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ANTÔNIO GRAMSCI:

UMA ALTERNATIVA PARA O MARXISMO

Osvaldo Luís Golfe

INTRODUÇÃO

Depois do desmantelamento da estrutura comunista, assistimos a uma grande crise de ideais, ou, em outras
palavras, assistimos a uma crise de utopias, modelos; tais modelos e utopias estiveram presentes em toda a
história. As utopias fazem parte das aspirações do humano, dos sonhos, dos desejos, da criatividade; fazem
parte da ousadia do humano de pensar o novo; algo diferente, capaz de trazer soluções para os problemas que
se apresentam na história. Karl Marx, com certeza teve muitos sonhos, muitas aspirações, pensamentos não
concretizados, ou concretizados de forma deturpada. Mas seu grande mérito, penso, está em chamar a atenção
para os problemas sociais de seu tempo – a Revolução Industrial e as conseqüências decorrentes... De maneira
alguma podemos ignorar um sistema amplo, científico, "esta casa com tantos cômodos" como o marxismo.
Porém, um sistema que se propõe ser científico, necessariamente precisa auto-renovar-se. A história caminha,
novos pensamentos, novas políticas, novas pessoas, novos problemas surgem... Os grandes ideais não podem
cristalizarem-se na história, tornarem-se incapazes de compreender o novo. De certa forma foi isto o que
aconteceu com o marxismo depois de Marx. Seu pensamento, "levado ao pé-da-letra", ou deturpado tornou-se
obsoleto, rígido, "mumificado", cristalizado na história, de certa forma perdido no tempo... É com este "pano-
de-fundo" que apresentamos o grande pensador italiano Antonio Gramsci. Antônio Gramsci (1891-1937),
membro do partido socialista italiano, tornou-se, em 1921, fundador do partido comunista, na Itália. Foi eleito
deputado em 1924. Em 1926, Mussolini o coloca no cárcere. Fora condenado a 20 anos de prisão. Devido à
precariedade de sua saúde fora levado do cárcere à enfermaria onde falecera alguns dias depois. No cárcere
escreve suas obras, das quais a mais importante é Cadernos do Cárcere. Dividimos este estudo em três partes,
sucintas frente a amplitude do tema. Na primeira parte, apresentamos alguns conceitos do marxismo
tradicional como, conceito de ideologia, materialismo histórico, etc. Na segunda e terceira parte tratamos
especificamente sobre o pensamento de Gramsci. Nestas duas partes abordamos alguns conceitos
fundamentais do pensador italiano como, sua concepção de ideologia, dialética, hegemonia, filosofia da práxis
e um pouco do seu pensamento pedagógico. Difusa nos conceitos está a grande e revolucionária proposta de
Gramsci. Percebemos que em sua proposta, analisa conceitos do próprio marxismo tradicional – ideologia,
dialética... – de uma forma muito mais ampla, mais abrangente. Desta forma, Gramsci devolve a
dinamicidade, a vida, dá uma nova face ao sistema. É revolucionário, em Gramsci, por exemplo, o seu
pensamento pedagógico. Parece ser a escola uma instituição com pouco valor no marxismo tradicional. A
mudança cultural também é uma mudança social. Neste sentido, a escola tem uma enorme influência na
formação das consciências. Por isso uma boa reforma social tem início em uma boa reforma do sistema
escolar. Oxalá todos pudessem Ter acesso a um mesmo nível cultural! É esta uma grande utopia que hoje,
mais do que nunca, nos provoca.

PARTE I: CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO MARXISMO

O marxismo, poderíamos compará-lo a um grande tronco de uma grande árvore que tem muitos ramos. Cada
corrente de pensamento que se diz de inspiração marxista, significa um ramo desta grande árvore. Assim
temos uma infinidade de diferentes leituras deste pensamento. Esta primeira parte pretende ser uma
introdução ao pensamento. Isto é a base que nos permitirá uma futura análise. Trabalhamos, na presente parte,
uma síntese, objetiva, de alguns principais conceitos do marxismo tradicional, para, em seguida
apresentarmos a alternativa apresentada por Antônio Gramsci para o marxismo.

