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Lições de Lógica para Filosofia

por Edelcio G de Souza

Departamento de Filosofia
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
Universidade de São Paulo
2020

1
Sumário

1 Elementos de teoria de conjuntos 5


1.1 Pertinência e inclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.2 Operações entre conjuntos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
1.3 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

2 Relações 13
2.1 Pares ordenados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
2.2 Produto cartesiano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
2.3 Relações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
2.4 Relações de equivalência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
2.5 Relações de ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
2.6 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

3 Funções 24
3.1 Conceituação de função . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
3.2 Propriedades de funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
3.3 Aplicação canônica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
3.4 Função caracterı́stica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
3.5 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

4 Conjuntos infinitos 31
4.1 Princı́pios de indução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
4.2 Boa ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
4.3 Conjuntos contáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
4.4 Conjuntos não contáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
4.5 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38

5 Linguagens proposicionais 40
5.1 Linguagens formalizadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
5.2 A linguagem proposicional LP . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

2
5.3 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45

6 Funções de verdade 47
6.1 Funções de verdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
6.2 Funções de verdade especiais . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
6.3 Composição de funções de verdade . . . . . . . . . . . . . . . 49
6.4 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54

7 Semântica para a linguagem proposicional 56


7.1 Valorações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
7.2 Conjuntos verdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
7.3 Tabelas de verdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
7.4 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62

8 Tautologias e consequência 64
8.1 Valorações para conjuntos de fórmulas . . . . . . . . . . . . . 64
8.2 Tautologias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66
8.3 Consequência tautológica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66
8.4 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69

9 Compacidade 72
9.1 Satisfatibilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
9.2 Demonstração do teorema da compacidade . . . . . . . . . . 74
9.3 O Lema de Teichmüller-Tukey . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
9.4 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78

10 Sequentes 80
10.1 Sistemas formais abstratos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
10.2 O sistema SEQP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82
10.3 Teoremas de SEQP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
10.4 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87

11 Adequação de SEQP 89
11.1 Correção de SEQP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
11.2 Implicação axiomática . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
11.3 Completude de SEQP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91
11.4 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97

3
12 Lógica quantificacional 99
12.1 A linguagem quantificacional LQ . . . . . . . . . . . . . . . . 99
12.2 Semântica para LQ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
12.3 Definição de verdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102
12.4 Variáveis livres e ligadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106
12.5 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107

13 Sequentes para LQ 109


13.1 Validade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
13.2 Implicação lógica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 110

4
Capı́tulo 1

Elementos de teoria de
conjuntos

Não é possı́vel apreender os aspectos mais interessantes da lógica sem al-


gum desenvolvimento da teoria elementar de conjuntos, que é a teoria na
qual estes aspectos serão definidos e estudados. Este capı́tulo, e alguns dos
seguintes, tem por objetivo apresentar a teoria de conjuntos em sua forma
não axiomática, com desenvolvimentos suficientes para servir de base para
o nosso estudo principal, que é a lógica de primeira ordem.

1.1 Pertinência e inclusão


As noções de conjunto e pertinência são conceitos primitivos da teoria de
conjuntos. Para indicar que um objeto x pertence a um conjunto A, utili-
zamos a notação
x P A.
Assim, a expressão x P A indica que x é um elemento de A ou que x pertence
a A. Também, para indicar que um objeto x não é elemento de A, usamos
a notação x R A.
Outra noção que pode ocorrer entre conjuntos é a relação de igualdade
(ou identidade). Para indicar que um conjunto A é igual a um conjunto B
escrevemos
A  B.
Também, para dizer que um conjunto A não é igual a um conjunto B escre-
vemos A  B.

5
Um princı́pio básico que vige entre conjuntos indica qual é a relação que
há entre pertinência e igualdade. Trata-se do:
Princı́pio de extensionalidade. Dois conjuntos são iguais se
e somente se eles possuem os mesmos elementos.
Assim, o que determina um conjunto são apenas os seus elementos e mais
nada!
A tı́tulo de exemplificação, vamos rever alguns conjuntos de números
que, em geral, se estuda no ensino médio.
ˆ N é o conjunto dos números naturais: 0, 1, 2, ...

ˆ N é o conjunto dos números naturais sem o zero: 1, 2, ...

ˆ Z é o conjunto dos números inteiros: 0, 1, 2, ...

ˆ Q é o conjunto dos números racionais p{q em que p e q são inteiros e


q é positivo.

ˆ R é o conjunto dos números reais.

ˆ C é o conjunto dos números complexos.

? Além? disso,
Repare que o número 1 é elemento de todos estes conjuntos.

temos que 0 P N, 0 R N , 3 R N, 3 P Z, 1{2 P Q, 1{2 R Z, 2 R Q, 2 P R,
π P R, i R R e p2 3iq P C.
Dizemos que um conjunto A é subconjunto de B se todo elemento de A é
também elemento de B. Dizemos também que A está incluı́do em B. Para
isso, utilizamos a notação
A „ B.
Repare que, nos conjuntos de números acima, temos:

N „ N „ Z „ Q „ R „ C.
Se A „ B e A  B, dizemos que A é um subconjunto próprio de B.
Nesse caso, utilizamos a notação A Š B. Veja, então, que A Š B se e
somente se A „ B e existe x P B tal que x R A.

Importante! Para que um conjunto A não seja subconjunto de


um conjunto B é preciso que exista um elemento de A que não
seja elemento de B. Nesse caso, usamos a notação A † B.

Vejamos algumas propriedades que o conceito de inclusão possui:

6
i. Se A „ B e B „ A, então todo elemento de A é elemento de B, e
também todo elemento de B é elemento de A. Ou seja, A e B possuem
os mesmos elementos. Logo, pelo princı́pio de extensionalidade, A  B.
(Se um conjunto é subconjunto de outro e vice-versa, então eles são o
mesmo conjunto.) Então, A  B se e somente se A „ B e B „ A, e
isto é outro modo de enunciar o princı́pio de extensionalidade.

ii. Todo elemento de A é elemento de A, isto é, A „ A para todo conjunto


A. (Todo conjunto é subconjunto de si próprio.)

iii. Se todo elemento de A é elemento de B e todo elemento de B é elemento


de C, então todo elemento de A é também elemento de C, isto é, se
A „ B e B „ C, então A „ C. (A relação de inclusão é transitiva.)
Vamos introduzir alguma notação que vai nos permitir indicar modos de
especificação de conjuntos.
ˆ Uso de chaves. ta, bu é o conjunto cujos elementos são a e b. Esse
conjunto é também denominado o par não ordenado de a e b.
N  t0, 1, 2, ...u.
tN, Zu é o conjunto cujos elementos são N e Z.
t1, t1uu é o conjunto cujos elementos são 1 e t1u.
tt1uu é o conjunto cujo elemento é t1u.
Um conjunto do tipo tau em que a é o seu único elemento é denominado
conjunto unitário de a. Observe que x  txu.

ˆ Princı́pio de especificação. Dado um conjunto A e uma proprie-


dade de conjuntos P, fica determinado o conjunto formado pelos ele-
mentos de A que possuem a propriedade P. Esse conjunto será deno-
tado por

tx P A : x tem a propriedade Pu ou tx P A : Ppxqu.


Exemplo: tx P N : x 5u  t0, 1, 2, 3, 4u.
Repare que sempre que especificamos um conjunto a partir de um con-
junto A e uma propriedade P, o conjunto obtido é sempre um subconjunto
de A. Isto é, tx P A : Ppxqu „ A.
Considere, agora, um conjunto A e tome a propriedade dada por x  x.
Utilizando o princı́pio de especificação, temos o conjunto dado por:

tx P A : x  x u.
7
Como nunca ocorre que x  x, esse conjunto não possui elementos e, pelo
princı́pio de extensionalidade, ele é único. Esse conjunto será denominado
o conjunto vazio e será denotado pelo sı́mbolo I.

Propriedade fundamental. O conjunto I é subconjunto de


qualquer conjunto! Para todo conjunto A, tem-se que I „ A.
(Justificativa. Para que I não fosse um subconjunto de A,
teria que existir um elemento de I que não fosse elemento de A.
Mas, isso é impossı́vel, pois I não tem elementos.)

Vamos aceitar como um princı́pio de que:


Princı́pio do conjunto das partes: Para qualquer conjunto
A, existe o conjunto cujos elementos são todos os subconjuntos
de A.
Este conjunto é dito o conjunto das partes de A, ou o conjunto potência de
A. Além disso, esse conjunto será denotado por ℘pAq.
Vejamos alguns exemplos:
1. Se A  t1, 2u, então ℘pAq  tI, t1u, t2u, t1, 2uu.

2. Se A  I, então ℘pIq  tIu.


Observe que ℘pAq nunca é o conjunto vazio, pois I P ℘pAq e A P ℘pAq.
Importante! Pertinência e inclusão são conceitos bem diferen-
tes. Para que um conjunto seja elemento de outro conjunto, é
preciso que o primeiro figure como elemento no segundo. Por
outro lado, para que um conjunto seja subconjunto de outro,
é preciso que os elementos do primeiro conjunto figurem como
elementos no segundo. Assim, temos que: txu P ttxuu, mas
txu † ttxuu. Por outro lado, txu P ttxu, xu e txu „ ttxu, xu.

1.2 Operações entre conjuntos


Seja X um conjunto fixado e considere os conjuntos A e B que sempre serão
subconjuntos de X. Definimos as seguintes operações entre conjuntos que
são subconjuntos de X.
ˆ A união de A e B é o conjunto denotado por A Y B dado por

A Y B : tx P X : x P A ou x P B u.

8
ˆ A intersecção de A e B é o conjunto denotado por A X B dado por

A X B : tx P X : x P A e x P B u.

ˆ A diferença de A e B é o conjunto denotado por A  B dado por

A  B : tx P X : x P A e x R B u.

ˆ O complemento de A em X é o conjunto denotado por Ac dado por

Ac : tx P X : x R Au.

Exemplo. Suponha que X  t1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10u. Assim, temos que:


t1, 2, 3u Y t2, 3, 4, 5u  t1, 2, 3, 4, 5u.
t1, 2, 3u X t2, 3, 4, 5u  t2, 3u.
t1, 2, 3u  t2, 3, 4, 5u  t1u.
t2, 3, 4, 5u  t1, 2, 3u  t4, 5u.
t1, 2, 3, 4u  t1, 2, 3u  t4u.
t1, 2, 3u  t1, 2, 3, 4u  I.
t1, 2, 3u  t4, 5, 6u  t1, 2, 3u
t2, 4, 5, 6uc  t1, 3, 7, 8, 9, 10u.
Essas operações possuem uma série de propriedades que são listadas
abaixo.
AYAA AXAA
AYB BYA AXB BXA
pA Y B q Y C  A Y p B Y C q pA X B q X C  A X pB X C q
AYIA AXII
A„AYB AXB „A

Temos, também, propriedades que misturam as operações apresentadas.

A Y pB X C q  pA Y B q X pA Y C q A X pB Y C q  pA X B q Y pA X C q
A Y Ac  X A X Ac  I
p A Y B qc  Ac X B c pA X B q c  Ac Y B c
X  A  Ac AX I
A  pB Y C q  pA  B q X pA  C q A  pB X C q  pA  B q Y pA  C q
Xc  I Ic  X
Algumas propriedades que serão utilizadas mais adiante no texto são as
seguintes.

9
ˆ Se A „ C e B „ C, então A Y B „ C.
ˆ Se C „ A e C „ B, então C „ A X B.

ˆ Se A „ B, então B c „ Ac .

Observe também que uniões e intersecções não satisfazem as chamadas


leis de cancelamento. Assim, A Y B  A Y C não implica que B  C.
Para ver isso, basta tomar A  t1, 2, 3, 4u, B  t2, 3u e C  t3, 4u. Temos,
também, que A X B  A X C não implica que B  C. Basta tomar A como
o conjunto I e B  C.
Quando A X B  I, dizemos que A e B são conjuntos disjuntos.
Vamos introduzir duas novas operações que, em algum sentido, genera-
lizam as operações de união e intersecção de dois conjuntos. Seja A uma
coleção não vazia de conjuntos”
que são subconjuntos de X. Assim, definimos
a união de A, denotada por A, como o conjunto formado por todos os
elementos de elementos de A. Assim, temos:
¤
A : tx : existe B P A e x P B u.
“
Definimos, também, a intersecção de A, denotada por A, como o conjunto
dos elementos que são elementos de todos os elementos de A. Assim, temos:
£
A : tx : x P B para todo B P Au.
”
Portanto,“se A  tt1, 2, 3u, t2, 4u, t2, 5, 6uu, então A  t1, 2, 3, 4, 5, 6u e,
também, A  t2u.
Em algumas aplicações em lógica, precisamos considerar uniões e in-
tersecções de famı́lias infinitas de conjuntos. Vamos, então, introduzir o
conceito de uniões e intersecções generalizadas.
Seja X um conjunto e A0 , A1 , A2 , ... uma sequência de subconjuntos de
X. Definimos:
¤
Ai : tx P X : x P Ak para algum k P Nu
P
i N

e £
Ai : tx P X : x P Ak para todo k P N u.
P
i N

Assim, informalmente, temos:


¤
Ai  A0 Y A1 Y A2 Y ...
P
i N

10
e £
Ai  A0 X A1 X A2 X ...
P
i N

Temos, então, as seguintes propriedades, tomando B „ X:


¤ £ £ ¤
p Ai qc  Aci e p Ai qc  Aci
P
i N P
i N P
i N P
i N

¤ £ £ ¤
B Ai  p B  Ai q e B Ai  p B  Ai q
P
i N P
i N P
i N P
i N

Além disso, vale que1 :


¤
xP Ai ô x P Ak , para algum k PN
P
i N

e £
xP Ai ô x P Ak , para todo k P N.
P
i N

Quando uma sequência A0 , A1 , A2 , ... de subconjuntos de X é tal que,


para todo i, j P N com i  j tem-se que Ai X Aj  I, dizemos que
A0 , A1 , A2 , ... é uma sequência de conjuntos dois a dois disjuntos.

1.3 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Considere o conjunto X  t1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10u e sejam
os seguintes subconjuntos de X: A  t1, 2, 3, 4, 5, 6u, B  t2, 4, 6u, C 
t1, 3, 5u. Calcule os conjuntos: A Y B, A X C, A  B, A  C, C  A, Ac,
pC  B qc, B X C, C Y C, A  A e B Y B.
Exercı́cio 2. Considere os conjuntos: A  t1, 2u, B  tt3, 4u, 1, 7u, C 
tt3, 4u, 1, 2u, D  tt1, 3u, 4, 7u, E  tt1, 3u, 1, 7u, F  tt1, 3u, 1, 2u, G 
tt1, 2u, 1, 7u, H  tt1, 2u, 1, 2u, I  tt1, 2u, t1u, t2uu. Calcule a união e a
intersecção do conjunto A com cada um dos outros conjuntos.
Exercı́cio 3. Calcule: I X tIu, tIu X tIu, tI, tIuu  I, tI, tIuu  tIu,
tI, tIuu  ttIuu.
Exercı́cio 4. Considere os conjuntos: A  t1u, B  t1, t1uu, C  t1, 2u,
D  t1, 2, t1uu e E  t1, t1, t1uuu.
1
O sı́mbolo ô abrevia a expressão “se e somente se”.

11
ˆ Calcule: A X B, A Y B, pA Y B qX C, tAuY B, pC Y Dq D, pA X Dq E,
tB u X E, ptAu Y Dq X pE  C q.
ˆ Verifique quais sentenças são verdadeiras: A P B, A „ B, B P E,
B „ E, C P D, C „ D, B „ D, pB  Aq P D, pE  B q „ A.

Exercı́cio 5. Encontre conjuntos A, B e C tais que os seguintes enunciados


sejam verdadeiros: B X C  I, pA X C q  B  I, pA X B q  C  I e
pA X B q Y pA X C q Y pB X C q  I.
Exercı́cio 6. O mesmo que o exercı́cio 5 para os enunciados: C  I,
A X B  I, A X C  I e pA X B q  C  I.
”
“
Exercı́cio7. Seja o conjunto A  tt1, 2u, t2, 3u, t1, 2, 3uu. Calcule: A,
A e A Y t1, 2, 3u.
Exercı́cio 8. Mostre que pA X B qY C  A XpB Y C q se e somente se C „ A.
Exercı́cio 9. Construa um conjunto A, diferente do conjunto vazio, tal que
todo elemento de A seja subconjnuto de A. Dê dois exemplos.
Exercı́cio 10. (Importante!) Dê um argumento, ainda que informal, que
mostre a seguinte afirmação: Seja X um conjunto e A0 , A1 , A2 , ... uma
sequência de subconjuntos de X tal que A0 „ A1 „ A2 „ ... Seja B um
subconjunto finito de X tal que:
¤
B „ Ai .
P
i N

Então, existe k P N tal que B „ Ak .

12
Capı́tulo 2

Relações

A noção de relação ocorre em todas as construções da lógica de primeira or-


dem. É preciso um bom domı́nio deste conceito e também de tipos especiais
de relações que serão úteis nos desenvolvimentos dos próximos capı́tulos.

2.1 Pares ordenados


Do princı́pio de extensionalidade, segue-se que:
tA, Au  tAu e tA, B u  tB, Au.
Assim, na medida em que um conjunto é determinado pelos seus elemen-
tos, ao descrever um conjunto, a ordem em que colocamos seus elementos
é irrelevente. No entanto, é importante para os desenvolvimentos que apre-
sentaremos em lógica, descrever um tipo de objeto que, embora seja um
conjunto, possamos também considerar uma determinada ordem em seus
elementos. Isso pode ser implementado de acordo com a seguinte definição.
Dados os objetos A e B, definimos o conjunto:
xA, B y : ttAu, tA, B uu.
Esse conjunto possui a seguinte:
Propriedade Fundamental: Para todo A, B, C e D vale que:
xA, B y  xC, Dy ô A  C e B  D.
Para ver que este resultado está correto, temos primeiramente um resul-
tado preliminar1 .
1
Esta demonstração aparece em Levi, Basic set theory.

13
Lema. Se tA, B u  tA, C u, então B  C.
Prova. Temos dois casos: A  B ou A  B. Se A  B, então, como
C P tA, C u  tA, B u  tAu (pois, A  B), segue-se que C  A  B.
Se A  B, então, como B P tA, B u  tA, C u, devemos ter B  C.
Assim, em qualquer caso, B  C e temos o resultado. l
Vamos, agora, usar o Lema para provar a propriedade fundamental.
Prova da Propriedade Fundamental. A parte (ð) é fácil, utilizando-
se o princı́pio de extensionalidade. Se A  C e B  D, então tAu 
tC u e tB u  tDu, e também, tA, B u  tC, Du. Assim, ttAu, tA, B uu 
ttC u, tC, Duu, isto é, xA, B y  xC, Dy.
Para a parte (ñ), observe que

tAu P ttAu, tA, B uu  xA, B y  xC, Dy  ttC u, tC, Duu.


Assim, tAu  tC u ou tAu  tC, Du. Se tAu  tC u, temos que A  C. Por
outro lado, se tAu  tC, Du, então, como C P tC, Du  tAu, temos também
que A  C. Assim, em qualquer caso, temos que A  C. Resta mostrar
que B  D. Mas, uma vez que tAu  tC u e ttAu, tA, B uu  ttC u, tC, Duu,
aplicando o Lema, temos que tA, B u  tC, Du e, novamente pelo Lema,
segue-se que B  D. Assim, a propriedade fundamental fica provada. l
Essa propriedade justifica denominar o conjunto xA, B y como o par or-
denado dos conjuntos A e B, nessa ordem. O conjunto A é dito o primeiro
elemento do par ordenado xA, B y e B é o seu segundo elemento. Repare
que se A  B, então xA, B y  xB, Ay, pois xA, B y  ttAu, tA, B uu e
xB, Ay  ttB u, tA, B uu; e esses conjuntos são diferentes (o primeiro pos-
sui tAu como elemento e o segundo não).
A questão que se impõe agora é: Como fazer para determinar uma ordem
em um conjunto que tenha mais de dois elementos?
Isso pode ser facilmente resolvido estabelecendo-se uma série de de-
finições que generaliza o conceito de pares ordenados introduzindo a noção
de n-upla ordenada. Definimos:

xa1, a2, a3y  xxa1, a2y, a3y


xa1, a2, a3, a4y  xxa1, a2, a3y, a4y
..
.
xa1, a2, a3, ..., any  xxa1, a2, ., an1y, any
Observe que n-uplas ordenadas, para n ¥ 3, 4, ..., são sempre pares or-
denados.

14
2.2 Produto cartesiano
Vamos, agora, introduzir uma nova e fundamental operação entre conjuntos.
Dados os conjuntos A e B, definimos um conjunto formado por todos
os pares ordenados em que o primeiro elemento do par é um elemento de
A o segundo elemento do par é um elementos de B. Este conjunto é dito
o produto cartesiano de A por B (nessa ordem), e é denotado por A  B.
Assim, temos que:

A  B : txa, by : a P A e b P B u.

Exemplo. Considere os conjunto A  t1, 2, 3u e B  ta, bu. Então, temos


os seguintes produdos cartesianos:
A  B  tx1, ay, x1, by, x2, ay, x2, by, x3, ay, x3, byu e
B  A  txa, 1y, xa, 2y, xa, 3y, xb, 1y, xb, 2y, xb, 3yu.
Observe que a noção de produto cartesiano tem as seguintes propriedades
elementares:

ˆ Se A  B e A, B  I, então A  B  B  A.
ˆ A  I  I  A  I.

ˆ pA Y B q  C  pA  C q Y pB  C q e, também C  pA Y B q  pC 
Aq Y p C  B q .

ˆ pA X B q  C  pA  C q X pB  C q e, também C  pA X B q  pC 
Aq X p C  B q .

Quando A  B denotamos A  A por A2 .


Podemos definir, utilizando-se as n-uplas, produtos cartesianos finitos.
Se A1 , A2 , ..., An são conjuntos, então definimos:

A1  A2  ...  An  txa1, a2, ..., any : ai P Ai para i  1, 2, ..., nu.


Se os conjuntos forem todos iguais, temos:

An : loooooooomoooooooon
A  A  ...  A .
n vezes

15
2.3 Relações
Vamos introduzir o conceito fundamental de relações definidas em conjuntos.
Considere os conjuntos A e B. Uma relação (binária) R de A em B é
qualquer subconjunto R „ A  B. Portanto, uma relação não vazia de A
em B é sempre um conjunto de pares ordenados xa, by tal que a P A e b P B.
Quando A  B, dizemos que R „ A  A  A2 é uma relação em A.
Vamos introduzir uma notação especial para lidar com elementos de
relações. Se R „ A  B é uma relação de A em B, denotaremos o fato de
que xa, by P R, simplesmente por aRb.
Se considerarmos a relação “ser maior que” no conjunto de seres hu-
manos escrevemos “João é maior que Pedro” ao invés de xJoão,Pedroy P
“é maior que”.
Apresentamos, agora, uma série de propriedades que relações em um
conjunto podem possuir. Se R „ A  A é uma relação em A, definimos:

ˆ R é reflexiva ô para todo a P A, tem-se que aRa.


ˆ R é irreflexiva ô para todo a P A, tem-se que não ocorre aRa.

ˆ R é simétrica ô para todo a, b P A, tem-se que se aRb então, bRa.

ˆ R é antissimétrica ô para todo a, b P A, tem-se que se aRb e bRa,


então a  b.

ˆ R é transitiva ô para todo a, b, c P A, tem-se que se aRb e bRc então,


aRc.

ˆ R é uma relação de equivalência ô tem-se que R é reflexiva, simétrica


e transitiva.

ˆ R é uma relação de ordem parcial ô tem-se que R é reflexiva, antis-


simétrica e transitiva.

ˆ R é uma relação de ordem estrita ô tem-se que R é irreflexiva e


transitiva.

Vejamos alguns exemplos. Fixemos o conjunto A  t1, 2, 3, 4, 5, 6u. Con-


sidere as relações:

1. R  tx1, 1y, x2, 2y, x3, 3y, x4, 4y, x5, 5y, x6, 6yu. Esta é a relação de
identidade em A. Ela reflexiva, simétrica, antissimétrica e transitiva.
Portanto, é uma relação de equivalência e de ordem parcial.

16
2. R  txa, by P A  A : a bu. Esta é a relação usual de “menor que”
em A. Neste caso, a relação não é reflexiva, não é simétrica, mas é
irreflexiva, antissimétrica (por vacuidade, dado que nunca ocorre a b
e b a) e transitiva. Portanto, é uma relação de ordem estrita.
3. R¤  txa, by P A  A : a ¤ bu. Esta é a relação usual de “menor que
ou igual a” em A. Neste caso, a relação é reflexiva, antissimétrica e
transitiva. Portanto, é uma relação de ordem parcial.
4. R  tx1, 1y, x2, 2y, x3, 3y, x4, 4y, x5, 5y, x6, 6y, x1, 2y x2, 1y, x1, 3y, x3, 1y,
x2, 3y, x3, 2y, x4, 5y, x5, 4yu é reflexiva, simétrica e transitiva. Portanto,
é uma relação de equivalência.
Podemos, também, generalizar a noção de relação em um conjunto A a
fim de admitir relações que contenham n-uplas de elementos de A. Assim,
A  A  ...  A  An .
uma relação n-ária em A é um subconjunto R „ loooooooomoooooooon
n vezes

2.4 Relações de equivalência


Relações de equivalênciaindexrelação de equivalência são muito importantes
em estudos de lógica. Vamos, assim, considerar algumas propriedades que
este tipo de relação possui.
Seja R „ A2 uma relação de equivalência em A. Nesse caso, se aRb
dizemos que os elementos a e b são equivalentes pela relação R (ou que são
R-equivalentes).
Considere um elemento a de A. Definimos a classe de equivalência de
a pela relação R (ou a R-classe de equivalência de a), denotada por rasR ,
como:
rasR : tb P A : aRbu.
Considerando o exemplo (4) acima, podemos calcular as R-classes de
equivalência de todos os elementos de A. Temos:

ˆ r1sR  r2sR  r3sR  t1, 2, 3u.


