Você está na página 1de 53

Universidade Federal de Catalão

Instituto de Biotecnologia
Departamento de Medicina

ATENÇÃO À SAÚDE NA PRÁTICA COMUNITÁRIA VII


Profº Dr. Dherik Fraga Santos
 Pessoas com tristeza e sintomas depressivos são muito comuns na
atenção primária à saúde (APS), mas a forma de apresentação mais
frequente é uma mescla de sintomas: dor crônica vaga, sintomas
ansiosos e depressivos.
 A maioria das pessoas com quadros leves e moderados melhora
espontaneamente ou com intervenções não medicamentosas, como
seguimento usual com médico de família, atividade física,
psicoterapias presenciais ou a distância.
 As intervenções medicamentosas apresentam bons resultados para
quadros leves e moderados, MAS SÃO IMPRESCINDÍVEIS APENAS
NOS CASOS GRAVES.
(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)
 NÃO HÁ DIFERENÇAS SIGNIFICATIVAS ENTRE OS DIVERSOS
ANTIDEPRESSIVOS DISPONÍVEIS EM RELAÇÃO AOS
RESULTADOS CLÍNICOS.
 Os INIBIDORES SELETIVOS DA RECAPTAÇÃO DA SEROTONINA
(ISRS) e os INIBIDORES SELETIVOS DA RECAPTAÇÃO DA
SEROTONINA E DA NOREPINEFRINA (ISRSN) têm sido os mais
indicados como primeira opção, pois apresentam menos efeitos
colaterais.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Há muitas e distintas formas de as pessoas manifestarem sofrimento, basta ver a
variedade de substantivos e adjetivos que cada língua cunhou ao longo de sua história
para expressar o mal-estar ou denominar aquele que sofre.

 Angústia, tristeza, desânimo, nervos, histeria, neurose, abatimento, depressão e


ansiedade são alguns exemplos em português.

 Ao se estudar os sintomas ou as manifestações desse desconforto íntimo em diferentes


culturas, vê-se que, sim, existem aspectos que são universais. Todas as pessoas sofrem,
choram, entram em pânico, ficam tristes, angustiam-se e, em algum momento, querem
morrer. Se as máscaras do sofrimento podem coincidir na expressão, ainda que em
outro tempo ou espaço, é em cada cultura que elas se sustentam, ganham significado
e são interpretadas.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Nas últimas décadas, é por meio do termo depressão que se define uma grande
variedade de sintomas e situações de sofrimento. Essa simplificação é própria da
biomedicina, que, há pelo menos dois séculos, constrói seu arcabouço teórico,
tendo como eixo a noção de que as doenças são entidades orgânicas homogêneas
e independentes das pessoas e dos espaços em que vivem.
 O médico de família e comunidade, na sua prática centrada na pessoa, precisa
relativizar o diagnóstico de depressão, assim como faz com a maioria dos outros
diagnósticos.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Para algumas pessoas e situações, sabe-se que o fato de haver um nome que
defina um problema ajuda; isso serve, por exemplo, para aqueles que são mais
pragmáticos e que gostam de seguir à risca as recomendações médicas. Pode ser
útil também para fins jurídicos, pois há sofrimentos que requerem algum tempo de
afastamento do trabalho, e rótulos simples funcionam melhor nesse meio.
 Para a comunicação entre pesquisadores de todo o mundo, também facilita haver
uma forma homogênea de classificar um grupo de sintomas. Por outro lado, a
ideia de uma entidade bem delimitada que existe em seu corpo, graças a um
desequilíbrio neuroquímico, pode ser extremamente imobilizadora naqueles casos
em que os sintomas pedem reflexões. O USO EXCESSIVO DA CATEGORIA
DEPRESSÃO PODE PRECIPITAR TAMBÉM A UTILIZAÇÃO DE MEDICAMENTOS,
a única opção terapêutica denominada antidepressiva.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 As classificações diagnósticas do DSM-5 e do CID-10 levam em conta apenas um
grupo de sintomas e a sua persistência para avançar em direção a um rótulo
diagnóstico, como o de depressão maior, o que pode desencadear efeitos
benéficos ou prejudiciais. A CIAP-2, mais voltada para a prática da APS, restringe-
se aos sintomas, sem a eleição de requisitos mínimos para definir uma entidade
nosológica.
 Utiliza-se, por exemplo, o código CIAP P-03 para tristeza/sensação de depressão,
em quadros mais leves, e o código CIAP P-76, para perturbações depressivas, nos
mais graves. Outra diferença se dá em relação ao que se define como transtorno
bipolar, do DSM-5, que é chamado psicose afetiva, na CIAP-2.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 A. Cinco (ou mais) dos seguintes sintomas estiveram presentes durante o mesmo
período de duas semanas e representam uma mudança em relação ao
funcionamento anterior; pelo menos um dos sintomas é (1) humor deprimido ou (2)
perda de interesse ou prazer.
 Nota: Não incluir sintomas nitidamente devidos a outra condição médica.