1 – Conceito de Ideologia
Marx trata a respeito de ideologia em "Ideologia Alemã". Nesta obra Marx dirige-se a um grupo específico: os
filósofos alemães que vieram depois de Hegel; estes são chamados de "ideólogos alemães" (Feuerbach, R.
Strauss. Max Stirner, Bruno Bauer...). Marx dirigi-lhes duas críticas principais. "A primeira é a de que esses
filósofos tiveram a pretensão de demolir o sistema hegeliano imaginando que bastaria criticar apenas um
aspecto da filosofia de Hegel, em lugar de abarcá-la como um todo. Com isto, as chamadas críticas hegelianas
apenas substituíram a dialética hegeliana por uma fraseologia sem sentido e sem consistência (com exceção
de Feuerbach). A segunda é a de que cada um desses ideólogos tomam um aspecto da realidade humana,
convertem este aspecto numa idéia universal e passam a deduzir todo o real desse aspecto idealizado. Com
isto, os ideólogos alemães, além de fazerem o que todo o ideólogo faz (isto é, deduzir o real das idéias desse
real), ainda imaginaram estar criticando Hegel e a realidade alemã simplesmente por terem escolhido novas
idéias que, como demonstra Marx, não criticam coisa alguma, ignoravam a filosofia hegeliana e, sobretudo,
ignoravam a realidade alemã".1O pensamento de Marx tem como ponto de partida o pensamento de Hegel.
Porém, no seu desenvolvimento encontramos muitos pontos divergentes, ou também usados com sentido
diferente. Exemplo clássico disto são as duas concepções divergentes sobre o "motor da história": Hegel
acredita ser as idéias as construtoras e movedoras do mundo; as idéias estão antes dos fatos, dos
acontecimentos. Sendo assim, a consciência do homem é anterior à realidade que busca conhecer e
transformar. A história poderia ser construída pela ação dos grandes homens, pensadores... Marx inverte este
processo, acreditando que as idéias surgem a partir das condições reais vividas por indivíduos reais dentro da
história. É o confronto do indivíduo com a vida real, da organização por meio da divisão do trabalho que
brotam as idéias. O termo ideologia tem vários sentidos: conjunto de idéias, opinião a respeito de algum
objeto em discussão, pensamento de um autor, uma doutrina, "organização sistemática dos conhecimentos
destinados a orientar a prática, a ação efetiva".2 De qualquer forma "ideologia", no marxismo tradicional,
recebe normalmente um sentido pejorativo. Este sentido aprofundaremos ao longo deste primeiro ponto. Marx
não separa a produção das idéias e as condições sociais e históricas nas quais são produzidas. As idéias não
estão separadas da vida prática, da história real, concreta feita pela ação dos homens. A "Ideologia" pode ser
compreendida como um conjunto de idéias. Este sentido pode ser observado, por exemplo, em uma
determinada classe, em um determinado grupo social. Podemos dizer que têm as suas idéias, suas convicções,
suas gírias, seus objetivos."Ideologia" pode ser entendida como uma organização sistemática dos
conhecimento destinados a orientar uma prática, uma ação efetiva. Este é recurso usado para "vender uma
idéia"; isto constitui uma propaganda enganosa. Uma formulação é enganosa quando esconde um segundo
objetivo. Os objetivos que se quer alcançar permanecem velados. Neste sentido "ideologia" é uma arma muito
poderosa dentro de uma sociedade, capaz de formular, e difundir opiniões nocivas à vida social, que jamais
seriam pensadas se não existisse a força da difusão ideológica. Sendo assim, "Ideologia", é uma forma subtil
de pensamento que pode trazer conseqüências graves. Por exemplo, um trabalhador, passa a não mais se dar
conta da situação em que se encontra, da exploração que está sofrendo, do quanto vale o seu trabalho. A
ideologia leva o homem a pensar, sentir, agir de uma maneira conveniente com interesses que permanecem
velados.

