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PROCURADORIA-GERAL FEDERAL
PROCURADORIA FEDERAL JUNTO À AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA
COORDENAÇÃO DE CONSUMIDOR, PROCESSO PUNITIVO E DÍVIDA ATIVA
SGAN, QUADRA 603 / MÓDULOS "I" E "J" CEP 70830-110, BRASÍLIA/DF BRASIL - TELEFONE (61) 2192-8614 FAX: (61) 2192-8149 E-MAIL:
PROCURADORIAFEDERAL@ANEEL.GOV.BR
PARECER n. 00317/2020/PFANEEL/PGF/AGU
NUP: 48500.003584/2020-12
INTERESSADA: Assessoria da Diretoria
ASSUNTOS: Enquadramento de unidade consumidora do Grupo A no Sistema de Compensação – opção de
faturamento no Grupo B.
I. - RELATÓRIO
9. Por fim, antes de levar a matéria a julgamento pelo colegiado, a assessoria do Diretor
Relator solicitou a opinião jurídica desta Procuradoria.
II. - FUNDAMENTAÇÃO
14. Desta forma, o chamado Grupo A é composto por unidades com fornecimento em tensão
primária (igual ou superior a 2,3 kV) e caracterizado pela tarifa binômia, ou seja, constituída por valores
monetários aplicáveis ao consumo de energia elétrica e à demanda faturável.
15. O Grupo B, por sua vez, diz respeito a unidades atendidas com tensão secundária (inferior a
2,3 kV) e é caracterizado pela tarifa monômia, que possui unicamente a parcela do consumo de energia
elétrica. Esta tarifa monômia, porém, é composta pela conjunção da componente de consumo de
energia elétrica e de demanda de potência que compõem a tarifa binômia. Nesse sentido, confira-se os
seguintes dispositivos da Resolução Normativa nº414/2010:
Art. 2o Para os fins e efeitos desta Resolução, são adotadas as seguintes definições:
LXXV-A - tarifa binômia de fornecimento: aquela que é constituída por valores monetários
aplicáveis ao consumo de energia elétrica ativa e à demanda faturável;
LXXV-B - tarifa monômia de fornecimento: aquela que é constituída por valor monetário
aplicável unicamente ao consumo de energia elétrica ativa, obtida pela conjunção da
componente de demanda de potência e de consumo de energia elétrica que compõem a
tarifa binômia
16. A despeito desta classificação, verifica-se que o art. 100, da Resolução Normativa nº
414/2010, trouxe a possibilidade de um consumidor ligado em tensão primária (isto é, pertencente ao
Grupo A) optar pelo faturamento com aplicação da tarifa monômia do Grupo B, desde que atendidos
determinados critérios. Confira:
III – a unidade consumidora se localizar em área de veraneio ou turismo cuja atividade seja
a exploração de serviços de hotelaria ou pousada, independentemente da potência nominal
total dos transformadores; ou
17. De acordo com a SRD, o objetivo pretendido pela regra transcrita acima é permitir que
unidades consumidoras que estejam perto do limiar da carga instalada de 75 kW sejam desobrigadas de
contratar demanda.
18. No caso dos autos, trata-se de uma unidade consumidora do Grupo A que poderia, em
princípio, optar pelo faturamento com aplicação da tarifa monômia do Grupo B uma vez que a potência
nominal do transformador é inferior a 112,5 kVA (critério previsto no art. 100, inciso I, da Resolução
Normativa nº 414/2010, destacado acima). Ocorre, porém, que a unidade consumidora questão
pretende aderir ao sistema de compensação de energia elétrica criado por meio da Resolução
Normativa nº 482, de 17 de abril de 2012, cujo mecanismo ( n e t metering) permite que a energia
excedente gerada por pela micro ou minigeração seja injetada na rede da distribuidora e posteriormente
utilizada para abater o seu consumo.
