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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE LINGUAGENS
DEPARTAMENTO DE LETRAS
COORDENAÇÃO DE ENSINO DE GRADUAÇÃO EM LETRAS

SEM VACINAS PARA TODOS, 400 MIL MORTES SÃO VIDAS, NÃO
ESTATÍSTICAS: NAS VOZES DA CAPA DO JORNAL EXTRA.

Bruna Kerolaine Alves Ferreira

Atualmente, é possível perceber que os gêneros produzidos na esfera


jornalística são uma construção discursiva de um fato, relato de acontecimentos que
tiveram lugar recentemente. No mundo contemporâneo a esfera jornalística é de
grande importância, pois é através das informações que circulam por este espaço
que a sociedade contemporânea toma conhecimento das atuais ocorrências,
dependendo do modo como os enunciados são apresentados, podem, em maior ou
menor grau, influenciar a interpretação dos fatos e o comportamento tanto individual
quanto coletivo. Na sociedade (pós) moderna, a mídia passou a ser o espaço por
excelência em que as informações têm curso, os veículos de comunicação são
responsáveis de apresentarem as informações do cotidiano como enunciados de
determinados gêneros midiáticos. Diante disso, faz-se necessário problematizar a
mídia e suas cenas enunciativas de apresentação de versões da realidade. Nessa
perspectiva, a análise se baseia nos efeitos de sentidos produzidos pela capa do
jornal Extra (Rio de Janeiro – RJ), do dia 30 de abril de 2021. O fato noticiado é o
registro da triste marca de 400 mil mortes no país, devido à Covid-19, a tragédia do
vírus no Brasil, não é visível apenas na impressionante marca atingida nesta quinta-
feira (29), segundo o consórcio dos veículos de imprensa. Em meio a falta de
vacinas e um governo questionado em CPI por sua ação na pandemia, o peso do
novo coronavírus sobre o sistema de saúde também surge em outro indicador —
uma em cada cinco mortes notificadas no país (21,7%) desde março do ano
passado é decorrente da doença. A publicação mostra o mapa do Brasil formado por
diversas frases que dão perfil às vítimas da pandemia do novo coronavírus. "Meu
pai", "Minha filha", "Minha mãe", "Minha professora", essas são algumas das
citações que compõem a arte na capa. O fato teve grande repercussão nas redes
sociais, causando uma onda de reações emocionadas de leitores.
A primeira página do jornal (a capa) destaca-se nesse cenário por anunciar
notícias consideradas destaque da edição, que chega ao leitor, dentre outras
formas, pela distribuição nos endereços dos assinantes ou nos pontos de
comercialização (bancas). Ressalta-se assim que a capa tem um papel importante,
pois, além de visar despertar o interesse do leitor pelo conteúdo do jornal,
consequentemente, pretende vender o jornal. Ou seja, tem relevância para a saúde
financeira do negócio jornal, tanto que há uma preocupação extra com a estética e o
designer aplicados a essa página. Por contemplar produções enunciativas (verbais e
visuais) que trazem à tona embates ideológicos verificados em diferentes segmentos
sociais, a capa de jornal configura-se como vasto e rico material para os estudiosos
da linguagem que têm como objeto de investigação o discurso dialógico. Quanto ao
jornal Extra, que veicula a capa a ser analisada, é valido destacar que, a Covid-19 é
a maior tragédia da história brasileira, tendo início no dia 26 de fevereiro de 2020,
quando o primeiro caso foi notificado em São Paulo, com passageiros egressos da
Itália. Segundo o Ministério da Saúde, no Brasil em 2020, o vírus matou mais que a
H1N1, dengue e sarampo em todo ano de 2019. Além disso, já superam o total de
mortos em eventos como a Gripe Espanhola (35.240 mortos) e a Guerra do
Paraguai (50 mil soldados mortos). A fim de comtemplar a proposta deste artigo,
torna-se necessário contextualizar o episódio que originou a capa do jornal Extra, do
dia 30 de abril de 2021, que traz como destaque a imagem do mapa do Brasil
composto de diversos enunciados entre eles: “400 mil mortos”; “minha mãe”; “meu
pai”; “meu marido”; “minha filha” e outros. Essa chamada refere-se as vidas ceifadas
pela à Covid-19, que nesta data mencionada infelizmente registrou a marca de 400
mil vítimas e praticamente todos conhecem alguém ou até mesmo familiares e
amigos que veio a óbito por essa trágica doença.
A esfera jornalística é um espaço privilegiado de instituição e produção de
sentidos, a partir de uma encenação discursiva construída pelas informações que ali
são publicadas. Será analisada as estratégias que os profissionais da área
escolhem para posicionarem sobre um fato do cotidiano, são esses efeitos de
sentido produzidos por elas que vão ser consideradas na análise da capa do Jornal
Extra do dia 30 de abril de 2021, edição que traz a ampla informação dos 400 mil
mortos por Covid-19. Para análise, tem-se como referência as normas éticas que
regem a atividade dos profissionais da área e indicam os critérios de padronização
da produção jornalística. As categorias analíticas estão estruturadas, por razões
metodológicas, em dois grupos interdependentes. O primeiro deles apresenta uma
reflexão acerca da capa do jornal em estudo e de efeitos produzidos pelos recursos
visuais utilizados (como cor, espaço e elementos gráficos). O segundo grupo analisa
os recursos verbais eleitos para a construção da capa, considerando (a)
designações utilizadas para a chamada sobre os 400 mil mortos e, de modo sucinto,
assim, produzem efeitos diversos.