(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)


 1. Humor deprimido na maior parte do dia, quase  6. Fadiga ou perda de energia quase todos os dias.
todos os dias, conforme indicado por relato subjetivo
(p. ex., sente-se triste, vazio, sem esperança) ou por  7. Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva ou
observação feita por outras pessoas (p. ex., parece inapropriada (que podem ser delirantes) quase todos
choroso). (Nota: Em crianças e adolescentes, pode os dias (não meramente autorrecriminação ou culpa
ser humor irritável.) por estar doente).
 2. Acentuada diminuição do interesse ou prazer em  8. Capacidade diminuída para pensar ou se
todas ou quase todas as atividades na maior parte concentrar, ou indecisão, quase todos os dias (por
do dia, quase todos os dias (indicada por relato relato subjetivo ou observação feita por outras
subjetivo ou observação feita por outras pessoas). pessoas).
 3. Perda ou ganho significativo de peso sem estar  9. Pensamentos recorrentes de morte (não somente
fazendo dieta (p. ex., uma alteração de mais de 5% medo de morrer), ideação suicida recorrente sem um
do peso corporal em um mês), ou redução ou plano específico, uma tentativa de suicídio ou plano
aumento do apetite quase todos os dias. (Nota: Em específico para cometer suicídio.
crianças, considerar o insucesso em obter o ganho de
peso esperado.)
 4. Insônia ou hipersonia quase todos os dias.
 5. Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias
(observáveis por outras pessoas, não meramente
sensações subjetivas de inquietação ou de estar mais
lento).

(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)


 B. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no
funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do
indivíduo.
 C. O episódio não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância ou a outra
condição médica.
 Nota: Os Critérios A-C representam um episódio depressivo maior.
 Nota: Respostas a uma perda significativa (p. ex., luto, ruína financeira, perdas por um
desastre natural, uma doença médica grave ou incapacidade) podem incluir os
sentimentos de tristeza intensos, ruminação acerca da perda, insônia, falta de apetite e
perda de peso observados no Critério A, que podem se assemelhar a um episódio
depressivo. Embora tais sintomas possam ser entendidos ou considerados apropriados
à perda, a presença de um episódio depressivo maior, além da resposta normal a uma
perda significativa, também deve ser cuidadosamente considerada. Essa decisão
requer inevitavelmente o exercício do julgamento clínico baseado na história do
indivíduo e nas normas culturais para a expressão de sofrimento no contexto de uma
perda.*

(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)


 D. A ocorrência do episódio depressivo maior não é mais bem explicada por
transtorno esquizoafetivo, esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme, transtorno
delirante, outro transtorno do espectro da esquizofrenia e outro transtorno psicótico
especificado ou transtorno da esquizofrenia e outro transtorno psicótico não
especificado.
 E. Nunca houve um episódio maníaco ou um episódio hipomaníaco.
 Nota: Essa exclusão não se aplica se todos os episódios do tipo maníaco ou do
tipo hipomaníaco são induzidos por substância ou são atribuíveis aos efeitos
psicológicos de outra condição médica.

