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Poemas Resgatados da Lixeira

Silva Rodrigues

Poemas Resgatados
da Lixeira

Segunda Edição
Título Original

POEMAS RESGATADOS DA LIXEIRA

Primeira publicação em

Martinópolis, São Paulo, Brasil

2022

2ª Edição

Todos os direitos da obra

Poemas Resgatados da Lixeira

Reservados ao autor

Copyright do texto © Silva Rodrigues,2022

R696p Rodrigues, Silva -20022

Poemas Resgatados da Lixeira/Silva Rodrigues —2 ed.

Martinópolis, SP: Ed. do Autor,2022.

ISBN: 978-65-00-51621-0

1. Poesia Brasileira. I. Titulo. II. Rodrigues, Silva

CDD —B869.
Informação
Nota da Edição

Ao organizar essa edição o autor reuniu os seus trabalhos


realizados nos últimos dois anos, visando talvez a qualidade
ou o período em que foi escrito.
A organização da presente obra foi feita de duas formas, a
primeira parte com o titulo de poemas dedicados a lixeira,
onde se encontram versos melancólicos e amadores, que
representam mais a formação de uma voz poética do autor,
essa busca por si dentro do verso, a segunda se chama
poemas resgatados da lixeira, que também nomeia o livro, e
nela estão contidos poemas escritos após um período de
maior reflexão acerca do ‘ser poeta’ do autor.
São poemas menos amadores, que representam a evolução
do autor durante o período, e consequentemente mais
experimentais e livres da faceta mais clássica adotada na
primeira parte.
É isto, não contratei ninguém para fazer a introdução, se
quiser pode partir direto para leitura., pois a seguir eu
escrevi apenas coisas vagas para poder preencher espaço.
Gostaria muito de fazer uma boa introdução para um bom
livro de poemas, mas ai eu teria dois problemas: Fazer uma
boa introdução e escrever bons poemas.
Desses que são recitados em voz alta e são objetos de
estudo.
Eu gostaria, sim, muito, disso tudo.
Mas eu teria que largar de fazer meu belo verso moderado.
Mas isso não deixo de lado.
E além do mais, ninguém lê o poeta em vida e

Desta jornada gostaria de sair vivo

Pois sendo autor de versos desconexos já sou um

Suicida.

Queria antes, ver a vida que rimei numa coletânea

de livro de bolso.

Mas escrevo tudo em almaço e em seguida logo amasso

Sou um caso clássico de poeta teimoso.

Silva Rodrigues
Martinópolis,2022
Poemas Dedicados a Lixeira

R.I.P
Aos queridos vermes que corroerão minha carne dedico
este poema.
Quero que se findem meus dias e nos meus versos fundem-
se abadias, que cultuem o mundo, o mais puro do profano
amor das dores.
E que após o circo dantesco encerrar-se, grafem na minha
lápide, com fezes e sangue: “Aqui jaz um se’’. E só assim
talvez, eu vá para o inferno de uma vez.
Mas praquê tão funesto meu deus? Eu digo de morte pois
ela é de todos os espíritos a excepcional sorte.
Que a lâmina da foice do fim me corte, e que eu vá para o
mais eterno e sublime fim.
A danação meus versos! De coração que se vão, para o
lugar onde todos os versos estão: Na cova com seus
autores.
De nada adiantou comunicar ao mundo dores e amores,
alguns leram, outros mais sábios ignoraram.
E a vala foram, é este o poder da palavra: te mandar
pravala, pois a mão que escreve o que acalma é a mesma
que todas as estruturas abala.
Bem como a boca que beija é a mesma que mal deseja.,
quero a morte bem como o cego ver
Quero a morte bem como o político poder
Quero a morte tanto quanto posso querer
Mas querer, tu sabes, não é poder.
Ao menos quero ser coroado, pela morte, pelos vermes
corroído, pelos corações abandonado, por todos esquecido.

[7]
Poemas Dedicados a Lixeira

E aqui encerro este podre texto curto que parece tão


infindo.
A morte, todos.

[8]
Poemas Dedicados a Lixeira

Choro do Solitário
Nesta noite vazia, de eterna agonia, não tenho ninguém
para conversar
Nem um corpo para abraçar
Um ombro para chorar
Alguém que me dê prazer.
Por isso fico a vaguear
Sem ninguém encontrar
Então só me resta escrever.
Para minha insanidade não se esvair
E meus demônios não tomarem conta de mim enquanto
sigo assim
Por este mundo de coração vazio a andar
Sem ninguém,
Ninguém que goste de mim.

[9]
Poemas Dedicados a Lixeira

Story
Bastou um olhar do meu lugar para se aproximar, e
conversar sobre minhas intenções de aproximar nossos
corações, e ali ficar.
Para eternizar em nossas memórias, nossas lindas e curtas
histórias, que cabe ao tempo alongar, para nos dizer, o que
vai ser de mim e você, e como nosso fim será.
Fomos juntos, desbravar nossos mais profundos,
conversando sobre diversos assuntos, reunidos não fomos
revelados, mas escondidos, por temos sentimentos
proibidos e não aceitados.
O que fosse, não era para ser, eu e você seremos ou
seríamos? Não dá para saber o que é agora o tempo dirá,
talvez uma vez, quem sabe mais, nossas memórias se
alonguem até para um aqui jaz.
Onde fizemos nossas trilhas, dançamos nossos tangos e
cantamos nossas quadrilhas, não escondemos o que
pensamos, tudo isso em uma cova viva em nossa mente,
daqui pra frente será uma lápide de tudo aquilo que pode
ser a união de dois sentimentos.
Que se unem em uma paixão, insistente, que não some, e
que arde constantemente.

[10]
Poemas Dedicados a Lixeira

Existência
Existo, logo sou?
E se sou, eu vivo?
Ou existo e sobrevivo?
Afinal, o que é ser, senão ser o que se é.
Tentar não ser, é nadar
Contra a maré
E ser levado pelas correntezas das
Incertezas do ser ou
Existir
É como perguntar:
Prefere morrer ou respirar?
E a morte aqui é a do
Espirito
Que morre a cada: será que sou, ou só existo?
Há algumas dúvidas que não tem resposta
E quando tem, a gente não gosta.
E há casos, em que nos perdemos na dúvida existencial,
quando deveríamos nos debruçar
Sobre a dúvida crucial:
Se levamos a vida que queremos, se vivemos uma vida de
mentiras ou se vivemos a vida real.

[11]
Poemas Dedicados a Lixeira

Carta aberta para a quarta pessoa do plural


Se tivesse me conhecido com menos passado talvez
houvesse um futuro
E o processo de se conhecer e se despedir não fosse tão
duro
Mas e se, se eu não tivesse passado eu não te teria no futuro
Talvez fosse melhor num passado futuro
Num futuro iria
Iriamos, amaríamos, sorriríamos e tudo o mais
Mas amamos, e choramos
E agora não há mais.

[12]
Poemas Dedicados a Lixeira

Flores
Flores me remetem a amores.
E esses, me remetem a dores.
Essas, que senti um dia. Quando descobri que ambos
Andam lado a lado.
Como as flores sobre o gramado.
Flores, tem diversas cores, assim como há diversos amores
Do Eros até o filia.
As flores me remetem a tudo isso, até mesmo a alergia.
Mas gosto mesmo é do gira, que tira do sol a sua energia.

[13]
Poemas Dedicados a Lixeira

Rabiscos versais de várias versões


I
Vivo do passado
E só, nada mais.
Vivo em função daquilo
Que mais me apraz.
E por isso, estou parado.
Remoendo e remoendo
Buscando sempre um sentido
Em tudo, que não foi, mas
Que poderia ter sido.
II
Morrerei te amando
Mesmo sem te ter
Seguirei cantando
Meus sentimentos por você.
III
Já andei de mãos dadas
Agora já não ando mais
Passo horas chorando
Nas madrugadas
Pensando nas minhas antigas namoradas.
Escrevendo mil e uma canções,

[14]
Poemas Dedicados a Lixeira

Mil e um haicais
Pensando nos tempos bons
Que agora não voltam mais.
IV
Um dia serei um bom fingidor, destes que escrevem versos
fantásticos
E que o público aplaude e elogia
E enquadra em escolas e em movimentos literários...
Mas para isso, preciso antes, morrer.

