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AS DIVERSAS FORMAS DE EXECUTAR O TRABALHO

BANCÁRIO
Nombre: Sônia Rosane Netz
título de la ponencia: “As diversas formas de executar o
trabalho bancário”
afiliación institucional del autor: No momento pesquisadora
“autonoma”, último vínculo institucional: Mestrado em Ciencias
Sociais Aplicadas UNISINOS- RS- Brasil, dissertação defendida
em 2002, título: “O trabalho bancário e as novas tecnologías da
informação”.
dirección postal: Rua Bispo Laranjeira, 54/ 106, Bairro: Santa
Teresa, Cidade: Porto Alegre, Estado: Rio Grande do Sul, País:
Brasil
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bloque temático: “Teoría, espistemología y metodología de
estudios sobre el trabajo” ou “Reestructuración productiva y
nuevas desigualdades en el mundo del trabajo”
“O homem não deixou de se transformar e ao mesmo tempo transformar o mundo e isso é
igualmente “trabalho”, para o melhor e para o pior, no destino prometeico da humanidade. Assim,
a crise contemporânea do trabalho não reside simplesmente no desemprego, ou seja, na ausência
de trabalho. È preciso lê-la, em primeiro lugar, no próprio trabalho, isto é, nas novas formas de
actividade técnica através das quais o homem moderno prossegue, quiçá até à sua perda, um
processo de transformação do seu meio ambiente iniciado há várias dezenas de milhares de anos.”
(Vatin, 2002, 24)

Introdução

Este texto trata, de forma breve, as transformações ocorridas no trabalho bancário


nos últimos 20 anos. O estudo do trabalho bancário reúne uma ampla gama de
perspectivas. Destaca-se a sua ligação com o atual estágio de desenvolvimento capitalista,
da globalização financeira. Até a utilização intensiva da tecnologia e a transformação do
trabalho bancário em trabalho feito dentro e fora das instituições bancárias, por
funcionários, terceirizados e clientes.

O desenvolvimento do trabalho bancário

Inicialmente ao se estudar o trabalho bancário precisamos definir o que seria


exatamente este trabalho bancário. O trabalho bancário até bem pouco tempo era aquela
atividade efetuada no interior das instituições bancárias. Consistia na contabilização e no
recebimento de depósitos. Também no recolhimento de tributos diversos, pagamentos,
desconto de títulos. Além de empréstimos e aplicações financeiras entre outras atividades.
O trabalho bancário pedia funcionários confiáveis em sua capacidade de execução e
honestidade no trato dos recursos dos outros. Também apresentava um processo de
conferência baseado na redundância de contabilização. Esta consistia em várias etapas de
escrituração e conferência com circulação dos lançamentos por diversos departamentos e
funcionários. No início dos anos 1980 um exemplo de fluxo de serviço em uma agência
bancária consistiria no recebimento pelo caixa mediante a autenticação do documento, no
final do expediente os documentos eram somados pelo conferente, verificados pelo
contador e remetidos para o CPD que executaria o processamento do movimento do dia.
A partir da metade da década de 1990 a circulação de papéis foi sendo reduzida de
forma rápida. Junto com esta redução também se processou uma grande diminuição no
número de trabalhadores bancários. Conforme o Dieese, organização que congrega
sindicatos de trabalhadores, ocorreu a redução de 40% da categoria bancária brasileira
durante os anos 1990 (Dieese, 1998). As etapas intermediárias de escrituração e
conferência dos lançamentos feitos na forma de papéis que circulavam nos diversos
departamentos tornaram-se lançamentos digitais. A alimentação dos dados era feita pelos
lançamentos on-line dos caixas ou dos próprios clientes nos terminais de auto atendimento.
A análise do processo de implantação das novas tecnologias no setor bancário
brasileiro, conforme obra de Jinkings, O mister de fazer dinheiro, cita o estudo de
Larangeira sobre a automação. Conforme Larangeira, na década de 1960 surgem os
computadores de grande porte. Deste início, passando pela década de 1970 até o início da
década de 1980, estes computadores foram utilizados pelos bancos em grandes centros de
processamento de dados. Na década de 1980 ocorreu o processo que pode ser denominado
de automação de “vanguarda”. Sua principal característica é a existência de um sistema
online que conecta as diversas agências de uma determinada instituição bancária em tempo
real. Com esta mudança há a possibilidade de diminuir a quantidade de trabalhadores nos
grandes centros de processamento de dados. A partir da metade da década de 1980
aconteceu o que denomina-se de automação de “retaguarda” com os terminais das agências
bancárias conectados ao computador central, fornecendo dados, em rede, para as agências
do banco. Já, no final dos anos 80, começa ocorrer a captura e a transferência de dados fora
das agências bancárias, em residências, lojas, escritórios (Larangeira Apud Jinkings, 1995,
46). Jinkings, quando descreve as transformações do trabalho bancário, destaca o estudo de
obras de Accorsi, Automação: Bancos e Bancários, Grun, A Produção de Uma Empresa
Moderna: os Bancários e a Automação, Helena Ely, As Transformações no Sistema
Financeiro Brasileiro e a Automação nos Bancos Comerciais. Nesta lista dos estudos
representativos das alterações sofridas pelo trabalho bancário acrescentamos a obra de
Liliana Segnini (1999), Reestruturação nos bancos no Brasil: Desemprego subcontratação
e intensificação do trabalho.
Em um período de tempo relativamente curto o trabalho bancário mudou de forma
substancial. Modificam-se as rotinas burocráticas que foram automatizadas e ocorre a
exteriorização do trabalho para pessoas contratadas de forma terceirizada, ou seja, não
como trabalhadores bancários, e até mesmo os próprios clientes. A evolução das várias
formas de se executar o trabalho bancário torna possível que atualmente a maioria das
pessoas seja, em algum momento do dia ou em alguns dias do mês, trabalhador bancário
mesmo que não remunerado. A inovação tecnológica tornou possível que um trabalho dos
mais exigentes no que diz respeito ao recrutamento de pessoas honestas e confiáveis tivesse
a confiabilidade passada para os modernos sistemas de processamento de dados.