(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)


(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)
 Os sintomas dos critérios para transtorno depressivo maior devem estar presentes
quase todos os dias para serem considerados presentes, com exceção de
alteração do peso e ideação suicida. Humor deprimido deve estar presente na
maior parte do dia, além de estar presente quase todos os dias.
 Insônia ou fadiga frequentemente são a queixa principal apresentada, e a falha
em detectar sintomas depressivos associados resultará em subdiagnóstico. A
tristeza pode ser negada inicialmente, mas pode ser revelada por meio de
entrevista ou inferida pela expressão facial e por atitudes. Com os indivíduos que
focam em uma queixa somática, os clínicos devem determinar se o sofrimento por
essa queixa está associado a sintomas depressivos específicos. Fadiga e
perturbação do sono estão presentes em alta proporção de casos; perturbações
psicomotoras são muito menos comuns, mas são indicativas de maior gravidade
geral, assim como a presença de culpa delirante ou quase delirante.

(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)


 A característica essencial de um episódio depressivo maior é um período de pelo
menos duas semanas durante as quais há um humor depressivo ou perda de interesse
ou prazer em quase todas as atividades (Critério A). Em crianças e adolescentes, o
humor pode ser irritável em vez de triste.
 O indivíduo também deve experimentar pelo menos quatro sintomas adicionais,
extraídos de uma lista que inclui mudanças no apetite ou peso, no sono e na atividade
psicomotora; diminuição de energia; sentimentos de desvalia ou culpa; dificuldade
para pensar, concentrar-se ou tomar decisões; ou pensamentos recorrentes de morte ou
ideação suicida, planos ou tentativas de suicídio.
 A fim de contabilizar para um episódio depressivo maior, um sintoma deve ser recente
ou então ter claramente piorado em comparação com o estado pré-episódico da
pessoa. Os sintomas devem persistir na maior parte do dia, quase todos os dias, por
pelo menos duas semanas consecutivas. O episódio deve ser acompanhado por
sofrimento ou prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, profissional
ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Para alguns indivíduos com
episódios mais leves, o funcionamento pode parecer normal, mas exige um esforço
acentuadamente aumentado.

(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)


 O humor em um episódio depressivo maior frequentemente é descrito pela pessoa
como deprimido, triste, desesperançado, desencorajado ou “na fossa” (Critério
A1). Em alguns casos, a tristeza pode ser negada de início, mas depois pode ser
revelada pela entrevista (p. ex., assinalando que o indivíduo parece prestes a
chorar).
 A perda de interesse ou prazer quase sempre está presente, pelo menos em algum
grau. Os indivíduos podem relatar menor interesse por passatempos, “não se
importar mais” ou falta de prazer com qualquer atividade anteriormente
considerada prazerosa (Critério A2).

 Quando as alterações no apetite são graves (em qualquer direção COMER MAIS
ou COMER MENOS), pode haver perda ou ganho significativos de peso, ou, em
crianças, pode-se notar insucesso em obter o ganho de peso esperado (Critério
A3).

(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)


 Perturbações do sono podem assumir a forma de dificuldades para dormir ou
dormir excessivamente (Critério A4). Quando a insônia está presente, costuma
assumir a forma de insônia intermediária (p. ex., despertar durante a noite, com
dificuldade para voltar a dormir) ou insônia terminal (p. ex., despertar muito cedo,
com incapacidade de retornar a dormir). A insônia inicial (p. ex., dificuldade para
adormecer) também pode ocorrer.

(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)


 As alterações psicomotoras incluem agitação (p. ex., incapacidade de ficar
sentado quieto, ficar andando sem parar, agitar as mãos, puxar ou esfregar a
pele, roupas ou outros objetos) ou retardo psicomotor (p. ex., discurso, pensamento
ou movimentos corporais lentificados; maiores pausas antes de responder; fala
diminuída em termos de volume, inflexão, quantidade ou variedade de conteúdos,
ou mutismo) (Critério A5)
 Diminuição da energia, cansaço e fadiga são comuns (Critério A6). O indivíduo
pode relatar fadiga persistente sem esforço físico. Mesmo as tarefas mais leves
parecem exigir um esforço substancial.
 O sentimento de desvalia ou culpa associado com um episódio depressivo maior
pode incluir avaliações negativas e irrealistas do próprio valor, preocupações
cheias de culpa ou ruminações acerca de pequenos fracassos do passado (Critério
A7).

