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( 816.4)-1
lc
BC Edição Comemorativa do Centenário
FÇC
"edções
WFBB
FUNDAÇÃO BANCO DO BfíAS/L
m
© família de Othon da Qama Lobo d'Eça.
EDITORA DA UFSC
Campus Universitário — Trindade
88040-900 — Florianópolis, SC
Revisão
LAURO JUNKES
1 6 JUN. 1999
Capa
JAYRO SCHM IDT
REGISTRO
Arte-final
DATA0 0 REGISTRO J(. L PAULO SILVEIRA
CDD-B869.1
CDU-869.0 (81)-1
SUMÁRIO
Apresentação ............................................................................. 9
Desterro: das brumas às cantigas ilhoas .............................. 11
CINZA E BRUMA
O LIVRO DA SAUDADE
(Cinza e Bruma!. . .) .......................................................... 29
Desterro, alma do m ar e da saudade ............................ 31
Na casa de Lobão ............................................................... 32
Alma sem corpo ................................................................. 34
Evocação ............................................................................. 35
Longes brancos ................................................................. 36
Papoula branca .................................................................. 37
FOLHAS MORTAS
A derradeira lembrança ................................................... 41
Eu e a noite .......................................................................... 42
Drozera vitae ...................................................................... 44
Mal do m undo ................................................................... . 46
As três sombras .................................................................. 47
Elegia do inverno ............................................................... 48
C iga no s ............................................................................... 50
Quando as amendoeiras floriram ................................. 52
Legenda antiga .................................................................. 53
Prosa enferma ................................................................... 55
POEMAS DISPERSOS
9
CINZA
E BRUMA
O LIVRO DA SAUDADE
inza e Bruma!. . .
C É o Outono. . . o derradeiro canto da cigarra na esparsa
tristeza da paisagem. . . Harmonias de Stradivarius, em surdi
na. . . nos longes desfalecidos. . . aos ritmos grisalhos dos
versos de Rodenbach!
E as folhas caindo lívidas, como lágrimas dímagens. . .
ao vento que vem do Sul. . .
São as árvores que choram com Saudades da Primave
ra!. . .
Eu tenho piedade das árvores no Outono. . .
Meigas e abismadas, entre as névoas emolientes, elas to
mam expressões raras e humanas!
Recordam raparigas tuberculosas nos êxtases da tarde. . .
É pelo Outono que as lembranças despertam e a Alma
das Cousas salmodia as canções do Passado — no Silêncio
cinzento dos caminhos. . .
íiesses dias de Vida imóvel, ao consolo das lareiras ace
sas. . . os velhos ficam a cismar, esquecidos dos anos. . . es
quecidos da Morte. . .
Enquanto fora, as nuvens peneiram, na garoa translúcida,
a melancolia que sobe dos pinheirais. . . das águas mudas
de Tédio. . . dos campos onde há mugidos que até parecem
lamentos!. . .
Quando eu era pequeno e ainda tinha meigos avós para
contarem-me histórias, quanta vez supliquei, nas minhas re
zas ingênuas, à dorida Senhora do Desterro, que não tardas
sem a cair as folhas dos pessegueiros!
E apenas apareciam as primeiras manchas de gaze nas
29
montanhas, e, sobre o mar, a bruma estendia as moles carícias
do Outono já próximo, no meu coração, onde bruxuieiam
restos do Sangue godo da minha raça, as alegrias edosavam,
abriam-se em glicínias de sóis. . . e era como se dentro de
m im continuasse aquele tempo que morria lá fora. . .
30
DESTERRO, ALMA DO MAR E DA
SAUDADE. . .
A Laércio Caldeira
31
NA CASA DE LABÁO. . .
A Agenor de Carvoliva
evanto-me do leito. . .
L Vagos restos de Noite espreitam das minhas retinas, pon
do Visões de Sombras nas paredes, ermas presenças nas cou-
sas que me rodeiam. . .
Abro as janelas. . .
Lá fora, Maio espraia-se, despindo a'clâm ide de gaze da
m anhã. . . desvendando nudezas de paisagens. . . torsos
azúis de montanhas mal despertas!
Má musselinas de sons pelo ar branco. . . tecidas do linho
dos sinos. . . desdobradas ao vento que vem do Mar. . .
Perto, a sereia satânica de uma fábrica uiva. . .
A Fera, estremunhada, distende os músculos potentes, bo
ceja rolos de fumo, no primeiro repasto da Miséria e da H u
lha. . .
O Sol é apenas um esboço nos meus olhos.
Pressinto núpcias de flores nos jardins. . .