ˆ r4sR  r5sR  t4, 5u.
ˆ r6sR  t6u.
Podemos, então, estabelecer algumas propriedades que as R-classes de
equivalência possuem.
Lema. Seja R uma relação de equivalência em A. Então, vale que:

17
i. Para todo a P A, tem-se que a P rasR . (Todo elemento de A pertence à
sua própria classe de equivalência.)

ii. Se a P rbsR , então b P rasR .

iii. Se a e b são elementos de A, então exatamente uma das seguintes coi-


sas acontecem: rasR  rbsR ou rasR X rbsR  I. (Duas R-classes de
equivalência ou são iguais ou são disjuntas.)

Prova. Sejam a e b elementos de A.

i. Para todo a P A, tem-se que aRa pela reflexividade de R. Assim,


a P rasR .

ii. Suponha que a P rbsR . Então, temos que bRa e, por simetria, aRb.
Logo, b P rasR .

iii. Suponha que rasR X rbsR  I. Temos que mostrar que rasR  rbsR .
Como rasR XrbsR  I, seja c P rasR XrbsR . Então, c P rasR e c P rbsR , isto
é, aRc e bRc. Vamos mostrar que rasR „ rbsR . Se x P rasR , então aRx
e, por simetria, xRa. Como aRc, temos, por transitividade, que xRc.
Novamente, por simetria, temos cRx. Como bRc, por transitividade,
bRx e bRa, isto é a P rbsR . Logo, rasR „ rbsR . Para mostrar a inclusão
inversa rbsR „ rasR , o argumento é análogo. Temos, então, que rasR „
rbsR e rbsR „ rasR . Por extensionalidade, obtemos rasR  rbsR .
E isso conclui a prova. l
Seja, agora, R uma relação de equivalência em A. Definimos o conjunto
quociente de A por R, denotado por A{R, como o conjunto de todas as
R-classes de equivalência de todos os elementos de A. Isto é:

A{R : trasR P ℘pAq : a P Au.


Novamente, se considerarmos o exemplo (4) da seção anterior, temos
que:
A{R  tt1, 2, 3u, t4, 5u, t6uu.
Repare que o conjunto quociente A{R reparte o conjunto A em partes
disjuntas. Isto não é por acaso.
Seja P „ ℘pAq um conjunto não vazio de subconjuntos de A que não
contém o conjunto vazio I (portanto, A  I). Dizemos que P é uma
partição de A se vale que:

18
”
i. P  A.

ii. Se P1 , P2 P P, então P1  P2 ou P1 X P2  I.
Assim, uma partição de A é um conjunto de subconjuntos de A dois a dois
disjuntos e que “cobrem” A.
Teorema. Seja R uma relação de equivalência em A. Então, o conjunto
quociente A{R é uma partição de A.
Prova. O resultado segue diretamente do Lema acima. Para a propriedade
(i), como a”P rasR , temos que a união das R-classes de equivalência cobrem
A, isto é, A{R  A. Além disso, a propriedade (ii) é exatamente o item
(iii) do Lema. l

2.5 Relações de ordem


Relações de ordem também aparecem em vários momentos nos estudos de
lógica.
Um conjunto parcialmente ordenado é um par xA, Ry em que A é um
conjunto não vazio e R é uma relação de ordem parcial em A. Vamos utilizar
a notação mais sugestiva ¤ no lugar de R. Então, ¤ „ A  A possui as
seguintes propriedades (vistas acima):

i. x ¤ x para todo x P A (propriedade reflexiva).

ii. Se x ¤ y e y ¤ x, então x  y para todo x, y P A (propriedade antis-


simétrica).

iii. Se x ¤ y e y ¤ z, então x ¤ z para todo x, y, x P A (propriedade


transitiva).

Um exemplo tı́pico (e importante) de conjunto parcialmente ordenado é


dado pelo seguinte resultado. (O conjunto das partes de um dado conjunto
munido da relação de inclusão neste conjunto é um conjunto parcialmente
ordenado.)
Proposição. Para todo conjunto A, o par x℘pAq, „y é um conjunto par-
cialmente ordenado. (Note aqui que „ é uma relação em ℘pAq, isto é, um
subconjunto de ℘pAq  ℘pAq.)
Prova. O resultado segue diretamente do propriedades da relação de in-
clusão enunciadas na primeira seção do presente capı́tulo. l

19
Exemplo. Seja A  t1, 2, 3u. Nesse caso podemos fazer um diagrama do
conjunto das partes de A dispondo seus subconjuntos de modo a indicar a
relação de inclusão.
t1, 2, 3u ..
....... ......... .......
..... .........
..... .... .....
..... .....
..
......
. ...
.. .....
.....
...
..... ... ....

t1, 2u t1, 3u t2, 3u


.

.. ....... ...... ....... ...... ..


......... ......... ........ ......... ........ .........
.... .......... .......... ....
.... ....
...
.. ......... ......... ......... ......... ...
..
.. ..... .. .....
... ..... .. ..... .. ...

t1u t2u t3u


. .

.
.......
......... .......... ........
.... ......

„
..... .....
..... ... .....
.....
..... ... ..
......
..... .... ....
....

I
.

Vejamos alguns conceitos diretamente associados a conjuntos parcial-


mente ordenados.
Seja xA, ¤y um conjunto parcialmente ordenado. Considere x P A e
Y „ A com Y  I.

1. Dizemos que x é limitante superior de Y se para todo y PY tem-se


que y ¤ x.

2. Dizemos que x é limitante inferior de Y se para todo y PY tem-se


que x ¤ y.

3. Dizemos que x é supremo de Y se x é limitante superior de Y e x ¤ y


para todo limitante superior y de Y . Notação x  sup Y .

4. Dizemos que x é ı́nfimo de Y se x é limitante inferior de Y e y ¤x


para todo limitante inferior y de Y . Notação x  inf Y .

5. Dizemos que x é um elemento maximal de A, se para todo a P A tal


que x ¤ a tem-se que x  a.

6. Dizemos que x é um elemento minimal de A, se para todo a P A tal


que a ¤ x tem-se que x  a.

7. Dizemos que x é o maior elemento de A, ou que x é o máximo de A,


se a ¤ x para todo a P A. Notação x  max A.

8. Dizemos que x é o menor elemento de A, ou que x é o mı́nimo de A,


se x ¤ a para todo a P A. Notação x  min A.

20
No conjunto parcialmente ordenado do exemplo acima, I e A são os
elementos mı́nimo e máximo de ℘pAq, respectivamente. O conjunto A é
também um elemento maximal. Suponha que tirássemos o elemento A do
conjunto das partes ℘pAq. Nesse caso, ainda terı́amos um conjunto parcial-
mente ordenado dado pelo seguinte diagrama:

t1, 2u t1, 3u t2, 3u


. .
.......... .......
........ ........
...... .......
........ ........
...... ..........
.. ..... .... ..... .... ..
... .......... .......... ...
... ... ... ...
.. ...... .. ......
... ..... ..... ..... ..... ...
... ..... ..... ...

t1u
.

t2u
.

.
t3u
........
........ .......... .......
.. ......

„
..... ... .....
.....
..... .. ..
......
..... ...
..... ... .....
... .....

I
Obeserve que, aqui, não temos elemento máximo, mas temos três ele-
mentos maximais: t1, 2u, t1, 3u e t2, 3u.
Proposição. Considere o conjunto parcialmente ordenado x℘pX q, „y para
algum conjunto X. Sejam A, B subconjuntos de X. Então, vale que:
i. X é o maior elemento de ℘pX q.

ii. I é o menor elemento de ℘pX q.


iii. A Y B  suptA, B u.

iv. A X B  inf tA, B u.


Prova. As propriedades (i) e (ii) são imediatas.
(iii) Note que A „ A Y B e B „ A Y B. Assim, A Y B é limitante superior
de tA, B u. Suponha que C é um subconjunto de X tal que C é limitante
superior de tA, B u, isto é, A „ C e B „ C. Então, A Y B „ C e temos que
A Y B  suptA, B u.
(iv) É provado de modo similar. Note que A X B „ A e A X B „ B. Assim,
A X B é limitante inferior de tA, B u. Suponha que C é um subconjunto de
X tal que C é limitante inferior de tA, B u, isto é, C „ A e C „ B. Então,
C „ A X B e, assim, temos que A X B  inf tA, B u. l

2.6 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Considere o conjunto E  t1, 2, 3, 4, 5, 6u e a seguinte relação
de equivalência:
R  tx1, 1y, x2, 2y, x3, 3y, x4, 4y, x5, 5y, x6, 6y, x1, 3y, x3, 1y, x1, 5y, x5, 1y,

21
x3, 5y, x5, 3y, x4, 6y, x6, 4yu.
Calcule as classes de equivalência de cada elemento de E e escreva qual
é o conjunto quociente E {R.
Exercı́cio 2. Considere o conjunto F  t1, 2, 3, 4u. Quantas relações
binárias podem ser definidas em F ? Quantas delas são relações de equi-
valência?
Exercı́cio 3. Seja R a relação de identidade em E, isto é, R  txx, xy : x P
E u. Nesse caso, como fica o quociente E {R? E se R fosse E  E?

“ ” 4. Seja P uma
Exercı́cio ” partição
” de E e A um elemento de P. Calcule:
P, P, A X P, A X P, A Y P.
Exercı́cio 5. Seja o conjunto E  t1, 2, 3, 4, 5, 6, 7u. Considere a partição
de E dada por P  tt1, 2, 5u, t4u, t3, 6, 7uu. Encontre uma relação de equi-
valência R em E tal que E {R  P. Será que existe outra relação que faria
o mesmo trabalho?
Exercı́cio 6. Prove que dada uma partição P de um conjunto E, existe
uma única relação de equivalência R em E tal que E {R  P.
Exercı́cio 7. Mostre que as propriedades de reflexividade, simetria e tran-
sitividade são todas independentes entre si. Isto é, encontre relações que
possuem apenas uma delas e não as outras duas e relações que possuem
duas delas e não a restante. Note que você deve fornecer seis exemplos.
Exercı́cio 8. Sejam R e S duas relações de equivalência em um conjunto
E. Mostre que R X S é também uma relação de equivalência em E. Será
que o resultado vale para a união R Y S?
Exercı́cio 9. Seja E um conjunto não vazio e I um subconjunto não vazio
de E. Defina uma relação R em E dada por xx, y y P R se e somente se x  y
ou ambos x e y pertencem a I.
a) Prove que R é uma relação de equivalência em E.
b) Como são as classes de equivalência?
Tente raciocinar a partir de exemplos.
Exercı́cio 10. (Importante!) Seja R uma relação binária em um conjunto
X que é reflexiva e transitiva. Defina uma nova relação binária  em X tal
que: x  y ô xRy e yRx.
Mostre que:
(1)  é uma relação de equivalência.
(2) Se a  a1 e b  b1 , então aRb ô a1 Rb1 .
(3) Defina a relação ¤ em X {  tal que: ras ¤ rbs ô aRb.

22
Pela parte (2), esta relação está bem definida (isto é, não depende do
representante da classe r s ). Mostre, então, que xX { , ¤y é um conjunto
parcialmente ordenado.

23
Capı́tulo 3

Funções

Funções são tipos especiais de relações. Para um entendimento adequado


da semântica da lógica classica é preciso um bom domı́nio do conceito de
função e de uma série de construções que fazemos com base neste conceito.

3.1 Conceituação de função


Seja R uma relação de A em B. Definimos o domı́nio de R como o conjunto
dos primeiros elementos dos pares que figuram em R. Isto é,

DomR : ta P A : existe b P B, xa, by P Ru.

Sejam os conjuntos A e B. Um função de A em B é uma relação

f „AB
tal que as seguintes condições são satisfeitas:

i. Condição de totalidade. Para cada a P A, existe b P B tal que xa, by P f .

ii. Condição de unicidade. Para um elemento a P A, existe um único b P B


tal que xa, by P f . Um jeito formal de afirmar isto é: Se xa, by P f e
xa, cy P f , então b  c.
Para indicar que f é uma função de A em B utilizaremos as seguintes
notações:
f :AÑB e AÑB
f

Repare que a condição de totalidade afirma nada mais do que Domf 


A. Por outro lado, a condição de unicidade, na medida em que xa, by P f , o

24
elemento b P B é determinado por a, permite escrever f paq  b no lugar de
xa, by P f . Nesse caso, dizemos que b é o valor da função f no argumento a.
Quando f : A Ñ B, já definimos que o domı́nio de f é A. O conjunto
B é dito o contradomı́nio de f , denotado por Codomf . Além disso, deno-
minamos a imagem de f como o conjunto dos valores que f pode assumir.
Isto é,
Imf : tb P B : existe a P A, f paq  bu.
Assim, Imf „ B.
Importante! Vamos convencionar que para que duas funções
sejam iguais elas precisam ter o mesmo domı́nio, o mesmo con-
tradomı́nio e para todo argumento no domı́nio elas forneçam o
mesmo valor no contradomı́nio.

Se f : A Ñ B e X „ A, definimos a imagem de X por f como o conjunto:


f pX q : tf pxq P B : x P X u.

Segue-se imediatamente que f pAq  Imf .

3.2 Propriedades de funções


Vamos, agora, definir algumas propriedades que uma função pode possuir.
Seja f : A Ñ B uma função.
1. Dizemos que f é injetora (ou que é uma injeção) se para todo a, a1 P A
tal que a  a1 , tem-se que f paq  f pa1 q. Assim, elementos diferentes no
domı́nio são “levados” por f a elementos diferentes no contradomı́nio.

2. Dizemos que f é sobrejetora (ou que é uma sobrejeção, ou ainda que


f é de A sobre B) se para todo elemento b P B, existe a P A tal que
f paq  b. Isto é o menmo que dizer que Imf  B.

3. Dizemos que f é bijetora (ou que é uma bijeção, ou ainda que é uma
correspondência biunı́voca) se f é injetora e também sobrejetora.
Há situações em que se pode definir naturalmente uma função por meio
de duas funções dadas.
Considere as funções A Ñ B Ñ C. (Repare que o contradomı́nio da f é
f g

o domı́nio da g.) Assim, fica definida a função g  f : A Ñ C dada por:

rg  f spaq  gpf paqq,


25
para todo a P A. Assim, para se obter o valor de g  f no argumento a P A,
primeiro aplicamos f no argumento a obtendo um elemento b P B e, então,
aplicamos a função g a b obtendo um elemento c P C que é o valor de g  f
no argumento a. Essa função é denominada a composição (ou a composta)
de f por g. Para composição de funções, vamos, frequentemente, utilizar
diagramas do tipo:
f
A .................................. B
..... ...
..... ...
.....

gf
.....
.....
.....
..... ..........
...
... g
.......... .

C
Observe que a composição de funções é associativa.

Proposição. Considere as funções A Ñ B Ñ C Ñ D. Então, vale que


f g h

ph  g q  f  h  p g  f q.
Prova. Em primeiro lugar, repare que ambas as funções ph  g q f e h pg  f q
possuem o mesmo domı́nio A e contradomı́nio D.
f
A .................................. B ...
hg
..... ... .....
..... ... .....
..... .....

gf
.....
.....
.....
..... ..........
...
... g .....
.....
.....
.....
.. .
....... . ..........
h
...............................
C D
Tome um elemento a P A. Temos:
rph  gq  f spaq  rph  gqspf paqq
 hpgpf paqqq
 hprg  f spaqq
 rh  pg  f qspaq.
Logo, segue-se que ph  g q  f  h  pg  f q. l
Com respeito à composição de funções, valem os seguintes resultados
quando temos a situação dada por A Ñ B Ñ C:
f g

ˆ Se f e g são injetoras, sobrejetoras ou bijetoras, então g  f é injetora,


sobrejetora ou bijetora, respectivamente.

ˆ Se g  f é injetora, então f é injetora.

ˆ Se g  f é sobrejetora, então g é sobrejetora.

26
Seja f : A Ñ B uma função bijetora. Podemos, então, definir uma
função f 1 : B Ñ A, dita a inversa da função f dada por:
f 1 pbq  a ô f paq  b,

para todo b P B. É fácil verificar que f 1 é também uma bijeção.


Seja X um conjunto e A „ X. Então, fica naturalmente definida uma
função
iA : A Ñ X
tal que iA paq  a, para todo a P A. Esta função é denominada a aplicação
inclusão de A em X e é denotada por iA : A ãÑ X. Note que iA é sempre
injetora. Quando A  X, essa função é dita a identidade em A, e é denotada
po IdA . A função IdA é sempre bijetora.
Proposição. Seja f : A Ñ B uma função bijetora e considere sua inversa
f 1 : B Ñ A. Então, vale que f 1  f  IdA e f  f 1  IdB .
Prova. É claro que f 1  f : A Ñ A.
f
A .................................. B
..... ...

f 1
..... ...
..... ...
.....

f 1  f
..... ...
.....
..... ..........
.. .
....... .

A
Então, para todo a P A com f paq  b, temos que rf 1  f spaq  f 1 pf paqq 
f 1 pbq  a  IdA paq. Logo, f 1  f  IdA . Para a outra equação a prova é
análoga. l

3.3 Aplicação canônica


Seja X um conjunto não vazio e R „ X  X uma relação de equivalência
em X. Considere o conjunto quociente X {R. Assim, fica naturalmente
definida uma função
πR : X Ñ X {R,
tal que πR pxq  rxsR , para todo x P X. (A função leva cada elemento
do conjunto em sua classe de equivalência.) Essa função é denominada a
aplicação canônica de R. Note que πR é sempre sobrejetora.
Considere, agora, uma função qualquer f : A Ñ B. Defina uma relação
em A dada por:
a  a1 ô f paq  f pa1 q.

27
É claro que  é uma relação de equivalência. Tome, agora, o conjunto
quociente A{  e a aplicação canônica π : A Ñ A{ .
Defina, agora, uma nova função f  : A{  Ñ B tal que:

f  pras q  b ô f paq  b.

Repare que esta função está bem definida e, além disso, é injetora. Veja,
então, que a nossa função f original é a composição:
f
A .................................................................................... B
..... .......
.....
..... ......
.....

f
.....
.....
π .....
.....
.......
...... .....
.
...
.....
.
..

A{ 

Isto é, f   π  f . De fato, tome a P A tal que f paq  b. Temos:


rf   πspaq  f pπpaqq  f prasq  b  f paq.
Esta construção nos fornece o seguinte resultado.
Teorema. Toda função pode ser decomposta em uma composição de uma
função sobrejetora com uma função injetora.

3.4 Função caracterı́stica


Vamos definir um tipo importante de função que terá um papel na descrição
da semântica de linguagens proposicionais.
Seja A um conjunto. Definimos o conjunto sucessor de A, denotado por
A como sendo:
A :  A Y t Au.
Segue-se que:

ˆ I  I Y tIu  tIu.
ˆ pI q  tIu Y ttIuu  tI, tIuu.
Vamos dar nomes especiais para estes conjuntos.

ˆ 0 : I.

ˆ 1 : 0  tIu  t0u.
ˆ 2 : 1  tI, tIuu  t0, 1u.

28
Seja X um conjunto e A „ X. Definimos, então, uma função

χA : X Ñ 2 p: t0, 1uq


tal que "
0 se x R A
χA pxq 
1 se x P A.
Vamos denominar a função χA a função caracterı́stica de A em X.
Proposição. Seja X um conjunto e A, B subconjuntos de X. Então, se
A  B temos que χA  χB .
Prova. Como A  B, suponha, sem perda de generalidade, que existe um
elemento x P A tal que x R B. Então, χA pxq  1 e χB pxq  0. Logo,
segue-se que χA  χB . l
Se A e B são conjuntos, vamos denotar por B A o conjunto de todas as
funções de A em B. Segue-se do resultado acima a seguinte propriedade.
Teorema. Dado um conjunto X qualquer, existe um bijeção f entre os
conjuntos ℘pX q e 2X , tal que para todo A „ X, tem-se que f pAq  χA .
Assim, para cada subconjunto A de X, temos univocamente determi-
nada uma função χA em 2X . As funções caracterı́sticas funcionam como
“codificações” de subconjuntos de X.

3.5 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Sejam A  t0, 1, 2, 3u e B  t4, 5, 6, 7, 8u. Justificar porque
as relações abaixo não são funções de A em B.
(1) R  tx0, 5y, x1, 6y, x2, 7yu.
(2) S  tx0, 4y, x1, 5y, x1, 6y, x2, 7y, x3, 8yu.
Exercı́cio 2. Seja X  t1, 2, 3u. Quantas bijeções de X em X existem? Se
um conjunto finito A tem n elementos, quantas bijeções existem de A em
A?
Exercı́cio 3. Sejam os conjuntos X  t1, 2, 3, 4u e Y  ta, b, cu. Seja
a função f : X Ñ Y tal que f p1q  a, f p2q  b, f p3q  b e f p4q  c
(“desenhe” a função!). Responda: 1) f é injetora? 2) f é sobrejetora? 3)
Qual é o valor de f no argumento 4? 4) Para os conjuntos X e Y dados,
haveria uma função injetora g : X Ñ Y ? 5) Para A  t1, 2u, o que é f pAq?
6) Quantas funções de X em Y existem? E de Y em X? 7) Se um conjunto
A tem n elementos e um conjunto B tem k elementos, quantas funções de
A em B existem?

29
Exercı́cio 4. Seja f : A Ñ B e D, E „ A. Mostre que:
(1) Se D „ E, então f pDq „ f pE q;
(2) f pD X E q  f pDq X f pE q;
(2) f pD Y E q „ f pDqY f pE q. Dê um exemplo que mostre que a inclusão
contrária não vale.
Exercı́cio 5. Considre as funções A Ñ B Ñ C. Mostre que:
f g

(1) Se f e g são injetoras, então g  f é injetora.


(2) Se f e g são sobrejetoras, então g  f é sobrejetora.
(3) Se g  f é injetora, então f é injetora.
Exercı́cio 6. Dada a função f : X Ñ Y , defina a relação R em X tal que
aRb ô f paq  f pbq. Mostre que R é uma relação de equivalência em X e
que a função f  : X {R Ñ Y , definida por f  prasR q  f paq é injetora.
Exercı́cio 7. Seja X um conjunto e A, B „ X. Considere as funções
caracterı́sticas χA , χB : X Ñ 2. Mostre que:
1) χAYB : X Ñ 2 é tal que:
"
1 se χA pxq  1 ou χB pxq  1
χA YB px q 
0 se χA pxq  χB pxq  0
2) χAXB : X Ñ 2 é tal que:
"
1 se χA pxq  χB pxq  1
χA XB px q 
0 se χA pxq  0 ou χB pxq  0
3) χAc : X Ñ 2 é tal que:
"
1 se χA pxq  0
χA c p x q 
0 se χA pxq  1

Exercı́cio 8. 1) Demonstre que a função f  descrita na seção 3.3 é, de fato,


uma injeção.
2) Aplique a construção desenvolvida nessa seção e encontre uma de-
composição da função descrita no exercı́cio 3 como uma composição de uma
função injetora com uma sobrejetora.
Exercı́cio 9. Seja X um conjunto. Dados H, X „ X, como ficam as funções
caracterı́sticas χH e χX ?
Exercı́cio 10. Considere a função f : X Ñ Y definida no exercı́cio 3.
Encontre uma função g : Y Ñ X tal que f  g  IdY . Será verdade que
dada qualquer função h : A Ñ B existe uma função h1 : B Ñ A tal que
h  h1  IdB ? Vale essa propriedade para algum tipo especial de função?

30
Capı́tulo 4

Conjuntos infinitos

Neste capı́tulo aprenderemos como demonstrar propriedades de conjuntos


infinitos de objetos sem precisar verificar a propriedade para cada objeto
do conjunto. As ferramentas básicas para isto são os princı́pios de indução.
Além disso, precisamos de uma conceituação razoavelmente precisa do que
vem a ser conjuntos finitos e infinitos. A exposição seguirá de perto o
capı́tulo XX de Hodel (XXXX).

4.1 Princı́pios de indução


Considere o conjunto N dos inteiros positivos1 , isto é,

N  t1, 2, 3, ...u.
Vamos apresentar uma técnica, denominada Princı́pio de Indução, que
serve para demonstrar certas propriedades de elementos N. Seja S pnq uma
propriedade qualquer dos inteiros positivos. Para mostrar que todos os in-
teiros positivos têm a propriedade S procedemos de acordo com os seguintes
passos:

ˆ Prova da base. Mostramos S p1q, isto é, que o número 1 tem a


propriedade S.

