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A obra é centrada numa das mais enigmáticas perguntas jamais feita neste
planeta Terra: “Que Vos Parece do Cristo?”, formulada por ele mesmo aos
seus discípulos.
ROHDEN alerta a seus leitores: “As páginas deste livro são dedicadas à
cristicidade individual de alguns, e não ao cristianismo social de muitos. Os
muitos condenarão este livro como heresia, e têm razão; mas é precisamente
este caráter herético a maior prova da sua autenticidade crística.
“Vós fareis as mesmas obras que eu faço, e fareis obras maiores do que
estas”. Eis aí implicitamente a resposta suficiente e total. Sim, nós estamos
nele e ele está em nós. Tudo é possível.
A conhecida lei de Lavoisier diz que “na natureza nada se crea e nada se
aniquila, tudo se transforma”, se grafarmos “nada se crea”, esta lei está certa
mas se escrevermos “nada se cria”, ela resulta totalmente falsa.
Antes de tudo, prevenimos o leitor que este livro não pretende justificar alguns
dos numerosos tipos de cristianismo que, há diversos séculos, existem nos
países ocidentais daquém e dalém-mar.
Damos plena razão a Nietzsche que, no princípio deste século, escreveu: “Se o
Cristo voltasse ao mundo em nossos dias, a primeira declaração que faria ao
mundo cristão seria esta: Povos cristãos, sabei que eu não sou cristão”.
A única coisa que pode haver é uma experiência crística individual, mas
nunca uma organização cristã social. Diversas pessoas têm tido e têm
experiência crística; e onde há muita plenitude há necessariamente um
transbordamento. Se houvesse muitos homens individuais com genuína
experiência crística, o mundo social seria grandemente beneficiado por essa
plenitude individual.
O nosso mundo conturbado não pode ser sanado por nenhuma nova
organização, religiosa ou civil; somente a experiência mística de muitos pode
beneficiar realmente a humanidade.
Durante quase três séculos, do ano 33 até 313, a cristandade das catacumbas
vivia dessa cristicidade mística, sem nenhuma organização social. E foi este o
período mais glorioso do mundo cristão, o período da verticalidade mística das
catacumbas, cuja única saída era para o martírio no Coliseu.
Sabemos que no ano 33, foi Jesus entregue à morte pelo beijo de um de seus
discípulos – mas muitos ignoram que o mesmo Cristo, no ano 313, foi
assassinado pelo beijo de outro discípulo dele, o primeiro imperador cristão
Constantino Magno. O beijo de Judas matou o corpo de Jesus – o beijo de
Constantino matou o espírito do Cristo.
Judas versus Jesus.
O beijo com que Constantino Magno traiu o Cristo foi o Edito de Milão, do ano
313, que pôs termo a três séculos de perseguição – mas com este benefício de
discípulo preludiou séculos de malefícios de traidor: convidou os discípulos do
Cristo a se integrarem na organização do Império Romano; fez do cristianismo
a religião oficial do Estado, uma religião estatal, defendida mediante armas,
política e dinheiro – armas para matar os inimigos, política para enganar os
amigos, dinheiro para comprar e vender consciências.
***
***
“Vós fareis as mesmas obras que eu faço, e fareis obras maiores do que
estas.”
A pergunta que serve de título a este livro foi feita, há quase 2000 anos, por
Jesus aos chefes da Sinagoga de Israel. E eles responderam que o Cristo era
filho de David, isto é, um descendente do rei de Israel, pai de Salomão.
Jesus não aceita a resposta, porque, de fato, o Cristo não é filho de David.
Esta confusão entre Cristo e Jesus é, pois, antiquíssima, e continua até hoje.
“No princípio era o Logos, e o Logos estava com Deus, e o Logos era Deus”.
A Vulgata Latina traduz Logos por Verbo: “No princípio era o Verbo...”.
Neste sentido, o Cristo é Deus, mas, não é a Divindade. E neste sentido diz ele
aos HOMENS: “Vós sois deuses”; os homens são manifestações individuais da
Divindade Universal. A primeira e mais perfeita das manifestações da
Divindade Universal, no Universo, é o Cristo, o Verbo, o Logos, que Paulo de
Tarso chama acertadamente “o primogênito de todas as creaturas” do
Universo.
O Cristo é Deus, mas não é a Divindade, que Jesus designa com o nome Pai:
“Eu e o pai somos um, mas o Pai é maior do que eu”.
Deus, na linguagem de Jesus significa uma emanação individual da Divindade
universal.
Parece, pois, que as Potências Creadoras (em hebráico Elohim) são idênticas
ao Logos, pelo qual foram creadas todas as coisas.
Elohim, Logos, Verbo, Cristo – são nomes vários que designam a creatura
cósmica que, antes do mundo material, emanou da Divindade transcendental.
Panta rhei, tudo flui, diziam os filósofos antigos; tudo é relativo, escreve
Einstein em nosso século.
Todos os avatares sabem, pela voz da sua consciência, que não há evolução
sem resistência, sem luta, sem sofrimento. E, como nas regiões superiores do
espírito não há suficiente resistência e sofrimento, resolve o avatar descer a
regiões inferiores da matéria em busca da necessária resistência.
Quanto mais liberto se sente o avatar tanto mais desejo tem ele de se
escravizar voluntariamente por amor.
Muitos pensam que o amor do avatar vise os seres inferiores no meio dos
quais ele encarna. Mas a verdade é que o amor do avatar visa sobretudo o
próprio avatar e sua evolução superior. Como já dissemos, não há nenhum
resquício de egoísmo nesse auto-amor, que é supremo imperativo cósmico e
divino: sede perfeitos, como perfeito é vosso pai.
“Da sua plenitude todos nós recebemos, graça e mais graça,” diz o texto sacro
com referência ao maior dos avatares.
Esses seres superiores que realizam a sua própria plenitude são os benfeitores
ignotos de outros seres. Não é possível ser realmente bom sem fazer bem a
outros seres devidamente receptivos.
Dizem alguns teólogos que Paulo transformou o humilde Jesus da Galiléia num
herói e redentor do mundo, à maneira dos super-homens dos escritores
gregos.