[15]
Poemas Dedicados a Lixeira

Quedas de Narciso
De primeira eu vacilei
E nem vi que eu cai
No meu ego tropecei
E no chão me encontrei.
Na segunda eu jurei que não ia tropeçar
Novamente, e acabei no mesmo lugar
Que acabaram grandes reis
Desesperados pra voltar.
Então eu prometi que iria mudar
E Odin imitei, decidi me enforcar, e muita atenção eu
chamei
Decidi aproveitar.
Por fim eu não mudei
Continuei a tropeçar
Pelos menos estive ao lado de iguais reis
Que me deram sua coroa para usar.

[16]
Poemas Dedicados a Lixeira

Sextina do Adeus
Adeus, a todos os atores da vida
Aqui, se encerra todo esse teatro
Levo comigo as belezas de uma existência
Insignificante e sem prazeres
Reais, nem carnais.
Infeliz, vivi uma vida de cenas.
Perfomadas de cima de um palco
Com uma plateia ansiosa por me ver cair, escorregar e ir
Rumo ao chão
Despencar como ícaro ao ver o clarão do sol, mas
Tudo que vejo é escuridão.
Para mim não há nada mais falso que
A luz, que sem rumo me conduz
Para o fundo do abismo, para
A agonia infinita de um
Mero solipsista, ao qual as regras da vida, a dor dita.
Ah! ínfima, efêmera e fútil alegria
A ti não dedico versos, e jamais
Dedicarei, me doei aos demônios
E diante deles me tornei rei
Na agonia, na dor, escrevi meus
Melhores versos, disto eu sei.

[17]
Poemas Dedicados a Lixeira

Um dia serei eternamente esquecido


E só dessa forma passará completamente
Minha agonia de ter vivido.
De encenar, me cansei
Eu nunca fui de atuar
Dos demônios me tornei rei
Mas nunca fui de reinar
Quero que tudo isso acabe
Para que eu possa descansar.
O poder das palavras pode chocar
Mas traz em si sinceridade
A dor e a vida andam lado a lado
Como duas confrades
Por isso aguardo o fim
O lindo e eterno fim.

[18]
Poemas Dedicados a Lixeira

Soneto de desamor número um

Amava – te, como jamais amei outrem


Sonhava em envolvê-la em meus abraços
Mas hoje, me encontro sem ninguém
Com meu peito feito em pedaços.

Haveria outra chance em outro instante?


Talvez um dia, nos amaremos novamente
Mas, enquanto isso, a dor me maltrata num rompente.

Lembro- me dos amores e fico contente


Ao mesmo tempo que me encontro triste
Esta mudança de humor de repente
Se instalou assim que partiste.

E para esquecer essa dor delinquente


Me coloco a escrever sonetos tristes
Que maltratam meu coração doente.

[19]
Poemas Dedicados a Lixeira

Soneto de Desamor número dois


Escrevi diversos versos que hoje se foram.
Se encontram dispersos
Pois minhas rimas acabaram
E hoje escrevo inversos.

Minhas dores estacionaram


De modo irregular no meu [coração
E sem que eu percebesse tudo se perdeu.

Triste é a canção que canto enquanto escrevo


Minha mente é rochosa
Meu peito cheio de relevos
E minha alma montanhosa.

Tanto que dentro dela me precipitei


Cai, chorei, sofri
E jamais me encontrei.

[20]
Poemas Dedicados a Lixeira

Tangamarindo sofrido
Então a banda toca
Um tango um samba um rock
Sentado à mesa eu bebo do meu
Uisque.
O sabor quente, sim quente como o
Diabo que vive dentro de mim
Que atormenta meus versos, que me
Põe a escrever assim.
Como quem não sabe o dia de amanhã
E no dia seguinte desperta
Infeliz de ter acordado, infeliz de ter sobrevivido
Infeliz de ser poeta.
E ser escritor do próprio livro de rimas, mal arranjadas e
Esquematizadas, mal vividas.

[21]
Poemas Dedicados a Lixeira

Solau da edificação
Esse prédio, esta construção
Me lembra de tempos fugidios
Que angustiam meu coração
Queria eu amar esta construção.
Mas estes empresários e engenheiros
Enrijeceram meu coração, colocaram vigas, areia
E cimento calcário e pedra.
E me transformaram num exemplar
De alguém
Que se tornou amargo por perder o teu lugar.

[22]
Poemas Dedicados a Lixeira

Os amores passam e
Com eles vão também as dores
Que ressaltam as alegrias.

Fiz tudo que queria


Fui a pasárgada
Foi lindo aquele dia.

[23]
Poemas Dedicados a Lixeira

Ode a paixão fulminante de jovens


desesperados

É como uma nota musical que


distoa da canção tocada
[incomoda.
E, sempre há um jeito, afinal sempre
tem um jeito, de tornar belo o imperfeito.
De transformar espinhos em toque de seda.
De abraçar alguém mesmo que a distância.
É interessante como amam, hoje, os jovens. Um beijo no
futuro
E um no passado, se atropelam em tudo e saem de coração
quebrado.
Dizendo: Odeio tudo, nunca deveria ter amado...
A vida reside no amor, e sem a dor o amor
Jamais seria valorizado.
Deveríamos saber disso ao declarar
Que estamos apaixonados...
Mas louve o amor!
Ave, paixão!
Que amem desenfreadamente, que se abstenham das
loucuras da razão!
E que chorem, e que sorriam, e que amem
E que sofram, mas que sofram sem sofrer...
E que não tenham dividido o coração:
Que sacrifiquem a conexão em prol de outra opção,
Que amem verdadeiramente, que amem todas as gentes
sem distinção.

[24]
Poemas Dedicados a Lixeira

Amar é o elo perdido em nosso ser, amar


A dor de amor faz a gente crescer.
E amar o mar de amor até onde conseguimos ver.

[25]
Poemas Dedicados a Lixeira

Fechei o livro
Fim de verdade
Voltei a realidade.

[26]
Poemas Dedicados a Lixeira

Se amar fosse bom


Não existiriam romances
Bom mesmo só bombom
E de vez em quando dar uns lances.

Carro corre
Que o tempo escorre
Pelo escapamento.

[27]
Poemas Dedicados a Lixeira

Roda mundo
Gira vida
O mundo gira
A vida capota.

[28]
Poemas Dedicados a Lixeira

Veloz e atroz
Como se sem voz
O peito gritou.

[29]
Poemas Dedicados a Lixeira

Entrei no ônibus
Sentei no banco
E agora, a vida segue?

[30]
Poemas Dedicados a Lixeira

Teatro vivência

Não pedimos para nascer


E sem querer viemos ao mundo
Cumprimos papéis sem querer
Para no final acabarmos todos moribundos.

Alguém nos cegou com a luz


E viemos escurecer o mundo
Atuando como palhaços.

Com sorrisos pintados


E desejos ocultos.
Presos em papéis mal roteirizados
Autoenganados pelo próprio mundo.

Essa é a vida.
É o teatro que criamos todo dia
É a nossa hipocrisia de cada dia.

[31]
Poemas Dedicados a Lixeira

Como pode ser o céu azul


Se tanta fumaça
Escapa de nós?

[32]
Poemas Dedicados a Lixeira

Máscara não
Esconde.
O como, o porquê
Nem onde.

[33]
Poemas Dedicados a Lixeira

Se eu te amasse
Eu diria
Ou talvez, escreveria.

[34]
Poemas Dedicados a Lixeira

Meu coração veio


Por sedex
Mas o amor foi extraviado.

[35]
Poemas Dedicados a Lixeira

Coral
Teu olhar moreno me fascina
suas ondas de cachos me afogam
Sua pele negra me chama.
Um dia talvez chegaremos a
ficar juntos., mas por enquanto
Nos mantemos distantes.
Sozinhos acompanhados, nos iludindo
Com outros que apenas cobrem
Instantes.
Beijando bocas diferentes de várias gentes
Que não tem o mesmo sabor de antes.
Quero ainda te levar pra um
Bistrô
Poder tomar vinho contigo te chamando de amor
Acabar um dia, com essa agonia e
Essa dor.
Por enquanto não fiz isso, mas
Ainda vou.