O trabalho bancário e a análise de Vatin do trabalho em fluxo

Como considerar o trabalho bancário como sendo aquelas operações executadas


pelos clientes? Os trabalhadores de empresas prestadoras de serviço para instituições
financeiras, trabalhadores terceirizados, são trabalhadores bancários? Estas questões
remetem ao próprio conceito do que seja trabalho bancário como do que seja trabalho de
maneira geral.
As teorias sociais são ricas em explicações sobre o conceito de trabalho. O
trabalho, como atividade produtiva, é considerado principal forma de inserção econômica
dos indivíduos. Para Vatin (2002, 16) na sociedade ocidental o termo trabalho é um
conceito que não tem equivalentes em outras sociedades.
Para Vatin (2002, 26) mesmo que seja do pensamento corrente aceitar que Taylor
inaugurou a nova ciência do trabalho, ele apenas apresenta de uma forma simples a
representação do trabalho como ação mecânica do homem que se achava no coração do
pensamento industrial moderno no começo do século XIX. No século XIX a fluidez
industrial e o trabalho de vigilância e controle já apareciam nas grandes indústrias químicas
e em setores da indústria alimentar. Portanto a interpretação do trabalho de forma
essencialmente mecanicista conforme o esquema de Taylor é considerada por Vatin como
anacrônica para a sua própria época.

O pensamento tayloriano iria assombrar duradouramente o


imaginário das ciências sociais e, nomeadamente, o da sociologia
do trabalho, a ponto de ainda hoje não se representar o “verdadeiro”
trabalho senão sob a figura do gesto tayloriano. ( Vatin, 2002, .27)

Hoje, quando observamos as modernas indústrias químicas e as instituições


bancárias, o trabalho mecânico, nos moldes tayloristas, é cada vez mais difícil de ser
encontrado. “Com a automação, o trabalho não desaparece; oculta-se por vezes. E,
sobretudo, fica cada vez menos inteligível à nossa compreensão marcada por uma longa
tradição mecanicista”. (Vatin, 2002, 28)
Conforme destacado anteriormente o trabalho em fluxo não pode ser considerado
como algo muito recente. Vatin descreve de forma clara o que considera trabalho em fluxo:

Foi seguramente naquilo que se pode designar por “indústrias de


fluxo” ou “indústrias de produção em contínuo” tais como a
química, o petróleo (...) onde a produção resulta de transformações
internas da matéria tratada, que a função de vigilância-controlo
surgiu inicialmente. Entretanto, porém, esta nova função assalariada
desenvolveu-se em muitos outros campos: é suficiente pensar no
tratamento informatizado de dados nos bancos ou nas seguradoras
(...) (Vatin, 2002, 159-160)

Em sua pesquisa em uma indústria química Vatin destaca o “trabalho” de vigilância


e controle como aquele executado pelos funcionários, principalmente aqueles considerados
os mais capacitados e pertencentes ao quadro de trabalhadores das indústrias químicas,
portanto não subcontratados. Uma das características do trabalho de vigilância e controle
não é a confecção de um produto mas a disponibilidade de estar presente em determinado
horário para agir no caso de que algum processo não ocorrer da forma como foi planejada.
Existe uma dificuldade crescente em medir o trabalho pela variável tempo. Também, com
as tecnologias de comunicação, torna-se difícil restringir o trabalho a um local fechado e
predeterminado como da oficina, do gabinete, para a toda da produção. Como exemplo,
pode-se citar a “restrição”, que é a obrigação de ficar disponível para o aparelho produtivo
em um enquadramento descrito com exatidão sem ter tarefa precisa a cumprir. (Vatin,
2002, 29)
Sobre o trabalho de vigilância e controle nós podemos assinalar que existe em
relação ao trabalho bancário uma questão bem interessante. O setor bancário dispõe de
funcionários ligados ao processamento de dados que executam o controle das operações,
mas uma dos principais “trabalhadores” na vigilância e controle são os próprios clientes.
Quando consultam saldos, imprimem extratos, estão verificando se as operações são
efetuadas de forma correta, não cobram nada pelo seu “trabalho” e na maioria das vezes até
lhes é cobrada uma taxa para efetuar a operação. A confiabilidade do sistema depende desta
disponibilidade de efetuar as consultas, no momento que se achar necessário.
A fluidez industrial mostra que a acepção tradicional do trabalho como esforço do
corpo humano tende a modificar-se. Para Vatin ainda dominam enquanto explicação
teórica dois sistemas de organização do trabalho: o modelo de ofício e o da divisão
tayloriana das tarefas mesmo que já se perceba um certo questionamento.
O modelo de ofício corresponde ainda à concepção smithiana da
divisão do trabalho, segundo a qual o mercado de trabalho podia
confundir-se com o dos produtos: vender o seu trabalho de
carpinteiro é vender uma viga e o do sapateiro um artigo de couro.
E uma concepção de algum modo pré-salarial (,,,) Actualmente, o
ofício continua a figurar como um ideal do mercado de trabalho já
sem carregar esta reivindicação da autonomia operária. É como se a
competência profissional (a qualificação) fosse suficiente para
definir um espaço social. ( Vatin, 2002, 239)

