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Letras (poemas)

Maria Rita Kehl*

Gineceu
minha boca. tudo
o que você não queria.
saliva macia
sopro
alívio de línguas
chama
sua alma de mulher.

minha boca. luta


pelo não dessa viagem.
nada que te fira: beijo
seus dois corpos machucados
(e se me deixo colher
e se não te peço nada
e se te sirvo de mar
de lágrima sangue ou água)

é por sua boca. calma


de certa coisa intocada
silêncio de lábios
suco
hálito doce infantil.

uma criança espreita em sua boca


e deixa que eu a toque sem tocar.
deixa. mas ri de que te encontre lindo
homem oceano coração
coração
bicho desacuado.

Abertura dos portos


fazer de você meu olho e olhar por esse olho
(fazer de você meu olho e acreditar no que vejo)

fazer de você minha alma habitar essa alma


esquecer a vocação do homem para a morte
o jogo torto do amor.

fazer de você meu sexo meu


corpo em torno do sexo
desvendar esse enigma gozo masculino
perder o medo do que você faz:

fazer de você meu sexo


(e amar a mulher cansada de mim que eu já não for mais)

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In: KEHL, Maria Rita. O amor é uma droga pesada. São Paulo: Vertente Editora, 1983.

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