[36]
Poemas Dedicados a Lixeira

De verdade
Olho pro lado
Quem há
Que não mentiu uma vez?

[37]
Poemas Dedicados a Lixeira

Pássaros
Os pássaros voam livres acima de mim
voam
voam
voam
voam
voam

Todos esses que pelo céu se vão, ocultam minha visão aqui
no chão.

E com seus trajetos no ar me dizem o quanto estou


sozinho

Ah como eu queria poder voar, encontrar um pardal e


dizer: Olá, para onde o senhor está indo?

Será meu caro Oxalá? Que seguirei sempre assim sozinho?

Me diga, onde minha liberdade está

Se não posso nem sequer voar, sem ter que pegar um avião
ou um jatinho...

[38]
Poemas Dedicados a Lixeira

Ninguém gosta de poesia

Ninguém gosta de poesia, de rimar as cores com amores e


enaltecer a luz do dia.
Oh, que erro, que erro!
De pensar que poderia viver de sofrer e escrever poemas
um dia.
Mas ainda há
(ainda se é
que já não se
foi
embora também)
A chance
De viver de escrever amores e dores em forma de romance
—Largue isso de poema, deixe essa ideia desvaria
Vá fazer outra coisa, viva até uma vida vadia
Faça tudo, rode o mundo, vire vagabundo
Mas não torne a fazer poesia.

[39]
Poemas Dedicados a Lixeira

O sol bate e reflete


Escurece, amanhece
Repete.

[40]
Poemas Dedicados a Lixeira

As horas passam
e com elas a vida.
Vivemos num relógio
sem ponteiro e sem
Saída.

[41]
Poemas Dedicados a Lixeira

Lá em Cartagena
Longe de Pirapó
Pula um peixe.

[42]
Poemas Dedicados a Lixeira

Volks
Quer dizer:
Vou e quis.

Wagen
Quer dizer:
Perambulem.

[43]
Poemas Dedicados a Lixeira

Esta hora
Que não passa
Quando quero.

[44]
Poemas Dedicados a Lixeira

Já não se fazem
Passados como antes.
Vivemos tudo num presente
Constituído de instantes.

[45]
Poemas Dedicados a Lixeira

Antes de viver
Morra.
Antes de morrer, tome um café.

[46]
Poemas Dedicados a Lixeira

Semanário
No início disse ele ‘’haja verbo’ e faltou o sujeito da ação
No segundo dia:
Quem faz?
Terceiro:
Precisamos de alguém para que se conclua a ação, o ato por
si só não basta
Quarta: Amanhã é quinta, depois é sexta, deixa pra outro
dia
Na quinta não se faz nada, é prelúdio de sexta.
Sexta:

Amo os agoras, eles deixam os momentos eternos bonitos,


é a escassez de eternidade que deixa as coisas eternas,
Na falta de tudo, o quase alguma coisa já vale.
Okay, mas quem sabe se
— Um dia —
Só bastasse para que você no meu pensamento se
eternizasse?
É por isso que amo os agoras e
Os instantes finitos
Os agoras é que deixam os para sempre
Bonitos.

[47]
Poemas Dedicados a Lixeira

O vento vem
Trazendo poeira e poluição
Se eu pudesse não respirar...

[48]
Poemas Dedicados a Lixeira

Sobre Haicais
Bashô escreveria melhor
Sobre isso
Mas todos sabem disso.

[49]
Poemas Dedicados a Lixeira

Para cada parágrafo


Há um par
Que grafo.

[50]
Poemas Dedicados a Lixeira

Meio dia
Todo dia
Troco a meia.

[51]
Poemas Dedicados a Lixeira

Tal-vez
Me ocorreu que eu poderia
Ter outra vez.

[52]
Poemas Dedicados a Lixeira

Sério
Para sorrir não precisa de
Critério.

[53]
Poemas Dedicados a Lixeira

Ceci n’est pas une pipe


Isso não é verso
E isso não é um fim.

[54]
Poemas Dedicados a Lixeira

Piro no biro biro


Miro, mas não atiro
Creio, mas não admiro.

[55]
Poemas Dedicados a Lixeira

Creio que
Aqui
Cai cáqui.

[56]
Poemas Dedicados a Lixeira

O ônibus não vem


E não dá a hora
Meu deus o que faço agora?

[57]
Poemas Dedicados a Lixeira

Quatro rodas
Quatro estações
Quatro comemorações
Uma vida.

[58]
Poemas Dedicados a Lixeira

Sus
Na fila de espera
Uma enfermeira me seduz.

[59]
Poemas Dedicados a Lixeira

Festa
Acho tudo isso muito lindo
Muita bela a decoração
Mas que horas passa o busão?

[60]
Poemas Dedicados a Lixeira

Cinquentanos
Se senta anos
Se tenta anos.

[61]
Poemas Dedicados a Lixeira

Dor e glória
Morro, senhor, de a ela amor
E por ela de amor
E dela de amor, morro
Morre?
Amo a como a mim você amou
Do monte mais alto ao morro mais
Médio.
Se não a vejo, morro de desejo e tédio
Morre?
Ah como eu morro! Se morro...morrido...
De tédio, sofrido, não ver ela é um sacrilégio
É melhor não ter nascido.
Morre?

[62]
Poemas Dedicados a Lixeira

Indagação
Talvez eu devesse parar
Não dá frutos escrever, nem rimar.
É, talvez eu devesse parar...

[63]
Poemas Dedicados a Lixeira

Antítese
Claro como escuro
Confuso como conciso
Simples como mais raro
Humilde como narciso
Recente como o passado
Fraco como se fortalecido
Falante como se calado
Lembrado como esquecido
Contrário como se do lado
Aliviado como dolorido.

[64]
Poemas Dedicados a Lixeira

Sangue
De morte falemos e oremos, pois, é o que mais vemos
De morte, não de sorte, pois isso não temos
Conversemos de morte e de sangue
Pois o tempo urge.
Que falemos, e debate façamos, de morte e de sangue
Como nas ruas, onde ele todo escorre, e todo
Dia alguém morre.
Então falemos disso.
Nas paradas mortais, onde há sangue e morte
Em lugares pobres, todos locais: sangue e morte
A tal da sorte de todos os jornais: não, não para não
iguais, para esses: sangue e morte.
Sangue e morte, sangue e morte,
Sangue e morte, todo dia sangue, morte e tal.
Todo dia, todo dia, todo dia no jornal.
Só sorte e sangue, e morte.
Nas ruas, morte, você sabe o local
Lá tem gente, tem muita gente, e muito sangue tropical
E também tem morte.
Sangue e morte, no jornal
Sangue e morte nas ruas

[65]
Poemas Dedicados a Lixeira

Na vida, em todos
Sangue, e também morte, muita morte.

[66]
Poemas Dedicados a Lixeira

Desafeto local
Morto o corpo preto no chão
Motivo: cobrou uma divida
Para poder fazer uma refeição.
O jornal viu e ouviu, horrorizou
E chocou, a população foi as ruas
Mas, ninguém ouviu.

[67]
Poemas Dedicados a Lixeira

Você
Você ainda pensa em mim?
Tem dias que me pego te vendo andando
Me diz como anda, e como vai
Se está bem ou se está mal
Tem visto a lua? Tem sorrido?
Me fale algo que eu não saiba
Conte todos os seus segredos novamente, vamos tocar
nossas almas como naquele dia.
Você ainda pensa em mim?

Tenho saudade do seu toque, da sua alma


De jovem apaixonada, do sotaque e da
Voz emocionada contando os sonhos
Como uma criança que quer voar
Tenho vontade de te ver e saber:
Você ainda pensa em mim?

Pois eu tenho pensado em você.

