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O universo vai acabar; saiba como a ciência nos

permite uma fuga espetacular


Por Michio Kaku
Especial para a
Revista Prospect

O universo está descontrolado, expandindo-se


aceleradamente. Um dia, toda a vida inteligente
enfrentará o destino derradeiro: o grande congelamento.
E uma civilização avançada teria que embarcar na
viagem final: a fuga para um universo paralelo.

Na mitologia norueguesa, o Ragnarok, ou "crepúsculo dos


deuses", começa quando a Terra é vítima de uma terrível
onda de frio. O próprio céu congela, e os deuses perecem
em grandes batalhas travadas contra serpentes malignas e lobos
assassinos. A escuridão eterna cai sobre a Terra exposta e congelada,
enquanto o Sol e a Lua são devorados. Odin, o pai de todos os deuses,
finalmente cai moribundo, e o próprio tempo pára.

Será que essa antiga lenda prevê o nosso futuro? Desde o trabalho de Edwin
Hubble na década de 20, os cientistas sabem que o universo se expande,
mas a maior parte deles acreditava que o processo de expansão se
desacelerava à medida que o universo envelhecia.

Em 1998, astrônomos do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley e da


Universidade Nacional Australiana calcularam o ritmo da expansão,
estudando dezenas de poderosas explosões de supernovas em galáxias
distantes, eventos capazes de iluminar o universo inteiro. Eles não
acreditaram nos seus próprios dados.

Alguma força desconhecida fazia com que as galáxias se distanciassem


umas das outras, o que implicava na aceleração da expansão do universo.
Brian Schmidt, um dos líderes do grupo, conta: "Eu fiquei balançando a
cabeça, sem acreditar, mas havíamos checado tudo. Relutei em dar a notícia
a outras pessoas, porque acreditei sinceramente que seríamos
massacrados".
Os físicos correram aos seus quadros-negros e perceberam que alguma
"energia escura" de origem desconhecida, similar à "constante cosmológica"
de Einstein, estava agindo como uma força antigravitacional.

Aparentemente, o próprio espaço vazio contém energia escura repulsora em


quantidade suficiente para explodir o universo. Quanto mais o universo se
expande, mais energia escura existe para fazer com que ele se expanda
ainda mais rapidamente, levando a um modelo exponencial de escape.

Em 2003, esse resultado surpreendente foi confirmado pelo satélite WMAP


(sigla em inglês de Sonda Wilkinson de Medida da Anisotropia em
Microondas). Girando em uma órbita localizada a cerca de 1,6 milhão de
quilômetros da Terra, esse satélite é equipado com dois telescópios capazes
de detectar a débil radiação de microondas que permeia o universo.

Ele é tão sensível que é capaz de fotografar detalhadamente o brilho residual


da radiação de microondas deixada pelo bigue-bangue, que ainda circula
pelo universo. O satélite WMAP, de fato, nos forneceu "fotos de bebê", de
uma época na qual o universo tinha apenas 380 mil anos de idade.

O satélite resolveu a antiga questão referente à idade do universo: ele tem


oficialmente 13,7 bilhões de anos (a margem de erro da estimativa é de 1%).
Mas o mais notável é que os dados mostraram que a energia escura não é
uma ocorrência fortuita, mas que compõe 73% da matéria e da energia de
todo o universo.

Para tornar o mistério ainda mais profundo, os dados revelaram que 23% do
universo consistem de "matéria escura", uma forma bizarra de matéria que é
invisível mas que ainda possui peso. Hidrogênio e hélio correspondem a 4%,
do universo, e os elementos mais pesados, você e eu incluídos, a apenas
0,03%. A energia escura e a maior parte da matéria escura não consistem de
átomos, o que significa que, ao contrário daquilo no qual os antigos gregos
acreditavam e àquilo que é ensinado em todo curso de química, a maior
parte do universo não é composta de átomos.