4.1 – Hegel: Lógica Formal X Lógica Dialética

As origens da dialética são anteriores a Hegel, mas nos limitaremos a fazer uma abordagem rápida sobre as
origens da dialética, mais em Hegel, pois, é daqui que Marx herda o conceito da dialética para aplicar à sua
teoria. Hegel percebe que na lógica formal está implícito o princípio da Identidade, isto é, da não contradição.
Isto tem origem já em Parmênides: "o ser é, e, o não ser não é". Uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo
tempo, sob o mesmo aspecto. Uma coisa se identifica somente com ela mesma; tudo é linear; o que não se
encaixa dentro desta linearidade é visto como erro. O pensamento até Hegel está orientado para a linearidade.
O real, porém, tem contradições, e, se o nosso pensamento exclui a contradição, então, não "podemos
conhecer as coisas em si, mas o nosso próprio conhecimento das coisas", como dizia Kant, por que o nosso
instrumento mental não possibilita este conhecimento. O conhecimento está limitado ao formal, à identidade.
A realidade não se encaixa dentro disto. Hegel propõe a lógica dialética admitindo a realidade contraditória. A
dialética seria a nova forma de pensar, resgatando o que foi excluído anteriormente: a contradição. Em Hegel
a contradição é mais abrangente que a identidade. Sendo assim ela engloba, abrange também a identidade
como um momento, uma parte da dialética. Existe a identidade dentro da dialética mas ela é provisória: o ser
é movimento. Para Hegel a realidade é o espírito; a realidade física é manifestação do espírito. O mundo
físico é uma verdadeira negação do espírito; é o espírito alienado de si mesmo. O Espírito Absoluto subsiste
por si mesmo; o espírito alienado de si mesmo, o mundo, é pura emanação do Espírito Absoluto.

Entre estas duas realidades (Espírito e espírito alienado) existe um conflito que só será superado por
intermédio do homem, através da consciência. À medida que a consciência do homem se desenvolve dentro
da história vai ocorrendo a superação da alienação do espírito. Disto surge este esquema:

O mundo é o espírito
de forma oposta; é a
materialização do
espírito, mas sem
ESPÍRITO MUNDO CONSCIÊNCIA consciência. O espírito
(Afirmação) (Negação) (Síntese) também não reconhece
o mundo como sendo
parte dele, por isto o
mundo é o espírito
alienado de si mesmo.

Dentro do mundo está o homem, que por sua vez também é mundo. O homem têm a capacidade de
desenvolver a consciência de si mesmo e das coisas: é como se dentro do mundo houvesse uma sementinha
do Espírito Absoluto. Esta sementinha é a consciência do homem. O mundo vai se espiritualizando à medida
que a consciência cresce. Isto ocorre através da cultura que se desenvolve dentro da história: é a síntese. A
síntese é a união daquilo que estava separado, alienado, oposto, contraditório.

A partir deste momento a contradição não é mais vista como um erro; a contradição é vista como a essência
do desenvolvimento. O processo de desenvolvimento é o movimento triádico descrito acima: afirmação,
negação e a negação da negação (nova síntese). Este movimento continua se repetindo infinitamente até
chegar o momento em que não haja mais contradições. Este momento é representado por Hegel pelo perfeito
desenvolvimento cultural, isto é, cultura desenvolveria tanto que não haveria mais nada para ser explicado.
Seria o fim da dialética.

Comparando a lógica formal com a lógica dialética temos dois princípios distintos e que tem sua aplicação
prática distinta.

Por um lado, a lógica formal, tem como base o princípio da não contradição; sempre trabalha com aspectos
parciais: analisa as partes. Isto podemos perceber, por exemplo, na medicina quando a preocupação está
somente em tratar os efeitos, os sintomas e não se procura a causa de tais efeitos; do ponto de vista da lógica
formal o corpo não é visto como um todo mas como partes. Como neste, em muitos outros casos a sociedade
se deixa levar unicamente pelo formal, legal; às vezes sabe orientar-se só dentro do pré-escrito.

Por outro lado a lógica dialética admite a contradição; já pressupõe uma totalidade (Espírito Absoluto). Assim
os fenômenos que ocorrem não são analisados isoladamente (formal). Na medicina, como falamos acima, o
tratamento deveria ir em busca da causa de determinada doença. Quando falamos, por exemplo, de
desemprego, não podemos entendê-lo como um fato isolado; precisamos analizá-lo como participante de um
conjunto que não tem uma única causa e também não tem um único efeito. Muitas coisas são causa e efeito
uma das outras. Este segundo modo de ver a realidade parece mais adequado para a modernidade globalizada
e holística.
5 – Luta de Classes
O conceito como tal não é de criação de Marx. Desde muito tempo antes de Marx já havia este conceito.
Aristóteles na POLÍTICA divide a sociedade em classe pobre, média e rica. "Nesta mesma obra, Aristóteles
estabelece relações entre formas de governo e predomínio de certas classes sociais".14

No século XIX o conceito de classe se identifica com o próprio fundamento da sociedade. "O que Marx vai
fazer é exatamente dar ao conceito de classe não só uma dimensão científica, mas também atribuir-lhe o papel
de base de explicação da sociedade e de sua história".15