Sobretudo nas Epístolas aos Colossenses, aos Efésios e aos Filipenses, exalta
Paulo as glórias do Cristo cósmico, que bem pouca semelhança tem com o
singelo Jesus dos evangelistas. “No Cristo converge como na cabeça tudo
quanto existe no céu e na terra”. O Cristo é “superior a todos os principados,
potestades, virtudes e dominações, e que outro nome haja, não só neste
mundo, mas também no outro – ele, que de tudo enche o Universo inteiro”.
A confusão que certos teólogos fazem entre Deus e Divindade, tem dado azo
a controvérsias seculares e milenares. Segundo os livros sacros, sobretudo na
visão de João e de Paulo, o Cristo é Deus, mas não é a Divindade, que ele
chama “Pai”, que está no Cristo e no qual o Cristo está, mas “o Pai é maior do
que eu”. Deus, à luz dos livros sacros é a mais alta emanação individual da
Divindade Universal, portanto creatura da Divindade, o “Primogênito de todas
as creaturas”.
Em face disto, compreende-se que Pedro, numa das suas epístolas previna os
cristãos daquele tempo, dizendo que, nos escritos do irmão Paulo, há certas
passagens difíceis que os ignorantes pervertem para sua própria perdição. De
fato, para Pedro e os outros pescadores galileus, deve ter sido difícil ter uma
visão exata do Cristo cósmico do erudito ex-rabino e iluminado vidente do
Cristo-Logos. Uma intuição cósmica nunca é exprimível em termos de análise
intelectual. Tanto em nossos dias como naquele tempo persiste esta mesma
dificuldade. Ainda hoje há filósofos e teólogos que consideram Paulo de Tarso
como um falsificador dos Evangelhos, como um contrabandista que tenha
introduzido no cristianismo um Cristo Cósmico ao lado do singelo Jesus
nazareno. Entretanto, o Cristo de Paulo é o mesmo Nazareno descrito pelos
Evangelistas, mas visualizado da excelsa perspectiva do Logos pré-histórico,
que também João, o místico, descreve no início do seu Evangelho: “No
princípio era o Logos, e o Logos estava com Deus, e o Logos era Deus”.
Então levou Jesus Tomé à parte e afastou-se com ele; e falou com ele três
palavras. E, quando Tomé voltou a ter com seus companheiros, esses lhe
perguntaram: que foi que Jesus te disse? Tomé lhes respondeu: Se eu vos
dissesse uma só das palavras que ele me disse, vós havíeis de apedrejar-me –
e das pedras romperia fogo para vos incendiar”.
O sentido profundo destas palavras não pode ser falado, mas tão-somente
calado. E é por esta razão que Tomé preferiu o silêncio, quando o Mestre lhe
pediu opinião sobre ele.
A última verdade sobre o Cristo não pode ser dita nem pensada. O que se
pode pensar, já está adulterado; e, se o pensado for falado, há uma segunda
deturpação; e se esse pensado e falado for escrito, completa-se a terceira
falsificação da verdade.
Quem quer saber realmente o que o Cristo é, deve calar-se em tão profundo
silêncio receptivo que a cosmo-plenitude possa plenificar a sua ego-vacuidade.
Podemos apenas soletrar o abc sobre o Cristo, mas, para saber e saborear
realmente o que ele é, temos de entrar na Universalidade Cósmica do silêncio.
O que há de mais estranho nessa passagem são as palavras que Jesus disse
a Tomé: “Eu não sou teu Mestre”, porque já ultrapassaste o Jesus humano e
entraste na visão do Cristo divino; bebeste do cálice da sabedoria suprema, e
por isto preferiste calar-te.
Esta revelação anônima e inefável que o Mestre fez a Tomé é um dos pontos
culminantes do Evangelho. À pergunta “que vos parece do Cristo?” opõe Tomé
o silencio absoluto, que é a melhor resposta.
“CRISTO, O PRIMOGÊNITO DE TODAS AS CREATURAS”
Com estas palavras declara Paulo de Tarso que o Cristo cósmico, o Verbo, o
Logos, é creatura – mas não nega que ele é Deus. Ele é a primeira de todas as
creaturas – cósmicas, mão humanas – que emanaram da eterna Divindade. Ele
não é essa Divindade, tanto assim que o próprio Cristo afirma que a Divindade,
que ele chama “Pai”, é maior do que ele.
Se ele não tivesse dito o Pai é maior do que eu, poderíamos pensar que ele
se tivesse igualado à Divindade. Mas ele nega expressamente a sua identidade
com a Divindade, apesar de se dizer Deus.
Façamos uma comparação ilustrativa: um ser vivo pode dizer; eu estou na vida
e a vida está em mim, mas eu não sou a vida, sou apenas um vivo; a vida é
infinitamente maior do que eu.
Quando Jesus, citando uma passagem da Bíblia do Antigo Testamento, diz aos
Judeus: “Vóis sois deuses”, toma ele a palavra Deus no sentido de creatura.
O texto grego do quarto Evangelho favorece esta explicação, quando diz: “No
princípio era o Logos (Cristo, Verbo) e o Logos estava com a Divindade, e o
Logos era Deus”. Quando o grego usa “Theós” sem artigo, devemos entender,
um Deus, quando usa “ho-Theós”, com artigo definido, “devemos entender a
única Divindade”.
É O CRISTO O FILHO UNIGÊNITO DO PAI?
Acima de tudo, devemos lembrar, que a palavra pai equivale a “Divindade”, que
nada tem que ver com uma pessoa, como é usado na língua tradicional.
A palavra “Filho”, no sentido comum, supõe um Pai e uma Mãe; ninguém é filho
só de um pai, ou só de uma mãe. A bipolaridade Universal da natureza viva só
conhece filho como produto de um pai e de uma mãe.
Mas, na Divindade não há pai nem mãe, nem doador nem receptora, nem
dativo nem receptivo, nem positivo nem negativo. A Divindade é absolutamente
neutra, embora esse neutro contenha implicitamente o pólo positivo e o pólo
negativo, o doador e o receptor.
Nesse sentido, o Cristo não é filho. Na Divindade não há nem gerador nem
geradora, não há pai nem mãe.