À medida que o universo se expande, o seu conteúdo de energia se dilui e


sua temperatura despenca para valores próximos ao zero absoluto, quando
os átomos deixam de se mover.
Uma das leis incontornáveis da física é a segunda lei da termodinâmica, que
afirma que no fim tudo descamba para a decadência, que a "entropia"
(desordem ou caos) total no universo sempre aumenta. Isso significa que o
ferro sofre oxidação, nossos corpos envelhecem e desmoronam, impérios
caem, estrelas exaurem seu combustível nuclear, e o próprio universo acaba,
à medida que as temperaturas descerem uniformemente rumo ao zero
absoluto.

Charles Darwin se referia a essa lei quando escreveu: "Acreditando, como eu


acredito, que o homem em um futuro distante será bem mais perfeito do que
aquela criatura que atualmente é, para mim é intolerável pensar que tanto ele
quanto todos os outros seres conscientes estão condenados à completa
aniquilação, depois de experimentar um progresso lento e de longa
continuidade".

E uma das passagens mais deprimentes da língua inglesa foi escrita por
Bertrand Russel, que descreveu o "desespero irredutível" que sentiu ao
pensar no futuro distante: "Nenhum fogo, heroísmo ou intensidade de
pensamento ou sentimento é capaz de preservar uma vida para além da
sepultura.

Todos os trabalhos de eras, toda a devoção, toda a inspiração, todo o brilho


intenso do gênio humano, estão condenados à extinção na vasta morte do
sistema solar; e todo o templo das realizações humanas terá inevitavelmente
que ser enterrado sob os destroços de um universo em ruínas".

Russel escreveu essa passagem em uma era anterior às viagens espaciais.


Atualmente, a morte do sol não parece tão catastrófica, mas o fim do
universo inteiro parece ser inevitável. Assim, em algum dia de um futuro
distante, a última estrela deixará de brilhar, e o universo estará repleto de
detritos nucleares, estrelas de nêutrons mortas e buracos negros.

Civilizações inteligentes, como moradores de rua esfarrapados, amontoados


em volta de uma fogueira que se apaga, se reunirão em torno das últimas
centelhas tremulantes oriundas de buracos negros emitindo uma débil
radiação de Hawking.
A teoria das cordas seria a salvação?

Embora a termodinâmica e a cosmologia apontem para a morte inevitável de


todas as formas de vida no universo, ainda existe uma esperança. Trata-se
de uma lei da evolução que preconiza que, quando o ambiente muda
radicalmente, a vida tem que se adaptar, fugir ou morrer. A primeira
alternativa parece ser impossível. A última é indesejável. Isso nos deixa com
apenas uma escolha: fugir do universo.

Embora o conceito de abandonar o nosso universo moribundo para adentrar


um outro pareça ser uma loucura total, não existe nenhuma lei da física que
impeça a entrada em um universo paralelo. A teoria da relatividade geral de
Einstein dá margem à existência de "buracos de minhoca" (Fendas
Espaciais), ou portais que conectam universos paralelos, por vezes
chamados de "pontes de Eintein-Rosen". Mas ainda não se sabe se as
correções quânticas permitiriam a realização de tal jornada.

Embora no passado tenha sido considerado uma idéia absurda, o conceito


do "multiverso" --ou seja, que o nosso universo coexiste com um número
infinito de universos paralelos-- gerou recentemente grande interesse em
meio a físicos de várias tendências. Primeiro, a principal teoria consistente
com os dados do WMAP é a teoria "inflacionária", proposta por Alan Guth, do
MIT, em 1979.

Ela postula uma expansão turbinada do universo no início dos tempos. A


idéia do universo inflacionário explica elegantemente vários mistérios
cosmológicos persistentes, incluindo o achatamento e a uniformidade do
universo.

Mas, considerando que os físicos ainda não sabem o que motivou esse
processo inflacionário rápido, ainda existe a possibilidade de que isso possa
ocorrer novamente, em um ciclo interminável. Essa é a idéia inflacionária
caótica de Andrei Linde, da Universidade Stanford, segundo a qual de
"universos pais" brotam "universos bebês", em um ciclo contínuo e eterno.
Assim como bolhas de sabão que se dividem em duas bolhas menores, os
universos podem brotar constantemente de outros universos.

