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Introdução ao Antropoceno

Book · December 2021

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Ulysses Paulino de Albuquerque


Federal University of Pernambuco
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INTRODUÇÃO AO

ANTROPOCENO

ULYSSES PAULINO DE ALBUQUERQUE | THIAGO GONÇALVES-SOUZA [EDITORES]


INTRODUÇÃO AO

ANTROPOCENO
ULYSSES PAULINO DE ALBUQUERQUE
THIAGO GONÇALVES-SOUZA
[EDITORES]

INTRODUÇÃO AO

ANTROPOCENO

1ª edição - 2022
Recife/PE
Primeira edição publicada em 2022 por NUPEEA
www.nupeea.com
Copyright© Os autores, 2022

Impresso no Brasil/Printed in Brazil

Editor-chefe Diagramação
Ulysses Paulino de Albuquerque Erika Woelke | www.canal6.com.br

Revisão Imagem da capa


Verônica Seidel Shutterstock

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(BENITEZ Catalogação Ass. Editorial, MS, Brasil)

I48 Introdução ao antropoceno / Editores Ulysses Paulino de Albuquerque,


1.ed. Thiago Gonçalves-Souza. – 1.ed. – Recife, PE: Nupeea, 2022.
106 p. ; 15 x 21 cm.

Vários autores.
Bibliografia.
ISBN 978-65-88020-10-4 (e-book)
ISBN 978-65-88020-09-8 (impresso)

1. Ações humanas. 2. Antropoceno. 3. Biologia. 4. Planeta Terra –


Transformação. I. Albuquerque, Ulysses Paulino de. II. Gonçalves-Souza,
Thiago.

12-2021/44 CDD 551.07

Índice para catálogo sistemático:


1. Geologia : Estudo e ensino 551.07

Bibliotecária responsável: Aline Graziele Benitez CRB-1/3129

É permitida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, sob


quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia,
distribuição na Web e outros), desde que citada a fonte e a autoria. Distribuição gratuita.

NUPEEA
Recife – Pernambuco – Brasil
APRESENTAÇÃO

Nunca se falou tanto, em diferentes canais de comu-


nicação, sobre como o nosso planeta está passando por um
processo de transformação sem precedentes em sua histó-
ria biológica. “Será que a preponderância das ações humanas
sobre os demais vetores que alteram a história da Terra teria
mesmo tirado o mundo do estável Holoceno, levando-o a essa
nova e ainda desconhecida Época, batizada de Antropoceno?1”.
É importante notar que existe um intenso debate na lite-
ratura sobre a determinação do antropoceno como uma
época (assim como Holoceno ou Pleistoceno) ou como um
evento geológico. Com o intuito de manter a simplicidade
dos conteúdos abordados neste livro, optamos por usar o
Antropoceno como época e recomendar a leitura das refe-
rências que tratam especificamente do debate para aqueles
que desejam se aprofundar nesta temática2.
Foi com essa pergunta que desafiamos os alunos das
disciplinas Ecologia Humana (UFRPE) e Ecologia e Evolução
no Antropoceno (UFPE) a refletir no ano de 2019. Essas

1 Veiga JE. 2019. O antropoceno e a ciência do sistema terra. São Paulo:


Editora 34. P. 20
2 Gibbard PLA, et al. 2021. A practical solution: The Anthropocene is a geo-
logical event, not a formal epoch. Episodes. https://doi.org/10.18814/
epiiugs/2021/021029
Crutzen PJ, Stoermer EF. 2000. The Anthropocene. IGBP Global Change
Newsletter 41:17–18.
disciplinas são ministradas nos cursos de Pós-graduação em
Etnobiologia e Conservação da Natureza e Pós-graduação em
Biologia Vegetal, respectivamente. A proposta, na época, era
de trabalhar os seres humanos na natureza sem perder de
vista o alinhamento com os efusivos debates sobre a emergên-
cia de um novo período na história da Terra, o Antropoceno.
Somado ao desafio da reflexão sobre o tema no debate con-
temporâneo, sugerimos a elaboração de um pequeno livro, de
introdução ao tema, que pudesse ser voltado para os cursos
de graduação, visto ainda termos carência de livros-texto
sobre o assunto. Este segundo desafio foi prontamente aceito
e este livro é o resultado final.
Nosso papel como editores foi de guiar os autores no
amadurecimento de seu material tanto na escrita quanto nas
ideias, o que demandou um natural ir-e-vir de versões, dis-
cussão e novas ideias. Esperamos que você, leitor, possa des-
frutar da leitura deste livro que representa o empenho de
uma nova geração de jovens pesquisadores.

Prof. Dr. Ulysses Paulino de Albuquerque


Professor titular do Departamento de Botânica
da Universidade Federal de Pernambuco

Prof. Dr. Thiago Gonçalves-Souza


Professor adjunto do Departamento de Biologia da
Universidade Federal Rural de Pernambuco
SUMÁRIO

1. O QUE É O ANTROPOCENO?..............................................................9
Paulo Wanderley de Melo, Mirela Natália Santos,
Ezequiel Leandro da Silva Júnior, Paulo Henrique Gonçalves

2. A DOMESTICAÇÃO DA NATUREZA COMO


MARCO DA HISTÓRIA HUMANA.......................................................23
Cicera Janaine Camilo, Catarina Leite Gurgel,
Maria de Oliveira Santos, Risoneide Henriques da Silva

3. A EXTINÇÃO DA MEGAFAUNA NO ANTROPOCENO............................41


Arthur Ramalho Magalhães, Luane Maria Melo Azeredo,
Kamila Marques Pedrosa, Risoneide Henriques da Silva

4. O ANTROPOCENO E A EMERGÊNCIA DAS AÇÕES HUMANAS.............. 59


Ana Claudia Batista Souza, Flávia Regina Domingos,
Julimery Gonçalves Ferreira Macedo, Samara Feitosa Oliveira,
Joelson Moreno Brito de Moura

5. ASPECTOS ECOLÓGICOS, EVOLUTIVOS E SOCIAIS DO ANTROPOCENO:


DO ADVENTO DA AGRICULTURA ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS...........71
Anderson Silva Pinto, Macelly Correia Medeiros,
Moacyr Xavier Gomes Silva, Joelson Moreno Brito de Moura

6. PADRÕES DE DIVERSIDADE NO ANTROPOCENO............................... 85


Djalma Souza, Emily Cavalcanti, Luciana Soares Lima,
Marleny Prada, Paulo Henrique Gonçalves

SOBRE OS AUTORES...........................................................................97

OUTRAS OBRAS DE INTERESSE.......................................................... 105


1
O QUE É O ANTROPOCENO?

Paulo Wanderley de Melo, Mirela Natália Santos,


Ezequiel Leandro da Silva Júnior, Paulo Henrique Gonçalves

Neste capítulo, introduziremos o conceito de Antropoceno e o


papel central exercido pela espécie humana nas transformações
climáticas e ecológicas ocorridas na biosfera terrestre. Nossa
discussão sobre o tema será feita à luz das descobertas científicas
sobre os impactos provenientes da atividade humana que marcam
– em pontos distintos de nossa linha do tempo enquanto espécie –
inúmeras alvoradas para esta que tem sido considerada uma nova
época na escala de tempo geológico do nosso pálido ponto azul,
o planeta Terra. Quais pistas fizeram cientistas de diversas áreas
apontarem para uma ideia de Antropoceno? Quando começou
esse novo período? O que a Revolução Industrial, os mamutes, a
Segunda Guerra Mundial e o aquecimento global têm a ver com
tudo isso?
Introdução: o que é o Antropoceno?

Nas últimas décadas, cientistas de diferentes áreas de


pesquisa têm identificado que nós, seres humanos, causa-
mos mudanças tão substanciais na superfície terrestre que
seria útil reconhecer que estamos em outra época geológica
(Crutzen & Stoermer 2000). Nessa nova época, chamada de
Antropoceno, os seres humanos são os principais agentes das
mudanças bióticas e abióticas em toda a biosfera (Crutzen &
Stoermer 2000; Crutzen 2006).
O Antropoceno tem sido definido de diferentes formas
na literatura (Malhi 2017). A perspectiva geológica demons-
tra que existem evidências estratigráficas de que popula-
ções humanas poderiam explicar mudanças ambientais
contemporâneas (a partir da Segunda Guerra Mundial). Tais
evidências indicam que elementos como alumínio puro,
concreto, plástico e hidrocarbonetos poliaromáticos deixam
assinaturas geológicas com elevadas concentrações desde
1950 (Waters et al. 2016). A perspectiva histórica, por sua
vez, sugere um início mais antigo do Antropoceno, cujas evi-
dências variam desde sinais de qualquer atividade humana
modificando os ecossistemas e a biodiversidade em escala
local (e em populações arcaicas) até transformações am-
bientais globais (Malhi 2017). Apesar do debate envolvendo
essa pluralidade de origens (Waters et al. 2016; Malhi 2017), o
Antropoceno é definido atualmente como “a magnitude, va-
riedade e longevidade de mudanças induzidas pela espécie
humana, incluindo a transformação da superfície terrestre

10 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
e a mudança na composição da atmosfera” (Lewis & Maslin
2015).
Um dos aspectos mais importantes do Antropoceno são
as mudanças ambientais que geram o aquecimento global e
os impactos desse aquecimento sobre as espécies e os ecos-
sistemas. Desde o início da Revolução Industrial (na metade
do século XVIII), várias atividades humanas como o uso de
combustíveis fósseis, a agricultura, a pecuária bovina e o des-
matamento resultaram no aumento da emissão de gases que
intensificam o efeito estufa (IPCC 2014; Lewis & Maslin 2015).
Nos últimos 150 anos, por exemplo, os níveis de gás carbôni-
co na atmosfera aumentaram em aproximadamente um terço
(IPCC 2014). Em termos gerais, as principais consequências
do aquecimento global são as mudanças de temperatura em
todas as regiões (afetando as práticas agrícolas e a distribui-
ção geográfica das espécies), o aumento na pluviosidade (mas
não em todas as regiões) e o aumento nos níveis dos oceanos
(US 2016).
Além das mudanças climáticas atmosféricas, os seres
humanos têm alterado a paisagem e afetado diretamente os
ecossistemas terrestres e aquáticos por meio do desmata-
mento. Estima-se que três quartos da área desses ecossiste-
mas foram completamente modificados pelos seres humanos,
a tal ponto que alguns cientistas estão propondo uma nova
classificação para os biomas terrestres, chamada antroma
(Ellis et al. 2010; Ellis, 2011; 2015). Além dos efeitos diretos da
degradação dos ecossistemas sobre as paisagens transforma-
das, como a perda de hábitats e a fragmentação de florestas,

O QUE É O ANTROPOCENO 11
existem efeitos indiretos que contribuem para a emissão de
gases causadores do efeito estufa (Vitousek et al. 1997).
Os ecossistemas marinhos também têm sido afeta-
dos pela ação humana. Estudos sugerem que, nos últimos
anos, houve um declínio consistente de biomassa pesquei-
ra, principalmente em locais onde não há gestão eficaz da
pesca (Hilborn et al. 2020; Palomares et al. 2020). Também já
é possível constatar algumas consequências do aquecimen-
to global sobre a biota marinha, a exemplo do aquecimen-
to das águas oceânicas, que pode ocasionar redução ou até
perda total de dinoflagelados simbiontes de corais que, por
sua vez, aumenta a frequência de eventos conhecidos como
branqueamento de corais (Glynn 1996; Hughes et al. 2017).
Além dos efeitos diretos drásticos sobre ecossistemas
aquáticos e terrestres, as atividades humanas geram diver-
sos tipos de poluição que afetam direta e indiretamente os
ecossistemas e a própria população humana. Por exemplo,
cerca de oito milhões de toneladas de plástico chegam aos
oceanos do mundo todo (Häder et al. 2020), gerando impac-
tos negativos sobre a biota marinha e o fornecimento de ser-
viços ecossistêmicos como o estoque pesqueiro, a recreação
e, consequentemente, o bem-estar humano (Beaumont et al.
2019).

Quando começou o Antropoceno?

Os cientistas estão cada vez mais convictos de que os


seres humanos modificaram substancialmente a biosfera,

12 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
a ponto de declarar que nós estamos em uma nova época
(Crutzen 2006) ou novo evento geológico (Gibbard et al.
2021). Entretanto, há diferentes visões (veja Tabela 1) sobre
os limites temporais do Antropoceno. Em uma das primei-
ras proposições para essa delimitação, Crutzen & Stoermer
(2000) sugeriram que o Antropoceno teve início no final do
século XVIII, porque os efeitos globais de atividades huma-
nas se tornaram notáveis a partir da Revolução Industrial.
Foi a partir desse evento histórico que houve um aumento
consistente nos níveis de gases causadores do efeito estufa,
como o gás carbônico e o metano.

Tabela 1. Diferentes perspectivas de estudo do Antropoceno definidas por Malhi


(2017).

Perspectiva Descrição

Perspectiva “A soma cumulativa da atividade humana está


das Ciências interrompendo muitos aspectos das funções
do Sistema planetárias e movendo-os para fora da faixa modesta
Terrestre de variabilidade que definiu o Holoceno, e em uma
direção diferente de aquecimento que está (ou logo
estará) fora da faixa dos ciclos glacial-interglacial do
pleistoceno. A mais proeminente dessas perturbações
é a mudança climática, mas outras perturbações
importantes da biogeoquímica planetária incluem a
acidificação dos oceanos.”

O QUE É O ANTROPOCENO 13
Perspectiva Descrição

Perspectiva da “Destaca mudanças fundamentais na biodiversidade


Biosfera planetária, independentemente de terem
consequências para a função planetária (que a
Perspectiva das Ciências do Sistema Terrestre
enfatiza). A atividade humana está alterando a
diversidade, distribuição, abundância e interações
das espécies na Terra por meio da conversão de
ecossistemas em ‘antromas’ agrícolas ou urbanos,
por meio da colheita direta ou exclusão de espécies,
por meio da mistura de espécies entre regiões
previamente isoladas e através da mudança
ambiental. Uma característica particular é a elevação
da taxa de extinção e um evento potencial de extinção
em massa por meio de uma combinação de perda de
habitat, colheita, invasão e mudança climática.”

Perspectiva “O debate geológico tende a se concentrar em


Geológica se há uma assinatura estratigráfica detectável
do Antropoceno, qual assinatura particular é a
mais apropriada e como isso acaba informando
uma decisão no início data para o Antropoceno. O
objetivo da abordagem geológica é examinar se a
mudança contemporânea é detectável e significativa
nas escalas de tempo da história da Terra. Essa
abordagem torna a definição do Antropoceno
como uma época geológica análoga ao processo de
definição de todos os outros períodos geológicos
anteriores.”

Perspectiva “Uma narrativa alternativa defende um início


Histórica: o anterior, às vezes muito anterior, com escalas de
caso de um tempo variando de vários milhares a até milhões de
Antropoceno anos atrás. Esta narrativa defende um Antropoceno
inicial primitivo e procura destacar e capturar é um senso
de longa alteração humana do meio ambiente, uma
história e pré-história que muitas vezes é pouco
reconhecida no foco tecnocêntrico predominante na
ruptura industrial e na modernidade.”

14 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
Perspectiva Descrição

Perspectiva “Um tópico se concentra nos desafios de responder


Cultural e ou gerenciar a alteração em grande escala e
Filosófica multifacetada do funcionamento do planeta e os
desafios existenciais que isso representa para a
história humana, para a ideia de progresso e para
o futuro da civilização. Um segundo tópico explora
como ver, responder e valorizar a natureza em um
mundo pós-natural onde a influência humana é tão
difundida – seja em escalas de tempo modernas ou
históricas – estimulando uma reavaliação do que é
humano e do que é natural.”

