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Eu vi as tuas lágrimas,
caiu-se as máscaras
e te percebi inteira!
No virar das páginas:
a mulher verdadeira
cravada de marcas
na selva da sala.
Percebi de pleno
os olhos serenos
cheios de água,
o turbilhão estava feito
para eu mergulhar...
Não tive dúvida,
talvez meu erro,
deveria perguntar,
foi paixão súbita
reflexo do teu olhar!
Um mar de gentileza
no qual fui banhado,
o espírito afogado
passei a te respirar,
inteiramente correnteza
eu te quis navegar.
Encantado, maravilhado,
arrebatado de desejo,
queria te abraçar
encher teus lábios
de muitos beijos,
afagar os teus cabelos
te aninhar no meu peito:
vem, pode chorar
eu te protejo!
Queria beber teu riso
Guarnecer-te de enfeite:
toma um doce, se deleite
tua felicidade é meu desígnio,
esquece essa gente desalmada
que vocifera contra ti!
Me cerquei de tua mágica
era o arco-íris, a tiara,
o óculos, o cordão; curuminha
tu te ria da minha palhaçada,
de cada verso que te escrevia,
contava o tempo pra te contar
mas só vinha verso, maldito verso,
maldito olhar de poesia!
Maldito eu poeta maldito!
Tentaram me ajudar,
uniram-nos na festa
ah meu eu poeta!
Foi um lindo sonho,
a vida é como é:
eu te vejo mulher,
tu não me vê homem.
Eu nunca tive chance!
No teu imaginário
eu sou pássaro
voando até o sol:
não bastam asas.
Um indivíduo
para caminhar:
não de mãos dadas!
Um bom amigo
para confidenciar
segredos, não beijos.
Não poderias me amar
e eu respeito.
Alheamento
DESFECHO
As coisas se encaminham para o desfecho,
acabou-se o inédito espetáculo
que tomou a todos em assalto:
é o acordar de um pesadelo!
O impacto do mundo parando
no estertor do falecimento branco
já se dissipou do espírito europeu.
O grande terror, oh meu Deus!,
já está à milhas escondidas
nas favelas e periferias,
já é fácil acordar do descanso
quando quem morre nas estatísticas
não são vizinhos, gente do condomínio,
quando quem encara o perigo
não volta de Milão, tá no busão
fodido
é hora de voltar porque cheiro de pobre
vivo ou morto
a sarjeta leva.
Viva a economia
à espera...
PÓS-MODERNAUTOCRÍTICO
Livros
Irremediavelmente
Lidos
Não são remédios
Para falta de juízo
Idiossincrasias
Automáticas,
Conversa pra boi
Dormir,
Hipocrisia.
Falta de excesso,
Excesso da falta
Autocrítica?
Palavrório
Assintomático
Epidemiologias
De pubs,
Noticiários
De condomínios:
BolsoLula!
BozoLula!
PROPOSITADO
Eu já morri
Há tanto tempo
Que não lembro
Quando ou onde
Sei que morri em mim.
Eu não vivo,
Respiro, como, bebo
A máquina, obsoleta
Em mim, persiste.
Vegeto a ver navios
Que navegam, navios
Navegam, é o que são.
A gente se vê, cria laço
Constitui-se no tempo
Um tempo que eu lembro,
Um tempo que não tenho.
Se não vivo, se morri,
Aonde diabo me carrego?
Eventualmente,
Acabo.
OS SONS
O som das coisas se apagando
A página virando
Rasgando
Com todos os “RRRR”
R de Rachel
Uma guria que conheci...
O vento cortando a janela
Soprando as verdades
Que sussurras longe das vozes
Um “Wooo” com W acentuado
W de Weend, primaveril...
Batidas ao longe
E como reverberam no oco
Deste coração frio,
Um “Do do do do” infindável
Com D de Daiane
Sem solução.
Pigarreios, algo irritando
A garganta, contraste
Da límpida e santa
Do “ARRRR”
Ar de Artemisa
Sereno.
Água vazando em torrentes
Um “JAAAA” que me falta
Desde sexta-feira
Com J de Jaci
Minha fiel escudeira.
Batidas na porta
Ou som de Chaves, Jirafales
“TA TA TA TA”
Com um T sonoro
T de deixa pra lá,
São só o som de coisas
Que se apagam
Sem as verdades que falam,
Como outros sons
Que não entraram neste poema
Mas estão presentes,
Sons e nomes se apagando
Indefinivelmente.
Sirenes. Noticiário. Um S
Próximo.
REPTO
Atravessa tempestade
vê se me esquece
lava, leva, afoga
minha prece
e não me apressa:
raios que te partam!
Que tens para alquebrares?
Minha paixão colérica?
Meu coração injuriado?
Chegaste tarde:
já estou em pedaços,
agarrado a osso, pedra
e álcool, o que esperas?
Só chova sua chuva em febre,
eu me embriago de tormenta,
dor e vazio me alimenta,
a solidão me aquece,
não há nada no céu
que aconteça
queres rebentar: rebenta,
estou no quarto contando
misérias e poemas,
o que pode ser o que resta
do que quer que eu seja.
EXPECTATIVAS
Afinal de contas
Me excedi em expectativas,
Desde que nasci
Olhei pro doutor
Disse que viveria
E fui levando em tropeços,
Rindo, com os outros,
De mim mesmo,
Mas ria sozinho
E não desisti.
Dobrar a mim?
Devias ter visto
Eu era cheio de sonhos,
Eu dançava com a vassoura,
Me chamavam no diminutivo:
Dieguinho, Dieguinho,
Tão gentis e cuidadosos
De não me quebrar,
Só que é claro:
Eu tinha um coração intocado
No qual, sem intenção, pisaram
E fui virando um rastro
Nunca lá, sempre aqui,
Eu só tinha parte em mim
O que hoje chamo meu-não-estado.