Salomão diz que a sabedoria de Deus brinca todos os dias, brincando sobre
toda a redondeza da terra.
E a filosofia oriental afirma que Brahman, a Divindade, faz lila, ou bailado, com
maya, a natureza.
Falando do Verbo, do Cristo-Logos, diz o quarto Evangelho que “por ele foram
feitas todas as coisas, e nada do que foi feito, foi feito sem ele ”.
Com isto, ao que parece, refere-se ele à sua existência cósmica anterior à
creação do Universo material, realizada por ele. Parece, dizem alguns, que a
creação do mundo material diminuiu a glória do Creador Cristo, e ele reentra
agora no esplendor da sua glória pré-mundial.
O Uno da Divindade Universal abstrata como Ser revela-se pelo Deus concreto
do Agir, e assim é por nós cognoscível.
O Cristo, é, pois, o “Teo-gênito, o filho da Divindade”, ao passo que nós e o
mundo somos Cristo-gênitos, e não diretamente Teo-gênitos. Em última
análise, é claro, tudo é Teo-gênito, nascido da Divindade. Do Uno do Absoluto,
do Infinito, nasce todo o Verso dos relativos, dos finitos. O Uni-verso é o
Creador e as creaturas.
................................................................................................. vida,
Trevas ..............................................................................................
Esta vida, porém, atingiu no mundo hominal a perfeição da luz, isto é, da vida
consciente. E as trevas do mundo inconsciente não prenderam a luz do
consciente; as trevas inconscientes não extinguiram a luz do consciente.
A creação não é algo separado do Infinito, assim como uma centelha que salta
da fogueira. A creação é comparável ao processo do pensamento em relação
ao pensador. O pensamento que o pensador pensa não é algo separado do
pensador, mas é o próprio pensador enquanto pensante. O pensamento é uma
manifestação parcial e imanente do próprio pensador.
Assim, a creatura está no Creador, é uma manifestação parcial e imanente no
Creador, é uma existêncialização finita da Essência infinita.
Hoje em dia, já se fala no Cristo interno no homem. Aliás, esse Cristo interno já
aparece nos evangelhos, sobretudo na parábola da videira e seus ramos: a
mesma seiva divina que circula no tronco da videira circula também nos ramos
dela, isto é, o espírito divino, que é o Cristo em Jesus, é Idêntico ao espírito
divino que existe em todos os seres humanos. Jesus afirma que a presença de
Deus é uma realidade em todo o ser humano- “o Pai está em mim, o Pai
também está em vós” – mas a consciência e atuação do espírito divino, varia
de pessoa à pessoa. A presença de Deus é a mesma em todo o homem, mas o
que cristifica o homem é a consciência e a vivência dessa presença divina. Diz
o Mestre!
“Aquele que em mim está, mas não produzir fruto, será cortado e jogado ao
fogo e destruído; mas aquele que em mim está e produzir fruto, será podado
(purificado) para que produza fruto ainda mais abundante”.
Com estas palavras, afirma o Mestre a presença real do Cristo divino em toda a
creatura humana, ao passo que a atuação subjetiva desse Cristo interno
depende da consciência do Homem. A despeito da presença objetiva do Cristo
no homem, pode o homem perecer espiritualmente, o que acontecerá se o
homem não viver de acordo com esse espírito. Mas, se a presença objetiva do
Cristo no homem produzir uma vivência subjetiva em harmonia com esse
espírito, então esse ramo humano da videira divina será podado, ou purificado,
a fim de produzir fruto mais abundante. A poda dos ramos da videira se faz no
início da primavera, para que a seiva se concentre em pequeno espaço, e
rompa com maior força, produzindo fruto vigoroso. Essa poda equivale a uma
espécie de sofrimento da planta; a videira “chora”, diz o povo, porque do
ferimento do ramo caem pingos de seiva vital e umedecem o solo. Quem vive
de acordo com o espírito do Cristo passa por uma “sofrimento-crédito” para se
tornar ainda mais espiritual. A espiritualidade não preserva o homem do
sofrimento, como se vê pela vida do homem justo Job, e pela própria vida de
Jesus; o sofrimento-crédito acompanha a evolução espiritual do homem. No
princípio, esse sofrimento é compulsório, como mostra a vida de pessoas
espirituais; só mais tarde passa esse sofrimento a ser um sofrimento voluntário,
como aconteceu a Jesus, que aceitou espontaneamente o sofrimento causado
pelo processo da sua cristificação: “Ninguém me tira a vida; eu deponho a
minha vida quando eu quero, e retomo a minha vida quando eu quero”. Não há
evolução sem resistência. A dor, o sofrimento é uma resistência, provocada
pela atuação do Eu superior sobre o ego inferior. Até na pessoa humana de
Jesus houve um resto dessa resistência evolutiva, Jesus pede que o sofrimento
passe dele; mas ao mesmo tempo o seu Cristo aceita livremente o sofrimento
“para assim entrar em sua glória”.
Também as palavras do Cristo “eu sou a luz do mundo – vós sois a luz do
mundo” exprimem a mesma identidade da luz do Cristo em Jesus e em outros
homens. Mas essa identidade da luz tem muitos graus de intensidade e
manifestação; em muitos homens, a luz está sob o velador opaco do ego, ao
passo que em Jesus estava ela no alto do candelabro da sua consciência
crística.
Em Deus não há pessoa, nem uma, nem duas, nem três pessoas.
Quando o Cristo se diz Deus, afirma ele que é uma manifestação individual da
Divindade, mas não faz de si uma parcela ou pessoa da Divindade, como não
faz dos homens parcelas ou pessoas da Divindade. Nenhuma creatura é
parcela ou centelha, da Divindade, como querem os poetas; se a Divindade se
parcelasse, ela se diminuiria na razão direta do seu parcelamento.
Desde o princípio do quarto século até o século 20 foi a igreja dominada pelo
aristotelismo analítico, sobretudo de Tomás de Aquino; ultimamente há uma
crescente prevalência do neoplatonismo intuitivo, que, como dissemos, era a
filosofia dos luminares do cristianismo nos primeiros séculos.