A luta de classes, na da teoria marxista, é como um motor poderoso capaz de "dinamizar a história"16. O
conflito, a dialética do real que gera o movimento ocorre entre as classes; e, é isto que dinamiza a história. Em
toda a história podemos observar este fato. "Segundo Marx, as raízes da evolução social não se situam numa
mudança de idéias ou valores, mas nos fatos econômicos e tecnológicos. A dinâmica da mudança é a de uma
interação dialética de opostos decorrente de contradições que são intrínsecas a todas as coisas. Marx tirou essa
idéia da filosofia de Hegel e adaptou-a à sua análise da mudança social, afirmando que todas as
transformações que ocorrem na sociedade provém de suas contradições internas. Considerou que os princípios
contraditórios da organização social estão consubstanciados nas classes da sociedade e que a luta de classes é
uma consequência de sua interação dialética. Para Marx, a luta de classes é a força propulsora da história. Ele
sustentava que todo progresso histórico importante nasce do conflito, da luta e da revolução violenta. O
sofrimento e o sacrifício humanos eram um preço que tinha de ser pago para se chegar à mudança social".17

Diz Marx/Engels no Manifesto do Partido Comunista: "A história da sociedade se confunde até hoje com a
história das lutas de classes. O homem livre e escravo, patrício e plebeu, senhor e servo, mestre de corporação
e companheiro, em outros termos, opressores e oprimidos em permanente conflito entre si, não cessam de se
guerrearem em luta aberta ou camuflada, luta que, historicamente, sempre terminou numa restruturação
revolucionária da sociedade inteira ou no aniquilamento das classes em choque".18

As relações entre os homens resultam das relações de oposição, antagonismo, exploração e


complementariedade entre as classes sociais.

Há uma relação de exploração entre a classe dos proprietários, a burguesia, e a dos trabalhadores – o
proletariado – porque a posse dos meios de produção, sob a forma legal de propriedade privada, faz com que
os trabalhadores, para assegurar a sobrevivência, tenham que vender sua força de trabalho ao empresário
capitalista, o qual se apropria do produto do trabalho de seus operários.

Estas relações são também de oposição e antagonismo, porque os interesses de classe são inconciliáveis. O
capitalista deseja preservar seus direitos, isto é, a propriedade dos meios de produção e a máxima exploração
do trabalho do operário. Isto acontece seja através da redução dos salários ou ampliando a jornada de trabalho.
O trabalhador, por sua vez, procura diminuir a exploração ao lutar por menor jornada de trabalho, melhores
salários e participação nos lucros.

Por outro lado, as relações entre as classes são complementares, pois uma só existe em relação à outra. Só
existem proprietários porque há uma massa de despossuídos cuja única propriedade é sua força de trabalho,
que precisam vender para assegurar a sobrevivência. As classes sociais são, pois, complementares e
interdependentes.

A Luta de Classes, a divisão, sempre existiu durante toda a história. Na antiga Roma encontramos os patrícios,
cavaleiros, plebeus, escravos. Na Idade média encontramos as figuras do senhor, dos vassalos, servos... A
nossa sociedade moderna (sua estrutura) está fundamentada em toda a história. O que vemos hoje na
sociedade é que ela está se dividindo cada vez mais em duas grandes classes, dois grandes grupos (Burguesia
moderna e Proletariado19), opostos que lutam entre si: classe rica e classe pobre. Estes dois grupos, um
domina, outro é dominado; uma classe é opressora e outra oprimida, seja pelas armas da ideologia ou pela
repressão. O que importa é manter-se no domínio.
A História do homem é, segundo Marx, a história da "luta de classes", uma luta constante entre interesses
opostos, embora nem sempre se manifeste socialmente sob a forma de guerra declarada. As divergências, as
aposições e antagonismos de classes estão implícitos em todas as relações sociais, nos mais diversos níveis da
sociedade, em todos os tempos, desde o surgimento da propriedade privada.

A burguesia é uma classe proveniente da decadência feudal. Esta gerou uma outra classe; desta mesma forma
que o feudalismo gerou a burguesia, assim também a burguesia moderna gerou uma classe: os proletários. O
próprio feudalismo gerou uma classe que foi a sua ruína: "Assim como para o Senhor Feudal foi inútil
defender os direitos feudais diante daquela sua criatura que era a burguesia, agora também é inútil para a
burguesia trabalhar em prol da conservação de seus direitos sobre o proletariado. A realidade é que a
burguesia não apenas fabricou as armas que a levarão à morte, mas também gerou os homens que
empunharão aquelas armas: os operários modernos, os proletários".20

II PARTE

ANTÔNIO GRAMSCI

Nesta segunda parte deste estudo enfocamos o pensamento de Antônio Gramsci. Queremos dar maior acento a
alguns principais conceitos, pois entendemos que neles aparece uma nova leitura, uma crítica sutil do
marxismo, segundo o pensados que nos propomos a estudar.