ˆ Passo indutivo. Para n ¥ 1, mostramos que se n tem a propriedade


S, então n 1 também tem a propriedade S. Isto é: mostramos que
se S pnq, então S pn 1q.
1
No que se segue, não faria diferença alguma se considerássemos o conjunto N incluindo
o número 0.

31
Com base nestes dois passos, o princı́pio de indução nos permite concluir que
todo inteiro positivo n tem a propriedade S. No passo indutivo, a suposição
de que n tem a propriedade S é denominada hipótese de indução.
Observe que propriedades de elementos de N podem ser identificadas
com subconjuntos de N . Assim, o princı́pio de indução poderia ser resumido
na seguinte propriedade:

Princı́pio de Indução. Dado um subconjunto A do conjunto


dos números naturais positivos N , tal que 1 pertence a A e
sempre que um número n pertence a A, o número n 1 também
pertence a A, tem-se que A  N .

Vejamos um exemplo matemático de aplicação do princı́pio de indução.


Proposição. Para todo n P N , tem-se que:

n pn 1q
1 2 ... n .
2
Prova. Temos que proceder em dois passos:

ˆ Prova da base. Fazemos n  1.


1p1 1q
2
 1 2 2  1.
Logo, a propriedade vale para o número 1.

ˆ Passo indutivo. Suponha que o resultado vale para n (esta é a


hipótese de indução), isto é, suponha que

np n 1q
1 2 ... n .
2
Para n 1, temos:

1 2 ... n pn 1q  p q n 1
n n 1

 p q 2n 2
2
n n 1
npn 1q 2pn 1q
2

 pn 1qpn2 2q
 pn 1qpp
2
n 1q 1q
2

e vemos que a fórmula também vale para n 1.

32
Logo, pelo princı́pio de indução, segue-se o resultado. l
Existe uma outra forma de indução denominada princı́pio de indução
completa (ou indução no curso de valores). Aqui, S ainda é uma propriedade
de inteiros positivos e temos os seguintes passos:

ˆ Prova da base. Mostramos S p1q, isto é, que o número 1 tem a


propriedade S.

ˆ Passo indutivo. Para n ¥ 1, mostramos que se todo k ¤ n tem


a propriedade S, então n 1 também tem a propriedade S. Isto é:
mostramos que se S p1q, S p2q, ..., S pnq, então S pn 1q.

Com base nestes dois passos, o princı́pio de indução completa nos permite
concluir que todo inteiro positivo n tem a propriedade S.
Vejamos também uma aplicação matemática.
Proposição. (Fatorização em números primos2 ). Todo número inteiro
n ¡ 1 é um produto de números primos.
Prova. Seja S pnq a propriedade “n é um produto de primos”.

ˆ Prova da base. A base começa com 2. Temos que S p2q vale pois 2 é
primo. (Aceitamos que um número primo é um “produto” de primos.)

ˆ Passo indutivo. Supomos que S p2q, S p3q, ..., S pnq (que é a nossa
hipótese de indução), ou seja, que 2, 3, ..., n são produto de primos.
Considere n 1. Se n 1 é primo, então n 1 é um produto de
primos. Se n 1 não é primo, tem-se que n 1 é um produto a  b,
em que ambos a e b não são nem 1 nem n. Como a e b são tais que
1 a, b n, segue-se, da hipótese de indução, que a e b são produto
de primos. Como n 1  a  b, tem-se que n 1 é um produto de
primos.

Logo, segue-se o resultado. l

4.2 Boa ordem


É sabido que os números naturais positivos (o conjunto N ) possuem uma
ordem natural dada por n ¤ m se e somente se existe k P N tal que n k  m.
Assim, o par xN , ¤y é um conjunto parcialmente ordenado, isto é, a relação
2
Um número natural positivo n é primo se n é diferente de 1 e os únicos divisores
positivos de n são 1 e o próprio n.

33
¤ satisfaz as condições dadas na seção 2.5.
No entanto, esta relação tem
uma propriedade adicional: Para todo n, m P N , tem-se que n ¤ m ou
m ¤ n. Isto torna a relação ¤ uma ordem total em N .
Um resultado útil relacionado com os princı́pios de indução é dado por:

Axioma da Boa Ordenação. Seja A um subconjunto não


vazio de N . Então, A tem um menor elemento, isto é, existe
x P A tal que x ¤ a, para todo a P A.

Teorema. São equivalentes:


i. Princı́pio de indução.
ii. Axioma da boa ordenação.
iii. Princı́pio de indução completa.
Prova. É imediato que (iii) ñ (i).
Mostremos que (i) ñ (ii)3 . Seja A um subconjunto não vazio de N . Supo-
nha, por absurdo que A não tem o menor elemento. Considere o conjunto
Ac que é o complementar de S com respeito a N . Definimos os conjuntos

P N  : k ¤ n u.
In : tk

Portanto, I1  t1u, I2  t1, 2u, I3  t1, 2, 3u e assim por diante. Considere


a propriedade S pnq dada por “In „ Ac ”. Vamos usar o princı́pio de indução
para mostrar que S pnq vale para todo n P N .

ˆ Prova da base. S p1q que é I1 „ Ac vale, pois, caso contrário 1 P A e


A teria o menor elemento.

ˆ Passo indutivo. Suponha que S pnq vale (hipótese de indução), isto


é, In „ Ac . Assim, t1, 2, ..., nu „ Ac . Nesse caso, temos também que
n 1 P Ac , pois caso contrário n 1 seria o menor elemento de A.
Então, vale S pn 1q.

Pelo princı́pio de indução, vale S pnq, para todo n P N . Isto é Ac  N .


Mas, então A  I, que é contrário à nossa hipótese. Logo, (i) ñ (ii).
Resta mostrar que (ii) ñ (iii). Seja S pnq uma propriedade de elementos de
N tal que vale que:
1. S p1q, isto é 1 tem a propriedade S.
2. Se 1, 2, ..., n possuem a propriedade S então n 1 também possui a
propriedade S.
3
O argumento encontra-se em Elon L. Lima, Curso de Análise, volume 1.

34
Temos que mostrar que S vale para todo n P N . Considere o conjunto
A  tn P N : S pnq valeu.
Assim, temos que:
1. 1 P A.
2. Se t1, 2, ..., nu „ A, então n 1 P A.
É preciso mostrar que A  N . Suponha, por absurdo, que A Š N . Então,
Ac , o complementar de A com respeito a N , é não vazio. Pelo axioma
da boa ordenação, Ac tem um menor elemento k. Mas, nesse caso, o con-
junto t1, 2, ..., k  1u é um subconjunto de A e, por (2), temos que k P A
(contradição!). Logo, segue-se que A  N e temos que (ii) ñ (iii). l
4.3 Conjuntos contáveis
Dois conjuntos A e B são ditos equipotentes, em sı́mbolos A  B, se existe
uma função bijetora de A em B. Dito de modo informal, dois conjuntos são
equipotentes quando possuı́rem a “mesma quantidade de elementos”.
Proposição. Equipotência entre conjuntos possui as mesmas propriedades
de relações de equivalência. Isto é, para todo conjunto A, B e C, temos:
i. A  B.
ii. Se A  B, então B  A.
iii. Se A  B e B  C, então A  C.
Prova. Para (i), a função identidade em A é bijetora. Para (ii), se f : A Ñ
B é uma bijeção, então a função inversa f 1 : B Ñ A é uma bijeção. Para
(iii), a composição de funções bijetoras é uma função bijetora. l
Um conjunto A é dito finito se A  I ou existe n P N tal que A 
t0, 1, ..., nu. Se A é um conjunto finito e A  t0, 1, ..., n  1u, dizemos que A
tem n elementos. Um conjunto que não é finito é denominado infinito. Um
conjunto A é contável se A é finito ou A  N. Finalmente, um conjunto A
é não contável se ele não é contável.
Lema. Se A é contável e A  B, então B é contável.
Prova. O resultado segue da transitividade da relação de equipotência entre
conjuntos. l
Vejamos três importantes resultados sobre conjuntos contáveis.
Teorema da Enumeração. Seja A um conjunto contável não vazio. Então,
os elementos de A podem ser enumerados como a0 , a1 , a2 ...; em outras pa-
lavras, A pode ser escrito como A  tai : i P Nu. Além disso, se A é infinito
podemos assumir que am  an sempre que m  n.

35
Prova. Assuma, primeiramente, que A  N e seja f : N Ñ A uma bijeção.
Como f é sobrejetora, temos que A  tf pnq : n P Nu. Assim, se fizermos
an  f pnq, para todo n P N, então A  tai : i P Nu. Além disso, como f é
injetora, vale que am  an sempre que m  n.
Assuma, agora, que A é finito e não vazio. Nesse caso, há uma bijeção f
que mostra que t0, 1, ..., k u  A, para algum k P N. Novamente, A pode
ser escrito como A  tf pnq : n  0, 1, ...k u e, tomando f pnq  an , para
n  0, 1, ..., k, obtemos que A  tai : 0 ¤ i ¤ k u . Agora, se fizermos
an  ak , para n ¥ k, obtemos A  tai : i P Nu (os elementos para n ¥ k são
todos repetidos). l
Teorema do Subconjunto. Todo subconjunto de um conjunto contável é
contável.
Prova. Seja A „ B com B contável. O caso em que B é finito será deixado
como exercı́cio.
Vamos provar o resultado primeiramente para B  N. A demonstração será
informal. Se A é finito, então A é contável e o resultado vale.
Suponha, então, que A é um subconjunto infinito de N. Construa uma
sequência crescente

a0 a1 a2 ... an ...

de elementos de N de acordo com a seguinte estipulação:

a0  o menor elemento de A
a1  o menor elemento de A  ta0 u
..
.
an 1  o menor elemento de A  ta0 , a1 , ..., an u
..
.

Como A é infinito, em cada estágio, o conjunto A  ta0 , a1 , ..., an u é não


vazio e, pelo axioma da boa ordem, esse conjunto tem o menor elemento
an 1 . Por construção, é claro que

A  tan : n P Nu

e, além disso, am  an se m  m. Defina, então, a função f : N Ñ A tal


que f pnq  an para todo n P N. Segue-se, então, que f é uma bijeção e,
portanto, A  N, isto é, A é contável.
Considere, agora, o caso geral em que A „ B e B é contável e infinito.
Então, B  N e existe f : B Ñ N bijetora. Seja C  f pAq  tf paq : a P Au,

36
o domı́nio da bijeção f . Assim, C „ N e, usando o argumento acima, C é
contável. Além disso, restringindo o contradomı́nio de f para C, obtemos
uma bijeção de A em C. Assim, A  C e C é contável. Pelo Lema, segue-se
que A é contável. l
Teorema da Injeção. Seja A um conjunto. Assim, se existe um conjunto
contável B e uma função injetora f : A Ñ B, então A é contável.
Prova. Seja C  f pAq, o domı́nio da f . Como f é injetora, restringindo o
contradomı́nio de f para C, temos uma bijeção de A em C, isto é A  C.
Mas C „ B e B é contável. Logo, pelo teorema do subconjunto, C é contável.
Assim, A  C e C é contável. Então, pelo Lema, A é contável. l

4.4 Conjuntos não contáveis


Já sabemos que existem conjuntos infinitos que são contáveis. (Por exemplo,
o conjunto N.) Algumas questões que se impõem são:
i. Será que existem conjuntos não contáveis?
ii. Não poderia ocorrer que todos os conjuntos infinitos fossem contáveis?
iii. Existem conjuntos infinitos “maiores” do que os contáveis?
iv. Existem “tamanhos” diferentes de infinito?
Vamos responder essas perguntas apresentando dois surpreendentes re-
sultados obtidos no final do século XIX pelo matemático alemão Georg Can-
tor, nascido no Império Russo (São Petersburgo) em 1845.
Teorema. (Cantor). O conjunto ℘pNq de todos os subconjuntos de N é não
contável.
Prova. Vamos fornecer, primeiramente, um argumento informal. Suponha
que ℘pNq é contável. Pelo teorema da enumeração, temos que ℘pNq  tAn :
n P Nu. A ideia é construir um conjunto B tal que

ˆ B „ N.
ˆ B  An , para todo n P N.

Assim, terı́amos B P ℘pNq e B R tAn : n P Nu, que contradiz que ℘pNq 


tAn : n P Nu.
Para fazer com que B  A0 tomamos a seguinte decisão sobre o número 0:
se 0 P A0 então 0 R B e se 0 R A0 , então 0 P B. Isto garante que B  A0 .
Aplicamos o mesmo raciocı́nio para o número 1. Se 1 P A1 então 1 R B e se
1 R A1 , então 1 P B. Isto garante que B  A1 .

37
Continuando o mesmo raciocı́nio, construı́mos B „ N tal que B  An, para
todo n P N.
Vamos, agora à prova que formaliza o argumento acima.
Seja B  tn P N : n R An u. Mostremos que B  An , para todo n P N. Tome
um certo n P N qualquer. Temos dois casos:

ˆ Se n P An , então n R B. Nesse caso, B  An .


ˆ Se n R An , então n P B. Nesse caso, também B  An .
Assim, em qualquer caso B  An e temos o resultado. l
Vamos, agora, apresentar um resultado mais geral, também devido a G.
Cantor, que vale para qualquer conjunto. De fato, o resultado acima pode
ser visto como um corolário do teorema seguinte.
Teorema. (Cantor). Dado qualquer conjunto A, não existe bijeção de A
em ℘pAq. Isto é, A e ℘pAq nunca são equipotentes.
Prova. É suficiente mostrar que não existe uma função f : A Ñ ℘pAq que
seja sobrejetora. Suponha, por absurdo que existe uma tal função f que é
sobrejetora.
Defina um conjunto B „ A tal que:

B  ta P A : a R f paqu.
Como B P ℘pAq e f é sobrejetora, existe k P A tal que f pk q  B. Verifique-
mos se k P B. Temos dois casos:

ˆ Se k P B, então, pela definição de B, k R f pk q. Logo, k R B (pois B é


f pk q).

ˆ Se k R B, então k R f pk q e, pela definição de B, temos que k P B.

Assim, k P B se e somente se k R B, o que significa que k P B e k R B


(contradição!). Logo, segue-se o resultado. l

4.5 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Forneça uma prova mais detalhada do Lema da seção 4.3.
Exercı́cio 2. Encontre um argumento que prove que o conjunto N é infinito.
Mostre que a união de dois conjuntos finitos é um conjunto finito. Generalize
o resultado para uma união finita de conjuntos finitos. (Use indução.)

38
Exercı́cio 3. Dê um exemplo de um conjunto A e um subconjunto próprio
B Š A tal que A  B.
Exercı́cio 4. Mostre que:
a. N  N;
b. Z  N.
Exercı́cio 5. Seja A um subconjunto infinito de N e defina f : A Ñ N
como f pk q  número de elementos do conjunto t0, 1, ..., k u X A (i.e., f pk q é
o número de elementos do conjunto A que são menores ou iguais a k).
a. Mostre que f é injetora. Mais precisamente, mostre que se i j,
então f piq f pj q;
b. Mostre que f é sobrejetora. (Use indução. Para começar, use o
princı́pio de boa ordem para escolher o menor k P A e mostre que f pk q  1.q
Exercı́cio 6. Teorema da Sobrejeção. (Hodel (XXXX), exercı́cio 9, pag
25.) Sejam A um conjunto contável e f : A Ñ B uma função sobrejetora.
Mostre que B é contável. (Para cada b P B, escolha ab P A tal que f pab q  b.
Defina g : B Ñ A tal que g pbq  ab . Mostre que g é injetora e use o teorema
da injeção).
Exercı́cio 7. Mostre, usando um argumento informal, que N  N é contável.
Exercı́cio 8. (Hodel (XXXX), exercı́cio 10, pag 25.) Seja tAn : n P Nu uma
” contável de conjuntos tais que cada conjunto An é contável. Mostre
coleção
que nPN An é contável.”(Uma vez que cada An é contável, An  txnk : k P
Nu; defina f : N  N Ñ nPN An por f pn, k q  xnk . Use os exercı́cios 6 e 7.)
Exercı́cio 9. Seja X um conjunto infinito e F pX q a coleção de todas as
funções de X em t0, 1u. Mostre que F pX q é não contável. (Lembre-se das
funções caracterı́sticas e use um teorema de Cantor.)
Exercı́cio 10. Mostre que:
a. A coleção de todos os subconjuntos finitos de N é contável. (O
argumento pode ser informal.)
b. A coleção de todos os subconjuntos infinitos de N é não contável.
(Use a parte a. e os resultados provados anteriormente.)

39
Capı́tulo 5

Linguagens proposicionais

Neste capı́tulo, começamos o estudo da lógica clássica propriamente dita.


Vamos começar pelo fragmento proposicional dessa lógica conhecido com o
cálculo proposicional clássico. Precisamos, primeiramente, entender como é
a linguagem desse cálculo.

5.1 Linguagens formalizadas


Para especificar uma linguagem formalizada (ou simplesmente, uma lingua-
gem), que denotaremos por L, introduzimos um conjunto S cujos elementos
são ditos sı́mbolos de L. Assumimos que o conjunto S é não vazio. Mais
tarde, faremos hipóteses adicionais sobre S.
Seja S o conjunto de sı́mbolos de uma liguagem L. Uma expressão de
L é qualquer sequência finita de sı́mbolos de L (portanto, elementos de S).
Cada aparecimento de um sı́mbolo em uma expressão é dito uma ocorrência
daquele sı́mbolo na expressão. O comprimento de uma expressão é o número
de ocorrências de sı́mbolos na expressão. Admitimos que a sequência vazia
é uma expressão de L e é a única expressão de comprimento 0.
Se u e v são expressões de L, a expressão formada pela justaposição de
u e v; isto é, escrevendo u e então escrevendo v imediatamente a seguir,
será denotada por uv. O conjunto de todas as expressões da linguagem L
será denotado por EXPL .
Exemplo. Seja S  ta, b, cu. Então, exemplos de expressões de S são:
aaa, abc, a, b, bbacbaa, etc. O sı́mbolo a ocorre três vezes em bbacbaa
e essa expressão tem comprimento 7. Como aba e cbcb são expressões, a
justaposição dessas expressões fornece a expressão abacbcb.
Para completar a descrição de uma linguagem L é preciso definir um

40
subconjunto do conjunto das expressões de L cujos elementos são ditos as
fórmulas de L. Este conjunto será denotado por F ORL . Repare que

„ EXPL.
F ORL

Exemplo. No exemplo acima, com S  ta, b, cu, podemos definir fórmulas


como aquelas expressões que começam com o sı́mbolo a. Assim, aa, abc, a
e abacb são exemplos de fórmulas, e bac é uma expressão que não é uma
fórmula.
Consideramos que uma linguagem está completamente determinada na
medida em que seus sı́mbolos e suas fórmulas estão especificados.
Teorema. (Número de expressões) Suponha que o conjunto S dos sı́mbolos
de uma linguagem L é contável. Então, EXPL é contável.1
Prova. Vamos provar o caso em que S é infinito. Pelo teorema da enu-
meração, temos que S  tsi : i P Nu, com sm  sn , se m  n. Um elemento
tı́pico de EXPL tem a forma si1 si2 ...sik em que ij P N, com j  1, ..., k
(observe que k é o comprimento da expressão).
Sejam p1 p2 ... pn ... os números primos em ordem crescente.
Defina f : EXPL Ñ N dada pelo produto:

f psi1 si2 ...sik q  pi11  pi22  ...  pikk .

Como vale, em aritmética, o teorema da fatorização única que afirma que


todo número natural ¥ 2 possui uma única decomposição em fatores primos
crescentes, segue-se que f é injetora. Pois, se u e v são expressões tais
que f puq  f pv q; é preciso mostrar que u  v. Seja u  si1 si2 ...sik e
v  sj1 sj2 ...sjn . De f puq  f pv q temos:

pi11  pi22  ...  pikk  pj1  pj2  ...  pjn .


1 2 n

Então, pelo teorema da fatorização única, temos que k  n e ir  jr para


1 ¥ r ¥ k. Logo, u  v e temos que f é injetora.
Agora, pelo teorema da injeção, segue-se que EXPL é contável. l
Corolário. Nas condições do teorema, F ORL é contável.
Prova. Como F ORL „ EXPL e, pelo teorema, EXPL é contável; segue-se,
pelo teorema do subconjunto, que F ORL é contável. l
1
A demostração desse teorema depende de um resultado da aritmética sobre decom-
posição de números em números primos, e pode ser omitida em uma primeira leitura.
Espera-se apenas que o leitor entenda o significado do teorema que será utilizado em
seções subsequentes do texto.

41
5.2 A linguagem proposicional LP
Vamos, agora, descrever uma linguagem LP que será denominada linguagem
proposicional .
A linguagem LP possui os seguintes conjuntos de sı́mbolos:

ˆ Variáveis proposicionais: são as letras p, q, r, p1 , q1 , r1 , ... (Lista infinita


contável).

ˆ Conectivos lógicos: são os sı́mbolos


(sı́mbolo de negação, lê-se “não é o caso que...”),
_ (sı́mbolos de disjunção, lê-se “...ou...”),
^ (sı́mbolos de conjunção, lê-se “...e...”).
ˆ Parênteses: p e q.

Como antes, expressões de LP são sequências finitas de sı́mbolos de LP .


Vamos usar u e v como variáveis sintáticas para expressões de LP .
As fórmulas de LP são os elementos do menor (no sentido da inclusão)
subconjunto F OR das expressões de LP que satisfaz as seguintes cláusulas:

i. Cada variável proposicional é elemento de F OR.

ii. Se u é elemento de F OR, então u é elemento de F OR.

iii. Se u e v são elementos de F OR, então pu _ vq é elemento de F OR.

iv. Se u e v são elementos de F OR, então pu ^ vq é elemento de F OR.

Vamos utilizar α, β, γ, ... como variáveis sintáticas para fórmulas de LP .


Vamos, também, denotar por P ROP o conjunto das variáveis proposicionais
de LP e, como já foi indicado, F OR denota o conjunto das fórmulas de LP .
Uma fórmula que é uma variável proposicional é dita fórmula atômica.
Uma fórmula do tipo α é dita a negação de α.
Uma fórmula do tipo pα _ β q é dita a disjunção de α e β e as fórmulas
α e β são os disjuntivos da disjunção.
Uma fórmula do tipo pα ^ β q é dita a conjunção de α e β e as fórmulas
α e β são os conjuntivos da conjunção.
Vamos introduzir mais dois sı́mbolos por meio de definições abreviativas.
(Portanto, esses novos sı́mbolos não são sı́mbolos da linguagem LP .)

ˆ pα  β q abrevia a fórmula p α _ β q.

42
ˆ pα  β q abrevia a fórmulappα ^ β q _ p α ^ β qq.
Uma fórmula do tipo pα  β q é dita a implicação (material) de α e β. A
fórmula α é o antecedente da implicação e β é o consequente da implicação.
Uma fórmula do tipo pα  β q é dita a equivalência (material) de α e β.
Assim, uma fórmula do tipo

pα  p⠁ αqq
é uma abreviação de
p α _ p β _ αqq.
Enquanto que
ppα  β q  αq
é uma abreviação de
p p α _ β q _ α q.
Convenções. Para facilitar a leitura das fórmulas introduzimos algumas
convenções sem afetar a leitura das mesmas. Por exemplo, parênteses exter-
nos serão omitidos. Assim, escrevemos α _pβ ^ γ q ao invés de pα _pβ ^ γ qq.
Outras convenções serão introduzidas oportunamente.
Teorema. (Princı́pio de indução em fórmulas.) Seja P uma propriedade
qualquer de fórmulas. Assim, para provar que todas as fórmulas possuem a
propriedade P é suficiente mostrar que:
(1) Toda variável proposicional possui a propriedade P.
(2) Se α é β e β tem a propriedade P, então α tem a propriedade P.
(3) Se α é pβ _ γ q ou pβ ^ γ q e β e γ têm a propriedade P, então α tem
a propriedade P.
Prova. (Por indução completa.) Suponha que (1), (2) e (3) acima valem.
Seja n um número natural e considere o seguinte enunciado que é uma
propriedade de números naturais.

S pnq: Toda fórmula com n ocorrências de conectivos lógicos tem


a propriedade P.

Vamos mostrar, por indução completa, que S pnq vale para todo número
natural n, o que implicará que toda fórmula tem a propriedade P.

ˆ Prova da base. S p0q afirma que toda fórmula sem conectivos lógicos
tem a propriedade P. Mas uma fórmula sem conectivos lógicos é uma
variável proposicional e, então, S p0q vale por (1).

43
ˆ Passo indutivo. Suponha que S p0q, S p1q, ..., S pnq valem (hipótese de
indução) e seja α uma fórmula com n 1 conectivos. Então, α pode
ser de três formas: β, pβ _ γ q ou pβ ^ γ q.
Se α é β, então β tem n conectivos e, pela hipótese de indução, S pnq
vale. Logo, por (2), α tem a propriedade P e S pn 1q vale.
Se α é pβ _ γ q ou pβ ^ γ q, então β e γ têm menos que pn 1q conectivos.
Pela hipótese de indução, segue-se que β e γ têm a propriedade P.
Assim, por (3), α tem a propriedade P e S pn 1q vale.
Portanto, em qualquer caso, S pn 1q vale.