Para o modelo taylorista Vatin acrescenta:

O sistema de pensamento tayloriano constitui, por seu lado, uma


metamorfose tardia da concepção emergentista do trabalho, que se
baseou nos modelos mecanicistas da época clássica e encontrou
uma formulação definitiva, na época do próprio Taylor, com o
fisiólogo francês Jules Amar. “O papel do homem na produção é,
segundo esta concepção, totalmente mecânico. É por essa razão que
o seu trabalho pode ser organizado “cientificamente”, dividido em
tarefas elementares que um organizador central coordenará e
adicionará. Esta concepção parece cada vez menos aceitável face à
automação, que permite efectivametne que um dispositivo
mecânico execute tudo o que é codificável e que, por esse facto,
confere ao operador humano o seu papel insubstituível de
intervenção para lá do previsto e do normalizado”. ( Vatin 2002,
239)

Estes dois modelos, segundo Vatin, de um lado podem parecer antagônicos mas de
outro compartilham da concepção de trabalho como sendo um objeto interpretado de forma
direta como mercadoria pela teoria econômica.
Os textos destacados acima referentes a pesquisa de Vatin não analisam o trabalho
bancário propriamente dito, apesar de apresentarem algumas referências bastante rápidas.
Estudar o trabalho bancário não era o objeto de estudo de Vatin. Mas o trabalho em fluxo
mostra uma outra forma de trabalho presente e que nem sempre muito destacada. Quando
intitulamos nosso texto de As diversas formas de executar o trabalho bancário temos que
trabalho bancário não é semelhante ao produzir um par de sapatos ou a um automóvel. A
dificuldade de enquadramento do trabalho bancário naquilo que usualmente se conhece
como trabalho “produtivo” nos proporcionou uma análise dos impactos das inovações
tecnológicas, as chamadas novas tecnologias da informação, NTI, no trabalho bancário.
Naquela época não tivemos ainda conhecimento da obra de Vatin e de sua crítica. No
decorrer do texto, O trabalho bancário e as novas tecnologias da informação, tratamos do
aumento da “produtividade’ do trabalho bancário. Estas referências a produtividade podem
sugerir uma certa interpretação mecanicista bastante criticada por Vatin. Mas de forma
geral compatilhamos com Vatin um certo “mal-estar” em aceitar a transferência direta dos
estudos sobre o trabalho de concepções mecanicistas para o setor bancário, no nosso caso,
e o das indústrias químicas, no caso de Vatin.
O trabalho bancário, as inovações tecnológicas e as possíveis contribuições de Marx e
Braverman

Em O trabalho bancário e as novas tecnologias da informação podemos salientar


que as inovações tecnológicas possibilitaram um aumento da “produtividade” do trabalho
bancário e isto não quer dizer mais contas, mais autenticações, mais lançamentos por
pessoa, mas a racionalização e o controle que eliminam o processo anterior de duplicidade
e redundância. (Netz, 2002, vii)
As inovações tecnológicas, as novas tecnologias da informação, NTI, são a forma
mais avançada de uma longa história de formas diferenciadas de obtenção de produtividade
do trabalho. De acordo com Marx (1985) em O Capital, no começo um determinado
número de trabalhadores foi reunido sob o comando de um capital individual. Trabalhado
de forma mais eficiente do que isoladamente, pois estão efetuando uma atividade planejada,
de forma conjunta, com processos diferenciados e conexos.
Na cooperação simples podemos destacar a primeira forma de aumentar a
produtividade do trabalho. Classicamente a cooperação simples ocorre na manufatura
mediante a união de diferentes trabalhadores de ofício autônomos. Ou por diversos artífices
que em princípio realizam todo o processo de produção da mercadoria e em outro, seu
trabalho é dividido em operações parciais realizadas mediante o trabalho cooperado.
Na manufatura não é somente o artesão virtuoso que existe, mas a combinação de
diferentes trabalhadores, cuja qualificação é variável, mas que o trabalho se torna virtuoso
na sua combinação em forma de trabalho coletivo. Assim, “na manufatura, o
enriquecimento do trabalhador coletivo e, portanto, do capital em força produtiva social é
condicionado pelo empobrecimento do trabalhador em forças produtivas individuais”
(Marx, 1985, 284).
As máquinas “superam a atividade artesanal como princípio regulador da produção
social. Assim, por um lado, é removido o motivo técnico da anexação do trabalhador a uma
função parcial, por toda a vida. Por outro lado, caem as barreiras que o mesmo princípio
impunha ao domínio do capital” (Marx, 1985, 289). Na maquinaria, as máquinas
ferramentas podem ser combinadas de forma a executarem operações impossíveis aos
trabalhadores que estavam limitados a operar instrumentos não superiores a quantidade de
órgãos corpóreos. Assim, “como máquina, o meio de trabalho logo se torna um
concorrente do próprio trabalhador. A autovalorização do capital por meio da máquina está
na razão direta do número de trabalhadores cujas condições de existência ela destrói.”
(Marx, 1985 A, 48).
De acordo com Braverman (1987) o controle dos trabalhadores não era possível
somente através da maquinaria. Os estudos de Taylor relativos a gerência científica
proporcionariam uma melhor maneira de controlar o processo de trabalho. Taylor estudou
tempos e movimentos. A gerência científica assumiria o papel de reunir o conhecimento
tradicional dos trabalhadores, elaborar manuais de procedimento. De conhecedor de seu
ofício o trabalhador se transformou em realizador de uma tarefa previamente planejada
pelo gerente. A gerência conheceria o processo de trabalho e pesquisaria as formas mais
eficientes de realizá-lo, estabelecendo metas de produtividade e velocidade do trabalho.
A atuação da gerência científica não ocorreria somente nas indústrias, nos
escritórios e nos bancos também se faria presente. Os benefícios da racionalização se
tornam ainda mais efetivos com o moderno sistema de processamento de dados.