Mas o que causou o bigue-bangue e motivou tal inflação? Essa pergunta


continua sem resposta. Considerando que o bigue-bangue foi um fenômeno
tão intenso, temos que abandonar a teoria da relatividade geral de Einstein,
que forma a estrutura subjacente de toda a cosmologia. A teoria da gravidade
de Einstein surge no instante do bigue-bangue, e portanto não é capaz de
responder às profundas questões filosóficas e teológicas geradas por aquele
evento.

Em se tratando dessas temperaturas incríveis, precisamos incorporar a teoria


quântica --a outra grande teoria que emergiu no século 20--, que governa a
física do átomo.

A teoria quântica e a teoria da relatividade de Einstein são opostas. A


primeira governa o mundo do muito pequeno, o peculiar reino subatômico
dos elétrons e quarks. Já a teoria da relatividade governa o mundo do muito
grande --dos buracos negros e dos universos em expansão.

Portanto, a relatividade não é apropriada para explicar o instante do bigue-


bangue, no qual o universo era menor do que uma partícula subatômica.
Naquele momento seria de se esperar que os efeitos da radiação
suplantassem os da gravidade, e, sendo assim, precisamos de uma
descrição quântica da gravidade. De fato, um dos maiores desafios para os
físicos é unificar essas teorias em uma teoria única e coerente de todas as
forças do universo.

Atualmente os físicos estão procurando por essa "teoria de tudo". Várias


propostas foram feitas no decorrer dos últimos 50 anos, mas todas se
revelaram inconsistentes ou incompletas. Até o momento, a principal
candidata (na verdade, a única) é a teoria das cordas.

A mais recente encarnação da teoria das cordas, a teoria-M, pode responder


a uma questão que há séculos confunde os defensores das dimensões
superiores: onde estão essas dimensões? A fumaça é capaz de se expandir
e de preencher uma sala inteira, sem entretanto se desvanecer no
hiperespaço.

Sendo assim, as dimensões superiores, se é que existem, devem ser


menores do que um átomo. Se o espaço de dimensões superiores fosse
maior do que um átomo, deveríamos ver os átomos penetrando e
desaparecendo misteriosamente em uma dimensão mais elevada, algo que
não observamos no laboratório.
Na velha concepção de teoria das cordas, era necessário "enrolar" ou dobrar
seis de dez dimensões originais, para que sobrasse o atual universo
tetradimensional. Essas dimensões indesejáveis eram compactadas em uma
minúscula bola (denominado espaço Calabi-Yau), demasiadamente pequena
para ser observada.

Mas a teoria-M acrescenta uma novidade a esse quadro: o tamanho de


algumas dessas dimensões superiores pode ser grande, ou mesmo infinito.
Imagine duas folhas paralelas de papel. Se uma formiga vivesse em cada
uma das folhas, cada um dos insetos veria a sua folha como sendo todo o
universo, sem saber da existência de um outro universo vizinho. De fato, o
outro universo seria invisível.

Cada formiga levaria a sua vida sem saber da existência de um outro


universo a apenas alguns centímetros de distância. De maneira similar, o
nosso universo pode ser uma membrana flutuando em um hiperespaço de 11
dimensões, e pode ser que desconheçamos a existência dos universos
paralelos que flutuam nas nossas vizinhanças.

Uma versão interessante da cosmologia da teoria-M é o universo "ekpirótico"


(derivado da palavra grega para "conflagração"), proposto por Paul
Steinhardt, Burt Ovrut e Neil Turok. Segundo essa concepção um universo é
uma membrana achatada e infinita flutuando em um espaço
multidimensional.

Mas, ocasionalmente, a gravidade atrai uma membrana vizinha. Cada um


desses universos paralelos se desloca velozmente na direção do outro até
colidirem, liberando uma quantidade colossal de energia. Essa explosão cria
o nosso universo conhecido e faz com que os dois universos paralelos sejam
arremessados em direções opostas do hiperespaço.