Figura 1: Capa do jornal Extra da edição de 30 de abril de 2021.


1. A capa do jornal e os recursos visuais
Na capa da edição de 30 de abril do Extra, foco desta análise, a chamada
sobre os 400 mil mortos ocupa a parte superior abaixo do nome do periódico e o
mapa do Brasil formado por diversas frases ocupa todo o espaço restante da capa
com o tamanho padrão de 12cm de largura por 8cm de altura. Na parte superior da
página ocupa o nome do jornal e na lateral informações sobre o jornal como: a
edição, local de publicação, valor e entre outros. Quanto aos aspectos visuais da
página, há de se destacar ainda o uso da cor preta. A cor preta no contexto da morte
é culturalmente o símbolo do luto, no Brasil, sendo assim, a revista traz consigo a
aspecto do luto generalizado, solidarizando com o sofrimento de cada pessoa que
perdeu um ente querido, em luto por chegar a esta marca. É usado outras cores na
escrita das frases, variando o tamanho e a fonte das letras para chamar a atenção
do leitor, cores que não se destacam tanto quanto a preta, mas estão presente nos
enunciados a cor branca e bege que mais aparecem, dando uma maior visibilidade
as frases. O elemento gráfico apresentado na página é o mapa do Brasil formado
pelas próprias sentenças que variam de cores conforme já mencionado a cima.
Assim, o mapa passa a ideia que muitos perderam a batalha para o coronavírus, no
Brasil inteiro, em todas regiões algum brasileiro perdeu alguém ou conhece alguém
que perdeu uma pessoa próxima em decorrência do vírus e independente de
classes sociais, étnicas, religiosas, faixa etária e outros. Na capa do jornal os
recursos visuais estão bem centralizados, com o objetivo de causar evidencias.
Ademais, é importante dizer que o uso de tais recursos visuais para criar uma
página esteticamente harmônica e que prenda a atenção do leitor não se configura
como uma quebra das normas éticas que regulam a atividade jornalística.