[68]
Poemas Dedicados a Lixeira

Exorcismo quinto
(num verde pasto)
Enfim a paz sinto nesse lugar.
Sem logos, sem marcas, sem massas nem milionários
querendo me controlar.
O mundo está indo rumo ao fim e não há nada que possa
parar
Mas sinto que enfim atingi a paz que queria
Sonho hoje como sonhei quando pequeno um dia.
Vazio e vazio e vazio e vazio e solidão mais solidão.
Só, e nada mais, estou eu e com paz no coração
Só eu e cristo, lado a lado. E ele me conforta: não tema
mais filho, você está curado das suas dores mesmo que a
terra esteja morta.
Não há nada mais, sem motivo para lutar.
Mas o que, adiantaria?
Se planto um ipê ali, e vem a máquina o derrubar?
Não terei filhos, não vou semear a terra.
Não viverei aos trinta, não sei se sobreviverei a guerra.
Mas cristo e Oxóssi me confortam, me perdoem por fazê-
los esperar.
A paz me domina, mesmo sabendo que tudo vai acabar.
Adeus, é o fim do fim dos tempos, tentar lutar agora é o
último e o mais fraco dos argumentos.

[69]
Poemas Dedicados a Lixeira

Perdoem -me Oxóssi e Deus, pois eu errei e não sabia o


que fazia.
Mas agora morrerei, estou feliz, pois finalmente se
encerrou minha agonia.

[70]
Poemas Dedicados a Lixeira

Exorcismo VI
Escrevi alguns versos, sei que alguns não
Rimaram valores nem utilizaram a poesia da alma
Não sou bom em fingir, alguns trechos não
São versos, são eu.

Pobres, amargos, curtos e longos


Se se identifica, é assim também
Somos dores, alguns amores, ou um operário
Que acorda às seis da manhã.

Pobres de nós, diabos.


Ai de nós, senhor.
Ai de amores, ai! Ai de dores, ai!
Que será de nós, amor?

Voltando aos versos, não são eu


Que rimas ricas não me fazem
Se em mim houve rima, ela morreu
Sou assimétrico como analogia.

Posso ser tudo, menos eu,

[71]
Poemas Dedicados a Lixeira

(meu deus que poesia ocre)


De que adianta ter isso e aquilo
Se não tem o amor?

Digo mais, seremos dominados por farmácias


(se atente aquela da esquina)
Viveremos? Não, sonho vão.
Somos bons, sim, mas digo que não.

Tenho demônios, muitos, do tamanho


De um homem.
Eles são...eles. E destroem almas, por elas.
As tornando o próprio algoz.

Diabo. Alguém me vê se o gás de cozinha abaixou?


Quero um café...
Mariquita traz cá o Drummond...
Eu não devia dizer, mas esse corote...
Me deixa comovido.

Já viu as rosas? Como são?


Olho as, me vem Monet a mente.

[72]
Poemas Dedicados a Lixeira

Superstição, alguém me entende?


Certa vez, aqui existia poesia...

Ela passava, sem cor e colorida


Sem rima e encadeada
Era como algo, poético sem explicar...
Uma beleza!

Se me lê, vejo seus olhos


Neles há uma poesia, que segue
A voar, querendo sair de ti um dia.
Rime junto dela, seja poeta da vida.

[73]
Poemas Dedicados a Lixeira

Criarte
Minha mente sangra
Grafite e eu
Estanco com a folha.

As vezes ela mesmo apaga


Mas eu volto a escrever
É tudo questão de
escolha.

[74]
Poemas Dedicados a Lixeira

Solau de desamores mil


Canto triste. Me encontro num canto
triste, onde canto.
As dores que senti logo que partiste.
E fico só.
Eu e minha solidão, pois tu partiste.,
Que deus de mim tenha dó
De mim e da alma só, aqui nesse
Escuro canto triste.

[75]
Poemas Dedicados a Lixeira

II. Dois. De frutas vermelhas e outras coisas


Há algumas horas falei de amoras
Mas agora já não amo as
Jogo cartas roxas na mesa e a vida
Me joga um rubro às.

[76]
Poemas Dedicados a Lixeira

Fluxo
As folhas vão sendo levadas pela enxurrada de água pelo
meio fio

Junto da lama, e da sujeira que sai dos canos das calçadas

Como pode a vida se juntar com a sujeira e seguir


incólume?

Talvez nós sejamos humanos demais e reparamos demais

Nas coisas disformes que nos rodeiam

Por isso pensamos que tudo que não sai conforme

O que gostamos, nos odeia.

Mas as folhas meu deus! Aquelas lindas e verdes amareladas


folhas...

Seguiam plenas junto da lama sem destino algum

E vieram lá do alto, como podem encarar a queda tão


calmas

Assim?

Não aceitaria jamais esse fim

Do alto do meu verde gostaria de ser levado pelo vento


para outro lugar

Longe da água suja e mais perto do límpido mar.

Contudo elas seguem o fluxo, verdes como esmeralda

[77]
Poemas Dedicados a Lixeira

Em meio a toda aquela sujeira.

[78]
Poemas Dedicados a Lixeira

Certa vez vi Breton, lhe disse oi


E ele me apertou a mão.
(no céu há nuvens roxas da cor do
[mar
Bem como um trem que
Sai do trilho....
A minha vida guio.

[79]
Poemas Resgatados da Lixeira

Rondó Improvisado

Deus, neste rondó de mim tenha dó


Neste momento, me pego desesperado
Andei por anos e me encontro só
Neste caminho mal iluminado.
Quem sabe me ouvirá
Enquanto minha alma não partir
Creio que um dia isto acabará
E finalmente poderei sorrir.
Tire de mim essa agonia existencial
Este temor infinito
Devaneio no mundo sobrenatural
— Temo e vejo, tenho dito.
Sei que isto lhe parece louco
Eu tenho muito a lhe dizer
Mas meu vocabulário é pouco
Sinto que não vou poder.
Perdoe me por importunar
Com palavras de tal forma
Mas eu lhe precisava falar
Afinal um bom filho a casa torna.

[81]
Poemas Resgatados da Lixeira

E por aqui mesmo encerrarei


Esta humilde conversa
Perdão, se não lhe agradei.

[82]
Poemas Resgatados da Lixeira

Céu cheio de nuvens


Na árvore
A sombra dos pensamentos.

[83]
Poemas Resgatados da Lixeira

Mãe
A ti devo todo meu amor
E toda minha compaixão
Sei que dias lhe causei dor
E feri teu coração.
E por isso peço perdão
Por ter lhe magoado
E agido sem razão.
Lembro de dias do breve passado, um passado quase perfeito.
Onde sempre estava ao seu lado, com a cabeça deitada em
seu peito.
E por ti era consolado,
Me afugentava em seus braços
Dos meus maiores medos.

[84]
Poemas Resgatados da Lixeira

Alguns Haicais
I
Aqui, neste cômodo
Jaz,
A minha paz.
II
Fixada no chão
A arvore faz sombra
Sobre meu coração.
III
Sentado sozinho
No banco da praça
Um homem chora.
IV
Solto um grito
Ali parado, do meu lado
O sofá maldito.

[85]
Poemas Resgatados da Lixeira

Balada ao som de Miles Davis


As notas de jazz ecoam pelo salão
As teclas do piano tocam meu coração
A música comove toda a plateia
Olhos lacrimejam com Coltrane, Miles Davis e seu minueto
quinto
A cada nota de jazz eu morro, e como odin, ressuscito.
A magia das notas me leva a lugares e ares que jamais pude
imaginar.
Flutuo com as notas, me vejo
Viajar pelas colcheias e semínimas
As chaves, as tercinas.
Me fazem dançar num ritmo acelerado
E quente, me envolvendo de uma forma que não posso
explicar
As notas cadenciadas me fazem delirar.
Diversas emoções trespassam
Meu coração, me fazendo rir e chorar ao mesmo tempo,
brincando com meus sentimentos
Me fazendo voltar a ser criança e reavendo minha esperança
de alcançar a felicidade.
Este é poder do jazz de verdade.
So cool! É o que tenho a dizer
Após ouvir uma das obras primas da humanidade
Que mal sei descrever.

[86]
Poemas Resgatados da Lixeira

Soneto da Vida
A vida bem vivida é pouco falada
Emotiva, alegre e agitada
Cheia de comida e bebida
Esta é, a vida bem vivida.