Procurando dimensões superiores

O interesse intenso pelas dimensões superiores, gerado pela teoria das


cordas, se infiltrou lentamente no mundo da física experimental. Conversas
mantidas durante jantares acabaram por se traduzir em experiências
multimilionárias de física.
Na Universidade do Colorado em Denver, foi realizada a primeira experiência
para a procura de um universo paralelo, talvez localizado a apenas
milímetros de distância. Os físicos procuraram por minúsculos desvios da lei
de Newton do inverso do quadrado da distância para a gravidade.

A luz de uma vela se dilui à medida que se dispersa, diminuindo segundo o


inverso do quadrado da distância da sua fonte. De forma similar, segundo a
lei de Newton, a gravidade também se dispersa pelo espaço e diminui da
mesma maneira.

Mas em um universo tetradimensional é maior o campo no qual a luz e a


gravidade se disseminam, de forma que os valores decrescem segundo o
cubo da distância. Assim, ao procurar por desvios ínfimos da lei do inverso
do quadrado, é necessário determinar a presença da quarta dimensão.

A lei de Newton do inverso do quadrado é tão precisa que é capaz de guiar


as nossas sondas espaciais através do sistema solar. Mas ninguém sabe se
ela funciona em uma escala milimétrica.

Até o momento, tais experiências não deram nenhum resultado. Outros


grupos estão buscando desvios ainda menores. Físicos da Universidade
Purdue, em Indiana, procuram testar a lei no nível atômico, utilizando a
nanotecnologia.

Outras possibilidades também são exploradas. Em 2007, o acelerador de


partículas de alta energia LHC (Large Hadron Collider), capaz de
bombardear partículas subatômicas com uma energia colossal de 14 trilhões
de elétron-volts (uma energia dez trilhões de vezes maior do que a de uma
reação química típica), será ativado próximo a Genebra.

Essa máquina enorme, que é o maior fragmentador de átomos do


mundo,com uma circunferência de 27 quilômetros, localizada na fronteira
entre França e Suíça, trabalhará com dimensões dez mil vezes menores do
que a de um próton. Os físicos esperam descobrir todo um grupo novo de
partículas subatômicas que não aparecem desde o bigue-bangue.

Eles prevêem que o LHC poderá criar partículas exóticas como mini buracos
negros e partículas supersimétricas, apelidadas de "spartículas", que
fornecerão evidências indiretas para apoiar a teoria das cordas. Segundo
essa teoria, toda partícula possui uma super-parceira. O parceiro de um
elétron é um "selétron", o de um quark um "squark", e assim por diante.

Além do mais, por volta de 2012, o detector de ondas gravitacionais Lisa


(sigla em inglês de Antena Espacial de Interferômetro a Laser) será colocado
em órbita. O Lisa será capaz de detectar as ondas gravitacionais de choque
emitidas menos de um trilionésimo de segundo após o bigue-bangue.

Ele consistirá de três satélites orbitando o Sol, conectados por feixes de


laser, formando um grande triângulo espacial no qual cada lado terá cinco
milhões de quilômetros. Qualquer onda gravitacional que atingir o Lisa
perturbará os lasers, e essa pequena distorção será captada por
instrumentos, assinalando a colisão de dois buracos negros ou a própria
onda de choque do bigue-bangue.

O Lisa é tão sensível --é capaz de medir distorções da ordem de um décimo


do diâmetro de um átomo-- que poderá testar vários dos cenários propostos
para o universo pré-bigue-bangue, incluindo a teoria das cordas.

Passos para deixar o universo

Infelizmente, a energia necessária para manipular essas dimensões mais


altas, em vez de apenas observá-las, fica bem além de qualquer recurso que
estará à nossa disposição em um futuro visível: 1019 bilhões de elétron-volts,
ou um quadrilhão de vezes a energia do LHC. Para operações em tal escala
é necessária a tecnologia de uma civilização super avançada.