Logo, segue-se o resultado. l


Observe que o resultado acima depende de uma importante proriedade
das fórmulas que vamos fornecer um enunciado informal sem uma demons-
tração.

Lema da Leitura Única. Para toda fórmula α de LP só existe


uma das quatro possibilidades: ou α é uma variável proposici-
onal, ou α é da forma β, ou α é da forma pβ _ γ q ou α é da
forma pβ ^ γ q.

Segue-se também do resultado acima que, dada uma expressão qualquer


que é uma fórmula, podemos “desconstruı́-la” por meio de um processo que
prova que a expressão é, de fato, uma fórmula. Por exemplo, para mostrar
que a expressão pp _ pq ^ pqq, podemos proceder como:

ˆ p e q são fórmulas porque são variáveis proposicionais

ˆ Então, p é fórmula.

ˆ Então, pq ^ pq é fórmula.

ˆ Então, pq ^ pq é fórmula.
ˆ Então, pp _ pq ^ pqq é fórmula.

ˆ Finalmente, pp _ pq ^ pqq é fórmula.

44
Isso, nos fornece uma espécie de árvore de desconstrução de fórmulas.

pp _ pq ^ pqq ...
...
...
...
..........
.

pp _ pq ^ pqq .....
...
..... .....
..... .....
..
......
. .....
.....
... .....
......... ...........
........

p pq ^ p q ...
...
...
...
..........
.

p q ^ pq
.... .....
..... .....
..... .....
..
......
.
.....
.....
... .....
....... .
........ ...........

q p
...
...
...
...
.........
.

5.3 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Invente e descreva uma linguagem formalizada definindo
o conjunto de sı́mbolos, exemplos de expressões, definição e exemplos de
fórmulas.
Exercı́cio 2. Decida se as seguintes expressões são fórmulas. Em caso
afirmativo, desenhe a árvore de desconstrução da mesma.
a. ppp _ q q ^ rq
b. p p _ p q qq
c. pp _ q ^ rq
Exercı́cio 3. Considere a fórmula α dada por:
ppp _ qq ^ pq.
a. Qual é o comprimento de α?
b. Quantas variáveis proposicionais α possui?
c. Quantas ocorrências de variáveis proposicionais α possui?
d. De que tipo é essa fórmula: uma variável proposicional, uma negação,
uma disjunção ou uma conjunção?
Exercı́cio 4. Considere a “expressão” dada por:
ppp  qq _ p r  pqq.
45
Elimine os sı́mbolos definidos obtendo a fórmula genuı́na que essa expressão
abrevia.
Exercı́cio 5. Dê exemplo de fórmula que:
a. Seja uma conjunção de disjunções de variáveis proposicionais.
b. Seja uma dupla negação de uma conjunção de negações de variáveis
proposicionais.
c. Seja uma disjunção de negações de conjunções.
Exercı́cio 6. Prove que toda fórmula tem o mesmo número de parênteses
à esquerda e à direita.
Exercı́cio 7. Prove que toda fórmula tem pelo menos uma ocorrência de
variável proposicional.
Exercı́cio 8. Prove que toda fórmula com n ocorrências de variáveis pro-
posicionais tem n  1 ocorrências de conectivos binários _ e ^.
Exercı́cio 9. Seja F OR o conjunto das fórmulas da linguagem proposicional
como definido. Considere o conjunto

∆  tα P F OR : α é uma conjunçãou.

Mostre que ∆ é infinito contável.


Exercı́cio 10. Mostre, com um argumento simples, que dada uma lingua-
gem qualquer o conjunto de suas expresões é sempre infinito.

46
Capı́tulo 6

Funções de verdade

A fim de apresentar uma semântica para a linguagem proposicional desen-


volvida no capı́tulo anterior, temos que fazer um estudo preliminar sobre
o conceito de função de verdade. A partir desse estudo, introduzimos a
noção de valoração para LP que é o conceito central para a construção
dessa semântica.

6.1 Funções de verdade


Já definimos os conjuntos:

0  I
1  t 0u
2  t0, 1u
Vamos denominar os elementos do conjunto 2  t0, 1u, que são os números
0 e 1, de valores de verdade. O número 1 é o valor de verdade verdadeiro e
o número 0 é o valor de verdade falso.
Seja n um número natural positivo. Uma função de verdade n-ária é
uma função
H : t0, 1un Ñ t0, 1u.
O número n é dito o grau ou a aridade da função.
Assim, uma função de verdade n-ária H atribui um valor 0 ou 1 para
cada n-upla de valores de verdade xx1 , ..., xn y. O valor de H em xx1 , ..., xn y,
isto é H pxx1 , ..., xn yq, será denotado simplesmente por H px1 , ..., xn q.

47
Uma função de verdade de grau 3 pode ser descrita por uma tabela:

x1 x2 x3 H px1 , x2 , x3 q
1 1 1 1
1 1 0 0
1 0 1 0
1 0 0 1
0 1 1 0
0 1 0 0
0 0 1 1
0 0 0 0

Assim, por exemplo, H p1, 0, 0q  1 e H p0, 1, 0q  0.

6.2 Funções de verdade especiais


Estamos interessados, principalmente, em certas funções de verdade de graus
1 e 2 que corresponderão aos conctivos lógicos da linguagem LP . Vamos
descrevê-las em detalhe.

ˆ Função negação. É uma função de grau 1 do tipo H : t0, 1u Ñ


t0, 1u. Sua tabela é dada por:
x H px q
1 0
0 1

Repare que H pxq  1  x.


ˆ Função disjunção. É uma função de grau 2 do tipo H_ : t0, 1u2 Ñ
t0, 1u. Sua tabela é dada por:
x1 x2 H_ px1 , x2 q
1 1 1
1 0 1
0 1 1
0 0 0

Repare que H_ px1 , x2 q  maxtx1 , x2 u.

48
ˆ Função conjunção. É uma função de grau 2 do tipo H^ : t0, 1u2 Ñ
t0, 1u. Sua tabela é dada por:
x1 x2 H^ px1 , x2 q
1 1 1
1 0 0
0 1 0
0 0 0

Repare que H^ px1 , x2 q  mintx1 , x2 u.

ˆ Função implicação. É uma função de grau 2 do tipo H : t0, 1u2 Ñ


t0, 1u. Sua tabela é dada por:
x1 x2 H px1 , x2 q
1 1 1
1 0 0
0 1 1
0 0 1

Repare que H px1 , x2 q  1 ô x1 ¤ x2 .


ˆ Função equivalência. É uma função de grau 2 do tipo H : t0, 1u2 Ñ
t0, 1u. Sua tabela é dada por:
x1 x2 H px1 , x2 q
1 1 1
1 0 0
0 1 0
0 0 1

Repare que H px1 , x2 q  1 ô x1  x2 .

6.3 Composição de funções de verdade


Considere a função de verdade de grau 2 dada por:

F px1 , x2 q  H_ pH px1q, x2q.


Vamos “calcular a tabela” de F .

ˆ F p1, 1q  H_ pH p1q, 1q  H_p0, 1q  1.


49
ˆ F p1, 0q  H_ pH p1q, 0q  H_p0, 0q  0.
ˆ F p0, 1q  H_ pH p0q, 1q  H_ p1, 1q  1.

ˆ F p0, 0q  H_ pH p0q, 0q  H_ p1, 0q  1.


Assim, temos a tabela:
x1 x2 F px1 , x2 q
1 1 1
1 0 0
0 1 1
0 0 1
que é a mesma tabela da função implicação. Assim, temos que:

H px1 , x2 q  F px1 , x2 q  H_ pH px1q, x2q.


Um resultado até certo ponto surpreendente é que: Todas as funções
de verdade de qualquer grau podem ser obtidas por composição a partir de
algumas funções de verdade básicas.1
Uma função H de grau n é definı́vel em termos das funções de verdade
H1 , ..., Hk se H tem uma definição

H px1 , ..., xn q  ...

em que o lado direito é construı́do a partir de H1 , ..., Hk , x1 , ..., xn , vı́rgulas


e parênteses.
Definimos, para cada n  1, 2, ..., as funções de verdade

Hd,n : t0, 1un Ñ t0, 1u,


denominadas disjunções generalizadas de grau n, dada por:

Hd,n px1 , ..., xn q  1 ô xi


 1, para algum i  1, ..., n.
Definimos também, para cada n  1, 2, ..., as funções de verdade

Hc,n : t0, 1un Ñ t0, 1u,

denominadas conjunções generalizadas de grau n, dada por:

Hc,n px1 , ..., xn q  1 ô xi  1, para todo i  1, ..., n.


1
Todo o resto dessa seção está baseada em um exercı́cio que aparece no capı́tulo 2 de
Shoenfield (1967).

50
Assim, para n  3, temos as seguintes tabelas.

x1 x2 x3 Hd,3 px1 , x2 , x3 q Hc,3 px1 , x2 , x3 q


1 1 1 1 1
1 1 0 1 0
1 0 1 1 0
1 0 0 1 0
0 1 1 1 0
0 1 0 1 0
0 0 1 1 0
0 0 0 0 0

Antes de apresentar o resultado proprimente dito, vejamos primeira-


mente um exemplo de como dada uma função de verdade podemos encontrar
uma composição para ela a partir das funções acima e da função negação.
Considere a seguinte função H descrita no inı́cio do capı́tulo.

x1 x2 x3 H px1 , x2 , x3 q
1 1 1 1 ð
1 1 0 0
1 0 1 0
1 0 0 1 ð
0 1 1 0
0 1 0 0
0 0 1 1 ð
0 0 0 0

Para cada linha em que H tem valor 1, construa uma conjunção generalizada
de grau 3 (o grau de H) incluindo negações onde o argumento na respectiva
linha é 0.
2 px , x , x q .
ˆ Linha 1: Hc,3 1 2 3

4 px , H
ˆ Linha 4: Hc,3 px2q, H px3qq.
1

ˆ 7 pH px q, H px q, x q.
Linha 7: Hc,3 1 2 3

Agora, construa uma disjunção generalizada de grau 3 (número de linhas que


H tem argumento 1) usando como conponentes as conjunções generalizadas
construı́das acima. Obtemos, assim, a função:

Hd,3 pHc,3
1
px1, x2, x3q, Hc,3
4
px 1 , H px2q, H px3qq, Hc,3
7
pH px1q, H px2q, x3qq.

51
Se o leitor fizer uma tabela da função de verdade acima, verá que é a mesma
tabela dada pela função de verdade H. Assim, H pode ser escrita como
uma composição das funções Hd,3 , Hc,3 e H .
Vejamos, agora, como descrever o procedimento acima em termos for-
mais2 .
Seja H px1 , ..., xn q uma função de verdade. Para cada atribuição de ver-
dade v i  pv1i , ..., vni q P t0, 1un com 1 ¤ i ¤ 2n , defina as funções de verdade
dadas por:
H i px1 , ..., xn q : Hc,n pH1i px1 q, ..., Hni pxn qq
em que, para 1 ¤ k ¤ n temos
"
Hki pxk q 
xk se vki  1,
H pxk q se vki  0.
(O que foi feito aqui é ligeiramente diferente do que foi feito acima. Cons-
truı́mos um H i para cada linha i da tabela sem considerar o valor de H na
linha.)
Lema. Para 1 ¤ i, j ¤ 2n , tem-se que H i pv j q  1 ô i  j.
Prova. pðq Se i  j, então

H i pv j q  H i pv i q  Hc,n pH1i pv1i q, ..., Hni pvni qq  Hc,n pT, ..., T q  1

pois, para 1 ¤ k ¤ n, Hki pvki q  vki  1, se vki  1 e Hki pvki q  H pvki q 


H pF q  1, se vki  0.
pñq Por outro lado, se i  j, então v i  v j e, assim, existe l, 1 ¤ l ¤ k tal
que vli  vl .
j

Se vli  0, então Hli pxl q  H pxl q e, assim, Hli pvlj q  H pvlj q  H p1q  0.
Se vli  1, então Hli pxl q  pxl q e, assim, Hli pvlj q  pvlj q  H p1q  0.
Assim Hli pvlj q  0, o que implica que H i pv j q  Hc,n pH1i pv1i q, ..., Hni pvni qq  0.
E o lema fica demonstrado. l
Se H é a função constante H px1 , ..., xn q  0, então H  Hc,2 px1 , H px1qq
que também é constante igual a 0.
Em caso contrário, considere o conjunto finito e não vazio

V : tv i P tT, F un : H pviq  1u  tvi , ..., vi u.


1 m

(Agora sim, estamos considerando apenas as linhas em que o valor da função


H é 1.)
2
O que se segue pode ser omitido em uma primeira leitura.

52
Correspondentes a esses v iu temos as funções já definidas H iu , para
1 ¤ u ¤ m. Seja, então, a função de verdade:

H̃ px1 , ..., xn q : Hd,m pH i1 px1 , ..., xn q, ..., H im px1 , ..., xn qq.

Construı́mos, aqui, a disjunção generalizada das funções H i1 , ..., H im .


Afirmação. H  H̃.
Prova. Seja v i P t0, 1un . Temos dois casos:
i. v i R V. Nesse caso, H i pv i q  0. Pelo Lema, como temos que i  i1 , ..., im ,
segue-se que H iu pv i q  0, para 1 ¤ u ¤ m. Logo, H̃ pv i q  0  H pv i q.
ii. v i P V. Nesse caso, H i pv i q  1 e i  iu para algum u, 1 ¤ u ¤ m. Mas,
então, também pelo Lema, H iu pv i q  1 e, portanto, H̃ pv i q  1  H pv i q.
Segue-se que H  H̃. l
Assim, temos o seguinte resultado:
Teorema. Qualquer função de verdade H pode ser definida em termos de
Hc,n , Hd,m e H , para algum natural m, n.
Por outro lado, observe que as disjunções generalizadas podem ser defi-
nidas em termos das disjunções usuais de grau 2. Temos:

ˆ Hd,1 px1 q  H_ px1 , x1 q.

ˆ Hd,2 px1 , x2 q  H_ px1 , x2 q.

ˆ Hd,3 px1 , x2 , x3 q  H_ px1 , Hd,2 px2 , x3 qq.

ˆ Em geral, Hd,n 1 px1, ..., xn 1q  H_px1, Hd,npx2, ..., xn 1qq.


Todas essas funções são descritas por H_ .
Além disso, também as conjunções generalizadas podem ser definidas em
termos das conjunções usuais de grau 2. Temos:

ˆ Hc,1 px1 q  H^ px1 , x1 q.

ˆ Hc,2 px1 , x2 q  H^ px1 , x2 q.

ˆ Hc,3 px1 , x2 , x3 q  H^ px1 , Hc,2 px2 , x3 qq.

ˆ Em geral, Hc,n 1 px1, ..., xn 1q  H^px1, Hc,npx2, ..., xn 1qq.


Todas essas funções são descritas por H^ .
Segue-se, então o seguinte resultado.

53
Teorema. (Post) Toda função de verdade pode ser escrita em termos das
funções de verdade H_ , H^ e H .
Dizemos que um conjunto de funções com essa propriedade é funcional-
mente completo.

6.4 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Liste todas as possı́veis funções de verdade unárias.
Exercı́cio 2. Conte o número de funções de verdade binárias e descreva
duas que sejam diferentes de H , H_ , H^ , H e H .
Exercı́cio 3. Mostre que:
a. H px, y q  H^ pH px, y q, H py, xqq.
b. H^ px, y q  H pH_ pH pxq, H py qqq.
c. H_ px, y q  H pH^ pH pxq, H py qqq.
d. Idt0,1u pxq  H pH pxqq.
e. H_ px, y q  H pH pxq, y q.
f. H px, y q  H pH^ px, H py qqq.
Exercı́cio 4. Mostre que os seguintes conjuntos são funcionalmente com-
pletos. Use os resultados da seção 6.3.
a. tH , H u
b. tH , H_ u
c. tH , H^ u
Exercı́cio 5. Considere a função de verdade de grau 2, S : t0, 1u2 Ñ t0, 1u
dada pela seguinte tabela:

x1 x2 S px1 , x2 q
1 1 0
1 0 0
0 1 0
0 0 1

Mostre que as funções H , H_ , H^ e H podem ser descritas apenas com a


função S.
Exercı́cio 6. Faça o mesmo que o exercı́cio anterior com a função de verdade

54
de grau 2, P : t0, 1u2 Ñ t0, 1u dada pela seguinte tabela:
x1 x2 P px1 , x2 q
1 1 0
1 0 1
0 1 1
0 0 1

Exercı́cio 7. Mostre que o conjunto tH_ , H^ , H u não é funcionalmente


completo.
Exercı́cio 8. É possı́vel definir H em termos de H ?
Exercı́cio 9. Expresse a função de verdade H_ em termos apenas da função
H .
Exercı́cio 10. Aplique o procedimento descrito na seção 6.3 para definir a
função de verdade H descrita pela tabela abaixo em termos das funções de
verdade Hc,n , Hd,m e H .

x1 x2 x3 H px1 , x2 , x3 q
1 1 1 0
1 1 0 1
1 0 1 1
1 0 0 0
0 1 1 1
0 1 0 0
0 0 1 1
0 0 0 0

55
Capı́tulo 7

Semântica para a linguagem


proposicional

Para construir a semântica para a linguagem LP precisamos de um conceito


fundamental que é a noção de valoração. Todas as outras noções semânticas
podem ser construı́das em termos de valorações.

7.1 Valorações
Lembremos que 2  t0, 1u é o conjunto de valores de verdade e que o valor
de verdade 1 é dito verdadeiro e 0 é o falso.
Toda a semântica para a linguagem proposicional LP é baseada em um
único conceito que chamaremos de valoração. Lembremos, também, que
P ROP e F ORM denotam os conjuntos das variáveis proposicionais e das
fórmulas de LP , respectivamente.

Definição. Uma valoração para LP é qualquer função definida


no conjunto das variáveis proposicionais assumindo valores em
2, ou seja,
v : P ROP Ñ t0, 1u.
Assim, uma valoração é um elemento do conjunto 2P ROP . Se
x é uma variável proposicional e v pxq  1, dizemos que x é
verdadeira em v. Se v pxq  0, dizemos que x é falsa em v,

Observe que, dada uma valoração v, existe apenas um conjunto A „ P ROP


tal que v paq  1 para todo a P A, isto é,

A  ta P P ROP : v paq  1u.

56
Nesse caso, temos que v é a função caracterı́stica de A „ P ROP , isto é,

v  χA .
Assim, valorações podem ser consideradas como funções caracterı́sticas de
subconjuntos de P ROP .
Vejamos, agora, como estender uma valoração v para o conjunto de
fórmulas de LP .

Definição. (Extensão de valorações) Seja v : P ROP Ñ t0, 1u


uma valoração. Estendemos v para o conjunto F OR de todas
as fórmulas por meio de uma função (que também denotaremos
por v) de acordo com as seguintes cláusulas:

i. Se α é uma variável proposicional s, então v pαq  vpxq (que


já está definida pela função original).
ii. Se α é β, então v pαq  H pvpβ qq.
iii. Se α é pβ _ γ q, então v pαq  H_ pv pβ q, v pγ qq.
iv. Se α é pβ ^ γ q, então v pαq  H^ pv pβ q, v pγ qq.

Segue-se do Lema da Leitura Única o seguinte resultado.


Proposição. Para toda valoração v P 2P ROP , existe uma única extensão
v : F OR Ñ t0, 1u,

tal que as cláusulas (i)-(iv) acima valem.


Assim, no que se segue, quando nos referirmos a valorações, estaremos
considerando funções definidas em P ROP ou F OR. O contexto dirá qual
será o caso. De qualquer forma, uma valoração v : F OR Ñ t0, 1u está
determinada pela sua correspondente v : P ROP Ñ t0, 1u.
Observe que, com respeito aos conectivos definidos  e , temos as
seguintes clásulas adicionais:
ˆ Se α é p⠁ γ q, então vpαq  Hpvpβ q, vpγ qq.
ˆ Se α é pβ  γ q, então v pαq  H pv pβ q, v pγ qq.
Vejamos, agora, um resultado importante que informalmente nos diz que:
Para saber o valor de verdade de uma fórmula em uma valoração v, tudo
que é preciso saber é como v atribui valores de verdade para as variáveis
proposicionais que ocorrem na fórmula.

57
Proposição Fundamental. Se duas valorações v1 e v2 concordam em
todas as variáveis proposicionais que ocorrem em uma fórmula α, então
v 1 p α q  v 2 pα q.
Prova. Por indução em fórmulas.

1. Se α é uma variável proposicional, então v1 pαq  v2 pαq por hipótese.

2. Se α é β e v1 pβ q  v2 pβ q (hipótese de indução), então temos que:

v 1 pα q  v1 p β q
 H pv1 pβ qq cláusula (ii)
 H pv2 pβ qq hipótese de indução
 v2 p β q cláusula (ii)
 v 2 pα q.

3. Se α é pβ _ γ q, v1 pβ q  v2pβ q e v1pγ q  v2pγ q (hipótese de indução),


então temos que:

v 1 pα q  v1 pβ _ γ q
 H_ pv1 pβ q, v1 pγ qq cláusula (iii)
 H_ pv2 pβ q, v2 pγ qq hipótese de indução
 v2 pβ _ γ q cláusula (iii)
 v2 pαq.

4. Se α é pβ ^ γ q, v1 pβ q  v2pβ q e v1pγ q  v2pγ q (hipótese de indução),


então temos que:

v 1 pα q  v1 pβ ^ γ q
 H^ pv1 pβ q, v1 pγ qq cláusula (iv)
 H^ pv2 pβ q, v2 pγ qq hipótese de indução
 v2 pβ ^ γ q cláusula (iv)
 v2 pαq.

Logo, segue-se o resultado. l


Outro resultado que será útil a seguir é:
Proposição. Seja v uma valoração para LP e considere as fórmulas α e β.

58
Então, valem as seguintes condições:

i. v pα q  v p α q
ii. v pα _ β q  1 ô v pαq  1 ou v pβ q  1 (ou ambos)
v pα _ β q  0 ô v pα q  v pβ q  0
iii. v pα ^ β q  1 ô v pαq  v pβ q  1
v pα ^ β q  0 ô v pαq  0 ou v pβ q  0 (ou ambos)
iv. v pα  β q  1 ô v pαq  0 ou v pβ q  1 (ou ambos)
v pα  β q  0 ô v pα q  1 e v pβ q  0
v. v pα  β q  1 ô v pαq  v pβ q
v pα  β q  0 ô v pα q  v pβ q.

Prova. Consequência imediata das definições das funções de verdade H ,


H_ , H^ , H e H . l

7.2 Conjuntos verdade


Vamos, agora, estudar uma noção que, em certa medida, é equivalente ao
conceito de valoração e, portanto, poderia fazer o papel do conceito central
da semântica para a linguagem proposicional.
Seja V „ F OR um conjunto de fórmulas de LP . Dizemos que V é um
conjunto verdade se as seguintes cláusulas são satisfeitas:
i. α P V ô α R V .
ii. α _ β P V ô α P V ou β P V (ou ambos).
iii. α ^ β P V ô α P V e β P V .
Mostremos que valorações e conjuntos verdade são, em um certo sentido,
conceitos equivalentes. Para isto, temos os seguintes resultados.
Proposição. Seja v : F or Ñ t0, 1u uma valoração. Então, o conjunto
V  tα P F OR : vpαq  1u
é um conjunto verdade.
Prova. É preciso verificar as três cláusulas acima para o conjunto V . Vamos

59
utilizar a proposição anterior nestas verificações.
i. αPV ô v pα q  1
ô v p αq  0
ô α R V.
ii. α_β P V ô v pα _ β q  1
ô vpαq  1 ou vpβ q  1
ô α P V ou β P V.
iii. α ^ β P V ô v pα ^ β q  1
ô v pα q  1 e v pβ q  1
ô α P V e β P V.
Logo, segue-se o resultado. l
Proposição. Se V „ F OR é um conjunto verdade, então χV , a função
caracterı́stica de V , é uma valoração.
Prova. Seja V um conjunto verdade e seja v a função caracterı́stica de V ,
isto é:
v : F OR Ñ t0, 1u
é tal que "
1 se α P V
v pα q 
0 se α R V.
Mostremos que v é uma valoração. Para isto, basta verificar as três primeiras
cláusulas da última proposição da seção anterior.
i. v p αq  1 ô αPV
ô αRV
ô vpαq  0. Isto é, v pαq  v p αq.

ii. v pα _ β q  1 ô α_β PV
ô α P V ou β P V
ô vpαq  1 ou vpβ q  1.
iii. v pα ^ β q  1 ô α^β PV
ô αPV eβPV
ô vpαq  1 e vpβ q  1.
Logo, v é uma valoração para LP e segue-se o resultado. l
Os resultados acima mostram que há uma correspondência biunı́voca
entre valorações para LP e conjuntos verdade.