19. Nos termos da Resolução Normativa nº 482/2012 , centrais geradoras que obedeçam a um
limite de potência instalada (menor ou igual a 75 kW, no caso da microgeração distribuída e superior a
75 kW e menor ou igual a 5 MW, no caso da minigeração distribuída) e que utilizem fontes com base em
energia hidráulica, solar, eólica, biomassa ou cogeração qualificada, poderão conectar-se na rede de
distribuição por meio de instalações de unidades consumidoras, injetando na rede o excedente de
energia não consumida, por meio de empréstimo gratuito. Ainda nos termos da norma, a energia cedida
à distribuidora será posteriormente compensada com o consumo de energia elétrica ativa da mesma
unidade consumidora ou de outra unidade de mesma titularidade daquela onde os créditos foram
gerados.
22. A rigor, a premissa que deve conduzir a presente análise é que os consumidores que optam
pelo sistema de compensação de energia elétrica estão submetidos a um conjunto de regras próprias e
específicas constantes da Resolução Normativa nº 482/2012. Ao instalar, manter e operar o seu ativo,
utilizando a energia por ele gerada, o consumidor atua como um gerador, não um gerador detentor de
concessão, permissão ou mesmo autorização, mas um gerador singular, com características delineadas
pela Resolução nº 482/2012. Na realidade, trata-se de um híbrido de consumidor e gerador, um híbrido
que se tem convencionado denominar de “prossumidor”. Não é por outro motivo que o art. 13-B, da
Resolução Normativa nº 482/2012 prevê que que as disposições da Resolução Normativa nº 414/2010
aplicam-se em caráter complementar, in verbis:
24. Portanto, a ANEEL deve atuar com a devida parcimônia em caso de aparente conflito entre
os dispositivos constantes das duas normas regulatórias.
25. Nesse sentido, é importante ressaltar que quando tratamos de conflitos entre normas
existem basicamente três critérios para solução de conflitos. São eles: os critérios de hierarquia (a
norma superior revoga a norma inferior), cronológico (a norma posterior revoga a norma anterior) e de
especialidade (a norma especial revoga a norma geral). A respeito destes critérios ensina Maria Helena
Diniz:
Critério Hierárquico
O critério hierárquico (lex superior derogat legi inferiori) é baseado na superioridade de
uma fonte de produção jurídica sobre a outra. O princípio lex superior quer dizer que num
conflito entre normas de diferentes níveis, a de nível mais alto, qualquer que seja a ordem
cronológica, terá preferência em relação à de nível mais baixo. Assim, p. ex., a Constituição
prevalece sobre uma lei.
Critério Cronológico
Na lição de Hans Kelsen, se se tratar de normas gerais estabelecidas pelo mesmo órgão em
diferentes ocasiões, a validade da norma editada em último lugar sobreleva á da norma
fixada em primeiro lugar e que a contradiz. (...) O critério lex posterior derogat legi priori
significa que, de duas normas do mesmo nível ou escalão, a última prevalece sobre a
anterior.
Critério da Especialidade
O critério da especialidade (lex specialis derogat legi generali) visa a consideração da
matéria normada, com o recurso aos meios interpretativos. (...) Uma norma é especial se
possuir em sua definição legal todos os elementos típicos da norma geral e mais alguns de
natureza objetiva ou subjetiva, denominados especializantes. A norma especial acresce um
elemento próprio à descrição legal do tipo previsto na norma geral, tendo prevalência sobre
esta, afastando-se assim o bis in idem , pois o comportamento só se enquadrará na norma
especial, embora também esteja previsto na geral ( RJTJSP, 29:303).