A fim de organizar uma discussão a respeito de civilizações extraterrestres


avançadas, os astrofísicos utilizam freqüentemente a classificação de
civilizações dos tipos I, II e III, introduzida pelo astrofísico russo Nikolai
Kardashev nos anos 60, que categorizou tais civilizações segundo níveis de
consumo de energia.

Poderia-se esperar que uma civilização Tipo III, utilizando toda a capacidade
dos seus inimagináveis recursos galácticos, fosse capaz de escapar do
grande congelamento. Os corpos dos cidadãos de tal civilização, por
exemplo, poderiam ser geneticamente alterados e os seus órgãos
substituídos por implantes computadorizados, representando uma fusão
sofisticada de tecnologias de silício e carbono.
Mas até mesmo esses corpos super-humanos não sobreviveriam ao grande
congelamento. Isso porque nós definimos inteligência como sendo a
capacidade de processar informação. Segundo os físicos, todas as
máquinas, sejam computadores, foguetes, locomotivas ou máquinas a vapor,
dependem em última instância da extração da energia dos diferenciais de
temperatura: as máquinas a vapor, por exemplo, trabalham por meio da
extração de energia da água em ebulição.

Mas o processamento de informações, e, por conseguinte, a inteligência,


exige energia fornecida por máquinas e motores, algo que se torna
impossível quando os diferenciais de temperatura caem para zero . Segundo
as leis da física, em um universo uniformemente gelado, onde inexistam
diferenças de temperatura, a vida inteligente não poderia sobreviver.

Mas considerando que provavelmente faltam ainda bilhões ou trilhões de


anos para o grande congelamento, existe tempo para que uma civilização do
Tipo III elabore a única estratégia consistente com as leis da física: fugir
deste universo. Para fazer tal coisa, uma civilização avançada teria primeiro
que descobrir as leis da gravidade quântica, que podem ou não vir a ser a
teoria das cordas.

Essas leis serão cruciais para o cálculo de vários fatores desconhecidos, tais
como a estabilidade dos buracos de minhoca (Fendas Espaciais) que nos
conectam a universos paralelos, e a maneira como saberemos qual será o
aspecto de tais mundos paralelos. Antes de saltarmos para o desconhecido,
precisamos saber o que existe do outro lado. Mas como dar tal salto? Eis
aqui algumas maneiras:

Encontrar um buraco de minhoca (Fenda Espacial) criado por causas


naturais

Uma civilização avançada que colonizou a galáxia pode ter se deparado


durante as suas explorações passadas com resíduos exóticos primordiais do
bigue-bangue. A expansão original foi tão rápida e explosiva que até mesmo
buracos de minhoca (Fendas Espaciais) diminutos podem ter sido estendidos
e violentamente expandidos até adquirirem dimensões macroscópicas.
Buracos de minhoca (Fendas Espaciais), cordas cósmicas, matéria negativa,
energia negativa, falsos vácuos e outras criaturas exóticas da física podem
ser relíquias deixadas pela criação.

Mas se esses portais surgidos devido a causas naturais não forem


encontrados, a civilização precisará tomar medidas mais complexas e
árduas.

Enviar uma sonda através de um buraco negro

Atualmente sabemos que os buracos negros são abundantes; existe um


deles assentado no centro da nossa galáxia, dotado de uma massa
aproximada de três milhões de sóis. Sondas enviadas através de um buraco
negro poderiam esclarecer algumas questões não resolvidas. Em 1963, o
matemático Roy Kerr demonstrou que um buraco negro que gire
rapidamente não entraria em colapso até se transformar em um mero ponto.
Em vez disso se tornaria um anel rotatório, impedido de entrar em colapso
gravitacional devido às forças centrífugas.

Todo buraco negro é cercado por um horizonte de eventos, ou ponto de não


retorno: a passagem pelo horizonte de eventos é uma viagem sem volta. É
de se imaginar que para uma viagem de ida e volta seriam necessários dois
desses buracos negros. Mas para uma civilização avançada fugindo do
grande congelamento uma viagem só de ida seria o bastante.