Críticas das “As críticas mais desdenhosas rotulam o Antropoceno


Ciências como um mero item da ‘cultura pop’, sujeito aos
Naturais caprichos e modas da política ambiental. Uma
crítica mais focada é que o Antropoceno, sendo uma
época em que estamos imersos, é uma entidade
fundamentalmente diferente das unidades crono-
estratigráficas anteriores. Na tentativa de formalizar
o Antropoceno, as práticas de conhecimento e
objetividade da convenção geológica estão sendo
esticadas além de sua utilidade para responder o que
é uma questão especulativa e política.”

Críticas das “Os críticos argumentam que a perspectiva de


Perspectivas sistemas em grande escala, de muitas ciências
Política, naturais que escrevem sobre o Antropoceno,
Filosófica e encoraja uma narrativa particular que emerge de um
Cultural enquadramento cultural ocidental e tecnocêntrico do
mundo. Quase todos os escritos sobre o Antropoceno
surgiram da Europa e da América do Norte, a maioria
dos comitês que decidem sobre o Antropoceno são
compostos por representantes dessa mentalidade cultural
e, como tal, tende a favorecer uma conceitualização
materialista e tecnocrática e uma resposta ao
ambiente contemporâneo. Desafio, particularmente
em argumentos para uma data de início recente para o
Antropoceno.”

O QUE É O ANTROPOCENO 15
Outra visão sobre a origem do Antropoceno foi chamada
de Hipótese do Antropoceno Inicial, Precoce ou Antecipado
(Early Anthropocene Hypothesis, em inglês), visto que versa
sobre datações muito anteriores às propostas pelos autores
mencionados até então (Ruddiman 2003; 2007). Segundo essa
hipótese, existem diversas evidências que associam flutua-
ções do gás carbônico na atmosfera à derrubada de flores-
tas (cerca de oito mil anos atrás) e, mais adiante, a sinais de
agricultura, com plantações de arroz (cerca de cinco mil anos
atrás) (Ruddiman 2007). Além disso, o cultivo de arroz pode-
ria explicar o aumento da emissão de metano, posto que é
cultivado em solos inundados, nos quais bactérias anaeróbias
produzem esse gás (Ruddiman 2007). Ressalta-se, ainda, a re-
dução de gás carbônico percebida há dois mil anos, que pode
ser explicada pela elevada mortalidade humana nesse perío-
do em decorrência de eventos como epidemias, pandemias e
declínios de impérios e da conquista do continente america-
no pelos europeus (Ruddiman 2007).
Posteriormente, Doughty et al. (2010) sugeriram um
limite ainda mais antigo para o Antropoceno. Segundo os
autores, há indícios de que atividades de caça de povos que
viviam na região entre a Sibéria e a América do Norte (entre
16 e 13 mil anos atrás) foram responsáveis pela extinção de
várias espécies de mamíferos de elevado tamanho corporal,
incluindo os mamutes. Os autores argumentam que os seres
humanos contribuíram com a expansão de florestas de bé-
tulas, que, por sua vez, reduziram o albedo (capacidade de
refletir a energia luminosa) e aumentaram a temperatura da

16 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
superfície terrestre em um grau. De fato, os registros fósseis
indicam que a extensão dessas florestas aumentou 26% após
a extinção dos mamíferos (Doughty et al. 2010).
Apesar das diferentes hipóteses sobre o início do
Antropoceno, as atividades humanas muito antigas tiveram
apenas um efeito localizado em algumas regiões da super-
fície terrestre (Certini & Scalenghe 2011; Malhi 2017). Visões
mais recentes sugerem que esse efeito se alastrou somente
por volta de dois mil anos atrás, quando as sociedades huma-
nas estavam mais estruturadas em consequência de terem
começado a substituir a caça-coleta pela agricultura. Nessa
época, em que o Império Romano, por exemplo, abran-
gia grande parte da Europa, do Oriente Médio e do norte
do continente africano (Certini & Scalenghe 2011), estima-
-se que as paisagens das províncias do norte do continente
africano tenham sido altamente modificadas visando à pro-
dução de trigo para sustentar a capital do Império Romano.
Além disso, sociedades em diferentes regiões da superfície
terrestre empreendiam modificações notáveis do ambiente
com vistas à produção agrícola e à construção dos impérios,
como os maias (na Guatemala e em Belize), os incas (no norte
do Peru) e os mesopotâmios (onde hoje é o Iraque) (Certini &
Scalenghe 2011).
Em 2011, diferentes pesquisadores declararam proposi-
ções semelhantes à de Crutzer & Stoermer (2000), afirmando
que o Antropoceno teve início com o advento da Revolução
Industrial (Ellis 2011; Steffen et al. 2011; Zalasiewicz et al. 2011).
Adicionalmente, eles argumentaram que os efeitos da ação

O QUE É O ANTROPOCENO 17
humana sobre a biosfera se intensificaram ainda mais após o
término da Segunda Guerra Mundial (em 1945), dando início
a um período denominado de a Grande Aceleração. Ao en-
contro disso, nos últimos 50 anos, por exemplo, a população
humana saltou de três bilhões para seis bilhões, resultando
em taxas de consumo de recursos naturais muito maiores,
especialmente no que concerne ao uso de combustíveis fós-
seis (Steffen et al. 2011).
Distinta das propostas anteriores, há outra perspectiva
que sugere que as datações do início do Antropoceno deve-
riam ser baseadas em evidências do comportamento humano
de modificação do ambiente, e não apenas nas consequências
desse comportamento (Smith & Zeder 2013). Esses pesquisa-
dores entendem que o Antropoceno iniciou a partir do mo-
mento em que os seres humanos começaram a domesticar
espécies de animais e plantas. Os primeiros indícios de plan-
tas e animais em processo de domesticação datam de cerca
de nove a 11 mil anos atrás (o que, praticamente, coincide com
o início da época do Holoceno). Assim, os autores propõem
que o Antropoceno e o Holoceno sejam reconhecidos como
uma única época, sem a necessidade de estabelecer uma no-
menclatura formal para o Antropoceno (Smith & Zeder 2013).
Finalmente, em 2016, o Grupo de Trabalho sobre o
Antropoceno reconheceu que há indícios suficientes para
compreender o Antropoceno como uma fase funcional e es-
tratigraficamente distinta do Holoceno, o que influenciou
parte dos cientistas a defender o Antropoceno como uma
época distinta do Holoceno (Malhi 2017; Zalasiewicz et al.

18 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
2017). Segundo essa linha de pensamento, o Antropoceno
seria funcional e estratigraficamente distinto do Holoceno
porque atividades antrópicas (i) ampliaram a disseminação
de combustíveis fósseis na atmosfera (ii) e depositaram nela
novos minerais como alumínio, concreto e plástico (conhe-
cidos como tecnofósseis) (Waters et al. 2016; veja também
Gibbard et al. 2021). Desse modo, a visão mais recente (e mais
aceita pelos cientistas) sugere que o Antropoceno iniciou por
volta de 1950, coincidindo com o período conhecido como a
Grande Aceleração (Waters et al. 2016; Malhi 2017).

Antropoceno: do conceito à aplicação

Este livro fornece uma breve introdução sobre o


Antropoceno. Ao invés de aprofundar o debate entre visões
de diferentes disciplinas (Ciências da Terra, Ecologia, Biologia
da Conservação, Geologia, Paleontologia, entre outras), nossa
proposta é sintetizar as distintas etapas do desenvolvimen-
to do conceito para dar suporte às explicações mais aceitas
sobre como populações humanas antigas ou modernas pode-
riam estar associados com mudanças climáticas e com a atual
perda da biodiversidade global.
De fato, reconhecer que nós estamos em um período no
qual a maior parte dos processos ecológicos e dos padrões de
biodiversidade é determinada pela ação humana tem implica-
ções teóricas e práticas. Do ponto de vista teórico, não pode-
mos mais estudar os processos ecológicos e evolutivos des-
considerando os efeitos dos seres humanos sobre as espécies

O QUE É O ANTROPOCENO 19
e os ecossistemas. Por outro lado, de uma perspectiva práti-
ca, autoridades políticas do mundo todo precisam planejar,
urgentemente, estratégias que possam mitigar os efeitos de-
letérios das nossas atividades sobre a superfície terrestre.
O restante do livro está organizado em cinco temas (e,
consequentemente, em cinco capítulos) que fornecem supor-
te para compreender o papel primordial da espécie humana
na transformação climática do planeta. No segundo capítu-
lo, Camilo et al. apresentam o papel da domesticação como
marco da transição de comportamento caçador-coletor para
uma capacidade de produção do alimento por intermédio da
agricultura. No terceiro capítulo, Magalhães e colaboradores
expõem as evidências que conectam a extinção da megafauna
com atividades humanas. No quarto capítulo, Souza e cola-
boradores discutem as ações humanas contemporâneas que
representam as principais transformações na biosfera, com
destaque para o marco da Revolução Industrial. No quinto
capítulo, Pinto e colaboradores comparam os efeitos antró-
picos sobre a biosfera em diferentes escalas espaciais. E, por
último, no sexto capítulo, Souza e colaboradores destacam os
padrões de biodiversidade no Antropoceno e apresentam as
regiões da superfície terrestre que são dominadas por ação
humana (conhecidas como antromas).

Referências
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22 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
2
A DOMESTICAÇÃO DA NATUREZA
COMO MARCO DA HISTÓRIA HUMANA

Cicera Janaine Camilo, Catarina Leite Gurgel,


Maria de Oliveira Santos, Risoneide Henriques da Silva

A domesticação é um processo evolutivo que, a partir da seleção


feita pelos seres humanos para atender aos seus interesses,
propiciou modificações genéticas em plantas e animais selvagens.
As plantas e os animais domesticados apresentam características
que os diferenciam dos seus ancestrais selvagens. Por um lado,
algumas características fenotípicas conferiram vantagens
adaptativas às espécies domesticadas para a ocupação de
ambientes modificados e dominados pelos humanos. Por outro
lado, a domesticação causou a perda de características essenciais
para a sobrevivência dessas espécies em seu ambiente selvagem.
Assim, neste capítulo, apresenta-se uma discussão acerca de como
a domesticação de plantas e animais, provavelmente, ocorreu,
constituindo um grande marco para o Antropoceno.
Transição para domesticação e origem da agricultura

A domesticação representa um dos processos mais im-


portantes da história humana nos últimos 13 mil anos, uma
vez que determinou o fornecimento de alimento para a so-
ciedade moderna e representa um divisor de águas para o
crescimento populacional global (Diamond 2002) e seu de-
senvolvimento tecnológico. Assim, esse processo teve um
papel relevante no comportamento dos primeiros seres hu-
manos, o que influenciou no desenvolvimento de ferramentas
e no grande número de espécies utilizadas na alimentação
(Salamini et al. 2002). Existem diversas hipóteses que tentam
explicar o que levou a uma mudança de estilo de vida de caça-
-coleta para domesticação das espécies. Entre elas, estão as
alterações climáticas ocorridas no final do Pleistoceno, que
forçaram não somente a concentração de pequenos grupos
humanos e animais em oásis, mas também a sincronia entre
as mudanças climáticas e culturais e a evolução gradual, irre-
gular e independente em diferentes ambientes (Sereno et al.
2008).
No Pleistoceno recente, estima-se que as primeiras po-
pulações humanas se organizaram em uma sociedade de ca-
çadores e coletores antes de iniciarem a prática agrícola no
período Neolítico, entre 13.000 e 10.000 anos a.C. (Diamond
2002; Diamond & Bellwood 2003; Meyer & Purugganan 2013).
Essas populações eram caracterizadas por se deslocarem
conforme mudanças sazonais na oferta de recursos e de
manejo de algumas espécies alimentícias (Bellwood 2006).

24 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
Entre aproximadamente cinco e 11 mil anos atrás, as so-
ciedades humanas, em muitas regiões diferentes do mundo,
domesticaram diversas espécies distintas de animais e plan-
tas, marcando o surgimento das economias de produção de
alimentos e o início de uma das principais transições na his-
tória dos seres humanos (Smith 2006a,b). Essa transição,
muitas vezes descrita como “Revolução Neolítica” ou “Origens
da Agricultura”, tem constituído, há mais de um século, uma
área duradoura de investigação em Arqueologia e Biologia
(Smith 2006a,b) (ver Figura 1).

Domesticação de plantas

Uma das grandes conquistas que favoreceram a manu-


tenção e o domínio dos humanos na Terra foi a domesticação
de espécies de plantas, o que, por sua vez, tem sido sugerido
como uma das maiores realizações da humanidade. A domes-
ticação de plantas ocorre quando a seleção humana sobre os
fenótipos vegetais resulta em mudanças nos genótipos das
populações, tornando-as mais úteis ao ser humano e mais
bem-adaptadas à intervenção humana na paisagem (Clement
1999). Assim, plantas domesticadas são aquelas que diferem
morfologicamente e genotipicamente de seus parentes sil-
vestres (Meyer et al. 2012).
O processo de seleção que leva à domesticação pode
ser inconsciente ou consciente (Martins 2014). Na seleção in-
consciente, provavelmente presente em muitos processos de
domesticação, o ato de mover as plantas da natureza para os

A DOMESTICAÇÃO DA NATUREZA COMO MARCO DA HISTÓRIA HUMANA 25


ambientes agrícolas estabelece pressões de seleção, podendo
levar ao aumento da aptidão de fenótipos que tendem a ter
baixa aptidão no ambiente natural (Fuller et al. 2010). Já na
seleção consciente, fenótipos desejáveis são selecionados, e
fenótipos menos desejáveis são negligenciados ou ativamente
removidos até que sua frequência diminua na população-alvo
(Meyer et al. 2012).
Assim, as plantas domesticadas divergem dos ances-
trais silvestres em suas características morfológicas, fisio-
lógicas e genéticas, criando um fenômeno conhecido como
síndrome de domesticação (Martins 2014). Entre as carac-
terísticas das espécies domesticadas, estão estrutura mais
robusta, perda da dispersão natural e da dormência de se-
mentes, floração sincronizada entre estruturas reprodutivas
masculinas e femininas, mudanças no metabolismo secundá-
rio, com perda de toxicidade ou sabor desagradável, e frutos
e órgãos de interesse com tamanho superior (Doebley et al.
2006). A domesticação frequentemente promove a seleção
contra características que aumentam o sucesso reprodutivo
no ambiente natural, como aquelas que ampliam a resposta
defensiva da planta (Meyer et al. 2012). Defesas contra herbí-
voros, por exemplo, tornam as plantas menos palatáveis, fa-
zendo com que suas populações sejam mais propensas a se
manter em ambientes naturais. De fato, alguns estudos de-
monstram que a domesticação pode reduzir as defesas quí-
micas e físicas das plantas domesticadas se comparadas aos
parentes silvestres (Rosenthal & Dirzo 1997).

26 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
Figura 1. Origem da agricultura e o processo de domesticação do milho (Zea mays).