(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)


 Muitos indivíduos relatam prejuízo na capacidade de pensar, concentrar-se ou
tomar decisões (Critério A8). Essas pessoas podem mostrar-se facilmente
distraídas ou queixar-se de dificuldades de memória.

(American Psychiatric Association; DSM-5, 2014)


A MAIOR PARTE DOS CASOS DE DEPRESSÃO PODE SER MANEJADA NA
APS, COM INTERVENÇÕES PSICOSSOCIAIS E TRATAMENTO
MEDICAMENTOSO, SE NECESSÁRIO.

Fatores de risco:

 Doença crônica (ex. diabetes, câncer, outros transtornos mentais)


 Doença aguda grave recente (ex. AVC, IAM)
 Mulher no período puerperal, com transtorno disfórico pré menstrual e na menopausa
 Estressor social (ex. desemprego, separação)
 Falta de apoio social
 Uso de álcool ou outras drogas
 Idade avançada
 História familiar de depressão
 Episódio prévio de depressão
 Realizar a aplicação do questionário PHQ-9,
composto por nove questões. Pontuação ≥ 9
indicam rastreio positivo para episódio
depressivo (BRASIL, 2022).
 Há duas respostas possíveis para essa crítica à APS: uma é a de que os atuais
critérios diagnósticos, especialmente os do DSM e seus questionários validados,
promovem um sobrediagnóstico ao incluir crises corriqueiras da vida em seu rol.
 A outra é a de que, na APS, não é necessário haver um diagnóstico para que se
tenha escuta, cuidado e melhora dos sintomas.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Os estudos de prevalência sobre os chamados transtornos mentais apontam que
aproximadamente 50% DAS PESSOAS TERÃO, EM ALGUM MOMENTO DA VIDA,
uma ou mais alterações dignas de serem classificadas como um diagnóstico
psiquiátrico.

 Os transtornos de ansiedade responderiam por 28,8% desses casos, e os


transtornos de humor, por 20,8% (KESSLER, 2016).

 Esses estudos têm uma implicação prática para os profissionais da APS e, em


especial, para os médicos de família e comunidade, que é a afirmação recorrente
de que há subdiagnóstico de transtornos mentais em sua prática, já que menos da
metade das pessoas potencialmente afetadas receberia um diagnóstico
psiquiátrico.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 A prevalência de 12 meses do transtorno depressivo maior nos Estados Unidos é
de aproximadamente 7%, com acentuadas diferenças por faixa etária, sendo que
a prevalência em indivíduos de 18 a 29 anos é três vezes maior do que a
prevalência em indivíduos acima dos 60 anos. Pessoas do sexo feminino
experimentam índices 1,5 a 3 vezes mais altos do que as do masculino, começando
no início da adolescência.
 Uma pesquisa realizada em 2013, no Brasil, identificou a prevalência de 7,6%
entre os adultos, com maior presença entre as mulheres (10,9%) e na população de
60 a 64 anos (11,1%). É maior também entre aqueles que se declararam brancos
(9,0%), moradores de regiões urbanas (8,0%) e na região sul do país (12,6%).

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Para uma pessoa com tuberculose, pode ser mais fácil explicar a fisiopatologia da
doença, ainda que os motivos pelos quais a contraiu possam ser tão obscuros
quanto os que fizeram com que o outro contactante não a contraísse.
 Apesar da heterogeneidade das narrativas de dor ou de sofrimento presentes na
APS, há determinadas condições que podem precipitar crises mais
frequentemente. Cada médico aprende sobre esses nós mais comuns da sua
população a partir da observação cotidiana das pessoas, das famílias, do seu
modo de vida, da situação econômica, dos valores morais e religiosos, de como
pensam e se comportam rotineiramente.
 Dificuldades da vida cotidiana que podem provocar crises de tristeza ou
ansiedade. Ao reconhecê-las, o médico pode avançar naquilo que Balint chamou
de “o exame pelo paciente.”