Algum dia, terei eu uma vida


Bem vivida, pois por enquanto
Ela me permanece escondida.

Sem amargor ou rancor, minha vida foi


Dolorida.

Tentei viver, ganhar, mas não sai do


ponto de partida.

Antes de sair, me parti


Então chorei, mas veio um guru
E me disse para sorrir. a vida é bela.

[87]
Poemas Resgatados da Lixeira

Violinista da Quinta Avenida


Passo pela rua após o sol se pôr, num quarto mais acima de
mim alguém toca violino
Paro por um instante e fico ouvindo
As notas ressoam pelo cômodo todo.
Meus ouvidos se movem em direção
A harmonia que invade minha imaginação.
Minhas pupilas dilatam, a
Luz adentra meus olhos, fascínio
Puro diante de tal criação, como pode somente algumas
Notas tocarem de tal maneira meu coração?
E as notas vão indo, passam por dentro de mim e vão
embora,
Saem do cômodo e partem rumo a rua
Para outro cidadão tocar.
Meu coração fica, fascinado.
Minha mente distante, se foi
Junto com as notas rumo ao mundo
Para encantá-lo.

[88]
Poemas Resgatados da Lixeira

Miscelânia ato zero


As más línguas dizem ser um poema...

Saltitante ficou meu coração


Com melodias inaudíveis
Que mexiam com a emoção.
Vaidade? Não sei o que é vaidade,
Sei o que é sombriedade. E não
Saber quem sou eu de verdade.
Afinal quem somos e praonde vamos?
Talvez eu não fizesse uma sextilha
Se não tivesse muito a falar
Talvez eu escrevesse uma quintilha
Se fosse bom em viver ou versejar.
Mas não há rimas na minha vida
E também nunca haverá.
E aqui está a quintilha,
Que falei, em outra hora, e agora, o que escreverei?

[89]
Poemas Resgatados da Lixeira

Prelúdios Noturnos
Abre - se alas/ entra o cão/ noite fria/ Marivalda traz o
blusão/
Deite se/ liga a televisão/ Aumento do feijão/ Que
terrível/
Mostra o peito/ satisfação/ não deste jeito/ Nesta posição/
Marivalda, aqui Marivalda.../ Lá fora frio/ Dentro um
arrepio/
Aí minhas costas Marivalda...

[90]
Poemas Resgatados da Lixeira

Poemas Ensaios
I
Coração, aonde vai coração?
Me dê inspirações, dessabores.
Me dê uma canção.
Para que eu possa cantar
E dizer quais são os prazeres
Que me causam o ato de amar!
II
Debaixo do ipê:
O que ninguém vê, e ninguém diz,
Abraçados, um casal feliz.
III
Embaixo do ipê rosa um casal se abraça
E se beija.
Um velhinho se espreguiça, uma criança boceja.
Uma mãe observa as crianças correndo
Um cachorro late enquanto persegue um gato.
Todos gostam do ipê rosa, isso é fato.
IV
Amar fortemente é para poucos
Como diz um ditado: Ame aos poucos.
É tudo uma questão de esperar que a hora irá chegar.

[91]
Poemas Resgatados da Lixeira

Como diriam os velhos roucos.

[92]
Poemas Resgatados da Lixeira

Talvez isso seja um poema:


A luz penetra a sala
Um homem caído fala: — A vida é um minimalismo de
um louco delirante universal!
Um sapo pula da sua boca: — Tragam me sal!
Lá fora os carros correm.
O dia nasce
O dia morre
Flores nascem
Flores morrem.
Dentro de um dia
Pessoas correm
Pra lá e pra cá
Nem se tocam que o dia passa
E que eles morrem.
A noite chega, acaba o dia
Pessoas dormem
Outras acordam
E continuam a correria.

[93]
Poemas Resgatados da Lixeira

Prenúncio de morte
Este é meu último e primeiro
Livro, ao menos escrevi um, e das
Garras da tristeza criativa não sou
mais cativo.
Feliz fui, feliz vivi, morrerei chorando
Mas saiba que em vida sorri.
Não tenho muito a dizer sobre minha morte, só que minha
vida será entregue a sorte.
E ao lado de meus ídolos sentarei, chorei, sorri, sofri, em
meu pequeno
reinado em vida fui rei.

[94]
Poemas Resgatados da Lixeira

Ato de renascer
Nas linhas há vida
São cheias de rima
Na caneta, a tinta
E por trás de tudo
Há um suicida.
O poeta é sujeito que comete constante suicídio
A cada verso que escreve: morre.
E na próxima estrofe já está revivido.

[95]
Poemas Resgatados da Lixeira

Vá ser feliz!
Vá viver a vida!
Correr pelos belos campos
Da natureza
Beber da água mais pura
Experimentar das comidas mais gostosas...
Veja tudo, coma tudo!
Seja feliz...
É o que me dizem
Enquanto me olho no espelho e arrumo minha gravata.

[96]
Poemas Resgatados da Lixeira

A cinza
A cinza voa pelo ar como ave, sua cor escura completa o
cenário azul marinho do céu polvilhado pelo branco das
nuvens.

Ela se destaca pela sua cor escura e modo de voar rumo ao


chão, devagar, bem lentamente
De onde vem escura cinza? Lhe perguntam as alvas nuvens.

Venho de baixo, daquele gramado queimado que vês.


Lá é meu berço, mas o puseram fogo
Agora o que lhe resta é arder.

As nuvens calaram, de onde vieram nem sabiam o que era


fogo, sua origem vem dos rios de água doce e do mar
salgado.

Onde as correntezas levam vida, matam sede e trazem


frescor.
A cinza era uma grama que temia ser queimada, mas que o
fogo alcançou.

[97]
Poemas Resgatados da Lixeira

Mercurial
Tive aos treze, era azul
Como as araras, voava
em campo.
Como as araras, sumiu.
Se foi pelos ares como
Meu sonho de ser jogador.
Levou consigo o amor
pelo esporte, todo azar,
Toda sorte e toda dor.
As araras sumiram, e a chuteira
velha eu doei
Os dias se consumiram
e eu nunca mais voei.

[98]
Poemas Resgatados da Lixeira

Meus primeiros anos foram infelizes


Que dias maus, que dias tristes!
Como herói, encarei meus algozes
Mas estes me quebraram como nozes.

[99]
Poemas Resgatados da Lixeira

Debaixo do ipê
O que ninguém vê, nem diz
Abraçados, um casal feliz.

[100]
Poemas Resgatados da Lixeira

Viver?
Não sei dizer,
Confusão.

[101]
Poemas Resgatados da Lixeira

Adeus? Jamais
É um até logo
E nunca mais.

[102]
Poemas Resgatados da Lixeira

Platônico
Seus cabelos cacheados
Me provocam e neles quero me enrolar
Envolve-la em meus lábios
E infinitamente te amar...
Porém não posso te amar
Pois há outro em meu lugar
Que teve a sorte de antes de mim te achar.

[103]
Poemas Resgatados da Lixeira

Indagações
Porquê o quase dói como o que foi?
Porquê o para sempre finito
Destrói mais que o para sempre eterno?
Porquê os amores longos
Nos tornam reis
E os curtos nos transformam em subalternos?

Aonde vão as nuvens se a água acabar?


O que seria de nós se não tivéssemos a capacidade de amar?
Qual outra coisa dá pra respirar que não o ar?
Tem como viver sem sequer poder errar?
Onde estarão todos quando o fim de fato chegar?
E será que o fim de fato vai chegar?
Se sim em que data virá?
Pela humanidade será que adianta algum deus voltar?
Diante de tudo, senão os cachorros, o que há no mundo
que dá pra salvar?
Quanto tempo dura para um coração sarar?
Quanta gente deixei pra trás?

Quantas histórias não voltam mais?

[104]
Poemas Resgatados da Lixeira

A essa hora o que será que ela faz?

Pensa em mim? Pensa em outro? Pensa no mundo ou na


geopolítica?
Pensa no aumento do gás?

O que será? O que será meu deus que ela faz?

Outro dia pensei nisso, nessas perguntas e no passado bem


passado e no futuro tão distante, tão bem longe que nem
pode ser enxergado...

