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Não é necessário retornar ou insistir em nossas zonas de perigo.

A imaginação humana é o
cerne de todas as nossas questões particulares. Quanto mais limitarmos a nossa
imaginação ao campo do conhecido e daquilo que se apresenta como novidade por causar
um infeliz incômodo em uma velha ferida, mais cavamos fundo nosso próprio buraco. O
amor, por exemplo, ao contrário do que diz o poeta adoecido, não é um cão dos diabos. O
amor é um navio guiado pelo céu cheio de estrelas, que faz o marinheiro solitário guiar-se
por entre os pontos luminosos. O amor, se quisermos explorar as imagens do cristianismo,
é mais a lira dos anjos, do que um cão dos diabos. Nunca, devemos nós, que acreditamos
em transformar a vida (rimbaud) e mudar a realidade (marx), nos apegar em imagens
decadentes. O capitalismo e sua dialética de destruição, nos leva a acreditar que nosso
papel neste mundo é sofrer, que merecemos punição por não produzirmos exatamente sua
imagem e semelhança de sucesso e propaganda. O amor, não tem nada a ver com isso. O
amor é uma instância eterna e absoluta, que nos guia de um para o outro. O amor é a
dádiva de quem se propõe à revolução, e a ser parte revolucionária do mundo. Por crer que
Marx estava certo, e Rimbaud ainda mais, sei que é indubitavelmente necessário sempre se
recompor e içar as velas do nosso destino, rumo àquilo para o que já despertamos, para tal,
é necessário compor com as imagens ascendentes. A linguagem é um campo de batalha
ardiloso é por onde guia-se a imaginação, e por tanto, é onde iremos enfrentar as nossas
maiores batalhas. É pela linguagem, que o inimigo capitalista nos vence, ao colonizar o
nosso imaginário, seja através de um rato de calças ou de um velho estúpido e doente. Se
fossem capazes e pudessem, os que se acham donos da imaginação, extinguiram os
sentimentos do mundo, pois assim, seria mais fácil dominar. É por esta razão, que tentam
desde sempre, nos ensinar o que é o amor, por um viés de mercadoria, por um viés de
posse, por um viés de uma falsa beleza que se produz em conluio com a ausência, própria
de todo ser humano. Por compreender Freud, a linguagem colonizadora, trabalha nesse
âmbito, para tentar se apropriar da imaginação dos homens. O amor romântico e
publicitário, aquele que se quer perfeito, limpo, higiênico e possuído - tem como objetivo,
cumprir falsamente o papel da ausência que sentimos quando somos dotados de
"existência" - ou seja, desde que partimos o útero, o primeiro mar que singramos antes de
atracar em terra firme. Essa ausência será por tanto, presente pelo resto de nossas vidas -
é dela que o desejo se compõe, é desse material, que a humanidade surge e também o que
nos faz únicos e maravilhosos perante a natureza. Portanto, para que o capitalismo
funcione, e sejamos todos produtivos, temos que seguir suas regras com afinco, e é por
isso, que a colonização de nosso imaginário é tão importante aos nossos inimigos. É por
isso, que insistem que acreditem que o amor é isto ou aquilo, pois é imprescindível para o
funcionamento geral desse sistema apodrecido, que determinadas diretrizes se mantenham.
O capital é um cão dos diabos - que se projeta em tudo o que toca. Inclusive o amor. E no
entanto, não somos e nunca seremos seus escravos, pois estamos despertos desde que
pela primeira vez fomos atingidos por palavras de liberdade. "Acorrentado ninguém pode
amar" diz a canção de Sérgio Ricardo, da qual faço coro. O amor só é possível, como
antítese do inferno e das correntes. O amor só é possível quando compreendido ao longe
dessas amarras da colonização dos nossos sentidos. O amor não é fruto de uma relação à
qual nos obrigam a comprar para seguirmos o que nos fazem engolir como verdade, mas
deve ser um desejo ascendente de construir um novo mundo, a imagem nova. Se não
colocarmos nossos esforços a serviço de uma revolução completa, de uma luta constante e
intensa contra a colonização dos nossos afetos, estaremos sim fadados ao fracasso. E
muito embora, seja exaustivo e sejamos drenados pelas dificuldades do caminho, é
necessário reafirmar o tempo todo os nossos verdadeiros desejos e lembrarmos sempre
que o amor existe e apesar de também ser signo de intensa disputa - é dos poucos signos
que o inimigo será capaz de se apropriar completamente - pois é magnético, convulsivo e
muito ao contrário do capital, não é somente uma invenção humana a ser superada - mas
uma instância do desejo a ser habitada por todos nós, que tivemos até aqui coragem, de
enfrentar a vida com a postura de quem quer e acredita na necessidade de seguir em frente
e avançar os caminhos de toda a humanidade.

Escrevi esse texto, para tentar te dizer algumas coisas que tenho mais dificuldade de
elaborar em palavras ditas, por que te amo, por que estou triste em te ver triste e tenha me
afetado muito com sua dor, por que me reconheço nela, porque sei que você é um homem
muito poderoso e querido. Saiba que eu tô aqui, e que viraremos qualquer jogo se nos
unirmos. Espero que esteja mais firme hoje, mano. Qualquer coisa, dá um salve.

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