Neste mesmo sentido monista, podem ser aceitas três pessoas como funções
da Divindade: A Essência Una se manifesta incessantemente como existência
iniciadora, continuadora e consumadora.
Entretanto, o próprio Jesus nada sabe dessa suposta salvação; ele mesmo
nunca afirmou que viera ao mundo para este fim.
“Ele (o Cristo), que estava na glória de Deus, não julgou necessário aferrar-se
a esta divina igualdade; mas esvaziou-se dos esplendores da Divindade e se
tornou homem, servo, vítima, crucificado. Por isto, Deus o exaltou
soberanamente e lhe deu um nome que está acima de todos os nomes, de
maneira que, em nome do Cristo, se dobram todos os joelhos, dos celestes,
dos terrestres e dos infra-terrestres, e todos confessam que ele é o Senhor”.
Quanto é pouco liberto não tem desejo de se escravizar – mas quem é muito
liberto se escraviza voluntariamente.
Os horrores que Jesus sofreu no fim da sua vida terrestre são totalmente
incompreensíveis senão à luz dessa gloriosa antidromia. Para que ele
pudesse dizer, na cruz, a sua última e mais gloriosa palavra “está consumado”,
quis ele humilhar-se até o ínfimo nadir da servidão, do vilipêndio, da infamação
voluntária. No fim da sua vida terrestre, como se estivesse com pressa, reúne
Jesus tudo que se possa imaginar de horrível e infamante. E, como se os
sofrimentos físicos não lhe fossem suficientes, acrescentou sofrimentos
metafísicos.
Jesus, porém, não desceu da cruz, não deu esta prova suprema da sua
messianidade, tomando sobre si o opróbrio de ser um falso Messias, de
enganar o povo com três anos de imposturas e magia negra.
E seus discípulos e amigos, que ouviram este grito de abandono, que deviam
eles pensar? Sua mãe, seu discípulo amado João, sua ardente discípula
Madalena, todos eles ouviram que seu querido Mestre se confessou
abandonado por Deus... E como podiam eles continuar a amá-lo e seguí-lo se
o próprio Deus o havia abandonado?...
Esta crudelíssima decepção dos seus devotados amigos e discípulos deve ter
sido o derradeiro passo, nessa marcha acelerada rumo à auto-difamação e ao
ego-esvaziamento.
Jesus, vendo, através dum véu de sangue, sua mãe e seu discípulo, ao pé da
cruz, disse à mãe: “Eis aí teu filho”, e disse ao discípulo: “Eis aí tua mãe”.
Depois de se desfazer desses últimos tesouros que ainda tinha na terra, estava
ele totalmente liberto de tudo e de todos, e seu Cristo podia dizer: “Está
consumado”. E por fim: Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”.
Bem sabia Jesus que nenhuma libertação – seja política, social ou moral – é
possível sem a libertação individual; e ele sempre falou desta libertação, que
ele mesmo possuía no mais alto grau. Qualquer outra libertação periférica era
para ele uma pseudo-libertação, pela qual nunca se entusiasmou com grande
decepção de seus conterrâneos e discípulos. Perante o governador romano,
como já mencionamos, poucas horas antes da sua condenação à morte,
afirmou o Nazareno: “Eu sou rei, mas o meu reino não é deste mundo”.
Sendo que Jesus possuía em grau supremo esta liberdade, não podia ele
interessar-se por nenhuma liberdade ou libertação que não fosse a
emancipação do homem da tirania da sua velha egocracia e a proclamação da
gloriosa Cristocracia.
Neste sentido resumiu ele toda a sua política e filosofia, sobretudo nas palavras
lapidares “conhecereis a verdade – e a verdade vos libertará”. Para ele, como
para todos os verdadeiros iniciados, a liberdade é o produto do conhecimento
do homem sobre si mesmo, um auto-conhecimento vivido como auto-
realização. Verdade, liberdade, felicidade – esta trilogia é o centro da sua
vivência individual e o cerne da mensagem do Cristo à humanidade.
E, por ser tão radicalmente feliz, podia Jesus permitir qualquer sofrimento,
porque nenhum sofrimento, nem a própria morte podem destruir a verdadeira
felicidade baseada no conhecimento e na vivência do Eu divino.
Segundo os teólogos, quer dizer que o homem, desde o princípio, por obra de
satanás, caiu no pecado, herdado depois por todos os homens; a humanidade
toda é pecadora desde o nascimento, e cada homem se torna cada vez mais
pecador por pecados pessoais.
Quer dizer que o homem é um grande devedor, por herança e por atos
próprios, e Deus é o grande credor. E, como o devedor é totalmente
insolvente, incapaz de pagar a Deus os seus débitos, a humanidade está
radicalmente falida perante a justiça divina, isto é, vítima de eterna
condenação. Deus exige imperiosamente o pagamento da dívida que a
humanidade contraiu, Deus se sente ofendido com os pecados da humanidade
e exige satisfação. A dívida da humanidade é de infinita gravidade, como ouvi
no catecismo e no curso de teologia – mas como a humanidade, falida e
insolvente, poderia pagar a Deus um débito infinito?
E assim, graças à morte de Jesus, nós somos salvos, libertos de toda a dívida
de nossos pecados, reconciliados com Deus.
Antes de tudo, é absurdo supor que uma creatura finita possa cometer uma
falta de gravidade infinita.
É repugnante a idéia que Deus seja vingativo e não queira perdoar a suposta
ofensa de pobres creaturas.
***
De que modo?
O pecado é, pois, uma voluntária inversão das leis eternas. Essa inversão só
se pode dar pela ilusão do ego. Mas, quando a verdade do Eu supera a ilusão
do ego, então surge a redenção do homem.
Entretanto, o cristianismo do primeiro século não achava isto tão evidente; para
os primeiros cristãos, a paixão e morte de Jesus eram um tenebroso enigma,
como Frei Leonardo Boff, faz ver no seu livro “Jesus Cristo Libertador” (Editora
Vozes). Era-lhes incompreensível porque Jesus, que, durante 33 anos,
desafiara vitoriosamente as ciladas dos seus inimigos, se entregasse, nos
últimos dias, à sanha deles, dizendo: “Esta é a vossa hora e o poder das
trevas”. E se deixou prender voluntariamente.