O que acontece com alguém que passa pelo anel de Kerr ainda é um
assunto que gera polêmicas. Alguns acreditam que o ato de entrar em um
buraco de minhoca (Fenda Espacial) faria com que este se fechasse,
tornando-se instável. E a luz que caísse em um buraco negro seria desviada
para o azul, criando a possibilidade de que quem passasse para um universo
paralelo fosse literalmente fritado.

Ninguém sabe ao certo, e por isso é necessário que se façam experiências.


Essa controvérsia esquentou no ano passado quando Stephen Hawking
admitiu que cometeu um erro 30 anos atrás, quando apostou que os buracos
negros devoram tudo, incluindo informação. Talvez a informação seja
esmagada para sempre, ou talvez ela passe para o universo paralelo no
outro lado do anel de Kerr. Segundo a mais recente idéia de Hawking a
informação não se perde totalmente. Mas ninguém acredita que tenha sido
proferida a palavra final a respeito dessa questão delicada.

Para obter dados extras a respeito de espaços-tempos estendidos até o


ponto de ruptura, uma civilização avançada precisaria criar um "buraco negro
lento". Em 1939, Einstein analisou a massa rotatória de restos estelares que
passavam por um lento processo de colapso gravitacional. Embora Einstein
tenha demonstrado que essa massa rotatória não entraria em um colapso
que resultasse em um buraco negro, uma civilização avançada poderia
duplicar esse experimento em "câmera lenta", coletando uma porção
giratória de estrelas de nêutrons com massa menor do que a de cerca de
três sóis.

A seguir, injetar-se-ia gradualmente nessa massa um material estelar extra,


forçando-a a entrar em colapso gravitacional. Ao invés de progredir no
processo de colapso até se tornar um ponto, a massa estelar se
transformaria em um anel, possibilitando assim que os cientistas
testemunhassem a formação de um buraco negro de Kerr em câmera lenta.

Criar energia negativa

Caso os anéis de Kerr se mostrem demasiadamente instáveis ou letais,


poder-se-ia também cogitar em abrir buracos de minhoca (Fendas Espaciais)
por meio de matéria e energia negativas. Em 1988, Kip Thorne e os seus
colegas do Instituto de Tecnologia da Califórnia demonstraram que se
alguém contasse com matéria ou energia negativas em quantidade
suficiente, poderia usá-las para a criação de um buraco de minhoca
"atravessável" --um buraco de minhoca (Fenda Espacial) pelo qual se
pudesse passar livremente em uma viagem de ida e volta entre o laboratório
e um ponto distante no espaço (e até no tempo). A matéria e a energia
negativas seriam suficientes para manter a entrada do buraco de minhoca
(Fenda Espacial) aberta para tal viagem.

Infelizmente, ninguém jamais viu a matéria negativa. Em princípio, ela


deveria pesar menos que o nada e cair para cima, em vez de para baixo.
Mesmo que ela existisse quando a Terra foi criada, teria sido repelida pela
gravidade terrestre e deslocado-se para o espaço.

Porém, a energia negativa foi vista em laboratório na forma do efeito Casimir.


Normalmente, a força existente entre duas placas paralelas descarregadas
deveria ser zero.

Mas se flutuações quânticas fora das placas fossem maiores do que as


flutuações entre as placas, uma força resultante de compressão seria criada.
As flutuações que empurram as placas a partir de fora são maiores do que
as flutuações que as empurram para fora a partir dos seus interiores, de
forma que essas placas descarregadas se atraem mutuamente.

Esse fenômeno foi previsto pela primeira vez em 1948 e registrado em 1958.
No entanto, a energia Casimir é minúscula, sendo inversamente proporcional
à distância entre as placas elevada à quarta potência.

Para a utilização do efeito Casimir seria necessária uma tecnologia avançada


para comprimir essas placas até que a separação entre elas fosse
extremamente pequena. Se essas placas paralelas fossem remodeladas em
formato de uma esfera de duas camadas, e se grandes quantidades de
energia fossem utilizadas para comprimir as duas placas esféricas uma
contra a outra, poderia ser gerada uma quantidade suficiente de energia
negativa para que o interior da esfera se separasse do resto do universo.