Esse sistema automático para processamento de dados assemelha-se


aos sistemas automáticos da maquinaria de produção naquilo que
reunificam o processo de trabalho, eliminando os muitos passos que
eram anteriormente atribuição de trabalhadores parcelados. Mas,
como na fabricação, o computador de escritório não se torna, no
modo capitalista de produção, o passo gigantesco que poderia ser
no sentido de desmantelar e seriar a divisão técnica do trabalho.
Pelo contrário o capitalismo vai contra a natureza da tendência
tecnológica e reproduz obstinadamente a velha divisão do trabalho
em uma forma nova e mais perniciosa. (Braverman, 1987, 278)

Uma das questões de maior interesse que abordamos em O trabalho bancário e as


novas tecnologias da informação é a importância crescente da inovação tecnológica. A
inovação tecnológica proporcionou a racionalização do processo de trabalho. Esta
racionalização do trabalho, de forma geral, e do trabalho bancário, de forma específica,
mostra que o conhecimento dos trabalhadores que foi sistematizado nos manuais, e depois
nos programas de computador, já não mais pertence a eles. Não existe nenhum direito
adquirido ou hereditariedade frente ao conhecimento dos trabalhadores.
Os efeitos da automação sobre o trabalho de escritório ainda estão pouco
identificados, segundo Castells, faltam estudos empíricos e suas interpretações estão
atrasadas. A tendência está na eliminação da maior parte do trabalho administrativo
mecânico e rotineiro. As tarefas intermediárias são reintegradas nas operações decisórias
com boa informação, que são avaliadas e processadas por funcionários administrativos com
autonomia na tomada de decisões. A automação dos escritórios não racionaliza somente a
tarefa, racionaliza também o processo, pois a tecnologia possibilita a integração de dados
originários de fontes diferentes, que são processados e redistribuídos para unidades de
forma descentralizada. Ao contrário de automatizar tarefas como digitação, cálculos, a
tecnologia racionaliza um procedimento inteiro e o integra em linhas ou mercados distintos.
(Castells, 1999, 269-270)

Uma análise do trabalho bancário terceirizado

A diferença entre o trabalho bancário feito nas agências bancárias e o trabalho


bancário feito pelos trabalhadores terceirizados mostra de forma bastante clara aquilo que
Harvey (1999) já havia descrito como características da acumulação flexível. Como a
acumulação flexível ocorre o surgimento de novos setores de produção, novas maneiras de
fornecimento de serviços, novos mercados, intensificação na inovação comercial,
tecnológica e organizacional.
Os empregadores, na acumulação flexível, exercem um controle mais forte sobre a
força de trabalho. O trabalho organizado foi enfraquecido pelo estabelecimento de focos de
acumulação flexível em regiões até então subdesenvolvidas. O desemprego estrutural
permanece alto dentro da acumulação flexível o que gera um grande contingente de mão-
de-obra excedente. A esta mão-de-obra excedente são impostos contratos flexíveis como
tempo parcial, temporário ou subcontrato.
Como resultado observa-se uma nova estrutura no mercado de trabalho. No centro
estão os empregados em tempo integral, estes gozam de segurança no emprego,
perspectivas de promoção de reciclagem, previdência social e vantagens indiretas. Na
periferia encontram-se dois subgrupos. O primeiro é composto de empregados em tempo
integral com habilidades disponíveis no mercado e alta rotatividade. O segundo grupo com
maior flexibilidade numérica é composto por “empregados em tempo parcial, empregados
casuais, pessoal com contrato por tempo determinado, temporários, subcontratação e
treinados com subsídio público, tendo ainda menos segurança de emprego do que o
primeiro grupo periférico” (Harvey: 1999, 144).
A seguir analisaremos dois casos de trabalho terceirizado, um em uma empresa que
contrata os empregados com carteira assinada e de outro que se utiliza de trabalho
cooperativado.

As empresas X e Y, dois exemplos de terceirização no setor bancário

A empresa X1 executa terceirização do trabalho bancário como uma das suas


atividades de prestação de serviço. É empresa de transporte de valores para indústrias,
comércio, bancos e empresas de serviços. Além do transporte de valores também tem um
setor de tesouraria que faz a contagem de cédulas para todos os seus clientes. Conta e
abastece os caixas eletrônicos de diversos bancos. Confere depósitos em dinheiro dos
terminais de auto-atendimento de bancos clientes. Confere o movimento de caixa de
diversas instituições financeiras e providencia os depósitos legais para o Banco Central. Faz
o processamento e a digitação de cheques e documentos para alguns bancos.
Os seus trabalhadores são todos de carteira assinada, recebem vales alimentação,
vale transporte, têm direito a férias, 13º, etc. A referência é a categoria dos empregados em
empresas de transporte de valores. Tem carga horária bem maior que os trabalhadores
bancários. Alguns apresentam vários anos de trabalho na mesma empresa, já outros são
contratados, em tempos de maior demanda, com carteira assinada, porém são dispensados
pouco antes de completarem os três meses de experiência. A empresa é bastante seletiva na
contratação, exige vários documentos legais tais como ficha corrida, negativa de ações
cíveis, visita na residência do futuro empregado para saber o seu padrão de vida.
Nossa análise se deterá mais no chamado setor de tesouraria que faria o trabalho de
contagem de numerário para bancos e outras empresas. No recrutamento do funcionário
para a tesouraria, o grau de escolaridade exigido não é muito alto, apesar de não serem
desprezados aqueles que possuem mais anos de estudo. Em uma observação mais geral,
sem ter acesso aos dados de escolaridade de todos os funcionários, podemos constatar que o
grau de escolaridade é bem mais baixo do que os dos bancários que trabalhavam em centros
de processamentos de dados, de compensação de cheques e de serviços nas décadas de
1980 e 1990.
Na empresa X no turno do dia, no setor de tesouraria, predomina o trabalho
feminino. Sendo recrutadas algumas mulheres acima de 35 anos de idade, acima do peso,
negras, em suma, pessoas que não seriam contratadas para trabalhar em alguma agência
bancária, conforme os padrões atuais. O turno do dia também conta com alguns jovens que