E vem -m e, entáo, a Saudade de ti, ó Maio da minha provín
cia, custódia azul onde o Sol, hóstia de oiro, se eleva na Exalta
ção pagã da Vida que voltou!. . .
M urm úrios d'águas moças reverdecendo os cam pos. . .
alegrando nas selvas os faunos tristes. . .
"Versos" de Mistral em revoadas. . . June Caprice a sorrir
pastorais entre as papoulas em sangue. . .
Ó Maio da minha província! Vaga Visão da Primavera coroa
da de rosas. . . Existências cantando em coro, pelas cigarras
que m orreram em Abril, a derradeira Missa do Esplendor. . .
32
o 3 0 l - 8 * 2-4
Pianíssimos da Seiva nas searas, tirados pelo Terral, nos
sistros de oiro das espigas. . .
33
ALMA SEM CORPO. . .
A Virgílio Várzea
34
EVOCAÇÃO.
A Diniz Júnior
35
LONGES BRANCOS.
Para Manoel da ílóbrega
Q
uando o Inverno chega, derramando das ânforas infinitas
as Horas de Cinzas e os Silêncios de névoas, as almas
dos contemplativos enchem-se de Fantasmas!. . .
Saudades de si mesmo. . . Sombras de Passados. . .Visões
que m orreram com as últimas cigarras!. . .
Os contemplativos são com o cegos perdidos nas estra
das. . .
Sentem apenas a Alma das Existências!
Almas das suas almas esparsas, transmigradas. . . feitas
de penumbras de paisagens — onde há perguntas de Silêncio
sem respostas, velhos céus cheios de deuses ignorados!. . .
Horas de Cinza que afloram as Essências. . . as asas bran
cas dos Sons impercebíveis. . .
"Borluut" suspenso muito acima da Vida. . .
Lá alto, onde é de Céus a música dos carrilhões. . . e são
de gaze as águas dos canais. . .
36
PAPOULA BRAMCA.
Para fiemésio Dutra
Depois. . .
De todas as bandas começou a subir uma penum bra lum i
nosa, Luz diluída em maciezas de veludos, que foi impreci-
sando, apagando esse Espectro de pedra de Cidade. . .
Abriu-se um grande Silêncio cheio de transparências. . .
Os meus olhos de alma reviram, entre a translúcida nuance
de sete cores em que tudo se irisara, SANTA BÁRBARA! quieto
recanto medieval da minha DESTERRO.
E era com o um deslum bram ento de gravura antiga!. . .
Gustavo Doré a ilustrar a História do meu sono. . .
Vozes invisíveis, ao ritmo éreo dos sinos, cantavam, em
versos do Passado, pelas ruas, as legendas marulhosas da
37
ilha. . .
Havia núpcias de reflexos nas pequenas alcovas dos azule
jos. . . Aparências de menestréis nos abraços das grades das
janelas. . .
As fachadas altas do casaredo, na tranqüila nudez dos
rostos de pedra, sugeriam Ursulinas em êxtase, meditando!. . .
E até o pequeno e claro rio que repousa no mar, junto
ao velho forte, tam bém cantava, no rolado m urm úrio dos sei
xos novos, as expressões de m ágoa dos álamos. . . as bíblicas
pastorais das Sombras refletidas na jornada.
Lenta e doce Harmonia rolava pelos telhados, música feita
de névoas, com o pedaços brancos de cristais diluídos em
sons!. . .
Depois. . .
Do escuro nicho de m eu corpo a minha alma reentrou!. . .
E eu fiquei parado no esplendor do meu Sonho. . .
Despertei.
Em torno do meu leito, na sala vasta onde se ocultava
a Noite, vultos erguiam os braços!. . .
Mas só as suas mãos branqueavam no ar úm ido e torvo,
trêmulas, com o asas fantásticas que adejassem, sem corpo,
na meia luz fugindo para o teto. . .
38
FOLHAS MORTAS
A DERRADEIRA LEMBRANÇA
l
A Olegário Mariano
41
EU E A NOITE.
A Correia Dias
42
Porque só T u podes fazer-nos sentir a Felicidade através
da tua treva, com o aos gregos a Beleza através dos seus
Deuses. . .
A minha alma procura-te. . . transmigrada e aflita. . .
A minha Alma. . . triste Mocho que habita, há mais de vinte
anos, a Torre escura e deserta do MEU CORPO!. . .
43
DROZERA VITAE. . .
(DUM D IÁRIO SEM FIM).
Ó!. . .
44
Eu fico novamente absorto. . . vazio de ânimo, no meu
quarto esparso de Solidão com o os confins de um m undo
estranho!. . .