Uma outra fonte de energia de negativas é o raio laser. Pulsos de energia


laser contém "estados comprimidos", que são dotados tanto de energia
negativa quanto de positiva. O problema é separar a energia negativa da
positiva dentro de um feixe de laser.

Embora isso seja teoricamente possível, trata-se de algo extremamente


difícil. Se uma civilização sofisticada fosse capaz de fazê-lo, então poderosos
raios laser poderiam gerar energia negativa suficiente para que a esfera se
descolasse do restante do universo.

Até mesmo buracos negros possuem energia negativa a sua volta, nas
proximidades dos seus horizontes de eventos. Em princípio, isso poderia
gerar grandes quantidades de energia negativa. No entanto, os problemas
técnicos relacionados à extração de energia negativa tão perto de um buraco
negro são extremante complexos.

Criar um universo bebê


Segundo a inflação, apenas algumas gramas de matéria seriam suficientes
para a criação de um universo bebê. Isso porque a energia positiva da
matéria anularia a energia negativa da gravidade. Se o universo fosse
fechado, elas se anulariam em proporções exatas. De certa forma, o
universo pode ser uma espécie de refeição gratuita, conforme enfatizou
Guth. Por mais estranho que pareça, não é necessária nenhuma energia
externa para a criação de um universo inteiro.

Os universos bebês são em princípio criados naturalmente quando uma certa


região do espaço-tempo se torna instável e entra em um estado chamado de
"falso vácuo", que desestabiliza a composição do espaço-tempo. Uma
civilização avançada poderia fazer tal coisa deliberadamente ao concentrar
energia em uma única região. Isso exigiria a compressão de matéria até uma
densidade de 1080 g/cm3, ou que ela fosse aquecida até uma temperatura
de 1029 graus Kelvin.

Para a criação das condições fantásticas necessárias à abertura de um


buraco de minhoca com energia negativa, ou à criação de um falso vácuo
com energia positiva, talvez fosse necessário um "esmagador cósmico de
átomos".

Os físicos estão tentando construir "aceleradores de mesa" que poderiam, a


princípio, gerar bilhões de elétron-volts em uma mesa de cozinha. Eles
utilizaram poderosos raios laser para conseguir uma energia de aceleração
de 200 bilhões de elétron-volts por metro, um novo recorde.

O progresso é rápido, e a energia obtida aumenta dez vezes a cada cinco


anos. Embora problemas técnicos ainda impeçam a criação de um
verdadeiro acelerador de mesa, uma civilização avançada conta com bilhões
de anos para aperfeiçoar esse e outros artefatos.

Para atingir a energia de Planck (1028 eV) com essa tecnologia de laser
seria necessário um esmagador de átomos com um comprimento de dez
anos luz, uma distância maior do que a que nos separa da estrela mais
próxima, algo que poderia estar muito bem ao alcance tecnológico de uma
civilização do Tipo III.

Considerando que o vácuo do espaço vazio é melhor do que qualquer vácuo


conseguido na Terra, talvez não fosse necessária uma tubulação com anos-
luz de comprimento para conter o feixe de partículas subatômicas. Este
poderia ser disparado no espaço vazio. Estações de força precisariam ser
instaladas ao longo da trajetória para bombear energia laser no feixe e
focalizá-lo.

Uma outra possibilidade seria curvar a trajetória em um círculo, de forma que


ela coubesse no sistema solar. Magnetos gigantes poderiam ser instalados
em asteróides a fim de curvar e focar o feixe em uma trajetória circular em
torno do Sol.

O campo magnético necessário para curvar o feixe seria tão grande que a
passagem de energia pelas bobinas poderia derretê-las, o que significa que
talvez só pudessem ser utilizadas uma única vez. Após a passagem do feixe,
as bobinas derretidas teriam que ser descartadas e substituídas a tempo
para a próxima passagem.