Café-com-Leite,
O que não consegue,
Irmão do Evandro,
Eu, que já não tinha nome,
Criei um mundo e fui inventando,
Os outros curvas e músculos,
Eu tergiversando
Meu círculo minúsculo.
Quando vi a vida passando
Foram os 18 anos,
Amigos formando e casando,
Desventuras e venturas
Eu cheio de expectativas
Que não eram pra mim,
As vezes penso
Se não tivesse lido
O primeiro livro,
Se não tivesse escrito
Aquele maldito verso,
Se não tivesse essa cabeça
Tão desgraçadamente pensante
Quem seria o Diego Ignorante?
Paradoxalmente: cheio de vida
Zero expectativa,
Tudo que viesse seria bom,
Sem horizontes, solidão?
Certeza que não sentiria
Com essa força inexata e violenta,
Seria como essas pessoas
Que giram a roda do mundo pra frente,
Manusearia o caixa, voltaria pra casa
Abriria uma cerveja, talvez fumasse,
O que viesse viria...
Que grande perda sem meus poemas,
Sem minhas vitrines de dores!
Eu me fiz de doido
Quando decidi que queria ser gente
Como qualquer outra pessoa,
Isso me fez empreender guerra
Com quem quisesse me pisar
Ou me tratasse da forma
Que me trataram na juventude,
Eu quis um nome pra mim
Que não fosse acrônimo do meu irmão,
Eu consegui só o que quiseram dar,
Nunca conquistei nada
Nem minha poesia alguma coisa,
Pelo simples fato:
EU NÃO SOU UMA PESSOA,
Faço tanta parte desse mundo
Como capim, musgo,
Se der se tira, corta, lava,
Se não der deixa lá,
Cuidado pra não escorregar,
O chão está liso das minhas lágrimas...
No final o mundo é feito de coisas
Inexplicáveis, mistérios de nós
As vezes impraticáveis, outras só convenientes,
Dessa forma, leniente,
Seria melhor que eu não tivesse nascido,
Assim eu teria ido sem ter chegado
Que é exatamente a forma em que vivo,
Inócuo ao mundo que mói meus ossos,
Como este poema que tenho certeza
Ninguém lerá.
Não importa, afinal me excedi
Em expectativas,
Agora teu terno bom dia
Com aquela carinha
É só mais uma falta
No empilhado de nada da minha alma
Tudo que corresponde a Diego Duarte.
DUAS TELAS
Do lado de cá da tela:
Uma pilha vencida de tragédia
Espremida nas quatro margens
Tristes da minha janela.
Do lado de lá:
Uma mulher fabulosa e bela
A mirar fragmentados retratos
Com sua tez suave e singela.
Entremeio um desaparecimento
Um assalto de sentimento
Um sequestro.
Adiante? Nada
Que nós dois
Não enfrentamos antes.
SINCERAMENTE DESCABIDO
ou ANTIDISCURSO
Espraio-me na solidão,
Fácil me perco
Quarto, cozinha, banheiro
As horas desse aperto
Transvertidas em imensidão.
A casa meu mundo inteiro:
Olá meu amigo mosquiteiro,
Bom dia livros que não leio,
Como vão garrafas vazias?
É terça-feira? Já é meio-dia?
Não faz diferença para Diego!
Eu sou um expectador,
Um passageiro furando o barco,
Descarrilando o trem
Sem ninguém ao redor,
Sala cheias de passos
De uma pessoa só.
Rumo? Tanto quanto
Nuvens carregadas,
Cédulas no Banco:
O punha que as amassa,
O deus que as trovoa!
É fácil um homem
Achar seu espaço:
Em nenhum coração de mulher,
Espraiado na solidão
E na dor.
Enquanto isso,
Acordo sem dormir
Rodeado de demônios
Qual será meu assassino?
Não tem nada de ridículo
Na solidão,
Tampouco de romântico.
Você não encontra sua existência
De viver só,
Não se conhece uma vírgula a mais,
Nem se encontra Deus,
Onde quer que Ele esteja
Está acompanhado
Do Filho e do Espírito Santo.
Tu? Tu Não!
A solidão é falta
Ausência,
Não é bela,
É antidiscurso.
A solidão não é epífana,
É sacrílega,
Quem quer que a use
Para seus nefastos planos
De engrandecimento moral
Ou busca
Não conhece seu abraço,
Frios e longos braços,
Implacável.
...
Ratos brincando no forro,
Mensageiro mudo,
Inferno e aplausos!
AUTOCOMBUSTÃO
T.
ERGÁSTULO
Dentro do meu coração
Eu estou sempre
Com a corda no pescoço,
Um nó de de repente,
Engasgado de um caroço.
Dentro do meu peito
Há sempre um alvoroço,
Uma confusão de vozes
Que me pedem teu retorno.
Dentro da minha cabeça
Tenho sempre a arma
Prontamente engatilhada
Apontada para a têmpora:
Ficai meus demônios
Que eu estou no controle
Um passo em falso
E nem tu nem nós,
Eu sou o cárcere,
O carcereiro
E o encarcerado.
A TRÍADE
Deus,
Pra sua companhia,
É filho
E espírito.
Eu sou só
O filho do meu pai
E da minha mãe.
Minha tríade,
Minha parte de santo:
Cachaça, vodka e cerveja.
Amém!
PROTOCOLOS
A prefeitura de Belém
Autoriza o Círio 2020
Sob rigorosos protocolos
De aglomeração
Segura:
Distanciamento de 1,5 metro,
Espaços demarcados na corda
E álcool em gel
Para romeiros e romeiras.
O novo normal:
Protocolos
protocolares
protocolados.