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Empresas analisadas mediante participação do pesquisador como trabalhador terceirizado.
estariam tendo seu primeiro emprego, para estes a cobrança de produtividade é um pouco
menor.
No turno da noite o número de homens aumenta. Também existem muitos
trabalhadores com muitos anos de empresa. São trabalhadores que já não seriam
contratados para uma agência bancária. Além de certa idade, alem do peso, e negros. Esta
separação entre aqueles funcionários visíveis e aqueles invisíveis pode ser um dos efeitos
chamados “perversos” da inovação. As tecnologias informacionais controlam de forma tão
eficiente o trabalho que não é preciso mais aqueles funcionários muito experientes. Tanto
no trabalho terceirizado como naquele feito nas agências bancárias. É só se observar lojas,
supermercados, bancos, a grande maioria de seus funcionários são jovens, com boa
aparência. Para aqueles que não estão adequados com o perfil sobram os empregos
escondidos, nestes a aparência não conta muito. E o fato de ser a última alternativa de
trabalho faz com que sejam muito mais produtivos.
Na empresa X os funcionários devem utilizar vestiário coletivo para vestirem-se
com o uniforme da empresa. Existe um vestiário masculino e um feminino. No vestiário
feminino não tem banheiro, portanto a troca de roupa deve ser feita na frente das outras
funcionárias. Seria uma medida de segurança. O uniforme teve duas versões, inicialmente
era uma espécie de macacão com fechamento nas costas sem nenhum bolso. Na nova
versão é um conjunto de camisa e calça também sem bolsos. As mulheres devem trabalhar
com os cabelos presos ou curtos.
É interessante de se fazer um paralelo entre o trabalho nos bancos, pelo menos nas
décadas de 1980 e 1990, em que o uniforme não era uma exigência, sendo pouco usado,
seja nas agências ou nos centros de processamento de dados. O trabalho bancário
executado nos centros de processamento e compensação, nas décadas passadas, era
considerado como repetitivo, parcelado e monótono. Exigia conhecimento que ficaria muito
aquém das possibilidades que os profissionais bancários poderiam executar o que geraria
formas de descontentamento. Mas mesmo assim as pessoas tinham sua forma de sem
portar, sua forma de vestir, sua forma de apresentação pessoal que não era das mais
exigentes. O trabalho que foi terceirizado continua repetitivo e ainda os funcionários devem
perder sua individualidade que poderia estar presente na maneira de vestir. A atividade não
é um trabalho sujo que exigisse o uniforme para preservar as roupas, no máximo um
avental, e as câmeras poderiam reconhecer muito melhor o funcionário pela roupa.
Depois de estarem todos uniformizados os funcionários da tesouraria podem
acessar ao setor portando somente com caneta, óculos, um creme para as mãos e o lanche.
As bolsas, sacolas, celulares, ficam em armários no vestiário. Devem passar por várias
portas que são liberadas por seguranças localizados em uma central monitorando as portas
através de câmeras.
O trabalho na tesouraria é monitorado com diversas câmeras localizadas acima de
cada mesa. Cada malote aberto deve ser identificado e cada diferença informada ao chefe.
Esta terceirização, em termos de segurança, não deixa nada a dever ao trabalho feito por
bancários. Seja pelo aparato tecnológico, seja pela capacidade de trabalho dos funcionários.
As falhas são mais visíveis no tratamento aos empregados. Apesar destes serem
contratados com carteira assinada, estão submetidos a jornadas de trabalho de, no mínimo,
oito horas diárias e trabalho em fins de semana, pelo menos uma vez ao mês. Como existem
épocas de pico a empresa faz os empregados trabalharem além da carga horária, nem
sempre paga hora-extra e prefere dispensar os trabalhadores em dias em que não tem muito
serviço. A princípio esta dispensa não seria problemática, mas muitos empregados ao
chegarem na empresa são comunicados que podem ir para casa, nesta altura já gastaram
tempo e dinheiro. Já nos dias de pico não podem sair enquanto a chefia não liberar.
Pelas análises feitas constata-se que a empresa X adota o banco de horas2. O banco
de horas é o mecanismo que torna possível que horas de trabalho em excesso em um dia
sejam compensadas com a diminuição em outro dia, fazendo com que o pagamento de
horas extras não seja necessário.
No setor de tesouraria periodicamente são feitas reuniões quando os funcionários
mais produtivos ganham prêmios como tíquetes refeição além daqueles recebidos por
todos. A produtividade é cobrada de forma bastante confusa pois os malotes não são todos
iguais, alguns devem ser contados manualmente e outros em máquinas . Alguns são feitos
por duplas, outros individualmente, outros por duplas em máquinas. São atribuídos pesos
conforme os malotes para tentar estabelecer uma certa homogeneização na produtividade,
mas na prática as mesmas pessoas acabam executando o mesmo serviço e aquelas que
trabalham nas máquinas conseguem ter uma produção bem maior.
O trabalhador da empresa X executa tarefas que há algum tempo atrás eram
exclusivas de bancários. A empresa terceirizadora está conectada via tecnologias da
informação de forma a atuar como se fosse parte das instituições financeiras que contratam
seu serviço. Não existe muita diferença entre a comunicação da instituição bancária com a
transportadora de valores e tesouraria daquele que existia internamente entre setores do
banco tais como tesouraria e processamento de dados.
As contribuições sociais usam como base o salário da categoria de transporte de
valores que é bem menor do que o da categoria bancária. As conquistas bancárias como
abonos e participação nos lucros não são estendidas para os trabalhadores terceirizados.
Quanto ao número de trabalhadores que estas empresas contratam fica bastante
difícil de se analisar se ocorre uma ampliação de empregos. Para os bancários certamente
não. Para os transportadores de valores as vagas abertas não conseguem ser todas
contabilizadas como de serviço de terceirização bancária. A empresa atua na segurança e no
transporte de valores para outras empresas que não são bancárias.
A outra empresa que realiza terceirização bancária é a empresa Y. Esta seria um
pouco mais fácil de ser enquadrada como executora de serviço de terceirização bancária e
seus trabalhadores como executores de serviço bancário. Ela é contratada por grandes
bancos, que já foram nacionais e atualmente apresentam o controle acionário de grandes
bancos de outros países. Inicialmente, em um local bastante amplo, a empresa executava o
processamento de dados de três grandes bancos, um ainda era basicamente de controle
acionário nacional. Este desligou-se e resolveu contratar os serviços de outra empresa
terceirizadora.
Pelo observado, no tempo aproximado de um ano, existe rotatividade na contratação
destas empresas que fazem a terceirização do processamento. Os bancos efetuam contratos
e, conforme o serviço apresentado, estes contratos não são renovados e outras empresas
novas, de outros estados ou com maior tradição são contratadas. O interessante é que alguns
funcionários acabam migrando, indo de uma empresa para outra. Na empresa analisada,
quando o banco que tinha participação nacional resolveu não mais utilizar os serviços de
terceirização levou muitos funcionários que já dominavam o serviço para a nova empresa.
Para muitos estava a dúvida se ficariam ou seriam usados até o momento que novos
funcionários soubessem o serviço. Muitos destes funcionários já haviam sido bancários,