60
7.3 Tabelas de verdade
Vamos mostrar que toda fórmula de LP está associada a uma função de
verdade que representa a tabela de verdade da fórmula. Utilizaremos as letras
em negrito p1 , p2 , ... como variáveis sintáticas que representam variáveis
proposicionais quaisquer.
Seja α uma fórmula de LP com as variáveis proposicionais p1 , ..., pn .
Assim, a função de verdade determinada por α é a função de grau n

Hα : t0, 1un Ñ t0, 1u,


dada por Hα px1 , ..., xn q  v pαq em que v é uma valoração tal que v ppk q  xk ,
para 1 ¤ k ¤ n.
Repare que a definição acima está correta pois, de acordo com a Pro-
posição Fundamental acima, o valor de verdade de uma fórmula α segundo
uma valoração v só depende dos valores que v atribui às variáveis proposi-
cionais que ocorrem em α.
Vamos analisar um exemplo do conceito acima definido.
Considere a fórmula α como sendo p _ pp ^ q q. Temos duas variáveis
proposicionais p e q. Valorações de α só dependem dos valores atribuı́dos a
p e q. Montamos, então, uma tabela com todas as possibilidades para essas
variáveis e calculamos o valor de α utilizando as funções H , H_ e H^ .
α
p q q p ^ q p _ pp ^ q q
1 1 0 0 1
1 0 1 1 1
0 1 0 0 0
0 0 1 0 0
Assim, fica definida a função de verdade Hα

Hα : t0, 1u2 Ñ t0, 1u,


dada pela tabela
x1 x2 Hα
1 1 1
1 0 1
0 1 0
0 0 0
Observe que Hα px1 , x2 q  x1 , isto é, Hα é uma função de grau 2 que toma o
valor do primeiro elemento do par correspondente ao argumento da função.

61
Dizemos que duas fórmulas α e β são equivalentes, em sı́mbolos α  β 1 ,
se para toda valoração v para LP , tem-se que v pαq  v pβ q.
Vejamos que fórmulas equivalentes determinam a mesma função de ver-
dade.
Proposição. Sejam α e β fórmulas com variáveis proposicionais p1 , ..., pn .
Assim, se α  β, então Hα  Hβ .
Prova. Assuma que α  β e considere xx1 , ..., xn y P t0, 1un . Seja v uma
valoração tal que v ppk q  xk , para 1 ¤ k ¤ n. Assim, por definição,

Hα px1 , ..., xn q  v pαq e Hβ px1 , ..., xn q  v pβ q.

Como α  β, temos que v pαq  v pβ q. Assim,

Hα px1 , ..., xn q  Hβ px1 , ..., xn q.

Logo, Hα  Hβ . l

7.4 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Mostre que se V1 e V2 são conjuntos verdade e V1 „ V2, então
V1  V2 .
Exercı́cio 2.Existem fórmulas α tais que v pαq  1 para toda valoração v?
Se sim, dê um exemplo.
Exercı́cio 3. Encontre as funções de verdade que estão associadas às se-
guintes fórmulas:
a. p _ p.
b. p  pq  pq.
c. pp _ q q  p.
d. pp  q q  p p ^ q q.
e. p  pq _ rq.
Exercı́cio 4. Dê exemplos de pares de fórmulas equivalentes.
Exercı́cio 5. Verifique se os seguintes pares de fórmulas são casos de equi-
valência (α  β):
a) α  p⠁ γ q e pα ^ β q  γ.
b) α ^ p⠁ αq e α.
c) α  pβ  γ q e pα  β q  γ.
1
Não confundir com a noção de equipotência de conjuntos que utiliza o mesmo sı́mbolo.
O contexto da discussão determinará o significado.

62
Exercı́cio 6. Mostre que a noção de equivalência entre fórmulas é uma
relação de equivalência.
Exercı́cio 7. Demonstre a conversa da proposição da seção 7.3. Se α e β
são fórmulas com as variáveis proposicionais p1 , ..., pn e Hα  Hβ , então
α  β.
Exercı́cio 8. É possı́vel encontrar dois conjuntos verdade que sejam dis-
juntos? Explique.
Exercı́cio 9. Faça uma demonstração da primeira proposição da seção 7.1.
Para toda valoração v P 2P ROP , existe uma única extensão

v : F OR Ñ t0, 1u,

tal que as cláusulas (i)-(iv) da definição de valoração valem.


Exercı́cio 10. Pense no seguinte problema. Para definir a semântica para a
lingugem LP fizemos uso do conceito de valoração que são funções definidas
em F OR com valores no conjunto t0, 1u. Note que t0, 1u é um conjunto
“estranho” com respeito à linguagem proposicional LP . Por outro lado,
introduzimos o conceito de conjunto verdade que é, em um sentido, equi-
valente à noção de valoração. No entanto, o conceito de conjunto verdade
pode ser definido inteiramente “dentro” da linguagem proposicional, sem o
intermédio de outros “elementos espúrios”. Será, então que, de fato, esta-
mos fazendo semântica para LP , no sentido de atribuir significado para os
seus componentes? Ou será que estamos trabalhando apenas ainda no nı́vel
da linguagem proposicional?

63
Capı́tulo 8

Tautologias e consequência

Neste capı́tulo, introduzimos alguns conceitos que são centrais para a lógica
proposicional. Repare que todas as definições são sempre baseadas na noção
de valoração (ou, o que dá no mesmo, em conjuntos verdade) introduzido
no capı́tulo anterior.

8.1 Valorações para conjuntos de fórmulas


Lembre-se que uma valoração v é qualquer elemento do conjunto 2P ROP . No
entanto, quando estendemos v para o conjunto de todas as fórmulas, não é
verdade que uma valoração seja um elemento qualquer de 2F OR . É preciso
que as cláusulas da extensão sejam respeitadas. Assim, vamos denotar por
V al o conjunto de todas as valorações para LP , isto é:

V al : tv
P 2F OR : v é uma valoraçãou.
Se α é uma fórmula de LP , denotamos por V alpαq o conjunto de todas
as valorações v tais que α é verdadeira em v, isto é:

V alpαq : tv P V al : vpαq  1u.


Além disso, se Γ é um conjunto de fórmulas de LP , denotamos por
V alpΓq o conjunto de todas as valorações v tais que v pγ q  1, para toda
γ P Γ. Assim, temos que:

V alpΓq : tv P V al : vpγ q  1 para toda γ P Γu.


Proposição. Considere as fórmulas α e β de LP . Então, vale que:
i. V alpα _ β q  V alpαq Y V alpβ q.

64
ii. V alpα ^ β q  V alpαq X V alpβ q.
iii. V alp αq  V alpαqc  V al  V alpαq.
Prova. As verificações são diretas.

i. Temos, para uma dada valoração v:

v P V alpα _ β q ô vpα _ β q  1
ô vpαq  1 ou vpβ q  1
ô v P V alpαq ou v P V alpβ q
ô v P V alpαq Y V alpβ q
Logo, V alpα _ β q  V alpαq Y V alpβ q.

ii. Temos:
P V alpα ^ β q ô vpα ^ β q  1
v
ô v pα q  1 e v pβ q  1
ô v P V alpαq e v P V alpβ q
ô v P V alpαq X V alpβ q
Logo, V alpα ^ β q  V alpαq X V alpβ q.

iii. Temos:
vP V alp αq ô vp αq  1
ô v pα q  0
ô v R V alpαq
ô v P V alpαqc
Logo, V alp αq  V alpαqc .

Portanto, segue-se o resultado. l


Vejamos um resultado que será útil mais adiante.
Lema. Sejam Γ, ∆ conjuntos de fórmulas. Então, vale que:
a. Se Γ „ ∆, “
então V alp∆q „ V alpΓq.
b. V alpΓq  tV alpγ q : γ P Γu.
Prova. 1. Considere v P V alp∆q. Como Γ „ ∆, então v pγ q  1 para todo
γ P Γ. Logo, v P V alpΓq e temos que V alp∆q „ V alpΓq.
2. Temos que:

P V alpΓq ô vpγ q  1 para todo γ P Γ


v
ô v P V“alpγ q para todo γ P Γ
ô v P tV alpγ q : γ P Γu
“
Logo, V alpΓq  tV alpγ q : γ P Γu. l
65
8.2 Tautologias
Seja α uma fórmula de LP .
ˆ Dizemos que α é uma tautologia (ou que é tautológica) se e somente
se α é verdadeira em qualquer valoração, isto é, v pαq  1 para toda
v P V al. Nesse caso, V alpαq  V al e utilizamos a notação ( α.
ˆ Dizemos que α é uma contradição (ou que é contraditória) se e somente
se α é falsa em qualquer valoração, isto é, v pαq  0 para toda v P V al.
Nesse caso, V alpαq  I.
ˆ Dizemos que α é uma contingência (ou que é contingente) se e somente
se α não é uma tautologia nem uma contradição, isto é, existem va-
lorações v1 , v2 P V al tais que v1 pαq  1 e v2 pαq  0. Nesse caso,
I  V alpαq Š V al.
Exemplos. p p _ pq, pp ^ pq, p p _ pp _ q qq são exemplos de tauto-
logias. Negações de tautologias são contradições. Variáveis proposicionais
são exemplos de contingências.
No capı́tulo anterior definimos que as fórmulas α e β são equivalentes
se elas possuem o mesmo valor em qualquer valoração, isto é, α  β se e
somente se v pαq  v pβ q, para todos valoração v P V al. Assim, temos que:

αβ ô V alpαq  V alpβ q.


Teorema da Substituição. Seja α  β e seja γ uma fórmula em que α
ocorre. Seja δ a fórmula obtida a partir de γ substituindo-se uma ou mais
ocorrências de α por β. Então, γ  δ.
Prova. O argumento será informal. Seja v uma valoração. É preciso mos-
trar que v pγ q  v pδ q. Como α e β são equivalentes, temos que v pαq  v pβ q.
As fórmulas γ e δ são praticamente iguais exceto que algumas (não necessa-
riamante todas) ocorrências de α foram trocadas por β. Assim, no cálculo
de v pγ q e v pδ q obtemos que v pγ q  v pδ q. l

8.3 Consequência tautológica


Vamos, agora, definir uma relação que vige entre fórmulas da linguagem
proposicional LP .
Sejam α e β fórmulas de LP . Dizemos que α implica tautologicamente β,
em sı́mbolos α ( β, se e somente se para toda valoração v tal que v pαq  1,
tem-se que v pβ q  1. Isso é o mesmo que afirmar que: V alpαq „ V alpβ q.

66
Da mesma forma, sejam Γ um conjunto de fórmulas e α uma fórmula.
Dizemos que Γ implica tautologicamente α, em sı́mbolos Γ ( β, se e somente
se para toda valoração v tal que v pγ q  1 para toda γ P Γ, tem-se que
v pαq  1. Isso é o mesmo que afirmar que: V alpΓq „ V alpαq.
Teorema A. Sejam α, β e γ fórmulas de LP . Então, valem os seguintes
resultados:
1. α ^ β ( α e α ^ β ( β.
2. α ( α _ β e β ( α _ β.
3. α(α e α( α.
4. α ^ pβ _ γ q ( pα ^ β q _ pα ^ γ q.
5. pα _ β q ^ α ( β.
Prova. As demonstrações são consequências diretas da proposição da seção
8.1 e das proriedades da inclusão, união, intersecção e complemento de con-
juntos. Por exemplo:

1. V alpα ^ β q  V alpαq X V alpβ q „ V alpαq, isto é, α ^ β ( α.


V alpα ^ β q  V alpαq X V alpβ q „ V alpβ q, isto é, α ^ β ( β.

2. V alpαq „ V alpαq Y V alpβ q  V alpα _ β q, isto é, α ( α _ β.


V alpβ q „ V alpαq Y V alpβ q  V alpα _ β q, isto é, β ( α _ β.

3. V alpαq  ppV alpαqqc qc e, portanto,


V alpαq „ ppV alpαqqc qc e ppV alpαqqc qc „ V alpαq, isto é,
α(α e α( α.

4. V alpα ^ pβ _ γ qq  V alpαq X pV alpβ q Y V alpγ qq


 pV alpαq X V alpβ qq Y pV alpαq X V alpγ qq
 pV alpα ^ β qq Y pV alpα ^ γ qq
 V alppα ^ β q _ pα ^ γ qq.
Logo, α ^ pβ _ γ q ( pα ^ β q _ pα ^ γ q.

5. V alppα _ β q ^ αq  pV alpαq Y V alpβ qq X V alpαqc


 pV alpαq X V alpαqcq Y pV alpβ q X V alpαqcq
 I Y pV alpβ q X V alpαqcq
 V alpβ q X V alpαqc „ V alpβ q.
Logo, pα _ β q ^ α ( β.

67
Portanto, segue-se o resultado. l
Teorema B. Sejam α, β, γ, α1 , α2 , β1 , β2 fórmulas de LP . Então, valem os
seguintes resultados:
1. Se α ( β e β ( γ, então α ( γ.
2. Se α ( β1 e α ( β2 , então α ( β1 ^ β2 .
3. Se α1 ( β e α2 ( β, então α1 _ α2 ( β.
4. Se α ( β, então β ( α.
Prova. Fazemos os mesmos raciocı́nios da prova do teorema anterior usando
a proposição da seção 8.1.
1. Se α ( β e β ( γ, então V alpαq „ V alpβ q e V alpβ q „ V alpγ q, o que
implica que V alpαq „ V alpγ q, isto é, α ( γ.

2. Se α ( β1 e α ( β2 , então V alpαq „ V alpβ1 q e V alpαq „ V alpβ2 q, o


que implica que V alpαq „ V alpβ1 q X V alpβ2 q  V alpβ1 ^ β2 q, isto é,
α ( β1 ^ β2 .

3. Se α1 ( β e α2 ( β, então V alpα1 q „ V alpβ q e V alpα2 q „ V alpβ q, o


que implica que V alpα1 q Y V alpα2 q  V alpα1 _ α2 q „ V alpβ q, isto é,
α1 _ α2 ( β.

4. Se α ( β, então V alpαq „ V alpβ q e, portanto, V alpβ qc „ V alpαqc, o


que implica que V alp β q „ V alp αq, isto é, β ( α.
Portanto, segue-se o resultado. l
Seja Γ um conjunto de fórmulas. Vamos considerar o conjunto de todas
as consequências tautológicas de Γ. Esse conjunto será denotado por CnpΓq.
Assim,
CnpΓq : tα P F OR : Γ ( αu.
Temos, então, o seguinte resultado.
Proposição. Sejam Γ, ∆ conjuntos de fórmulas e α uma fórmula. Então,
vale que:
1. (Inclusão) Se α P Γ, então Γ ( α.
2. (Monotonicidade) Se Γ ( α e Γ „ ∆, então ∆ ( α.
3. (Corte) Se Γ ( α e ∆ ( γ para todo γ P Γ, então ∆ ( α.
Prova. 1. Considere v P V alpΓq. Como α P Γ, segue-se que v pαq  1, isto
é, v P V alpαq. Portanto, V alpΓq „ V alpαq, isto é, Γ ( α.
2. Suponha que Γ ( α, isto é, V alpΓq „ V alpαq. Como Γ „ ∆, pela parte
(a) do Lema do final da seção 8.1, temos que V alp∆q „ V alpΓq. Mas, então,
V alp∆q „ V alpαq, isto é, ∆ ( α.

68
3. Seja v P V alp∆q. Como ∆ ( γ para todo “ γ P Γ, temos que V alp∆q „
V alpγ q para todo γ P Γ. Então, V alp∆q „ tV alpγ q : γ P Γu. Pelo mesmo
Lema parte (b), temos que V alp∆q „ V alpΓq. Como, por hipótese, temos
que Γ ( α, isto é, V alpΓq „ V alpαq; segue-se que V alp∆q „ V alpαq, isto é,
∆ ( α. l

8.4 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Seja α uma fórmula. Mostre que:
a) α é tautologia se e somente se α é contradição.
b) α é contingente se e somente se α é contingente.
Exercı́cio 2. Sejam as fórmulas α e β. Mostre que:
a) α ( β se e somente se ( α  β.
b) α  β se e somente se ( α  β.
Exercı́cio 3. Sejam Γ, ∆ conjuntos de fórmula. Mostre que:
1. (Inclusão) Γ „ CnpΓq.
2. (Monotonicidade) Se Γ „ ∆, então CnpΓq „ Cnp∆q.
3. (Idempotência) CnpCnpΓqq  CnpΓq.
Exercı́cio 4. Seja α uma tautologia com variáveis proposicionais p1 , ..., pn .
Sejam β1 , β2 , ..., βn fórmulas quaisquer. Seja δ a fórmula obtida a partir de
α substituindo-se pi por βi para 1 ¤ i ¤ n. Mostre que δ é uma tautologia.
(Use indução nas fórmulas.)
Exercı́cio 5. Verifique se as seguintes fórmulas são tautologias, contradições
ou contingências:
a) pp  pq  rqq  ppp  q q  pp  rqq.
b) pp  q q  ppp  q q  pq.
c) p  pq ^ pq.
d) pp ^ q q ^ pp  q q.
Exercı́cio 6. Seja α uma fórmula e considere Hα a função de verdade
determinada por α (Capı́tulo 7). Mostre que:
a) α é tautologia se e somente se Hα é constante igual a 1.
b) α é contradição se e somente se Hα é constante igual a 0.
Exercı́cio 7. Mostre que:
a) Se α é tautologia, então β ( α para toda fórmula β.
b) Se α é contradição, então α ( β para toda fórmula β.
c) Se α ( γ e α ( γ, então α é uma contradição.
d) Se α ( γ e α ( γ, então α ( β para toda fórmula β.

69
Exercı́cio 8. Um argumento é um conjunto de sentenças em que uma
delas é a conclusão e as outras são as premissas (vamos supor que em um
argumento o número de premissas é sempre finito). Se α1 , α2 , ..., αn são as
premissas e β é a conclusão, então indicamos o argumento como:
α1 , α2 , ..., αn
.
β
Dizemos que um argumento é válido se ocorrer que o conjunto das premissas
implica tautologicamente a conclusão, isto é:

é válido ô tα1 , α2 , ..., αn u ( β.


α1 , α2 , ..., αn
β
Considere o seguinte argumento1 : Se Deus pode evitar o mal e não quer
fazê-lo, então ele é malevolente. Se Deus quer evitar o mal e não pode fazê-
lo, então ele é impotente. Se o mal existe, então ou Deus não quer ou não
pode evitá-lo. Se Deus existe, então ele não é impotente e nem malevolente.
O mal existe. Portanto, Deus não existe.
Esse argumento é válido? (Tente encontrar uma valoração que dê falso
para a conclusão e verdadeiro para as premissas.)
Exercı́cio 9. a) Considere a definição de argumento válido dada no exercı́cio
anterior. Suponha que um argumento
α1 , α2 , ..., αn
β
é válido. Seria possı́vel acrescentar novas premissas no argumento a fim de
torná-lo não válido? Se sim, dê um exemplo; se não, justifique.
b) É verdade que para quaisquer fórmulas α, β e γ vale que: se α ( β,
então α ^ γ ( β.
c) Que relação há entre as partes a) e b) desse exercı́cio?
Exercı́cio 10. Suponha que fazemos uma alteração na semântica da lógica
proposicional clássica considerando que o conjunto de valores de verdade
agora é t0, 1{2, 1u, sendo que 1{2 representa o valor de verdade indetermi-
nado. Nesse caso, reflita inicialmente como você poderia redefinir as funções
de verdade H , H_ e H^ de modo a manter o significado intuitivo de “não”,
“ou” e “e” generalizando o caso clássico. Depois de um pouco de reflexão,
suponha que você conclua as seguintes definições para essas funções de ver-
dade:

H pxq  1  x H_ px, y q  maxtx, y u H^ px, y q  mintx, y u.


1
Esse argumento é um exercı́cio que está em I. M. Copi, Introdução à Lógica.

70
a) Escreva explicitamente as tabelas de verdade dessas funções.
b) Defina valoração exatamente como definido para o caso clássico exceto
que a função passa a ser v : F OR Ñ t0, 1{2, 1u. Defina que uma fórmula
α é uma tautologia se para toda valoração v, tem-se que v pαq  1. Nesse
caso, p _ p é uma tautologia? Existiriam tautologias nessa lógica?
c) Como definir, nessa caso, as contradições?
d) E se redefinı́ssemos a noção de tautologia de modo que: α é uma
tautologia se para toda valoração v, tem-se que v pαq  1 ou v pαq  1{2. O
que aconteceria nesse caso?

71
Capı́tulo 9

Compacidade

Vamos aqui tratar de um resultado profundo da lógica clássica. Trata-se


do teorema da compacidade para a lógica proposicional (o caso de primeira
ordem será discutido em um capı́tulo posterior). O resultado diz respeito
à noção de satisfatibilidade de conjuntos de formulas de LP . No caminho,
estudaremos um outro resultado importante da teoria de conjuntos. Nesse
Capı́tulo, a exposição seguirá de perto o texto Lógica de Primeira Ordem
de Raymond M. Smullyan.

9.1 Satisfatibilidade
Um conjunto Γ de fórmulas é dito satisfatı́vel se e somente se existe uma
valoração v tal que para todo γ P Γ tem-se que v pγ q  1. Caso contrário, Γ
é dito insatisfatı́vel. Assim, temos que:

ˆ Γ é satisfatı́vel ô V alpΓq  I.
ˆ Γ é insatisfatı́vel ô V alpΓq  I.

Dizemos que um conjunto Γ é finitamente satisfatı́vel (ou f-satisfatı́vel )


se e somente se todo subconjunto finito de Γ é satisfatı́vel. Caso contrário,
Γ é dito f-insatisfatı́vel. Assim, temos também que:

ˆ Γ é f-satisfatı́vel ô para todo subconjunto finito Γ1 „ Γ, tem-se que


V alpΓ1 q  I.

ˆ Γ é f-insatisfatı́vel ô existe algum subconjunto finito Γ1 „ Γ tal que


V alpΓ1 q  I.

72
É claro que todo conjunto satisfatı́vel é f-satisfatı́vel. Nosso problema
consiste em investigar a questão inversa: Suponha que todas as partes fini-
tas de um conjunto possuem valorações que torna as fórmulas destas partes
todas verdadeiras. Segue-se daı́ que podemos encontrar uma valoração que
torne todas as fórmulas do conjunto verdadeiras? Para que isso fosse o caso,
as valorações das partes finitas deveriam concordar em suas intersecções.
Seria isso possı́vel? O resultado que estudaremos no presente Capı́tulo res-
ponde afirmativamente a essas questões.
Teorema da Compacidade para a Lógica Proposicional Clássica.
Todo conjunto f-satisfatı́vel de fórmulas de LP é satisfatı́vel.
Um conjunto Γ de fórmulas é dito f-satisfatı́vel maximal se e somente
se Γ é f-satisfatı́vel e nenhuma extensão própria de Γ é f-satisfatı́vel. (Uma
extensão própria de um conjunto S é um conjunto M tal que S é subconjunto
de M e existe um elemento de M que não está em S, isto é, S Š M .) Isso
é o mesmo que afirmar que: Γ é f-satisfatı́vel maximal se e somente se Γ é
f-satisfatı́vel e se Γ1 é f-satisfatı́vel e Γ „ Γ1 , então Γ  Γ1 . Assim, temos
que:

ˆ Γ é f-satisfatı́vel maximal ô valem as seguintes condições:


i. Γ é f-satisfatı́vel.
ii. Se α R Γ, então Γ Y tαu é f-insatisfatı́vel.

Vamos começar estudando um resultado que relaciona conjuntos verdade


com a noção de f-satisfatibilidade.
Proposição. Todo conjunto verdade é f-satisfatı́vel maximal.
Prova. Seja Γ um conjunto verdade.

i. Mostremos que Γ é f-satisfatı́vel.


Como Γ é um conjunto verdade, a função caracterı́stica de Γ é uma
valoração. (Veja a segunda proposição da seção 7.2.) Logo, Γ é sa-
tisfatı́vel e, portanto, todo subconjunto finito de Γ é satisfatı́vel (pela
mesma valoração), isto é, Γ é f-satisfatı́vel.

ii. Mostremos que Γ é f-satisfatı́vel maximal.


Seja α R Γ. Como Γ é um conjunto verdade, temos que α P Γ. Mas,
então, Γ Y tαu não é f-satisfatı́vel, pois tα, αu „ Γ e tα, αu não é
satisfatı́vel. Logo, Γ é f-satisfatı́vel maximal.