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Em relação a outras situações clínicas que podem provocar sintomas depressivos,
facilita o fato de a maioria das pessoas já serem conhecidas dos profissionais da
APS, o que evita muitas perguntas de check-list, como sobre o uso de bebidas
alcoólicas e outras drogas, comorbidades, história de doenças e internações.
 Não será necessário solicitar exames laboratoriais para hipotireoidismo para
todas as pessoas com sintomas depressivos. A avaliação clínica e a identificação
de outros sinais e sintomas, além da lentidão psicomotora, ganho de peso,
ressecamento da pele, constipação e eventualmente edema de membros inferiores,
auxiliarão nessa decisão.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)
(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)
 O médico de família e comunidade deve pensar em psicose afetiva (ou transtorno
bipolar) se, na história, surgirem períodos de intensa e incontrolável excitação e
euforia alternadamente aos sintomas depressivos, ou naqueles em que o uso de
antidepressivos provoque agitação psicomotora.
 Pessoas que apresentam essa variação de humor intensa constituem um desafio
para os médicos de família e também para psiquiatras experientes.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Há muitas opções efetivas para o atendimento às pessoas com tristeza intensa e
perturbações depressivas na APS. A SIMPLES ABORDAGEM INICIAL, AO SE
FAZER UMA BOA ESCUTA E PERMITIR QUE A PESSOA EXPONHA SUAS
INQUIETAÇÕES, É SUFICIENTE PARA LIDAR COM A MAIORIA DOS CASOS.
Estudos demonstram que a qualidade da atenção às pessoas com sintomas
depressivos É MAIOR QUANDO ELAS PARTICIPAM MAIS ATIVAMENTE DO
ENCONTRO E QUANDO OS MÉDICOS EXPLORAM E VALIDAM SUAS
PREOCUPAÇÕES.
 Talvez o maior desafio para as equipes de APS seja separar, já no primeiro
atendimento, os casos muito graves, ou seja, os que necessitarão intervenções
mais precoces e os que podem ser acompanhados com mais calma na sequência.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 É importante lembrar-se dos alertas
vermelhos, sinais de gravidade que
os profissionais da APS devem ter
em mente ao perceberem que se
trata de alguém com sintomas
depressivos graves

Fluxograma para atendimento a pessoas com sintomas


depressivos na atenção primária à saúde.
ISRS, inibidores seletivos de recaptação de serotonina.
(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)
Fluxograma de avaliação e tratamento do episódio
depressivo na Atenção Primária à Saúde (BRASIL, 2022)
 Se há a percepção de que se trata de um sofrimento intenso e a pessoa não
verbalizou durante a consulta que tem pensado em suicídio, pode ajudar muito
perguntar sobre isso. Como o suicídio é carregado de valores morais e religiosos
negativos, as pessoas muitas vezes têm medo de falar sobre esses pensamentos, o
que pode ser uma carga a mais. Conversar sobre esse tema, explicar que são
pensamentos recorrentes para a maioria das pessoas e mais ainda para aqueles
que passam por dificuldades pode ser muito terapêutico.
 Sabe-se que o suicídio é identificado conforme a frequência com que é
questionado pelos profissionais que realizam o atendimento, e que
APROXIMADAMENTE 75% DOS INDIVÍDUOS QUE COMETERAM
SUICÍDIO PROCURARAM OS SERVIÇOS DE APS NOS MESES
ANTERIORES.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Além do acesso fácil aos serviços de saúde e de uma boa abordagem inicial, o
seguimento continuado é fundamental, especialmente para as pessoas com
sintomas moderados e graves. Essa é mais uma vantagem da APS em relação aos
serviços especializados, porque os encontros entre os profissionais e as pessoas
que ele acompanha não são motivados apenas por um problema e ocorrem
inúmeras vezes ao longo do tempo por queixas diversas.
 Os ensaios clínicos e metanálises sobre o seguimento de pessoas com sintomas
depressivos na APS não costumam apresentar resultados claros em relação às
diferentes abordagens possíveis. Isso se deve, entre outras coisas, às dificuldades
técnicas que esses estudos encontram para definir homogeneamente o que é caso;
para padronizar intervenções quando as personalidades de profissionais e
consultantes são tão importantes quanto diferentes; e para definir o que seriam os
desfechos desejáveis.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Diversas terapias têm sido utilizadas e testadas para pessoas com sintomas
depressivos.
 Atividade física regular, terapia cognitivocomportamental (TCC),
acompanhamento com médico de família e comunidade e tratamento
medicamentoso demonstraram impactos significativos.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)
(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)
 AS PSICOTERAPIAS MAIS UTILIZADAS são as Terapia Cognitivo-comportamental
(TCC), e a terapia de resolução de problemas (TRP).