2
intr oduzido pela Lei nº 9.601/98 com a alter ação do § 2º e ins tituição do § 3º do ar t. 59 da CLT .
foram demitidos, contratados pela primeira terceirizadora, e com a saída do banco,
contratados pela segunda empresa terceirizadora. Esta segunda empresa terceirizadora
optou por contratar todos os funcionários com carteira assinada, mas com salários mais
baixos.
Mas, voltando para a empresa Y nesta ocorre a coexistência de várias formas de
contratação de mão-de-obra. Como é executado o processamento de documentos dos
bancos clientes, existem funcionários dos bancos fazendo a supervisão do serviço. Num
segundo nível existem os funcionários da empresa Y, com carteira assinada. Muitos já
foram bancários e exercem atividades de chefia, conferência e postos chave. Num nível
mais baixo estão os cooperados que fazem as tarefas mais repetitivas e rotineiras como
digitação, abertura de envelopes, autenticação de pagamentos feitos por auto-atendimento.
Nestes trabalhadores cooperados ainda existem dois tipos. Aqueles que trabalham todos os
dias, são os chamados “fixos” e aqueles que trabalham somente nos dias de pico
(chamaremos “não-fixos”) tais como inícios de mês, finais de mês, quinzenas e segundas-
feiras. Para os cooperados a remuneração é por hora sem pagamento de vale refeição, vale
transporte. Somente desconto de INSS, principalmente daqueles cooperados “fixos”.
A empresa Y contrata os serviços de uma cooperativa que faz os contratos com os
trabalhadores. A cooperativa precisa de grande quantidade de pessoas para trabalhar nos
dias de pico. A contratação ocorre mediante um teste de digitação e a assinatura da adesão
do cooperado à cooperativa, além da inscrição do cooperado como trabalhador autônomo.
São verificados os dados no SPC dos cooperados, seu endereço e empregos anteriores.
Para os cooperados iniciantes é feita uma palestra salientando que sua remuneração será
bem maior que um trabalhador de carteira assinada, por exemplo, os cooperados que
trabalham na empresa Y ganhariam aproximadamente 700,00 reais enquanto que os
assalariados chegariam perto de 500,00 reais. Explica-se que inicialmente os cooperados
trabalhariam nos dias de pico para fazerem seu treinamento e posteriormente poderiam
trabalhar todos os dias.
As informações sobre o que seria uma cooperativa são feitas em uma palestra antes
dos futuros cooperados assinarem sua adesão e concordarem com o desconto de 10,00 reais
por mês que seria a sua contribuição. É informado o endereço do site da cooperativa e feita
a distribuição de um jornal das diversas atividades da cooperativa nos diversos estados em
que atua. Maiores informações sobre direitos dos cooperativados e histórico do movimento
cooperativista não são apresentadas.
A seleção, principalmente daqueles que trabalham nos dias de pico, tal qual na
empresa X, recai nas pessoas que teriam maior dificuldade em ter empregos: com maior
idade, ex-bancários, negros e homens (talvez por não terem tanta dificuldade com o
horário). A expectativa de vir a se tornar um cooperado “fixo” é utilizada para motivar
todos os novos cooperados. Muitos trabalham um único dia e desistem, outros ficam quase
um ano, sendo chamados nos horários de pico, esperando se tornarem cooperados “fixos”.
Estas formas de contratação flexíveis dependem muito de um componente
psicológico. Na empresa X , a carteira assinada com contrato de experiência, mesmo que já
fosse o plano demitir antes dos três meses, exigia uma dedicação total, se fosse assinada
como temporário talvez o esforço fosse bem menor. Já na empresa Y a motivação era
tornar-se um cooperado “fixo”, as chamadas esporádicas não poderiam ser negadas para
que o mais cedo possível se tornassem cooperados “fixos”.
Na empresa Y, em certo sentido, como a remuneração é por hora, não há nenhuma
obrigação de freqüência dos cooperados, afinal, se não comparecerem não recebem. Mas na
prática quem se nega a comparecer muitas vezes não é mais chamado ou é colocado na
“geladeira”, fica algum tempo sem ser chamado.
Uma vez sendo solicitado o serviço o cooperado comparece. Permanece trabalhando
até que o serviço acabe, isto é, muitas vezes, acaba prejudicando o seu retorno ao lar, no
caso do trabalho noturno. Nem a empresa Y, nem a cooperativa, tenta alternativas para
compatibilizar os horários possíveis para os cooperados ou, até mesmo, transporte para a
sua residência. Nos cooperados que trabalham somente nos dias de pico há alta
rotatividade, grande parte nem chega a receber a remuneração próxima ao valor de um
salário mínimo pelas horas de serviço prestadas.
Os cooperados “não-fixos”, caso não executem o trabalho em outras empresas,
apresentam dificuldade em ter grande produção, principalmente na digitação, pois esta
requer o treinamento constante. Algumas atividades que precisam de maior velocidade