Mas, mesmo assim, não foi geralmente aceita pelo cristianismo primitivo esta
solução. O próprio Jesus, que diversas vezes predisse a sua morte e
ressureição, nunca afirmou que ia sofrer e morrer pelos pecados da
humanidade. Muitos cristãos viam na morte do Nazareno a continuação da
sorte de quase todos os profetas antigos: o justo não é tolerado pelos
pecadores, no meio dos quais vive, e sofrer morte violenta. A idéia de uma
morte expiatória não era opinião geral no primeiro século, e não deve ser
“absolutizada”, como frisa o referido livro.
A idéia duma alo-redenção, duma morte expiatória, como se vê, teve origem no
judaísmo, e não no cristianismo. Nem Jesus nem os quatro evangelistas se
referem a essa idéia de que Jesus tivesse morrido para pagar os pecados da
humanidade – tanto mais que, segundo os teólogos cristãos, todo homem,
ainda hoje, nasce outra vez em pecado. Nem o Quinto Evangelho, do Apóstolo
Tomé, recentemente descoberto no Egito, se refere com uma só palavra à
morte de Jesus por causa dos pecadores.
Toda a creatura, por mais evolvida, pode evolver ainda mais, porque a
evolução é um processo indefinido e jamais definidamente terminado. O Cristo,
segundo João, era o “Unigênito do Pai”, e, segundo Paulo, era o “Primogênito
de todas as creaturas”; isto é, era “gênito”, creatura, e toda a creatura, mesmo
teo-gênita ou primogênita, é finita e pode realizar ulteriormente a sua evolução,
pode entrar numa glória maior. Jesus, apesar de tão altamente evolvido já ao
entrar na vida terrestre, podia evolver ulteriormente, sob os auspícios do Cristo
divino, como ele mesmo dá a entender no Gólgota. Quando diz “está
consumado” dá por terminada a sua evolução terrestre, porque entrou em sua
glória.
Refere o Evangelho de João que, depois da última ceia, véspera da sua morte,
levantou-se Jesus e assim falou:
“Pai, é chegada a hora. Glorifica-me agora com aquela glória que eu tinha em
ti, antes que o mundo fosse feito”.
“Não devia então o Cristo sofrer tudo isto para entrar em sua glória?”
Na última ceia, pede Jesus ao Pai que lhe restitua a glória que ele tinha em
Deus; e aos discípulos de Emaús declara ele que entrou novamente em sua
glória, pela voluntária inglória do sofrimento e da morte.
Paulo de Tarso escreve aos cristãos de Filipes que o Cristo, graças a essa
voluntária inglória, foi “super-exaltado” a uma glória maior do que tivera antes.
Quando uma entidade de alta evolução entra num ambiente de baixa evolução,
ingressa numa zona de resistência, de oposição, de sofrimento, de crucifixão.
Entre a glória e a glória maior jaz a inglória – a gloriosa inglória dos grandes
avatares.
Existem numerosos livros que afirmam que Jesus passou a sua juventude,
entre 12 e 30 anos, em países estrangeiros, no Egito, na Índia, no Tibet.
Em face desse silêncio total, não podemos admitir como provável que Jesus
tenha estado no Egito, na Índia, no Tibet, ou em outro país longínquo, nem
como Mestre, nem mesmo como discípulo.
Lucas, o consciencioso historiador, liquida com uma única frase esses 18 anos
de auto-iniciação, dizendo: “E Jesus foi crescendo em graça e sabedoria,
perante Deus e os homens”.
Por espaço de cerca de 2000 anos, desde Abraão, ou, pelo menos, desde
Moisés, praticou Israel a cerimônia do bode expiatório. Cada ano reunia-se o
povo de Israel na esplanada do templo de Jerusalém. O sumo sacerdote
colocava as mãos sobre a cabeça de um cabrito, transferindo para esse animal
os pecados do povo. Depois, esse “bode expiatório” era tocado para o deserto
e precipitado por um barranco abaixo, onde morria. E com ele morriam todos
os pecados de Israel, como era crença geral. Um mensageiro voltava, agitando
uma bandeira branca e exclamando: “Deus extinguiu os pecados de seu povo,
aleluia! aleluia!” E havia grande alegria em Israel, porque todos se sentiam
como carta branca – e podiam carregar de novo o carro de lixo para o próximo
ano.
Israel não celebra mais o ritual do bode expiatório. Com a destruição do templo
de Jerusalém, no ano 70, e a dispersão dos Judeus por todos os quadrantes do
Império Romano, terminou também a cerimônia do bode expiatório. O novo
Estado de Israel, criado há poucos decênios não voltou a praticar esse
simbolismo.
Esta ideologia se baseia em diversos equívocos. Supõe que Deus possa ser
ofendido por suas creaturas – quando até homens avançados como Mahatma
Gandhi, atingem uma completa inofendibilidade. Quem não se sente ofendido
não precisa vingar-se nem perdoar; mas, quem se sente ofendido, pode vingar-
se da ofensa, ou então perdoá-la. Deus, porém, o Deus da teologia, ofendido
pelos homens, não se vinga, nem perdoa, mas exige satisfação pela ofensa.
Mas, como o homem é pecador é insolvente, incapaz de saldar o seu débito,
Deus exige que um homem não pecador pague o débito dos devedores. E,
como o único homem sem pecado é Jesus, é ele considerado como único
pagador capaz de extinguir os pecados da humanidade. E o pagamento só
pode ser feito com sangue, com o sangue inocente do único homem sem
pecado. O bode expiatório Jesus tem de morrer, derramando o seu sangue,
para que o Divino Credor ofendido se dê por satisfeito. Tomás de Aquino,
considerando o maior teólogo cristão, diz, num dos seus poemas espirituais,
que uma única gota do sangue de Jesus seria suficiente para pagar todos os
débitos da humanidade, mas que Jesus, por excessiva bondade, quis derramar
até a última gota do seu sangue para pagar os pecados da humanidade.
Mas, como pode um pecador absolver-se dos seus pecados? Não é isto um
círculo vicioso?