 Há modalidades mais recentes de TCC, como as autoguiadas (feitas pelo


computador) ou à distância, com a ajuda de psicoterapeuta.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Em relação aos medicamentos, os principais têm apresentado nos ensaios clínicos
bons resultados no alívio dos sintomas depressivos, leves a graves, mas esses
estudos são feitos em condições especiais de cuidado e com uma amostragem
particular de voluntários que os distanciam das situações comuns da APS.
 Diferentemente da visão geral dos protocolos clínicos, em que um diagnóstico e
um tratamento corretos levarão à remissão completa dos sintomas, o que se vê na
prática clínica comum são respostas mais heterogêneas ao uso dos
medicamentos.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 O médico de família costuma perceber essa heterogeneidade na utilização e nas
respostas ao medicamento em sua prática clínica, e isso não pode ser atribuído
unicamente ao erro de avaliação do profissional.
 O padrão-ouro visto nos protocolos clínicos – de remissão dos sintomas em 4 a 8
semanas e manutenção do tratamento por 6 a 12 meses – é confrontado na APS com
aquelas pessoas que se sentem melhor já no primeiro dia de utilização do medicamento
e com outras que relatam ter melhorado, apesar de confessarem depois utilizar o
medicamento apenas quando se sentem mal. Há, ainda, muitas pessoas que vêm
utilizando antidepressivos continuadamente há anos e estabelecem uma relação afetiva
com ele.
 Na APS, é importante pensar o medicamento para além do efeito químico e do efeito
placebo; ele costuma fazer parte da comunicação com o consultante no momento de
encontrar um terreno comum para o manejo dos problemas ou sintomas.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Existem várias classes de medicamentos antidepressivos, mas os mais conhecidos e
utilizados são os antidepressivos triáclicos (ADTCs), os inibidores seletivos de recaptação de
serotonina (ISRS) e os inibidores seletivos de receptação de serotonina e norepinefrina
(ISRSN). A diferença na efetividade entre as diferentes classes de antidepressivos é pequena;
assim, a escolha do medicamento deve ser baseada nas necessidades da pessoa.
 Por exemplo, entre os ISRS, a sertralina parece ter efeito mais rápido quando comparada aos
outros medicamentos da mesma classe, porém provoca mais vertigem, náuseas e vômitos.
 A paroxetina está relacionada à maior sedação e ganho de peso, e a fluoxetina é a que provoca
menos alteração no peso. Os ADTCs estão relacionados à maior sedação e ganho de peso, com
exceção da nortriptilina, que é menos sedativa.
 A bupropiona não ocasiona disfunção sexual e pode induzir perda de peso, mas provoca mais
cefaleia e insônia.
 Os ISRSN parecem ter uma resposta ligeiramente melhor do que os ISRS na melhora dos
sintomas, mas apresentam maiores taxas de efeitos adversos, como náuseas e vômitos.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 As reações adversas são muito comuns, entre os usuários de ISRS e ISRSN, em
torno de 63% apresentam pelo menos um efeito durante o tratamento. Além de
náuseas e vômitos, diarreia, tontura, boca seca, fadiga, dor de cabeça, disfunção
sexual, sudorese, tremor e ganho de peso são frequentemente descritos.