No mundo todo, existem aproximadamente 200 mil es-


pécies de plantas silvestres, das quais 100 espécies possuem
grande importância econômica (Diamond 2002). A maioria
das espécies domesticadas pertence a um pequeno número
de famílias (2.489 espécies domesticadas distribuídas em 173
famílias). Além de serem representadas por poucas famílias,
a proporção de espécies domesticadas varia consideravel-
mente entre elas (Diamond 2002). As principais espécies do-
mesticadas estão distribuídas em oito das 173 famílias, que
são: gramíneas (poáceas), leguminosas, rosáceas, solanáceas,
asteráceas, mirtáceas, malváceas e cucurbitáceas (Diamond

A DOMESTICAÇÃO DA NATUREZA COMO MARCO DA HISTÓRIA HUMANA 27


2002). Para compreender o universo de usos e as possíveis
origens da domesticação, a seguir, são apresentadas as espé-
cies mais importantes.
As espécies do gênero Cucurbita (família Cucurbitaceae)
são nativas das Américas e faziam parte da base alimentar
da civilização olmeca, posteriormente incorporada pelas ci-
vilizações asteca, inca e maia (Ferreira 2008). Registros ar-
queológicos associam essas espécies ao ser humano há pelo
menos 10 mil anos, já que no período pré-colombiano os
homens iniciaram um processo seletivo, com base em mu-
tantes de polpa não amarga, dando origem às espécies do-
mesticadas (Ferreira 2008).
Além disso, acredita-se que a domesticação do amen-
doim (Arachis hypogaea L., família Fabaceae) ocorreu por
volta de seis a sete mil anos atrás, havendo registros de seu
plantio na região andina desde o período pré-colombiano
(Fávero & Veiga 2008). Consta que suas sementes podem ter
sido levadas, por vias transpacíficas, da América até a China
e a Índia, antes da chegada de Cristóvão Colombo à América
(Fávero & Veiga 2008). Supõe-se que o utensílio mais primiti-
vo utilizado em seu cultivo tenha sido o “pau cavador”, usado
para plantar com baixa movimentação da terra e para colher
partes subterrâneas de plantas silvestres (Fávero & Veiga
2008). Assim, o “pau cavador” seria uma ferramenta neolítica
com ponta aguda ou em bisel, empregada provavelmente no
período entre 10.000 e 4.000 anos a.C. (Fávero & Veiga 2008).
Postula-se, ainda, que o arroz (Oryza sativa, família
Poaceae) seja originário da Ásia, embora não se saiba com

28 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
precisão o país de início de sua domesticação (Pereira 2002).
Alguns estudos sugerem que existem fortes evidências de que
sua origem tenha sido no sudeste asiático, mais precisamen-
te na região compreendida entre a Índia e Mianmar (antiga
Birmânia), em virtude da rica diversidade de formas cultiva-
das desse arroz nessa região (Pereira 2002).
Outra planta domesticada há milhares de anos atrás e
com grande uso moderno é a batata (Solanum tuberosum, fa-
mília Solanaceae) (Castro 2008), cuja origem da domestica-
ção permanece desconhecida. Com base em dados arqueo-
lógicos, estima-se que tenha ocorrido provavelmente entre
5.000 e 2.000 anos a.C., simultaneamente com a domesti-
cação da lhama (Castro 2008). As primeiras batatas cultiva-
das provavelmente foram selecionadas de populações silves-
tres na região central dos Andes, englobando o sul do Peru e
o norte da Bolívia, de seis a 10 mil anos atrás (Castro 2008).
No processo de domesticação da batata, além da redução da
concentração de glicoalcaloides, visou-se à seleção de plan-
tas com estolões mais curtos e tubérculos maiores, frequen-
temente coloridos e com várias formas (Castro 2008).
Outra espécie que também passou por esse processo,
uma das mais antigas hortaliças cultivadas, é a cebola (Allium
cepa, família Liliaceae) (Fritsch & Friesen 2002), provavelmen-
te domesticada inicialmente nas regiões montanhosas da Ásia
Central (Fritsch & Friesen 2002). Nos estágios primitivos da
domesticação, além da coleta das plantas na forma silvestre,
é provável que tenha ocorrido a transferência das mudas para
as hortas primitivas (Fritsch & Friesen 2002). Possivelmente,

A DOMESTICAÇÃO DA NATUREZA COMO MARCO DA HISTÓRIA HUMANA 29


há milhares de anos, o excesso de extrativismo tenha torna-
do escassos os bulbos do ancestral da cebola cultivada, esti-
mulando sua transferência para o entorno das habitações e
iniciando, assim, o processo de domesticação (Barbieri 2008).
Além disso, acredita-se que o trigo (Triticum sp.) foi
a primeira planta a ser domesticada (Faris 2014). Sua do-
mesticação, iniciada há cerca de 10 mil anos na região da
Mesopotâmia (sudoeste da Ásia), permitiu que o ser humano
abandonasse milhares de anos de existência errante, como
caçador e coletor, estabelecendo-se em povoados e geran-
do seu próprio sustento (Faris 2014). A capacidade de produ-
zir alimento em grandes quantidades, aliada à possibilidade
de armazenar excedentes, levou ao aumento da população
e à evolução cultural, fazendo com que os homens das co-
munidades sedentárias priorizassem o cultivo do trigo de tal
forma que esse cereal é hoje a principal espécie cultivada no
mundo (Piana & Carvalho 2008).
Os frutos de uva (Viti vinifera L., família Vitaceae)
também são usados há muito tempo, antes mesmo que
alguma domesticação tivesse ocorrido (Radmann & Bianchi
2008). Sua domesticação teve início com a migração dos
nômades que carregavam sementes de plantas arbóreas,
de modo que, paralelamente ao nascimento da agricultura,
ocorreu o estabelecimento do cultivo da videira (Radmann
& Bianchi 2008). O cultivo para a produção de vinho iniciou
nos anos 8.000 a.C., no Oriente Próximo, mais precisamente
entre a Armênia e a Pérsia, região delimitada pelo Mar Negro
e pelo Mar Cáspio e pelas montanhas do Cáucaso (Radmann

30 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
& Bianchi 2008). A uva é considerada a fruta de domesticação
mais antiga de que se tem conhecimento, graças ao fato de
muitas civilizações terem deixado algum registro a ela rela-
cionado (Radmann & Bianchi 2008). A principal razão dessa
popularidade é seu produto, o vinho, que faz da uva uma
das frutas de maior produção mundial (Radmann & Bianchi
2008).

Domesticação de animais

Diversos animais foram domesticados para distintos


fins, como alimentação, agricultura e companheirismo (Lear
& Harris 2012). Mila et al. (2018) mostraram a distribuição fi-
logenética de espécies de mamíferos utilizados para alimen-
tação, evidenciando que espécies de gado apareceram distri-
buídas em cerca de 10 famílias, que Bovidae, em particular,
abrigava aproximadamente 40% das espécies domesticadas
e que apenas 22 gêneros representavam espécies domesti-
cadas. Sabe-se, ainda, que somente 14 dos grandes mamífe-
ros herbívoros e onívoros terrestres (pesando 45 kg ou mais),
considerados como mais vantajosos aos humanos, foram do-
mesticados de um total de 148 espécies (Diamond 2002). No
entanto, o que teria impedido a domesticação desses ani-
mais? Diamond (2002) destaca alguns dos principais obstá-
culos: (i) dieta que seria difícil de os humanos conseguirem
fornecer; (ii) taxa de crescimento lenta e espaçamento longo
entre os nascimentos; (iii) relutância em se reproduzir em
cativeiro; (iv) tendência a entrar em pânico em recintos ou

A DOMESTICAÇÃO DA NATUREZA COMO MARCO DA HISTÓRIA HUMANA 31


quando confrontados com predadores; (v) disposição desa-
gradável; e (vi) falta de uma hierarquia de dominância (ausên-
cia de um líder).
Atualmente, o processo de domesticação de animais
tem sido medido por algumas características comportamen-
tais que tornaram certas espécies melhores candidatas à do-
mesticação do que outras (Price 1984; 2002; Zeder 2012a).
Nesse processo, as seguintes características são considera-
das como as mais importantes: (1) estrutura social, especial-
mente o tamanho e a organização dos grupos; (2) compor-
tamento sexual, particularmente o grau de seletividade na
escolha dos parceiros de acasalamento e a facilidade de subs-
tituir um parceiro preferido por outro; (3) interações pais-jo-
vens, facilidade e rapidez com que os pais se relacionam com
os jovens e maturidade e mobilidade dos jovens ao nascer;
(4) comportamento alimentar e escolha de hábitat, grau de
flexibilidade na dieta e tolerância ao hábitat; e (5) respostas
a seres humanos e novos ambientes, incluindo respostas de
voo e reatividade a estímulos externos (Hale 1969; Price 1984;
2002; Zeder 2012a).
A forte seleção de cautela reduzida e de baixa reati-
vidade é um recurso universal que abrange toda a domes-
ticação animal, abarcando todos os mamíferos domestica-
dos, tais como carnívoros (Trut 1999; Coppinger & Coppinger
2001), herbívoros (Tennessen & Hudson 1981) e roedores
(Murphy 1985), bem como aves domésticas (Andersson et al.
2001), peixes (Waples 1991) e algumas espécies de inverte-
brados (Marliave et al. 1993; Price 2002). Entre as espécies

32 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
domesticadas, destacam-se as apresentadas nas seções a
seguir.

Animais de estimação

Os cães (Canis familiaris, família Canidae) prova-


velmente foram os primeiros animais a serem domestica-
dos pela humanidade, precedendo o advento da agricultura
e a domesticação de outros animais (Udell & Wynne 2008;
Galibert et al. 2011). Evidências genéticas mostram que o lobo
(Canis lupus) é o principal ancestral do cão, compartilhan-
do com este 98% do seu DNA (Galibert et al. 2011). Segundo
Clutton-Brock (1995), os lobos podem ter sido atraídos para
perto de grupos humanos em busca de alimento, benefician-
do-se de restos de comida e, consequentemente, acostu-
mando-se com a presença humana. Os humanos, por sua vez,
podem ter sido beneficiados pela presença de lobos ao matá-
-los para remover sua pele para a confecção de roupas. Nesse
cenário, de acordo com Clutton-Brock, os lobos podiam car-
regar seus filhotes, os quais, após a morte dos animais adul-
tos, podem ter acabado se acostumando ao convívio humano
e sendo domados. Nesse sentido, é possível que a seleção ar-
tificial humana de fenótipos presentes em lobos seja respon-
sável pelas centenas de raças de cães domésticos existentes
atualmente (Udell & Wynne 2008; Galibert et al. 2011).
Já a domesticação do gato (Felis catus, família Felidae)
segue outra trajetória. Acredita-se que esses animais foram
domesticados há 7.500 anos a.C. e são descendentes de cinco

A DOMESTICAÇÃO DA NATUREZA COMO MARCO DA HISTÓRIA HUMANA 33


diferentes linhagens de gatos selvagens (Lear & Harris 2012).
Todavia, os gatos selvagens eram candidatos improváveis​​
para a domesticação humana, pois são animais solitários e
territorialistas, o que os torna mais interessados em luga-
res do que em pessoas (Driscoll et al. 2009a). Portanto, há
poucos indícios que sugerem que populações agrícolas pri-
mitivas tenham selecionado gatos selvagens como animais de
estimação (Driscoll et al. 2009a). Em vez disso, é mais prová-
vel que os gatos que exploravam ambientes humanos tenham
sido tolerados pelas pessoas e, ao longo do tempo, tenham
gradualmente divergido de seus parentes selvagens (Driscoll
et al. 2009b). Isso pode ter ocorrido porque os gatos selva-
gens se aproximavam de ambientes humanos atraídos por
áreas infestadas por ratos (Lear & Harris 2012).

Animais alimentícios e de uso agrícola

Alguns animais domesticados trouxeram vantagens


inestimáveis aos
​​ seres humanos, seja como fonte de calorias
na alimentação, seja como auxílio em atividades cotidianas,
como na agricultura. Acredita-se que os primeiros animais
domesticados para uso alimentício tenham sido as ovelhas,
entre 11.000 e 9.000 a.C. no sudoeste da Ásia, e mais tar-
diamente, por volta de 8.000 a.C., as cabras (Lear & Harris
2012). Esses animais eram usados para o consumo de carne e
leite e para a confecção de casacos, tornando-se importan-
tes em comunidades nômades (Lear & Harris 2012). Embora
os porcos e o gado tenham sido domesticados no mesmo

34 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
período, tendiam a ser utilizados apenas por populações que
possuíam assentamentos permanentes, propriedade da terra
e excedentes agrícolas (Lear & Harris 2012).
A domesticação do cavalo (Equus sp.) ocorreu após a
das ovelhas, das cabras, do gado e dos porcos (Orlando 2020).
Há relatos de que o cavalo tenha sido domesticado nos anos
5.000 a.C. no Cazaquistão e nos anos 4.000 a.C. nas estepes da
Eurásia (ver Outram et al. 2009; Lear & Harris 2012). Evidências
arqueológicas sugerem que os cavalos foram usados ​​inicial-
mente para a alimentação (carne e leite) e apenas posterior-
mente para a locomoção (Lear & Harris 2012). O cavalo trouxe
importantes benefícios às sociedades humanas, pois permi-
tiu que pessoas se locomovessem rapidamente por longas ex-
tensões territoriais, levando consigo um maior número de
artefatos, bem como possibilitou a exploração de paisagens
maiores e diversificadas, o mantimento de famílias maiores e
um maior alcance de contatos comerciais (Levine 2012).

O efeito da domesticação na fisiologia, no


comportamento e na evolução humana

A ação de domesticar plantas e animais pode ter efeito


sobre seus próprios domesticadores, afetando sua fisiologia,
seu comportamento e sua evolução. Alguns estudos demons-
traram, por exemplo, que existe uma associação entre o fenó-
tipo de persistência da lactase em humanos e a prática cultu-
ral de domesticação de gado e consumo de leite (Albuquerque
et al. 2015). Ao encontro disso, Ingram et al. (2009) sugeriram

A DOMESTICAÇÃO DA NATUREZA COMO MARCO DA HISTÓRIA HUMANA 35


que essa prática cultural atuou como fonte de seleção na po-
pulação e produziu uma maior frequência de alelos específi-
cos ligados à absorção de lactose, especialmente em pessoas
de que vivem em regiões da Europa e da África, onde essa
prática cultural é realizada há muito tempo.
Outro exemplo marcante é a capacidade observada em
grupos humanos de digerir o amido, a qual pode ser resul-
tado do processo de domesticação de plantas e do advento
da agricultura (Perry et al. 2007). Populações agrícolas têm
maior proporção de indivíduos que possuem um número
mais elevado de cópias do gene que promove a expressão da
enzima amilase (AMY1) quando comparadas a outras popula-
ções, como caçadores-coletores e pescadores (Albuquerque
et al. 2015). Um maior número de cópias de AMY1 permite,
consequentemente, o aumento nas concentrações de amilase
na saliva, melhorando a eficiência da digestão de alimentos
ricos em amido (Albuquerque et al. 2015).
Assim, ao selecionar artificialmente fenótipos desejáveis
em determinada espécie ou ao alterar seu hábitat, pessoas
herdam de seus antecessores o ambiente criado ou modifi-
cado pela prática da domesticação (Albuquerque et al. 2015).
Esse fenômeno é conhecido como construção de nicho, pro-
cesso pelo qual os organismos alteram seus próprios ambien-
tes e o de outros seres vivos por meio de suas atividades e de-
cisões, podendo levar a alterações nas atividades fisiológicas
e comportamentais de todos os organismos envolvidos nesse
processo (Odling-Smee et al. 2003; Laland & O’Brien 2012;
Flynn et al. 2013). As atividades humanas também podem levar

36 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
a novas pressões seletivas, modificando sua história evolutiva
e a de outros seres vivos (Laland & O’Brien 2012). Um exem-
plo disso é a associação entre as práticas culturais de domes-
ticação de plantas e animais e a expressão de determinados
genes em seres humanos, como demonstrado nesta seção, o
que pode ocasionar maior adaptabilidade a ambientes criados
ou modificados por esses poderosos construtores de nicho.

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40 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
3
A EXTINÇÃO DA MEGAFAUNA
NO ANTROPOCENO

Arthur Ramalho Magalhães, Luane Maria Melo Azeredo,


Kamila Marques Pedrosa, Risoneide Henriques da Silva

Neste capítulo, você vai entender um pouco melhor uma das


primeiras e mais importantes consequências negativas da
presença humana na natureza: a extinção dos grandes carnívoros
e herbívoros do Cenozoico, conhecidos como megafauna, que
trouxe mudanças drásticas para os ecossistemas do globo.
Estudos sugerem que a extinção da megafauna interrompeu
ciclos biogeoquímicos importantes para a ciclagem de nutrientes,
alterou a cobertura vegetal em várias regiões e levou à coextinção
de inúmeros organismos que dependiam direta e indiretamente
desses grandes vertebrados.