O que será? O que será? Que ela faz?

Hein? Viver o agora?


Só depois do escurecer da aurora, só assim que vou
esquecer, e nos meus sonhos voltar a viver sem pensar nisso
e no que ela faz.

[105]
Poemas Resgatados da Lixeira

Tangamarindo nove
(este versa sobre poesia)
Hoje não tem poema
Amanheci feliz, sem dilemas.
Quero ver as flores rosas
Que cheiram mel.
Ver as nuvens brancas que enfeitam o céu.
Quero poetar num dia sem poesia
Esquecer de escrever, de cantar e sofrer
Como poeta estou ausente, não há nada
Em mim que se descontente
Com o sol a pino, a pinga amarga e a dor
Latente, que só quem é poeta sente.
Uma necessidade de rimar no dia em que o espirito devia
descansar...

[106]
Poemas Resgatados da Lixeira

Minha vida de lápis


escrevo
Quando erro, apago.
De caneta eu capricho
Às vezes, tenho que usar corretivo
E assim, sigo vivo.

[107]
Poemas Resgatados da Lixeira

Passe a fase, e desenlace


Essa vontade escrever
Um livro da face
A cada segundo.
Se construa e se desfaça
Desse virtual mundo
E contemple o real, essa imensa desgraça, que
Acaba com todo mundo.
Mas que nos mostra o surreal
Em cada casca de nois, há
Um mundo.
Sim, somos todos uma castanha
Que urina e defeca e da vida
apanha.
Que por uma foto com filtro se assanha
Os rapazes e as moças de hoje em dia
Perderam a manha de viver a vida
De mandar por carta, um perfume e um: Oi sumida.

[108]
Poemas Resgatados da Lixeira

Comédia soneto
Há um vazio do tamanho de deus no home
Este vazio, que não é quente nem frio
Se chama fome.
E nos deixa a andar desvario.
Digo asneiras como o presidente
Incomodo como um dente ciso
Podem até não me considerar gente
Mas em meus versos me faço vivo.
Digo fato e ali me mato
Por dizer verdades não
Sou acatado, e por isso
Descontinuado.

[109]
Poemas Resgatados da Lixeira

Se não fosse, seria


Se houvesse, não houve jamais.
Se talvez, algum dia
Eu escrevesse versos com sentidos reais.

[110]
Poemas Resgatados da Lixeira

Gramamor
Amoramar
Roma ama
Rama ama
Armaoma
O amor, ama?
Amorama

[111]
Poemas Resgatados da Lixeira

Pátria brasileira
Ouvi dizerem que nos estados unidos
Os poetas são valorizados
Os carros são mais bonitos
E nós não somos roubados.
Que lá todos creem em deus
O dinheiro escorre pelos hidrantes
Aqui? Nem o preço da cachaça é como antes...
As mulheres são loiras, brancas de cabelo liso.
As daqui? Nem isso...
Queria que aqui fosse diferente, que aqui
Fosse o que quiséssemos, não o que querem da gente.

[112]
Poemas Resgatados da Lixeira

Epifania
Adeus meu amor
A ti dediquei
Versos meus
Que agora são teus.

Pois levou consigo


Por favor devolva os
Porque sem eles corro perigo.

De amargurar até
Morrer
Sem poesia sentimental
Poder escrever.

Retorna a mim
Os versos meus, amor
Pois são meus escritos
De dor.

[113]
Poemas Resgatados da Lixeira

Amour non reciproque

Não sei porque


Eu te espero
O que de ti tanto quero.

[114]
Poemas Resgatados da Lixeira

Meu primeiro Jordan


Custou cenzão, um mês
De trabalho cortando rama com o facão na mão.
Pra escola ia todo dia
Variava entre ele e o all star
Pra impressionar as gatinhas.
Me achava top, mas por dentro era
tristão.
Cem reais dava uma refeição
Arroz, feijão batata e macarrão.
De vez em quando dava até um aperto
no meu coração, minha mãe
Me perguntando se eu tenho cinquentão pra
interar no dinheiro pro botijão.

[115]
Poemas Resgatados da Lixeira

Canção
Ah meu deus que agonia...
Penso nela toda noite e dia
Mas quem diria que a moça com quem
Fiz planos durantes anos
Ela mesmo os destruiria.
Agora fico aqui, dia e noite me lamentando
Do sorriso dela vou me lembrando
Ah meu deus, que agonia!
Penso nela toda noite e dia
Enquanto isso, ela vai vivendo
Vai beijando e vai sorrindo
E eu vou chorando e vou sofrendo.
Ela a vida vai seguindo
Eu a vida lamentando.
Ah meu deus que agonia!

[116]
Poemas Resgatados da Lixeira

Ovoned?
Sabe, sabia que sou sábio?
Se sim, só saia se sozinho se sente
A gente tem que cuidar da gente.
Vamos, escove os dentes.

[117]
Poemas Resgatados da Lixeira

O Sofrimento do jovem Erlenmeyer

Seu beijo era de cianeto


Mas se parecia com frutose
Cada vez que eu o experimentava queria mais uma dose.
Éramos Covalentes.
Na minha percepção, tínhamos a mais forte ligação.
Mas sem estabilidade
Me sufoquei como se inalasse Cloro
E quando lembro que me sentia bem ao seu lado, eu
choro.
Hoje estou só.
O amor para mim é raro como ástato
E nessas noites solitárias e vazias
Com saudade do seu cianeto, me mato.

[118]
Poemas Resgatados da Lixeira

Amor
Fogo e depois fumaça.
O beijo, e a paixão devassa
mandam embora a solidão
Que dá espaço pra imensidão
De vários amores, febris e fortes.

Mas logo vem, pelo tempo, a desilusão


Onde houve beleza há agora horror
E trocamos o amar pelo desamor
E tudo se esvai, como água entre os dedos da mão.
Adeus amorzinho foi bom enquanto houve entre nós a
paixão
E logo vem também o frio, aquele de dar gelo no peito, as
folhas do amor se secam no chão, e o céu azul fica quase
todo preto.

É fogo e também emoção, a única chama cheia de


persistência, se apaga e some na escuridão da enorme
lânguidão da existência.

[119]
Poemas Resgatados da Lixeira

Romeu e Julieta
O escuro um dia acordou se sentindo claro
Pensava haver em si menos escuridão, por isso
Se achava um escuro raro, em meio a toda a escuridão.
O escuro tinha um bom coração, e gostava de uma garota
claro
Por ela, ele morria de paixão.
E por ela, tinha um amor raro, desses de aquecer o coração.
Então lá se foi a escuridão
Mostrar a ela seu amor caro, para sua surpresa
Ela também o amava, e disse
Sim a aquela paixão.
Claro-escuro a melhor junção
Como dia e noite eles viveram a partir de então.
Mas o pai de claro não gostava dessa relação, seu nome era
luz e ele
Odiava a escuridão.
Fez de tudo para acabar com o amor
Brigava com claro e agredia a escuridão
Até que um dia ele triunfou e conseguiu pôr um fim a
relação
Até hoje escuro tenta se encontrar com claro, mas quando
luz chega
Ele espanta a escuridão.

[120]
Poemas Resgatados da Lixeira

Resgate
Meus poemas são mais podres
Que o que tem na lixeira
Sangro minhas dores nas linhas
Na esperança de quem alguém os leia.

[121]
Poemas Resgatados da Lixeira

Sol
Foi de manhã que
A janela aberta permitiu
Que a luz entrasse no meu coração
E acendesse a chama que iluminou minha
Visão
Logo que a escuridão sumiu.

[122]
Poemas Resgatados da Lixeira

A praça
Ali naquela praça histórias mil se fizeram
Crianças que se conhecem por acaso, se tornam amantes e
logo casam.

E outros que não puderam.

[123]
Poemas Resgatados da Lixeira

Vazio
Aqui nesse vazio houve um dia
Que tinha dentro dele horas.
E também minutos, que traziam mais dias e horas
E dentro delas, momentos.
Curtos, longos e infinitos
Grandes como anos.