73
Isso conclui a prova. l
Vamos, na próxima seção, provar que vale também a conversa da pro-
posição acima. Para isto, precisamos de um resultado preliminar.
Proposição. Seja Γ um conjunto de fórmulas. Então, vale que:
(a) Se Γ é f-satisfatı́vel, então, para qualquer fórmula α, pelo menos um
dos dois conjuntos Γ Y tαu ou Γ Y t αu é f-satisfatı́vel.
(b) Se Γ é f-satisfatı́vel maximal, então, para qualquer fórmula α, ou
α P Γ ou α P Γ.
Prova. (a) Seja Γ f-satisfatı́vel e considere α P F OR. Suponha, por ab-
surdo, que Γ Y tαu e Γ Y t αu não são f-satisfatı́veis. Então, existe um
subconjunto finito Γ1 „ Γ tal que Γ1 Y tαu é insatisfatı́vel e, também,
existe um subconjunto finito Γ2 „ Γ tal que Γ2 Y t αu é insatisfatı́vel.
Seja Γ  Γ1 Y Γ2 . Então, os conjuntos Γ Y tαu e Γ Y t αu são ambos
insatisfatı́veis. (Pois cada um deles incluem um conjunto insatisfatı́vel.)
Afirmação: Γ é insatisfatı́vel. Pois, em caso contrário, se uma valoração v
é tal que v P V alpΓ q, então ou v pαq  1 ou v p αq  1, e isto faria com que
um dos conjuntos, Γ Y tαu ou Γ Y t αu, fosse satisfatı́vel.
Mas, Γ  Γ1 Y Γ2 é finito (pois é uma união de conjuntos finitos) e Γ „ Γ.
Assim, Γ não é f-satisfatı́vel, o que é contrário à nossa hipótese. Segue-se
que pelo menos um dos dois conjuntos Γ Y tαu ou Γ Y t αu é f-satisfatı́vel.
(b) Seja Γ f-satisfatı́vel maximal e considere α P F OR. Pela parte (a), temos
que pelo menos um dos dois conjuntos Γ Y tαu ou Γ Y t αu é f-satisfatı́vel.
Como Γ é maximal, segue-se que ou α P Γ ou α P Γ. l
9.2 Demonstração do teorema da compacidade
Vejamos, então, dois resultados fundamentais para a demonstração do te-
orema da compacidade. O primeiro deles é a conversa de um resultado
provado na seção anterior.
Lema Fundamental. Todo conjunto f-satisfatı́vel maximal é um conjunto
verdade.
Prova. Seja Γ „ F OR, um conjunto f-satisfatı́vel maximal. Vamos mostrar
que Γ é um conjunto verdade. Para isto, temos que verificar as três cláusulas
da definição de conjunto verdade (ver seção 7.2).
i. Como Γ é f-satisfatı́vel, para uma fórmula α qualquer, vale que α R Γ
ou α R Γ. (Pois se α, α P Γ, então Γ não seria f-satisfatı́vel.) Por
outro lado, como Γ é f-satisfatı́vel maximal, pela parte (b) da proposição
acima, tem-se que α P Γ ou α P Γ. Assim, vale que: α P Γ ô α R Γ.

74
ii. Suponha que α _ β P Γ. Como Γ é f-satisfatı́vel, existe uma valoração
v tal que v pα _ β q  1. Mas, então, temos que v pαq  1 ou v pβ q  1.
Como Γ é maximal, segue-se que α P Γ ou β P Γ.
Suponha que α P Γ. Então, existe uma valoração v tal que v pαq  1.
Como Γ é maximal, temos que α _ β P Γ. Com o mesmo raciocı́nio,
mostramos que: se β P Γ, então α _ β P Γ.
Assim, vale que: α _ β P v ô α P Γ ou β P Γ.
iii. Considere a fórmula α ^ β. Então, temos que:
α ^ β P Γ ô existe valoração v, v pα ^ β q  1
ô existe valoração v, vpαq  1 e vpβ q  1
ô α P Γ e β P Γ (pois Γ é maximal.)
Assim, vale que: α ^ β P v ô α P Γ e β P Γ.
Segue-se, então, que Γ é um conjunto verdade. l
O Lema Fundamental é um dos ingredientes para a demonstração do
teorema da compacidade. O outro ingrediente é o seguinte resultado.
Lema de Lindenbaum. Qualquer conjunto f-satisfatı́vel pode ser esten-
dido a um conjunto f-satisfatı́vel maximal.
Vamos deixar a demonstração do Lema de Lindenbaum para a próxima
seção. Vejamos, agora, que o teorema da compacidade é decorrência direta
dos dois resultados acima.
Prova da Teorema da Compacidade. Seja Γ um conjunto f-satisfatı́vel.
Pelo Lema de Lindenbaum, existe Γ f-satisfatı́vel maximal tal que Γ „
Γ . Pelo Lema Fundamental, Γ é um conjunto verdade. Pela segunda
proposição da seção 7.2, a função caracterı́stica v de Γ é uma valoração.
Assim, para todo γ P Γ , tem-se que v pγ q  1. Como Γ „ Γ , temos que
v P V alpΓq. Logo, Γ é satisfatı́vel. l
9.3 O Lema de Teichmüller-Tukey
Resta, então, provar o Lema de Lindenbaum. Vamos fazer isso mostrando
que esse lema é um caso particular de um resultado da teoria de conjuntos,
denominado Teorema de Teichmüller-Tukey.
Uma propriedade P de conjuntos é dita de caráter finito, se para qual-
quer conjunto S, tem-se que S tem a propriedade P se e somente se to-
dos os subconjuntos finitos de S têm a propriedade P. Mostremos que a
f-satisfatibilidade é uma propriedade de caráter finito.

75
Proposição. Vale que:
(a) Um conjunto finito é f-satisfatı́vel se e somente se ele é satisfatı́vel.
(b) Um conjunto (possivelmente finito) é f-satisfatı́vel se e somente se
todos os seus subconjuntos finitos são f-satisfatı́veis.
Prova. (a) Seja Γ um conjunto finito. Se Γ é f-satisfatı́vel, como Γ é finito
e Γ „ Γ, segue-se que Γ é satisfatı́vel.
Por outro lado, se Γ é satisfatı́vel, então todo subconjunto de Γ é satisfatı́vel
e, então, Γ é f-satisfatı́vel.
(b) Suponha que Γ é f-satisfatı́vel. Então, por definição, todo subconjunto
finito de Γ é satisfatı́vel. Assim, pela parte (a), todo subconjunto finito de
Γ é f-satisfatı́vel.
Por outro lado, se todo subconjunto finito de Γ é f-satisfatı́vel, então, pela
parte (a), todo subconjunto finito de Γ é satisfatı́vel. Isto é, tem-se que Γ é
f-satisfatı́vel. l
Corolário. Para conjuntos de fórmulas da linguagem proposicional, temos
que a f-satisfatibilidade é uma propriedade de caráter finito.
Prova. Decorrência direta da parte (b) da proposição. l
Passemos ao resultado da teoria de conjuntos mencionado acima. Seja
U um conjunto arbitrário e vamos considerar apenas subconjuntos de U.
Seja, então, P uma propriedade de subconjuntos de U. Dizemos que um
subconjunto S „ U é P-maximal se e somente se S tem a propriedade P
e nenhuma extensão própria de S (subconjunto de U) a possui. (Compare
com a definição de f-satisfatı́vel maximal.) O Teorema de Teichmüller-Tukey
é simplesmente a afirmação de que: Todo subconjunto de U que tem uma
propriedade P de caráter finito possui uma extensão P-maximal.
Tal como está, a prova desse resultado envolve certas ferramentas da
teoria de conjuntos, a saber: o axioma da escolha ou, equivalentemente, o
Lema de Zorn. Vamos apresentar uma formulação do resultado que dispensa
essas técnicas, fazendo uma restrição no conjunto U.
Teorema de Teichmüller-Tukey para o caso contável. Para qualquer
conjunto contável U e para qualquer propriedade P de caráter finito de
subconjuntos de U, todo subconjunto S „ U que tenha a propriedade P
pode ser estendido a um subconjunto de U que é P-maximal.
Prova. Sejam U um conjunto contável e S „ U um conjunto com um
propriedade de caráter finito P.
Usando o teorema da enumeração (seção 4.3), considere uma enumeração
fixa dos elemento de U:
U  tX1 , X2 , X3 , ...u.

76
Vamos construir uma sequência contável de subconjuntos de U, denotada
por S0 , S1 , S2 , S3 ..., de acordo com as seguintes cláusulas:
S0  S"
S1  SS00 Y tX1u se esse conjunto tem P
" caso contrário.
S2  S1 Y tX2u
S1
se esse conjunto tem P
caso contrário.
..
. "
Sn Y tXn u
Sn 1  Sn
1 se esse conjunto tem P
caso contrário.
..
.
Segue-se, por construção, que S0 „ S1 „ S2 „ ... „ Sn „ Sn 1 „ ....
Mostremos, por indução finita, que para todo n P N, Sn tem a propriedade
P.
ˆ Prova da base. S0  S tem P por hipótese.
ˆ Passo indutivo. Suponha que Sn tem a propriedade P (hipótese de
indução). Temos dois casos:

1. Sn Y tXn 1 u tem P. Então, Sn 1  Sn Y tXn 1u tem P por


construção.
2. Sn Y tXn 1 u não tem P. Então, Sn 1  Sn tem P pela hipótese
de indução.

Assim, para todo n P N, tem-se que Sn tem a propriedade P.


Defina, agora o conjunto M como a união de todos esses Si ’s, isto é:
¤
M : Si .
P
i N

Afirmação. M tem a propriedade P.


Suponha, por absurdo, que M não tem a propriedade P. Então, existe um
subconjunto finito M 1 „ M tal que M 1 não tem a propriedade P. Assim,
existe k P N tal que M 1 „ Sk (ver exercı́cio 10 do Capı́tulo 1). Como M 1
é finito e não tem P, segue-se que Sk não tem P, o que contradiz o que foi
mostrado acima. Logo, M tem a propriedade P.
Afirmação. M é P-maximal.
Seja X P U tal que M Y tX u tem a propriedade P. Precisamos mostrar que
X P M.

77
Como X P U, existe k P N tal que X  Xk 1 . Logo, como M Y tXk 1 u
tem a propriedade P, segue-se que Sk Y tXk 1 u tem a propriedade P. (Pois,
todos os subconjuntos de um conjunto M que tem P também devem ter
a propriedade P, dado que os subconjuntos finitos de subconjuntos de M
também são subconjuntos de M .) Assim, por construção, Sk 1  Sk Y
tXk 1u e, portanto, X  Xk 1 P Sk 1. Agora, como Sk 1 „ M , segue-se
que X P M . Portanto, M é P-maximal e isso completa a demonstração do
teorema. l
Resta, finalmente, mostrar que o Lema de Lindenbaum é consequência
do Teorema de Teichmüller-Tukey.
Prova do Lema de Lindenbaum. O Teorema de Teichmüller-Tukey para
o caso contável afirma que: Para qualquer conjunto contável U e para qual-
quer propriedade P de caráter finito de subconjuntos de U, todo subconjunto
S „ U que tenha a propriedade P pode ser estendido a um subconjunto de
U que é P-maximal. Para o Lema de Lindenbaum, o universo U é o conjunto
F OR das fórmulas de LP (que é contável, pelo corolário do teorema da seção
5.1) e P é a propriedade de f-sastisfatibilidade, que é de caráter finito, pelo
corolário da proposição acima. Assim, todo subconjunto de F OR que é f-
satisfatı́vel pode ser estendido a um subconjunto de F OR que é f-satisfatı́vel
maximal; e temos o Lema. l

9.4 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Mostre que:
(a) Todo conjunto satisfatı́vel é f-satisfatı́vel.
(b) Todo conjunto f-insatisfatı́vel é insatisfatı́vel.
(b) Se Γ é satisfatı́vel e ∆ „ Γ, então ∆ é satisfatı́vel.
(b) Se Γ é insatisfatı́vel e Γ „ ∆, então ∆ é insatisfatı́vel.
Exercı́cio 2. Dê exemplos de conjuntos de fórmulas que são insatisfatı́veis
e não possuem contradições.
Exercı́cio 3. Mostre que:
(a) Se α é contraditória e α P Γ, então Γ é insatisfatı́vel.
(b) Γ ( α se e somente se Γ Y t αu é insatisfatı́vel.
Exercı́cio 4. Mostre que o conjunto da fórmulas de LP que não possuem
o sı́mbolo de negação é satisfatı́vel. (Use indução em fórmulas.)
Exercı́cio 5. Mostre que Γ é um conjunto verdade se e somente se Γ
é satisfatı́vel maximal. Faça duas provas: uma diretamente a partir das

78
definições e outra utilizando o teorema da compacidade.
Exercı́cio 6. Seja M axSat o conjunto formado pelos conjuntos “ de fórmulas
de LP que são satisfatı́veis maximais. Calcule o que é o conjunto M axSat.
Exercı́cio 7. Mostre que se Γ é um conjunto satisfatı́vel maximal de
fórmulas de LP , então temos que CnpΓq  Γ. (Veja a definição de CnpΓq
no final da seção 8.3.)
Exercı́cio 8. (a) Mostre que a noção de satisfatibilidade é de caráter finito,
isto é, se Γ é satisfatı́vel, então todo subconjunto finito de Γ é satisfatı́vel.
(b) Demonstre o Lema de Lindenbaum para o caso da satisfatibilidade:
todo subconjunto de F OR que é satisfatı́vel pode ser estendido a um subcon-
junto de F OR que é satisfatı́vel maximal. (Use o Teorema de Teichmüller-
Tukey e a parte (a).)
Exercı́cio 9. Prove o Lema de Lindenbaum diretamente, sem usar o Te-
orema de Teichmüller-Tukey. (A ideia é fazer a construção empregada no
teorema diretamente para a noção de f-satisfatibilidade.)
Exercı́cio 10. Seja xX, ¤y um conjunto parcialmente ordenado. Um sub-
conjunto A „ X é dito uma cadeia se para todo a, a1 P A tem-se que a ¤ a1
ou a1 ¤ a. O Lema de Zorn é um resultado da teoria de conjuntos que afirma
que: Se xX, ¤y é um conjunto parcialmente ordenado tal que toda cadeia tem
um limitante superior, então X tem um elemento maximal. Por outro lado,
vimos no texto que o Teorema de Teichmüller-Tukey, no caso geral, afirma
que: Todo subconjunto de U que tem uma propriedade P de caráter finito
possui uma extensão P-maximal. Prove o Teorema de Teichmüller-Tukey
utilizando o Lema de Zorn. (Considere o conjunto dos subconjuntos de U
que têm a propriedade P parcialmente ordenado por inclusão.)

79
Capı́tulo 10

Sequentes

Vamos, aqui, formalizar a noção de implicação tautológica entre fórmulas


da linguagem proposicional LP . Apresentaremos um cálculo de sequentes
baseado no texto Topics in Modern Logic de D. C. Makinson.

10.1 Sistemas formais abstratos


Vamos começar com algumas considerações bem abstratas que ficarão mais
claras quando aplicadas no contexto da nossa linguagem proposicional LP .
Seja S um conjunto não vazio e n um número natural positivo (n P N ).
Denotemos por ℘pnq pS q o conjunto dos subconjuntos de S que possuem n
elementos.
Uma regra de inferência de grau n sobre S é uma relação binária R tal
que:
R „ ℘pnq pS q  S.
Se o par xtx1 , ..., xn u, xy P R dizemos que x é uma consequência imediata de
tx1, ..., xnu em virtude da regra de inferência R. Nesse caso, utilizamos a
seguinte notação:
x1 , ..., xn
R,
x
e dizemos que os elementos do conjunto tx1 , ..., xn u são as hipóteses da regra
de inferência R e x é a sua conclusão.
Seja R uma famı́lia de regras de inferência sobre S. Dizemos que x é
uma consequência imediata de tx1 , ..., xn u se x é uma consequência imediata
de tx1 , ..., xn u em virtude de alguma regra de inferência R P R.
Um sistema formal abstrato F é uma tripla F  xS, Ax, Reg y tal que
S é um conjunto não vazio, Ax é um subconjunto de S cujos elementos

80
são denominados axiomas de F e Reg é um conjunto finito de regras de
inferência sobe S.
Os teoremas (ou teses) de um sistema formal F  xS, Ax, Reg y são os
elementos de S que decorrem das seguintes cláusulas:

ˆ Um axioma de F é um teorema de F .

ˆ Se as hipóteses de uma regra de inferência de F são teoremas de F ,


então a conclusão da regra de inferência também é um teorema de F .

Baseado em um princı́pio de indução generalizado, vamos enunciar um


resultado análogo ao princı́pio de indução para fórmulas.
Teorema. (Princı́pio de indução em teoremas.) Seja P uma propriedade
qualquer de teoremas de um sistema formal S. Assim, para provar que todos
os teoremas de S possuem a propriedade P é suficiente mostrar que:
(1) Prova da base. Todo axioma de S possui a propriedade P.
(2) Passo indutivo. Se as hipóteses de uma regra de inferência de F
têm a propriedade P, então a conclusão da regra de inferência também tem
a propriedade P.
Seja F  xS, Ax, Reg y um sistema formal abstrato. Uma prova em F é
uma sequência finita, A1 , ..., An , de elementos de S tal que para i  1, ..., n
tem-se que:
i. Ou Ai é um axioma de F ;
ii. Ou Ai é obtida pela aplicação de uma regra de inferência de F cujas
hipóteses são anteriores a Ai na sequência.
Temos algumas propriedades imediatas da definição de prova.
(P1) Um axioma isolado de F é uma sequência (com um elemento) que
é uma prova em F .
(P2) Todo segmento inicial de uma prova em F é também uma prova
em F . Isto é, se A1 , ..., An é uma prova, então A1 é prova, A1 , A2 é prova,
A1 , A2 , A3 é prova etc.
(P3) A concatenação de provas em F é ainda uma prova em F . Isto é, se
A1 , ..., An e B1 , ..., Bk são provas, então A1 , ..., An , B1 , ..., Bk é uma prova.
(P4) Insertar provas no meio de uma prova ainda fornece uma prova.
Isto é, se temos que A1 , ..., Ai , Ai 1 , ..., An e B1 , ..., Bk são provas, então

A1 , ..., Ai , B1 , ..., Bk , Ai 1 , ..., An

é ainda uma prova.

81
Seja A um elemento de S. Uma prova de A é uma prova em F (portanto,
uma sequência finita de fórmulas) cujo último elemento é A.
Proposição. Seja F  xS, Ax, Reg y um sistema formal abstrato. Então,
um elemento A de S é um teorema se e somente se existe uma prova de A
em F .
Prova. (ð) Suponha que A1 , ..., An é uma prova de A. Segue-se de i. e ii.
da definição de prova que, para todo i  1, ..., n, Ai é um teorema. Como A
é An , então A é um teorema.
(ñ) A prova é por indução em teoremas.

ˆ Prova da base. Pela propriedade (P1) acima, cada axioma de F é


uma prova de si mesmo. Logo, os axiomas de F possuem a propriedade
de ter uma prova em F .

ˆ Passo indutivo. Suponha que as hipóteses de uma regra possuem a


propriedade de ter uma prova em F (hipótese de indução). Usando
a propriedade (P3), a concatenação das provas das hipóteses da regra
junto com a conclusão é uma prova da conclusão.

Logo, segue-se o resultado. l

10.2 O sistema SEQP


Nosso problema, agora, é encontrar um sistema formal abstrato cujos teore-
mas serão exatamente os casos de implicação tautológica entre fórmulas de
LP .
Como a noção de implicação tautológica envolve sempre duas fórmulas
de F OR, vamos denominar de sequente qualquer expressão da forma:

αÑβ

em que α e β são fórmulas de LP . (Note que o sı́mbolo Ñ não é um sı́mbolo


de LP .)
Vamos denotar por S o conjunto de todos os sequentes.

Observação. Repare que poderı́amos considerar S como o con-


junto de todos os pares ordenados de elementos de F OR , isto é,
S  F OR  F OR. Então, escreverı́amos α Ñ β como uma abre-
viação para o par ordenado xα, β y. Assim, um sequente pode ser
considerado simplesmente como um par ordenado de fórmulas de
LP .

82
Vamos escolher, entre os elementos de S um conjunto de axiomas. Esses
axiomas serão selecionados por meio de esquemas de sequentes. Assim,
sejam α, β, γ elementos quaisquer de F OR.
Os axiomas serão sequentes dos seguintes tipos:
1. Axiomas de Simplificação (SIMP): α ^ β Ñ α e α ^ β Ñ β.
2. Axiomas de Adição (AD): α Ñ α _ β e β Ñ α _ β.
3. Axiomas de Dupla Negação (DN): α Ñ α e α Ñ α.
4. Axiomas de Distribuição (DIST): α ^ pβ _ γ q Ñ pα ^ β q _ pα ^ γ q.
5. Axiomas de Silogismo Disjuntivo (SD): pα _ β q ^ α Ñ β.
O conjunto de todos os axiomas será denotado por Ax.
Vejamos, agora como serão as regras de inferência. Essas regras também
serão selecionadas por meio de esquemas de sequentes.
Sejam α, β, γ, α1 , α2 , β1 , β2 fórmulas quaiquer de LP .
1. Regra de Corte (COR). Inferir α Ñ γ a partir de α Ñ β e β Ñ γ.
αÑβ βÑγ
αÑγ
COR

2. Regra de Conjunção (CONJ). Inferir α Ñ β1 ^β2 a partir de α Ñ β1


e α Ñ β2 .
α Ñ β1 α Ñ β2
α Ñ β1 ^ β2
CONJ

3. Regra de Disjunção (DISJ). Inferir α1 _ α2 Ñ β a partir de α1 Ñβ


e α2 Ñ β.
α1 Ñ β α2 Ñ β
α1 _ α2 Ñ β
DISJ

4. Regra de Contraposição (CONTR). Inferir β Ñ α a partir de


α Ñ β.
αÑβ
βÑ α
CONTR

O conjunto de todos as regras de inferência será denotado por Reg.


Assim, com base nas estipulações acima, definimos um sistema formal
abstrato, denotado por SEQP , como:
SEQP  xS, Ax, Regy,
denominado o sistema de sequentes para a lógica proposicional clássica.

83
10.3 Teoremas de SEQP
Vejamos, agora uma série de teoremas de SEQP . Cada teorema será seguido
de uma prova do mesmo no sistema. Lembre-se que, para mostrar que um
sequente é um teorema do sistema, precisamos encontrar uma sequência
finita de sequentes cujo último elemento é o sequente que desejamos provar.
Cada elemento da sequência que constitui uma prova será acompanhado de
uma justificativa baseada na definição de prova da seção anterior. Algumas
provas serão acompanhadas também de diagramas em forma de árvore que é
uma reconstrução dos passos da prova. Como o leitor perceberá, as provas,
de fato, serão esquemas de provas, de modo que um esquema demonstrado
representará uma quantidade infinita de teoremas que possuem a forma do
esquema.
I. α Ñ α é um teorema de SEQP .
1. α Ñ α (DN)
2. α Ñ α (DN)
3. α Ñ α 1, 2, (COR)
αÑ α αÑα
αÑα COR

II. α ^ β Ñ β ^ α é um teorema de SEQP .


1. α ^ β Ñ α (SIMP)
2. β ^ α Ñ β (SIMP)
3. α ^ β Ñ β ^ α 1, 2, (COR)

α^β Ñα β^αÑβ
α^β Ñβ^α
COR

Vejamos dois exemplos mais elaborados. São algumas das leis associati-
vas para a conjunção e disjunção.
III. α ^ pβ ^ γ q Ñ pα ^ β q ^ γ é um teorema de SEQP .
1. α ^ pβ ^ γ q Ñ β ^ γ (SIMP)
2. β^γ Ñβ (SIMP)
3. α ^ pβ ^ γ q Ñ β 1, 2, (COR)
4. α ^ pβ ^ γ q Ñ α (SIMP)
5. α ^ pβ ^ γ q Ñ α ^ β 3, 4, (CONJ)
6. β^γ Ñγ (SIMP)
7. α ^ pβ ^ γ q Ñ γ 1, 6, (COR)
8. α ^ pβ ^ γ q Ñ pα ^ β q ^ γ 5, 7, (CONJ)

84
Fica para o leitor a construção da respectiva árvore da prova.
IV. α _ pβ _ γ q Ñ pα _ β q _ γ é um teorema de SEQP .

1. αÑα_β (AD)
2. α _ β Ñ pα _ β q _ γ (AD)
3. α Ñ pα _ β q _ γ 1, 2, (COR)
4. β Ñα_β (AD)
5. β Ñ pα _ β q _ γ 2, 4, (COR)
6. γ Ñ pα _ β q _ γ (AD)
7. β _ γ Ñ pα _ β q _ γ 5, 6, (DISJ)
8. α _ pβ _ γ q Ñ pα _ β q _ γ 3, 7, (DISJ)

Fica para o leitor a construção da respectiva árvore da prova.