A EXTINÇÃO DA MEGAFAUNA NO ANTROPOCENO 41


Existem diferentes definições de megafauna, mas o
termo mais usual está associado a grandes vertebrados
que viveram principalmente durante o Cenozoico, perío-
do iniciado há aproximadamente 65 milhões de anos atrás.
Especialistas utilizam distintos limiares de massa corporal
para que os animais sejam considerados como membros do
grupo, desde 40 kg até acima de uma tonelada (Malhi et al.
2016; Galetti et al. 2018). Definições mais recentes classificam
a megafauna de acordo com a atividade trófica das espécies
no sistema, a exemplo de megaherbívoros, que abarcam orga-
nismos acima de 1000 kg, e de megacarnívoros, que incluem
animais acima de 100 kg (Malhi et al. 2016).
Embora o termo seja comumente associado a grandes
mamíferos terrestres, outros grupos de vertebrados podem
ser incluídos na megafauna, como répteis, aves e peixes (ver
Lewison et al. 2014; Teh et al. 2015; Estes et al. 2016). Neste
capítulo, utilizaremos a definição de megafauna que conside-
ra grandes vertebrados (principalmente mamíferos) que vi-
veram no Pleistoceno (iniciado há aproximadamente 2,5 mi-
lhões de anos atrás), entre os quais alguns são encontrados
até hoje ou tiveram sua extinção recente (Galetti et al. 2018).

Condições para o surgimento e


evolução da megafauna

A megafauna sofreu grande diversificação durante o


período Cenozoico, provavelmente como consequência da
disponibilidade de nichos, que aumentou após a extinção do

42 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
Cretáceo-Paleógeno (K-Pg), especialmente de dinossauros
não avianos (Smith et al. 2010). Durante os primeiros 140 mi-
lhões de anos, os mamíferos existentes ocupavam uma faixa
restrita de nichos e tamanhos corporais (Luo 2007). De fato,
alguns estudos sugerem que esses mamíferos tinham tama-
nho corporal reduzido (abaixo de 15 kg), alimentação gene-
ralista e ocorrência predominante em ambientes terrestres
(Luo 2007).
Com um palco vazio deixado pelos dinossauros, o pe-
ríodo após a extinção desses organismos foi marcado por
uma intensa diversificação filogenética, ecológica e fisioló-
gica, que permitiu o surgimento de grandes mamíferos de
até quatro ordens de magnitude maiores do que os grupos
comuns no Cretáceo (Luo 2007; Smith et al. 2010). Os megah-
erbívoros desenvolveram maiores tamanhos com altas taxas
de crescimento em diferentes ecossistemas, configurando
uma estratégia comum e eficaz de defesa contra predadores,
influenciada por limites mecânicos, térmicos, demográficos
e de recursos disponíveis (Malhi et al. 2016). Os megacarní-
voros, por sua vez, tinham crescimento restrito por limita-
ções energéticas, pois dependiam do suprimento de comida
gerada pelos herbívoros (Malhi et al. 2016). O surgimento de
organismos cada vez maiores foi um padrão presente em di-
ferentes continentes e ecossistemas (aquáticos e terrestres)
(Smith et al. 2010)

A EXTINÇÃO DA MEGAFAUNA NO ANTROPOCENO 43


Megafauna e funções dos ecossistemas

Comunidades vegetais inteiras passaram a interagir


com as espécies de megavertebrados que foram surgindo e di-
versificando após o Cretáceo. Como resultado, novas relações
de dispersão de sementes, bem como de herbivoria, estrutu-
raram-se em diferentes ecossistemas (Malhi et al. 2016). Nesse
cenário, grandes espécies tornaram-se dispersores-chave,
principalmente para espécies vegetais com sementes grandes,
incompatíveis com pequenos frugívoros, possibilitando espé-
cies com sementes maiores (ou mais sementes) levadas para
distâncias maiores. Na América do Sul, por exemplo, estima-
-se que preguiças-gigantes realizavam dispersão de grandes
frutos por longas distâncias – de 10 até 100 vezes maiores que
os vertebrados atuais, já que retinham sementes em seus in-
testinos por longos períodos (Guimarães et al. 2008; Pires et
al. 2018). Além disso, com sua enorme biomassa, os megah-
erbívoros alteravam a vegetação e, consequentemente, a pai-
sagem, posto que removiam material lenhoso e consumiam
grandes quantidades de folhagem, exercendo forte pressão do
topo da cadeia trófica em direção à sua base (Malhi et al. 2016;
Galetti et al. 2018). Como exemplo, pode-se citar os elefantes
africanos, representantes da megafauna moderna capazes de
reduzir em até 95% a cobertura vegetal de espécies lenhosas
(Bakker et al. 2016). Segundo Malhi et al. (2016), megaherbívo-
ros alteram o equilíbrio competitivo entre espécies vegetais,
uma vez que reduzem a vegetação lenhosa, abrindo espaço no
hábitat para o crescimento de plantas herbáceas.

44 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
Grandes vertebrados representavam massas ricas em
nutrientes e partes vitais de ecossistemas dos quais inúme-
ras espécies dependiam. Adicionalmente, a megafauna apre-
sentava um papel essencial na ciclagem de nutrientes, rein-
serindo de forma abrupta nutrientes antes retidos em caules,
folhas, troncos e outras formas de matéria vegetal, que, do
contrário, não ficariam disponíveis para os sistemas (Malhi
et al. 2016; Galetti et al. 2018). Assim, herbívoros constituíam
verdadeiras máquinas de renovação bioquímica, possuindo
intestinos longos e bem compartimentados, que lhes pos-
sibilitavam manter dentro de si temperaturas ideais para a
proliferação de bactérias decompositoras de matéria vegetal
mesmo em ambientes temperados (Malhi et al. 2016; Galetti
et al. 2018). Como tinham intestinos longos e digestão lenta,
esses animais promoviam movimento de nutrientes entre
locais e até ecossistemas, por meio de fezes e urina, aumen-
tando no mínimo em 10 vezes as taxas de difusão de nutrien-
tes (Malhi et al. 2016).
Com o aumento de tamanho, alguns megaherbívoros
adultos praticamente escapavam da possibilidade de serem
caçados por qualquer predador em potencial (Smith et al.
2010; Malhi et. al 2016; Galetti et. al 2018). Já no que concer-
ne aos carnívoros, novas pressões seletivas, que envolviam
o processo de capturar, abater e consumir animais cada vez
maiores, foram um fator-chave para o surgimento de espe-
cializações (Valkenburgh 2007). Exemplos envolvem o apare-
cimento independente de animais “dentes-de-sabre” em di-
ferentes espécies, como os tigres-dentes-de-sabre (Smilodon

A EXTINÇÃO DA MEGAFAUNA NO ANTROPOCENO 45


fatalis) na América do Norte e o tilacosmilo (Thylacosmilus
atrox) na América do Sul (Valkenburgh 2007).
Salvo alguns eventos e fenômenos restritos de extin-
ção, a megafauna de forma geral proliferou e diversificou ao
longo de todo o restante do Cenozoico, mesmo durante os
períodos de glaciação e interglaciação, até que há, aproxima-
damente 50 mil anos atrás, houve um rápido decréscimo das
populações de megafauna no planeta (Malhi et al. 2016).

Extinção da megafauna

O desaparecimento de animais de grande porte duran-


te o fim do Pleistoceno e o início do Holoceno (aproximada-
mente 50 mil anos atrás) ocorreu de maneira generalizada
em todos os continentes, o que originalmente deixou os pes-
quisadores com grandes dúvidas a respeito de qual distúr-
bio ambiental teria provocado essas perdas (Chichkoyan et
al. 2017). As principais hipóteses sobre a extinção em massa
da megafauna vêm dos estudos acerca dos efeitos das mu-
danças climáticas e dos impactos causados pela colonização
humana (Barnosky et al. 2004). Tais estudos originaram hipó-
teses que foram suportadas por evidências provindas da cor-
relação entre o aumento das taxas de extinção, alguns even-
tos climáticos e a chegada de populações humanas (Homo
sapiens) em várias regiões do mundo (Barnosky et al. 2004).
A hipótese de que as mudanças climáticas tenham causado a
extinção da megafauna do Pleistoceno encontra suporte nas
seguintes evidências: (1) declínio da cobertura vegetal e da

46 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
disponibilidade de alimentos; e (2) declínio da massa corpó-
rea da fauna, o que, por sua vez, reduziu o recurso forrageiro
e a densidade da vegetação (Barnosky et al. 2004).
O H. sapiens surgiu há cerca de 200 mil anos atrás
na África do Sul (Richter et al. 2017)3. A hipótese de que os
seres humanos tiveram forte influência negativa sobre as
extinções da megafauna sugere que, por volta de 70 mil
anos atrás, dominaram todo o planeta e, por meio da caça,
levaram as espécies à extinção. À medida que os grupos
humanos se expandiram, milhares de animais desapare-
ceram, sendo essa a primeira marca significativa que o H.
sapiens deixou no planeta (Harari 2019). A extinção pelos
efeitos da chegada da espécie humana tem sido atribuída
ao desenvolvimento de técnicas aprimoradas para captu-
ra dos animais, o que propiciou a expansão da caça. Além
disso, as perturbações ambientais em decorrência das mu-
danças climáticas facilitaram a captura da fauna pelos hu-
manos, principalmente após o aumento da densidade po-
pulacional desses grupos (Fariña et al. 2014).
A coincidência entre o registro fóssil de mamíferos e
de alterações do clima e a estimativa da chegada de popu-
lações humanas é particularmente acentuada no continen-
te americano. Acredita-se que a chegada dos seres humanos
nesse continente tenha ocorrido entre 12,5 e 18,5 mil anos

3 Atualmente, há controvérsias sobre a origem do Homo sapiens, pois evi-


dências fósseis recentes apontam uma origem mais antiga, de cerca de
350 mil anos atrás, no Marrocos (ver Hublin et al. 2017).

A EXTINÇÃO DA MEGAFAUNA NO ANTROPOCENO 47


atrás, mesmo período em que há registro de mudanças climá-
ticas no Pleistoceno e da maioria das extinções megafaunais
(Barnosky et al. 2004; Bisso-Machado & Fagundes 2019). Em
escalas regionais, as congruências ficam mais evidentes. Na
América do Sul, estima-se uma extinção de 83% da megafau-
na acompanhada de aumentos de temperatura dos mares que
circundam os continentes, que vão de 2 ºC no oeste tropical
do Pacífico até 7 ºC no sudoeste tropical atlântico (Barnorsky
et al. 2004). Vale salientar, ainda, que essas mudanças climáti-
cas não foram mais fortes nem mais rápidas do que as ocorri-
das nos últimos 70 mil anos. Porém, combinadas com a expan-
são humana, poderiam causar esses impactos (Barnorsky et
al. 2004). Alguns estudos argumentam que ainda é necessária
a investigação de vestígios, artefatos e marcas antrópicas re-
lacionadas aos fósseis da fauna para analisar a relação entre a
caça e a diminuição dos animais no passado (e.g., Chichkoyan
et al. 2017). Por exemplo, o estudo de Yeakel et al. (2014) com-
binou dados paleontológicos e arqueológicos para entender a
dinâmica de comunidades e extinção de mamíferos ao longo
de 6,000 anos no Egito. Os autores demonstraram fortes in-
dícios de que a mudança climática e o impacto humano con-
tribuíram para o colapso das comunidades de mamíferos, que
mudou de 37 espécies no Pleistoceno/Holoceno para somen-
te oito espécies que vivem no período atual.

48 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
Extinção de grandes herbívoros

As evidências corroboram que a megafauna extinta no


último ciclo glacial, cerca de 130 milhões de anos atrás, era
formada predominantemente por herbívoros (Johnson 2009).
As extinções dos herbívoros foram simultâneas às mudan-
ças na composição das plantas desencadeadas após as varia-
ções na temperatura e na precipitação durante a transição do
Pleistoceno para o Holoceno (Gill et al. 2009)
Esses animais contribuíram para a manutenção de
hábitats abertos, promovendo o rápido crescimento da ve-
getação herbácea e removendo espécies lenhosas (Bakker
et al. 2016). Após a redução na densidade dos herbívoros,
a estrutura da vegetação perdeu interação com boa parte
dos frugívoros, enfrentando, por conseguinte, menor dis-
persão de sementes – sabe-se hoje que o papel de disper-
são desempenhado pela megafauna é praticamente insubs-
tituível por outros vertebrados (Pires et al. 2018). Assim, a
restrição da síndrome de dispersão dificultou a dispersão
de grandes sementes a longas distâncias até em assem-
bleias ricas em espécies de mamíferos. Nos cenários mais
conservadores, a dispersão foi reduzida em dois terços
depois do desaparecimento da megafauna (Pires et al.
2018). Dessa forma, as paisagens que antes eram diversas
e heterogêneas foram se tornando homogêneas e unifor-
mes (Bakker et al. 2016; Pires et al. 2018). Além disso, a den-
sidade da vegetação herbácea pode ter aumentado a pro-
babilidade de fogo, mediante alterações na temperatura e

A EXTINÇÃO DA MEGAFAUNA NO ANTROPOCENO 49


na aridez que levaram a mudanças no regime de incêndios
devido ao acúmulo de matéria vegetal e que, consequen-
temente, podem ter transformado a vegetação em exten-
sas pastagens, impossibilitando o forrageamento desses
animais (Johnson 2009).
Nesse contexto, vários frutos com sementes disper-
sas exclusivamente por esses organismos deixaram de ser
disseminados. Esse fenômeno em que espécies de plantas
não possuem animais com características que permitam a
dispersão de suas sementes é conhecido como anacronis-
mo de dispersão (ver Janzen & Martin 1982). Os “frutos da
megafauna”, hoje, são dispersados por animais recentes,
como gado, cavalos e humanos.