 Os antidepressivos devem ser usados com cautela em idosos, citalopram,


escitalopram e setralina são preferidos entre os demais. Paroxetina e fluoxetina
estão mais associados com efeitos colinérgicos.

 A escolha do medicamento deve ser feita respeitando as necessidades do


consultante e como parte de uma aliança terapêutica em que o contexto de vida e
do sofrimento sempre seja abordado.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 A retirada dos antidepressivos pode ser bastante difícil, além da síndrome de
descontinuidade, que provoca sintomas variados, como tontura, náusea, letargia e
cefaleia, a pessoa pode recear a volta das sensações iniciais e ter de lidar com
elas e com seus significados. A RETIRADA GRADUAL DO MEDICAMENTO PODE
AJUDAR A DIMINUIR ESSES EFEITOS.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 A maioria das situações pode ser manejada na APS, mas algumas podem
requerer o apoio de um psicólogo, psiquiatra, assistente social ou de instituições.
 Naqueles casos em que há sinais de gravidade, os alertas vermelhos, ou quando
há dúvidas sobre o quadro clínico, como com a suspeita de psicose afetiva
(transtorno bipolar) ou quando há sintomas psicóticos, pode ser interessante
contatar precocemente a equipe de saúde mental. Do mesmo modo, em relação
àquelas pessoas que não melhoram após alguns meses de seguimento ou cujo
estado se agrave muito.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


(BRASIL, 2022)
 ► Rotular ou aceitar precocemente o rótulo ► Evitar oferecer o antidepressivo como uma
de depressão sem explorar o contexto de das opções terapêuticas.
sofrimento.
 ► Naqueles casos em que o antidepressivo
 ► Manter e renovar continuadamente foi introduzido como opção terapêutica,
prescrições de ansiolíticos e de utilizar uma dose inadequada ou
antidepressivos sem aproveitar para rever a insuficiente para a melhora dos sintomas.
indicação, os sintomas iniciais, os benefícios
e malefícios do uso desses medicamentos.  ► Não solicitar apoio de outros profissionais
da APS ou do Núcleo de Apoio à Saúde da
 ► Atender repetidas vezes pessoas com Família (NASF) para situações graves ou
dores crônicas vagas e mal-estar sem usar o que não apresentaram a melhora esperada.
tempo para aprofundar esse sofrimento.
 ► Não conversar sobre suicídio nos casos
► Iniciar antidepressivos sem haver moderados e graves.
aprofundado minimamente os sintomas e o
contexto de sofrimento.
(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)
 As consequências do problema que aqui foi chamado “perturbações depressivas”
podem ser analisadas de diferentes formas. O efeito mais importante deles, no
entanto, que é o impacto que cada pessoa sente ao sofrer profundamente, talvez
seja o mais difícil de medir ou avaliar.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 O que se vê na prática da APS é essa heterogeneidade na forma de sofrer e nas
implicações desse sofrimento para a vida de cada um. Algumas vezes, o
“ensimesmamento” provocará sérias e irreparáveis consequências na dinâmica
familiar, nas relações de trabalho, etc. Em outras, parece haver mudanças
positivas na situação de vida daquela pessoa, que, de algum modo, foram
promovidas, porque o mal-estar e a tristeza empurraram-na nesse sentido. Há
também aqueles casos em que esse sofrimento socialmente aceito, que tem sido
em geral sintetizado na ideia de depressão, pode imobilizar as pessoas, mantê-las
no mesmo lugar por muitos anos, na mesma dinâmica familiar, trocando de
medicamentos e recebendo benefícios sociais.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 Vários estudos epidemiológicos têm encontrado uma maior morbidade e
mortalidade por doenças crônicas e agudas entre as pessoas com os chamados
transtornos mentais do que em outros grupos. Não é uma associação difícil de ser
feita para o médico de família que vê e entende as pessoas que atende de um
modo integral, sem separá-las em mente e corpo.
 O SUICÍDIO TEM SIDO APONTADO COMO O DESFECHO MAIS INDESEJADO
NOS TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS. De acordo com Maris, até 90% das
pessoas que se suicidam teriam algum diagnóstico psiquiátrico, e as perturbações
depressivas representariam a maioria desses casos.
 A probabilidade de antecipar uma tentativa séria de suicídio na APS pode ser
menor de 8% menor do que o encontrado nesse estudo.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