26. Na situação em exame, o que se nota é o que art. 7º, inciso I, da Resolução Normativa nº
482/2012, trata especialmente sobre como deve se dar o faturamento da unidade consumidora
integrante do sistema de compensação de energia elétrica. Nessa linha, de acordo com o art. 7º, inciso
I, da Resolução Normativa nº 482/2012, "no faturamento de unidade consumidora integrante do sistema
de compensação de energia elétrica deve ser cobrado, no mínimo, o valor referente ao custo de
disponibilidade para o consumidor do grupo B, ou da demanda contratada para o consumidor do grupo
A, conforme o caso." (grifos meus)
27. Dessa forma, para participar do sistema de compensação, a unidade consumidora com
minigeração distribuída, tal como é o caso em julgamento. deve ser classificada no Grupo A e contratar
a demanda, nos termos do art. 7º, inciso I, da Resolução Normativa nº 482/2012.
29. Por força do critério da especialidade, a norma especial deve prevalecer sobre a norma
geral em determinado caso concreto, razão pela qual esta Procuradoria entende que o art. 7º, inciso I,
da da Resolução Normativa nº 482/2012 deve prevalecer sobre a regra geral do art. 100, da Resolução
Normativa nº 414/2010.
30. A lógica que permeia o art. 7º, inciso I, da Resolução Normativa nº 482/2012 é evitar o uso
da rede sem o pagamento apropriado. Como minigeradores exigem um porte maior de rede do que os
microgeradores, nada mais justo que os critérios de faturamento para esses dois grupos de
consumidores sejam distintos. Os microgeradores estão conectados em baixa tensão, sujeitos à
tarifação monômia e, ao contrário dos minigeradores, não precisam contratar demanda e têm regras
simplificadas de conexão. Sobre este aspecto, vale a pena transcrever o seguinte trecho da em sua Nota
Técnica nº 0035/2020-SRD/ANEEL:
"busca-se garantir que o pagamento mínimo efetuado pelo consumidor esteja compatível
com o porte da rede necessário a atendê-lo, que é diretamente relacionado com a energia
transacionada (injetada ou consumida da rede). Caso isso não venha a ocorrer, estar-
se-ia criando um subsídio cruzado em prol do minigerador, que, mesmo exigindo
um porte de rede maior, pagaria o mínimo faturável do Grupo B, deixando custos
a serem cobertos pelos demais usuários."
31. Outro ponto que deve ser enfatizado é que a situação de minigeradores (faturados,
portanto, no Grupo A) é distinta dos consumidores do Grupo A que não aderiram ao sistema de
compensação da Resolução Normativa nº 482/2012. Isto porque com os minigeradores não há
consumo, e, portanto, não há de se falar em similaridade de perfil de uso da rede com um consumidor
do Grupo B. Além disso, para o minigerador que apenas injeta energia, a fatura equivale apenas ao
custo de disponibilidade (valor monetário equivalente a 100 kWh), enquanto que os consumidores
comuns que fazem a opção prevista no art. 100 da Resolução Normativa nº 414/2010 têm um alto nível
de consumo, e, portanto, dificilmente sujeitam-se ao faturamento pelo custo de disponibilidade.
32. Ou seja, a possibilidade de opção pelo faturamento em Grupo B, prevista no art. 100, da
Resolução Normativa nº 414/2010, foi aventada considerando a realidade de um consumidor comum de
energia, que efetivamente usa a rede para consumir e ter um valor de fatura compatível com o seu
porte. Por outro lado, a realidade do minigerador é diferente já que não utiliza a rede para consumir
energia e apenas para injetar.
33. Desta forma, acatar a adesão de consumidores faturados pelo Grupo B ao sistema de
compensação seria admitir que minigeradores de grande porte se esquivassem do pagamento do uso do
fio. Foi justamente para evitar este cenário que o art. 7º, da Resolução Normativa nº 482/2012
estabeleceu a necessidade de o minigerador pagar a demanda contratada. Este ponto ficou bem claro
nos seguintes trechos da Nota Técnica n° 0035/2020- SRD/ANEEL:
23. Dessa forma, caso se aceite a adesão ao Sistema de Compensação dos consumidores
abrangidos pelo art. 100 da REN 414/2020, com base no inciso III, grandes hotéis poderiam
optar pelo faturamento em Grupo B e aproveitar-se do Sistema de Compensação para
pagar apenas o equivalente 100 kWh6 por mês de fatura, esquivando-se do devido
pagamento pelo uso do fio. Como consequência, ocorre a alocação dos custos e encargos
que ele provoca na rede para os demais consumidores.