Alteração dos regimes naturais do fogo e


mudanças do clima regional e global

A modificação na vegetação após a perda dos grandes


herbívoros também foi causada pela alteração nos regimes
do fogo (Flannery 1990). Uma vez que a extinção de tais ani-
mais pode ter levado ao aumento da densidade vegetacional,
cientistas sugerem que o acúmulo de biomassa das plantas
acabou servindo de combustível em incêndios, centenas de
anos após a extinção da megafauna (Flannery 1990). As espé-
cies de animais que conseguiram sobreviver ao fogo, assim
como ao período de regeneração da paisagem, foram favore-
cidas pelo novo padrão vegetacional. Essa hipótese, proposta
por Flannery (1990) é chamada de “hipótese da substituição

50 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
dos herbívoros”, e sugere que grandes herbívoros atuaram
como modificadores da paisagem e que, como consequência,
o fogo assumiu papel fundamental após sua extinção.
Janzen & Martin (1982), por sua vez, propuseram a
hipótese de que, com a extinção dos grandes herbívoros,
as plantas que possuíam frutos dependentes de sua dis-
persão foram extintas e, como resultado, a pressão sele-
tiva favoreceu a sobrevivência e a manutenção de espécies
de plantas com sementes menores. Doughty et al. (2016)
corroboraram esta hipótese por meio de modelos mate-
máticos, indicando que as sementes dispersadas pela me-
gafauna sofreram uma redução de cerca de 26% em seu
tamanho e que a abundância de sementes é menor atual-
mente (em torno de 50%). A diminuição da abundância das
sementes provavelmente ocorreu porque sementes que
alcançam uma menor distância de dispersão têm menores
chances de encontrar espaço para germinar do que se-
mentes com maior alcance de dispersão. Ademais, o papel
funcional dos grandes herbívoros para garantir essa dis-
persão de longa distância foi confirmado por simulações
(Pires et al. 2018).
Doughty et al. (2016) também demonstraram que a re-
dução teve impactos não apenas na variedade de tamanhos
e na abundância das espécies, mas também na capacidade
de sequestro de carbono nas florestas da América do Sul. As
estimativas dos modelos indicaram uma correlação positiva
entre os tamanhos das sementes dispersadas pelos animais e
a densidade da madeira de suas respectivas árvores. Uma vez

A EXTINÇÃO DA MEGAFAUNA NO ANTROPOCENO 51


que as simulações evidenciaram que houve uma redução no
tamanho das sementes, estima-se que as árvores podem ter
reduzido seu teor de carbono em cerca de 4,2 ± 2,1 Mg/ha.
Como comentado anteriormente, a extinção de me-
gaherbívoros afetou a composição vegetal e, consequen-
temente, a paisagem de diferentes regiões (Doughty et al.
2016; Malhi et al. 2016). Em regiões temperadas com neve
sazonal, a ausência de grandes herbívoros provocou au-
mento na quantidade e no adensamento de árvores, que
tendem a refletir menos luz que a neve, o que pode ter re-
duzido significativamente o coeficiente de reflexão de luz
(isto é, o quanto determinada superfície reflete radiação
solar, reduzindo o calor que absorve). Tais estimativas
levam em consideração o carbono retido pelas árvores, a
evapotranspiração e a reflexão de radiação solar. Em ex-
perimentos de reintrodução de herbívoros, estipulou-se
que grandes animais são capazes de alterar a reflexão de
luz também por meio de pisoteamento e de remoção de
herbáceas, atingindo surpreendentes resfriamentos de 15
a 20 ºC ao nível do solo (Malhi et al. 2016).
Em escala global, a redução do coeficiente de reflexão
de radiação gerada pela extinção pode ter esquentado o pla-
neta em 0,2 ºC. Por outro lado, grandes vertebrados são fontes
de metano, gás com capacidade de reter calor na atmosfera.
Assim, cálculos sugerem que, na ausência de grandes verte-
brados como fonte de metano, o planeta pode ter esfriado de
0,08 a 0,20 ºC (Malhi et al. 2016). Portanto, curiosamente, há
um empate técnico: os valores de aumento de temperatura

52 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
associados ao aumento de árvores em regiões de neve são
muito próximos aos valores da redução de temperatura rela-
cionados à redução de emissão de gás metano. Dessa forma,
não há um consenso sobre as consequências climáticas da
extinção da megafauna em nível global, e estudos precisam
levar em consideração diferentes fontes do efeito estufa e de
reflexão da luz para não focar apenas uma faceta do fenôme-
no (Malhi et al. 2016).

Perda de interações bióticas e coextinções

Diversos estudos sugerem que grandes vertebrados da


megafauna coevoluíram com vários organismos através de
inúmeras interações bióticas como mutualismo, competição
e predação. Assim, a extinção desses organismos pode ter in-
fluenciado várias outras espécies, como parasitas, comensais
e mutualistas (Galetti et al. 2018). Contudo, o efeito de coex-
tinções sobre os ecossistemas é relativamente difícil de ser
estimado, devido ao pouco conhecimento sobre as relações
dinâmicas das interações entre as várias espécies extintas,
com exceção do material de registros fósseis (Galetti et al.
2018).
Organismos comensais associados à megafauna
também passaram por uma possível coextinção. Exemplos
seriam besouros rola-bosta (Scarabeidae), que são depen-
dentes das fezes de grandes vertebrados principalmente
para reprodução. Além disso, animais carniceiros dependen-
tes de carcaça desses vertebrados podem ter sido fortemente

A EXTINÇÃO DA MEGAFAUNA NO ANTROPOCENO 53


afetados (Galetti et al. 2018). É possível que parte das espé-
cies de escarabeídeos tenha transitado de hábito e passado
a utilizar fezes de outros vertebrados menores ou até de es-
pécies domesticadas por humanos, como o gado. No entan-
to, mesmo com essas pressões seletivas, algumas espécies de
besouros mantiveram os padrões de distribuição geográfica
que apresentavam na época em que interagiam com a mega-
fauna (Galetti et al. 2018).
O desaparecimento de várias espécies da megafau-
na também levou à coextinção de necrófagos, como hienas,
em especial as de maiores tamanhos como a “hiena gigante”
(Pachycrocuta brevirostris), hoje conhecida por registro fóssil
(Galetti et al. 2018). Quando grandes vertebrados morrem,
a disponibilidade de vários nutrientes e de energia diminui
de maneira abrupta, modificando drasticamente as imedia-
ções em que se encontram, o que os torna espécies-chaves
nos ciclos biogeoquímicos dos sistemas. Isso é observável até
hoje, quando da morte de espécies como elefantes, por exem-
plo (Malhi et al. 2016; Galetti et al. 2018).
Com a diminuição das populações de grandes herbívo-
ros, as relações de predação de grandes vertebrados prova-
velmente foram afetadas, uma vez que os parentes dos pre-
dadores atuais como onças (Panthera onca) e coiotes (Canis
latrans), tinham maiores tamanhos no Pleistoceno. Essa mu-
dança no tamanho do corpo sugere uma mudança na dieta:
sem a disponibilidade de grandes herbívoros, tais predado-
res passaram a buscar presas menores, já que ambas as espé-
cies têm um leque amplo de presas, e, assim, a seleção natural

54 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
passou a favorecer corpos menores (Galetti et al. 2018). Como
resultado, estudos sugerem que carnívoros maiores e especia-
listas que foram incapazes de se adaptar à ausência de presas
grandes desapareceram. Essa extinção de grandes predado-
res ocorreu antes mesmo do desaparecimento total de gran-
des herbívoros em muitas localidades, como mostra o registro
fóssil (Galetti et al. 2018). A diversidade de grandes mamíferos
predadores, até então especializados em consumir grandes
quantidades de carne, foi drasticamente reduzida durante o
fim do Pleistoceno e o início do Antropoceno/Holoceno.

Figura 1. Síntese dos efeitos da extinção de grandes vertebrados. 1 – Coextin-


ção de espécies comensais ou mutualistas que dependiam da megafauna, como
besouros rola-bosta (Scarabeidae), abutres e espécies de árvores dependen-
tes da dispersão de sementes. 2 – Redução abrupta da ciclagem dos nutrientes
nos ecossistemas, visto que a megafauna reintroduzia nos sistemas nutrientes
da biomassa vegetal; 3 – Aumento do adensamento de árvores em diferentes
ecossistemas, resultante do pisoteamento causado por grandes vertebrados e
da diminuição da herbivoria. O adensamento das árvores aumentou a escala e o

A EXTINÇÃO DA MEGAFAUNA NO ANTROPOCENO 55


risco de incêndios naturais nos ambientes (3a) e, em regiões sazonais, reduziu os
índices de reflexão de luz, causando o aumento da temperatura regionalmente
(3b); 4 – Com a extinção de grandes vertebrados, houve redução da produção de
metano gerado pela digestão desses animais, o que tem potencial para influen-
ciar mudanças climáticas.

Considerações finais

A extinção de grandes vertebrados está simultanea-


mente relacionada à expansão de populações humanas e a
mudanças climáticas naturais. Inúmeros efeitos indiretos da
extinção ocorreram nos ecossistemas do mundo, incluindo
(i) coextinção de espécies dependentes da megafauna, (ii) al-
terações drásticas na cobertura vegetal das paisagens e (iii)
mudanças climáticas regionais e globais. Como a megafau-
na representava espécies-chaves na reintrodução de nutrien-
tes e na regulação de cadeias tróficas, observar os efeitos de
sua ausência nos ecossistemas pode auxiliar cientistas a en-
tender e prever as eventuais consequências das extinções
modernas.

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58 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
4
O ANTROPOCENO E A EMERGÊNCIA
DAS AÇÕES HUMANAS

Ana Claudia Batista Souza, Flávia Regina Domingos,


Julimery Gonçalves Ferreira Macedo, Samara Feitosa
Oliveira, Joelson Moreno Brito de Moura

O modo de vida da espécie humana tem promovido intensas


transformações no planeta desde a Revolução Industrial, indicada
por alguns cientistas como o início do Antropoceno. As mudanças
globais têm resultado na depleção dos recursos ambientais e na
desigualdade social, que representam indícios das ações humanas
pós-Revolução Industrial e podem, inclusive, ser identificadas nas
camadas estratigráficas formadas pela deposição de “tecnofósseis”
e por mudanças nos ciclos biogeoquímicos. Essas mudanças
evidenciam a capacidade humana de interferir na dinâmica do
planeta, capacidade essa que também poderia ser usada a fim
de avaliar as alternativas tecnológicas para minimizar os danos
socioambientais ocasionados por nossa espécie, diminuindo a
pegada ecológica individual e coletiva da humanidade.
Não é tarefa fácil datar o início de uma era geológica,
ainda mais quando esta é fortemente caracterizada por
outros fatores além da geologia propriamente dita. Esse é
o caso do Antropoceno, época em que a influência humana
na Terra se tornou marcante e alterou a paisagem global,
moldando, consequentemente, a evolução do planeta que
conhecemos hoje (Cooke et al. 2019; Schweiger et al. 2019;
Syvitski et al. 2020). Embora, aparentemente, as ativi-
dades humanas causem impactos no planeta desde sua
origem no final do Pleistoceno, há cerca de 315 mil anos
(Hublin et al. 2017), há propostas que remetem o início do
Antropoceno à última parte do século XVIII, com o adven-
to da Revolução Industrial, em 1760 (Waters et al. 2016)
(veja discussão no primeiro capítulo deste livro). Esse pe-
ríodo coincide com o aumento das concentrações de gás
carbônico e metano na atmosfera e, também, com a in-
venção da máquina a vapor, em 1784 (Crutzen & Stoermer
2000).
De acordo com Syvitski et al. (2020), algumas práticas
humanas – uso de energia, produtividade econômica e cresci-
mento populacional – são tão marcantes que funcionam como
impulsionadores fundamentais da passagem do Holoceno
para o Antropoceno. O gasto de energia no Antropoceno, por
exemplo, principalmente por meio da combustão de combus-
tíveis fósseis, é de aproximadamente 22 zetajoules (ZJ), exce-
dendo os 14,6 ZJ do Holoceno.
Dessa forma, os efeitos globais das atividades huma-
nas sobre o planeta Terra, a partir da Revolução Industrial,

60 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
tornaram-se claramente perceptíveis, tais como (i) inten-
sificação do crescimento urbano, (ii) aumento significativo
da produção de bens de consumo e (iii) sobrecarga no uso
dos recursos naturais (Waters et al. 2016). Na Figura 1, a
seguir, ilustram-se as características mais marcantes de
cada época, desde o surgimento do ser humano até dos
dias atuais.

Figura 1. Características mais marcantes relacionadas à chegada do H. sapiens no


Pleistoceno (estimativa de cinco indivíduos por 100 km2), no Holoceno (estima-
tiva de um indivíduo por km2) e no Antropoceno (estimativa de 51 indivíduos por
km2) (ver Chaput et al. 2015; Archer 2021).

O ambiente natural vem sofrendo significativa in-


fluência humana há mais de oito mil anos, mas as maiores
e mais intensas transformações na biosfera se concen-
tram nos últimos 200 anos. Diversas práticas culturais
da espécie humana criaram estressores ambientais que
podem moldar certos ecossistemas de forma significativa
ao longo do tempo (Cooke et al. 2019; Le Roux et al. 2019;
Dong et al. 2020). O extrativismo vegetal praticado pelos

O ANTROPOCENO E A EMERGÊNCIA DAS AÇÕES HUMANAS 61


seres humanos, por exemplo, constitui uma ação capaz
de resultar em alterações de paisagens e das caracterís-
ticas fenotípicas das espécies-alvo. Cabe citar Saussurea
laniceps e Saussurea medusa, plantas usadas na medici-
na tradicional chinesa e tibetana que são coletadas como
souvenirs. S. laniceps é colhida com mais frequência do que
S. medusa, e indivíduos maiores são mais comumente co-
lhidos porque a população local considera esse procedi-
mento mais eficiente (Law & Salick 2005). Pesquisadores
observaram que, ao longo de 100 anos, S. laniceps apre-
sentou um declínio significativo no tamanho, aspecto que
permaneceu inalterado em S. medusa. Além disso, em áreas
de alta intensidade de colheita, os indivíduos de plantas de
S. laniceps são menores do que aqueles em áreas protegi-
das (Law & Salick 2005).

Evidências estratigráficas

Cientistas afirmam que as atuais mudanças globais


representam evidências robustas de que vivenciamos uma
mudança de época geológica nos últimos dois séculos
(Zalasiewicz et al. 2011; Baskin 2015; Rickards 2015). Alguns
estudos sugerem que tais mudanças podem ser represen-
tadas por meio de assinaturas litoestratigráficas, resul-
tantes da modificação da paisagem pela movimentação ar-
tificial de sedimentos para extração de minerais metálicos
e não metálicos, obras de aterro e recuperação costeira
(Waters et al. 2016). Além disso, a fabricação e a deposição

62 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
no ambiente de materiais totalmente novos, sem registros
anteriores na história do planeta, como concreto, vidro,
alumínio e plástico, também exercem influência nessa mu-
dança. Esses novos materiais ocupam grande espaço na
vida moderna e se espalham pelos ambientes terrestres
e marinhos, formando camadas que funcionam como um
sinal geológico persistente e generalizado da atividade
humana (Dong et al. 2020). Ademais, a resistência desses
materiais à decomposição, principalmente o plástico,
transforma-os em verdadeiros fósseis (tecnofósseis) que,
tal como os fósseis biológicos, fornecem um registro es-
tratigráfico dessa época (Elias 2018).
Existem evidências de assinaturas quimioestratigráfi-
cas, referentes a alterações globais nos ciclos biogeoquímicos
e no clima devido ao aumento sem precedentes da produção
e liberação de gases do efeito estufa. Esse aumento se encon-
tra registrado na Antártida e na Groenlândia, em pequenas
bolhas de ar que se solidificaram no gelo e, desse modo, pre-
servaram as características presentes na atmosfera em dado
período (Zalasiewicz et al. 2011). Registros atmosféricos do
século passado evidenciam que as concentrações de gás car-
bônico anteriores à Revolução Industrial são 40% menores do
que os níveis atuais e indicam que a concentração de metano
apresenta atualmente taxas que representam o dobro dos va-
lores pré-industriais (Elias 2018).
Para Syvitski et al. (2020), o extraordinário aumen-
to do consumo e da produtividade provocado pelos seres
humanos forçou mudanças físicas, químicas e biológicas

O ANTROPOCENO E A EMERGÊNCIA DAS AÇÕES HUMANAS 63


abruptas no registro estratigráfico da Terra, o que pode
ser usado para justificar e caracterizar a proposta de
nomear uma nova época, o Antropoceno. Ao encontro
disso, um estudo realizado na área urbana da cidade ita-
liana de Palermo mostrou que as grandes mudanças geo-
morfológicas produzidas pelo ser humano nos últimos
2.700 anos afetaram a superfície topográfica e subterrâ-
nea da região, expondo grandes áreas da cidade a riscos
hidráulicos, de sumidouros e deslizamentos de terra. Além
disso, essas mudanças aumentaram os níveis de suscetibi-
lidade sísmica da região (Cappadonia et al. 2020).