Apagado na treva, plangentemente, taciturnamente, o car
rilhão do meu velho relógio esfuma um triste lied renano. . .
Já deve ser noite lá fora. . .
E eu não escutei tanger o Ângelus.
Só!. . .
O Tédio. . . a Monotonia mortal do banzo d África estribi-
Ihando aos meus ouvidos. . .
C o m o a Vida é tão longa sem morfina!. . .
45
MAL DO MUNDO.
A Helios Seelinger
46
AS TRÊS SOMBRAS.
A Roberto Qomes
47
ELEGIA DO INVERNO.
A Caio de Melo Franco
48
"— Só quando se foi Feliz é que a Saudade é um consolo!
Bem-aventurados os que têm histórias na velhice, e ouvi
ram os discos celestes da Ventura, e esperam serenamente
a Morte, num canto da lareira, na Transfiguração do Tabor
excelso do Passado!"
49
CIGANOS.
A Raul de Leorti
50
E por sobre tudo, pairando com o Deuses fatais, a renúncia
da gleba, o Am or. . . os olhos cheios de sortilégios das zínga-
ras acobreadas. . .
51
QUANDO AS AMENDOEIRAS LEGENDA ANTIGA.
FLORIRAM. . .
Para o Jocelyn De Viegas
A João Crespo
52 53
nado...
E, no parque do castelo, às m argens do grande lago, as
garças versalheanas sentiam a existência tão pungente, com o
velhas duquesas no exílio e na miséria. . .
Em esforço vão os jograis contorciam-se, enguisalhados,
e os menestréis vinham de longe, ao castelo, cantar bala
das. . .
A princesinha ficava pálida, muda, e cheia de indiferen
ças. . .
Esbatia-se na sombra do que fora, com o as órbitas das
estátuas envelhecidas.
A abstração estendera na sua alma de cisne heráldico a
planura sem fim da Sombra e do Silêncio.
Dia a dia definhava. . . levada para a Morte, nos braços
do cavaleiro desconhecido. . .
E nunca mais, do eirado das barbacãs, ela foi seguir o
vôo imperial das águias negras. . .
55
Através da face que está perto da Luz vê-se a caveira. . .
A Ilusão, na Sombra, ri-se dessa pobre beleza transpa
rente. . . sepulcro de vidro cheio de ossos lívidos e arrum a
dos. . .
A Verdade tem as sete voltas do Estige dissimuladas em
letras. . .
Ai! do que se deixa enganar pela sua harmonia de Água-
Viva. . .
não viverá até ao instante de morrer!
ninguém deve abrir o coração para o que é. . .
Os Felizes. . . os Triunfadores, são aqueles que passam
pela Existência na quadriga doirada da Quim era, bebendo
o perfume lavado das alturas, na vertigem deslumbrante da
Ascenção!
Eles cham am -se Poetas. . . Loucos. . . Magos. . . Visioná
rios. . . e o núm ero de suas Vitórias nunca chegará a ser conta
do!. . .
Porque não se contarão nunca as estrelas da Via-Láctea. . .
56
POEMAS
DISPERSOS
MINHA ILHA
OFERENDA
60
CANTIGAS ILHOAS
Coitada da entrevadinha,
Que no caminho encontrei!
Tão velha, tão pobrezinha,
Que até de pena eu chorei.
Coitada da entrevadinha,
Que só me disse: "Não sei!"
No cálice da madrugada,
Eu vi a rosa de Pã!
Tão linda, e toda orvalhada
C om o uma deusa pagã. . .
No cálice da madrugada,
Eu vi a flor da manhã!
II
eu am or partiu para a guerra,
M Quando o meu filho nasceu.
Fiquei sozinha na terra,
Porque meu filho morreu.
Meu am or partiu para a guerra,
E já de m im se esqueceu.
62
CANTIGAS ILHOAS
III
om o a cigarra vadia
C Eu cantei de olhos no céu.
E cantando noite e dia
ninguém, ninguém me entendeu.
C om o a cigarra vadia,
Meu coração já morreu.
("República" — 20/04/1923)
CANTIGAS ILHOAS
IV
V
doce luz que desmaia,
A Por sobre as ondas do mar,
O velho cedro da praia
Parece um monge, a rezar!
À doce luz que desmaia,
Um vulto passa a cantar!
V
igarra d'asas de renda,
C Perdulária da canção,
Verde folha dum a lenda
Que o outono atira ao cháo!
Cigarra d'asas de renda,
Voz alada do verão!
