Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
poetAs
Coletânea preparada pelo Terceiro Ano
de Licenciatura em Linguagens
DIA 5. LOCAL DE NASCIMENTO
(américa)
uma mulher não é um território
mesmo assim
lhe plantam bandeiras
uma mulher não é um souvenir
mesmo assim
lhe colam etiquetas
mais que nuvem
menos que pedra
uma mulher não é uma estrada
não lhe penetre as cavidades
com a fúria
de um minerador hispânico
o ouro que lhe brota da tez
é antes oferenda
que moeda
uma mulher descende do sol
ainda que
forçado à sombra
Luiza Romão
Abrindo caminhos
na estrada recém-aberta
esta lança esgarça o caminho
os galhos o rio toda a miríade
cruza o interior da folhagem densa
onde apenas bichos passaram durante
anos. algum tempo depois encontra o teu peito
fechado como o matagal. a geleira imediatamente
se derrete e peixes engaiolados saltam para as margens do rio
você alonga as sobrancelhas abre um assovio fino
_ demorou para os peixes mergulharem de novo
o mato volta a crescer, cobrindo toda ferida
foi um assovio ou alguma coisa foi dita?
despreocupada com os pés na grama
rio dos homens só mais uma vez
enquanto treme o meu corpo
inflado por aquele assovio
na navalha do silêncio
ouço trovões grunhi
dos ilumina-se céu
aprendo a falar
Jhenifer Silva
Certidão de óbito
Conceição Evaristo
Último poema
II
Colheu a flor – o Poema – III
arrancou-o à resina da vida Sob a Árvore chamas,
e entre as páginas prendeu-o sem que os lábios falem.
debatendo-se, vivo. Eis o cervo, a pantera,
A fonte alimentou-o nas águas. a áspide, o pássaro,
E a mão o feriu o boi ruminando sombra:
para dispersá-lo ramos dispersos,
e, nele, o coração. bebem o orvalho da música,
reunidos nas cordas
de teu claro
coração.
Leda Cartum
Entregue a Mim
Virgínia Guitzel
Entregue a Mim
Virgínia Guitzel
solitude
em casa
sozinha
observando
o corpo que me conduz
os dedos dos pés, as tatuagens
a textura da pele
Ryane Leão
solitude
em casa
sozinha
observando
o corpo que me conduz
os dedos dos pés, as tatuagens
a textura da pele
Ryane Leão
Tenta-me de novo
Hilda Hilst
Poema aos homens do nosso tempo
Hilda Hilst
Moço, cuidado com ela!
Há que se ter cautela com esta gente que menstrua...
Imagine uma cachoeira às avessas:
cada ato que faz, o corpo confessa.
Cuidado, moço
às vezes parece erva, parece hera
cuidado com essa gente que gera
essa gente que se metamorfoseia
metade legível, metade sereia
É da poeira do cotidiano
que a mulher extrai filosofia
cozinhando, costurando
e você chega com a mão no bolso
julgando a arte do almoço: Eca!...
Vaca e galinha...
ora, não ofende. Enaltece, elogia:
comparando rainha com rainha
óvulo, ovo e leite
pensando que está agredindo
que tá falando palavrão imundo.
Elisa Lucinda
Minha Senhora de Mim
Comigo me desavim
minha senhora
de mim
Comigo me desavim
minha senhora
de mim
Comigo me desavim
minha senhora
de mim
Clarice Lispector
Eu-mulher
Conceição Evaristo
Quando faltou luz
Alice Sant'Anna
Quando (A) e (B) se sentam no degrau
da banca de jornal para conversar sobre
pormenores supradimensionados
A: estava chovendo.
B: você jura?
A: estava chovendo.
B: mas não era preciso.
A: estava chovendo.
B: tem certeza?
A: escute, quando chove
todo mundo escorrega.
B: se machucou?
A: não muito, não.
B: mas era necessário?
A: estava chovendo.
B: em março sempre acontece.
A: eu escorreguei.
B: que bom que não se machucou.
A: não muito, não.
B: porque fez isso?
A: foi só uma vez.
B: não acha meio despropositado?
A: só liguei uma vez.
B: já passou tanto tempo.
A: acho que, quando a gente telefona
fora de época, é porque está dando
uma ligadinha para o passado. não
para a pessoa realmente.
B: foi porque estava chovendo?
A: em março sempre acontece.
B: conseguiu falar?
A: deixei recado: “alô, é do passado?
queria pedir uma pizza, por gentileza.”
B: atendeu?
A: estava chovendo.
B: mas…
A: não atendeu, ainda bem. eu
nem gosto mais de pizza.
B: vá para dentro, você vai pegar
um resfriado.
A: parou de chover.
Matilde Campilho
Retrato
Cecília Meireles
Luna plena
(Luar 1)
Nitidamente
Uma circunferência plena
Amarela
Desponta
Endeusa
Inunda o céu
Rompendo nuvens, mar e firmamento
Feliz Aniversário
Ana Amália
Bixarte