Assim seria se o homem fosse apenas o seu ego pecador, insolvente; mas
todo o homem é também o seu Eu redentor; apesar de ser pecador na sua
periferia humana, continua a ser sem pecado no seu divino; a imagem e
semelhança de Deus mão se apagou com o pecado. Quem peca é o ego
periférico – quem redime é o Eu central, o “Pai em nós”, o “Cristo interno”.
Sim – e não.
Mas o que, hoje em dia, se entende por igreja é algo totalmente diferente do
sentido primitivo desta palavra. Igreja é, para nós, uma organização social e
hierárquica, com seu chefe humano e com sua constituição jurídica. Tomás de
Aquino defende a igreja como uma sociedade perfeita, dotada de poder
executivo, poder legislativo e poder judiciário. A igreja, segundo este conceito
teológico, desenvolvido desde o quarto século, é uma organização estatal, cujo
funcionamento obedece às mesmas normas de qualquer outro governo.
No Evangelho, porém, a palavra igreja nada tem que ver com este conceito.
Todo o Evangelho do Cristo gravita em torno do conceito central do “reino de
Deus”, ou “reino dos céus” – e esse reino coincide exatamente com o que o
Evangelho entende por igreja.
O Mestre nega explicitamente que o reino de Deus possa ser descoberto por
meio de observação; que ele tenha localização geográfica, e possa apontá-lo a
dedo, dizendo: aqui está o reino, acolá está o reino.
Depois, resumindo tudo, termina ele: O reino de Deus está dentro de vós.
A tradução “está entre vós”, como se fosse um fenômeno apenas social, é
falsa; tanto o texto grego do primeiro século como o texto latino posterior dizem
“está dentro de vós”, isto é, no interior da alma humana. Com isto nega o
Mestre que se trate de uma organização social, com sua constituição, seus três
poderes: executivo, legislativo e judiciário.
A verdadeira igreja do Cristo nada tem que ver com organização social ou
jurídico-legal.
A igreja visível foi fundada pelos homens, pelos teólogos, e pode coexistir com
a igreja invisível, assim como o corpo é o aspecto material da alma espiritual.
Mas seria absurdo dizer que a alma tem cabeça, pernas, braços, etc.
Já no primeiro século escrevia Paulo de Tarso aos cristãos: “Aos que, entre
vós, são infantes em Cristo, dei-lhes leite para beber – mas aos que são
adultos em Cristo, dei-lhes comida sólida”.
Vinte séculos não foram suficientes para que muitas dessas crianças se
tornassem adultas em espírito. A evolução vai com passos mínimos em
espaços máximos.
Não basta dizer e fazer – é necessário ser, em espírito e verdade, aquilo que
recomendamos aos outros.
INSTITUÍU JESUS A PEDRO COMO PEDRA
FUNDAMENTAL DA IGREJA?
É esta a convicção de Agostinho, que ele nunca revogou, nem mesmo no seu
livro posterior “Retractationes”.
Quem confessa o Cristo como suprema e única rocha da igreja está de acordo
com o Evangelho e com as palavras do próprio Cristo.
O CORPO DE JESUS ERA MATERIAL?
Era tanto material como astral – se por astral entendemos estado de pura
energia.
A ciência de hoje não admite mais a diferença essencial entre material e astral.
A ciência é, hoje em dia, altamente monista ou unitária: os 92 elementos da
química, de que são formadas todas as coisas, são fundamentalmente luz, luz
cósmica, invisível. A luz é a mais alta vibração do mundo conhecido. Quando a
luz cósmica diminui de vibração, aparece a luz visível das estrelas e dos sóis.
Quando a luz continua a diminuir de vibração, aparece a energia (astral). E,
quando a energia continua a se passivizar (congelar), aparece a matéria
perceptível.
Quanto maior é a vibração, tanto mais real é uma coisa – e quanto menor a
vibração, tanto menos real.
Esse estado sem gravidade e visibilidade pode ser chamado corpo astral,
energético, ou bioplásmico.
Neste estado carismático fez ele eclodir o Eu divino dos 120 discípulos, após
uma longa incubação de três anos e uma intensa introspeção de 9 dias de
silêncio e meditação. Essa metamorfose dos 120 era um estado permanete de
consciência e de vivência do Cristo interno.
Sim – e não.
Não era um curador no sentido usual da palavra. Não curava por meio de
passes, nem com vibrações mentais.
Bem sabia Jesus que o verdadeiro mal não está no corpo, mas na alma, e que
não adianta reprimir os efeitos, enquanto persistir a causa. Já no Gênesis foi
dito que as doenças e a morte são creações do pecador, e Paulo de Tarso
repete que “o salário do pecado é a morte”.
Daí essa indiferença de Jesus em face das doenças. Ele é muito mais Mestre
que médico.
Quem esteve na Índia, deve ter estranhado o desinteresse do hindu em face de
caridade e filantropia; parece que está no subconsciente desse povo que o
principal não é curar doenças, mas sim estabelecer contacto com o mundo
espiritual, não tanto na zona corporal, mas sim do espírito.
Sendo que Jesus era o “Filho do Homem”, dava ele a máxima importância
àquele ideal do homem que fora planejado pelos Elohim do Gênesis, mas até
hoje não prevaleceu na humanidade. Aplainar os caminhos da alma é, para
Jesus e a nova humanidade, mais importante do que consertar o corpo da
velha humanidade. Nunca se recusa ele a curar os corpos doentes que lhe
apresentam, mas nunca mostrou interesse em organizar uma campanha
sistemática no sentido de curar todas as enfermidades do seu tempo. Das
alturas da sua visão crística, o que mais o interessava era proclamar o Reino
de Deus, e, uma vez estabelecido este, cessariam, não só os males, mas,
acima de tudo, as maldades, causa daqueles. É esta a lógica genial do
Nazareno, dificilmente compreensível e aceitável para certos cristãos que
costumam pôr o carro diante dos bois.
Alguns desses irmãos de Jesus parecem ter sido filhos de José, oriundos de
um matrimônio anterior; portanto, enteados. Em todas as imagens, mesmo os
mais antigos ícones bizantinos, aparece José invariavelmente como homem
idoso, de cerca cinquenta anos, ao passo que Maria aparece sempre como
uma jovem de uns dezoito a vinte anos.