acabam sendo feitas por aqueles melhor treinados. Não são estabelecidos dias alternativos
para que os cooperados possam aprender o serviço. A contratação em dias de pico acaba
mantendo somente aqueles que já possuem outra fonte de renda, sendo essa uma espécie de
hora extra. Ou aquelas pessoas que trabalhariam somente por satisfação pessoal ou por
futura perspectiva de inserção no mercado.
Na empresa Y não se utiliza uniforme, os pertences ficam nas mesas de trabalho dos
funcionários e cooperados. O acesso a área de trabalho é feito mediante a passagem em
várias portas de segurança liberadas pelos vigilantes. No local de trabalho existem várias
câmeras que fiscalizam o trabalho e chamam a atenção de alguém que faça algum
movimento suspeito.
Apesar da precariedade na contratação quem estava acostumado com o trabalho de
centros de processamento de dados, digitação e conferência não apresenta dificuldades em
trabalhar na empresa Y. Os bancários que supervisionam e os funcionários de carteira
assinada apresentam-se bastante prestativos no tratamento aos cooperados. As tarefas de
exigência de produção e coordenação dos cooperados ficam a cargo de um cooperado
“chefe”. O ambiente de trabalho não se apresenta dos mais desfavoráveis. O serviço tem
horários, precisa que todos colaborem, sejam cooperados, funcionários ou bancários.
As reclamações dos cooperados estão nos poucos dias trabalhados, na dificuldade
de transporte, na baixa remuneração, mas não, especificamente, no tipo de trabalho
executado. Ou quanto à Previdência, em muitos casos a remuneração é tão baixa que não
sobrará nada. se forem feitos os descontos legais. Somente aqueles que são “fixos” acabam
conseguindo descontar o INSS e até futuramente utilizar para aposentadoria.
Tanto de parte dos bancos que contratam a empresa Y, da empresa Y, e da
cooperativa, não existe nenhuma iniciativa de pelo menos se comprometer com o
pagamento da contribuição sobre o salário mínimo, independentemente do número de horas
trabalhadas pelo cooperado. Esta poderia ser um incentivo para aqueles que trabalham de
forma esporádica, pelo menos estariam contando tempo para a aposentadoria.
A inovação proporcionou um aparato que, em conjunto, permite que estas formas
alternativas de contratação sejam possíveis sem prejudicar a qualidade e confiabilidade do
serviço. O trabalhador cooperativado sabe que está sendo vigiado por câmeras, que o
cheque digitado faz parte de um envelope que teve seu total já informado para o sistema.
As antigas rotinas bancárias, anteriormente burocráticas, foram automatizadas. Aqueles que
as faziam tiveram que se “requalificar” ou são a mão-de-obra excedente que procura
trabalho mesmo em condições desfavoráveis.
O problema é que o setor bancário é um dos setores mais ricos, que mais condições
favoráveis vêm obtendo ao longo dos anos e, mesmo assim, é o que menos se preocupa
com uma forma de contratação de pessoal que esteja de acordo com a riqueza gerada pelo
setor. Se o setor mais rico da economia contrata desta maneira o que podemos deixar para
os assalariados que contratam seus empregados domésticos ou para as pequenas empresas
familiares que mal conseguem sobreviver. Como a inovação tecnológica possibilitou este
tipo de contratação, o setor bancário utilizou a “via baixa”, conforme Castells (1999)
analisa, onde ocorre a integração do processo de trabalho e a desintegração da força de
trabalho. Esta seria uma opção do setor bancário brasileiro, opção que valoriza o aumento
da produtividade e da lucratividade a curto prazo, e não contribui para a Sociedade com o
peso proporcional a sua pujança econômica.
No caso a afirmação de Castells poderia ser acrescentada não somente como
determinada sociedade implanta, mas como determinado segmento econômico, como no
caso o bancário faz a sua reestruturação produtiva. A título de exemplo podemos citar que
no ano de 1989 a categoria bancária contava com 824 mil trabalhadores, e em 1996 contava
com 497 mil. (Dieese 1998). Estes trabalhadores terceirizados não estão nas estatísticas
nem mesmo do balanço social dos bancos. Conforme a Febraban em 2003 eram atendidos
384 mil colaboradores.
Outro aspecto a analisar sobre os trabalhadores temporários, sejam cooperados ou
de carteira assinada, é o fato de não terem uma constante fonte de renda. Assim, se
perguntaria quem os sustenta? Com carteira assinada, na possibilidade de trabalharem em
certo número de meses, mesmo que em empresas diferentes, ainda poderão solicitar seguro
desemprego. Já os cooperados, no caso de não serem trabalhadores em outras empresas, o
seu sustento se dará por meio de familiares e não pelo trabalho. Indiretamente as empresas
não só exploram os trabalhadores mas exploram os familiares dos trabalhadores
temporários pois estes é que definitivamente os sustentam.