A prova do próximo teorema apresentará uma novidade.
V. α _ pα ^ β q Ñ α é um teorema de SEQP .
Uma prova natural seria a seguinte:

1. αÑ α (DN)
2. αÑα (DN)
3. αÑα 1, 2, (COR)
4. α^β Ñα (SIMP)
5. α _ pα ^ β q Ñ α 3, 4, (DISJ)

αÑ α αÑα
αÑα COR α^β Ñα
α _ pα ^ β q Ñ α
DISJ

Observe que os três primeiros passos da prova servem para estabelecer


α Ñ α, que já foi estabelecido no Teorema I acima. Podemos, então, sim-
plificar a prova escrevendo:

1. α Ñ α Teorema I
2. α ^ β Ñ α (SIMP)
3. α _ pα ^ β q Ñ α 1, 2, (DISJ)

A árvore ficaria:
Teorema I
αÑα α^β Ñα
α _ pα ^ β q Ñ α
DISJ

85
Vamos, agora, para uma outra forma da lei distributiva.
VI. α _ pβ ^ γ q Ñ pα _ β q ^ pα _ γ q é um teorema de SEQP .
1. β^γ Ñβ (SIMP)
2. β Ñα_β (AD)
3. β^γ Ñα_β 1, 2, (COR)
4. αÑα_β (AD)
5. α _ pβ ^ γ q Ñ pα _ β q 3, 4, (DISJ)
6. αÑα_γ (AD)
7. β^γ Ñγ (SIMP)
8. γ Ñα_γ (AD)
9. β^γ Ñα_γ 7, 8, (COR)
10. α _ pβ ^ γ q Ñ pα _ γ q 6, 9, (DISJ)
11. α _ pβ ^ γ q Ñ pα _ β q ^ pα _ γ q 5, 10, (CONJ)
Fica para o leitor a construção da respectiva árvore da prova.
Vamos, agora, aos Princı́pios de de Morgan.
VII. pα ^ β q Ñ α _ β é um teorema de SEQP .
1. αÑ α_ β (AD)
2. p α _ βq Ñ α 1, (CONTR)
3. αÑα (DN)
4. p α _ βq Ñ α 2, 3, (COR)
5. β Ñ α_ β (AD)
6. p α _ βq Ñ β 5, (CONTR)
7. βÑβ (DN)
8. p α _ βq Ñ β 6, 7, (COR)
9. p α _ βq Ñ α _ β 4, 8, (CONJ)
10. pα _ β q Ñ p α _ β q 9, (CONTR)
11. p α _ βq Ñ α _ β (DN)
12. pα ^ β q Ñ α _ β 10, 11, (COR)
Fica para o leitor a construção da respectiva árvore da prova.
VIII. α_ β Ñ pα ^ β q é um teorema de SEQP .
1. α ^ β Ñ α (SIMP)
2. α Ñ pα ^ β q 1, (CONTR)
3. α ^ β Ñ β (SIMP)
4. β Ñ pα ^ β q 3, (CONTR)
5. α _ β Ñ pα ^ β q 2, 4, (DISJ)
A árvore fica:

86
α^β Ñα α^β Ñβ
α Ñ pα ^ β q β Ñ pα ^ β q
CONTR CONTR

α _ β Ñ pα ^ β q
DISJ

Observe que, até o momento, não utilizamos o axioma do silogismo dis-


juntivo. Vamos utilizá-lo para provar um dos Princı́pios de Lewis.
IX. α ^ α Ñ β é um teorema de SEQP .

1. α^ αÑα (SIMP)
2. α Ñ α _ βq (AD)
3. α^ αÑα_β 1, 2, (COR)
4. α^ αÑ α (SIMP)
5. α ^ α Ñ pα _ β q ^ α 3, 4, (CONJ)
6. pα _ β q ^ α Ñ β (SD)
7. α^ αÑβ 5, 6, (COR)
A árvore fica:
α ^αÑα α Ñ α _ βq
α^ αÑα_β ^ Ñ
COR
α α α
α ^ α Ñ pα _ β q ^ pα _ β q ^ Ñβ
CONJ
α α
α ^ α Ñβ COR

Nos exercı́cios que se seguem o leitor encontrará mais exemplos de es-


quemas de teoremas de SEQP .

10.4 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Dê um exemplo de um sistema formal abstrato simples espe-
cificando os conjuntos S, Ax e Reg. Dê exemplos de teoremas desse sistema
apresentando suas provas.
Exercı́cio 2. Formule argumentos para mostrar as propriedades (P1)-(P4)
da noção de prova em um sistema forma abstrato.
Exercı́cio 3. Na simplificação da prova que fizemos no Teorema V do texto
foi utilizado uma propriedade da noção de prova. Qual é essa propriedade?
Justifique.
Exercı́cio 4. Mostre que α _ β Ñ β _ α é um teorema do sistema SEQP .
Exercı́cio 5. Mostre que as seguintes leis associativas são teoremas de
SEQP :
(a) pα _ β q _ γ Ñ pα _ β q _ γ.

87
(b) pα ^ β q ^ γ
Ñ pα ^ β q ^ γ.
Exercı́cio 6. Mostre que α Ñ α ^pα _ β q é um teorema do sistema SEQP .
Exercı́cio 7. Mostre que pα _ β q ^ pα _ γ q Ñ α ^ pβ _ γ q é uma tese do
sistema SEQP . Difı́cil! Você terá que fazer uso do axioma de distribuição
original.
Exercı́cio 8. Mostre que as seguintes leis de de Morgan são teses de SEQP :
(a) α _ β Ñ pα ^ β q.
(b) α ^ β Ñ pα _ β q.
Exercı́cio 9. Mostre que o outro Princı́pio de Lewis, α Ñβ_ β, é um
teorema do sistema SEQP .
Exercı́cio 10. Mostre por indução em teoremas que se um sequente α Ñ β é
uma tese de SEQP , então α implica tautologicamente β. (Este é o Teorema
da Correção que será demonstrado no próximo Capı́tulo.)

88
Capı́tulo 11

Adequação de SEQP

Quando se propõe o sistema SEQP para formalizar a noção de implicação


tautológica entre fórmulas de LP , queremos que esse sistema seja adequado
no seguinte sentido: (i) todos os teoremas de SEQP são casos de implicação
tautológica e (ii) todos os casos de implicação tautológica são teoremas de
SEQP . O objetivo do presente capı́tulo é demonstrar esses dois resultados.
Seguimos novamente de perto o texto Topics in Modern Logic de D. C.
Makinson.

11.1 Correção de SEQP


A demostração da propriedade (i) mencionada acima é relativamente fácil
com base no princı́pio de indução em teoremas como descrito na seção 10.1.
Teorema da Correção. Sejam α e β fórmulas de LP . Se o sequente α Ñ β
é um teorema de SEQP , então α ( β, isto é, α implica tautologicamente β.
Prova. (Por indução em teoremas.)
ˆ Prova da base. Temos que mostrar que se um sequente α Ñ β é um
axioma de SEQP , então vale que α ( β. Assim, é preciso mostrar que
valem as seguintes implicações tautológicas:
1. Simplificação. α ^ β (α e α^β ( β.
2. Adição. α ( α _ β e ( α _ β.
β
3. Dupla negação. α(α e α( α.
4. Distribuição. α ^ pβ _ γ q ( pα ^ β q _ pα ^ γ q.
5. Silogismo disjuntivo. pα _ β q ^ α ( β.
Mas, isso foi demonstrado no Teorema A da seção 8.3.

89
ˆ Passo indutivo. Temos que mostrar que se as hipótese de uma regra
de inferência são casos de implicação tautológica, então a conclusão
da regra também é um caso de implicação tautológica. Assim, temos
que mostrar que:
1. Corte. Se α ( β e β ( γ, então α ( γ.
2. Conjunção. Se α ( β1 e α ( β2 , então α ( β1 ^ β2 .
3. Disjunção. Se α1 ( β e α2 ( β, então α1 _ α2 ( β.
4. Contraposição. Se α ( β, então β ( α.
Mas, isso foi demonstrado no Teorema B da seção 8.3.

Logo, segue-se o resultado. l


Temos aqui, uma consequência imediata e importante.
Corolário. Existem sequentes α Ñ β que não são teoremas de SEQP .
Prova. Pela contrapositiva do teorema da correção, temos que se α não
implica tautologicamente β, então α Ñ β não é uma tese de SEQP . Assim,
basta tomar α e β como variáveis proposicionais p e q, respectivamente; e
temos que v não implica tautológicamente q (tome uma valoração v tal que
v ppq  1 e v pq q  0). Assim, p Ñ q não é um teorema de SEQP . l

11.2 Implicação axiomática


Antes de mostrar que o sistema SEQP possui a propriedade (ii) referida no
inı́cio do presente capı́tulo, vamos introduzir uma noção adicional que será
utilizada na referida demonstração.
Sejam Γ „ F OR e α P F OR. Dizemos que Γ implica axiomaticamente
α, em sı́mbolos Γ $ α, se e somente se existe tψ1 , ψ2 , ..., ψn u „ Γ tal que o
sequente
ψ1 ^ pψ2 ^ ... ^ ψn q...qq Ñ α
é um teorema de SEQP .
Se Γ não implica axiomaticamente α, escrevemos Γ & α.
A noção de implicação axiomática possui uma série de propriedades.
Proposição 1. Os parênteses e a ordem na conjunção ψ1 ^pψ2 ^ ... ^ ψn q...qq
são irrelevantes na definição.
Prova. Decorrência direta das leis associativa e comutativa para a con-
junção, Teoremas II e III de SEQP e exercı́cio 5(b) do Capı́tulo 10. l

90
Assim, temos que o sequente ψ1 ^ pψ2 ^ ... ^ ψnq...qq Ñ α pode ser
representado simplesmente como:

ψ1 ^ ψ2 ^ ... ^ ψn
Ñ α.
Proposição 2. tαu $ β se e somente se α Ñ β é tese de SEQP .
Prova. Imediata a partir da definição de implicação axiomática. l
Proposição 3. (Inclusão.) Se α P Γ, então Γ $ α.
Prova. Como α P Γ e, pelo Teorema I do Capı́tulo anterior, temos que o
sequente α Ñ α é teorema de SEQP , segue-se que Γ $ α. l
Proposição 4. (Monotonicidade.) Se Γ $ α e Γ „ ∆, então ∆ $ α.
Prova. Como Γ $ α, existe tψ1 , ψ2 , ..., ψn u „ Γ tal que o sequente

ψ1 ^ ψ2 ^ ... ^ ψn Ñα
é tese de SEQP . Mas, como Γ „ ∆, temos que tψ1 , ψ2 , ..., ψn u „ ∆. Logo,
segue-se que que ∆ $ α. l
Proposição 5. Se Γ é finito, então Γ $ α se e somente se γ Ñ α é teorema
de SEQP em que γ é uma conjunção de todas as fórmulas de Γ.
Prova. Imediata a partir da definição de implicação axiomática e da Pro-
posição 1 acima. l
Proposição 6. (Finitude.) Γ $ α se e somente se existe um subconjunto
finito Γ1 „ Γ tal que Γ1 $ α.
Prova. Decorrência direta da definição de implicação axiomática e da Pro-
posição 5 acima. l
Utilizaremos estas propriedades na prova do teorema da completude a
ser desenvolvida na próxima seção.

11.3 Completude de SEQP


A prova da completude do sistema SEQP é bem mais intrincada que a da
sua correção. Vamos precisar de uma série de resultados intermediários para,
então, completar a demonstração.
Teorema da Completude. Sejam α e β fórmulas de LP . Se α ( β, isto
é, α implica tautologicamente β, então o sequente α Ñ β é uma tese de
SEQP .

91
Vamos começar com uma construção1 e provaremos vários lemas com
base na mesma.
Sejam α e β fórmulas de LP tais que α Ñ β não é um teorema de SEQP .
(Tais fórmulas existem pelo corolário do teorema da correção.)
Usando o teorema da enumeração (seção 4.3), considere uma enumeração
fixa das fórmulas de LP :

F OR  tγ1 , γ2 , γ3 , ...u.

Vamos construir uma sequência contável de subconjuntos de LP , denotada


por Γ0 , Γ1 , Γ2 , Γ3 ..., de acordo com as seguintes cláusulas:

Γ0  t"αu
Γ1  ΓΓ00 Y tγ1u se Γ0 Y tγ1 u & β
" caso contrário.
Γ2  Γ1 Y tγ2u
Γ1
se Γ1 Y tγ2 u & β
caso contrário.
..
. "
Γn Y tγn u se Γn Y tγn 1 u & β
Γn 1  Γn
1
caso contrário.
..
.

Segue-se, por construção, que Γ0 „ Γ1 „ Γ2 „ ... „ Γn „ Γn 1 „ ...; pois,


para todo i P N, ou Γi 1  Γi Y tγi 1 u ou Γi 1  Γi. Em qualquer dos
casos, Γi „ Γi 1 .
Definimos, agora, o conjunto
¤
Γ Γi
P
i N

que é a união (infinita) dos conjuntos Γi ’s.


Lema 1. α P Γ.
Prova. Por definição, α P Γ0
 tαu. Como Γ0 „ Γ, segue-se que α P Γ. l
Lema 2. Para todo i P N, tem-se que Γi & β.
Prova. Por indução em N.

ˆ Prova da base. Γ0 & β. Pois Γ0  tαu e, por hipótese, α Ñ β não é


teorema de SEQP .
1
Convidamos o leitor a comparar a construção abaixo com aquela que foi feita para a
demonstração do Teorema de Teichmüller-Tukey.

92
ˆ Passo indutivo. Suponha que Γi & β (hipótese de indução). Para
Γi 1 temos dois casos:

1. Se Γi  Γi Y tγi 1u, então Γi 1 & β, por construção.


1
2. Se Γi 1  Γi , então Γi 1 & β, pela hipótese de indução.

Em qualquer caso, Γi 1 & β.

Logo, segue-se o resultado. l


Lema 3. Γ & β.
Prova. Suponha, por absurdo, que Γ $ β. Então, existe tψ1 , ψ2 , ..., ψn u „ Γ
tal que o sequente
ψ1 ^ ψ2 ^ ... ^ ψn Ñ α
é um teorema de SEQP . Assim, pela proposição 5 acima, vale que:

tψ1, ψ2, ..., ψnu $ α.


Como tψ1 , ψ2 , ..., ψn u „ Γ é finito, pelo exercı́cio 10 do Capı́tulo 1, existe
k P N, tal que tψ1 , ψ2 , ..., ψn u „ Γk . Usando a proposição 4 acima, temos
que Γk $ β, o que contradiz o Lema 2. Logo, Γ & β. l
Lema 4. β R Γ.
Prova. Suponha, por absurdo que β P Γ. Pela proposição 3 acima, temos
que Γ $ β, o que contradiz o Lema 3. Logo, β R Γ. l
Pela proposição 3, sabemos que se ψ P Γ, então Γ $ ψ. Vejamos que
vale a conversa desse resultado para o conjunto Γ, ou seja, Γ contém todas
as fórmulas que são axiomaticamente implicadas por ele.
Lema 5. Para toda fórmula ψ P F OR, se Γ $ ψ, então ψ P Γ.
Prova. Seja ψ uma fórmula e suponha, por absurdo, que Γ $ ψ e ψ R Γ.
Como Γ $ ψ, então existe tψ1 , ψ2 , ..., ψn u „ Γ tal que o sequente

ψ1 ^ ψ2 ^ ... ^ ψn Ñψ
é um teorema de SEQP . Como ψ é uma fórmula de LP , então, na enu-
meração de F OR fixada, ψ  γi para algum i P N. Como ψ  γi R Γ, então,
por construção, ψ R Γi e Γi1 Y tψ u $ β. Logo, existe tθ1 , .., θm u „ Γi1 tal
que
θ1 ^ ... ^ θm ^ ψ Ñ β
é tese de SEQP . (A fórmula ψ deve ocorrer na conjunção pois, pelo Lema
2, temos que Γi1 & β.)

93
Afirmação. Vale a seguinte regra de inferência derivada:

ϕÑψ θ^ψ Ñβ
ϕ^θ Ñβ
Para ver isso, considere a seguinte prova na forma de árvore:

hipótese
ϕ^θ Ñϕ ϕÑψ
ϕ^θ Ñθ ϕ^θ Ñψ
COR
hipótese
ϕ^θ Ñθ^ψ θ^ψ Ñβ
CONJ
ϕ^θ Ñβ
COR

Como ψ1 ^ ψ2 ^ ... ^ ψn Ñ ψ e θ1 ^ ... ^ θm ^ ψ Ñ β são teoremas de SEQP ,


aplicando a regra de inferência definida acima temos que

ψ1 ^ ψ2 ^ ... ^ ψn ^ θ1 ^ ... ^ θm ^ ψ Ñψ
é também um teorema de SEQP . Mas, então, como tψ1 , ψ2 , ..., ψn u „ Γ
e tθ1 , .., θm u „ Γi1 „ Γ, temos que tψ1 , ψ2 , ..., ψn , θ1 , .., θm u „ Γ. Assim,
Γ $ β, o que contradiz o Lema 3. Logo, ψ P Γ e segue-se o resultado. l
Vamos, agora, mostrar que Γ é um conjunto verdade. Para isso, pre-
cisamos mostrar que valem as três propriedades da definição de conjunto
verdade (seção 7.2).
Lema 6. O conjunto Γ é bem comportado com respeito à conjunção. Isto
é: para toda fórmula ϕ e ψ vale que: ϕ ^ ψ P Γ ô ϕ P Γ e ψ P Γ.
Prova. (ñ) Suponha que ϕ ^ ψ P Γ. Então, pela proposição 3, temos
Γ $ ϕ ^ ψ. Logo, existe tα1 , ..., αn u „ Γ tal que o sequente

α1 ^ ... ^ αn Ñϕ^ψ
é um teorema de SEQP .
Afirmação. Valem as seguintes regras de inferência derivadas:

αÑϕ^ψ αÑϕ^ψ
αÑϕ αÑψ
e

Para ver isso, considere as seguintes provas em forma de árvore.

hipótese
αÑϕ^ψ ϕ^ψ Ñϕ
αÑϕ COR

94
e, também,

hipótese
αÑϕ^ψ ϕ^ψ Ñψ
αÑψ
COR

Assim, como α1 ^ ... ^ αn Ñ ϕ ^ ψ é um teorema de SEQP , pelas regras


acima, α1 ^ ... ^ αn Ñ ϕ e α1 ^ ... ^ αn Ñ ψ são também teoremas de SEQP .
Logo, Γ $ ϕ e Γ $ ψ. Pelo Lema 5, segue-se que ϕ P Γ e ψ P Γ.
(ð) Suponha que ϕ P Γ e ψ P Γ. Então, pela proposição 2, temos que Γ $ ϕ
e Γ $ ψ. Assim, existe tα1 , ..., αn u „ Γ tal que o sequente α1 ^ ... ^ αn Ñ ϕ é
um teorema de SEQP e, também, existe tβ1 , ..., βm u „ Γ tal que o sequente
β1 ^ ... ^ βm Ñ ψ é um teorema de SEQP .
Afirmação. Vale a seguinte regra de inferência derivada:

αÑϕ βÑψ
α^β Ñϕ^ψ
Para ver isso, considere as seguinte prova em forma de árvore.

hipótese hipótese
α^β Ñα αÑϕ α^β Ñβ βÑψ
α^β Ñϕ α^β Ñ ψ CONJCOR
COR
α^β Ñϕ^ψ
Assim, como α1 ^ ... ^ αn Ñ ϕ e β1 ^ ... ^ βm Ñ ψ são teoremas de SEQP ,
então, pela regra acima, temos que α1 ^ ... ^ αn ^ β1 ^ ... ^ βm Ñ ϕ ^ ψ
é teorema de SEQP . Mas, como tα1 , ..., αn , β1 , ..., βm u „ Γ, segue-se que
γ $ ϕ ^ ψ. Pelo Lema 5, temos que ϕ ^ ψ P Γ.
Assim, ϕ ^ ψ P Γ ô ϕ P Γ e ψ P Γ e segue-se o resultado. l
Lema 7. O conjunto Γ é bem comportado com respeito à disjunção. Isto
é: para toda fórmula ϕ e ψ vale que: ϕ _ ψ P Γ ô ϕ P Γ ou ψ P Γ.
Prova. (ð) Suponha que ϕ P Γ ou ψ P Γ.
ˆ Se ϕ P Γ, então, pela proposição 2, tem-se que Γ $ ϕ. Então, existe
tα1, ..., αnu „ Γ tal que o sequente
α1 ^ ... ^ αn Ñϕ
é um teorema de SEQP .
Considere a seguinte prova:

95
hipótese
α1 ^ ... ^ αn Ñ ϕ ϕÑϕ_ψ
α1 ^ ... ^ αn Ñϕ_ψ COR

Assim, α1 ^ ... ^ αn Ñ ϕ _ ψ é um teorema de SEQP e, portanto,


Γ $ ϕ _ ψ. Pelo Lema 5, ϕ _ ψ P Γ.

ˆ Se ψ P Γ, o argumento é análogo.
Concluı́mos, então, que ϕ _ ψ P Γ.
(ñ) Seja ϕ _ ψ P Γ e suponha, por absurdo, que ϕ R Γ e ψ R Γ. Como ϕ e
ψ são fórmula de LP , existem i, j P N tais que ϕ  γi e ψ  γj .
Como ϕ  γi R Γ, segue-se que γi R Γi . Logo, Γi1 Ytγi u $ β. Assim, existe
tθ1, ..., θnu „ Γi1 tal que o sequente θ1 ^ ... ^ θn ^ γi Ñ β é uma tese de
SEQP 2 . Fazendo θ  θ1 ^ ... ^ θn , temos que o sequente θ ^ γi Ñ β é uma
tese de SEQP . Por um argumento similar, temos que θ1 ^ γj Ñ β é uma
tese de SEQP .
Agora, usando a regra de disjunção, temos que

pθ ^ γ i q _ p θ 1 ^ γ j q Ñ β
é uma tese de SEQP .
Usando distributividade e transitividade, segue-se que

pθ ^ θ 1 q ^ p γ i _ γ j q Ñ β
é uma tese de SEQP .
Como γi _ γj  ϕ _ ψ P Γ, segue-se que Γ $ β, o que contradiz o Lema 3.
Logo, temos que ϕ P Γ ou ψ P Γ.
Assim, ϕ _ ψ P Γ ô ϕ P Γ ou ψ P Γ e segue-se o resultado. l
Lema 8. O conjunto Γ é bem comportado com respeito à negação. Isto é:
para toda fórmula ϕ vale que: ϕ P Γ ô ϕ R Γ.
Prova. Mostremos, primeiramente, que não pode ocorrer ϕ, ϕ P Γ. Se
esse fosse o caso, como o sequente ϕ ^ ϕ Ñ β é uma tese de SEQP (ver
Teorema IX da seção 10.2), temos que Γ $ β, contradizendo o Lema 3.
Mostremos, agora, que ϕ P Γ ou ϕ P Γ. Temos que α Ñ ϕ _ ϕ é um
teorema de SEQP (ver exercı́cio 9 do Capı́tulo 10) e como, pelo Lema 1,
α P Γ, segue-se que Γ $ ϕ _ ϕ. Pelo Lema 5, temos que ϕ _ ϕ P Γ e,
pelo Lema 7, segue-se que ϕ P Γ ou ϕ P Γ.
2
Obeserve que estamos empregando o mesmo argumento usado no inı́cio da demons-
tração do Lema 5.

96
Assim, obtemos: ϕ P Γ ô ϕ R Γ. l
Corlorário. O conjunto Γ é um conjunto verdade.
Prova. Decorrência direta dos Lemas 6, 7 e 8. l
Podemos, finalmente, demonstrar o teorema da Completude para o sis-
tema SEQP .
Prova da Teorema da Completude. Vamos fazer a demonstração pela
contrapositiva. Suponha que α Ñ β não é uma tese de SEQP . Por meio da
construção do inı́cio da seção, obtemos um conjunto Γ de fórmulas tal que
valem os Lemas 1-8. Pelo corolário, Γ é um conjunto verdade. Assim, pela
segunda proposição da seção 7.2, a função caracterı́stica v  χΓ de Γ é uma
valoração. Mas, pelos Lemas 1 e 4, temos que α P Γ e β R Γ. Assim, v pαq  1
e v pβ q  0 e temos que α * β, isto é, α não implica tautologicamente β.
Logo, segue-se o resultado. l

11.4 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Dê uma demonstração completa das proposições 2, 5 e 6
referentes ao conceito do implicação axiomática.
Exercı́cio 2. Mostre que Γ $ α se e somente se Γ Y t αu é insatisfatı́vel.
Exercı́cio 3. Prove o Lema 4 a partir dos Lemas 3 e 5.
Exercı́cio 4. Complete a demostração do Lema 7 mostrando que vale uma
regra de infrência derivada do tipo:

pθ ^ ϕq _ pθ1 ^ ϕ1q Ñ ψ
pθ ^ θ1q ^ pϕ _ ϕ1q Ñ ψ
Use associatividade e distributividade.
Exercı́cio 5. Um conjunto Γ de fórmula é dito consistente se existe uma
fórmula α tal que Γ & α. Caso contrário, Γ é dito inconsistente. Mostre que
Γ é inconsistente se e somente se existe uma fórmula α tal que Γ $ α ^ α.
Use um Princı́pio de Lewis.
Exercı́cio 6. Mostre que se um conjunto de fórmulas Γ é satisfatı́vel, então
ele é consistente.
Exercı́cio 7. Mostre que se um conjunto de fórmulas Γ é consistente, então
ele é satisfatı́vel. Use o teorema da completude.

97
Exercı́cio 8. Mostre que todo conjunto consistente pode ser estendido
para um conjunto consistente maximal, isto é, um conjunto consistente que
não é subconjunto próprio de um conjunto consistente. (Este resultado é
conhecido também como Lema de Lindenbaum.)
Exercı́cio 9. Faça uma nova demonstração do teorema da compacidade
usando a noção de implicação axiomática e o teorema da completude.
Exercı́cio 10. Esboce uma maneira de formalizar o conceito de tautologia
por meio de um sistema formal abstrato.

98
Capı́tulo 12

Lógica quantificacional

Nesse capı́tulo, vamos estender a linguagem proposicional para uma lingua-


gem com maior poder de expressão. Introduziremos, sı́mbolos relacionais,
variáveis e quantificadores. Em contrapartida, a construção da semântica
para tal linguagem será consideravelmente mais complicada que a semântica
de valorações estudada nos capı́tulos anteriores.

