbido à anorexia nervosa,

sobretudo entre aqueles com o tipo compulsão alimentar purgativa,

representada por vômitos autoinduzidos ou uso indevido de laxantes, diuréticos

ou enemas. A priori, com os elementos que se dispõe, não é possível identificar

nenhuma comorbidade no caso clínico.


Para além de investigar as possíveis comorbidades

supradescritas, é necessário, especialmente para o profissional que conduz o

tratamento de transtorno alimentar, estabelecer diferenças entre a Bulemia e a

Anorexia Nervosa. As pessoas acometidas por BN mantém um peso corporal

eutrófico ou sobrepeso. Enquanto pacientes com AN, do subtipo compulsão

alimentar purgativa (em que as compulsões e as purgações são frequentes)

mantém peso corporal abaixo do indicado. Além disso, faz-se importante

evidenciar a possibilidade de “migração” de um quadro de anorexia nervosa

purgativa (dada a regularização do peso corporal e a distorção da imagem) para

BN, ou ainda, a consideração do diagnóstico de anorexia purgativa em

remissão parcial. Pessoas acometidas de bulimia nervosa exibem episódios

recorrentes de compulsão alimentar, adotam comportamento indevido para

evitar o ganho de peso (p. ex., vômitos autoinduzidos) e preocupam-se

excessivamente com a forma e o peso corporais.

Nessa mesma toada, é imprescindível considerar outras

possíveis causas de baixo peso corporal ou perda de peso significativa no

diagnóstico diferencial de anorexia nervosa, especialmente quando o quadro

for atípico (p. ex., manifestação depois dos 40 anos de idade). O diagnóstico

diferencial é feito no DSM-5-TR com transtorno alimentar restritivo/evitativo,

transtorno de ansiedade social, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno

dismórfico-corporal, transtorno pelo uso de substâncias, esquizofrenia,

transtorno depressivo maior e condições médicas.

Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos

Mentais, no transtorno depressivo maior pode ocorrer perda de peso grave, mas

a maioria dos indivíduos com esse transtorno não manifesta nem desejo de
perda de peso excessiva, nem medo intenso de ganhar peso. Indivíduos com

esquizofrenia podem exibir comportamento alimentar estranho e às vezes

apresentam perda de peso significativa, mas raramente manifestam o medo de

ganhar peso e a perturbação da imagem corporal necessários para um

diagnóstico de anorexia nervosa. Já indivíduos com transtornos por uso de

substâncias podem apresentar perda de peso devido à ingesta nutricional

deficiente, mas geralmente não temem ganhar peso e não manifestam

perturbação da imagem corporal. Pessoas com o transtorno alimentar

evitativo/restritivo podem exibir perda de peso ou deficiência nutricional

significativas, mas não temem ganhar peso ou se tornar gordos nem apresentam

perturbação na maneira como vivenciam a forma e o peso do próprio corpo. A

perda do peso também pode ocorrer em condições médicas (p. ex., doença

gastrointestinal, hipertireoidismo, malignidades ocultas e síndrome da

imonudeficiência adquirida – AIDS), mas indivíduos com estes distúrbios

geralmente não manifestam também perturbação na maneira como a forma ou

o peso de seus corpos é vivenciada, medo intenso de ganhar peso nem

persistem em comportamentos que interferem no ganho de peso apropriado. A

perda de peso aguda associada a uma condição médica às vezes pode ser

seguida pelo início ou por recaída de anorexia nervosa, que podem ser

inicialmente mascarados pela condição médica comórbida. Raramente, a

anorexia nervosa se desenvolve depois de um cirurgia bariátrica para

obesidade. Por fim, acentua-se que alguns dos aspectos da anorexia nervosa se

sobrepõem aos critérios para o transtorno de ansiedade social, TOC e

transtorno dismórfico corporal. Mais especificamente, os indivíduos podem

sentir-se humilhados ou envergonhados de serem vistos comendo em público,


como ocorre no transtorno de ansiedade social; podem exibir compulsões e

obsessões relacionadas a alimentos, como no TOC; ou podem ficar

preocupados com um defeito imaginado na aparência do corpo, como no

transtorno dismórfico corporal. Se o indivíduo com anorexia nervosa tiver

temores sociais que se limitem apenas ao comportamento alimentar, o

diagnóstico de transtorno de ansiedade social não deve ser feito, mas temores

sociais não relacionados ao comportamento alimentar (p. ex., temor excessivo

de falar em público) podem justificar um diagnóstico adicional de transtorno de

ansiedade social. Da mesma maneira, um diagnóstico adicional de TOC deverá

ser considerado apenas se o indivíduo exibir obsessões e compulsões não

relacionadas a alimento (p. ex., medo excessivo de contaminação), e um

diagnóstico adicional de transtorno dismórfico- corporal deverá ser

considerado apenas se a distorção não estiver relacionada à forma e ao tamanho

do corpo (p. ex., preocupação com o tamanho excessivo do próprio nariz).

Nesse aspecto, a mesma conclusão que se teve a respeito da não

existência de comorbidades é de ser dada também a respeito do diagnóstico

diferencial do respectivo caso clínico em análise, qual seja, mesmo

considerando a existência de outras causas possíveis de baixo peso corporal ou

perda de peso, nenhuma das que foram apresentadas acima foram constatadas

ou detém prevalência sobre a AN.

Importa anotar, por fim, que a hipótese diagnóstica levantada no

capítulo do livro está adequada, pois em consonância com os elementos

trazidos com o quadro clínico, especialmente relativos à queixa principal,

história, contexto familiar, exame psíquico, funcionamento cognitivo e

aspectos médicos.
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