Conclusão

No espaço disponível tentamos analisar a problemática teórica do trabalho e o


trabalho bancário. As transformações ocorridas no trabalho bancário são emblemáticas das
transformações ocorridas no trabalho de forma geral. A última parte de nosso estudo tento
mostrar de forma mais concreta as dificuldades dos trabalhadores terceirizados. O trabalho
flexível presente no setor bancário na sua forma mais radical nos remete a constatação
assinalada por Vatin:

A automatização do sistema produtivo apenas pode acelerar este


processo não só ao reduzir a necessidade global de mão-de-obra
com também ao transformar radicalmente a própria natureza dessa
necessidade, que deixa de estar necessariamente ligada à
necessidade de executar um “trabalho” propriamente dito. (...) A
questão é fundamental; é social, mas também econômica. Com
efeito, o que está em jogo são as próprias condições de partilha do
rendimento social. Até hoje, parecia evidente que aquele devia
fazer-se principalmente com base do trabalho. (Vatin, 2002, 244-
245)
Referências Bibliográficas
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Século XX. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987.
CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede: A era da informação: Economia, Sociedade e
Cultura, Volume I. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
DIEESE. EVOLUÇÃO RECENTE DO EMPREGO BANCÁRIO NO BRASIL. TEXTO N°
02/98, DIEESE - Subseção SEEB-BH /DIEESE - Subseção SEEB-SP, Belo Horizonte,
1998.
FEBRABAN, Balanço Social.
<http://www.febraban.org.br/Arquivo/Servicos/Dadosdosetor/BSocial2004/balsoc.asp>,
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HARVEY, David. Condição Pós-Moderna: Uma pesquisa sobre as origens da mudança
cultural. São Paulo: Loyola, 1999.
JINKINGS, Nise. O mister de fazer dinheiro: Automatização e Subjetividade no Trabalho
Bancário. São Paulo, Boitempo/ Sindicato dos Bancários-SP, 1995.
MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. São Paulo: Nova Cultural, 1985 (Os
Economistas: Marx Vol I)
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NETZ, Sonia R. Novas Tecnologias Da Informação: Suas influências no trabalho
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acesso. 18/01/2007
NETZ, Sônia Rosane. O trabalho bancário e as novas tecnologias da informação
Dissertação (mestrado) — Universidade do Vale do Rio dos Sinos. São Leopoldo-RS,
2002.
SEGNINI, Liliana Rolfsen Petrilli. Reestruturação nos bancos no Brasil: Desemprego,
subcontratação e intensificação do trabalho. In: Educação & Sociedade. Campinas (SP):
CEDES, 1999, ano XX, nº 67, agosto99, p. 185-211.
VATIN, François. Epistemologia e Sociologia do Trabalho. Lisboa: Instituto Piaget, 2002.
Anexo 1 Comparativo empresa X e Y

Empresa X Empresa Y
Forma de Contratação Carteira Assinada Carteira Assinada
Trabalho Terceirizado
Cooperado
Rotatividade Funcionários com estabilidade. Responsáveis pela coordenação e
Baixa Conferência e contagem de valores. controle do serviço. (De carteira
assinada)
Cooperados “Fixos” digitação,
autenticação de documentos e
serviços diversos.
Rotatividade Funcionários no contrato de Cooperados chamados nos dias de
Alta experiência. pico.
Responsáveis pela conferência e Responsáveis pela digitação e
contagem de valores. serviços diversos.
Remuneração Conforme a categoria de transporte Pela categoria bancária para os
de valores bancários que controlam a
execução do serviço, pago pelos
bancos.
Pela categoria de prestadoras de
serviços para os funcionários da
empresa.
Por hora para os cooperados sejam
fixos ou não-fixos.
Segurança Monitoramento por Câmeras Monitoramento por Câmeras
Uso das novas tecnologia da Uso de uniforme Cadastramento de valores
informação Acesso restrito de utensílios pessoais Conferências dos malotes por
aos locais de trabalho. funcionários da empresa.
Uso de vestiário coletivo.

Raça, gênero e idade Grande parte dos Funcionários com Mais homens bancários,
(trabalhadores visíveis e carteira assinada e temporários são Maior número de homens, e boa
invisíveis) mulheres (principalmente no dia) e parte negros, nos cooperativados.
homens (no turno da noite). Homens Seleção dos cooperativados não-
negros e mulheres negras contratados fixos sem exigência de aparência
em número maior do que nos bancos. ou idade.
Sem restrição a idade.
Uso de Uniforme Exige Não Exige
(perda da individualidade)
Jornadas de Trabalho No Mínimo de 8 horas por dia. Nos bancários jornadas de até 8
Trabalhos além das 8 horas horas, nos funcionários também.
compensados com saídas mais cedo. Nos cooperativados fixos 6 a 8
horas e nos não-fixos conforme o
fluxo. Não trabalham todo o dia
nem um número mínimo de horas.

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