Se José era viúvo e trouxe para o matrimônio com Maria os filhos dele,
compreende-se porque nenhum deles se tenha tornado discípulo de Jesus, e
nenhum deles acompanhou a morte do Nazareno. A fama do profeta de Nazaré
deve ter enciumado esses filhos de José, que desaparecem na obscuridade.
Esta concepção hominal, por indução vital, e não por contacto material, implica,
naturalmente, na preservação da virgindade, que não é uma finalidade, em si,
mas apenas um fenômeno concomitante da origem da nova humanidade.
Em face disto, é lógico que uma mulher futura fosse a mãe de alguém que
esmagasse a cabeça da serpente.
E não diz Jesus de si mesmo: “Eu venci o mundo?” mas dos seus discípulos e
de outros homens diz ele: “O príncipe deste mundo, que é o poder das trevas
tem poder sobre vós”. Ele distingue nitidamente entre duas humanidades: a
velha humanidade, ainda sujeita ao poder das trevas – e a nova humanidade
que venceu o poder das trevas.
ERA JESUS UM MESTRE BONDOSO?
Ser meigo, ser bondoso, é, para muitos de nós, ser bonachão, bonzinho,
conivente com todas as fraquezas humanas; ser incapaz de rigor para defender
a verdade e a justiça. A idéia que muitos livros dão de um mestre espiritual é
que ele nunca diga não em face das molezas, indisciplinas e misérias dos
outros. Para muitos, o mestre espiritual deve ser, acima de tudo simpático,
deixando tudo como está para ver como fica.
Quando três homens queriam ser discípulos dele, o Mestre não os abraçou
entusiasticamente como maravilhosos idealistas ou espiritualistas, mas
encarou calmamente um destes entusiastas e lhe disse: “As raposas têm
cavernas, as aves têm ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a
cabeça”. E o fogoso candidato desapareceu para sempre.
Um entusiasta declara ao Mestre que quer ser discípulo dele, contanto que o
Mestre lhe permita despedir-se primeiro da sua família. Mas o Mestre lhe
replica: “Quem lança mão ao arado, e depois olha para trás, não presta para o
reino de Deus”. E, com esta trovejante reposta, o candidato sentimental
desaperece para sempre.
Quando o Mestre age com rigor, age sempre em defesa de uma causa
sagrada, e não em defesa de sua personalidade ofendida. Quando alguém lhe
dá uma bofetada, está disposto a receber mais outra. Mas, ai de quem põe em
risco a verdade, a justiça, a sacralidade, o respeito devido aos valores eternos
da vida humana! Em face disto, o Mestre só conhece rigor e disciplina.
É muito comum entre nós encobrir a fraqueza ou covardia espiritual com o véu
colorido de espiritualidade, de bondade, de meiguice humana.
A imensa maioria do nosso mundo social necessita mil vezes mais do rigor da
verdade do que da meiguice da bondade. Amor sem rigor não é muito amor
verdadeiro. Quem é rigoroso consigo mesmo pode ser rigoroso com os outros,
sem faltar à verdade e ao amor.
É possível dizer verdades duras a alguém sem o ofender, se ele percebe que o
rigor é inspirado pelo amor.
Que aconteceu?
Mestre Lucas achou tão importante esse acontecimento que consignou a data
e o momento exato: era às 9 horas da manhã, num domingo, no cenáculo de
Jerusalém.
Do mesmo modo, nenhum homem pode integrar o seu Eu divino sem que
primeiro desintegre o seu ego humano: “Se o grão de trigo não morrer, ficará
estéril; mas, se morrer, produzirá muito fruto”.
Na última ceia, o grão de trigo do ego humano não morreu em nenhum dos
seus discípulos, e por isto não podiam produzir fruto. O Mestre dera a seus
discípulos os símbolos materiais, que não os fizeram produzir fruto espiritual;
tanto assim que, depois desta ingestão dos símbolos, um deles consumou o
crime da traição, e logo depois de suicidou; outro negou três vezes o Mestre e
jurou que não era discípulo dele; e todos, a excessão de um só, fugiram
covardemente, abandonando o Mestre.
“As palavras que vos digo são espírito e são vida – a carne de nada vale... Eu
sou o pão vivo que desceu do céu... Eu sou a ressureição e a vida – quem tem
fé em mim não morrerá, e, ainda que tenha morrido, viverá para todo o
sempre”.
Nesse sentido, disse Jesus, referindo-se ao seu Cristo: “Eu sou o caminho, a
verdade e a vida; quem me segue não anda em trevas, mas tem a luz da vida”.
Esta verdade sugere o seguinte: parece difícil para a creatura humana comum
entrar em contacto com a Divindade, diretamente; a distância é grande demais;
quer dizer a distância interna, a capacidade receptiva do homem é pequena
demais para receber em si algo do grande mar da Divindade transcendente,
que o Cristo chama o Pai. O homem comum necessita de um intermediário, de
um mediador, de um elo interligante, de um Deus-homem, de um Verbo feito
carne, Verbo e carne para estabelecer contacto entre o homem e a Divindade,
entre a Imanência de cá e a Transcendência de lá, entre o Aquém da
humanidade e o Além da Divindade.
A ligação com esse canal-mestre nada tem que ver com ocidente ou oriente,
cristão ou pagão; depende unicamente do estado de consciência de cada
creatura humana. Mahatma Gandhi era, certamente, um canal firmemente
ligado ao canal-mestre do Cristo, embora não fosse oficialmente cristão; era
tão crístico e tão pouco cristão que podia dizer aos missionários cristãos que
procuravam convertê-lo ao cristianismo deles: “Aceito o Cristo e seu Evangelho
– não aceito o vosso Cristianismo”.
Quando Jesus diz “niguém vai ao Pai a não ser por mim”, refere-se ele ao seu
Cristo cósmico, e não a seu Jesus humano. O Cristo cósmico, é único e pode
ter-se homificado muitas vezes – talvez em Moisés, em Buda, em Krishna, em
Gandhi, e em muitos outros seres humanos.