Construir uma máquina de implosão a laser

Em princípio, seria possível criar raios laser de energia ilimitada; os únicos


empecilhos são a estabilidade do material e a fonte de energia. No
laboratório, os lasers de terawatt (um trilhão de watts) atualmente são
comuns, e os de petawatt (um quadrilhão de watts) estão se tornando
lentamente factíveis (a título de comparação, uma usina nuclear comercial
gera apenas um bilhão de watts de energia contínua).

É possível até pensar em um raio-X laser alimentado pela liberação de


energia de uma bomba de hidrogênio, que poderia inserir uma quantidade
inimaginável de energia no feixe de radiação. No Laboratório Nacional
Lawrence Livermore, uma bateria de lasers é disparada radialmente contra
um pequeno fragmento de um composto de deutério e lítio, o ingrediente
ativo da bomba de hidrogênio, a fim de domar o poder de uma fusão
termonuclear.

Uma civilização avançada poderia criar enormes estações de laser nos


asteróides e, a seguir, disparar milhões de raios laser contra um único ponto,
criando temperaturas e pressões extremas, atualmente inimagináveis.

Enviar um nano-robô para recriar a civilização


Se os buracos de minhoca (Fendas Espaciais) criados segundo os passos
anteriormente descritos forem muito pequenos, instáveis, ou se os efeitos da
radiação forem demasiadamente intensos, então talvez se pudesse enviar
apenas partículas de dimensões atômicas através de um buraco de minhoca
(Fenda Espacial). Nesse caso, a civilização poderia adotar a derradeira
solução: enviar uma "semente" de dimensões atômicas pelo buraco de
minhoca, capaz de regenerar a civilização do outro lado.

Esse processo é comumente encontrado na natureza. A semente de um


carvalho, por exemplo, é compacta, rugosa e elaborada para sobreviver a
uma longa jornada e para sobreviver fora da terra. Ela também contém todas
as informações genéticas necessárias para a regeneração da árvore.

Uma civilização avançada poderia querer enviar informação suficiente pelo


buraco de minhoca para a criação de um "nano-robô", uma máquina de
dimensões atômicas auto-replicadora, construída com nanotecnologia. Ele
seria capaz de viajar a uma velocidade próxima a da luz porque teria o
tamanho de uma molécula. O artefato pousaria em uma lua árida e a seguir
utilizaria a matéria-prima encontrada para criar uma fábrica química capaz de
gerar milhões de cópias da máquina microscópica.

Uma legião desses robôs viajaria a seguir para outras luas em outros
sistemas planetários e criaria novas fábricas químicas. Esse processo se
repetiria muitas vezes, criando milhões e milhões de cópias do robô original.
Começando a partir de um único robô, haveria uma esfera de trilhões de tais
sondas-robôs se expandindo a uma velocidade próxima a da luz,
colonizando toda a galáxia.

(Essa foi a base para o filme "2001: Uma Odisséia no Espaço",


provavelmente a descrição ficcional mais cientificamente precisa de um
encontro com uma forma de vida extraterrestre. Ao invés do encontro com
discos voadores ou com a USS Enterprise, a possibilidade mais realista é a
de que façamos contato com uma sonda robô deixada na Lua por uma
civilização do Tipo III que esteve por aqui de passagem. Esse processo foi
descrito por cientistas nos minutos iniciais do filme, mas Stanley Kubrick
cortou as entrevistas da edição final).

A seguir, essas sondas-robôs criariam grandes laboratórios de biotecnologia.


As seqüências de DNA dos criadores das sondas teriam sido
cuidadosamente gravadas, e os robôs seriam projetados para injetar essa
informação em incubadoras, que a seguir clonariam toda a espécie. Uma
civilização avançada poderia também codificar personalidades e memórias
dos seus habitantes e inseri-las nos clones, permitindo que toda a raça
reencarnasse.

Embora pareça fantástico, esse cenário é consistente com as leis conhecidas


da física e da biologia, e está ao alcance de uma civilização do Tipo III. Não
há nada nas leis da ciência que impeça a regeneração de uma civilização
avançada a partir do nível molecular. Para uma civilização moribunda
aprisionada em um universo em processo de congelamento, essa poderia
ser a última esperança.

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