2 – Conceito de Ideologia em Antônio Gramsci

O tema da "ideologia" é um tema muito conturbado dentro da teoria marxista. O marxismo tradicional usa
este termo em sentido pejorativo. Gramsci resgata, além do pejorativo, um sentido positivo para este termo.
Portanto, Gramsci trata deste assunto sob dois aspectos. Este é um primeiro ponto que distingue Gramsci
como revisionista do marxismo.

Diz Gramsci: "a ideologia foi um aspecto do "sensismo"21"22, tendo como significado original "origem das
idéias". Como no Século XVIII, no Sensismo, a análise era o único método aplicado à ciência, ideologia
significava a análise das idéias; análise sobre sua origem, quais os elementos originais de uma idéia. Segundo
o Sensismo, as idéias derivam das sensações.

Com o passar do tempo, o conceito de ideologia como análise sobre a origem das idéias passou a significar, a
ideologia, um sistema de idéias. "Com a filosofia da práxis, ideologia ganhou um novo conceito capaz de
superar o antigo. Tal conceito "exclui que para os fundadores (da Filosofia da Práxis) a origem das idéias
tivesse que procurar-se nas sensações"23. Segundo a Filosofia da Práxis, ideologia, tem que ser analisada
historicamente como uma superestrutura24.

Segundo Gramsci, o erro no ato de considerar o valor das ideologias, é que se dá o nome de "Ideologia" tanto
à uma superestrutura que é necessária a uma determinada estrutura, como à iniciativas individuais. Com isto,
ideologia, ganhou um sentido pejorativo e este sentido estendeu-se muito mais que o não pejorativo. O
processo de tal erro pode ser dito em três pontos:
Ideologia é identificada como algo diferente ou separado da estrutura e diz-se que não são as ideologias que
modificam as estruturas, mas sim, o contrário.
"Afirma-se que uma determinada solução política é ideológica e que, embora se julgue poder modificar a
estrutura, é insuficiente para modificar; afirma-se que é inútil, estúpida, etc."25
Passa-se a afirmar que toda a ideologia é pura aparência, inútil e estúpida.
Entre as ideologias é preciso distinguir dois grupos: 1) as que são historicamente orgânicas e que surgiram
conforme a necessidade que a história apresenta; 2)as que surgiram por iniciativas individuais e racionalistas.
"Na medida em que são historicamente necessárias, têm uma validade "psicológica", "organizam" as massas
humanas, formam o terreno em que os homens se movem, adquirem consciência de sua posição, lutam,
etc.".26 Ao contrário, quando são proveniente de iniciativas individuais criam movimentos individuais,
polêmicas sem muita duração, e, que não trazem solução para os problemas apresentados pela história.

O marxismo tradicional, de modo geral, como um modo de pensar determinado pela estrutura econômica.
Gramsci, considerado um revisionista do marxismo, concebe ideologia como uma concepção de mundo;
combate energicamente qualquer "determinismo"27: "A pretensão de apresentar e expor cada flutuação da
política e da ideologia como uma expressão imediata da estrutura, deve ser combatida teoricamente como um
infantilismo primitivo"28.

Gramsci ao falar de "ideologia" não está preocupado somente com sua definição e sua origem; está também
preocupado com a difusão de uma determinada ideologia.

O processo de difusão da ideologia há basicamente dois momentos progressivos: num primeiro momento é
natural que uma determinada concepção de mundo seja mais difundida entre a classe dirigente; num segundo
momento a ideologia difunde-se na cultura popular.

"Ideologia" pode ser caracterizada como uma concepção de mundo. A concepção mais bem elaborada recebe
o nome de filosofia; no nível mais baixo recebe o nome de folclore, e, em último lugar se encontra o senso
comum.