Não há ponto final na evolução de nenhuma creatura; toda a creatura, por mais
evolvida, é sempre ulteriormente evolvível.
A despeito de tudo isto, continua a ser verdade que nenhum homem vai à
Divindade a não ser através do canal-mestre da primeira e mais alta emanação
individual da Divindade Universal.
“EU VENCI O MUNDO”
Ele o diz claramente: “O príncipe deste mundo, que é o poder das trevas, tem
poder sobre vós”.
Logo, o que o Cristo superou foi a humanidade dominada pelo poder das
trevas.
Nesse quase dois mil anos de cristianismo, parece, nunca foi tomado a sério o
conteúdo do Gênesis. Nunca foram devidamente focalizadas as horríveis
maldições que as Potências Creadoras fulminaram sobre a nossa humanidade:
maldição sobre a inteligência simbolizada pela serpente: maldição sobre a
mulher e maldição sobre o homem: “Maldita seja a terra por tua causa”.
A causa que provocou esses anátemas deve ter sido de alcance cósmico,
afetando toda a humanidade do futuro.
Paulo de Tarso, na epístola aos romanos, referindo-se a isto, diz que, até à
presente hora, toda a natureza geme e sofre dores de parto, na expectativa da
revelação dos filhos de Deus, porque nós, que recebemos as primícias do
espírito não realizamos ainda a nossa filiação divina; mas quando o homem se
libertar da sua servidão, também a natureza será liberta da servidão da sua
corruptibilidade.
Quem desviou o homem da sua rota foi ele mesmo, fazendo prevalecer o
lúcifer da sua inteligência sobre o Deus do espírito.
Quando uma linha reta que aponta para o norte se desvia, digamos, por um
milímetro ou menos dessa direção, esse desvio insignificante aumenta
gradativamente, até dar um centímetro, depois um metro, e finalmente um
quilômetro e mais – e o sentido inicial é totalmente desnorteado.
Sobre mim, diz o Mestre o príncipe deste mundo não tem poder algum, porque
eu venci o mundo. Desde o início, tinha ele vencido este mundo da serpente,
porque a origem do corpo de Jesus já obedeceu às leis que dominam a
matéria, e não são dominadas pela matéria. E toda a sua vida terrestre foi
orientada por essa mesma lei que vence o mundo.
O Apocalipse afirma que o Reino dos céus será proclamado sobre a face da
terra, e haverá um novo céu e uma nova terra.
Jesus disse aos seus ouvintes do primeiro século: “Há entre vós alguns que
não verão a morte antes de virem o Reino de Deus em sua glória”. Daí
concluíram os ouvintes que o Reino de Deus se manifestaria antes do fim do
século – e sentiram-se decepcionados, quando nada aconteceu.
Nada aconteceu?
Nessa descrição, não ignorada nos tempos antigos, se inspirou a pintura cristã,
à exceção de alguns raros pintores espanhóis e de Morelli em seu “Cristo
Moribundo”. A carta do procônsul romano diz o seguinte:
“Apareceu e vive estes dias por aqui um homem de singular virtude, que seus
companheiros chamam Filho de Deus. Cura os enfermos e ressuscita os
mortos. É belo de figura e atrai os olhares. Seu rosto inspira amor e temor ao
mesmo tempo. Seus cabelos são compridos e louros, lisos até as orelhas e das
orelhas para baixo crescem crespos, anelados. Divide-os ao meio uma risca e
chegam-lhe aos ombros, segundo o costume da gente de Nazaré. As faces
combrem-se de leve rubor. O nariz é bem conformado e a barba crescida, um
pouco mais escura do que os cabelos e dividida em duas pontas. Seu olhar
revela sabedoria e candura. Tem olhos azuis com reflexos de várias cores.
CRISTIANISMO – CRISTICIDADE
QUE É O CRISTO?
O CRISTO INTERNO
Nasceu na antiga região de Tubarão, hoje São Ludgero, Santa Catarina, Brasil
em 1893. Fez estudos no Rio Grande do Sul. Formou-se em Ciências, Filosofia
e Teologia em universidades da Europa – Innsbruck (Áustria), Valkenburg
(Holanda) e Nápoles (Itália).
Rohden não está filiado a nenhuma igreja, seita ou partido político. Fundou e
dirigiu o movimento filosófico e espiritual Alvorada.
Ao fim de sua permanência nos Estados Unidos, Huberto Rohden foi convidado
para fazer parte do corpo docente da nova International Christian University
(ICU), de Metaka, Japão, a fim de reger as cátedras de Filosofia Universal e
Religiões Comparadas; mas, por causa da guerra na Coréia, a universidade
japonesa não foi inaugurada, e Rohden regressou ao Brasil. Em São Paulo foi
nomeado professor de Filosofia na Universidade Mackenzie, cargo do qual não
tomou posse.
Nos últimos anos, Rohden residia na capital de São Paulo, onde permanecia
alguns dias da semana escrevendo e reescrevendo seus livros, nos textos
definitivos. Costumava passar três dias da semana no ashram, em contato com
a natureza, plantando árvores, flores ou trabalhando no seu apiário-modelo.
À zero hora do dia 8 de outubro de 1981, após longa internação em uma clínica
naturista de São Paulo, aos 87 anos, o professor Huberto Rohden partiu deste
mundo e do convívio de seus amigos e discípulos. Suas últimas palavras em
estado consciente foram: “Eu vim para servir à Humanidade”.
A FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA
O SERMÃO DA MONTANHA
O NOSSO MESTRE
ÍDOLOS OU IDEAL?
ESCALANDO O HIMALAIA
O CAMINHO DA FELICIDADE
DEUS
EM ESPÍRITO E VERDADE
PORQUE SOFREMOS
LÚCIFER E LÓGOS
A GRANDE LIBERTAÇÃO
FILOSOFIA DA ARTE
ORIENTANDO
ROTEIRO CÓSMICO
A METAFÍSICA DO CRISTIANISMO
A VOZ DO SILÊNCIO
A NOVA HUMANIDADE
O HOMEM
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PROFANOS E INICIADOS
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