12.1 A linguagem quantificacional LQ


Vamos, agora, descrever uma famı́lia de linguagens LQ que serão denomi-
nadas linguagens quantificacionais.
Uma linguagem quantificacional LQ possui os seguintes conjuntos de
sı́mbolos:
ˆ Váriáveis individuais: são as letras x1 , x2 , x3 , ....

ˆ Sı́mbolos de predicado: são as letras maiúsculas P, Q, R, P1 , Q1 , R1 , ...


A cada sı́mbolo de predicado, fica atribuı́do um número inteiro positivo
n ¥ 1 denominado o grau do sı́mbolo de predicado. Em geral, o grau
ficará implı́cito na descrição das fórmulas.

ˆ Conectivos lógicos: são os sı́mbolos já definidos , _ e ^.


ˆ Quantificador : é o sı́mbolo @ (sı́mbolo de quantificação universal, lê-se
“para todo...”).

ˆ Parênteses: p e q.
Uma linguagem quantificacional fica determinada quando se escolhe os
seus sı́mbolos de predicado. Esses são sı́mbolos especı́ficos da linguagem

99
denominados simbolos não lógicos. Todos os outros sı́mbolos, ditos sı́mbolos
lógicos, pertencerão à todas as linguagens quantificacionais.
Como antes, expressões de LQ são sequências finitas de sı́mbolos de LQ .
Vamos continuar a usar u e v como variáveis sintáticas para expressões de
LQ . Usaremos as letras em negrito x, x1 , ..., y, y1 , ..., z, z1 , ... como variáveis
sintáticas para variáveis individuais. Os sı́mbolos Π, Π1 , ... são variáveis
sintáticas para sı́mbolos de predicado.
As fórmulas de LQ são os elementos do menor (no sentido da inclusão)
subconjunto F OR das expressões de LQ que satisfaz as seguintes cláusulas:
i. Se Π é um sı́mbolo de predicado de grau 1 e x1 é uma variável individual,
então Πx1 é elemento de F OR.
Se Π é um sı́mbolo de predicado de grau 2 e x1 , x2 são variáveis indivi-
duais então Πx1 x2 é elemento de F OR.
Em geral, se Π é um sı́mbolo de predicado de grau n e x1 , ..., xn são n
variáveis individuais então Πx1 ...xn é elemento de F OR.

ii. Se u é elemento de F OR, então u é elemento de F OR.

iii. Se u e v são elementos de F OR, então pu _ vq é elemento de F OR.

iv. Se u e v são elementos de F OR, então pu ^ vq é elemento de F OR.

v. Se u é um elemento de F OR e x é uma variável individual, então @xu


é elemento de F OR.
Vamos continuar a utilizar α, β, γ, ... como variáveis sintáticas para as
fórmulas de LQ . Vamos, também, denotar por V AR o conjunto das variáveis
individuais de LQ e, como já foi indicado, F OR denota o conjunto das
fórmulas de LQ .
Uma fórmula do tipo Πx1 ...xn , para n  1, 2, ... é dita fórmula atômica.
Quando um sı́mbolo de predicado Π for de grau 2, então uma fórmula
do tipo Πxy poderá ser escrita como xΠy.
Uma fórmula do tipo @xα é dita a quantificação universal da fórmula α
com respeito à variável individual x.
A expressão @x é denominada o quantificador universal com respeito à
variável x.
Além dos sı́mbolos definidos já introduzidos, vamos incluir mais um
sı́mbolo de quantificador existencial D (lê-se “existe pelo menos um...”) por
meio de uma definição abreviativa.
ˆ Dxα abrevia a fórmula @x α.

100
Uma fórmula do tipo Dxα é dita a quantificação existencial da fórmula
α com respeito à variável individual x.
Exemplo. Vamos considerar uma linguagem quantificacional com apenas
três sı́mbolos de predicado.
P : um sı́mbolo de predicado de grau 1.
Q: um sı́mbolo de predicado de grau 1.
R: um sı́mbolo de predicado de grau 2.
Algumas fórmulas atômicas dessa linguagem seriam: P x14 , Qx17 , Rx5 x2 ,
P x21 .
Outras fórmulas seriam: P x4 , pQx1 _ Rx2 x3 q, pP x1 ^ Qx1 q.
Ou ainda: @x2 P x2 , @x1 pQx1 _ Rx2 x2 q, Dx2 Rx1 x2 .

12.2 Semântica para LQ


Para apresentar a semântica para uma linguagem quantificacional LQ intro-
duzimos o conceito de interpretação que serve para atribuir significado aos
sı́mbolos de LQ em um conjunto fixo de indivı́duos que será o domı́nio do
discurso.

Definição. Uma interpretação A para a linguagem LQ é uma


tripla
A  xD, F, f y
tal que

ˆ D é um conjunto não vazio denominado o domı́nio ou uni-


verso da interpretação A.
ˆ F é uma regra (função interpretativa) que atribui valores
em D para os sı́mbolos de predicado de LQ de acordo com:
1. Se Π é um predicado de grau 1, então F pΠq é um sub-
conjunto de D.
2. Se Π é um predicado de grau 2, então F pΠq é um sub-
conjunto de D  D.
3. Em geral, se Π é um predicado de grau n, então F pΠq
D  D  ...  D.
é um subconjunto de looooooooomooooooooon
n vezes
ˆ f é uma função f : V AR Ñ D que a cada variável indivi-
dual atribui um elemento de D.

101
Exemplo. Vamos construir uma interpretação para a linguagem exemplifi-
cada na seção anterior. Fazemos:

ˆ D  N  t0, 1, 2, ...u.
ˆ F pP q  tn P N : n é paru  t0, 2, 4, ...u.
F pQq  t1, 5, 13u.
F pRq  txn, my P N  N : n mu.

ˆ f : V AR Ñ D é a função tal que f pxi q  i, para i  1, 2, 3, ... Ou seja


f px1 q  1, f px2 q  2, ..., f px31 q  31, ...

Observe que para a mesma linguagem poderı́amos construir outras in-


terpretações. Por exemplo:

ˆ D é o conjunto das vogais do alfabeto. D  ta, e, i, o, uu


ˆ F pP q  ta, i, uu.
F pQq  ti, ou.
F pRq  txa, ay, xa, ey, xi, ay, xu, oy, xo, oyu.

ˆ f : V AR Ñ D é a função tal que f px1 q  a, f px2 q  e, f px3q  e,


f px4 q  i, f px5 q  o e f pxk q  u, para k  6, 7, ...

12.3 Definição de verdade


Quando fixamos a semântica por meio de uma interpretação para uma
linguagem quantificacional, o primeiro resultado que obtemos é que cada
fórmula da linguagem passa a ter um valor de verdade de acordo com a
interpretação escolhida. Vejamos, informalmente como isso acontece.
Considere a linguagem definida no final da primeira seção em que os
sı́mbolos de predicado são: P (grau 1), Q (grau 1) e R (grau 2).
Seja a interpretação construı́da acima em que o universo é N, F pP q são
os pares, F pQq é o conjunto formado pelos números 1, 5 e 13; e R é a relação
“menor que”. Além disso, f é tal que f pxi q  i.
Tome uma fórmula atômica tal como P x14 . Temos:

ˆ f px14 q  14.

ˆ F pP q é o conjunto dos pares.

102
ˆ 14 é par.

Parece natural considerar que o significado da fórmula P x14 , segundo


essa interpretação, é “14 é par” e, portanto, P x14 é verdadeira segundo essa
interpretação.
Já a fórmula Qx17 é falsa segundo essa interpretação dado que:

ˆ f px17 q  17.

ˆ F pP q é o conjunto t1, 5, 13u.

ˆ 17 não é elemento do conjunto t1, 5, 13u, isto é, 17 R t1, 5, 13u.

Também, Rx5 x2 é falsa segundo essa interpretação dado que 5 não é


menor que 2.
Assim, para essa interpretação, podemos dizer como são os valores de
verdade para fórmulas atômicas.

1. P x é verdadeira segundo essa interpretação se e somente se f pxq é par,


isto é f pxq P F pP q.

2. Qx é verdadeira segundo essa interpretação se e somente se f pxq é um


dos números 1, 5 ou 13, isto é f pxq P F pQq  t1, 5, 13u.

3. Rxy é verdadeira segundo essa interpretação se e somente se o número


f pxq é menor que o número f pyq, isto é, se o par xf pxq, f pyqy P F pRq.

Para as fórmula com conectivos lógicos, o procedimento é o mesmo que


fizemos para a lógica proposicional. Aplicamos as funções de verdade H ,
H_ e H^ . Assim, como Rx5 x2 é falsa segundo a interpretação conside-
rada, temos que Rx5 x2 é verdadeira segundo essa interpretação. Também,
pP x14 _ Qx17q é verdadeira e pP x14 ^ Qx17q é falsa segundo a interpretação
dada.
O problema é mais complicado com fórmulas com quantificadores. Con-
sidere a fórmula @x2 P x2 . Intuitivamente, essa fórmula está afirmando que
“para todo x2 , x2 é par”, isto é, “todos os números são pares”. Embora
f px2 q  2 seja par, é claro que é falso que todos os números são pares.
Uma maneira de contornar esse problema seria considerar todos os sig-
nificados possı́veis de x2 e verificar se para todos eles o número é par. É
claro que se f px2 q fosse 3, a sentença P x2 seria falsa.
Para implementar essa ideia, vamos introduzir uma noção adicional.
Seja A  xD, F, f y uma interpretação para uma linguagem quantificaci-
onal LQ e x uma variável individual. Uma interpretação x-variante de A é

103
uma interpretação Ax  xD, F, f x y que difere de A no máximo no valor que
a função f atribui a x. Assim, Ax tem o mesmo universo D de A, mesma
função F que interpreta os sı́mbolos de predicado de LQ e a função f x é tal
que para toda variável individual y com y  x, tem-se que f x pyq  f pyq.
Assim, para avaliar o valor de verdade de @x2 P x2 na interpretação A
acima, devemos considerar o valor de verdade de P x2 em todas as inter-
pretações x2 -variante de A. Mas, já sabemos que uma função f x2  3, faz a
fórmula P x2 ser falsa. Assim, @x2 P x2 é falsa na interpretação considerada.
Isso motiva a seguinte cláusula para fórmulas com quantificadores:
ˆ @xα é verdadeira na interpretação considerada A se e somente se α é
verdadeira em todas as interpretações Ax , que são x-variantes de A.
Podemos, então, sumarizar as cláusulas acima introduzindo uma de-
finição de verdade para fórmulas de uma linguagem quantificacional segundo
uma interpretação dada.
Definição. (Tarski.) Seja A  xD, F, f y uma interpretação
para uma linguagem quantificacional LQ . Para cada fórmula
de LQ vamos atribuir um valor de verdade 0 ou 1 segundo a
interpretação A. Assim, vamos definir uma função:
vA : F OR Ñ t0, 1u
de acordo com as seguintes cláusulas:
ˆ Se α é a fórmula Πx1 ...xn em que Π é um predicado de grau
n e x1 , ..., xn são n variáveis individuais, então
vA pαq  1 ô xf px1 q, ..., f pxn qy P F pΠq.
ˆ Se α é β, então vA pαq  H pvA pβ qq.
ˆ Se α é pβ _ γ q, então vA pαq  H_ pvA pβ q, vA pγ qq.
ˆ Se α é pβ ^ γ q, então vA pαq  H^ pvA pβ q, vA pγ qq.
ˆ Se α é @xβ, então vA pαq  1 se e somente se vAx pβ q  1,
em todas as interpretações Ax , que são x-variantes de A.
Vejamos algumas consequências dessa definição.
1. Se α é @xβ, então temos que:
vA p α q  0 ô vA p@xβ q  0
ô não é o caso que para toda interpretação Ax ,
x-variante de A, tem-se que vAx pβ q  1
ô existe uma interpretação Ax ,
x-variante de A, tal que vAx pβ q  0.

104
2. Se α é Dxβ, então temos que:

vA p α q  1 ô vA pDxβ q  1
ô vA p @x β q  1
ô vA p@x β q  0
ô existe uma interpretação Ax ,
x-variante de A, tal que vAx p β q  0
ô existe uma interpretação Ax ,
x-variante de A, tal que vAx pβ q  1.

3. Se α é Dxβ, então temos que:

vA pαq  0 ô não existe uma interpretação Ax ,


x-variante de A, tal que vAx pβ q  1.

Vamos apresentar um exemplo que pode ilustrar os conceitos acima in-


troduzidos.
Exemplo. Vamos construir uma interpretação A que dê 1 para a fórmula
@x1pP x1 _ Qx1q e dê 0 para a fórmula @x1P x1 _ @x1Qx1.
Considere A  xD, F, f y Tal que:

ˆ D  t0, 1, 2u;
ˆ F pP q  t1, 2u;

ˆ F pQq  t3u;

ˆ f é qualquer função de V AR em D. (O leitor perceberá que o valor


de verdade destas fórmulas não dependem de f !)

Como o domı́nio de A possui 3 elementos, temos exatamente três inter-


pretações x1 -variantes de A. Essas interpretações só diferem de A na cons-
trução das funções f x1 .

1. Em Ax1 1 , temos f1x1 px1 q  1.

2. Em Ax1 2 , temos f2x1 px1 q  2.

3. Em Ax3 1 , temos f3x1 px1 q  3.

105
Nesse caso, temos que V alA p@x1 pP x1 _ Qx1 qq  1. Pois,

f1x1 : vAx1 pP x1 _ Qx1 q  1 porque vAx1 pP x1 q  1,


f1x1 px1 q  1 P F pP q.
1 1
pois
f2x1 : vAx1 pP x1 _ Qx1 q  1 porque vAx1 pP x1 q  2,
f2x1 px1 q  2 P F pP q.
2 2
pois
f3x1 : vAx1 pP x1 _ Qx1 q  1 porque vAx1 pQx1 q  1,
f3x1 px1 q  3 P F pQq.
3 3
pois

Por outro lado, V alA p@x1 P x1 _ @x1 Qx1 q  0. Pois,

vA p@x1 P x1 q  0 porque vAx1 pP x1 q  0,


f3x1 px1 q  3 R F pP q.
3
pois
vA p@x1 Qx1 q  0 porque vAx1 pQx1 q  0,
f1x1 px1 q  1 R F pQq.
1
pois

12.4 Variáveis livres e ligadas


Vamos, agora, considerar um conceito importante de ligação de variáveis
por quantificadores.
Em fórmula do tipo @xα e Dxα dizemos que a variável x está anexada
ao sı́mbolo de quantificador @ ou D e também que a fórmula α é o escopo do
quantificador @x ou Dx.
Seja α uma fórmula e x uma variável individual. Dizemos que uma
ocorrência de x na fórmula α é ligada em α se e somente se a ocorrência
está anexada a um quantificador ou se ela ocorre em α no escopo de um
quantificador cuja variável anexada é também x. Em caso contrário, dizemos
que a acorrência de x é livre em α.
Exemplos. Considere as fórmulas:

@x1pP x1 _ Qx2q.
Aqui, todas as ocorrência de x1 são ligadas e a ocorrência de x2 é livre.

Dx1pP x1 _ Qx1q _ P x1 .

Aqui, a última ocorrência de x1 é livre e todas as outras ocorrências são


ligadas.
@x2pP x2 ^ Qx1q _ Dx1Rx1x2.
Aqui, a primeira ocorrência de x1 e a última de x2 são livres e todas as
outras ocorrências de variáveis individuais são ligadas.

106
Uma fórmula que não possui variáveis livres é dita uma sentença. Um
resultado interessante sobre o cálculo de valores de verdade para sentenças
é dado a seguir.
Teorema. Seja α uma sentença de uma linguagem quantificacional LQ e
A  xD, F, f y uma interpretação para essa linguagem. Então, o valor de
verdade segundo a interpretação A não depende da função f . Isto é, se
A1  xD, F, f 1 y é uma outra interpretação para LQ (com os mesmos D e F ),
então V alA pαq  V alA pαq.
1

12.5 Exercı́cios
Exercı́cio 1. Construa uma linguagem quantificacional e dê exemplos de
fórmulas para essa linguagem.
Exercı́cio 2. Construa uma interpretação para a linguagem do exercı́cio 1
e dê cinco exemplos de fórmulas vedadeiras e cinco de falsas.
Exercı́cio 3. Considere a interpretação dada no final da seção 12.2.

ˆ D é o conjunto das vogais do alfabeto. D  ta, e, i, o, uu


ˆ F pP q  ta, i, uu.
F pQq  ti, ou.
F pRq  txa, ay, xa, ey, xi, ay, xu, oy, xo, oyu.

ˆ f : V AR Ñ D é a função tal que f px1 q  a, f px2 q  e, f px3q  e,


f px4 q  i, f px5 q  o e f pxk q  u, para k  6, 7, ...

Dê cinco exemplos de fórmulas vedadeiras e cinco de falsas segundo essa


interpretação.
Exercı́cio 4. Calcule o valor de verdade das seguintes fórmulas segundo
a interpretação do exercı́cio 3: P x3 , Qx4 , Rx1 x2 , Rx2 x1 , P x15 , pQx10 _
P x3 q, pRx3 x4 ^ P x2 q, Dx1 Rx1 x1 , @x2 pQx2  P x2 q, Dx1 Rx1 x4 , @x1 pP x1 
Dx2Rx1x2q.
Exercı́cio 5. Encontre uma interpretação que dê verdadeiro para as seguin-
tes fórmulas:

ˆ @x1Rx1x1
ˆ @x1@x2pRx1x2  Rx2x1q

107
ˆ @x1@x2@x3ppRx1x2 ^ Rx2x3q  Rx1x3q
Que tipo de relação a interpretação de R deve ser?
Exercı́cio 6. Encontre uma interpretação que dê verdadeiro para Dx1 P x1
e Dx1 Qx1 e falso para Dx1 pP x1 ^ Qx1 q.
Exercı́cio 7. Encontre uma interpretação que dê verdadeiro para a fórmula
@x1Dx2Rx1x2 e falso para Dx2@x1Rx1x2.
Exercı́cio 8. Considere uma linguagem quantificacional com um único
sı́mbolo não lógico R, um predicado de grau 2. Encontre fórmulas que
expressem os seguintes significados:

ˆ O domı́nio da relação que interpreta R é o universo todo da inter-


pretação.

ˆ O contradomı́nio da relação que interpreta R é o universo todo da


interpretação.

ˆ Cada elemento do universo da interpretação aparece ou no domı́nio ou


no contradomı́nio da relação que interpreta R.

Exercı́cio 9. Considere a linguagem quantificacional do exercı́cio 8. En-


contre um conjunto finito de fórmulas tais que qualquer interpretação que
atribua verdadeiro para todas as fórmulas desse conjunto, deve necessaria-
mente ter um domı́nio infinito.
Exercı́cio 10. Demonstre o teorema do final da seção 12.4.

108
Capı́tulo 13

Sequentes para LQ

Neste capı́tulo introduzimos uma relação de implicação lógica entre fórmulas


de uma linguagem quantificacional e a formalizamos novamente por meio de
um sistema de sequentes. Continuamos mantendo o sistema no texto Topics
in Modern Logic de D. C. Makinson.

13.1 Validade
O conceito de tautologia que estudamos para a lógica proposicional possui
um correlato na lógica quantificacional que é a noção de fórmula válida.
Dizemos que uma fórmula α de uma linguagem quantificacional LQ é
válida se e somente se para toda interpretação A  xD, F, f y para LQ tem-
se que vA pαq  1.
Vejamos que existem muitas fórmulas de linguagens quantificacionais que
são válidas.
Seja ψ pp1 , ..., pn q uma tautologia da linguagem proposicional LP que
possui as variáveis proposicionais p1 , ..., pn . Dizemos que uma fórmula α
de uma linguagem quantificacional LQ tem a forma de ψ se α é obtida de
ψ substituindo-se uniformemente as variáveis proposicionais p1 , ..., pn por
fórmulas de LQ . (É claro que cada ocorrência de pi é substituı́da sempre
pela mesma fórmula, para i  1, ..., n.)
Temos, assim, o seguinte resultado:
Proposição. Toda fórmula da uma linguagem quantificacional que tenha a
forma de uma tautologia proposicional é válida.
Segue-se da proposição acima que P x1 _ P x1 e P x1  pQx2  P x1q
são exemplos de fórmulas válidas.

109
No entanto, em uma linguagem quantificacional, existem fórmulas que
não possuem a forma de uma tautologia proposicional, mas que são válidas.
Um exemplo de uma tal fórmula é: Dx1 @x2 Rx1 x2  @x2 Dx1 Rx1 x2 . Observe
que a conversa dessa implicação não é válida (ver exercı́cio 7 do Capı́tulo
12).

13.2 Implicação lógica


Vejamos, agora, um conceito das linguagens quantificacionais que é o corre-
lato da noção de implicação tautológica entre fórmulas proposicionais..
Sejam α e β fórmulas de uma linguagem quantificacional LQ . Dizemos
que α implica logicamente β, em sı́mbolos α ( β 1 , se e somente se para
toda interpretação A  xD, F, f y para LQ tal que vA pαq  1, tem-se que
vA pβ q  1.
Da mesma forma, sejam Γ um conjunto de fórmulas e α uma fórmula de
LQ . Dizemos que Γ implica logicamente α, em sı́mbolos Γ ( β, se e somente
se para toda interpretação A  xD, F, f y para LQ tal que vA pγ q  1 para
toda γ P Γ, tem-se que vA pαq  1.
Não é difı́cil verificar que aqui também valem os resultados expressos nos
Teoremas A e B do Capı́tulo 8.

1
Note que estamos utilizando o mesmo sı́mbolo de implicação tautológica. O contexto
dirá qual é o caso.

110
Exercı́cio 1. Demonstre a proposição da seção

111
Índice Remissivo

EXPL , 40 conjunto finito, 35


F OR, 42 conjunto infinito, 35
F ORL , 41 conjunto não contável, 35
P ROP , 42 conjunto parcialmente ordenado, 19
R-equivalentes, 17 conjunto potência, 8
V al, 64 conjunto quociente, 18
V alpΓq, 64 conjunto sucessor, 28
V alpαq, 64 conjunto vazio, 8
LP , 42 conjunto verdade, 59
n-upla ordenada, 14 conjuntos disjuntos, 10
ı́nfimo, 20 conjuntos equipotentes, 35
consequente, 43
antecedente, 43 contradomı́nio, 25
antissimetria, 16 correspondência biunı́voca, 25
aplicação canônica, 27
aplicação inclusão, 27 diferença, 9
argumento, 25 disjunção, 42
aridade, 47 disjunções generalizadas, 50
Axioma da Boa Ordenação, 34 disjuntivos, 42
domı́nio, 24
bijeção, 25
elemento maximal, 20
classe de equivalência, 17 elemento minimal, 20
complemento, 9 equivalência (material), 43
composição de funções, 26 expressão, 40
comprimento de expressão, 40 Extensão de valorações, 57
conectivos lógicos, 42
conjunção, 42 fórmula atômica, 42
conjunções generalizadas, 50 fórmulas, 41
conjuntivos, 42 falso, 47, 56
conjunto contável, 35 função, 24
conjunto das partes, 8 função bijetora, 25

112
função caracterı́stica, 29 ordem total, 34
função composta, 26
Função conjunção, 49 par ordenado, 13, 14
função de verdade, 47 partição, 18
função de verdade determinada por pertinência, 5
fórmula, 61 Princı́pio de especificação, 7
Função disjunção, 48 Princı́pio de extensionalidade, 6
Função implicação, 49 Princı́pio de Indução, 31
função injetora, 25 princı́pio de indução completa, 33
função inversa, 27 Princı́pio de indução em fórmulas, 43
Função negação, 48 produto cartesiano, 15
função sobrejetora, 25 produtos cartesianos finitos, 15
funções de verdade definı́veis, 50 propriedades da inclusão, 7

grau, 47 reflexividade, 16
relação n-ária, 17
identidade em um conjunto, 27 relação (binária), 16
igualdade, 5 relação de equivalência, 16
imagem, 25 relação de ordem, 19
implicação (material), 43 relação de ordem estrita, 16
inclusão, 6 relação de ordem parcial, 16
indução no curso de valores, 33 relação em um conjunto, 16
injeção, 25
intersecção, 9 sı́mbolo de negação, 42
intersecções generalizadas, 10 sı́mbolos, 40
irreflexividade, 16 sı́mbolos de conjunção, 42
sı́mbolos de disjunção, 42
Lema da Leitura Única, 44 simetria, 16
limitante inferior, 20 sobrejeção, 25
limitante superior, 20 subconjunto, 6
linguagem formalizada, 40 subconjunto próprio, 6
linguagem proposicional, 42 supremo, 20

máximo, 20 tabela de verdade de fórmulas, 61


mı́nimo, 20 Teorema da Cantor, 38
maior elemento, 20 Teorema da Enumeração, 35
menor elemento, 20 Teorema da Injeção, 37
Teorema da Sobrejeção, 39
negação, 42 Teorema de Post, 54
Teorema do Subconjunto, 36
ocorrência de sı́mbolo, 40

113
Teorema sobre número de expressões,
41
transitividade, 16

união, 8
uniões generalizadas, 10

valor, 25
valoração, 56
valores de verdade, 47, 56
variáveis proposicionais, 42
variáveis sintáticas para expressões,
42
variáveis sintáticas para fórmulas, 42
verdadeiro, 47, 56

114

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