Mudanças biológicas

O crescimento da humanidade gerou impactos também


em fatores abióticos e bióticos (Rick & Sandweiss 2020), dos
quais se destacam os seguintes:

• Recursos hídricos (mudanças no ciclo da água,


crise de abastecimento, esgotamento de aquíferos
e variações nos períodos de seca e chuva) – muitas
atividades executadas pela humanidade com o de-
senvolvimento de tecnologias exercem influência
sobre a dinâmica dos recursos hídricos. A altera-
ção no curso dos rios ou a instalação de barramen-
tos, a retirada de mata ciliar e a contaminação da
água podem ter consequências graves, tais como
crises de abastecimento, esgotamento de aquíferos

64 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
e rebaixamento dos níveis dos lençóis freáticos.
As mudanças no ciclo da água envolvem, também,
uma maior variação nos períodos de chuva e seca,
bem como elevação dos níveis do mar e mudanças
nas linhas de costa. Os impactos dessas mudanças
atingem toda a população do planeta, mesmo que
as atividades transformadoras sejam realizadas em
nível local (Cirilo 2015; Rick & Sandweiss 2020).

• Invasão biológicas e expansão de pragas biológi-


cas – a globalização e as tecnologias aperfeiçoadas
pós-Revolução Industrial também influenciaram a
expansão de pragas biológicas, com a disseminação
de espécies invasoras, em decorrência da facilidade
de transporte através do aumento da capacidade de
deslocamento do ser humano. As espécies exóticas
invasoras, segundo o Ministério do Meio Ambiente
(MMA 2006), “são organismos que, introduzidos fora
da sua área de distribuição natural, ameaçam ecos-
sistemas, habitats ou outras espécies”. Alguns es-
tudos sobre esses organismos sugerem que a inva-
são biológica representa uma das principais causas
de extinção de biodiversidade (Gurevitch & Padilla
2004; Ricciardi 2004), o que, por sua vez, tem efei-
tos diretos e indiretos sobre a economia e a saúde
humana (Holmes et al. 2009; Nuñez et al. 2020).

O ANTROPOCENO E A EMERGÊNCIA DAS AÇÕES HUMANAS 65


• Deterioração do solo – a aceleração do desmata-
mento para cultivo e pastagens gerou mudanças na
qualidade do solo em todos os biomas terrestres. O
principal fator associado à conversão de ecossiste-
mas naturais em cultivos é a produção de alimen-
tos (Artaxo 2014), que exerce influência também em
outros aspectos, como a biodiversidade, o uso de
água e o clima. Thomaz et al. (2020) argumentam
que o desmatamento e o estabelecimento de pasta-
gem no sudoeste da Amazônia brasileira estão afe-
tando o funcionamento do ecossistema como, por
exemplo, a ciclagem de nutrientes. Essas modifica-
ções, ao longo do tempo, afetam as propriedades
físico-químicas do solo, o conteúdo de carbono no
solo e os sistemas aquáticos. Segundo Childs (2007),
a microbiota do solo tem papel essencial para a ma-
nutenção da biodiversidade, uma vez que é respon-
sável por processos que possibilitam o controle de
pragas e doenças.

Mudanças Sociais

O Antropoceno representa uma grande transformação


na natureza geofísica do sistema global, que coincide com a
transformação mundial provocada pelo aumento populacio-
nal e pela ocidentalização, estando, assim, vinculado também
a questões sociológicas, às formas de governos, aos cenários
econômicos, às guerras, ao poder e à desigualdade em escala

66 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
global (Luke 2017). Para Hornborg (2019), o Antropoceno, em
termos de energia, clima e ambiente, teve implicações pro-
fundas em questões de justiça e desigualdades globais, de
tal forma que é preciso repensar as noções convencionais de
desenvolvimento econômico e progresso tecnológico, mais
especificamente a tendência contemporânea de idealizar a
economia de maneira separada da natureza e a tecnologia de
modo cindido da sociedade. Para Dasgupta (2008), faz-se ne-
cessário considerar a natureza como um fator essencial para
o progresso econômico. Todavia, pouco se tem feito nesse
aspecto, e as políticas econômicas ainda insistem em estra-
tégias que afastam cada vez mais a natureza de suas pautas
(Dasgupta 2008).
Uma pergunta que pode ser colocada agora é se os seres
humanos já atingiram um ponto de transformação evolutiva
que coincida com o Antropoceno, já que populações huma-
nas e não humanas evoluíram juntas e continuamente modi-
ficam umas às outras (Russel 2011; Albuquerque et al. 2019).
Devido a processos de aceleração química, o corpo humano
atual é provavelmente muito distinto fisiologicamente do
corpo anterior ao ano de 1945 (Thomas 2014). Alguns enten-
dem que os avanços em neurologia, biotecnologia e fisiologia
humana criaram o “corpo tóxico”, mas também produziram
um ser humano muito diferente daquele que viveu alguns sé-
culos atrás no que concerne à saúde, longevidade e capacida-
de cognitiva (ver Thomas 2014).
Vive-se, hoje, um enfrentamento conjugado da crise
ambiental e da realidade desigual das sociedades humanas

O ANTROPOCENO E A EMERGÊNCIA DAS AÇÕES HUMANAS 67


em escala planetária. Diante disso, o enorme desafio das pró-
ximas décadas consiste em sanar a desigualdade insustentá-
vel, fazendo ao mesmo tempo as reformas estruturais, tec-
nológicas e existenciais necessárias para enfrentar a crise
ambiental e social global.

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70 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
5
ASPECTOS ECOLÓGICOS, EVOLUTIVOS
E SOCIAIS DO ANTROPOCENO:
DO ADVENTO DA AGRICULTURA
ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Anderson Silva Pinto, Macelly Correia Medeiros,


Moacyr Xavier Gomes Silva, Joelson Moreno Brito de Moura

A capacidade de promover transformações na paisagem para


que o hábitat se tornasse cada vez mais favorável para práticas
agrícolas pode ser considerada um dos principais motivos pelos
quais a espécie humana é uma das mais bem-sucedidas da
história. No entanto, as mesmas alterações que possibilitaram
o impressionante aumento populacional dos humanos hoje
ameaçam não só nosso estilo de vida, mas também a vida de outras
centenas de milhares de espécies. Uma das consequências mais
emblemáticas são as mudanças climáticas, que provavelmente
surgiram devido às alterações ambientais causadas por nosso estilo
de vida. Tendo isso em vista, faremos uma reflexão sobre como
as alterações na paisagem geradas pelo Homo sapiens ao longo
da história constituem uma via de mão dupla, ora favorecendo a
permanência da espécie, ora ameaçando sua existência.
Apesar de ter aparecido recentemente na história geo-
lógica da Terra, há cerca de 315 mil anos (Hublin et al. 2017), a
espécie humana foi e está sendo responsável por grandes mu-
danças no planeta, uma vez que tem a capacidade de moldar
o ambiente em que está inserida conforme suas demandas
(Laland & Brown 2006). Durante o Pleistoceno, por exemplo,
a chegada dos seres humanos na região dos Andes promoveu
o aumento da prática de incêndios e levou ao desaparecimen-
to da megafauna (como discutido no terceiro capítulo deste
livro) (Raczka et al. 2019). O desaparecimento desses grandes
animais pode ter ocasionado sérios problemas ambientais,
como a diminuição da dispersão de sementes no ambien-
te, posto que provocou perda ou mudança de várias funções
ecológicas (Pires et al. 2018). Sabe-se, ainda, que o impacto
humano sobre o ambiente se tornou mais intenso no início
do Holoceno, há cerca de 12 mil anos, época em que o plane-
ta passava por maior estabilidade climática. Nesse período,
temperaturas mais elevadas e constantes foram essenciais
para que a espécie humana desse um dos passos mais im-
portantes para seu desenvolvimento, a agricultura (Tierney
et al. 2017).
Durante o Holoceno, fase em que também ocorreu a
chamada “revolução agrícola”, a espécie humana desenvol-
veu duas atividades essenciais para a mudança drástica de
sua relação com o ambiente: (i) a vida assentada e fixa e (ii)
a domesticação de plantas e animais. Se, por um lado, plan-
tas e animais domesticados passam a ser dependentes da
manutenção por parte da espécie humana, por outro, a vida

72 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
assentada dos seres humanos aumenta a dependência que
estes possuem de plantas e animais domesticados. A manu-
tenção de um estoque estável (seja de plantas ou animais) ao
longo do ano requer o desenvolvimento de estratégias e prá-
ticas de manejo do ambiente que modificam a relação entre
humanos e natureza (ver Koster 2008; Santos et al. 2009).
Como resultado, as práticas agrícolas estimularam grandes
mudanças na paisagem, uma vez que a necessidade de espaço
livre para plantações e pastagens levou ao desmatamento e
à conversão da vegetação natural (Ucko & Dimbleby 2007).
Assim, a modificação constante da paisagem ao longo de mi-
lhares de anos tem impulsionado mudanças evolutivas sobre
outras espécies (ver Sullivan et al. 2017).
Neste capítulo, iremos discutir como as atividades hu-
manas podem representar uma pressão seletiva sobre a bio-
diversidade e, desse modo, explicar os padrões atuais de di-
versidade no planeta. Além disso, debateremos uma das
principais causas da perda de biodiversidade – as mudanças
climáticas – e a forma como elas também afetam questões
evolutivas e sociais.

Atividades humanas passadas e o padrão


de distribuição atual da biodiversidade

Um dos exemplos mais emblemáticos que demonstra-


ram a capacidade de populações humanas de alterar (em escala
espacial e temporal) a distribuição de outras espécies foi en-
contrado na Amazônia. Levis et al. (2017) observaram que o

ASPECTOS ECOLÓGICOS, EVOLUTIVOS E SOCIAIS DO ANTROPOCENO:


DO ADVENTO DA AGRICULTURA ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS 73
uso de certas espécies vegetais de algumas regiões da Floresta
Amazônica por povos antigos há oito mil anos resultou na hi-
perdominância dessas espécies em períodos atuais. Assim, prá-
ticas humanas passadas podem influenciar por muito tempo a
distribuição de algumas espécies de árvores encontradas em
florestas modernas (Levis et al. 2017). Outro exemplo é o caso
do deserto da Austrália, em que os aborígenes praticam a caça
de lagartos-monitores, por meio da estratégia da queima de
trechos de pastagens, criando um mosaico de sucessão vegeta-
tiva que suporta densidades mais altas de muitas espécies tra-
dicionalmente caçadas. Nos meados do século XX, houve uma
pausa na queima tradicional, o que levou ao colapso trófico e
coincidiu com a extinção de alguns marsupiais endêmicos. Isso
sugere que, ao mesmo tempo que a predação humana e a mo-
dificação da paisagem podem afetar negativamente a distribui-
ção de outros animais, adaptações significativas de certos mar-
supiais à presença de perturbação humana intensiva em longo
prazo podem, por exemplo, promover a evolução de adaptação
morfológica (Sullivan et al. 2017).
Além de alterar os padrões ecológicos, as atividades hu-
manas podem gerar mudanças evolutivas em populações de
outras espécies, ocasionando, principalmente, modificação na
frequência genética por meio da diminuição ou do aumento
da diversidade genética de certas espécies (Laland et al. 1996).
Entretanto, a perda da diversidade genética pode ter sérias
implicações evolutivas, como a extinção de espécies (Sullivan
et al. 2017). Assim, diversos estudos têm demonstrado de que
forma práticas humanas podem influenciar a história evolutiva

74 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
de outras espécies, a exemplo da fragmentação da paisagem
no Parque Nacional de Doñana e na Serra Morena (Espanha),
que reduziu a diversidade genética da águia-imperial espanho-
la (Aquila adalberti) (Martínez-Cruz et al. 2004). No Brasil, a
fragmentação da Mata Atlântica resultou na redução da diver-
sidade genética da onça-pintada (Panthera onca) (Valdez et al.
2015). De maneira semelhante, em sistemas aquáticos, a pesca
intensa reduziu a diversidade genética de peixes do gênero
Merluccius (Henriques et al. 2016).
Uma vez que tais atividades são capazes de afetar a
diversidade genética, a manutenção dessas pressões seleti-
vas pode gerar também modificações fenotípicas nas espé-
cies. Por exemplo, Law & Salick (2005) demonstraram que
o extrativismo vegetal de lótus-da-neve (Saussurea lani-
ceps) propiciou, em longo prazo, a redução do tamanho das
plantas. Tais evidências foram encontradas também em ani-
mais. A construção de uma ponte em Nebraska, nos Estados
Unidos, causou a fragmentação da paisagem e a diminui-
ção no comprimento das asas das andorinhas-do-penhasco
(Petrochelidon pyrrhonota), provavelmente porque asas mais
curtas auxiliaram na agilidade do voo e reduziram o risco
de colisão com veículos que transitavam no local (Brown &
Brown 2013). Nesse caso, as aves mortas por carros possuíam
asas mais longas do que a população geral, e a frequência de
aves mortas na estrada declinava constantemente, apesar do
crescente aumento de veículos.
Além dos efeitos ecológicos e evolutivos causados
pela domesticação, fragmentação e sobre-exploração, as

ASPECTOS ECOLÓGICOS, EVOLUTIVOS E SOCIAIS DO ANTROPOCENO:


DO ADVENTO DA AGRICULTURA ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS 75
mudanças climáticas ocasionadas pela espécie humana estão
gerando mudanças na distribuição espacial e temporal das
demais espécies, bem como em suas características genéti-
cas e morfológicas (MacLean et al. 2018). O estudo de Weeks
et al. (2019), por exemplo, analisou mais de 70 mil indivíduos
de 52 espécies de aves durante uma série temporal de quatro
décadas para entender como o aquecimento global explicaria
mudanças no tamanho corporal ao longo do tempo. Os au-
tores demonstraram que o aumento da temperatura média
entre os anos de 1978 e 2016 causou uma redução do tamanho
corporal e um aumento do comprimento da asa das espécies
estudadas. Consequentemente, as modificações morfológi-
cas determinadas pela temperatura e pelo clima afetaram
diferentes aspectos da história de vida dessas aves migrató-
rias, como, por exemplo, fenologia e distribuição geográfica
(Weeks et al. 2019).