34. Por fim, o recorrente argumenta que a SRD expediu vários ofícios no final de 2019 dirigidos
a diferentes agentes setoriais externando seu posicionamento favorável quanto à possibilidade da
distribuidora acatar o pedido do minigerador de aderir ao sistema de compensação mesmo tendo
optado pelo faturamento do Grupo B com base no art. 100, da Resolução Normativa nº 414/2010.
35. Inicialmente, esta Procuradoria adverte que a finalidade do ofício deve se simplesmente
informar sobre algo relevante, encaminhar documentos importantes, solicitar providências, etc. As
decisões em processo administrativo devem ser tomadas mediantes despachos ou deliberações pela
Diretoria, nos termos do Regimento Interno da ANEEL. Todas as decisões devem constar nos autos de
um processo administrativo para que depois possam ser publicadas nos órgãos oficiais. Tudo em
obediência ao princípio da publicidade e da motivação dos atos administrativos decisórios.
36. Desta forma, justamente por não conterem conteúdo decisório, esta Procuradoria entende
que os ofícios que foram suscitados pelo recorrente trataram de situações concretas e específicas de
outros agentes. Logo, a orientação constante dos referidos ofícios não deve servir como referência ou
orientação de caráter geral sobre o tema que está em julgamento.
37. De todo modo, ao que parece, a própria SRD reconhece que evoluiu o seu entendimento
sobre assunto em pauta, o que é perfeitamente legítimo e até esperado de um regulador.
38. É importante ter em vista que, ainda que a ANEEL tenha adotado no passado outro
entendimento a respeito do tema, isso não significa que esse entendimento não possa ser reformulado,
com vistas a dar um enquadramento que melhor tutele o interesse protegido pela norma.
39. No caso em tela, a incompatibilidade da opção prevista no art. 100, da Resolução Normativa
nº 414/2010, com o comando do art. 7º, da Resolução Normativa nº 482/2012, encontra fundamentos
técnicos e jurídicos também. Portanto, tal fato deve ser entendido como uma evolução da regulação
produzida por esta Agência mediante uma mudança de interpretação que é perfeitamente aplicável ao
caso concreto, uma vez que quando do pedido de conexão, o ora recorrente já sabia que estaria
impedido de ser enquadrado no Sistema de Compensação por força da regulamentação vigente
porque foi corretamente orientado pela distribuidora Equatorial Maranhão e pela SRD nas oportunidades
de análise do caso concreto. Logo, não se trata de aplicar nova interpretação retroativamente, pois a
nova interpretação vai se materializar no caso concreto.
III. - CONCLUSÃO
40. Pelo exposto, esta Procuradoria, em linha com o entendimento manifestado pela
SRD/ANEEL, opina pelo conhecimento e não provimento do recurso administrativo interposto contra o
Despacho n. 2.254/2020. Esta Procuradoria comunga da mesma tese da área técnica no sentido de que
há, de fato, uma incompatibilidade do enquadramento no Sistema de Compensação de unidades
consumidoras com minigeração distribuída e optante pelo faturamento no Grupo B.
41. É o parecer.
À consideração superior.
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DESPACHO n. 00669/2020/PFANEEL/PGF/AGU
NUP: 48500.003584/2020-12
INTERESSADOS: SUPERINTENDÊNCIA DE REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS DE DISTRIBUIÇÃO - SRD
ASSUNTOS: GERAÇÃO
2. Encaminhe-se à Diretoria.
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LUIZ EDUARDO DINIZ ARAUJO. Data e Hora: 04-11-2020 09:34. Número de Série: 17234919. Emissor:
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