Quebra de confidencialidade: Em situações que
envolvem risco de vida, a quebra de
confidencialidade é permitida. A segurança do
paciente deve ser uma prioridade. Se o paciente
não concordar, o contato deve ser realizado para
informar o risco.

Quando houver casos suspeitos ou confirmados de violência autoprovocada


(suicídio consumado; tentativa de suicídio; ato de automutilação, com ou sem
ideação suicida), realizar notificação compulsória imediata (Portaria nº
204/GM/MS, de 17 de fevereiro de 2016 e Lei nº 13.819, de 26 de abril de
2019), por meio da Ficha de Notificação de Violência Interpessoal
Autoprovocada.

(BRASIL, 2022)
 Pouco se sabe sobre as motivações de pessoas ou de grupos para terminar com a
própria vida, e não parece haver um denominador comum para uma questão que
mescla aspectos morais, religiosos, familiares e psicológicos envolvidos.
 De qualquer forma, como apontado, é fundamental valorizar esse tema na
abordagem de pessoas com sintomas depressivos, especialmente os quadros
graves.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 É importante lembrar-se sempre de que o SOFRIMENTO É ALGO INERENTE À
EXPERIÊNCIA HUMANA. A medicalização das emoções é um fenômeno atual do
qual o médico precisa proteger as pessoas e a si mesmo.
 Não há e nem nunca houve como fugir do sofrimento e da frustração. Segundo
Freud, as tentativas coletivas de criar um mundo menos hostil e as individuais para
fugir dos relacionamentos com as pessoas (como o isolamento social dos eremitas)
apenas provocarão outras formas de mal-estar. Reconhecer a sua necessidade de
prazer e as limitações que se impõem a si mesmas e as impostas pela vida pode
ajudar as pessoas.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 O papel da equipe multidisciplinar na APS é essencial em todos os aspectos da
abordagem da tristeza, da sensação de depressão e das perturbações
depressivas.
 A enfermeira, o assistente social e também os técnicos de enfermagem podem
prover suporte, aconselhamentos e reassegurar a importância de participar em
atividades de grupo, realizar exercícios físicos, orientar as dúvidas, incentivar
condutas positivas e otimistas, assim como repassar suas observações ao médico
de família para que ele possa contemplar outras percepções sobre a pessoa ou a
família envolvida.

(GUSSO; LOPES; DIAS, 2019)


 American Psychiatric Association. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos
mentais [recurso eletrônico] : DSM-5 Tradução: Maria Inês Corrêa Nascimento ... et
al.] ; revisão técnica: Aristides Volpato Cordioli ... [et al.]. – 5. ed. – Dados
eletrônicos. – Porto Alegre : Artmed, 2014.
 Gustavo Gusso, José Mauro Ceratti Lopes, Lêda Chaves Dias. Tratado de medicina
de família e comunidade: princípios, formação e prática [recurso eletrônico].
[coordenação editorial: Lêda Chaves Dias]. – 2. ed. – Porto Alegre : Artmed, 2019.
 BRASIL. Ministério da Saúde. Linhas de cuidado: Planejamento terapêutico –
Depressão. 2022. Disponível em:
https://linhasdecuidado.saude.gov.br/portal/depressao/unidade-de-atencao-
primaria/planejamento-terapeutico/#Abordagem/Tratamento&#pills-fluxograma-
de-avaliacao
 BRASIL. Ministério da Saúde. Linhas de cuidado: Diagrama de risco suicida. 2022.
Disponível em: https://linhasdecuidado.saude.gov.br/portal/depressao/unidade-
de-atencao-primaria/manejo-inicial-conduta/#pills-diagrama-do-risco

Você também pode gostar