[124]
Poemas Resgatados da Lixeira

Sobre apostas e o vicio


Todas rimas são apostas
Eu faço as minhas num bloco de notas.

[125]
Poemas Resgatados da Lixeira

Improviso de miliquinhentos
Portu-guês veio
Por tu sal
Que portou seis
Por tu: Qual?
Diz que não é inglês
Se não for será qual?
Aí pôs seis
Para o portu-guês
Só não sei em que porto-qual?

[126]
Poemas Resgatados da Lixeira

Clamor
Me deixe ler poesia!
Quero afogar minhas mágoas
Em Andrade
Quero chorar minhas dores
Em Cecilia.
Faça de mim o que quiser
Arranque minha alma cansada
Me deixe com fome por dias
Faça o que lhe couber
Mas por favor
Só me deixe ler poesia...

[127]
Poemas Resgatados da Lixeira

Rondô da Morena
Amor vem que lhe espero

Sentir teu calor é o que mais quero

Vem, amor, acalentar minhalma desesperada

Me dar teu amor singelo.

Amor vem que lhe espero

Sentir teu calor é o que mais quero

Penso em ti do começo da noite ao amanhecer

Tocar tua pele macia quero poder.

Amor vem que lhe espero

Sentir teu calor é o que mais quero

Seu beijo deixa minha mente avoada

E meu coração saltitante.

Amor vem que lhe espero

Vem ensolarar minhalma nublada

[128]
Poemas Resgatados da Lixeira

Sentir teu calor é o que mais quero

Neste extremo frio cortante.

Amor vem que lhe espero

Sentir teu calor é o que mais quero

Te quero por inteiro e redobrada

Vem amor, sanar esta dor

De uma alma adoentada

Teu remédio é o que mais quero

E teu remédio é amor.

[129]
Poemas Resgatados da Lixeira

Risos
São o remédio da alma

O arco íris que surge depois da chuva

Um abraço de mãe que acalma.

Um riso as vezes dói, como tudo que traz alegria

Mas não conheço ninguém que queira parar de chorar de


rir

Um dia.

[130]
Poemas Resgatados da Lixeira

Antropofagia poética

De um
Rosas oram horas
Flores rezam rezas.

De noite
Açoite num afoito
Aceite, que alguns tem
Na dor, deleite.

Jogral
Neste jogo
De quente frio
Agua e fogo
Não jogo.

Ador
Adores, o dourado
Adora ser adorado
Quanto mais melhor, adulado.

Luxo
Tive luxação
De repartição
Uns juntavam muito nesta tal divisão.

Agora
De política a gatos fofos
Todos iam para ágora antes de voltar
Aos cafofos.

Lágrima
Rola baldeia e faz rotatória

[131]
Poemas Resgatados da Lixeira

Retórica aristotélica da emoção


Cruzou sinal vermelho no coração.

Privi
Me privei do que nunca tive
Me abstive de ir aonde nunca estive
E fui chamado de humilde.

Légio
Comer estudar sobreviver, ou quase.
Depois morrer.
Essa é a sorte que alguns tem.

Ratos e roots
Roots roots rats rats rats
Algum passado presente doente
Relembrado matado.

Doramingo
Estabelecido por alguém
Que disse ser ler marcial divina
Hoje temos, que trabalhar nele também.

Defenda
De buraco em buraco de rocha em rocha
Ao fundo mais fundo profundo como onde enterraram
meu passado? Caio.

Jornal
Jogaram um cadáver do quarto andar
O São Paulo ganhou semana passada
Alta do gás

[132]
Poemas Resgatados da Lixeira

"Como foi minha viagem a Londres ".

[133]
Poemas Resgatados da Lixeira

Esgoto
Se eu não tivesse tanto passado talvez teríamos futuro...
Talvez a gente fosse feliz
mas é sempre talvez e talvez e
talvez
quem sabe, a gente nunca tenha vez
porque o nosso tempo se esgotou...

[134]
Poemas Resgatados da Lixeira

Como?

Como que rima?


E mais: como que faz esse lance de sonetos e haicais?
E como é essa arte de escrever sobre o papel e ser
parabenizado pela academia de letras?
Como é que faz esse negócio de criar histórias e mundos
com a caneta?
E dizer: meu coração chorou quando tu partiste, que dia!
Que dia mau, que dia triste!
Como que faz?

[135]
Poemas Resgatados da Lixeira

Reflexão diegética da vida

A gente corre?
Corre
Corre
Corre

Morre

Não demores que o sangue escorre

Corre
Corre

Corroídos doloridos corações partidos


Abandonados todos sofridos e a gente morre

E
O
S
A
N
G
U
E

[136]
Poemas Resgatados da Lixeira

C
O
R
R
E

Escorre
Escorre

Hoje mais vi que foi no jornal enquanto ia a escola baleado


morto por policial.

Corre.
Corre
Corre

Coração partido, todo dolorido


A gente morre.

Morre
Morre
Morre
Morre
Morre

[137]
Poemas Resgatados da Lixeira

Morre
Morre
Morre
Morre
Morre
Morre
Morre
Morre

Morre

Morre

Morre

Morre

Morre

Morre

Morre

[138]
Poemas Resgatados da Lixeira

Fézs

Dias mil a vaguear


Na minha mente que insiste em me lembrar
Que no dia de amanhã minha boca talvez não tenha o que
mastigar.
Porém continuo a ter esperança, ou talvez
No mínimo, confiança.

De que a água que domina a geladeira vire


Vinho
Por um milagre que eu, messias moderno e subalterno mal
trajado e paupérrimo, tenho que realizar sozinho.
Voltamos, ao mapa da fome, vamos comemorar com os
ossos que encontramos no caminhão do lixo.

Viva! Ao menos tem um tequinho de carne!


Dá pra saborear. Sim, e muito bem...
Carne boa bem assada temperada com o amargo gosto que
a vida tem.
O melhor limão é o da vida de um zé ninguém.
Não há como fazer limonada, se sua vida é ignorada, e nem
te consideram alguém.
Amém. Diz o doutor, após encerrar a oração.
Deus me ajude, diz a criança faminta, com vazio no
estômago e no coração.

[139]
Poemas Resgatados da Lixeira

Das inutilidades

Queria ser útil


Mas útil não posso ser
Pois o útil serve ao outro
E servir ao outro não é ser.
Queria mais é ser inútil
Pois o inútil não serve a nada
A não ser a si, vale em si, se contenta em si
E não tem a paz perturbada.

[140]
Poemas Resgatados da Lixeira

E nada mais
Mas
Quando olho para trás
Vejo todos meus erros
E o que aprendi
E o prazer que isso me traz.
Porém só
E...nada mais.
Quando olho me vejo e as vezes choro e desejo
Deixar tudo pra trás
E ficar só, nada mais.
Nada.
Nada mais.
Tudo isso em um segundo, mas olho ao redor, e vejo o
mundo, de uma forma melhor.
E volto atrás.
Torno a ficar só, nada mais.

[141]
Poemas Resgatados da Lixeira

De Poe e Emas

Gato preto pula a janela, entra voando sobre palavras


miando versos
Em busca de sorrateiros adjetivos.
Já a ema, corre do presidente
Sou um admirador de loucutiridades.

[142]
Poemas Resgatados da Lixeira

D
De palavras em brasas e geladas e rasas
que exaltam rosas e voam com suas asas.
Que avoam em ondas e surfam em modas
De coisas toscas e horas tortas, de vivo em roupas, de rosas
mortas.

[143]
Poemas Resgatados da Lixeira

Sobrenada

Defronte desfruto, do fruto a fonte que surto, ou surto


assusto com esse tumulto de a____ssunto, o quê, há de
dizer, de tudo?

[144]
Poemas Resgatados da Lixeira

Tangamarindo quinto

A lagartixa dança sobre a parede


Sua dança encanta moscas
Seu vestido é de poeira
Atrai mosquitos e espanta moças.