2. A capa do jornal e os recursos verbais


Agora será abordado a capa do jornal e os recursos verbais, articulados aos
expressivos recursos gráficos, os recursos verbais utilizados na capa da edição de
30 de abril de 2021 constituem fonte fundamental para observar posições
ideológicas empreendidas pelo jornalista/jornal ao produzir a capa de jornal. Quanto
às designações utilizadas para a chamada sobre os 400 mil mortos por Covid-19,
considerei, dentre as que chamam atenção, o uso do pronome possesivo
meu/minha, que dá ênfase para o acontecido, usado repetidas vezes para fazer
referência a essas vítimas. Pelas observações dos recursos verbais utilizados na
capa, é possível perceber que o verbo morrer tem grande significado, porque essas
pessoas cessam sua vida ali, decorrente a um vírus que poderia ter sido cessado
antes, se as políticas públicas integradas tivessem tomado iniciativas plausíveis
antecipadamente. O adjetivo mortos vem reforçar essa ideia que, após deixar de
viver não é possível mais se fazer nada e cada leitor conhece uma vida perdida por
conta do coronavirus. Outras duas palavras que não estão expostas na página, mas
de forma abstratas podem ser consideradas são os substantivos: vítimas e luto.
Porque, esses indivíduos são vítimas do atraso de investimentos na vacinação e
demais recursos necessários para a saúde pública e também da falta de
responsabilidade de muitos que não seguem os protocolos de segurança contra o
Covid-19 e o que resta de tudo isso, é o luto coletivo, a saudade de uma pessoa
querida que poderia ser o meu/minha familiar e está capa de jornal representa a dor
de todos os brasileiros que perderam alguém especial para o vírus.
Os enunciados eleitos para a construção da chamada sobre os 400 mil
mortos são, sem dúvida, impactantes. De acordo com a teoria Bakhtiniana, o
dialogismo está ligado à própria concepção de língua como interação verbal. Além
do autor que escreve a capa do jornal, há também outras vozes num enunciado e
podem aparecem de várias formas. O jornalista, então, faz com que seu próprio
discurso entre em diálogo com o discurso da questão pública que citou, neste caso
os mais de 400 mil mortos vítimas da Covid-19. Além disso, nesta página foi inserido
vozes de outrem, de brasileiros que perderam seus entes queridos, de tal modo que,
o embate entre a voz da mídia e desses brasileiros, mostra que podemos entrar em
relações dialógicas com diversos enunciados. Por fim, “o dialogismo, então, se dá
pela inteiração entre interlocutores diretos e pela relação entre vozes (dizemos
também discursos) presentes, de forma explícita ou não, nos enunciados” (Silva,
2013, p. 54).

Considerações Finais
Com o propósito de analisar discursivamente a capa de sexta-feira do jornal Extra
do dia 30 de março de 2021 no marco dos 400 mil mortos vítimas da Covid-19, que
causou grande repercussão na mídia brasileira, procede à observação dos
enunciados em sua materialidade verbal e visual, procurando verificar relações
dialógicas estabelecidas de modo a recuperar efeitos de sentido em circulação.
Nesta seara, procurei observar os efeitos de sentidos causado com a imagem do
mapa do Brasil relacionado à população brasileira. Os enunciados compostos na
capa do jornal foram marcantes para os leitores, trazendo lembranças dos seus
entes queridos. O recurso gráfico utilizado para compor tal chamada – como a cor
preta que refere ao luto social e o mapa do Brasil composto por frases é possível
verificar que todo o Brasil, do norte ao sul, do leste ao oeste, chora por alguém
vítima do coronavirus. Além disso, mostra que o jornal se solidariza com essas
percas e pessoas enlutadas. Diante disso, é perceptível ver a voz daqueles que
perderam um familiar, um amigo ou conhecido, com o uso dos pronomes possesivo
meu/minha. A voz do Extra, sem dúvida, não deixa de mostrar suas avaliações a
respeito desse marco, sua indignação apoiando o social. No entanto, exige uma
visão crítica do leitor para estar preparado para compreender que, 400 mil mortes
são vítimas, existem culpados e não são apenas números.

REFERÊNCIAS

DI FANTI, Maria da Glória; LIMA, ÉLIDA. Tensionamento de vozes na primeira


página do jornal: o episódio Aracruz na capa de Zero hora. Gragoáta, Niterói, n.
28, p. 175-192, 1. sem. 2010

Oliveira, Luciano Amaral; SILVA, Adriana P. P. de Faria. et al . Estudos do


discurso, perspectiva teóricas, 1º edição. Parábola Editorial, 2013.

EXTRA, Globo. Brasil atinge marca de 400 mil mortes pela Covid-19. Disponível
em: <https://extra.globo.com/noticias/saude-e-ciencia/brasil-atinge-marca-de-400-
mil-mortes-pela-covid-19-24994203.html>. Acesso em: 25 jun. 2021.

EXTRA, Globo. Leitores do EXTRA se emocionam e repercutem nas redes


sociais capa do jornal que destaca as 400 mil mortes por Covid no Brasil.
Disponível em: <https://extra.globo.com/noticias/brasil/leitores-do-extra-se-
emocionam repercutem-nas-redes-sociais-capa-do-jornal-que-destaca-as-400-mil-
mortes-por-covid-no-brasil-24996086.html>. Acesso em: 18 jun. 2021.
WIKÉPEDIA, a enciclopédia livre. Pandemia de COVID-19 no Brasil. Disponível
em: < https://pt.wikipedia.org/wiki/Pandemia_de_COVID-19_no_Brasil>. Acesso em:
18 jun. 2021.

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