A filosofia sendo o estágio mais elaborado da concepção do mundo deve possuir um alto grau de coerência:
"o filósofo não somente pensa com maior coerência, rigor lógico e espírito sistemático que os outros homens,
mas conhece toda a história do pensamento, ou seja, é capaz de explicar o desenvolvimento que o pensamento
sofreu até ele; assume, no plano do pensamento, a mesma função assumida pelos especialistas nos diversos
domínios científicos".29

O papel essencial da filosofia é difundir a concepção de mundo dentro do senso comum. Uma filosofia que
nasceu dentro da história, isto é, orgânica deve estender-se até ao senso comum. Qualquer pensamento,
superior ao senso comum (cientificamente coerente), deve permanecer em contato com as camadas populares,
"os simples" e assim ver a origem dos problemas a serem resolvidos visando a melhor direção ideológica.
"Realmente apesar deste contato, Gramsci constata que a verdadeira relação entre filosofia 'superior' e senso
comum é garantida pela política, que assim assegura a unidade ideológica do bloco histórico".30

2.5.1- A função dos intelectuais

De certa forma a função dos intelectuais vem aparecendo ao longo deste trabalho, principalmente quando
abordamos a questão das ideologias em Antônio Gramsci e a questão do intelectual "orgânico".

"Orgânico" é aquele que está junto, trabalha em conjunto, movimenta-se, relaciona-se com aqueles que
representa; não está separado. Os intelectuais não formam um grupo a parte. Os intelectuais são encarregados
pela elaboração e pela difusão das novas concepções de mundo, das novas ideologias. Sendo assim, a
principal função do intelectual, além de ser a de elaborar novas idéias, é ser o elo de ligação entre estrutura e
superestrutura ideológica. Esta última só é válida se for "historicamente orgânica, isto é, necessária a uma
certa estrutura"59. Dizendo de outra forma, uma ideologia só é válida se for historicamente orgânica,
necessária, que nasceu com um objetivo. Assim como uma ideologia também são os intelectuais: se não
movimentarem-se organicamente, a exemplo de um organismo, na concepção de Gramsci, serão inúteis, sem
nenhuma validade; as ideologias que produzem terão o mesma validade, isto é, nenhuma. Isto porque não tem
vínculo orgânico; o intelectual perde o seu sentido. As ideologias produzidas pelos intelectuais desligados das
massas são qualificadas por Gramsci de "elocubraçõezinhas individuais"60
Intelectuais, em Gramsci, está intimamente ligado com o conjunto de sua teoria, em especial, o conceito de
hegemonia. Intelectuais e hegemonia relacionam-se mutuamente, ou melhor, os intelectuais são
"funcionários" de uma classe que aspire à hegemonia, à direção. O intelectual, além de formular a ideologia
da classe que representa, é encarregado de sua difusão, para que a ideologia se torne hegemônica.

CONCLUSÃO

O que deu grande impulso para a teoria de Marx foi ter ele presenciado na Inglaterra a miséria, a fome,
menores trabalhando em troca de sua subsistência, enfim, ver toda a situação de exploração e precárias
condições de vida, produtos da dupla Revolução e do capitalismo nascente.

No decorrer deste estudo procuramos responder à questão proposta "Gramsci: Uma Alternativa para o
Marxismo? Depois de ter estudado o marxismo tradicional e o pensamento de Gramsci, depois de uma análise
e comparação dos conceitos de um e de outro, concluímos por uma resposta afirmativa a esta questão:
Gramsci constitui uma alternativa para o marxismo. Isto não significa que este estudo quer ser a última
palavra neste assunto, mas quer ser uma tentativa de ressaltar a importância deste pensador que tem tido muita
influência no Brasil, também no meio acadêmico, principalmente a partir da década de 60.

Gramsci direciona sua crítica mais ao rumo que o marxismo tomou depois de Marx, isto é, à cristalização da
teoria marxista. Com isto, Gramsci reacende dentro do marxismo o conceito de revolução. A transformação –
revolução – proposta por Gramsci é lenta, gradativa e sólida. A transformação social tem sua base no
crescimento do nível cultural, na formação da consciência, na formação intelectual e moral. Isto explica a
grande importância que Gramsci dá ao intelectuais orgânicos, o partido político e à escola como um lugar de
formação intelectual e moral igual para todos.

Com certeza, Gramsci é muito atual, fala diretamente para a realidade brasileira, ou melhor, para todos os
países não oferece educação para todos, tem um sistema escolar que reproduz as desigualdades sociais.
Gramsci nos inspira a trabalhar para que todos tenham acesso à escola, ao desenvolvimento da consciência, ao
desenvolvimento cultural.

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