Atividades humanas passadas e seus


impactos climáticos e sociais

Como visto nos exemplos anteriores, as populações hu-


manas alteram o hábitat local no qual estão inseridas de tal
forma que as mudanças causadas são percebidas espacial-
mente, temporalmente e evolutivamente. Além de influen-
ciar a distribuição de árvores na Amazônia, a extinção de
marsupiais na Austrália e a redução da diversidade genéti-
ca da águia-imperial espanhola e da onça-pintada brasileira,
as atividades humanas impactam seu próprio estilo de vida e

76 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
toda a sua organização social. O aperfeiçoamento das técni-
cas agrícolas é um bom exemplo de como a espécie humana
modificou significativamente o ambiente ao seu redor e, de
modo simultâneo, alterou drasticamente suas características
sociais. A implementação de técnicas agrícolas possibilitaram
uma produção de alimentos cada vez maior e culturas agríco-
las diversificadas e progressivamente mais adaptadas às con-
dições ambientais locais. Como resultado, a agricultura pro-
piciou o aumento de assentamentos humanos e a criação de
vilas e cidades em que as relações comerciais, econômicas,
religiosas e políticas eram cada vez mais comuns (Bocquet-
Appel 2011).
Outro fator impulsionador do grande crescimento po-
pulacional humano e de sua diversificação cultural foi a
Revolução Industrial, que possibilitou a exploração de ter-
ritórios cada vez mais distantes e a produção em massa de
produtos antes inacessíveis para a maior parte da popula-
ção. Com a construção das ferrovias e a criação da máquina
a vapor, territórios inacessíveis até então puderam ser alte-
rados em velocidade nunca antes vista, e um dos principais
fatores de alteração das mudanças do equilíbrio global co-
meçou a ganhar força: o aumento das emissões de gás carbô-
nico na atmosfera (Crutzen & Steffen 2003). O gás carbônico
constitui um dos principais gases responsáveis por mudanças
na temperatura da atmosfera e dos oceanos e, consequen-
temente, pelas mudanças climáticas do planeta. Embora seja
sabido que a Terra passe por eventos naturais e periódicos de
resfriamento e aquecimento ao longo do tempo, acredita-se

ASPECTOS ECOLÓGICOS, EVOLUTIVOS E SOCIAIS DO ANTROPOCENO:


DO ADVENTO DA AGRICULTURA ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS 77
que as atividades humanas estão contribuindo para um aque-
cimento não natural do planeta. Para confirmar essa hipó-
tese, Steffen (2000) coletou amostras de gelo na Antártica a
uma profundidade de 3.623 metros – uma vez que o gelo se
forma a partir do acúmulo de camadas anuais de neve, as ca-
madas mais profundas são mais antigas do que as superiores.
A partir disso, os autores concluíram que as concentrações
de gás carbônico e metano no gelo variaram entre 180 e 200
partes por milhão (ppm) em períodos glaciais e entre 265 e
280 ppm em períodos interglaciais nos últimos 420 mil anos.
Na época da publicação do artigo, as concentrações de gás
carbônico alcançaram a marca de 365 ppm, valor que está
muito acima dos observados em um passado recente.
As consequências do aquecimento global são inúmeras
para as diversas espécies vegetais e animais, inclusive para a
espécie humana. O IPCC destaca que o aumento da tempera-
tura global pode gerar mudança no ciclo das chuvas em várias
regiões do planeta, provocando secas prolongadas ou alaga-
mentos que podem gerar perdas e/ou aumentar os custos
da produção de insumos agrícolas (Trenberth et al. 2007).
De fato, alguns estudos têm demonstrado que pessoas que
trabalham com a produção de alimentos, por exemplo, pre-
cisam se adaptar a essas paisagens modificadas e desenvol-
ver estratégias de sobrevivência diante das novas condições
ambientais.
Cabe destacar, ainda, que as alterações podem ir muito
além do ciclo de chuvas. Para Lenton (2011), alguns sistemas
climáticos estão no seu limite, de modo que uma pequena

78 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
mudança na temperatura poderia causar perdas irreversíveis.
Estão em risco, por exemplo, a Corrente do Golfo (que contri-
bui para o clima ameno da Europa), o degelo de regiões do he-
misfério norte (Groelândia), o derretimento de parte do gelo da
Antártica, a mudança no ciclo de monções na Ásia e o aumen-
to do nível do mar entre 50 e 100 metros em diversas partes do
mundo. Nesse sentido, algumas abordagens de práticas sus-
tentáveis, como as fronteiras planetárias4, podem auxiliar na
elaboração de práticas humanas mais sustentáveis, uma vez
que estipulam os limites físicos dentro dos quais a humanidade
pode operar com segurança (Rockström et al. 2009).
Além de ser uma mudança ambiental significativa, o au-
mento do nível dos mares configura uma mudança que pode
ter consequências políticas catastróficas. Considerando que
10% da população mundial vive em áreas costeiras a menos
de 10 metros acima do nível do mar, os efeitos adversos do au-
mento do nível do mar nessas áreas constituem uma grande
ameaça, podendo, nos próximos anos, impactar milhões de
pessoas (ver Cazenave & Le Cozannet 2013). Brown (2007)

4 Rockström et al. (2009) destacaram a existência de nove fronteiras pla-


netárias: mudanças climáticas, acidificação dos oceanos, esgotamento
estratosférico de ozônio, ciclos de nitrogênio e fósforo, uso de água
doce, mudança no uso da terra, taxa de perda de biodiversidade, polui-
ção química e carga atmosférica de aerossóis. Os sete primeiros podem
ser quantificados, e três das nove fronteiras planetárias – mudanças
climáticas, taxa de perda de biodiversidade e ciclo do nitrogênio – já
foram ultrapassadas. Além disso, a humanidade está se aproximando
rapidamente dos limites para o uso de água doce e para a conversão de
florestas e outros ecossistemas naturais.

ASPECTOS ECOLÓGICOS, EVOLUTIVOS E SOCIAIS DO ANTROPOCENO:


DO ADVENTO DA AGRICULTURA ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS 79
destaca que essa será uma das maiores consequências das
mudanças climáticas, pois poderá fazer com que cerca de 200
milhões de pessoas se tornem “migrantes climáticos” até o
ano de 2050. A esse respeito, é preciso lembrar que muitos
países europeus fecharam suas fronteiras e que várias cam-
panhas de cunho nacionalista surgiram na década de 2010,
pressionando os governos para que não aceitassem refugia-
dos políticos em seus territórios, e questionar se os migran-
tes climáticos enfrentarão o mesmo problema.

Considerações finais

Fica evidente, portanto, que as mudanças percebidas


no Antropoceno geram implicações para os campos político,
econômico, social, cultural e ambiental. A partir do momento
em que se começou a falar sobre limites (ver Rockström et al.
2009), torna-se nítido que os recursos estão sendo sobre-ex-
plorados e que uma mudança de hábitos se faz necessária. Ao
discutir mudança de práticas e de estilo de vida, por exemplo,
também é preciso repensar os parâmetros de qualidade de
vida adotados pela sociedade atual. Além disso, deve-se re-
pensar as técnicas e teorias utilizadas para entender como os
processos sociais e culturais modificam a biodiversidade e a
ecologia do planeta (Ellis 2019).
Trocar um uso presente por um benefício futuro, que
será aproveitado por gerações posteriores à nossa, pode re-
presentar algo inviável para os governos e a sociedade de
forma geral, já que a espécie humana possui a tendência de

80 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
dedicar mais atenção a questões imediatas do que a questões
futuras (Death 2013). Moore et al. (2019) utilizam a metáfora
do sapo fervente para ilustrar esse cenário. A metáfora fala de
um sapo que pode morrer se for colocado em água que ferve
lentamente, mas que pode viver, apesar de ferido, se for colo-
cado em uma água que já está fervida. Para Gonçalves­Souza
et al. (2020), essa metáfora serve como alerta para as socieda-
des humanas, que costumam responder rapidamente a even-
tos climáticos extremos e riscos ambientais, como o surto de
Covid-19, mas não percebem que esses problemas que aco-
metem o mundo podem estar correlacionados. Inclusive, po-
líticas conservacionistas que lidam com ameaças ambientais
de longo prazo são difíceis de serem implementadas justa-
mente pela dificuldade de os seres humanos se preocupa-
rem com problemas ambientais que podem acontecer em um
futuro distante (Penn 2003; Henry et al. 2017).
Esse cenário já pode ser observado atualmente quando
países desenvolvidos e em desenvolvimento, temendo sofrer
prejuízos econômicos em curto prazo, entram em desacor-
do sobre suas metas e obrigações acerca das questões cli-
máticas. Nessa perspectiva, se não houver uma mudança de
atitude no presente, o futuro talvez testemunhe a humani-
dade conquistando novos materiais e fontes de energia e, ao
mesmo tempo, destruindo o que resta do hábitat natural e le-
vando a maior parte das outras espécies (e quem sabe inclu-
sive a nossa) à extinção.

ASPECTOS ECOLÓGICOS, EVOLUTIVOS E SOCIAIS DO ANTROPOCENO:


DO ADVENTO DA AGRICULTURA ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS 81
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84 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
6
PADRÕES DE DIVERSIDADE
NO ANTROPOCENO

Djalma Souza, Emily Cavalcanti, Luciana Soares Lima,


Marleny Prada, Paulo Henrique Gonçalves

As diversas transformações no Antropoceno são claramente


evidenciadas nos padrões regionais e globais de diversidade
biológica. A biodiversidade deve ser entendida como a diversidade
da vida, isto é, a variedade de seres vivos que existem no planeta e
as relações que estabelecem entre si e com o meio que os cerca. As
paisagens alteradas por populações humanas e seus efeitos sobre
a criação de ecossistemas alterados deram origem ao conceito
de “antroma”, que será discutido neste capítulo. Também serão
abordadas as principais ameaças à biodiversidade, como a redução
histórica da riqueza de espécies e a homogeneização biótica, e
as principais incorreções e dificuldades existentes nas métricas
de biodiversidade do Antropoceno, apresentando-se, por fim,
perspectivas futuras para contornar essa problemática.
Durante a maior parte da história geológica da Terra,
os padrões de diversidade foram estruturados por fatores
ecológicos (como clima e interações) e histórico-geológicos
(como movimento de placas tectônicas e história evolutiva).
Um dos padrões de diversidade mais conhecidos é o gradien-
te latitudinal de diversidade, que indica que o número de es-
pécies varia conforme a latitude, sendo menor na região polar
e maior nos trópicos (Brown, 2014). Apesar de dezenas de hi-
póteses terem sido sugeridas para explicar esse gradiente
(Willig et al. 2003), uma das mais aceitas é a hipótese da pro-
dutividade, que sugere que a maior incidência solar na região
tropical determina maior disponibilidade de energia, produ-
tividade e biomassa, o que, por sua vez, favorece a manuten-
ção de mais espécies (Willig et al. 2003; Brown 2014).
Embora esse gradiente seja amplamente confirmado
para diversos grupos biológicos, de árvores a mamíferos, ele
não é universal. Constitui exemplo disso o fato de a riqueza
de espécies da fauna aquática que habita o fitotelma da planta
Sarracenia purpurea ser menor na região tropical (Buckley et
al. 2003). Já em ecossistemas marinhos, a hipótese mais pro-
vável para explicar o aumento da diversidade em regiões tro-
picais é a de heterogeneidade de hábitats (Gray 1997).
Outro padrão amplamente aceito e considerado lei na
Ecologia é a relação entre espécies e área, que foi formalizada
por MacArthur & Wilson (1967) em sua Teoria de Biogeografia
de Ilhas. Os autores sugeriram que ilhas maiores e mais pró-
ximas do continente (áreas fonte) possuem menor taxa de
extinção, maior taxa de colonização e, consequentemente,

86 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
maior riqueza de espécies. Em sua origem, essa teoria re-
presenta basicamente um processo neutro associado com
a distribuição das abundâncias das espécies (Volkov et al.
2003). Contudo, o desenvolvimento da proposta original de
MacArthur & Wilson (1967) acrescentou mecanismos bioló-
gicos que podem explicar esse padrão de diversidade. Por
exemplo, Chase et al. (2019) sugerem que ilhas maiores pos-
suem maior heterogeneidade de hábitats, o que, por sua vez,
favorece a agregação de mais indivíduos da mesma espécie e
aumenta a dissimilaridade da composição de espécies (isto é,
a diversidade beta).
Historicamente, biogeógrafos e ecólogos utilizam dados
sobre a riqueza e a composição da flora e da fauna (como
número de espécies endêmicas) para produzir mapas de clas-
sificação de biomas e ecorregiões (Olson et al. 2001; Spalding
et al. 2007; Abell et al. 2008). A partir de uma perspectiva teó-
rica, esses sistemas de classificação podem auxiliar a enten-
der os fatores ambientais que afetam a biodiversidade (Olson
et al. 2001), mas sua principal aplicabilidade é contribuir para
identificar áreas prioritárias para conservação, a exemplo das
extensas áreas de proteção ambiental estabelecidas no Indo-
Pacífico Central, conhecido por sua elevada biodiversidade
(Brander et al. 2020).

Neoecossistemas e antromas

Conforme discutido nos capítulos anteriores, o cresci-


mento populacional da espécie humana e as transformações

PADRÕES DE DIVERSIDADE NO ANTROPOCENO 87


no planeta impactam fortemente a biodiversidade. Estima-se
que, até o ano de 2000, cerca de 55% da superfície terrestre
já tinha sido extensivamente alterada pela ação humana (Ellis
et al. 2010). Os biomas terrestres mais severamente alterados
foram as pradarias, as savanas e as florestas tropicais decí-
duas, que tiveram grande parte de suas extensões conver-
tidas em pastos e lavouras (Ellis et al. 2010). Portanto, uma
compreensão mais aprofundada dos ecossistemas terrestres
deve levar em consideração essas modificações ocasionadas
pela presença humana.
Isso motivou geógrafos e ecólogos a criarem o termo
“antroma” para referir-se a regiões da superfície terres-
tre extensivamente alteradas pela ação humana (Ellis 2015).
Esses antromas, de acordo com Ellis et al. 2010, são classifi-
cados em seis níveis:
• Densos assentamentos humanos – ambientes ur-
banos ou com densidade populacional humana ≥
2.500/km2. Até o ano de 1700, apenas 0,01% da su-
perfície terrestre correspondia a esse antroma,
mas, com a aceleração do processo de urbanização,
esse índice passou para 0,04%.

• Vilarejos rurais – povoados rurais com densidades


populacionais ≥ 100/km2, cujas áreas são usadas,
principalmente, para a agricultura e a pecuária.
Esse antroma inclui a maior parte da Índia e do leste
da China, onde grande parte das populações sub-
sistem do cultivo de arroz.

88 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
• Lavouras – ambientes de baixa densidade popula-
cional extensivamente utilizados para a agricultura.
Grande parte das florestas temperadas decíduas da
Europa e das pradarias dos Estados Unidos foi con-
vertida nesse antroma.

• Campos de pastagem – ambientes com baixa densi-


dade populacional usado principalmente para a pe-
cuária. Esse foi o tipo de antroma que mais se ex-
pandiu nos últimos três séculos, passando de 3%
da superfície terrestre em 1700 para 26% no ano de
2000 e ocupando a maior parte da Austrália, do sul
do continente Africano, da região central da Ásia,
do México e do nordeste e do sudeste do Brasil.

• Áreas seminaturais – paisagens com baixa den-


sidade populacional, nas quais menos do que 20%
da superfície foi convertida em campos agrícolas
ou pastos. Esse antroma é encontrado nos trechos
mais habitados no interior da Floresta Amazônica,
no centro-oeste do continente africano e nos ar-
quipélagos da Indonésia e da Papua Nova-Guiné.

• Áreas naturais – correspondem a paisagens com


densidades populacionais muito baixas e cujos
biomas naturais foram pouco alterados. São encon-
trados em grande parte dos biomas de tundra e de
florestas boreais no Canadá e no norte da Europa,

PADRÕES DE DIVERSIDADE NO ANTROPOCENO 89


nos desertos do continente africano e em trechos
não habitados da Floresta Amazônica.

A perda de espécies e a homogeneização biótica (i.e.,


redução gradual de muitas espécies nativas por poucas es-
pécies nativas ou não-nativas - Mckinney & Lockwood 1999)
têm sido intensificadas durante o Antropoceno (Ellis 2015).
Mesmo em ecossistemas razoavelmente conservados, a bio-
diversidade é afetada pela ação humana, principalmente
pela fragmentação florestal (maior isolamento de fragmen-
tos florestais) e pela perda de hábitats (redução de grandes
áreas de florestas a pequenos fragmentos florestais). Sabe-
se, ainda, que a riqueza de espécies em ecossistemas naturais
é fortemente influenciada pela quantidade de hábitats dis-
poníveis para as populações (Fahrig 2013). Como resultado,
vários fragmentos pequenos de florestas podem abrigar um
número de espécies similar ao de um único fragmento grande
de tamanho correspondente ao somatório desses menores.
Porém, em paisagens muito fragmentadas e com pouca área
de floresta (especialmente em paisagens de alta intensida-
de agrícola), o número de espécies animais e vegetais é bem
menor do que o de suas paisagens originais (Fahrig 2003).
Além disso, o efeito da fragmentação pode ser mais forte em
determinados organismos. Por exemplo, animais de maior
porte, como felinos e primatas, podem ser mais vulneráveis
aos efeitos da fragmentação e da perda de hábitats, porque
requerem áreas maiores para manutenção da alimentação e
reprodução (Thornton & Branch 2011). Assim, esses animais

90 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
enfrentam riscos ao passarem de um fragmento ao outro ou
ao locomoverem-se nas bordas das florestas (faixas de tran-
sição entre as florestas e as paisagens antrópicas) (Thornton
& Branch 2011).
As atividades humanas desenvolvidas no entorno de
ecossistemas naturais afetam a biodiversidade. Fragmentos
de florestas tropicais que possuem em sua adjacência centros
urbanos ou campos de mineração podem ter menor número
de espécies de aves do que fragmentos que possuem campos
agrícolas na sua cercania (Kennedy et al. 2011). Isso aconte-
ce porque as áreas urbanas e de mineração funcionam como
uma barreira que dificulta a dispersão das aves (Kennedy et
al. 2011). Da mesma forma, os ecossistemas de rios e lagos
são afetados por efluentes domésticos ou agrícolas advindos
das ocupações humanas dos seus entornos. As comunida-
des de diatomáceas, por exemplo, são muito sensíveis a mu-
danças físico-químicas da água, sendo, por isso, empregadas
como bioindicadores de poluição aquática (Duong et al. 2007;
Tornés et al. 2018).
É importante salientar que há cada vez mais evidências
de que áreas identificadas como ecossistemas naturais (in-
cluindo aquelas classificadas dessa forma por Ellis et al. 2010)
podem ter sido alteradas por atividades humanas pretéritas
ou muito antigas (Levis et al. 2017, Wright 2017; Robinson et al.
2018). Nesse sentido, na Bacia Amazônica, durante o século
XX, a caça comercial pode ter sido responsável pelo declí-
nio das populações de várias espécies de animais aquáticos,
como o peixe-boi, a ariranha e o jacaré-açu (Antunes et al.