[145]
Poemas Resgatados da Lixeira

Carta
Gostaria de fazer uma carta a João
Falar como é viver em um lugar onde as nuvens descem ao
chão
Dizer sobre a água, o sabor daqui lembra suco de caqui e
mamão
As ruas são tortas, sobem e descem e voam a esquina
É um bom lugar, não há assassínio senão o do mar
Que cobre os rabiscos na areia, e matam ilusões de um
desatento.
Gostaria de dizer isso a João, mas ele não acreditaria, e a
lontra-pombo correio já partiu.

[146]
Poemas Resgatados da Lixeira

Já se
Deram conta que talvez as sobrancelhas nos traiam?
Como saber se a mentira é corroborada por ela?
Quem há que diga seguramente que sua sobrancelha
também
Mente, quando a gente mente?

[147]
Poemas Resgatados da Lixeira

E disse ele:
Certa vez eu fui lá, e estava lá
Tinha tudo lá
Era um bom lugar, mas onde fica
Não posso falar.

[148]
Poemas Resgatados da Lixeira

A viagem para minas

A estrada era povoada por mato ao redor


Dentro do ônibus ia com minha vó
Para um lugar ao meu ver sem rumo e sem fim
Queria estar lá? Não. Mas minha mãe disse que sim.
Então fui com minha vó
Para as longes terras de Minas Gerais
Terra boa do bom pão de queijo, daqueles que não se faz
igual a não ser lá.
Na boa terra de Minas Gerais.
O povo? o que dizer? foi de lá que veio a minha vó
E isso eu me orgulho de dizer
Ao ver o povo exclamar: Nó!
E em seguida indagar: Então quer dizer que você é de lá?

— Sim sou se não sabia agora sabe que sou de lá


Bem longe aonde se dá pra ver o horizonte de tanto perto
dele você chegar.
O sol a pino, o galo cantando na madrugada, o café
quentinho, o pão morninho, mas que terra abençoada!

[149]
Poemas Resgatados da Lixeira

Lá em xique xique
Lá em xique xique da Bahia há uma morena a me esperar

Em xique xique da Bahia tenho alguém pra amar

Nas águas azuis do São Francisco poder me banhar

Como eu queria em xique xique estar.

Viver de amores doces e receber abraços que mais me


parecem lar

Comer da boa comida, e boa música escutar

Como eu queria meu deus, um dia xique xique visitar!

E encontrar os cachos soltos, e o sorriso belo dela a me


esperar

Um romance de Jorge Amado vivo, na areia do Velho


Chico andar

Ver as estrelas solitárias ao vivo, na imensa e infinita galáxia


a brilhar.

Acho tudo isso muito chique, muito lindo

Dentro de mim cultivo esse desejo infindo

De um dia em xique xique poder estar.

[150]
Poemas Resgatados da Lixeira

! ... ; .
A História de um Relacionamento

[151]
Poemas Resgatados da Lixeira

Bravata

Disse assim para ela quando terminamos: Ide


Mas que se quisesse voltasse
Queríamos ir embora para longe um do outro?
Que impasse!
Bom, nos beijamos.
E isso talvez por si só devia selar o fim do fim e o
Começo do recomeço, sim?
Não. Não foi assim.
Vaivém vaivolta
Me diz que não sou ninguém
Aos sábados bate na minha porta
Mas quem se importa?
Cada um decidiu o que quer para si
E a decisão foi a indecisão.
Se continua o que estava acabado
E as vezes volta todo remendado
Ou se continuamos assim, bem assim.
Desse jeito que não sei dizer.

[152]
Poemas Resgatados da Lixeira

O gol

A bola voou pelo ar como um condor


Era colorado contra tricolor
Meu deus que dor!
A bola rodou no próprio eixo com
Aquele chute muito mal dado.
Ela girou
Girou
Girou
Girou
E foi bem para a toca da coruja
Neste instante o coração parado
Era um gol pro colorado
Que dor! que dor para o peito tricolor!
— Era melhor meu ingresso nem ter comprado...

[153]
Poemas Resgatados da Lixeira

Mil vezes

Vezes mil é um superlativo matemático muito romântico


É um dos melhores elogios, na minha opinião, no sentido
simbólico
E semântico.
Te amarei mil vezes, mil vezes mais, mil vezes melhor, mil
milhões e mil e etecetera
Como é belo, e matematicamente perfeito amar alguém
vezes mil
É um amor curto, porém longo
Que na vida dura pouco (dezesseis horas tem mil minutos)
Mas vale muito, vezes mil é quase tudo
Muito maior que o mundo
É quase tempo espacial medido em anos luz
Mil vezes cabe no peito, mil vezes é quase perfeito
Pois seria se durasse mais
Mas mil vezes segue bom, mil vezes melhor que cem vezes
Afinal mil é maior que cem
E mil vezes é amar alguém.

[154]
Poemas Resgatados da Lixeira

Como canto

Como Cecilia canto porque o instante existe.


E minha voz ninguém escuta quando estou no banheiro
Como Manoel Bandeira meu canto é de desalento e de
desencanto.
Mas mesmo assim eu canto.
Canto até quadrilha
— Olha a fogueeeira, é mentira!
Mas fogo é chama e depois fumaça
O fumo vem,
As vezes a raiva da minha mãe não passa.
Mas canto bem.
Minha voz é pouca, bem curtinha e até rouca,
As vezes até meio devassa.
Canto tudo, do grilo irritante até o fado mais triste do
mundo.
Cantiga de amor, amor de verão, falo de dor, falo de
paixão
Canto os valores, e quem diria...
— Olha a fogueeeira, é mentira!

[155]
Poemas Resgatados da Lixeira

Bolso de calça

No bolso da calça tem tudo


Chaves, dinheiro, celular...
Menos papel, as vezes esquecemos que ainda há papel.
O único que nos resta hoje é o papel da vida
Este sempre em branco e sempre sendo preenchido
Seríamos nós o pedaço de papel do bolso de alguém?
Mas no bolso da calça que usamos não tem mais papel
Em algum momento a gente deixou de levar
E por consequência deixamos de escrever.
Alguns poetas nem nasceram, pois esqueceram de rimar
De tirar o pedaço de papel do bolso e versejar
Tudo isso para cumprir seu papel na vida:
O de trabalhar.
E depois morrer.

[156]
Poemas Resgatados da Lixeira

Breguenaite

Thingado
Lê se: Coisado
Que para se conjugar as coisas tem que ter jingado
Caso contrário se toma uma rasteira por bobeira e acaba
com o rabo todo sujo no chão.
E ninguém merece tomar bandão de palavra errada e ser
repreendido em prol da correção
Mas eu digo pois falo que num futuro hipotético eu diria (
ou eu já disse e não sabia?) que as vezes temos que ter
rebeldia
E lutar pelo nosso lugar ao sol em pleno dia
E dizer: Vrido crebado não cisconde em lugar errado ou cê
sai de cu cortado.

[157]
Poemas Resgatados da Lixeira

Copo de café

Há anos que digo que não tenho fé


Mas há anos me ocorre um milagre:
O de ainda saber fazer um café
Pois não há nada maior que esse pecado: Fazer café aguado
É um ato de enorme má fé
Acho que no início oxalá disse: Que haja também a cafeína
pra que todos possam viver e sorrir
E tenham ânimo de manhã pra ir aos seus trabalhos
Se não disse, deve ter pensado.
Caso contrário, sigo tomando meu café
Pensando que a criação dele foi um ato de extrema
bondade.

[158]
Poemas Resgatados da Lixeira

Manifunesto das causas mortas e um copo de


café

Fé é para os tolos, e não há ninguém mais tolo que eu


Vejo a luz no fim do túnel, em meio a todo estebreu
Apocalipse meu e tive lapso
Adeus a todos envolto na morte estou em seu laço
Fui de rimas, mas dela me desfaço
Se queres algo bom leia meus versos do almaço
Que fiz em grafite, mas que já hoje não faço
Te faço este convite antes que também caia no laço
De pensar que eterno nós somos e dizer amanhã faço
A vida é uma enorme borracha e nós somos um fraco traço
E dessa forma assino meu óbito. Ao fim deixo o
manifunesto
E esse trecho que deixo
Deste meu vil texto.
PS: Esvazie meu copo de café e jogue este livro no lixo.

[159]
Silva Rodrigues
Poemas Resgatados da Lixeira

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