66
É toda a vida da gente
Num sonho azul que se esvai.
Poeira resplandecente
Que do passado nos cai. . .
É toda a vida da gente,
Que se resume num ai!
("República" — 11/02/1923)
POEMAS DA MINHA ILHA
A Ivo d Aqui no
(República"— 14/12/1919)
n o e x íl io
70
E a paisagem friorenta,
Cismarenta,
Esbatida entre a gaze fumacenta,
Quem a deforma, adelgaça e a esfarela,
Parece
Uns debuxos manchados em flanela.
72
MARINHA
(1936)
A LUA E A PONTE
76
BALADAS DO SILÊNCIO
A Haroldo Callado
ardes de Inverno! . . .
T Tristes e desertas!. . .
De frangalhos de névoas mal cobertas!
Ante a lenta expressão dos vossos passos,
Tudo em torno parece meditar,
Na postura de quem, cruzando os braços,
Sente a vida esvair-se, d eva ga r!. . .
A Tito Carvalho
/
a triste lagoa, a pobre água parada.
A
vela que vem, côncava e branca
C om o um túm ido seio de mulher!
Quanto alvoroço aos corações arranca!
E Só o vento consegue, passageiramente, enrugar-lhe a
superfície lisa, balançar as manchas despum as verdes que
Quanta alegria viça em quem a quer! fervem, imóveis, no seu dorso de polvo.
Quando a noite desce e os escaravelhos do cam po se reco
A vela que cai, imóvel na distância, lhem, alguns sapos emergem, a espiar as estrelas, sujos de
Com o um ponto sombrio de exclamação! lodo visguento.
Tristeza de quem fica, ressonância E é só quando a água parada sente a sensação efêmera
Da saudade que foi num coração! do movimento.
Sob o sol a lagoa adormece, entorpecida com o polvo.
Velas que vêm! Velas que vão! Singelas Apenas, de quando em quando, sobe do fundo paludoso
C om o folhas, estranhas com o opalas! uma bolha prateada, que rebenta na superfície morna e oleosa
É o destino plácido das velas e fica imóvel, flutuando entre outras, aberta e úmida com o
Trazer felicidades ou levá-las! a flor dos pantanos.
Tu d o é deserto, infinitamente deserto, em torno da água
parada!
E de tanta solidão, e de tanta tristeza, uma garça velha
e suja, sobre um pê, escondendo a cabeça sob a asa, ficou
táo indiferente e tão insensível que um pequeno caburé, sinis
tro e feio, posou-lhe no dorso para sentir, através dos seus
olhos redondos e amarelos, a enervante melancolia das cou-
sas.
('República" — 02/03/1924)
79
BALADA DA ÁRVORE
80
OFERENDA
("República" — 08/09/1923)
82
O fUM O DO MEU CIGARRO
("Atualidades" — junho/1950)
DOR SEM ORLAS
Para o pecado dos homens e o luxo das mulheres.
86
RENÚNCIA
("República"— 27/09/1923)
ESSES TEUS DEDOS. . .
A Edm undo da Luz Pinto
s teus dedos,
O Com essas unhas longas e felinas,
Que sugerem carícias e segredos,
E volúpias perversas e assassinas;
Esses teus dedos
São dez punhais de lâminas rosadas. . .
("República" — 7/04/1923)
MEDITAÇÃO
A Henrique Fontes
("República" — 29/03/1923)
92
FLOR DE HAXIXE
A João Tolentino Júnior
("República" — 28/02/1923)
94
DIÁLOGO ROMÂNTICO
("República" — 11/04/1923)
MILAGRE DE AMOR
96
E a terceira bateu. E a mesma voz:
— Quem bate? — serena e doce interrogou.
— Um Poeta que sempre andou de rastro
Pela Vida e que a Vida maltratou!
— Que fizeste na terra? — Eu amei,
E pondo em cada rima aromas e arrebóis,
O meu am or em versos espalhei!
("Atualidades" — 1946)
O MILAGRE DO TEU NOME
em ao pé da parreirinha
B Que o vento sul derrubou,
Havia um a roseirinha
Que o frio de julho matou.
('República''— 13/02/1923)
NATAL DO CÉU
("República" — 25/12/1919)
99
ROMANCE
103
Mas aos pés dos guris tem fofos de veludo,
E quando vara o gol parece até que sente
A alegria que enlaça os moleques da equipe!
104
COMPOSTO E IMPRESSO
NAS OFICINAS GRÁFICAS DA
0IOESC
IMPRENSA OFICIAL DO ESTADO
DE SANTA CATARINA
Florianópolis