PADRÕES DE DIVERSIDADE NO ANTROPOCENO 91


2016). As consequências do declínio dessas populações sobre
os ecossistemas aquáticos ainda são desconhecidas (Antunes
et al. 2016). Além disso, achados arqueológicos indicam que
povos indígenas que habitaram a Floresta Amazônica há pelo
menos 8.000 anos podem ter alterado parcialmente a paisa-
gem da floresta, favorecendo a abundância de árvores úteis
(Levis et al. 2017).
Em ambientes dulciaquícolas, uma das maiores amea-
ças atuais consiste na poluição por efluentes domésticos e
agrícolas, que, por serem ricos em compostos contendo ni-
trogênio e fósforo, promovem o desenvolvimento massivo
de microalgas e cianobactérias, algumas capazes de produ-
zir compostos nocivos aos seres humanos (O’Neil et al. 2012).
Ademais, estudos laboratoriais e de campo mostram que o
aumento da temperatura favorece a proliferação das ciano-
bactérias, o que pode indicar que as mudanças climáticas in-
tensificarão esse problema (O’Neil et al. 2012). Como exemplo,
pode-se citar uma análise de 20 mananciais de abastecimen-
to público no semiárido brasileiro, que demonstrou em todos
eles a presença de proliferações perenes de cianobactérias,
inclusive com registro de hepatotoxinas e neurotoxinas na
água (Barros et al. 2019).
Ambientes marinhos, por sua vez, são extensivamente
ameaçados pela indústria pesqueira, estimando-se, de 1977
até o final dos anos 2000, uma redução de cerca de 10% da
biomassa total dos estoques pesqueiros marinhos (Worm et
al. 2009). A região do Atlântico Norte Temperado (que inclui
a costa europeia e o leste dos Estados Unidos e do Canadá)

92 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
destaca-se como a área com maior intensidade de pesca do
mundo (Worm et al. 2009). As indústrias pesqueiras do leste
do Canadá, por exemplo, enfrentam colapso na biomassa de
mais de 50% das espécies pescadas na região (Worm et al.
2009), o que tem alterado drasticamente a cadeia alimentar.
A redução da abundância de populações de peixes bentôni-
cos (os principais alvos da atividade pesqueira local) resultou
no aumento da abundância de peixes pelágicos pequenos e
de macroinvertebrados (Frank et al. 2005). Como consequên-
cia, a comunidade de zooplâncton passou a ser dominada por
organismos menores, o que pode ter acarretado um aumen-
to da produtividade primária na região (Frank et al. 2005).
Assim, torna-se claro como a atividade pesqueira pode afetar
todo o funcionamento dos ecossistemas marinhos.
Uma vez que as mudanças climáticas são uma das al-
terações ambientais mais graves do Antropoceno, cientistas
têm usado ferramentas computacionais para predizer de que
forma o aumento na emissão de gases de efeito estufa afeta-
rá os padrões de diversidade (Borzée et al. 2019; Lourenço-
de-Moraes et al. 2019; Oliveira et al. 2019). Com base nessas
ferramentas, há evidências, por exemplo, de que o coral-cé-
rebro (Mussismilia harttii), comum na costa nordeste e su-
deste do Brasil, apresentará substancial mudança em sua
área de distribuição (Oliveira et al. 2019). Estima-se que, até
o final do século XXI, as mudanças climáticas podem fazer
com que esse coral perca aproximadamente 50% do seu há-
bitat atual e migre para zonas mais profundas no sudeste do
Brasil (Oliveira et al. 2019). Tais achados reforçam, assim, a

PADRÕES DE DIVERSIDADE NO ANTROPOCENO 93


necessidade de criação de unidades de conservação mari-
nhas no Brasil.
Esse breve apanhado sobre os padrões de diversidade
no Antropoceno demonstra algumas das principais ativida-
des humanas que afetam os ecossistemas da superfície ter-
restre. Portanto, mudanças nas posturas políticas globais são
necessárias para enfrentar esses problemas e tentar conciliar
o desenvolvimento econômico com a conservação dos ecos-
sistemas e a manutenção da biodiversidade.

Referências
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96 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
SOBRE OS AUTORES

Ana Claudia Batista Souza – Doutoranda pelo Programa de


Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento,
Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro. Mestra pelo Programa de Pós-Graduação de
Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal
de Sergipe. Tem interesse sobre as temáticas relacionadas à
valoração ambiental e aos impactos sociais dos megaprojetos.

Anderson Silva Pinto – Doutorando pelo Programa de Pós-


Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza da
Universidade Federal Rural de Pernambuco. Mestre pelo
Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Conservação da
Universidade Estadual da Paraíba. Biólogo pela Universidade
Estadual da Paraíba. Pesquisador associado ao Laboratório
de Ecologia Neotropical da Universidade Estadual da Paraíba.
Desenvolve estudos sobre ecologia, etnobotânica e conserva-
ção de fragmentos florestais do nordeste do Brasil, com ênfase
nos aspectos evolutivos e funcionais desses ecossistemas.

Arthur Ramalho Magalhães – Doutorando pelo Programa de


Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Pesquisador
associado ao Laboratório de Síntese Ecológica e Conservação
da Biodiversidade da Universidade Federal Rural de
Pernambuco. Interessa-se em compreender como variáveis

SOBRE OS AUTORES 97
ambientais e climáticas influenciam o risco de doenças em
diferentes escalas.

Catarina Leite Gurgel – Mestra pelo Programa de Pós-


Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza da
Universidade Federal Rural de Pernambuco. Busca compreen-
der a relação entre as pessoas, o conhecimento e a utilização
de plantas medicinais para tratar enfermidades que acome-
tem animais domésticos, com vistas ao potencial etnofarma-
cológico dessas espécies como alternativas de tratamento.

Cicera Janaine Camilo – Doutoranda pelo Programa de Pós-


Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza da
Universidade Federal Rural de Pernambuco. Pesquisadora
associada ao Laboratório de Pesquisa de Produtos Naturais
da Universidade Regional do Cariri. Atua nas áreas de
Farmacognosia, Química de Produtos Naturais, Bromatologia,
Microbiologia Aplicada a Produtos Naturais e Antioxidantes
Naturais.

Emily Cavalcanti de Souza – Mestranda pelo Programa de


Biologia Vegetal da Universidade Federal de Pernambuco.
Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal
Rural de Pernambuco. Atualmente faz parte do grupo de pes-
quisa do Laboratório de Fisiologia Vegetal da Universidade
Federal Rural de Pernambuco. Tem experiência nas áreas de
Botânica, Ecologia e Educação Ambiental.

98 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO
Ezequiel Leandro da Silva Júnior - Graduado em Ciências
Biológicas (Licenciatura) pela Universidade Federal Rural de
Pernambuco.

Flávia Regina Domingos – Mestra pelo Programa de Pós-


Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Analista
Ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Natureza. Tem interesse em pesquisas nos temas de etnoe-
cologia e etnoconservação de plantas medicinais.

Joelson Moreno Brito de Moura – Doutorando pelo Programa


de Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Tem como in-
teresse científico a compreensão dos processos que contribuí-
ram para a evolução da mente humana. Para isso, trabalha na
perspectiva da Etnobiologia Evolutiva, que aborda a influência
do passado evolutivo sobre o comportamento humano atual e
sobre a relação entre as pessoas e seus ambientes.

José Djalma de Souza – Mestrando pelo Programa de


Biologia Vegetal da Universidade Federal de Pernambuco.
Graduado em Licenciatura Plena em Ciências Biológicas
pela Universidade Federal Rural de Pernambuco. Atualmente
faz parte do grupo de pesquisa do Laboratório de Fisiologia
Vegetal da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Tem
experiência nas áreas de Educação, Botânica, Ecologia,
Ecofisiologia e Fisiologia Vegetal.

SOBRE OS AUTORES 99
Julimery Gonçalves Ferreira Macedo – Doutoranda pelo
Programa de Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação
da Natureza da Universidade Federal Rural de Pernambuco.
Mestra em Bioprospecção Molecular pela Universidade
Regional do Cariri. Bacharela em Ciências Biológicas
pela Universidade Regional do Cariri. É colaboradora no
Laboratório de Ecologia Vegetal da Universidade Regional
do Cariri, desenvolvendo pesquisas na área de Etnobiologia e
Química de Produtos Naturais, com ênfase em etnobotânica
de plantas medicinais e metabólicos secundários com ativi-
dades biológicas.

Kamila Marques Pedrosa – Doutoranda pelo Programa de


Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Pesquisadora
associada ao Laboratório de Ecologia Neotropical da
Universidade Estadual da Paraíba. Tem interesse em etnobo-
tânica e no uso diferencial de plantas por populações huma-
nas que vivem em Florestas Secas.

Luane Maria Melo Azeredo – Doutoranda pelo Programa de


Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Pesquisadora
associada ao grupo de Etnozoologia da Universidade Estadual
da Paraíba. Professora da Educação Básica da Prefeitura
Municipal de Pilõezinhos. Atua na área de Etnozoologia, ava-
liando o interesse da população brasileira em aves silvestres
como pets e observando o efeito do comércio na modificação

100 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO


da distribuição dessas espécies. Tem interesse em modela-
gens de nicho ecológico, big data e ferramentas computacio-
nais que auxiliem na compreensão e avaliação de tendências
sobre o comércio de animais silvestres e outros tópicos liga-
dos à conservação.

Luciana Soares Lima – Doutoranda pelo Programa de Pós-


Graduação em Biologia Vegetal da Universidade Federal de
Pernambuco. Mestra em Biologia Vegetal pela Universidade
Federal de Pernambuco. Bacharela e licenciada em Ciências
Biológicas pela Universidade Federal do Maranhão. Atua nos
temas de biologia floral, sistema reprodutivo de angiosper-
mas, heterostilia (tristilia e distilia) e polinização. Tem ex-
periência na área de Botânica e Ecologia, com ênfase em
Ecologia Vegetal.

Macelly Correia Medeiros – Doutoranda pelo Programa de


Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Técnica
de Laboratório de Biologia pela Universidade Estadual da
Paraíba. Atua na área de Etnobiologia de ecossistemas cos-
teiros e marinhos, estudando o conhecimento e a relação de
pescadoras e pescadores com os recursos e os ambientes
explorados.

Maria de Oliveira Santos – Doutoranda pelo Programa de


Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Mestra em

SOBRE OS AUTORES 101


Bioprospecção Molecular e Graduada em Ciências Biológicas
(bacharelado e licenciatura) pela Universidade Regional
do Cariri. Membro do Grupo de Pesquisa do Laboratório
de Ecologia Vegetal da Universidade Federal Rural de
Pernambuco. Tem experiência na área de Botânica e Química
Biológica, com ênfase em etnobotânica, fenologia e óleos
essenciais.

Marleny Prada De La Cruz – Mestranda pelo Programa de


Pós-Graduação em Biologia Vegetal da Universidade Federal
de Pernambuco. Colaboradora do Herbário San Cristóbal de
Huamanga (Ayacucho-Perú). Tem interesse em entender as
relações dos seres humanos com os recursos naturais, espe-
cialmente em comunidades indígenas.

Mirela Natália Santos – Doutoranda pelo Programa de Pós-


Graduação em Biologia Vegetal da Universidade Federal
de Pernambuco. Pesquisadora associada ao Laboratório
de Ecologia e Evolução de Sistemas Socioecológicos da
Universidade Federal de Pernambuco. Mestra em Botânica
pela Universidade Federal Rural de Pernambuco. Tem inte-
resse em compreender os processos que modulam a relação
entre pessoas e o uso dos recursos naturais.

Moacyr Xavier Gomes da Silva – Mestre pelo Programa de


Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Tem interesse
direcionado a compreender as relações dos seres humanos

102 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO


com a natureza, especialmente em ambientes urbanos, utili-
zando os sistemas cognitivos.

Paulo Henrique Santos Gonçalves – Doutor em Ciências


Biológicas pelo Programa de Pós-Graduação em Diversidade
Biológica e Conservação nos Trópicos da Universidade
Federal de Alagoas. Tem amplo interesse em conservação da
biodiversidade e em uso sustentável de recursos florestais
(em especial, de produtos florestais madeireiros).

Paulo Wanderley de Melo – Mestre pelo Programa de Pós-


Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza da
Universidade Federal Rural de Pernambuco. Tem interes-
se em pesquisas nos temas de etnoecologia, etnoconserva-
ção e conservação biocultural em populações de pescadores
artesanais.

Risoneide Henriques da Silva – Doutoranda pelo Programa de


Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Pesquisadora
associada ao Laboratório de Ecologia e Evolução de Sistemas
Socioecológicos da Universidade Federal de Pernambuco.
Interessa-se em entender como a mente humana evoluiu e
funciona atualmente para resolver diferentes desafios am-
bientais e como isso auxilia a explicar o comportamento
humano na natureza.

SOBRE OS AUTORES 103


Samara Feitosa Oliveira – Doutoranda pelo Programa de
Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza
da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Mestra
em Bioprospecção Molecular pela Universidade Regional
do Cariri. Bacharela e licenciada em Ciências Biológicas
pela Universidade Regional do Cariri. É colaboradora no
Laboratório de Botânica da Universidade Regional do
Cariri, desenvolvendo pesquisas na área de Etnobiologia e
Conservação Ambiental, com ênfase em etnobotânica de
plantas medicinais e fitossociologia aplicada à conservação.

104 INTRODUÇÃO AO ANTROPOCENO


OUTRAS OBRAS DE INTERESSE

Breve introdução à
Etnobiologia Evolutiva
https://drive.google.com/file/d/1P3J5lrZOeq4hM8
NGdAzMwJwvDJY446J4/view?usp=sharing

Métodos de pesquisa qualitativa


para Etnobiologia
https://drive.google.com/file/
d/1pTrptKidrPV2-e8QrduJW4rk9xz3fU3_/
view?usp=sharing
Sobre o livro
Formato 15 x 21 cm
Tipologia Lora (texto)
Fedra Sans e Lato (títulos)
Papel Pólen 80g/m2 (miolo)
Supremo 250g/m2 (capa)
Fotos Unsplash e Shutterstock
Apoio

ANOS ANOS
1992 2022 1992 2022

1992 2022

Programa de Pós-graduação em
Etnobiologia e Conservação da Natureza
10 ANOS • 2012-2022

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ISBN 978-65-88020-09-8

9 7 8 6 5 8 8 0 2 0 0 9 8
www.nupeea.com

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